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O SR. PRESIDENTE (Bruno Ganem. Bloco/PODE - SP) - Bom dia a todos.
Declaro aberta a presente reunião de audiência pública para debater a Resolução Nexus entre Bem-Estar Animal, Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente — UNEP, em atendimento ao Requerimento nº 55, de 2023, de autoria do Deputado Nilto Tatto, que, inclusive, quero cumprimentar. Ele não pôde estar presente hoje, mas todos sabemos que é um Deputado bastante atuante neste tema e em outros temas importantes na Casa.
Tenho a honra de anunciar que foram convidados para esta audiência pública os seguintes expositores: Vanessa Negrini, Diretora do Departamento de Proteção, Defesa e Direito dos Animais do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima; Celso Funcia Lemme, Pesquisador da Universidade Federal do Rio de Janeiro — UFRJ; Cristina Mendonça, Diretora-Executiva da Mercy for Animals no Brasil; Karina Ishida, Coordenadora de Programas de Food Systems, que nos acompanham pelo Zoom; e Alysson Soares, Especialista em Políticas Públicas da The Good Food Institute Brasil.
Procedimentos. Antes de passar às exposições dos nossos convidados, esclareço os procedimentos que serão adotados na condução desta audiência pública. Os convidados deverão limitar-se ao tema do debate e disporão de 10 minutos para suas apresentações, não podendo ser interrompidos. Após as exposições, será iniciado o debate. Os Deputados que quiserem usar da palavra poderão fazê-lo por até 3 minutos, inscrevendo-se na lista de debates. Após isso, será concedida a palavra aos expositores para as respostas e considerações sinais. Os expositores deverão ligar seus microfones apenas quando forem usar da palavra. Para os que participam pelo aplicativo Zoom, as câmeras devem permanecer ligadas tanto quanto possível.
Comunico que esta audiência pública está sendo transmitida ao vivo pelo Portal da Câmara dos Deputados, na página da Comissão, e pelo canal da Câmara no Youtube.
A SRA. VANESSA NEGRINI - Muito obrigada, Deputado Bruno Ganem, que, além da pauta ambiental, também carrega o desafio e a missão — eu considero missão — da pauta animal e o tem feito de forma magistral.
Gostaria de cumprimentar os organizadores na pessoa da Cristina e agradecer o convite para participar aqui. Muito me anima e me deixa cheia de esperanças ver aqui na plateia, acompanhando-nos, não só nós do departamento, mas também os nossos colegas representantes do MAPA: o Fernando, a Valéria, o Lucas, a Natercia, que estão à frente desse olhar do bem-estar animal lá; a Natiela, do Grupo Técnico de Saúde Única, do Ministério da Saúde; a Sabrina, da EMBRAPA, mostrando que esse tema do bem-estar animal não faz parte só de uma Pasta, ele precisa ser debatido, no conjunto dos interesses da sociedade, nos vários órgãos que discutem isso.
O bem-estar animal já não é de hoje que não é mais só uma pauta de quem ama os animais, Deputado. Seria fácil se estivesse só na mão de quem ama os animais. Hoje o bem-estar animal é uma pauta inclusive econômica, uma pauta econômica importante para os países.
Há uma variedade de interesses. Ela tem repercussão, é claro, na vida animal e também na vida humana e no meio ambiente. Por isso é tão importante a presença desses nossos colegas aqui, também participando deste debate.
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Uma questão econômica clara que nós vemos: tratados internacionais podem acabar se tornando barreiras para as economias dos países se não avançarmos no debate interno com relação ao bem-estar animal, como, por exemplo, o tratado entre União Europeia e MERCOSUL. Há hoje discussões sobre cláusulas ambientais e bem-estar animal que estão impedindo o avanço da formalização desse tratado. Isso é prejuízo, inclusive, para o bolso do agronegócio, não é de interesse para a pauta do País como um todo. Então, essa é uma pauta que perpassa não só uma questão de quem gosta ou não gosta dos animais, é uma pauta de Estado e precisa ser discutida.
Inclusive, seria muito interessante conhecermos como está o andamento da revisão de normas de bem-estar animal na União Europeia. Elas estão passando por uma profunda revisão, que deve ser aprovada até novembro. Isso, com certeza, trará impactos para as nossas relações comerciais. E precisamos estar atentos a esse debate e saber dialogar e nos preparar. Precisamos preparar, inclusive, o setor produtivo para que não tenha esses impactos econômicos.
Com relação à Resolução Nexus entre Bem-Estar Animal, Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, do PNUMA, foi a primeira vez que tivemos o reconhecimento pela Organização das Nações Unidas, em 2022, dessa relação. Essa relação é tão óbvia, e tão singela a compreensão, mas haver o reconhecimento em uma resolução importa desafios.
E essa resolução o que diz? Que há evidências desse nexus entre bem-estar animal, meio ambiente e desenvolvimento sustentável e determina que os Estados-membros realizem estudos, pesquisas e prospecções para dizer em que nível está essa relação e que deem respostas a esse enfrentamento. Inclusive, esta semana, respondemos a uma consulta do PNUMA, que queria saber em que pé está esse desdobramento dentro do Brasil.
O que essa resolução pede? Que os Estados-membros produzam um estudo provisório para orientar a elaboração de um relatório sobre o nexo entre bem-estar animal, meio ambiente e desenvolvimento sustentável, com colaboração da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura — FAO e a Organização Mundial da Saúde — OMS.
Sim, bem-estar animal dialoga com a fome! Se não atentarmos para a produção de alimentos seguindo o requisito de bem-estar animal, colocaremos em xeque, inclusive, a capacidade de alimentar as pessoas.
Além da Organização Mundial da Saúde, deve haver a colaboração de um painel de especialistas de alto nível em Saúde Única para relatarem, então, essas experiências e pesquisas em cada país-membro sobre o bem-estar animal, meio ambiente e desenvolvimento sustentável.
Segundo o desafio do PNUMA nessa consulta — provocando os parceiros —, devem-se identificar os principais parceiros relevantes e, se necessário, as partes interessadas.
Vejam que oportuna esta audiência! Já estamos identificando aqui vários parceiros. E vamos ter que ampliar mais esta audiência, porque vai ser um conjunto.
Como a Valéria mesmo bem pontuou, isso leva tempo. Nós vamos ter que passar por uma série de construções internas, de debates internos, até que essas normas sejam assimiladas. Comecemos. Comecemos.
Outro desafio: definir um mecanismo robusto, positivo e progressivo para estabelecer como bem-estar animal se interconecta com o elemento essencial de esforços globais para garantir o futuro sustentável de todas as pessoas, do planeta e dos animais, ou seja, isso aqui é a base da ciência, é o chamado do PNUMA para que a ciência seja trazida à tona para estabelecer esses critérios e, de forma científica, possamos fazer esse enfrentamento.
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Estabelecer um sistema para que o relatório seja elaborado de forma transparente, inclusiva, não tendenciosa, revisada pelos 194 membros da união, da organização do PNUMA e apresentado para aprovação dos Estados-membros. Olhem o trabalho que isso vai envolver, e o Brasil tem o seu papel nisso.
O chamamento do PNUMA é para fazer a produção desses relatórios, dessas evidências. É um chamado que, penso, é responsabilidade de todos nós e que tem que vir à provocação do Congresso Nacional, do Executivo, e nós estamos aqui representando o Executivo, as várias instâncias do Executivo. E hoje temos Ministério do Meio Ambiente, Ministério da Agricultura e Pecuária, Ministério da Saúde e vários outros. A questão ambiental é pauta nº 1 hoje no País. Isso porque não é só uma pauta ambiental, mas é também a pauta das nossas vidas, é a definição se estaremos vivos ou não.
Lembro que 88% dos brasileiros e brasileiras, incluindo as pessoas que se alimentam de carne, preocupam-se com o bem-estar animal, ou seja, também é uma reivindicação. Tanto é uma reivindicação, Deputado, que no PPA Participativo a primeira proposta mais votada no MAPA — Ministério da Agricultura e Pecuária foi a de produção livres de gaiolas, ou seja, é uma pauta que dialoga com objetivo desta audiência, que é o bem-estar animal.
Essa votação no PPA Participativo obriga o Governo a dar uma resposta a essa demanda da sociedade. O conjunto do Governo vai ter que olhar para essa demanda da sociedade e dizer: "O que estamos fazendo com isso? O que estamos organizando para caminhar rumo a esses anseios da sociedade?" Não é um anseio sem respaldo. Hoje temos a Organização das Nações Unidas cobrando dos Estados-membros respostas para a Resolução Nexus entre Bem-Estar Animal, Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável.
O SR. PRESIDENTE (Bruno Ganem. Bloco/PODE - SP) - Obrigado, Vanessa.
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(Segue-se exibição de imagens.)
Quais são os pontos básicos sobre os quais gostaria de conversar hoje? Primeiro, quero lembrar que esta pauta traz um conjunto muito grande de oportunidades econômicas, ambientais e sociais para o Brasil. Ela serve para reforçar posicionamento e liderança nesse setor de alimentação do agronegócio. É uma oportunidade enorme que o Brasil tem.
Onde está inserida essa discussão quando olhamos por um lado econômico e empresarial? A discussão está acontecendo em vários setores relevantes no mundo, e eu listei alguns aqui. O de alimento está aqui na lista, e, talvez, possamos completar esses pontilhados com outros setores que estão examinando se as estratégias e as operações que eles adotaram nos últimos 10 anos, 20 anos, 30 anos poderiam permanecer como estão para os próximos 10 anos, 20 anos, 30 anos ou se está na hora de buscar inovações e modificações relevantes alinhadas com essa agenda.
Aqui é apenas uma indicação do impacto que tem o nosso sistema de produção atual. Esse é um dado de pesquisa recente da National Academy of Sciences, de fevereiro deste ano. Se nós somarmos o peso da espécie humana em milhões de toneladas sobre o planeta, 390, com os nossos rebanhos domésticos, 630, e até os cães domésticos, por uma indicação de convívio com a espécie humana, observaremos o que eles representam em termos de comparação com o peso de todos os mamíferos selvagens terrestres e marinhos. Isso dá para ter uma ideia do desafio que estamos enfrentando em termos de modelos de produção ou ocupação territorial e impacto ambiental.
Aqui há uma indicação. Para enfrentar esses desafios nos diversos setores, o que se tem buscado na atividade empresarial? Os chamados caminhos sustentáveis, modelos de negócios. Aqui eu listei uns sete, oito. Talvez, novamente, nós possamos completar a linha pontilhada com novos modelos, novas formas de abordar sistemas de produção, sistemas econômicos em vários setores, e o bem-estar animal aparece como uma dessas alternativas, um desses caminhos.
Reparem o seguinte: se há 10 anos, 20 anos, 30 anos, nós listássemos esses nomes de modelos de atuação, talvez a maioria de nós nem sequer entendesse o significado. Hoje são termos que estão em ampla discussão e ampla implantação.
Aqui é importante chamar atenção para o seguinte: embora os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável pareçam 17 objetivos genéricos apenas, por trás deles há 169 indicadores que materializam esses objetivos.
Por que o bem-estar animal pode ser uma oportunidade muito interessante para nós brasileiros, para a economia, para o desenvolvimento? Por algumas razões.
A primeira delas é porque parte de princípios muito simples, muito comuns e que são quase consenso nas sociedades humanas das mais diversas regiões e culturas, como respeitar a vida, evitar o sofrimento desnecessário, manifestar comportamentos naturais.
Então, quando alguma inovação surge no horizonte, qual é a pergunta que se faz? "Ah, isso é uma mera repetição?" Então, não interessa. "Não, isso é uma utopia?" Então, não é possível fazer. Mas o bem-estar animal não é uma coisa nem outra, é uma possibilidade concreta, ancorada em princípios comuns, ancorada num outro conhecimento bastante utilizado no meio econômico, no meio empresarial, que é a avaliação de qualidade.
Ao longo da história da gestão para a qualidade nas empresas, nós passamos pela discussão da qualidade do produto, das embalagens, da logística.
E o bem-estar animal começou a se alinhar com as discussões da origem do produto e da ética no sistema de produção. Então, novamente, é um fator que fortalece a discussão, porque está alinhado com um conceito tradicionalmente adotado no sistema de produção.
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Quais são os alertas importantes na nossa visão de universidade? Primeiro, devemos olhar para o fato de que nós temos um certo senso de urgência. Esta é uma matéria de mais de 10 anos atrás, e vocês podem ver a chamada na página de Agronegócios, talvez da maior publicação na área de economia e finanças. Ela já chamava a atenção para essa inclusão do bem-estar animal na pauta dos acionistas, nas decisões econômicas empresariais.
Se nós observarmos 2 anos à frente, mas já 9 anos atrás, veremos novamente alertas na área de negócios de um dos maiores produtores de alimentos do mundo, a Nestlé, fazendo a indicação aos seus fornecedores de que não deseja mais adquirir produtos que venham da criação de aves submetidas a gaiolas em bateria. São alertas que vêm do sistema econômico, das cadeias de suprimento e das oportunidades de negócios.
O que nós notamos na universidade, quando vamos discutir inovação, é o fato de que, às vezes, nós deixamos de fazer as boas perguntas. Quem faz perguntas erradas nunca recebe respostas certas, embora a pergunta certa possa gerar respostas erradas também. Uma questão muito importante, um desafio muito importante para quem vai conduzir esse assunto é saber o seguinte — é a primeira pergunta que lá está: quem é que paga a conta? Quanto custa? Qual é o investimento para fazer essas mudanças de sistemas de produção? É uma pergunta importante? Não há a menor dúvida. E tem que ser muito bem estudada. Os colegas que vão me suceder aqui vão abordar essas questões.
A segunda pergunta que lá está é: quem é que vai sair na frente? Ela é, talvez, tão ou mais importante, porque ela diz o quê? Quem é que está entendendo essas mudanças e vai saber tirar partido disso, ou seja, quem é que pode olhar essas modificações não como ameaças, mas, sim, como oportunidades, principalmente.
E devemos lembrar o seguinte: o custo de fazer uma mudança pode ser alto, mas o risco de não fazê-la pode ser muito maior, ou seja, você pode vir a ser eliminado de mercados, perder oportunidades ou perder a sua liderança.
Estas aqui são mais algumas evidências de por que o bem-estar animal merece um espaço de destaque na agenda, por algumas dimensões. Este é um estudo que acabou de sair das escolas de Harvard e New York University que associa métodos tradicionais de criação com possível disseminação de zoonoses ou futuras pandemias. Esse é um assunto que já foi muito bem discutido desde a pandemia do coronavírus, com uma origem possível em mercados de animais. Um primeiro fator é a discussão de saúde, de saúde única, da combinação da saúde animal com a saúde humana e a saúde do ambiente, que também vai ser discutida pelos colegas que vão me suceder.
Além da questão de saúde, existe a questão de posicionamento de consumidores. Este é um artigo publicado um pouquinho antes da pandemia que mostra a relação dos millennials, da Geração Z, das novas gerações com o dinheiro, com o seu valor, como é que eles pensam consumo, investimento, trabalho. E a relação é muito diferente das gerações anteriores. Eu tenho quase 70 anos e percebo essa diferença todo dia na universidade. Essa mudança de comportamento do consumidor exige mudança de comportamento nos sistemas econômicos e produtivos, para não se perderem os consumidores do futuro.
Estes são alguns estudos. Não vou entrar em detalhes, mas este é da KPMG, de janeiro deste ano, que discute o comportamento desses novos consumidores e como eles exigem cada vez mais produtos sustentáveis. E, particularmente, eles abordam a questão de produção animal.
Este é de fevereiro, de outra dupla de consultoria, muito grande, muito renomada, e reforça essa mensagem.
Notem que não é uma indicação apenas de institutos de pesquisa, e sim de consultorias empresariais das mais relevantes no mundo.
Aqui, já de abril de 2023, o ranking do RepTrak, que é a avaliação da reputação das companhias e as consequências da reputação empresarial e econômica sobre valores econômicos. E o bem-estar animal aparece como um dos fatores de avaliação de reputação.
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Do consumidor para o varejo, nós temos já algumas redes trabalhando com políticas de bem-estar animal. Aqui é a questão do Grupo Pão de Açúcar no Brasil. Aqui é a Whole Foods, lá fora, trabalhando com carne originada de cultura de células. Então, é uma indicação de que o varejo aponta que vai falar com o consumidor final e está olhando para essas demandas que aparecem dos estudos anteriores.
E, se nós olharmos os produtores, veremos este estudo que também acabou de sair. Ele é a visão de 300 mil produtores rurais em alguns continentes — América do Norte, Europa, África —, mostra como os produtores estão conscientes cada vez mais disso e como estão em condições de fazer a transição dentro de certas circunstâncias. Então, vale a pena olhar.
E, se nós passarmos das demandas de consumidores para as de investidores, veremos esta tela do Global Reporting Initiative, que é o maior padrão internacional de relatórios de sustentabilidade e transparência corporativa. E, dentro da norma para o setor 13, que é agricultura, aquicultura e pesca, especificamente, ele trata de bem-estar animal em itens e indicadores específicos.
A Bolsa de Valores brasileira, a B3, tem um índice de sustentabilidade empresarial, e o bem-estar animal está lá como um dos requisitos para avaliação.
A XP fala do crescimento das dívidas sustentáveis, ou seja, adotar estratégia de sustentabilidade permite acesso a capital mais barato. Isso é muito importante para os modelos de desenvolvimento.
O SR. PRESIDENTE (Bruno Ganem. Bloco/PODE - SP) - Obrigado, Celso. O senhor falou bastante da importância que o bem-estar animal está assumindo nas mais diversas direções da sociedade.
Eu queria até fazer um comentário aqui de uma dimensão que vivencio muito, que está muito ligada à opinião das pessoas, o que, no fim das contas, é o que acaba direcionando o processo eleitoral. Nós vemos aqui na Câmara um crescimento enorme da bancada exclusivamente de bem-estar animal. Houve um crescimento bastante grande. E também vemos um crescimento enorme daqueles que não são diretamente da causa animal, mas que, de alguma maneira, somam com a causa animal. Isso quer dizer que a população está buscando pessoas para representá-las que tenham a causa animal como uma dimensão, se não principal, pelo menos como uma dimensão que está presente nos mandatos. Essa é uma escolha que as pessoas têm feito não só aqui, na Câmara Federal, mas também em todos os Municípios do Brasil, é o que nós temos visto. E isso mostra que as pessoas realmente colocaram o bem-estar animal como uma pauta que não pode ser ignorada.
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(Segue-se exibição de imagens.)
A minha fala vai estar centrada em como é que o bem-estar animal pode ser e é o indutor dos cinco grandes pilares do desenvolvimento sustentável. Segundo a Agenda 2030 da ONU, os 17 objetivos de desenvolvimento sustentável podem ser destrinchados em cinco grandes pilares: Prosperidade, que o Prof. Celso tão bem colocou na sua primeira apresentação; Planeta; Pessoas; Parceria; e Paz. Então, a minha apresentação está voltada para essa dinâmica.
Rapidamente, quero falar sobre a Mercy For Animals, que é uma organização voltada para a transformação do sistema alimentar para um mais justo e sustentável. Nós temos atuação global, principalmente nos Estados Unidos, no Canadá, no México, na Índia e no sudeste asiático. Estamos presentes no Brasil desde novembro de 2015.
A Resolução Nexus, ligada ao bem-estar animal, como a Vanessa colocou na sua fala, foi originada por uma coalizão de países africanos junto com o Paquistão. No fim de 2020, 2021, eles formaram essa coalizão por verem a necessidade de endereçar o bem-estar animal para a promoção do desenvolvimento sustentável, o que está sendo sentido na pele na África. A partir dessa mobilização dos países — Gana mais cinco Estados-membros e o Paquistão —, foi feita também uma mobilização mundial para aprovação dessa resolução, ou seja, além dos Estados-membros, a sociedade civil e a academia se mobilizaram para aprovar a resolução.
Aqui no Brasil, a Mercy For Animals, junto com mais 26 organizações — agradeço aqui à Proteção Animal Mundial, ao GFI, à Sinergia Animal, à Sociedade Vegetariana Brasileira, ao Fórum —, ajudaram na mobilização para a aprovação da resolução. Juntos éramos mais de 1 milhão de pessoas apoiando a implementação dela.
Em março, como a Vanessa colocou, essa resolução foi aprovada de uma forma unânime. Todos os Estados-membros a aprovaram.
Mas o que significa essa resolução, como a Vanessa colocou? Significa que foi pedido ao Diretor Executivo do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente — PNUMA a realização de um grande relatório para ajudar na criação, na orientação, na demonstração científica, a fim de ter, de uma forma consolidada, as evidências de como o bem-estar animal está interligado com a tripla crise planetária, a crise de biodiversidade, a crise climática, a poluição, além das emergências ligadas a zoonoses.
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O PNUMA contratou uma consultora, está fazendo consultas públicas, como a Vanessa colocou — eu sou muito grata ao Governo brasileiro, representado na presença da Vanessa, por estar respondendo essa consulta pública, ajudando a influenciar esse novo relatório, que é justamente resultado da pesquisa que foi realizada com os Estados-membros, a academia e a sociedade civil —, para ajudar a identificar o escopo desse relatório, que eu diria que vai servir como, entre aspas, um "IPCC" para a causa animal, interligando-a com os outros problemas ambientais.
Vocês podem estar me perguntando: "Cristina, como assim Resolução Nexus e bem-estar animal estão associados aos cinco pilares do desenvolvimento sustentável?" A minha fala tem o objetivo de demonstrar isso, particularmente como que o sistema de produção e consumo de produtos de origem animal está ligado a isso. A questão, como o Prof. Celso colocou, é um risco e uma oportunidade. O mundo está em grande evolução, e é muito importante o apoio. E é esta a nossa intenção: apoiar o Governo brasileiro e o setor produtivo a ver essa oportunidade, a ver essa necessidade de mudança como uma oportunidade para aproveitar o mercado.
Eu vou falar sobre cada um destes pontos. Vou começar abordando a questão da crise climática, como é que bem-estar animal está nos pilares da crise climática.
Eu gostaria de convidar vocês a perceberem como é que ouvem as questões que eu vou colocar aqui. Eu sou engenheira química, sou mestre em engenharia urbana e ambiental. Desde 2007 eu trabalho ativamente na área climática. Fiz uma pesquisa com os dados do PNUMA e do IPCC e vou trazer falas das pessoas. Eu confesso a vocês que até mesmo eu fiquei incrédula — essa é a palavra — com a gravidade da crise climática. E eu queria convidar vocês a notarem sensações, percepções relacionadas a como vocês enxergam isso. Então, faço um convite agora para nos abrirmos para essa questão.
Os dados verdes estão ligados ao pilar Planeta; os dados amarelos, ao pilar Pessoas. Também vou abordar os pilares Parceria e Paz.
Crise climática. Esta foto foi tirada no dia 22 de julho, no Rio de Janeiro. Trata-se de uma manifestação que foi feita para despertar a consciência para a gravidade da crise climática, indicando que nós temos praticamente 6 anos para fazer mudanças significativas de modo a permitir que não ultrapassemos 1 grau e meio de aumento na temperatura do planeta. O que isso aqui significa?
Vocês podem estar pensando: "Mais um ativismo. Mais um alarde". Não, não é isso, a questão não é de ativismo. Esses são dados baseados em ciência.
Aqui, gente, eu trouxe dados do PNUMA, o mesmo organismo que aprovou a resolução da ONU, e ele coloca o seguinte — eu trouxe os dados todos em inglês porque eles são tão chocantes que eu quis trazer o original; eu vou traduzindo aqui para vocês —: essa circunferência aqui é a quantidade de emissões que precisam ser reduzidas para conseguirmos limitar o aumento da temperatura do planeta a até 1 grau e meio. O que eles colocam é que há uma necessidade de reduzir as emissões de uma forma nunca antes vista, de fazer uma redução muito significativa. Se nós só reduzirmos o que está hoje comprometido, o que hoje os países colocaram na mesa, o que eles afirmaram podem conseguir reduzir, que representa 5% das emissões, isso leva o planeta a um cenário de elevação da temperatura em 2,8 graus Celsius.
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Se os países conseguirem negociar com setores produtivos, se conseguirem financiamentos, eles poderão reduzir mais 10% dessas emissões. Isso leva o mundo a uma temperatura de 2,6 graus Celsius.
Para conseguirmos que a temperatura fique bem menor que 2 graus Celsius, ou em torno ainda de 2,4 graus Celsius, nós temos que reduzir mais 30% de emissões. Hoje não existem planos para isso, não existem metas para isso, mas é o que a ciência indica como necessário.
Para atingirmos realmente a temperatura de 1 grau, nós precisamos reduzir 45% das emissões de gases do efeito estufa. A magnitude dessa mudança é extraordinária.
Eu estou trazendo este dado, porque ele é melhor que a minha palavra, ele é melhor que qualquer artigo científico, trata-se da palavra da Secretária-Geral das Nações Unidas, da Diretora Executiva do programa das Nações Unidas. Eu gostaria que nos abríssemos a essas palavras. Eu vou lê-las com os senhores, começando pelas que estão à esquerda do eslaide:
Não vou desperdiçar seu tempo falando sobre os impactos da mudança climática. Todos nós os conhecemos. Todos nós os sentimos. Todos sabemos que eles vão piorar. E, ainda assim, como mostra o Emissions Gap Report 2022 do PNUMA, nós ainda, ainda, não estamos fazendo o suficiente para reduzir as emissões de gases de efeito estufa.
Esse relatório nos envia uma mensagem muito clara. Se levarmos a sério as mudanças climáticas, precisamos dar o pontapé inicial em uma transformação — ela não está falando de mudança, mas de transformação — de todo o sistema, agora. Precisamos de um redesenho radical do setor elétrico, do setor de transportes, do setor de construção e dos sistemas alimentares. E precisamos reformar os sistemas financeiros para que eles possam financiar as transformações das quais não podemos escapar.
Nós estamos falando de transformação. Vou usar uma metáfora da natureza: uma lagarta que vira borboleta. Não existe mais aquela lagarta; é uma borboleta — uma rasteja, outra voa. É esse tipo de transformação, é esse tipo de mudança que está sendo pedido. É um convite que nos está sendo feito. É essa mudança que precisamos fazer. É a mudança de um sistema de transporte, que era a cavalo e passou a carro. É um sistema de mudança, de transformação. Era uma tocha de luz e virou, depois, um filamento, que virou a luz com vapor de sódio, vapor de mercúrio, e agora é luz em estado sólido, é LED. Eu estou falando de uma luz que, de filamento, passou para uma luz em estado sólido.
Quanto aos sistemas alimentares, não é uma mudança incremental, é necessária uma transformação. Se o Brasil não entrar nesse trilho de transformação, perde mercado. E não só perde mercado; como vocês vão ver aqui na questão climática, não existe emprego num país morto, num país sem vida.
Quando ela fala de mudança radical, ela se refere a esta mudança radical. Reparem que a linha de emissões está subindo; e na primeira curva, com os cenários atuais de políticas públicas, a temperatura do Planeta dispara. Precisamos fazer essa mudança radical, essa mudança drástica, descer essa curva. É isso que é necessário para conseguirmos trabalhar nesse 1,5 grau.
É por isso que se fala em mudanças radicais, em mudanças transformacionais.
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Trago as soluções que a ciência coloca — não é a Mercy for Animals, não são as organizações, não é a Mesa, é a ciência que traz.
Este é um relatório também da ONU sobre sistemas alimentares. Os sistemas alimentares atuais representam um terço das emissões globais. Isso, no mundo. Olhem o dado do Brasil! A pecuária produz quatro vezes mais emissões que a agricultura. Quando consideramos que, na agricultura, mais de 70% da terra é usada só para três culturas — entre elas, principalmente, soja e milho, usadas para alimentar animais e, muitas vezes, para exportação —, e na pecuária são quatro vezes mais emissões, já percebemos que algo não está certo.
Como isso está ligado à crise climática? Quando consideramos que a mudança de uso dos solos normalmente é para a produção de pasto ou para plantio, depois, de soja e milho, para alimentar animais, para alimentar porcos, galinhas, peixes em cativeiro, vemos o tamanho da lacuna em que estamos. Isso é ciência. Esse dado é do Sistema de Estimativas de Emissões e Remoções de Gases de Efeito Estufa, do Observatório do Clima. Isso é dado científico.
O relatório da ONU aponta para se atuar em uma mudança de demanda, inclusive em dieta, para utilizar um produto mais variado, nutritivo, reduzindo as perdas alimentares.
Isto aqui é um dado do IPCC. Sei que pode ficar meio complicado ver o gráfico, mas vamos de ponto a ponto e analisamos.
O primeiro gráfico é sobre o potencial de redução de emissões de gases de efeito estufa do ponto de vista de demanda, ou seja, do setor que demanda produtos — seja indústria, seja pessoas consumidoras. E o IPCC faz uma avaliação da parte de nutrição e faz uma avaliação de toda a parte de produtos de manufatura, mobilidade, indústria, transporte e habitações. Reparem o seguinte: quanto maior a barra, maior o potencial de redução de emissões. Na parte de nutrição, que são os efeitos socioculturais, a faixa de redução de emissões é maior do que em qualquer outro setor — maior que a indústria, maior que o transporte de terra, maior que edificações. Isto é dado do IPCC! Você pode falar: "Ah, Cristina, mas isso então é global". Não estou falando de um número global. Olhem aqui o Brasil! Olhem o tamanho da emissão da pecuária! Olhem o tamanho da emissão de transporte de carga, de transporte de passageiro, de energia elétrica, das emissões da pecuária! Somem todos esses setores!
Precisamos de abertura para olhar. Estamos aqui para apoiar o setor produtivo para que ele possa fazer esta mudança e possa aproveitar este movimento.
Em termos de perda de biodiversidade — estes são dados do Brasil —, cerca de 80% do milho produzido no Brasil é utilizado para ração, não é para o consumo humano; três quartos da soja produzida é usada para ração.
Este dado é de um relatório da Mercy for Animals de 2020, que mostra que a Amazônia brasileira perdeu 17% da sua cobertura florestal pré-1970.
E grande parte, 75% desta área desmatada, está hoje ocupada por pasto ou pela soja, usada para alimentar animais. Ou seja, há uma perda de biodiversidade que vai afetar a fauna, vai afetar a flora também, porque tudo é uma cadeia interligada. Ao lidarmos com sistemas alimentares, estamos lidando, também, com a questão da perda de biodiversidade. O Brasil é detentor da maior biodiversidade do planeta.
Volto a um dado: é óbvio que são importantes as melhorias do sistema, mas são melhorias no sistema, são mudanças incrementais; precisamos é promover inovações, precisamos é promover saltos evolutivos.
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Cito que saúde humana é igual à saúde ambiental e igual a bem-estar e saúde animal. Não vou entrar muito em detalhes — acredito que a minha colega Karina, da Proteção Animal Mundial, vai mergulhar nesses dados —, mas é importante destacar um ponto direto: mais de 70% dos antibióticos utilizados no mundo não são utilizados para pessoas, são utilizados para animais. Nós, pessoas consumidoras, quando compramos nossos antibióticos na farmácia, temos de entregar uma receita, porque fica registrado, mas 70% dos antibióticos são usados para os animais. Aqui no Brasil ainda não temos isso. Este é um pedido que fazemos também ao MAPA, à ANVISA, a todos os Ministérios, para termos o registro desse uso de antibióticos, porque os animais, no sistema de produção, acabam em situação de muito estresse, e acaba sendo oferecida a eles uma quantidade extraordinária de antibióticos. O Brasil é o segundo maior consumidor de antibióticos para este fim, segundo estudos. Sobre a resistência antimicrobiana, acredito que a Karina também vá tocar neste assunto. Não vou usar o tempo de vocês para isto, mas tudo isso mostra que falar da saúde animal é também falar da saúde humana, e é também falar da saúde ambiental — está tudo interconectado.
Sobre segurança alimentar, assunto que a Vanessa também abordou, o que acontece? Estamos falando muito em transição energética, que temos de sair de combustíveis fósseis para combustíveis renováveis, que temos de sair de carro de combustão para carro de energia elétrica, para não haver desperdício de energia, e olhem o nosso sistema de produção, como ele é! Usamos um ser vivo como fábrica — um ser vivo que gasta energia para andar, que gasta energia para respirar, que gasta energia para evacuar. É assim que o animal gasta energia.
E as melhorias que têm sido feitas no sistema de confinamento, no melhoramento genético, para que o animal cresça gigantescamente em pouco tempo, a fim de tentar melhorar a eficiência, vão ser melhorias incrementais, não é uma melhoria transformacional. Estamos falando de um sistema de eficiência, por exemplo, de carnes, em 2%. Isso é menos eficiente que a lâmpada incandescente. A lâmpada incandescente foi banida do mercado. Vocês lembram por que ela foi banida do mercado? Porque, de cada 100% de energia que uso para alimentar uma lâmpada incandescente, 90% dessa energia gera calor, não gera iluminação — é perda, é "lixo", entre aspas, de energia. O sistema alimentar, do mesmo jeito; eu estou alimentando sempre esse sistema e jogando 98% fora, ou estou jogando 70% fora.
Como podemos apoiar o setor produtivo para que ele se torne eficiente na promoção de mudanças transformacionais, já que as mudanças que estão sendo feitas para tentar melhorar essa eficiência não trazem resultado?
São melhorias incrementais que detonam — desculpem-me usar essa palavra — e prejudicam sobremaneira a qualidade e o bem-estar do animal. O animal não consegue nem se segurar no próprio peso com essas melhorias genéticas, quando apenas algumas frações de eficiência são melhoradas.
O que acontece com isso? O que isso tem a ver com segurança alimentar? Hoje, no mundo, 83% das terras agrícolas geram somente 18% das calorias necessárias para alimentar a humanidade, ou seja, a produção de carnes, ovos e laticínios utiliza 83% das terras agrícolas e gera 18% de calorias.
Se todos no mundo consumissem carne, haveria planeta para todo mundo? Não queremos produzir um planeta igual, um planeta no qual todo mundo tenha acesso à comida, por exemplo? De fato, é isso o que acontece.
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Esta é uma simulação do relatório da EAT Forum, que coloca: se todas as pessoas no planeta comessem a média do consumo brasileiro de carne, nós precisaríamos de 5,21 planetas em 2050. É duro, é muito difícil de ouvir, e eu até sinto uma quentura dentro de mim.
Eu gostaria de trazer um convite: como lidaremos com essa verdade? Nem vou usar a palavra verdade, mas realidade, ou seja, como lidaremos com essa realidade?
Eu me lembro muito de uma frase do ex-Prefeito de Bogotá Enrique Peñalosa, que dizia: "Uma cidade rica, um país rico não é aquele onde os pobres têm dinheiro para comprar carro; uma cidade rica, um país rico é aquele em que os ricos e também as pessoas mais humildes podem usar um transporte público de qualidade". Isso porque não há ruas suficientes para os carros de todo mundo. E eu sou uma dessas pessoas que reclamava do trânsito, do engarrafamento. Eu, dentro do meu carro, xingava a pessoa na minha frente. Mas como assim? Eu estou no carro? Eu vou reclamar de quem?
O mesmo acontece com a alimentação? Como transformamos o sistema alimentar para que todos em um planeta possam se alimentar de forma sustentável? É essa a pergunta que está em jogo, e não há como suprir essa alimentação para toda a população do planeta se mantivermos esse prazo.
As parcerias, como Vanessa bem disse, mostram como esse assunto é transversal. Esta sala mostra essa necessidade de parceria.
Por fim, quanto à questão de paz, eu trago essa leitura dos próprios ODS. Como é viver em uma sociedade pacífica, justa e inclusiva que está livre do medo e da violência? Seria possível criar um sistema alimentar calcado nesses princípios? Como bem Vanessa colocou, 9 em cada 10 pessoas ouvidas pelo Datafolha responderam que se importam, em maior ou menor grau, com o sofrimento dos animais de fazenda.
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O SR. PRESIDENTE (Bruno Ganem. Bloco/PODE - SP) - Obrigado, Cristina.
É um imenso prazer estar aqui, ainda que de forma remota. Infelizmente, não pude comparecer à audiência, pois tivemos alguns imprevistos no quadro de colaboradores e não consegui prestigiar esse evento tão importante em Brasília.
É um prazer estar ao lado de tantos especialistas renomados, como o Prof. Celso, a Vanessa, a Cristina e o representante do The Good Food Institute Brasil. São grandes organizações e grandes nomes que estão batalhando pelo melhor sistema alimentar. É uma honra imensa poder compor esta Mesa.
(Segue-se exibição de imagens.)
Há mais de 50 anos trabalhamos com a causa, no mundo inteiro, para pôr fim ao sofrimento desnecessário dos animais, tanto animais de vida livre, silvestres, quanto animais de produção, de fazenda, inspirando pessoas a mudar definitivamente a vida desses animais.
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A Produção Animal Mundial trabalhou por muitos anos em busca de cooperações, estudos científicos, trabalhos de campo, treinamentos, como o abate humanitário, que tivemos com o Governo, e resgate de animais. No entanto, entendemos que muitas dessas ações não surtem mudanças significativas na vida dos animais, que não têm voz e não podem lutar por seus direitos. Entendemos que a melhor maneira de trabalhar essas mudanças é sistemicamente, ou seja, compreendendo as conexões entre os impactos ambientais, como a crise climática, a escassez de água, a fome, as questões econômicas e até mesmo a pandemia — todas elas são possíveis vincularmos com as causas decorrentes da exploração dos animais para produção e consumo.
Há dois pontos que já foram constatados e reconhecidos, até mencionados anteriormente, que é o impacto da pecuária, responsável por mais de 60% do desmatamento da Floresta Amazônica, e a crise climática, pois 25% das emissões de gases poluentes do planeta são provocadas pela agropecuária. Esses dados já são reconhecidos e fomentados pelas principais organizações de defesa de saúde global e animal.
Acredito que um dos motivos pelo qual a Márcia nos procurou e nos fez compor esta audiência foi um documento elaborado por nós. As Nações Unidas para o Meio Ambiente organizaram a 5ª Assembleia sobre o Fortalecimento de Ações para a Natureza, a fim de alcançar os ODS — Objetivos de Desenvolvimento Sustentável. Ela nos procurou como organização global para dar uma contribuição. Achei importante trazer para V.Exas. essa carta, por meio da qual enviamos nossas considerações para as Nações Unidas. Compartilho aqui o link de acesso para a consulta do documento. Na nossa carta, defendemos que a exploração animal é uma das principais causas para o aparecimento de crises, como as de saúde pública, para o aumento das emissões de gases de efeito estufa e para a perda de biodiversidade, como a Cristina também comentou. Depois, esta apresentação e a carta vão ficar à disposição da Comissão. Então, nossa contribuição foi muito nesse sentido.
Como tratamos da questão da perda de biodiversidade? Como a Cristina comentou, o Brasil é realmente o berço de uma biodiversidade imensa e única globalmente. Temos espécies nativas que são apenas regionais, nem todas foram catalogadas. Há muito ainda a se descobrir. E há um impacto muito grande para que essa biodiversidade não consiga existir e até entre em extinção.
Para falarmos em perda de biodiversidade, entramos na questão da exploração animal e das mudanças no uso da terra. A exploração animal caracteriza o principal sistema de produção de produtos de origem animal para consumo humano. Estamos falando de salsicha, presuntos, carnes, hambúrgueres, leites, ovos, etc. Para produzir todos esses alimentos — nem todos são saudáveis, há muitos embutidos — e para que toda essa produção seja possível, há uma mudança no uso da terra. Então, para alimentarmos todos os animais, há necessidade de produzirmos soja, milho, ração, como a Cristina comentou, e isso traz uma consequência muito grave para as paisagens do País. Não sei quem aqui já viajou de carro, mas, ao percorrermos o País, percebemos só plantações de milho, de cana e de soja. Vemos com os nossos olhos a mudança na paisagem.
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Há uma pressão muito forte do avanço das monoculturas, em que todos os ecossistemas ficam prejudicados. A terra não está mais sendo usada de forma adequada. Não há mais espaço para o crescimento das árvores e dos animais silvestres. Todos os ecossistemas ficam prejudicados quando há esse avanço sistemático da produção de grãos. Esses vínculos são muito claros para conseguirmos produzir os alimentos de forma sistêmica.
Quanto ao sistema de produção animal, vou caracterizá-lo. Nem todo mundo tem o mesmo contato como o nosso. Eu sou médica-veterinária e, na graduação, tive contato com todos os tipos de sistema. Por isso, trouxe uma imagem sobre o que seria um sistema intensivo de produção animal. Observamos que os animais estão em gaiolas, confinados, sem acesso à luz ou ao pasto, com movimentos restritos e em processo de estresse. São muitos animais em pouco espaço, em altas densidades. Em contraposição há o sistema extensivo, em que os animais estão há o enriquecimento ambiental. Neste ambiente, os animais conseguem expressar seus comportamentos naturais.
Essas duas imagens são para contextualizar o nosso foco no sistema intensivo de produção animal, em que há produção em larga escala e são usadas rações animais.
O Prof. Celso mostrou, na contagem de peso das espécies do planeta, que há cerca de 80 bilhões de animais apenas para consumo humano. Para que esses animais sejam criados, ocorre o uso intenso de pesticidas, a monocultura de grão, como comentamos, o desmatamento proveniente dessa monocultura e o uso excessivo de antibióticos.
Todos os meios necessários para sustentar esse modelo de produção geram impactos na saúde humana, impulsionam a crise climática, provocam a perda de biodiversidade, causam a poluição do meio ambiente e o sofrimento de milhões de animais, além de colocar em risco a segurança alimentar.
Na saúde pública, três quartos dos antibióticos são usados pelos animais. Entre todos os antibióticos produzidos no mundo, a maioria vai para a medicina veterinária, e não para a medicina humana. Isso contribui para a chamada crise de superbactérias ou crise de resistência aos antibióticos, em que as doenças param de responder aos tratamentos, como respondiam antigamente aos tratamentos comuns. Assim, os antibióticos tornam-se mais caros e as doenças, incuráveis. Essa é uma crise de saúde pública. Vou falar sobre isso um pouco mais à frente.
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Quanto às mudanças do clima e do uso da terra, como já foi mencionado bastante, estima-se que 27% de todos os gases produzidos pelo homem são provenientes dos sistemas alimentares. As perdas da biodiversidade são caracterizadas pelos incêndios devastadores, que são provenientes das queimadas e dos desmatamentos. Os animais silvestres morrem ou são impactados pelos incêndios, se não diretamente, indiretamente. Muitas vezes os animais que sobrevivem não conseguem se recuperar de maneira que consigam voltar à vida livre. Então, ocorre uma grave perda de biodiversidade.
Em relação à segurança alimentar, quase 80% da safra mundial de soja é destinada para a alimentação dos animais. Então, muito da nossa produção de grãos não é para alimentação humana, mas para a alimentação animal. Esse é um fato que gera insegurança alimentar, porque está disseminando sementes. Quanto aos transgênicos, a falta de diversidade das sementes vai impactar a crise climática. Então, é como se fosse um ciclo de impactos que inviabilizam a sustentabilidade desse sistema.
Registro os relatórios em que a organização vem trabalhando para fomentar dados científicos e apoiar essa transição.
Em 2022, lançamos o relatório chamado Mudança Climática e Crueldade Animal. Esse estudo foi encomendado à organização e conduzido pela Blonk, uma consultoria realizada por especialistas internacionais, focada em sustentabilidade do sistema alimentar. Ela foi contratada com a proposta de entender o impacto ambiental, na cadeia de valor, para a produção focada em suínos e aves. Percebemos que muito se falava da questão do gado e pouco se falava dos suínos e das aves. Muitas vezes eles até eram vistos como alternativas sustentáveis de consumo de proteína animal. Porém, vimos que não é bem assim. Para essas duas espécies, há uma intensificação global e a ração para destinada a elas é em larga escala.
É importante lembrar que para manter o sistema de criação animal é necessária a produção de grãos, mas, infelizmente, isso tem ocorrido em áreas de desmatamento ilegal.
Trago agora uma imagem de Mato Grosso, onde realizamos outra pesquisa, em que identificamos as cadeias de soja. Essa imagem mostra os incêndios e como as queimadas são extensivas. Olhem a mudança na paisagem! Quando olhamos essa fotografia, ela corta o nosso coração. Há um resquício de mata nativa e apenas plantações ao redor, com um fogo que vai ser a expansão da monocultura nas lavouras.
Observamos a importância de se construir uma estratégia de adequação para as mudanças. Elas até já estão acontecendo, como a Vanessa comentou. Há acordos internacionais, como da União Europeia, em que já vão existir restrições para produtos provenientes de desmatamento. A carne vai ser um produto impactado.
Este são dados de 2016 sobre estimativas de emissões e remoções de gases de efeito estufa, uma iniciativa do Observatório do Clima. Esses dados compõem o nosso relatório, comparando-se as emissões da pecuária com toda a produção plantas.
Observamos que 64,8% dos gases emitidos são provenientes da agropecuária. Em contrapartida, menos de 40% são gases emitidos por produtos de origem vegetal. Então, o impacto é muito grande para produzir aves, bovinos e suínos. Observamos ainda, nesse ranking global, que o Brasil fica acima da perspectiva mundial. Dessa maneira, temos um papel importante como produtor e exportador. Por isso, precisamos nos mobilizar e olhar para alternativas que reduzam essas emissões.
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Deixo de lado a questão ambiental para tratar dos impactos na saúde única, como a Cristina mencionou. Registramos a crise de resistência antimicrobiana. Desde 2018 esse ponto está sendo trabalhado muito fortemente na organização por meio de pesquisas com a Universidade de São Paulo, com a Universidade Federal do Paraná e com parcerias como Instituto de Defesa do Consumidor — IDEC, para trazer essa agenda à discussão com dados científicos, pautando a questão do bem-estar animal.
Entendemos que para a crise de resistência antimicrobiana a melhor forma de transformá-la é incluir (ininteligível) animal nas produções. Por que isso? Comentamos que há 70 bilhões de animais sendo produzidos no mundo. Dois terços estão em sistema de confinamento, os intensivos, como mostrei nas imagens. Nesse sistema, há um comprometimento da humanidade, há prejuízos da qualidade de vida, o que eleva a suscetibilidade dos animais a doenças. Eles estão em ambientes em que são pressionados a estresses físicos e mentais e a altas densidades. Isso tudo é sustentado pelo uso excessivo de antibióticos. Como mencionamos, 75% dos antibióticos do mundo são utilizados na produção animal. Isso equivale a 131 mil toneladas de antibióticos por ano nesses sistemas. É claro que isso vai ter um impacto na nossa saúde, na nossa produção.
Registro as consequências da antibioticoterapia na produção animal devido às práticas intensivas: altas densidades, seleção genética para crescimento rápido desses animais, desmame precoce, mutilações de rotina.
Apresento algumas imagens de práticas muito comuns na indústria: tatuagem na orelha dos animais e corte dos dentes para que eles se tornem menos agressivos. Os animais estão estressados, porque vivem confinados, e tende a aumentar o nível de agressividade. Para prevenir esses prejuízos, a indústria corta os dentes dos animais e corta as caudas para que eles não se mutilem, ou seja, não mordam a cauda um do outro. Além disso, castram-se os animais, sendo os testículos removidos.
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Um exemplo de uso terapêutico é o tratamento individual quando o animal está com uma infecção, e um exemplo de profilático ou preventivo é quando a indústria já sabe que terá um desafio ambiental maior para aquele animal. O desmame do leitão, por exemplo, é feito precocemente, com apenas 21 dias de idade, o que pode acarretar uma perda ou uma não adaptação correta da fisiologia do animal, e já se dá o antibiótico preventivamente para esta perda não acontecer, quer seja por diarreia, quer seja pelo próprio estresse mesmo.
O antibiótico vai modulando a microbiota e permitindo que os animais continuem produzindo, continuem crescendo e se desenvolvendo, independentemente destes desafios ambientais. Como promotor de crescimento, há o uso também do antibiótico como modulante da microbiota intestinal. Microdoses são oferecidas aos animais nas rações, ao longo da sua vida, para que eles possam se desenvolver e ser produtivos.
Nosso estudo de custo global de saúde pública que nós lançamos no começo deste mês nos mostra que apenas 20% do uso atual de antibióticos é para fins terapêuticos, e 80% para fins não terapêuticos, ou seja, para fins profiláticos ou como promotores de crescimento.
A RAM, sigla para resistência antimicrobiana, tem uma mortalidade já alta e reconhecida. Em 2022, dados da OMS contabilizaram a morte de 1,27 milhão de pessoas, o que caracteriza uma crise de saúde. Isso tende a evoluir para 2050 e chegar a 10 milhões de pessoas. Estes dados são da Organização Mundial da Saúde, já confirmados pelos pesquisadores, o que vai nos mostrar que, em 2050, estes 10 milhões de pessoas terão como principal causa de morte a resistência a antibióticos. Estes 10 milhões de pessoas vão sofrer com a falta de recursos para tratar infecções, com infecções que não responderão a antibióticos, com as superbactérias nos hospitais. Esta será a principal causa de morte no mundo, superando o câncer, o diabetes, as doenças no coração, os acidentes de trânsito. Esta é uma questão muito crítica, que está vinculada à produção animal.
Vou tentar para explicar para todos, embora isso nem sempre seja tão claro, como esta resistência chega às rotas de contaminação. Este é um infográfico da PAHO, organização que já trabalha muito com esta crise, e ele ilustra o ciclo das bactérias resistentes. Nós temos, nas fazendas, os animais recebendo antibióticos; suas bactérias vão ficando resistentes aos antibióticos. Estas bactérias vão estar presentes nos seus dejetos, que, muitas vezes, são usados como adubo na agricultura, o que, por sua vez, contamina os vegetais, o ambiente, o solo, a água e chega às comunidades humanas. Nós temos hospitais onde este processo é agravado.
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As bactérias ficam mais resistentes ainda, e isso vai se tornando um ciclo no qual o humano tem contato com estas bactérias e contamina o ambiente quando faz mau uso de antibiótico. Estas bactérias vão se tornando resistentes em todo o meio.
Trata-se, basicamente, uma inserção rápida, mas se dá via contato direto ou indireto com os animais e consumo dos próprios produtos também. Estas bactérias acabam circulando, e os genes de resistência que as bactérias vão adquirindo, à medida que elas vão tendo contato com os antibióticos, também são transmissíveis entre as bactérias. Trata-se de um mecanismo natural de evolução das bactérias que tem sido muito alavancado pela pressão do uso na pecuária.
Nosso estudo mostra, ainda, que nós estamos em um momento muito crítico, em que a demanda por proteína está crescendo. Temos, neste eslaide, a África com 80%; Ásia, 18%; América do Norte, 9%; América Latina, 12%. Nosso estudo indica que, a cada mil toneladas que aumentar no uso de antibióticos no mundo, nós temos 21% no aumento de riscos de as pessoas terem infecções resistentes à bactéria.
Já me encaminhando para o fim, acho que já me alonguei bastante, mas contribuo para um último estudo da nossa organização, lembro que nós fizemos um levantamento em que a proteção animal mundial mostrou que 9 dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável podem ser alcançados através de melhorias de bem-estar animal. Nós dividimos em vida silvestre e os lugares em que temos impactos na questão de fome, de saúde e bem-estar, trabalho decente, indústria e inovação, consumo e produção responsáveis, vida na água e vida terrestre — qualquer uma destas pode ser garantida quando nós protegemos a vida silvestre — e animais de produção, em que temos fome, saúde, igualdade de gênero, trabalho decente de novo, indústria e inovação, consumo e produção responsáveis, e ação contra a mudança global climática.
O SR. PRESIDENTE (Bruno Ganem. Bloco/PODE - SP) - Muito obrigado, Karina.
Faço um agradecimento especial à Mercy for Animal por fomentar este debate na Câmara dos Deputados. Eu acho muito importante trazermos as perspectivas que este suscita. Mais do que apenas criticar, precisamos debater como podemos resolver este problema.
Primeiramente, vou falar um pouquinho sobre o GIF, o The Good Food Institute. Nós somos uma ONG internacional que surgiu nos Estados Unidos. Uma pergunta que nós sempre recebemos é de onde vem nosso financiamento. Não vem das empresas de proteínas alternativas. Nossa ONG é 100% financiada por fundos filantrópicos internacionais. Nós trabalhamos para promover as proteínas alternativas como ferramenta de mitigação dos impactos
climáticos justamente para o bem-estar animal.
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(Segue-se exibição de imagens.)
Nós acreditamos em três tecnologias cruciais, e as colocamos como disruptoras para esta mudança no sistema alimentar atual: as proteínas vegetais, os produtos plant-based, as proteínas cultivadas e obtidas a partir de cultivo celular, quando você tira uma biópsia do animal, ele continua vivo, não há morte, e, a partir desta biópsia, desta amostra sanguínea, você replica num biorreator e obtém a carne animal. Há também a fermentação de precisão.
No GFI, nós temos três áreas pragmáticas. São elas a área de ciência e tecnologia, que trabalha diretamente no fomento da pesquisa, junto com a Academia, com institutos de pesquisa; a área de engajamento corporativo, que lida diretamente com a indústria, a parte mais de assessoria e até de problemas de logística, outras questões de mercadológicas são com a área de engajamento corporativo; e a área da qual eu faço parte, puxando sardinha, vou dizer que é a melhor área do GFI: a área de políticas públicas, que tem o trato com o poder público, com os agentes de governo e os tomadores de decisão, para buscar políticas públicas que, de fato, vão ao encontro do desenvolvimento deste setor e do seu consequente benefício para o planeta Terra.
Bem brevemente, nós estamos nas seis regiões do planeta: Estados Unidos, Israel, Índia, Ásia Pacífico, China e Brasil. Nós acreditamos que, para alimentar uma população que vai chegar a 7 bilhões de pessoas até 2050, é necessário oferecer uma alternativa, algo diferente. Nós enxergamos as proteínas alternativas desta forma, tanto é que este é um setor que tem tido um crescimento muito grande nos últimos anos, um crescimento exponencial. Muitos têm considerado o setor como um dos novos unicórnios do setor de alimentos, mas que já vem se provando consolidado, ainda que novo, já bem pujante e consolidado. O GFI Brasil acredita no potencial, especialmente, do País de liderar este segmento em nível global. Eu vou falar um pouquinho mais disso mais à frente.
Aqui temos o panorama atual de como está o cenário no Brasil. Atualmente, vale ressaltar, temos companheiros colegas do Ministério da Agricultura, nós temos uma consulta pública em andamento, liderada pelo Ministério da Agricultura, para regulamentar as nomenclaturas de produtos análogos.
O que são alimentos análogos? São aqueles que buscam replicar os produtos de origem animal, mas sem o sofrimento animal, sem o uso de recursos, são os plant-based, as carnes cultivadas. Enfim, estes produtos que nós chamamos de alimentos análogos, aqui no Brasil, estão em franca expansão. O primeiro produto plant-based análogo chegou às prateleiras dos supermercados brasileiros em 2019. De lá para cá, de um produto já passou para mais de 30, com mais de 100 empresas que atuam em todos os segmentos: carnes vegetais, derivados, laticínios, ovos, ingredientes e carne cultivada.
Vocês podem notar, por este mapa, esta é uma coisa de que nós não temos vergonha alguma, muito pelo contrário,
é interessante observar que muitos players, como o Prof. Celso mencionou, muitas empresas da indústria de alimentos, tradicionalmente ligadas às proteínas animais, hoje estão investindo pesado em proteínas alternativas. Nós temos até algumas gigantes que outrora se diziam frigoríficos — desculpem-me usar essa palavra; eu, vegetariano, também não gosto dela, é pesada — e hoje já se consideram indústrias de proteínas. Ponto! Nem animal é mais: é indústria de proteínas! Falo assim para vocês verem o tamanho disso.
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Estimativas indicam que este mercado deve chegar à incrível cifra de 1,5 trilhão de dólares anuais de receita até 2050. Não estou falando de bilhões, mas de trilhões, tamanha é a perspectiva de crescimento, ainda mais quando falamos de impactos climáticos.
Ao falarmos do crescimento deste setor no Brasil, é imprescindível falar também do Programa Biomas, um programa do GFI de incentivo à pesquisa nacional, através do qual a ideia é aproveitar as mais de 46 mil espécies vegetais que nós temos nos seis biomas brasileiros: Amazônia, Cerrado, Caatinga, Pampas gaúchos, Mata Atlântica e Pantanal. No Brasil, nós temos 20% das espécies da fauna e da flora do mundo — este é um número muito impressionante. Vemos que isto é algo que dá para ser aproveitado, é algo com muito potencial. A bioeconomia, que está tão em voga hoje na boca dos governos e nas discussões internacionais, tem tudo a ver, é basicamente sinônimo de Brasil.
É pensando nisto que o Programa Biomas surge, na busca de utilizar ingredientes cada vez mais sustentáveis, que melhorem os indicadores sociais, regionais e culturais das comunidades locais no seu entorno, e de transformar estas comunidades em fornecedores de ingredientes sustentáveis para fazer produtos plant-based cada vez mais gostosos. Uma crítica que muitas vezes esta indústria recebe é a seguinte: "Por que mimetizar carne animal? Bem, se você quer ser vegetariano ou vegano, então esqueça o sabor!" Não é bem assim.
Nós entendemos, assim como o próprio Deputado mais cedo me falou: "Ah, eu já passei pelo vegetarianismo, pelo veganismo, mas é difícil ficar". É exatamente isso. Por isso, hoje nós temos o termo "flexitarianos", que diz respeito àquelas pessoas que, por motivos nem sempre ligados à causa animal ou à mitigação de impactos climáticos, mas muitas vezes por conta de saúde. O médico da pessoa diz: "Seu colesterol está muito alto; você tem de reduzir seu consumo de carne". O motivo pode se dar por outras questões. As pessoas reduzem, mas não cortam totalmente o consumo de carne. É este público que os produtos plant-based, das proteínas alternativas no geral, miram.
Nas três edições do Programa Biomas que nós tivemos, mais de 20 projetos foram selecionados, com mais de 80 propostas submetidas à utilização de ingredientes dos biomas brasileiros. Já foram investidos mais de 4 milhões de reais em pesquisas. Nós fazemos estes investimentos geralmente em parceria com fundos de mitigação de impactos climáticos e com fundos de preservação do meio ambiente. Trata-se de um projeto bem bacana.
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Quem quiser saber mais ou tiver interesse, até quem for da Academia, da área de pesquisa, quem perceber que seu projeto se encaixa aqui, por favor, o QR Code está na tela. Depois, é só falar comigo ou com a Gabriela, que está ali no fundo, e nós conversamos mais.
Passando para a parte final, o que tudo isso tem a ver com sustentabilidade, afinal? Uma coisa que eu sempre gosto de lembrar é que, no Brasil e no sul-global, historicamente, nós temos o cultivo de monoculturas e commodities como viés central das nossas economias. O Brasil é o exemplo claro, há mais de 500 anos. Começou com o pau-brasil. É o extrativismo na sua essência: extrai-se o pau-brasil, manda-se para a Europa. Depois, veio o ciclo da cana-de-açúcar: extrai-se a cana-de-açúcar o máximo que dá, manda-se para o resto do mundo. Depois, veio o café, o ouro e, mais recentemente, a soja, e nós vemos o mesmo padrão se manter. Nós produzimos, vendemos — geralmente a commodity, que não é processada, não tem nenhum valor agregado — e compramos de volta, depois, o mesmo grão que vendemos, já em sua versão com valor agregado, com 10, 20, 30 vezes o preço pelo qual vendemos.
Nós acreditamos que é possível inverter esta lógica, através das proteínas alternativas. Por que não utilizarmos os ingredientes nativos, como o feijão brasileiro, e fomentar esta cultura, que hoje está tão desvalorizada, em detrimento de commodities? Para quem não sabe, o feijão não é uma commodity, está muito desvalorizado. Estão deixando de plantar feijão para plantar soja, milho, que, como foi muito bem colocado aqui, vão para a ração animal, muito mais do que para o consumo humano.
Por que não processar esses feijões nas comunidades locais, nas cooperativas agrícolas, nas cooperativas de agricultores familiares, e permitir que o agricultor tenha uma fonte a mais de renda, e não só vender o grão in natura, mas também processado. O Brasil deixa de vender apenas commodities para outros países e passa a vender produtos com valor agregado, insumos agrícolas com valor agregado, que são muito mais benéficos para o solo do que as monoculturas em geral.
Há muitos outros exemplos, mas o feijão, exemplo que eu estou usando, nitrogena o solo, devolve ao solo o oxigênio retirado por outras culturas, entre diversos outros fatores. Precisamos, portanto, pensar neste ponto.
Trata-se de algo que pode ser expandido, e nós, no GFI, estamos trabalhando por isso, para num nível global, com a Índia e a China, como podemos inverter esta lógica. Chega de extrativismo, de vender tudo para o Hemisfério Norte, e eles ficarem com os lucros, e nós, com o prejuízo ambiental!
Aqui temos um dado que, acho, ninguém tinha mencionado: um bife vegetal, em comparação com um bife animal, emite 90% menos de gases de efeito estufa, 99% menos de água, 93% a menos de terra e necessita de 46% menos de energia elétrica para ser feito. Aqui na tela tenho também dados sobre carne cultivada. Não vou me delongar muito, porque já estourei o tempo.
Um último pedido que eu queria fazer, a última coisa que queria apresentar é a Coalizão Global pelas Proteínas Alternativas, iniciativa que o GFI está capitaneando. Vai ser lançada agora na COP 28, em Dubai. Basicamente, é uma forma que nós estamos buscando para nos congregar. Portanto, fica o convite a todas as ONGs, às entidades, aos agentes de governo para participar.
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Todos que tiverem interesse nesta pauta venham saber mais, venham entender o que é a coalizão. O que nós queremos é justamente reunir as lideranças globais que estão pensando em como mudar o sistema alimentar através das proteínas alternativas, para maximizar as políticas públicas que saírem daí.
Realmente nós pensamos em botar a galera toda junta, todo mundo que quer fazer acontecer, juntar este pessoal, para ganhar mais força e tração.
O SR. PRESIDENTE (Bruno Ganem. Bloco/PODE - SP) - Obrigado, Alysson.
Agora vamos passar à fase das perguntas. Pelo nosso tempo, eu posso abrir a palavra para duas ou três perguntas; vai depender de como a coisa se estender. Nosso objetivo é concluir antes do meio-dia; são dez para o meio-dia, mais ou menos.
Nós já temos uma pessoa que manifestou interesse em fazer uma pergunta. Eu vou passar 2 minutos para a realização da pergunta, da explanação. Na sequência, eu abro a palavra aos integrantes da Mesa.
Eu também gostaria de pedir a colaboração dos senhores para que possam responder rapidamente, para corrermos para chegar, pelo menos, a uma terceira pergunta.
Só uma correção: meu nome é Natiela Oliveira, mas Natália também está ótimo. Estou sabendo que sou eu.
Na realidade, eu não tenho uma pergunta, especificamente. Eu queria era acrescentar à nossa discussão um pouco do que o Ministério da Saúde tem a apresentar para vocês, já que estamos trazendo a questão do bem-estar animal, mas, principalmente, as questões de desenvolvimento sustentável e saúde única.
Dentro do Ministério da Saúde, nós temos um grupo técnico que está trabalhando especificamente com saúde única. Este grupo técnico faz parte da Coordenação-Geral de Vigilância de Zoonoses e Doença de Transmissão Vetorial. Lá dentro, nós entendemos que todas as questões que vocês trouxeram aqui são ligadas à saúde única.
A saúde única não está simplesmente baseada na questão das resistências antimicrobianas, como foi dito. Ela perpassa toda a questão da saúde humana, animal, ambiental, e hoje estamos trazendo também a vegetal. Portanto, nós temos que entender esta amplitude toda. Precisamos compreender que tudo o que foi dito é uma questão de saúde.
A saúde única quer trazer, principalmente, a visão de que todos os setores têm responsabilidade pela saúde humana. Muitas vezes, as pessoas dizem que se trata de uma questão de saúde. Nós queremos mostrar que não é apenas a saúde que tem que trabalhar nesta quadra, não é apenas o meio ambiente, mas, sim, todos os setores.
Nós precisamos muito discutir este tema. Eu fico muito feliz por ver esta discussão ser feita dentro desta Casa. O Legislativo tem que trabalhar muito com esta temática. Nós vivemos uma extrema dificuldade de definições de competências, uma dificuldade em trazer os motivos por que a saúde única tem que ser trabalhada. Nós trazemos isso como a saúde, como o meio ambiente, como o MAPA, que também está aqui.
Eu acho que todos nós estamos entendendo que não é só o setor, não é só o Executivo que tem que trabalhar, mas o Legislativo também. Todos os envolvidos. Essa é uma mudança de cultura, na realidade, que tem que vir de todos nós, porque essa é uma abordagem que temos que mudar, desde a mudança climática, que é um impacto, desde a poluição química, que é um impacto, desde a poluição da mudança de biodiversidade, que é um impacto. Tudo isso vai gerar processos de saúde humana nos quais todos nós devemos trabalhar, como a indústria tem que trabalhar. Trouxemos a alternativa de que todos temos que trabalhar pela saúde. É mais nesse sentido que queremos dizer.
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Estamos trabalhando arduamente na elaboração do Plano de Ação Nacional de Saúde Única, o Ministério da Saúde está trabalhando com os setores. São mais de 16 instituições que estão trabalhando nesse processo, como MMA, MAPA, EMBRAPA, FIOCRUZ.
A intenção é trazer prioridades de trabalho e que possamos trazer, inclusive, para dentro desta Casa também a discussão sobre esse plano de ação. A nossa dificuldade também é entender que isso é uma mudança de cultura política, uma mudança de cultura... Até estávamos comentando que estamos falando aqui de meio ambiente, estamos falando de saúde única, mas no momento estamos também consumindo água em copinhos de plástico. São copos descartáveis. Isso é uma mudança dentro da nossa instituição e dentro do nosso processo cultural mesmo. Precisamos discutir tudo isso.
Fico muito feliz com este momento e coloco à disposição o Ministério da Saúde, a CGZV, a Coordenação Geral de Vigilância em Saúde Ambiental — CGVAM, que também está aqui presente.
O SR. PRESIDENTE (Bruno Ganem. Bloco/PODE - SP) - Obrigado, Natiela.
Meu nome é Maressa Lacerda. Sou de Salvador e estou em visita. Sou engenheira sanitarista ambiental.
Eu tenho uma dúvida. Vi que você mostrou um dado sobre a Amazônia, em que 17% de todo o território da Amazônia hoje são ocupados por pastos. Esse é até um dado também do TerraClass, que, junto com a EMBRAPA, fizeram um estudo, mas outros meios de comunicação mostram que, na verdade, não é a pecuária a grande vilã do desmatamento, mas é a extração de madeira nobre.
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Na realidade, o dado é o seguinte: 17% da Amazônia brasileira, até 1970, foram desmatados. Dessa área desmatada, 75% foram ocupados pela cadeia, digamos assim, da pecuária.
O SR. PRESIDENTE (Bruno Ganem. Bloco/PODE - SP) - Ainda temos tempo para mais alguma pergunta.
Eu gostaria só de anunciar para os presentes que, no dia 1º de agosto, foi reinstituído o Fórum Técnico de Bem-Estar Animal no âmbito do MAPA.
Um dos artigos do fórum prevê o convite a especialistas ou a experts na matéria para ajudar o MAPA na proposição de regulamentos e de todo tipo de matéria que for tratada dentro do fórum. No fórum, os titulares são da casa, de várias secretarias. E fiquem sabendo que isso vai acontecer!
O SR. PRESIDENTE (Bruno Ganem. Bloco/PODE - SP) - Perfeito. Muito obrigado.
A SRA. VALÉRIA STACCHINI FERREIRA HOMEM - Ele é composto por membros da casa, ou seja, do Ministério, e existe a previsão de chamar convidados para participarem de algumas sessões ou de algumas coisas.
O SR. PRESIDENTE (Bruno Ganem. Bloco/PODE - SP) - Obrigado.
Quero agradecer aos convidados, aos participantes, ao Alysson Soares, à Cristina Mendonça, ao Celso Funcia Lemme e à Vanessa Negrini.
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Falando sobre a provocação do Legislativo à Frente Ambientalista, quero apenas falar que ela acompanha arduamente aqui nesta Casa a pauta sobre o bem-estar animal, e não só sobre o bem-estar do animal doméstico, mas também sobre o bem-estar do animal silvestre.
Hoje, a Frente Parlamentar Ambientalista tem um site, o Observatório de Leis, que está aberto a todos: www.frenteambientalista.com.
Lá, nas pautas sobre a causa animal, estão cadastrados, hoje, como projetos de leis que a Frente Ambientalista acompanha como prioridade, mais de 56 projetos relacionados ao bem-estar animal doméstico e silvestre, que estamos sempre debatendo.
Então, eu convido a todos que tenham notas técnicas e que queiram acrescentá-las no site da frente, a respeito de um projeto de lei que vocês acompanhem, caso queiram acrescentá-la, nós estamos abertos. Podem entrar em contato conosco, que fazemos questão de recebê-la.
Assim, conseguiremos, tanto nos debates on-line que levamos à sociedade, como nos debates feitos aqui na Casa, informar e levar essa voz, cada vez mais, para o público.
Quero fazer só uma observação, e não somente como participante da Frente Ambientalista, mas também, de forma voluntária, como Diretora de Bem-Estar Animal da Associação Nacional de Municípios e Meio Ambiente — ANAMMA Brasil, para finalizar o que eu tenho a dizer.
A Frente Ambientalista faz incentivos nacionalmente, mas é muito importante levarmos esses debates também para a instância estadual e municipal. É muito importante essa conscientização. As pessoas precisam, por exemplo, ter essa noção de que todos os palestrantes passaram por aqui, principalmente do que a Cristina Mendonça falou. Ela fez ali todo um parâmetro, que eu acho bastante importante.
O SR. PRESIDENTE (Bruno Ganem. Bloco/PODE - SP) - Perfeito.
A SRA. SILVIA WAIÃPI (PL - AP) - Obrigada, Sr. Presidente.
Eu trago uma demanda do Estado do Amapá, que é a questão da contaminação do solo em aldeias indígenas, onde não conseguem produzir o seu sustento, o seu alimento, como a mandioca.
Nós — e eu digo "nós" como sociedade — já comunicamos isso às autoridades competentes, e até então nada foi feito, para que pudessem solucionar esse caráter de emergência. Há a presença de três fungos e uma bactéria, para os quais ainda não existe cura. Isso condena completamente o solo de comunidades indígenas no Brasil.
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Nós temos um Estado bloqueado 73% em reservas, tanto indígenas quanto minerais, impossibilitado de se desenvolver economicamente, que faz fronteira com a Guiana Francesa e passa por uma interferência internacional quanto à sua liberdade econômica e à sua liberdade de desenvolvimento, principalmente na questão do meio ambiente.
É necessário que comecemos a perceber o Brasil e suas áreas de fronteira como áreas estratégicas de defesa, e não permitir que interesses internacionais continuem delimitando e coordenando o que deve ou não deve ser feito no nosso País.
O SR. PRESIDENTE (Bruno Ganem. Bloco/PODE - SP) - Perfeito.
Foi muito bom que V.Exa. falou disso, porque me lembrou que eu estava me esquecendo de um ponto muito importante aqui da nossa audiência, que é um encaminhamento. Até com base em tudo o que discutimos aqui, acredito que todos concordarão, trata-se de um encaminhamento referente a esta audiência, que é justamente solicitar ao Governo brasileiro que apoie e auxilie o PNUMA no desenvolvimento do Relatório Nexus, liderando um processo consultivo regional, capacitando os serviços públicos federais de diversos Ministérios envolvidos, dentre outras ações necessárias.
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