4ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA 55 ª LEGISLATURA
Comissão de Legislação Participativa
(Reunião Deliberativa Extraordinária)
Em 12 de Junho de 2018 (Terça-Feira)
às 13 horas
Horário (Texto com redação final.)
14:40
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O SR. PRESIDENTE (Glauber Braga. PSOL - RJ) - Havendo número regimental, declaro abertos os trabalhos da 14ª Reunião da Comissão de Legislação Participativa.
Boa tarde a todas e a todos os presentes.
Passamos agora à audiência pública convocada para debater a digitalização de documentos em mídia ótica ou eletrônica, que também se encontra em discussão no Projeto de Lei nº 7.920, de 2017, em tramitação nesta Casa.
Esta audiência pública está sendo realizada em atendimento à Sugestão nº 107, de 2017, da CLP, da Associação dos Servidores do Arquivo Nacional, aprovada em 10 de outubro de 2017.
Informo que o conteúdo da audiência está sendo gravado e transmitido ao vivo.
O material desta reunião vai ser disponibilizado em áudio e vídeo na página da Comissão de Legislação Participativa da Câmara dos Deputados, www.camara.leg.br/clp.
Comunico que esta atividade também faz parte de um bate-papo virtual em tempo real, possibilitando aos cidadãos interagirem com os Deputados e as entidades por meio de perguntas ou considerações, que pode ser acessado pelo link edemocracia.camara.leg.br/.
Convido para compor a mesa o Sr. André Gustavo de Melo Araújo, professor da Universidade de Brasília — UnB, representando a Associação Nacional de História. (Palmas.)
Convido também a Sra. Ívina Flores Melo Kuroki, arquivista doutoranda em Ciência da Informação pela UnB. (Palmas.)
Convido o Sr. Rodrigo Cavaliere Mourelle, Presidente da Associação dos Servidores do Arquivo Nacional. (Palmas.)
Convido a Sra. Tânia Maria de Moura Pereira, arquivista e doutoranda em Ciência da Informação. (Palmas.)
Convido ainda o Sr. Erlando da Silva Rêses, professor da Universidade de Brasília e membro da Diretoria do Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior. (Palmas.)
Comunico as regras de condução para a realização dos debates.
Cada palestrante deve limitar-se ao tema em debate e vai dispor de 20 minutos para sua exposição. Ao final das exposições, vamos iniciar os debates, passando a palavra primeiramente aos Parlamentares inscritos e depois aos demais participantes inscritos.
Vou começar passando a palavra à Sra. Ívina Flores Melo Kuroki, arquivista e doutoranda em Ciência da Informação pela UnB.
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A SRA. ÍVINA FLORES MELO KUROKI - Boa tarde a todos.
Boa tarde, meus colegas de profissão.
Estou um pouco rouca hoje. Desculpem-me.
Boa tarde, meus colegas pesquisadores da área de arquivo.
Boa tarde, Exmo. Deputado Glauber Braga.
Agradeço de antemão a oportunidade dada à nossa comunidade de se expressar com relação a um tema tão importante para nós.
Hoje eu venho aqui falar não só como pesquisadora, mas também como arquivista, como servidora pública, como professora da Universidade de Brasília e como cidadã.
Peço desculpas, Deputado, se em alguns momentos a fala for um pouco acalorada ou aguerrida, mas é porque o tema é muito caro para nós, é um tema muito sensível, objeto da nossa profissão.
Para nós, os arquivos são muito caros, são objetos da nossa profissão, são fruto das nossas atividades, do nosso dia a dia. É onde o Estado registra suas ações, onde há registros contundentes do espelho da nossa sociedade. Estão lá nos arquivos a história, a história do que fomos, a história do que somos e a história do que seremos.
Bom, para contextualizar a minha fala, que não vai ser muito longa, quero dizer que, entre os anos 60 e os anos 80, o Arquivo Nacional investiu em alguns movimentos para a institucionalização dos arquivos no Brasil. Eles já existiam, mas havia necessidade de uma consolidação mais robusta do assunto. Foram trazidos alguns especialistas internacionais, alguns renomados nomes da arquivologia internacional — americana, canadense, francesa —, de grandes polos de arquivologia, de grandes escolas. E eles trouxeram contribuições robustas, sobretudo para a regulamentação. Um dos regulamentos que surgiram foi a Lei nº 6.546, que regula a profissão de arquivista e de técnico em arquivo. Essa lei foi publicada em 1978 e este mês completou 40 anos. Ao longo desses 40 anos, nós arquivistas e técnicos de arquivo lutamos diariamente nos nossos arquivos pela gestão de documentos. Não é uma luta fácil, é uma luta que sofre com falta de recursos, com falta de apoio, com falta de apoio político-institucional das instituições em que nós trabalhamos.
O Arquivo Nacional realizou um diagnóstico e o apresentou, em 5 de julho, na reunião do Sistema de Gestão de Documentos de Arquivo — SIGA. Para se ter uma ideia, esse estudo demonstrou que 72% dos órgãos da administração pública direta não possuem área de arquivo em seus organogramas. Esse dado demonstra o quão negligenciados têm sido os arquivos como um todo. E isso gera consequências, o.k.?
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Bom, quando a instituição tem uma área de arquivo estabelecida, essa área está em posições hierárquicas não muito privilegiadas, posicionada em locais em que não deveria estar. Por exemplo, num Ministério, a área de arquivo está vinculada à área de manutenção predial. Não têm muita relação, certo? Mas, na verdade, isso demonstra que os arquivos não são vistos como área estratégica ou assunto estratégico dentro das instituições.
Esse mesmo estudo do Arquivo Nacional classificou as instituições em cinco níveis de maturidade de gestão de documentos e de arquivos, em que o zero representa inexistente, ou seja, que não há gestão no órgão, e 5 representa que o órgão possui uma gestão de excelência. Nenhum órgão está nos níveis 4 e 5. Apenas 3% se apresentam no nível 3; no nível 2, estão 44%; no nível 1, estão 15%; e 39% estão no nível zero, ou seja, sem condições mínimas para que o profissional de arquivo efetue a gestão de documentos. O nível zero representa que a instituição não tem controle sobre a tramitação e a produção documental. Ou seja, os documentos são produzidos ao bel-prazer do administrador, do produtor, sem padrão, sem orientação. E a ausência de políticas nesses órgãos nível zero com relação aos arquivos denota que há clara falta de conhecimento da área, de técnica e de responsabilidade. Afinal, o arquivo é patrimônio brasileiro.
Mas como gerir uma área que sofre com tamanha negligência, uma área esquecida em garagens e depósitos? Porque é ali que estão os arquivos, geralmente. É uma área que tem dificuldades sérias de ser escutada. Como fazer uma gestão efetiva em cenário tão desfavorável, com indicadores que demonstram o baixo comprometimento das altas gestões?
Um só limão, Deputado, não faz limonada. Precisamos de mais. Precisamos de mais seriedade por parte de todos ao olharem os arquivos. Documentos públicos não são lixo nem papel velho. Essa é uma retórica muito comum entre aqueles que, veladamente, querem que os arquivos desapareçam e que os cidadãos se sirvam de opacidade, que não tenhamos transparência nas nossas ações públicas.
Pois bem. Todos esses anos de esquecimento e negligência por parte dos governantes resultaram, sem dúvida, em massas documentais. Documentos de toda ordem, que registram todo tipo de função estatal, essas massas documentais sem organização representam, de acordo com a pesquisa do Arquivo Nacional, algo em torno de 50% dos acervos públicos.
Essas massas que nós arquivistas chamamos de "massas documentais acumuladas" geram gastos, sim, não podemos negar, custos que perpassam por aluguel, luz, água, manutenção, segurança, servidores para cuidarem delas. Enfim, gastos de manutenção.
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Todavia, o que não foi levado em consideração na proposta do projeto de lei é que esses gastos podem diminuir drasticamente, desde que a gestão de documentos seja implementada.
O mesmo estudo do Arquivo Nacional que citei anteriormente fez um levantamento dos custos que os Ministérios geram — só os Ministérios, não as secretarias que têm status de Ministério — com o armazenamento de documentos físicos. Esse custo é de 10 milhões de reais por ano. O mesmo estudo solicitou informações sobre digitalização. Os Ministérios já gastaram em torno de 11 milhões. Só que esses 11 milhões foram gastos para digitalizar apenas 10% do acervo total deles. Então, se há 90% ainda a ser digitalizado, nós estamos falando de mais 99 milhões de reais a serem gastos com digitalização. Esses mesmos 99 milhões seriam suficientes para custear 10 anos de armazenagem de documentos físicos, se os documentos físicos permanecessem da maneira como estão, sem tratamento, negligenciados.
Esse custo que eu mencionei não inclui servidores, infraestrutura de TI, técnicos especializados para gerir essas infraestruturas, locais de armazenagem dos servidores, que são salas-cofres climatizadas, o que, aproximadamente, somaria mais 12 milhões por Pasta ou 1 milhão por mês. Ao final de 1 ano, teríamos 288 milhões de reais de gastos públicos com armazenamento de digitalizações.
Com a demonstração desse raciocínio, seria mesmo a digitalização um processo viável? Seria o projeto de PL um equívoco ou uma tentativa de contratações desnecessárias? Ou, ainda, seria um incentivo a gastos públicos indevidos? Deixo as perguntas.
Se houvesse o investimento necessário e apoio político-institucional para a gestão efetiva de documentos, nos mesmos 10 anos que mencionei, teríamos massas documentais já organizadas. E, quando falo de gestão de documentos e massas documentais, eu me refiro ao ciclo de gestão de documentos previsto na Lei 8.159, a Lei dos Arquivos, que dispõe sobre a política nacional de arquivos públicos e privados. A lei traz subsídios sobre as temporalidades definidas para que os documentos sejam eliminados. Pois é, não guardamos tudo.
Eu escutei, antes do início da audiência, alguns senhores falarem que hoje viriam algumas pessoas que têm mania de guardar documento. Pois é, não guardamos tudo, só guardamos o que é necessário, o que está na legislação, o que deve ficar um pouco mais na instituição. Alguns documentos são guardados permanentemente, sim, e são eles documentos históricos, que registram a memória do País. Muitos arquivos nacionais no mundo têm uma cultura já bastante instituída. Inclusive, neles há conselhos a fazerem pesquisas para verificar o quão maduros estão em gestão de documentos.
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Temporalidade é algo que, em se tratando das discussões que vimos acompanhando aqui no desenvolvimento do PL, entristece muito a comunidade arquivista. Nós escutamos alguns despautérios do tipo “elimina o documento em 2 ou 5 anos”. Para vocês terem conhecimento, documentos fiscais ou aqueles que geram despesas nos órgãos permanecem neles, por motivos legais, fiscais, por aproximadamente 15 anos após a aprovação de contas. Contas aprovadas, anos passados, eles são eliminados com muita tranquilidade.
A temporalidade não foi definida aleatoriamente, na cabeça de um arquivista que queria guardar tudo, como eu escutei hoje mais cedo. Ela foi definida por uma resolução do Conselho Nacional de Arquivos, vinculado ao Arquivo Nacional, a Resolução n° 14, e foi estudada minuciosamente por um grupo disciplinar que levou em consideração toda a legislação brasileira — Código Penal, Código Civil —, para garantir que todos os documentos cumpram seu papel de prova nas ações governamentais que de algum modo geram consequências para a nossa sociedade. A correta temporalização dos documentos e a sua manutenção pelos prazos que se lhes competem também resguardam o direito do cidadão e a comprovação dos serviços públicos na garantia dos princípios e pressupostos constitucionais.
Valor de prova é uma das finalidades do arquivo. Gostaria de destacar que o valor de prova acontece a partir de documentos originais. A digitalização, senhores, não torna um documento original. A digitalização seria mais como fotocópia. Como leigos chamam, seria uma xérox. Então, em uma conclusão simplista do que venho falando, trocaríamos documentos originais por cópias e utilizaríamos essas cópias para provar as mais diversas atividades e funções do Estado.
Outra questão a ser pontuada é a da durabilidade das digitalizações. Duas semanas atrás, um Ministério — eu não vou dizer qual, para não expor as pessoas que ali trabalham e gerem a Pasta — perdeu um banco de dados inteiro. Após inúmeras tentativas de recuperação das informações e dos dados nele contidos, não conseguiram, e tudo o que havia lá foi perdido. O servidor do banco de dados hospedava o site, o portal do Ministério. Então, tudo o que tinha entrado ali, de janeiro a junho, o período que aquele banco de dados guardava, foi perdido.
Pergunto a vocês: se acontecesse o mesmo com os servidores que armazenassem as digitalizações, teríamos perdido todo o acervo da instituição, teríamos perdido toda a história, toda a prova? E, se ocorresse uma auditoria, como é que o gestor iria provar o que fez e o que não fez, o que gastou e o que não gastou?
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E ainda, se alguém, de maneira criminosa, apagasse ou destruísse um banco de dados? Ainda que essa pessoa fosse penalizada, a informação estaria irrecuperável, os dados, perdidos, ilegíveis.
Gostaria que V.Exa. percebesse a seriedade da publicação de um normativo que permita a queima de arquivos, porque não há outro termo que possa denotar o que vem sendo articulado.
Termino a minha fala indicando que o melhor caminho é o arquivamento do PL e que V.Exa. e os demais Deputados que estão à frente do PL se debrucem sobre articulações que objetivem, com o apoio do Arquivo Nacional, a instituição arquivística oficial do Brasil no assunto, buscar formas de viabilizar a gestão de documentos, a avaliação e o descarte com as normas já existentes. Que haja responsabilização e sanções para a negligência que estamos sofrendo. Que possamos ultrapassar o limiar da empiria.
A digitalização não resolverá o problema das massas documentais, será apenas um placebo de longa data que cresce no coração do País. Precisamos de gestão documental. Como disse no início da minha fala, documentos são evidências de memória, não são apenas papéis e depósitos. Causa-me estranheza acreditar que um dia, se o PL passar, o Brasil será, infelizmente, um país desmemoriado.
Muito obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Glauber Braga. PSOL - RJ) - Muito obrigado, Ívina.
Passo a palavra, imediatamente, ao Sr. Rodrigo Cavaliere Mourelle, Presidente da Associação dos Servidores do Arquivo Nacional — ASSAN.
O SR. RODRIGO CAVALIERE MOURELLE - Em primeiro lugar, quero elogiar a realização desta audiência pública. Quem dera que na discussão de todos os temas de maior relevância a sociedade pudesse ser ouvida, como nesta ocasião.
Queria ressaltar que integram a Mesa, além do Deputado Glauber Braga, que preside esta reunião, diversas pessoas que podem dar diferentes contribuições acerca do tema da digitalização, em especial do Projeto de Lei nº 7.920, de 2017, que motivou a nossa sugestão, da Associação dos Servidores do Arquivo Nacional, de realização de audiência pública: o Prof. André Gustavo, representando aqui a Associação Nacional de História — ANPUH; a Ívina, arquivista e doutoranda na UnB; a Tânia, arquivista e doutoranda, representando aqui também o Fórum Nacional das Associações de Arquivologia do Brasil — FNARQ; o Prof. Erlando, professor da UnB, representando aqui o Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior — ANDES; e eu, aqui representando os servidores do Arquivo Nacional como Presidente da Associação dos Servidores do Arquivo Nacional — ASSAN.
Bem, esse projeto dispõe sobre a digitalização de documentos em mídia ótica ou eletrônica e prevê a eliminação dos documentos originais após essa digitalização, sob a ideia incorreta de que a documentação seria reduzida, bem como os custos com sua guarda e preservação. O processo de digitalização depende de meios tecnológicos e não garante a segurança na armazenagem, não confere autenticidade ao documento, que pode ser alterado sem mais poder recorrer-se à contraprova com o documento original em formato analógico, uma vez digitalizado e destruído o original, e fere princípios da arquivologia e da diplomática.
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Além do mais, como muito bem colocou a Ívina, apresenta custos tão ou mais elevados de guarda e preservação por demandar atualizações tecnológicas, transferências de mídia e reformatações.
Do mesmo modo, o projeto permite a cartórios e empresas privadas realizar essas digitalizações e conferir a certificação dos documentos, o que fere a Lei de Arquivos e transfere o papel do Estado, através dos arquivos públicos, para a iniciativa privada.
A deliberação do Conselho Nacional de Arquivos — CONARQ, ligado ao Arquivo Nacional e ao Ministério da Justiça, pelo arquivamento do então Projeto de Lei do Senado nº 146, de 2007 — já então apelidado de "PLS da Queima de Arquivo" —, foi ignorada no Senado Federal. Foi desconsiderada e esvaziada a importância política e técnica do CONARQ, formado por representantes do próprio poder público e da sociedade civil como um todo.
Esse PL conta com diversas notas, manifestações e moções contrárias de várias entidades da comunidade arquivística, sindicatos de profissionais de memória e de servidores, como o Fórum Nacional das Associações de Arquivologia do Brasil — FNARQ, aqui representado pela Tânia; o Fórum Nacional de Ensino e Pesquisa em Arquivologia — FEPARQ; a Rede Nacional de Arquivistas das Instituições Federais de Ensino Superior — ARQUIFES; a Associação Nacional de História — ANPUH; a Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais — ANPOCS; a Associação Brasileira de Antropologia — ABA; a Associação Brasileira de Educação em Ciência da Informação — ABECIN; a Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ciência da Informação — ANCIB; a Associação Brasileira de Pesquisadores em História Econômica — ABPHE; a Associação Brasileira de Preservação Audiovisual — ABPA; a Executiva Nacional dos Estudantes de Arquivologia — ENEA; o Curso de Arquivologia da Universidade Federal de Santa Maria; o Grupo de Pesquisa CNPq UFSM Ged/A; o Grupo Tortura Nunca Mais; a Fundação Pedro Calmon; a Fundação Estudos Políticos, Econômicos e Sociais Dinarco Reis — FDR; o Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior — ANDES, aqui representado pelo Prof. Erlando; a Auditoria Cidadã da Dívida; o Sindicato dos Servidores de Ciência, Tecnologia, Produção e Inovação em Saúde Pública — ASFOC; o Sindicato dos Trabalhadores do Judiciário Federal no Rio Grande do Sul — SINTRAJUFE/RS; a Associação dos Servidores da Fundação Biblioteca Nacional — ASBN; o Movimento Luta de Classes — MLC e o Centro de Documentação e Pesquisa do Conselho Seccional do Rio de Janeiro da Ordem dos Advogados do Brasil — CDP-OAB/RJ.
Citei todas para vocês terem uma ideia da quantidade de entidades que se manifestaram contrariamente a esse projeto, além do próprio CONARQ, como eu disse no início.
Na nossa avaliação, esse projeto tem pelo menos três graves problemas.
O primeiro problema está relacionado à questão da segurança. Não há garantia nenhuma de que o suporte digital seja uma maneira segura de armazenamento de informações, levando-se em conta a obsolescência dos formatos digitais proprietários e das mídias. A evolução dos formatos e suportes digitais pode tornar impossível ou de custo muito alto a recuperação da informação no longo prazo.
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O segundo é relativo à autenticidade do documento. O então PLS 146, agora PL 7.920, prevê a eliminação física do documento original após a sua reprodução em meio digital. A garantia de autenticidade de um documento depende de vários preceitos teóricos da arquivologia da diplomática. A digitalização prevista no projeto ignora esses fundamentos e confere à certificação digital uma falsa ideia de autenticidade. Além disso, o PLS 146, agora PL 7.920, despreza a possibilidade real de adulterações nos documentos digitais, que seriam impossíveis de ser verificadas caso os documentos que deram origem a eles tenham sido destruídos.
No nosso entender, o terceiro e mais grave problema é a justificativa de que se faz necessário diminuir a quantidade documentos para que se possa economizar na guarda e preservação dos mesmos, como bem colocou a apresentação da Ívina. Isso é uma falácia tremenda.
O armazenamento de documentação digital é tão ou mais custoso do que o dos documentos analógicos. E as constantes atualizações, transferências de mídia e reformatações são processos também custosos e difíceis. Na realidade, esse projeto pode representar um aumento muito grande no custo de armazenamento e de preservação de documentos. O valor seria repassado a cartórios e a empresas privadas, que, necessariamente, cobrariam por isso.
Além dos problemas técnicos, no que tange à Arquivologia e ao Direito, e das falácias, no que diz respeito à economia de recursos públicos e ao risco real de perda de informações — por isso o apelido de queima de arquivo, muito bem apresentado no manifesto do qual a ASSAN é signatária e está disponível na Internet —, entendemos que um dos pontos-chave que explica a existência do projeto em si e o lobby pela sua aprovação é o interesse político na transferência de atividades hoje públicas para a iniciativa privada. Percebemos tal proposta como mais uma entre tantas frentes do Governo Federal para privatizar atividades públicas potencialmente geradoras de lucros.
Na verdade, essa é mais uma medida neoliberal do processo de desmanche do Estado planejado pelo Governo Temer. O PL pretende privatizar os procedimentos de reprodução, autenticação e certificação de documentos públicos, uma vez que empresas privadas e cartórios seriam credenciados para realizar essas atividades, o que fere a Lei de Arquivos e atenta contra o papel do Arquivo Nacional e das demais instituições custodiadoras de documentos.
Atualmente, a guarda, a preservação, a digitalização e a reprodução de um documento público, bem como a autenticação de sua cópia como fiel ao original, seja em ambiente analógico ou virtual, são responsabilidade dos órgãos públicos, em especial dos arquivos públicos em qualquer esfera.
Nesse sentido, para entender melhor o PL 7.920, precisamos compreender a sua relação dialética com tudo o que o Arquivo Nacional passou, principalmente no ano de 2017, mesmo ano em que o PLS 146/07 passou a ser o PL 7.920/17.
O Arquivo Nacional é uma das mais antigas instituições do Estado brasileiro. Com recém-completados 180 anos de existência, é a maior instituição arquivística da América Latina, um dos principais guardiões da história, memória e cultura nacionais, órgão cabeça do Sistema de Gestão de Documentos de Arquivo do País e responsável por emanar orientações técnicas a toda a administração pública federal.
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Por força de lei, todo documento público, para ser descartado, precisa da aprovação do Arquivo Nacional. Esse projeto de lei transformaria o Arquivo Nacional, cujo trabalho é referência de excelência, em mero detentor de documentos permanentes, diminuindo sua importância e suas atribuições, que poderiam ser realizadas por cartórios e empresas privadas, sem instituir critérios técnicos e sem a garantia de qualidade de serviços hoje presente no Arquivo Nacional, além de cobrar por eles.
Para tanto, o Governo, recentemente, tem empreendido um ataque ao Arquivo Nacional, cortando verbas, que quase fizeram fechar as portas do Arquivo Nacional no ano passado, e permitindo perdas brutais na aposentadoria dos seus servidores, o que impede o já envelhecido quadro de funcionários do órgão de se aposentar e de se renovar através de concurso público.
Para vocês terem uma ideia, hoje um em cada três servidores do Arquivo Nacional já tem idade para se aposentar, já está em abono permanência. Em 10 anos, esse número vai crescer para cerca de 60%. Ou seja, daqui 10 anos o Arquivo Nacional pode ter apenas 40% dos servidores que tem hoje. E o Governo tem usado o cargo de Diretor-Geral, que consequentemente é o Presidente do CONARQ, como determina a Lei de Arquivos, como moeda de troca no jogo político, fazendo com que, no ano passado, em 2017, o Arquivo Nacional tivesse três diretores-gerais diferentes.
Recentemente, os dois últimos boletins da ASSAN — de maio e de junho — denunciaram essa desvalorização das atividades-fim por excelência do órgão, no que tange ao tratamento técnico da documentação permanente por ele custodiada, exatamente no mesmo sentido da desvalorização das atividades públicas que o PL aponta e no momento mundial de valorização da informação.
Se o PL, por um lado, aponta no sentido de transferir atividades públicas realizadas essencialmente por arquivos públicos para iniciativas privadas, isso, de alguma forma, já está sendo feito. Já estão sucateando o Arquivo Nacional e reduzindo as ações das suas atividades-fim na preservação e no tratamento técnico da documentação. Já estão empreendendo um esforço no sentido de esvaziar o órgão, de esvaziar essas atividades, enquanto fortalecem o lobby dentro do Congresso pela aprovação desse PL 7.920/17. E isso ocorre no momento de valorização da informação, como bem colocou a Ívina.
Documentos de arquivo não são simplesmente papel velho guardado, mas são documentos da administração pública federal, são informações que subsidiam políticas públicas e também, não por acaso, são os documentos que a Polícia Federal tem buscado em diversos gabinetes, inclusive no dia de hoje.
Por isso tudo, entendemos que o arquivamento do PL e a valorização do Arquivo Nacional, como valorização do serviço público em si, caminham pari passu. Portanto, reafirmamos nossas reivindicações históricas: incorporações de gratificações para uma remuneração justa na aposentadoria; concurso público para o Arquivo Nacional, considerando que só houve um concurso público em seus 180 anos de história, há quase 12 anos; e critérios democráticos para a escolha do Diretor-Geral do Arquivo Nacional, como foi estabelecido como resolução na 1ª Conferência Nacional de Arquivos, realizada em 2011.
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A ASSAN vem aqui unir forças com a comunidade arquivista, assim como com toda a academia e demais entidades que têm se manifestado sobre esse assunto tão caro a toda a sociedade brasileira, no sentido de tentar barrar esse projeto, no sentido do seu arquivamento. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Glauber Braga. PSOL - RJ) - Muito obrigado, Rodrigo.
Passo imediatamente a palavra à Sra. Tânia Maria de Moura Pereira, arquivista e doutoranda em Ciência da Informação.
A SRA. TÂNIA MARIA DE MOURA PEREIRA - Boa tarde a todos, ao Deputado, aos membros da Mesa, aos meus colegas arquivistas que aqui se encontram e a todos os presentes.
Na condição de arquivista, servidora pública da Universidade de Brasília e pesquisadora na área de arquivos há 10 anos, eu quero começar falando um pouco sobre o manifesto de repúdio ao PL da Queima de Arquivos, que está em discussão. Esse PL prevê a eliminação dos documentos públicos, que poderá se dar de diversas maneiras, na condição de desintegração de documentos. Ao legalizar essa destruição dos documentos de arquivos originais após a sua digitalização ou mera reprodução eletrônica, como foi dito, a proposição vai interferir na garantia de autenticidade desses documentos públicos, que é aquilo que há de mais valioso nesses acervos, nesses documentos. Essa autenticidade poderá ser colocada em dúvida e se tornar discutível, o que impossibilita a sua futura verificação no caso de suspeita de fraudes, o que pode ser considerado uma verdadeira queima de arquivos.
Nesse contexto, as comissões e grupos como a Comissão de Anistia, a Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos e o Grupo Tortura Nunca Mais, que buscam as reparações em relação à execução de ações autoritárias contra os cidadãos e à violação dos direitos humanos, bem como outros movimentos que lutam pela transparência pública e o combate à corrupção, como a Auditoria Cidadã da Dívida, correm o risco de ter os seus trabalhos comprometidos, visto que dependem de documentos autênticos e confiáveis para a execução dos seus trabalhos.
Além disso, o projeto pode impedir que a investigação de escândalos políticos e econômicos que assolam o nosso País tenha continuidade, diante da possibilidade de falta de provas. Se aprovado, o PL 7.920/17, imputará sérios danos à sociedade brasileira ao extinguir a função de prova dos documentos produzidos no seio do Estado. Suas justificativas, calcadas na redução de custos, não se legitimam, porque não haverá redução de custos. Haverá aumento de custos na manutenção desses documentos. Além de comprometer a acessibilidade à informação por parte da sociedade e a sustentabilidade ambiental, ele vai dificultar o manuseio e a recuperação dos documentos e prejudicar as instituições arquivísticas que já existem e são tão sucateadas no nosso País.
Essas falácias, quando analisadas sob os preceitos da gestão de documentos, desaparecem, se pensarmos a respeito dos arquivos e da condição em que eles estão hoje. Nesses 10 anos de atuação nos arquivos, eu tenho visto iniciativas infelizes de substituição de suporte e reprodução de documentos. Hoje, se pegarmos acervos de 10 anos atrás que foram reformatados e tiveram mudados os seus suportes originais, veremos que estão perdidos. Os documentos foram totalmente comprometidos. A perspectiva para o futuro é a mesma, a diferença é que estaremos passando esses documentos para a iniciativa privada, o que é ainda mais grave.
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Sem especificar qualquer pré-requisito técnico, o projeto permite que empresas privadas e cartórios realizem essas operações de digitalização, o que vai gerar custos absurdos. Se formos pensar neste momento de crise e na falta de dinheiro que os órgãos públicos, principalmente, estão vivendo, isso é infundado, é inadmissível, sem falar no comprometimento da preservação desses documentos. A existência de documentos digitais imputa a necessidade de investimentos constantes em ambientes tecnológicos, como já foi dito aqui, como parques tecnológicos, profissionais especializados, preservação de ambientes, tecnologias, tudo isso. Não se justifica esse tipo de investimento atualmente. Nós já estamos vivendo uma revolução tecnológica na produção de documentos, hoje. Não há porque digitalizar o passado e simplesmente eliminá-lo. É um absurdo! Assim, a sugestão de que o proposto no PL geraria uma economia de recursos não é verdadeira, já que a segurança dos documentos digitais e sua proteção de longo prazo vincula-se à disponibilização de somas consideráveis de recursos públicos.
A partir do exposto, é possível inferir que a categoria profissional dos arquivistas pode ser prejudicada, visto que tira a responsabilidade da gestão dos documentos desses profissionais e a transfere a empresas especializadas em tecnologia da informação. Esses profissionais estão lutando nos arquivos desde que D. João VI veio para o Brasil. A profissão de arquivista neste ano completa 40 anos da sua regulamentação, pela lei de 1978.
Várias entidades representando arquivistas, historiadores, cientistas sociais, antropólogos, pesquisadores e profissionais que atuam em arquivos e na preservação do patrimônio documental já se mostraram contrárias, se manifestaram e vêm se manifestando desde que as iniciativas desse projeto de lei começaram. Como foi dito pelo Rodrigo, isso hoje culmina nesta audiência em que estamos, mais uma vez, tentando fazer uma interferência nesta proposta de possível aprovação desse projeto.
Nesse sentido, e considerando que o PL apresenta graves ameaças à transparência pública, à gestão e à preservação dos documentos de arquivo, bem como à preservação da memória, nós solicitamos o seu imediato arquivamento.
Obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Glauber Braga. PSOL - RJ) - Obrigado, Tânia.
Passo imediatamente a palavra ao Sr. Erlando da Silva Rêses.
O SR. ERLANDO DA SILVA RÊSES - Obrigado, Deputado Glauber Rocha, a quem eu cumprimento e saúdo pela iniciativa...
O SR. PRESIDENTE (Glauber Braga. PSOL - RJ) - Rêses, é Braga, como eu também me equivoquei no Rêses inicialmente, está perdoado... (Risos.)
O SR. ERLANDO DA SILVA RÊSES - Saúdo os demais colegas aqui, o professor da UNB e representante da ANPUH, o Prof. André, a Ívina, que também é professora lá agora, além de estudante, a Tânia, que eu já conhecia, e o Rodrigo, que estou conhecendo hoje. Quero cumprimentar também o plenário e as pessoas que nos ouvem — acho que estão transmitindo ao vivo esta reunião, não é?
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Quero dizer que sou do Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior — ANDES, que representa instituições federais, estaduais e municipais e CEFETs deste País. É uma instituição, portanto, grande, em termos de representação em todo o território nacional, com divisões regionais. A razão da nossa presença aqui, nesta audiência, é por termos atuação no centro de documentação desse sindicato nacional — e está aqui a nossa funcionária, a Roseni —, e também na Comissão da Verdade. O ANDES instituiu uma Comissão da Verdade própria, para fazer uma investigação no âmbito das universidades.
Obviamente, com a existência da Comissão da Verdade oficial, parou o processo, que havia chegado a um determinado ponto, mas ela foi falha no sentido das reparações, da busca do fim da impunidade, no que se referia aos crimes da ditadura empresarial militar deste País que várias universidades sofreram naquele período. Foi o caso, por exemplo, da nossa instituição, a UnB. Este ano completam-se 50 anos do episódio, Deputado, da invasão do Exército naquele campus universitário. Em agosto de 1968, vários professores estiveram numa praça de futebol, enfileirados, sendo, obviamente, revistados, torturados e expulsos da instituição. Muitos vieram a sofrer com aposentadoria precoce, com não retorno, com falta de anistia, e por aí vai, o que, obviamente, representou menos vida e uma atrocidade, portanto, humana.
Quero também lembrar o caso do estudante Honestino Guimarães, cujo desaparecimento até hoje não tem respostas.
A UnB instituiu a sua Comissão da Verdade e tem materiais, tem documentos — não só ela, mas também uma série de outras instituições de ensino superior. Portanto, o ANDES vem atuando no sentido de dar prosseguimento a esse trabalho, buscando o fim da impunidade, a reparação e a justiça a professores, estudantes e técnicos.
Também e talvez por ser, dentro da UnB, coordenador de um centro de documentação e referência em educação — eu sou da Faculdade de Educação, e há ênfase em educação popular e educação de jovens e adultos —, eu aqui quero saudar o Patrono da Educação Brasileira, o Prof. Paulo Freire, que sofreu, recentemente, até um ataque por conta desse título, com a ameaça de retirada. Quero lembrar que nós fazemos uma vasta homenagem em referência a ele, no sentido de haver sido um dos proponentes do Plano Nacional de Alfabetização neste País em 1963, no Governo João Goulart. Ele esteve em Brasília e aqui pôde implementar, inclusive, um trabalho de base chamado Círculo de Cultura para alfabetizar trabalhadores da construção civil que vieram para esta cidade construí-la. Gama, Sobradinho, Núcleo Bandeirante são algumas das cidades da Capital que tiveram o benefício de ter Paulo Freire atuando diretamente nelas.
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Paulo Freire também foi do Conselho Diretor da Fundação Universidade de Brasília e lá pôde estar por alguns momentos até a sua partida, em 1997. Em 1992, ele recebeu o Prêmio Andrés Bello, da OEA. Fundou o nosso Centro Acadêmico Pedagogia do Oprimido, na Faculdade de Educação, onde também estiveram pisando e trabalhando Anísio Teixeira e Darcy Ribeiro. Lá há um gabinete que até hoje se mantém. Portanto, há um registro memorialístico fortíssimo, na Universidade de Brasília, o Auditório Dois Candangos, a Sala dos Papiros e outros espaços. Inclusive, há uma praça em homenagem ao estudante Edson Luís. Está completando 50 anos de seu assassinato no Calabouço, um restaurante no Rio de Janeiro, na região do Deputado. Ele foi assassinado por tropas da ditadura militar, porque estava naquele espaço trabalhando inclusive para se manter enquanto estudante. Era a forma que ele tinha para se manter enquanto estudante. Foi barbaramente assassinado numa operação da Polícia do Exército.
Por conta disso, nós fazemos referência a esse momento, a histórias assim. Portanto, é o foco na história e na memória. Tudo o que foi falado aqui se refere a esse campo fortemente, além da área específica de arquivologia, em que nós temos autores expoentes na literatura que fartamente nos brindam com essa discussão, como por exemplo, Jacques Le Goff. Ele é autor de um livro chamado História e Memória. É interessante, ao ler Jacques Le Goff, como ele relaciona uma chamada história nova — estou diante do historiador André que vai ajudar ou refutar o que eu estou falando —, no sentido de dizer como ele trabalha essa relação de história e memória.
Por exemplo, muitas vezes nós temos o salto na história linear por períodos. Não é o caso dessa história chamada "história nova", em que o antigo e o moderno se relacionam, segundo a abordagem dialética da história, em que o passado e o presente vivem interagindo, em que esse passado e esse presente não se constituem em termos de um dado, mas de uma construção.
Por ser uma construção, esse passado vai servir para esclarecer, fortalecer, dar base, dar solidez ao presente. Assim, em muitos momentos, nós podemos lembrar o Renascimento até o século XVIII, sociedades ocidentais valorizaram muito o passado, o tempo das origens e dos ancestrais, surgindo, por exemplo, uma época muito forte de inocência e felicidade. Nós podemos lembrar a Idade de Ouro, do Paraíso Terrestre e por aí vai.
Portanto, há uma crítica à noção de fato histórico. Essa crítica surge com muita força no século XX, quando não é objeto dado e acabado esse chamado "fato histórico", mas sim é um propulsor de novas análises, novas construções, seguindo na construção do conhecimento. Nós condenamos no campo científico epistemológico o que se chamou de "fim da história". Francis Fukuyama, secretário do governo norte-americano, nos anos 90, instituiu essa expressão como "fim da história". Adveio outras expressões similares como "fim da ideologia", "fim da política" e por aí vai, ressaltando a lógica ou a tese do pensamento único.
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Ao fazer isso, obviamente, veem-se a história e, por conseguinte, a memória por um viés dominante, hegemonizado, calcado na chamada teoria da globalização, que nada mais é do que um capitalismo hegemonizado, já condenado por muitos, dentre eles Milton Santos. Por exemplo, o documentário O Mundo Global Visto do Lado de Cá, do cineasta Sílvio Tendler, mostra raízes da especificidade, da singularidade que há nesse mundo.
Cada um aqui mora em uma região, cada um mora em um bairro de uma cidade onde se produz, onde há ação humana, onde há trabalho e, portanto, há valor. Se há valor, obviamente não cabe falar de uma globalização que impõe sua ideologia e seus mecanismos de produção de mercadoria e de valor dentro dessas sociedades.
Nas redondezas de Brasília, existem regiões que produzem muito. Temos uma região próxima, a 40 quilômetros, que é uma das poucas que produzem marmelo, inclusive o doce de marmelo: a região de Mesquita, na Cidade Ocidental. Há produções na cidade de Ceilândia; há confecções aqui perto, na cidade de Anápolis; e por aí vai. Então, há uma riqueza material produzida no âmbito local. Não carecemos de estar aqui fortalecendo pensamento único, viés ideológico hegemonizado por uma linha de pensamento. Cabe a nós analisar, como fizeram muito bem os historiadores, o conceito de origem e também o conceito de gênese, para entendermos a riqueza e o poder do fato histórico.
A noção de documento, por exemplo — não é um material bruto, não é objetivo e não é inocente —, exprime o poder da sociedade do passado sobre a memória e o futuro. É importante notar como é que sociedades trataram ou lidaram com documentos. Por exemplo, na antiguidade, a memória era baseada no sobrenatural, ou seja, no chamado dom exercido. Poetas exerciam lembranças do passado para transmiti-las aos mortais. O poeta resgata o que é importante do esquecimento. Portanto, memória e imaginação têm a mesma origem. Lembrar e inventar têm ligações profundas.
Já na Grécia, o sujeito que lembrava tinha um papel social fundamental. Havia o ato de deixar marcas em cera, como uma espécie de memória viva do grupo. Houve uma marca interessante dentro da sociedade grega antiga, no sentido de fazer a demarcação identitária, a identidade coletiva e social de determinados grupos.
Em Roma, por exemplo, a memória indispensava a retórica. Era preciso convencer e emocionar os ouvintes pela linguagem. Desenvolveu-se a memória oral como um saber necessário ao trabalho e à vida em grupo.
Na Idade Média, o forte é a memória litúrgica, ligada aos santos, mártires e milagres. O cristianismo pauta o presente pela remodelação dos acontecimentos e milagres do passado.
É importante lembrar para todos nós o papel da Bíblia. Historiadores da Bíblia, historiadores que trabalham com essa questão sagrada registram que a história bíblica nada mais foi do que a lembrança e a memória de povos 100 anos depois da chamada vinda de Cristo. Esse registro oral memorialístico se transformou em papel, em documento conhecido mundialmente, um dos mais famosos documentos históricos: a Bíblia. É um documento que define ações, posturas e comportamentos humanos e tem um valor histórico na sociedade brasileira e mundial.
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Já na modernidade, o comércio, a urbanização e as novas ocupações demandam o registro de operações lícitas e transações. Desenvolveu-se, portanto, a memória em textos e imagens.
É preciso lembrar também a memória oral, muito forte em comunidades, como a indígena, e em continentes, como o africano. A demarcação territorial se fez com base na oralidade. Assim, Deputado, é que muita atrocidade ocorreu com essa comunidade, porque a memória era a da oralidade. Não havia, obviamente, o papel, o título da terra, que neste País só se instituiu em 1850, com a Lei de Terras, dando muita força a quem já tinha terras ao longo do processo de colonização e escravidão, no qual o escravo não teve nada de terra, assim como os indígenas, enfim, aqueles que estavam subjugados ao poder do colonizador.
Já na contemporaneidade, há o advento do computador, da informática, da informatização e da consequente digitalização. Essa ferramenta é responsável pela guarda de grande quantidade de informações que envolvem os meios inventados anteriormente, ou seja, retenção, esquecimento, seleção, construção no presente a partir das vivências, experiências no passado e relatos individuais para a constituição da memória local e coletiva.
Desse modo, constituir a memória coletiva e viva é parte fundamental para a pesquisa, a história dos saberes, a luta e o reconhecimento da construção coletiva.
Fazendo referência específica ao Projeto de Lei nº 7.920, de 2017, o que vemos? Conforme já foi colocado por quem me antecedeu — e eu chamei a atenção para vários aspectos —, uma das questões consideradas maléficas nesse projeto é exatamente a não garantia de autenticidade já relatada nesta audiência. Pode haver documentos públicos com origem duvidosa e discutível, impossibilitando a verificação no caso de suspeita de fraude.
É muito interessante nós nos reportarmos à conjuntura atual do nosso País, onde a força da corrupção está posta — o Rodrigo acabou de falar de uma ação da Polícia Federal —, onde crimes e mais crimes são cometidos em torno da chamada corrupção, os quais poderiam e podem ser desvendados a partir de documentações, e, obviamente, como eu já chamei a atenção antes, crimes cometidos pelo estado de exceção na ditadura militar neste País.
Portanto, fica vulnerável a consulta a qualquer documento original se extinguimos esse documento, se o tirarmos de circulação.
Há outra questão que já foi colocada: é preciso realizar, no âmbito dos poderes públicos, a chamada gestão documental, para haver a correta digitalização e servir às várias etapas que compõem essa gestão documental.
Precisamos de uma legislação sobre documentos que respeite a tabela de temporalidade, como também já foi colocado. É necessário um julgamento de uma comissão específica de gestão documental — não é somente digitalizar e depois eliminar. Como já foi colocado, é preciso haver uma discussão em torno da temporalidade do documento, do valor histórico, da permanência ou não e, inclusive, de uma política de descarte.
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É preciso dizer que essa política de descarte existe, inclusive, para o sistema digital. Não precisamos ter sempre um servidor lotado na nossa máquina. Um e-mail que você recebe constantemente não precisa estar lá, a depender do teor desse e-mail, é claro. É preciso avaliar se se mantém ou não um e-mail que você recebe constantemente de alguém. Desse modo, uma política de descarte é bem-vinda diante da postura de se avaliar a chamada massa documental.
Aqui já foi citada pela Ívina a questão de o projeto ter mais economia. Ela trouxe números. Digitalizar e manter os documentos digitalizados demanda recursos. Há custos para manter esse ambiente tecnológico, como ela bem colocou, ponderando inclusive a questão de tempo e valor.
Como o Rodrigo já ressaltou, é preciso avaliar a segurança da digitalização e a vulnerabilidade. Na guarda, há a necessidade da existência de mecanismos contra danos e perda de dados. Ele citou o exemplo da presença de vírus. O hackerismo também é uma ação, uma postura que pode dar contar do sumiço de dados. Há também a chamada obsolescência tecnológica. Portanto, no campo digital, temos mecanismos de insegurança.
É preciso lembrar do gerenciamento de documentos e acesso à informação, Deputado Glauber. A auditoria da dívida pública, por exemplo, reivindicou e reivindica, desde a redemocratização, o necessário debate da crise econômica a partir do acesso à informação. A CPI da Dívida Pública, de 2009 a 2010 — a Gleice, membro da auditoria e também arquivista da UFMS, está aqui nos prestigiando e é uma das militantes contra esse projeto —, por exemplo, não teve acesso a documentos e informações, sob o argumento de que o sistema informatizado estava desativado. Como comprovar os fatos que geraram tal dívida se você não tem acesso aos documentos e à informação?
Outra grave situação ocorre quando há a proposta de armazenamento em nuvens privadas. Ao armazenar em nuvens privadas, conforme denunciado recentemente por Snowden, o norte-americano que está exilado, temos o fortalecimento de empresas como Google e Microsoft e o controle total sobre o acesso à informação do que quiserem em qualquer país, no caso o Brasil, ferindo subitamente a soberania nacional.
Não há nada sobre nuvens públicas! Não há nenhum debate, nenhuma proposta, no projeto, em relação às chamadas nuvens públicas. Nós precisamos de políticas de preservação da memória e gestão de documentos, junto com os servidores públicos, debatendo — é o que traz o Rodrigo, e estamos juntos na defesa do Arquivo Nacional — no sentido de fazer a defesa da documentação física.
Finalizo citando o forte lobby das empresas privadas de tecnologia da informação em torno desse projeto de lei, de olho no lucro, como já colocado e denunciado aqui, e de olho nos benefícios da digitalização e do lucro, por consequência.
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E há, ainda, um aspecto grave, que temos visto crescer sobremaneira neste País: a ampliação da terceirização — agora existe até a quarteirização, segundo a reforma trabalhista aprovada.
Para finalizar, eu gostaria de lembrar que temos que observar inclusive quem propõe um PL como esse. Recentemente, apresentaram um projeto de lei referente ao Escola sem Partido, que obviamente está indo muito bem em alguns Municípios e Estados. Nós conseguimos uma liminar no STF, mas tem andado de vento em popa, em alguns Estados e Municípios, esse projeto que fere e criminaliza a prática docente, a liberdade de aprender e a liberdade de ensinar.
Portanto, pelo arquivamento já, imediato, deste projeto de lei!
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Glauber Braga. PSOL - RJ) - Obrigado, Sr. Erlando.
Passo a palavra imediatamente ao Sr. André Gustavo de Melo Araújo, professor da Universidade de Brasília e representante da Associação Nacional de História.
O SR. ANDRÉ GUSTAVO DE MELO ARAÚJO - Boa tarde a todos e a todas aqui presentes. Boa tarde aos colegas e às colegas de Mesa e de causa.
Agradeço ao Exmo. Deputado Glauber Braga por acatar a proposta de realização desta audiência.
Como já adiantei no meu cumprimento inicial, eu me coloco aqui, em nome da Associação Nacional de História, favoravelmente às colocações já apresentadas na tarde de hoje pelos integrantes desta Mesa. Pretendo ampliar o debate a partir de dois pontos muito breves, sendo o segundo deles um ponto que eu acho que pode acrescentar algo a esse debate: a perspectiva do historiador frente às consequências temerosas desse projeto de lei que está tramitando nesta Casa.
A primeira colocação que eu faço diz respeito à tentativa de enquadrar esse problema de uma perspectiva mais ampla. Lembro que, há poucos dias, há pouco mais de 2 semanas, a edição da revista inglesa The Economist publica um caderno especial sobre novas tecnologias de registro da informação. Diversos artigos analisam os benefícios e os riscos, para o Estado, de projetos de lei ou de posturas e políticas públicas associadas às novas tecnologias. A imagem que vocês veem projetada é evidentemente a capa desse periódico ao qual eu faço referência.
(Segue-se exibição de imagens.)
A minha referência inicial tem como objetivo destacar, evidentemente, benefícios e riscos associados às políticas e às novas tecnologias de registro da informação.
No caso do projeto que está em causa e discussão na tarde de hoje, parece-me que há um benefício potencial do projeto, a saber, a disposição pública de documentos públicos com maior facilidade e acesso geográfico ou temporal a distância, mas me parece ser esse o único benefício do projeto.
Diversos são os riscos associados à proposta que se encontra em tramitação nesta Casa. Eu vou sintetizar esses riscos remetendo-me à fala dos colegas e das colegas na tarde de hoje, fazendo referência inicialmente ao custo dessa proposta, que foi apresentada com uma justificativa de redução de custos. Já foi muito bem colocado pela Ívina e pelo Rodrigo que propostas como essa podem representar potencialmente um crescimento dos custos associados não apenas à digitalização, mas também à preservação desse tipo de informação numa plataforma digital.
Uma das reportagens incluídas nesse dossiê a que faço referência diz respeito a um dos projetos de registro da informação associado à criminalidade pública.
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O custo de manutenção de um projeto como esse é absolutamente assustador até para um governo de orçamento muito maior do que o do Estado brasileiro.
O segundo grave problema associado a um projeto como esse, já tocado pelos colegas aqui, diz respeito à autenticidade, à qualidade e à função de prova de grande parte de documentos públicos que se perderiam a partir do momento em que esses documentos fossem eliminados após o processo de digitalização.
Eu gostaria de acrescentar novos elementos a esse debate, que são elementos próprios do trabalho de historiador.
Eu acho que as questões relacionadas à digitalização de documentos partem de um pressuposto falso, segundo o qual documentos digitais são iguais a documentos originais. Do ponto de vista da pesquisa histórica, há diferenças fundamentais entre documentos digitalizados e documentos originais. A primeira dessas diferenças diz respeito a informações contidas no suporte documental que se perdem por completo num processo de digitalização. Todo trabalho de pesquisa histórica, que evidentemente se vale do trabalho de bibliotecários e arquivistas, aqui também representados, a depender do tipo de pergunta com a qual o historiador se dirige à documentação, depende da natureza física e original dos seus suportes. Eu acho que esse argumento deve ser acrescentado às falas da Ívina, da Tânia, do Rodrigo e do Erlando, para que se possa entender o risco que esse projeto de lei representa não apenas para a memória deste País, mas também para futuras pesquisas e trabalhos de historiadores.
Eu me lembro de uma das consultas que fiz a bibliotecas de pesquisa, ocasião em que conversei com bibliotecários e arquivistas numa instituição alemã sobre os processos de digitalização — à época, tratava-se de processos de microfilmagem de documento antigos. Os bibliotecários apresentavam, com segurança, esses processos novos de registro da informação como mais uma tecnologia. Aquilo que permanecia, tanto para os arquivistas quanto para os bibliotecários, era evidentemente a fonte original, que para nós é a fonte da pesquisa histórica.
Isso ocorre não só porque as tecnologias mudam, mas porque os historiadores conseguem extrair informações não necessariamente registradas nesse tipo de suporte, que representa, no limite, uma forma de reprodução digital do texto, mas oblitera informações relacionadas à materialidade do suporte original do documento.
Além de questões dessa ordem, relacionadas ao custo, à função de prova, à questão de autenticidade, a digitalização e a posterior eliminação de documentos originais acabam por eliminar mais uma fonte de informação da pesquisa histórica e evidentemente mais uma fonte de informação de primeira ordem para o passado das instituições que ela registra.
Então, eu acho que esse é mais um elemento que nós temos de acrescentar a este debate. É também nesse sentido que a Associação Nacional de História abraça a causa aqui defendida por todos nesta Mesa e, como vocês podem ver neste terceiro eslaide, é signatária de toda essa discussão que se encontra reunida no site que vocês veem aí projetado, um site que se coloca de forma contrária a esse projeto de lei e apresenta a divisa "Queima de arquivo não!"
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O endereço desse site encontra-se também projetado para todos aqueles que quiserem obter mais informações relacionadas a esse projeto de lei e às consequências que ele tem para as associações de arquivos, para as bibliotecas e também para a pesquisa de historiadores no Brasil. Esse site condensa essas informações e, inclusive, apresenta artigos científicos recentemente publicados sobre a fragilidade e a gravidade de um projeto de lei como este que está tramitando nesta Casa. Nesse sentido, também sou signatário da fala dos colegas desta Mesa.
Agradeço a oportunidade de apresentar a visão da Associação Nacional de História, frente a esse temeroso projeto de lei.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Glauber Braga. PSOL - RJ) - Obrigado, André.
Eu vou passar a palavra para quem está presente nesta audiência pública e queira fazer uma intervenção, pelo período de 3 minutos. Depois, nós retornaremos a palavra à Mesa, para a discussão dos encaminhamentos na parte da finalização da audiência.
Como é o nome do senhor?
O SR. WANDERLEI - Wanderlei.
O SR. PRESIDENTE (Glauber Braga. PSOL - RJ) - Eu só vou pedir aos próximos que forem fazer uso da palavra que se apresentem e que fiquem à vontade.
Tem a palavra o Sr. Wanderlei, pelo tempo de 3 minutos.
O SR. WANDERLEI - Obrigado.
Eu queria cumprimentar a Mesa pela oportunidade, pelos encaminhamentos, pelos comentários bastante pertinentes, e dizer que já era o momento de esta audiência pública acontecer.
Eu queria ratificar o que todo o mundo comentou e abordar mais três aspectos.
O primeiro aspecto que eu queria comentar diz respeito ao ar de modernidade que esse projeto de lei tem. Parece que, se falamos de tecnologia, nós estamos falando de algo moderno, e quem é contra qualquer tecnologia, seja qual for, está sendo antigo. Eu não conheço, entre os arquivistas que trabalham atualmente, nenhum que diga que documento digital nunca vai ser a nossa área de trabalho. Muito pelo contrário, para nós, isso é uma naturalidade. Acho que quem ficar defendendo que vai trabalhar o resto da vida com papel provavelmente vai sair da área.
Porém, ao contrário do que imaginamos, a maioria das coisas que têm acontecido no Parlamento e no Executivo foca no aspecto da digitalização, quando deveria focar na suspensão da produção de papel. Deveria haver um esforço para produzir documentos digitalmente natos. Se queremos fazer alguma coisa, façamos no modo digital e não no papel para, depois, digitalizar! Quando você digitaliza, você perde uma série de requisitos da construção do documento original. Se você tem um documento digital nato, ele é original. Nós não vamos discutir se vamos transformá-lo em digital, porque ele é original. Há um caso muito clássico hoje: ninguém discute se vamos armazenar em fitas magnéticas os discursos dos Parlamentares, porque eles nascem na forma digital, são digitais e serão guardados assim.
O primeiro aspecto que eu queria abordar é só contextual e se refere ao amplo aspecto jurídico que essa norma, se aprovada, será obrigada a alterar. Não se trata só da Lei nº 8.159, de 1991. Há muitas outras questões. A própria Lei da Microfilmagem já é questionada por muitos órgãos. Inclusive, a própria Receita Federal, o Ministério da Fazenda, não aceita que o documento original seja eliminado antes que a Receita afirme, mesmo com a microfilmagem já existindo.
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Outra questão se refere às empresas privadas. Apesar de a Lei nº 8.159 dispor sobre o arquivo público e o privado, a questão do privado é um tanto quanto relativa, porque o arquivo privado passa a ser considerado pela lei a partir do momento em que o Arquivo Nacional, por exemplo, via decreto presidencial, diz que é de interesse público determinado acervo. Assim, ele fica então obrigado a respeitar as normas de gestão. Antes disso, não é obrigado. Então, o conceito de arquivo permanente não tem que existir para a empresa privada. O que significa isso? Significa que, uma vez que ela digitaliza o seu acervo, ela pode realizar a eliminação antes que qualquer instituição pública diga: "Isso deve ser permanente". Nesse caso, já houve a eliminação.
A questão dos investimentos em preservação digital. A Lei nº 11.419, de 2006, dispõe sobre o processo judicial eletrônico. Desde então, o Estado brasileiro tem caminhado no fio de uma navalha, porque, desde 2006, os registros judiciais são produzidos em meio digital. Cadê as políticas de preservação disso? Elas não existem. Desde 2017, ano passado, quando o Governo criou esse projeto novo dele de estratégia de governança digital, e está trabalhando para a migração digital, não há uma linha que fale sobre gestão documental nem sobre preservação digital. Ou seja, estamos criando uma bomba-relógio sobre a memória nacional. Daqui a pouco, isso explode.
Temos que parar de discutir sobre digitalização e falar efetivamente sobre documento nato-digital.
Era só isso.
Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Glauber Braga. PSOL - RJ) - Muito obrigado.
Alguém mais deseja falar? (Pausa.)
Tem a palavra Luiz Fernando.
O SR. LUIZ FERNANDO - Excelente tarde a todos os presentes nesta importantíssima audiência.
Quero também cumprimentar cada um dos integrantes dessa Mesa.
As palavras aqui ditas foram fundamentais para se poder ratificar a importância do arquivo público e também a importância do suporte documental, a importância do papel. As falas aqui foram essenciais também para se poder demonstrar a todos da sociedade que estão neste momento nos acompanhando pela Internet quão ruim é esse tipo de projeto. É extremamente nefasto para os arquivos públicos, para a história nacional, para a memória do nosso País. Mais uma vez os interesses particulares, a força do dinheiro está ficando acima do interesse público, do interesse, no caso, que cada cidadão tem que ter, que é o de ter acesso a sua memória pessoal, cujos documentos, com grande frequência, estão guardados nos arquivos públicos, em âmbito seja municipal, seja estadual, seja federal — âmbito em que está o Arquivo Nacional —, ou de ter acesso a documentos de interesse da coletividade.
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Meu nome é Luiz Fernando. Sou servidor concursado do Arquivo Nacional. Atualmente estou na diretoria da Associação de Servidores do Arquivo Nacional, de que o Rodrigo Mourelle também faz parte. Como associados e, acima de tudo, como cidadãos, é nosso dever nos irmanarmos nessa luta com todas as entidades aqui presentes e com os coletivos que não tiveram como estar aqui representados neste momento, na luta contra esse projeto de lei, que, repito, é extremamente nocivo para a memória do nosso País.
Para finalizar, eu gostaria de dar uma sugestão de encaminhamento. Eu não sei se, pelo Regimento Interno da Câmara dos Deputados, isso seria viável, mas sugiro que parta da Comissão de Legislação Participativa algum tipo de requerimento para que, por exemplo, a Comissão de Cultura e até a Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados convoquem audiência similar à que acontece aqui neste momento.
Eu acredito que há questões a respeito até da constitucionalidade desse projeto de lei que devam ser debatidas de forma séria. A Constituição prevê o direito à educação, o direito à memória. Eu pergunto: até que ponto esse projeto de lei não está violando um dos mais caros direitos da nossa Constituição?
Finalizo minhas palavras agradecendo de novo ao Deputado Glauber pela oportunidade e aos integrantes dessa Mesa.
Uma excelente tarde a todos! (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Glauber Braga. PSOL - RJ) - Muito obrigado, Luiz. Nós lhe agradecemos a articulação para a realização da audiência, articulação feita também com os convidados para a apresentação da sugestão.
Há três perguntas que vieram de internautas. A primeira é de Gilberto Suhett, que diz: "Eu gostaria de saber se, de fato, os Deputados estão escutando o apelo de toda a comunidade arquivística". A segunda é esta: "Mostra-se a ignorância de alguns senhores ao acharem que os arquivos existem para guardar papéis. Os arquivos existem para resguardar direitos e memória, por meio de seus acervos. Querendo fazer lobby, esses senhores não enxergam o quão errado é esse PL. Será que o Brasil mais uma vez vai querer se tornar uma fraude, onde se destroem as informações e não se respeitam as leis instituídas sobre os arquivos? Nenhum outro país do mundo tem um PL absurdo como esse".
Rogéria Santos diz: "Antes foram os livros; hoje, os documentos de arquivos. O conhecimento depende dos livros e dos documentos, que são fontes de conteúdo de arte, cultura e pesquisas científicas, além de direitos e deveres para os cidadãos e cidadãs. Se não existem documentos em arquivos em sua materialidade, em suportes físicos e com sua organização de gestão feita pelas instituições públicas, não existe justiça".
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Rogéria está exprimindo uma opinião de rejeição do PL. Gilberto, além de exprimir sua opinião, faz uma pergunta bem objetiva. Como eu sou um Parlamentar que esteve presente na coordenação dos trabalhos da audiência e na discussão, eu vou responder. Ele pergunta se, de fato, os Deputados estão escutando o apelo de toda a comunidade arquivística.
Gilberto, não necessariamente. Acho que temos de ampliar a movimentação, ampliar a mobilização, inclusive para que outros Parlamentares estejam motivados a arquivar esse projeto de lei. Essa matéria já passou pela Comissão de Ciência e Tecnologia da Câmara dos Deputados. Ainda tem que passar pela Comissão de Trabalho e pela Comissão de Constituição e Justiça.
Luiz sugeriu aqui que a Comissão de Cultura, além da CCJ, faça audiência pública para tratar do tema. O mesmo deveria ser feito pela Comissão de Trabalho.
Passaremos à fase dos encaminhamentos. Antes, eu pergunto se alguém ainda quer fazer uso da palavra. (Pausa.)
O senhor tem a palavra.
O SR. FELIPE LOCKE CAVALCANTI - Deputado Glauber, muito obrigado. Eu fico muito honrado por estar presente nesta audiência pública.
Sou Felipe Locke, procurador de justiça, ex-membro do Conselho Nacional de Justiça, membro da Comissão de Concurso do Ministério Público do Estado de São Paulo e ex-Presidente da Associação Paulista do Ministério Público.
Louvo a presença do Deputado Marquezelli, meu conterrâneo e querido amigo.
Eu gostaria de louvar a atuação do senhor...
O SR. PRESIDENTE (Glauber Braga. PSOL - RJ) - Peço um minuto para fazer uma observação.
O SR. FELIPE LOCKE CAVALCANTI - Pois não.
O SR. PRESIDENTE (Glauber Braga. PSOL - RJ) - Eu só quero dizer aos Parlamentares presentes que se iniciou a Ordem do Dia no plenário principal da Casa. Sendo assim, não haverá possibilidade aqui de deliberação de requerimentos, segundo me comunica de maneira diligente a Secretária desta Comissão. Vamos tentar chamar a reunião quando a Ordem do Dia for finalizada, para deliberação de requerimentos por esta Comissão. Mas continuamos com a audiência pública, porque ela não tem que ser interrompida, já que requerimentos não vão ser deliberados.
Vejo que o Deputado Eros deseja falar.
O SR. EROS BIONDINI (Bloco/PROS - MG) - Eu só quero uma informação. O quórum vai ser mantido?
O SR. PRESIDENTE (Glauber Braga. PSOL - RJ) - A ideia é suspender a reunião para tentar retomá-la depois de finalizada a Ordem do Dia.
O SR. EROS BIONDINI (Bloco/PROS - MG) - Ela só vai ser suspensa. Está bom.
O SR. PRESIDENTE (Glauber Braga. PSOL - RJ) - Peço perdão ao orador.
O SR. FELIPE LOCKE CAVALCANTI - Imagine! Eu agradeço a oportunidade e a honra de estar aqui.
Eu gostaria de trazer um dado histórico. Em São Paulo, o Tribunal de Justiça editou um ato, no âmbito da Justiça, para destruir os processos antigos, nos mesmos sistemas e nos mesmos moldes desse projeto de lei. Na ocasião, a Associação dos Advogados, o Instituto dos Advogados e a Seção de São Paulo da OAB ingressaram com uma ação de inconstitucionalidade, que obteve resultado positivo no sentido de obstar essa destruição.
Eu entendo, assim como os oradores anteriores entenderam, que esse projeto representa um dano à história do País e possivelmente um vício de constitucionalidade, que já foi examinado pelo Supremo Tribunal Federal. Um ato da Presidência do Tribunal de Justiça — um ato que não é legislativo ordinário, mas é similar — foi julgado inconstitucional.
Eu gostaria de dizer aos senhores que nós temos o maior interesse na preservação da história. Preservar a história é obrigação de todos.
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Eu sempre me sinto reconfortado quando estou no Congresso Nacional e vejo que a Câmara dos Deputados sempre procura preservar a sua história, seja com a edição de livros, de periódicos, seja com a fotografia de todos os Parlamentares que presidiram esta Comissão, seja com as sessões do Plenário e das Comissões transmitidas pela TV Câmara. Essa é uma história viva, seja a oral, seja a escrita, seja a fundamentada em qualquer base documental. Sem ela não há futuro. Esse PL obsta o futuro do Brasil, porque o país que não conhece a sua história não é um verdadeiro Estado, e o Estado se faz conhecendo a história, para que com ela possamos aprender e prevenir erros.
Então, eu ofereço uma contribuição com um dado histórico e estou também imbuído da defesa do nosso patrimônio histórico-cultural. Entendo que esse PL pode causar danos irreversíveis, seja no suporte, seja no documento, seja na transmutação de dados. As tecnologias vão e vêm, mas a história é uma só e deve ser preservada, para que tenhamos um futuro.
Eu já falei demais. Antes de concluir, gostaria de parabenizar o Deputado Glauber por esta oportunidade maravilhosa. Como ex-integrante do Conselho Nacional de Justiça, ex-membro da banca de concurso do Conselho Superior do Ministério Público e presidente de associação do Ministério Público, eu não poderia estar alheio a esta discussão, tão importante.
Gostaria de me solidarizar com todos que me antecederam aqui, com uma preocupação absolutamente necessária, fundamental para o nosso futuro.
Agradeço a todos os Deputados presentes, pessoas a quem quero muito bem, que sempre me recebem com muito carinho.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Glauber Braga. PSOL - RJ) - Nós é que agradecemos ao senhor por estar contribuindo para a nossa audiência, trazendo uma visão importante de quem está vivenciando a questão com outro olhar.
Alguém mais quer fazer uso da palavra? (Pausa.)
Vamos então aos encaminhamentos.
Algo que senti que esteve presente em todas as falas foi a vontade de que esta matéria seja arquivada. Acho que esse é o desejo de todos os que estão aqui presentes e de todos que assinaram a manifestação pública contra o Projeto Queima de Arquivo. Eu posso apresentar uma manifestação, como Parlamentar da Comissão de Legislação Participativa que conduziu a articulação e coordenou a reunião, tanto ao Presidente da CTASP quanto ao Presidente da CCJ, colocando o manifesto de vocês e a ata desta reunião, com tudo aquilo que foi aqui abordado e que demonstra que esse projeto não deve prosseguir. E posso fazer um encaminhamento ao Presidente da Câmara dos Deputados, de maneira formal. Se os senhores estiverem de acordo com esse encaminhamento, já peço que fique registrado em ata. Eu faço isso como membro da Comissão de Legislação Participativa. Temos acordo quanto a esse encaminhamento? (Pausa.)
Isso é dirigido às duas Comissões da Câmara pelas quais ainda falta passar a matéria e ao Presidente da Câmara.
Há algum encaminhamento a mais neste momento que os senhores consideram que seja relevante e ao qual podemos dar prosseguimento na atuação parlamentar? Alguém quer colaborar com mais algum ponto específico sobre alguma medida que acham que devamos adotar do ponto de vista legislativo? (Pausa.)
16:12
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Também existe a sugestão do Luiz de que, tanto na CTASP quanto na CCJ e na Comissão de Cultura, possamos fazer a solicitação, mostrando a gravidade do tema, para que eles também realizem audiências públicas, sem que essa matéria entre em deliberação antes disso. Temos acordo em relação a este ponto também, o de sugerir à Presidência dessas Comissões a realização de audiências? (Pausa.)
Há outra possibilidade. Essa é um pouco mais difícil, porque depende de acordo dos Líderes partidários. É preciso que haja número de assinaturas suficiente. Trata-se de fazer uma Comissão Geral, em que, no plenário da Câmara dos Deputados, os convidados têm a possibilidade de expor suas opiniões sobre o assunto. Ao mesmo tempo, o Plenário estará voltado a uma discussão ampla com o conjunto dos Parlamentares, não só com os Parlamentares da Comissão específica. Se acharem que essa é uma boa alternativa, eu lhes proponho que comecemos pela manifestação às Comissões pelas quais essa matéria ainda tem que passar. Apresentaríamos a solicitação de audiência pública. Se não houver o arquivamento já nessas Comissões e a matéria vier a passar em mais uma delas, pediríamos a realização de Comissão Geral, no plenário da Câmara dos Deputados. Pode ser assim? Esse encaminhamento é adequado? (Pausa.)
Então, peço que sejam registrados em ata os encaminhamentos que foram aqui pactuados do ponto de vista legislativo — no caso, eu falo na condição de membro da Comissão de Legislação Participativa. Isso não obsta que ações possam ser avaliadas pelas entidades que assinam o manifesto. Nós nos colocamos à disposição para dialogar sobre o assunto em qualquer momento, se acharem que o caminho judicial é o caminho que deve ser trabalhado. Nós nos colocamos à disposição. Eu me coloco à disposição também como membro da bancada de um partido político que tem legitimidade para ingressar com uma ação. Mas aqui ficamos assim pactuados. Eu sei que essa decisão tem que partir das entidades, após estabelecerem e aprofundarem uma discussão sobre o assunto, mas já registramos em ata o pacto que firmamos em relação às ações que dependerem do Legislativo.
Agradeço muito a presença das senhoras e dos senhores a esta audiência pública.
Declaro suspensa a presente reunião, com previsão de retorno após a Ordem do Dia de hoje.
Muito obrigado. (Palmas.)
(A reunião é suspensa.)
20:17
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O SR. PRESIDENTE (Eros Biondini. Bloco/PROS - MG) - Declaro reabertos os trabalhos da 14ª Reunião da CLP.
Encontram-se disponíveis cópias das atas da 10ª, 11ª e 12ª Reuniões, realizadas nos dias 29 de maio e 5 e 7 de junho de 2018.
Indago se algum membro desta Comissão quer solicitar a dispensa da leitura das atas.
O SR. FELIPE BORNIER (Bloco/PROS - RJ) - Peço a dispensa da leitura, Sr. Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Eros Biondini. Bloco/PROS - MG) - Fica dispensada a leitura das atas, a pedido do Deputado Felipe Bornier.
Não havendo manifestação, em votação as atas.
Os Deputados que as aprovam permaneçam como se encontram. (Pausa.)
Aprovadas as atas.
Passa-se à Ordem do Dia.
Consulto o Plenário sobre a possibilidade de fazer a deliberação em globo dos requerimentos constantes da Ordem do Dia.
O SR. FELIPE BORNIER (Bloco/PROS - RJ) - Concordamos, Sr. Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Eros Biondini. Bloco/PROS - MG) - Em votação os Requerimentos nºs 207, 209, 210, 211, 212 e 213.
Os Srs. Deputados que os aprovam permaneçam como se encontram. (Pausa.)
Aprovados os requerimentos.
Item 8. Sugestão nº 118, de 2017, do Sindicato dos Trabalhadores de Serviços Gerais Onshore e Offshore de Macaé, Casimiro de Abreu, Rio das Ostras, Conceição de Macabu, Quissamã e Carapebus, no Rio de Janeiro, que sugere projeto de lei que altera a Lei nº 7.783, de 1989, para vedar ao empregador o desconto pelos dias não trabalhados decorrente de paralisação por motivo de atraso de pagamento de salário e de recolhimento de contribuição previdenciária ou FGTS. Relator: Deputado Felipe Bornier.
O SR. FELIPE BORNIER (Bloco/PROS - RJ) - Sr. Presidente, vou direto ao voto.
"Preliminarmente, informamos, conforme declaração prestada pela Secretaria da Comissão, que os requisitos formais, previstos no art. 2º, I e II, do Regulamento Interno da Comissão de Legislação Participativa — CLP foram plenamente atendidos.
(...)
No ato de assistência, o empregado recebia orientações sobre a existência e a regularidade de vários documentos, tais como TRCT, anotações na Carteira de Trabalho e Previdência Social — CTPS, comprovante do aviso prévio ou do pedido de demissão, convenção ou acordo coletivo de trabalho ou sentença normativa aplicáveis, extrato da conta vinculada no Fundo de Garantia do Tempo de Serviço — FGTS, guias de recolhimento dos meses que não constem no extrato, comunicação da Dispensa e Requerimento do Seguro-Desemprego, atestado de Saúde Ocupacional Demissional, ou Periódico, documento de representação do empregador, demonstrativo de parcelas variáveis, prova de quitação das parcelas devidas, entre outros.
Como se observa, não são poucos os documentos envolvidos na rescisão do contrato de trabalho. Além desses, outros ligados à prestação de trabalho em condições específicas podem ser necessários. Toda essa documentação é produzida unilateralmente pelo empregador, cabendo ao empregado verificar sua regularidade.
A revogação do citado dispositivo pela Lei nº 13.467, de 2017, teve como argumento a desburocratização do ato de rescisão e de levantamento do FGTS pelo empregado. É certo que a burocratização dos negócios jurídicos deve ser evitada. Há que se notar, porém, que algumas cautelas são imprescindíveis para dar segurança e transparência à manifestação de vontade das partes. Esse é o caso, parece-nos, dos empregados analfabetos e dos idosos.
Infelizmente o Brasil ainda tem cerca de 11,8 milhões de analfabetos, o que corresponde a 7,2% da população de 15 anos ou mais. Não é possível entender que se possa considerar como hígida a manifestação de um empregado nessas condições sobre o volume de documentos acima citado, sem assistência.
20:21
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Diferentemente do trabalhador analfabeto, cujo letramento ineficiente leva-o também a uma condição social e econômica precária, não se pode considerar que o trabalhador com mais de 60 anos, apenas por isso, esteja em piores condições que o trabalhador mais jovem para atender as questões legais envolvidas no TRCT.
Nesse ponto, divergimos da Sugestão, pois entendemos que o corte por idade não é fundamento adequado para a presunção de hipossuficiência para o ato compatível com o analfabetismo. Ao contrário, entendemos que a idade milita em favor do trabalhador, pois lhe acrescenta conhecimento de vida e experiência, favorece a maturidade intelectual e emocional, além de consolidar sua inserção social e rede de relacionamentos.
Todos esses fatores, sem dúvida, colocam o trabalhador com mais de 60 anos em melhor condição para lidar sozinho com o momento da rescisão ou para buscar informação e assistência para o ato.
Por fim, entendemos que a melhor forma para estabelecer a obrigação sugerida é a alteração do texto celetista, reintroduzindo a previsão de assistência no ato da rescisão em favor do empregado analfabeto.
Em razão do exposto, somos pela aprovação da Sugestão nº 153, de 2018." (Pausa.)
"A Lei de Greve, que se sugere alterar, não faz menção ao pagamento de salários durante o movimento paredista, que deve, portanto, ser negociado, arbitrado ou objeto de decisão judicial como os demais aspectos reivindicados pela greve.
No entanto, quando a greve decorre de atraso do empregador no pagamento de salários ou no recolhimento previdenciário ou fundiário, o desconto salarial não deve sequer ser cogitado. Os salários são devidos durante todo o período.
Não é razoável que a empresa atrase o pagamento de salários e depois venha a descontar os dias parados para reivindicar esse pagamento. Lembre-se de que o inadimplemento salarial configura justo motivo até para a rescisão contratual.
O trabalhador se vê, nesse caso, forçado a iniciar uma greve para garantir a sua sobrevivência.
Assim, somos favoráveis à Sugestão nº 118, de 2017, nos termos do Projeto de Lei ora apresentado."
O SR. PRESIDENTE (Eros Biondini. Bloco/PROS - MG) - Em discussão o relatório. (Pausa.)
Não havendo quem queira discutir, encerro a discussão.
Em votação o parecer do Relator.
Aqueles que concordam com o parecer permaneçam como se encontram. (Pausa.)
Aprovado o parecer do Relator.
Item 11. Sugestão nº 153, de 2018, do Sindicato dos Trabalhadores de Serviços Gerais Onshore e Offshore de Macaé, Casimiro de Abreu, Rio das Ostras, Conceição de Macabu, Quissamã e Carapebus, que sugere projeto de lei para dispor que o trabalhador maior de 60 anos de idade e analfabeto deverá ser assistido por sindicato ou pelo Ministério do Trabalho e Emprego, no momento da rescisão contratual.
O Relator é o Deputado Felipe Bornier, que tem a palavra.
O SR. FELIPE BORNIER (Bloco/PROS - RJ) - Sr. Presidente, a Sugestão nº 153, de 2018, é muito positiva, porque ela sugere projeto de lei para dispor que o trabalhador de mais 60 anos e o analfabeto sejam assistidos pelo sindicato ou pelo Ministério do Trabalho e Emprego no momento da rescisão contratual.
"No ato de assistência, o empregado recebia orientações sobre a existência e a regularidade de vários documentos, tais como TRCT, anotações na Carteira de Trabalho e Previdência Social – CTPS, comprovante do aviso prévio ou do pedido de demissão, convenção ou acordo coletivo de trabalho ou sentença normativa aplicáveis, extrato da conta vinculada no Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS, guias de recolhimento dos meses que não constem no extrato, comunicação da Dispensa e Requerimento do Seguro-Desemprego, atestado de Saúde Ocupacional Demissional, ou Periódico, documento de representação do empregador, demonstrativo de parcelas variáveis, prova de quitação das parcelas devidas, entre outros.
Como se observa, não são poucos os documentos envolvidos na rescisão do contrato de trabalho. Além desses, outros ligados à prestação de trabalho em condições específicas podem ser necessários. Toda essa documentação é produzida unilateralmente pelo empregador, cabendo ao empregado verificar sua regularidade.
20:25
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A revogação do citado dispositivo pela Lei nº 13.467, de 2017, teve como argumento a desburocratização do ato de rescisão e de levantamento do FGTS pelo empregado. É certo que a burocratização dos negócios jurídicos deve ser evitada. Há que se notar, porém, que algumas cautelas são imprescindíveis para dar segurança e transparência à manifestação de vontade das partes. Esse é o caso, parece-nos, dos empregados analfabetos e dos idosos.
Infelizmente o Brasil ainda tem cerca de 11,8 milhões de analfabetos, o que corresponde a 7,2% da população de 15 anos ou mais. Não é possível entender que se possa considerar como hígida a manifestação de um empregado nessas condições sobre o volume de documentos acima citado, sem assistência.
Diferentemente do trabalhador analfabeto, cujo letramento ineficiente leva-o também a uma condição social e econômica precárias, não se pode considerar que o trabalhador com mais de 60 anos, apenas por isso, esteja em piores condições que o trabalhador mais jovem para entender as questões legais envolvidas no TRCT.
Nesse ponto, divergimos da Sugestão, pois entendemos que o corte por idade não é fundamento adequado para a presunção de hipossuficiência para o ato compatível com o analfabetismo. Ao contrário, entendemos que a idade milita em favor do trabalhador, pois lhe acrescenta conhecimento de vida e experiência, favorece a maturidade intelectual e emocional, além de consolidar sua inserção social e rede de relacionamentos.
Todos esses fatores, sem dúvida, colocam o trabalhador com mais de 60 anos em melhor condição para lidar sozinho com o momento da rescisão ou para buscar informação e assistência para o ato.
Por fim, entendemos que a melhor forma para estabelecer a obrigação sugerida é a alteração do texto celetista, reintroduzindo a previsão de assistência no ato da rescisão em favor do empregado analfabeto.
Em razão do exposto, somos pela aprovação da Sugestão nº 153, de 2018, na formação do projeto de lei anexo".
O SR. PRESIDENTE (Eros Biondini. Bloco/PROS - MG) - Em discussão o parecer do Relator. (Pausa.)
Não havendo quem queria discutir, encerro a discussão.
Em votação o parecer do Relator.
Os Srs. Deputados que concordam com o parecer permaneçam como se encontram. (Pausa.)
Aprovado o parecer do Relator.
Esta Presidência informa que os itens 7, 9 e 10 foram retirados da pauta pela ausência do Relator.
Nada mais havendo a tratar, vou encerrar a presente reunião, antes, porém, convocando os membros para o X Seminário Nacional de Guardas Municipais e Segurança Pública, a ser realizado amanhã, dia 13 de junho, com início às 10 horas, no Auditório Nereu Ramos.
Está encerrada a reunião.
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