Horário | (Texto com redação final.) |
---|---|
10:20
|
O SR. PRESIDENTE (Aureo Ribeiro. Bloco/SOLIDARIEDADE - RJ) - Declaro abertos os trabalhos desta reunião de audiência pública híbrida, convocada para o debate de soluções que promovam a vigilância e a repressão à lavagem de dinheiro, necessária à sobrevivência do crime organizado.
Convido para compor a Mesa, representando a Polícia Federal, o Sr. Felipe Alcântara de Barros Leal, Chefe da Divisão de Repressão à Lavagem de Dinheiro da Polícia Federal; representando o Banco Central do Brasil, o Sr. Valdemir Fortes de Sousa, Chefe Adjunto do Departamento de Supervisão de Conduta do Banco Central do Brasil, que participará de forma virtual, pelo nosso sistema híbrido; o Sr. Ricardo Liáo, Presidente do Conselho de Controle de Atividades Financeiras, o COAF, que participará de forma virtual, pelo nosso sistema híbrido; representando o Ministério Público Federal, o Dr. Henrique de Sá Valadão Lopes, Procurador da República no Estado do Amazonas, da 2ª Câmara Criminal de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal.
O tempo reservado aos convidados é de 10 minutos, prorrogável, se for necessário, não podendo haver apartes.
Os convidados interpelados terão igual tempo para responder, facultadas a réplica e a tréplica, pelo mesmo prazo.
Antes de iniciar as exposições, quero fazer os seguintes esclarecimentos sobre a importância do debate proposto no requerimento de minha autoria.
A atuação do crime organizado é um problema grave que assola a segurança pública do País, uma ameaça ao Estado Democrático de Direito, e a situação que aconteceu recentemente no Rio de Janeiro é apenas uma mostra de algo que, em graus diferentes, atinge toda a sociedade brasileira, em todas as regiões. Grandes facções criminosas, com ramificações no tráfico internacional de drogas, associam-se a milicianos, que, via força, criam um Estado paralelo, extorquindo a população mais vulnerável do nosso Estado do Rio de Janeiro e de diversos Estados do Brasil.
O elemento comum entre todas as atividades criminosas, seja de milicianos cobrando proteção, gerindo transporte irregular ou vendendo gatos de TV, Internet e eletricidade, seja de traficantes de drogas e de quadrilhas, é a necessidade de acesso ao sistema financeiro, para lavar os proventos criminosos. Este tema tem que ser debatido aqui, nesta Comissão. Na economia brasileira atual é factível que todas as atividades sejam conduzidas completamente em espécie ou por meios de pagamento como cartões, Pix e outros. Esses são meios rotineiros, usados por praticamente a totalidade da população, especialmente em áreas urbanas.
|
10:24
|
(Segue-se exibição de imagens.)
Eu tenho aqui um ponto específico, Deputado. Em um passado muito recente, uma decisão nos causou certa inquietude, uma inquietude profissional. Foi a decisão específica de questionamento da validade de Relatórios de Inteligência Financeira, de relatórios de intercâmbio, mas penso eu que isso foi, ao menos por ora, superado com uma decisão do Ministro Cristiano Zanin, do Supremo Tribunal Federal, que veio a confirmar a utilização dos Relatórios de Inteligência Financeira, sejam eles Relatórios de Inteligência Financeira Espontâneos, sejam eles Relatórios de Inteligência Financeira por intercâmbio. Então, nesse ponto específico, essa decisão, Deputado, veio de fato a ter grande valia, porque não pôs mais em xeque todas as investigações da Polícia Federal, principalmente sobre a criminalidade organizada.
Nós temos aqui um ponto interessante, Deputado. Muitos conversam, muitos falam sobre inteligência, mas talvez nem todos compreendam muito bem o conceito de inteligência. Aquelas perguntas básicas — o quê? onde? como? quando? por quê? — são voltadas ao crime, em sua maioria, mas, para a inteligência financeira, são exatamente essas as perguntas voltadas para a própria atuação de um órgão, e não para o crime. Então, seriam estas: O que a polícia vai fazer? Onde vai atuar? Em que momento ela vai alcançar o seu desiderato? Em que circunstâncias iniciaremos? Então, a inteligência financeira é muito importante.
Na tela nós vemos, por exemplo, a mera ilustração de uma consolidação de Relatórios de Inteligência Financeira. No desenho conseguimos ver o mapa de calor e melhor desenhar a atuação profissional, não nas pontas, mas nos elos, nos hubs, nos escuros, em cores vivas, o que nos permite melhor direcionar a nossa investigação.
A Polícia Federal faz um controle de Relatórios de Inteligência Financeira. Todos os Relatórios de Inteligência Financeira espontâneos são recebidos pela divisão que eu chefio hoje, a Divisão de Repressão à Lavagem de Dinheiro. Fazemos um controle muito importante, um controle específico que nos permite realizar uma investigação proativa, Deputado. Por quê? A grande dificuldade de uma investigação proativa é justificar a razão pela qual, por exemplo, a polícia começou a investigar o fato A e não o fato B, a razão pela qual o fato "x" decorre da empresa "y" ou não, ou outro fato específico. Quando há um trabalho de mapeamento de Relatórios de Inteligência Financeira, nós temos uma suspeição objetiva, que é um princípio que rege a nossa atuação, a da polícia, ou seja, o de trabalharmos não exatamente e especificamente sobre o subjetivo, mas de termos uma linha de corte que nos permita trabalhar com um anteparo, para evitar qualquer questionamento.
Aproveitando a oportunidade, penso eu que preciso trazer três pontos, até porque o tempo não nos permite trazer pontos a mais. Por exemplo, dentre pontos fortes, oportunidades e fraquezas, nós temos necessidade de discutir mais
alguns pontos interessantes. Esse ponto aqui, específico, é a ausência hoje de ferramentas bancárias para monitoramento on-line. Temos que trabalhar hoje com fatos atuais, com fatos contemporâneos, não há mais espaço para a polícia olhar para trás, simplesmente trabalhar com fatos pretéritos. Temos que ter em mente o pretérito, as casuísticas, delas retirar tipologias, avançar em fatos que estejam acontecendo e nos antecipar em fatos que possam ocorrer. Então, alguns pontos precisam avançar, Deputado, como a ideia específica de ferramentas bancárias para monitoramento on-line pelos órgãos de investigação, como também — por que não? — os alertas de aprovisionamento. Os aprovisionamentos são feitos, principalmente, em um ano eleitoral, como o que se aproxima. É muito importante termos esse diálogo muito mais próximo com movimentações suspeitas, para permitir uma resposta contemporânea nesse ponto.
|
10:28
|
Avançando, Deputado, nós temos aqui alguns outros pontos e algumas necessidades. No segundo quadro eu trago à discussão a importância de avançarmos no envio de dados estruturados de todas as Receitas, não apenas das Estaduais e Municipais, mas também da Federal. À semelhança do SIMBA — Sistema de Investigação de Movimentações Bancárias, nós temos necessidade de consolidar um sistema, que já está em desenvolvimento dentro da polícia, mas esse sistema depende da recepção de dados estruturados pela Receita Federal, para as unidades de investigação. Sabemos nós que há um avanço nesse ponto específico entre o Conselho Nacional de Justiça e a Receita, mas é preciso contemplar também as unidades de investigação nesse ponto.
Em outros detalhes específicos eu gostaria também de avançar, Deputado. Para além da inteligência financeira, para além da investigação e da repressão à lavagem, nós temos que ter olhos bem atentos para a ideia da recuperação de ativos, porque, sem a recuperação de ativos, nós não iremos avançar em nenhuma dessas iniciativas de combate à lavagem ou de inteligência financeira.
Eu queria sublinhar, pela importância que tem, uma rede que foi criada há pouco, uma rede que congrega, por iniciativa do Ministério da Justiça e Segurança Pública, tanto a Polícia Federal quanto as Polícias Civis, que se chama RECUPERA — Rede Nacional de Recuperação de Ativos. Foi um ponto importante, um ponto bem agudo de discussão, que acabou consolidando a ideia de que a recuperação de ativos não é apenas destinação do ativo, ou seja, não é apenas o leilão, mas também a ideia de identificar o ativo, localizar o ativo, ter uma medida assecuratória de constituição do ativo, repatriar o ativo, se for o caso, gerir aquele ativo e destinar o ativo, ou seja, são vários verbos. Pela quantidade de núcleos verbais, nós temos noção da importância e Da necessidade dessa recuperação específica.
Alguns desafios existem em relação à recuperação de ativos, como, por exemplo, cláusulas contratuais com leiloeiros. São alguns pontos que precisamos realmente discutir em relação a um avanço, para que sejam contratos convidativos não só para os leiloeiros, mas que também sejam realmente um ponto de solução para a SENAD — Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas e para a própria polícia, que não pode ter em seus depósitos bens sem alienação antecipada.
Então, concentro-me, Deputado, se assim me permite, nesses três pontos. Um deles é a necessidade, de fato, de monitoramento on-line das movimentações suspeitas, algo em que precisamos avançar.
A outra necessidade, também muito importante, é a de recebimento de dados estruturados da Receita. Na verdade, cada região acaba encaminhando de uma maneira diferente os dados para a polícia. Isso dificulta muito a nossa atuação. Por fim, há necessidade de darmos ênfase à ideia de recuperação de ativos em todos os núcleos verbais. É uma cadeia concatenada por nexos forçosos investigativos, sem a qual nós não conseguimos avançar no tema.
Agradeço mais uma vez e fico à disposição, Deputado.
|
10:32
|
O SR. PRESIDENTE (Aureo Ribeiro. Bloco/SOLIDARIEDADE - RJ) - Agradeço pela exposição ao Sr. Felipe Alcântara, Chefe da Divisão de Repressão à Lavagem de Dinheiro da Polícia Federal.
O SR. VALDEMIR FORTES DE SOUSA - Excelentíssimo Sr. Deputado Aureo Ribeiro, autor do requerimento de realização desta audiência pública, saúdo V.Exa. em nome do Banco Central e os demais participantes desta Mesa.
Dr. Felipe Leal, Dr. Henrique de Sá Valadão, meu amigo Ricardo Liáo, é com grande satisfação que eu compareço a esta Comissão, em nome do Banco Central, para debater este tema.
Eu gostaria de usar o meu tempo, primeiramente, para dar uma rápida pincelada sobre a atuação do Banco Central como stakeholder do sistema de prevenção à lavagem de dinheiro. Nós temos um departamento especializado, o Departamento de Supervisão de Conduta, que conta atualmente com cerca de 55 servidores, que efetua a supervisão do sistema bancário, do sistema financeiro, das entidades autorizadas pelo Banco Central. Por conta dessa proporção e por conta da necessidade de aplicar uma supervisão baseada em risco, o foco do Banco Central tem sido muito o de fazer a supervisão dos processos. As inspeções são bastante focadas em avaliar a qualidade da política, dos procedimentos e dos controles internos das instituições por nós supervisionadas.
Nós temos um desafio grande, pois foi extraordinário o crescimento do sistema de pagamentos nos últimos anos, principalmente depois do lançamento do Pix. Contamos hoje com cerca de 1.600 entidades para supervisionar. Temos dado um foco muito grande no aprimoramento dos nossos processos de supervisão, para que nós consigamos ser eficazes nessa atuação, especialmente agora, que notamos a notoriedade do crescimento do crime organizado como uma ameaça ao sistema de prevenção à lavagem de dinheiro.
Nós temos discutido formas contínuas, a partir desse escopo, de fechar cada vez mais as portas para a atuação dessas redes. Tivemos um desenvolvimento grande no ano passado em relação a prevenção a fraudes. Até foi editada uma norma sobre o compartilhamento de informações relativas a fraudes, tentando endereçar de maneira mais eficaz essa questão, que é um dos modus operandi das facções criminosas.
|
10:36
|
Também estamos atuando na ENCCLA — Estratégia Nacional de Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro, juntamente com os demais membros integrantes, para endereçar questões que foram inclusive colocadas pelo Dr. Felipe Leal, como a questão das ferramentas, do uso intensivo de dados estruturados, para que possamos, com os recursos humanos que temos à disposição, ter eficiência, conseguir atingir de maneira mais eficaz a questão.
Atualmente, temos feito essa revisão de processos e das nossas matrizes de risco, para fazer bem feito esse trabalho, principalmente num novo segmento, que tem representado um risco crescente, que é o das instituições de pagamento. Temos um trabalho já de muitos anos junto das grandes instituições bancárias, que desenvolveram os seus sistemas, e agora a nossa estratégia de supervisão está voltada principalmente para atingir esse segmento, dado o extraordinário crescimento que ele teve, dados os riscos que ele representa hoje.
Ressalto também outro ponto levantado pelo Dr. Felipe Leal, que é o da cooperação de ativos. A nossa estratégia de supervisão também tem focado isso e tem avançado nesse tema, em relação às instituições supervisionadas no sentido de desenvolver, supervisionar e requerer dessas instituições processos que permitam, no caso do universo que supervisionamos, o bloqueio de recursos e a atuação célere para promover esse bloqueio, deixá-lo à disposição do Poder Judiciário, para que depois seja feito um trabalho de recuperação desses ativos, conforme a lei.
O nosso trabalho continua, e estamos incentivando muito as instituições, sejam as grandes instituições bancárias, sejam as menores, a recorrerem também ao uso do Analytics. O que estamos constatando é que esse é o futuro. Temos que fazer frente à extraordinária capacidade das organizações de criarem novas tipologias para tornar seus recursos lícitos, fora a quantidade de golpes, de fraudes e de atuações ilegais que elas representam.
Recentemente, agora no mês de outubro, acabamos de aprovar o Plano de Supervisão, justamente para dar foco nos mecanismos de estruturação de dados, internamente, e aperfeiçoar o nosso sistema de monitoramento. Sobre isso existe uma frente, de que temos que tratar bilateralmente ou através da ENCCLA, que é a da integração de informações. Eu vejo que há muita necessidade, nos órgãos de detecção, de investigação e de persecução, de promover essa integração com os sistemas informacionais de prevenção, de modo a haver uma atuação mais célere.
Várias ações e vários estudos da ENCCLA para o ano de 2024 endereçam essa questão, e o Banco Central vai participar desses grupos com essa intenção de propiciar maior integração.
|
10:40
|
Existe outra frente que estamos discutindo também, com o COAF, que é a de melhorar a qualidade das informações, das comunicações. É um trabalho conjunto, digamos assim, porque o supervisor tem um papel a exercer nessa questão. Na verdade, todas as políticas, todos os procedimentos e controles que requeremos que as instituições montem para a prevenção da lavagem de dinheiro têm justamente por finalidade coletar operações atípicas — é papel delas coletar operações com indícios de atipicidade — e comunicá-las ao COAF. Hoje temos já uma quantidade extraordinária de comunicações. O problema não é mais a quantidade de comunicações, mas, sim, a qualidade das comunicações. Esse é um trabalho que temos que desenvolver, é uma nova frente, justamente para que a informação chegue de uma maneira que propicie maior eficiência tanto na produção dos Relatórios de Inteligência Financeira quanto na eficiência do próprio processo investigatório.
O SR. PRESIDENTE (Aureo Ribeiro. Bloco/SOLIDARIEDADE - RJ) - Agradeço pela exposição ao Sr. Valdemir Fortes.
Cumprimento o colega Felipe Leal, que nos representa presencialmente à Mesa — é um prazer reencontrá-lo —, cumprimento o colega Henrique Valadão, do Ministério Público Federal, e o colega Valdemir Fortes, do Departamento de Supervisão de Conduta do Banco Central do Brasil.
Para nós, é um prazer compartilhar com esta Comissão, de maneira bastante resumida é claro, pelo tempo disponível, que iniciativas recentes têm sido adotadas pelo Governo Federal, como um reforço, vamos dizer assim, ao enfrentamento do crime organizado. Esta não é uma agenda nova. Na verdade, é uma agenda que já remonta a alguns anos. Creio que, pelo comportamento das instituições que hoje se envolvem, que se dedicam tanto à prevenção quanto ao combate à lavagem de dinheiro, tendo essa lavagem de dinheiro agora como principal foco do Comitê Integrado de Investigação Financeira e Recuperação de Ativos, criado recentemente pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública, em conjunto com o Governo do Rio de Janeiro — e, acredito, extensivo a outros Estados —, iremos criar uma sinergia mais específica, mais própria, mais concentrada, além daquela que hoje já funciona de maneira regular dentro do Sistema Brasileiro de Prevenção e Combate à Lavagem de Dinheiro e ao Financiamento do Terrorismo. O que trouxe o colega Valdemir, do Banco Central, nós vimos discutindo já há algum tempo, face ao volume representativo de comunicações oriundas dos chamados "sujeitos obrigados", tendo o sistema financeiro como uma das principais, vamos dizer assim, fontes de comunicação.
|
10:44
|
Só para se ter uma ideia, nós chegamos, neste ano, ao final de outubro, a quase 6 milhões e 400 mil comunicações, oriundas de todo o sistema financeiro, e já produzimos e disseminamos às autoridades competentes, principalmente Polícia Federal, polícias estaduais e Ministério Público Federal e estaduais mais de 14.300 relatórios de inteligência financeira até recentemente.
Então, a nossa função, vamos dizer assim, enquanto unidade de inteligência financeira acho que já é um tema que nos últimos anos tem sido bastante discutido, bastante tratado em vários ambientes, quer no Legislativo, quer no Judiciário, quer propriamente no Poder Executivo.
E, como bem lembrado pelo Delegado Felipe Leal, tivemos mais uma situação de certa preocupação, em termos da boa condução do processo de investigação, quando se levantou a hipótese de haver uma requisição natural de quebra de sigilos, quer bancário, quer fiscal, para que se procedesse a um intercâmbio de informações com as autoridades competentes, coisa que nós já tínhamos definido em decisão do Supremo Tribunal Federal no ano de 2019, quando também houve um primeiro questionamento sobre a competência da formulação e do intercâmbio de informações entre órgão de inteligência e órgão de persecução, que foi superado. Numa decisão recente, entretanto, levantou-se novamente o problema, mas o Ministro Zanin, num despacho de bastante felicidade, confirmou, vamos dizer assim, a manutenção desse procedimento e a legitimidade, a constitucionalidade dessa forma de atuação.
Então, isso somente favorece, vamos dizer assim, a continuidade da ação do COAF junto às chamadas autoridades competentes, que são responsáveis pela persecução penal dos crimes de lavagem e dos chamados crimes antecedentes.
E temos, como já se comentou, um trabalho permanente nesse aspecto. O COAF completou, este ano, 25 anos. Nos últimos 20 anos, a nossa atuação na produção de inteligência financeira tem sido crescente, é claro, com todas as dificuldades operacionais que órgãos da administração pública observam — isso não é um privilégio nosso. Mas, enfim, nós tentamos isso, dentro da nossa capacidade e da recente aplicação com maior ênfase das análises de inteligência financeira, dos recursos de inteligência artificial, que nos permitem ter uma boa condição de análise de grandes massas de informação — e nós falamos de grande massa de informações porque recebemos, diariamente, em torno de 30 a 35 mil comunicações.
Então, há que haver um sistema robusto, um sistema consistente, um sistema auditável. E o nosso sistema é totalmente auditável. Tivemos recentemente trabalhos revisados pelo TCU e pela própria auditoria do Banco Central, dando conformidade aos nossos procedimentos, dentro do que a Lei nº 9.613, de 1998, que é a lei que tipificou a lavagem de dinheiro, a ocultação e a dissimulação de bens e valores obtidos de maneira indevida, e ao nosso processo de inteligência financeira.
|
10:48
|
Também atuamos residualmente, numa atuação de supervisão, em setores que não têm um órgão regulador da atividade, que são setores de bens de luxo e alto valor: o setor de joias e joalherias, o setor de factoring e os setores adquirentes de passe de atletas e artistas. Esses quatro segmentos o COAF também é incumbido de regular, de fiscalizar e de aplicar as penalidades administrativas quando observa alguma irregularidade no procedimento ante às normas estabelecidas para esses segmentos.
Eu diria que as normas, tanto do Banco Central, quanto da CVM, quanto da SUSEP, quanto da PREVIC, quanto da Polícia Federal em relação às transportadoras, e também as normas do CNJ em relação aos cartórios, ou seja, todos os reguladores que atuam junto aos seus regulados na parte de regulação, fiscalização e aplicação de penalidades têm, vamos dizer assim, uma identidade, pontos comuns nas suas regulamentações, que é fundamentalmente a política de conhecer o seu cliente, porque ninguém melhor do que aquele que presta o serviço para conhecer o seu cliente; um registro de operações que permita a rastreabilidade de todas as operações realizadas, caso algumas delas se vejam relacionadas a algum processo de investigação pelas autoridades de persecução; e a famosa comunicação ao COAF, à unidade de inteligência financeira, como forma de colaboração da sociedade civil, vamos dizer assim, dos particulares, no enfrentamento ao crime organizado de uma forma geral, no enfrentamento a todas as situações que, vamos dizer assim, buscam esses setores para dar legitimidade a recursos obtidos de maneira indevida ou ilícita.
Então, resumindo, a criação desse comitê recentemente pelo Ministério da Justiça e (falha na transmissão) Estado do Rio de Janeiro é mais uma reunião de esforços adicionais àqueles que hoje já são desenvolvidos por todas as autoridades integrantes do sistema financeiro como pessoas obrigadas, COAF, como a produtora de inteligência financeira a partir dessas informações, e as autoridades de persecução, quer Ministério Público Federal e Estaduais, quer Polícia Federal e polícias estaduais, no sentido de compartilhar essas informações e melhor orientar e direcionar os trabalhos para o que, realmente, é a relação, vamos dizer assim, de atuação do crime organizado, de uma maneira geral. E não falo apenas do crime organizado, mas também daqueles agentes que praticam, seguidas e repetidas vezes, atos corrupção, que é uma preocupação permanente também, vamos dizer assim, das autoridades no enfrentamento desse fenômeno. Há ainda a questão do financiamento do terrorismo, que agora começa a bater um pouco mais forte à nossa porta, não em relação a atos terroristas, mas em relação àqueles que, de alguma forma, financiam atos terroristas mundo afora.
E essa é uma das grandes preocupações que, hoje, a comunidade internacional revela, vamos dizer assim, nos seus comitês, nos seus grupos de trabalho. E o Brasil, naturalmente, não se exclui dessa obrigação, dessa capacidade inclusive de enfrentar o tema com os instrumentos que ele já tem disponíveis em sua mão.
Então, acho que a continuidade desse trabalho, a continuidade dessa interação de todos os agentes do Estado no combate ao crime organizado focado aqui e na recuperação de ativos, que também é um elemento bastante importante para desestimular, vamos dizer assim, o crime, deve ser apoiada por todos os setores da sociedade e por todos os setores do Governo Federal, Estadual e Municipal.
|
10:52
|
O SR. PRESIDENTE (Aureo Ribeiro. Bloco/SOLIDARIEDADE - RJ) - Agradeço a apresentação do Sr. Ricardo Liáo.
Eu trouxe 13 ideias, 13 propostas de solução para maior repressão à lavagem. Eu vou falar de uma por uma. Prefiro ser bem telegráfico, para que as ideias fiquem bem concretas.
A primeira ideia é reduzir ou acabar com as notas de 100 reais e de 200 reais. Essa seria uma solução que ajudaria muito a repressão à lavagem.
Segunda: o STF precisa reafirmar a possibilidade de RIFs por solicitação ou por intercâmbio. Essa decisão do Ministro Zanin é uma decisão, de certa maneira, precária, tomada de forma monocrática, e não há ainda uma decisão por parte de Turma ou do Plenário, além daquelas que já foram mencionadas aqui pelo Dr. Ricardo Liáo.
A terceira ideia é a de que nós precisamos aumentar o número de servidores lotados no COAF. É muito claro, quando se comparam as unidades de inteligência financeira do Brasil com as unidades de inteligência financeira de outros países, que o COAF tem um número de servidores muito pequeno para o tamanho do trabalho que ele tem que realizar. É um trabalho hercúleo. O COAF faz o melhor trabalho possível; mas, obviamente, com mais servidores, esse trabalho poderia ser feito de forma muito melhor.
Quarta ideia: nós precisamos aumentar o número de servidores na SENAD. A SENAD é a Secretaria Nacional de Drogas e é a Secretaria responsável por fazer o que o Dr. Ricardo Liáo trouxe: justamente o processo de alienação dos bens que foram apreendidos nas investigações criminais. Com mais servidores na SENAD, com mais leiloeiros, com mais estrutura e com mais pessoas para administrar os bens que forem arrecadados nos processos criminais, nós vamos conseguir dar mais efetividade à arrecadação e à recuperação de ativos.
Quinta ideia: a Receita e os bancos precisam bloquear as contas que tenham CPF ou CNPJ suspenso ou declarado inapto pela Receita. Por algum motivo, isso ainda não foi implementado. Determinada pessoa física ou jurídica está com o CPF suspenso na Receita e mesmo assim a sua conta bancária continua sendo passível de movimentação. Isso é um problema. Uma vez declarado suspenso ou inapto o CPF ou o CNPJ, a conta tem que ser bloqueada; não tem que ser possível movimentar valores a partir daquela conta.
Sexta ideia: nós precisamos de um confisco, de um perdimento de bens sem condenação criminal. Se o Marcola morre, todos os bens bloqueados no processo criminal têm que ser liberados. Essa é a realidade de hoje. Somente com o processo penal condenatório é que é possível o perdimento dos bens. Se o nosso investigado, o nosso réu morre durante o processo, durante a investigação, hoje, os órgãos de persecução penal não têm nenhum instrumento efetivo para dar perdimento dos bens, para fazer com que o crime sinta no bolso. Isso é vital, já existe em vários outros países, e o Brasil ainda não implementou.
Sétima ideia, a OAB precisa ser instada a criar uma normativa interna que evite lavagem de dinheiro por meio de escritórios de advocacia. A OAB já foi instada várias vezes e continua se recusando a criar uma normativa que estabeleça quais são os parâmetros de "conheça seu cliente" para evitar que escritórios de advocacia sejam usados para lavagem de dinheiro. Nós temos reiterados casos de escritórios de advocacia que simulam prestação de serviço advocatício para justamente realizar a lavagem de dinheiro.
|
10:56
|
Oitava ideia, a competência do processo criminal tem que ser fixada em momentos bem específicos. Hoje, ela é analisada em qualquer momento, durante a investigação, durante o processo. Pode-se chegar até quase no trânsito em julgado sem que se analise a competência — e competência, hoje, é o principal motivo de anulação de casos relevantes que combatem a lavagem de dinheiro. Nós precisamos estabelecer que a competência tem que ser fixada no início da investigação e na hora do recebimento da denúncia. Qualquer outro tipo de informação que venha, em tese, a alterar essa competência não será levada em consideração. O que acontece, muitas vezes, é que, depois de o processo tramitar por 4 anos ou 5 anos, surge uma informação nova e tudo que foi feito, depois de 4 anos ou 5 anos de investigação, de 4 anos ou 5 anos de processo, vai abaixo. No processo, inevitavelmente, acontece a prescrição e toda a ação acaba, de certa maneira, sendo inútil.
Nona ideia, é preciso constar na Lei de Lavagem de forma mais clara que é impossível, na verdade, não é necessária para obter uma condenação por lavagem a identificação com todas as circunstâncias do ato que gerou o recurso ilícito. A Lei de Lavagem foi criada para combater o tráfico internacional de drogas. Ninguém nunca pensou em efetivamente exigir dos órgãos de persecução penal a descoberta da boca de fumo, de qual localidade, de qual cidade, que gerou a nota de 20 reais, ou todas as notas de 20 reais, ou todas as notas de 50 reais. Mas, infelizmente, alguns juízes exigem esse tipo de prova para que se consiga uma condenação por lavagem. Esse tipo de prova é impossível. Se isso for efetivamente levado a cabo de maneira ampla pelo Judiciário, nenhuma condenação de lavagem ocorrerá no Brasil.
Décima primeira ideia, é preciso também prever na Lei de Lavagem que a diferença total dos recursos à disposição do réu e aquele que seja compatível com seu rendimento lícito autoriza o juiz a entender que os valores que são de sua titularidade e estão à sua disposição têm origem ilícita. Se determinada pessoa não tem renda lícita comprovada, mas tem um patrimônio de 20 milhões de reais, o juiz tem que estar autorizado a entender que esse patrimônio de 20 milhões de reais tem origem ilícita. Isso já é feito em outros países, como no Reino Unido e na Alemanha, mas não no Brasil. E seria uma grande vantagem e uma grande solução para a repressão à lavagem no Brasil.
Décima segunda ideia, a mistura de ativos ilícitos com ativos lícitos autoriza o perdimento de todos os valores. Então, se eu misturei ativo ilícito na conta de uma empresa lícita, todos os valores daquela conta vão poder ser objeto de perdimento. Isso tem um efeito muito grande. E é assim, no fundo, que funciona o confisco não criminal de bens nos Estados Unidos. Se movimentou dinheiro e misturou ativo lícito com ativo ilícito, todos os valores vão ser perdidos.
E a décima terceira ideia, para encerrar a minha fala: é preciso prever também na Lei de Lavagem que o descumprimento dos deveres antilavagem pode ensejar responsabilização criminal. O exemplo mais recente é o caso da Binance, nos Estados Unidos, que durante o seu funcionamento dos últimos 6 anos nunca apresentou nenhum tipo de informe à unidade de inteligência financeira dos Estados Unidos. Por conta disso, o presidente e a própria empresa foram acusados criminalmente e fizeram um acordo com o Departamento de Justiça dos Estados Unidos para pagar 4 bilhões de dólares. Além disso, reconheceram a culpa por não exercerem de forma suficiente os deveres antilavagem.
|
11:00
|
Nós não temos no Brasil hoje nenhuma previsão de responsabilização penal clara e explícita de que o descumprimento dos deveres de comunicação ao COAF pode ensejar responsabilização criminal. Nós precisamos de uma alteração legislativa que diga isso às claras, para que o MPF e a polícia possam efetivamente conseguir o que nós estamos aqui para fazer, que são condenações criminais e o perdimento de bens.
O SR. PRESIDENTE (Aureo Ribeiro. Bloco/SOLIDARIEDADE - RJ) - Agradeço ao Sr. Henrique Valadão a exposição.
Prezados membros da presente Comissão e demais convidados, gostaria de cumprimentá-los e agradecer-lhes a presença.
Como todos sabem, recentemente fui Presidente da CPI das Pirâmides Financeiras, que logrou êxito em evidenciar diversas organizações criminosas, indiciando pessoas, além de trazer luz a diversas mazelas existentes no sistema de prevenção e repressão a essa modalidade de crime organizado que lesa os cidadãos de bem no País e, em alguns casos, leva as vítimas até ao suicídio.
Pois bem, diante desse cenário, gostaria de fazer algumas perguntas e que elas fossem respondidas por todos que fizeram exposição de acordo com as experiências de cada convidado.
Recentemente, o Superior Tribunal de Justiça, por intermédio de decisão do Ministro Antônio Saldanha Pinheiro, declarou a ilicitude dos Relatórios de Inteligência Fiscal oriundos de solicitação da autoridade policial sem decisão judicial antecedente em apertada síntese. Os órgãos de fiscalização continuam solicitando diretamente os Relatórios de Inteligência sem decisão judicial? Quais os critérios para avançar em uma fiscalização diante de um Relatório de Inteligência Financeira? Como se escolhem e quais são os critérios utilizados para a difusão e a escolha da atividade a ser investigada diante de um Relatório de Inteligência Fiscal?
Durante as quebras de sigilo e dos diversos depoimentos na CPI, percebemos que houve intensa movimentação atípica das denominadas pirâmides financeiras e que órgãos de controle não tiveram agilidade suficiente para que houvesse a prevenção a contento. Tanto é assim que vivemos uma verdadeira febre de pirâmides no País. Quais são as medidas adotadas pelos órgãos presentes para que esse tipo de modalidade delituosa não traga mais mazelas à sociedade brasileira?
Outra pergunta: só a título de exemplo, ao cidadão médio que vai ao banco depositar em dinheiro determinada quantia — qualquer cidadão brasileiro, político, advogado, médico — é solicitado o CPF, e possivelmente ele terá essa movimentação adotada como atípica se fugir do padrão de sua movimentação. Qual é a explicação para tamanha e intensa movimentação de atividade financeira das pirâmides financeiras não ter ligado o alerta de forma imediata dos órgãos de prevenção e repressão? Falta vontade ou é ausência de mão de obra qualificada para atuação? Os bancos e os segmentos, como um todo, fecham os olhos para essa intensa movimentação financeira por ser lucrativa?
|
11:04
|
Contribuindo para o debate, é importante aqui dar luzes, como eu falei. Após a decisão do Superior Tribunal de Justiça, Deputado, graças a Deus, tivemos um claro de tranquilidade, porque a polícia precisa ter uma segurança jurídica mínima na sua atuação. Então, tivemos esse descompasso de questionamento sobre os RIFs de intercâmbio, mas com a decisão do Supremo Tribunal Federal continuaremos realizando esse tipo de compartilhamento de informações junto ao COAF.
Pela polícia, não houve nenhuma suspeição — respondendo já à primeira pergunta. Os RIFs continuaram sendo solicitados e continuarão a ser solicitados certos de que não há qualquer, digamos, atuação à margem da lei. Pelo contrário, há uma atuação em compasso direto e que vai ao encontro de recomendações internacionais, como as do GAFI. Recentemente, o Brasil foi avaliado e tivemos boas notas no GAFI. O relatório final se aproxima, está previsto para dezembro. Há ali o reconhecimento internacional dos esforços não apenas do COAF, mas de todas as unidades que estavam presentes, inclusive a Polícia Federal.
No que de fato precisamos avançar — e há caminhos para isso — é quanto ao estabelecimento de tipologias. A Polícia Federal está trabalhando muito em relação às tipologias recentes de lavagem — há um banco próprio sobre isso —, no estabelecimento de flags em tipologias específicas do relatório de inteligência, tal como apostas esportivas, crimes ambientais, pirâmides financeiras, entre outros assuntos, que, pela recorrência e importância, justificam um olhar mais próximo dos órgãos de investigação.
De fato, Deputado, há algumas necessidades. Foram postas aqui algumas sugestões por mim e pelo próprio Ministério Público Federal, com o Dr. Henrique Valadão. Elas são muito oportunas e, uma vez aceitas, será importante termos esse ponto de partida, essa oportunidade, na Câmara, porque há realmente necessidade de avanço, inclusive no Legislativo, para que possamos trabalhar com a segurança necessária no enfrentamento ao crime organizado no Brasil.
O SR. PRESIDENTE (Aureo Ribeiro. Bloco/SOLIDARIEDADE - RJ) - Passo a palavra ao Sr. Valdemir Fortes de Sousa, do Banco Central do Brasil.
O SR. VALDEMIR FORTES DE SOUSA - Sr. Deputado, relativamente às questões que o senhor nos endereça, o Banco Central tem, conforme disse na exposição inicial, em relação aos RIFs — não aos RIFs, mas às comunicações que embasam os RIFs —, um trabalho para os próximos anos no sentido de melhorar a qualidade. A questão não é mais a quantidade, mas, sim, a qualidade das informações que compõem as comunicações. Com isso, devemos enriquecer os Relatórios de Inteligência Financeira e melhorar a eficácia.
|
11:08
|
Em relação às movimentações atípicas, a regulação dessas entidades, baseada na lei específica de criptoativos, está prevista para 2024. Estamos trabalhando intensamente no departamento de normas para garantir que a regulação esteja pronta até meados do próximo ano. Estamos na iminência de realizar a primeira consulta pública junto aos agentes de mercado e à sociedade, que também pode participar. No primeiro momento, abordaremos o entendimento melhor do negócio. A partir do início do ano que vem, com a primeira minuta de regulação dessas entidades, acredito que fecharemos uma porta importante em relação ao uso dessas entidades para a promoção de pirâmides financeiras.
Há outro grupo de trabalho no Banco Central que visa aprimorar a regulamentação das instituições de pagamento e o serviço chamado banking as a service, que são provedores de plataformas para instituições de pagamento abaixo do volume e outras entidades. Além disso, buscamos fechar algumas portas identificadas que podem ser restritas, para que esses agentes façam um controle mais eficaz das contas de pagamento e, assim, monitorem melhor essas contas, com mais detalhes, comunicando adequadamente ao COAF as movimentações atípicas.
Acredito que não haja leniência do sistema bancário com esse tema. O número de comunicações atesta que eles, de fato, estão preocupados com o assunto. Estamos sempre trabalhando. O desenvolvimento de tipologias é um trabalho contínuo, nunca para. Um processo nevrálgico em um sistema de prevenção à lavagem de dinheiro que um banco monta, um banco digital monta, uma instituição de pagamento monta é ter uma equipe especializada para desenvolver tipologias. Portanto, temos cobrado não apenas o desenvolvimento, mas também a manutenção e revisão dessas tipologias. Isso demanda interlocução via associações com os órgãos de investigação e persecução. Acaba sendo rico para as próprias instituições essa interação, com insumos para desenvolver essas tipologias. O nosso papel é cobrar que isso seja feito.
|
11:12
|
Acredito também na ênfase a essa tipologia de pirâmide, a construção de um modus operandi que permita a detecção da ocorrência de pirâmides por parte das instituições, e podemos fazer isso via mecanismos nos fóruns de que participamos. A avaliação setorial de riscos é um momento em que nos debruçamos sobre os produtos financeiros e sobre o risco que eles representam no sistema a serem utilizados para esse tipo de delito, e avançar nisso. Então, acho que criptoativos, IPs e banking as a service, vamos dizer, representam um avanço na regulamentação. O diálogo com os órgãos de detecção e persecução e a maior integração das informações já estamos endereçando. Também precisamos de maior integração das informações relativas a sigilo fiscal.
Um ponto que eu não trouxe aqui no início — mas, talvez, futuramente, o Banco Central leve como uma demanda à Casa — é que há IPs na casa de centenas. Então, precisamos de um processo mais célere de retirada delas do sistema quando se constatar que são usadas para esse tipo de crime, ou são, inclusive, eventualmente abertas por organizações para poder promover crimes. Precisamos de um processo mais célere de retirada delas do mercado. Hoje, temos alguns óbices legais. Eu não sou a pessoa mais apropriada para falar disso, mas o assunto está sendo debatido internamente como medida necessária para termos a condução da supervisão. E aí, quando se constatar essa ocorrência, e pudermos evidenciar isso, promoveremos a retirada rápida dessas instituições do mercado.
O SR. PRESIDENTE (Aureo Ribeiro. Bloco/SOLIDARIEDADE - RJ) - Agradeço a exposição.
Tentando ser breve e objetivo, primeiro, há que se distinguir um Relatório de Inteligência Fiscal de um Relatório de Inteligência Financeira.
O que nós estamos tratando aqui é da utilização, da forma de intercâmbio de Relatórios de Inteligência Financeira produzidos pelo Banco Central, no entendimento de que não há qualquer necessidade de autorização judicial prévia, segundo a própria decisão do Supremo Tribunal Federal, para que esse tipo de informação seja compartilhado entre o COAF e as autoridades competentes. Por quê? Porque nós não estamos, nesse relatório, quebrando o sigilo bancário ou fiscal. O sigilo das informações que eventualmente conste dessa peça informativa é transferido para a autoridade à qual o documento é disseminado. Para um Relatório de Inteligência Fiscal há o entendimento, parece-me, tanto envolvendo informações bancárias como fiscais, de que haveria a necessidade do afastamento do sigilo por uma autorização judicial. Mas isso já se dá dentro do processo de investigação.
|
11:16
|
Na verdade, as condições para o COAF compartilhar informações com as autoridades são, primeiro, a declaração e a comprovação da existência de um inquérito aberto com a motivação declarada e, em tese, os principais envolvidos relacionados, para que tenhamos a certeza de que a autoridade competente tem instaurado no seu ambiente um procedimento investigativo criminal. A informação é compartilhada desde que haja alguma informação na base de dados do COAF, ou seja, se não houver nenhuma informação relacionada àquele CPF ou CNPJ, não há como se produzir um Relatório de Inteligência Financeira. O COAF não requer de nenhuma pessoa informações para atender a um requerimento de informações de intercâmbio ou a um pedido de informações de intercâmbio. Isso é bom ficar muito claro dentro das competências do COAF. O COAF não é o órgão de investigação. Os órgãos de investigação tributária são a polícia, a Receita e o Fisco. O COAF simplesmente direciona ou busca direcionar com seus Relatórios de Inteligência os caminhos do dinheiro a partir da comunicação também oriunda dos setores obrigados. Os nossos olhos são os setores obrigados.
Quando eu recebo uma comunicação de um banco, descrevendo um comportamento atípico, em determinado período, de movimentações de recursos incompatíveis com renda declarada, ou patrimônio de determinadas pessoas, isso nos sinaliza evidências de indícios. Porém, eu não tenho como afirmar que aquilo é um crime, a não ser que eu compartilhe os dados com a autoridade competente para desenvolver essa investigação, e aí, sim, se confirme, ou não, através de quebra de sigilo bancário, através de quebra de sigilo fiscal, a evidência da prova de que aquele recurso foi obtido de maneira ilícita e de que aquele movimento informado realmente buscava ocultar ou dissimular a origem desse recurso, buscando dar licitude aos respectivos recursos.
Então, essa distinção entre Relatório de Inteligência Fiscal e Relatório de Inteligência Financeira é fundamental para que não confundamos as regulações que orientam cada um desses documentos.
A questão das pirâmides não é nova. Ela tomou uma dimensão mais ampla nos últimos tempos, mas sempre foi um item de preocupação das autoridades, do direito do consumidor, do próprio Banco Central, em termos de tentar mapear ou identificar aqueles que se dedicam a produzir esse tipo de sonho entre os que acreditam em milagres em termos de finanças. Mas imagino que haja uma preocupação não só por parte dos bancos, mas também por parte das autoridades policiais, em identificar eventuais sinais exteriores de riqueza que naturalmente os mentores dessas pirâmides começam a demonstrar. E é essa demonstração que atrai os incautos que acreditam na possibilidade de uma remuneração mensal de 10% a 15%, quando hoje, no movimento regular do mercado, não se chega a 1% ou a 1,5%, dependendo do mercado de risco.
Então, essa pirâmide, ainda mais com a atração dos chamados criptoativos, complicou um pouco mais a possibilidade de atuação
da polícia nos processos de investigação, embora tenhamos conhecimento de vários casos de grande sucesso conduzidos pela polícia, chegando até a dar perdimento, alcançar os criptoativos e dar perdimento a esses documentos, a esses ativos, dentro da ideia de recuperação de ativos decorrentes da atuação criminosa, enfim, do crime organizado.
|
11:20
|
Então, a decisão a que não só o Felipe se referiu, como também o Dr. Henrique — essa é uma decisão recente do Ministro Cristiano Zanin —, só confirma uma decisão de 2019. Essa decisão já era clara e precisa para todos nós que, enfim, lidamos com aquele assunto. Tivemos uma participação bastante intensa com os Ministros durante aquele período, para tentar esclarecer ao máximo, demonstrar ao máximo como o procedimento se dá, e tivemos êxito naquela demonstração com a decisão do Recurso Extraordinário nº 1.055.941, que, por essas questões de buscar confundir relatório de inteligência fiscal com relatório de inteligência financeira, conseguiu provocar dúvida na autoridade judicial e conseguiu aquela suspensão no Tribunal de Justiça do Pará, coisa que foi recolocada pela manifestação e decisão do Ministro Zanin àquela condição anterior, de 2019.
O SR. PRESIDENTE (Aureo Ribeiro. Bloco/SOLIDARIEDADE - RJ) - Agradeço-lhe a resposta.
O SR. HENRIQUE DE SÁ VALADÃO LOPES - Eu não sei se consegui anotar todas as perguntas, mas vou tentar responder a todas.
A decisão do STJ é um problema? Sim, ela é um problema. A decisão do Ministro Zanin agora ainda não resolve completamente a situação. Dentro do Ministério Público Federal, deixou-se de pedir relatório de inteligência financeira por conta da decisão do STJ? Não, não se deixou de fazer essas solicitações, até porque se acreditava que a decisão estava equivocada, ia ser revista pelo STF. E vem aí, esperamos, o processo de revisão.
Em relação às questões das pirâmides financeiras, existem duas maneiras, duas preocupações diferentes que se pode ter. Se a preocupação é condenação criminal, eu acho que as instituições, tanto públicas quanto privadas, vêm adotando, vêm agindo da forma que é esperada e da forma que é possível. Talvez, os casos criminais não tenham sido levados para frente numa velocidade maior porque isso não é possível. Eu mesmo fiz um caso de pirâmide financeira no Amazonas e a investigação dura por volta de 1 ano ou 2 anos. Não dá para fazer uma investigação num tempo menor do que isso, dentro das nossas limitações de recursos humanos e dentro até das limitações do Judiciário. Às vezes, é um juiz só que tem vários casos, todas as decisões precisam passar por ele, e ele não dá as decisões na velocidade que seria necessária para podermos desenvolver a investigação de forma mais rápida.
E há uma outra forma de combate a pirâmides financeiras, uma forma que ainda não se levou adiante, pelo menos no Brasil eu não vi isso, uma forma de combate cível, não criminal, que é a seguinte: o Ministério Público Federal ou a Procuradoria do Banco Central poderia entrar com ações cíveis para bloquear as contas que fossem detidas por essa pirâmide, das pessoas que manejam essa pirâmide.
O funcionamento das pirâmides exige um fluxo constante de recursos. Então, uma decisão dessas, que bloqueasse as contas de um esquema de pirâmide, que isso durasse por volta de 3 meses ou 4 meses, já seria suficiente para quebrar a pirâmide. Dessa forma, a pirâmide não teria massa de gente suficiente para virar o problema que houve, por exemplo, na Operação Kryptos, lá na Região dos Lagos do Rio de Janeiro.
|
11:24
|
Nesse sentido, essa seria uma ação muito mais rápida, muito mais séria e muito mais fácil de ser feita. No entanto, por outra via, ela acaba impedindo ou dificultando a persecução penal. E o nosso objetivo é evitar que a pirâmide vire um monstro e acabe com os valores da população. A via cível é mais célere e efetiva, creio que vai ser efetiva. "Não, o nosso objetivo é, de fato, colocar as pessoas na cadeia." Aí o prazo de 2 anos para uma investigação vai ser o prazo que vai ocorrer. Eu não consigo ver uma outra solução para acelerar isso que não seja, por exemplo, nós termos mais juízes federais que atuem única e exclusivamente em matéria criminal. Os juízes têm uma carga de trabalho muito grande, e isso demora, essas decisões que são necessárias para uma investigação acabam demorando um tempo, o que faz com que a investigação dure 2 anos.
Existe algum tipo de demora ou de compactuação das instituições financeiras? Não, não é a percepção do Ministério Público Federal, não é a minha percepção. Eu acho que as instituições atuam de maneira célere. As comunicações são feitas de fato. Uma investigação criminal demora porque demora, como eu já disse.
Além disso, um outro problema que nós ainda temos é que os casos de pirâmide, a grande maioria deles, não são de atribuição federal, são casos de atribuição estadual. Então, especificamente, em relação à atuação do Ministério Público Federal, o Ministério Público Federal se vê impedido de atuar. A não ser que haja algumas circunstâncias específicas, os casos vão ser levados a cabo por via da Justiça estadual. Mesmo a legislação que tratou dos casos de pirâmides mais recentes, que aumentou a pena, que criou uma modalidade específica de estelionato, não trouxe atribuição federal para esses casos. E, de novo, o problema da competência, que eu já disse na minha fala, é um problema sério. Você demarcar muito bem as hipóteses de competência federal e as hipóteses de competência estadual é vital para que não tenhamos uma decisão judicial anulando uma investigação e todo o esforço dos órgãos de persecução penal sendo jogado por terra.
O SR. PRESIDENTE (Aureo Ribeiro. Bloco/SOLIDARIEDADE - RJ) - Agradeço-lhe as respostas.
O SR. RICARDO LIÁO - Bem, a respeito das exchanges, como são conhecidas as empresas que negociam criptoativos ou provedores de artigos virtuais, embora já inclusas objetivamente na lei como sujeitos obrigados, ou seja, passaram a ser incluídas no art. 9º da Lei nº 9.613, de 1998, no qual são definidas as chamadas "pessoas obrigadas", todas elas têm o chamado "regulador próprio", que regula a atividade.
|
11:28
|
No caso específico das exchanges, são corretoras de valores, vamos dizer assim, nós temos a clássica situação, que foi confirmada pela legislação, de ter o órgão supervisor do sistema financeiro como seu regulador, tanto da atividade quanto das regras de prevenção à lavagem de dinheiro.
Como colocado pelo colega Valdemir, um trabalho está sendo agora desenvolvido pela equipe técnica do Banco Central do Brasil, da área de normas, que vai cumprir todo um ritual de exigências, vamos dizer assim, a chamada consulta pública, para obter a informação da sociedade e de todos aqueles que se interessam pelo tema. A finalidade é contribuir com a melhor normativa, quer em relação à atividade e eventualmente a alguns sinais de alerta que sejam importantes serem trazidos à regulamentação já existente no Banco Central que trata desse assunto, que é a Circular nº 3.978, de 2020, que orienta todas as instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central na adoção de procedimentos de controles internos.
Hoje, ainda não temos para o setor específico das exchanges uma regulamentação da atividade, uma autorização para funcionamento, para aprovação dos seus quadros diretivos, societários. E também não temos uma definição de situações específicas, chamadas "sinais de alerta", que é o que basicamente orienta todos os setores obrigados, ao perceberem a ocorrência de um sinal de alerta — é um sinal de alerta, não é necessariamente já a definição de uma prática criminosa —, a promoverem uma investigação, uma diligência interna, para verificar se aquele sinal de alerta realmente corresponde a uma situação de suspeição. E, se isso se caracterizar, que eles comuniquem aquele fato à unidade de inteligência financeira, ao COAF.
Nós ainda não temos hoje essas especificações, então não há como exigir, ou permitir, na verdade, que alguma instituição integre o Sistema de Controle de Atividades Financeiras — SISCOAF, sem ter primeiro uma autorização ou cadastro no seu órgão regulador. Hoje, nós não temos nenhuma dessas empresas, pelo que eu entendo, inclusas como autorizadas a funcionar pelo Banco Central. Esse processo entrará em andamento a partir da regulamentação que vier a ser baixada.
Então, eu não tenho como autorizar o ingresso no meu sistema de informação — que é um sistema seguro, criptografado, que requer todo um controle — de uma empresa que eu não sei de quem é, que não sei quem é o diretor, que não tem autorização da autoridade competente. Eu não posso permitir que ela se utilize desse mecanismo, que é restrito, volto a dizer, a pessoas obrigadas, cadastradas ou autorizadas pelo seu órgão regulador. A partir de então, observados os sinais de alerta pela autoridade que a regula, ela poderá passar a ser um comunicante regular dentro do sistema de prevenção da unidade de inteligência financeira.
O SR. PRESIDENTE (Aureo Ribeiro. Bloco/SOLIDARIEDADE - RJ) - Então, deixe-me tentar ver se eu compreendi de uma forma mais resumida: todo mundo que opera com criptoativo opera no mercado livre. Podemos dizer que...
|
11:32
|
O SR. PRESIDENTE (Aureo Ribeiro. Bloco/SOLIDARIEDADE - RJ) - É o mercado não regulado que não tem o olhar do COAF. Então, se traficantes de drogas, milicianos e pessoas quiserem fazer evasão de divisas, de dinheiro ilegal do País, de tudo quanto é fonte, podem trabalhar com criptoativos, que não vão ter o olhar do COAF nessa evasão de divisas do Brasil. Transformam bilhões de reais, de dinheiro ilegal, que podem ser sacados em outros países de forma legalizada, porque o COAF não vai ver. Hoje, não tem como ver, não é isso?
O SR. PRESIDENTE (Aureo Ribeiro. Bloco/SOLIDARIEDADE - RJ) - Isso é bom para termos clareza, Sr. Ricardo, porque são transacionados no Brasil, nas plataformas de criptoativos, 30 bilhões de reais diariamente. Há diversas empresas que lesaram a população brasileira. E essas empresas, quando você vê na Receita Federal, eram inscritas no SIMPLES Nacional e tiveram bilhões de reais transacionados nas suas contas correntes.
O Brasil tem corretoras de valores que transacionam bilhões de reais por dia e não têm nenhum olhar sobre elas. Então, é muito fácil tentarmos, no Rio de Janeiro, combater o tráfico de drogas, combater os milicianos, enquanto eles pegam esse dinheiro de forma ilegal, transformam esse dinheiro em dinheiro legal e sacam em outros países, porque não há o olhar do Governo. Eles podem transacionar esse dinheiro. Sabemos que o dinheiro está sendo transacionado por meio de criptoativos, conforme revelaram diversas operações da Polícia Federal, diversas operações da Polícia Civil, diversas fontes já claras e objetivas. E não conseguimos fazer esse combate; estamos como o cachorro, correndo atrás do rabo.
Não conseguimos nunca resolver esse problema e vamos ter que conviver com ele pela falta de competência do Executivo de resolvê-lo, seja o Banco Central, seja o Ministério da Fazenda, seja a Receita Federal. Temos um problema e vivemos correndo atrás do rabo, e, infelizmente, quem está sofrendo é a população brasileira, com o aumento da violência, com o crescimento dos crimes relacionados às drogas no Rio de Janeiro e no Brasil. E não conseguimos resolver um simples problema, que é combater quem está transacionando esse dinheiro.
Essa é uma triste realidade com que estamos convivendo no Brasil. Isso é só um desabafo, porque é inadmissível termos movimentações de bilhões de reais e vermos o povo brasileiro sofrer da forma que está sofrendo.
O SR. FELIPE ALCÂNTARA DE BARROS LEAL - Deputado Aureo, mais uma vez, renovo o meu agradecimento pelo convite. É sempre importante debatermos esse assunto de extrema valia, altamente contemporâneo.
Foram postos aqui alguns assuntos de alto relevo, como, principalmente, a ideia de criptoativos, as exchanges, o reconhecimento de que há necessidade enorme de avançarmos.
Pela Polícia Federal, laboratórios de repressão à lavagem de dinheiro, crimes financeiros, foram implementados esse ano. Inclusive, nesta semana, uma primeira grande operação foi feita pelo nosso laboratório de Santa Catarina, que envolveu as questões de pirâmide e de criptoativos. A Polícia Federal permanece ativa nesse enfrentamento e nos objetivos estratégicos que já desenhamos para o próximo ano.
|
11:36
|
O SR. PRESIDENTE (Aureo Ribeiro. Bloco/SOLIDARIEDADE - RJ) - Concedo a palavra ao Dr. Valdemir de Sousa.
O SR. VALDEMIR FORTES DE SOUSA - Também aproveito para agradecer a oportunidade de estar aqui nesta audiência pública para debater esse assunto. Lembro que, agora, o Banco Central também tem uma tarefa de alta responsabilidade, que é fazer o processo de regulação das provedoras de artigos virtuais, as exchanges.
Posso garantir ao Sr. Deputado que estamos nos dedicando a esse trabalho com prioridade. Pretendemos fazer essa regulamentação o mais breve possível. Acho que ela vai contribuir bastante ao criar um mercado saudável, uma referência para a população de onde ela deve aplicar seus recursos quando decidir investir em criptoativos. Esperamos criar isso.
O padrão que a Supervisão de Conduta traçou para esses provedores é o mesmo que se exige para bancos, financeiras, cooperativas de crédito, que é a Circular nº 3.978. A ideia é aplicar todos aqueles processos que estão previstos nessa circular, para que as provedoras também tenham esses processos montados. Isso vai ser um trabalho da supervisão, tão logo tenhamos a regulação e a autorização dessas empresas. Acho que isso reduz possibilidades.
Ressalto que na ENCCLA definimos, há 1 semana, uma ação específica para a questão de ativos virtuais voltados para questões de detecção, investigação e persecução. O Banco Central participa como colaborador. Ele vai ser coordenado, se eu não me engano, pelo Ministério Público. Com essa ação, vamos desenvolver essas questões, ver questões importantes de integração e troca de informação, definição de tipologia, pois isso tudo está afetando o nosso trabalho na supervisão.
O SR. PRESIDENTE (Aureo Ribeiro. Bloco/SOLIDARIEDADE - RJ) - Agradeço ao Sr. Valdemir de Sousa.
Deixo claro que é só um desabafo, Dr. Ricardo. Eu sou o autor do Marco Legal das Criptomoedas no Brasil. E é triste vermos que demoramos a ter um avanço; é triste vermos o crime crescendo no Brasil, prejudicando, em especial, o meu Estado do Rio de Janeiro, que vem sofrendo com o aumento da violência; é triste vermos investimentos que poderiam ter sido gastos — eu vi em uma reportagem que na operação da Força Nacional realizada no Rio mais de 10 milhões de reais foram empregados — em saúde e educação serem gastos para combater o crime.
Vemos que poderíamos ter pequenos avanços, porque todo esse dinheiro que está em uma corretora tem que passar pela instituição de pagamento, mas não conseguimos resolver esse problema.
|
11:40
|
O senhor sabe que os órgãos do Estado só atuam dentro da lei, o que é a nossa grande desvantagem em relação aos criminosos, que atuam fora da lei. Com isso, fica uma competição, às vezes, um pouco desigual.
No entanto, o fato de as exchanges ainda não terem a possibilidade de fazer a comunicação ao COAF não elimina a responsabilidade das outras instituições que, eventualmente, tenham essas corretoras como clientes. É importante destacar isso. Nós temos, sim, vários casos já conduzidos pela Polícia Federal, conduzidos pelo Ministério Público, em que parte dos recursos obtidos de maneira ilícita são transformados em criptoativos das várias naturezas que eles se apresentam e até com algumas operações de sucesso, como o próprio Delegado Felipe destacou na fala dele.
A luta é permanente. A nossa ansiedade em resolver mais essa questão também já é agenda dos últimos anos, tanto nos ambientes individuais de cada instituição como no ambiente da própria ENCCLA, como destacou o colega Valdemir, do Banco Central.
Neste ano, certamente, houve uma convergência de ações e de experiências já adquiridas dos vários órgãos que integram o sistema de prevenção. Certamente, vão conseguir enfrentar melhor esse fenômeno e, quem sabe, até reduzi-lo a ponto de não ser tão mais importante, para que, efetivamente, recursos que são empregados na segurança pública tenham uma destinação melhor na saúde e na educação do nosso País.
O SR. PRESIDENTE (Aureo Ribeiro. Bloco/SOLIDARIEDADE - RJ) - Obrigado Dr. Ricardo Liáo.
Eu só queria reiterar e bater de novo na tecla da necessidade de um procedimento de perdimento de bens não criminal. Hoje, de fato, se o investigado morrer, o dinheiro vai para a família, mesmo que seja, por exemplo, dinheiro de pirâmide.
Nós precisamos de uma previsão legislativa clara que estabeleça que, uma vez iniciada a investigação criminal, ainda que com a morte do investigado, vai ser possível obter o perdimento criminal daqueles bens ou mesmo o perdimento não criminal daqueles bens de forma independente do processo criminal. Isso é, de fato, um calcanhar de Aquiles, hoje, na percepção penal.
Um outro ponto que eu queria colocar na minha fala final é que, se o objetivo é, de fato, inviabilizar as pirâmides financeiras, nós precisamos prever formas de bloqueio não criminal desses valores, seja por via administrativa, por parte dos bancos ou pelo Banco Central — a via administrativa mesmo, alguém lá no Banco Central apertar um botão e os valores serem bloqueados —, seja por meio de uma decisão em uma ação cível. Isso é muito mais fácil, muito mais célere, muito mais rápido do que tentarmos implementar isso por meio de processo penal.
|
11:44
|
O SR. PRESIDENTE (Aureo Ribeiro. Bloco/SOLIDARIEDADE - RJ) - Agradeço a todos os participantes da nossa audiência pública.
|