2ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA 57 ª LEGISLATURA
Comissão de Saúde
(Audiência Pública Extraordinária (semipresencial))
Em 7 de Maio de 2024 (Terça-Feira)
às 9 horas
Horário (Texto com redação final.)
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A SRA. PRESIDENTE (Jandira Feghali. Bloco/PCdoB - RJ) - Declaro aberta a presente reunião.
Informo às Sras. e aos Srs. Parlamentares que esta reunião está sendo transmitida ao vivo pelo canal da Câmara dos Deputados no Youtube, para ampliar a participação social por meio da interação digital.
O registro de presença do Parlamentar se dará tanto pela aposição de sua digital nos coletores existentes no plenário quanto pelo uso da palavra na plataforma de videoconferência. As inscrições serão feitas por meio do menu Reações do aplicativo Zoom ou por solicitação verbal do Parlamentar.
Eu gostaria, primeiro, de agradecer a presença de todas e todos aqui, porque nós estamos fazendo um debate sobre a saúde e a vida. Medicamento não é mercadoria, medicamento não é simplesmente um produto de mercado; é um insumo em saúde e, sendo um insumo em saúde, precisa ser cercado de todos os cuidados e regulações que possibilitem que esse seja um insumo que proteja a vida, e não que prejudique a vida.
Então, nós estamos discutindo aqui o direito à informação, nós estamos discutindo aqui se a bula impressa dos medicamentos deve ou não deve permanecer. Para isso, nós trouxemos convidados a favor e convidados contrários, representações do setor, para que façamos um debate produtivo, rico, qualificado, porque nós sempre trazemos o contraditório, e isso é importante.
Nós vamos dar início a esta audiência, que foi requerida por mim e pela Deputada Alice Portugal — aliás, a Deputada Alice é a única farmacêutica do Congresso e tem, então, toda legitimidade para esse debate e para essa autoria.
Nós vamos compor a Mesa. Como não cabem todos aqui, uma parte ficará aqui na mesa e uma parte ficará no plenário, para que consigamos fazer o nosso trabalho.
Registro a presença da amiga atriz Elizabeth Savalla, que está aqui conosco participando e acompanhando todo esse processo e que é completamente posicionada em relação a esse tema.
Portanto, Deputada Alice, eu vou lhe passar a palavra, para que V.Exa. chame os convidados para compor a Mesa, para que nós possamos dar início aos nossos trabalhos.
A SRA. ALICE PORTUGAL (Bloco/PCdoB - BA) - Bom dia a todos e a todas. Eu gostaria de agradecer a todos que acorreram para atender a esse nosso convite. Além de farmacêutica, sou Presidente da Frente Parlamentar em Defesa da Assistência Farmacêutica nesta Casa, que tem tido grandes vitórias, como a nova lei da farmácia brasileira, que hoje garante que cada farmácia tenha um farmacêutico em todos os turnos, para uma melhor orientação da sociedade brasileira.
Temos debatido com intensidade a introdução do farmacêutico na equipe da Estratégia Saúde da Família, porque temos observado dispensação de medicamentos pelos vigilantes das Unidades Básicas de Saúde, sem falar no processo da infraestrutura de transporte de medicamentos no Brasil, que são flagrados a 51 graus, para chegar a regiões quentes do nosso País, viajando pelas estradas brasileiras.
Então, a valorização do farmacêutico e a compreensão de que o medicamento é parte indispensável do processo terapêutico para nós são fundamentais.
Este debate de hoje sucede à discussão de uma lei cuja intenção foi efetivamente garantir um acessório ilustrativo acerca da composição dos medicamentos. Sabedores de que no Brasil nós temos 40% da população ainda sem acesso à Internet, preocuparam-nos os movimentos que foram realizados em direção à supressão da bula impressa. Evidentemente, isso tem que ser debatido com posições que sejam favoráveis e contrárias, mas eu adianto que essa é uma preocupação gigante, na medida em que a bula é a ata do medicamento. Isso é algo que pode parecer secundário, mas os hipertensos ou os idosos, por exemplo, que não têm acesso à Internet ou que não têm habilidade com as novas tecnologias podem consultar. Um hipertenso pode tomar? Um diabético pode tomar? O que é um comprimido dispersível? O que é um efervescente? Pode engolir? Está ali.
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Então, nós queremos discutir isso com muita seriedade e franqueza, porque nós estamos tratando de saúde e vida.
Esta reunião de audiência pública foi convocada por dois requerimentos similares, o da Deputada Jandira, que foi o primeiro, e o meu, o segundo, posteriormente aditado pela Deputada Rosangela Moro e pelos requerimentos do Deputado Rodrigo Valadares e do Deputado Isnaldo Bulhões Jr.
O objetivo desta audiência é debater o fim da exigência de bulas impressas de medicamentos.
Nós gostaríamos agora de convidar os expositores. Vamos chamar três pessoas para a mesa, mas sintam-se à mesa vocês que estão nesse doutoral, nessa primeira fileira do nosso plenário.
Então, nós gostaríamos de chamar para tomar assento à mesa o Sr. Luiz Gustavo de Freitas Pires, Vice-Presidente do Conselho Federal de Farmácia; o Dr. Alexandre Rohlf de Morais, representante do Movimento Exija Bula; e o Dr. Tiago de Moraes Vicente, Presidente Executivo da Associação Brasileira das Indústrias de Medicamentos Genéricos e Biossimilares — PróGenéricos.
A partir daqui, nós daremos a palavra a todos e todas que tiverem interesse e constarem da nossa lista.
Antes de passar à Deputada Jandira Feghali para que solicite a exibição de um importante vídeo do Padre Júlio Lancellotti, eu quero registrar que está entre nós o Sr. Alexandre Rohlf de Morais, do Exija Bula; o Dr. Tiago de Moraes Vicente, que já foi aqui anunciado; o Sr. Henrique Uchio Tada, Diretor Executivo da Associação dos Laboratórios Farmacêuticos Nacionais — ALANAC; o Sr. Jackson Lucena, Assessor de Relacionamento Governamental da Associação Brasileira da Indústria de Produtos para o Autocuidado em Saúde — ACESSA. Não sei se o Sr. Fábio José Basílio conseguiu chegar. O Sr. Fábio José Basílio, nosso Presidente da Federação Nacional dos Farmacêuticos — FENAFAR, participará de forma remota. Recebemos também, com muita satisfação, o Sr. Marcelo Polacow Bisson, Presidente do Conselho Regional de Farmácia do Estado de São Paulo, que é o Estado no Brasil com o maior número de farmacêuticos e, evidentemente, de consumidores de medicamentos.
Os convidados terão 10 minutos para usar da palavra. Os Deputados inscritos terão sempre 3 minutos, tendo o interpelado igual tempo para responder. Enfim, aqui a Mesa vai, com flexibilidade e leveza, tratando dos assuntos.
Quero registrar que recebemos as justificativas de ausência do Conselho Nacional de Saúde. O querido Fernando Pigatto está ilhado no Rio Grande do Sul, não teve como sair, e a sua representante também está no Sul, que está sem possibilidade de movimentação aérea.
A ANVISA justifica que, em função da consulta pública e do posicionamento que a sua Diretoria Colegiada terá que fazer, não será possível o encaminhamento de representante com finalidade de debater o assunto. Julga que, eticamente, não seria correto. Assina a Dra. Vanessa Zardin, da ASPAR da ANVISA, que, portanto, não estará presente na audiência. Mas nós, com certeza, faremos chegar até ela as opiniões aqui levantadas.
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Por último, o Ministério da Saúde agradece o convite para a participação da audiência pública com o tema Fim da exigência das bulas impressas nos medicamentos, mas informa a impossibilidade do comparecimento de representantes dessa Pasta ministerial devido a outras pautas agendadas para a referida data.
Então, são estas as justificativas.
Agora a companheira Deputada Jandira Feghali fará os encaminhamentos.
A SRA. PRESIDENTE (Jandira Feghali. Bloco/PCdoB - RJ) - Pergunto à assessoria se está tudo certo para ouvirmos os convidados que estarão participando remotamente. (Pausa.)
Obrigada.
Eu gostaria aqui de dizer que, para que depois possamos passar aos debates ao vivo, dado o início das exposições, a palavra será concedida por até 10 minutos. Como são muitos, espero que não passem do tempo, senão o debate não acontece.
Compõe a Mesa o Sr. Alexandre Rohlf de Morais, que é representante do Movimento Exija Bula. Na verdade, nós fomos provocados por este movimento a reabrir o debate sobre o tema na Câmara dos Deputados.
Então, eu penso que seria importante abrir com vocês.
Antes, exibiremos um vídeo do Padre Júlio Lancellotti, que não pôde participar ao vivo, mas teve a gentileza e o carinho de nos encaminhar um vídeo.
Então, nós vamos imediatamente exibir o vídeo do Padre Júlio Lancellotti, e depois nós passaremos às intervenções.
(Exibição de vídeo.)
A SRA. PRESIDENTE (Jandira Feghali. Bloco/PCdoB - RJ) - Agradecemos ao Padre Júlio Lancellotti por esse vídeo curto e denso.
Agradecendo-lhe a presença, passo a palavra ao Sr. Alexandre Rohlf de Morais, representante do Movimento Exija Bula, pelo prazo de 10 minutos.
O SR. ALEXANDRE ROHLF DE MORAIS - Bom dia a todos, todas e todes que estão participando desta audiência, que é inclusive virtual. Bom dia, nobres Deputadas Jandira Feghali e Alice Portugal. Cumprimento V.Exas. e também cumprimento todos os Deputados e Deputadas aqui presentes e os que estão de forma remota.
O Movimento Exija Bula é orgânico. Eu sou advogado, especialista em defesa do consumidor, e deparei com a Lei nº 14.338, de 2022, que prevê, dentre as suas disposições, a manutenção da bula impressa nos medicamentos, Deputada, como referência para a bula digital. Isso consta no art. 3º, § 4º. O § 5º, imediato, já diz que a agência de vigilância ou o órgão regulador poderá escolher que medicamentos terão uma ou outra modalidade de bula.
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Eu gostaria de fazer uma pergunta, de propor uma reflexão aos presentes e aos que estão de forma virtual: a mãe e o pai de quem aqui consegue acessar uma bula digital? Qual avó tem a habilidade para abrir um dispositivo? Será o Dia das Mães agora, logo em seguida. Aproveitem, no almoço do Dia das Mães, para perguntar se ela acessa uma bula pelo celular e se consegue ler as informações de medicamentos.
O Movimento Exija Bula não é contra o meio digital. A nossa vida hoje ou parte dela é no meio digital. Nós temos que manter os dois meios.
Aproveito, Deputada, para dizer que eu sou proveniente do Rio Grande do Sul. Estou em São Paulo desde 1996, eu me formei lá, ingressei na OAB com muita honra lá e defendo consumidores desde então. O Rio Grande do Sul hoje precisa de tudo, e imaginem se tivessem que acessar a prescrição de um medicamento por um smartphone hoje em Porto Alegre, em Canoas: não tem energia, não tem Internet, não tem bateria. Esses são aspectos básicos que deveriam estar na cabeça de todas as pessoas.
Mas vamos passar, então, para os aspectos legais. A Lei nº 8.078, de 1990, Código de Defesa do Consumidor, prevê que o direito à informação tem que se dar por todas as formas, ele não pode ser restrito. Nós não podemos imaginar que vamos criar uma bula digital e vamos dizer assim: "Olha, como tem um pessoal aí que não pede a bula, para quem pedir nós imprimimos". Isso é uma fragilização. Isso irá fragilizar.
Eu sei que terão convidados aqui nesta Comissão que trabalham no ramo de farmácia no dia a dia e sabem que isso não funciona. O consumidor que entra para comprar um Doril leva 8, 9, 10 minutos dando CPF, dando dados para comprar um medicamento, um comprimido qualquer, um MIP — Medicamento Isento de Prescrição, aquele que está na prateleira, mas que não deixa de ser medicamento.
Nós estamos vendo até aqui, nobre Deputada, é que já houve uma resolução depois da promulgação da lei em maio de 2022. Em dezembro, saiu uma resolução da ANVISA que diminuiu a quantidade de bulas desses MIPs e também de embalagens de displays múltiplos, de 100% para 10%. Portanto, para quem se propõe a estudar a redução gradual de alguma coisa, causa-nos espanto algo cair de 100% para 10%. Se caísse de 100% para 90% faria algum sentido. Mas já se tirou a bula de toda essa quantidade de medicamentos nas farmácias. Notem que MIP é Medicamento Isento de Prescrição. Ele ainda é medicamento.
Nós temos o exemplo de um remédio bastante popular aqui. Eu acho que eu preciso citar: é a Aspirina, superpopular. Mas existem pessoas alérgicas que, se tomarem Aspirina, podem morrer. Onde vai estar escrito isso? Só no digital? Quando ele abrir aquele envelope e rasgar o QR Code, ele vai ler onde? Às vezes, nós lemos quando uma coisa fez mal, quando utilizamos um remédio e deu um efeito contraditório. "Deixe-me ver a bula para ver o que está acontecendo". Mas ele vai rasgar aquela embalagem de um único comprimido e não vai mais ter informação? Isso afronta o Código de Defesa do Consumidor.
Nesta Casa, Deputadas e Deputados, nós temos a certeza de que, quando foi aprovada a Lei nº 14.338, os Srs. Parlamentares e as Sras. Parlamentares pensaram que haveria as duas formas de informação ao consumidor. Surpreendeu-nos essa primeira RDC da ANVISA, de dezembro de 2022, que reduziu só para 10%, e também nos causa espanto o que pode acontecer ainda.
A consulta pública, determinada na última reunião da ANVISA, do ano passado, em 6 de dezembro de 2023, terminou em 19 de março deste ano. A consulta pública já está orientada para a retirada das bulas dos medicamentos, já está escrito lá. E foi uma consulta feita de tal sorte que as pessoas poderiam abrir navegadores e votar à vontade. Então, parece-nos que isso não favorece o direito da consumidora e do consumidor brasileiro. Isso causa imensa preocupação. A partir da criação do nosso Movimento Exija Bula nós recebemos a adesão de várias pessoas, pesquisamos todos os setores, investigamos como são feitas as bulas. A produção de celulose é absolutamente responsável. Só existe floresta de manejo preparada para a produção de celulose e papel, 100% reciclável.
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Descobrimos também que o custo dessas bulas varia de 4 a 6 centavos. Vejam bem: 0,4 a 0,6 centavos. Eu acho que ninguém colocaria a sua vida em risco para economizar 6 centavos e acho também que nenhum medicamento iria receber desconto de 6 centavos. Isso seria absolutamente irrelevante.
Então, parece-me que esses argumentos que motivaram o projeto de lei, juntamente com a questão do cardápio digital, são infundados, inconsistente. Aliás, o cardápio digital vem caindo em todos os Estados do Brasil. Vários deles já aprovaram leis obrigando a ter cardápio impresso. A pessoa não pode chegar ao restaurante e só ter a opção de pegar um aparelho celular e acessar o cardápio.
Adicionalmente, eu queria dizer a todos os debatedores aqui o seguinte: a informação no produto ou serviço tem que ser entregue ao consumidor. O consumidor não tem que ir atrás da informação, não tem que ter plano de dados. Não tem que ter um celular, um dispositivo complicado para acessar uma informação. Ele tem que receber a informação, senão não faz sentido, e está contra o Código de Defesa do Consumidor, assim como estaria contra esse código fragilizar a garantia da informação. Ou seja, quando o cidadão compra um medicamento, vão perguntar a ele se quer a bula ou se ele é daqueles que não leem bula? Eu vi esse tipo de argumento já em debates na Internet. "Não, mas tem gente que não lê a bula". Então, o que quer ler vai pedir uma bula? Aí ele vai entrar em uma fila para imprimir uma bula? Isso não existe. Nós estamos desinventando alguma coisa.
Que sociedade queremos? Vamos dizer o que para os nossos netos depois? Que nós cometemos a insanidade de tirar o direito à informação e permitir que alguém tenha uma intoxicação cruzada? São 29 milhões de pessoas, e esse número varia para cima, chega a quase 40 milhões sem acesso à Internet. Ainda há as pessoas com dificuldades digitais.
Portanto, esse tema tem que ser melhor debatido com a sociedade. Infelizmente, a lei saiu como saiu, mas ainda dá tempo de revermos essa lei, de trazermos para a realidade brasileira. Somos um País continental. Em Estados do Norte, por exemplo, não se têm acesso total à Internet. Existem cidades inteiras não têm acesso à Internet. Independentemente da enchente, lá no Rio Grande do Sul há cidades de 14 mil, 15 mil habitantes que não têm Internet. Não têm. E isso no Rio Grande do Sul. Na Região Norte, nós temos vários lugares assim, como no Pará. Eu ando por Manaus, andei muito por lá. Conheço o Mato Grosso, o Centro-Oeste. Trabalhamos em vários locais do Brasil.
Todos aqui conhecem essa realidade. Aqui é o Parlamento, aqui é a Casa do Povo. O Brasil está representado nesta Casa. É desnecessário dizer isso. Não existe uma bolha, onde todo mundo faz tudo pelo dispositivo, pelo aparelho.
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Deputada, em 1998, esta conhecida revista produziu uma matéria sobre falsificação de medicamentos — nós achamos a revista. (Exibe documento.)
Esta revista Veja é de 8 de julho de 1998. Aqui se discutiu que quase um terço dos medicamentos era falsificado ou produto de contrabando ou descaminho. Dentro da Veja falaram: O paraíso dos remédios falsificados.
Então, criou-se o Sistema Nacional de Controle de Medicamentos, numa lei de 2009. Hoje nós temos uma lei um pouco mais fragilizada — digamos — em relação a esse controle.
Uma pesquisa espontânea do Datafolha com mais de 2 mil pessoas indicou que 84% das pessoas querem manter a bula impressa e a bula digital.
Muito obrigado, senhores e senhoras.
A SRA. PRESIDENTE (Jandira Feghali. Bloco/PCdoB - RJ) - Agradeço ao nosso representante do movimento Exija a Bula, que traz aqui um conjunto de dados importantes para nós.
Ele mencionou o Rio Grande do Sul. Nós gostaríamos, em meu nome — certamente a Deputada Alice e os outros Parlamentares falarão —, de expressar a nossa solidariedade.
Ontem, o Parlamento foi muito rápido e aprovou um decreto do Governo Lula — a Câmara o aprovou de forma suprapartidária e unânime — para possibilitar o envio de recursos sem limites fiscais, sem limites burocráticos, sem limites administrativos, para que mais rapidamente essa emergência seja atendida e também tenhamos recursos para a reconstrução do Estado.
Nós do Rio de Janeiro sabemos — aliás, vários Estados brasileiros sabem — o que é essa dor causada pelos deslizamentos, pelos extremos climáticos, que ainda não encontram nas cidades e nos Estados a resposta estrutural devida.
São questões que precisamos prevenir. Existe legislação urbana para isso. A legislação ambiental, infelizmente, vai sendo enfraquecida no Congresso e nos Estados também. Nós precisamos rever essa atitude política dos parlamentos e dos governos. Há, inclusive, um sucateamento de estruturas no Rio Grande do Sul, um Estado razoavelmente preparado para as enchentes, cujas estruturas não funcionaram por falta de manutenção, por falta de cuidados.
Então, é preciso olhar para os extremos climáticos e incidir sobre isso. É preciso ter uma atitude junto com as cidades e os Estados, porque as chuvas virão, outros impactos naturais virão; no entanto, não podemos perder vidas. É preciso que os Estados e as cidades atuem no sentido mais estrutural, seguindo a legislação, não a pressão ou o lobby da especulação imobiliária ou de outros.
Neste momento, a saída é resgatar, é salvar, para depois ver como reconstruir, como aplicar, de forma coordenada, a legislação que existe. A flexibilização da legislação urbana e da legislação ambiental tem prejudicado muito a sociedade e tem levado à morte de pessoas.
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Então, manifesto a nossa solidariedade e a nossa preocupação e, ao mesmo tempo, registro a resposta imediata da Câmara — que, eu imagino, será dada hoje no Senado — para que esse decreto possa ter vigência, autorizado pelo Congresso Nacional, e o Rio Grande do Sul possa ter os recursos e toda a infraestrutura necessária para se recuperar e salvar as pessoas. É isso.
A SRA. ALICE PORTUGAL (Bloco/PCdoB - BA) - Eu queria registrar a presença do Deputado Rafael Simoes, do União Brasil de Minas Gerais; da Deputada Rosangela Moro, do União Brasil de São Paulo; da Deputada Gisela Simona, do União Brasil de Mato Grosso; e do Deputado Dr. Luiz Ovando, que é membro desta Comissão.
A SRA. PRESIDENTE (Jandira Feghali. Bloco/PCdoB - RJ) - Eu quero chamar para falar, por 10 minutos, o Tiago Vicente, Presidente Executivo da Associação Brasileira das Indústrias de Medicamentos Genéricos e Biossimilares — Pró-Genéricos.
O SR. TIAGO DE MORAES VICENTE - Exma. Deputada Jandira Feghali, Exma. Deputada Alice Portugal, é um prazer imenso poder me dirigir aos Deputados aqui para falar sobre um assunto que nos é relevante.
Eu queria agradecer a oportunidade de falar sobre esse tema.
Eu queria fazer só uma retificação pequena: não queria que me colocassem aqui como alguém que é contra a bula impressa. A indústria como um todo é a favor da bula impressa, tanto é que a indústria gráfica é muito próxima da indústria farmacêutica, porque quem fabrica a bula também fabrica a embalagem — é tão simples quanto isso.
Há uma lei destinada à melhor informação e ao maior acesso pelo paciente — eu gostaria de dizer "paciente", não "consumidor". Estamos falando de alguém que está com alguma enfermidade, eventualmente numa situação de necessidade, que vai até uma farmácia, até um posto de saúde, até qualquer unidade do SUS e procura informação sobre o medicamento X, Y ou Z. Ele pode ter a opção impressa e também a opção digital.
Eu vejo a questão da bula em formato digital como um acessório — alguém aqui mencionou isso, e eu concordo —, mas como uma ferramenta extra também, olhando isso de forma positiva, para que aquelas pessoas que têm uma dificuldade visual, muitas vezes, possam lê-la com mais facilidade. Há pessoas que não sabem ler. Nós temos essa realidade também, que é muito gritante no nosso País. Essas pessoas podem ouvir a bula.
Na lei, que foi aprovada aqui pelo Congresso e sancionada pelo Poder Executivo, não está escrito que a bula será extinta, que a bula vai acabar. Muito pelo contrário, ela até valoriza o papel da bula impressa no momento em que diz que a bula impressa é referência para a bula digital. Eu acho que nesse assunto nós temos que sair daqui mais unidos do que separados.
O Dr. Alexandre Morais colocou um aspecto muito importante quando trouxe a reportagem de 1998 que mostrou que havia muitos medicamentos falsificados no nosso País. Isso, sim, é um drama sanitário.
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No ano seguinte, em 1999, foi criada a ANVISA, que é a razão precípua de todos nós estarmos aqui. Graças à ANVISA, hoje, conseguimos ter uma indústria de medicamentos genéricos, que, de novo, trabalha junto com a indústria gráfica. Hoje temos pesquisas que apontam que os medicamentos genéricos gozam de mais de 90% de altíssimo grau de confiança da população.
Eu acho que nós temos diversas situações que precisam ser abordadas. De fato, não estamos falando e não vamos falar sobre valores — se o custo é de 3 centavos, 4 centavos ou 6 centavos. Isso não vai impactar o valor final do medicamento.
Nós temos que pensar sempre no paciente — volto a dizer: é paciente, não é consumidor. O paciente deve ter mais acesso à informação. O paciente não pode ter a ilusão de que, se for a um buscador da Internet, vai ter uma informação medicamentosa superior àquela da bula, seja ela impressa, seja ela digital.
Nós temos hoje ameaças à indústria farmacêutica instalada no nosso País que são muito graves. Eu até peço aos Parlamentares que fiquem atentos a isso, a Exma. Deputada Alice Portugal. Por exemplo, estão sendo construídas iniciativas legislativas que visam à demora da entrada de medicamentos genéricos no País. Existe lá fora uma política chamada Data Protection, que diz que o medicamento genérico só vai poder ser pesquisado após um período de proteção de dados. Isso está sendo discutido. Na semana que vem, haverá outra audiência no Senado Federal, aqui ao lado. Eu vou estar lá para tentar defender essa nossa indústria. O que não podemos ter é uma política que reduza a quantidade de medicamentos genéricos no País.
Primeiro, nós temos que fortalecer a ANVISA, que sabe muito bem o que vai fazer. A ANVISA sabe exatamente o que vai fazer. Ela tem em mão uma lei que foi aprovada por este Congresso. Ela foi criada como uma autarquia vinculada ao Ministério da Saúde. Está dito que ela deve fazer a regulamentação da lei. Felizmente, a lei não diz, em momento algum, "extinguir a bula impressa", "acabar com a bula impressa". Isso em momento algum é dito. Muito pelo contrário, coloca a bula impressa como uma referência. A bula em formato impresso será uma referência à bula digital. É dentro desse aspecto que esperamos, com muita confiança, que a ANVISA faça o papel dela, como sempre fez, com muita dignidade e com muita capacidade.
Em 1998, como o Dr. Alexandre colocou, havia muitos medicamentos falsificados no País. Hoje isso não é mais uma manchete. Hoje isso não está mais em capa de revista. Nós temos um órgão de âmbito mundial, cuja qualidade é reconhecida mundialmente, que nos coloca entre as dez melhores agências do mundo. Posso dizer também que está entre as melhores do País. Nós temos várias agências para trazer segurança a esses mercados regulados.
A ANVISA, mais do que nunca, passou por testes dificílimos. Um deles foi há pouquíssimo tempo, na pandemia. Nós vimos que, apesar de todas as dificuldades, ela foi infensa a qualquer tipo de pressão externa e seguiu o caminho dela. As missões da ANVISA foram perseguidas em sua totalidade.
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Nesse aspecto, em relação à implementação desse instrumento extra de informação ao paciente, não ao consumidor, que é o formato digital, nós confiamos que a ANVISA vai fazer o melhor do seu trabalho. Há contribuições de toda sorte. Dentro dessas contribuições, a ANVISA vai atuar tecnicamente, não de forma plebiscitária. Nós temos um exemplo muito recente: a ANVISA foi instada a se manifestar sobre a proibição ou liberação de um dispositivo de fumo — vou chamar assim, pois não sou expert nessa matéria. Na consulta pública, muita gente achava que deveria ser regulamentado, mas a ANVISA, tecnicamente, orientada pelo Ministério da Saúde, disse "não" e manteve a proibição que vigia desde 2009.
A lei foi aprovada pelas duas Casas — nós estamos respeitando a lei — e sancionada pelo Poder Executivo, que posso até dizer que não tinha tanto apreço por coisas digitais, vamos dizer assim. Hoje está nas mãos da ANVISA a regulamentação.
Eu transito bastante pela ANVISA e conheço pessoas que trabalham lá. O nível de capacidade e de comprometimento que as pessoas têm com a função que exercem lá dentro é muito alto. Eu sei que qualquer decisão que a ANVISA tomar em relação a esse tema vai ser muito positiva.
Preocupa-me um pouco — perdoe-me por discordar um pouquinho do senhor, Dr. Alexandre — a questão dos resíduos. Ainda que as fontes sejam árvores de reflorestamento, estamos falando de 3 mil toneladas de papel por mês. Isso é muita coisa. Isso vai para o lixo. Isso, às vezes, é descartado incorretamente. Isso, às vezes, é descartado na rua. Nós temos que pensar em racionalizar isso.
Digo de novo: não vai acabar. Nós nunca falamos isso. A lei não diz que vai acabar. A lei até, de certa forma, eleva o papel da bula impressa quando a coloca como uma referência para a bula digital.
Espero que possamos sair alinhados daqui. Essas duas indústrias trabalham juntas. Essas duas indústrias têm uma sinergia muito grande. Podemos ter alguma discordância, mas isso é natural. Por isso, estamos aqui debatendo.
Eu acredito que, ao fim desta discussão, vamos conseguir achar um caminho comum. Eu me arrisco a dizer que o caminho comum já está colocado: uma lei aprovada, pronta para ser regulamentada pela ANVISA, seguindo todos os trâmites legais, conforme a legislação que foi definida por este Parlamento, pelos representantes do povo brasileiro, que vão definir o que é melhor para a população.
Era basicamente o que eu queria dizer.
Obrigado.
A SRA. ALICE PORTUGAL (Bloco/PCdoB - BA) - Muito obrigada.
Sem dúvida, é justamente sobre eventuais contradições no texto que nós devemos discutir. O texto tem muitas coisas positivas. É justamente no § 5º do art. 3º que nós focamos este debate. É muito importante que tenhamos, neste momento, este foco em relação às adversidades e aos problemas que podem advir dessa circunstância.
Quero chamar para fazer uso da palavra o Dr. Luiz Gustavo Pires, representante do Conselho Federal de Farmácia, autarquia federal que regula o exercício profissional dos farmacêuticos e as estruturas que lidam com medicamentos.
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O SR. LUIZ GUSTAVO DE FREITAS PIRES - Bom dia a todos e todas.
Primeiro, eu quero cumprimentar a Mesa, na pessoa da Deputada Jandira Feghali e na pessoa da Deputada Alice Portugal. Nada melhor do que uma médica e uma farmacêutica para conduzirem um debate muito importante para a saúde pública do País.
Agradeço o convite.
Eu fiz uma apresentação bem resumida.
(Segue-se exibição de imagens.)
Este tema, com o qual nós farmacêuticos lidamos desde sempre, trata de uma situação muito interessante e importante para o paciente.
O paciente, obviamente, deve ter acesso à informação. Ele tem esse acesso em três situações: quando faz uma consulta com o médico; quando vai à farmácia e recebe orientação do profissional farmacêutico, que é o profissional do medicamento; e quando tem acesso, obviamente, às informações da bula. É muito importante que o paciente tenha essa informação.
Eu coloquei este tema no eslaide: Bula digital e/ou impressa. Por que eu coloquei "e/ou"? Porque entra na polêmica que a Deputada colocou do texto que está aprovado em lei. Eu acho que a discussão aqui não é sobre haver ou não haver bula. A bula deve existir, até porque ela faz parte do processo regulatório. Para você registrar um medicamento no País, uma parte do processo regulatório é a bula, ou seja, tem que existir a bula, não tem como ela não existir. A discussão é: será que as duas têm que existir? Tem que existir só uma ou só a outra? É sobre esse ponto que eu queria conversar com vocês.
O PL da Deputada altera a Lei nº 11.903, de 2009, para revogar o § 5º do art. 3º, que, conforme a Deputada acabou de comentar, tem uma pequena contradição.
O que diz o texto?
Art. 3º ..........................................................................
§ 5º A autoridade sanitária poderá definir quais medicamentos terão apenas um formato de bula.
Esse artigo já está excluindo um dos dois formatos: físico ou digital.
Nós elencamos aqui as justificativas para este debate.
A Lei nº 14.388, de 2022, é contraditória, em nosso ponto de vista. Por quê? Ela inclui a possibilidade de formato digital para as bulas, mas veda a substituição da bula impressa pela eletrônica.
Diz o § 4º do art. 1º:
Art. 1º ..............................................................................
§ 4º A inclusão de informações em formato digital (...) não substituirá a necessidade da sua apresentação também em formato de bula impressa (...).
Então, em um artigo, ela diz uma coisa e, em outro, ela crava outra. Já está um pouco contraditório.
Nesse ponto de vista, nós consideramos que a lei é um pouco excludente, porque está excluindo um ou outro formato. O objetivo é dispensar as bulas impressas, deixando aproximadamente 36 milhões de brasileiros que não possuem acesso à Internet sem acesso às bulas dos medicamentos. É isso que está colocado ali.
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Hoje, 100% dos usuários de medicamentos conseguem pesquisar na bula informações sobre posologia, reações adversas e orientações sobre intervalos para administração. Mais de 20 milhões de idosos não estão familiarizados com a tecnologia e enfrentariam dificuldades para acessar as bulas exclusivamente no formato digital.
Eu estou colocando algumas justificativas antes de nós entrarmos, de fato, no debate.
Esta é a realidade do País: 95% têm acesso à Internet — aqui eu não estou falando da qualidade, estou falando só do acesso —, 82% utilizam a Internet diariamente e 22% têm boas condições de conectividade. Portanto, dos 95% que têm acesso, apenas 22% têm acesso, digamos assim, full time.
Esta questão aqui é interessante: segundo pesquisa — daqui a pouco, eu vou colocar a fonte —, 80% das pessoas que consomem medicamentos leem a bula de alguma forma. Vejam que interessantíssimo: isso representa 84% das mulheres e 70% dos homens.
Dentre os 20% que não têm esse hábito, 50% acham o vocabulário complicado; 35% confiam no prescritor, ou seja, se o prescritor prescreve, faz a orientação, essas pessoas não leem a bula; 21% acham as letras pequenas — nós tivemos algumas alterações ao longo do tempo e as letras ficaram um pouquinho maiores, porém essa alteração não é necessariamente suficiente para pessoas que têm dificuldade na leitura —; e 18% consideram o formato pouco atraente, ou seja, com informações muito técnicas, que não são fáceis de compreender. Esse dado e o anterior são de uma pesquisa de 2019 do IBOPE e de uma indústria.
O que o CFF debateu e apoia? O CFF apoia o acesso amplo e diversificado à informação, como forma de promoção do uso correto e racional do medicamento. O acesso tem que ser total. O paciente ou usuário deve ter acesso. O CFF apoia a utilização de qualquer recurso que possa contribuir para a compreensão do paciente a respeito do seu tratamento. Se uma tecnologia vem para somar, ela deve vir, desde que parta do princípio básico e coloque um acréscimo. O CFF apoia o direito do paciente de ter acesso à bula do medicamento que está utilizando. Como eu falei anteriormente, é um processo regulatório, está inerente ao processo regulatório, ou seja, não tem como ser excluído.
Nós colocamos, também, as vantagens de se acrescer uma bula digital a esse processo. Talvez haja diminuição de custos de produção, se isso for apresentado e aprovado pelos senhores; benefícios ao meio ambiente; fácil acesso às informações; informações portáveis; aumento de fornecimento de informações sobre o medicamento, com a disponibilidade adicional de dados científicos não promocionais. Se você insere a informação digital, você pode ter acesso, por exemplo, a um vídeo sobre a bula. Nos dispositivos inalatórios, cuja utilização é complexa, um vídeo ensinando a pessoa a utilizar o extensor, por exemplo, facilitaria o uso. É o caso também do áudio sobre a bula para deficientes visuais.
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Outra vantagem é o acesso a informações atualizadas. De certa forma, quando há uma alteração no registro, você é obrigado a atualizar essa informação. Também são vantagens a acessibilidade a informações via leitura dinâmica; o aprimoramento do conteúdo; e o favorecimento da adesão ao tratamento.
Agora nós vamos aos desafios que colocamos e às preocupações que temos.
A conectividade é limitada. Como eu falei no começo, não é porque 80% têm acesso à Internet que essa Internet é estável e de qualidade. Nós estávamos falando dos rincões. O meu Presidente, Dr. Walter — eu peço desculpas por ele não estar presente aqui —, que vocês conhecem, é do Estado do Pará. Quem já andou no interior do Pará sabe como é o acesso à Internet lá. Até em Belém, às vezes, é complexo o acesso à Internet. Ele coloca muito isso. Então, a conectividade é limitada.
Além disso, há disparidades de acesso entre aqueles que usam a Internet. Há também as barreiras de habilidades digitais. Essa é uma preocupação bem constante. Não é porque a pessoa tem acesso que ela tem habilidade de manusear, por exemplo, um aplicativo, uma ferramenta digital.
Eu cito aqui medidas para mitigar esses desafios ou iniciar um debate, como nós colocamos. Esse debate, com a lei aprovada, está na ANVISA. Foi feita uma consulta pública, mas não foi dado o andamento. Nós não tivemos sequer um teste, um piloto: "Vamos fazer um piloto. Vamos ver como as pessoas se sentem, o que vão achar disso, como vão se sentir com essa tecnologia, se vai somar, se não vai".
Nessas medidas, nós colocamos a disponibilização de cópias físicas, que seria aquela questão do paralelo, de haver uma física e uma digital; iniciativas de alfabetização digital para pessoas que, mesmo tendo conectividade, não têm facilidade de manusear um aplicativo ou coisa parecida; assistência personalizada, ou seja, uma assistência individualizada para aqueles que precisam de ajuda extra para acessar essas informações on-line.
É preciso compromisso com a igualdade, ou seja, deve-se garantir que ninguém seja deixado para trás no acesso à informação. É essencial que todos tenham acesso. Isso é um direito. Também é preciso implementar políticas e práticas que promovam essa equidade, ou seja, acessibilidade e inclusão em todos os aspectos do sistema de saúde digital.
Nós sabemos que a questão digital é muito nova, é inovadora, tanto é que o atual Governo criou, Deputado, uma Secretaria que cuida só de políticas digitais na área da saúde. Nós temos a prescrição digital, que ajudou muito na pandemia. A questão digital vem para somar. Nós acreditamos muito nisso; achamos que isso vai estar no nosso dia a dia; mas temos que colocar um ponto de interrogação: nós estamos preparados para isso? A nossa população está preparada? Nós temos tecnologia suficiente que suporte isso?
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Há outra questão que eu deixo para reflexão: com quem vai ficar a guarda dessas informações? Vai ficar com a ANVISA? Vai ficar com a própria indústria? Essa questão também é muito importante, até para evitar aquilo que o Dr. Alexandre colocou aqui sobre a questão dos dados — não vou falar em falsificação.
Hoje, realmente, se você pesquisar, é muito fácil encontrar um bulário na Internet. Você encontra o bulário em PDF, mas também encontra o bulário comentado. No entanto, não sabemos se aquele comentário é uma questão técnica e científica equânime com a questão original da própria bula. Então, deve haver acesso a um lugar que seja, de certa forma, validado.
Isso que eu trouxe para vocês é um ponto de reflexão. O Conselho Federal de Farmácia sempre está aberto ao debate. Já recebemos lá o Alexandre, o pessoal do Alexandre, fizemos uma reunião on-line. Já recebemos diversas indústrias. Estamos de portas abertas para debatermos em conjunto e, quem sabe, chegarmos o mais rápido possível a um consenso ou a uma proposta que seja justa para todos.
Muito obrigado.
A SRA. ALICE PORTUGAL (Bloco/PCdoB - BA) - Muito obrigada, Dr. Gustavo.
Eu queria, antes de passar a palavra para o próximo orador, dizer que estão aqui entre nós servidores técnicos e administrativos das universidades federais, que estão aderidos ao comando de greve dos servidores que têm os menores salários do Brasil, inclusive os dos hospitais universitários.
Quero destacar a figura do companheiro Hilton, de Ouro Preto, que é um patrimônio dessa luta de todos os servidores das universidades federais.
Obrigada, Hilton, pela sua presença.
Agradeço também às demais companheiras que estão neste recinto.
A SRA. PRESIDENTE (Jandira Feghali. Bloco/PCdoB - RJ) - Eu quero dar uma informação. Eu apresentei o Projeto de Lei nº 715, de 2024, citado na apresentação, e a Deputada Alice apresentou um projeto similar, um projeto com o mesmo conteúdo — ela me diz aqui que é um projeto genérico. (Risos.)
Esses projetos estão em prazo de emendamento. Esse prazo começou ontem, dia 6. Assim que acabar o prazo de emendamento, ele poderá receber o parecer. A Relatora dos dois projetos, que estão apensados, é a Deputada Juliana Cardoso.
Então, daqui a pouco, ele poderá entrar em debate no âmbito da Comissão.
A SRA. ALICE PORTUGAL (Bloco/PCdoB - BA) - Por uma questão operacional, nós vamos antecipar a fala do Sr. Fábio José Basílio, que se encontra no local de trabalho. Ele é Presidente da Federação Nacional dos Farmacêuticos, mas não conseguiu a liberação para representar os farmacêuticos — desde já, deixo registrado aqui esse protesto da ação antissindical contra a Federação Nacional dos Farmacêuticos.
Tem a palavra o Sr. Fábio José Basílio, Presidente da Federação Nacional dos Farmacêuticos.
O SR. FÁBIO JOSÉ BASÍLIO - Obrigado, Deputada Alice Portugal.
É uma pena eu não poder estar presente aí. Hoje é o dia do meu plantão. Eu estou aqui no hospital. Não tive como me ausentar do trabalho.
De pronto, eu agradeço o convite feito à Federação Nacional dos Farmacêuticos e cumprimento a Deputada Jandira Feghali e a Deputada Alice Portugal, duas mulheres de luta, que sempre carregaram a bandeira dos farmacêuticos e da farmácia brasileira, que sempre fizeram os enfrentamentos, que não foram poucos durante todos esses anos.
Na pessoa das Deputadas, eu cumprimento todos os participantes.
Quero dizer da minha felicidade por participar desta audiência e discutir um assunto muito importante para a população brasileira: o acesso à informação.
Senhores e senhoras, falam em diminuir custos, em preservar a natureza, mas, na verdade, estão pensando em uma ação meramente mercantilista. Nós vivemos num país continental, onde as condições não são iguais. Todos aí já falaram isso, inclusive quem defende apenas a bula digital. Todos já falaram das condições desiguais de acesso a tecnologias que nós temos no Brasil.
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Nós deveríamos estar discutindo, Deputada Alice, Deputada Jandira, demais Deputados, convidados, o acesso do paciente ao farmacêutico. É um direito do usuário do medicamento o acesso à assistência farmacêutica de maneira integral.
Eu sou servidor, Deputada Alice Portugal. Em Goiânia e em Brasília, ainda há dispensação de medicamentos por pessoas que não são da área farmacêutica, inclusive pessoas de serviços gerais, de outros serviços da saúde, que são importantes, mas não são da assistência farmacêutica. Vou dar um exemplo: se um paciente precisa de 30 comprimidos de hidroclorotiazida, recorta-se ao meio uma cartela com 20 comprimidos. Com isso, um paciente leva uma parte da cartela contendo a validade do medicamento, mas sem o nome; o outro paciente leva uma parte da cartela contendo o nome, mas sem a validade.
(Falha na transmissão) o acesso adequado aos medicamentos, o acesso equânime. O acesso é um direito de todos. É um direito da população brasileira o acesso à assistência farmacêutica. Isso está na Constituição. A assistência farmacêutica é um direito. A assistência farmacêutica vai da fabricação dos medicamentos ao uso pelo paciente de forma correta, ao uso racional do medicamento. Isso é um direito das pessoas no Brasil. Isso foi conquistado após muita luta da FENAFAR, Deputada Alice Portugal, Deputada Jandira.
Então, é fundamental garantir às pessoas o acesso adequado aos medicamentos, com informação. Em vez disso, a discussão que vemos é para baratear o custo, para tirar a bula, para permitir a venda em supermercados. Há um contrassenso total no ambiente em que vivemos. Há um contrassenso total neste País continental que é o Brasil.
A defesa aqui é muito simples, Deputada Alice. Não existe contradição. A FENAFAR é favorável à bula digital, sim. É lógico que nós somos favoráveis à bula digital, mas também é lógico que nós somos contra a retirada da bula impressa. A bula impressa dá às pessoas a garantia de que vão ter acesso à informação em qualquer local. Como o companheiro Alexandre disse, no Rio Grande do Sul agora há locais sem Internet, sem energia. Como a pessoa vai ter acesso à informação em casa ou em outro local? Quem vive no meio dos trabalhadores, como eu vivo, como os sindicalistas vivem, Deputada Alice, Deputada Jandira, sabe que, muitas vezes, para ter Internet no celular, a pessoa tem que colocar crédito, que não dura 1 mês. Essa pessoa tem acesso à Internet? Sim, mas não é o tempo todo nem é de boa qualidade. Nós devemos garantir que as pessoas tenham acesso à informação.
A FENAFAR defende a bula digital — será melhor para quem tem acesso à Internet, pois essa pessoa poderá fazer a consulta e até obter informações adicionais —, mas também defende que a bula impressa continue. E digo mais: a lei diz que a bula deve ter letras em tamanho legível, mas não diz que tamanho é esse. O que é legível? Eu vou completar 49 anos no sábado, Deputada Alice. As letras estão ficando menores a cada dia para mim. Imaginem a situação das pessoas que têm dificuldade visual! O que é uma letra legível? Eu acho que a lei deveria especificar o tamanho e a fonte. O que é uma letra legível? O que são nomenclaturas acessíveis? Isso já melhorou bastante quando, por exemplo, tiraram "cefaleia" e colocaram "dor de cabeça"; quando tiraram nomes técnicos e colocaram nomes mais usuais; mas é preciso que a bula consiga, de fato, informar as pessoas; é preciso que as pessoas leiam e entendam as informações. Podem manter as informações técnicas. Não há problema nisso. Os trabalhadores da saúde conseguem acessar essa informação, pois têm mais acesso à informação. Nós temos que cuidar da população brasileira, do povo brasileiro, que sofre, que, muitas vezes, não tem acesso adequado ao medicamento.
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A FENAFAR defende, principalmente, que o acesso ao farmacêutico seja garantido a todos e todas, para não termos populações de segunda categoria no Brasil. Todos têm direito à informação, à assistência farmacêutica e ao acesso qualificado ao medicamento. É disso que nós temos que falar.
É preciso haver o fim dos dispensários no Brasil. É uma aberração que hospitais não precisem contratar farmacêuticos, que clínicas façam uma série de procedimentos com medicamentos relacionados à Portaria nº 344, de 1998, sem farmacêuticos. É isso que devemos discutir, em vez de discutir o fim da bula impressa, que vai impossibilitar o acesso das pessoas à informação.
Eram basicamente essas as informações da FENAFAR, Deputada Alice.
Quero agradecer muito o convite feito pela Comissão. Nós nos colocamos sempre à disposição. Nas próximas vezes, se Deus quiser, estaremos presencialmente com vocês. É sempre uma honra e uma felicidade estar junto com vocês nas agendas, nas discussões. É preciso garantir que a população brasileira tenha esse cuidado.
No meio Parlamentar — V.Exas. sabem muito mais do que eu —, existe aquela questão do jabuti na árvore. Quem o colocou lá? O § 5º é um jabuti na árvore, porque é totalmente contrário ao § 4º, que diz que a bula digital não pode substituir a impressa. Já o § 5º diz que a ANVISA pode determinar um ou outro formato. Isso é um jabuti que alguém colocou na lei.
Ao contrário do que o colega disse, eu não acho que isso vai dar mais prestígio. Nós sabemos que não é assim. No Brasil, as coisas têm que estar escritas, muito bem escritas mesmo, porque o mercado arruma brechas, o mercado arruma maneiras para burlar tudo. A ANVISA, uma agência valorosa, que tem toda credibilidade, discutiu a possibilidade de se colocar na bula da ivermectina o tratamento da COVID. Isso foi discutido na ANVISA e quase foi aprovado. Nós devemos ter esse horizonte de que as coisas não podem ficar na mão de pessoas, de ideias e de governos; as coisas devem estar na mão da população brasileira, através das leis bem escritas.
Então, eu defendo a revogação imediata do § 5º. Para mim, a lei já está adequada. Só esse jabuti na árvore é que está atrapalhando, está estragando.
No mais, coloco a FENAFAR à disposição. Deputadas Alice e Jandira, contem sempre conosco. Temos muita admiração pela luta e pela força de V.Exas. sempre.
Obrigado. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Jandira Feghali. Bloco/PCdoB - RJ) - Obrigada, Fábio, pela sua entrada. Mesmo virtualmente, você nos dá uma importante contribuição.
Eu reitero a preocupação da Deputada Alice com a liberação dos presidentes de entidades. Ele não conseguiu estar aqui porque não foi liberado do trabalho, e ele é o presidente de uma federação nacional. Isso precisa ser resolvido. Podemos ajudar ou pelo menos tentar.
Aqui várias coisas já foram levantadas no debate: a questão especificamente do apartheid digital brasileiro, o direito à informação, a sustentabilidade levantada pela representação do Pró-Genéricos, a preocupação com os genéricos, que nós também temos. Nós também achamos que os genéricos têm que estar no mercado sem dificuldade, com facilitação inclusive administrativa, logística e tributária, se for o caso. Nós aprovamos a política dos genéricos como política de mercado, porém de barateamento dos medicamentos e diversificação de produção. Faz parte da nossa política a defesa dos genéricos, sem que isso entre em contradição com o debate que nós estamos fazendo neste momento. Depois, obviamente, quando os Deputados falarem, vamos entrar mais no mérito. Agora nós só estamos coordenando a audiência.
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Passo a palavra ao próximo convidado, o Sr. Henrique Uchio Tada, Diretor-Executivo da Associação dos Laboratórios Farmacêuticos Nacionais — ALANAC, que está na nossa frente, na primeira fila.
O SR. HENRIQUE UCHIO TADA - Bom dia a todos.
Nós agradecemos muito a chamada para participarmos desta reunião.
Ao cumprimentarmos a Deputada Jandira Feghali e a Deputada Alice Portugal, cumprimentamos todos os Parlamentares presentes e todos os que assistem à reunião pessoalmente e virtualmente.
Eu sou farmacêutico e executivo da Associação dos Laboratórios Farmacêuticos Nacionais — ALANAC, da indústria farmacêutica brasileira, de capital 100% nacional. Com muito orgulho, eu queria comentar um pouco sobre a indústria farmacêutica nacional.
É uma questão de soberania nacional o País produzir medicamentos para suprir as demandas de medicamentos da população. O Brasil, nos últimos 30 anos, conseguiu estabelecer uma produção farmacêutica nacional muito sólida, muito forte. Nós já estamos no ponto de inovação, tanto incremental, como radical, de produtos biológicos. Também estamos internacionalizando. O País já não faz mais fronteira para as indústrias farmacêuticas nacionais ganharem outros mercados.
Nós tivemos um histórico que eu gostaria de comentar. Segundo a Relação Nacional de Medicamentos Essenciais — RENAME, 86% dos medicamentos do componente básico são produzidos pela indústria farmacêutica nacional, 43% exclusivamente pela indústria farmacêutica nacional. Trata-se de um percentual muito significativo de produção que atende à necessidade da população brasileira. Ela é a principal fornecedora de medicamentos para o Programa Farmácia Popular no Brasil para tratar de hipertensão, diabetes, asma, osteoporose; de anticoncepcionais; de copagamento para dislipidemia, rinite, doença de Parkinson e glaucoma. Todos esses medicamentos para os beneficiários do Programa Bolsa Família são gratuitos. Esse avanço ocorreu na gestão do Ministério da Saúde do ano passado para cá, em que houve ampliação de acesso ao Programa Farmácia Popular, com a SECTICS, a Secretaria do Dr. Gadelha, e o Ministério, comandado pela Dra. Nísia.
Nos últimos 30 anos, desde 1990, com a regulamentação do SUS, pela Lei nº 8.080, houve participação significativa da indústria farmacêutica nacional, que promoveu maior acesso a medicamentos. Isso resultou em 75% de redução na mortalidade infantil. Tivemos também um aumento de 16% na expectativa de vida, o que equivale a aproximadamente 10 anos a mais de vida para os brasileiros. A indústria farmacêutica nacional teve a sua importância ímpar e contribuiu muito com esse acesso.
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Hoje nós temos o programa Nova Indústria Brasil — NIB, cuja Meta nº 2 trata do fortalecimento da Meta nº 6, que é o complexo econômico da indústria da saúde. O objetivo é aumentar significativamente a produção nacional de insumos em saúde. O setor farmacêutico nacional investe, em média, mais de 10% do seu faturamento em pesquisa, desenvolvimento e inovação. São poucos os setores que conseguem investir nesse montante. Há produção, geração de emprego, renda e desenvolvimento tecnológico no Brasil.
Hoje, majoritariamente, a produção nacional de medicamentos é por indústrias de capital nacional. Não vou entrar no detalhe dos motivos que fizeram as indústrias de capital estrangeiro deixarem de produzir localmente no Brasil por outras questões, mas a realidade é essa. Graças à indústria nacional, estamos conseguindo avançar cada vez mais, tanto em quantidade, como também em valores na participação do mercado brasileiro.
Isto posto, a indústria farmacêutica nacional é totalmente a favor do acesso à informação da bula. Não existe nenhum ponto de debate do que foi feito na construção da Lei nº 14.338, de 2022, que tramitou nas Comissões, tanto nesta Casa, a Câmara, como também no Senado, e foi aprovada sem nenhum susto, sem nenhum problema, sem nenhum ponto de que isso vai trazer falta de informação à população.
A indústria farmacêutica registra seus produtos na Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Até faço uma pontuação sobre a revista de 1998 apresentada pelo Dr. Alexandre Morais. Em 1998, o Brasil estava em uma crise enorme. Havia, sim, uma falta de vigilância sanitária, tanto é que a indústria farmacêutica nacional e também as de capital estrangeiro apoiaram imediatamente uma mobilização, que resultou na criação da ANVISA. Isso foi muito necessário e até fruto do PNIF — Programa Nacional de Inspeção em Indústrias Farmacêuticas e Farmoquímicas, que o Brasil começou a fazer nos anos 90 e que teve um resultado muito ruim, apontando a necessidade de uma vigilância sanitária mais forte, mais atuante.
Assim, nesse cenário, com o Congresso, com o apoio da indústria farmacêutica local e também de capital estrangeiro, a ANVISA foi criada. Ela foi galgando a passos largos e conseguiu reconhecimento, tanto nacional como internacional, da capacidade, da qualificação, do rigor do trabalho de fazer inspeção sanitária e regular esse mercado de medicamentos, entre outros produtos de vigilância sanitária.
Com base nisso, a Lei 14.338 colocou pontos importantes. No art. 3º, § 4º, numa primeira leitura, pode até haver algumas dúvidas, mas ela fala do acesso à bula digital e usa mesmo como referência a bula em papel, que é a que todos nós conhecemos. Ela não diz, em nenhum momento, que vai ser já definida a retirada de bula de todos os medicamentos, que vai haver uma falta de acesso às informações das bulas. Ela diz que isso vai ser regulamentado pela autoridade sanitária, que é a Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Tanto no § 4º, quanto no § 5º, ela fala isso dessa forma. Então, não vemos nenhum ponto de preocupação de falta de acesso à informação. A ANVISA não está aqui presente hoje, mas ela tem toda qualificação, estrutura e seriedade para fazer a regulamentação de quais produtos vão ter a opção de colocar somente a bula digital com QR Code. Essa bula com QR Code traz a inclusão, inclui a população que tem deficiência visual, deficiência auditiva, com as vídeo-bulas, com as áudio-bulas, também para os iletrados. Foi colocado pelo Dr. Alexandre de Moraes o número de 29 milhões de pessoas que não têm acesso à Internet. O Dr. Luiz Gustavo disse que são 36 milhões de pessoas. São referências com números até próximos.
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Queríamos também colocar que 80% dessa população de 29,4 milhões de pessoas que não têm acesso à Internet são iletradas, não são alfabetizadas, ou têm o ensino fundamental, no máximo, incompleto. Então, essas pessoas já não vão conseguir ler a bula em papel. Uma vez colocando isso como exemplo, a bula em QR Code...
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. HENRIQUE UCHIO TADA - Dr. Alexandre, digo isso com base na pesquisa TIC de Internet do Brasil. Isso está referenciado. A bula pode ser acessada por áudio-bula.
A bula com QR Code consegue captar uma...
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. HENRIQUE UCHIO TADA - Sim, mas o iletrado, que não consegue ler, também já não apresenta...
A SRA. PRESIDENTE (Jandira Feghali. Bloco/PCdoB - RJ) - Gente, vamos evitar o debate paralelo. Tudo bem, eu entendi a sua indignação, mas vamos deixá-lo concluir. Depois, no debate, falamos sobre isso.
O SR. HENRIQUE UCHIO TADA - Acho que tenho o direito de terminar a minha fala.
A SRA. PRESIDENTE (Jandira Feghali. Bloco/PCdoB - RJ) - É claro, estou garantindo a sua fala. O seu tempo já acabou, mas você pode concluir, por favor.
O SR. HENRIQUE UCHIO TADA - Muito obrigado.
Outros aspectos que queríamos colocar é que o acesso ao TIC Saúde de 2022, realizado pelo Comitê Gestor da Internet no Brasil, é essa a referência, indicou também que 98,4% dos estabelecimentos de saúde utilizaram a Internet nos últimos 12 meses antecedentes à pesquisa.
O Programa SUS Digital, lançado pelo Ministério da Saúde, conta também com adesão de todos os Estados e o Distrito Federal, além de 5.566 Municípios, 99,9% do total. E o auxílio governamental oferecido majoritariamente por canais digitais — Auxílio Emergencial, durante a pandemia, Bolsa Família, dentre outros — também foi feito por aplicativo e pela Internet. E o Conecte SUS hoje é o aplicativo governamental mais utilizado.
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Então, o que nós estamos colocando aqui é essa necessidade. E é muito bem-vinda essa opção a mais de acesso por QR Code. Com a regulamentação da ANVISA, vai ser feita uma coisa muito bem estruturada, considerando todo o risco sanitário inerente à questão.
A definição da classe de medicamentos que utilizará a bula digital é responsabilidade da ANVISA. Em todos os casos, quando solicitada, a bula impressa vai ser disponibilizada, garantindo, assim, que não vai haver falta de informação a ser entregue para quem dela necessitar no momento da aquisição do medicamento.
Muito obrigado.
A SRA. PRESIDENTE (Jandira Feghali. Bloco/PCdoB - RJ) - Obrigada, Dr. Henrique Tada.
Quero registrar a presença do Deputado Reimont, do Rio de Janeiro, meu Estado.
Quero apenas dizer que faltam duas intervenções para podermos abrir a palavra para os Parlamentares e abrir o debate.
Deputada Alice Portugal, V.Exa. poderia apresentar o próximo orador?
A SRA. ALICE PORTUGAL (Bloco/PCdoB - BA) - Sim.
Nós gostaríamos de convidar para fazer uso da palavra o Dr. Jackson Lucena, Assessor de Relacionamento Governamental da Associação Brasileira da Indústria de Produtos para o Autocuidado em Saúde — ACESSA.
O SR. JACKSON LUCENA - Obrigado, Deputada.
Eu gostaria de saudar as duas Deputadas na Mesa.
Quero agradecer, em nome da ACESSA, o convite. Agradeço também aos demais colegas que aqui estão.
Eu acredito que esse momento deve ser considerado de bastante importância, porque, quando reunimos tantas pessoas boas para falar sobre acesso à informação, à saúde para os pacientes, isso já é uma vitória. Então, isso aqui nós já temos que considerar uma vitória.
Os pontos mais críticos que estão sendo tratados aqui também devem ser parabenizados, porque nós estamos preocupados principalmente, Dr. Tada, com aquelas pessoas que não têm acesso à Internet e aquelas pessoas que têm dificuldade na leitura e na interpretação da complexidade de uma bula.
E aproveitando que a ACESSA hoje é uma associação que pensa no autocuidado em saúde, eu aproveito a oportunidade de estar diante desta plateia, destes colaboradores e desta Mesa tão qualificada para falar não só em informação, mas também em formação em saúde.
Eu sou de uma cidade do interior da Paraíba chamada Patos, com 100 mil habitantes. E nós ainda temos lá a realidade de pessoas em situação de rua que vão a uma unidade de saúde, recebem medicamento e o amarram no pescoço, para que não sejam furtadas ou roubadas durante a noite. E, quando perguntadas qual era o horário que elas tomavam aquele medicamento, elas diziam: "Na unidade de saúde básica, eles me disseram que eu tenho que tomar o remédio de 8 horas em 8 horas". E a pesquisadora perguntava: "E como você toma de 8 horas em 8 horas?" Elas responderam: "Eu tomo às 8 horas da manhã e às 8 horas da noite".
E essa pesquisa também foi realizada pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, por meio do Dr. Rogério Maldivia. Ele foi para a rua escutar a população em situação de pobreza e extrema pobreza, e o indivíduo dizia que precisava proteger o medicamento, porque o furtavam durante a noite. Ele perguntava: "Como é que você toma o remédio?" E o engraçado é que, da Paraíba, Alto Sertão, à Capital Rio de Janeiro, a resposta foi igual: "Às 8 horas da manhã e às 8 horas da noite".
Hoje nós estamos dentro do Ministério da Saúde protocolizando um pedido de criação de um grupo de trabalho para se discutir a formação da população em saúde através do autocuidado. Isso porque, se o indivíduo, com uma bula física ou com uma bula digital, não a consegue ler ou interpretar, essa discussão nossa aqui não tem espaço.
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Nós precisamos de um agente comunitário de saúde que vá à residência do indivíduo mensalmente, que saiba conversar com ele sobre a forma de se cuidar no dia a dia, que saiba auxiliá-lo na interpretação da bula, seja ela digital, seja ela física, para que ele faça o manejo correto da medicação.
Nós precisamos de uma unidade básica de saúde, em que o cidadão, primeiro, saia de lá e vá direto para a farmácia básica para receber o seu medicamento e, segundo, sabendo como vai fazer aquele tratamento. Isso porque, quando a atenção primária em saúde funciona, nós desafogamos a assistência complexa, nós diminuímos a fila nos hospitais. Hoje a ACESSA é a única parceira da FIOCRUZ na construção de um aplicativo de antecipação de pandemias.
A FIOCRUZ hoje, juntamente com a Secretaria Nacional de Vigilância Sanitária e a Secretaria Nacional de Atenção Primária à Saúde, está desenvolvendo, Dr. Luiz, um aplicativo chamado AESOP. E nós da ACESSA estamos levando os dados da farmácia.
E olhem que interessante: quando os dados da atenção primária à saúde foram cruzados com os da vigilância sanitária, conseguiu-se antecipar uma curva de surto em determinados locais em 2 semanas. Quando nós levamos, através da ACESSA, os dados da farmácia, nós conseguimos uma curva de antecipação de surtos em 4 semanas.
Então, nós estamos aqui em um debate de extrema riqueza, que é o de acesso à informação. E é importante também, através desse público qualificado, através dessas pessoas qualificadas, discutir a formação do cidadão em saúde.
A Organização Mundial da Saúde tem sete pilares estabelecidos para o autocuidado pelo próprio cidadão. Um deles é o letramento em saúde. E temos que avançar na formação da sociedade, para que ela possa se identificar, se autoconhecer e, a partir daí, tomar o seu autocuidado.
Então, quando tratamos de informação, nós voltamos um pouquinho e falamos em formação, para, a partir daí, avançarmos.
E o que já discutimos aqui hoje — eu achei de extrema importância a pontuação do Dr. Alexandre — foi a questão da redução das bulas para os MIPs de prateleira em farmácia. E é importante ressaltar, doutor, que, para que um medicamento passe de prescrito para não prescrito, ele passa 10 anos em experiência de prescrição até que alcance qualidade, segurança e eficácia. A partir daí, ele passa a ser não prescrito, ele passa a ser um medicamento isento de prescrição, ele passa a fazer parte da rotina de uma pequena parte da população. E aí eu volto ao tema formação, porque a pequena parte da população que usa a medicação não prescrita o faz com consciência, porque leu uma bula, seja ela digital, seja ela impressa. Então, nós temos experiência do medicamento isento de prescrição depois desse prazo.
E, por fim, até para não me estender tanto, porque tantas pessoas já falaram aqui do tema, eu acredito que nós não estamos cerceando um direito; pelo contrário, nós estamos criando um direito a mais, que é a informação virtual.
Depois que um processo legislativo é aprovado nesta Casa, que nele foi previsto que o órgão de regulação específica fizesse a regulamentação, deixando que ele atue, como se está fazendo através de uma consulta pública, como ainda se está pensando em como vai fazer esse processo de transição, se vão coexistir os dois modelos, isso é pensado na sede da ANVISA. Nós temos que nos preocupar é em facilitar o conteúdo da bula, em torná-lo mais claro. Toda informação inserida na bula deixa a cabeça do paciente ainda mais complexa, seja essa bula virtual, seja essa bula impressa. Toda lei aprovada nesta Casa, por exemplo, que insere uma informação nova na bula ou no rótulo das embalagens, nós já começamos a conversar com a ANVISA. "E agora? Não cabe mais." A ANVISA tem que pensar, por exemplo, num pictograma para fazer uma referência ao conteúdo que vai estar na bula. Agradeço esse espaço, agradeço a oportunidade desta discussão e deixo muito claro: a nossa intenção é prezar pelo avanço e pelo acesso à informação.
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Muito obrigado, meus caros.
A SRA. ALICE PORTUGAL (Bloco/PCdoB - BA) - Muito obrigada, Dr. Jackson Lucena, da ACESSA.
Vamos ao nosso último convidado da manhã — logo após, abriremos a palavra para os colegas Parlamentares —, o Dr. Marcelo Polacow Bisson, Presidente do Conselho Regional de Farmácia do Estado de São Paulo.
Tem V.Sa. a palavra.
O SR. MARCELO POLACOW BISSON - Bom dia a todos.
Agradeço, no primeiro momento, à Deputada Alice Portugal, à Deputada Jandira Feghali, pelo convite. Na pessoa delas cumprimento todos os membros da Mesa, os Deputados presentes.
Na pessoa da Deputada Rosangela Moro, cumprimento todos os Deputados da bancada paulista. Tenho a honra de presidir o Conselho Regional de Farmácia do Estado de São Paulo.
Eu vou apresentar o ponto de vista e também um pouco do histórico desta discussão no Estado de São Paulo e no Conselho de Farmácia.
(Segue-se exibição de imagens.)
Sou farmacêutico de formação, tenho mestrado, doutorado na área de farmacologia também.
Já foi falado em outras apresentações aqui, um ponto que realmente chamou atenção nesse assunto, do § 5º da Lei nº 11.903, de 2009, alterado pela Lei nº 14.338, de 2022, que diz que a ANVISA é a autoridade sanitária que tem a premissa de regulamentar o assunto.
Vou abordar alguns pontos importantes.
O CRF participou dessa consulta pública, que se encerrou agora em março. Nós participamos também, na época, da lei de 2022, ativamente, mandando sugestões para os Deputados. Inclusive, a posição do CRF de São Paulo foi pela manutenção dos dois formatos concomitantemente, e sempre entendemos que a bula digital é um avanço. Porém, neste momento, concomitante e posteriormente, poderíamos até avaliar, discutir, mas não abrimos mão. Esse foi o nosso ponto.
O CRF de São Paulo hoje congrega um terço dos farmacêuticos brasileiros — há mais ou menos 90 mil farmacêuticos só no Estado de São Paulo, um terço de todos os farmacêuticos do País está no Estado de São Paulo — e mais de 30 mil estabelecimentos farmacêuticos.
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O nosso ponto de vista é que seria necessário, antes de discutir se tira ou põe a bula impressa, implantar 100% a bula digital. Hoje, nós não sabemos nem onde vai ficar disponibilizada a base de dados dessa bula digital. Então, talvez fosse oportuno que essa consulta pública ocorresse num segundo momento, para se discutir de quais medicamentos seria retirada a bula impressa, se isso realmente seria viável ou não. Se vamos escolher um formato digital ou impresso, temos que discutir quais seriam esses medicamentos que vão ter mantida a bula impressa e quais não a vão ter, se isso avançar, se a ANVISA realmente for caminhar nesse sentido.
Pontos importantes para posicionamento, uma vez implantada a bula digital. Primeiro: acesso da população à Internet e a dispositivos para leitura. Isso já foi discutido, é necessário. Será que todo mundo tem um smartphone, tem acesso à Internet? Em que ponto nós estamos? O Dr. Gustavo trouxe alguns dados do Conselho Federal de Farmácia. Isso já foi apresentado.
Outro ponto: quem imprimirá as bulas, quando solicitadas pelo paciente, se nós tirarmos a bula física? Seria a farmácia? A farmácia teria que imprimir essa bula quando solicitada? Então, são pontos que ficam realmente no ar. Quais tipos de medicamentos podem abrir mão de bula impressa? Eu entendo que, uma vez implantada a bula digital, algumas categorias até possam... Eu trabalhei como farmacêutico em hospital. Em hospital, o farmacêutico dispensa diretamente o medicamento para o paciente, através do enfermeiro. Não há contato, praticamente, do paciente com a caixa, com a embalagem do medicamento. No hospital, as bulas são jogadas fora, literalmente, sem acesso, até porque o farmacêutico tem informação e tem acesso a ferramentas digitais.
Qual o cronograma e prazos para transição? O Japão, por exemplo, um país que implantou a bula digital, não a implantou 100%, deu um prazo de 2 anos, após a bula digital, para avaliar e fez um piloto, como disse o Gustavo, do Conselho Federal de Farmácia. Um ponto importante é testar a bula digital concomitantemente com a bula impressa. Aí, sim, nós podemos avaliar a real situação. Singapura também fez esse processo. Os Estados Unidos e a Europa também estão fazendo. Inclusive foi publicado um paper em que se fazia uma análise comparativa das legislações farmacêuticas, em que pé está cada uma. E o Brasil estava nesse paper, porque nós temos uma legislação.
Alguns alertas. Qual é a nossa preocupação? Implantação sem teste. Como se vai retirar a bula sem realmente haver a bula digital? Então, talvez haja inoportunidade para essa consulta pública. Não estou questionando a competência da ANVISA para fazer isso, mas, sim, o momento.
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Identificação dos pontos de vista dos profissionais da saúde, o que pensa a sociedade. Eu procurei conversar com todos os atores, com a indústria. Estive pessoalmente na ACESSA, LANAC, SINDUSFARMA, ABIGRAF para conversar com as pessoas, com os médicos. Estive no Conselho Regional de Medicina de São Paulo, que congrega o maior número de médicos, conversei com o Presidente para saber a opinião dele, para tentar entender. E a conclusão a que eu cheguei é que é necessário um amadurecimento maior para esse tipo de discussão.
A cibersegurança nós sabemos que hoje é um problema. Se entra um hacker e muda um texto, pode-se induzir um paciente a óbito por uma dosagem errada. Qual é a segurança que nós vamos garantir? Então, isso precisa ser discutido.
E é preciso esgotar essa discussão entre os envolvidos. Eu acho que nós não a esgotamos ainda. Já conversei com todos os segmentos, coloquei-me à disposição, como representante do Conselho Regional de Farmácia de São Paulo. Com certeza, o Gustavo, do Conselho Federal, também tem esse ponto de vista de fazer uma discussão para aprofundamento do tema.
Eu acredito que é uma discussão em que precisamos avançar, evoluir. Eu entendo a polêmica do tema e o calor que ela gerou. Por isso, é importante estarmos aqui, na Casa do Povo, fazendo esta discussão com todos.
A Deputada Alice e a Deputada Jandira sempre estão envolvidas nos temas da saúde. Inclusive a Deputada Alice está com um projeto que nasceu no Conselho Federal, junto com o Conselho Regional de São Paulo. É um projeto do Deputado Ricardo Silva, que trata dos técnicos em farmácia. Esse é um outro tema importantíssimo que nós vamos ter que debater, discutir, avançar, para regulamentar a profissão de uma categoria importantíssima, que ficou no limbo. Essa categoria, hoje, praticamente não tem segurança jurídica nenhuma. Nós temos essa pauta importantíssima para discutirmos.
Eu conversei, no início, com a Deputada Alice, que é a Relatora aqui na Comissão de Saúde, e esperamos também avançar nesse tema.
Então, muito obrigado a todos.
A SRA. ALICE PORTUGAL (Bloco/PCdoB - BA) - Bom, então, vou rememorar o nosso regramento interno, que temos que seguir. Os Deputados inscritos para interpelar os convidados poderão fazê-lo estritamente sobre o assunto da exposição, no prazo de 3 minutos. No entanto, nós achamos que conceder a palavra para réplica e tréplica vai ficar complicado, pois já são 11 horas. Então, os Deputados falarão, e, pelo mesmo prazo, depois, os nossos oradores apresentarão suas contrarrazões, e nós concluiremos o debate.
Estão abertas as inscrições.
Vai falar como requerente, primeiro, a Deputada Jandira; depois, o Deputado Dr. Luiz Ovando. Eu vou registrando as inscrições.
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A SRA. PRESIDENTE (Jandira Feghali. Bloco/PCdoB - RJ) - Como eu estou coordenando a audiência, eu quero ser muito breve.
Eu requeri a realização desta audiência pública com base no que nós vivenciamos no debate da lei, quando ela foi aprovada. Nós do PCdoB tentamos destacar esse parágrafo, mas nós perdemos no plenário a votação sobre a não inclusão desse parágrafo.
Há algo muito importante nas relações institucionais: qualquer agência reguladora pode e deve regular, mas ela não pode fazê-lo acima da lei. Então, se o artigo anterior diz que têm que existir as duas bulas, eu não posso, no parágrafo seguinte, dar autoridade à agência para dizer se a bula tem ou não um dos dois formatos — ou tem ou não tem —, ou seja, a lei é muito clara no artigo anterior quando coloca a necessidade de se manter os dois formatos de bula. Então, no parágrafo seguinte, como diz o Fábio, esse jabuti, essa inovação entra na lei — e só não é um jabuti porque tem a ver com o assunto, e em geral os jabutis são assuntos estranhos ao texto legal — e dá um poder à ANVISA que confronta a determinação legal. Esse não é um processo que devamos admitir como correto.
As exceções nós podemos discutir mais à frente, mas neste momento a discussão é a seguinte: nós estamos no século XXI? Estamos. Nós estamos na época da Inteligência Artificial? Sim. Isso tem marcha à ré? Não. Só que nós estamos falando do Brasil. O Brasil é um país imenso, com profundas desigualdades de acesso a tudo, e não acho que o não letramento, o analfabetismo seja argumento para se anular a leitura de uma informação, até porque quem não lê a bula impressa também não vai conseguir acessar a Internet, também não vai conseguir fazer nada disso. E não é contraditório, com a existência da bula impressa, que haja todos os mecanismos possíveis para pessoas com deficiência, sem acessibilidade, sem letramento, até porque, para acessar o áudio e o vídeo, tem que haver acesso à Internet. Se não, também não acessa o áudio e o vídeo, nem audiodescrição, se não tiver absolutamente nenhuma forma de acessibilidade. Quer dizer, esse argumento nos distancia da realidade brasileira. É um argumento de quem concentra privilégios, e não o argumento de quem pensa o povo na sua universalidade.
Além disso, quanto ao aspecto da sustentabilidade, nós também temos solução, porque existe a reciclagem de papel no Brasil, que é alta, que já é elevada, de quase 70%. Além de observar as fontes, existe o papel reciclado também.
Nós precisamos observar que a argumentação para suprimir a bula impressa não se sustenta na realidade brasileira, uma realidade de profunda desigualdade social, de desigualdade de acesso à informação e a recursos inclusive. Quando aqui se menciona o medicamento hospitalar, nós podemos até discutir isso, porque o profissional de saúde acessa, e o paciente, deitado na cama, pode não ter a bula, mas precisa ter a informação. Qualquer paciente, mesmo internado, tem o direito à informação. A família também tem o direito à informação sobre o medicamento que está sendo infundido no seu familiar.
Então, nada, na minha opinião, na minha humilde opinião, desencoraja ou sustenta a ideia de que nós não podemos ter os dois formatos. Eu leio muito bula digital, mas eu tenho acesso. Eu acesso a bula digital, leio, interpreto, por ser médica, compreendo e sei fazer uso, mas acho que nós não podemos projetar isso para o conjunto da população brasileira.
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Essa questão da formação em saúde é muito importante. Penso que a Atenção Primária no Brasil se estendeu bastante, com formação de recursos humanos, com equipes multissetoriais. Não existe ainda o farmacêutico no Programa Saúde da Família, como defende a Deputada Alice no seu projeto, mas é uma possibilidade de formação, tendo os agentes comunitários como um vetor, uma mediação fundamental nesse ensinamento. Eles também têm que ser preparados. Isso, com eles organizados, é fácil de fazer, para chegarem à população em cada território, em cada lugar, principalmente neste Brasil profundo que nós temos. Eu sou do Rio de Janeiro, mas tenho que pensar no interior do Norte e do Nordeste e mesmo na Baixada Fluminense, no Rio de Janeiro, que também tem um grau de desigualdade social muito profundo.
Eu penso que nós precisamos ter mais consciência da população-alvo desta discussão, deste debate. Isso não é um gasto excessivo, não compromete a sustentabilidade e permite de fato o acesso universal à informação. Lá na frente, num outro estágio do Brasil, nós podemos discutir a possibilidade de suprimir, mas não agora. Este debate pode continuar, mas suprimir esse parágrafo neste momento impede que qualquer tentativa de manter só a bula digital aconteça. Então, suprimir o parágrafo significa deixar a lei clara neste sentido: "É necessário manter as duas bulas". Ponto. Qualquer outra regulação posterior, futura, que nós possamos fazer, junto com o Congresso, com os Parlamentares que aqui estão, nós podemos avaliar lá na frente. Hoje nós não devemos debater isso sob a ótica de um segmento da população, um segmento privilegiado que está no apartheid digital, do lado de cá de quem tem acesso. O privilégio não pode ser a sustentação de um argumento dessa natureza.
Por fim, quero falar da necessidade de não estimularmos, de não fortalecermos e de não ampliarmos a visão de medicamentos como mercadorias. Botam acesso em supermercados, botam acesso em qualquer lugar, sem orientação. Isso, de fato, não é produto de consumo normal, isso é medicamento. Mesmo a Aspirina e o Dorflex — e ele estava me dizendo agora que o Dorflex é o remédio mais vendido no Brasil — têm efeito colateral, a depender da dose. A Aspirina, se tomada em excesso, pode causar hemorragia digestiva. Tudo o que nós fazemos sem orientação, sem informação e sem o cuidado com o paciente, pensando em saúde, pode ter um efeito colateral dramático. Os Medicamentos Isentos de Prescrição — MIPs parecem muito tranquilos, muito simples, mas não são. Dependendo da dose, do uso que se faz deles e da sensibilidade de cada paciente, eles podem causar efeito colateral grave. A automedicação sem informação e sem orientação é um problema grave no Brasil. Uma das maiores razões de internação hoje é a automedicação, são os efeitos colaterais dela. Esse é um fator importante de internação hospitalar. A falta de dinheiro também é um fator importante de internação, porque a pessoa não consegue sequer acessar o remédio onde não há Farmácia Popular, onde não há SUS fornecendo o medicamento.
São os dois lados do processo que nos indicam a necessidade de manter uma informação precisa, ampla, universal, para todas as pessoas, independentemente do seu letramento, independentemente da sua classe social.
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Então, nós puxamos esta audiência pública para este debate porque achamos importante que a Casa avalie essa lei que nós apresentamos. A lei é simples, suprime apenas o parágrafo que dá autoridade à agência de fazer o que quiser ou de regular diferentemente do que a lei determina, para que possamos manter as duas bulas. Lá na frente, quem sabe chegue um momento no Brasil em que todos tenham acesso, universal, e saibam manejar? Porque os idosos analógicos não sabem manejar um computador, um celular ou um equipamento que se ligue à Internet. Mesmo que tenham a tecnologia, eles não sabem usar. Então, nós precisamos, neste momento, universalizar o direito e, lá na frente, a depender da evolução do Brasil, rediscutir esse processo.
Neste momento, nós não podemos abrir mão de uma informação impressa para a grande maioria da população. Esta é a minha opinião. Agradeço aos convidados.
Deputada Alice Portugal, V.Exa. pode chamar o próximo orador, por favor?
A SRA. ALICE PORTUGAL (Bloco/PCdoB - BA) - Muito bem, Deputada Jandira Feghali.
Deputado Dr. Luiz Ovando, V.Exa. vai falar pelo tempo de Líder. Somado ao tempo previsto na Comissão, V.Exa. terá 13 minutos.
O SR. DR. LUIZ OVANDO (Bloco/PP - MS) - Muito obrigado.
Não vou falar por todo esse tempo, Deputada Jandira. Muito obrigado.
A SRA. PRESIDENTE (Jandira Feghali. Bloco/PCdoB - RJ) - Pode falar.
A SRA. ALICE PORTUGAL (Bloco/PCdoB - BA) - É um prazer ouvi-lo.
O SR. DR. LUIZ OVANDO (Bloco/PP - MS) - Deputada Jandira Feghali e Deputada Alice Portugal, é uma satisfação participar desta audiência. Na pessoa de V.Exas., cumprimento toda a Mesa, que expôs de forma magistral, brilhante, os seus posicionamentos. É fundamental que nós tenhamos posicionamento.
Eu quero parabenizar a Deputada Jandira pela colocação. Eu acho que realmente nós não temos que dar essa força, através dessa lei. Ela precisa (falha na gravação) simplesmente legislando em lugar daquilo que já foi estabelecido, diante de uma condição técnica sobre a qual ainda não se tem determinado realmente o comportamento, as ações relacionadas à presença dos dados necessários à informação. Eu concordo plenamente.
O meu posicionamento é simples. Nós temos que ter direito à informação, como disse o Alexandre. Isso resume tudo. Esse direito à informação tem que vir de acordo com a habilidade das pessoas. Se nós buscarmos aqueles que não conhecem, que não são letrados, que não tiveram o privilégio de ser alfabetizados, veremos que o nosso País tem algo em torno de 11 milhões deles, e metade desse pessoal tem mais de 60 anos. O Alexandre falou: "Agora vai ser Dia das Mães. E as avós? Vamos ver se elas sabem lidar com a coisa". Eu tenho mais de 60 anos e sei mais ou menos — viu, Alexandre? (Risos.)
Quando eu tenho um problema, eu chamo a minha neta de 14 anos e falo: "Ajude-me aqui". Ela fala: "Mas vô! Está difícil aí, vô?" "Está difícil. Ajude-me aqui". Então ela vem e resolve o problema, coisa simples.
Eu quero citar uma experiência, Deputada Jandira, como médico. Eu continuo trabalhando no consultório.
Nós ouvimos aqui o posicionamento do Henrique, que respeito, sobre a questão da medicação, de que reduziu a mortalidade — porque são dados — em 16%, conforme ele colocou. Mas o que verdadeiramente reduz bem a mortalidade são os dados que levantamos com a Atenção Primária. Lá na Conferência de Alma-Ata, em 1978, há mais de 40 anos, ficou estabelecido que se deve priorizar o aleitamento materno, a hidratação oral, a vacinação, os cuidados básicos, o saneamento, principalmente. Isso realmente faz a diferença.
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Por que eu estou dizendo isso? Porque no consultório nós temos muitos medicamentos disponíveis. Com relação aos medicamentos, como foi colocado aqui pelo Lucena — e eu vejo isso todos os dias, Lucena, no consultório —, eu faço questão de explicar para o paciente desta forma: "Olha, é para tomar às 8 horas e às 20 horas, às 8 horas da manhã e às 20 horas, que são 8 horas da noite". O grande sucesso do tratamento está exatamente nesse tempo que gastamos, e isso, infelizmente, não temos visto nos dispensários, nos postos de saúde, nos CRS — Centros Regionais de Saúde, nas UPA — Unidades de Pronto Atendimento. Muitas vezes, nos postos de saúde, mal o atendente levanta a cabeça, mal fala. Ele simplesmente resmunga. A pessoa já tem certa dificuldade, já tem limitação auditiva, já é idosa, é frágil em vários aspectos e acaba sendo orientada, não pelo farmacêutico, mas pelo técnico, outra coisa que a Deputada Alice levantou. A pessoa é orientada por um balconista, que, muitas vezes, quer vender o remédio.
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. DR. LUIZ OVANDO (Bloco/PP - MS) - Exatamente.
Ainda ontem atendi uma senhora de 92 anos, à tarde, portadora da Doença de Parkinson. Nós pedimos a ela que fizesse uma colonoscopia, porque ela tinha teste de sangue oculto positivo. Ela estava muito ansiosa. Eu falei: "Temos que ver. A senhora tem 92 anos e tal". Felizmente, ela não tinha nenhuma neoplasia. Ela tinha simplesmente gastrite enantematosa e alguns divertículos no cólon, que provavelmente eram os responsáveis exatamente por esse sangramento, por esse sangue oculto presente nas fezes. O neto estava junto, um senhor já — se ela está com 92 anos, ele provavelmente tem 40 anos —, e falou assim: "Doutor, eu não consigo tirar as bulas dela. Ela lê todas as bulas". (Risos.)
Então, são situações específicas. Nem todo mundo lê bulas. Uma pessoa que tem condição de ler rápido e visão boa, que é rapidinha inclusive na leitura, não gosta de ler. Eu não leio bula. Há pessoas outras que têm bastante instrução, e não leem bula.
O que é importante aqui, como muito bem se colocou, para sintetizar, é que eu sou favorável, Deputada Jandira. Nós temos que manter a bula impressa e a eletrônica, a digital. Esse é o meu posicionamento. Contem comigo, vamos em frente. Vamos levar isso, para manter, por um período de teste, um plano-piloto, como foi colocado aqui, de 2 anos. Mas eu acho que talvez em 5 anos consigamos ter uma verdadeira transformação, uma modificação.
Muito obrigado.
A SRA. PRESIDENTE (Jandira Feghali. Bloco/PCdoB - RJ) - Obrigada, Deputado Dr. Luiz Ovando. Até me chama a atenção essa questão da complicação da bula. De fato, a bula tem que ser mais simples e ter letras maiores, porque nem todo mundo consegue ler, mas isso não coloca a inexistência dela e, sim, a melhoria dela. Então, há argumentos importantes na sua intervenção.
Chamo agora o Deputado Rafael Simoes, do União de Minas Gerais, que tem 3 minutos para fazer sua intervenção.
O SR. RAFAEL SIMOES (Bloco/UNIÃO - MG) - Bom dia a todos os presentes.
Cumprimento as Deputadas Jandira Feghali e Alice Portugal e todos os Deputados que acompanham esta audiência, este debate importante.
Eu quero dizer que me causa extremo incômodo ver que, de uma lei que acabou de ser aprovada e sancionada, de um dispositivo legal, estamos discutindo a revogação. Nós não demos oportunidade para que ela fosse aplicada, nós já estamos dizendo "não" a ela.
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A informação da Deputada Jandira Feghali foi importante. Na oportunidade em que a lei foi votada nesta Casa, houve um destaque, e o Plenário disse "não" a esse destaque. Nós estamos tentando ressuscitar isso aqui.
Incomoda-me isso, que o povo brasileiro pague para que venhamos aqui discutir, debater, votar leis e depois não damos nenhuma oportunidade para que essa lei seja aplicada.
Eu vi que há uma proposta — e, se eu estiver errado, gostaria de ser corrigido — segundo a qual a ANVISA estabelece fases de aplicação da norma. A primeira fase é esta: "Abrangerá, unicamente, amostras grátis e os medicamentos destinados exclusivamente ao uso em ambiente hospitalar, clínicas, ambulatórios e serviços de atenção domiciliar, exceto farmácias e drogarias". Essa é a primeira fase. Quer dizer, nós estamos dando uma oportunidade para a lei ser aplicada, nós estamos.
Eu sou diabético, Dra. Jandira, e meu medicamento é de uso contínuo. Ele inclusive está aqui — é o Jardiance. Isso foi o médico que me recomendou. Todas as caixas dele têm bula. Todos os meses eu compro uma caixa. Todos os meses eu jogo a bula fora. Eu compro insulina. Ela vem com uma bula imensa. Eu abro a caixinha e a bula eu jogo fora. Quer dizer, pode ser que eu seja um ignorante, mas acredito que a grande maioria faça isso.
Eu vejo que esta discussão é importante. Escutei atentamente cada uma das pessoas que aqui se manifestaram. Vejo que há o interesse de ambos os lados, da indústria gráfica e da indústria farmacêutica, mas acho que as coisas sempre precisam evoluir, e precisamos dar chance para que isso aconteça. Eu não sei se este é o momento de já falarmos em revogação do dispositivo. Se nós percebermos que a coisa não está caminhando, Deputada Jandira Feghali, aí sim, só haverá um parceiro para lutar por isso. Eu acho que primeiro nós temos que dar oportunidade para que as coisas se mostrem da forma como elas vão acontecer.
Eu estive conversando com o meu professor, o Deputado Dr. Luiz Ovando, e ele falou: "Eu sou radicalmente contra". Ele é um professor para mim. Eu acho que nós temos que permitir que a ANVISA atue e que temos que fazer uma segunda avaliação, senão nós vamos ter o terceiro turno da discussão da mesma legislação. No País existem mais de 5 milhões de leis. Nós fazemos lei todos os dias, todos os dias e, no outro dia, nós falamos: "Essa lei nós não queremos mais, essa nós não vamos aplicar mais". Isso me incomoda profundamente. Eu que venho do Poder Executivo, que fui Prefeito, sei das dificuldades dos Municípios, sei como é difícil fazer a Atenção Primária à Saúde — o Jackson falou sobre isso. Saúde nós fazemos na Atenção Primária à Saúde — e temos que fazer saúde lá —, porque dentro de hospital nós só cuidamos de doença.
Eu gostaria que avaliássemos com mais cautela essa proposta de revogar um dispositivo que foi aprovado nesta Casa, mesmo com destaque, e que tivéssemos mais para a frente uma solução razoável.
Muito obrigado.
A SRA. ALICE PORTUGAL (Bloco/PCdoB - BA) - Tem a palavra o Deputado Reimont.
O SR. REIMONT (Bloco/PT - RJ) - Deputada Alice Portugal e Deputada Jandira Feghali, duas companheiras queridas e comprometidas radicalmente com aquilo que beneficia a luta do povo brasileiro e, neste caso específico, com a questão da saúde, quero cumprimentá-las. Cumprimentando-as, cumprimento todos os integrantes da Mesa, os Parlamentares e as pessoas que nos acompanham aqui no plenário ou de outros espaços.
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Eu sou membro da Comissão de Defesa dos Direitos da Pessoa Idosa. Este é um tema de que nós vamos tratar também lá na Comissão da Pessoa Idosa, um tema que de fato nos é muito caro.
Há uma frase que diz: "Nós precisamos fazer isso sem deixar de fazer aquilo". É claro que nós precisamos entender os avanços da tecnologia, é claro que nós devemos entender os avanços da digitalização dos processos, mas nós também precisamos compreender que não podemos tirar o direito à informação de um brasileiro sequer. Esse é o custo que nós temos por haver no Brasil analfabetismo, não o analfabetismo que o Jackson citou aqui, das pessoas em situação de rua, mas o analfabetismo funcional, que de certa forma perpassa todos os estratos da sociedade.
Eu sou professor e sou bancário. Uma das lutas que nós temos na rede bancária é, por exemplo, a da automatização. Nós achamos que todo mundo consegue acessar os caixas eletrônicos e que está tudo certo, quando, na verdade, nós vemos que há pessoas que têm dificuldade em relação a isso, e não são só pessoas dos estratos econômicos e sociais menos favorecidos, são pessoas de todos os estratos. Então, há sempre uma luta do capital, da questão econômica: "Olha, eu vou diminuir postos de trabalho aqui e vou aumentar o atendimento virtual, o atendimento digital".
Quando nós trazemos para a dimensão das bulas, devemos compreender que não só um homem em situação de rua ou uma mulher em situação de rua, conforme citada aqui pelo Jackson, faz confusão com a orientação de 8 em 8 horas e toma o medicamento às 8 manhã e às 8 da noite — é uma confusão, porque nós estamos falando de 12 em 12 horas —, mas também muita gente que faz confusão com isso também. Nós temos que cuidar para que essas questões sejam de certa forma resolvidas.
A continuidade da exigência de bulas impressas é importante, é necessária, para não negarmos direito a quem quer que seja. Eu comentava — e comento sempre isto — que, quando um médico me receita algum medicamento, às vezes eu fico apavorado e não leio a bula. Eu penso assim: "Vou ler essa bula e vou ver os efeitos colaterais. Vou parar com isso, não vou ler isso, vou tomar uma coisa errada". Mas a ignorância é minha. Percebe? A ignorância é minha. Isso não está só comigo. É um direito que nós precisamos rever.
Nós vamos fazer este debate também na Comissão da Pessoa Idosa — acho importante. Eu fui procurado pelo Alexandre, lá no nosso gabinete — ele estava acompanhado por uma senhora. Depois disso, comecei a conversar com muita gente sobre o tema.
Acho que nós estamos fazendo aqui um debate muito importante. O contraditório é bom ouvir, não tenham dúvida — e estamos ouvindo —, mas o que eu tenho de entendimento é que, se nós de fato partimos exclusivamente para o virtual, nós negamos direitos. E nós não podemos negar direitos a quem quer que seja. Muito obrigado.
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A SRA. ALICE PORTUGAL (Bloco/PCdoB - BA) - Deputado Reimont, obrigada.
Tem a palavra a Deputada Rosangela Moro. (Pausa.)
A Deputada precisou sair.
Tem a palavra a Deputada Gisela Simona.
A SRA. GISELA SIMONA (Bloco/UNIÃO - MT) - Bom dia a todos os presentes, a nossas colegas Parlamentares.
Primeiro quero parabenizar as Deputadas Jandira Feghali e Alice Portugal pela iniciativa desta audiência pública. Eu participo desta audiência principalmente porque o que me traz a este Parlamento é exatamente minha luta pela defesa dos consumidores.
Eu sou concursada do PROCON do Estado de Mato Grosso, licenciada para o mandato, e quem está ali no balcão sabe exatamente das angústias do consumidor brasileiro e principalmente que a grande demanda que chega ao PROCON é por vício na informação.
Então, hoje a informação é um direito básico do consumidor. Isso está estabelecido no Código de Proteção e Defesa do Consumidor e é algo de que nós não abrimos mão de forma alguma, é um direito inegociável. É exatamente dali que nós conseguimos aferir o que se tem ou não de razão em uma relação de consumo.
Quando nós falamos da área de saúde, essa situação é ainda mais crítica. Vejam que a lei, em um primeiro momento, é muito positiva. Deputada Jandira, é preciso ver que, em um primeiro momento, a lei veio dando as duas opções.
Houve uma comemoração do consumidor no sentido de haver um ganho. Vejam: além da bula impressa, nós teremos a bula digital. Inclusive há a situação dos analfabetos. Poder transformar a informação em áudio resolveria um problema de acesso gravíssimo no Brasil. E isso antecede toda e qualquer discussão só de relação de consumo.
Então, realmente, nós não podemos retroceder.
Quero dizer aqui, primeiro, que sinto falta da ANVISA nesta audiência pública. Vejam que foi dado um poder a ela nessa legislação da regulamentação, e acredito, sim, que ela jamais poderá extrapolar os limites da lei. Em que contexto? Primeiro, o Código de Defesa do Consumidor tem que ser analisado em conjunto com essa lei, para que ela seja aplicada. Por isso, a inconsistência ou a incongruência, como já foi apontada aqui, desse artigo específico, que precisa ter uma correção do Parlamento. Se não houver revogação, que se estabeleçam parâmetros disso.
Quando nós abordamos as questões de que poderia haver um único tipo de bula para hospitais ou, por exemplo, nessa questão que foi posta de amostra grátis, minha dúvida é se o controle disso não fica mais caro do que manter a bula em todos os lugares. Se a defesa da retirada é por custo, eventualmente, pode-se fazer o controle do que vai chegar à mão do consumidor, do que vai para o hospital, do que realmente é amostra grátis e vai chegar a um balcão de comercialização.
Então, eu gostaria muito de ouvir os que defendem especificamente a bula digital. Dentro do peso disso, não seria mais caro fazer esse controle? Para os órgãos de defesa do consumidor, por exemplo, o PROCON, se chegar sem informação, é multa e pronto. Esse é um direito básico do consumidor, inalienável, do qual nós jamais abriremos mão.
E algo que nos preocupa sempre — eu não digo sobre a ANVISA — é que sabemos que muitas agências reguladoras são cooptadas por fornecedores. Na verdade, a ANVISA é uma das que nós entendemos ser das mais sérias do nosso País no que se refere a esse trato com o consumidor. Eu, particularmente, confio muito na ANVISA. Nos projetos de lei que tento apresentar nesta Casa, sempre coloco, sim, a parte técnica para a ANVISA poder decidir, mas, de novo, não sabemos qual é a pressão que se sofre dentro desse contexto empresarial.
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Então, eu venho manifestar meu apoio no sentido de manter as duas bulas, a digital e a física, a impressa, para o consumidor, porque essa é a realidade do povo brasileiro hoje e é o que está vigente no ordenamento jurídico.
Era isso.
A SRA. PRESIDENTE (Jandira Feghali. Bloco/PCdoB - RJ) - Obrigada, Deputada Gisela Simona.
Tem a palavra o Deputado Isnaldo Bulhões Jr., Líder do MDB.
V.Exa. quer usar o tempo de Líder, Deputado, ou apenas os 3 minutos?
O SR. ISNALDO BULHÕES JR. (Bloco/MDB - AL) - Minha querida Presidente, vou tentar economizar, mas peço para agregar o tempo de Líder pelo simples fato de eu ter sido o Relator dessa matéria e ter travado, de forma ampla, no que diz respeito à fidelidade e à amplitude, um debate com todos os setores, tanto internos, aqui da Câmara dos Deputados, como também externos.
Volta e meia, coincidentemente, cai para mim uma relatoria que trata de questões lincadas ao ramo de farmácias e à indústria farmacêutica. E eu sempre tenho que fazer um enfrentamento com a Deputada Alice Portugal e buscar um acordo. Quando não faço o acordo, a Deputada Alice sempre ganha de mim, até porque entende disso muito mais do que eu. (Risos.)
Desta vez, nós fizemos um acordo.
Inicialmente, eu e minha assessoria escrevemos um bocado de perguntas para os atores da audiência pública, mas vou procurar até dispensá-las, porque, pelo que ouvi meus colegas Parlamentares colocarem, é muito mais um caminho opinativo do que o de fazer perguntas, indagando aos partícipes.
Mas o que eu estou notando neste debate, primeiro, é um grande movimento pela desinformação. Este Congresso Nacional não discutiu o fim da bula em nenhum momento, muito menos o impedimento do acesso a ela. Muito pelo contrário, nós a aperfeiçoamos, passamos a adotar um caráter digital para ampliar a informação, defendendo, sem dúvida nenhuma, a inclusão para cegos, para analfabetos, enfim, para aqueles que têm limites para a leitura de uma bula. E não dá para discutirmos, em âmbito de ignorância, quem lê e quem não lê bula, o interesse por ler ou não a bula.
Então, na busca de um texto para encontrar o melhor relatório, aquele possível de ser aprovado, nós resolvemos buscar o que está sendo discutido aqui nesta audiência pública, que é o § 5º. Buscamos a autoridade sanitária, de excelência mundial, que dá exemplo a todo o mundo, não apenas ao Brasil, e que baseia a opinião de todos os Parlamentares do Congresso Nacional em qualquer matéria que venha a envolver suas competências. Então, incluímos a competência, porque realmente é indiscutível o valor da ANVISA.
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Num dado momento, eu estava relatando a matéria, essa em que eu sofri duas ou três derrotas — a Deputada Alice estava do outro lado do balcão —, sobre a venda de medicamentos isentos de prescrição em supermercados, com todo o critério. Eu terminei de ser vencido nos meus argumentos, quando chegou ao plenário um relatório da ANVISA que foi amplamente divulgado. Essa é uma questão do Parlamento, é a democracia, é o sentimento daqueles que entregaram a nós a procuração para representá-los.
Então, não pode o Presidente ou o líder Alexandre, não sei, do Movimento Exija a Bula fazer um movimento de desinformação, principalmente quando nós vimos discutindo, exaustivamente, Presidente Jandira, a questão de fake news. É isso o que está acontecendo.
O que o legislador quis fazer, e houve sanção presidencial, não foi eliminar a bula, mas sim promover uma ação de sustentabilidade, para, dentro do limite possível, sem prejudicar o consumidor, que não consome o medicamento porque quer, e sim porque precisa, retirar essa questão do uso de papel. Nós lutamos tanto na busca da sustentabilidade, de energia renovável — votar o projeto do Programa MOVER nos próximos dias —, e agora ficamos com esse movimento arcaico?
Deputada Alice, é natural comprar um medicamento isento de prescrição médica exposto na gôndola sem a bula. Quando está na caixa, tem que ter a bula.
Esses debates sempre foram muito acalorados, durante toda a história. Quando foi travado o debate para retirar alguns medicamentos do balcão para colocar na prateleira, nós passamos por tudo isso. Eu não estava aqui, lógico, porque isso faz muito tempo, mas eu conheço a história. Nós passamos por todos esses debates, meus queridos Deputados e Deputadas.
Então, francamente, nós temos que deixar muito clara a intenção do legislador com essa lei. Todos foram ouvidos. É injusto dizer que no processo, no caminho da construção do parecer ao projeto de lei, feito, salvo engano, pelo Deputado e Ministro André Fufuca, nós não tratamos realmente da intenção do legislador.
A intenção do legislador foi acabar com a bula, foi excluir a bula, Dr. Luiz Gustavo Pires, representante do Conselho Federal de Farmácia? Jamais! Isso é indiscutível!
E agora volta aqui a discussão sobre a obrigatoriedade de termos uma e outra. Por que ter uma e outra? É preciso garantir que haja medicamento que terá uma só e haverá medicamento que terá as duas. Eu sou um defensor da bula impressa. Eu não entro na discussão, mas, modéstia à parte, eu leio a bula. Sim, eu leio! Eu gosto de ler a bula. Por outro lado, o querido colega que já saiu, eu acho, disse que toma o mesmo remédio todo mês, então joga fora a bula, porque é um medicamento de uso contínuo. Então, nós vamos retroagir diante de uma lei que tem apelo, que é correta, que é atual? Nós discutimos aqui se é justo termos a bula digital apenas, diante da pequena cobertura de Internet que nós temos no Brasil. Realmente, isso não é justo, não. Então, vamos arrumar uma alternativa para que haja a bula impressa.
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Eu não quero discutir quem defende isso e por quê. Eu não escuto fake news nem de um lado, nem do outro, nem quem tem interesse, se é A, B ou C, quem toca uma gráfica de bula ou quem não toca e que cobertura existe no Brasil. Esse não é o debate. O debate, eu tenho que dizer isso, sem nenhuma vaidade, é que foi um texto construído, bem discutido, bem conversado, com todos os setores. Eu escrevi o parecer com todo o cuidado que a responsabilidade exige.
Acho que todo debate é importante. Nós não podemos diminuir a importância de um debate e dizer que qualquer debate é inócuo. Esta é a Casa do Povo, lugar em que o povo tem direito a voz, por intermédio dos seus representantes, nas audiências ordinárias, ou com a participação da sociedade nas extraordinárias, e esta é uma delas. Ou seja, eu compreendo que o debate é saudável. Agora, nós temos que fazer o debate correto, justo, honesto, não a divulgação de que agora o Congresso Nacional, com a lei que foi aprovada, acabou com a bula. Não existe mais bula, não? Desde quando?
Para não ter que perguntar, eu quero desafiar qualquer dos presentes a mostrar onde a lei diz que não pode haver bula impressa. E quero desafiá-los também a dizerem qual a autoridade maior para definir isso do que a ANVISA. Será que nós somos essa autoridade? Somos nós Deputados que temos que escrever na lei quais são os medicamentos que devem ter e os que não devem ter bula? E nós temos que nos manter longe da sustentabilidade, longe da agenda atual, longe da tecnologia, longe da inclusão? É assim que nós temos que nos manter? Por quê? Não há proibição de bula impressa, meus queridos colegas! Isso está muito claro!
Revogar um dispositivo da lei para inserir a obrigatoriedade da existência da bula eu acho que é, acima de tudo, um grande desrespeito à ANVISA, que é a autoridade maior para definir isso. Não há ninguém que possa francamente saber o que realmente deve possuir bula digital e bula impressa ou só bula digital.
Eu mesmo não entendo. Se eu pego uma cartelinha de Dorflex na prateleira, compro e levo para casa, ela não vai com a bula. Se eu comprar uma caixinha de Dorflex, ela virá com a bula. Aquilo não deveria mais nem vir na caixa, na verdade. Deveria ter o preço justo mesmo, e não ter nem caixa, porque caixa também é um problema. Se o medicamento já está sem caixa, vendam sem a caixa mesmo. Ele não precisa de caixa, porque não precisa guardar a bula dentro. Essa é a minha opinião.
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Eu, por óbvio, tenho que defender o meu relatório, que foi aprovado pela Câmara dos Deputados, confirmado pelo Senado Federal, sancionado pelo Presidente da República. Nessa linha, eu compreendo que retomar este debate é legítimo — este ou qualquer outro debate —, mas continuarei na mesma toada, na mesma concepção, no mesmo entendimento do intuito do legislador sobre o projeto de lei que o Deputado André Fufuca apresentou e que, com o aperfeiçoamento trazido com a discussão, com o debate, aproveitando-se as opiniões positivas e sábias daqueles que entendem mais do assunto, como a Deputada Alice, finalmente foi aprovado.
Aqui nós tocamos de ouvido. De medicamento eu não entendo nada. Agora, quando nos chega um projeto de lei para relatar, temos que estudar o tema. Sobre recuperação judicial eu também não entendia não. Quando eu tive que relatar um projeto sobre o tema, eu o estudei, aprendi, ouvi quem entende mais e busquei fazer um relatório possível de ser aprovado.
Eu quero deixar este registro e espero que nós não nos adiantemos para que não chegarmos ao plenário da Câmara dos Deputados com esse retrocesso quanto a uma lei moderna.
Muito obrigado, Presidente. Muito obrigado, querida Deputada Alice.
A SRA. PRESIDENTE (Jandira Feghali. Bloco/PCdoB - RJ) - Obrigada, Deputado Isnaldo, Líder do MDB, querido colega.
Quero registrar, Deputado Isnaldo, que aqui não há nenhum desrespeito ao seu relatório. Há o debate de um parágrafo, reconhecendo-se o trabalho, o esforço feito. A lei é muito mais ampla do que esse parágrafo. A lei, de fato, trata das duas bulas. Ninguém, em nenhum momento, disse que a lei não permite as duas, ao contrário. O que se discute aqui é como que nós estabelecemos parâmetros...
O SR. ISNALDO BULHÕES JR. (Bloco/MDB - AL) - Presidente, desculpe-me interrompê-la, mas ninguém aqui disse isso, nem nenhum Parlamentar que votou a favor do parecer, mas a desinformação roda nas redes sociais, sim.
A SRA. PRESIDENTE (Jandira Feghali. Bloco/PCdoB - RJ) - Infelizmente, a tecnologia é para o bem e para o mal.
Eu apenas quero dizer que está em debate aqui se a ANVISA, com sua competência reconhecida, com sua competência absolutamente valorizada, não só por nós, mas também pelo mundo todo, como V.Exa. disse, pode ter o direito de contrapor a legislação que estabelece as duas bulas, sem que haja um parâmetro legal para isso, porque a agência regula o que a lei diz. Ela não pode regular acima da lei. Então, o que nós estamos discutindo aqui é isso.
Nada impede que a Relatora desta nossa proposta estabeleça já uma excecionalidade de regulamentação pela ANVISA, quando a medicação é dada em serviço de saúde, como um hospital. Esse é o problema colocado aqui. Isso pode estar escrito. A ANVISA pode regular ou regulamentar a excepcionalidade da não existência da bula, no caso de o medicamento ser ministrado dentro de serviço de saúde. Isso pode estar escrito na lei. O que não pode é dar à ANVISA o direito de ela simplesmente dizer o seguinte: "A bula vai ser digital para todos os remédios".
(Intervenção fora do microfone.)
A SRA. PRESIDENTE (Jandira Feghali. Bloco/PCdoB - RJ) - Mas isso pode acontecer. Pelo que está escrito no parágrafo, isso pode acontecer, porque nós demos a ela o direito de definir onde pode haver uma única forma de informação.
(Intervenção fora do microfone.)
A SRA. PRESIDENTE (Jandira Feghali. Bloco/PCdoB - RJ) - Não, eu sei! Hoje, a ANVISA é uma, amanhã pode ser outra, Deputado Isnaldo.
(Intervenção fora do microfone.)
A SRA. PRESIDENTE (Jandira Feghali. Bloco/PCdoB - RJ) - Isso nós não sabemos. Essa lei foi feita em 2022, e o debate evolui. Hoje, nós temos inteligência artificial, temos uma série de tecnologias que surgiram, e nós precisamos ter cuidado com isso.
O que se está discutindo aqui é o direito amplo e universal à informação com as duas formas de apresentação da bula. Essa é a discussão. Ninguém aqui está retirando a competência nem faltando com o respeito à ANVISA. O fato é que a lei é a lei. O Congresso aprova uma lei, mas em algum momento, pela evolução do tempo, pela evolução da tecnologia e pela desigualdade que existe no Brasil, ela tem que ter o seu conteúdo reavaliado.
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Nós destacamos esta parte no plenário. Esta polêmica não é nova, é antiga. Nós fizemos o destaque desta parte lá no plenário. Não é novidade o que nós estamos propondo como debate neste momento.
A última inscrita é a Deputada Alice Portugal. Depois, nós vamos voltar à Mesa, para as respostas e os comentários finais de vocês, por um tempo menor, obviamente.
Tem a palavra a Deputada Alice Portugal.
A SRA. ALICE PORTUGAL (Bloco/PCdoB - BA) - Bom, depois desta ampla rodada de debates, eu quero, mais uma vez, saudar todos.
Eu falo aqui também na condição de autora de um projeto de lei que exclui, que retira o § 5º do art. 3º. (Pausa.)
Não vai me ouvir, Deputado Isnaldo? (Risos.)
(Intervenção fora do microfone.)
A SRA. ALICE PORTUGAL (Bloco/PCdoB - BA) - Fique à vontade.
De fato, este parágrafo foi fruto de destaque no plenário da Casa. A votação se deu em regime de urgência. Nós não tínhamos condições efetivas de emendamento. A lei não me parecia algo urgente, e isso foi literalmente levantado no debate. Tanto é que a realidade demonstra que o assunto volta à baila, inclusive no âmbito da ANVISA, que realiza uma consulta pública sobre a matéria.
A matéria é sobre direito à informação. A matéria e a discussão que se dá renovam o debate sobre a possibilidade de a ANVISA escolher uma alternativa de formato de bula, de discricionariamente definir que este ou aquele medicamento não precisará da bula impressa. Efetivamente, esta discussão é sobre a proteção do paciente. E digo mais: é também sobre a proteção da indústria e sobre a proteção do prescritor, porque a bula, que vem de priscas eras, é um documento legal, sanitário.
A bula é um documento legal, sanitário, que traz orientações sobre o uso, a posologia, a natureza essencial daquele produto, daquele medicamento, escrita do ponto de vista solene mesmo: "Este medicamento aqui é isto". E o que está grafado não tem como ser modificado. E esse é um grande problema que está posto em relação à digitalização das bulas. O QR Code pode seguir na caixa, mas a ausência da bula impressa significa risco a quem produz, a quem prescreve e a quem efetivamente usa o medicamento.
A bula, que vem do latim bulla, era uma marca de cera em documentos que atestava a sua autenticidade e que a indústria de medicamentos — ou a botica — passou a utilizar originalmente para diferenciar seus produtos das garrafadas, meus senhores, para diferenciá-los do charlatanismo, para diferenciá-los daquilo que era feito de maneira anticientífica, empírica. E isso está posto.
Eu não vejo segurança em optar-se apenas por um meio de apresentação da bula. Renegar o desenvolvimento científico-tecnológico e não ter o acesso digital seria algo absolutamente absurdo, mas vamos abrir mão daquilo que autentica, mesmo para uso de medicamento contínuo, a patente de um medicamento — e hoje genérico é patenteado, efetivamente — que está posto à disposição?
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Nós tivemos aqui um insucesso no caso da vacina, porque conseguimos aprovar a licença compulsória, e ela foi vetada por um Presidente da República que adiou de maneira bastante larga o uso da vacina no Brasil, a ponto de perdermos 700 mil vidas para o vírus da COVID-19. Até os laboratórios de produtos veterinários se colocaram à disposição para adaptar a produção e produzir vacina humana. Isso não pode ser esquecido. Isso não pode ser esquecido!
Efetivamente, a bula é um documento solene, oficial, autenticador daquele medicamento. Isso não é burocracia. Nós estamos vendo na Internet em todo lugar algo assim: "Assistam ao meu vídeo sobre este medicamento que vai secar a sua barriga". Se você vai até o fim de um vídeo desses, vê que se trata da venda de um medicamento, muitas vezes, não autenticado pela ANVISA, não testado cientificamente. Aonde nós vamos parar?
O Deputado Isnaldo a certa altura disse: "Os debates foram acalorados", ou "Fui derrotado", ou "Fui vencedor", mas não é essa a questão. Trata-se exatamente da natureza dessas matérias, que são delicadas, finas, relacionadas com a vida, relacionadas com a possibilidade de uma intoxicação.
É atestado pelo próprio Conselho Federal de Farmácia em pesquisas que 80% das intoxicações brasileiras são acontecimentos derivados do uso indevido de drogas lícitas. Se não se garante que exista a observação acerca da natureza daquele princípio ativo, num documento oficial do laboratório, põe-se em risco o usuário daquela substância.
Eu, portanto, acho que devem coexistir essas duas formas de apresentação da bula. Quando esse dispositivo entrou na lei, porque o destaque não foi aprovado, efetivamente ele ficou em suspenso do ponto de vista opinativo, e a realidade tem demonstrado essa dúvida. É exatamente por isso que existem projetos — e são vários; há quatro projetos sobre isso tramitando — para retirar esse parágrafo do art. 3º. E isso não me parece abusivo ou repetitivo, porque ainda há dúvida sobre a segurança na utilização de medicamentos sem a bula, sem o documento oficial, sem o registro solene da sua autenticidade.
É importante também dizer que, no Brasil, as bulas custam 6 centavos, em média, e elas já são feitas em papel de madeira de reflorestamento, com certificação, ou de manejo responsável. Isso é o que a própria ANVISA informa. Então, não me parece que isso altere o valor do medicamento na praça.
Este ano, o reajuste no preço dos medicamentos que se deu no mês de março foi de 4,5%, o menor reajuste dos últimos 20 anos; em 2023, 5,6%; em 2022, ano da aprovação da lei, 10,89%. Repito: este ano, o reajuste foi de 4,5%, índice que é um teto, negociado com a indústria farmacêutica do Brasil, inclusive com a circunstância de o Governo Federal ter aumentado o acesso a medicamentos — o que ainda é baixo no Brasil devido à pobreza, à exclusão —, com o retorno da política pública do Farmácia Popular ou mesmo com o convênio com as redes de farmácias privadas e farmácias individualizadas com o Aqui tem Farmácia Popular.
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Então, não podemos dizer que a existência da bula aumenta o preço do medicamento, porque este ano houve o menor aumento dos últimos 20 anos, com a existência da bula impressa no formato que está sendo praticado no Brasil.
É necessário tratar, realmente, dessa questão da exclusão digital, pois 39 milhões de brasileiros não têm acesso à Internet. Além disso, há 22 milhões de idosos no Brasil com grande dificuldade de acesso à tecnologia, tanto pela instabilidade das redes Brasil afora, um Brasil continental, gigantesco, quanto pela falta de habilidade para o uso dessas ferramentas. A existência de um papel escrito dá a eles a oportunidade de pedirem a alguém que leia o que há naquele papel, como se pede que se leia o letreiro de um transporte público.
Portanto, eu penso que a coexistência dos formatos de apresentação da bula é moderna, é necessária. A manutenção da bula impressa é um objeto de segurança industrial, de segurança medicamentosa, de segurança aos profissionais prescritor e dispensador do medicamento e, acima de tudo, do paciente.
Parece-me que esta é uma questão que não se remete a preço, mas, sim, a uma redução do direito à informação. Nós estamos vivenciando um momento de debate nessa direção que, infelizmente, foi obstaculizado nos últimos dias. Mas esse debate terá que retornar necessariamente, inclusive para tratar sobre a propaganda, nas redes sociais, de medicamentos não certificados, não cientificamente testados, o que tem levado a prejuízos à saúde em nosso País.
Eu finalizo dizendo que tenho concordância com a posição das entidades farmacêuticas e tenho concordância com a posição que o Deputado Dr. Luiz Ovando, como médico experiente, trouxe a esta Casa. Este não é um problema político-partidário, assim como não o é a discussão sobre venda de medicamentos isentos de prescrição — MIPs em supermercados, porque, se você toma, ininterruptamente, por 6 meses, um diclofenaco de potássio, você será um possível candidato a um transplante de rim no futuro. Então, os MIPs não são inofensivos. O fato de eles serem isentos de prescrição não significa que o seu uso possa ser realizado de maneira autônoma, sem que o profissional médico tenha orientado o paciente ou um farmacêutico dispensado a forma, o tempo e o risco do uso.
Medicamento não é mercadoria, e o seu lugar é na farmácia de dispensação, quer seja no hospital, quer seja na farmácia privada, que é um estabelecimento de saúde — no Brasil, a farmácia assim é regulada —, para que ele possa ter uso certo.
Evidentemente, temos que coibir as farmácias de venderem de mercadorias cuja venda é própria dos supermercados. É um abuso que algumas farmácias ainda pratiquem essa venda no Brasil, sem a anuência dos conselhos de fiscalização. Isso é um absurdo! Farmácia não é lugar para vender sandália, não é lugar para vender bebidas, nem alimentos. Farmácia é lugar para vender medicamentos, dispensar medicamentos, com orientação do farmacêutico. E supermercado não é lugar para vender medicamentos, se a presença do farmacêutico, sem orientação efetiva. Então, cada um no seu quadrado. Como diz Gilberto Gil: "Cada macaco no seu galho".
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Acredito que isso garante biossegurança e garante segurança ao paciente. A minha opinião é muito clara sobre isso. Dá para coexistirem os dois tipos de bula.
E a ANVISA ficar, discricionariamente, dizendo o que poderá ter bula escrita e o que poderá não ter bula escrita é um caminho para a extinção da bula escrita. E isso gera insegurança jurídica, inclusive, para os laboratórios, para o profissional prescritor e para o farmacêutico que dispensa o medicamento e orienta o seu uso.
Muito obrigada. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Jandira Feghali. Bloco/PCdoB - RJ) - Obrigada, Deputada Alice Portugal. V.Exa., como farmacêutica, conhece com profundidade o tema. Agradeço a V.Exa. a contribuição.
Nós vamos voltar às falas dos convidados. Agora são 3 minutos para cada um, senão não terminamos esta audiência de hoje na hora, e há limite de tempo para o uso do plenário, porque haverá outra reunião aqui em seguida.
Eu quero apenas dizer que a ótica deste debate e a ótica dos nossos projetos não leva em conta interesses econômicos. Nós não estamos polarizadas por interesses econômicos de quem quer que seja. Aqui a nossa preocupação é o direito à informação universal da população brasileira.
Eu, ontem, dava uma aula e disse que há três grandes lobbies no Congresso Nacional. Um deles é o do agro, o outro é o dos meios de comunicação e o terceiro é o da indústria farmacêutica, principalmente a estrangeira. Isso é real.
Por exemplo, há mais de 20 projetos tramitando para alterar a lei de patentes, e nós não conseguimos evoluir com essa matéria. Há vários projetos aqui instituindo políticas nacionais para estímulo à indústria nacional, pública ou privada, e eles também não conseguem evoluir. Não é fácil essa disputa e esse debate dentro do Congresso Nacional.
Aqui, no caso, o que está em discussão, é apenas, na nossa ótica — minha, da Deputada Alice e, pelo que eu vi, do Deputado Dr. Luiz Ovando e da Deputada Gisela —, é a questão do direito à informação, o que o Deputado Isnaldo Bulhões Jr. também valoriza e respeita, mas com uma visão diferente em relação ao texto do projeto, o que nós respeitamos muito. E o debate democrático que ocorre na Casa é sobre se é possível se alterar uma lei aprovada em 2022 para que possamos dar uma resposta mais ampla às demandas que nos chegam aqui em relação aos medicamentos.
Eu vou voltar a dar a palavra na mesma sequência em que iniciamos a audiência.
Tem a palavra o Dr. Alexandre de Morais, do Movimento Exija a Bula, por 3 minutos, por favor.
O SR. ALEXANDRE ROHLF DE MORAIS - Muito obrigado, Deputada Jandira e demais Deputados.
O debate foi muito bom. Eu acho que a grande fake news é se dizer que esta lei recém-promulgada, a Lei nº 14.338, foi bem debatida com os setores da sociedade, porque ela não foi. Ela foi bem debatida com a indústria. Mas essas são águas passadas.
Eu queria também dizer ao meu colega Moraes — ele tem sobrenome Moraes; é que ele está omitindo na plaquinha —, que todo mundo que adquire produto ou serviço, seja pessoa física, seja pessoa jurídica, é um consumidor, porque remédio não é de graça, só na rede pública, no SUS, que merece todas as nossas homenagens. O SUS é o maior sistema de saúde do mundo, por isso ele merece homenagens. Mas também causa espanto ver pessoas saírem com cartelinha enrolada dos postos de saúde sem uma bula, porque aquilo vai parar numa gaveta, num armário da cozinha, se for amostra grátis. Se não for, daqui a alguns anos ninguém entende mais nada daquilo ali. Então, isso causa muito espanto em nós.
Mais uma coisa que eu queria destacar é que o § 5º do art. 3º da Lei 14.338 é claramente incompatível com o § 4º, e isso acontece sempre. Não se pode dizer que o Parlamento é infalível. Há assessores aí que são nossos professores. Eu sou advogado militante há mais de 20 anos, aprendo muito com as assessorias e aprendo lendo justificativas de projetos de lei. O que baseou este projeto, como as Deputadas muito bem disseram, foi uma questão de QR Code, onde se falou em preservar a floresta, um argumento totalmente desfocado da realidade.
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Estão aí as fontes do papel, onde ele é produzido, onde ele é criado. Já está mais do que provado que ninguém derrubou jatobá nenhum para fazer bula de remédio, nem vai derrubar. E o custo de uma bula é absolutamente irrelevante.
Quanto à tecnologia, ela é muito bem-vinda. Isto aqui não é um debate arcaico — eu não sei quem usou a palavra "arcaico" no meio da discussão. Não há nada de arcaico neste debate. Ninguém está defendendo que deve existir só a bula impressa. Devem existir as duas bulas. Elas têm que conviver, e a informação tem que chegar ao usuário.
O que causa espanto é achar que o Brasil inteiro tem acesso à Internet e desprezar 29 milhões de pessoas. Isso me espanta demais.
O Movimento Exija a Bula agradece por este espaço aos Deputados e às Deputadas e tem muita gratidão por poder ouvir a opinião das pessoas.
Nós continuaremos, nas redes sociais, chamando a atenção para o trabalho do Congresso, porque fora da política não há solução. Nós temos que resolver as coisas politicamente.
Obrigado. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Jandira Feghali. Bloco/PCdoB - RJ) - Obrigada, Alexandre de Morais.
Eu me preocupo com esse seu nome, viu? Você está no alvo! Cuidado! (Risos.) Cuidado quando andar na rua, viu, porque está sério o negócio.
Bom, vai falar em seguida, por 3 minutos, o Tiago Vicente, da Associação Brasileira das Indústrias de Medicamentos Genéricos e Biossimilares — PróGenéricos.
O SR. TIAGO DE MORAES VICENTE - Deputada, mais uma vez, obrigado.
Concordo com o colega debatedor Alexandre de Morais. Eu queria só trazer um ponto de esclarecimento em relação a essa questão do artigo.
Eu me permito colocar outro ângulo de análise do art. 5º da lei. A consulta pública, que por sinal é uma obrigação regulatória da ANVISA, determinada pela Lei das Agências, tem, no art. 22, o seguinte:
Art. 22. Para os medicamentos autorizados a suprimirem as bulas impressas da embalagem, deve haver garantias de que a bula física esteja disponível sempre que solicitada pelo estabelecimento de saúde, seja por meio de impressão ou do envio de bula avulsa.
Então, mesmo quando a ANVISA disser, por alguma razão, que tal medicamento prescinde de bula impressa, a pessoa tem direito a ter naquele local a bula impressa. Isso está na consulta pública. Isso é um fato. É por isso que dizemos que a bula não vai desaparecer. Ela existirá de uma forma ou de outra. Isso está claro no texto da consulta pública.
De toda forma, eu não acho que este seja um debate arcaico. Quem disse isso foi o Relator da matéria, o Deputado Isnaldo. Estamos falando que podemos olhar o copo meio cheio ou meio vazio. Eu vejo o copo meio cheio, porque estamos oferecendo mais oportunidades. Como é que se pode falar em redução de informação, se estamos colocando uma coisa a mais, e não retirando uma e colocando outra? Não estamos falando em substituição, e sim em adição. É em soma que estamos falando.
E a consulta pública da ANVISA é muito clara. Se a ANVISA disser que só pode a bula digital, ela tem que explicar para nós, população brasileira, por que só pode a forma digital. Aí vamos ter que entender por que ela disse isso. E, se ela disser que só pode a forma digital, ainda assim ela tem que manter a bula impressa no estabelecimento, seja na farmácia, seja no hospital, seja onde for.
E, como muito bem colocou aqui outro debatedor, o colega Marcelo, no hospital as pessoas jogam a bula fora.
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Eu não tenho vivência em hospital, apesar de ser filho de médico. Eu vejo que também alguns outros não necessitam ter um mostruário.
Aliás, hoje é dia 7 de maio, Dia do Oftalmologista. Acho que todos nós aqui precisamos dele. Quando ele nos dá um colírio, ele já explica o uso, felizmente, o porquê daquilo. Então, faço uma homenagem a eles também.
Eu gostei do debate e estou disposto a tratar também, com muito interesse, da questão das patentes, esse, sim, um problema muito sério.
Agradeço a vocês por colocarem o tema em pauta, Deputados.
Obrigado.
A SRA. PRESIDENTE (Jandira Feghali. Bloco/PCdoB - RJ) - Obrigada, Tiago.
Todos que usamos óculos aqui temos que homenagear os oftalmologistas. (Risos.)
O próximo orador é o Luiz Gustavo Pires, do Conselho Federal de Farmácia, por 3 minutos.
O SR. LUIZ GUSTAVO DE FREITAS PIRES - Bom, como foi dito aqui, é lógico que este é um debate interessante e necessário para avançarmos.
Eu gostaria apenas de agradecer à Deputada Jandira Feghali e à Deputada Alice Portugal o convite e de dizer que o Conselho Federal está de portas abertas para darmos continuidade a este debate. Já recebemos lá representantes — e o Alexandre confirma aqui que os recebemos — de todas as áreas de interesse desse tema. E é importante nós levarmos este debate também para o Plenário do Conselho Federal — não é, Marcelo? —, para tirarmos o posicionamento lá dos nossos conselheiros, que representam os 27 Estados brasileiros. Tenho certeza de que o nosso Presidente, o Dr. Walter, vai pautar, o mais breve possível, este novo debate em plenário, para tirarmos uma posição oficial do conselho.
O que eu tiro daqui, olhando todos os lados, é que de fato a bula digital vem para somar, é uma coisa que soma, que agrega valor à questão da informação, até porque, se colocarmos o meio digital junto com o meio físico, conseguiremos, talvez, até diversificar a informação.
Vou citar aqui um exemplo que já debatemos. Quem sabe, pode-se colocar no meio digital um conteúdo mais técnico, voltado aos profissionais prescritores, não é, Deputada, e um conteúdo um pouco mais, digamos assim, simples de entendimento no meio físico. Estou propondo uma hipótese para debate. Temos que continuar debatendo, para continuarmos avançando e chegarmos, se não a um consenso, pelo menos a uma decisão, porque quem fica dependente disso é realmente a população brasileira, aqueles que não têm acesso à informação. E o mais importante, como a Deputada disse, é de fato garantir o acesso à informação de todos os usuários de medicamentos, seja no sistema público, seja no sistema privado, em todos os lugares.
Muito obrigado pelo convite. Estamos à disposição, Deputada.
A SRA. PRESIDENTE (Jandira Feghali. Bloco/PCdoB - RJ) - Obrigada, Luiz Gustavo, do Conselho Federal de Farmácia.
Passo a palavra agora ao Henrique Tada, da ALANAC.
O SR. HENRIQUE UCHIO TADA - Obrigado.
Para contribuir com o debate — e isso é muito salutar —, podemos colocar, sim, a interpretação que está na legislação, inclusive em consonância com o que está na proposta de norma que a ANVISA publicou em dezembro passado, na Consulta Pública nº 1.224, de 2023, de que todos os medicamentos — todos! —, como definido no art. 22, se não me falha a memória, terão a obrigação de disponibilizar bula em papel. Isso já garante o acesso à informação sobre todos os medicamentos, ao mesmo tempo em que coloca, como proposta, critérios muito cuidadosos, com muito debate, considerando todo o risco sanitário, conforme já colocado.
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Sem sombra de dúvida, a colocação de textos, tanto na lei como na proposta em consulta, que está ainda em fechamento, vai trazer desinformação e o não acesso a bulas. Está muito claro isso. Então, nós damos o nosso apoio e vamos continuar colaborando e contribuindo para que tenhamos o máximo de acesso à informação, ainda mais com o avanço tecnológico que acontece em todas as instâncias, inclusive para medicamentos também em relação a bulas.
Muito obrigado.
A SRA. PRESIDENTE (Jandira Feghali. Bloco/PCdoB - RJ) - Obrigada, Henrique Tada.
Passo a palavra ao Fábio, que está de plantão, virtualmente colocado, para que possamos acelerar sua liberação.
Tem a palavra o Fábio.
O SR. FÁBIO JOSÉ BASÍLIO - Obrigado, Deputada Jandira Feghali.
Quero agradecer à FENAFAR por se colocar à disposição.
Discordando do Deputado Isnaldo, eu acho que o debate foi realizado, mas foi meio atropelado. A FENAFAR, por exemplo, que representa 300 mil trabalhadores farmacêuticos do Brasil, não foi ouvida no debate da aprovação da lei. Ele disse que desafiava alguém que dissesse que a lei retira a bula. Mas ela a retira. O art. 3º, § 5º diz: "A autoridade sanitária poderá definir quais medicamentos terão apenas um formato de bula". Então, se a ANVISA determinar que todos os medicamentos só terão bula digital, ficará extinta a bula impressa. É sobre isso que estamos falando. Essa é a questão. Ouvimos a FENAFAR dizer que esse parágrafo é contraditório à própria lei. E a lei tem todo o nosso apoio. Não há como remar contra a maré; a tecnologia veio para ficar. Que bom que temos tecnologia! Por exemplo, eu estou no hospital, fazendo o meu plantão e podendo participar de uma audiência pública tão fundamental e importante como esta. Que bom que temos tecnologia! Mas devemos pensar nas pessoas, que precisam que a lei seja redigida de forma a atender às suas necessidades.
Novamente, quero dizer que somos a favor da bula digital e somos a favor que todos tenham a bula impressa. Inclusive, somos contra o Dorflex na prateleira. Ele tem que ir para trás do balcão e sair de lá com a bula, sim. O paciente que comprar Dorflex tem que saber que pode estar com um problema que será mascarado por esse analgésico. Ele não está procurando assistência médica e está se dopando com medicamentos em casa, fazendo uso irracional de medicamentos. Isso, nós somos contra.
Nós defendemos a presença do farmacêutico em todas as unidades de saúde. Precisamos aprovar a inserção do farmacêutico e acabar com o dispensário. A estratégia de saúde da família precisar ter o farmacêutico, que é o profissional que, com sua prática, vai "desmedicalizar" os pacientes. Muitos medicamentos são tomados de forma incorreta. Eu já atendi a pacientes que procuravam três, quatro prescritores, como ortopedistas e cardiologistas, por causa de uma série de patologias. Principalmente idosos pegavam prescrição de cada um e ficavam com medicamentos da mesma classe, que interagiam trazendo uma série de problemas, em que fazemos a conciliação medicamentosa. Então, precisamos garantir à população brasileira o acesso ao profissional farmacêutico e à assistência farmacêutica.
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A bula digital veio para ficar, sim, mas ela não pode substituir a bula impressa. Esse é o ponto que eu quero deixar registrado.
Agradeço, Deputada Jandira e Deputada Alice. Um abraço da FENAFAR ao Gustavo Pires, nosso companheiro do Conselho Federal de Farmácia, ao Marcelo Polacow e a todos. Ela está sempre à disposição para qualquer debate sobre a profissão farmacêutica, porque isso também a atinge. O farmacêutico é fundamental nessa cadeia de atendimento, desde a prescrição até o uso do medicamento de forma correta pelo paciente. O tratamento não se encerra na prescrição, ele se encerra com o paciente curado, evoluindo bem com o uso daquele medicamento. E o farmacêutico é fundamental nesse processo.
Obrigado a todos. E estou à disposição. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Jandira Feghali. Bloco/PCdoB - RJ) - Obrigada, Fábio. Você já viu que está sendo aplaudido o tempo todo aqui, não é?
Ele colocou uma questão importante: às vezes, o paciente compra o medicamento genérico e o medicamento com o nome fantasia, ambos contendo a mesma substância. Ele compra os dois e os toma juntos. Pela falta de orientação, ele acaba usando o mesmo remédio duas vezes: um da caixa com o nome fantasia e o outro genérico, e não sabe que são a mesma coisa. E, se não houver bula, não vai saber mesmo, porque na bula está escrito qual é o princípio ativo. Sem a bula, ele não sabe. Então, é mais um problema que associamos ao nosso debate neste momento.
Tem a palavra o Jackson Lucena, do ACESSA.
O SR. JACKSON LUCENA - Obrigado, Deputada. Obrigado a todos.
Mais uma vez, quero parabenizá-la pelo debate, que foi muito enriquecedor. Cada um teve a oportunidade de colocar sua visão e, acima de tudo, de pensar em quem está na ponta, seja consumidor, seja paciente ou aqueles a quem se destinam as decisões desta Casa, sempre tomadas com muita ponderação e parcimônia, que é o direito do brasileiro.
Estamos tratando a evolução da informação. Já avançamos na CNH digital, que antigamente era um bicho de sete cabeças e hoje está no celular de quase todo mundo. Também avançamos nos requerimentos dos benefícios assistenciais junto ao INSS, pois, durante a pandemia, o CRAS e o CREAS ficaram fechados, e os indivíduos contaram com a ajuda de um neto, sobrinho, primo ou alguém para fazerem o requerimento do benefício assistencial pelo celular. Então, avançar é sempre positivo.
Também é importante preservar o tradicional. Preservar a bula física é um ato de respeito à tradicionalidade, a quem aderiu àquele hábito como rotina e a quem respeita essa prática. Mas, acima de tudo, como o próprio Deputado Rafael mencionou, não podemos ser seletivos quando falamos da ANVISA. Não podemos ser seletivos ao escolhermos enaltecer a ANVISA em determinados momentos e, em outros, questionar sua capacidade técnica de agir. Não podemos colocar essa questão em xeque. O que devemos fazer é fortalecer cada vez mais aquela instituição. Devemos batalhar dentro desta Casa e junto ao Executivo pelo fortalecimento da ANVISA, que, há tantos anos, de forma tão renomada, vem atuando no âmbito nacional e é reconhecida internacionalmente. Então, devemos acreditar na decisão do que é tomado como lei nesta Casa, credibilizá-la e, acima de tudo, não sermos seletivos quando se trata da ANVISA. Pelo contrário, devemos fortalecê-la e reconhecer seu papel como órgão máximo regulador.
Muito obrigado. Foi um prazer estar presencialmente aqui com as senhoras, cujo trabalho admiro há muito tempo. E estamos, enquanto ACESSA, sempre disponíveis para contribuir com os debates.
Obrigado a todos também pelo momento e pelo aprendizado.
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A SRA. PRESIDENTE (Jandira Feghali. Bloco/PCdoB - RJ) - Obrigada, Jackson, pela contribuição.
O último a falar é o Marcelo Polacow. Tem a palavra o Marcelo.
O SR. MARCELO POLACOW BISSON - Assim como os outros que me antecederam, também considero o debate muito enriquecedor, Deputada Alice e Deputada Jandira, e, com certeza, irá subsidiar a ANVISA. Todo o fruto dos pontos aqui colocados irá ajudar a ter discernimento e parcimônia em analisar as contribuições que chegaram por consulta pública. E tenho certeza de que sairemos mais fortalecidos.
Realmente, a bula física é um direito do consumidor adquirido há muitos anos. Da mesma maneira que a Deputada Alice mencionou, a bula dá autenticidade ao medicamento. Essa é uma questão realmente importante e deve ser levada em consideração.
O Conselho Regional de Farmácia de São Paulo está também sempre à disposição de V.Exas., do Congresso Nacional, para participar das reuniões. Sempre fomos muito bem recebidos nesta Casa, tanto pela Deputada Jandira, como pela Deputada Alice e pelos demais Deputados, assim também pelos da bancada de São Paulo. Espero que possamos estar juntos em outras oportunidades, como nas pautas sobre o técnico de farmácia, sobre o piso salarial dos farmacêuticos, que são pautas importantes que não podemos esquecer, além de tantas outras que são do nosso interesse.
Muito obrigado, Deputada Alice, Deputada Jandira e todos os participantes presentes.
A SRA. PRESIDENTE (Jandira Feghali. Bloco/PCdoB - RJ) - Para fechar a Mesa, vou conceder a palavra à Deputada Alice e, depois, eu finalizo, para encerrarmos a audiência.
A SRA. ALICE PORTUGAL (Bloco/PCdoB - BA) - Eu serei também bem rápida; já desfiei meus argumentos.
Acredito que as contribuições foram excelentes, mesmo com opiniões diversas, que me parecem diversas do ponto de vista temporal. Mas é possível fazer um relatório que acomode o seguro e, efetivamente, o avanço tecnológico para o acesso digital.
Não me parece que a nomenclatura correta seja "manter o tradicional". O problema não é a tradição. O problema é de fato a segurança técnico-científica, a segurança farmacológica e da autenticidade da natureza daquele produto. É isto que está em discussão: a segurança do paciente e a segurança de quem oferta o medicamento. E me parece que não houve tempo para essa discussão. Mas estamos realizando este debate agora. Evidentemente, espero que o debate tenha inspirado a ANVISA, que, com certeza, saberá dele.
O Ministério da Saúde, possivelmente dedicado à tragédia gaúcha, não teve condições de vir, mas nós chegaremos até ele com este debate. E acredito que isso precisa ser levado em consideração, inclusive com a presença do setor jurídico da indústria de genéricos no Brasil e do setor jurídico da ALANAC, porque essa é uma questão de segurança jurídica para vocês. Isso porque, infelizmente, em tempos de fake news, em tempos de inteligência artificial, tudo pode ser modificado — tudo pode ser modificado. Essa é uma questão importante para vocês e também para nós, que defendemos a indústria nacional. Peço que façam essa imersão nessa direção.
Sobre o autocuidado, houve uma contribuição maravilhosa para a questão do letramento. Isso é fundamental! E o letramento não significa indução à automedicação. Por isso, eu peço que vocês reflitam sobre essa questão dos supermercados. O setor supermercadista vem agressivamente, ano após ano, repetindo o mesmo texto.
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E nós sabemos o que significa a fila de transplante e a circunstância do uso irracional de medicamentos, que infelizmente é algo muito perigoso.
Na prateleira do supermercado, nos apagões elétricos... Para as farmácias, é exigida toda uma estrutura: azulejos, iluminação, refrigeração. Mas o supermercado não é ambiente para medicamento! Este é um problema muito grave! Nós precisamos unificar a posição da indústria, dos farmacêuticos, das redes de farmácia. Isso é fundamental. Os donos das redes contam conosco para isso, mas nós não contamos com eles para um piso do farmacêutico, para o farmacêutico não ser o gerente de vendas. Isso tudo precisa ser discutido no Brasil.
A propaganda de medicamentos foi tratada aqui, numa geração anterior, pela Deputada Jandira junto com a ex-Deputada Vanessa Grazziotin — eu era Deputada estadual ainda. Isso é uma coisa muito séria no Brasil! Nós tratamos aqui de anorexígenos, e esta Câmara foi praticamente chantageada para votar uma pílula que se traduzia como solução para o câncer.
Nós não somos câmara técnica, nós somos generalistas. A verdade é que o Parlamentar se transforma num generalista e tem que entender um pouco de tudo. Mas nós temos que beber na fonte dos especialistas, e é o que estamos fazendo aqui, com respeito a todas as opiniões.
Então, eu finalizo dizendo que eu tenho o claro convencimento de que a bula é uma segurança ao paciente, é uma segurança a quem fornece o medicamento, tanto para venda como para uso hospitalar, no setor público ou no setor privado, é uma segurança para quem produz o medicamento, é uma segurança jurídica, e nós não podemos abrir mão dela.
Nós gostaríamos muito que a ANVISA, na excelência do seu trabalho... E, particularmente, não contesto a excelência da ANVISA, nem a Deputada Jandira, pelo contrário, nós entendemos que, neste caso, não podemos conflitar interesses ou duvidar da sua excelência. Mas é preciso que a ANVISA analise, do ponto de vista da realidade nacional, o que pode advir de uma supressão da bula impressa, inclusive em apenas parte dos medicamentos brasileiros. Isso já será um grande problema pelo gigantismo do Brasil.
Obrigada. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Jandira Feghali. Bloco/PCdoB - RJ) - Obrigada, Deputada Alice.
Primeiro, eu quero agradecer o vídeo do Padre Júlio Lancellotti, em que ele dá a sua contribuição. A sua liderança social agrega muita riqueza a esta audiência que nós estamos fazendo aqui hoje.
Segundo, eu quero dizer que a lei expressa o espírito do legislador, a intenção do legislador. Eu não me lembro de a ANVISA ter demandado esse parágrafo. A ANVISA não pediu para colocar esse parágrafo. Esse foi um caminho que se encontrou no relatório para mediar o conflito que se estabeleceu no debate. Mas não foi um pedido da ANVISA. De que eu me lembre, e V.Exa. também, não houve um pedido de jogar para ela a competência de definir que medicamento tem ou não bula impressa, ou bula digital, porque dali consta que é uma das formas: pode ser só impressa ou só digital.
Então, é necessário que o espírito do legislador, naquele momento em que avança para as duas formas, avance para uma soma de fato. Repito que estamos no século XXI e temos que ter tecnologia à disposição.
Aliás, a tecnologia não é neutra. A energia nuclear serve para bomba atômica e serve para diagnóstico precoce do câncer, depende da intenção de quem a usa. Então, na lei nós temos que ter muita precisão, senão, nós abrimos caminhos para que aquilo que a população não precisa acabe acontecendo.
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A ANVISA é gerida por mandatos: hoje ela é uma, amanhã, pode ser outra. Nós não podemos deixar isso para uma regulação simplesmente. A lei tem que definir o que ela quer.
O relatório pode gerar excepcionalidades para o caso levantado aqui pelo Marcelo. De repente, um medicamento dispensado em um ambiente hospitalar não precisa ter bula para o paciente, mas, se ele quiser acesso a essa informação, ele tem que tê-la, ele tem esse direito, porque, mesmo internado, é o corpo dele, é a vida dele. Ele pode ter o direito a acessar essa informação. Mas o relatório pode compor essa preocupação, e nós damos à ANVISA essa regulação. Tudo bem. Mas eu acho que a lei tem que ser clara. A ANVISA segue o parâmetro da lei, ela tem uma lei própria da sua criação e tem outras leis. Ela tem que seguir o parâmetro da lei, mas, quando o parâmetro da lei diz que tem que ter as duas bulas, não pode simplesmente ser anulada a bula impressa, que é o que nós queremos estabelecer para benefício dessa universalidade populacional.
Por fim, já que temos aqui várias entidades presentes ligadas ao setor da indústria, ao setor do trabalho no campo da indústria da saúde e da produção, quero dizer que nós temos trabalhado muito no campo do complexo econômico do Ministério da Saúde.
Eu já coordenei duas vezes a Subcomissão, relatei uma delas. Em 2021, soltamos o último relatório, quando fui a Presidente da Comissão e o Relator foi o Deputado Alexandre Padilha, hoje Ministro, que contou com a contribuição do Deputado Odorico Monteiro. Era um relatório muito bem construído, muito redondo, nós ouvimos 50 representações da sociedade. E esse relatório apontou um conjunto de propostas para o marco da regulação. Apontamos propostas para o Parlamento, para o Executivo, para o Tribunal de Contas, para o BNDES, para o Ministério das Relações Exteriores, ou seja, é um conjunto de indicações e de propostas. E vamos provocar a Comissão de Saúde para que monte um grupo de trabalho agora, não uma Subcomissão, para acompanhar a implementação, seja das indicações do relatório, seja do que o novo Governo faz em relação ao complexo.
Foi recuperado o Grupo Executivo do Complexo Econômico-Industrial da Saúde — GECEIS, e essa política entrou nos seis itens da política estratégica da nova indústria brasileira. Estão envolvidos principalmente dois Ministérios, o Ministério da Saúde e o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações, incluindo o Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços e os bancos públicos. Mas é importante que nós do Parlamento acompanhemos a implementação e, ao mesmo tempo, as indicações do relatório, para ver se elas estão em curso.
Nós precisamos reduzir a dependência à vulnerabilidade brasileira. Nós vimos o que foi a pandemia, quando, para respirar, precisamos importar respirador. O ventilador respiratório é uma tecnologia simples, e nós paramos de produzi-lo. Nós importamos máscara, equipamento, quase importamos seringa e agulha, importamos vacina, medicamentos, tudo. Não dá! Então, nós precisamos crescer em nossa independência — e esse é um problema geopolítico também — em anestesia, em sedação para pessoas entubadas, etc. Isso foi desesperador para nós. Portanto, é preciso implementar, para reduzirmos a nossa vulnerabilidade e a nossa dependência. Muitos países disseram: "Não vamos exportar mais nada" — no período da pandemia —, "porque nós vamos atender primeiro ao mercado interno, ao público interno". E aí? Como é que nós ficamos?
Não podemos mais ter essa vulnerabilidade. Precisamos avançar, pelo menos em grande percentual, não só em medicamentos biotecnológicos, mas também em vacinas, em equipamentos médicos e em equipamentos de saúde, para que possamos respirar sem depender do que os Estados Unidos, ou Canadá, ou a Europa pensem de nós.
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Esse é um trabalho que queremos fazer para proteger a indústria nacional — pública e privada, mas nossa —, para não dependermos da boa vontade da geopolítica internacional e da conjuntura que se estabelece.
Dito isso, vou concluir, encerrando esta audiência.
Muito obrigada pela presença de todas e de todos. Isso vai servir, certamente, para o debate do projeto em si, para que possamos aprovar um projeto que reequilibre a questão da lei anterior e para que possamos atender à universalidade da população brasileira.
Muito obrigada.
Está encerrada esta audiência. (Palmas.)
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