2ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA 57 ª LEGISLATURA
Comissão Especial destinada a estudar e analisar formas de prevenção e auxílio a desastres e calamidades naturais que vêm assolando o Território Nacional
(Audiência Pública e Deliberação Extraordinária (semipresencial))
Em 5 de Março de 2024 (Terça-Feira)
às 14 horas e 30 minutos
Horário (Texto com redação final.)
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O SR. PRESIDENTE (Leo Prates. Bloco/PDT - BA) - Declaro aberta a 5ª Reunião Extraordinária da Comissão Especial destinada a estudar e analisar formas de prevenção e auxílio a vítimas de desastres e calamidades naturais, que vêm assolando o nosso território nacional.
Encontra-se à disposição, na página da Comissão na Internet, a Ata da 4ª Reunião, realizada no dia 12 de dezembro de 2023.
Fica dispensada a sua leitura, nos termos do parágrafo único do art. 5º do Ato da Mesa nº 123, de 2020.
Não havendo quem queira retificar a ata, coloco-a em votação.
Os Deputados e as Deputadas que a aprovam permaneçam como se encontram. (Pausa.)
Aprovada a ata.
Expediente.
Informo que o resumo do expediente encontra-se publicado na página da Comissão na Internet. Informo também que, em resposta ao solicitado no Requerimento nº 27, de 2023, apresentaram informações os Governos do Distrito Federal e dos Estados de Goiás, Minas Gerais e Tocantins, assim como as Prefeituras de Natal e de Palmas.
Ordem do Dia.
Esclareço que, na Ordem do Dia de hoje, está prevista a realização de audiência pública que cumpre decisão do colegiado em atendimento ao Requerimento nº 25, de 2023, de autoria dos Deputados Tarcísio Motta, Fernanda Melchionna e Professora Luciene Cavalcante, bem como a votação de requerimentos.
Audiência.
Daremos início à audiência pública em que debateremos o estado atual de conhecimento sobre os efeitos das mudanças climáticas sobre o planeta Terra e sobre o território brasileiro, isto é, especialmente sobre o território brasileiro, já que o Brasil faz parte do planeta Terra (riso).
Saulo, eu tinha que lhe fazer essa pegadinha, porque o planeta Terra e o Brasil separados realmente ficou... (risos).
Agradeço a presença a todos, em especial aos convidados.
Informo que participarão dos trabalhos os seguintes palestrantes: Sr. Saulo Rodrigues, Professor Associado do Centro de Desenvolvimento Sustentável da Universidade de Brasília e Cientista do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas — IPCC; Sr. Gustavo Luedemann, Pesquisador do IPEA e Cientista do IPCC; Sr. Alexandre Araújo Costa, Cientista do IPCC; Sra. Luciana Gatti, Pesquisadora do INPE e Acadêmica do IPCC; Sr. Marcio Astrini, Secretário-Executivo do Observatório do Clima.
O Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima nos informou da impossibilidade de enviar representante para participar desta audiência pública, o que lamento profundamente, porque seria importante a participação de um representante do Governo que trate da questão das mudanças climáticas.
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Regras da audiência pública.
Para o melhor andamento dos trabalhos, esclareço que adotaremos os seguintes procedimentos.
Em conformidade com decisão da Presidência da Casa, não será mais permitida a divisão do tempo para Comunicações de Liderança. O tempo concedido ao convidado será de 20 minutos, prorrogáveis a juízo desta Comissão. O autor do requerimento será o primeiro a fazer o uso da palavra para considerações, por 3 minutos. Cada membro inscrito terá mais 3 minutos. Cada não membro inscrito terá 2 minutos.
Vou fazer só alguns comentários que acho importantes. Primeiro, eu me orgulho muito — agradeço ao Deputado Tarcísio Motta e aos coautores do requerimento que possibilitaram isto — de sermos a primeira Comissão a retornar aos trabalhos. Acho que isso é marcante, e urge a nossa atuação.
Recebi um comunicado do Ministério de que este ano e os dois anos futuros serão extremamente complicados para a Bahia na questão da seca. Para isso quero chamar a atenção do nosso Relator, um brilhante Parlamentar dedicado à questão dos desastres e apoio às vítimas, o Deputado Gilson Daniel. Agradeço muito a parceria com ele e com toda a sua equipe.
Agradeço em nome de toda a equipe da Câmara dos Deputados. Quero agradecer muito à Juliana, assessora do Deputado Gilson Daniel, e ao Saulo, que é funcionário da Câmara, porque desde a semana passada nós vamos e voltamos, vamos e voltamos — não é fácil operar isso. Agradeço também à equipe do Deputado Tarcísio Motta, que foi muito diligente na feição desta audiência, assim como às equipes dos institutos envolvidos.
Quero realmente chamar a atenção para a nossa necessidade, Deputado Gilson, de dar ao Brasil um arcabouço legal que proteja especialmente os mais pobres desses desastres. As cenas no Amazonas me chocaram bastante. Vejam como coisas que nos parecem simples passam a ser complicadas. Eu fui Secretário de Saúde. Sei que o deslocamento de profissionais de saúde é a coisa mais básica, mas, com a seca que houve no Amazonas no segundo semestre do ano passado, os profissionais de saúde relataram as dificuldades de se deslocar para as comunidades onde eles atendiam. Especialmente nos postos de saúde, havia 2 semanas, 3 semanas que faltavam médicos, simplesmente porque não havia mais o rio para deslocar esses profissionais de saúde — e não há estradas.
Esse é um exemplo claro do que esses desastres e as mudanças climáticas podem trazer de efeito direto, principalmente para as comunidades mais vulneráveis do nosso País. Isso nos preocupa bastante.
Há um segundo tema, Deputado Gilson, sobre o qual eu acho que temos que nos debruçar. A Frente Parlamentar da Agropecuária — FPA e outras entidades da agricultura soltaram uma nota falando da complicação, neste e em mais 2 anos de seca no Estado da Bahia, em relação ao aumento considerável de preço das verduras e leguminosas — isso já foi notícia, e eu até postei no nosso grupo, assim como o Deputado Tarcísio, que é bastante atuante.
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No meu Estado, por exemplo, essa compra já está complicada para os mais pobres. Nós precisamos ter uma atenção aos mais pobres sobre essa questão da segurança alimentar, porque, como falou o Deputado brilhantemente em outra oportunidade, nós já estamos em emergência climática, nós já estamos vivendo cenas de chuvaradas em alguns locais, de seca em outros e até de revezamento entre de chuvaradas e secas, infelizmente.
Estou falando da seca na Bahia e conversando com o Deputado Tarcísio sobre a possibilidade de enchente no Rio de Janeiro entre março e abril. O Rio de Janeiro também já foi notificado. Nós vamos começar um período de chuva complicado na maioria dos Estados. As capitais sofrem muito. O Deputado Tarcísio tem uma ligação muito forte com a cidade do Rio de Janeiro, e eu tenho uma ligação muito forte com a cidade de Salvador. As comunidades vulneráveis realmente sofrerão muito, infelizmente. Nós precisamos ter um olhar atento.
Sempre tenho conversado com o Deputado Gilson e com toda a sua equipe sobre a necessidade de construirmos o que na engenharia se chama de matriz. Trata-se de uma matriz que possa dizer o que aconteceu e qual é a resposta, e que essa resposta seja automatizada. Se vamos ter 3 anos complicados, isso mostra a importância desta Comissão.
No mais, quero agradecer e ver se o Deputado Gilson quer fazer alguma consideração antes que eu chame os convidados. Ele que é o nosso Relator. Tenho certeza de que vai entregar ao Brasil essa importante contribuição. Aliás, ele já foi autor de uma importante lei que trata do fundo para desastres.
Estamos lutando para botar dinheiro lá, não é Gilson?
O SR. GILSON DANIEL (Bloco/PODE - ES) - Agradeço ao Deputado Leo Prates, que conduz muito bem esta Comissão. Ele se lembrou aqui do fundo de calamidade. Nós conseguimos colocar, no ano passado, três fontes de recursos no fundo que foi criado em 1969. O fundo hoje já está começando a ser abastecido com recurso que é fruto do trabalho da Câmara dos Deputados.
Primeiramente, quero parabenizar o Deputado Tarcísio Motta por esta audiência. O tema é de alta relevância para a montagem do nosso relatório, bem como sua discussão e a presença de todos os convidados para a audiência pública desta Comissão Especial.
Quero agradecer muito a presença aos Deputados, à Deputada Silvia Waiãpi, ao Deputado Tarcísio Motta, ao Deputado Duarte Gonçalves Jr, a quem eu quero fazer uma saudação especial. O Deputado está chegando na Casa, é um colega nosso, foi Prefeito de Mariana no mesmo período em que eu também era Prefeito. S.Exa. sabe muito, passou muito pelas dificuldades de desastre na sua cidade e vai dar uma contribuição muito grande para este Parlamento.
Também quero agradecer a presença ao Pedro Herrara, meu parceiro, que também é uma referência para nós na prevenção de desastres. Ele é bombeiro em Minas Gerais e um parceiro nosso aqui na Câmara dos Deputados. Quero agradecer também a presença aqui do Secretário de Turismo do Espírito Santo, que me acompanha, o Felipe Lemos. Felipe é um amigo, foi candidato a Deputado Federal e teve voto para estar conosco, mas, por legenda, não está aqui. Ele representa o Espírito Santo hoje aqui na nossa sessão como Secretário de Turismo. Por fim, quero parabenizar o Deputado Tarcísio e a todos os palestrantes.
Espero muito desta audiência para que possamos ter ainda mais subsídios, apesar de haver muitos estudos já feitos nessa área por parte de quem vai nos abrilhantar com sua fala. Eu quero muito, ao final desta audiência, ter mais informação para que possamos trabalhar o nosso relatório.
Era isso.
Muito obrigado, Presidente, e vamos na sequência.
Parabéns, Deputado Tarcísio.
O SR. PRESIDENTE (Leo Prates. Bloco/PDT - BA) - Eu queria convidar agora o Sr. Saulo Rodrigues, o Sr. Gustavo Luedemann e o Sr. Marcio Astrini para comporem a Mesa, por favor.
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Passo a presidência dos trabalhos ao Deputado Tarcísio Motta, autor do requerimento.
O SR. PRESIDENTE (Tarcísio Motta. Bloco/PSOL - RJ) - Muito obrigado, Presidente. Não precisava. De qualquer forma, a condução do trabalho é sempre de V.Exa. Obrigado, Deputado Leo Prates.
Vamos, sem mais delongas, às falas dos expositores de hoje.
O Deputado Gilson Daniel já destacou qual é o pano de fundo sobre o qual travaremos o debate, diante do caos climático hoje existente no planeta Terra, e sobretudo quais são os impactos esperados sobre o território brasileiro e como os cientistas avaliam e têm analisado essa situação.
Passo a palavra, sem mais delongas, ao Sr. Saulo Rodrigues, Professor Associado do Centro de Desenvolvimento Sustentável da Universidade de Brasília e Cientista do IPCC, que disporá de 20 minutos.
O tempo no momento está sendo marcado naquele relógio. Caso precise de mais tempo, verificaremos o horário.
Muito obrigado pela presença.
O SR. SAULO RODRIGUES PEREIRA FILHO - Boa tarde a todas e a todos.
Antes de mais nada, quero agradecer o convite para participar desta audiência pública da Comissão Especial que trata da prevenção de desastres e calamidades naturais. Quero agradecer ao Deputado Tarcísio Motta, ao Deputado Leo Prates, ao Deputado Gilson Daniel e à Deputada Fernanda Melchionna. É uma satisfação poder contribuir com o debate sobre um tema tão relevante.
Venho da Universidade de Brasília, sou professor do Centro de Desenvolvimento Sustentável desde 2006. No ano de 2007, eu inaugurei a disciplina de mudanças climáticas na pós-graduação da UnB e venho, desde então, desenvolvendo pesquisas e orientando alunos de mestrado e doutorado sobre essa temática.
No ano de 2008, passei a integrar o grupo da Rede CLIMA — Rede Brasileira de Pesquisa sobre Mudanças Climáticas Globais, no tema do desenvolvimento regional e mudanças climáticas. Fui ponto focal da quarta edição da Comunicação Nacional sobre Segurança Socioecológica, documento que reúne as principais informações sobre o Brasil para a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas.
Então, é nessa condição, Deputado Tarcísio Motta, que eu faço aqui um reparo: eu ainda não fui indicado como membro do IPCC. Espero ser em breve. No momento, venho acompanhando toda a produção dessa instância importante, multilateral, científica, que faz justamente a compilação do conhecimento científico sobre o tema das mudanças climáticas para o mundo todo.
No ano de 2007, como eu falei, foi lançado o Quarto Relatório de Avaliação do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas — IPCC. Desde então, a cada 6 anos, é lançado um novo relatório atualizando essas informações.
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Lá na pós-graduação em desenvolvimento sustentável da UnB, nós temos acompanhado muito de perto essa produção do IPCC, que traz os fundamentos científicos sobre a emergência climática, sobre a crise que nós estamos vivendo, sobre o poder que o clima possui de causar perdas e danos para a humanidade. Muitas vezes, não nos damos conta desse poder, cujas dimensões são difíceis de ser enfrentadas. Isso é o mínimo que podemos dizer.
Há, porém, uma série de estudos e uma série de ações importantes que podem e devem ser adotadas para que consigamos mitigar as perdas e os danos — perdas não apenas de vidas humanas, mas da biodiversidade, das florestas, dos ecossistemas; danos à infraestrutura, danos à produção econômica, danos ao bem-estar das populações. E é justamente dessa prevenção de perdas e danos que estamos tratando nesta Comissão.
Eu queria parabenizar a Câmara dos Deputados por esse esforço. Eu acho que realmente está faltando o Brasil se colocar de uma forma mais assertiva nesse debate, nessas iniciativas. O Brasil é um país que tem características muito singulares na agenda climática. O Brasil tem uma grande potencialidade nas energias renováveis, nos recursos naturais, recursos hídricos, biodiversidade, fertilidade de solos, produção de alimentos. O Brasil é uma potência ambiental por natureza. Então, nós temos vantagens importantes, em relação a outros países do mundo, que nos colocam numa posição de protagonista na agenda climática.
Entretanto, há que se ressaltar que nós somos também um dos países mais vulneráveis do mundo aos eventos climáticos extremos, por estarmos nessa faixa tropical e subtropical, onde o clima já é, por natureza, mais intenso e mais imprevisível. Com a mudança do clima, com o aquecimento global, essa característica só se acentua ainda mais. Então, o Brasil é, sim, um dos países mais vulneráveis do mundo aos impactos climáticos extremos.
É um pouco, eu diria, dúbia a posição do Brasil na agenda climática. Na parte de emissões de gás de efeito estufa, nós temos tudo para ser protagonistas e um dos líderes mundiais em energia renovável e em atividade econômica de baixo carbono. O Brasil tem tudo para ser protagonista, e já está se colocando como tal.
Agora, eu faço questão de ressaltar que a prevenção de desastres naturais é urgente no Brasil, porque os danos são muito grandes. Eu rascunhei uma pequena lista antes de vir para cá. Nós tivemos no Brasil, desde 2008, um desastre de grandes dimensões no Vale do Itajaí, em Santa Catarina; depois, em Teresópolis e Friburgo, em 2011; depois, em Petrópolis, em 2022; depois, em São Sebastião, em 2023 — isso para falar de eventos que causaram milhares de mortes e prejuízos econômicos difíceis de serem calculados.
As secas também são eventos climáticos extremos, que trazem grandes prejuízos para a nossa população, para a nossa economia.
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Nós estamos num El Niño forte agora, que deve perdurar até meados deste ano, que vai trazer, como sempre faz, seca ao Norte e ao Nordeste e muita chuva ao Sul e ao Sudeste. Essa é a característica do fenômeno El Niño. O fenômeno La Niña, que terminou ano passado, inverte essa lógica: passa a haver muita seca no Sul e no Sudeste e muita chuva no Norte e no Nordeste.
Esses ciclos naturais do Oceano Pacífico trazem impactos muito grandes para o clima da América do Sul, para o clima do Brasil. E a mudança do clima está acentuando a intensidade dos fenômenos naturais El Niño e La Niña. Então, o que podemos fazer para nos prevenir?
Com relação às secas, eu gosto sempre de trazer um exemplo que tem muito a nos ensinar, que é o Programa Um Milhão de Cisternas, que foi criado no Semiárido do Nordeste, pela Articulação Semiárido Brasileiro, no final do século XX e no início do século XXI, em 2003, no primeiro Governo Lula. Esse Programa Um Milhão de Cisternas foi trazido para dentro do Governo Federal. O Deputado Gilson sabe muito bem o sucesso que foi esse programa por trazer segurança hídrica para a população que vive no Semiárido. Durante a cheia, com a cisterna cria-se uma reserva de água para o enfrentamento de estiagens prolongadas. Já construímos 1 milhão e 200 mil cisternas de 16 mil litros, com esse programa, e 100 mil cisternas de 52 mil litros, concebidas pelo programa chamado P1+2, que são cisternas para a produção alimentar de subsistência.
Esse é o melhor exemplo, gente, que eu conheço. Se me pedissem para citar uma ação concreta de adaptação às mudanças climáticas, eu não teria dúvida em citar o Programa Um Milhão de Cisternas. Esse programa foi tão bem-sucedido que recebeu prêmios internacionais. Além disso, ele pode ser estendido para outras regiões do Brasil que também são vulneráveis às secas. E aí eu destacaria o Distrito Federal.
Nós tivemos uma ameaça ao abastecimento de água no Distrito Federal em 2017, depois do último El Niño muito forte, que foi em 2015 e 2016. Depois de 2017, a população do Distrito Federal ficou ameaçada de não ter água para abastecimento. Nós estamos próximos às cabeceiras, às nascentes das principais bacias hidrográficas do Brasil. Isso faz de nós um território vulnerável a estiagens prolongadas, porque, se não chover, não temos de onde tirar água aqui. Em outras regiões de rios caudalosos, a fonte de água é muito mais distribuída — aqui não. Se não chover no Planalto Central, Brasília fica sem água. Isso aconteceu em 2017.
Eu, no ano de 2022, fui convidado pelo Governo do Distrito Federal a fazer um trabalho de consultoria sobre medidas adaptativas às mudanças climáticas aqui no Distrito Federal. Na época, o Secretário de Meio Ambiente era o Zequinha Sarney. Fizemos esse trabalho e indicamos as cisternas para serem introduzidas aqui como mecanismos de adaptação às mudanças climáticas, porque novas estiagens vão ocorrer aqui com certeza. Nós não conseguimos precisar quando elas vão acontecer, mas vão, com certeza, acontecer novamente. Então, é importante aumentarmos a oferta de água, como estamos fazendo aqui no Distrito Federal, mas também é importante pouparmos a água dos reservatórios do Distrito Federal. A melhor forma de se fazer isso é fazendo um programa bastante assertivo de cisternas para a reservação da água da chuva, poupando, com isso, os reservatórios.
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Com relação aos desastres de chuva muito intensa que provocam inundações, alagamentos e movimentos de massa, os chamados fenômenos hidrogeológicos, deslizamento de encostas, é possível fazer algo para prevenir esses desastres, Deputado? Sim, é possível. Basta trafegarmos nas nossas rodovias sob concessão que nós vamos facilmente verificar que os taludes dos cortes de estrada passam por um trabalho de prevenção de risco de deslizamento, porque, se desliza um talude desse, para a operação das estradas, o que causa prejuízo para as concessionárias. Então se faz drenagem pluvial na crista dos taludes, escadas de chuva, para não saturar o solo nesses taludes e eles não escorregarem.
Em encostas habitadas na Serra do Mar, densamente povoada, não se faz nada disso. Então, para proteger as estradas, fazemos investimentos de prevenção de risco de deslizamento, mas nas encostas habitadas não estamos fazendo. Eu estive o ano passado, como Gerente de Sustentabilidade da EMBRATUR, com o Marcelo Freixo, e desenvolvemos alguns programas de adaptação às mudanças climáticas para o turismo. Agora, em fevereiro, voltei para a UnB — não estou mais na EMBRATUR. Mas é possível implementar ações que reduzam o risco de perdas e danos causados por impactos climáticos.
Além disso, eu destacaria ainda o controle do desmatamento. O controle do desmatamento não é benéfico apenas para reduzir as emissões de gás de efeito estufa do Brasil, uma vez que a fonte principal de emissão de gás de efeito estufa no Brasil é o desmatamento da Amazônia e do Cerrado. É a chamada agenda da mitigação. O controle do desmatamento não beneficia apenas esse controle das emissões de gás de efeito estufa no Brasil. Ele também é importante para a adaptação. Ele também é importante para fortalecer os serviços ecossistêmicos, a conservação da biodiversidade, da fertilidade dos solos e da disponibilidade de água. Então, o controle do desmatamento é uma ferramenta importantíssima para aumentar nossa resiliência aos impactos climáticos que afetam principalmente, Deputado Gilson, os povos e comunidades tradicionais, cujos modos de vida dependem intrinsecamente da conservação da floresta e dos seus serviços ecossistêmicos, muito mais do que nós, que fazemos compra no supermercado e abastecemos o carro no posto de gasolina. Eles dependem dos serviços da floresta para a manutenção dos seus modos de vida.
Então, nessa agenda de povos indígenas e comunidades tradicionais, a questão do controle do desmatamento desempenha um papel fundamental para que eles sofram menores perdas e danos, menores prejuízos, como ocorreu ano passado no Amazonas. Quem podia imaginar que o Estado do Amazonas fosse ter os seus rios caudalosos completamente secos?
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O Deputado Leo Prates estava lembrando aqui a dificuldade prosaica de levar uma mercadoria de um lugar para outro. Não tem como, se a via fluvial seca e não há estrada. Víamos imagens lá dos povos tradicionais andando de moto no leito do rio seco, uma coisa inimaginável até muito pouco tempo atrás.
Mais uma vez, eu digo que sou entusiasta das cisternas, porque elas podem beneficiar não apenas o Semiárido do Nordeste, mas também o Centro-Oeste e a Amazônia, que muitas vezes passa por períodos de seca extrema, como ocorreu no ano passado, ou às vezes até a população não tem acesso à água potável. Por mais abundante que seja a água na Amazônia, em muitas comunidades, o acesso à água potável não está presente. Então, a cisterna é também um instrumento de segurança hídrica para a questão da qualidade da água que está sendo consumida pela população.
Eu já estou me alongando um pouco. Eu queria destacar ainda um último ponto. Está em curso a revisão do Plano Clima, uma iniciativa do Governo Federal, liderada pelo Ministério do Meio Ambiente, que infelizmente não se fez presente aqui hoje. Eu sei desse trabalho que está acontecendo lá. É uma revisão que envolve vários Ministérios, como tem que ser. A agenda climática não pode ser setorial. A agenda climática é intersetorial por natureza. Ela precisa envolver os Ministérios do Meio Ambiente, da Ciência e Tecnologia, da Fazenda, da Agricultura, do Desenvolvimento Regional. E é isso que está sendo feito na revisão do Plano Clima.
E uma das críticas que nós fazíamos, exatamente acompanhando essa agenda climática desde a academia, é que estavam sendo tratadas a tal da agenda da mitigação e a agenda da adaptação de forma separada, estanque, como se uma coisa não tivesse nada a ver com a outra. E, de fato, tivemos o Plano Nacional de Adaptação à Mudança Climática, de 2009, e depois o Plano Nacional de Adaptação, em 2016. E, agora, eu acho muito louvável que o Governo Federal tenha decidido, por meio do Ministério do Meio Ambiente, que coordena esse esforço, junto com o MCTI, elaborar um Plano Clima que integre esforços de adaptação e de mitigação, porque não dá para separar essas coisas. Então, é muito importante, porque existem sinergias e conflitos também, muitas vezes, entre as ações planejadas, tratar desses elementos de forma integrada.
Eu queria deixar esse recado, Deputado Tarcísio Motta, falando mais uma vez da minha alegria de estar aqui, e agradecer o convite.
Eu falei para o Deputado aqui que a minha filha, de 18 anos, lá no Rio, é uma fã incondicional do Deputado Tarcísio. Ela acabou de passar agora no vestibular para o curso de direito da UERJ e vai continuar lá sendo sua admiradora.
Eu queria agradecer a oportunidade e dizer que, sim, estou à disposição desta Comissão e deste esforço parlamentar para tornar realidade essa agenda tão importante de prevenção e controle de desastres naturais, antropicamente induzidos, causados por uma ocupação irregular de áreas de risco, que passa por desenvolvimento urbano e regional, passa por investimentos em prevenção de risco.
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O meu colega e amigo Gustavo Luedemann, que está aqui, do IPEA, também faz parte conosco da Rede Clima já há muitos anos e sabe, tão bem quanto eu, que a Rede Clima tem o papel de fazer essa ponte, essa interlocução entre a academia e as políticas públicas, não só com o Executivo, mas também com o Legislativo.
Então, coloco-me à disposição para que possamos continuar desenvolvendo esse trabalho.
Tive a alegria de encontrar aqui um velho amigo Consultor Legislativo, o Maurício Boratto, que fez o doutorado dele comigo lá na UnB há muitos anos.
Então, estamos juntos e espero continuarmos juntos por muito tempo.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Tarcísio Motta. Bloco/PSOL - RJ) - Muito obrigado, Prof. Saulo, pelas suas contribuições.
Passo a palavra, então, para o Gustavo Luedemann, que é do IPEA e também é cientista do IPCC.
Se tiver mais alguma coisa para orientar a sua própria apresentação, fique à vontade.
O senhor tem 20 minutos para as suas contribuições.
O SR. GUSTAVO LUEDEMANN - Muito obrigado, Deputado Tarcísio.
Infelizmente, eu tenho que retificar a mesma coisa também. Não fui indicado para ser membro do IPCC. Fica a dica.
O SR. PRESIDENTE (Tarcísio Motta. Bloco/PSOL - RJ) - Deixe-me só esclarecer uma coisa: nós encaminhamos um pedido, e o Ministério, o MCTI, encaminhou o nome dos senhores como representantes, no e-mail, informando que eram do IPCC. Por isso, estamos reproduzindo a informação vinda.
Daqui a pouco falará, ele está pelo Zoom, o Prof. Alexandre Araújo Costa. Ele com certeza é membro do IPCC e poderá falar também a respeito disso.
O MCTI acabou indicando o nome dos senhores, claramente por conhecerem o tema, mas o e-mail acabava dando a entender que os senhores eram cientistas do IPCC. Por isso, nós os estávamos aqui nominando dessa forma.
É claro que os senhores podem corrigir tranquilamente essa situação.
O SR. GUSTAVO LUEDEMANN - Não tem nenhum problema. Agradecemos a ideia da indicação. O que eu acredito que tenha ocorrido, na verdade, é que, como somos ambos da Rede Clima, confundiram o IPCC com a Rede Clima.
Agradeço muito a palavra, parabenizo pela iniciativa da criação da própria Comissão. Fico feliz porque o Prof. Saulo já adiantou muito do que precisamos falar sobre o tema.
O que eu pensei foi em organizar, talvez, alguma informação para que pensemos de maneira bem prática em tomada de decisão e, dentro do Governo também, no entendimento do papel de cada agente público.
O IPCC ensina, com base na produção científica que acontece em todo o globo, que os impactos observados pelas mudanças climáticas — o risco de eles ocorrerem ou a probabilidade de eles acontecerem — dependem, primeiramente, do próprio clima, que é um sistema bastante caótico e de difícil previsibilidade, como o Prof. Saulo já pontuou; dos perigos do próprio clima, mesmo que naturalmente haja uma variabilidade grande; e do clima alterado pelo aumento da concentração de gases de efeito estufa, principalmente por queima de combustíveis fósseis, mas também por outros motivos, como pelo uso do calcário, pelo desmatamento e pela queima de material biológico.
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A exposição a esses riscos deve ser levada em consideração, e, por isso, é muito importante o investimento em ciência e tecnologia, para que consigamos aprimorar cada vez mais a nossa previsibilidade espacialmente distribuída, para que saibamos onde há maior risco, onde há probabilidade da frequência de determinados eventos extremos ocorrerem. E, com base na possibilidade de sabermos se estamos expostos ou não a essas ameaças, precisamos entender as nossas vulnerabilidades. Em se tratando da qualidade da construção, no Brasil, existe uma situação nas periferias de autoconstrução, não necessariamente com a aplicação da ciência da engenharia civil e da arquitetura. A situação de saúde é uma situação de vulnerabilidade. Precisamos saber se a população está sendo atendida no sistema de saúde de maneira a que ela não se torne uma população de risco para determinados tipos de eventos climáticos.
Em eventos climáticos, estamos pensando lato sensu, naquele que decorre indiretamente da mudança climática. Quando falamos de saúde, pensamos também na mudança da distribuição geográfica de vetores de doença, como estamos observando agora no mundo inteiro. Por exemplo, a dengue está ocorrendo em localidades onde nunca ocorreu, e assim tem sido com várias outras doenças devido ao deslocamento dos vetores ou, às vezes, ao próprio agente em si encontrar uma situação propícia onde antes o clima não favorecia.
Então, precisamos atuar com política pública em cima da exposição. Precisamos evitar que a população viva, como o Prof. Saulo já citou inclusive, em localidades geográficas onde há riscos de desabamento em caso de chuvas fortes, não tendo, justamente nas encostas, pessoas morando em habitações que eventualmente não toleram o deslizamento de terra, não toleram o acúmulo de água. A população viver em área de risco é um exemplo clássico de vulnerabilidade, mas há vários outros.
Para atuar nisso, precisamos entender que, para a questão de aumentarmos a resiliência, é preciso chamar à responsabilidade os Municípios. E, quando falamos em responsabilidade dos Municípios, precisamos pensar também no lado financeiro, em como ele pode financiar a redução da sua vulnerabilidade. Então, há uma necessidade de concertação entre os diferentes entes da Federação. Precisamos entender, quando vamos tratar de orçamento, por exemplo, que é importante que o Município tenha os recursos orçamentários necessários para reduzir a sua vulnerabilidade, mas, ao mesmo tempo, também é necessário que haja uma coordenação desse orçamento para sabermos quais são os Municípios mais vulneráveis, quais são os Estados que vão sofrer mais, estão no momento mais vulneráveis e, nesse momento, precisam de um investimento maior em infraestrutura, por exemplo, para que reduzamos o risco desses impactos.
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Então, é muito importante, quando tratarmos da questão de adaptação, de resiliência, lembrarmos a necessidade de tratarmos disso nos diversos entes federativos. Sabemos que o Executivo tem a Câmara Técnica de Desenvolvimento Econômico Sustentável e Mudança do Clima, que já foi instalada. Mas a questão de orçamento, por exemplo, passa também pelo Legislativo. Então, o Legislativo precisa pensar nessa arquitetura de como tratamos disso, uma vez estudadas as prioridades.
Eu vou abrir um parêntese aqui rapidinho. Antigamente, era muito difícil investir em adaptação, não é, Saulo? Não sabíamos... Os modelos do IPCC davam prováveis mudanças lato sensu e em áreas geográficas muito extensas. E o que os cientistas brasileiros fazem, e fazem isso com excelência, é gerar modelos — há modelos brasileiros — e gerar o que chamamos de downscaling para conseguir enxergar as regiões brasileiras e tentar entender o que acontece. Ocorre que na ciência climática, até pouco tempo atrás, os modelos climáticos eram extremamente complicados. E havia modelos, que sempre derivam de algum modelo anterior, que davam, por exemplo, no Semiárido, previsões de maior seca, enquanto outros davam previsões de enxurradas muito grandes, e os dois não conversavam. Os outputs dos modelos ainda não eram muito compatíveis. Mas isso já foi superado. A ciência climática avançou muito da última década para cá.
O Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, só para dar um exemplo, já tem um instrumento muito interessante para os gestores municipais que se chama AdaptaClima. Ele tem uma sobreposição de dados, e há diversos dados sobre os eventos climáticos prováveis em cenários futuros e as vulnerabilidades. Ainda é um pouco precária a base de dados, mas eu acho que o grande salto foi dado. Existe essa plataforma, e eu tento botar algumas pessoas do IPEA que também trabalham com dados de vulnerabilidade espacial em contato com essas pessoas.
O que eu quero dizer com isso é que já existem mecanismos, que a ciência está evoluindo de maneira que já podemos fazer a política pública e que as decisões políticas já podem ser tomadas de maneira a trabalharmos com investimento em redução da vulnerabilidade, diminuindo a exposição ao risco das populações vulneráveis.
Então, era essa a minha contribuição por hora. Espero poder contribuir na discussão também.
O SR. PRESIDENTE (Tarcísio Motta. Bloco/PSOL - RJ) - Muito obrigado, Gustavo.
Passamos, então, a palavra, pelo Zoom, espero que esteja nos escutando, ao Prof. Alexandre Araújo Costa, Cientista do IPCC — agora eu acho que acertamos. Ele vai fazer uso da palavra também por 20 minutos.
O Prof. Alexandre Araújo Costa eu conheço de longa data e já contribuiu bastante inclusive em algumas das reflexões que fizemos de base lá no Rio de Janeiro, quando presidi uma CPI sobre as enchentes no Rio de Janeiro. Gostaria muito de agradecer pela participação ao Prof. Alexandre Araújo Costa.
Tem a palavra o Prof. Alexandre, por 20 minutos.
A SRA. ALEXANDRE ARAÚJO COSTA - Caro Deputado Tarcísio, eu queria só saber se seria possível fazer uma inversão com a minha colega Luciana Gatti.
O SR. PRESIDENTE (Tarcísio Motta. Bloco/PSOL - RJ) - Sem problemas, professor!
A SRA. ALEXANDRE ARAÚJO COSTA - Eu falarei em seguida.
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O SR. PRESIDENTE (Tarcísio Motta. Bloco/PSOL - RJ) - Ótimo, Alexandre! Tranquilo!
Então, passamos primeiro a palavra à Sra. Luciana Gatti, pesquisadora do INPE e acadêmica do IPCC, para usar da palavra por até 20 minutos.
A SRA. LUCIANA VANNI GATTI - Primeiro, eu queria dizer que é um prazer muito grande estar aqui. Eu solicitei essa mudança porque vai parar na frente da minha casa o caminhão de mudança da minha filha, e ela se atrasou, e eles não vão saber onde botar as coisas dela. Por isso, eu pedi para fazer essa troca.
Vou aproveitar para me desculpar. Eu queria muito estar aí com vocês, porque o assunto é de extrema importância. Eu acho que é, no mínimo, nossa obrigação contribuir e compartilhar com vocês o que temos aprendido. Então, foi essa a razão de eu não ter ido, mas eu prometo estar disponível para outras conversas, outras contribuições.
Eu queria compartilhar a minha tela com vocês. Eu fiz uma apresentação e quero compartilhar com vocês o que temos aprendido a respeito das mudanças climáticas por meio da Amazônia.
(Segue-se exibição de imagens.)
Eu sou a Luciana Gatti, cientista do INPE. Coordeno o Laboratório de Gases de Efeito Estufa no INPE e sou especializada em fazer coleta com avião na Amazônia para os gases de efeito estufa. Daquele artigo de 2021, que diz que a Amazônia passou a ser fonte de carbono, eu sou a primeira autora. Nós já temos três artigos em função desse projeto. E isso vem nos possibilitando entender muito não só sobre a Amazônia, mas também por que o nosso mundo está colapsando em termos de clima dessa maneira.
Vejam que eu deixei aqui meus dois e-mails e meu telefone. Coloco-me à disposição e a serviço dos senhores. Acho que a ciência está aí para servir a sociedade.
Cada barra dessa representa 1 ano das emissões de carbono da Amazônia. Quando eu falo carbono, refiro-me ao carbono que está no CO2, que é o dióxido de carbono. Vocês veem que há uma variabilidade enorme. Nós começamos tentando entender como esse clima funciona: por que tanta variedade? Por que em 1 ano a Amazônia emite tanto carbono e, em outro ano, não chega a emitir nada, até absorve um pouco? Aí nós corremos atrás para tentar entender isso.
No primeiro gráfico, nós vimos essa discrepância enorme entre 2010 e 2011 e entendemos que o clima tem um impacto gigante na Amazônia. No segundo, foi quando nós já tínhamos 9 anos e aí pudemos entender essas correlações. No terceiro, foi quando o desmatamento cresceu muito no Brasil e quisemos entender o impacto desse crescimento na Amazônia.
Eu vou falar desse artigo de 2021, que teve um impacto gigantesco não só nacionalmente, no Brasil, mas internacionalmente. Aqui vocês veem que esse artigo é o número 7 na revista Nature. A revista Nature está entre as quatro revistas científicas de maior impacto da ciência. E nós temos que nos vangloriar disso, porque uma cientista brasileira é a primeira autora. Isso quer dizer o seguinte: nós fizemos a ciência; nós somos líderes dessa ciência. Isso é importante, e nós temos que ter orgulho disso. No Brasil, faz-se ciência de primeiro mundo. E eu vou falar dos aprendizados, principalmente, desse artigo.
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O que nós aprendemos aqui é uma sequência de mais de mil coletas, usando avião na Amazônia ao longo desse período. O aviãozinho vai a esses quatro pontos. Vocês estão vendo cinco, porque começou mais a oeste. Em TAB, o aviãozinho sofreu um acidente. Aí, passou a ser TEF. O avião começa em cima e coleta em várias alturas. Depois, nós podemos calcular as emissões de carbono, ou metano, ou N2O, ou CO.
Esse é o jeitão do perfil vertical, como nós o chamamos, que é essa coleta em várias alturas. Acima de zero, nós estamos falando de emissão. Abaixo de zero, nós estamos falando de absorção, remoção de carbono da atmosfera. E vocês podem ver que, nessas quatro regiões, quando vamos lá para o resultado, a resultante, infelizmente, é positiva, fala que a Amazônia virou uma fonte de carbono.
Vamos entender bem isso. Nós estamos coletando no ar, na atmosfera. Então, aqui eu não estou falando só da floresta. Nós estamos falando da floresta e de todas as ações humanas que estão na Região Amazônica. E, quando nós fazemos esse perfil vertical, ele representa toda a área que atmosfera passou, antes de chegar lá, são essas manchinhas. Quanto mais escuras, mais para o vermelho, mais essa área está representada nesse resultado que nós coletamos.
Agora, eu queria chamar atenção para o seguinte: para as quatro grandes áreas que temos. Vamos chamá-las de nordeste, sudeste, noroeste e sudoeste. Se você olharem esses números, verão: nordeste, 0,41 — para cada metro quadrado, ali é emitido por dia 0,41 grama de carbono; sudeste, 0,32; sudoeste, 0,03; e sudoeste, 0,05. O que isso quer dizer? Que há uma discrepância gigantesca entre uma região e outra da Amazônia. Por quê?
Essa foi a grande pergunta que nós percorremos. E nós fomos aprender como esse clima funciona, o que está acontecendo com este planeta que está ficando doido.
Bom, a primeira coisa que começou a nos dar luz: nós calculamos quanto cada área estava desmatada. Essa que mais emite já foi 37% desmatada, até dezembro de 2018; agora, 38%. Essa aqui foi desmatada 28%, é a segunda que mais emite. Essa aqui, que está quase neutra, quase a floresta consegue compensar tudo o que as emissões humanas jogam na atmosfera. Mas vejam que o desmatamento é bem menor. Ele é menos da metade do que o desmatamento lá na região nordeste da Amazônia, e aqui também.
Vamos lembrar o nosso Código Florestal? Vinte por cento é o percentual mágico dele. Vejam, nesse cenário, quanta sabedoria há nos 20%! E nós estamos extrapolando os 20%, e esse é todo o nosso problema. E não adianta dizer: "Em média, a Amazônia está nos 20%". Está, mas a natureza não tem essa de média. O lado leste da Amazônia tem uma parte que está quase 40% desmatada e outra parte que está quase 30%. Isso quer dizer o seguinte: essa parte já está funcionando de maneira doente. Nós já estamos vendo consequências terríveis, e isso está influenciando já todo o resto da Amazônia e o resto do Brasil. Bom, isso aqui é só para vocês verem que, de um ano para outro, há uma variabilidade enorme. E nós fomos atrás de estudar isso. Perguntamos o seguinte: quanto a Amazônia mudou nos últimos 40 anos? Nós calculamos, em termos de chuva e em termos de temperatura, quanto a Amazônia mudou nos últimos 40 anos.
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Aqui, nós estamos falando da chuva. As linhas pretas são o quanto chove acumuladamente, somando tudo no ano, em todas essas quatro regiões. Vejam que o preto está reto em todas, exceto, na SAN, que é o nordeste da Amazônia.
Essa região que está quase 40% desmatada perdeu chuva o ano inteiro. O azul é a chuva na estação chuvosa. Até na estação chuvosa, ela perdeu chuva. E o resto, que está abaixo de 37%, perdeu chuva na estação seca.
Então, vamos olhar só a estação seca. Nesse pontinho, nessa linha tracejada, se chove menos do que 100 milímetros em 1 mês, a região é considerada estação seca; se chove mais, é considerada estação chuvosa.
Vejam que no lado que está com o desmatamento em quase 40%, durante 3 meses — agosto, setembro e outubro —, chove não mais do que 42 milímetros. Vamos relembrar que nós estamos falando de uma floresta tropical úmida. Como é que pode chover apenas quarenta e poucos milímetros por mês. As árvores já estão doentes, não funcionam mais de forma igual. Isso não é clima de uma floresta tropical úmida.
A área que está 28% desmatada já perdeu 24% da chuva. Atualmente, está chovendo em torno de sessenta e poucos milímetros, o que ainda não é muito, não. E o problema não é só que está chovendo pouco. A estação seca está ficando cada vez mais longa. Como chove pouco, atrasa o começo da estação chuvosa. Esse período de extremo estresse está cada vez maior, mais prolongado, levando as árvores mais sensíveis à morte. Isso não é só porque nós desmatamos, mas é também porque estamos matando o clima da Amazônia. Então, elas também estão morrendo por falta de condição climática de sobreviver lá.
No lado oeste, que está menos de 20% desmatado, vejam como a condição é completamente diferente. No noroeste, quase não há estação seca. Vocês estão vendo que, recentemente, começou a vir um pouquinho abaixo de 100 milímetros. Então, mesmo sendo uma estação seca, essa não é uma condição de estresse. Vamos lembrar que ele está só 16% desmatado. Aqui para baixo, no sudeste da Amazônia, que está 17% desmatado, chove mais de 90 milímetros na estação seca. Agora, por que perdeu 20% de chuva? Apesar de ter perdido 20% de chuva, ainda há uma quantidade razoável. Mas por que perdeu tanto? Porque a chuva vem do lado leste. A chuva entra pelo oceano na Amazônia — daqui a pouco eu falo dos rios voadores. Como está muito desmatado no início, já está chegando menos chuva lá. Vou voltar a falar disso. E agora vamos falar da temperatura, que também está subindo. Vamos olhar só durante a estação seca, que é o pior de tudo?
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Olhem quanto subiu a temperatura nos últimos 40 anos em cada uma dessas regiões. Vejam que a região sudeste é a pior região, onde já subiram 2,5 graus, só que isso é uma média de 90 dias, agosto, setembro e outubro. Eu não estou falando da temperatura máxima no pico do dia. Já foi medida, na altura da copa das árvores nessa região, uma temperatura de 50 graus. Como é que uma árvore de uma floresta tropical úmida vai sobreviver a 50 graus? Ela, no mínimo, para de fazer fotossíntese e hiberna, esperando chover e a temperatura amainar, e, se isso se prolonga muito, morre.
Deem uma olhada nisso. Na verdade, esse aumento nem é mais linear. O que quer dizer isso? Que o aumento da temperatura está andando cada vez mais rápido, ele está acelerando. Se pegarmos quanto a temperatura aumentou em 40 anos, quanto ela aumenta a cada ano, e compararmos os últimos 20 anos, veremos que o aumento é de 50%. Isso é o tal do ponto de não retorno chegando, gente! A Amazônia está em situação de emergência. No sudeste da Amazônia deveriam decretar estado de emergência, proibir qualquer desmatamento e fazer um esforço gigantesco de recuperação de áreas florestais para não perdermos o resto da Amazônia.
Agora eu queria explicar o que o desmatamento tem a ver com essa condição. Por que a Amazônia está nessa condição? Imaginem que o sol esquenta o oceano, o oceano evapora vapor de água, e esse vapor de água vai entrando na Amazônia. Imaginem que há um monte de caixa d'água cheia, uma atrás da outra, entrando na Amazônia, e há um chuveirinho embaixo de cada caixa d'água, só que esse chuveirinho está lá chovendo, então a caixa d'água está esvaziando. Quem enche essa caixa d'água? Ela é enchida em 50% com a própria vaporização das árvores da Floresta Amazônica.
A Floresta Amazônica joga na atmosfera quase a mesma quantidade de água que o Rio Amazonas joga no oceano por dia. O Rio Amazonas joga no oceano o equivalente a 20% de toda a água doce do planeta. É muita água! Nós estamos falando de um chafariz gigantesco. É um Rio Amazonas sendo jogado na atmosfera por dia! Isso faz toda a diferença no clima, toda. Por quê? Porque, para a água sair do estado líquido — ela está no solo em estado líquido —, a raiz da árvore pega aquela água e joga na atmosfera na forma de vapor. A água, para sair do estado líquido e ir para o de vapor, precisa receber energia na forma de calor. Não pomos a água no fogo para ferver? Se não a pusermos no fogo, ela não ferverá! Então, na atmosfera, ela rouba calor de onde ela está. Por isso, quando você está num bosque, num parque, é mais fresco. E não é só por causa da sombra da árvore, é por esse processo em que a árvore joga vapor de água na atmosfera. Então, as árvores estão fazendo chuva e reduzindo a temperatura. Na medida em que se desmata, reduz-se a chuva e aumenta-se a temperatura. E, como o lado mais desmatado da Amazônia é bem nesse início da Amazônia, o Estado do Pará, o Estado do Mato Grosso, está chegando menos chuva aos Estados do lado oeste e, em consequência, a todo o resto do Brasil. Nós estamos falando do nosso centro e do Sudeste, que são as áreas com o maior setor da agricultura, que já está tendo prejuízos com a redução de chuva, e não só com a redução de chuva, mas também com o aumento de eventos extremos. E o que a Amazônia tem a ver com isso? Imaginem essa massa de água evaporando todo santo dia e resfriando a atmosfera. Gente, isso é como um airbag climático, o que quer dizer o seguinte: isso nos protege contra as mudanças climáticas. Na medida em que estamos tendo um desmatamento acelerado nos últimos anos, o que está acontecendo? Estamos perdendo a nossa proteção contra as mudanças climáticas. Então, não se está só reduzindo a chuva, mas também está aumentando o número dos eventos extremos no Brasil. Olhem essa figura a respeito do desmatamento, que foi crescendo a cada Governo que tivemos. Vamos ver como vai ser o próximo, temos 1 ano.
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E eu queria mostrar a vocês esse cenário. Esse gráfico maior, embaixo, é o quadro do desmatamento na Amazônia. E, aqui em cima, nesse quadrinho, há o número de mortes por eventos extremos. Vocês estão vendo que são muito semelhantes? Nós aceleramos o desmatamento no Brasil nos anos 2019, 2020, 2021 e 2022. E o aceleramos não só na Amazônia, mas também no Cerrado, no Pantanal, nos Pampas, na Mata Atlântica, em todos os ecossistemas, por isto: "Vamos vender soja, vamos vender carne. Olhem a oportunidade na economia!" E estamos aumentando o número de perdas de vida no Brasil. Se não entendermos o que estamos fazendo de errado para acelerar os eventos extremos no Brasil, poderemos ter o dinheiro que for, moçada, que vai cada vez mais morrer gente, e nós só estaremos enxugando gelo. Temos que entender o que estamos fazendo. Precisamos saber que dinâmica é esta. Temos que ter uma ação efetiva para minimizar as mudanças climáticas e os eventos extremos. Eu vou passar mais rapidamente os eslaides, por causa do tempo.
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O SR. PRESIDENTE (Tarcísio Motta. Bloco/PSOL - RJ) - Fique tranquila. Você acha que consegue encerrar em 5 minutos?
A SRA. LUCIANA VANNI GATTI - Sim, Presidente. Vamos lá!
Eu ia dizer que, no mundo inteiro, as maiores emissões vêm da queima de combustível fóssil, de onde tiramos a energia no planeta. Isto aqui é a média dos últimos 10 anos: 88% dos gases de efeito estufa que vão para a atmosfera decorrem da queima de combustíveis fósseis: carvão, petróleo e gás natural fóssil. Por favor, não entendam gás natural como algo que não faz mal. Ele é natural lá embaixo, nas profundezas, mas aqui ele é a terceira fonte de gás de efeito estufa na atmosfera.
O Brasil, por causa da privatização da ELETROBRAS, está fazendo um giro para construir uma termoelétrica a gás natural fóssil, uma atrás da outra. Isso vai completamente na contramão daquilo que temos que fazer. Nos outros 12%, nós tínhamos uma floresta, um ambiente natural, nós desmatamos e pusemos outra coisa no lugar.
Eu queria dizer que aqui temos três cenários. Vocês podem ver que aquele cor-de-rosa é o pior deles: representa o aumento de temperatura. A vida vai ficar para lá de difícil, senão impossível. Esta linha preta mostra a realidade. Vocês podem ver que estamos piores do que o pior cenário? Apesar de tudo o que sabemos, nada muda. A cada ano, a humanidade está emitindo, o tempo inteiro, mais gás de efeito estufa do que no ano anterior. O que está faltando acontecer?!
Eu queria falar para vocês deste cenário. Aqui temos a temperatura média diária da superfície de todos os oceanos. Este monte de pequenas linhas representa, em cada ano, qual foi a temperatura: às vezes mais, às vezes menos, alta. Em laranja, a temperatura no ano passado. Primeiro, começou em janeiro, subiu, subiu. Em abril, descolou, e estamos presenciando aumentos de temperatura nos oceanos como nunca vimos antes.
Vejam a linha preta lá em cima. Ela representa o que aconteceu neste ano. Está pior ainda! Dá para dizer que o colapso climático ainda não começou? Desculpem, não dá para dizer isso, porque o que nós estamos vendo parece estar incontrolável, parece estar escapando das mãos. O negócio está esquentando, esquentando e esquentando!
Aqui temos outro cenário. Vemos como está a distribuição de temperatura em cada canto destes oceanos. Há lugares mais frios e lugares mais quentes. Quanto isso está normal? Está acima do que era? Está abaixo do que era?
Isto aqui é o que chamamos de anomalia. Vamos pegar a média de 30 anos. Não podemos comparar com o ano anterior — tem que ser a média de 3 décadas para trás. Pegue cada cantinho do planeta e o compare com essa média. Do branco para o vermelho, está acima do que era; do branco para o azul, está abaixo do que era.
16:03
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Vocês estão vendo que há regiões mais quentes e outras mais frias? E vocês também estão vendo que há muitas regiões muito mais quentes?
Todos vocês muito provavelmente escutaram muito falar do El Niño no ano passado. Parecia que toda a culpa era do El Niño. Desculpem-me, isso foi falta de informação de quem deu as notícias. A culpa é de todo o planeta. Vejam como todos os oceanos acima do Equador estavam mais quentes. O El Niño fica nessa faixa do Oceano Pacífico, na região do Equador. Realmente, está muito mais quente, mas não é só isso! Todos os oceanos para cima do Equador estão muito mais quentes.
Na Amazônia, chove menos, sob a influência do El Niño. Chove menos na Amazônia quando as temperaturas de todo o Oceano Atlântico Norte também ficam mais quentes. Os dois fatores aconteceram no ano passado. E há o desmatamento na Amazônia, que está fazendo chover menos. Então, tivemos três grandes fatores que contribuíram para assistirmos ao que foi o ano passado. Detalhe, pode ser que este ano seja pior, porque a previsão é de que o El Niño seja pior este ano. Eu não sei, eu não trabalho nessa área de previsões.
Eu queria mostrar outras épocas para vocês. Eu estava falando de 27 de agosto do ano passado.
Aqui eu já mostro como está agora, em 16 de fevereiro, e parece que todo o Oceano Atlântico Norte e Sul está mais quente.
E aqui, no dia 26 de novembro, foi quando começou a esquentar no Oceano Atlântico Sul. Vejam que mancha intensa há perto da África, entre o Brasil e a África. São esses processos de uma região muito mais quente com uma região que está mais fria que fazem ter tornados, que fazem ter esses grandes sistemas e que causam essas chuvas enormes.
Esta imagem mostra a temperatura de todo o globo.
Eu queria falar para vocês por que os eventos extremos estão aumentando.
Essa é a distribuição da temperatura, mas vejam aqui nesse mapa que há uma anomalia de temperatura. Foquem no Brasil, a Região Sudeste e o centro do Brasil estão muito mais quentes do que o normal. O resto está todo mais quente, só que está em febre. Passamos por uma onda de calor terrível, que levou um monte de gente à morte.
Agora, vejam que o Sul do Brasil, o Uruguai, o Paraguai, a Argentina estão mais frios. Vejam no oceano como há regiões mais quentes e mais frias. A Antártica está muito mais quente. Essas diferenças de temperatura...
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Tudo o que faz mover, no Planeta Terra, é diferença de temperatura. Se uma pessoa fuma, a fumaça não sobe? Por quê? Porque em cima está mais frio. Quanto mais nós temos diferença de temperatura, mais ocorre evento extremo. Nós estamos fazendo umas regiões do planeta ficarem com uma temperatura mais baixa, outras com uma temperatura muito mais quente, e então ocorrem esses tornados, ocorrem esses grandes eventos.
Eu queria entrar nas sugestões.
Número 1, reduzir as emissões de gases de efeito estufa.
Número 2, resfriar a superfície das áreas rurais e urbanas. Vamos pensar no que eu acabei de falar: quanto mais a superfície está quente, mais essa região vai atrair um evento extremo.
Número 3, continuar o monitoramento, o estudo da Amazônia e de outros ecossistemas.
Aqui está o cenário. Como o nosso colega do SEEG vai falar, eu vou pular.
Então, vamos lá.
Em primeiro lugar, como reduzir emissões? Reduzindo o desmatamento, não só na Amazônia, mas também no Cerrado; reduzindo a produção de petróleo; e não construindo termoelétricas. Esse é o principal cenário no Brasil.
Em segundo lugar, como resfriar as superfícies das áreas rurais e urbanas? Reflorestar, reflorestar e reflorestar, mas não com eucalipto e pinos; reflorestar com espécies daquela região, porque são aquelas árvores que conseguem fazer aquele sistema funcionar. Observem como os Estados que mais estão sofrendo eventos extremos são Rio Grande do Sul, Bahia, Espírito Santo. Essas regiões têm um monte de eucalipto plantado, pinos, e estão se transformando num enorme celeiro de soja e pastagem. Nós precisamos resgatar uma parte do ecossistema para minimizar a temperatura, para ela poder dar uma refrescada.
O SR. PRESIDENTE (Tarcísio Motta. Bloco/PSOL - RJ) - Luciana, se você puder acelerar a conclusão, por favor, porque senão vamos estourar o tempo.
A SRA. LUCIANA VANNI GATTI - Estou finalizando.
E, também, clarear a superfície: pintar tetos das casas de branco, porque são as áreas urbanas as que têm os maiores eventos. Por quê? Por causa das ilhas de calor. Então, é preciso plantar árvore e pintar os tetos de branco, as paredes, o chão. Temos que clarear a superfície para não absorver tanto calor.
Em terceiro lugar — tudo que eu estou aqui contando para vocês eu aprendi nesse estudo na Amazônia, eu sou uma química, e nossos recursos estão terminando este ano; a Amazônia está mudando, e nós estamos muito perto de perder a Amazônia —, eu queria propor a continuação do monitoramento, o estudo da Amazônia, e começar no Cerrado também, através de uma emenda parlamentar. Eu queria propor o financiamento de uma rede de monitoramento de gases de efeito estufa na Amazônia e em outros ecossistemas — para mim, o segundo teria que ser o Cerrado; o terceiro, o Pantanal. Precisamos expandir a rede para os demais ecossistemas com perfis de avião e torres.
Era isso. Desculpem-me a enorme exposição, mas é difícil falar, em 20 minutos, como é que nós estamos caminhando para o fim do mundo e o que podemos fazer para evitar o fim do mundo. Contem com a ciência.
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Acho que não há trabalho mais importante que eu faça hoje. Nós estamos falando do direito à vida. As pessoas estão morrendo, as pessoas vão morrer cada vez mais, porque os eventos extremos serão cada vez maiores e mais frequentes.
Não há dinheiro para mitigar que vai dar certo. Nós temos que reduzir o estrago que estamos fazendo, porque nós estamos acelerando os eventos extremos. Então, se nós não só pararmos de acelerar como ainda se reflorestarmos uma parte, não temos esperança. Nós estamos enxugando gelo.
Obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Tarcísio Motta. Bloco/PSOL - RJ) - Nós é que agradecemos, Luciana. São palavras e análises duras, difíceis, mas que precisamos, sem sombra de dúvida, escutar e ficar cada vez mais alertas. Muito obrigado.
Queria registrar a presença do Deputado Jorge Goetten, que está aqui conosco. Passou por aqui, pelo que vi, a Deputada Fernanda Melchionna. E, se por acaso mais algum Parlamentar tiver chegado aqui e não tiver sido registrado ainda, peço que encaminhe para a Mesa.
Vou passar a palavra para o Sr. Alexandre Araújo Costa, também cientista do IPCC, para sua exposição de 20 minutos.
O SR. ALEXANDRE ARAÚJO COSTA - Boa tarde, Tarcísio. Boa tarde a todos da Mesa.
Eu vou tentar compartilhar com vocês uma apresentação.
(Segue-se exibição de imagens.)
Eu sou professor da Universidade Estadual do Ceará, sou físico de formação, com doutorado em ciências atmosféricas pela Colorado State University, pós-doutorado pela Yale University; fui um dos autores principais do primeiro relatório de avaliação do Painel Brasileiro de Mudanças Climáticas, mas, veja só, eu ainda estou esperando ver se meu nome entra eventualmente como cientista do IPCC. Quero dizer com bastante tranquilidade, o IPCC me representa do ponto de vista científico.
Vamos falar então de eventos extremos, mas eu não queria falar apenas como cientista, eu queria falar como pai dessa futura oceanógrafa, a Bárbara, desse cara que faz sistemas e mídias digitais na universidade, que é o Arthur, e dessa pessoinha pequena de 4 anos de idade chamada Ana Greta — Greta, obviamente, numa reverência e referência a Greta Thunberg.
É preciso entender que temos um sistema físico por trás do processo de alteração climática. O equilíbrio do clima de qualquer planeta depende da equivalência dos fluxos de energia que entra e que sai. Nós estamos basicamente, especialmente a partir da Revolução Industrial, perturbando esse equilíbrio.
Nós estamos jogando na atmosfera quantidades gigantescas de dióxido de carbono, através da queima de combustíveis fósseis, de desmatamento, da produção de cimento e outras fontes, aliado a outros gases de efeito estufa que muitas vezes não são mencionados. É o caso do metano, largamente emitido na forma de emissões fugitivas nas operações de petróleo e gás e na forma de fermentação entérica através dos enormes rebanhos e animais ruminantes e também da decomposição de resíduos; além do óxido nitroso, subproduto de atividades agropecuárias e de gases halogenados usados na indústria, mas também na propulsão e refrigeração.
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O resultado dessas atividades: como são gases que reagem quimicamente de forma muito lenta, levam um tempo muito longo para serem absorvidos pelo sistema terrestre, esses gases se acumulam. É como se você pegasse todo o lixo da sua casa e simplesmente jogasse em algum cômodo. A consequência é que esses gases se acumulam e permanecem lá na atmosfera, ao ponto de nós hoje termos 50% a mais de CO2, duas vezes e meia a mais de metano e mais de 30% a mais de óxido nitroso do que tínhamos, por exemplo, em 1800.
Isso muda as propriedades físicas do planeta. Hoje, nós temos uma atmosfera que retém muito mais calor, que bloqueia uma fração muito maior da quantidade de calor que a princípio seria emitida para o espaço e, portanto, garantiria o equilíbrio climático do planeta.
Esse desequilíbrio climático é tão grande, é tão grande, que equivale a pegar a energia da explosão de 21 bombas de Hiroshima por segundo e armazenar essa energia toda. Não é à toa que essa quantidade formidável de energia está alterando o centro hidrológico, aumentando as temperaturas globais, como nós veremos, multiplicando eventos extremos, dilatando os oceanos e derretendo geleiras. É uma física básica.
São inéditas essas mudanças em uma escala de tempo geológica. Em 800 mil anos, a Terra sofreu mudanças climáticas oscilando entre estados mais frios, as chamadas glaciações, e períodos mais quentes, os chamados interglaciais. Mas isso sempre se deu com a concentração de CO2 oscilando entre, grosso modo, 170 e 300 partes por milhão. Hoje nós estamos com 420 partes por milhão de CO2 na atmosfera. Quantidade equivalente a essa só se viu há cerca de 3,5 milhões de anos, no mínimo. Há 3,5 milhões de anos, o planeta era 3 graus mais quente, praticamente sem calota polar no hemisfério norte, e com um manto de gelo da Antártica muito menor do que é hoje, e, em consequência, com oceanos de 15 a 20 metros acima dos níveis atuais.
Essa atmosfera, com essa composição química atual, é uma verdadeira máquina do tempo, em termos de temperatura, em termos de características dos oceanos, e em termos de distribuição de gelo, em escala planetária.
É preciso que observemos também a velocidade desse processo. Falamos de adaptação, e, evidentemente, precisamos adaptar a nossa sociedade e as nossas infraestruturas, mas eu queria que pensássemos também que nós não estamos sozinhos neste planeta, nós compomos uma biosfera, e é preciso pensar também na capacidade de adaptação dessa biosfera toda, da qual somos parte, da qual dependemos, e não existe possibilidade de isso ser feito com o ritmo atual dessas mudanças.
O que eu estou mostrando aí nesse eslaide é basicamente o seguinte: é uma comparação da mudança climática atual, essencialmente o que acontece no canto superior direito do gráfico, é uma mudança praticamente vertical, 1,2 graus Celsius na escala de 1 século, em comparação com a última grande mudança climática natural que o mundo sofreu, que foi a saída da glaciação, iniciada há 23 mil anos e completada há 11.700 anos, no começo do que convencionamos chamar de Holoceno.
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O mundo precisou de cerca de 10 mil anos para aquecer 4 graus Celsius. Hoje, nós temos potencial, a depender do grau de irresponsabilidade da atual geração no poder, de produzir um aquecimento dessa magnitude em 1 século. Hoje, essa mudança climática é 30 vezes mais rápida do que a última grande mudança climática natural. Ela pode vir a ser 100 vezes mais rápida.
E esse processo, obviamente, é amplificado por vários feedbacks naturais, por vários processos que amplificam a contribuição, a perturbação antrópica, a perturbação introduzida pelas atividades humanas no sistema climático. Isso torna todo o processo muito mais perigoso. É como cutucar uma fera violenta com vara curta.
Detendo-me à questão especificamente dos extremos e, depois, relacionando as duas questões de como uma mudança climática produz alteração nos eventos extremos, precisamos entender o que é um extremo. Basicamente, um extremo é o valor de alguma variável meteorológica ou climática muito acima ou muito abaixo da média. Portanto, é um valor raro, um valor que não acontece com frequência.
Como vemos neste modelinho, nesta distribuição — você pode imaginar que isso seja, por exemplo, temperatura ou chuva —, apenas uma fração muito pequena dos eventos é considerada extrema. Se você considerar, por exemplo, o grosso do que ocorre está dentro de um desvio padrão daquela variável para mais ou para menos. O que acontece, portanto, é que os eventos extremos têm grande impacto, um impacto desproporcional em relação ao que cotidianamente acontece.
Como é que o mundo em mudança tem alteração na ocorrência de extremos? Isso pode ocorrer de várias maneiras. Uma delas é mudando a média da distribuição. Simplesmente mudando a média da distribuição, percebe-se que os extremos podem aumentar de uma maneira assustadora. Pode-se multiplicar, com pequenos desvios na média, pequenos aumentos na média. Pode-se rapidamente sair de uma quantidade de extremos relativamente pequena para uma quantidade efetivamente muito grande.
Além disso, mudanças mais complexas, como aumento da variabilidade, aumento da amplitude de variabilidade e mudanças na assimetria da distribuição também concorrem para a mudança de ocorrência de extremos.
No caso de extremos de temperatura, aquilo que eu mencionei sobre o deslocamento da média explica muito bem o fenômeno. Se há uma distribuição com eventos frios e eventos quentes nos extremos e se desloca a média, os eventos frios se tornam muito mais raros e os eventos quentes se tornam muito mais frequentes.
E, efetivamente, a frequência de extremos, sim, tem mudado. A partir da mudança da média, damos um zoom aqui sobre o Brasil, vamos ter ideia de como esses extremos de calor tendem a se multiplicar. Por exemplo, nas últimas décadas, no período de 1980 a 2015, nós temos tido um aquecimento acelerado em todas as regiões da América do Sul, com destaque para o Nordeste brasileiro, com 0,29 graus Celsius de aumento de temperatura por década. Isso já dá quase 3 graus em um século. No caso do norte da América do Sul, que pega uma parte importante da nossa Amazônia, 0,28 graus Celsius. E, especialmente no centro da América do Sul, pega todo o Brasil central, 0,36 graus Celsius por década.
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Isso é observado, isso não é projeção, isso não é modelo, isso é o que nós já temos. Se nós continuarmos no ritmo atual — e, como bem frisou a colega Luciana, nós não estamos mantendo o ritmo atual, nós estamos acelerando como se estivéssemos com um tresloucado ao volante que quer carregar todos para o precipício —, se nós mantivermos o ritmo, o centro do Brasil aquece 3,6 graus Celsius por século. Então, imaginem como nós vamos chegar às próximas décadas nessa região.
A Região Sul tem um pouquinho menos, mas também valores muito próximos aos da Amazônia e do Nordeste.
É importante entendermos que existem vários cenários de emissões. O passado nós não podemos mudar. O futuro está aí, em aberto, está em disputa. Diferentes cenários de emissões significam diferentes posturas da nossa sociedade em relação às emissões, é o que fazer com combustíveis fósseis, é o que fazer com o desmatamento das nossas florestas.
O cenário em que nós contemos as emissões de imediato e as reduzimos ao longo das próximas décadas ainda oferece alguma esperança de evitar as piores consequências do aquecimento global. Os piores cenários nos levam à falência completa da civilização. E não há sombra de dúvida quanto a isso.
Claro, não estou aqui exagerando, não se poderia dourar a pílula. Mesmo hoje, o cenário de emissões intermediárias nos leva a um futuro que, no mínimo, é catastrófico. Por isso que eu mencionei Bárbara, por isso que eu mencionei Artur e por isso que eu mencionei Ana Greta. Porque os destinos dessas pessoas e de todos os jovens e crianças deste planeta está sendo decidido agora.
Nós temos, obviamente, com essa mudança de temperatura média, um rebatimento imediato no aumento dos dias quentes. E, a depender do cenário, no melhor cenário, sobre a América do Sul, a expectativa é que nós tenhamos uma média de 88 dias com temperaturas acima de 35 graus Celsius. No pior cenário, seriam 217 dias ao final do século.
No entanto, 127 dias já agora em 2040. Em 2040, gente, minha filha Ana Greta vai ter 21 anos. Eu quero que cada um aqui, que eu imagino que sejam pais, mães, tios, avôs e avós, pensem seriamente nisso.
Vamos falar aqui de 40 graus Celsius, que é uma temperatura a qual o nosso corpo não resiste. Ele entra em choque por hipertermia. Nós teríamos, provavelmente, mesmo num cenário bom, 14 dias. Estou falando da Índia, que é um concentrado de gente gigantesco. Mas teríamos 46 dias num cenário mais grave.
No Brasil também, vejam só, não estaria nada imune. Ficaria também com algo nessa ordem de magnitude. As projeções são que a temperatura máxima nas regiões da América do Sul cresçam — do melhor cenário para o pior cenário —, entre 2,1 graus Celsius e 5,2 graus Celsius para o Nordeste.
Eu sou filho e neto de trabalhadores rurais do Sertão Central do Ceará. Eu quero que isso entre na cabeça de cada um e cada uma: o que é trabalhar na roça no Sertão do Semiárido com 5 graus a mais de temperatura. Eu quero que vocês pensem o que será da floresta com 2,3 graus a mais, que ela pode ainda suportar, talvez. Mas com 6 graus a mais de temperatura, tem-se mortandade de árvores, interrupção da fotossíntese e o colapso da Amazônia, mesmo que nós não tenhamos de volta à Presidência deste País um tresloucado que simplesmente incentiva que nossas florestas virem madeira e pasto.
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A projeção para o centro do Brasil é de um aumento de temperatura de 2,5 graus e, no pior cenário, de 6,7 graus. E para o sudeste da América do Sul, que pega principalmente as Regiões Sudeste e Sul do Brasil e também parte do norte da Argentina e também Uruguai, a projeção fica entre 1,8 grau e 4,7 graus. A quantidade de dias com temperaturas acima de 35 graus Celsius está aí para todos verem. Se quisermos imaginar o que são entre 43 e 135 dias a mais do que nós já temos hoje de temperaturas acima de 35 graus Celsius no centro do Brasil, continuemos na rota em que estamos. É só continuar, não precisa de muito esforço. Alguns falam que isso é agro suicídio, mas eu realmente acho que é um suicídio de quem está lá no campo. Eu duvido que os grandes investidores do agro se preocupem com isso. Eles não estão lá. Eles estão, na verdade, em gabinetes refrigerados.
Hoje nós já temos cerca de cinco vezes mais eventos extremos de temperatura do tipo daquele que só ocorria a cada 50 anos. Se a temperatura subir 2 graus Celsius globalmente, como é um dos melhores cenários que nós ainda temos à disposição, a quantidade de eventos de onda de calor crescerá 14 vezes em relação ao período pré-industrial. Se nós deixarmos esse mundo aquecer 4 graus, esses eventos crescem 39 vezes. O extremo de calor de hoje se torna o normal. Então, não queiram imaginar — ou melhor, por favor, imaginem — o que será o extremo de um amanhã pintado nessas cores.
E não se trata apenas de extremos de temperatura, mas também de extremos hidrológicos. Extremos hidrológicos são uma consequência imediata do aquecimento global. Vocês se lembram do ciclo hidrológico: a água na superfície evapora e forma nuvens, e as nuvens formam chuva. Isso é básico, é ciência básica. Mas algo que talvez não tenham contado para vocês na escola é que a quantidade de vapor d'água que a atmosfera é capaz de armazenar é uma função direta da temperatura e é uma função quase exponencial: quanto mais quente estiver a atmosfera, mais vapor d'água cabe na atmosfera. Isso significa que, se você agora imaginar que a atmosfera funciona como um recipiente de água, a evaporação na superfície vai encher a atmosfera. A evaporação é como se fosse uma torneira ligada para a água ir para a atmosfera. Já a chuva é a consequência de que a atmosfera está cheia ou, como dizemos na ciência, saturada de vapor d'água. Esse vapor d'água se condensa, e a água retorna na fase líquida ou sólida, sendo despejada por esse reservatório. O que a mudança climática faz? Ora, quanto mais quente a atmosfera mais vapor d'água cabe nela, é como se agora esse reservatório, esse balde que está ilustrando, fosse um balde maior. Primeiro, um balde maior dá mais trabalho para encher. Então, teria que evaporar mais água. As secas ficam mais severas. Mas, uma vez que essa atmosfera esteja saturada de vapor, há mais água para despejar. O vapor é a matéria-prima dos eventos extremos de chuva. Então, tanto secas quanto chuvas extremas se intensificam no mundo mais quente. É uma física simples. E que bate com as observações. Nós já temos cerca de 7% a 8% a mais de vapor d'água na atmosfera do que em meados do século XX. Já temos mudanças na precipitação total em diferentes regiões da América do Sul. São mudanças, em alguns casos, para mais e, em outros, para menos. Mas o que interessa mais quando se fala de eventos extremos não é, de novo, a média. A média é importante, sem dúvida alguma. Mas o que acontece, independentemente de a região ter uma tendência à redução ou ao aumento de chuva, é que coisas como a máxima precipitação em um dia e a quantidade de dias consecutivos secos, esses dois parâmetros de eventos extremos, ambos aumentam. Isso aqui já é observado. No sudeste da América do Sul, a chuva máxima anualmente já está tipicamente 3 milímetros mais intensa do que no período pré-industrial. A estação seca do Nordeste já está seis dias mais longa, e a do Brasil, igual ao centro da América do Sul, está cinco dias mais longa do que no período pré-industrial.
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De acordo com as projeções, em praticamente todas as regiões do mundo, a máxima precipitação em um dia aumenta. Aumenta em menor grau nos melhores cenários e em maior grau nos piores cenários. De novo, é uma escolha: qual é o tamanho das enxurradas, das enchentes, dos alagamentos, dos deslizamentos que nós queremos encomendar para o futuro?
Quanto à duração das secas, isso é uma questão hoje em aberto. As projeções para o Brasil, de novo, são de que a precipitação máxima em um dia, a depender da região, pode aumentar, num bom cenário, algo como 7% a 12%, ou seja, as chuvas ficam mais intensas. Mas, num pior cenário, as chuvas podem se concentrar a um ponto em que o máximo de precipitação diária tende a aumentar até 31%. Quanto aos dias consecutivos secos, de novo, dependem do cenário. Nós podemos ter um prolongamento, em um bom cenário, de 1 a 11 dias, nas nossas estações secas, além do que já foi prolongado. Mas, em piores cenários, nós estamos falando de mais de 20 dias, são 3 semanas de seca a mais no Nordeste e no Brasil central. Nós vamos comprar esse futuro aí? Vamos encomendar esse futuro?
E aí eu concluo, mas concluo fazendo um apelo, porque é de gabinetes como esses em que os senhores e as senhoras estão agora — e aproveito para dizer que há poucas senhoras, inclusive na mesa, o que é contraditório para o mês de março, mas tudo bem — que nós precisamos agir. As leis da física precisam ser olhadas por vocês, que fazem as leis.
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Nós não podemos mais continuar como antes. Vivemos em uma situação de irracionalidade. É preciso colocar esse tema no topo da agenda. Isso não pode ficar apenas como mais um tópico a ser discutido, a ser dialogado; precisa estar todos os dias nos debates, porque nós dependemos de grandes mudanças, não são pequenas.
Nós precisamos de um plano de rápida implementação para abandonar os combustíveis fósseis como fonte de energia, o que implica, inclusive, em abdicar de projetos absurdos, como os de explorar petróleo na foz do Rio Amazonas. Nós precisamos zerar o desmatamento, mais do que isso, na medida do possível precisamos recompor os estoques de carbono na vegetação e no solo, replantando-os. Nós precisamos fazer o melhor que pudermos para regenerar nossos biomas. Isso, por si só, já tem efeito positivo, porque as grandes florestas são fontes de água. Nossas nascentes geram mais água se estiverem arborizadas. Nossos rios são mais seguros se tivermos mata ciliar. Precisamos replantar.
Nós precisamos reduzir também outras fontes emissoras, porque são várias delas. Hoje existe a fermentação entérica. O Brasil ganhou propaganda...
O SR. PRESIDENTE (Tarcísio Motta. Bloco/PSOL - RJ) - Alexandre, se você puder acelerar a conclusão, eu agradeceria. Desculpe-me.
O SR. ALEXANDRE ARAÚJO COSTA - Eu já concluo em 2 minutinhos, Deputado Tarcísio. Obrigado.
Nós precisamos pensar nisso. Nós somos os maiores exportadores de carne e soja do mundo. Isso tem impacto, gente! Isso tem impacto. Imaginem mais de 200 milhões de cabeças de gado emitindo metano! Isso precisa entrar na conta.
Nós também precisamos acelerar os nossos planos de gestão em resíduos sólidos e ver algo que possa ser feito em relação aos (falha na transmissão). Isso é para frear a piora da situação climática e termos chance de adaptação, porque, no pior cenário, é impossível haver adaptação — ao pior cenário ninguém se adapta.
Nós precisamos fazer duas coisas, o dever de casa duplo e ao mesmo tempo: medidas profundas de mitigação e medidas profundas de adaptação, sabendo o que está encomendado. Tanto as medidas de mitigação quanto as de adaptação precisam ser justas do ponto de vista social, justas para as periferias, justas para as comunidades do campo e da floresta, justas para os povos indígenas e quilombolas, justas para trabalhadores e trabalhadoras, justas para as gerações vindouras. Nós precisamos agir em nome delas e não subtrair-lhes o futuro.
Era o que eu queria dizer para vocês.
Um abraço a todos e a todas! (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Tarcísio Motta. Bloco/PSOL - RJ) - Muito obrigado, Alexandre. Desculpe por meu papel chato de ter que controlar parte do tempo, porque nós temos um tempo limitado aqui. Aliás, essa ideia de que estamos ficando sem tempo pode ser pensada também na própria fala do Prof. Alexandre Araújo Costa.
Passo a palavra, então, ao nosso último palestrante de hoje, o Sr. Marcio Astrini, Secretário-Executivo do Observatório do Clima.
O SR. MARCIO ASTRINI - Boa tarde a todo mundo.
Muito obrigado pelo convite, Deputado Tarcísio Motta. Agradeço também ao Presidente da Comissão, o Deputado Leo Prates.
Boa tarde, Deputada Silvia Waiãpi e Deputada Daiana Santos.
Muito boa tarde aos meus colegas aqui de Mesa.
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Eu não tenho como prometer a vocês algo muito diferente do que acentuar a crise de ansiedade e depressão trazida pelos meus colegas. A diferença é só uma: eles têm um pouco mais de jeito do que eu, Deputado Leo, para falar, porque todos eles são professores, e eu sou aluno, não dou aula. Eu não corro nem o risco de ser chamado pelo IPCC. (Risos.) Vou ser um pouco mais direto, inclusive, na forma de abordar o problema e também trazer um pouco do recorte desta Comissão, que é uma Comissão que está olhando para os desastres naturais, que vão se acentuar por conta de problemas que nós já viveríamos sem o aquecimento do Planeta, sem a mudança do clima. A mudança do clima acentua o que estava ruim; piora o que já estava difícil.
Tudo isso que foi dito aqui pela colega Luciana e pelos demais colegas de Mesa são coisas que nós estudamos há décadas. Nada disso surgiu agora. A ciência vai evoluindo o conhecimento, apenas. Ela vai ficando mais acurada, como a Profa. Luciana mostrou em relação ao problema da Amazônia. A Amazônia é uma só, com problemas diferentes a depender do que acontece, da região em que acontece e de como se intercede junto àquele bioma.
A discussão sobre essa agenda de clima começou há pelo menos 50 anos, em Estocolmo, em 1972. Depois, nós tivemos vários momentos dos quais o Brasil participou ativamente — a ECO 92, a Rio+20, vamos ter a COP 30 agora no Brasil.
Em 1995, iniciaram-se as conferências de clima, que estão ficando cada vez mais populares. Inclusive, sugiro aos Parlamentares que ainda não foram a irem, porque é muito interessante ir lá saber o que está acontecendo, verificar esses acordos. O maior evento que a ONU promove, o maior encontro de países que existe hoje é a Conferência do Clima. Todos os países signatários do Acordo de Paris vão. Então, há muito tempo se estuda isso. São muitos os relatórios feitos. Os principais deles são os seis relatórios do IPCC, que surgiram em 1988.
Há uma coisa muito importante a se citar sobre esses relatórios, Deputado Tarcísio. O último relatório, que é o mais contundente deles, traz duas certezas. A primeira certeza é que a crise é grave; e a segunda é que a culpa é nossa. Essas certezas, esses relatórios, esses números, esses alertas não são feitos apenas — como se fosse apenas — pelos cientistas. São juntados ali mais de 14 mil estudos para dar vazão a um relatório desses. Ele é escrito com essa quantidade de ciência e ele é acordado pelos 196 países. Então, são 196 países que chancelam o que está escrito lá, porque, às vezes, se tem dúvida sobre quem está escrevendo, se isso é enganoso, ou algo assim. É o mundo inteiro que está escrevendo.
É muito difícil nós imaginarmos que todos os Governos, de todos os países, estão se reunindo para produzir algo com que eles mesmos não concordam entre si. Não é isso. Inclusive, esses relatórios, como são frutos de acordo, normalmente trazem uma linguagem um pouco menos crítica ou realista do que deveria ser, exatamente porque você precisa de acordos para poder fazer a publicação.
Eu vou partir um pouquinho mais já para a situação em que estamos e quem está nessa situação.
16:43
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Eu vou passar muito rapidamente pela apresentação que eu preparei, indo em seguida direto para uma fala do Presidente Lula no Egito.
O SR. PRESIDENTE (Tarcísio Motta. Bloco/PSOL - RJ) - Depois, todas as apresentações estarão disponíveis na pasta da Comissão, no site da própria Câmara dos Deputados. Inclusive, estará completa sua apresentação, Marcio.
O SR. MARCIO ASTRINI - Obrigado.
(Segue-se exibição de imagens.)
Esta é só uma introdução, que eu não fiz, do que é o Observatório do Clima, do qual sou Secretário-Executivo.
Nós temos aqui 95 membros citados, mas já existem 107 membros. É uma rede cuja composição me dá muito orgulho, porque ela não é uma rede formada apenas por ambientalistas, cientistas e pesquisadores, que estão lá, e devem estar, com certeza, mas ela é formada também pelo movimento negro, indígena, quilombola, de populações tradicionais e de periferia urbana, porque a mudança do clima diz respeito a todos esses segmentos e setores, não é exclusividade de quem prenegocia clima, às vezes, diplomata, cientista, ambientalista — não é. Estes estão aqui apenas há mais tempo — só —, mas a crise é de todos nós, infelizmente.
Os números trazidos aqui pelos professores e por quem estuda o clima mais a fundo já se revelaram fora dos estudos. Hoje, nós não dependemos mais exclusivamente dos relatórios para saber o que está acontecendo; você abre a janela da sua casa, você vê a previsão do tempo, você abre um jornal, você pesquisa na Internet.
O clima virou isto aqui: "2023 foi o ano mais quente já registrado nos últimos 100 mil anos (...)". "Últimos oito anos — eu vou atualizar, últimos 9 anos — foram os mais quentes já registrados (...)." E nós temos mais notícias. "Temperatura global em janeiro — deste ano de 2024, o que corrobora o gráfico que foi mostrado aqui de que as coisas só estão piorando — foi a mais alta já registrada no mês (...)." Nós temos aqui alerta da ONU de concentração recorde de gases de efeito estufa na atmosfera, que chegou a 424 partes por milhão já na última medição. "Antártida registra degelo marinho recorde (...)." Temos a situação da Sibéria. Deputado Tarcísio, você acha que o Rio de Janeiro é quente? Na Sibéria a temperatura está batendo os 38 graus Celsius no verão, em recorde absoluto. As temperaturas esquentam realmente no verão, mas nunca chegam a isso. "Gelo da Groenlândia derrete em velocidade recorde em 12 mil anos." Isso é algo nunca visto.
Este é um eslaide que já foi passado, inclusive pelo Prof. Alexandre, e que mostra, em diversos setores, as adversidades que as mudanças do clima vão trazer. E têm para todo mundo aí consequências drásticas: para a biodiversidade, para a fauna, para a flora, para os humanos, para todo mundo que depende de água e vive neste Planeta. Conforme a temperatura vai aumentando, essas consequências vão seguindo o mesmo caminho.
Mas eu queria pular isso e, rapidamente, mostrar este vídeo.
16:47
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(Exibição de vídeo.)
O SR. MARCIO ASTRINI - Eu peguei esse discurso do Lula só porque ele traz alguns dados interessantes para que eu possa fazer uma pergunta para todos nós. Há dados econômicos aqui, dados de impacto em todo o mundo, mas o dado principal, segundo a OMS — Organização Mundial da Saúde, segundo o que nós sabemos hoje, segundo o que nós vemos hoje, é que 250 mil vidas a mais serão perdidas por ano.
Muito bem. A pergunta é: quem é que vai morrer? Como nós vimos na pandemia, os impactos de uma crise de saúde — e o mesmo vale para crises climáticas — não é igual para todo mundo. Então, quem é que vai morrer? Quem são essas 250 mil pessoas a mais que vão morrer? Onde essas pessoas estão no Brasil?
A crise do clima é uma crise humana, é uma crise social. Ela transforma tudo o que está desigual em algo ainda mais desigual. Ela transforma a vida daquele que sofre em algo muito mais sofrido.
Eu vou trazer aqui dados de um estudo feito pelo Instituto Pólis. Inclusive, Deputado Tarcísio, seria muito interessante ouvi-los. Eles fazem um recorte social sobre populações em alguma espécie de área de risco no Brasil e como elas são caracterizadas. O recorte é racial. Então, vamos lá.
Eles pegaram três capitais: Belém, Recife e São Paulo. Em Belém, 64% da população é negra. Porém, em área de alto risco por conta de eventos climáticos, 75% da população é negra. Então, 64% da população da cidade é negra, porém, nas áreas de alto risco, a população negra representa 75% dos moradores.
Em Recife, 55% da população é negra. Porém, em áreas propensas a inundações, 59% da população é negra. Em área propensa a deslizamentos, 68% da população é negra — lembro que, do total da população, apenas 55% são negros.
Em São Paulo, 37% da população registrada no Município é negra. Nas áreas de risco, são 55% de negros.
E nós podemos fazer outro recorte aqui. Há um dado da ONU que diz que 80% das pessoas que foram deslocadas por conta de situações extremas relacionadas ao clima, no ano passado, no mundo, eram mulheres e crianças.
Por que esses dados são importantes? Exatamente para respondermos à pergunta decorrente da informação trazida pela OMS e que ouvimos na voz do Presidente Lula, de que 250 mil pessoas a mais vão morrer por ano. As pessoas que vão morrer são mulheres negras. Esse é o público atingido pela crise do clima. E essas pessoas são as que já vivem hoje em áreas consideradas de extremo risco, ou áreas de vulnerabilidade social, ou que estão em vulnerabilidade social, ou que não têm emprego, ou que não têm renda, ou que não têm esgoto, não têm saneamento, ou que não têm dinheiro para comprar um botijão de gás e moram em situação precária. São essas as pessoas. E há o aspecto cruel de que essas pessoas são as que menos contribuíram para o problema, historicamente. Essas pessoas não andam de iate, essas pessoas não pegam avião, essas pessoas não têm casa cara, essas pessoas não têm carro a diesel, essas pessoas não gastam milhares e milhares de reais em consumo, o que nós todos fazemos. Inclusive, nesta sala aqui, dificilmente nós vamos encontrar pessoas nessas situações. Elas não estão aqui. Muitas delas nem sabem disso que nós estamos debatendo aqui. Essa é a situação. Essa é a realidade da crise do clima.
16:51
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Vamos pegar outros exemplos. O Paquistão é um país que passa por uma dificuldade econômica muito grande, é um país extremamente populoso e muito pobre. Em 2022, o Paquistão teve uma enchente tão violenta que alagou 1/3 do país. Há uma declaração de uma Ministra do Paquistão ou Governadora de uma região, na qual ela diz o seguinte: "Nós não temos nem como drenar a água, porque não há onde jogar, está tudo inundado". Não havia como tirar água de um lugar e jogar em outro, porque o outro lugar estava inundado também. Não havia como drenar a água. Morreram milhares de pessoas, metade era de mulheres e crianças.
No Vietnã, os produtores de arroz, que em grande parte são produtores em pequena escala, da agricultura pequena familiar, agricultores de pequeno porte, durante o período de verão, tiveram que se adaptar, já ano passado, e passaram a trabalhar à noite, porque não conseguem trabalhar durante o dia mais. Não há condições de fazer a colheita do arroz durante o dia, porque faz muito calor, há muita radiação solar, e eles não conseguem trabalhar.
Em 2023, nós tivemos uma seca recorde no chifre da África, região que engloba Etiópia, Somália, Quênia, Sudão e, se não me engano, mais 2 países. O calor e a seca recorde empurraram 22 milhões de pessoas para o risco de fome extrema. E nós tivemos aqui na Amazônia uma seca nos rios como nunca vista. A imagem impacta, mas o maior impacto se dá nas populações que vivem isoladas, Deputada Silvia, porque as populações que vivem isoladas se deslocam por meio do transporte fluvial, muitas vezes. Então, elas passam a não ter acesso a atendimento médico, por exemplo, ou ao mercado. Não conseguem levar o filho para a escola, o que é básico, algo está na nossa rotina e fazemos todos os dias. Esse é o impacto de uma crise do clima.
Não lembro exatamente quem aqui falou da vulnerabilidade ao clima no Brasil. Nós temos vários exemplos, até exemplos que não conseguimos detectar como decorrentes do clima de tão corriqueiros.
A bandeira vermelha na conta de luz é fruto de impacto climático, ocorre porque não choveu o suficiente, para a matriz hídrica brasileira, ou choveu de forma errada, ou não choveu o suficiente para se reservar água nos reservatórios e fazer girarem as turbinas das hidrelétricas. E as hidrelétricas respondem por grande parte da geração de eletricidade no Brasil, da luz que chega a nossas casas. Então, institui-se a bandeira vermelha. Maravilha! Entretanto, um aumento de 10% na conta de luz tem um impacto absolutamente diferente para quem ganha 100 mil reais e para quem vive com 2 ou 3 salários mínimos. Por mais que criemos auxílios, bolsas e o que quer que seja para ajuda, isso impacta em escala a população de mais baixa renda. E nós podemos citar crise do clima aqui à vontade. Tem para todo mundo. No setor produtivo rural, na safra 2021-2022, a seca que assolou a soja no Rio Grande do Sul resultou em 20 bilhões de reais de prejuízo. Na safra 2022-2023, outra seca resultou em 28 bilhões de reais de prejuízo. Na safra 2023-2024, houve muita chuva. Não deu para calcular ainda o tamanho do prejuízo, mas ele existe, porque atrasou o plantio de soja em algumas regiões.
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O MST, por exemplo, maior produtor de arroz orgânico da América Latina, está tendo um prejuízo recorde. Em algumas regiões do Rio Grande do Sul, a produção de arroz orgânico foi devastada, perderam tudo.
Isso também é um recorte muito interessante de se fazer. O grande produtor tem a quem recorrer, nós sabemos. O pequeno produtor, esse que perdeu tudo, fica muitas vezes inviabilizado economicamente, o que vai demandar muito mais esforço do Estado para que esse produtor se recomponha.
Termino chamando a atenção para outras coisas.
Nós podemos ter problemas terríveis — o Prof. Alexandre falou disso aqui — com fluxo migratório no nosso País, se algumas regiões forem impactadas pelas mudanças climáticas. Se houver aumento, por exemplo, do ciclo de calor e seca em uma região como o Semiárido brasileiro, será um desastre. Temos uma quantidade gigantesca de agricultores familiares e de pequenos agricultores nessa região. Podemos passar de um período de secas severas em 1 ou 2 anos por década para secas em 5 anos por década, a depender do grau de aquecimento daquela região ou da mudança do clima naquela região. Isso significa inviabilizar várias culturas.
O que vai acontecer com essas pessoas? Para onde elas vão? Elas vão migrar. Para onde? Para as capitais e outras cidades. E essas cidades estão preparadas para receber essas pessoas, com escola, creche, saneamento, habitação, emprego, renda, educação, saúde, tudo isso? Nós estamos preparados para receber um fluxo migratório que, de repente, vai parar de produzir comida no Brasil — e qualquer um faria isso — para procurar uma vida melhor, uma vida mais digna para si, para a sua família e para os seus filhos?
Nós já vivemos fluxos migratórios assim no Brasil. Temos um Presidente da República que saiu com a sua família do Semiárido por uma situação de seca décadas atrás. Agora vamos imaginar o que vai acontecer com uma situação mais severa relacionada ao clima.
A questão da saúde é devastadora, principalmente para o Norte e para o Nordeste. Quem é Deputado aqui do Norte e do Nordeste precisa se preocupar infinitamente com a questão da saúde, em relação a zoonoses, doenças como zika, chikungunya, dengue, malária. A tendência é que, com o aumento da temperatura, os casos dessas doenças explodam, porque aumenta o ciclo reprodutor do mosquito.
Além do estresse térmico citado aqui pelo Prof. Alexandre, algo que acomete principalmente os mais idosos e as crianças e, de novo, pressiona mais os serviços de saúde, nós poderemos ter essas doenças infecciosas se alastrando de forma muito maior do que a que vemos hoje com o aumento do calor e do período de reprodução dos mosquitos. Esta Comissão é extremamente importante porque nós estamos falando de um país que tem vulnerabilidades diversificadas e gravíssimas na questão do clima e estamos vendo um cenário de clima que está se deteriorando numa velocidade cada vez mais intensa. Nós estamos com uma média de aquecimento do planeta de 1,2 grau. Ele aqueceu um pouco mais nesse último período por conta de uma série de circunstâncias, principalmente por causa do El Niño, mas a tendência é que volte à média, depois de passar o El Niño, 1,2 grau, e assim, infelizmente, continuaremos avançando. Nós já temos aquecimento contratado de 1,5 ou 1,6 grau. Se pararmos todas as emissões, a temperatura do planeta vai aumentar nesse montante. E a previsão é de ela aumente ainda mais. O que nós estamos discutindo aqui é o quanto nós vamos aumentar mais daqui para frente. Ficaremos em 1,5 grau, 1,6 grau? Onde a adaptação é possível nós iremos para 2 graus? Nós iremos para 2.7 graus?
16:59
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Vejam — e vou concluir, Deputado Tarcísio Motta —, nós precisamos de um esforço global para limitarmos o aquecimento do planeta. Esse esforço global é feito com ações, que são combinadas entre os países nas conferências de clima. Essa combinação dos países vem com promessas, ou seja, os países prometem o que vão fazer. Essas promessas são identificadas pela sigla NDCs. Essas são as promessas nacionais que cada país deposita ali na ONU — promessas! Se todas as promessas de hoje — todas! — forem realizadas, o planeta vai aquecer 2,7 graus. Quer dizer, se tudo der certo com as promessas, dará tudo errado. Essa é a situação em que nós estamos. Em ações, nós estamos caminhando para um cenário muito pior, inclusive, porque nós estamos acima da pior curva.
Bom, eu prometi para vocês ansiedade e depressão e as estou entregando. E estou entregando isso porque é muito importante que debatamos as circunstâncias da adaptação às catástrofes e a todas as alterações climáticas que nós vamos ter.
Esta Comissão tem um papel importantíssimo, independentemente de partido ou convicção política. Nós estamos falando do nosso povo, dos brasileiros, que votam inclusive em todos os senhores, são eleitores de todos os que estão aqui e de alguns outros que não entraram. Essas são as pessoas, em larga escala, que vão mais sofrer. Aqueles que pouco contribuíram para essa situação, como eu disse, são os que vão ficar com a carga pior, com a carga mais pesada da situação. E não é apenas no Brasil que isso está acontecendo, é no mundo inteiro.
Então, nós precisamos cuidar do problema com a mitigação que foi dita aqui, acabar com o desmatamento, liderar pelo exemplo. O Brasil tem todas as condições de fazer isso. Nós podemos fazer aqui horas e horas de debates apenas sobre como o Brasil, apesar de não ser um país protagonista econômica e militarmente no mundo, tem no clima uma janela de oportunidade para ser uma liderança global. Podemos liderar pelo exemplo nessa parte de mitigação para atacar o problema, mas nós temos que nos preparar para a adaptação, porque o problema está contratado. Ele vai acontecer, e as pessoas vão morrer.
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Cada tonelada de carbono a mais emitida é um risco de vida a mais que nós colocamos na conta das pessoas que estão em estado de vulnerabilidade no planeta inteiro. Então, parar com o problema é extremamente importante e o principal, mas precisamos nos adaptar, e eu acho que esta Comissão aqui tem um papel importantíssimo nesse sentido.
Obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Tarcísio Motta. Bloco/PSOL - RJ) - A distribuição de ansiedade foi tamanha que eu acho que até as palmas ficaram mais tímidas. Como batermos palmas para uma situação dessas, não é? Batemos palmas pela sua fala, agradecemos a você por nos trazer esse alerta, mas é difícil bater palmas numa situação como essa. Eu acho que, nas cinco falas que nós ouvimos aqui, isso foi notado.
Queria registrar a presença aqui no Plenário 4 da Deputada Daiana Santos e do Deputado Nilto Tatto. Muito obrigado pela presença.
Como autor do requerimento, eu estou inscrito para falar. Farei uso da palavra por 3 minutos e peço àqueles que também queiram fazer uso da palavra ainda nesta audiência pública que se inscrevam com o Saulo ou pelo sistema. Eu vi que há um Deputado inscrito pelo sistema. O Saulo pode pegar as demais inscrições, de acordo com as regras ditas pelo nosso Presidente no início da audiência.
Bom, parece-me que é bastante factível, depois dessas cinco falas que nós ouvimos aqui, uma primeira constatação: o clima já mudou. Há um elemento claro sobre as mudanças climáticas. Elas já aconteceram e há a probabilidade, a chance real de que elas sigam acontecendo num ritmo cada vez mais acelerado. Nós estamos então diante da seguinte discussão: como então pelo menos diminuir o ritmo desse processo ou manter as coisas como estão?
Isso me lembra uma frase do Davi Kopenawa — eu encontrei com ele hoje na Conferência Nacional de Cultura que está acontecendo aqui —, em que ele diz: "Ideias para adiar o fim do mundo". Parece-me que nós estamos a discutir, ou deveríamos estar a discutir em escala planetária, como adiar o fim do mundo e tratando um pouco nessa discussão do fato de que estamos sendo muito pouco eficazes nisso. Há muitos equívocos, muitos erros sendo cometidos, e nós não estamos sendo bem-sucedidos nessa tarefa, muito pelo contrário. Parece que seguimos insistindo em acelerar o fim do mundo.
E outra questão dita também em várias falas — o Marcio no fim inclusive falou muito disso — é que o fim do mundo não chega na mesma hora para todo mundo. O fim do mundo chega logo para a família que tem um barraco numa encosta no Rio de Janeiro. A encosta desaba sobre a casa dessa família, e o mundo dela se acaba, seja porque perde um familiar, seja porque perde tudo na vida, seja porque não tem mais casa. O mundo dela desaba ali, materialmente, na expressão de um desastre que não é natural, é um desastre socioeconômico.
Este mundo seguirá terminando cada vez mais rápido, exatamente para aqueles mais pobres. Territórios mais vulneráveis, portanto, sofrem ameaças maiores. Os mais pobres estão morrendo, e os negros e negras estão morrendo mais. Por isso, falar em racismo ambiental segue sendo um elemento fundamental para todos nós.
Então qual é o papel desta Comissão? Repetir as falas? Não, nós temos o papel aqui de trazer o pano de fundo sobre o qual o tema desta Comissão está sendo debatido, Relator Gilson Daniel.
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Qual é o pano de fundo em que esse debate dos desastres socioambientais acontece e o que nós temos que fazer aqui?
Nós iniciamos esse processo — e o Deputado Leo Prates, Presidente, foi o proponente disso — porque nós precisamos evitar que as pessoas morram. Esta é a lógica: evitar que as pessoas morram, evitar que prejuízos continuem a acontecer com eventos climáticos extremos. Mas o que nós estamos entendendo é que esse processo significa enxugar gelo, se nós não conseguirmos evitar que os desastres aconteçam.
Trata-se de ter um Estado preparado para atender as pessoas na hora do desastre, trata-se de preparar e conseguir infraestrutura para evitar que os desastres criem tantas mortes, mas é preciso também evitar que os próprios desastres aconteçam. Esse é o desafio talvez mais profundo e mais amplo, e é um problema mundial.
O clima é um problema mundial, e os desastres são um problema claramente nacional. E os Municípios não dão conta de arcar com os custos e com os gastos com as coisas que precisam ser feitas.
Estudos da Confederação Nacional dos Municípios dizem que, entre 2013 e 2022, 5.199 Municípios foram atingidos por tempestades, inundações, enxurradas ou alagamentos. Não estamos nem falando de seca, estamos falando só da outra parte. Esses 5.199 Municípios são 93% dos Municípios deste País. Portanto, não é possível mais deixar que os Municípios tentem resolver um problema que é mundial, com aspectos estruturantes nacionais. É preciso que corramos atrás disso. É preciso pensar orçamento, é preciso pensar políticas, é preciso pensar a lógica de enfrentar a questão climática e, ao mesmo tempo — portanto, é trocar a roda do carro com ele em movimento —, preparar as cidades e adaptá-las para o que vai acontecer cada vez mais.
Portanto, temos muito trabalho para este ano de 2024. Os desastres não são naturais, eles são socioambientais. Quem morre são os mais pobres, são os negros e negras, e nós temos responsabilidade diante disso.
Muito obrigado a todos e a todas.
Tem a palavra o Relator, o Deputado Gilson Daniel.
O SR. GILSON DANIEL (Bloco/PODE - ES) - Sr. Presidente Tarcísio Motta, requerente desta audiência pública, eu o parabenizo pela condução dos trabalhos. Parabenizo também todos os convidados, que relataram informações muito relevantes. Assustam-nos muito essas informações, até porque é um diálogo que esta Casa tem feito constantemente, mas, quando ouvimos os cientistas, vemos que temos ainda muito a trabalhar, muito a produzir. Nosso relatório precisa, a partir da nossa equipe técnica e das informações que nós estamos tendo a cada momento, preparar este País para o futuro.
Eu ouvi muitas falas aqui que assustam a nós Parlamentares. Nós estamos vendo a cada dia, nos nossos Estados, nas nossas cidades, que os efeitos das mudanças climáticas estão cada vez mais intensos.
A pesquisadora e Profa. Luciana relatou uma questão que eu julgo importante. Ela falou em financiar uma rede de monitoramento e até citou que fosse através de emendas Parlamentares.
17:11
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Depois, vou pedir à equipe que busque a Profa. Luciana para que ela nos oriente com relação aos custos para se montar essa rede de monitoramento. Ela apresentou três localidades no País como possibilidades para se montar essa rede. É uma das sugestões que ela deu, entre inúmeras sugestões dadas nesta audiência pública.
A minha participação aqui é mais para parabenizar o Deputado Tarcísio. Quero dizer a ele que nós precisamos, no contexto desta Comissão, trazer debates como este, que nos orientam, que nos ajudam, com especialistas das diversas áreas, para que possamos, ao final, produzir um relatório que realmente ajude na mitigação dos efeitos das mudanças climáticas, que estão cada vez mais intensos.
Na semana passada, estive com o Ministro Waldez. Acredito que ele deva estar aqui na nossa Comissão nos próximos dias. Há muitos dados relevantes, importantes, relatados por ele nessa agenda em que estivemos juntos. Acredito que ele vá trazer para nós, inclusive, alguns investimentos que o País está fazendo, principalmente nos alertas.
Uma preocupação que temos é que toda discussão que passa por esta Casa tem muito a ver com a pronta resposta no pós-desastre. Esta Comissão tem que se debruçar sobre esse problema para avançarmos não na pronta resposta, e sim na prevenção.
Então, agradecendo a todos a participação, quero pedir licença, porque eu vou ter que sair. Fiz questão de estar aqui até o final, ouvindo todos os técnicos, mas tenho que ir ao plenário.
Quero parabenizar de forma especial o Deputado Tarcísio Motta pelo relevante requerimento desta audiência pública.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Tarcísio Motta. Bloco/PSOL - RJ) - Eu é que agradeço, Deputado Gilson Daniel.
Deputado Gilson, quero informar a V.Exa. que há quatro Parlamentares inscritos para falar. Logo após a fala desses quatro, temos dois requerimentos para apreciação. Se, por acaso, notarmos que vai abrir a Ordem do Dia, interromperemos a audiência e votaremos os requerimentos, para não termos problema de requerimento sem votação hoje.
Passo a palavra para a Deputada Silvia Waiãpi, que dispõe de 3 minutos.
A SRA. SILVIA WAIÃPI (PL - AP) - Boa tarde. Agradeço pela oportunidade e pela deferência para poder comentar este período. Já parabenizo pela preocupação todos os cientistas aqui representados e parabenizo a Presidência da Mesa pelo fato de trazer este tema à discussão.
Nós tanto discutimos sobre responsabilidades e falamos tanto sobre o Brasil, mas não tive nenhuma resposta do quanto a China, a Índia, a Alemanha, a França, a Noruega e outros países têm atuado para a diminuição da emissão de gás carbônico na atmosfera. Observamos que todos esses países, em reuniões e reuniões, cobram do Brasil um posicionamento. Entretanto, eles não deixam de emitir os gases, não fecham as suas fábricas para plantar árvores, mas impedem o Brasil, o povo brasileiro...
17:15
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Falo como mulher do Norte, mulher da floresta. Nós não podemos sequer derrubar uma árvore para fazer um roçado.
Eu tive um acidente recentemente na Transamazônica, onde o carro capotou, caiu da ponte. Eu pergunto: não poderíamos construir uma ponte de concreto? Não, não podemos, porque é preciso ter licenciamento ambiental. O.k., então vamos construir de madeira. Não se pode arrancar madeira da floresta, não se pode derrubar árvore. Então nós ficamos sem socorro, sem acesso, sem saneamento, sem saúde, em nome de uma política ambiental para manter a estabilidade climática do mundo, mas em benefício principalmente de países desenvolvidos economicamente.
A minha preocupação é, primeiro, com o Brasil, com o povo brasileiro, principalmente o povo do Norte, que não tem saneamento básico, que não tem saúde, que não tem ensino de qualidade, um povo cuja possibilidade de sobrevivência, na sua própria região, é dificultada. Eu vejo, tanto no Sul quanto no Sudeste e no Centro-Oeste, homens e mulheres protegidos em seus apartamentos, comendo comida pedida por iFood, com água quente, podendo beber água gelada, em detrimento do povo do Norte. Lá não temos isso. Se eu estiver na minha aldeia, no Itapé, e quiser fazer xixi e cocô, eu vou ter que fazer na água, porque nós não temos saneamento.
Para quem nós estamos defendendo estabilidade climática, estabilidade econômica, proteção da natureza, proteção do mundo, se o povo do Norte é quem está pagando a conta mais cara para manter a estabilidade econômica e a boa vida em países desenvolvidos economicamente?
Esta é apenas uma reflexão de uma mulher indígena do Norte brasileiro, a principal área afetada, quando se fala em manutenção do clima.
O SR. PRESIDENTE (Tarcísio Motta. Bloco/PSOL - RJ) - Obrigado, Deputada Silvia Waiãpi.
Passo a palavra ao Deputado Jorge Goetten, que dispõe de 3 minutos.
O SR. JORGE GOETTEN (PL - SC) - Presidente Tarcísio, receba minha saudação especial. É um prazer vê-lo.
Deputada Silvia Waiãpi, demais Deputados presentes e todos os Deputados que já saíram também — o Presidente Leo Prates, o Deputado Gilson —, todos os palestrantes presentes e on-line, muito obrigado pela oportunidade. Não pude ficar o tempo todo. Perdi, portanto, uma oportunidade.
O Coleman disse bem que, quando você se distrai ou perde uma reunião importante assim, está perdendo uma oportunidade. Eu perdi uma oportunidade de aprender mais com vocês.
Se alguém tinha dúvida da importância desta Comissão, Presidente Tarcísio, hoje eu acho que ficou bem claro como esta Comissão é muito importante e oportuna.
Eu gostei muito de todas as falas. E a Deputada Silvia, na fala dele, trouxe o tema para a realidade. Eu acho que, acima de tudo, a solução tem que ser boa para quem paga mais caro. O Norte paga muito caro, então, essa preocupação ambiental tem que primeiro ser boa para eles.
Eu sou de Santa Catarina, que também vive eventos climáticos. Eu sou talvez dos Parlamentares o mais atingido pelos eventos climáticos. Eu já peguei 17 enchentes. Eu sempre digo isto, Marcio: eu já peguei 17 enchentes em Rio do Sul, Santa Catarina. Mas o Norte paga um preço muito caro pelos nossos benefícios e pelos benefícios do mundo, e isso tem que ser corrigido.
17:19
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Fiquei muito feliz com tudo o que eu ouvi, por isso quero parabenizar a Comissão.
Eu só queria colocar uma coisa. Em 2020, o meu gabinete foi carbono zero. Paguei do próprio bolso para ter um gabinete carbono zero, compensando as emissões de carbono com o plantio de árvores. Na época, foi o que me orientou a fazer um biólogo do Rio de Janeiro, talvez conhecido de vocês, o Prof. Ricardo Harduim, meu amigo. E agora eu estou fazendo de novo o gabinete carbono zero.
Eu faço até um apelo para os colegas Parlamentares. Eu fiz um pedido ao Presidente Lira — esse pedido está na 1ª Secretaria, com o Deputado Luciano Bivar —, porque somos muito competentes aqui em criar leis para as pessoas cumprirem, para o outro lado do balcão cumprir. Eu acho que passaríamos uma mensagem muito positiva para o mundo e também para os brasileiros, se fizéssemos a nossa parte, cortássemos na carne. Por que não a Câmara ser carbono zero, nós fazermos dos nossos gabinetes e de toda a Câmara uma instituição carbono zero? Mais que uma mensagem, mais do que as palavras, eu acho que as atitudes é que arrastam as pessoas, as atitudes são mais pedagógicas. Então, eu fiz esse pedido ao Presidente Lira, à Mesa. Quem sabe eles autorizam essa mudança. Com a ajuda de vocês, podemos fazer da melhor forma a Câmara carbono zero. Isso vai contagiar os outros órgãos públicos e assim por diante.
Agora, eu queria colocar que fiz esse apanhado como cidadão flagelado de 17 enchentes, com gabinete carbono zero e com esse pedido de fazermos esta Casa carbono zero, mas queria fazer um apelo para os senhores, que eu admiro tanto e fazem um papel tão importante, os cientistas que estão aqui e os que participaram da reunião on-line. Eu acho que não somamos para o meio ambiente, quando falamos do clima, da importância de tudo o que vocês colocaram, mas o fazemos com um viés político. Eu acho que perdemos a oportunidade de trazer mais gente para a discussão.
Eu sou do PL. Eu sou simpático a isso que vocês estão fazendo. Eu já disse que, sempre que eu tenho oportunidade, eu procuro aprender, e hoje eu aprendi bastante com vocês.
Ouvi Frei Betto dizer a seguinte frase uma vez: "O que você fala soa tão alto aos meus ouvidos que eu não consigo ver o que você faz". Então, algumas vezes, uma fala com viés político meio que nos blinda, e ficamos meio reativos. Vocês têm muito conhecimento para transmitir para nós. Então, a retirada do viés político não vai diminuir em nada o público, e eu acho que vocês podem conseguir mais adeptos.
17:23
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Digo isso em benefício do clima, digo isso em benefício da descarbonização, digo isso em benefício mais necessitado.
Você foi muito bem, Marcio, quando disse que o mais vulnerável é que paga o preço mais caro pela mudança do clima. Você usou outra palavra, disse que é o mais desigual. Este País é tão desigual que temos que unir forças, ver o que nos une. Já que passa muita coisa pelo Parlamento, é importante nós buscarmos somar forças. Quanto mais pudermos somar forças melhor. Eu acho que isso ajudaria sermos mais célebres e avançarmos em políticas públicas tão importantes, como as que vocês colocaram. Só quero que isso fique registrado.
Parabenizo o Deputado Tarcísio...
(Desligamento do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Tarcísio Motta. Bloco/PSOL - RJ) - Desculpe-me, Deputado. Religue o microfone, porque acho que cometi um erro aqui.
O SR. JORGE GOETTEN (PL - SC) - Está na hora de eu encerrar.
Parabenizo esta Comissão pela aprovação do requerimento do Deputado Tarcísio, o que nos deu a oportunidade de ouvir os expositores de hoje.
O SR. PRESIDENTE (Tarcísio Motta. Bloco/PSOL - RJ) - Obrigado, Deputado Jorge. Desculpe-me. Não era minha intenção desligar o seu microfone. Achei que V.Exa. estava terminando. Não era o meu objetivo fazer aquilo.
Deputada Daiana Santos, tem V.Exa. a palavra por 3 minutos.
A SRA. DAIANA SANTOS (Bloco/PCdoB - RS) - Prometo que não vou nem usar os 3 minutos, porque quero ser bem breve nesta intervenção.
Primeiro, agradeço ao Deputado Tarcísio Motta e ao Deputado Gilson Daniel a iniciativa de abertura deste espaço de discussão. E agradeço a presença a quem participou da reunião tanto virtual quanto presencialmente.
O que me toca muito neste debate como um todo é observar que temos um enfrentamento real de algo que constantemente está nas nossas práticas, o enfrentamento da desigualdade, essa desigualdade que acaba de forma muito latente, quando se fala nessas mudanças climáticas radicais, impondo o pagamento da conta aos mais vulneráveis.
Acho que a Deputada Silvia Waiãpi foi muito feliz quando trouxe o tema para a realidade da forma mais prática, falando da vida cotidiana, de algo concreto, daquilo que existe. Nos últimos 8 meses — e digo isso inclusive linkando diretamente ao que houve meu Estado, o Rio Grande do Sul —, houve grandes impactos no País por conta das mudanças climáticas, e as pessoas que pagaram essa conta foram justamente aquelas que já vivem em condições mais vulnerabilizadas.
Então tratar desse tema é tratar de investimentos nas cidades, é tratar de uma estrutura muito maior do que aquilo que debatemos em determinados pontos. Digo isso porque acaba sendo pontual a discussão, quando acontecem essas situações. Não conseguimos mais tangenciar o problema, uma vez que, se estamos falando da desigualdade, temos que falar não só de geração de emprego e renda, mas também de qualidade de vida, de direito à cidade, de como essas cidades são organizadas e de quais os encaminhamentos reais que, principalmente neste ano, quando temos uma estrutura organizada e pensada para o período eleitoral, devem ser parte das plataformas de todas e todos os candidatos.
Isso tem que fazer parte do nosso cotidiano. Isso tem que estar no debate da estrutura real que vai tratar de um plano de governo para as cidades. Caso contrário, colegas, daqui a pouco, vamos falar dos 18 episódios de enchentes que vamos enfrentar. Caso contrário, vamos falar de mais vidas que se perderam.
No Rio Grande do Sul — de novo falo do meu Estado —, houve cidades completamente arrasadas, destruídas. Há pessoas que até hoje são dadas como desaparecidas, mas sabemos que já estão mortas. Essa é uma perda que não tem tamanho.
17:27
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Tratar disso, Deputado Tarcísio, é tratar de investimento, é tratar de prioridade e é tratar de política objetiva, que tem que estar no nosso plano real e na ordem do dia, para fazermos uma transformação onde esse impacto tira vidas, tira possibilidades de avanço, tira esperança, tira do povo aquilo que ele tem de mais genuíno, o desejo de seguir naquele espaço, porque se perde tudo, até a esperança.
Quero me somar a este grupo que vai fazer esse enfrentamento real do problema, tratando não só daquilo que é técnico, mas também daquilo que é político, de forma una. Nós precisamos fazer esse embate em conjunto.
Coloco-me à disposição, porque acredito que nós ainda temos tempo para isso. Mesmo que o tempo seja curto, é possível fazer uma mudança, cuidando daqueles e daquelas que já sofrem com a desigualdade neste País e precisam do nosso olhar atento, falando de habitação, de saúde, de direito à cidade e principalmente de direito à vida.
É isso. Obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Tarcísio Motta. Bloco/PSOL - RJ) - Muito obrigado, Deputada Daiana, pela participação e pela disposição.
Aproveito para lembrar os Parlamentares e todos os que estão aqui nos assistindo de que recorram a seus partidos, porque há uma Comissão Especial a ser instalada para discutir uma PEC sobre orçamento para desastres, e diversos partidos ainda não encaminharam os nomes que comporão essa Comissão. Orçamento é um dos elementos que, desde as primeiras reuniões, nós aqui colocávamos como um elemento central. Como vamos financiar os Municípios, na vida real, na vida concreta, a fim de que eles lidem com essa questão? Eu me refiro à Proposta de Emenda à Constituição nº 44, de 2023. Já há o convite para que os partidos indiquem os nomes dos integrantes da Comissão, mas não há ainda a primeira reunião convocada. Lembremo-nos, portanto, disso.
Muito obrigado, Deputada Daiana, por me fazer lembrar dessa PEC.
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Tarcísio Motta. Bloco/PSOL - RJ) - O Deputado Bibo Nunes é o primeiro propositor, mas é um debate, efetivamente, sobre a questão orçamentária.
Há dois Deputados inscritos. Passo a palavra primeiro ao Deputado Duarte Gonçalves Jr. Depois falará o Deputado Bohn Gass.
Deputado Duarte Gonçalves Jr, V.Exa. dispõe de 3 minutos.
O SR. DUARTE GONÇALVES JR (Bloco/PODE - MG) - Boa tarde a todas e a todos.
Quero cumprimentar o autor do requerimento, o Deputado Tarcísio Motta.
Infelizmente, não participei da reunião desde o início para acompanhar a fala de todos, mas percebi aqui a importância do que está sendo discutido. Falar de impactos climáticos é algo muito maior do que pensar única e exclusivamente numa situação colocada. Digo isso porque vivenciamos em Mariana, cidade da qual eu era Prefeito à época, o maior desastre ambiental do mundo, não por impactos climáticos, mas por culpa e responsabilidade unicamente do ser humano, principalmente das empresas Vale e BHP.
Percebi, diante de tudo o que aconteceu, que, no primeiro momento após a ocorrência de qualquer tipo de impacto, há uma grande participação de todos os Poderes públicos, da imprensa, mas é natural que, com o passar do tempo, o interesse por aquele assunto vá diminuindo, e poucas pessoas fiquem acompanhando aquilo de perto. Digo isso porque já se passaram 8 anos dessa tragédia, e várias pessoas da nossa região ainda não foram indenizadas, aguardam ainda uma indenização. Os Municípios não foram indenizados. E nós estamos falando das duas maiores mineradoras do mundo.
17:31
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Fico a imaginar qual seria a solução para se pensar em relação aos impactos climáticos ou em relação aos investimentos no meio ambiente, porque temos a percepção de que tudo o que foi dito aqui precisa ser enfrentado. Por isso esta audiência passa a ser tão importante.
No meu mestrado, eu apresentei uma proposta que acho muito interessante, principalmente para Municípios como os da minha região, Municípios mineradores que recebem uma cota da CFEM — Compensação Financeira pela Exploração Mineral, em razão da retirada do minério de ferro da região. Esse recurso que chega realmente faz esses Municípios terem uma receita maior. O que eu estudei e percebi é que dos 100% desses recursos que vêm para a cidade — e falo da cidade de Mariana, por ter vivenciado isso na prática — 0,3% é aplicado na Secretaria de Meio Ambiente.
Uma das propostas que quero muito discutir e para a qual peço o apoio da Casa é que isso possa se tornar uma lei com um percentual real de investimentos para a Secretaria de Meio Ambiente. Assim, poderemos buscar profissionais, técnicos, doutores, pessoas que se preparam e que entendem o que está acontecendo, a fim de que lá onde as pessoas vivem possa haver investimentos.
Então, pegaríamos uma parte de um recurso que não deixa de ser do Município, então podemos legislar sobre isso, porque o recurso continua a ser do Município, e diríamos ao Chefe do Executivo que é necessário que um percentual seja aplicado ali.
É necessário que, nos Municípios — volto a dizer, esse é o exemplo da região de onde venho — que têm o diferencial dos recursos da CFEM, uma parte desses recursos seja devolvida para o meio ambiente, porque nós fazemos investimentos em determinadas áreas, mas não investimos no lugar de onde vem a nossa riqueza. A totalidade do que está ali vem do meio ambiente.
Aqui nós temos pessoas muito mais preparadas que eu, mas temos que começar a entender onde está o recurso e como fazer esse recurso chegar ao Município, principalmente à Secretaria de Meio Ambiente, e fazer com que essa Secretaria possa fazer um trabalho de conscientização, de prevenção. Aí, sim, nós conseguiremos deixar um verdadeiro legado.
Acho que é uma proposta interessante que eu gostaria muito, Deputado Tarcísio, que V.Exa., com a sua experiência, analisasse, para quem sabe levarmos para os Municípios de Minas Gerais.
O SR. PRESIDENTE (Tarcísio Motta. Bloco/PSOL - RJ) - Muito obrigado, Deputado Duarte.
Acho que essa ideia está entre as outras ideias expostas aqui que o Deputado Gilson Daniel certamente vai colocar no relatório para nós as analisarmos.
A experiência do GT da violência contra escolas, por exemplo, presidida pelo Deputado Jorge Goetten, que está aqui na minha frente, foi exatamente a de que os projetos e ideias, ao serem encampados, com a ajuda da Consultoria Legislativa, por um coletivo como esta Comissão Especial, ganharam mais força.
Vimos os projetos votados no Plenário da Câmara nesta semana. Se eles dependessem, de fato, do trâmite normal, regular, não passando por uma Comissão como esta, demorariam muito mais tempo.
Vamos pensar muito nessa ideia, como em outras. Certamente, o Deputado Gilson, como Relator do coletivo desta Comissão, há de acolher as sugestões de diversos Deputados e Deputadas que estão passando por aqui.
Registro a presença do Deputado Chico Alencar.
Passo a palavra ao Deputado Bohn Gass, que dispõe de 3 minutos.
O SR. BOHN GASS (Bloco/PT - RS) - Boa tarde.
Deputado Tarcísio, quero parabenizar V.Exa. e os nossos palestrantes e convidados.
Nós fizemos uma reflexão sobre isso também no PPA Participativo. Nós relatamos o PPA Participativo e andamos por todos os Estados do País.
17:35
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O Presidente Lula determinou que fizéssemos escutas com participações virtuais e presenciais.
Esse tema entrou com muita força, e ele é a consequência que estamos tendo hoje das alterações que estão sendo feitas.
Outro dia, Deputado, eu falava sobre as reações da natureza, e aí uma pessoa me disse: "A natureza é vingativa. Ela cobra as ações da humanidade". Eu disse que a natureza não era vingativa. A natureza é generosa! O que está acontecendo são consequências da ação da humanidade sobre a natureza. Então, trata-se de uma consequência, não se trata de uma vingança, até porque, como um Deputado colocou lá em Santa Catarina, nós vivemos, Duarte, consequências fortíssimas no Rio Grande do Sul, e é impressionante como a natureza rapidamente se recompõe.
Há lugares, como vimos depois até da experiência do desastre de Mariana mesmo, vendo todo aquele lodo, aquela situação, aquela tragédia que todo mundo vivenciou, onde, se você passar, parece que isso não aconteceu, porque a natureza se regenera. Basta darmos a ela condições e não a continuarmos agredindo.
Então, eu queria só colocar isso, porque às vezes passa uma reflexão sobre isso. É a ação da humanidade sobre a natureza que traz exatamente as consequências tão drásticas que estamos vendo hoje.
Então, o PPA incorporou, no período de 2024 a 2027, recursos sensíveis na área do meio ambiente. Eu acho que isso é um tema que nós precisamos abordar.
Duarte, eu concordo com essa ideia de que essa parte sempre é de infraestrutura, são outros elementos. Existem situações emergenciais que têm que ser resolvidas. Às vezes, as pessoas estão passando fome, ou estão sem casa, ou estão nas ruas, ou há pontes que têm que ser reconstruídas. Mas é preciso haver também a preocupação com a preservação ambiental.
Eu acompanhei, na semana passada, o retorno que o Governo e os Ministérios do Presidente Lula deram para o Rio Grande do Sul, especificamente para o Rio Grande do Sul, naquela região que foi mais atingida no Vale do Taquari.
Nós estivemos em Muçum, na semana passada, com o povo do Ministério das Cidades, com o povo da Caixa Econômica Federal, com duas entidades bem importantes. Eu queria até divulgar isso, porque se trata do resultado também do nosso trabalho, do trabalho das Comissões e dos Parlamentares, que cobram do Governo, e, como agora tivemos um retorno, temos que divulgar também para dizer e parabenizar.
A CONTAG no Rio Grande do Sul é a FETAG, é o Sistema FETAG dos agricultores familiares, sistema de cooperativa de habitação. E o Movimento dos Pequenos Agricultores — MPA também tem uma cooperativa de habitação.
O Governo lançou o Minha Casa, Minha Vida Rural Calamidade. Então, existe uma modalidade nova, que foi construída a partir da realidade do Minha Casa, Minha Vida Rural, na área rural.
Existem 600 famílias de agricultores, e cada uma vai passar a receber, sem retorno. Serão 75 mil reais para 600 famílias, sendo 300 em cada uma das cooperativas, que são da FETAG e do MPA, que vão reconstruir suas casas, agricultores que perderam as residências por causa da enxurrada.
Eu acho que isso faz parte dessa política pública que nós temos que ter de reconstrução. Toda vez que existe uma situação de sinistralidade — eu vou concluir, Deputado Tarcísio Motta —, há aquelas ajudas emergenciais: as pessoas morreram; foram perdidas mais de 50 vidas; as pessoas estão desalojadas e têm que ter acomodação, têm que ter comida, têm que ter água; tem que haver um conjunto de coisas que são as questões emergenciais.
Outro aspecto é a reconstrução. Isso faz parte dessa reconstrução.
O terceiro elemento é o que vocês colocaram aqui, que é a questão estratégica do nosso clima e dos cuidados preventivos que devem ser tomados.
17:39
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Então eu queria deixar o registro desses três elementos.
O PPA debateu demais e esta Comissão vai ajudar muito. O Deputado Tarcísio Motta já está dando os encaminhamentos ao nosso Relator para que incorpore isso.
Eu queria concordar também com que os recursos fossem alocados para as questões do meio ambiente. Essas questões sempre ficam relegadas por causa da outra emergência. Parece que isso não é principal, nós temos que colocar como principalidade!
Também quero dar essa notícia de que está em reconstrução. Existem outros programas junto, mas este é um concreto, que já foi entregue.
Então, faço apenas esse registro e me coloco também à disposição.
O SR. PRESIDENTE (Tarcísio Motta. Bloco/PSOL - RJ) - Muito obrigado.
Deputado Chico Alencar, quer fazer uso da palavra, ou podemos encerrar a audiência aqui?
V.Exa. pode ter a palavra por 3 minutos, é claro!
Como não tínhamos avisado, antes da sua chegada aqui, que iríamos encerrar as inscrições, V.Exa. quer fazer uso da palavra por 3 minutos?
O SR. CHICO ALENCAR (Bloco/PSOL - RJ) - Menos de 3 minutos. Eu infelizmente não pude acompanhar a reunião, mas a nossa equipe da Liderança e do meu mandato estavam aqui.
Nós temos que aprender essa realidade nova. Há um mau costume — inclusive dos que se consideram progressistas ou da Esquerda — de termos uma caixinha para olhar a realidade, ou uns óculos bem tradicionais, muitas vezes, que têm dificuldade de incorporar as novas realidades.
Quando o Deputado Bohn Gass falou que existe o programa Minha Casa, Minha Vida Calamidade, esse é um sinal dos tempos!
Nós agora estamos entrando na era da incerteza absoluta. Isso não significa o caos iminente, a destruição do planeta, mas nunca, em qualquer outra época da história da humanidade, houve tanta imprevisibilidade — e não estou me referindo às sessões plenárias da Câmara Federal, que estão sob o signo da imprevisibilidade (risos), o que é péssimo para o trabalho legislativo — nos caminhos do mundo. Há a articulação dos planetas, o pluriverso de galáxias em expansão, e o planeta Terra está vivendo uma doença profunda. Se não atentarmos para isso, se isso não estiver na centralidade das nossas preocupações e das políticas públicas do mundo, estamos caminhando para o desastre efetivo.
Imaginem como a guerra na Ucrânia e a guerra em Gaza prejudicam o meio ambiente. O que é a vida em Gaza, que eu conheci, em tempos de relativa paz — a paz lá é sempre muito relativa —, e a vida agora? Na Ucrânia também...
Então, existe muita destruição, não só pelo nosso modo costumeiro de produzir, distribuir e consumir, como também pelos conflitos internacionais.
Esta audiência pública, pelo que pude recolher até agora, pelo que vou capturar também, vai ser muito importante, inclusive, para orientar nossas posições aqui na construção do arcabouço jurídico do nosso País, que não tem mais como ser uma autarquia isolada do mundo.
O mundo explode
Longe muito longe
O Sol responde
O tempo esconde
O vento espalha
E as migalhas caem todas sobre...
Copacabana
Essa é uma música do Caetano Veloso, de 1967. Todo poeta é um pouco profeta.
O SR. PRESIDENTE (Tarcísio Motta. Bloco/PSOL - RJ) - Eu gosto do Chico, porque ele cita a música, o autor e o ano. É um negócio impressionante! Um dia eu ainda vou conseguir fazer isso. Eu digo isso toda hora.
17:43
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Senhores e senhoras, eu vou solicitar ao Deputado Jorge Goetten que me substitua, se puder, rapidamente. Nós vamos proceder à votação dos dois requerimentos que estão na pauta da Ordem do Dia. Como um dos requerimentos é de minha autoria, eu não posso presidir esse momento da sessão.
Depois, vou retomar a Presidência apenas para verificar se os palestrantes gostariam de fazer uso da palavra por 2 minutos — não há mais tempo do que isso, o tempo está acabando —, para considerações finais ou alguma consideração a respeito do que os demais Parlamentares disseram.
Passo a Presidência ao Deputado Jorge Goetten.
O SR. PRESIDENTE (Jorge Goetten. PL - SC) - É impossível substituir o Deputado Tarcísio Motta.
Deputado Bohn Gass, eu estava me lembrando de algo. Alguém falou, não sei quem, se foi V.Exa., que a natureza é vingativa. Eu ouvi de alguém, tenho até anotado: Deus sempre perdoa; os homens algumas vezes perdoam; mas a natureza nunca perdoa.
Passemos agora à votação dos requerimentos.
Requerimento nº 30, de 2023, do Sr. Tarcísio Motta, que requer a realização de uma visita técnica ao Município de Maceió, para conhecimento in loco da situação de afundamento do solo urbano, comprometimento das edificações, evacuação de dezenas de milhares de pessoas, em contexto de grave desastre socioambiental.
Em votação o requerimento.
Os Deputados que o aprovam permaneçam como se encontram; os que o rejeitam queiram se manifestar. (Pausa.)
Aprovado o requerimento.
Requerimento nº 1, de 2024, da Sra. Silvia Waiãpi, que requer a realização de audiência pública para discussão do tema Atuação dos profissionais de serviço aeromédico, Corpo de Bombeiros Militar, forças de segurança e Forças Armadas envolvidos no resgate e auxílio a desastres e calamidades naturais, com foco nos equipamentos de proteção e saúde destes profissionais.
Em votação o requerimento.
Os Deputados que o aprovam permaneçam como se encontram; os contrários queiram se manifestar. (Pausa.)
Aprovado o requerimento.
Antes de devolver a Presidência ao Deputado Tarcísio Motta, só queria anunciar a presença do meu conterrâneo, o melhor Parlamentar de Santa Catarina, o Deputado Ismael dos Santos, que acabou de chegar aqui e faz parte da Comissão também. É lá de Blumenau, também flagelado muitas vezes por enchente.
Eu passo a Presidência ao Deputado Tarcísio Motta.
O SR. PRESIDENTE (Tarcísio Motta. Bloco/PSOL - RJ) - Muito obrigado ao Deputado Jorge Goetten pela presidência e pela votação dos requerimentos. A Secretaria da Comissão dará andamento, depois, ao encaminhamento de cada um desses requerimentos.
Para que nós possamos concluir a nossa audiência no limite máximo de 16 horas, pergunto agora aos palestrantes se os Srs. Saulo, Gustavo, Alexandre, Luciana ou Marcio gostariam de fazer uso...
(Intervenções fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Tarcísio Motta. Bloco/PSOL - RJ) - Dezoito horas, desculpem-me.
Pergunto ao Sr. Saulo se gostaria de fazer uso da palavra por 2 minutos para suas considerações finais ou comentários a respeito de alguma das falas feitas durante a nossa audiência.
17:47
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O SR. SAULO RODRIGUES PEREIRA FILHO - Agradeço ao Deputado Tarcísio, mais uma vez; ao Gustavo, do IPEA; ao Marcio, do Observatório do Clima, ao Deputado Chico Alencar e a todos os Deputados e Deputadas aqui presentes.
E, por último, finalizando o agradecimento por ter participado desta audiência pública, eu queria dizer que, depois de trabalhar há 20 anos nessa agenda climática, na Universidade de Brasília, como professor do Centro de Desenvolvimento Sustentável e pesquisador da Rede Clima, especificamente nessa temática de impactos, vulnerabilidade e adaptação, eu gostaria de trazer uma mensagem final — depois de todas as falas brilhantes que nós ouvimos aqui, de todos os participantes —, a de que eu acredito em soluções.
A crise é muito grave, a crise é muito séria, as soluções são muito difíceis de serem encontradas, porque a crise climática depende de múltiplos setores, da interação de múltiplos setores econômicos, e os interesses políticos e econômicos dos países mais desenvolvidos são muito poderosos. Então, é uma agenda difícil.
Os 30 anos da Convenção Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima mostram isso. Os avanços são muito incrementais e lentos, porque as decisões passam necessariamente por consenso entre todas as nações signatárias da Convenção do Clima.
Mas eu não perco esse otimismo — é um realismo otimista, eu chamaria, reconhecendo a gravidade da crise, reconhecendo a dificuldade de superação dos obstáculos que nós temos —, eu não consigo perder essa esperança de que nós encontremos soluções. Acho que, para finalizar a minha fala, é isso.
O Brasil é uma potência climática, o Brasil é uma potência de energia renovável, o Brasil é parte da solução da crise climática, sim. Nós temos vantagens comparativas e vantagens competitivas muito notáveis em relação a quase todos os países do mundo. Entretanto, somos um dos países mais vulneráveis do mundo aos impactos climáticos.
Então, essa dubiedade da posição brasileira nessa agenda, eu acho muito importante ser destacada. O Brasil é altamente vulnerável aos impactos climáticos, por estar num clima subtropical, por estar numa região da Zona de Convergência do Atlântico Sul, sujeito a El Niño e a La Niña do Pacífico. Então, os eventos climáticos são sempre muito intensos e muito extremos e estão se tornando cada vez mais intensos e mais extremos.
Porém, as medidas de adaptação, as soluções que reduzem o risco de perdas e danos podem salvar milhares de vidas de pessoas que vivem em encostas com risco de deslizamento, milhares de vidas de pessoas que estão sofrendo nas regiões mais atingidas por secas, como o Semiárido do Nordeste, mas também o Sul do Brasil e, agora, no Amazonas. As secas tornam as populações muito vulneráveis, e é preciso pensar em duras medidas de enfrentamento. Há os planos de contingência, que são os planos de remediação do pós-desastre. Nós precisamos nos preparar melhor. A Defesa Civil precisa estar equipada para oferecer as respostas diante dos eventos extremos pós-desastre.
Mas existem as medidas adaptativas preventivas, que não são menos importantes, e essas, sim, são atribuição do Ministério do Meio Ambiente, do Ministério da Ciência e Tecnologia, do Ministério do Desenvolvimento Regional, do Ministério da Integração, que têm uma missão muito importante, que é trabalhar a prevenção de risco.
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É possível — na literatura científica, os relatórios do IPCC mostram isso —, trabalhar a prevenção de risco, atenuando a gravidade e a intensidade de perdas e danos causados por impactos climáticos.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Tarcísio Motta. Bloco/PSOL - RJ) - Muito obrigado, Prof. Saulo.
Passo a palavra, então, ao Prof. Gustavo para as suas considerações finais e os comentários que achar pertinentes.
O SR. GUSTAVO LUEDEMANN - Muito obrigado, Deputado Tarcísio. Farei algumas considerações, rapidamente.
Primeiramente, foi um prazer estar em tão boa companhia nesta Mesa.
A primeira intervenção da Deputada Silvia Waiãpi foi muito interessante, porque, de fato, nós temos que levar em consideração que nós precisamos fazer tudo o que podemos fazer, como foi muito bem explicado pela Profa. Luciana e pelo Prof. Alexandre, para parar de causar o problema. É o que chamamos de mitigação, ao falarmos de mudança do clima, ou seja, nós temos que diminuir radicalmente, drasticamente, as nossas emissões de gases de efeito estufa. Isso é uma coisa.
A segunda coisa, que foi muito falada aqui na Mesa também, é que nós precisamos fazer tudo o que pudermos para proteger as pessoas que estão em risco, que estão em alto risco, principalmente, como comentado, em relação à vulnerabilidade.
Em terceiro lugar, uma coisa que nós não tínhamos abordado, realmente existe uma terceira frente em que nós precisamos trabalhar na política, como Governo brasileiro, que é realmente exigir também a contribuição daqueles países que mais causaram problema.
Na Convenção Quadro de Mudança do Clima, nós temos, no primeiro princípio da convenção, a responsabilidade comum, porém diferenciada, e respectivas capacidades. Então, nós precisamos pressionar os Governos. Eu lembro a fala do Deputado Chico Alencar também, em relação à questão das guerras, que estão sendo financiadas justamente por esses países mais ricos, que se recusam a chegar até o compromisso prometido em relação ao financiamento e desperdiçam esses recursos tão importantes de que nós precisamos. Em vez de evitar que pessoas sejam mortas, estão matando pessoas.
O Deputado Jorge Goetten não está aqui mais. Eu ia deixar uma provocação, porque, na verdade, não é possível nós compensarmos emissões quando colocamos gasolina, com recurso do gabinete, no carro e queimamos essa gasolina. Não se consegue compensá-la plantando árvores, porque um é o carbono do ciclo curto e outro é o carbono do ciclo lento, mas isso é uma aula que precisa ser dada com um pouquinho mais de tempo.
Enfim, esqueci alguma intervenção?
Deputado Diego Andrade e Deputada Daiana Santos, todos falaram também da questão da arquitetura, de como conseguir financiar isso, e eu vejo com muito bons olhos que estejamos discutindo isso. É isso mesmo que é a função do Parlamento, é nós pensarmos nisso.
O IPEA coloca-se à disposição, mesmo sendo do Executivo também — nós já trabalhamos muito com a Consultoria Parlamentar —, no que for conveniente, para pensarmos nessas arquiteturas e em como resolver essas questões, que são federativas, que são regionais. Especialmente a diretoria onde eu trabalho trabalha muito com essa questão.
Então, nós ficamos à disposição para qualquer nova colaboração que possamos vir a dar.
O SR. PRESIDENTE (Tarcísio Motta. Bloco/PSOL - RJ) - Muito obrigado, Sr. Gustavo.
Passo a palavra ao Prof. Alexandre Araújo Costa, que deve estar ainda nos acompanhando, para as suas considerações finais, em pouquíssimos 2 minutos.
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O SR. ALEXANDRE ARAÚJO COSTA - Obrigado, Deputado Tarcísio. Serei bastante breve.
Primeiro, queria agradecer a oportunidade e dizer que permanecemos abertos ao diálogo, com o compromisso de promover formação e informação a respeito da crise climática. Além do nosso trabalho básico de pesquisa, ensino, orientação etc., nós temos, na Universidade Estadual do Ceará, um projeto de extensão, de divulgação científica chamado O que você faria se soubesse o que eu sei? Temos disponibilização de cursos gratuitos, através da plataforma do Youtube. É só colocar @oqvf para buscar mais informações.
No minuto que resta, eu queria apenas dialogar com a fala da Deputada. Eu concordo que precisamos cobrar dos países ricos — eles têm uma responsabilidade fundamental —, mas nós não podemos entrar num abraço de afogados ou na lógica de: "Se você não vai fazer, eu não vou fazer nada". Se todo mundo pensar assim, realmente estamos fritos — em alguns aspectos, inclusive literalmente.
O Brasil tem os seus BOs, o Brasil tem uma grande responsabilidade. Pegando principalmente a questão do uso da terra, o Brasil é o quarto emissor histórico, atrás de Estados Unidos, China e Rússia. Na realidade, com uma grande quantidade, de quase 97 bilhões de toneladas de CO2, chegando perto de 100 bilhões de toneladas de CO2, o Brasil é o maior emissor por mudança no uso da terra, ou seja, desmatamento. Então, esse dever de casa nós temos que cumprir e temos que cobrar que todo mundo faça a sua parte também.
É isso.
O SR. PRESIDENTE (Tarcísio Motta. Bloco/PSOL - RJ) - Alexandre, obrigado. Repita o arroba, por favor. Qual é?
O SR. ALEXANDRE ARAÚJO COSTA - É @oqvf, "O que você faria".
O SR. PRESIDENTE (Tarcísio Motta. Bloco/PSOL - RJ) - Obrigado, Alexandre. Perguntei isso para que quem está nos assistindo possa pegar direitinho o arroba que deve procurar.
Eu não sei se a Profa. Luciana ainda está aí.
A SRA. LUCIANA VANNI GATTI - Estou.
O SR. PRESIDENTE (Tarcísio Motta. Bloco/PSOL - RJ) - Ah, ótimo! Então, a senhora poderá falar também por 2 minutos.
Além das mudanças climáticas, havia a mudança da sua filha, e eu sei que isso poderia tê-la tirado do final da nossa conferência, do nosso debate aqui, legitimamente. (Risos.)
A SRA. LUCIANA VANNI GATTI - Ambas causando o caos.
Eu queria aproveitar para dizer o seguinte: nós temos que pensar em solução.
Já mostramos aqui, em números, que o desmatamento está gerando a aceleração dos eventos extremos, causando mortes. Não só está causando mortes de brasileiros, mas também está causando prejuízos à própria agricultura, que é o motor por trás do desmatamento.
Então, senhores, mais área plantada não significa aumento de produtividade, pode significar isso num período curto de tempo, mas a longo ou a médio prazos significa um prejuízo da agricultura como um todo. Este País vai quebrar se não mudarmos a cabeça.
Eu proponho a criação de comissões técnicas às quais os vários setores venham para elaborar soluções. Como produzir alimentos e economia neste mundo de mudanças climáticas? Por que, ao invés de pensarmos em ampliar a exportação da soja, do milho e da carne, não pensamos em chamar, por exemplo, a China — que recebe 60% da soja para fazer ração animal — para trazer as fábricas de ração animal para o Brasil? Isso vai gerar renda, e nós vamos ter que produzir muito menos soja para gerar muito mais produtividade, rendimento e economia para o País. Ao invés de exportarmos matéria-prima, vamos exportar matéria elaborada e restaurar uma parte dos nossos ecossistemas — que agora estão fazendo falta para nós na produção da chuva, minimizando esses eventos extremos no Brasil. Usemos a Amazônia a nosso favor.
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Desmatamento não é progresso. Desmatamento está causando mortes. Soja na Amazônia traz envenenamento da população também. Temos que pensar num modelo bom para todos. O modelo atual está nos levando para o caos, inclusive o agronegócio, que está falindo com os eventos extremos, as secas e as chuvas intensas.
Vamos nos sentar todos, nos juntar, nos unir e elaborar planos de como fazer essa transição econômica em face das mudanças climáticas. E eu estou oferecendo os préstimos.
O SR. PRESIDENTE (Tarcísio Motta. Bloco/PSOL - RJ) - Nós agradecemos, Luciana, e certamente entraremos em contato para seguir neste debate central para o presente e futuro do planeta.
Passo a palavra, para as considerações finais, ao Secretário Executivo do Observatório do Clima, o Sr. Marcio Astrini, que dispõe de 2 minutos.
O SR. MARCIO ASTRINI - Obrigado.
Que bom que o senhor retornou, Prof. Chico, a esta Casa, porque é bom também termos um pouco de poesia e um pouco da sua memória nos assuntos mais difíceis que enfrentamos! Precisaríamos ter mais desses lampejos de lembrança poética aqui. Faz falta. Eu acho. Deviam se juntar o senhor e o Suplicy numa mesma sessão. (Risos.)
Não vou me referir necessariamente ao que foi dito aqui, mas há uma coisa neste debate que quero mencionar.
Quando o Papa veio ao Brasil, acho que em 2014, no Rio, havia um painel lá, e eu fui convidado para falar. Era uma coisa mais ou menos assim: O que fazer para salvar o mundo? E aí eu abri o painel já falando contra o nome do painel, porque é uma arrogância muito grande acharmos que vamos salvar o mundo. Não vamos salvar mundo nenhum. No máximo vamos nos salvar nele. O mundo não precisa de nós. Nós é que precisamos do mundo. Este é o primeiro pensamento que eu acho que precisamos mudar: se extinguirmos toda a raça humana, o planeta vive muito bem. Nós é que precisamos aprender a viver bem com o que existe nele. Essa é a diferença.
É isso que tentamos fazer há 30 anos nas conferências de clima. O pessoal se reúne, os diplomatas, todos os países e tal. Talvez o nosso maior ativo ambiental não dê para contar, porque é a sabedoria de uma população que existe também em outros países do mundo, que é a população indígena. A Amazônia é muito importante para o equilíbrio do clima, não apenas pelo que ela emite com o desmatamento, mas pelo que ela não emite ainda. A Amazônia é uma bomba de carbono. Estamos sentados em cima de uma floresta que estoca entre 5 anos e 10 anos das emissões atuais de gases de efeito estufa. Se perdermos a Amazônia, perdemos a briga pelo clima. Mas outra coisa muito importante no Brasil são as populações indígenas. O que fazemos há décadas, reunindo-nos para tentar achar um caminho de como conviver com este planeta, eles praticam há milênios já. Nós deveríamos exportar essa tecnologia e tratar os indígenas de forma digna e adequada, inclusive na confecção das leis.
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Vou terminar com esta crítica: esta Casa e a outra Casa irmã também têm maltratado demais os nossos indígenas. Deveríamos aprender com eles e não tratá-los da forma como vêm sendo tratados.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Tarcísio Motta. Bloco/PSOL - RJ) - Muito obrigado.
Encerramos, portanto, com algumas propostas e algumas questões absolutamente fundamentais.
Agradeço a todos a presença, a atenção e a participação.
Declaro encerrada a nossa audiência pública.
A próxima reunião extraordinária será oportunamente convocada pela Presidência.
Muito obrigado a todos e a todas.
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