1ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA 57 ª LEGISLATURA
Comissão de Educação
(Audiência Pública Conjunta das Comissões CE e CLP (semipresencial))
Em 7 de Dezembro de 2023 (Quinta-Feira)
às 10 horas
Horário (Texto com redação final.)
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A SRA. PRESIDENTE (Professora Goreth. Bloco/PDT - AP) - Declaro aberta a reunião de audiência pública da Comissão de Legislação Participativa em conjunto com a Comissão de Educação, destinada a debater a regulamentação do exercício da profissão de pedagogo.
Ressalto que a presente audiência decorre da aprovação do Requerimento nº 80, de 2023, aprovado por esta Comissão de Legislação Participativa, de minha autoria e do Deputado Chico Alencar, e ainda do Requerimento nº 229, de 2023, de minha autoria, aprovado pela Comissão de Educação.
Quero agradecer a presença dos membros deste colegiado, dos convidados e de todos e todas que nos assistem pelos nossos canais. Informo que este evento está sendo transmitido via Internet, e o vídeo pode ser acessado pela página da CLP no site da Câmara dos Deputados e pelo canal da Câmara dos Deputados no Youtube.
Hoje é um dia muito importante para milhares de pedagogos espalhados no Brasil.
Como pedagoga, professora, Parlamentar que preside a Frente Parlamentar Mista em Defesa da Escola Pública, como coordenadora da Bancada da Educação no GT de Desenvolvimento e Valorização do Professor, sinto-me honrada em presidir esta importante audiência. Aqui tenho o nobre objetivo de construir caminhos possíveis baseados em diálogos, entendimentos e compreensão para a melhoria da vida profissional do pedagogo no Brasil e, principalmente, para a melhoria da educação pública do País.
Sou Relatora do Projeto de Lei nº 1.735, de 2019, que dispõe sobre a regulamentação do exercício da profissão de pedagogo. Tenho a missão de relatar esse tema, com muita responsabilidade e seriedade. Sabemos que o curso de pedagogia existe desde 1939, é um dos mais antigos, mas a profissão não é regulamentada, o que por si só parece um paradoxo. Outros profissionais com os quais esse profissional trabalha dentro da escola, profissionais da educação física, historiadores, geógrafos, sociólogos, químicos e biólogos já têm sua profissão regulamentada. Fora da escola, a situação não é diferente. Os pedagogos atuam na assistência social, nos sistemas socioeducativos e nos sistemas judiciários, em equipes multiprofissionais compostas por psicólogos e assistentes sociais, que têm suas profissões regulamentadas. Essa situação não raramente coloca os pedagogos em situação de invisibilidade e subalternização em relação a esses e outros profissionais com os quais compartilham tarefas, como produção de relatórios, análise de casos.
Este tema é muitíssimo importante para este Parlamento, e nós não vamos nos omitir em dialogar sobre ele e tentar construir caminhos possíveis.
Antes de passarmos aos debates, peço a atenção das senhoras e dos senhores presentes para as normas internas da Casa. As Sras. e os Srs. Parlamentares interessados em interpelar os expositores deverão inscrever-se previamente junto à Mesa. Cada convidado terá o tempo de 10 minutos para a sua exposição. Após o encerramento das exposições, cada Deputado inscrito terá o prazo de 3 minutos para fazer suas considerações.
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Para compor a Mesa, convido o Sr. Jean Carlos Nascimento Lobato, Presidente da Federação Brasileira dos Pedagogos, a FEBRAPEC, Presidente dos Sindicatos dos Pedagogos do Pará, a SINPEP, e da Associação dos Pedagogos do Pará, a ASSPEEPA, que terá a participação on–line; Sra. Marlei Fernandes de Carvalho, Vice-Presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação, a CNTE; a Sra. Selma Garrido Pimenta, professora sênior da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo, a FEUSP, que terá participação on-line; o Sr. José Leonardo Rolim de Lima Severo, Coordenador Nacional da REPPED, professor na Universidade Federal da Paraíba, a UFPB, que também terá participação on-line; a Sra. Cyntia Bernardes, representante do Coletivo dos Pedagogos Jurídicos, a ANPEJUD, que terá participação on-line; o Sr. Adauto Leite Oliveira, membro do GT de Regulamentação da REPPED, Diretor-Geral da Associação de Pedagogas e Pedagogos do Norte e Nordeste, que terá participação on-line. Sejam todos bem-vindos.
Vamos dar início aos trabalhos.
Dando início às exposições, passo a palavra, por 10 minutos, ao Sr. Jean Carlos Nascimento Lobato, Presidente da Federação Brasileira dos Pedagogos, Presidente do Sindicato dos Pedagogos do Pará e da Associação dos Pedagogos do Pará.
O SR. JEAN CARLOS NASCIMENTO LOBATO - Bom dia, Deputada Professora Goreth. Bom dia a todos da Mesa. É um prazer enorme estar aqui representando a FEBRAPEC, que é a Federação Brasileira dos Pedagogos, o SINPEP, que é o Sindicato de Pedagogos do Estado do Pará, e a ASSPEEPA, que é a Associação de Pedagogos do Estado do Pará. São três entidades específicas de pedagogos que vêm trabalhando, ao longo de décadas, a favor da regulamentação da profissão de pedagogos no Brasil, tema esse de extrema importância.
E aqui, na abertura da minha fala, nobre Deputada Professora Goreth, pedagoga, quero parabenizá-la por encarar este tema com muita responsabilidade e chamar as entidades que, de fato e de direito, estão à frente desse debate no Brasil, como é o caso aqui da associação, da federação e do sindicato, como é o caso do colega Adauto, como é o caso dos colegas da REPPED e de outras entidades que, de fato, debatem a importância da regulamentação da profissão de pedagogos no Brasil. Mais do que isso, é o fato de que estamos há décadas à frente desse tema.
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E aí eu quero fazer aqui um breve apanhado histórico desse trabalho que envolve atores e políticos que o iniciaram, que foram precursores desse trabalho. Quero fazer menção aqui ao Deputado Arnaldo Faria de Sá, que deu início a esse tema em 1988, depois passou pelo Deputado Antonio Goulart, posteriormente, pelo Deputado Mauro Nassif e agora está sob sua relatoria.
Nós, do Sindicato de Pedagogos do Estado do Pará, somos o sindicato pioneiro no Brasil específico de pedagogos, fundado em setembro de 2001. Portanto, vamos fazer no ano que vem 23 anos nessa luta. Em 2014, nós criamos a ASSPEEPA e, por meio dela, nós já debatemos esse tema em forma de congresso, de seminário e de fórum nacional quatro vezes. O primeiro foi o Congresso Paraense de Pedagogos. Depois nós fizemos, no Estado do Amapá, o 1º Congresso Amapaense de Pedagogos para debater o tema. Posteriormente, o 1º Congresso Brasileiro de Pedagogos e, no último mês de novembro, nos dias 16 e 17, aqui, no Estado da do Pará, fizemos o 1º Congresso Amazônico de Pedagogos e demais Profissionais da Educação.
Como o nosso tempo é pouco, eu gostaria de me deter sobre fatos de extrema importância, como o de que nós, pedagogos, temos a certeza da necessidade de que essa regulamentação é algo que vai dirimir questões em torno da atuação do profissional de pedagogia. Primeiro ponto, nós pedagogos que atuamos em massa na educação, nas séries iniciais, mas que não estamos restritos somente à educação, somos os únicos profissionais no Brasil que atuamos dentro e fora da educação em todos os contextos.
Da empresa de ônibus ao supermercado, da Marinha, Exército, Aeronáutica ao Corpo de Bombeiros, em todas as instituições públicas e privadas, há atuação do profissional da pedagogia. E, pasmem, nós recebemos diariamente aqui no sindicato, na associação e na federação denúncias da atuação de pedagogos que ganham abaixo do salário mínimo. No entanto, é importante destacar a discrepância da quantidade de nós profissionais pedagogos atuando na educação para os demais profissionais. E aqui nós não queremos falar em divisão de educação, não queremos falar em divisão de trabalhadores, mas queremos fazer justiça em relação à importância desse profissional, na educação do Brasil, que dá início à vida escolar das crianças que estão ingressando nas unidades escolares.
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Aqui, no Estado do Pará, segundo dados do IBGE de 2022, último período de levantamento, nós somos 58.873 docentes no ensino fundamental, contra 15.367 docentes no ensino médio. Vejam bem essa quantidade! E aqui eu vou fazer o relato apenas sobre o Estado do Pará. Os pedagogos são os profissionais que estão nas séries iniciais, na coordenação, na orientação, no serviço técnico, na docência, na direção de escola, na gestão de Unidades Seduc na Escola, na gestão de Unidades de Referência Especializada, ou seja, estamos em todo o contexto escolar e fora dele. Uma profissão como essa, tão antiga, com relevante número de profissionais da educação, não ser regulamentada para definirmos a atuação do profissional da pedagogia no Brasil, em todos os âmbitos, é triste.
Nós somos milhões de pedagogos no Brasil e vivemos sempre, durante essas décadas, durante essas centenas de anos em que o pedagogo atua, à margem da educação, sempre se mantendo muito quietinho, sendo que era a maioria, e a minoria sempre quis falar pelos profissionais da pedagogia.
No ano da pandemia, os pedagogos estiveram na linha de frente, porque outros profissionais foram dispensados. Quem era que estava nas escolas entregando a alimentação para os pais dos alunos, entregando os kits escolares? Os técnicos, os diretores, os coordenadores pedagógicos, os pedagogos que têm turma.
E aqui, nesse tempo que me resta, eu gostaria que fosse feita justiça em torno da profissão de pedagogo no Brasil, que é uma profissão de extrema importância, como eu já disse, mas que, ao longo dessas décadas, nunca teve colocada a sua relevância no cenário nacional.
Eu gostaria de parabenizar a Sra. Deputada Professora Goreth, pela sua trajetória excelente na educação do Estado do Amapá, por ter chegado a Brasília como Deputada Federal e ter tido a responsabilidade de puxar este tema. Tenho eu a certeza de que a senhora sabe da importância dos profissionais da pedagogia para o Brasil. E a regulamentação da profissão de pedagogo é uma reparação histórica da nossa profissão. É uma reparação que vai dirimir a atuação do pedagogo dentro e fora da educação, trazendo para esse profissional da pedagogia a valorização, trazendo para este profissional da pedagogia a sua autoestima, para que ele entenda que agora, tendo sua profissão regulamentada, terá atuação específica no contexto geral da educação e fora dela. Concursos públicos para pedagogos fora da educação é um tema que precisa ser debatido. É preciso que se fale sobre isso. E, para que se fale sobre isso, para que esses temas possam ser debatidos, é importante que a nossa profissão seja regulamentada.
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Então, meus parabéns à senhora, meus parabéns à sua equipe, meus parabéns a vocês que tiveram a responsabilidade em trazer esse tema para um debate nacional e chamar quem, de fato, representa os pedagogos no Brasil para dizer que, sim, queremos a regulamentação da nossa profissão, porque já é mais que tempo que isso aconteça.
Muito obrigado.
A SRA. PRESIDENTE (Professora Goreth. Bloco/PDT - AP) - Obrigada, Jean, pela sua importante participação. Eu quero parabenizá-lo pela luta histórica e reconhecer o trabalho que vem capitaneando no Brasil, especialmente no Pará.
Quero mencionar aqui a presença da nossa Prefeita de Estiva Gerbi, em São Paulo, a Sra. Cláudia Botelho, professora e pedagoga. Seja bem-vinda.
Também quero saudar a Associação Universitária de Pedagogia do Brasil, que está acompanhando a reunião pelo nosso canal do Youtube.
Vamos passar a palavra à Sra. Marlei Fernandes, Vice-Presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação — CNTE.
A SRA. MARLEI FERNANDES DE CARVALHO - Bom dia. Deputada Professora Goreth, é uma satisfação imensa, em nome da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação, participar desta audiência pública e poder realizar importante debate sobre a atuação dos pedagogos e das pedagogas no País.
Quero ressaltar aqui a importância de realizarmos o bom debate e de também, progressivamente, podermos chegar a consensos necessários para a nossa atuação no País.
Como o nosso tempo é bastante curto, eu não vou me ater ao histórico da nossa profissão, enquanto pedagogos e pedagogas. Entendo que nós temos bastante consenso sobre a importância e necessidade da nossa profissão e, ao mesmo tempo, das nuances ou das disputas que esta profissão tem ao longo de todos os anos, desde 1939, como foi colocado aqui.
Como a audiência trata do Projeto de Lei nº 1.735, de 2019, eu quero, enquanto representante da Confederação e demais entidades, como a ANPAE, a ANPED e o Fórum Nacional Popular de Educação e também a ANFOPE, que emitiu nota recentemente acerca de todo esse debate, dialogar aqui com companheiros e companheiras, pedagogos e pedagogas da rede de pedagogos que se organizam no País, mas quero deixar muito clara a preocupação da CNTE e dessas entidades com a regulamentação da profissão de pedagogos e pedagogas no País. Nós entendemos que é uma profissão já regulamentada. Nós, pedagogos e pedagogas, somos profissionais da educação. A nossa formação precípua é de profissionais da educação, e isso está garantido na LDB, a Lei nº 9.394, de 1996, no art. 61, na Lei nº 11.494, de 2007, e na Lei nº 11.738, de 2008, a lei do piso salarial profissional nacional.
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Então, a nossa compreensão é de que nós somos profissionais da educação, portanto, professores, atuando em grande maioria na escola pública ou privada, mas não há, Deputada, nenhum impedimento legal da atuação daqueles que fazem a graduação em pedagogia em outras áreas. Não existe no País impedimento para isso. O art. 5º da nossa Constituição afirma que é livre o exercício de trabalho. Ao criarmos um processo de regulamentação de uma determinada profissão, no caso aqui, do pedagogo e da pedagoga, nós teremos outras implicações neste processo.
Por exemplo, falando diretamente do Projeto de Lei nº 1.735, de 2019, ele considera pedagogo quem tem em curso de graduação em pedagogia para exercer a docência. E, nas atribuições, por exemplo, fala em ministrar as disciplinas pedagógicas e afins nos cursos de formação de professores. Aqui não fala da docência na educação infantil e nem nas séries iniciais, o que já é um equívoco e uma preocupação que nós temos em relação à legislação que está na Casa. Então, aqui já excluiria todos os profissionais que estão na educação infantil e nas séries iniciais.
Ao mesmo tempo, quando fala também de outras profissões — e eu sei que a REPPED tem uma proposta de mudança no substitutivo dessa proposta que está colocada aqui hoje —, nós caímos na mesma situação. Quando eu vou identificar numa lei onde eu posso atuar, que se houver qualquer atuação numa outra nova fonte de trabalho, de exercício da profissão, também não poderá, porque estará restrito ao que dirá a lei.
Então, na nossa avaliação, enquanto representante da Confederação Nacional dos Trabalhadores e Trabalhadoras em Educação, é uma falsa ideia e um falso sentido essa ideia de regulamentação da profissão de pedagogos e pedagogas no País. O colega que me antecedeu disse: "Nós estamos na educação infantil, mas nós somos professores da educação infantil, formados em Pedagogia". Eu sou professora de Língua Portuguesa, formada em Letras, mas também formada em Pedagogia. Eu sou pedagoga da rede pública estadual do Paraná. Faço o ano que vem 30 anos como pedagoga da rede pública estadual. Nós somos profissionais da educação.
Então, essa preocupação que a CNTE traz hoje vai muito na contramão da fala do colega que me antecedeu — e, talvez, os outros colegas também possam falar a respeito —, no sentido de há uma injustiça em relação à nossa profissão. Não! Há uma injustiça em relação a todos os profissionais da educação no País.
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A senhora acompanha aqui na Comissão a defesa dos profissionais da educação. O que nós vivemos no País já é uma situação de calamidade pública, mas isso ocorre em relação a todos os profissionais da educação, não é algo adstrito aos pedagogos e pedagogas por conta de "sim" ou "não" à regulamentação da sua profissão. E reitero, Deputada, que, assim que a pessoa se forme no curso de pedagogia em graduação — o que todos nós que estamos nesta sala defendemos —, ela possa atuar em qualquer outra atividade que necessite da graduação, da formação enquanto pedagogo e pedagoga, para se fazer um concurso público ou não, para que se exerça a profissão de pedagoga e pedagogo em outras áreas. Não há impedimento. É por isso que nos causa certa estranheza esta condição de dizer que só a partir da regulamentação é que teremos reconhecimento. Então, nós da CNTE entendemos que não é isso.
Mais adiante, e mesmo já sabendo que há um debate sobre isso, temos aqui também estabelecido, no art. 4º do mesmo projeto de lei, que caberá ao Poder Executivo a criação do Conselho Federal e Conselhos Regionais de Pedagogia, para disporem sobre as demais atribuições, direitos, deveres, impedimentos, bem como sobre a jornada e o piso salarial da profissão de pedagogos. Isso está na contramão do que nós fizemos até hoje na história da educação brasileira. Nós já vimos isso. Quando você torna a profissão uma profissão que — entre aspas — "já é regulamentada enquanto profissionais da educação" e já tem toda a legislação para isso em uma profissão de pedagogos, nós vamos ter conflito na legislação. Nós temos uma lei do piso, que dispõe sobre o salário para todos os profissionais da educação no País. Que salário será esse regionalizado? Que salário será esse no âmbito do País? Não queremos que nenhum profissional ganhe menos do que um salário mínimo ou um salário mínimo. Isso é uma luta histórica das entidades e dos trabalhadores e das trabalhadoras. Nós sabemos disso. É desumano, assim como a Deputada deve ter acompanhado, que, quando nós não tínhamos a lei do piso, até 2008 — foram 200 anos desde a lei do Império para conquistá-la —, tínhamos professores no País ganhando menos de 300 reais. Hoje, temos uma legislação, a Lei nº 11.738, de 2008, que garante um piso profissional.
O que vai acontecer com essa possível regulamentação no conflito de pisos ou no conflito de salários? Como se dará isso? Nós não temos isso disposto em nenhum lugar. Na nossa avaliação, isso gerará um conflito entre os profissionais da educação na escola e os que atuam em outras situações, assim como um pedagogo, por exemplo, que atua na Justiça, como a colega aqui falará, deve ter um salário superior ao piso salarial profissional nacional. Estamos falando de aproximadamente 2 milhões de profissionais da educação, que atuam nas escolas públicas e privadas, e estamos falando de uma pretensa regulamentação para menos de 15 mil profissionais. E, claro, não somos contra isso, mas vemos uma desnecessidade da regulamentação. É nesse sentido que queremos retomar o tema aqui.
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Nós vimos também, Deputada Goreth — o que muito nos preocupa, e podemos fazer esse debate de forma muito ampla —, que já temos na educação pública, por exemplo, o Conselho dos profissionais da educação física. Por muitos anos, lutamos também contra esses conselhos. Para concluir, quero dizer que há profissionais da educação básica nas escolas que recebem de oficial de justiça, com mandado de segurança, mandado de prisão, porque não pagaram o Conselho, sendo que nós temos a nossa profissão regulamentada como professores.
Então, há enormes brechas ainda colocadas sob esses aspectos no Projeto de Lei nº 1.735, de 2019, e há outros elementos que podemos trabalhar na sequência, para ver qual é o melhor encaminhamento. A valorização dos pedagogos e pedagogas no País passa por uma proposta de educação pública, por uma proposta de reconhecimento do trabalho. O reconhecimento não necessariamente passa pela regulamentação da forma como está posta.
Eu reitero isso e coloco aqui o posicionamento da CNTE, da ANFOPE, da ANPED, da ANPAE, do Fórum Nacional Popular de Educação e de outras entidades que também se reunirão para enviar um novo documento a esta Casa e à senhora, respeitando as diversidades, para que também se compreenda que nós não podemos dissociar a profissão da pedagogia, dos cursos de pedagogia nessa distinção hoje colocada.
Sei que o tempo é curto, mas fico aqui para ouvir os demais colegas, respeitando os posicionamentos e para trazer, ao final, mais considerações.
Obrigada.
A SRA. PRESIDENTE (Professora Goreth. Bloco/PDT - AP) - Obrigada, Marlei, pela sua importante contribuição a este debate.
Passo a palavra agora para a Sra. Selma Garrido Pimenta, professora sênior da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo.
A SRA. SELMA GARRIDO PIMENTA - Bom dia, Deputada Professora Goreth e todas as pessoas que aqui se encontram.
Agradeço a oportunidade de estar aqui com vocês e, em especial, com V.Exa., Deputada Goreth, pedagoga como eu. V.Exa. demonstra um apreço enorme com esta iniciativa de buscar a regulamentação de um profissional que é também docente, mas não apenas docente. Ele tem inúmeras atribuições, como falarei em instantes.
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Eu trago aqui alguns pontos para a reflexão sobre esse tema, a partir da minha formação acadêmica e do meu exercício profissional como pedagoga desde a década de 60, em que atuei como profissional pedagoga nas escolas técnicas federais — em todo o sistema de escolas técnicas federais do Brasil —, apoiando pedagogicamente os professores e as escolas, para que estas fossem de melhor formação.
Além disso, há também minha execução como profissional pedagoga e inúmeras experiências de educação escolar, sobretudo aquelas que se voltaram ao princípio de incorporar na educação escolar e, portanto, na formação humana, uma ampla quantidade de crianças e jovens que estavam à margem da escola, devido às suas condições sociais.
Nesse sentido, eu vou trazer alguns argumentos sobre por que defendemos a pedagogia e a profissão de pedagogo, e começo com uma questão, eu direi aqui, que é a relação entre educação e pedagogia: às vezes, há algumas confusões sobre esses conceitos.
A educação, como nós sabemos, é uma atividade específica dentre os seres humanos; ela não existe em outros animais. Os humanos precisam se tornar humanos. A educação possui essa finalidade, como uma ação dos humanos para integrar a criança que nasce no contexto cultural que lhe é preexistente e na constituição da sua subjetividade. Isso só pode ocorrer entre os humanos na relação uns com os outros.
Nesse sentido, aos processos educativos realizados em todas as instituições e espaços da sociedade, escolares e não escolares, compete desenvolver as capacidades, os valores, os conhecimentos, as atitudes nas crianças e nos jovens, para que eles adquiram a compreensão crítica deles como sujeitos, indivíduos; e que compreendam também as práticas educativas que são realizadas na sociedade como um todo, analisando e propondo coletivamente transformações daquelas práticas que impedem a humanização como direito de todos os humanos.
E a pedagogia é uma ciência. Ela é um campo teórico-prático. Ela traz a sua histórica produção para o estudo dessa educação que é praticada na sociedade em todas as instâncias. A pedagogia, portanto, pesquisa os determinantes e as condições sociais, políticas, econômicas que favorecem ou que impedem os processos de humanização como direito dos humanos.
E os pedagogos, por sua vez, são profissionais de formação acadêmica no ensino superior, que atuam nas instâncias sociais, como já disse, nos sistemas escolares e não escolares, como hospitais, mídias, organizações não governamentais, etc. Fazendo o quê? Justamente analisando as práticas e propondo transformações, a partir dos estudos e conhecimentos científicos, teóricos e práticos da pedagogia como ciência da educação, conhecimentos esses que foram construídos e reconstruídos historicamente, e que podem e devem ser atualizados, conforme os problemas que essa formação humana apresenta nos atuais contextos. Nesse sentido, portanto, é que nós vamos apontar que a perspectiva desse trabalho pedagógico do pedagogo, que inclui a docência, mas não se restringe à docência, contribui para efetivar essa educação humanizadora como direito de todos.
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Nós vemos na longa história da pedagogia, desde a Grécia clássica, quando ela surge, as contribuições de grandes intelectuais, educadores, pedagogos que consolidaram a democracia de direitos políticos e sociais, dentre os quais o acesso à educação escolar pública, laica, gratuita para todos.
No Brasil, desde finais dos anos 30, após a criação dos cursos de pedagogia, nós temos profissionais pedagogos atuando no suporte pedagógico com vistas a melhorar as condições de formação humana; no suporte ao ensino e aprendizagem, ao trabalho docente, às crianças, aos seus familiares, coordenadores pedagógicos, orientadores educacionais e seus diversos e complexos contextos, apoiando a organização e gestão de espaços escolares e das atividades em geral que possam garantir uma escola de qualidade para este processo de formação humana de todos os estudantes que ali estão, o que nem sempre tem ocorrido.
Nesse sentido, nós podemos lembrar que no Brasil, desde a década de 1950, nós tivemos inúmeras iniciativas de criação de escolas, contemplando a presença dos pedagogos como profissionais da educação para esta escola que foi sendo criada. Como experiências educacionais de sucesso na direção da inclusão social em escolas públicas. Eu vou citar aqui alguns exemplos.
Podemos lembrar as escolas parque criadas por Anísio Teixeira na Bahia e em outros Estados, algumas ainda em vigência; as escolas experimentais e vocacionais dos anos 50, 60 e um pouquinho dos anos 70 em São Paulo, Pernambuco, Paraná e outros Estados; as escolas de aplicação ligadas às instituições públicas de ensino superior; as escolas em tempo integral criadas nos anos 80 e que permanecem até hoje, como, por exemplo, os CIEPs, no Rio de Janeiro, com Darcy Ribeiro; e os CEUs — Centros Educacionais Unificados, especializados na formação da educação básica, com a Marta Suplicy quando Prefeita. Em todas essas escolas, os profissionais pedagogos se fizeram presentes para além dos docentes também nas experiências não escolares, como, por exemplo, com Paulo Freire, e nos movimentos de educação popular, visto que foram posteriormente institucionalizados na Constituição Federal de 1988. Em todos esses períodos, nós podemos afirmar que os pedagogos, junto com outros profissionais que se voltam ao estudo da escola e à importância dessa formação humana, como, por exemplo, os psicólogos escolares, que têm regulamentada a sua profissão e outros que foram compondo o que nós denominamos de equipes de assessoria às demandas para uma escola de qualidade, tiveram e têm significativa contribuição à democratização da escola pública brasileira, garantindo a qualidade formativa das crianças e jovens das camadas populares especialmente. Além das escolas particulares, essas crianças e jovens passaram a ter acesso ao seu direito de escolarização após o movimento de ampliação de escolas públicas no País, que aconteceu no final dos anos do século passado e no início do século XXI, a partir de movimentos de várias instituições dos educadores que defendem essa perspectiva da democratização do acesso à escolaridade de qualidade para todas as crianças e jovens.
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Avançando um pouco na reflexão sobre o papel e o poder da escola nessa formação humana, nós trazemos vários autores, um deles é um inglês que nos diz que as escolas capacitam ou podem capacitar jovens a adquirir o conhecimento. Vejam bem que eu estou frisando aqui o conhecimento em todas as áreas — específicas e científicas — para garantir à maioria desses jovens e crianças o conhecimento que não pode ser adquirido em casa ou na sua comunidade e também aos adultos em seus locais de trabalho.
Este argumento se refere à essência da escola pública. Vamos lembrar que, hoje, depois desses movimentos de ampliação da escolaridade, nós conseguimos, no Brasil, ter escolas que atendem a 95% da população em idade escolar. Vamos lembrar que, até os anos de 1990, as escolas atendiam apenas a 40% da população em idade escolar. Vamos lembrar aqui, na história recente do nosso País, o Movimento dos Pioneiros, na década de 30, e o Movimento dos Pioneiros, mais uma vez convocado, na década de 60, com intelectuais de ponta — como Darcy Ribeiro, Paulo Freire, Florestan Fernandes, Octavio Ianni, Milton Santos e tantos outros, além das nossas entidades. Na época, fui fundadora — e sou membro até hoje — da ANPED, a Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação, já citada aqui, e da Associação Nacional de Didática e Práticas de Ensino. Fui responsável também pela promoção da ANDIPE. Já fizemos 42 encontros nacionais sobre didática e prática de ensino, cada um deles com mais de 4 mil participantes. Também fui promotora, na condição Presidente da Associação Nacional de Educação, das Conferências Brasileiras de Educação — que foram seis —, em defesa da escola pública, da educação pública e da expansão da escolaridade para todas as crianças brasileiras como um direito democrático. Então, esses argumentos se referem, portanto, à essência da escola pública que aqui defendemos. Valem essas minhas considerações para as escolas particulares, mas, como eu disse, a massiva participação na escola pública é das crianças de baixa renda, porque é nelas, nessas escolas públicas, que as novas gerações podem encontrar o que em nenhuma outra instância social lhes é disponibilizado. É isso o que o autor chamou de "conhecimento poderoso", que é decorrente das várias áreas do conhecimento: matemática, história, geografia, ciências, filosofia, psicologia, história, enfim.
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Esses conhecimentos é que permitem explicações confiáveis ou novas formas de se pensar a respeito do mundo e da sociedade atual e seus problemas, contribuindo assim para a produção de novos conhecimentos.
Então, os professores são responsáveis por essas atividades, mas eles estão inseridos, no contexto atual, em situações de extrema complexidade. Temos também alguns autores brasileiros que chamam a nossa atenção para o fato de que é pelo currículo que os alunos aprendem esses conteúdos e habilidades; escolhem e adotam valores; desenvolvem novos comportamentos e entendem melhor o mundo em que vivem.
Então, para contribuir com a democratização da educação brasileira, precisamos de um quadro de professores com formação própria às suas atribuições, valorizado em seus conhecimentos de saber e disciplinares. Somos responsáveis também pelas suas condições de trabalho, quadros de carreira e salários dignos; pelas condições para desenvolverem trabalho coletivo e pelo conhecimento das diversas e complexas realidades das escolas frente aos desafios decorrentes do aumento da pobreza e da miserabilidade e frente às dificuldades familiares, ao ensino com meios virtuais e à consideração das conquistas por igualdade social , das diferenças de gênero, raça, cor, etnia e minorias, que colocam questões extremamente importantes ao processo de ensino-aprendizagem, esses profissionais professores, nas escolas e fora delas, necessitam do apoio da equipe pedagógica especializada para realizarem bem seu trabalho de ensino-aprendizagem, assegurando a formação humana de todos. Finalizando, portanto, afirmo que a pedagogia e seus profissionais pedagogos têm muito a contribuir para essa educação humanizadora, direito de todos os seres humanos, tanto nos sistemas escolares quanto não escolares em geral. Por isso, nós precisamos regulamentar a profissão de pedagogo com um projeto de lei que corporifique esses princípios e, nesse sentido, contribua para que tenhamos um quadro de profissionais voltados, junto com os professores, para esses princípios que defendemos enquanto categoria de pedagogos. Uma observação importante é que inúmeras pesquisas têm mostrado que a pedagogia, como foi apresentada aqui por mim, não faz parte dos estudos dos atuais cursos de licenciaturas em pedagogia que formam professores. É muito necessário que ela seja inserida nesse contexto. Espero ter colocado alguns elementos que ampliem a nossa reflexão, para que tenhamos um debate e um encaminhamento para o fortalecimento da educação brasileira praticada nas escolas e fora delas. Muitíssimo obrigada. Desculpe-me por ter avançado um pouco no nosso tempo.
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A SRA. PRESIDENTE (Professora Goreth. Bloco/PDT - AP) - Obrigada, Profa. Selma Garrido Pimenta, pela sua brilhante participação. Eu passaria horas escutando a senhora aqui. Muitíssimo obrigada. Sou muito fã do seu trabalho e do seu engajamento. É um prazer estar aqui hoje como professora, pedagoga e Deputada Federal. Espero encontrá-la em breve.
A SRA. SELMA GARRIDO PIMENTA - Muito obrigada.
A SRA. PRESIDENTE (Professora Goreth. Bloco/PDT - AP) - Um abraço. Parabéns!
Agora passo a palavra para José Leonardo Rolim de Lima Severo, Coordenador Nacional da Rede Nacional de Pesquisadores em Pedagogia — REPPED e Professor da Universidade Federal da Paraíba — UFPB.
O SR. JOSÉ LEONARDO ROLIM DE LIMA SEVERO - Prezada Relatora, professora e pedagoga Goreth, prezadas e prezados Parlamentares desta Comissão, prezadas e prezados participantes desta audiência pública, pedagogas, pedagogos e estudantes de pedagogia espalhados pelo Brasil, começo por agradecer e valorizar a oportunidade de estarmos hoje aqui, apresentando de forma plural e democrática perspectiva de compreensão sobre um tema emergente e de fundamental importância para a comunidade acadêmica e profissional da pedagogia e para a sociedade como um todo.
A regulamentação da profissão de pedagoga e pedagogo é um dilema que tem transpassado décadas em nosso País, com tentativas malsucedidas de avanço. Agora nós temos, efetivamente, na composição de participantes desta audiência pública, a representatividade de perspectivas que, em momentos anteriores, sequer tiveram espaço, dada a hegemonia de determinados atores institucionais que operam com uma única, arbitrária e invariável visão sobre o tema.
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Quando falamos em pedagogia, como mencionou a Profa. Selma, que me antecedeu, e em seus e suas profissionais, não estamos falando de outra coisa senão de escolhas educativas que nos levam a determinadas perspectivas de futuro. Ressalto esse aspecto para reafirmar a importância de estarmos hoje aqui e, mais uma vez, para felicitar esta Comissão. Como pedagogo, professor do magistério superior em uma universidade Federal e coordenador da REPPED, vejo a potencialidade desta audiência para avançarmos na busca por consensos propositivos.
No Brasil, o curso de pedagogia existe desde o ano de 1939, o que o faz ter uma existência acadêmica anterior a muitos cursos cujas profissões hoje gozam de claro reconhecimento social. Ao longo de mais de 8 décadas, o perfil de profissionais tituladas neste curso, majoritariamente constituído por mulheres, alterou-se: de bacharelas a licenciadas, de especialistas a professoras. Porém, a marca dada por uma representação social que é bastante consolidada nessa trajetória caracteriza a pedagoga e o pedagogo como o profissional que possui conhecimentos amplos, vastos, para apoiar, conduzir, estruturar, gerir, criar e mediar processos e situações que articulam as mais variadas formas de ensinar e de aprender. Foi assim que conquistamos nosso lugar nas escolas, como docentes da educação infantil, dos anos iniciais do ensino fundamental, em suas diferentes modalidades, da educação profissional, da educação superior e, mais particularmente, referindo-me aqui às últimos 3 décadas, em espaços educacionais emergentes, não escolares, como aqueles vinculados às políticas de assistência social, de saúde, de justiça, em organizações sociais e comunitárias diversas. Nesses âmbitos, nós fazemos a diferença como profissionais que promovem os potenciais de desenvolvimento humano e social. Nós somos profissionais da educação, estando dentro e/ou fora das escolas.
É legítimo, então, que reivindiquemos nosso lugar, historicamente conquistado, pois confiamos em nossos saberes, esses saberes produzidos e aperfeiçoados ao longo do tempo. Toda pedagoga e todo pedagogo devem ter orgulho do que são e do que fazem, porque reconhecemos que nosso trabalho é guiado pela pedagogia como ciência da educação. Isso nos torna produtoras e produtores de saberes específicos, que são socialmente relevantes.
Todavia, esse trabalho tão importante tem sido ameaçado de várias formas. Como a profissão de pedagogo não é regulamentada, lamentavelmente — e faço referência à fala da colega Marlei, quando listou alguns dispositivos jurídicos que não se aplicam à regulamentação de profissões, o que é objeto de outro fórum jurídico —, os profissionais da pedagogia têm se deparado com realidades marcadas pelo não reconhecimento da especificidade, daquilo que sabem, daquilo que fazem. Com isso, temos situações de desvalorização, de subalternização, de tutela profissional, todas essas situações geradoras de circunstâncias que tornam a profissão de pedagogo e pedagoga pouco atrativa, instável, o que gera uma crise que, no limite, pode, sim, levar à sua extinção. A partir de estudos sobre perspectivas teóricas e tendências normativas realizados ao longo de quase 2 anos e apoiados também em pesquisas anteriores, desenvolvidas por seus membros, a REPPED entende que a regulamentação é um dispositivo que se integra a um aparato de garantias fundamentais para a continuidade histórica da profissão e melhores condições de reconhecimento e inserção profissional. Nós concebemos que uma proposta de regulamentação deve partir das necessidades concretas de profissionais que têm o direito legítimo de serem reconhecidos. É preciso dar vez e voz às pedagogas e aos pedagogos deste País.
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Como mencionado aqui pela Marlei, a Constituição Federal prevê que é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer, considerando os seus impactos, benefícios e danos à sociedade.
Eu gostaria de indagar: a ausência de formação qualificada para exercer o trabalho pedagógico junto de crianças, jovens, adultos, idosos, dentro e fora das escolas, não comprometeria o desenvolvimento humano? Isso não constituiria dano social? O dano social existe quando, pela imperícia, o trabalho realizado por profissionais não qualificados compromete os fins da educação e o desenvolvimento da própria sociedade.
Poderíamos enumerar um amplo espectro de situações em que a ausência de formação sólida em pedagogia é um fator que se desdobra em danos sociais. Por exemplo, escolas que delegam a regência de salas de educação infantil e ensino fundamental a pessoas sem formação específica ou até mesmo a estagiárias em formação inicial; Estados e Municípios que utilizam cargos de direção, coordenação e outras modalidades de suporte pedagógico à docência como moeda de troca de favores políticos e abrem mão de concursos públicos, que garantem que essas funções sejam bem exercidas por profissionais, com condições dignas de salário, carreira e formação continuada; profissionais em creches e em suporte educacional especializado junto de pessoas com deficiências e outras condições atípicas de desenvolvimento sem domínio pedagógico de suas funções.
Não seriam essas situações causadoras de danos sociais? Não seria a pedagogia uma formação necessária para que esse trabalho fosse bem desenvolvido? Pergunto mais: não seria, então, a hora de regulamentar a profissão de pedagogo, tendo em vista que o trabalho desenvolvido por essas e esses profissionais contribui para a promoção da educação como bem público?
Em um levantamento feito no ano de 2022, a REPPED coletou dados de mais de mil profissionais e estudantes de pedagogia de todo o País. As informações apontam um amplo consenso, representado por um quantitativo de mais de 90% a favor, em prol da regulamentação, por entendê-la como um instrumento de luta por direitos e garantia de segurança jurídica.
Mesmo nas escolas balizadas pela Lei de Diretrizes e Bases, cujo conteúdo dispõe sobre direitos e deveres de educadores e educadoras, as pedagogas e os pedagogos encontram insegurança jurídica. Essa lei nos destina à docência na educação infantil e nos anos iniciais do ensino fundamental, atribuição que não é uma prerrogativa nossa, uma vez que ainda se admite a formação em nível médio, em cursos normais, e também nos destina a funções de administração, supervisão escolar, inspeção escolar e orientação educacional, as quais também não são condicionadas à formação em pedagogia, uma vez que podem ser exercidas por qualquer licenciado com formação lato sensu, ou seja, as pedagogas e os pedagogos são hoje, diante desse quadro dilemático, dispensáveis, podem ser substituídos por quem possui uma formação acadêmica inferior e por quem possui uma formação acadêmica superior — aqui, em termos de hierarquia de graus de escolaridade. Quanto à atuação em espaços não escolares, o aparato jurídico é ainda mais limitado e susceptível a interpretações conforme os interesses dos que exercem poder administrativo. Então, enquanto REPPED, nós defendemos uma proposta de regulamentação que se oriente pela perspectiva de garantir o fortalecimento de espaços de atuação já conquistados, especialmente no contexto das escolas, mas também em outros contextos em plena expansão, expansão essa que se dá por demandas populares de democratização do conhecimento, do desenvolvimento humano integral, da inclusão social, sem que isso implique a criação de conselhos profissionais.
11:16
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Nesse sentido, nós requeremos à Deputada Goreth o compromisso explícito, firmado em carta constituída pelos seguintes princípios, tendo em vista a inserção de alterações no Projeto de Lei nº 1.735, de 2019. Primeiro, a retirada do art. 4º, cuja redação propõe a criação, pelo Poder Executivo, do Conselho Federal de Pedagogia. Além disso, a defesa da docência na educação infantil, nos anos iniciais do ensino fundamental, e das disciplinas pedagógicas como atribuição e função a serem reconhecidas e incorporadas no texto do PL; a legitimidade e a relevância do pleito para todos os profissionais que atuam em escolas, na docência, em funções de gestão, coordenação, supervisão escolar e orientação educacional, e nas áreas da assistência social, da cultura, da saúde, do Judiciário, da comunicação, do lazer, da educação profissional, entre outros âmbitos; o reconhecimento das pedagogas e dos pedagogos como profissionais da educação, independentemente do âmbito em que atuem, e que, quando no exercício do magistério — e aqui incluímos também as funções de apoio à docência, aquelas que mencionei anteriormente: gestão, coordenação, orientação educacional, supervisão, inspeção —, tenham garantida a devida aplicação do piso salarial dos profissionais do magistério, e não qualquer outro piso, e outras prerrogativas e direitos concedidos pela legislação vigente; e o reconhecimento de que os pedagogos exercem uma profissão única e fundamental, que não deve ser fragmentada.
Eu concluo reafirmando que a perspectiva de regulamentação proposta pela REPPED se respalda em necessidades concretas de reconhecimento desses profissionais, que têm legitimidade de requerê-la, que não fragmentam o trabalho dos pedagogos e das pedagogas, que não opõem categorias funcionais e não criam estruturas de controle e fiscalização, que não operam com lógicas hierarquizantes para sustentar relações verticais entre pedagogas e outros profissionais, incluindo as professoras e os professores. Nossa perspectiva colabora com a luta pela educação pública, gratuita, justa, equitativa, de qualidade social e pedagógica. Isso passa, necessariamente, pelas respostas que uma pedagoga e um pedagogo são capazes de oferecer às demandas sociais. Para isso, nós precisamos existir, nós precisamos ser reais. Para isso, nós precisamos que os nossos espaços e atribuições estejam definidos. Para isso, nós precisamos que a nossa profissão seja regulamentada.
Muito obrigado.
11:20
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A SRA. PRESIDENTE (Professora Goreth. Bloco/PDT - AP) - Obrigada pelas suas excelentes contribuições, Prof. José Leonardo, da Universidade Federal da Paraíba.
Passo a palavra agora para Cyntia Bernardes, representante do Coletivo dos Pedagogos Jurídicos — ANPEJUD.
A SRA. CYNTIA BERNARDES - Bom dia.
Meus cumprimentos a todos os integrantes da Mesa na pessoa da Deputada Professora Goreth e da Profa. Selma.
Agradeço a oportunidade, que no meu entendimento é ímpar, de participar desta audiência pública, que trata da regulamentação da minha profissão, de que eu tenho muito orgulho. Entendo que este é um dos momentos mais importantes e significativos, não só da minha carreira, mas também de todos os pedagogos e pedagogas.
Eu sou pedagoga de formação, especialista em infância e direitos humanos e sou mestre em educação. A minha trajetória profissional, Deputada Goreth, percorre 10 anos como docente da educação básica na rede pública de ensino, 2 anos na educação profissional e 8 anos no Poder Judiciário, onde atuo como analista judiciária especialista em pedagogia.
Hoje eu estou aqui como porta-voz dos cerca de 200 pedagogos que atuam nos Tribunais de Justiça Estaduais mapeados na pesquisa acadêmica de Pedro e Mirelly, publicada no livro As Práticas do Pedagogo nos Tribunais de Justiça Brasileiros, e também de muitos outros que atuam em outras instituições do Poder Judiciário, como os Tribunais Superiores, os tribunais eleitorais, os tribunais do trabalho e militares, no Conselho Nacional de Justiça, nos tribunais federais, além daqueles que hoje se inserem nos órgãos do sistema de justiça, como o Ministério Público e as Defensorias Públicas, ainda carentes de um mapeamento que identifique a quantidade.
Eu também acredito veementemente que a minha fala e a minha expectativa — a nossa, dos pedagogos que estão no Judiciário — em relação à regulamentação da nossa profissão ecoa também a voz de outros pedagogos que laboram nos mais variados espaços sócio-ocupacionais da nossa sociedade, especialmente aqueles que estão situados nos ambientes não escolares.
Existem várias pesquisas, entre as quais eu cito a pesquisa de doutorado da Mariana Serejo, que foi publicada no livro Atuação Profissional de Pedagogos em Contextos Não Escolares, que evidenciam os vários espaços. Quero citar alguns, que, embora sejam minoria em relação à quantidade de professores, hoje pedagogos professores, como a Profa. Marlei falou, são bastante significativos, dado o tempo histórico dessa inserção, como o Prof. Leonardo já destacou. Hoje nós temos profissionais pedagogos atuando em instituições socioeducativas, de acolhimento de crianças e adolescentes, de acolhimento de idosos, em Comunidades Terapêuticas, nos Centros de Referência e nos Centros de Referência Especializados de Assistência Social, o CRAS e o CREAS, em hospitais, Previdência Social, museus, centros de memória, Núcleos de Atendimento à Mulher Vítima de Violência, na aviação civil, em Departamentos de Trânsito, em editoras, em creches e em escolas institucionais, em organizações não governamentais, em departamentos de recursos humanos de empresas, entre tantos outros espaços.
11:24
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Nós estamos falando de espaços de trabalho que abriram portas não apenas aos profissionais pedagogos, mas que também foram motivados por lei ou por outras circunstâncias que buscam garantir e proteger os direitos humanos. Isso advém de uma legislação que aponta o conhecimento pedagógico como primordial. Entendemos que eles reconhecem e reivindicam o conhecimento pedagógico nesses espaços, para garantir não apenas o direito à educação, mas também o entendimento complexo da realidade do desenvolvimento humano de sujeitos nessas instituições e para além delas.
Então, a pedagogia, como ciência da educação, tem sido convocada não apenas para conduzir processos educativos sistematizados, com docentes nessas instituições, mas também com analistas, como é o nosso caso no Judiciário, que lança mão do conhecimento pedagógico, que é a nossa especificidade. Nós defendemos uma perspectiva emancipatória e crítica de educação e temos desenvolvido as nossas práticas pautados por essa perspectiva, para atender pessoas e famílias vulneráveis, crianças e adolescentes, idosos institucionalizados, pessoas em situação de encarceramento prisional, adolescentes em conflito com a lei, mulheres em situação de violência, população em situação de rua, pessoas com deficiência e, quase por unanimidade, pessoas que tiveram os seus direitos violados, como ocorre no Judiciário, e para promover a garantia desses direitos nas mais variadas instituições.
Feita essa panorâmica, eu quero contextualizar um pouco o nosso trabalho. Como o Prof. Leonardo disse, nós entramos no Poder Judiciário no início dos anos 2000, por uma especificação do Estatuto da Criança e do Adolescente, a da inserção de equipes multidisciplinares nas varas de infância e juventude. Somente em 2014 houve uma definição do Conselho Nacional de Justiça apontando o pedagogo para inserção nessas equipes, como contribuição do conhecimento pedagógico para as equipes. Hoje a nossa função primordial nas equipes multidisciplinares do Judiciário é a de assessorar, com o nosso conhecimento especializado e de forma interdisciplinar, os magistrados nas suas decisões judiciais. Entendemos isso como uma relevância inestimável no sentido de que são decisões que vão impactar a vida de pessoas e não apenas processos. Embora essa colocação ainda seja feita de forma tímida, os tribunais, a partir dessas definições legais, começaram a se adaptar, mas ainda de forma muito incipiente. Esses levantamentos que foram feitos sobre os pedagogos no Judiciário mostram que existe um amplo potencial de abertura de novos postos de trabalho no sistema de justiça.
Do meu ponto de vista, os legisladores já incorporaram o entendimento do valor do conhecimento pedagógico em outras instituições e na garantia dos direitos humanos, porque vemos várias legislações, como a Lei Maria da Penha, a Lei de Execução Penal, as leis que protegem as crianças e os adolescentes em situação de violência e os idosos, trazendo as equipes multidisciplinares — e muitas delas incorporam os pedagogos.
11:28
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Exemplo disso é o art. 100 do ECA, que define que, para o juiz aplicar uma medida protetiva, ele precisa considerar as necessidades pedagógicas da criança e do adolescente. Aí eu pergunto: quem é o profissional por excelência que define, orienta e subsidia o magistrado, para ele entender quais são as necessidades pedagógicas daquela criança?
No nosso entendimento, enfrentamos vários desafios quando entramos no Judiciário, justamente por questões como as que o Prof. Leonardo trouxe, como a questão do reconhecimento social da nossa profissão. Por ela não ser regulamentada, fomos colocados muitas vezes à margem, com certa invisibilidade, porque muitos de nós carregávamos uma identidade muito firmada na docência. Isso não é diferente para quem nos vê. As instituições, os nossos colegas de trabalho, muitas vezes, entendiam de forma equivocada o nosso lugar. É muito comum acontecer, por exemplo, de advogados questionarem os nossos relatórios nos processos judiciais, argumentando que não temos competência para avaliar um contexto, por exemplo, de disputa de guarda e o melhor interesse de uma criança numa situação de disputa de guarda. Esse é só um exemplo que trago à luz. Isso nos leva a uma situação de vulnerabilidade e de insegurança jurídica. No nosso entendimento, ficamos à mercê do entendimento pessoal e institucional sobre onde podemos atuar e o que devemos fazer, por não haver uma legislação ou uma regulamentação da nossa profissão que clarifique as atribuições que podem competir ao pedagogo e os espaços a atuar com o conhecimento científico que ele carrega. Entendemos que temos um papel social primordial nos mais variados espaços da sociedade que requeiram o conhecimento pedagógico.
Caminhando para o encerramento, quero deixar registrado que, por entender que os conhecimentos pedagógicos são cabíveis nos mais variados espaços e instituições em que há um domínio que é próprio da pedagogia, como nos apontam a Profa. Selma, o Prof. Libâneo, o Prof. Saviani, acreditamos que a regulamentação poderá nos proporcionar maior segurança jurídica, para não apenas permanecermos nesses espaços, como também viabilizarmos a abertura de novos postos de trabalho.
A regulamentação vai dar mais visibilidade para a nossa profissão e para a nossa especificidade, que são os saberes pedagógicos, frente aos mais diversos espaços sócio-ocupacionais, inclusive a escola. A regulamentação vai dar maior visibilidade aos pedagogos que trabalham há mais de 2 décadas no sistema de justiça e nas outras instituições que citamos. Isso porque entendemos que somente os esforços individuais dos profissionais abnegados e o reconhecimento pontual de algumas instituições e de alguns locais de trabalho não garantem a sobrevivência da pedagogia nessas instituições.
Encerro defendendo que precisamos de uma regulamentação que nos nomeie, que nos localize, que nos proteja e que nos projete em qualquer ambiente no qual o conhecimento pedagógico seja requerido, porque é por meio da regulamentação que sairemos da invisibilidade, que poderemos atuar em todos os espaços, inclusive na escola, com legitimidade, segurança jurídica e reconhecimento social, pela primordialidade do conhecimento pedagógico nos mais variados contextos que se voltem para o desenvolvimento humano, para a proteção do direito à educação e para a atenção às necessidades pedagógicas e educativas dos sujeitos atendidos.
11:32
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Eu agradeço a oportunidade e encerro com o coração muito agradecido. Parabenizo a Deputada Professora Goreth pela iniciativa de trazer o tema à tona e abrir a possibilidade de diálogo e de debate dos mais variados pontos de vista sobre a regulamentação.
Obrigada.
A SRA. PRESIDENTE (Professora Goreth. Bloco/PDT - AP) - Obrigada, Cyntia Bernardes, representante do Coletivo dos Pedagogos Jurídicos, pela sua brilhante contribuição.
Passo a palavra agora ao Sr. Adauto Leite Oliveira, que é membro do GT de Regulamentação da Profissão de Pedagogo da REPPED e Diretor-Geral da Associação de Pedagogas e Pedagogos do Norte e Nordeste — ASPENN.
O SR. ADAUTO LEITE OLIVEIRA - Bom dia.
Eu quero começar saudando a Deputada Professora Goreth pela coragem de propor este debate, um debate espinhoso, que levanta diversas paixões, mas que é extremamente necessário para que definamos o destino de um profissional tão importante na educação brasileira e em outros espaços fora do ambiente escolar.
Quero saudar também todos os membros da Mesa, a companheira Marlei, o Jean Carlos, com seu trabalho de algum tempo — inclusive, eu também tenho uma história nesse processo de defesa da regulamentação —, a colega Cyntia e o colega Leonardo, gestor da Rede Nacional de Pesquisadores em Pedagogia, da qual me aproximo de maneira muito feliz, porque, dentro dessa rede, há profissionais de extrema qualidade, de extrema competência, que nos fazem, o tempo inteiro, avançar na compreensão da importância da pedagogia.
Quero fazer uma saudação muito especial à Profa. Selma Garrido, porque ela é que tem dado, há muito tempo, no Brasil, junto com o Prof. Libâneo, as bases mais sólidas para a compreensão da pedagogia na sua dimensão de ciência e, portanto, como ela já apresentou, da sua capilaridade, da sua possibilidade e da sua pertinência em outros espaços de trabalho.
Das falas que observamos aqui, restam comprovados alguns pontos. Primeiro, a pedagogia é uma ciência da e para a educação. Segundo, esta ciência estrutura uma base profissional segura nos diversos espaços sociais, e a regulamentação da profissão é fundamental para o reconhecimento e valorização dos pedagogos e pedagogas de todo o Brasil.
É importante também ressaltar que esta audiência pública tem um diferencial, que é justamente estar composta por profissionais pedagogos e pedagogas de formação, porque, até aqui, o debate sobre a regulamentação tem sido interditado, nas nossas observações, por entidades, por grupos que, em sua maioria, são compostas por não pedagogos e não pedagogas. Então, nada é mais justo do que, em uma audiência pública, ouvir as pessoas que são realmente ligadas a essa profissão e que têm interesse no tema, têm interesse no debate.
11:36
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Eu sou professor da rede municipal dos anos iniciais e também tenho uma experiência na assistência social de 17 anos. Portanto, eu tenho outro elemento importante aí, que é o elemento de quem está na ponta, de quem está na base executando o trabalho, porque, muitas vezes, esses debates são direcionados por pessoas que não conhecem a realidade concreta do pedagogo e da pedagoga no exercício da sua profissão nos diversos espaços.
É importante dizer que a regulamentação está tratando de uma questão muito importante, que é a identidade profissional do pedagogo, como aqui já vem sendo dito pelos outros colegas. Vejam, quando dizemos que o pedagogo é restrito à docência, nós simplesmente apagamos todo o restante do arcabouço teórico da pedagogia, que demonstra que o pedagogo, como a própria Profa. Selma falou, não se restringe à sala de aula, não se restringe à docência.
O Prof. António Nóvoa, inclusive num trabalho que foi organizado pela Profa. Selma Garrido, intitulado Pedagogia, ciência da educação? — com uma interrogação —, fala justamente o seguinte: "Ora, quando estamos tratando sobre a identidade profissional, sobre a identidade do pedagogo, nós dizemos assim: o pedagogo é professor", como defendem os contrários à regulamentação. Aí se pergunta: "Professor de quê?". Se é professor de língua portuguesa, o que é que de fato o legitima nesse lugar específico de professor de língua portuguesa? É professor de letras? É professor de matemática? É professor de ciências? Então, na verdade, a natureza do trabalho pedagógico é muito mais amplo do que esses campos disciplinares específicos que são postos nas escolas, que podem ser desenvolvidos, inclusive, pelos profissionais com formações específicas. Portanto, a regulamentação vai proporcionar não apenas a permissão do pedagogo nos diversos espaços, mas o reconhecimento da sua competência técnica para estar em determinados lugares e em determinados fazeres.
É importante dizer que, na assistência social, nós somos o segundo profissional em número de atuação. Somos o segundo profissional, em quantitativo, que atua na assistência social. Entretanto, assim como na pedagogia jurídica, nós não somos reconhecidos como profissional competente para, por exemplo, emitir relatórios, assinar relatórios. Nós somos instados a fazer coisas que não têm relação direta com a nossa competência teórica, com a nossa competência profissional. Quando você regulamenta a profissão e define nessa regulamentação as suas competências, você faz com que todos os espaços profissionais reconheçam o pedagogo como detentor de um saber que vai, definitivamente, modificar para melhor aquele ambiente. Então, não basta apenas dizer que é permitido ao pedagogo trabalhar em qualquer lugar, é importante dizer que ele precisa ser reconhecido naquilo que ele é competente para fazer.
11:40
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Eu quero também trazer uma questão a respeito dos conselhos, um tema muito batido. Não há nenhum estudo científico sério que aponte para, digamos assim, a inutilidade, ou a ineficiência, ou a negatividade dos conselhos diante dos profissionais que a eles são vinculados. No nosso debate junto com a REPPED, como membros do GT de regulamentação, nós entendemos que o conselho deve ser retirado da proposta de regulamentação atual. Essa é uma defesa nossa, mas não é por demonizarmos os conselhos. Vejam, os profissionais de enfermagem conseguiram garantir o seu piso salarial com a junção do trabalho do Conselho de Enfermagem com o Sindicato de Enfermagem. Então, não há incompatibilidade de defesa de palcos. Os pedagogos continuarão sendo profissionais da educação. Nós entendemos que a retirada do conselho é importante porque, obviamente, o assunto demanda um debate mais aprofundado com a categoria, mas não porque nós entendamos que o conselho é uma instituição a ser demonizada. Isso é algo que depõe, inclusive, contra conselhos que atuam de maneira muito importante na sociedade, como o Conselho de Pedagogia, o Conselho de Medicina, a própria OAB, o Conselho de Engenharia. Então, temos que ter cuidado ao tratar de determinados temas, porque senão nós podemos, digamos assim, dizer algo que não tem relação direta com a realidade.
Compreendemos que a regulamentação da profissão de pedagogo é superimportante por conta do seu reconhecimento profissional nos diversos espaços, por conta da relação horizontal que precisa ser mantida em todos os ambientes. Mesmo na escola, o pedagogo não é visto em uma relação horizontal, ou seja, quando você coloca o pedagogo restrito à docência, ele, muitas vezes, é excluído do debate da definição de políticas públicas da educação e de tantos outros espaços.
Para finalizar, eu quero agradecer ao grupo da associação de pedagogos e pedagogas que eu componho e aos colegas que se somam na nossa luta pela valorização do pedagogo e da pedagoga. Não posso citá-los nominalmente porque são centenas de colegas. E quero dizer que a regulamentação, de fato, é o caminho que nós temos para fazer com que esse profissional seja valorizado e tenha o seu espaço não apenas permitido, mas reconhecido, onde quer que ele esteja.
Obrigado, Deputada. Agradeço a todos os membros da Mesa. Estamos aqui para somar no que for necessário neste debate.
A SRA. PRESIDENTE (Professora Goreth. Bloco/PDT - AP) - Obrigada, Adauto Leite Oliveira, membro do GT de Regulamentação da Profissão de Pedagogo da REPPED e Diretor-Geral da Associação de Pedagogas e Pedagogos do Norte e Nordeste, pela sua brilhante participação.
Registro a presença do Deputado Prof. Paulo Fernando.
Muito nos honra a sua participação. Já quero perguntar se V.Exa. gostaria de falar. (Pausa.)
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Nós estamos caminhando para o encerramento das exposições. Vou pedir, então, que todos os participantes desta audiência passem a fazer as suas considerações finais, por 3 minutos. Gostaria que atentassem para isso. Acho importantes essas considerações finais.
Eu passo a palavra imediatamente para o Jean Carlos Nascimento Lobato.
O SR. JEAN CARLOS NASCIMENTO LOBATO - Mais uma vez, agradeço à nobre Deputada e a todos os presentes neste debate tão importante e histórico para a regulamentação da profissão de pedagogo no Brasil.
Ressalto novamente a importância de este debate estar sendo feito com quem de fato representa pedagogos, porque, embora haja muitas instituições no Brasil que representam parte dos trabalhadores da educação, a representatividade específica de pedagogos é dessas pessoas que aqui falaram, dizendo a importância deste debate e por que queremos esta regulamentação.
A regulamentação, volto a repetir, é uma reparação histórica de um profissional que, como aqui já foi falado, não está restrito somente à educação. Ora, o art. 69 da LDB classifica quem é o profissional da pedagogia e diz a sua área de atuação. Todo pedagogo é docente, ou professor, como queiram chamar, mas nem todo professor é pedagogo. O professor é aquele profissional da educação que atua em uma matéria específica — química, física, biologia, arte, matemática e assim por diante. O pedagogo é o único profissional que atua na docência, fora da docência e em todos os âmbitos educacionais. Não podemos ter a nossa identidade apagada. Nós somos profissionais cuja profissão tem centenas de anos e, ao longo desse tempo, sempre ficamos à margem da educação. É um momento histórico, é um momento em que precisamos ecoar alto a nossa voz e dizer o seguinte: a regulamentação da profissão de pedagogos já passou da hora de vir.
Deputada Goreth, colocamos a nossa instituição e o nosso trabalho à disposição para dizer que queremos ser reconhecidos como profissionais da pedagogia, que atuam dentro e fora da educação. E somos a maioria desses trabalhadores no Brasil — que isso fique bem claro.
Obrigado pela oportunidade. Obrigado por este debate rico em ideias, que trata da importância de nossa profissão no Brasil.
A SRA. PRESIDENTE (Professora Goreth. Bloco/PDT - AP) - Obrigada, Jean Carlos Nascimento Lobato.
Passo a palavra agora para a Marlei Fernandes de Carvalho.
11:48
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A SRA. MARLEI FERNANDES DE CARVALHO - Obrigada, Deputada Goreth.
Eu quero aqui, de forma bem solidária, dialogar com os demais expositores, porque nós temos poucas divergências. Eu acho que nós precisamos convergir em algumas orientações neste momento e neste período histórico.
Todos sabemos que nós pedagogos e pedagogas somos profissionais e defendemos a nossa profissão como uma ciência da educação, mas não desconsideramos as demais licenciaturas também como ciência da educação. Já superamos essa dicotomia na década de 80, quando se colocava o pedagogo como o único da ciência da educação. Não, todos os profissionais da educação — e eu concordo com a Selma Garrido, aliás estudei para fazer a pedagogia — têm que ter a parte da ciência, que no ensino superior é mais considerada, mas na educação básica, não.
Aí, nós já vamos começar a trabalhar no que vocês têm levantado aqui, no sentido de que a regulamentação vai dar direito à valorização. Nós já temos a nossa profissão regulamentada. Somos profissionais da educação, como todos vocês colocaram aqui, e não é por isso que não há o processo, neste momento histórico, inclusive de reconhecimento da nossa valorização profissional.
Então, primeiro, eu queria colocar isso. Segundo, quero dizer que esta não é uma posição pessoal da Profa. Marlei, que há 30 anos é pedagoga.
Eu fiz licenciatura também. Eu sou professora de letras e sou pedagoga da escola pública, mas não atuo como pedagoga em sala de aula. Eu atuo como docente, como professora pedagoga no meu Estado, na parte que diz respeito ao apoio da organização do trabalho pedagógico. Mas eu me considero profissional da educação, segundo o que diz a LDB.
"Art. 61. Consideram-se profissionais da educação escolar básica os que, nela estando em efetivo exercício e tendo sido formados em cursos reconhecidos, são:
...................................................................................................................................................................................................................................................
II – trabalhadores em educação portadores de diploma de pedagogia, com habilitação em administração, planejamento, supervisão, inspeção e orientação educacional, bem como com títulos de mestrado ou doutorado nas mesmas áreas".
Está aqui. Está regulamentado.
Companheiros e companheiras, eu queria ainda salientar aqui que todos nós estamos na mesma linha da defesa da pedagogia como ciência, na defesa da pedagogia que forma os profissionais da educação e na defesa da pedagogia da Resolução nº 2, de 2015, que a REPPED também assina. Que seja considerada a Resolução nº 2, de 2015, que foi revogada, e que seja revogada a Resolução nº 2, de 2019. Que volte a Resolução nº 2, de 2015, que trata toda a pedagogia e todas as licenciaturas como ciência da educação, e não a fragmentação que está posta na Resolução nº 2, de 2019.
Desculpem-me por passar um pouquinho mais do tempo, mas é para dialogar, por fim, nesta condição, com o José Leonardo, com a Cyntia e também com o Adauto.
Então, vejam bem. Nós também não defendemos que haja a contratação precarizada desses profissionais. Nós não defendemos que para a educação infantil sejam contratados outros profissionais, com outras denominações que não seja o profissional pedagogo. Nós não vamos viver uma extinção do pedagogo.
11:52
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Estamos na maior lacuna da história: até 2030 não teremos mais profissionais da educação. E eu estou falando de todas as licenciaturas, inclusive da pedagogia. Os nossos jovens não querem mais se tornar profissionais da educação, porque, de fato, essa é uma carreira desvalorizada. Dói-me falar isso. A luta é de mais de 30 anos para termos reconhecimento profissional, para termos carreiras reconhecidas, para termos piso salarial sem achatamento dessas carreiras. Isso é o reconhecimento da valorização profissional. E eu torno a dizer: não é só no ambiente escolar, mas fora dele, que a pedagogia lhes dá esta condição.
Cyntia, você é analista jurídica e é pedagoga. A pedagogia lhe deu essa condição. Mas que bom! Sabemos que no Judiciário as equipes multidisciplinares têm psicólogo, têm assistente social e têm pedagogo. É muito bom isso! Não é ruim, nós apoiamos. Quando vocês falam que é preciso valorizar quem está nos espaços não escolares, eu pergunto: quem vai fazer a avaliação dessa regulamentação? E aí vão entrar os conselhos de regulamentação. O percurso para nós, até hoje, dentro da educação básica, com o Conselho de Educação Física, foi e é muito desastroso, difícil.
Vocês disseram assim: "É um equívoco dizer que nós precisamos de mais valorização". Todos nós estamos de acordo com isto: a necessidade da valorização. Mas a necessidade da valorização não passa especificamente pelo processo da regulamentação, mas por um amplo debate do que nós pedagogos e pedagogas significamos para o País. Então, preocupa-me novamente esta segmentação: sou pedagoga e não estou na escola; não sou profissional, mas posso atuar em todos estes espaços.
Como pedagoga, faço relatórios na escola. Como pedagoga, convoco pais e mães para a escola. Como pedagoga, encaminho cada problema da escola, de um menino, de uma menina, para as políticas públicas intersetoriais na educação, que são a saúde, a assistência e outras tantas que nós definimos coletivamente.
Eu quero mais e mais pedagogos e pedagogas, não tenham dúvida disso. Há 30 anos eu estou nesta profissão, defendo-a e luto pela sua valorização. Nós estamos aqui querendo apresentar o que pode acontecer neste processo de regulamentação que defendemos contrariamente, da forma como está a legislação e da forma como ela vem sendo apresentada por alguns.
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Deputada Professora Goreth, estamos à disposição.
Agradeço imensamente este espaço democrático — é para isso o Parlamento — e a sua atuação em defesa da educação pública.
Muito obrigada.
A SRA. PRESIDENTE (Professora Goreth. Bloco/PDT - AP) - Obrigada, Marlei.
Eu passo a palavra agora à Profa. Selma Garrido Pimenta, para as suas considerações finais.
A SRA. SELMA GARRIDO PIMENTA - No Estado de São Paulo, o Governo Estadual, ainda na década de 1990, extinguiu o cargo de pedagogo nas escolas públicas, nas 5.500 escolas públicas que tínhamos. O pedagogo não regulamentado desapareceu da educação pública nas escolas estaduais, mas permanece nas escolas municipais. No Município, temos mil e poucas escolas; no Estado, temos mais de 5 mil. Não temos o pedagogo, por ausência da regulamentação, porque sabemos que o interesse do Estado não é este da valorização da qualidade da educação pública e das escolas públicas.
Eu fico aqui invejosa do Jean, porque o Estado do Pará mantém. E eu o cumprimento, pois é importante que permaneça. Então, se a profissão não for regulamentada, vocês poderão ter governantes com as mesmas questões ideológicas que as do Estado de São Paulo, e acabar com a presença desses profissionais, porque não são regulamentados. Esse é um ponto muito importante.
Vocês sabem que esse Estado, no Governo Estadual, tem sido um laboratório de políticas que caminham na direção contrária à da pedagogia, da ciência, da educação, da qualidade formativa, das condições de trabalho dos professores e assim por diante.
A profissão de pedagogo não está regulamentada. A regulamentação que foi aqui referida é dos profissionais da educação em geral. Os pedagogos são profissionais da educação, mas eles não estão sendo contemplados nessa regulamentação geral e muito genérica, que é aplicada com muito mais ênfase, aliás, oportunamente, eu diria, aos professores em geral. Eu posso dizer isso, porque eu atuei nas experiências educacionais em nível nacional, em inúmeras universidades, em inúmeras, como eu falei, escolas dos sistemas federais de educação e fui muito valorizada.
Eu agradeço o reconhecimento que várias pessoas colocaram à minha pessoa, ao meu trabalho, à minha formação, mas eu também quero acrescentar o reconhecimento dos profissionais professores na minha atuação como pedagoga. Em parte, tive essa possibilidade pela minha formação, pela minha trajetória, por aquilo que penso, pelos valores, pelas associações que coordenei, etc., mas os pedagogos que estão sendo formados atualmente não terão esse reconhecimento para atuar como pedagogos, como já foi falado aqui, porque nós vivemos um momento da sociedade brasileira, diferentemente de outros países que já regulamentaram a profissão, sem conselho nenhum para interferir... Nós temos quase certeza de que esses estudantes de pedagogia, que são mais de 60 mil em todo o Brasil, se eu não me engano — é um número estratosférico —, ao serem formados, não terão reconhecimento para atuar como pedagogos sem a regulamentação. Então, nós estamos falando de presente e de futuro. Nós podemos projetar a sociedade que queremos, uma sociedade justa, de direitos, a partir da análise da realidade, como o Adauto bem lembrou aqui. Eu faço aqui esse adendo para colocar do que nós estamos falando.
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Eu quero também aqui lembrar que foi uma conquista de todos nós educadores colocar a formação dos professores para educação infantil e ensino fundamental, as séries iniciais, em nível superior, porque antes a habilitação era realizada no ensino médio, no magistério ou nas escolas normais, como a que eu fiz lá na década de 50. Isso foi uma conquista importante.
Em pesquisas, quando você indaga o que contém a profissão de pedagogo, os estudantes de pedagogia não se reconhecem como pedagogos, porque eles não sabem. Essa é uma questão muito importante, que não significa mexer... É claro que isso varia conforme os cursos em todo o País, mas vamos lembrar que, considerando as escolas superiores e os institutos de educação superior que oferecem licenciatura em pedagogia no Brasil, 92% das matrículas em pedagogia ocorrem em instituições de ensino superior que não têm pesquisa, ensino, extensão, que não têm a valorização do pedagogo, que não têm, por ene razões, condições de oferecer uma formação de qualidade para o formando atuar como pedagogo professor, atuar como pedagogo no apoio pedagógico em várias locais. Então, são esses dados da realidade que nós temos que olhar.
Portanto, não se trata aqui de uma defesa de um espaço exclusivo. Trata-se da defesa do espaço de atuação de um profissional que necessita ser reconhecido para atuar junto com outros no coletivo, como fizemos aqui, no Ginásio Estadual Pluricurricular Experimental. Éramos um grupo de coordenação da escola, incluindo a gestão, a coordenação pedagógica, o apoio psicológico aos alunos, aos professores e às famílias, mas tínhamos um projeto coletivo de uma escola de qualidade. É nesse sentido que nós estamos colocando a importância da regulamentação. É preciso, como diz o Jean... Eu diria que, se consideramos 1939, são muito mais do que 30 anos de luta. A luta começou lá na década de 30, como eu disse, com Anísio Teixeira e os demais, na defesa da escola, da expansão da educação pública e da escola pública, porque, como nós sabemos, até então, as escolas brasileiras tinham apenas um professor, que, às vezes, nem tinha formação para tanto, nas escolas particulares, ligadas a várias instituições.
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A valorização do professor e do pedagogo com a criação do curso de pedagogia vai na direção de reconhecer a complexidade que os espaços de educação escolar e não escolar requerem. E os professores necessitam, nesta complexidade, deste trabalho. São poucos, muito poucos, os pedagogos que, como a colega que me antecedeu colocou, atuam da forma...
Eu parabenizo você por essa atuação de apoio pedagógico nos locais nos quais você se inseriu, mas eu fui formada na década de 60. Os pedagogos que aqui estão, se me permitem, foram formados há 30 anos, ou um pouco mais recentemente, diferentemente dos estudantes que estão sendo formados no momento. Aí, caberia perguntar: por que eles não querem ser professores? Nós sabemos as razões; não vou me estender aqui.
Então, a regulamentação da profissão de educador, do profissional da educação, não está sensível a esta problemática dos dados de realidade.
Mais uma vez, agradeço-lhes o debate feito aqui. Parabenizo a cada um e a cada uma das pessoas, especialmente a Deputada Professora Goreth. Sigamos!
Muito obrigada.
A SRA. PRESIDENTE (Professora Goreth. Bloco/PDT - AP) - Obrigada, Profa. Selma Garrido.
Passo a palavra agora para o José Leonardo Rolim de Lima Severo.
O SR. JOSÉ LEONARDO ROLIM DE LIMA SEVERO - Nestes minutos finais, eu gostaria de ressaltar que não restam dúvidas de que todos e todas aqui somos defensores e defensoras de uma educação de qualidade social e pedagógica capaz de colaborar com a resolução de problemas da realidade brasileira, especialmente no que concerne ao direito a uma escola pública laica, gratuita, justa, equitativa. Isso deve nos levar a enxergarmo-nos como pares, e não como antagonistas, nesse grande esforço de fortalecer pautas que promovem a educação transformadora em nosso País. É desse diálogo que devem resultar proposições para aperfeiçoar este PL, inclusive — friso — com a retirada da previsão de conselho.
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Profa. Marlei, é importante lembrar que, desde 1985, apenas 13% de profissões regulamentadas instituíram conselhos. Conselho não é uma condição para regulamentação, vide o caso da profissão de historiador, que, inclusive, não suscitou da CNTE nenhuma posição contrária, pelo menos até onde eu pude acompanhar, sabendo que historiadores e historiadoras também estão nas escolas como professores de história.
Nós não podemos negar a demanda por reconhecimento que esses pedagogos e essas pedagogas estão explicitando por meio da nossa representação aqui nesta audiência pública. A história demonstra que a profissão tem se redimensionado, e nós precisamos de segurança jurídica para preservá-la e promovê-la. A profissão, ao contrário da interpretação trazida pela Profa. Marlei, não é regulamentada. O quadro em que nós estamos não pode se perpetuar. Os instrumentos postos não são suficientes, inclusive porque não se destinam a essa matéria jurídica.
Nos 30 anos em que a senhora atua, Profa. Marlei, a condição profissional dos pedagogos e das pedagogas teve seu estatuto descaracterizado. É preciso que assumamos isso. Reconhecer a profissão de pedagogo e de pedagoga não implica colocá-la em uma condição vertical em relação às professoras e aos professores, como sugeriu a sua fala. Nós somos a favor da unidade, porém unidade sem reconhecimento de especificidades é homogeneização, e homogeneização impede o reconhecimento de contribuições indispensáveis que temos dado e que podemos dar, desde que nós existamos profissionalmente.
Aqui eu faço um chamamento à reflexão. Nem sempre nós que estamos na academia compreendemos de perto as realidades dessas profissionais e desses profissionais, especialmente quando não estão atuando em escolas. Portanto, nós precisamos ampliar o nosso olhar sensível, como dizia a Profa. Selma, para compreender movimentos concretos de uma profissão que, apesar de tudo, tenta se reinventar para dar respostas à necessidade de transformações sociais. Porém, para isso, mais uma vez eu friso, é preciso que a profissão exista.
Concluo reafirmando que a REPPED apoia essa pauta com muita convicção, mas deseja que o PL seja alterado em vários aspectos. Para isso, nós incitamos a Deputada Professora Goreth a assinar uma carta-compromisso em favor de ajustes a partir dos princípios que nós defendemos aqui.
Agradeço a possibilidade de ocupar este espaço como uma voz que historicamente não tem sido ouvida no âmbito de outras audiências públicas, que é a voz de pedagogos e pedagogas querendo falar por si mesmos e por si mesmas.
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Reconhecemos o esforço da Deputada Professora Goreth em garantir que este debate ocorra de forma democrática e propositiva.
Sigamos na luta em prol do reconhecimento da pedagogia e da valorização de uma educação emancipatória e transformadora.
Muito obrigado.
A SRA. PRESIDENTE (Professora Goreth. Bloco/PDT - AP) - Obrigada, José Leonardo, pela sua contribuição.
Quero deixar registrado que estão participando desta audiência pública o Fórum de Pedagogia do Estado do Rio de Janeiro e a Associação de Professores Inspetores Escolares do Estado do Rio de Janeiro — obrigada pela participação.
Passo a palavra agora para a Cyntia Bernardes.
A SRA. CYNTIA BERNARDES - Obrigada pelo retorno da fala.
Quero ser breve. Vou começar pela provocação feita pela Profa. Marlei na sua fala com relação à dicotomia que ela diz vencida desde a década de 80, à caracterização e à identidade da pedagogia.
Profa. Marlei, eu me formei na primeira década dos anos 2000, e eu não vi essa dicotomia vencida na minha formação. Eu compartilho isso com vários outros colegas que se formaram nesses anos. A Profa. Selma trouxe esse histórico, e não quero ser redundante, mas eu entendo que essa identidade que foi constituída em nós pedagogos foi distorcida ao longo dos anos.
Quando eu estava fazendo pedagogia, na minha formação, eu não estudei pedagogia, assim como vários outros. Se você fizer um levantamento, eu acredito que todas as pesquisas com foco nos pedagogos que estão no Judiciário hoje perguntam isso para os profissionais, e eles respondem: "Eu não estudei pedagogia na minha formação". Então, há uma lacuna aí.
Eu não me sinto representada na identidade que me imprimiram. A identidade que eu assumo hoje como pedagoga jurídica e como pedagoga foi construída desbravando um campo que, muitas vezes, é negado, como todos os outros campos fora da escola. Durante a formação, eu sempre busquei oportunidades de inserção em outros espaços, mas não como uma negativa à docência, porque a docência faz parte de nós, mas a nossa identidade não se resume a ela.
Eu quero deixar aqui este registro. Eu entendo que a regulamentação nos fortalece. Como o Prof. José Leonardo disse, não se trata de dicotomizar, muito pelo contrário, trata-se de mostrar que existe um conhecimento específico da nossa ciência. Embora as instituições que se colocam contra a regulamentação tenham se posicionado, como a Profa. Marlei colocou, no sentido de não serem contra a pedagogia como ciência, nós vemos uma contradição nisso, considerando o que tem sido feito e como tem sido representado isso.
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Hoje nós pedagogos que atuamos fora da escola estamos estudando, tentando sistematizar o conhecimento teórico sobre as nossas práticas, para tentar dar visibilidade a essa identidade do pedagogo, mas muitas vezes os nossos projetos são negados. Não há uma linha que abre essa possibilidade. São poucas as universidades e as instituições de representatividade profissional que têm ampliado esse debate, que têm acolhido as nossas demandas.
Aqui eu quero parabenizar a frente do Adauto e do Jean nessa representatividade. Nós pedagogos jurídicos temos tentado dar voz, abrir a possibilidade de um reconhecimento social através da regulamentação. Essa é a nossa defesa.
O que eu queria complementar... Eu acho que eu fui muito bem representada pelas falas da Profa. Selma e do Prof. José Leonardo, que trouxeram esses elementos — e eu reitero e assino embaixo —, no sentido de defesa da proposta da REPPED, de alteração do PL, para que possa haver um acolhimento mesmo do que é a pedagogia, sem dicotomia, sem minimizar a docência, mas também para que se dê visibilidade para a especificidade do nosso conhecimento.
Lembro aqui que, como o Prof. José Leonardo disse, a profissão de historiador foi regulamentada, existem profissionais atuando na educação, e nem por isso existe um conselho. Quando dialogamos com esses profissionais, percebemos que isso dá outro status profissional, social, de visibilidade, de compreensão e de existência enquanto profissão.
Esse é o meu desejo. Agradeço, mais uma vez, pela oportunidade de fala e encerro por aqui.
Muito obrigada, Deputada Professora Goreth.
A SRA. PRESIDENTE (Professora Goreth. Bloco/PDT - AP) - Obrigada, Cyntia Bernardes.
Passo a palavra agora para o Adauto Leite Oliveira, para as suas considerações finais.
O SR. ADAUTO LEITE OLIVEIRA - Quero iniciar agradecendo a oportunidade de estar aqui com os meus pares, colegas pedagogas e pedagogos de altíssima competência, que realmente deveriam há muito tempo estar presentes nestes debates.
Quero acrescentar um dado importante que vai ao encontro da defesa da regulamentação. O fato de se permitir a presença do pedagogo em determinados ambientes não significa que se reconheça a sua competência, tanto é que, na assistência social, o pedagogo e a pedagoga não compõem a equipe de referência da assistência social, ou seja, não fazem parte do núcleo duro da assistência social para tratar questões da assistência social, dentre as quais, obviamente, há também questões pedagógicas, educativas, de garantia de direitos de crianças e adolescentes. Então, quando falamos de regulamentação, nós estamos falando da demarcação de um lugar que hoje não é reconhecido na sua amplitude, no seu direito. Vejam que, por mais que nós defendamos, digamos, a política de cotas e outras políticas de ações afirmativas, não havendo, por exemplo, o Estatuto da Igualdade Racial, não havendo a política de cotas, essas questões, ainda que as defendamos, não são materializadas. Então, nós precisamos de um marco legal para materializar aquilo que nós estamos dizendo aqui que compreendemos que é uma realidade. E é uma realidade que a profissão de pedagogo é extremamente importante em ambientes escolares e não escolares.
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Vejam, há uma (falha na transmissão) inclusão ou não de assistentes psicossociais nas escolas. Diferentemente do debate que se tem travado inclusive no âmbito da nota da CNTE, nós entendemos que esses profissionais são importantes dentro do ambiente escolar, porque a escola é um espaço complexo de questões sociais e psicológicas que precisam de equipe multidisciplinar. O que nós não queremos é que essa relação seja hierarquizada, e a regulamentação vai nos colocar em pé de igualdade com esses profissionais no momento de discutir as questões dentro da própria escola. Então, nós não queremos interditar a presença desses profissionais, mas queremos estar, tanto na escola quanto nos outros espaços que demandam o trabalho pedagógico, em uma mesma relação de importância.
A nossa unidade se dá a partir da defesa das nossas pautas. Somos todos profissionais da educação. Portanto, todos nós vamos defender uma educação democrática, uma educação de qualidade, uma educação pública. Isso é o que nos unifica dentro do processo educativo, porque as nossas diferenças, que são das nossas competências, das nossas ações, são complementares em todos os espaços que nós atuamos. Então, reconhecer as especificidades em nenhum momento pode ser considerado como um movimento de fragmentação. É extremamente equivocado (falha na transmissão) o pedagogo e a pedagoga, nas suas especificidades, seja um movimento de fragmentação da categoria. Não é correto isso.
E aí eu já quero reforçar o entendimento dos colegas da REPPED, junto dos quais eu tenho tido o prazer muito grande de refletir sobre esse processo da regulamentação, e ressaltar o acolhimento pela Deputada da nossa minuta, que traz alguns avanços importantes em relação não só à garantia de direitos, mas inclusive à própria compreensão de tudo que compõe esses afazeres do pedagogo em todos os espaços.
Deputada, mais uma vez, muito obrigado por este espaço. Agradeço aos meus pares por terem participado, enriquecido este momento. Quero dizer que, daqui por diante, nós precisamos assumir que nós não seremos mais tutelados por outras falas. Há uma fala no movimento social que é potente: "Nada de nós sem nós". Qualquer discussão a respeito do pedagogo e da pedagoga precisa contar com a presença desses profissionais dizendo qual é o rumo que eles querem tomar nas suas profissões. E, neste momento, o rumo que nós queremos tomar é o da regulamentação da nossa profissão, que significa o reconhecimento do nosso lugar específico dentro e fora dos ambientes escolares. Muito obrigado. Desejamos os melhores efeitos possíveis.
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A SRA. PRESIDENTE (Professora Goreth. Bloco/PDT - AP) - Obrigada, Adauto.
Gostaria de agradecer a participação dos nossos expositores, que muito contribuíram para o debate.
Regulamentar a profissão é conferir proteção contra a contratação de indivíduos sem formação para exercer funções pedagógicas, manobra comum utilizada por Municípios e Estados. Portanto, regulamentar a profissão também é qualificar a educação pública. Regulamentar a profissão é conferir maior proteção jurídica aos pedagogos, especialmente aos que atuam em espaços não escolares, que não se encontram respaldados por nenhuma lei, mas apenas pela definição não referenciada e, por vezes, arbitrária de suas prerrogativas profissionais. Regulamentar a profissão é criar um dispositivo jurídico que confere direitos relacionados às prerrogativas profissionais e que poderá ser acionado por sindicatos e pelo Ministério Público em casos de abusos, como desvio de função, subaproveitamento e contratação de outros profissionais sem formação para o exercício de funções pedagógicas. A regulamentação da profissão tem efeitos objetivos e simbólicos, pois, além de se constituir como um dispositivo que poderá ser mobilizado por sindicatos e Ministério Público para combater abusos, como contratação de profissionais não habilitados para exercício de funções pedagógicas, também guarda um simbolismo importante ao reconhecer a importância, a legitimidade e a especificidade dessa profissão para a educação e o desenvolvimento humano.
Estou muito feliz por ter conduzido esta importante audiência pública.
Nada mais havendo a tratar, vou encerrar a presente reunião. Antes, porém, gostaria de convocar as Deputadas e os Deputados membros deste colegiado para o seminário destinado a debater as políticas públicas para o queijo artesanal de leite cru, tendo como referência a Missão Técnica Queijeira na França, temas e inovações da edição do Mondial du Fromage — desculpem-me o francês —, em decorrência da aprovação do Requerimento nº 86, de 2023, de autoria do Deputado Zé Silva, a ser realizado no próximo dia 14 de dezembro, quinta-feira, às 14 horas, neste mesmo plenário.
Está encerrada a presente reunião.
Muito obrigada a todas e todos.
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