2ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA 57 ª LEGISLATURA
Comissão de Saúde
(Desafios e Perspectivas em Políticas Públicas para Doenças Raras e Autismo (semipresencial))
Em 10 de Dezembro de 2024 (Terça-Feira)
às 9 horas
Horário (Texto com redação final.)
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O SR. APRESENTADOR (André Castro) - Senhoras e senhores, bom dia.
Tem início, neste momento, a solenidade de abertura do Seminário Desafios e Perspectivas em Políticas Públicas para Doenças Raras e Autismo. Este evento é uma iniciativa da Subcomissão para Políticas Públicas de Saúde para o Transtorno do Espectro Autista e para as Doenças Raras e demais Neurodiversidades da Comissão de Saúde da Câmara dos Deputados.
Este seminário é uma experiência ímpar para ouvir especialistas em doenças raras e em autismo, e as discussões das cinco Mesas de hoje certamente contribuirão para alguns dos principais objetivos desta Subcomissão. Dentre esses objetivos, podemos destacar a proposição, discussão e aprovação de projetos de lei que assegurem às pessoas com doenças raras e autismo o direito e as garantias fundamentais previstas na Constituição Federal, em especial a atenção à saúde.
Eu informo aos presentes que este seminário está sendo transmitido ao vivo pelo canal da Câmara dos Deputados no YouTube para ampliar a participação social por meio da integração digital.
Nós convidamos, para compor a Mesa de honra desta solenidade, o Presidente da Comissão de Saúde da Câmara dos Deputados, Deputado Dr. Francisco. (Palmas.)
Convidamos a Presidente da Subcomissão para Políticas Públicas de Saúde para o Transtorno do Espectro Autista e para as Doenças Raras e demais Neurodiversidades da Comissão de Saúde da Câmara dos Deputados, Deputada Flávia Morais. (Palmas.)
Nós convidamos a Relatora-Geral da Subcomissão para Políticas Públicas de Saúde para o Transtorno do Espectro Autista e para as Doenças Raras e demais Neurodiversidades da Comissão de Saúde da Câmara dos Deputados, Deputada Iza Arruda. (Palmas.)
Convidamos a Sra. Ministra de Estado da Ciência, Tecnologia e Inovação, Sra. Luciana Santos. (Palmas.)
Convidamos o Ministro de Estado do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome, Sr. Wellington Dias. (Palmas.)
Nós registramos e agradecemos as presenças do Secretário-Geral Substituto de Educação Continuada, Alfabetização de Jovens e Adultos, Diversidade e Inclusão do Ministério da Educação, Sr. Cleber Santos Vieira; do Coordenador-Geral de Saúde da Pessoa com Deficiência do Ministério da Saúde, Sr. Arthur Medeiros; e do Coordenador-Geral Substituto de Diversidade e Interseccionalidade do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, Sr. Hisaac Alves de Oliveira.
Senhoras e senhores, nós convidamos todos os presentes para, em posição de respeito, ouvirmos o Hino Nacional Brasileiro, interpretado pelo coral da Câmara dos Deputados.
(Procede-se à execução do Hino Nacional.)
09:47
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O SR. APRESENTADOR (André Castro) - Nós registramos e agradecemos, ainda, as presenças das Deputadas Federais Ana Paula Lima e Maria Rosas.
Neste momento, nós convidamos para uma saudação inicial a Presidente da Subcomissão Permanente para tratar de Políticas Públicas de Saúde para o Transtorno do Espectro Autista e para as Doenças Raras e demais Neurodiversidades, Deputada Flávia Morais.
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A SRA. FLÁVIA MORAIS (Bloco/PDT - GO) - Bom dia a todos, bom dia a todas. Gostaria de cumprimentá-los com muito carinho e dar-lhes as boas-vindas. Quero cumprimentar o nosso Presidente da Comissão de Saúde, Deputado Dr. Francisco, que, de forma muito desprendida, autorizou a criação da Subcomissão, que é um espaço importantíssimo para que nós possamos detalhar, especificar os debates, as discussões em torno do autismo e das doenças raras.
Quero cumprimentar o Ministro do Desenvolvimento e Assistência Social, Wellington Dias, que se faz presente e que com certeza tem uma preocupação enorme com esta pauta. S.Exa. está aqui para nos prestigiar e também para compartilhar conosco as suas experiências, principalmente de quando foi Governador no Piauí. A sua presença engrandece muito este evento.
Quero cumprimentar também a nossa Ministra Luciana Santos, que foi Deputada Federal, sempre humana e que luta por várias causas. Hoje, como Ministra de Ciência e Tecnologia, também é uma presença muito importante neste evento.
Cumprimento a nossa Relatora da Subcomissão, a Deputada Iza Arruda, engajada principalmente no tema do autismo e que tem feito um belo trabalho junto à Comissão.
Queria agradecer a presença da sociedade civil, que tem sido grande parceira e tem nos subsidiado muito no nosso trabalho. Eu me refiro às Apaes: a Apae de Anápolis, que é referência na triagem neonatal no nosso Estado de Goiás, e a Apae de Palmeiras de Goiás.
Queria cumprimentar a todos os gestores municipais, na pessoa da nossa Vice-Prefeita de Montividiu, a Debora, que está aqui, da nossa Vereadora Camila, eleita, que também já tem uma afinidade muito grande com esta causa.
Cumprimento os nossos Deputados Maria Rosas, Ana Paula e Geraldo Resende.
Quero dizer que temos, na atuação da Comissão de Saúde, uma importância muito grande para o povo brasileiro. É através desta Comissão que nós discutimos todos os temas relacionados à saúde. Muitas conquistas, em termos de orçamento, de garantias, conseguimos através dos participantes desta Comissão, que têm feito um trabalho incansável na defesa do acesso à saúde.
Estamos hoje, neste seminário, coroando os trabalhos da Subcomissão que foram realizados durante todo este ano. Hoje será um momento em que vamos ouvir vários especialistas, que vão nos trazer suas experiências e o que há de mais novo em relação ao autismo e às doenças raras, para que possamos avançar.
Hoje, o autismo nos traz um desafio muito grande em relação a essas pessoas que, com todo o seu potencial, com todas as suas perspectivas, precisam muito do apoio direcionado, específico, para que possam desenvolver todas as suas habilidades. Da mesma forma em relação às doenças raras, que para nós também são um grande desafio, desde o diagnóstico até o tratamento. Sabemos da dificuldade que temos, do quanto precisamos investir mais em pesquisas e em conhecimento e trazer isso, sim, a esses pacientes de doenças raras, para que eles possam ter acesso a condições melhores de vida. Então, fica o nosso trabalho.
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Quero dar as boas-vindas a todos e desejar um ótimo dia de trabalho.
Muito obrigada e bom dia. (Palmas.)
O SR. APRESENTADOR (André Castro) - Senhoras e senhores, neste momento, nós convidamos para falar a Ministra de Estado da Ciência, Tecnologia e Inovação, a Sra. Luciana Santos.
A SRA. MINISTRA LUCIANA SANTOS - Muito bom dia a cada uma e a cada um de vocês aqui presentes.
Quero parabenizar a iniciativa da Câmara dos Deputados, esta Casa onde eu tive a honra e o prazer de conviver, por 8 anos, na Comissão de Ciência, Tecnologia e Inovação e em outras Comissões. Aqui estão muitos dos meus colegas — a Deputada Flávia Morais, que foi do meu tempo na Câmara dos Deputados, com quem partilhamos; o Wellington Dias já estava em outros voos; e a Deputada Iza Arruda, também é minha colega de Pernambuco.
Quero saudar o Presidente da Comissão de Saúde. Parabéns por conduzir, Deputado Dr. Francisco, uma Comissão tão importante para a Câmara dos Deputados! Saúdo a Deputada Federal Maria Rosas; a Deputada Federal Ana Paula Lima; o Wellington Dias, além de ter partilhado comigo outros momentos, agora também partilha comigo, sob a liderança do Presidente Lula, os desafios do Ministério, como Ministro do Desenvolvimento Social; e a Juana Nunes, Diretora do Departamento de Popularização da Ciência, Tecnologia e Educação Científica.
Quero parabenizar a Deputada Iza Arruda pela relatoria da Subcomissão para Políticas Públicas de Saúde para o Transtorno do Espectro Autista e para as Doenças Raras e demais Neurodiversidades; a Deputada Flávia Morais, que foi a primeira a falar aqui e preside a Subcomissão mencionada; o Arthur Medeiros, Coordenador-Geral de Saúde da Pessoa com Deficiência do Ministério da Saúde; e o Coordenador-Geral de Diversidade e Interseccionalidade do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, Hisaac Alves de Oliveira.
Estou saudando este Plenário que vejo repleto, principalmente, numa composição muito feminina. Esta é uma causa em que vemos a presença dos familiares, das mães que fazem movimentos justos no País afora, para que o Estado brasileiro possa responder com políticas cada vez mais arrojadas no tratamento das pessoas com doenças raras, com TEA, ou seja, com esse conjunto de desafios que este seminário se propõe a debater.
É uma honra participar desta importante iniciativa promovida pela Comissão de Saúde da Câmara. Hoje estamos aqui para debater questões cruciais para a construção de uma sociedade mais justa e inclusiva, que são as políticas públicas para doenças raras e transtornos de espectro autista.
No Governo do Presidente Lula, saúde e ciência andam de mãos dadas. Este é um Governo que cuida das pessoas, trabalha para não deixar ninguém para trás e entende que a ciência existe, sobretudo, para melhorar a vida das pessoas. Então, quando falamos de saúde, falamos também de pesquisa e desenvolvimento, de inovação e tecnologia, de produção de equipamentos, medicamentos e tratamentos que atendam às necessidades específicas da população. Não por acaso, o setor de saúde é o terceiro que mais recebe apoio da nossa agência financiadora, a FINEP. Desde o início da atual gestão até outubro de 2024, o nosso Ministério já havia investido mais de 2,6 bilhões de reais em 148 projetos voltados ao Complexo Econômico Industrial da Saúde. Quando consideramos as contrapartidas desses projetos, o valor ultrapassa os 3 bilhões de reais.
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Especificamente para doenças raras e TEA, o Ministério tem atuado com determinação, financiando iniciativas que geram impacto direto na qualidade de vida das pessoas. Sabemos que pacientes com doenças raras frequentemente enfrentam desafios relacionados ao diagnóstico — o principal é a dificuldade de obtenção de um diagnóstico precoce — e ao acesso a tratamentos apropriados, o que impacta diretamente a sua qualidade de vida. Compreendemos que promover a inclusão e fortalecer a conscientização sobre a neurodiversidade são passos essenciais para a construção de uma sociedade mais justa e igualitária, livre de preconceitos, que respeite e valorize as características únicas de cada pessoa.
Para exemplificar um pouco a nossa atuação, quero citar que, com recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, que o Presidente Lula recompôs integralmente — eu agradeço a esta Casa, a Câmara dos Deputados, que aprovou de forma célere a reintegração desse fundo —, nós investimos 69 milhões de reais, em 2023 e em 2024, na contratação de 28 projetos de pesquisa, desenvolvimento tecnológico e inovação na área de doenças raras. São projetos que envolvem risco tecnológico para o diagnóstico, o tratamento e a reabilitação de pessoas com doenças raras e para melhorar o acesso ao serviço de saúde e à informação, buscando atender às demandas do SUS.
Entre os projetos que apoiamos, eu destaco alguns aqui para ilustrar para vocês: um projeto de 1,9 milhão de reais da Universidade Federal de Pernambuco que visa a utilização de ômicas para avaliação de biomarcadores na progressão de doenças reumatológicas raras para o desenvolvimento de nanossistemas voltados ao uso em dispositivos sensores portáteis de diagnóstico humano aplicável no Sistema Único de Saúde; um projeto de 1,3 milhão de reais do Centro de Tecnologia da Informação Renato Archer para desenvolver um teste inovador para diagnóstico de ataxia de Friedreich; um projeto de 7,9 milhões de reais do Hospital das Clínicas da USP para um estudo que envolve imunoterapia em pacientes com neoplasias malignas avançadas ou metastáticas; um projeto do Instituto de Ciências Biológicas da UFMG para desenvolver uma plataforma de biotecnologia para a produção de terapias avançadas para doenças raras; e um projeto de 1,9 milhões de reais do Instituto de Tecnologia em Fármacos, que é o nosso famoso Farmanguinhos, da FIOCRUZ, para estabelecer formulações inovadoras para melhorar o tratamento de fibrose cística.
Esses são exemplos concretos de como a ciência, a tecnologia e a inovação podem transformar a realidade de pacientes que, historicamente, enfrentam enormes barreiras para acessar cuidados adequados.
O transtorno do espectro autista é uma condição complexa que afeta milhões de pessoas em todo o mundo, com uma diversidade de manifestações e desafios que impactam não apenas os indivíduos diagnosticados, mas também as suas famílias e a sociedade como um todo. A pesquisa científica sobre TEA é, portanto, fundamental para o avanço do conhecimento. Compreender melhor as causas desse transtorno pode levar ao desenvolvimento de métodos e diagnósticos mais precisos e precoces, o que é essencial para a intervenção e o tratamento eficazes no tempo certo. Além disso, a pesquisa sobre novas terapias e intervenções terapêuticas inovadoras podem melhorar significativamente a qualidade de vida das pessoas com TEA e suas famílias. Nesse sentido, estamos empenhados na construção de uma rede nacional de pesquisa e desenvolvimento sobre autismo, nos moldes que ocorreram com a rede de estudos relacionada à síndrome de Down. Essa foi uma demanda que recebemos à época da última reunião da SBPC, e que tem o objetivo de produzir e sistematizar as evidências científicas mais relevantes na área de transtorno do espectro autista. A ideia é fomentar estudos que abranjam desde o diagnóstico e a estimulação precoce até a empregabilidade, passando por tratamento multidisciplinar, educação inclusiva e socialização. Essa rede é algo que está no nosso horizonte, e não vamos medir esforços para que seja implementada o mais rapidamente possível. Nós estamos fazendo o debate, numa construção coletiva com pesquisadores, cientistas, militantes, familiares da causa e todos os demais atores, para definir de maneira mais precisa, para além dos valores, os temas desafiadores que vão ser envolvidos. É nesse estágio em que estamos, mas pretendemos lançar esse edital no máximo até o segundo mês do ano que vem. Nós estamos formalizando esse compromisso com vocês. Podem ter certeza disso.
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O MCTI está desenvolvendo uma série de iniciativas voltadas à inclusão. Em 2023 e 2024, por exemplo, destinamos 72,5 milhões de reais para a instituição do Sistema Nacional de Laboratórios de Tecnologia Assistiva, chamado SisAssistiva, um dos nossos compromissos junto ao Novo Viver sem Limite do Governo Federal, do Presidente Lula. A iniciativa fomenta laboratórios multiusuários, abertos para o desenvolvimento de tecnologias acessíveis a pessoas com deficiência, incluindo pessoas com o transtorno do espectro autista. Um exemplo significativo da aplicação tecnológica disso está na comunicação aumentativa e alternativa para pessoas do espectro autista que não possuem comunicação verbal. Estamos apoiando pesquisas em pranchas de comunicação baseadas em ícones, bem como no desenvolvimento de tecnologias que ampliem a interação e a autonomia dessas pessoas.
Essas iniciativas reforçam o compromisso do Presidente Lula e do nosso Governo em garantir que o Viver sem Limite seja, mais que uma aspiração, uma realidade para todas as pessoas. Ao avançarmos na integração entre saúde e ciência, contando com esta Casa, estamos construindo um Brasil mais equânime e inclusivo, em que a ciência é a ponte para a dignidade e o respeito à vida.
Encerro agradecendo o convite para este diálogo fundamental. Estamos juntos na construção de políticas públicas que coloquem a ciência a serviço da sociedade, promovendo saúde, inovação e inclusão para todos os brasileiros e brasileiras.
Eu peço desculpas. Vou ter de sair correndo, porque participarei de um seminário sobre a Lei de Inovação Tecnológica.
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No fim de ano, quando pensamos que as agendas vão arrefecer, elas aumentam. Mas isso é sinônimo de trabalho e disposição para garantir as boas práticas e as boas políticas públicas para o nosso povo, para a nossa gente.
Um grande abraço.
Muito obrigada. (Palmas.)
O SR. APRESENTADOR (André Castro) - Obrigado, Ministra.
Nós ouviremos agora a Relatora-Geral da Subcomissão para Políticas Públicas de Saúde para o Transtorno do Espectro Autista e para as Doenças Raras e Demais Neurodiversidades da Comissão de Saúde da Câmara dos Deputados, Deputada Iza Arruda. (Palmas.)
A SRA. IZA ARRUDA (Bloco/MDB - PE) - Bom dia.
Hoje é um dia de alegria e conquistas. Hoje, de verdade, nós vamos coroar, neste grande seminário, todo o trabalho realizado até aqui. É um dia de compartilhamentos.
Eu gostaria muito de agradecer e saudar toda a Mesa: a Ministra Luciana Santos, minha conterrânea; o Ministro Wellington Dias; o Presidente da Comissão, Deputado Dr. Francisco, que aprovou para que tivéssemos uníssemos a Subcomissão que tratava das pessoas com autismo e a que cuidava das doenças raras numa única grande Subcomissão, que hoje se tornou permanente. Também quero agradecer e saudar a Presidente Flávia Morais, que conduziu tão bem esta Subcomissão, assim como os Deputados e Deputadas Maria Rosas, Ana Paula, Geraldo Resende, Diego Garcia, Amom, Alessandra Haber e tantos outros que estiveram conosco nesse trabalho, com diversas audiências públicas, diversos projetos aprovados.
Eu disse que hoje é um dia de compartilhamentos, mas tenho certeza de que será também um dia de aprendizagem, de inovação, de tecnologia e de conhecimentos. Sairemos deste seminário sensibilizados. Não sairemos daqui assim como chegamos. A partir dos compartilhamentos e das experiências, vamos adquirir ainda mais informações para termos mais garra e mais força para trabalharmos ainda mais pela inclusão, pela acessibilidade, pelas pessoas com deficiência.
Queria compartilhar rapidamente com vocês um momento que vivenciei em uma oportunidade que tive de ir à ONU, em Nova Iorque, onde conheci uma cafeteria inclusiva, chamada Joyeux. A pessoa que estava no caixa era autista, quem servia o café tinha síndrome de Down, e a pessoa ao lado, que anotava os pedidos, tinha uma deficiência intelectual. Cada pessoa estava ali, de forma inclusiva, estava trabalhando tão bem naquela cafeteria!
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Eu falo em inglês, Deputada Flávia, mas é um inglês “mais ou menos”. Então, na hora em que fui fazer meu pedido, eu até pensei em escolher algo rápido, mas eu queria muito estar ali, compartilhando aquele momento, Deputada Maria. Aí, pedi, em inglês, um café com leite e um sanduíche. A pessoa que me atendeu era autista. Na hora, ela disse: “Tudo bem, você quer um café com leite e um sanduíche. E o seu leite é integral ou desnatado? Qual é o tipo de leite?” Eu não o entendia. Eu falava: não, não, eu só quero um café com leite e um sanduíche. E ele, em inglês, respondia: “Tudo bem, é um café com leite e um sanduíche. Mas qual é o tipo de leite?” Quando ele começava a perguntar qual era o tipo de leite, eu não o entendia.
Na hora — e, todas as vezes em que eu falo isso, penso sobre essa situação —, eu até falei: minha gente, café é coffee, leite é milk. O que estou falando, Arthur, que não estou conseguindo ser compreendida aqui? Quando a gente estava em Nova Iorque, o Arthur era quem estava ali e conseguia me ajudar o tempo todo. E, aí, o atendente me olhou e disse: “Bom, se eu mudar de idioma, se eu falar com você em outra língua, facilita?” E, na hora, eu disse: sim, facilita muito. Ele perguntou: “Posso falar com você em espanhol?” Eu disse: está bem. Pode falar em espanhol. Naquele momento, ele me perguntou, em espanhol, o que era que eu queria. O café com leite ele já tinha entendido, mas ele queria saber qual era o tipo de leite.
E é por isso que sempre digo: não é a deficiência que limita a pessoa. A deficiência não limita. E a gente precisa, assim como está escrito na camisa da Samara, valorizar as capacidades e respeitar os limites. Naquele momento, era eu que não o conseguia entender. Ele inclusive mudou de idioma para que eu pudesse compreendê-lo, para eu entender o que ele estava dizendo e que eu não estava conseguindo compreender.
Naquele momento, quando vi aquela cafeteria com pessoas com deficiência e vi que aquela pessoa que estava me servindo, Camila, conseguia falar outros idiomas, lembrei-me de uma proposição que já tramitava aqui, que foi sancionada como a Lei nº 14.992, de 3 de outubro de 2024, e que tem a Deputada Flávia Morais como Relatora. É a lei que incentiva a inserção de pessoas com deficiência no mercado de trabalho.
Esse projeto já tramitava. E, naquele momento, eu tive a certeza, Deputada Ana Paula, de que a gente precisava lutar muito mais para que ele fosse sancionado, para que a tente pudesse ter esse incentivo, para que a gente pudesse ter mais pessoas com deficiência no mercado de trabalho, inseridas na sociedade. Lembro que 85% das pessoas com deficiência, 85% dos autistas, estão fora do mercado de trabalho. Ali, eu tive certeza de que a gente conseguiria, sim, fazer isso acontecer. Saí daquele momento muito mais encorajada para lutar aqui na Câmara.
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A Deputada Flávia Morais foi a Relatora desse projeto, e os Deputados e Deputadas aprovaram-no aqui, minha gente, por unanimidade. Todos aprovaram esse projeto, para que a gente pudesse ter esse incentivo, para que houvesse feiras e para que mais pessoas pudessem ser trazidas para o mercado de trabalho e, assim, a gente falasse das pessoas com deficiência. Não me refiro apenas às crianças, porque estas irão crescer. Mas, assim, a gente pode falar, ver, visualizar e trabalhar para as crianças, para os adultos e para os idosos com deficiência, porque inclusão é atitude, e inclusão é dar visão e colocar isso em ação.
É assim que a gente está fazendo aqui, trabalhando muito. Eu fico muito grata aos colegas Deputados e Deputadas, que trabalham tanto e incansavelmente para que essa pauta seja cada vez mais visibilizada. Espero que hoje a gente possa aprender muito. Espero também que este seminário seja cheio de conquistas, com muitas bênçãos de Deus, e que todos saiam daqui bem felizes e mais dispostos a trabalhar.
Um beijo no coração de todos. (Palmas.)
O SR. APRESENTADOR (André Castro) - Obrigado pela fala, Deputada Iza Arruda.
Neste momento, nós passamos a palavra ao Coordenador-Geral de Diversidade e Interseccionalidade Substituto do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, o Sr. Hisaac Alves de Oliveira.
O SR. HISAAC ALVES DE OLIVEIRA - Bom dia a todos e a todas.
Cumprimento, em nome da Ministra Macaé Evaristo, dos Direitos Humanos e da Cidadania, a Mesa, na pessoa do Presidente, o Deputado Dr. Francisco. Cumprimento todos que estão aqui presencialmente e os que estão nos acompanhando on-line pelo Youtube.
Meu nome é Hisaac Oliveira. Eu estou Coordenador Substituto de Diversidade e Interseccionalidade da Diretoria dos Direitos da Pessoa com Deficiência da Secretaria Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência do MDHC.
Eu trouxe várias informações, mas, como me falaram que o tempo das apresentações é curto, eu vou tentar resumir as ações que o nosso Ministério tem feito voltadas às pessoas com deficiência e, em especial, às pessoas com autismo.
Para quem não entende, informo que eu vou precisar aproximar bastante o papel porque eu sou pessoa com baixa visão. Eu tenho uma cegueira no olho esquerdo e enxergo 10% somente do olho direito.
Vou fazer a minha autodescrição. Eu sou um homem de 41 anos. Estou usando um terno cinza, com gravata também na tonalidade de cinza. Estou usando o meu crachá com o cordão de girassol, representando que eu tenho deficiência oculta. Tenho pele morena.
Estou na Secretaria desde 2021. Sou formado em Direito pela Universidade Federal do Acre, da qual também sou servidor, e estou requisitado para atuação no Ministério dos Direitos Humanos.
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Bem, dada a importância de ter a sociedade civil aqui presente para ouvir de nós enquanto Governo as ações realizadas, e considerando que o Ministério dos Direitos Humanos tem dentro do Plano Viver Sem Limite ações realizadas com 27 Ministérios, eu não vou trazer as ações do Viver Sem Limite diretamente, vou focar apenas duas ações que eu julgo bastante importantes do nosso Ministério, que estão a cargo da secretaria, uma delas a cargo da coordenação da qual eu estou substituindo o coordenador titular, que é o Raul.
A primeira ação, diretamente para o pessoal autista, é a criação da Câmara Técnica sobre Políticas Públicas e Deficiências Psicossociais, dentro do Viver Sem Limite, justamente para discutir as políticas e os direitos da pessoa autista, de forma a ouvir também as pessoas autistas e suas famílias. Nós, Governo, não podemos trabalhar decidindo somente, nós temos que ouvir vocês. Quem está lá na ponta é que sabe o que precisa ser melhorado, o que precisa ser ajustado, o que precisa ser criado.
Também está a cargo da minha coordenação o planejamento da implementação do Sistema Nacional de Cadastro da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista, instituído ainda na conferência, pelo Presidente Lula. Precisamos fazer uma implementação gradual, de forma que essa unificação não venha a trazer prejuízo para as pessoas, de forma que esse sistema venha a funcionar corretamente. Então, a ideia é de que seja um sistema que emita a Carteira de Identificação da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista que tenha validade nacional, para que quebremos aquela barreira... Por exemplo, eu sou uma pessoa autista do Acre — para quem não sabe, eu sou acriano, vim do Acre para Brasília — e tiro a minha carteira no Município de Rio Branco. Quando eu chego ao Distrito Federal, alguém me diz: "Não, aqui não vale". Quantas famílias já passaram por isso? Quantas vezes ouvimos famílias, dentro do próprio CONADE, falarem dessa dificuldade de ter o seu direito reconhecido, simplesmente porque o documento apresentado é de uma localidade diferente. Então, nós estamos trabalhando nessa regulamentação, para padronizar a CIPTEA, para que, quando precise se deslocar de uma Unidade da Federação para outra, uma pessoa autista não venha a ter o seu direito, o seu reconhecimento quanto as suas necessidades tolhido, simplesmente porque o documento foi emitido num local diferente. O Brasil é um país continental. Nós precisamos reconhecer as pessoas com deficiência, os seus direitos, as suas necessidades, independentemente do local em que elas estão. Então, o sistema de cadastro das pessoas com autismo vem nessa direção.
Outra ação, não exclusivamente para a pessoa autista, mas também para todas as pessoas com deficiência, é o Sistema Nacional de Avaliação Unificada da Deficiência, a Avaliação Biopsicossocial Unificada da Deficiência. Nós trabalhamos na regulamentação do art. 2º. O GT do qual eu fui secretário executivo, que encerrou seus trabalhos no mês de junho, apontou para o Governo Federal, no relatório final, que está publicado no site do Ministério, como deve ser a organização de um sistema nacional, para que a condição de deficiência seja reconhecida nacionalmente. Se eu fui avaliado no Acre, que a minha avaliação sirva em qualquer Unidade da Federação, em qualquer Município. Se eu fui avaliado em São Paulo, no Rio de Janeiro ou em algum Estado da Região Nordeste, que essa barreira de não reconhecer a condição de deficiência também seja quebrada e que, com apenas uma única avaliação, a pessoa com deficiência possa acessar as diversas políticas públicas. Só em âmbito federal, são mais de 30 as políticas públicas. Com a avaliação unificada da deficiência, quebramos a necessidade, por exemplo, de um edital de concurso público pedir um tipo de avaliação, e outro edital de concurso pedir outro tipo de avaliação. E as pessoas que não têm plano de saúde? Como elas conseguem, de um edital para o outro, renovar o laudo, correr atrás dessa documentação? É sempre uma maratona que o cidadão precisa correr anualmente para comprovar que tem deficiência, por diversos órgãos, nas diversas Unidades da Federação.
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O SISNADEF vem com essa ideia também, a de desburocratizar o reconhecimento dos direitos da pessoa com deficiência, numa visão biopsicossocial, como a convenção coloca, numa visão de direitos humanos, não estritamente numa visão biomédica. Então, esse sistema vem também trazer uma economia para os cofres públicos, porque não vai ser preciso avaliar a mesma pessoa dez vezes, 15 vezes durante o mesmo ano. A condição de deficiência precisa ser reconhecida, e tem que haver um tempo suficiente, caso a pessoa necessite de uma reavaliação — que não seja no mesmo ano. "Ah! Saíram dez editais de concurso. Eu preciso participar dos dez editais. Eu tenho que ter dez avaliações?" Não.
O Ministério dos Direitos Humanos vem com essas duas políticas, além do Plano Viver sem Limite, buscando reconhecer a pessoa com deficiência nas suas necessidades. O SISNADEF também, mais do que reconhecer a deficiência, vem, através do Índice de Funcionalidade Brasileiro Modificado, apontar as barreiras que nós pessoas com deficiência enfrentamos. Por exemplo, no meu caso, quando eu for avaliado, mais do que apontar que eu sou uma pessoa com deficiência do tipo sensorial, esse sistema vai apontar, através desse instrumento, as barreiras que o Hisaac enfrenta no dia a dia, seja para ir ao trabalho, seja para estudar, seja para exercer atividade laboral. Isso é importante para o Governo porque, ao identificar as barreiras que as pessoas com deficiência no nosso Brasil enfrentam, nós podemos focalizar as políticas públicas que servem para reduzir ou eliminar essas barreiras. Isso é muito mais importante. O nosso conceito de deficiência hoje no Brasil é o de que a deficiência está no meio, não no meu corpo. Então, eu preciso fazer com que esse meio seja acessível, com que ele seja inclusivo, com que ele respeite as minhas necessidades. Não sou eu que tenho que me adaptar ao ambiente. Não é isso o que todos nós pessoas com deficiência buscamos?
Então, essas são grandes missões do nosso Ministério.
Apontando sobre o Plano Viver sem Limite, na primeira fase temos 95 ações, 27 Ministérios e a previsão de um orçamento de 6,5 bilhões de reais, para realizar todas essas ações voltadas para a pessoa com deficiência.
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Para finalizar, mais uma vez eu agradeço, em nome da Ministra Macaé Evaristo, pelo convite. É uma pena que o tempo tenha sido curto. Eu ia trazer uma apresentação maior sobre avaliação biopsicossocial. O Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania se coloca disponível para vir outra vez e falar sobre a avaliação, explicar onde nós estamos e dizer quais são as ideias e as barreiras que precisamos enfrentar para implantar o Sistema Nacional de Avaliação Biopsicossocial Unificada da Deficiência. Quanto mais informações trouxermos para a sociedade, para o nosso Parlamento, mais vamos ter parceiros para construir esse sistema, que vem para reconhecer a pessoa com deficiência como um indivíduo de direitos que precisa ter suas necessidades reconhecidas e suas barreiras eliminadas, para que possamos estar realmente e plenamente incluídos e participar efetivamente da sociedade.
Era isso.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. APRESENTADOR (André Castro) - Nós agradecemos ao Sr. Hisaac Alves de Oliveira pelas palavras.
Neste momento, senhoras e senhores, nós convidamos para a sua fala o Ministro de Estado do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome, o Sr. Wellington Dias. (Palmas.)
O SR. MINISTRO WELLINGTON DIAS - Bom dia.
Eu sou descendente de indígena — minha cara não nega —, tenho cabelos pretos e 1 metro e 73 centímetros de altura. Estou vestindo neste instante um terno de cor azul-clara e uma gravata de cor vinho claro.
Eu quero, na pessoa do meu conterrâneo, o Deputado Dr. Francisco, parabenizar a Comissão de Saúde por apoiar essas iniciativas.
Na pessoa da Deputada Flávia Morais, quero saudar todos os membros das duas subcomissões que tratam da temática do autismo e das doenças raras, que é uma comissão unificada. Eu gostei desse formato, que é muito importante. Contem comigo, não só como Ministro, contem comigo também como Senador. Abraço essa causa há muitos anos.
Temos uma professora em casa, a Deputada Rejane Dias e eu — acho que muitos a conheceram aqui e convivem com ela —, e a Danielle Dias é a minha professora. Quem convive com pessoas com deficiência sabe o quanto aprendemos com isso.
Esteve aqui a nossa querida Ministra Luciana Santos. Como ela apontou, o Presidente Lula, ao retomar os investimentos na área de ciência e pesquisas, coloca essas duas áreas como prioridade.
Quero lembrar que o Deputado Dr. Francisco foi Secretário de Saúde, vivenciou experiência semelhante e, por isso, tem toda a sensibilidade.
Quero saudar minhas queridas Deputadas Flávia Morais e Iza Arruda, com muito carinho. Sei de todo o seu entusiasmo. Saúdo a minha querida Deputada Ana Paula Lima. Tenho acompanhado o seu trabalho muito destacado na área social.
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Saúdo o Deputado Federal Geraldo Resende, a Deputada Maria Rosas, que também é muito atuante, o meu sempre Ministro Osmar Terra, colega aqui no Parlamento. Eu ainda era Deputado Federal, e já atuávamos juntos. Depois fui para o Senado. Aqui juntos trabalhamos em um grupo de trabalho que terminou viabilizando para o Brasil a primeira política mais organizada voltada para a pessoa com deficiência.
Osmar, quero agradecer por todo o seu trabalho, pelo seu empenho.
Quero saudar o Deputado Dr. Zacharias Calil, o Deputado Diego Garcia, o Deputado Dr. Frederico, a Deputada Rosangela Moro, o Sr. Arthur Medeiros, que está aqui pelo Ministério da Saúde, o Sr. Hisaac de Oliveira, que falou pelo Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania, e a Sra. Helena dos Santos, do Ministério da Saúde.
Quero saudar a Felícia dos Reis e, na pessoa dela, a nossa equipe do Ministério do Desenvolvimento Social.
Permitam-me saudar a Samara. Ela é mãe do Isaac e do Carlinhos, essa dupla dinâmica que está aqui para nos trazer à memória a importância de olhar para eles e para elas.
Quero saudar o Sr. Oswaldo Freire. Na pessoa dele, saúdo todos os cientistas. Ele é autor do livro sobre autismo.
Eu vi aqui a programação e achei fundamental.
Há dois pontos que eu queria colocar. O primeiro é uma experiência de vida. Lembro-me de quando eu estava numa campanha pelo meu Estado, o Piauí, quando recebi o diagnóstico de autismo da nossa filha. Isso mexe conosco e mexe mais quando começamos a ir atrás de tratamento e vemos que o pouco que existe é muito pulverizado. Você encontra aqui alguém que vai trabalhar a parte psicológica, mas a parte nutricional está em outro lugar, a fisioterapia, em outro local. O pai e a mãe entram em pânico, porque realmente é uma alteração de vida. Eu confesso, da minha parte e da Rejane, que isso nos ajudou e muito a mudar a nossa vida.
O outro ponto que eu queria citar — aliás, sem querer me vangloriar — é que isso nos levou, tendo eu lá na frente a oportunidade de ser Governador do Piauí por quatro vezes e Parlamentar, a organizar no Estado uma rede que pudesse trabalhar as condições da política para a pessoa com deficiência. Não é exagero, mas o meu Estado era um dos que tinham o maior número de pessoas com deficiência. Visto o tamanho do problema, criamos uma secretaria exclusiva para a pessoa com deficiência, com um fundo. A partir daí criamos os centros de alta complexidade que existem hoje no centro do Estado, na cidade de Teresina, no norte do Estado, na cidade de Parnaíba, no sul do Estado, na cidade de São João do Piauí. Também há uma rede, na linha da atenção básica, de baixa e média complexidade, espalhada em 56 regiões do Estado. Conto isso porque um dos pontos de que eu vou tratar aqui como prioridade eu vi depois que era um problema. O Rio Grande do Sul também tinha uma política avançada, bem como Santa Catarina — são poucos Estados —, Brasília, com o Hospital Sarah Kubitschek, e São Paulo, com a AACD. Quando você começa a lidar com o tema, você descobre um buraco do tamanho do mundo, a começar pela escassez de profissionais e pela escassez de conhecimento disponível — conhecimentos existem, mas você não encontra com facilidade disponíveis. A partir daí, você pensa numa rede. O principal desafio é esse.
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Então, nós estamos dialogando sobre isso. Eu acho que é importante este trabalho da Comissão de Saúde, da subcomissão, que deve ser integrado com o social, com a educação, com ciência e tecnologia, com a área dos direitos humanos, com outras áreas, porque realmente há necessidade dessa forte integração, desde curso técnico voltado para a pessoa especializada até política de cuidados com a pessoa com deficiência, porque não há. Você tem um técnico de enfermagem que tem conhecimento sobre um ponto, mas não é específico. Quando precisamos de alguém para cuidar de um autista, de uma pessoa com doença rara, enfim, encontramos a falta de um piso, descobrimos ali o tamanho da dificuldade.
O Ministério abraçou a ideia da política de cuidados. E devo dizer que ela nasceu de uma agenda de mães com o próprio Presidente da República, ainda após a eleição.
Quando ele me convidou para o Ministério, Osmar, ele colocava a importância de organizar a política de cuidados, pensando em quem cuida e em quem precisa de cuidados, pensando em crianças, em pessoas com deficiência, idosos, em pessoas com problemas, não só com autismo, mas também com outros transtornos mentais, pensando também em pessoas que são refugiadas, na população em situação de rua. Enfim, há necessidade de olhar para quem precisa de cuidados e para cuidadores, especialmente as mulheres.
Nesse aspecto, eu agradeço à Câmara Federal e agora ao Senado Federal, que, por unanimidade, coisa que é rara no Parlamento, aprovaram a Lei da Política Nacional de Cuidados. O Presidente da República amanhã sancionaria a lei, mas — e não sei se todos acompanharam — ele fez uma cirurgia. Se Deus quiser, vai ficar tudo bem. A partir de um debate que começamos no ano passado, nós vamos ter a primeira Política Nacional de Cuidados. O principal foco dela é exatamente este: como trabalhar as condições do ponto de vista social, com o olhar voltado para a família, com um atendimento de preferência vinculado, ou seja, que possamos ter, por exemplo, as equipes de saúde e as equipes da área social fazendo o atendimento domiciliar — este é um dos pontos principais — e, é claro, os centros de convivência e as unidades de atendimento onde não for possível. Depois que a Ministra Macaé assumiu, tratamos disso como um ponto destacado. Vamos ter que atuar junto com várias áreas do Governo e também com Estados e Municípios, a academia e toda essa rede, com entidades e com o próprio setor privado. Conto outra história. Eu estava aqui no Parlamento, no Senado, quando uma garota chamada Bárbara Cardoso me procurou. Ela trazia o problema do seu irmão, o Rafael, que na época tinha 27 anos de idade. Goiano, formado em tecnologia da inteligência, seu sonho era ser piloto de avião. Cerca de 10 anos atrás, a vida do Rafael, como Bárbara disse, parou, por causa de uma doença rara. Esse jovem passou a ter uma doença rara no ouvido — há apenas 150 casos registrados no mundo. A dor que ela causa é considerada a pior dor do mundo. O termo técnico é neuralgia glossofaríngea, originada no plexo do tímpano. Então, esse jovem e também sua família se sentiram desamparados. Eu mesmo liguei para o Governador Ronaldo Caiado e para a Ministra Nísia Trindade. A partir daí, com a solidariedade de muita gente da ciência, ele conseguiu ir para o único lugar do mundo que trata disso, para os Estados Unidos. A notícia boa é que o tratamento está dando resultado. Ele não esqueceu o sonho, continua sonhando em ser piloto de avião. Agora ganhou um patrocínio lá mesmo nos Estados Unidos para fazer o curso de piloto de avião. Eu cito esse caso para dizer que não escolhemos ter uma doença e que, quando a família se depara com alguém com uma doença rara, a situação é muito mais complexa. Por isso a importância desta Comissão, porque eu creio mesmo que, se não houver um olhar do Poder Central, no caso, do Parlamento brasileiro, não vamos avançar.
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Então, eu vim aqui hoje para dizer da minha alegria com esta Comissão, com esta subcomissão especial, meu querido Deputado Dr. Francisco e minhas queridas Deputadas Flávia Morais e Iza Arruda e todos os Parlamentares. Abracem com todo o coração essas duas causas, que, na verdade, têm muito em comum. Repito: independentemente de onde eu estiver, contem comigo. Eu sei da importância do que vocês resolveram priorizar. Não é fácil. Eu quero prevenir que não é fácil. Mas, para que possamos dar os passos necessários, estamos aqui com pais, mães, pessoas que militam nessa causa, profissionais — talvez eu seja o que menos conhece sobre a temática, do ponto de vista científico. Com certeza, no MDS, nós vamos implementar, com todo vigor, a política de cuidados focada nessa área, além de todas as outras políticas da assistência, com muito carinho, de forma integrada com outros Ministérios e com outras áreas. Posso afirmar que o Presidente do Brasil tem muita sensibilidade e muito compromisso com essas causas. Contem comigo! Muito obrigado.
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(Palmas.)
O SR. APRESENTADOR (André Castro) - Nós agradecemos ao Sr. Ministro Wellington Dias pelas palavras.
Senhoras e senhores, neste momento, nós convidamos para fazer uso da palavra o Presidente da Comissão de Saúde da Câmara dos Deputados, Deputado Dr. Francisco.
O SR. DR. FRANCISCO (Bloco/PT - PI) - Minhas saudações e meu bom-dia especial a todos os presentes neste importante seminário.
Quero saudar e parabenizar as pessoas que conduzem os trabalhos desta Subcomissão, nas pessoas da Deputada Flávia Morais, Presidente, e da Deputada Iza Arruda, Relatora-Geral.
Agradeço ao nosso Ministro do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome, Wellington Dias, pela presença. É sempre um prazer ouvir seus relatos, que demonstram sua experiência e sua dedicação. Eu o acompanhei de perto nessa política pública muito importante. O Estado do Piauí sempre teve um cuidado especial com as pessoas com deficiência. O Estado tem uma política pública muito efetiva na área da saúde, na área social, na área da educação, sempre com cuidado e preocupação com a inclusão.
Saúdo também o Hisaac Alves de Oliveira, representante do Ministério dos Direitos Humanos. Hoje, Dia Internacional dos Direitos Humanos, é importante termos aqui um representante desse Ministério.
Saúdo os representantes dos demais Ministérios. Na pessoa do Arthur Medeiros, Coordenador-Geral de Saúde da Pessoa com Deficiência, do Ministério da Saúde, eu quero saudar os representantes dos mais diversos Ministérios.
Saúdo os nossos colegas Parlamentares: Deputado Osmar terra, Deputada Ana Paula Lima, Deputada Dra. Mayra, Deputado Geraldo Resende, Deputada Maria Rosas.
Saúdo todos que, no dia a dia, fazem muito bem o trabalho desta Subcomissão.
No início deste ano, em comum acordo com os membros da Comissão de Saúde, tomamos a decisão de concentrar em uma Subcomissão Permanente este tema, que antes era tratado de forma fragmentada na Subcomissão Especial do Autismo e na Subcomissão Especial de Doenças Raras. Com esta Subcomissão Permanente, os Parlamentares podem se dedicar mais, podem se aprofundar no tema, a fim de debater sobre essas políticas públicas muito necessárias.
Nós sabemos da sensibilidade que este tema sempre provoca. No que diz respeito às doenças raras, o grande desafio é chegar ao diagnóstico. Quando você chega ao diagnóstico, a grande dificuldade é o acesso a uma linha de cuidado, com locais para o acompanhamento, com locais para o tratamento. Muitas vezes, há dificuldade de acesso ao tratamento. Em muitos casos, o tratamento acaba tendo um custo elevado.
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Da mesma forma, isso ocorre com os pacientes com autismo e com suas famílias que se deparam com a necessidade de um acompanhamento multiprofissional, mas, muitas vezes, recebem um tratamento muito fragmentado. Embora reconheçamos o trabalho que tem sido feito pela política da pessoa com deficiência, com a estruturação de centros especializados de reabilitação, com a garantia de mais acesso a esses centros que atendem pessoas com autismo, sabemos que precisamos avançar. É necessário oferecer mais acessos não só na área da saúde, mas também na área da educação. Acima de tudo, é preciso garantir que esses pacientes e suas famílias tenham realmente o apoio do poder público, com uma política pública mais efetiva.
Neste seminário, o nosso papel é debater sobre esse tema. Parabenizo os Parlamentares que se dedicam, de forma muito acentuada, a estudar esse tema, que trazem especialistas para o debate, a fim de aperfeiçoar os projetos que tramitam nesta Casa, para que se tornem políticas públicas mais efetivas e melhorem a vida de toda a nossa população.
Quero desejar um bom seminário a todos os participantes. Boa sorte! Tenho certeza de que vai ser um dia de muito conhecimento para todos nós.
Muito obrigado.
Tenham todos um bom dia. (Palmas.)
O SR. APRESENTADOR (André Castro) - Senhoras e senhores, nós ouviremos agora o Secretário Substituto de Educação Continuada, Alfabetização de Jovens e Adultos, Diversidade e Inclusão, do Ministério da Educação, Sr. Cleber Santos Vieira. (Palmas.)
O SR. CLEBER SANTOS VIEIRA - Bom dia a todas as pessoas que estão presentes neste importante seminário.
Quero cumprimentar a Deputada Iza Arruda, a Deputada Flávia Morais, o Ministro Wellington Dias, a Ministra Luciana Santos, que participaram da Mesa de abertura.
Eu estou aqui representando o Ministério da Educação, o Ministro Camilo Santana, na condição de Secretário Substituto da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização de Jovens e Adultos, Diversidade e Inclusão — Secadi. A Secretária Zara Figueiredo encontra-se em um compromisso oficial.
Para nós do Ministério da Educação, esse tema é muito importante. Desde que assumimos a Pasta, no ano passado, nós temos nos empenhado, de maneira muito intensa, nesta agenda. O fortalecimento e a afirmação da Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva foram compromissos assumidos em novembro do ano passado. Houve uma reconfiguração e uma reorganização para implementar essa política.
Nós tratamos das políticas de doenças raras e do autismo na perspectiva dos direitos humanos. Trago esta lembrança para aqueles que atuam na gestão da pauta dos direitos humanos, para todos os acadêmicos, para os agentes públicos, para os Parlamentares que atuam na agenda dos direitos humanos. Hoje é um dia muito importante para todos nós. Neste dia 10 de dezembro, a comunidade internacional é convidada a refletir sobre a importância de se considerarem políticas públicas para os seres humanos, respeitando, obviamente, as diferenças e as necessidades específicas de cada público, de cada situação, de cada segmento.
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Do ponto de vista do Ministério da Educação, temos trabalhado intensamente para atuar em algumas frentes.
Eu gostaria de destacar, em primeiro lugar, o processo de formação de professores e professoras que atuam nas classes regulares. Pela primeira vez, o Ministério da Educação oferta, de maneira massiva, um curso para esses profissionais. Esse curso, lançado ontem, é fruto de uma parceria do MEC, por meio da Secadi; da Capes, com a Universidade Aberta do Brasil; e da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, além de outras instituições que aderiram ao processo.
No total, 1 milhão e 250 mil vagas serão ofertadas para professores de classes regulares. O curso foi lançado ontem em cadeia nacional, por meio de uma live. Para este ano, já estão abertas 250 mil vagas. Estamos investindo 20 milhões de reais na construção desses cursos. A perspectiva é que cheguemos, até o fim do terceiro mandato do Presidente Lula, a 1 milhão e 250 mil vagas constituídas, por meio de uma rede construída com mais de 50 instituições, incluindo universidades e institutos federais que atuam nessa agenda.
Além disso, outra política que muito nos honra e na qual temos trabalhado intensamente é a Renafor — Rede Nacional de Formação Continuada de Professores, destinada a professores, agentes e gestores que atuam na pauta do atendimento especial. Apenas no ano passado, foram investidos 13 milhões de reais, com a oferta de 37 cursos e 22.977 vagas para esse público. Em 2024, o Ministério da Educação disponibilizou 30 milhões de reais, ofertando 77 cursos de formação, totalizando 38.113 vagas, considerando os números até outubro, pois o ano ainda está em fechamento.
Em terceiro lugar, destaco uma demanda intensa da sociedade, das famílias, das escolas e dos gestores que atuam nessa agenda específica: as salas de recursos multifuncionais e bilíngues para surdos. No ano passado, o Ministério da Educação investiu 237 milhões e 294 mil reais na compra de equipamentos e na estruturação dessas salas, de modo que sejam mais bem adaptadas para atender, com qualidade, as pessoas com deficiência, incluindo, na perspectiva dos direitos humanos, as pessoas com autismo e doenças raras. Estamos, portanto, nessa caminhada. Ao longo deste ano, tivemos um debate muito intenso, porém produtivo. É importante citar a recente homologação do Parecer nº 50, feita pelo Ministro Camilo Santana. Esse debate envolveu gestores, políticos, Parlamentares, militantes, famílias e escolas e trouxe diversas perspectivas e compreensões sobre a função do atendimento a essas pessoas. Esse processo foi liderado principalmente pela Secretária Zara Figueiredo. Nesse debate, ouvimos todos e todas em audiências e reuniões específicas. Finalmente, o documento, que gerou grande expectativa na sociedade, foi homologado pelo Ministro Camilo Santana. Agora, o processo se encontra em fase de operacionalização.
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Temos diversas outras ações a relatar, mas, em razão do tempo e do horário, eu gostaria de destacar que o Ministério da Educação, por meio da Diretoria de Políticas de Educação Especial na Perspectiva Inclusiva — representada pela Coordenadora Liliane Garcez e pelo Diretor Alexandre Mapurunga, que já esteve em diversos momentos nesta Casa —, coloca-se totalmente aberto a parcerias com outros Ministérios, órgãos e a sociedade civil, para garantir os direitos humanos das pessoas com doenças raras e das pessoas autistas.
Para finalizar esta minha participação, ressalto também a importância do programa Viver sem Limite, no qual o Ministério da Educação tem investido, de maneira honrada, recursos significativos para sua concretização. Alguns dos programas que aqui citei estão dentro desse repertório.
Que tenhamos um bom seminário!
Obrigado. (Palmas.)
O SR. APRESENTADOR (André Castro) - Nós ouviremos agora o Coordenador-Geral de Saúde da Pessoa com Deficiência do Ministério da Saúde, Sr. Arthur Medeiros. (Palmas.)
O SR. ARTHUR DE ALMEIDA MEDEIROS - Bom dia a todas e todos.
É uma satisfação estar aqui. Farei a minha audiodescrição rapidamente. Eu sou um homem branco, alto, careca, uso barba e estou vestindo um terno cinza, uma camisa branca e uma gravata bordô.
Venho, em nome da Ministra Nísia Trindade, trazer um abraço, demonstrando minha satisfação de estar presente neste evento tão importante, no qual poderemos, juntos, conversar, debater e refletir sobre estratégias para o fortalecimento das ações de cuidado às pessoas com transtorno do espectro autista e doenças raras.
A gestão do Presidente Lula e da Ministra Nísia tem empenhado todos os esforços para avançarmos e qualificarmos o cuidado dessas pessoas. Tanto é que, nessa nova configuração do Ministério da Saúde, foi criada uma coordenação específica para o cuidado das pessoas com doenças raras: a Coordenação-Geral de Doenças Raras, liderada pelo Dr. Natan de Sá, que tem promovido avanços significativos no diagnóstico e no cuidado de pessoas com doenças raras.
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Desde o início da gestão, já houve um aumento de mais de 40% nos centros de referência de doenças raras habilitados pelo Ministério da Saúde, justamente para que possamos avançar na capilarização desses centros pelo País. Precisamos garantir espaços preparados, qualificados, para que as pessoas consigam ter o seu acesso garantido.
Em relação ao cuidado das pessoas com deficiência, não vou me alongar aqui, porque, logo na sequência, haverá um painel para falar dos avanços específicos em relação à Política Nacional de Saúde da Pessoa com Deficiência. Mas quero dizer que, desde o ano passado, todos os esforços foram direcionados para a qualificação da política, para a qualificação da rede, para a ampliação dos recursos de investimento e de custeio da Rede de Cuidados à Pessoa com Deficiência, para o cuidado de todas as pessoas, incluindo aquelas com transtorno do espectro autista.
A Ministra tem nos demandado muito em relação à qualificação da Rede de Cuidados à Pessoa com Deficiência, para que possamos capilarizar e levar os serviços para cada vez mais perto das pessoas, a fim de que elas consigam ter o acesso garantido, em tempo oportuno e o mais próximo da sua realidade.
Então, o Ministério da Saúde tem avançado em relação a isso. Vou trazer um pouco mais desse tema para vocês daqui a pouco.
Mais uma vez, quero dizer que é uma satisfação estar aqui hoje com todas essas pessoas. Tenho certeza de que vamos sair daqui com bons encaminhamentos em relação ao cuidado a essas pessoas.
Obrigado. (Palmas.)
O SR. APRESENTADOR (André Castro) - Nós agradecemos às autoridades que compuseram esta Mesa, convidando-as a se integrarem ao Plenário, para darmos início à Mesa de debates deste seminário. (Pausa.)
A SRA. PRESIDENTE (Iza Arruda. Bloco/MDB - PE) - Convido para compor esta primeira Mesa de discussões o Coordenador-Geral de Saúde da Pessoa com Deficiência do Ministério da Saúde, Sr. Arthur Medeiros, que está aqui presente; o Auditor de Controle Externo do Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco, Sr. João Francisco Alves.
Anuncio a participação nesta Mesa, no formato virtual, da Sra. Luciana Brites, pedagoga, psicopedagoga e psicomotricista, fundadora do Instituto Neurosaber.
Convido o Deputado Geraldo Resende para compor a Mesa neste momento, a fim de compartilharmos a Presidência. (Palmas.)
Antes de passar a palavra aos convidados desta Mesa, informo aos presentes que a participação popular nas discussões poderá ocorrer por meio da ferramenta Debate Interativo, disponível no link deste evento, na página da Comissão de Saúde da Câmara dos Deputados, na Internet. As perguntas mais votadas e mais relevantes poderão ser selecionadas para serem respondidas pelos expositores.
Passo a palavra à Sra. Luciana Brites, que terá até 8 minutos para sua exposição.
A SRA. LUCIANA BRITES - Muito obrigada.
Senhoras e senhores, bom dia.
É uma honra estar aqui para discutir um tema muito crucial e urgente: as políticas públicas voltadas para o transtorno do espectro autista.
Meu nome é Luciana Brites. Também faço parte da Frente Parlamentar da Neurodiversidade.
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Para entendermos um pouquinho o transtorno do espectro autista, destaco que é uma condição de desenvolvimento neurológico complexa e multifacetada, caracterizada por desafios na comunicação, na interação social e no comportamento.
Para termos uma ideia, nos Estados Unidos, estima-se que uma a cada 36 crianças seja diagnosticada com TEA. Esse é um dado alarmante, que nos convoca a uma ação imediata e eficaz. No Brasil, a falta de dados precisos reflete a necessidade de investirmos em pesquisas e levantamentos epidemiológicos que nos permitam entender melhor a prevalência e o impacto do TEA em nossa população.
Quais são os desafios atuais das políticas públicas em relação ao Brasil? No cenário brasileiro, enfrentamos vários desafios significativos, que exigem uma atenção social. Por ser um transtorno do neurodesenvolvimento, é de fundamental importância que haja a detecção precoce do autismo. Quanto mais precoce for essa detecção, mais conseguiremos melhorar o prognóstico. Isso é o que falam as evidências científicas.
A ausência de um sistema de saúde pública amplamente capacitado para esse diagnóstico precoce resulta em atrasos significativos na identificação e intervenção. Os Estados Unidos e outros países já utilizam a escala M-CHAT, por meio da qual já é possível fazer uma escala de triagem. Isso poderia ser implementado no Brasil inteiro, para que fizéssemos um diagnóstico de triagem, não um diagnóstico do autismo, ou seja, uma escala de triagem para crianças a partir de 1 ano e 6 meses.
A distribuição desigual de serviços especializados cria um cenário de ainda mais exclusão, em que apenas uma parcela da população tem acesso a um suporte necessário. Esse problema é exacerbado por longas filas de espera, que impactam o prognóstico dessas crianças com autismo, pela falta de financiamento adequado de centros de tratamento, e um dos temas mais importantes, que é a inclusão escolar e a formação de educadores. Apesar de políticas inclusivas estarem em vigor, muitas escolas não estão preparadas para receberem alunos com autismo, devido à falta de recursos e de formação adequada dos educadores.
Acabamos de ouvir que o Governo está implementando essas formações, mas é muito importante que a formação dos educadores passe pelo crivo das evidências científicas. Deve haver uma formação que alie a teoria e a prática. Essa formação deve ser multidisciplinar, já que o autismo é um quadro que vai demandar médico, fonoaudiólogo, professor, família. Precisamos que essa formação contemple todas essas questões, principalmente tratando-se da escola.
É necessário apoio — é óbvio — às famílias. As famílias de pessoas com autismo frequentemente encontram desafios emocionais e financeiros. Isso fica muito claro quando as pesquisas científicas dizem que a chance de separação em uma família que tem uma criança, um paciente, com autismo é três vezes maior. Há índices aumentados de depressão, transtorno de ansiedade. Esses índices são realmente importantes. Precisamos cuidar de quem cuida.
Para enfrentar esses desafios, proponho a criação e o fortalecimento de centros de referência em autismo. Por que isso seria importante? Porque seria um lugar de suporte para pessoas com autismo e suas famílias e também para os profissionais. Esses centros poderiam desempenhar um papel crucial na formação e na capacitação de profissionais de educação que querem muito fazer a inclusão, mas, por conta da dificuldade da formação, que muitas vezes não é dada ou é dada de maneira inadequada, não conseguem realizar o sonho de todo professor: fazer com que todas as crianças consigam aprender.
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Como poderiam ser a estrutura e a localização dos centros de referência? É importante a distribuição geográfica. Deve haver centros estrategicamente distribuídos para atender tanto áreas urbanas quanto áreas rurais. O ideal seria que cada Estado tivesse pelo menos um centro de grande porte, com unidades menores distribuídas em regiões estratégicas, para garantir acessibilidade a todos, além de uma infraestrutura projetada com toda a questão da acessibilidade.
Ali poderiam ser oferecidos vários tipos de serviços: do diagnóstico — busca-se, principalmente, que seja precoce — à avaliação de uma forma mais abrangente, utilizando, acima de tudo, profissionais qualificados. Sim, além de capacitarmos os professores e os pais, nós precisamos da capacitação dos profissionais. Muitos médicos, psicólogos, fonoaudiólogos precisam ser capacitados. Terapeutas ocupacionais e vários outros profissionais precisam passar por uma capacitação de qualidade, baseada em evidência científica e neurociência, para que esses centros realmente sejam efetivos.
Intervenções terapêuticas disponibilizaram uma gama completa de terapias baseadas em evidências científicas, como análise aplicada do comportamento, terapia ocupacional, fonoaudiologia e outras intervenções personalizadas. O objetivo é adaptar os programas às necessidades individuais de cada usuário e, é óbvio, oferecer o suporte educacional. Pode-se trabalhar em parceria com escolas locais para fornecer apoio educacional, incluindo formação de professores e elaboração de planos educacionais individualizados — PEIs para alunos com TEA.
A formação e a capacitação dos professores, no meu ponto de vista, são questões mais importantes. Deve haver programas de formação continuada. É essencial a implementação de programas nacionais de formação continuada, com focos baseados em evidência. Por que falamos tanto em evidências? Porque, diante das atividades e dos programas, com toda a questão teórica e prática, quando temos evidências, sabemos que aquilo funciona. O dinheiro público não pode ser investido em programas e formações que depois podem não ter resultado. E qual é o resultado? Os nossos alunos aprendendo, os professores seguros, as famílias felizes pelo desenvolvimento dos seus filhos.
Esses programas têm que ser atualizados regularmente para incorporar as últimas pesquisas e abordagens inovadoras no ensino de alunos com autismo. Deve haver módulos específicos sobre autismo, abordando desde a compreensão teórica até as estratégias práticas em sala de aula. Também precisa haver um programa de certificação e avaliação. Deve-se desenvolver um sistema de certificação para professores que completem a formação em práticas inclusivas e que também, futuramente, tenham redes de apoio e intercâmbios de boas práticas educacionais.
Além disso, é de fundamental importância capacitar também os gestores e todas as equipes escolares. Falamos muito da inclusão escolar, considerando somente o professor, mas temos que capacitar o diretor, o coordenador, a pessoa que cuida da merenda. Todos precisam ser capacitados. Então, devemos oferecer workshops e seminários a gestores escolares e equipes administrativas sobre a importância da inclusão escolar e sobre como criar um ambiente acolhedor, adaptado às necessidades dos alunos com autismo. Isso inclui a adaptação física e também a abertura para melhores políticas de inclusão.
Precisamos sempre promover campanhas de sensibilização e conscientização. Esses centros também poderiam auxiliar, tendo em seu calendário todas essas questões, ajudando a criar uma cultura escolar mais inclusiva e também mais empática.
O envolvimento da comunidade também é importante, porque a escola é um grande gerador de cultura, de valor, que a espalha para toda a sociedade, para toda a comunidade ao redor.
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Devemos fazer parcerias com instituições e universidades de pesquisa. Nós temos muitas pesquisas sendo realizadas no Brasil. Precisamos levar essas pesquisas e esses centros de pesquisa para o chão da sala de aula, para esses centros de referência, para que haja um acompanhamento, uma junção, a fim de que a pesquisa possa verdadeiramente auxiliar na transformação das práticas inclusivas que nós temos em toda a nossa sociedade.
Como exemplos de boas práticas, temos vários modelos. Temos, por exemplo, a Austrália, que tem um modelo de apoio integrado reconhecido pelo National Disability Insurance Scheme, um programa nacional que fornece financiamento e suporte personalizado para indivíduos com deficiência, inclusive autismo. Esse modelo oferece uma abordagem centrada na pessoa, permitindo que as famílias escolham serviços que melhor atendam às suas necessidades.
Além disso, há várias políticas em vários países, como Canadá e Dinamarca. Essas práticas internacionais destacam a importância de abordagens integradas centradas na pessoa e também baseadas em pesquisas e evidências científicas e promovem a inclusão e a participação plena da sociedade.
É muito importante considerarmos a implementação dessas políticas públicas no Brasil. É importante aprendermos com esses modelos e os adaptarmos sempre à nossa realidade.
Concluo reforçando a importância da colaboração entre Governo, sociedade civil, academia e organizações especializadas. Somente através de esforços conjuntos podemos criar e implementar políticas públicas nas quais o dinheiro público realmente seja investido, a fim de que nós possamos ter o retorno de tudo isso e que realmente façam a diferença na vida das pessoas com autismo e também das suas famílias.
Convido todos os presentes a se envolverem ativamente e a continuarem esse diálogo, propondo a formação de um grupo de trabalho contínuo para monitorar e ajustar nossas estratégias conforme necessário.
Muito obrigada pela atenção.
Estou à disposição para perguntas e para a discussão. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Iza Arruda. Bloco/MDB - PE) - Muito obrigada, Dra. Luciana Brites.
É muito importante o que a senhora fala sobre o programa de certificação de intercâmbios, com o qual podemos ter um ambiente acolhedor, para que todos — diretores, professores, coordenadores — possam participar. A partir daí, teremos avanços de verdade na cidadania plena.
Há pouco eu conversava com o Deputado Geraldo Resende sobre a importância de termos essa formação dos educadores.
Nós passamos a palavra para o Sr. João Francisco Alves, para que faça sua exposição.
O senhor tem até 8 minutos para discursar aqui, Sr. João.
O SR. JOÃO FRANCISCO ALVES - Bom dia, pessoal.
Eu agradeço o convite da Casa para participar deste evento muito importante. Em nome do Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco, eu agradeço o convite para falarmos um pouco sobre o trabalho que fazemos lá. Ele casa um pouco com o que está sendo feito aqui hoje.
(Segue-se exibição de imagens.)
O Tribunal de Contas está se debruçando sobre a temática do autismo basicamente desde 2021. Chegaram ao Tribunal de Contas várias denúncias de pais, mães, responsáveis legais, entes da sociedade civil e de outros órgãos públicos. Por exemplo, o Ministério Público Estadual solicitou ao Tribunal de Contas dados para saber em que pé estava a política pública em Pernambuco em relação ao tema, porque eles estavam recebendo várias demandas, sempre em relação a tratamento, diagnóstico, falta de profissionais capacitados. Eles não sabiam em que pé estava essa política pública em Pernambuco. De fato, faltavam informações, o que é uma tônica em todo o Brasil em relação ao autismo. Faltam dados sobre vários pontos importantes dessa política.
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Nós começamos a fazer um levantamento preliminar para identificar em que pé estava a política pública em relação ao TEA. Nós verificamos, de pronto, que existia um grande público-alvo envolvido. Faltavam serviços essenciais em relação à pessoa com transtorno do espectro autista. Basicamente, nós observamos que, se não fossem realizadas ações a curto prazo, direcionadas a esse público, outras áreas, tais quais educação, assistência social e emprego, sofreriam o impacto direto em curto prazo.
Eu sou auditor da área da saúde. Nós sempre fazemos um planejamento bianual para saber quais temáticas serão incluídas, porque não conseguimos abarcar todos os temas. Sabemos que saúde é um tema que, infelizmente, ainda possui uma série de problemas a serem enfrentados. Então, temos que, infelizmente, fazer um escopo para trabalhar e verificar quais são as prioridades. O TEA, dados esses pontos que eu falei, de 2022 a 2023, entrou no nosso sistema como prioridade, o que também ocorreu agora, em 2024 e 2025. Nós vamos aumentar o escopo para assistência social, emprego e educação, porque observamos essa necessidade.
Eu vou mencionar rapidamente o trabalho que fizemos. Há um QR Code disponível para quem quiser consultá-lo, para entendê-lo um pouco.
Fizemos um levantamento na saúde, no ano passado, em 2023, que abarcou todos os Municípios pernambucanos. Dos 185 Municípios existentes, 182 responderam as perguntas que nós fizemos e enviaram documentação comprobatória.
Mostro aqui uma imagem do painel que fizemos, um resumo, para apresentar esses resultados.
Há dados referentes a diagnóstico precoce, profissionais capacitados para prestar o diagnóstico para a pessoa autista, locais que prestam o serviço, tipos de locais que prestam o serviço, existência de treinamento parental ou não. Enfim, é algo bem completo, bem legal. Está bem interessante esse painel. Quem tiver interesse poderá acessá-lo no site do Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco. Quem quiser acessá-lo também pode usar o QR Code.
Além desse trabalho, nós fizemos um levantamento na educação. Eu não trouxe o QR Code com os dados, porque isso vai ser publicado no fim deste ano. Acho que, na semana que vem, ele será publicado. Fizemos uma varredura em 13 Municípios; e 801 escolas foram alvos dessa averiguação. Consultamos 10.816 profissionais, dentre professores regulares, professores de Atendimento Educacional Especializado — AEE, professores de apoio e de acompanhamento especializado. Então, mostraremos um panorama bem interessante. Eu não posso trazer dados, porque não fizemos a publicação.
Basicamente, isso se refere ao que a Dra. Luciana falou agora: atuação de profissionais sem capacitação, falta de crivo na contratação de profissionais de apoio, não se certificando se ele tem capacidade para prestar esse atendimento. Já, já, essa pesquisa do Tribunal de Contas estará no site.
Temos que chamar a atenção para o que observamos em relação a esse levantamento. O primeiro ponto foi o quantitativo de pessoas autistas que demandam serviços na área de saúde e educação.
Destaco um ponto rapidamente. Nos Municípios, em uma fiscalização da área da saúde, fizemos a seguinte pergunta: "Você tem um médico apto a atender uma pessoa autista?" A pergunta era simples: "Você tem um médico apto? Se você tiver, consegue verificar a fila de espera para esse profissional, para todos os atendimentos, não só para o autismo? Você sabe a fila de espera dele? E, se você sabe, você tem conhecimento de quantos se referem à avaliação para diagnóstico do autismo?" Cento e dois Municípios disseram "sim" para todas essas perguntas. Nós somamos as respostas deles em relação à fila de espera e observamos que há 45.367 pessoas na fila de espera para atendimento com esses profissionais. Dessas, 10.848 são avaliações diagnósticas do TEA.
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Portanto, um quarto dos atendimentos que esses médicos estão fazendo em Pernambuco — isso foi feito em 182 Municípios, pois três Municípios não responderam — está sendo demandado apenas para avaliação de diagnóstico. Isso não quer dizer que só atendem a um quarto de autistas. Aqui, só estão computados aqueles que fazem avaliação de diagnóstico. Se algum autista voltou lá para regulação de medicação, ele não entrou nesse cômputo. Pode haver até mais. Isso daqui é só avaliação de diagnóstico.
Fora isso, vimos que 711 escolas responderam "sim" às seguintes perguntas: "Você sabe mensurar a quantidade de neuroatípicos matriculados na sua escola? E, desses neuroatípicos, você sabe indicar quantos são autistas?" Assim, vimos que 17.441 neuroatípicos estavam matriculados nessas escolas. Desses, 9.070 eram autistas, ou seja, mais da metade desse público referia-se a pessoas autistas.
E o que é que chamou a nossa atenção em relação a isso? Sempre vemos a política pública caminhando com dados que discrepam da realidade. Por exemplo, quando houve a pandemia do novo coronavírus — eu sou auditor da saúde —, verificávamos, de forma muito fácil, a política pública se moldando para tentar diminuir aquela problemática que ficou discrepante. E nós vimos aumentar o número de casos, aumentar o número de mortes, e, paralelamente, a política pública foi avançando para trazer investimentos de outras Pastas, comprar insumos, trazer profissionais de campanha. Nós estávamos vendo a política pública andando, dada aquela situação discrepante. No autismo, chamou-nos a atenção o fato de que não vimos isso acontecer. Desde 2021, já estamos fazendo essa verificação. Nós vimos que, por mais que os números aumentem, cada vez mais a demanda está sendo represada. A política pública ou não existe, ou é incipiente, ou existe, mas de forma insuficiente.
Então, é difícil entender que haja dados tão discrepantes em relação à realidade que estejam nos chamando a atenção, mas não haja essa política. Nós pensávamos: o que acontece para não termos já, hoje, ações urgentes relacionadas à temática?
Novamente, parabenizo a Casa por ter feito esta Subcomissão importantíssima, pois este tema tem que ser discutido técnica e politicamente. Nós ainda nos perguntávamos o que acontecia e chegávamos à conclusão de que faltavam dados, faltavam insumos. Por mais que você, como gestor, receba a informação de que está havendo problema, se isso não estiver exposto em dados, a política pública não anda. Entendíamos que estavam faltando mais dados e mais estudos, mas sabíamos que, devido a esses números, não tinha como esse problema impactar de forma séria os próximos anos. Essa é a nossa constatação de 2021.
Neste ano, em 2024, já saiu uma matéria dizendo que autismo e judicialização são 60% da alta do BPC para pessoas com deficiência. Notou-se que o autismo é disparado a principal causa desse aumento da utilização do BPC. Isso aqui reflete, de forma direta, o que estamos falando.
Vejam: se em uma família há uma pessoa autista, cuja mãe — e normalmente é a mãe — não consegue ter um trabalho, não consegue se empregar e não consegue ter outra renda para cuidar dessa criança, essa criança não é inserida no tratamento para que possa desenvolver sua comunicação, sua interação social e pleitear uma vaga no mercado de trabalho, o que é outro grande problema. Esse público vai ficar com extrema dependência de recursos para sua subsistência e, normalmente, vai tentar se valer de uma medida assistencialista, o que configura o BPC. A partir de 2012, quando a pessoa autista foi considerada pessoa com deficiência, começou a haver, sim, uma série de solicitações do BPC para a pessoa autista. Isso reflete um pouco essa dinâmica que estamos vendo em relação à falta de políticas públicas para o tema.
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Quando dizemos que não há políticas públicas para o autismo, referimo-nos ao Estado de Pernambuco, quero ressaltar desde já, mas acredito que isso se replique em vários outros Estados, como eu havia dito. Eu vou trazer alguns dados desse trabalho da saúde que fizemos.
Quando dizemos que faltam políticas públicas, estamos falando do básico. Nós não conseguimos, nesse trabalho, avançar em questões mais técnicas, como, por exemplo: que tipo de método esse Município está adotando em relação à pessoa com deficiência de espectro autista? Qual é o tipo de teste? Nós não conseguimos, porque ainda não se conseguem enfrentar questões basilares.
Por exemplo, vimos que, dos 182 Municípios pernambucanos, apenas 68 não possuem profissional para laudar o TEA, ou seja, 68 Municípios não têm um profissional apto a prestar atendimento a esse público. Fora isso, em relação ao tratamento, vimos que apenas 36% prestam atendimento em alguma unidade especializada, não o prestam em hospitais, não o prestam em UPA. Vimos que cerca de 64% prestam atendimento basicamente em unidades básicas de saúde, nos CAPS, em policlínicas, em unidades de pronto atendimento. Esse é o tipo da maioria dos atendimentos em Pernambuco. Fora isso, fora a dificuldade no diagnóstico, fora o local não ser adequado para o tratamento, vimos que a grande maioria dos profissionais não tem capacitação para prestar atendimento a esse público. Para atender a pessoa autista, necessariamente o profissional deve ter uma capacitação específica voltada a esse público. Vimos que, de 846 profissionais, somente 82 tinham algum tipo de capacitação para atender a esse público, o que representa menos de 10% deles.
Então, existe dificuldade para se obter o diagnóstico, o local não é adequado e, ainda, o atendimento é feito por profissionais que, em regra, não têm a devida capacitação para tal. E não é só isso. Quando você consegue ter acesso ao serviço desses profissionais, a maioria sem capacitação, as consultas, em média, realizam-se uma vez por semana por profissional e, em média, por 30 minutos.
Além disso, há um ponto importantíssimo: o treinamento parental. Acho que já é fato que, por mais que o poder público se organize para prestar um atendimento melhor, não vai conseguir abarcar de forma satisfatória a quantidade de pessoas que necessitam desse atendimento. Necessariamente, tem que haver um processo de capacitação dos pais para prestarem esse atendimento.
Vimos que apenas 8,2% dos 182 Municípios fizeram alguma ação de capacitação e treinamento parental. Desses 8,2% — eu posso dizer isto, porque fui eu que fiz esse trabalho —, se fizéssemos um crivo maior dos documentos que eles enviaram para comprovar essa capacitação, isso chegaria a zero. Nós tivemos uma leniência maior, fomos um pouco menos rigorosos, porque era o primeiro trabalho que estávamos fazendo. Deixamos passar algumas coisas. Se fôssemos um pouco mais rigorosos, seria zero. Portanto, não há capacitação dos pais. A capacitação que fizeram para os pais era basicamente roda de conversa, palestra. Isso não é treinamento parental. O treinamento parental é algo bem mais complexo e requer uma carga horária bem maior.
Para finalizar, em resumo, vimos que as principais causas desse cenário são: falta de dados sobre o transtorno — ouvimos aqui mais de uma pessoa dizer que haverá estudos elaborados em relação à temática — e falta de conhecimento de grande parte dos gestores públicos sobre o tema.
O Tribunal de Contas de Pernambuco está lançando um curso — é para quem quiser fazê-lo, pois vai ser disponibilizado no site da Escola de Contas — que vai servir justamente para a capacitação dos gestores. O nome do curso é Transtorno do Espectro Autista — Noções Básicas, Boas Práticas e Situação do Estado de Pernambuco. O curso abrange muitos temas legais. O Arthur está participando. É um curso bem interessante sobre o tema. Nós vimos que, quando nos sentávamos com os gestores para conversar, eles não tinham as noções básicas sobre o tema. Como eu vou implementar uma política pública se eu não tenho dados, se eu não tenho uma noção mínima sobre o tema? Eu falo de gestores em cadeia: Prefeito, Secretário, Secretário-Executivo. A noção sobre o tema era mínima. Alguns Municípios até entendem, só que não priorizam a temática. No fim, tem que se destacar que faltam recursos voltados ao tema. Eu quero aqui, desde já, indicar — o Arthur vai falar melhor — que o Governo Federal vem aumentando o número de aportes. Houve uma política, a partir do ano passado, que aumentou o incremento de verba para o tema. Já está financiando locais que prestam serviços específicos ao autismo, mas é preciso mais não só do Governo Federal, como dos Estados, dos Municípios. É preciso, sim, uma reorganização dessa política, para que esse orçamento migre para uma política que hoje é prioridade, que é o transtorno do espectro autista.
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Esse tema precisa ser discutido, dados precisam ser levantados.
Agradeço novamente, Deputada Iza Arruda, e coloco-me à disposição para qualquer tipo de discussão relacionada ao tema. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Iza Arruda. Bloco/MDB - PE) - Obrigada, Dr. João. Parabéns pelo trabalho!
Como é importante nós trabalharmos com evidências científicas, com estatísticas. Assim, conseguimos fazer uma política pública eficaz.
Aqui na Câmara, temos a função de fiscalizar, de propor, de fomentar. Creio que assim, com todo mundo junto, com todo mundo pensando nos mesmos ideais, possamos, nos próximos seminários, ter dados diferentes.
Agora nós convidamos o Arthur Medeiros, que está representando o Ministério da Saúde.
Arthur, você também tem 8 minutos para discursar.
O SR. ARTHUR DE ALMEIDA MEDEIROS - Mais uma vez, Deputada Iza Arruda, Deputado Geraldo Resende, eu agradeço o convite e a oportunidade.
Agora, complementando a minha fala anterior, vou apresentar um pouco dos avanços que temos tido em relação à Rede de Cuidados à Pessoa com Deficiência.
O João já adiantou algumas questões importantes, que precisamos levar em consideração nessa organização do cuidado às pessoas com deficiência, às pessoas com transtorno do espectro autista. Muito rapidamente, eu quero fazer um retrospecto.
É sempre importante nos lembrarmos de onde viemos, onde estamos e para onde queremos seguir. Então, lembro que a organização dentro do SUS, das ações para as pessoas com deficiência, datam de 2001. Teoricamente, é recente essa organização das linhas de cuidados e tudo mais.
Nós tivemos, em 2002, a publicação da primeira política de saúde da pessoa com deficiência. A política é esse documento norteador, que organiza as ações e os serviços de saúde. Em 2002, nós tivemos esse documento, que começou a direcionar as ações de saúde dentro do Ministério da Saúde. De lá para cá, inúmeros outros documentos foram publicados e tivemos alguns marcos importantes.
Em 2009, o Brasil assume sua responsabilidade no compromisso mundial da garantia dos direitos das pessoas com deficiência. Quando o Brasil assina a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, isso assume status de emenda constitucional e, a partir de então, em todo o Brasil, todos os Ministérios se organizam para garantir esses direitos.
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Nessa perspectiva, em 2011, tivemos a publicação do Viver sem Limite, primeiro Plano Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência. Na ocasião, tratava-se de um plano elaborado por 15 Ministérios que trouxe ações para a garantia de direitos. No âmbito da saúde, no plano Viver sem Limite, foram criados e apresentados os Centros Especializados em Reabilitação, as Oficinas Ortopédicas, os componentes que, no ano seguinte, em 2012, viriam compor a Rede de Cuidados à Pessoa com Deficiência. Então, o plano nacional foi indutor e primordial para que tivéssemos a constituição da Rede de Cuidados à Pessoa com Deficiência em 2012. Temos a Portaria nº 793, de 2012, que criou a rede de cuidados, e a Portaria nº 835, de 2012, que destinou recursos de financiamento para essa rede. Além disso, chegamos a 2015 com a publicação da Lei Brasileira de Inclusão, a Lei nº 13.146, que reforça a garantia dos direitos.
Nessa perspectiva, quando falamos das pessoas com transtorno do espectro autista, precisamos nos lembrar da Lei nº 12.764, de 2012, que equipara a pessoa com transtorno do espectro autista à pessoa com deficiência. Consequentemente, seus direitos também são salvaguardados pela Lei 13.146, a Lei Brasileira de Inclusão.
De lá para cá, tivemos a organização e a definição dos fluxos, mas também não avançamos. Nós assumimos esta nova gestão do Presidente Lula e da Ministra Nísia com a responsabilidade e o compromisso de atualizar, dentro do Ministério da Saúde, todos os atos normativos que tratam do cuidado das pessoas com deficiência. No ano passado, iniciamos a revisão e a reformulação da política. Esse processo se iniciou em maio, com uma consulta pública. Depois tivemos a escrita e a redação do novo texto, que voltou para uma consulta pública em que, de fato, conseguimos coletar as demandas da sociedade em relação ao cuidado das pessoas com deficiência e com transtorno do espectro autista.
Essa política foi pactuada pelo Governo Federal, pelos Estados e Municípios, na Comissão Intergestores Tripartite, e foi publicada no ano passado, no dia 13 de outubro. A Portaria nº 1.526 atualizou a Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Pessoa com Deficiência, ampliando o escopo e a robustez dessa política, trazendo a necessidade de garantirmos ações intersetoriais, porque sabemos que não se faz saúde somente na saúde. Nós não vamos conseguir avançar enquanto não avançarmos para ações intersetoriais, fazendo a articulação entre assistência, educação, esporte, lazer, por exemplo. A política traz isso. E, sobretudo, lembro que o foco é promover autonomia, inclusão e melhorar a qualidade de vida dessas pessoas em todas as idades. A garantia de cuidado em todo o ciclo de vida, em todas as idades, foi um marco extremamente importante também nessa reformulação da política que aconteceu no ano passado.
Quando falamos da intersetorialidade, lembramos que ela demanda tanto no aspecto da formulação da política quanto no aspecto da implementação da política no território. Então, é imprescindível que tenhamos essa articulação. E, por isso, como o Hisaac já trouxe, no ano passado, em novembro, o Presidente lançou o Novo Viver sem Limite, dessa vez, um plano um pouco mais robusto, com a presença de 27 Ministérios, 96 ações dispostas e cerca de 6 bilhões de reais.
11:35
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No eixo da saúde, foram apresentadas 20 ações e aproximadamente 2,6 bilhões de reais, para que nós pudéssemos avançar, com o Novo Viver sem Limite, para além das questões de reabilitação, para além da habilitação de novos serviços de construção, mas avançar para a perspectiva da formação.
A Luciana trouxe muito bem a questão da necessidade de qualificação e formação dos profissionais, assim como a Deputada Iza. Se queremos ter um serviço de qualidade e que atenda às necessidades de saúde das pessoas, nós precisamos lembrar que a base inicial é a formação e a qualificação dos profissionais que vão assistir essas pessoas. Então, nós também temos agora no Viver sem Limite, no âmbito da saúde, propostas de formação, de qualificação, de especialização dos profissionais para o cuidado das pessoas com deficiência.
Quando falamos da atualização da Rede de Cuidados à Pessoa com Deficiência, precisamos dizer que a rede foi criada em 2012, e nós sabemos que, de 2012 a 2023, o Brasil passou por uma grande transformação epidemiológica, sanitária e econômica. Então, os valores de repasse do Governo Federal precisavam ser revistos. Os valores que eram repassados até outubro já não eram mais suficientes para dar conta das demandas dos Centros Especializados em Reabilitação e das Oficinas Ortopédicas. Dito isso, foi feito todo um estudo econômico, e nós conseguimos, com uma portaria, ampliar o repasse financeiro. Então, os serviços que já eram habilitados tiveram um incremento automático em outubro. Os Centros Especializados em Reabilitação II, os Centro Especializados em Reabilitação III e as Oficinas Ortopédicas tiveram um reajuste de 35%, e os Centros Especializados em Reabilitação IV, de 25%.
Relembremos que o CER é um componente da rede de atenção especializada que faz a habilitação ou a reabilitação das pessoas com deficiência. O Deputado Wellington trouxe o seu relato da necessidade de, às vezes, procurar múltiplos profissionais e ter que peregrinar pela cidade atrás do cuidado. O Centro Especializado em Reabilitação vem justamente romper com essa lógica e congregar todos os profissionais de reabilitação em um único espaço, para que a pessoa, ao adentrar no Centro Especializado em Reabilitação, consiga ter o cuidado de saúde adequado e garantido, com os profissionais de que necessita. Ele tem uma equipe multiprofissional à disposição. Então, o CER vem nessa perspectiva de congregar os profissionais e congregar as modalidades. O centro é do tipo II, III ou IV, a depender das modalidades de reabilitação que oferta: física, intelectual, visual ou auditiva.
Então, isso permite que consigamos fazer com que a pessoa seja assistida nesse ambiente sem necessitar de deslocamentos desnecessários, o que, às vezes, atrapalham e distanciam as pessoas das unidades de saúde.
Pensando nisso, a Portaria 1.523 trouxe esse reajuste importante para a requalificação da rede, para que pudéssemos ter um direcionamento de recursos relevante para atualizar e garantir o funcionamento desses serviços. Também tivemos a criação de novos incentivos. A realidade epidemiológica que nós temos visto nos mostrou a necessidade de termos um olhar cuidadoso sobre a demanda do autismo. E, nessa perspectiva, foi criado um recurso adicional para os Centros Especializados em Reabilitação para o cuidado das pessoas com autismo. No Brasil, os Centros Especializados em Reabilitação habilitados na modalidade intelectual que desejem, que optem e que tenham condição de ampliar suas equipes, para aumentar o número de vagas e os atendimentos poderão requerer 20% a mais do que eles já recebem. Então, se formos somar o repasse que já foi automático de 35% e a possibilidade de 20%, alguns serviços já podem requerer e ter, no seu dia a dia, 55% a mais de reajuste. Essa foi uma iniciativa para que pudéssemos expandir a rede no sentido de haver mais profissionais e, consequentemente, ampliar o número de vagas para o cuidado das pessoas com transtorno do espectro autista.
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Agora, reforçando a questão da intersetorialidade, por mais que tenhamos ampliado o número de serviços habilitados, desde o início da gestão da Ministra Nísia, até agora, nós tivemos a habilitação de quarenta novos serviços, cinco oficinas ortopédicas e 35 novos centros especializados em reabilitação. Por mais que nós tenhamos essa ampliação, ainda é importante e necessária essa expansão. Atualmente, o Brasil conta com 325 Centros Especializados em Reabilitação em todas as Unidades da Federação, tentando capilarizar o atendimento ao máximo. Porém, nós esbarramos num problema bastante importante, que é a ausência de algumas categorias profissionais. Mais uma vez, reforço a importância da intersetorialidade. Nós não vamos conseguir avançar na rede de cuidados da pessoa com deficiência se não tivermos uma articulação muito forte, por exemplo, com o Ministério da Educação, com as Secretarias Estaduais e as Secretarias Municipais de Educação. Nós precisamos pensar e juntos traçar estratégias para avançar na formação de novos profissionais. Para além disso, não só na formação de novos profissionais, mas também na qualificação daqueles que já atuam. Essas são estratégias em que precisamos avançar para que possamos ter novos serviços e qualificação dos serviços existentes.
Por que eu estou dizendo isso? No ano passado, o Presidente lançou o novo PAC — Programa de Aceleração do Crescimento. O eixo saúde foi contemplado e, dentro do eixo saúde, a Rede de Cuidados à Pessoa com Deficiência foi contemplada também. Até o momento, foi aprovada a construção de trinta novos Centros Especializados em Reabilitação. Todos esses trinta estabelecimentos vão ser em regiões de saúde de vazio assistencial absoluto, ou seja, regiões que congregam inúmeros Municípios que não tinham nenhum serviço de reabilitação habilitado pelo Ministério da Saúde. Então, essa ação vem para suprir essa lacuna, capilarizando e aproximando as pessoas dos serviços. E esses centros já estão no início da fase de construção. Em breve, teremos os novos prédios equipados, mas nós precisaremos de profissionais para trabalhar e prestar esse serviço. Então precisamos avançar também em relação à formação e à qualificação desses servidores.
Nós tivemos a aprovação de trinta Centros Especializados em Reabilitação e 23 oficinas ortopédicas, isso somente pelo novo PAC. Então são 53 obras aprovadas no novo PAC no ano passado e neste ano. Para além disso, com recursos de programa discricionário do Ministério da Saúde e com recursos de emendas parlamentares, nós já temos 87 novas construções em andamento no Brasil para a ampliação da Rede de Cuidados à Pessoa com Deficiência, entre centros especializados e oficinas ortopédicas. Isso equivale a 271% a mais de construções em relação a toda a gestão anterior. Na gestão anterior, nós tivemos uma expansão, com trinta novos serviços e até hoje, dia 10 de dezembro, nós temos 87 novas construções em andamento. E também tivemos a ampliação dos recursos, como eu já disse, e a ampliação da rede com novos estabelecimentos. Então nós também tivemos um avanço de mais de 170% no custeio mensal de financiamento para esses serviços.
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Pensando nessa necessidade de qualificar o cuidado, nós também tivemos a reativação, a abertura de novas possibilidades para o Pronas/PCD, o Programa Nacional de Apoio à Atenção da Saúde da Pessoa com Deficiência. O Pronas/PCD é um programa em que instituições filantrópicas apresentam projetos para o cuidado às pessoas com deficiência, e os projetos aprovados são financiados com recursos de instituições privadas. Essas instituições privadas têm isenção fiscal. Então, essa é outra maneira que temos para avançar e qualificar o cuidado. No ano passado, foi aberto um novo edital, e retomamos o Pronas, que havia sido suspenso. Só na edição passada, 103 novos projetos foram aprovados para o cuidado das pessoas com deficiência e inúmeros projetos com foco nas pessoas com autismo. Só para execução desses projetos foram destinados mais de 119 milhões de reais. Então, além da iniciativa de programas, de emendas parlamentares e do PAC, nós também temos o fortalecimento do Pronas no desenvolvimento dessas ações de cuidado.
Pensando também na questão da formação e da qualificação, recentemente houve o lançamento do edital do Ministério da Saúde para o financiamento de bolsas de residência. São mais de 2 mil bolsas destinadas para a qualificação de profissionais. E a Rede de Cuidados à Pessoa com Deficiência foi priorizada também para que possamos ter qualificação e formação desses profissionais para atender os pacientes. Como o João trouxe, faltam profissionais nos Municípios, e isso tem gerado impactos importantes no cuidado e no fortalecimento da rede nos territórios.
São inúmeras as ações. Estamos ainda caminhando a passos lentos, mas, sem sombra de dúvidas, estamos caminhando, acho que isso é importante dizer. Temos muito a avançar. Como o Deputado Dr. Francisco trouxe, já avançamos bastante, mas ainda há necessidade de mais. Temos 325 Centros Especializados em Reabilitação, mas ainda há muitas regiões de saúde que não têm nenhum. Embora já tenhamos 87 construções, entre centros especializados e oficinas ortopédicas, ainda há muito a se fazer. Então, precisamos garantir que Estados e Municípios façam esse desenho. O grupo condutor, que é a instância dentro dos Estados que organiza a Rede de Cuidados à Pessoa com Deficiência, precisa ser fortalecido para que possamos ter um desenho de rede, de demandas e que essas demandas sejam pactuadas entre Estados e Municípios para que cheguem até o Governo Federal e que possamos fazer a alocação de recursos. Contamos com o apoio de Deputados, Senadores, Deputados Estaduais e Vereadores, para que possamos, de maneira conjunta, fazer esse fortalecimento.
E agora, finalizando de fato, só quero dizer que esse é um retrato, um panorama dos 2 primeiros anos de gestão, 2 anos de bastante trabalho, bastante luta, de fortalecimento e de ampliação da rede. Temos ainda muito a caminhar e contamos com o apoio de todos vocês!
Obrigado. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Iza Arruda. Bloco/MDB - PE) - Obrigada, Arthur. Parabéns pelo trabalho! De fato, ao garantir o cuidado com todo o ciclo, através da intersetorialidade, conseguimos ter muitos avanços, não apenas sob o aspecto da saúde, mas também da vida.
Neste momento, passamos à rodada de perguntas que recolhemos através da ferramenta do debate interativo.
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A primeira pergunta é do Jairo Varella, que faz o seguinte questionamento: "Como diferenciar o que não é ABA e garantir que práticas terapêuticas sejam baseadas em evidências científicas, enfrentando a falta de informação, o assistencialismo e a adesão a métodos sem comprovação, promovendo uma cultura de esclarecimento, confiança e segurança nos tratamentos?"
Eu gostaria que a Dra. Luciana Brites pudesse responder, se estiver nos escutando.
A SRA. LUCIANA BRITES - Sim, estou. Muito obrigada.
Como vemos algo que é uma evidência? Por que falamos que a ABA, a análise do comportamento aplicada, é uma ciência que tem evidência? Porque temos diversas pesquisas que dão lastro para que esta abordagem funcione. Assim, o que temos de olhar ao falar dessa questão da análise do comportamento aplicada? Temos que ver a formação desse profissional, onde ele fez todas as suas atividades. Estamos vendo que tudo aqui passa pela formação. Então, acabamos olhando tudo isso. Também é muito importante que essas formações sejam dadas por pessoas capacitadas. Temos que ver o quadro de professores que vão ministrar o curso de formação. Temos toda essa questão na análise do comportamento aplicada. Falamos que ela é uma abordagem com evidência científica porque tem um amplo resultado quando aplicado.
Não temos só a ABA, temos muitas abordagens, desde a abordagem fônica, que é primária, é a primeira abordagem baseada em evidência para a alfabetização das pessoas com autismo. Então, temos várias questões e vamos ver isso por meio das pesquisas. Es pesquisas vão nos dar lastro. Nas pesquisas que são feitas nos Estados Unidos, no Brasil, no Japão, independentemente do lugar em que são feitas, existe todo um critério científico colocado, como a coleta da população para essa pesquisa, a pergunta de pesquisa e toda a estatística organizada para ver se aquela teoria funciona ou não, independentemente do meio.
Então, é muito legal, é muito interessante, é muito importante que todas as práticas educacionais, principalmente das pessoas com autismo, que estão aí nos transtornos do neurodesenvolvimento, sejam assertivas, porque não se pode ficar testando. "Ah, vou fazer isso agora." O que está acontecendo com o cérebro dessa criança ou desse adolescente? Ele está crescendo. Com isso, o processo de neuroplasticidade vai ficando cada vez mais difícil.
Por isso, abordagens baseadas em evidência, todo diagnóstico e intervenção precoce salvam vidas. E o que acontece? Temos menos custos. Estamos falando tanto dos custos. Menos pessoas vão depender do Estado, porque se consegue mais independência para autistas, no sentido de desenvolverem fala, comunicação, comportamento. Tudo isso se se investir principalmente na etapa da educação infantil, no diagnóstico e na intervenção dessas pessoas diagnosticadas. Isso também melhora a qualidade de vida da família. Esse é um círculo virtuoso.
A SRA. PRESIDENTE (Iza Arruda. Bloco/MDB - PE) - Obrigada, Dra. Luciana.
Tenho certeza de que esse ponto ficou bem esclarecido também.
11:51
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Nós temos outro questionamento, o da Marita de Almeida, que é o seguinte: "Como médica de família e comunidade da atenção primária do Distrito Federal, vejo no cotidiano o drama das famílias em busca de terapia, bem como o aumento da prevalência de transtorno do espectro autista sem que a rede de saúde consiga direcionar para um tratamento adequado. É preciso tornar as unidades de saúde peças fundamentais nessa estrutura. Há expectativa na expansão das equipes eMulti e capacitação desses profissionais e dos profissionais da ESF para diagnosticar e acompanhar pessoas com TEA?"
Eu passo essa pergunta para o Arthur responder.
O SR. ARTHUR DE ALMEIDA MEDEIROS - Obrigado, Marita, pela pergunta.
Sem sombra de dúvidas, precisamos nos lembrar do papel primordial da atenção primária.
Como coordenadora e ordenadora do cuidado, a Equipe de Saúde da Família tem que estar preparada e qualificada. Esse tem sido um debate bastante intenso e rotineiro dentro do Ministério. Temos feito reuniões quinzenais para discutir a linha de cuidado do transtorno do espectro autista. Nós tínhamos duas linhas de cuidados concomitantes no Ministério da Saúde. Agora nós estamos trabalhando no sentido de unificá-las, justamente para direcionar como coordenar e organizar esse cuidado. E a centralidade tem sido colocada, sem sombra de dúvidas, na atenção primária.
Como ela mesma trouxe, nós precisamos avançar na qualificação e na formação. Mais uma vez, como a Luciana colocou, tudo perpassa pela formação. Isso reforça a necessidade da articulação intrassetorial. Então, a atenção primária conversa com a atenção especializada, com a Secretaria de Gestão do Trabalho e Educação em Saúde, a SGTES, com a Secretaria de Ciência e Tecnologia, para que tenhamos as evidências científicas para nortear a organização da linha de cuidado e as condutas a serem direcionadas no processo terapêutico.
Então, a organização traz sempre a atenção primária como porta de entrada e ordenadora desse cuidado. Para isso, vamos avançar, sem sombra de dúvidas, na formação e na qualificação desses profissionais.
A SRA. PRESIDENTE (Iza Arruda. Bloco/MDB - PE) - Obrigada, Arthur.
Agora, encerrando a rodada de perguntas, eu passo a palavra para o Deputado Geraldo Resende.
O SR. GERALDO RESENDE (Bloco/PSDB - MS) - Não farei perguntas. Eu apenas quero dizer que me sinto muito feliz por partilhar esta Mesa com a Deputada Iza; com o Deputado Osmar Terra; com a nossa Presidente da SUBRAUT, a Deputada Flávia Morais; com outros Deputados que já estiveram aqui; com Ministros; com o Arthur Medeiros, do Ministério da Saúde, nosso conterrâneo lá do Mato Grosso do Sul; e com o João Francisco Alves, lá de Pernambuco.
Quero dizer que estou, neste sexto mandato, saindo muito dos discursos e indo para a prática. Eu adotei neste sexto mandato o compromisso com o terceiro setor, com as entidades que cuidam das pessoas com deficiência.
Ontem mesmo eu estive com a Prefeita reeleita de Campo Grande, nossa capital. Não existe uma estrutura adequada para tratar o autismo lá no Mato Grosso do Sul. Eu assumi o compromisso de fazer essa construção através de recursos das emendas parlamentares. Nós Deputados temos hoje um valor bastante substantivo, muito alto, e, se tivermos de fato compromisso com essa causa, podemos trabalhar.
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Então, falamos ontem com a nossa Prefeita. Já conseguimos o terreno e fizemos uma varredura para construir os projetos. Muitas entidades cuidam desse setor — se não for o poder público —, mas elas não têm recurso nenhum, muito menos para construir projetos. Fomos atrás de grandes construtores no Mato Grosso do Sul, e eles estão dando todo o apoio aos projetos, para que possamos fazer essa construção.
Dourados, minha cidade, é a segunda maior cidade de Mato Grosso do Sul. Lá, nós entregamos, no dia 5 de abril, junto com o Ministro e a Primeira-Dama do Estado, a melhor estrutura para atender às pessoas com autismo no Estado até este momento. Aquele foi um dia muito importante, na medida em que essa estrutura está atendendo cerca de quatrocentas crianças e jovens, quatrocentas famílias que têm o autismo presente em suas vidas.
Então, eu estou, neste momento, com esse objetivo, no sexto mandato, cuidando das pessoas com deficiência, cuidando das pessoas com autismo, trabalhando junto com o Ministério da Saúde. Quanto às emendas parlamentares, estou fazendo um trabalho junto ao Governo do Estado, que assumiu o seguinte compromisso: a cada 1 real que eu colocar, o Governo coloca outro 1 real. Então, duplicaremos o valor que nós temos. Nós estamos construindo, junto com o Ministério, essa rede de assistência em Mato Grosso do Sul, pois a estrutura estava muito depauperada, muito frágil. Levando em consideração aquilo que o Ministério tem preconizado, e com a minha experiência de ter sido Secretário de Saúde por duas ocasiões em Mato Grosso do Sul, nós estamos vendo todos esses vazios no atendimento a essas pessoas e fazendo com que tenhamos estruturas adequadas para atendê-las.
O grande problema, que eu estava compartilhando aqui com a Deputada Iza Arruda, é o preparo dos profissionais, para podermos ter, de fato, um avanço na abordagem, no tratamento, ou naquilo que precisamos dar a essas pessoas. Mais uma vez eu digo que nós podemos direcionar recursos das emendas para que entidades e instituições façam esse treinamento, e, então, esses cidadãos e essas cidadãs, na sua plenitude, mesmo com autismo, mesmo com deficiência, possam ser, de fato, participantes na construção de uma sociedade melhor, como nós sempre estamos buscando.
Essa é a nossa abordagem aqui, colega Deputada Iza Arruda. (Palmas.)
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A SRA. PRESIDENTE (Iza Arruda. Bloco/MDB - PE) - Agradeço aos expositores pela disponibilidade e disposição de estarem aqui conosco, pela sua contribuição e compartilhamento.
Eu gostaria de deixar um agradecimento aos pernambucanos das clínicas Espaço Desenvolver e da Ceclin TEA, que vieram participar desta reunião, que fizeram questão de sair de Pernambuco para vir aqui para aprender e também para deixar esse compartilhamento de informações para o nosso Estado. Por isso, convido-os a continuarem no plenário para darmos início à segunda Mesa de debates deste seminário.
Muito obrigada. (Palmas.)
O SR. APRESENTADOR (André Castro) - Senhoras e senhores, daremos início à segunda Mesa.
Nós convidamos agora a Presidente da Subcomissão para Políticas Públicas de Saúde para o Transtorno do Espectro Autista, as Doenças Raras e demais Neurodiversidades, da Comissão de Saúde da Câmara dos Deputados, a Deputada Flávia Morais, para que conduza a segunda Mesa deste seminário, cujo tema é Do diagnóstico ao tratamento: soluções tecnológicas para doenças raras.
A SRA. PRESIDENTE (Flávia Morais. Bloco/PDT - GO) - Vamos iniciar a nossa segunda Mesa. Eu gostaria de convidar para fazer parte da nossa Mesa o Deputado Osmar Terra. Eu queria agradecer a presença de todos os participantes, que com certeza trazem informações valiosas para os trabalhos da Subcomissão.
Convido, neste momento, para compor a Mesa a Sra. Beatriz Ribeiro Versiani, médica geneticista, representante da Sociedade Brasileira de Genética Médica e Genômica; e o Sr. Rômulo Bezerra Marques, Diretor Financeiro da Federação Brasileira das Associações de Doenças Raras, a Febrararas. Anuncio ainda que participa desta Mesa, em formato virtual, o Sr. Mateus de Oliveira Torres, médico neurogeneticista do Serviço de Genética e Genoma da Beneficência Portuguesa de São Paulo.
Antes de iniciarmos as exposições, eu gostaria de registrar a presença da Vice-Prefeita de Montividiu, a Débora, e do Vereador de Trindade, o Raimundo, por intermédio dos quais eu cumprimento todas as lideranças presentes.
Convido agora a Deputada Rosangela Moro, que vai estar junto conosco coordenando os trabalhos.
Passo a palavra ao Deputado Federal Osmar Terra, que vai fazer uma pequena explanação sobre o tema desta Mesa, Do diagnóstico ao tratamento: soluções tecnológicas para doenças raras.
Tem a palavra o Deputado Osmar Terra.
O SR. OSMAR TERRA (Bloco/MDB - RS) - Agradeço o convite da Deputada Flávia Morais para estar nesta Mesa e, assim, cumprimento todos os participantes, e também a nossa Deputada Rosangela Moro e todos os demais.
Eu queria fazer uma fala curta, mas acho que nós estamos tratando de um assunto extremamente relevante. Não preciso dizer isso para os senhores, porque o interesse de todos já mostra isso.
A humanidade, a evolução humana tem uma marca, que não é o tamanho do crânio. Quando se faz um estudo arqueológico, antropológico, paleoantropológico vê-se que a humanidade, o homo sapiens, não surge quando o crânio aumenta de tamanho, mas sim quando as primeiras pessoas, há milhares de anos, aparecem com fraturas consolidadas. Isso mostra que aquelas pessoas foram cuidadas, foram atendidas por alguém, que não as deixou morrer de fome. Uma pessoa com a perna quebrada, no mundo primitivo, estava fadada a morrer de fome, porque precisava caminhar para caçar, precisava caminhar para buscar alimento, frutas, raízes. E uma pessoa ficou impossibilitada de fazer isso, e alguém cuidou dela. Aí se comemora, efetivamente, o nascimento da humanidade, com o surgimento do cuidado, da cooperação, até que, por meio da evolução da tecnologia para a produção de alimentos e a criação de animais, surge a civilização.
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Então, a marca da humanidade é o cuidar, é não deixar ninguém para trás, até como forma recíproca de tratamento, porque se eu cuido de alguém, eu imagino que, quando eu precisar, eu vou ser cuidado também. Então existe essa reciprocidade, essa empatia que se desenvolve nos seres humanos ao longo da sua história, para chegarmos até os dias de hoje. E, com o tempo e com a tecnologia, cada vez mais pessoas passaram a precisar de cuidados. As pessoas vivem mais, então precisam mais de cuidados. As crianças que nascem com problemas sobrevivem e podem ter uma qualidade de vida melhor. Esse é o desenvolvimento do que há de mais humano em todos nós, o cuidado, a proteção daqueles que mais precisam, daqueles que precisam de algum tipo de atenção. Essa é uma marca que devemos considerar, para sabermos o que nos faz humanos. Assim, dá para dizer que tudo o que nós estamos discutindo aqui agora tem a ver com se ampliar a proteção às pessoas que mais precisam e fazer com que essa proteção seja efetiva.
Eu fui Secretário de Saúde por 8 anos, fui Prefeito, fui Ministro duas vezes, e o que me chama a atenção é que o trabalho do Executivo para efetivar um programa, para fazê-lo existir, para fazê-lo acontecer e melhorar a cobertura de atendimento às pessoas que mais precisam exige preocupação com a efetividade. Não adianta fazermos discurso bonito. É fácil chegar aqui e dizer que nós temos que integrar todos os serviços, ou que nós vamos regionalizar o sistema, etc. Como é que isso funciona na prática? Como é que se pode dar um exemplo de que funciona? Eu acho que essa é uma questão prévia até ao tratamento em si. Como é que podemos fazer com que toda essa multiplicidade de ações se concretize.
Nós estamos trabalhando com uma síndrome, o transtorno do espectro autista. O diagnóstico dessa síndrome já não é nem tão preciso, de tão amplo que ela é. Há algumas coisas em comum que nos levam a chegar ao diagnóstico de transtorno do espectro autista, mas não existe um diagnóstico preciso. O diagnóstico não é preciso.
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Quando nós falamos de doenças raras, nós estamos falando de doenças que atingem mais de 5% da população. Então elas não são tão raras. Mas elas não são raras no todo; por outro lado, elas são raras individualmente. Há milhares de doenças raras com grupos pequenos de pessoas portadoras dessas enfermidades. Então, quando nós falamos de diagnóstico, nós falamos também de descobrir coisas mais recentes, inclusive na parte da genética.
Eu acredito que boa parte dessas doenças — mais de 90% — tem origem basicamente genética. Descobrir o tratamento, avançar na questão de dar conforto, atendimento inclusivo, atendimento em que as pessoas e as famílias também possam se sentir bem pela resposta ao transtorno é muito importante para todos nós. Mas, antes de falar do tratamento em si, quero dizer que, particularmente, sou adepto da ideai de pegarmos alguns Municípios como modelo.
Não adianta querermos fazer um programa funcionar em todo o Brasil ao mesmo tempo. "Vai ser uma maravilha!" Nós fazemos um discurso muito bonito, mas, quando o programa chega à ponta, não acontece nada, ou vem alguém pegar dinheiro para implantação do programa, mas usa o dinheiro em outra coisa. Então, nós temos que ter monitoramento.
Para fazer isso funcionar, temos que testar em Municípios que já estejam andando bem, que tenham mais programas nessa área, onde haja predisposição dos gestores em atender melhor as crianças com doenças raras, com transtorno do espectro autista, e fazer com que aquilo funcione, mostrar que é possível, sim, fazer um bom atendimento e fazer daquela cidade uma cidade amiga do autista, uma cidade amiga dos portadores de doenças raras, para não deixarmos ninguém para trás.
Essa, para mim, seria uma estratégia, e não fazermos grandes programas. É claro que nós precisamos contar com o Ministério da Saúde e com o Ministério da Educação. Acho que a formação dos profissionais é muito importante. E a chave central dessa formação são os membros da atenção básica, e nós temos um problema com a atenção básica no Brasil.
A atenção básica, no Brasil, tem que resolver 80% dos problemas de saúde de uma comunidade e pedir o encaminhamento para especialistas dos 20% restantes, mas hoje acontece o contrário: ela atende e resolve em torno de 20% a 30% dos problemas e encaminha o restante a um especialista. Então, já não há qualidade adequada na atenção básica no Brasil. Essa é uma das causas da sobrecarga dos hospitais e dos prontos-socorros, que não funcionam.
Há outra coisa que é importante também. Eu não estou querendo resolver todos os problemas para discutir cuidados com doenças raras, mas é importante falar de outros problemas, porque, se no caso das outras enfermidades já é difícil fazer diagnóstico, já é difícil resolver o problema, é mais difícil ainda quando se trata de um transtorno mais raro, que exige um conhecimento maior, que exige uma atenção maior da comunidade.
Nós temos que resolver 80% dos problemas na atenção básica; não temos que encaminhá-los para frente, não temos que pedir pilhas e pilhas de exames que dão todos normais. Nós temos que ter qualificação. Nós não podemos ter terceirização de serviços de saúde. Eu acho um absurdo terem sido terceirizados os programas de atenção básica, porque, além de pagarem o profissional, ainda têm que garantir margem para o ganho de quem está gerindo a terceirização. São coisas assim que estão aí para serem conversadas.
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Eu volto ao ponto inicial para dizer que nós temos que escolher alguns lugares e procurar atender lá da maneira mais adequada. Eu imagino que as novas tecnologias vão nos ajudar. Por exemplo, vamos pegar o transtorno do espectro autista. O transtorno do espectro autista compreende uma miríade de alterações, inclusive morfológicas, provocadas por genes distintos. Mais de um gene produz o transtorno espectro autista. Eles precisam ser conhecidos, e é preciso estabelecer uma possibilidade até de terapia gênica.
Nós estamos com uma viagem marcada para visitar o Instituto do Cérebro do Rio Grande do Sul, que, agora, ficou em primeiro lugar na Financiadora de Estudos e Projetos — Finep, em pesquisa sobre genes e terapia gênica. Nós estamos dependendo muito dos centros avançados dos Estados Unidos para ter enzimas específicas para tratar doenças raras, quando nós podemos desenvolver isso aqui no Brasil. Deveria haver uma priorização da questão da terapia gênica, para desenvolvimento de pesquisa sobre alteração dos genes para melhorar funcionamento do cérebro, para a melhoria da qualidade de vida da pessoa portadora de um transtorno. Eu acredito muito que nós vamos ter, em pouco tempo, terapia gênica funcionando a favor de quem tem doenças raras.
A ocorrência do transtorno do espectro autista, por exemplo, aumentou muito no mundo. Quando eu comecei a lidar com o transtorno do espectro autista, como médico, eu atendia no interior do Rio Grande do Sul, e havia um caso de autismo para cada 10 mil pessoas; hoje, há um para cada 36, 40 pessoas. Foram aperfeiçoados o diagnóstico e a compreensão do problema, mas também se incorporaram ao transtorno do espectro autista doenças que não eram do transtorno do espectro autista. A esclerose tuberosa e a síndrome do X Frágil são alterações que podem ter um padrão de comportamento autista, mas são doenças que têm uma origem específica, que têm, inclusive, um nome de diagnóstico.
Para estabelecer melhor esses diagnósticos e a possibilidade de tratamento, temos que avançar na pesquisa. E, para avançar na pesquisa, temos que investir muito em pesquisa. Não estamos falando de pouca gente. Mais de 5% da população brasileira têm doenças raras; autistas, mais ainda. Nós temos que nos inspirar nos doze trabalhos de Hércules e fazer funcionar melhor o sistema de saúde, fazer com que as equipes e os professores entendam melhor as crianças com transtornos e doenças raras dentro das escolas. Então, tem de haver capacitação também. E precisamos de uma linha de tratamento e de pesquisa bem desenvolvida.
Eu acho que nós podemos, aqui na Câmara dos Deputados, oferecer recursos para essas entidades e oferecer uma linha de apoio, inclusive junto aos Ministérios — Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações, Ministério da Saúde e o próprio Ministério da Educação —, para que elas possam ter capacidade de investimento e de foco nas doenças raras e nas pessoas que possuem transtorno do espectro autista. Genericamente, era isso o que eu queria dizer. Eu acho que nós temos que mexer com muita coisa. A melhor maneira de começarmos isso é escolher um ou dois Municípios por Estado, para que funcionem como projetos-pilotos, a fim de mostrarmos que isso funciona. E os centros de pesquisa e de tratamento que estão mais disponíveis, que estão avançando mais nessa direção, devem ter um apoio maior.
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Muito obrigado.
A SRA. PRESIDENTE (Flávia Morais. Bloco/PDT - GO) - Deputado Osmar Terra, muito obrigada.
Antes de passar a palavra para o próximo orador, eu queria dizer que daqui a pouco nós vamos ter um intervalo para o almoço. Nós vamos ter um coffee break aqui. Se quiserem ficar e participar conosco vai ser muito bom.
Passo a palavra agora para a Deputada Rosangela Moro, muito atuante na Subcomissão. Ela vai fazer um breve relato das ações que aconteceram este ano durante os trabalhos da Subcomissão.
A SRA. ROSANGELA MORO (Bloco/UNIÃO - SP) - Obrigada, Presidente.
Quero saudar todos os membros da Mesa, na pessoa da Presidente Flávia Morais, também muito comprometida com o tema das doenças raras. São todos muito bem-vindos à nossa Casa!
Eu quero ser muito breve, até para poder escutar todas as falas, as trocas que nós vamos fazer hoje neste seminário.
Faço um parêntese aqui para dizer que eu presido a Frente Parlamentar Mista de Inovação e Tecnologias em Saúde para Doenças Raras. Temos trabalhado muito lá para saber quais são os avanços, com encontros técnicos com a pesquisa clínica, para sabermos realmente, diante de tantas necessidades, o que poderíamos colocar como prioridade.
Não resta dúvida de que, quando a gente trata de doença rara, duas situações são essenciais: o diagnóstico — e temos que trabalhar para que o tempo de diagnóstico seja reduzido; e, da mesma maneira, o acesso. E uma das formas de se ter acesso ao tratamento é, sim, por meio da pesquisa clínica.
Nós aprovamos, recentemente, aqui na Câmara dos Deputados, a lei da pesquisa clínica. O Brasil é um país com um potencial muito grande para ter pesquisa clínica, dada a amplitude territorial, dada a diversidade étnica. Então, há muitos players interessados em fazer pesquisa clínica no nosso País.
Só que a pesquisa clínica envolve custos, envolve estudos, envolve ene fatores. E as pessoas precisam de segurança jurídica. Agora, com a lei aprovada, a segurança jurídica fica mais bem sedimentada, para que os financiadores, os estudiosos, os pesquisadores, com o suporte financeiro dos investimentos dos patrocinadores, possam desenvolver essa pesquisa clínica aqui.
Contudo, houve um veto à lei da pesquisa clínica, e nós vamos trabalhar para que isso seja melhor compreendido. O que foi objeto de veto? A limitação de prazo para fornecimento do medicamento, pelo laboratório, ao final dos estudos, sob a alegação de que teria que ser para o resto da vida.
Quando se trata das doenças ultrarraras, há uma resolução do Conselho Nacional de Saúde — CNS, aquele colegiado com participação popular, com muitos atores com assento no colegiado. No caso das doenças ultrarraras, o CNS estabeleceu que seria possível exigir um fornecimento pelo prazo de 5 anos. Poderiam, então, ter tomado como parâmetro esse prazo de 5 anos.
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Eu não posso dizer aqui, Deputada Flávia, é que seria correto fornecer por 1, 2, 5 ou 10 anos, mas precisamos achar um denominador comum que não afaste a pesquisa clínica do Brasil. Se for imposta, via legislação, essa obrigatoriedade de custeio de medicamento para o resto da vida, as empresas, os pesquisadores, os patrocinadores vão escolher outros países para fazer pesquisa clínica, e não o Brasil. E isso trará dificuldades para a pessoa que tem o diagnóstico e está diante da necessidade de acesso a algum tratamento de forma imediata.
A pesquisa clínica precisa ser vista assim, como uma forma de acesso a tratamento. Trata-se do início de uma terapia, ainda que nova. A pessoa se submete a ele por seu livre consentimento e pode desistir, não querer mais participar, a qualquer momento, também por livre decisão.
Na frente parlamentar, nós estamos trabalhando internamente junto com outros colegas, atentos a essa decisão, para que a gente ache um meio-termo, a fim de que não seja para toda a vida, mas que seja por um prazo que atenda o paciente.
Quando falamos de acesso, temos que falar também de incorporação. Não há como falar de acesso a tratamento se não falarmos da incorporação. E a incorporação hoje é feita pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde — Conitec, um órgão do Ministério da Saúde. É claro que essa análise feita pela Conitec é em relação ao custo-efetividade, afinal de contas, há um orçamento a ser cumprido. Então, nós estamos trabalhando também para que a Conitec se torne cada vez mais técnica e menos política. Levantamos sempre a questão do conflito de interesses, que precisa ser superado, para que a Conitec comece a fazer outros estudos para determinar a incorporação ou não de tecnologias no SUS.
Por exemplo, custa mais caro o medicamento ou custa mais caro aquela pessoa e sua família ficarem dependendo do sistema por mais tempo? Essa tem sido, Deputada Flávia, a nossa principal razão de atuar na frente parlamentar, porque nós consideramos que o diagnóstico, o acesso e a incorporação são os pilares fundamentais que precisamos enfrentar, Rômulo, para que consigamos avançar.
Eram essas as observações, Deputada, que eu queria fazer. Agradeço a V.Exa. a iniciativa e a oportunidade que me foi dada de compor esta honrosa Mesa com os demais colegas. Fico à disposição para algum esclarecimento adicional.
A SRA. PRESIDENTE (Flávia Morais. Bloco/PDT - GO) - Obrigada, Deputada Rosangela.
Passo a palavra para Beatriz Ribeiro Versiani, médica geneticista, representante da Sociedade Brasileira de Genética Médica e Genômica.
A SRA. BEATRIZ RIBEIRO VERSIANI - Boa tarde a todos.
Em nome da Sociedade Brasileira de Genética Médica e Genômica, eu agradeço muito pelo convite para participar deste evento tão importante sobre doenças raras e autismo. Esse é um tema bem amplo, tem muita coisa para falar, mas como tenho pouco tempo, eu decidi focar um ponto.
(Segue-se exibição de imagens.)
O título desta apresentação é Do diagnóstico ao tratamento: soluções tecnológicas para doenças raras. Eu vou focar mais especificamente o transtorno do espectro autista e como a genética médica pode contribuir na odisseia desse paciente dentro do serviço médico.
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Para começar, eu vou apenas relembrar os critérios diagnósticos do transtorno do espectro autista. Todo mundo que trabalha com o transtorno do espectro autista já sabe quais são, mas é sempre bom relembrar.
Esses aqui são os critérios do DSM-5, o Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders — manual diagnóstico de estatísticas das desordens mentais.
O que o paciente tem que apresentar? Começo pelo déficit persistente na comunicação e interação sociais. Nós poderíamos ficar aqui por 40 minutos, 1 hora, falando só desse item, mas não é o caso agora. Há também padrões repetitivos e restritos de comportamento, interesse ou atividade. Isso inclui movimentos e falas repetitivas estereotipadas. E os sintomas têm que estar presentes precocemente no desenvolvimento. Isso é interessante porque, às vezes, esse diagnóstico vem só mais tarde. Porém, se você for ver a história pregressa do paciente, ele tinha sintomas antes, mas o diagnóstico só foi feito mais tarde. É preciso ainda que os sintomas causem prejuízos sociais, ocupacionais ou em outras áreas. E as alterações apresentadas pelo paciente não podem ser explicadas somente por um déficit intelectual ou um atraso global do desenvolvimento.
Quanto às estatísticas, de acordo com a OMS, o transtorno acomete atualmente 1% da população. Há números diferentes, dependendo dos trabalhos. Há trabalhos que mostram que o transtorno acomete 1 pessoa para cada 40, às vezes, mais. Porém, hoje, nós usamos o dado da OMS, que é mais ou menos a média de 1% da população.
O transtorno é mais comum em homens — mais ou menos, 4 homens para cada mulher. Existem muitos estudos para tentar explicar por que essa maior incidência em homens. Parece que as mulheres seriam menos sensíveis às alterações genéticas. A associação com deficiência intelectual ocorre em mais ou menos 1/3 dos casos, e também há associação com várias outras comorbidades.
Como já foi dito aqui, está havendo aumento na prevalência de diagnóstico bem importante nos últimos anos.
Quais são os tipos de transtorno, do ponto de vista do médico geneticista? Quando chega um paciente a um consultório médico, o que é importante para começarmos a avaliação daquele paciente e depois fazer a investigação diagnóstica? Nós fazemos uma divisão. O transtorno do espectro autista pode ser sindrômico ou não sindrômico. Sindrômico ocorre quando o paciente, além do espectro autista, tem alguma outra comorbidade, que pode ser uma malformação congênita, uma malformação cardíaca ou renal; um quadro de surdez, alteração visual, ou, às vezes, dismorfias, um exame dismorfológico alterado. O que são dismorfias? Dismorfias são alterações físicas, principalmente craniofaciais, que fazem você pensar em uma síndrome genética.
O TEA não sindrômico acomete aquele paciente que realmente tem somente o transtorno do espectro autista, se é que podemos dizer que é somente.
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Eu queria dizer que, mesmo antes dos grandes avanços genéticos que mostraram alterações genéticas realmente relacionadas com o autismo, já se tinha uma ideia de que ele era herdável, digamos assim. Por quê? Os exames já mostravam isso. São feitos muitos exames em gêmeos monozigóticos e dizigóticos para estudar a herdabilidade de doenças. E, no caso do transtorno do espectro autista, eles viram que, em gêmeos monozigóticos, existe em torno de 60% a 90% de concordância. Lembro que os gêmeos monozigóticos têm o mesmo material genético, se comparados com os gêmeos dizigóticos, que têm concordância de 0% a 30%, dependendo dos trabalhos. Então, vê-se aí uma diferença bem grande, falando a favor de as alterações genéticas estarem relacionadas sim com o autismo.
Quanto ao risco de irmãos de pacientes com TEA também apresentarem a doença, todos os trabalhos já mostravam que havia uma maior chance, algo em torno de 7% a 20%, a depender do trabalho.
O que se notava também, mesmo antes dos estudos, é que parentes de pacientes com transtorno do espectro autista, principalmente parentes de primeiro grau, muitas vezes, não tinham diagnóstico do transtorno, não fechavam critérios para o transtorno do espectro autista, mas tinham muitos sinais leves. Então, é muito comum o paciente chegar, e, ao fazermos a história familiar, perguntarmos se há alguém... Não perguntamos apenas se há alguém com transtorno do espectro autista. Nós perguntamos se há alguém com qualquer tipo de malformação. E sempre há alguém na família: o pai, a mãe, o tio, um primo, um irmão. Eles dizem: "Não, doutora, ele não tem diagnóstico não, mas ele é esquisito. Ele não gosta de sair, não tem muitos amigos, gosta de ficar em casa, não tem uma sociabilidade muito grande". Então, isso já era uma coisa notada também.
Como já foi dito pelo Deputado, há doenças com o diagnóstico etiológico já conhecido que você vê que têm características de transtorno do espectro autista. Então, isso também já era uma ideia de que o transtorno do espectro autista estava ligado a alterações genéticas.
Eu vou falar um pouquinho dos exames genéticos do transtorno do espectro autista. Nós sabemos que não há um exame genético para dar um diagnóstico de maneira nenhuma do TEA. O diagnóstico do TEA é clínico. Como os exames genéticos podem ajudar? Eles podem ajudar na tentativa de se chegar a um diagnóstico sindrômico ou a alguma alteração que esteja influenciando no aparecimento do transtorno do espectro e que vai poder ajudar a orientar as famílias.
Então, eu vou dar uma pincelada nos exames que existem, mas não vou me aprofundar neles, porque esse é um tema complexo. Grosso modo, os exames se dividem entre aqueles que vão avaliar alterações cromossômicas e aqueles que vão avaliar alterações gênicas. Lembro que os cromossomos são formados pelo DNA. Então, alterações cromossômicas vão pegar pedaços muito grandes do DNA. Com isso, serão pegos vários genes, de poucos até milhares de genes. E as alterações gênicas, em geral, são de gene único, mas elas podem provocar alterações fenotípicas tão grandes como as alterações cromossômicas.
Os exames que nós temos atualmente para a pesquisa de alterações cromossômicas é o cariótipo e a análise cromossômica por microarray. Se você for consultar a literatura, verá que o cariótipo não é mais usado para avaliação de doenças raras de maneira geral. Mas, aqui no Brasil, nós usamos bastante pelo custo mais reduzido.
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Para as alterações gênicas, há o sequenciamento completo do exoma ou do genoma. E, especificamente para o transtorno do espectro autista, é importante a pesquisa da síndrome do X Frágil. Por que isso? Justamente porque, se chega um paciente com transtorno do espectro autista que você considera sindrômico, você vai tentar buscar ver se ele tem alguma síndrome que tenha características de autismo também.
E qual é a resolutividade dos exames genéticos no transtorno do espectro autista? Você encontra alterações cromossômicas em aproximadamente 15% dos pacientes; alterações gênicas em 15% a 20% dos pacientes; e outras alterações, como as alterações metabólicas ou síndrome do X Frágil, em algo entre 1% e 7% dos pacientes. Então, se vocês fizerem as contas, na verdade, em menos de 50% dos pacientes você vai encontrar alguma alteração genética.
Muitas vezes, vem a seguinte questão: "Então, por que eu vou testar?" Algumas mães ou pais se perguntam isso, pois a chance é pequena de encontrar alguma coisa. Mas, se encontrarem alguma coisa, haverá muitos benefícios.
O primeiro benefício que eu gosto de citar é o benefício psicossocial da família: saber o que ele ou ela tem. Eu já tive mãe no consultório chorando de emoção por eu ter dado um diagnóstico para o filho dela e dizendo: "Nossa, agora eu sei o que ele tem. Quando as pessoas perguntarem, eu poderei dizer o nome". Isso no transtorno do espectro autista talvez não exista tanto, porque esse já é o nome, mas, às vezes, a mãe sabe que a criança tem outra coisa. "Não é só isso, ele tem mais alguma coisa." Então, testar ajuda muito a família.
Os trabalhos mostram que há sensação de empoderamento, de melhora na aceitação, de melhora na qualidade de vida familiar e de diminuição da sensação de culpa dessas famílias.
Isso ajuda a ter maior acesso a terapias de apoio, a grupos de suporte. Se você sabe o nome da doença que você tem, você consegue encontrar outras pessoas com a mesma coisa. Ao conseguir falar melhor com a família, a família consegue entender o prognóstico daquele paciente. Você pode, então, identificar, tratar e prevenir comorbidades que irão aparecer no futuro. Você consegue um manejo adequado do paciente em relação à educação e à empregabilidade. Consegue possíveis tratamentos. Você poderá entrar, às vezes, em protocolos de pesquisa, se você não tem um tratamento ainda estabelecido. E, o que é muito importante, pode evitar exames desnecessários, a famosa odisseia diagnóstica, tão comum nos pacientes da genética médica que chegam com doenças raras. Eles já passaram por vários e vários médicos, várias especialidades, fizeram muitos exames, sem conseguir chegar a um diagnóstico.
Às vezes, quando a pessoa faz uma testagem genética, consegue ver uma alteração. Se há alteração em determinado gene, é isso que o paciente tem. Pronto. Acabou. Com isso você não precisa mais se preocupar. Por fim, pode-se evitar tratamento sem comprovação científica.
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Você pode falar com a família, então, se você sabe o que aquela criança ou aquele paciente tem, sobre o risco de recorrência. Por exemplo, em relação à síndrome do X Frágil ou a uma alteração cromossômica herdada de um dos pais, aquele pai e aquela mãe terão 50% de chance de ter um filho afetado. O risco pode ser de 25% se for uma doença autossômica recessiva, como a síndrome de Smith-Lemli-Opitz, ou pode ser de cerca de 1,5%, se for uma alteração genética "de novo", isto é, que aconteceu naquela criança, não veio do pai nem veio da mãe. Esses números fazem uma diferença muito grande para as famílias.
Ter um diagnóstico pode ajudar num diagnóstico pré-natal ou pré-implantacional, se for o desejo da família, a depender do tamanho do risco. Do mesmo modo, pode-se ter o diagnóstico de familiares afetados sem diagnóstico etiológico. Às vezes, você faz um diagnóstico numa criança, num paciente, e, de repente, a própria família percebe que aquele primo ou aquele tio também pode ter a doença. Então fazem o exame e, às vezes, comprovam a doença. Assim, consegue-se aumentar o número de pessoas diagnosticadas.
Eu deixo aqui, para terminar, os desafios futuros. Em relação à avaliação etiológica, não só do transtorno do espectro autista, mas também das doenças raras de maneira geral, o desafio é aumentar o acesso às ferramentas diagnósticas existentes, tanto na saúde pública quanto na suplementar. Outro desafio é a pesquisa de novos mecanismos implicados na etiologia do transtorno do espectro autista.
Deixo aqui o e-mail da Sociedade Brasileira de Genética Médica, secretaria@sbgm.org.br, e agradeço novamente pelo convite. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Flávia Morais. Bloco/PDT - GO) - Obrigada, Beatriz.
Eu queria registrar a presença do Dr. Thales Potenciano, médico neurologista do Hospital de Urgência de Goiás — HUGO e também do Centro de Especialidades de Aparecida de Goiânia, no ambulatório de neurologia para adolescentes, onde mais de 80% dos pacientes têm autismo e outras neurocomorbidades.
Registro também a presença da Joyce Matias, Presidente Nacional do Instituto Kylie.
Dando continuidade à reunião, passo a palavra agora ao Sr. Rômulo Marques, Diretor Financeiro da Federação Brasileira das Associações de Doenças Raras — Febrararas.
O SR. RÔMULO BEZERRA MARQUES - Boa tarde a todos os presentes.
Boa tarde aos ilustres integrantes da Mesa de que eu tenho a oportunidade de compartilhar.
Deputada Flávia Morais, na sua pessoa, cumprimento os Parlamentares presentes na Mesa e também no plenário.
Cumprimento ainda aqueles que nos acompanham em ambiente remoto. Impossibilitados de comparecer, permanecem ativos nesta atividade.
Meus agradecimentos também ao Antoine Daher e à Lauda Santos, respectivamente, Presidente e Vice-Presidente da Febrararas, por terem me concedido esta oportunidade de representar a federação em momento tão distinto.
Eu quero também saudar as nossas comissões regionais, as nossas associadas. Sem o trabalho de vocês, lá nos rincões do nosso Brasil, não seríamos o que somos hoje, uma federação robusta, madura, com a sua governança em construção e com suas mais de 90 associadas.
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Mais especificamente, cara Deputada Flávia Morais, receba os nossos agradecimentos por haver requerido relevante audiência para a comunidade dos raros e dos pacientes com TEA também. Esses agradecimentos são extensivos à Deputada Rosangela Moro e aos demais signatários do requerimento de realização deste seminário, por participarem dos trabalhos desta Subcomissão e, com zelo, conduzirem os temas de nosso interesse.
Na sua pessoa também, Deputada Flávia, cumprimento todos os Parlamentares presentes integrantes desta Subcomissão e, em especial, os Parlamentares signatários que deram origem a este seminário, a este evento.
Faço uma saudação especial a você paciente acometido com alguma doença rara! Você é a razão da nossa existência, da nossa representatividade como ente federativo, que tem entre seus associados diversas outras organizações sociais.
Aludir, Deputada, ao tema Desafios e perspectivas em políticas públicas para doenças raras e autismo é sempre oportuno e necessário para todos nós. No nosso caso específico, falar do diagnóstico ao tratamento e das possíveis soluções tecnológicas para doenças raras mantém o assunto atual e permite focar mais de perto esse tema importante para nós.
Faço aqui um parêntese na leitura, para dizer que a minha maior motivação de estar aqui é que eu tenho um filho que é paciente com doença rara.
Quando este seminário propõe a discussão da questão — aspas — "do diagnóstico ao tratamento", essa expressão nos remete direto à jornada do paciente, que ainda tem sido penosa para as pessoas com algum tipo de doença rara.
Faço outro parêntese para dizer aos painelistas que me antecederam que vocês perceberão que nós temos alguns pontos convergentes sobre o que está sendo tratado de um modo geral no plenário.
Segundo a publicação do Ministério da Saúde — isso pode ser encontrado no site do Ministério —, a jornada do paciente, a qual a palestrante que me antecedeu chamou de odisseia, inicia-se com a suspeita da existência de uma doença rara, levantada em um ponto de entrada em algum local da rede de saúde pública ou privada nacional. Essa suspeita segue para um diagnóstico e, depois, para orientações para os cuidados e, a partir daí, para o início de um tratamento, quando isso ocorre. Essa é a jornada mapeada em forma de rotina, mas essa entrada tem sido penosa para o paciente caminhar.
Numa apertada síntese, pode-se dizer que o diagnóstico é uma etapa primordial e que merece comentários. Quando nós falamos, mais uma vez, reforço, em diagnóstico, falamos na ampliação do Programa Nacional de Triagem Neonatal, regulamentado pela Lei nº 14.154, de 2021. No entanto, a implantação do programa se encontra ainda em fase inicial, em fase embrionária, frustrando as nossas expectativas. E existe uma disparidade na implantação dos diagnósticos entre os Estados da Federação e o Distrito Federal. Isso nos faz entender, às vezes, a migração — o que converge com a fala do Deputado Osmar Terra — dos pacientes para determinada cidade, para determinado nicho de excelência.
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O Deputado Osmar Terra falou em macrogestão da saúde, gestão da saúde pública, modelo hospitalocêntrico, modelo de atendimento em rede. Isso precisa ser discutido tanto quanto os medicamentos e os insumos para o aprimoramento do tratamento das doenças raras.
Ainda sobre o diagnóstico, há demora na identificação de algumas doenças que pode ter impacto nos efeitos, e impactos, muitas vezes, irreversíveis, Dra. Beatriz. Há relatos de diagnósticos que levam meses e até anos para sair com exatidão. Eu identifico aqui alguns familiares de pacientes que passaram ou passam por essa jornada. Isso se deve a alguns fatores, como a ausência de profissionais capacitados ou a sua não identificação na rede de atendimento para o diagnóstico correto e a falta de centros estruturados para o diagnóstico no tempo certo.
Passar meses — às vezes, anos — para se chegar a um desfecho e aliviar a angústia é extremamente penoso. O tema diagnóstico será debatido mais tarde na Mesa 4, mas, desde já, fica o nosso alerta como usuário, como representante dos pacientes: diagnósticos tardios levam a sequelas irreversíveis e, às vezes, até à morte.
Noutro giro, falo de tratamento. As realidades se diferenciam também. A diversidade das doenças raras no Brasil impõe tratamentos diferentes também. Para um tratamento adequado, são necessários alguns requisitos, como um insumo medicamentoso ou farmacêutico; um centro de referência instalado em unidade hospitalar que acolha equipe multidisciplinar; um protocolo clínico; a consequente incorporação da tecnologia no SUS, como bem foi dito aqui em falas anteriores.
Reparem que todos estes conceitos: equipe multidisciplinar, centro de referência, centro de atendimento estão pululando nas apresentações dos painelistas. E, sobre o que eu disse até aqui, esta é a situação atual quando o assunto é — aspas — "do diagnóstico ao tratamento": o diagnóstico tem falhas graves; há demora até que se alcance um parecer definitivo; faltam profissionais para serem inseridos nesse contexto; e os tratamentos não encontram estruturação completa.
Faço aqui outro parêntese em relação ao que está escrito para dizer que, às vezes, nós passamos por um estado de angústia e de ansiedade infinito. Por vezes, pode parecer que não reconhecemos alguns avanços que aconteceram até o presente momento, mas é claro que nós os reconhecemos. Não é uma percepção angustiante, paranoica. É uma percepção realista. Mas nós não podemos deixar de apontar a falha grave que existe, porque há risco de sequelas irreversíveis ou até de morte.
Levantar e identificar possíveis soluções tecnológicas para essa jornada que se inicia no diagnóstico e termina no tratamento não é uma tarefa fácil, mas seguramente podemos inferir que isso é possível quando estabelecemos uma prioridade. Quando eu digo "nós", refiro-me à sociedade: as organizações sociais que representam os pacientes, esta Casa Legislativa, o Poder Executivo e todo o conjunto da sociedade.
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Quando se fala em inovação, em solução, é fundamental mencionar a pesquisa clínica, já citada aqui. Sem ela, permaneceremos à mercê de pesquisas e resultados originários de centros de pesquisa de fora do País, alheios a esse grande movimento de investimento na pesquisa clínica, que traz resultados excepcionais para os pacientes num primeiro momento.
Aprimorar a regulamentação do setor é fundamental para que a pesquisa clínica se desenvolva de forma relevante, decidida e bem definida em nosso País.
Para sermos desenvolvedores da pesquisa clínica, é preciso derrubar o Veto nº 13 aposto à Lei 14.807, de 2024, a lei da pesquisa clínica, recém-aprovada.
Outro avanço tecnológico, além da pesquisa propriamente dita, são as terapias gênicas, que estão diretamente ligadas e caminham a passos largos para tratamento das doenças raras. Avanços nessas terapias, que servem para corrigir mutações genéticas causadoras dessas doenças ou minorar seus efeitos, são um passo significativo que não podemos deixar passar adiante. Temos que estar inseridos no contexto da terapia gênica, das pesquisas, da genômica, etc.
Nessa lavra, é bom destacar o Projeto de Lei nº 3.262, de 2020, da Câmara dos Deputados, que propõe a criação do Fundo Nacional para Custeio e Fornecimento de Medicações e Terapias Destinadas ao Tratamento de Doenças Raras ou Negligenciadas. Esse PL, que prevê o aporte de recursos para o desenvolvimento tecnológico, atualmente se encontra apensado ao Projeto de Lei nº 3.302, de 2015 — observei isso ontem no site da Câmara dos Deputados —, aguardando parecer da relatoria na Comissão de Saúde. Urge que essa tramitação ocorra, urge que possamos avaliar e verificar os efeitos que, a nosso ver, como usuários, são significativos no tema de que estamos tratando.
Embora existam lacunas a preencher, não custa levantar algumas tecnologias que estão bem próximo da realidade das doenças raras e podem contribuir para a jornada que se inicia com o diagnóstico e termina no tratamento.
Sentimos uma lacuna, mas não podemos deixar de falar daquilo que pode ser um futuro promissor. Refiro-me à telemedicina, que facilita o acesso a especialistas em doenças raras, por meio de consultas virtuais, especialmente para pacientes em áreas remotas. Falamos tanto de equidade, de igualdade de oportunidade para fazer com o que a tecnologia e o que há de melhor chegue a quem está nos rincões mais distantes, então, vamos pensar na telemedicina.
Outra tecnologia que merece destaque é a farmacogenômica. Esse é um conceito que está nascendo, mas plenamente alinhado com o que foi dito.
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A farmacogenômica consiste na personalização de tratamentos com base no perfil genético do paciente, aumentando a eficácia e minimizando os efeitos colaterais. Isso é o que chamamos de medicina de precisão. A medicina de precisão já está em prática em diversas partes do mundo, e o nosso País não pode deixar isso passar em branco.
Em síntese, Deputada, do diagnóstico ao tratamento, existem etapas a melhorar, e existem lacunas em que pode haver a inserção de tecnologias, porque esse é o tema do nosso debate.
Este ano de 2004, quero recapitular a todos vocês, é um ano bissexto. Por essa razão, fica ainda mais significativo o 29 de fevereiro. E, por isso, por diversos lugares do País e do mundo, lançamos campanhas de conscientização, para promover o conhecimento da sociedade sobre doenças raras. Só teremos outro ano bissexto, obviamente, daqui a 4 anos. E está se esvaindo esse 2024, um ano bissexto.
E, embora não tenhamos alcançado os avanços necessários para o aprimoramento do tratamento das doenças raras e tenhamos tido surpresas inesperadas, podemos declarar, como pacientes, usuários e também como federação, que enfrentamos os desafios e seguimos incansáveis, Deputada, imparáveis, pois não temos outra chance ou opção. Procuramos sempre agir juntos, sempre que possível, pelo bem dos pacientes acometidos por algum tipo de doença rara.
Caso desejem entrar em contato conosco, podem fazê-lo pelo nosso e-mail febrararas@febrararas.org ou pelo telefone 3246-9284.
Finalizo aqui, prezada Deputada, caras senhoras e senhores presentes, incluindo os que nos acompanham de forma remota, a nossa fala na qualidade de representante de pacientes da FEBRARARAS.
Muito obrigado pela atenção. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Flávia Morais. Bloco/PDT - GO) - Obrigado, Sr. Rômulo Marques.
Quero registrar a presença de Lorena Zuppa Graziani e da Luciana Chaud, do Grupo de Apoio às Mães Atípicas de Itapuranga e Região. Sejam bem-vindas!
Registro também a presença do Dr. Ricardo Emílio Pereira Salviano, Defensor Público Federal do Grupo de Trabalho Saúde da DPU do Estado de Goiás, nascido em Catalão, nosso querido Estado de Goiás.
Agora, vou passar a palavra ao último expositor desta manhã, a quem vou pedir que seja breve devido ao avançado da hora.
Anuncio a participação virtual do Sr. Mateus de Oliveira Torres, médico neurogeneticista do Serviço de Genética e Genoma da Beneficência Portuguesa de São Paulo.
Tem a palavra o Dr. Mateus de Oliveira Torres.
O SR. MATEUS DE OLIVEIRA TORRES - Bom dia, eu acho que a melhor forma de contribuir para este debate sobre políticas públicas para doenças raras e autismo é, na verdade, apresentar a forma como estamos fazendo isso aqui na Beneficência Portuguesa de São Paulo e como nós achamos que se trata de um caso de sucesso, para dar melhor assistência diagnóstica e terapêutica para esses pacientes.
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(Segue-se exibição de imagens.)
De uma forma geral, conceituando doenças raras, há uma doença que acomete menos de 65 pessoas a cada 100 mil indivíduos. Por termos conceituais, isso pode variar bastante dependendo da fonte literária utilizada, entendendo que 80% dessas doenças raras têm etiologia genética. Daí, surgiu a necessidade de montar um centro de doenças raras com foco nesses especialistas.
Hoje, há mais de sete mil doenças consideradas raras, há estudos populacionais de 8%, alguns estudos falam em 5%, 6%. E nos chama muita atenção a questão dos manifestos clínicos diversos, porém eles são unidos pela pouca frequência. Na verdade, essas doenças raras não têm uma frequência baixa. Nós entendemos que elas são doenças subdiagnosticadas e, por isso, estão em debate, em pauta e devem ser analisadas com carinho.
Podemos dizer que 10% dessas condições vão ter alguma terapia específica, não necessariamente uma medicação, mas uma terapia instituída. Porém, 100% dessas doenças são tratáveis, seja com acolhimento multidisciplinar, seja com algumas medicações não específicas para aquela doença em questão.
Um serviço de medicina genômica que nós acreditamos que seja a melhor forma de acolher esse paciente com doença rara vai ser aquele serviço que faz a identificação não só dos indivíduos, mas também das suas famílias. O ponto número zero da doença rara é trazer essa família para perto do serviço de saúde. Aquela família não necessariamente precisa desenvolver a condição ou ter a condição, basta estar sob o risco de desenvolvê-la, lembrando que nem toda doença genética, por si só, é hereditária, ou seja, transmissível ao longo das gerações. E, a partir disso, nós conseguimos estabelecer algumas estratégias de prevenção e tratamento.
O passo número um é a investigação da história; o passo número dois é a investigação do exame físico; e, por fim, quando indicado, a realização do teste genético.
Obviamente, nem toda doença é genética, existe a ocorrência esporádica. Pouco se falou aqui neste debate, mas existem fatores ambientais que têm uma influência importante sobre a carga genética e sobre o diagnóstico das doenças raras. A investigação desses fatores ambientais e a determinação dos genes causadores associados às doenças raras também têm um impacto na forma como nós chegamos ao diagnóstico e levamos o tratamento a esses pacientes.
Como já foi dito e eu reforço, nem todo quadro é hereditário, nem todo quadro é familiar. Eventualmente, nós temos pacientes com doenças raras que são caso único na família e também não. Especialmente nos casos da oncogenética, nós temos uma marcada hereditariedade nas síndromes de predisposição tumoral.
Assim, nós estabelecemos um fluxo que nós acreditamos que seja a melhor forma de chegar ao diagnóstico de um paciente com doença rara. Não existe uma tecnologia que seja embarcada, que seja melhor do que o treinamento da equipe profissional em um serviço bastante estruturado. Com isso, nós conseguimos diagnosticar essas condições e apresentar o tratamento mais adequado e definitivo.
Percebam que esse paciente, ao chegar ao serviço — assim deveria ser da melhor forma possível —, já vem com um questionário preenchido, já vem com suas informações de base. Isso evita que o paciente se esqueça de trazer alguma informação relevante para a consulta.
Nós acreditamos que o diagnóstico da doença rara passa também por uma equipe multidisciplinar. Nós temos uma equipe de enfermagem sensacional que já consegue, na verdade, no primeiro contato com o paciente, determinar com quem nós estamos falando, desenhar o seu heredograma, ou seja, aquele instrumento gráfico da família, e detectar os maiores pontos nos quais podemos nos apoiar.
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Após a avaliação inicial do enfermeiro, passamos para a consulta médica, uma reorientação com o enfermeiro. Aí sim, depois de ter feito toda a anamnese, todo o exame físico, todo o levantamento da família, com aquela propedêutica armada, nós indicamos o teste genético: sim ou não. Então, entenda que esse teste é muito bem indicado, não para o paciente, mas para a família dele como um todo. Esse paciente vai realizar ou não o teste genético, sabendo o que ele pode esperar, sabendo quais os familiares que poderão se beneficiar desse teste. Ele retorna ao médico e vai para o seu segmento. Esse segmento pode ser com especialistas, com procedimentos, etc.
Nosso serviço foi pautado no acompanhamento desses três principais pilares. No centro, nós temos a genética; de um lado da nossa ponta, as doenças oncológicas; em cima, as doenças cardiológicas; e, embaixo, na ponta da pirâmide, as doenças neurológicas, entre as quais estão os transtornos do neurodesenvolvimento e o transtorno do espectro autista. É óbvio que o paciente não precisa se encaixar em nenhum desses quadrinhos ou lacunas. Eventualmente, ele pode passear por todas e se beneficiar do acompanhamento profissional. Então, nós capacitamos os profissionais ao ponto de cada um ter a capacidade de detectar a principal demanda do paciente dentro das principais áreas. Eventualmente, esses três profissionais vão atuar juntos, objetivando um diagnóstico preciso dos pacientes com doenças raras e com transtorno do espectro autista.
Acho que todo mundo já conhece a jornada, que já foi chamada aqui de odisseia ou de diversos outros sinônimos disponíveis nos sites oficiais. Esse paciente passa por uma extensa jornada desde o seu acolhimento até a melhoria na condição de saúde. O nosso entendimento é que o paciente não necessariamente vai ter um tratamento específico, mas, sim, que ele precisa ter uma melhoria na sua qualidade de vida. Talvez, isso é o mínimo que nós podemos ofertar a esse doente. E isso tudo passa por uma linha. Essa linha não existe à toa, e nós não pulamos passos. A melhoria da condição de saúde desse paciente, com a tecnologia e terapêutica, é necessariamente dependente de um diagnóstico adequado. Eu não posso tratar do meu paciente se não tenho um diagnóstico para ele. Eu não digo um diagnóstico etiológico, mas um diagnóstico sindrômico ou um diagnóstico presumido de uma condição dita rara.
Volto a dizer que esses são os nossos pilares. Nós não podemos esquecer que a maior tecnologia embarcada nas doenças raras, volto a repetir essa temática, é o treinamento profissional, profissionais capazes, habilitados para realizar uma adequada anamnese ou entrevista clínica, fazer um bom exame clínico, exame físico, o que cada vez mais vem se perdendo na medicina: o fato de você parar, olhar, examinar aquele seu paciente, tocar o paciente, checar se existe alguma alteração na forma dele, alguma alteração na função dele, e, aí sim, partir para os exames complementares.
Eu acho que é importante a comunidade ter domínio e conhecimento dos testes dos quais a Dra. Beatriz começou a falar na apresentação dela: testes genéticos, de cariótipos, de array, de exoma, de PCR, voltados para a detecção de doenças. Muitas vezes, os serviços oferecem exames laboratoriais e exames de imagem que, no caso das doenças raras, não são necessários. Se for feita uma boa anamnese e um bom exame físico, nós podemos direcionar esse paciente para o teste genético adequado, "pulando", entre aspas, algumas etapas diagnósticas desnecessárias e exames complementares que não vão dar o diagnóstico daquela condição.
O que fazemos no nosso serviço? A Dra. Beatriz comentou o cariótipo e seu baixo range de diagnóstico, o seu baixo impacto. E, realmente, isso gira em torno de 5%, nos melhores centros, com profissionais treinados. Hoje, a ideia, tanto para doenças raras quanto para transtorno do espectro autista, é focar nos exames de array, exoma e PCR.
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O PCR é para a síndrome do X frágil, uma síndrome muito relevante. No nosso serviço, nós sempre priorizamos a união do sequenciamento do exoma com o array. Nós optamos por isso. É obvio que um exame só não vai resolver tudo, mas, com a anamnese bem feita e um exame físico bem dedicado, nós conseguimos dar ao paciente um direcionamento. Hoje, a nossa preferência para diagnosticar doenças é realmente a análise do exoma ou do genoma com a análise CNV. Esse é um exame pouco conhecido pela população e pelos pacientes. Muitas vezes, temos dificuldades de chegar até ele devido a burocracias e sistemas operacionais. Na análise do exoma com CNV, existe um ganho de 30% a 50% de resolutividade em relação a transtornos do neurodesenvolvimento. E essa análise do CNV nos permite um ganho de até 19%, um ganho muito próximo ao array, que gira em torno de 20%.
Então, com a nossa perspectiva diagnóstica e toda a tecnologia embarcada, além da avaliação clínica e todo aquele fluxo que eu desenhei para vocês aqui na Beneficência, nós optamos por pedir prioritariamente o exoma com análise CNV. Com isso, nós ganhamos tempo, ganhamos velocidade no diagnóstico e temos uma precisão muito maior. Porém, volto a dizer: esse exame tem que ser bem indicado por profissionais habilitados, porque falar de diagnóstico de doença rara sem profissionais sem capacitados para isso, haverá muita dificuldade de chegar a diagnósticos assertivos.
Por fim, do diagnóstico ao tratamento, entendam que todo tratamento precisa de uma grande tecnologia embarcada para isso. Eventualmente, nós podemos utilizar restrições dietéticas, suplementação alimentar. E, com medidas eventualmente simples, quando a tecnologia embarcada é o conhecimento — volto a reforçar a importância disso —, nós conseguimos tratar uma infinidade de condições.
Nós temos medicamentos ditos órfãos, que são as medicações para doenças raras. Tanto se falou hoje aqui em terapia gênica, em alto grau de tecnologia embarcada, na tentativa de corrigir uma variação ou mutação genética, além dos próprios tratamentos, com os quais muitos pacientes já têm contato, como a terapia de reposição enzimática, a terapia de redução de substrato. Enfim, hoje, as opções para as doenças raras são inúmeras e vastas, e acho que a nossa missão é levar isso aqui de forma igual a todos os pacientes portadores de doenças raras.
Peço desculpas, em virtude do tempo. Meu e-mail é mateus.torres@bp.org.br. Havendo qualquer dúvida, podem me enviá-la por e-mail. Infelizmente, eu vou precisar me ausentar neste momento, para dar continuidade a outras agendas.
Obrigado a todos.
Desejo um excelente evento a todos.
A SRA. PRESIDENTE (Flávia Morais. Bloco/PDT - GO) - Obrigada, Mateus.
Eu queria registrar também a presença do Dr. Edilson Barbosa, Presidente do Movimento Orgulho Autista Brasil — MOAB; a do Sr. Augusto Bravo, representando o Deputado Distrital Eduardo Pedrosa, Coordenador da Frente Parlamentar do Autismo e das Doenças Raras no Distrito Federal.
Agradecendo mais uma vez a todos os expositores, vamos partir agora para o debate.
Eu passo a palavra ao Deputado Osmar Terra, que quer fazer alguns comentários sobre as falas que tivemos.
O SR. OSMAR TERRA (Bloco/MDB - RS) - Uma das questões que vêm sempre à tona quando falamos de doenças raras é o custo do tratamento. Esse é um dilema ético e moral. Como eu fui, durante 8 anos, gestor da saúde no Estado do Rio Grande do Sul, sempre fui da opinião de que nós temos que garantir o tratamento. No entanto, há laboratórios que fazem experiência, estão em fase experimental, não têm certeza do resultado e ficam induzindo as famílias a entrarem com processo, a irem para a secretaria fazer chantagem com o secretário. É claro que usam essas estratégias. Imaginem o desespero de uma família ao saber que pode haver um remédio que melhora a saúde do filho, mas que o Governo não o está fornecendo! O laboratório diz que aquilo funciona, mas não há evidências científicas, como a Beatriz falou, não há evidências. Então, esse é um drama terrível.
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Nós temos que avançar um pouco mais na legislação para obrigar os laboratórios a provarem, com evidências científicas, que aquele medicamento funciona. E, aí sim, temos que ver de que maneira podemos garantir esse tratamento para as pessoas com doenças raras.
Também temos que garantir que haja uma disseminação de centros de pesquisa e desenvolvimento de medicamentos o Brasil que façam a concorrência com esses laboratórios de fora, porque praticamente tudo vem de fora. Essas enzimas, esses tratamentos sofisticados vêm de fora. Assim, nós poderemos baratear esse custo e garantir o tratamento aqui. Eu sou a favor dessa garantia.
Lá no Rio Grande do Sul, quando eu era secretário, nós criamos um comitê científico que trabalhava diretamente com os juízes. Nós tínhamos uma ligação com a Associação de Juízes do Rio Grande do Sul — AJURIS. Antes de proferir uma decisão, o juiz consultava o comitê. Era tudo em tempo real. Sempre havia alguém de plantão para opinar. Se fosse o caso, esse comitê se reunia e dizia o que realmente fazia sentido. Se houvesse tratamento e evidências, dever-se-ia garanti-lo. Assim, nós íamos atrás para garantir o tratamento da pessoa.
Eu mesmo sofri, em outras circunstâncias, um tratamento para câncer. Os laboratórios fazem isto: pegam as pessoas que têm algum contato com o secretário, com o gestor da saúde, para ir lá pressionar. Por exemplo, houve o caso de uma pessoa que foi meu paciente quando eu clinicava lá no interior, em Santa Rosa. O paciente disse para mim: "O médico me receitou esse remédio que custa 250 mil dólares. Ele só tem nos Estados Unidos e não está autorizado pela ANVISA. Se eu não tomá-lo, vou morrer em 6 meses. Foi isso que o médico me disse". E aí nós fizemos uma reunião com o comitê científico lá. E o pessoal disse que esse remédio não fazia efeito para aquele tipo de câncer, não tinha efeito nenhum. E como é que eu iria tratar desse assunto com uma pessoa que está desesperada?
Estou dando um exemplo que, diretamente, não tem nada a ver com doenças raras, mas que também pesa. Então, nós temos que andar no fio da navalha. Para garantir o tratamento, tem que haver evidências científicas. Não pode ser assim e tirar da cartola: "Agora há um tratamento para isso, custa milhões, mas é tratamento. Não havia nada, agora há isso". Então, o Ministério da Saúde pode fazer isso. E também podemos, na legislação, montar um passo a passo para garantir um tratamento que faça efeito, independentemente do custo dele, e tentar baratear o custo com um trabalho, apoiando um centro de pesquisa e desenvolvimento no Brasil. Eu acho que esse é um passo importantíssimo para avançarmos.
E digo o seguinte: não existe salvação fora de um Sistema Único de Saúde funcionando melhor, principalmente a atenção básica. O problema do Brasil não é hospital. O problema do Brasil é a atenção básica, que cada vez mais funciona pior, cada vez mais resolve menos, cada vez mais encaminha mais, cada vez mais pede mais exame. No entanto, não se não toca no doente, não se fala com o doente, não se conversa com o doente, principalmente em serviços terceirizados — disso, então, nem se fala. Eu tenho experiência disso. Fui o primeiro Prefeito do Brasil a criar a Equipe de Saúde da Família. Em 1994, Santa Rosa já tinha doze Equipes de Saúde da Família atendendo nos bairros. Hoje são dezoito em uma cidade de 80 mil habitantes. Então, nós criamos uma carreira com dedicação exclusiva, pagávamos o melhor salário do Estado para atrair profissionais. E foi muita gente para lá. Há gente com doutorado em epidemiologia em Boston trabalhando lá.
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Nós também temos que ter uma carreira nacional — essa é outra discussão —, em que a pessoa possa se dedicar à atenção básica e não fazer mais nada, também com dedicação exclusiva, sem precisar sair correndo para um consultório, um emprego aqui ou lá. Se não for assim, não funcionará. A qualidade do atendimento é a peça-chave nesse processo. Para resolver 80% dos problemas que chegam ao posto, tem que haver qualidade. Tem que olhar para o doente, tocar no doente, colocá-lo deitado, examiná-lo, conversar com ele para se chegar a um diagnóstico. Isso alivia. Esse procedimento já alivia uma quantidade gigantesca de recursos que são gastos com exames totalmente desnecessários.
Tem que haver protocolos, tem que haver meritocracia. No fim do ano, aquela Equipe de Saúde da Família que melhorou o atendimento, que reduziu o número de diabéticos sem tratamento, que reduziu o número de hipertensos sem tratamento, que atendeu melhor os autistas, que atendeu melhor as pessoas com doenças raras, tem que ganhar um prêmio em dinheiro, todo mundo. Tem que ganhar um salário, um 14º, um 15º salário. Nós estamos estudando com o Tribunal de Contas lá do Rio Grande do Sul como fazer isso sem haver um problema trabalhista depois. Está-se trabalhando essa questão na forma de um bônus. Tem que se estimular o profissional a ficar ali e ter um bom desempenho, senão fica uma coisa burocrática, de bater ponto. "Ah, estou com dor de cabeça!" "Vá ao neurologista." "Eu estou com uma dor muito forte de cabeça." "Tomografia e ressonância." Então, as coisas estão funcionando assim no Brasil.
E os hospitais não aguentam mais. Estão sobrecarregados, mal remunerados, quebrando. Não existe um Estado brasileiro que não tenha um monte de hospitais em vias de fechar, sempre com a mesma desculpa: sobrecarga. E o sistema básico não está funcionando.
Existem duzentas mil, trezentas mil equipes — não sei quantas existem — hoje no Brasil. E qual é o resultado delas? Não adianta termos número de pessoas atendidas. "Ah, 1 bilhão de pessoas foram atendidas!" E o que resolveu? Nada. Não adianta termos atendido 1 bilhão pessoas. Tem que se ganhar mais por saúde, por diminuição de doenças, por diminuição de atendimento desnecessário. Se houvesse uma boa prevenção... Eu estou falando de um assunto que não está aqui na nossa pauta, mas que está ligado ao que nós estamos tratando. Para haver o atendimento ao autista, o atendimento bem feito para as doenças raras... Só mais uma e última coisa: é preciso cuidar a partir do início da vida. Os programas da primeira infância são peças-chaves nesse processo. Não adianta só haver a puericultura; tem que haver programas de acompanhamento em casa das crianças pequenas, principalmente das desvalidas, das famílias mais pobres.
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Se o Ministro Wellington, que eu respeito muito, do Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, que era o Ministério da Cidadania, teve dificuldade para tratar a filha com problema, imaginem uma pessoa pobre, miserável, que nem sabe falar no assunto!
Então, o acompanhamento em casa pela Equipe de Saúde da Família, o acompanhamento em casa pelas equipes de primeira infância, tem que ser feito, pois boa parte das doenças raras ocorre na infância, começa na infância. Isso faz com que a prevenção, o atendimento precoce melhore a situação. Por isso, o sistema de saúde é a peça-chave nesse processo.
Era isso.
A SRA. PRESIDENTE (Flávia Morais. Bloco/PDT - GO) - Obrigada, Deputado Osmar Terra.
Nós temos aqui uma pergunta, que até já foi respondida pelo Deputado Osmar, do Sr. Jairo Varella Bianeck: "Como as inovações tecnológicas no diagnóstico e tratamento das doenças raras podem ser alinhadas aos princípios de equidade e acessibilidade, respeitando a Lei Geral de Proteção de Dados e promovendo avanços terapêuticos?"
Pelo avançado da hora, nós vamos pedir à assessoria da Comissão que depois providencie a resposta para essa pergunta.
Nos próximos painéis, nós vamos falar um pouquinho, Dra. Eliane, sobre a implementação e o desdobramento da Lei nº 14.154, de 2021, que amplia o teste do pezinho, que é uma das formas de se detectar, de forma precoce, as doenças raras, os vários tipos de doenças. Então, precisamos cada vez mais ampliar essa triagem neonatal, fortalecê-la e garantir todos os tipos de exames, e não só alguns, que é o caso que nós enfrentamos lá no nosso Estado.
Depois, vamos falar de práticas baseadas em evidências científicas do TEA. E, por último, também vamos falar de alimentação e nutrição para pessoas com TEA e doenças raras. Vamos falar um pouquinho sobre alimentação e nutrição.
Então, esses são os temas da parte da tarde.
Eu quero mais uma vez agradecer a presença de todos e dizer que nós vamos ter um intervalo. Eu vou encerrar por aqui, Deputado Osmar Terra, porque o intervalo vai ser bem curto, às 14 horas temos que retornar ao plenário, e já são 13h18min.
Os participantes que quiseram almoçar, podem fazê-lo, mas aqui teremos um coffee break, que é justamente para dar esse suporte para quem está participando do evento. Todos estão convidados para esse coffee break. Até daqui a pouco.
Encerro, então, a presente Mesa.
Agradeço a todos os participantes.
Muito obrigada. (Palmas.)
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