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O SR. PRESIDENTE (Dimas Gadelha. Bloco/PT - RJ) - Bom dia a todos.
Nos termos regimentais, declaro aberto os trabalhos desta 17ª reunião semipresencial destinada à audiência pública da Comissão de Fiscalização Financeira e Controle da Câmara dos Deputados.
Esta audiência pública tem amparo no Requerimento nº 303, de 2025, de minha iniciativa, aprovado por este colegiado, para que o Tribunal de Contas da União e o Ministério da Fazenda apresentem informações relativas aos gastos tributários, renúncias tributárias, diagnósticos, evoluções, perspectivas e impactos sobre as finanças públicas.
Esta audiência pública ocorre no âmbito do Plano Anual de Fiscalização e Controle, aprovado pela Comissão em abril. Debater o importante tema das renúncias e benefícios fiscais é um dos cinco eixos estruturantes do plano que me coube relatar.
Os convidados, os quais saúdo, já estão à mesa: Rafael Gomes Lima, Auditor-Chefe da Unidade de Auditoria Especializada em Orçamento, Tributação e Gestão Fiscal, auditor fiscal do Tribunal de Contas da União; Claudemir Rodrigues Malaquias, auditor fiscal e Chefe do Centro de Estudos Tributários e Aduaneiros da Secretaria da Receita Federal do Ministério da Fazenda.
O tempo reservado a cada convidado é de 15 minutos, prorrogável e, se necessário, não podendo haver aparte. Cada Deputado inscrito poderá usar a palavra por 3 minutos, concedendo a preferência ao autor do requerimento. Os convidados disporão de igual tempo para responder, facultadas a réplica e a tréplica, pelo mesmo prazo. Nos termos regimentais, Líderes e Vice-Líderes inscritos poderão somar o tempo da Liderança.
O SR. CLAUDEMIR RODRIGUES MALAQUIAS - Obrigado, Deputado, pela oportunidade e também pelo convite que foi formulado à Receita Federal para poder participar deste debate.
Viemos de uma série de encontros como este e sempre a gente elogia a iniciativa, pois o tema é de suma importância. Muitas das informações necessárias para um bom debate sobre gastos tributários estão no âmbito do Poder Executivo, e, por isso, a gente se sente muito honrados com o convite e a oportunidade de apresentar a todos os elementos que fundamentarão futuros posicionamentos dos parlamentares.
Iniciaremos esta nossa conversa destacando alguns pontos. É claro que não conseguimos esgotar, em uma única sessão, todos os aspectos que envolvem a governança, a gestão, o tratamento, a transparência e todo o arcabouço regulatório dos benefícios tributários. Em cada sessão, fazemos um recorte para destacar alguns pontos específicos.
(Segue-se exibição de imagens.)
O primeiro aspecto diz respeito à mensuração dos benefícios de natureza tributária. A Receita Federal é responsável pelo aspecto quantitativo, ou seja, pelo acompanhar e monitorar os benefícios e gastos tributários e tornar público à sociedade os aspectos quantitativos desses benefícios, ou seja, o quanto de tributo esses benefícios estão sendo renunciados ao longo das séries históricas.
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A gente começou nossas publicações em 1989. Então, desde 1989, a Receita tem uma estrutura fixa para apurar o aspecto quantitativo dos benefícios. Por que a gente destaca a questão quantitativa? Não fazemos a avaliação qualitativa dos benefícios, apenas a quantitativa.
O segundo aspecto: com base no estudo sobre os gastos e benefícios tributários, é que é possível a gente estimar ou projetar a arrecadação potencial. O que é a arrecadação potencial? É uma informação importante para o gestor público, que permite a ele saber o quanto o sistema tributário tem condições de arrecadar, caso não houvesse os benefícios tributários.
Além disso, o Centro de Estudos também é responsável por incluir nas projeções orçamentárias o impacto decorrente dos benefícios tributários. A Receita Federal é responsável por aquela primeira linha do orçamento, que é o resultado da arrecadação das receitas primárias, as receitas que vêm dos tributos. Essas receitas são computadas, projetadas e estimadas levando em consideração os benefícios e as renúncias fiscais. Sem isso, a gente não consegue projetar a receita. A Receita que é projetada, então, é o resultado de uma operação em que a gente projeta o total e deduz os benefícios fiscais.
Por último, a gente vai comentar aqui rapidamente sobre a estratégia para a otimização dos gastos tributários, que é o tema do momento. A gente pretende apresentar uma pequena contribuição nesse debate sobre qual caminho ou via adotar prioritariamente para otimizar os benefícios tributários.
No eslaide seguinte, a gente apresenta os fundamentos legais, ou seja, a atuação da Receita Federal. Ela parte do que está preconizado em determinados dispositivos, como a própria Constituição, que transferiu, no âmbito do Poder Executivo, a responsabilidade de acompanhar os benefícios tributários quanto ao seu aspecto quantitativo para a Receita Federal, por ela ser a detentora da maior parte das informações necessárias.
É importante a gente também fazer um comentário a respeito da mensuração. Se vocês perguntarem: a Receita faz a mensuração e a publicação de todos os benefícios tributários? Não faz. Mas por que não? Porque a Receita vai tratar apenas dos gastos tributários, que são um subconjunto do que a gente genericamente chama de benefícios de natureza tributária.
Vou dar um exemplo: os regimes de suspensão de tributos, que se convertem em isenção para os contribuintes predominantemente exportadores — a gente está citando o Repetro e o Drawback como exemplos — não estão nos nossos demonstrativos ou nas nossas apurações que são publicadas no DGT, que é só para gastos tributários. A Receita acompanha esses regimes de outra forma, mas o relatório de gastos tributários só inclui os gastos tributários. Por que o Repetro e o Drawback não são considerados um gasto tributário? Porque, para ser gasto tributário, tem que haver perda de receita. Esses regimes suspensivos, que simplesmente alteram o processamento interno da arrecadação dos tributos, apesar de aumentarem a disponibilidade financeira dos contribuintes beneficiados, eles não são considerados gastos tributários são benefícios tributários em lato sensu.
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Outro exemplo é a depreciação acelerada e incentivada, que ocorre quando o dispositivo legal, a lei concessiva, autoriza o contribuinte a antecipar a dedução da depreciação de um bem que adquiriu, normalmente uma máquina, um equipamento de grande porte, que é substancial em sua atividade. Essa faculdade oferecida ao contribuinte somente antecipa suas despesas, reduz sua lucratividade e a base de cálculo do imposto no início, mas, no final, ela será aumentada. Então, não há perda de arrecadação. Portanto, também nessa situação não há benefício tributário. Apenas para exemplificar rapidamente. Por isso a gente coloca ali o conceito de gasto tributário.
O conceito de gasto tributário é um conceito internacional e não é um conceito jurídico, Deputado, é um conceito econômico. É uma construção oriunda da teoria econômica tributária. Então, muitas vezes, a gente tem a tentação: "Vamos colocar na lei que isso é benefício, considera-se benefício", e nós, internamente, a gente fala assim: "Olha, não adianta citar na lei, porque é um conceito econômico". E o conceito econômico a gente não muda. A gente costuma dar um exemplo da fórmula do benzeno. Alguém aqui é químico? A fórmula do benzeno é a mesma aqui no Brasil, é a mesma na China, é a mesma na Europa e é a mesma nos Estados Unidos. Tudo é benzeno. É a mesma coisa com o conceito de gasto tributário. É um conceito econômico que se define pelas características que reúne, pelos requisitos que preenche e que foi consolidado em nível global.
Então, o Brasil, para ter comparação, poder de comparação ou facilidade de comparação com os demais relatórios produzidos pelos demais países, que comparam gastos tributários, a gente tem que adotar uma nomenclatura, um critério internacional. São considerados gastos indiretos, ou seja, são aqueles que, aqui no Brasil, não estão no orçamento. Eles estão vinculados a objetivos econômicos ou sociais, ou seja, na concepção do gasto tributário, tenho que ter uma política pública vinculada, não é gratuitamente. É uma exceção ao sistema tributário de referência e introduz um conceito novo, que é o que a gente chama de sistema tributário de referência, ou seja, se não existe lei nenhuma, se não existe lei concessiva nenhuma, qual é o sistema tributário de referência? Ou seja, qual o valor que o contribuinte deveria pagar? Se está pagando menos, é porque é beneficiário de um gasto tributário.
Terceiro aspecto: ele aumenta a disponibilidade financeira do contribuinte, ou seja, existe, sim, uma renúncia por parte do Estado, e o contribuinte fica com uma disponibilidade financeira diferenciada a mais, ou seja, tem mais recursos para destinar à sua atividade. E ele pode ter também o caráter compensatório ou incentivador. É compensatório quando o legislador entende que aquele benefício está compensando-o de alguma ação do Estado em que deveria atuar, só que não tem capilaridade para isso. Então, por exemplo, a gente admite a dedução na Declaração do Imposto de Renda da Pessoa Física para os fundos da criança e do adolescente, para o fundo do idoso. Mas por quê? É porque o Estado entende que o particular, se doar para uma entidade, tem uma capilaridade maior. Então, ele, o Estado, que deveria cuidar socialmente desses vulneráveis, transfere para o particular a possibilidade jurídica de reduzir o imposto, transferindo a doação para essa entidade. Então, é o caráter compensatório.
O benefício é incentivador quando, por exemplo, quero induzir o agente econômico a investir em determinada atividade ou em determinada região. Exemplo: Zona Franca de Manaus. Tenho que ter o incentivo para que o investidor desloque seu capital, sua expertise, todo seu negócio para aquela região, porque quero desenvolver aquela região. Então, o benefício tem um caráter incentivador. É isso que caracteriza, em linhas gerais, o gasto tributário.
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Quando eu falei de arrecadação potencial, a gente tem que ter uma noção do todo para entender o volume de gastos tributários. E o que está em discussão agora, Deputado, olha que interessante, é o valor, o montante de gastos tributários, que corresponde a 4%, 4,86% do PIB, projetado para 2025. É muito? É pouco? Como a gente compara isso? É o estudo Techs Gap. Eu trouxe uma representação gráfica. Ela é um pouco hermética, mas aquele quadro total representa tudo aquilo que a gente pode cobrar de tributo.
A parte verde é a que nós efetivamente estamos arrecadando. É aquilo que efetivamente nós arrecadamos. A parte marrom corresponde ao gap de arrecadação devida, ou seja, aquela parte que o contribuinte deve, já compensou, mas está em atraso e em processo de cobrança. Ele ainda não pagou. Essa é outra parte da arrecadação.
E tem a parte em vermelho. O que é essa parte vermelha? É a fraude, o vazamento, aquilo que a gente ainda não alcançou, ou seja, é a sonegação.
À direita, eu tenho duas colunas: uma coluna azul, que representa o que nós chamamos de gap de não tributação. O gap de não tributação é a opção que o legislador fez de não incluir determinada matéria tributária na incidência. Por exemplo, partidos políticos não são tributados, templos não são tributados — são as imunidades. As entidades filantrópicas e as sem fins lucrativos também gozam dessa imunidade, ou seja, a gente não tributa a renda e o patrimônio dessas entidades. Isso foi opção do legislador, e também está representado na coluna azul.
Já a parte roxa é a das renúncias: quando o legislador, podendo cobrar o tributo, decide não cobrar. Por exemplo, a cesta básica. A gente tem o PIS e COFINS, que incidem sobre quase todos os produtos comercializados, mas o legislador determinou alíquota zero para os produtos da cesta básica, configurando uma renúncia tributária.
Então, quando a gente fala de gasto tributário, está falando da coluna roxa, esta coluna central, que é a parcela do sistema tributário de referência que não gera arrecadação para o Estado.
Na tela seguinte, a gente conversa um pouco sobre os elementos metodológicos, porque muitos dos números que a Receita produz, e a agora a Receita tem várias fontes de captação de informação a respeito de benefícios, são resultado da aplicação de determinadas metodologias. A Receita não calcula o gasto tributário cada hora de um jeito, cada ano de um jeito. Não. A Receita segue metodologias. E essas metodologias foram se consolidando e aperfeiçoando ao longo do tempo.
Mas, para simplificar, o auditor que vai mensurar o gasto tributário tem que fazer o quê? Ele tem que cumprir o que está no CTN. Primeiro, ele em que identificar o sujeito passivo, ou seja, os contribuintes que foram alcançados por determinado benefício. Segundo passo, o auditor verifica a ocorrência do fato gerador, para certificar que esses contribuintes estão ativos, emitindo notas fiscais, produzindo bens ou prestando serviços, ou seja, que o fato gerador ocorreu.
Depois, ele identifica a base econômica, que é a matéria tributária, ou seja, quanto esse contribuinte vendeu. Por exemplo, no caso da cesta básica, a base econômica pode ser representada pela rede de supermercados ou pelo mercadinho da esquina. A base econômica dos dois é diferente, mas ambos foram alcançados pela mesma renúncia.
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Primeiro, a gente só considera efeito de primeira ordem. A Receita é criticada por isso? Mas a Receita cumpre justamente o que as regras internacionais preveem para esse tipo de tratamento.
Então, o que é efeito de primeira ordem? Normalmente, um benefício tributário, como a gente mesmo anunciou aqui, está vinculado a uma política — uma política econômica, uma política social. Só que nós não calculamos o efeito de segunda ordem.
O que é o efeito de segunda ordem? Quantos empregos esse benefício gerou? Quanto de agregação de valor na economia esse benefício proporcionou? Esses benefícios considerados de segunda ordem não são calculados, e isso ocorre mundialmente. A gente só calcula a renúncia: qual é o efeito tributário?
Depois, fazemos projeções por três períodos e, como eu disse, o nosso critério é o jurídico, o critério legal. E vimos isso claramente agora na DIRB. Na DIRB apareceram contribuintes que, na nossa avaliação, não deveriam estar incluídos. Mas, ao investigar, percebemos que eles estavam usufruindo do benefício do Perse, por exemplo, com base em medida judicial. Ou seja, nós adotamos sempre o critério legal, e não o critério efetivo.
Também adotamos o critério ceteris paribus — isso mais na conversa entre economistas. Esse critério significa que congelamos todas as demais variáveis e utilizamos apenas as informações do contribuinte.
Por fim, é importante destacar que esses gastos tributários subsidiam a elaboração das peças orçamentárias, tanto Lei de Diretrizes Orçamentárias — LDO, quanto a Lei Orçamentária Anual — LOA.
Na última parte da nossa fala, vamos passar para o final, onde trataremos da gestão e governança das políticas públicas.
Aqui chamamos a atenção para um aspecto importante que deve contribuir para o debate sobre gastos tributários: sempre que estamos avaliando ou debatendo um gasto tributário, corremos o risco de analisá-lo isoladamente, sem levar em consideração a política que o fundamenta.
E isso é importante, porque grande parte dos problemas de um benefício tributário — se ele está mal calibrado, gerando distorção na economia, sendo mal distribuído ou até regressivo, sem atingir o que deveria atingir — muitas vezes não está no benefício em si, mas no desenho da política. O benefício é parte da política. O legislador escolheu o benefício tributário como forma de financiamento daquela política, mas poderia ter optado pela verba orçamentária, pelo orçamento direto. Ele optou pelo benefício tributário. Mas o que está por trás, de fato, é a política.
Por isso chamamos a atenção para cinco itens que devem integrar toda discussão sobre benefícios tributários. Quando nos sentamos à mesa para debater um benefício tributário, é essencial considerar o diagnóstico da situação-problema que ele buscava resolver. Isso é importante, porque é no diagnóstico que se verifica se as decisões foram tomadas consoante o problema real. Às vezes, temos um diagnóstico, mas a solução adotada não corresponde a ele. Exemplo: a desoneração da Folha dos Municípios. O problema era outro, mas a solução foi desonerar a folha dos Municípios.
Como vincular a desoneração da folha dos Municípios a um incremento na atividade econômica? Não é possível. O servidor público não faz parte da atividade econômica; ele faz parte do consumo das famílias, mas, da apuração do PIB, ele não faz parte.
Ele não vai gerar agregação de valor, é o serviço de Estado. Então, assim, não tinha nenhum caráter incentivador nem compensatório. No entanto, o benefício foi instrumentalizado para utilizar isso. Então, assim, é importante o diagnóstico.
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Então, por exemplo, hoje — vamos usar essa expressão aqui, usem com limitação — são condenáveis, ou tecnicamente reprimidos, quaisquer benefícios concedidos em tributos da categoria dos indiretos ou em tributos sobre o consumo, por exemplo. Porque esse benefício é concedido ao produtor, sendo que quem suporta o ônus do tributo é o consumidor. Então, eu estou dando benefício para a pessoa errada.
A gente viu isso muito claramente no julgamento do Tema 69. O Tema 69 é aquele julgamento do Supremo, que analisava a exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da COFINS. E o Supremo concluiu que o ICMS não deve fazer parte dessa base de cálculo. "Ah, tudo bem, então vamos devolver o dinheiro." Mas devolver o dinheiro para quem? Devolver o dinheiro para o contribuinte de direito e não de fato. Ou seja, as empresas transformaram a decisão em margem para elas, enquanto quem suportou o ônus foi o consumidor. Foi ele quem pagou PIS e COFINS a mais, porque se trata de tributo indireto. Por isso que a gente fala que o desenho é importante.
Depois, nós temos que ter, no âmbito da administração pública, estrutura e governança para acompanhar o benefício. Senão, vai acontecer de contribuintes que não foram eleitos para atingir aquele benefício tributário passarem a se beneficiar indevidamente. E a administração tem que cuidar disso. Tem que acompanhar, tem que fiscalizar, tem que gerir o benefício, tem que controlar quem está tendo acesso a ele.
E, por último, fica a operacionalização, o acompanhamento e a avaliação. Ou seja, não faz sentido nós trabalharmos em uma lei concessiva de um benefício sem pensarmos na forma como esse benefício vai ser acompanhado, monitorado e avaliado.
Eu termino por aqui, só demonstrando uma representação gráfica que mostra que, ao longo do ano, estamos reduzindo os benefícios. Esse é um movimento que a gente tem que continuar. A gente não consegue fazer esse dever de casa de uma vez só. A reforma tributária sobre o consumo vai ajudar na redução e na otimização desses benefícios. E essa é a trajetória que a gente deve perseguir.
O SR. PRESIDENTE (Dimas Gadelha. Bloco/PT - RJ) - Seu Claudemir, aquele gráfico que o senhor apresentou do quadrado que fala sobre os gastos indiretos, aquilo ali está proporcional? Aquilo ali é uma proporcionalidade? Ou só é ilustrativo?
O SR. PRESIDENTE (Dimas Gadelha. Bloco/PT - RJ) - Agora ouviremos a exposição do Tribunal de Contas da União, representado pelo Auditor-Chefe Rafael Gomes Lima.
O SR. RAFAEL GOMES LIMA - Exmo. Sr. Deputado Dimas Gadelha, em nome de quem eu cumprimento e saúdo a todos aqui presentes, aqueles que nos assistem remotamente.
O tema gastos tributários é uma temática que a gente vem trabalhando no TCU há décadas, podemos dizer assim, desde a instituição da Lei Complementar nº101, a Lei LRF. É um tema muito caro para nós, principalmente, pelo fato de ser uma política pública, representar um gasto indireto, que é suportado por todos aqueles que não são beneficiados pelas políticas públicas.
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(Segue-se exibição de imagens.)
O SR. RAFAEL GOMES LIMA - O Deputado, de forma muito prudente, elencou este tema como um dos principais para o Plano Anual de Fiscalização. Isso porque, como nós vemos aqui, o Claudemir até trouxe um diagnóstico mais recente da redução dos benefícios tributários, mas a gente vê que os benefícios tributários — e a gente fez um recorte de 9 anos, 10 anos — vêm se elevando em proporção do PIB e, principalmente, em termos nominais. No contexto em que temos sucessivos déficits primários, ou seja, mais de 10 anos com déficits primários, o fato de abrirmos mão de uma receita primária tão relevante é algo que chama a atenção e, eventualmente, precisa ser bem tratado. Esse seria o primeiro diagnóstico.
O segundo ponto é a necessidade de avaliação e redução dos benefícios tributários. O próprio legislador constitucional, na Emenda nº 109, estabeleceu um plano de redução gradual dos benefícios tributários, uma redução de 10% no primeiro ano e um teto de 2% do PIB até 2029. Existem algumas considerações ou nuances nessa Emenda nº 109, mas o fato é que o próprio legislador constitucional, atento a esse crescimento dos gastos tributários, trouxe isso para a gente.
Posteriormente, e muito recentemente, a Lei Complementar nº 211 alterou o Regime Fiscal Sustentável, que é o novo teto de gastos, e estabeleceu que, em caso de déficits primários, não poderão ser concedidos ou prorrogados incentivos tributários. Pelo que a gente vê nas projeções do próprio Poder Executivo, neste ano, possivelmente, nós teremos algum déficit primário, e essa regra será implementada nos próximos exercícios. É, portanto, mais um aspecto que corrobora a questão da redução dos benefícios tributários.
O TCU, como eu disse no início da minha explanação, vem desde o ano 2000 trabalhando com esse tema. No início, a gente tinha fiscalizações mais exploratórias, como quem eram os beneficiários, quais eram os benefícios, os atores e os fluxos de informações. E evoluímos posteriormente para uma questão relacionada à conformidade e à governança. A aplicação do art. 14 da LRF estabelece uma série de medidas, e, mais recentemente, o art. 103 do ADCT e as LDOs vêm estabelecendo. Trabalhamos também com questões de transparência e arranjo de governança. E a gente teve uma interação muito grande nesse período com a própria Receita Federal. Cada um, no âmbito de suas instituições, suas competências, fazendo com que isso fosse implementado e gerasse mais valor público, que é o próximo estágio.
Então, começamos a fazer uma análise de mérito, de custo-efetividade: realmente, quanto custa aquele benefício tributário? Ele tem um retorno positivo? Adotamos isso também. E, nos últimos 5 anos, a gente vem trabalhando, principalmente, com foco em política pública. O Claudemir foi muito feliz em sua explanação, trazendo a questão de como o benefício tributário tem que ser tratado como política pública, ou seja, é um gasto que a União faz
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No TCU, como eu disse, a gente tem vários trabalhos. Então, aqui eu elenquei alguns trabalhos recorrentes, a maioria deles em bases anuais, no trabalho que talvez seja o mais relevante constitucionalmente para o TCU, que é o parecer prévio sobre as contas do Presidente da República.
Anualmente, Deputado, colegas, nós fazemos a análise tanto do montante, evolução e regionalização dos benefícios tributários quanto, principalmente, do atendimento aos requisitos legais para a concessão de benefícios tributários.
Também temos um acompanhamento anual de renúncia de receitas, que engloba despesas obrigatórias de caráter continuado. As DOCCs são outro tema bastante relevante, que não está no foco da nossa discussão, mas nós também fazemos esse acompanhamento.
O TCU elencou os gastos tributários na lista de alto risco, que é uma lista que o TCU revisita todo ano, como os principais riscos para o Estado brasileiro. Então, o TCU elencou, e todo ano a gente faz um monitoramento; a gente analisa como estão os gastos tributários, além de denúncias, representações e solicitações do próprio Congresso Nacional, que são bastante frequentes na nossa área.
Aqui eu trago, é claro, dezenas e dezenas de achados em nossos trabalhos. Eu quis trazer dois aqui, principalmente em relação aos aspectos fiscais e aos requisitos legais. O primeiro deles é o impacto fiscal e a concentração regional, ou seja, as renúncias têm crescido muito nos últimos anos, mas uma outra coisa que chama a atenção é a concentração. A Região Sudeste é a que mais concentra os benefícios fiscais no Brasil. Esses dados são derivados da própria Receita Federal, que regionaliza os benefícios. É natural que isso ocorra, pois as maiores empresas estão presentes no Centro-Oeste, mas um dos objetivos dos benefícios tributários como política pública é reduzir a desigualdade regional. Então, esse é um dado que chama muito a atenção.
Eu trouxe outra figura para um outro aspecto. Não sei se é possível para as pessoas entenderem. Isso é a análise que a gente faz nas contas do Presidente da República. Então, você vê ali vários atos que concederam renúncias de receitas, e diversos deles não atenderam a alguns dos requisitos legais estabelecidos para a concessão de renúncias de receitas.
E aqui eu faço uma parte, dizendo que, nos últimos anos, principalmente por parte da Receita Federal como instituição, quando o projeto nasce no âmbito do Poder Executivo, a Receita vem adotando todas as medidas, principalmente para colocar medidas compensatórias. E isso é um tema de muita importância. Quando a gente concede um benefício fiscal, a gente tem que ter uma neutralidade fiscal, ou seja, não prejudicar as finanças públicas, não reduzir a capacidade arrecadatória do Estado, como está previsto no art. 14 da LDO.
Aqui eu também trouxe uma figura que achei muito interessante. Esses são os atos — e por atos estou compreendendo em sentido lato sensu, tanto leis quanto atos do próprio Poder Executivo — que estabeleceram medidas de renúncia de receita. A gente vê que, no ano de 2021, nós tivemos 26 atos que deveriam estar submetidos a todos os requisitos legais, e metade deles não atendeu a pelo menos um dos requisitos legais.
E depois que a lei nasce e está no mundo jurídico, é muito difícil para a gente consertar isso.
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Felizmente, como eu disse no início desta explanação, a gente vem reduzindo o número de leis e atos que não atendem aos requisitos legais. Além disso, no ano passado, a gente teve um número menor de atos e leis que concederam benefícios tributários, o que está em linha com o que o Claudemir trouxe, que os benefícios tributários estão se reduzindo. No entanto, a gente tem um estoque muito grande ainda.
Aqui, eu também trago aspectos de governança. Antes eu havia falado sobre os achados referentes ao impacto fiscal, regionalização e cumprimento legal. Agora, trago a questão da governança. O Claudemir, na sua última ela, também trouxe o aspecto da governança. A gente identificou, Deputado, que há uma governança muito frágil. Isso é visível, por exemplo, na ausência de um órgão responsável por fazer a análise de custo-benefício e verificar a efetividade de um benefício tributário.
Alguns benefícios tributários têm baixa custo-efetividade. Por exemplo, no caso das políticas automotivas, em que o TCU fez um trabalho e identificou que o custo gerado para a sociedade era de 34 mil reais por emprego criado. Foi uma política que, no trabalho do TCU, mostrou um desenho frágil e não gerava tantos benefícios para a sociedade.
Outros pontos que a gente aponta incluem a reversão distributiva, ou seja, um benefício que deveria trazer maior ganho de eficiência e redução das desigualdades acaba fazendo o contrário. Por exemplo, a desoneração da cesta básica, que, segundo o Deputado Mauro Benevides, em sua exposição de ontem, tem mais de mil itens, incluindo salmão. A desoneração da cesta básica, portanto, se torna regressiva. Obviamente, isso já foi tratado na reforma tributária sobre o consumo que foi aprovada, mas a gente tem esses problemas.
Outro ponto são as contrapartidas frágeis. A gente identificou que, às vezes, o Estado concede um benefício tributário e não exige nenhuma métrica ou meta da empresa ou do setor beneficiário. Concede-se o benefício sem que haja um controle para o beneficiário ter contrapartidas. Também foram aspectos que nós verificamos. A gente tem diversos trabalhos, e eu poderia trazer outros aspectos, mas quis elencar somente estes quatro que considero mais relevantes.
Aqui, eu trouxe algumas decisões do TCU ao longo dos anos. A primeira delas foi o Acórdão nº 793, que eu elenquei, em que a gente interagiu muito com a Receita Federal para que houvesse transparência nas metodologias e maior acesso ao público. Depois, nós tivemos o Acórdão nº 2.756, também relacionado à transparência, mas mais focado na governança. E esse Acórdão nº 1.907 é oriundo de uma consulta feita pelo próprio Ministro da Fazenda, perguntando sobre a aplicabilidade dos gastos tributários. O TCU respondeu que o gasto tributário só pode ser implementado se atender aos requisitos legais constitucionais. A gente tem algumas nuances sobre esse acordo, mas é um acordo paradigmático. E, por fim, a gente trouxe o Acórdão nº 333, sobre as questões de sanção dos projetos que concedem benefícios tributários.
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A gente sabe que nem todos os projetos que versam sobre benefícios tributários são oriundos do Poder Executivo; podem ser modificados pelo próprio Parlamento e, eventualmente, pode faltar o atendimento a algum requisito. Então, nós demos ciência também ao Presidente da República, na questão de verificar isso no momento da sanção dos projetos de lei.
Aqui é o caminho para o final da minha apresentação, trazendo os aprimoramentos que julgamos necessários. Eles vão muito em consonância com o que o Sr. Claudemir trouxe.
O primeiro deles é tratar os benefícios tributários como política pública. Então, têm que ser tratados como política pública. A gente não pode dar um tratamento diferente daquele que é dado ao gasto direto, que tem controle, avaliação e autorização anual pelo Parlamento.
Outra questão: é preciso ter uma análise prévia. Não adianta a gente pensar no benefício, como disse o Sr. Claudemir, para corrigir outro problema. É necessário fazer uma análise de custo-benefício. Governança, prazos de validade, órgão responsável, avaliações, enfim, tudo isso nesse sentido.
Deputado, agora eu trago algumas novas frentes de trabalho que o TCU está implementando. Aqueles trabalhos recorrentes que já tínhamos, e agora algumas novas frentes justamente para dar mais força ao tema e analisar os gastos tributários sob uma nova ótica.
O primeiro deles: a gente estabeleceu um referencial de controle de benefícios tributários. Ou seja, como o TCU e até mesmo órgãos do Executivo podem beber dessa fonte para fazer análise de custo-efetividade, avaliando se determinado benefício é positivo ou não, com uma série de critérios. Esse material foi divulgado.
Outro aspecto bastante interessante: ontem entregamos ao Congresso Nacional — e foi publicado ontem, portanto é recentíssimo — um relatório sobre gastos tributários no País, em que ranqueamos, segundo os critérios do próprio referencial, quais benefícios tributários oferecem, em tese, maior risco às finanças públicas. Esse relatório está disponível, e vamos colocar aqui também o QR Code para todos acessarem.
E, por fim, trouxemos também o Observatório de Gastos Tributários, de Benefícios Tributários, que será um portal dentro da plataforma do TCU, em linguagem simples e acessível, para que o cidadão comum consiga entender as dinâmicas dos benefícios tributários. A despesa é bastante conhecida pela sociedade em geral, principalmente nos últimos anos, mas a questão da receita, da renúncia de receita, não é. Então, a ideia do Tribunal, do Presidente Vital do Rêgo, é justamente trazer esse tema para o âmago do poder do cidadão comum. Além do próprio Parlamento e dos órgãos de Estado, o cidadão também precisa ter atenção a esse ponto.
Aqui está o ranking que mencionei ao senhor. É uma consolidação do trabalho, em ordem decrescente de risco. O primeiro deles é a poupança de créditos, seguido do setor automotivo, deduções do Imposto de Renda, saúde e educação. Foram analisados conforme práticas contrariadas do referencial: insuficiência de resultados, lacuna de avaliação e viabilidade de alteração. A gente pensa ainda em termos de constitucionalização dos benefícios, resistência de setores específicos, se a política é difusa ou não.
Enfim, classificamos isso a partir de "n" avaliações. Reunimos estudos do TCU, do CEMAP, do IPEA e de outros órgãos da academia para elaborar este ranking, que é inédito. Então, nós inauguramos esse ranking ontem.
E a gente vai ofertá-lo justamente para trabalhar com os projetos de lei do Deputado Mauro Benevides e do ex-Senador Esperidião Amin, que tratam da matéria, mas como uma forma de o TCU, órgão auxiliar do Legislativo, poder dar sua parcela de contribuição.
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Para aqueles que tiverem interesse, aqui estão os dois QR Codes dos portais. Então, como eu disse, foi lançado ontem, em primeira mão aqui para o Congresso Nacional, e é com muita satisfação que eu apresento.
O SR. PRESIDENTE (Dimas Gadelha. Bloco/PT - RJ) - Eu que agradeço, Rafael, a sua presença aqui. Acho que as falas se complementaram. Você fez uma avaliação muito quantitativa, e o Claudemir trouxe mais alguma coisa da qualidade, da avaliação qualitativa.
O SR. RAFAEL GOMES LIMA - Há, sim Deputado. Nós fizemos um estudo de catorze gastos tributários, sendo que um deles se subdivide em dois. Então, a gente vai chegar a dezesseis gastos tributários, e eles alcançam 84% dos gastos previstos lá no DGT. Então, há o Simples Nacional, há todas as avaliações.
Nós temos três produtos: o próprio ranking, um relatório mais sintético, que possivelmente o senhor possa utilizar, e um outro mais analítico que desdobra totalmente quais foram os critérios que nós utilizamos. Há dezesseis gastos. Nós temos avaliações muito boas, Deputado, e o nosso trabalho foi justamente consolidar e atribuir.
O SR. PRESIDENTE (Dimas Gadelha. Bloco/PT - RJ) - Estou satisfeito com a nossa exposição. Acho que vocês trouxeram muito material que a gente vai poder usar.
A gente fica muito feliz quando vocês colocam, principalmente, a questão da renúncia fiscal como uma política pública, para incentivar o desenvolvimento do País, o desenvolvimento econômico e social. É muito importante isso.
Eu queria agradecer mais uma vez a presença e a participação dos senhores convidados, bem como os assessores ouvintes aqui que prestigiaram o debate.
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