1ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA 57 ª LEGISLATURA
Comissão de Legislação Participativa
(Audiência Pública Extraordinária (semipresencial))
Em 13 de Junho de 2023 (Terça-Feira)
às 10 horas
Horário (Texto com redação final.)
10:31
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O SR. PRESIDENTE (Chico Alencar. Bloco/PSOL - RJ) - Declaro aberta a presente reunião da Comissão de Legislação Participativa.
Convido para compor a Mesa meu querido amigo e parceiro de arquibancadas, mais alegrias que sofrimentos de uns anos para cá, Deputado Eduardo Bandeira de Mello. (Palmas.) Convido ainda o Sr. Eduardo Rosa, Coordenador de Mapeamento do Pantanal, o MAPBIOMAS, que falará do coração do Brasil tão pulsante, tão rico, tão ameaçado — espero que os filhos dos nossos filhos dos nossos filhos vejam, vivam e o continuem protegendo —, que é o Pantanal (palmas); o Sr. Luciano Furtado Loubet, Vice-Presidente da ABRAMPA — Associação Brasileira dos Membros do Ministério Público de Meio Ambiente e Promotor de Justiça no Ministério Público do Estado de Mato Grosso do Sul, que falará de forma virtual (palmas); o Sr. Leonardo Gomes, Diretor do Instituto SOS Pantanal (palmas); a Sra. Luciana Leite, Defensora do Clima e da Biodiversidade pela Environmental Justice Foundation, baiana do mundo e do Pantanal (palmas); a Sra. Joanice Lube, Superintendente do IBAMA de Mato Grosso do Sul (palmas) — viva o IBAMA, que sobreviveu, assim como os menininhos indígenas da mata amazônica da Colômbia —, que falará de forma virtual também.
Serão concedidos 10 minutos a cada expositor.
Seguindo a ordem, concedo a palavra o Sr. Eduardo Rosa, a quem peço que fale tudo o que precisamos ouvir.
Para quem não é de Brasília, repito uma recomendação de um adversário político quando eu vim aqui pela primeira vez, o então Senador Jarbas Passarinho: "Água em Brasília de maio a setembro é remédio indispensável". Quem não tomar vai secar, e pode até morrer.
10:35
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O SR. EDUARDO ROSA - Bom dia a todos.
Eu sou o Eduardo Reis Rosa, engenheiro agrônomo e trabalho na Arcplan, uma empresa de geoprocessamento. Nós começamos, em 2105, fazendo o mapeamento da Bacia do Alto Paraguai, no Pantanal, por meio do MAPBIOMAS, que mapeia todos os biomas do Brasil.
(Segue-se exibição de imagens.)
O MAPBIOMAS é uma rede formada por organizações não governamentais, universidades e empresas de geotecnologia. Estamos distribuídos pelo Brasil inteiro. São especialistas que fazem esse trabalho em cada bioma.
O propósito do MAPBIOMAS é fazer mapeamentos anuais para tentar entender a dinâmica do uso da terra no Brasil. Ressalte-se que 70% das emissões de gases de efeito estufa do Brasil são advindas da mudança no uso da terra, como áreas de florestas que viraram pastagem, áreas que se regeneraram, áreas com atividades agrícolas, que também têm o potencial de sequestro de carbono.
Em relação à metodologia, nós utilizamos imagens de satélites Landsat, com resolução de 30 metros. As imagens de satélites são geradas desde 1985. Nós utilizamos imagens anuais para fazer esses mapeamentos. O processamento dessas imagens é feito pixel a pixel. O pixel da imagem de Landsat tem 30 metros de resolução. O ideal do nosso trabalho é contar a história do pixel, o que aquele pixel era em 1985, o que ele virou e o que ele é até hoje. Então, nós fazemos esse processamento pixel a pixel, com a utilização de algoritmos de aprendizagem de máquina e de inteligência artificial. Eles classificam essas imagens e retornam com mapas. Isso só é possível com a plataforma Google Earth Engine, que possibilita o trabalho em nuvem com esses dados e o trabalho em rede com especialistas em cada bioma para fazer esse mapeamento acontecer.
Quanto à evolução metodológica desse mapeamento, ele surgiu, como disse, em 2015, primeiro, com seis classes de tipos de vegetação e áreas de uso antrópico. Ele foi evoluindo, e, hoje, nós estamos na sétima coleção. Ainda neste ano vamos lançar a oitava coleção. Nessa sétima coleção — vou tentar focar um pouco mais o Pantanal, na vegetação mapeada no Pantanal —, nós temos: formações florestais, formações savânicas, áreas de campos naturais, ou formações campestres, áreas de campo alagado, áreas de pastagens, que são áreas de uso antrópico, e também agrícolas. Basicamente, no Pantanal, são essas as classes que nós temos.
10:39
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No Brasil, há 27 classes separadas e classificadas, de acordo com o tipo de agricultura. Existem outros mapas, outros temas derivados dessas classes que mapeamos.
A plataforma do MAPBIOMAS é pública. Tudo o que nós produzimos está disponível on-line. A premissa do MAPBIOMAS e do Google é de que todos os dados produzidos sejam públicos, ou seja, tem que ser um dado público e acessível. Tudo isso está disponível na plataforma, onde há diversos módulos. Não entrarei nos detalhes de cada módulo, porque são extensos demais os assuntos de cada tema. Tentarei focar um pouco mais o Pantanal.
Quando pensamos nele, não podemos pensar só no Bioma Pantanal. Ele está inserido na Bacia do Alto Paraguai, que abrange partes do Bioma Cerrado, a leste, e partes do Bioma da Amazônia, ao norte. A parte de Planalto está sobre o Bioma Cerrado e o da Amazônia, e a planície é o bioma do Pantanal.
Justamente essa parte de Planalto é a responsável pelo abastecimento da água que o Pantanal absorve. O pulso de inundação do Pantanal é controlado, principalmente, pelas águas que caem em suas cabeceiras, nas áreas do Cerrado e nas áreas da Amazônia. Por isso, é muito importante tentarmos entendê-lo como Bacia do Alto Paraguai, e não só como os limites do bioma.
Para tentarmos entender o motivo de olharmos além do Bioma Pantanal, destaco que a Bacia do Alto Paraguai se estende também para fora do Brasil, abrangendo três biomas e parte da Mata Atlântica. Então, o Pantanal é um pouco de mistura de tudo isso, do Cerrado, da Amazônia e da Mata Atlântica.
Em função da análise da água e de como o Pantanal vem se comportando com essas alterações, tanto climáticas, quanto de uso do solo, quero abordar o comportamento do Pantanal e a absorção dessas mudanças, principalmente, nas áreas de Planalto, nas áreas de nascente dos rios.
Trago um resumo no qual mostro que o Pantanal está 83% preservado, ainda. A antropização do Pantanal, a questão da conversão de áreas naturais em pastagem exótica, isso é muito mais recente.
Na região do Planalto, por sua vez, sobrou apenas 43% de vegetação nativa. Ele é muito mais antropizado, com a presença de áreas antrópicas já em 1985, as quais foram aumentando. O processo de desmatamento no Planalto é muito maior do que no Pantanal. Logo, precisamos tentar entender como esse processo de antropização do Planalto está interferindo, hoje, no Pantanal.
Fizemos um estudo para avaliar como estão as questões das áreas de preservação permanente, na beira de rios e de nascentes. Usamos os dados de hidrografia da Fundação Brasileira para o Desenvolvimento Sustentável — FBDS, o melhor que temos de hidrografia, que consiste em uma interpretação visual em cima de imagens de alta resolução dos rios e das nascentes.
10:43
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Fizemos o estudo e vimos que temos, no Planalto, 1,4 milhão de hectares de APP de rios e de nascentes, que 30% dessa área de APP estão antropizados e que 30% dessas áreas antrópicas foram convertidas de 1985 a 2022. Estamos falando de APP de rios e de nascentes, de áreas no entorno dos rios, no entorno de 30 metros dos rios e de 50 metros das nascentes.
Tivemos um aumento de áreas de pastagem, de agricultura, de mineração e de áreas urbanas nessas APP de rios e nascentes. Além das áreas antrópicas, dos campos produtivos, das pastagens, temos também uma interferência, especificamente, na proteção dos rios e das nascentes. Houve eliminação de nascentes, eliminação de alguns rios.
Vou mostrar algumas fotos depois, para tentarmos entender.
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. EDUARDO ROSA - Foi no planalto que fizemos esses estudos das APP, no planalto da Bacia Hidrográfica do Alto Paraguai. Nós temos a planície, que é o Pantanal, e temos a Bacia do Alto Paraguai, onde nascem os rios do Pantanal. As nascentes de todos os rios que irrigam o Pantanal naturalmente estão no planalto, em áreas do Cerrado e da Amazônia. Como sabemos, os estudos de preservação, de ecologia, todos eles devem levar em consideração a questão das bacias hidrográficas. O que é feito na nascente de um rio lá em cima, no planalto, na bacia hidrográfica, pode ter interferência lá embaixo. Isso acontece muito na Amazônia, com os garimpos da Amazônia. Às vezes, no tributário de um rio um cara abre um garimpo, e o rio inteiro praticamente acaba sendo contaminado e poluído, em função desse garimpo na nascente. É isso um pouco o que acontece no Pantanal. As áreas agrícolas, as pastagens degradadas que estão lá em cima, no planalto, modificam o ambiente lá embaixo, na planície. Por isso precisamos olhar o Pantanal não só pelos limites do bioma, mas também extrapolar os limites do bioma e olhar a Bacia do Alto Paraguai.
Bom, em relação à antropização do planalto, que é a área do Cerrado e da Amazônia, nós temos muitas áreas antrópicas já consolidadas desde 1985, temos o desmatamento também, que ocorreu desde 1985. Nessa animação podemos ver um pouco como aumentou essa questão da agricultura.
O que acontece? O desmatamento remove a vegetação nativa. Primeiro, são estabelecidas áreas de pastagem. Depois, em áreas nas quais o relevo é apto à agricultura, entra-se com a agricultura, de soja, de milho, de algodão, de cana de açúcar, em áreas mecanizáveis. Nas outras áreas menos mecanizáveis, a pastagem acaba se estabelecendo.
Então, tivemos um aumento muito grande na BAP — Bacia do Alto Paraguai, principalmente, de mais de 1,6 milhão de hectares de áreas agrícolas, em 37 anos. No Pantanal, houve um aumento de 14 mil hectares de áreas agrícolas nesses últimos 37 anos.
Vou dar um foco no Pantanal: em termos de agricultura, na região de Miranda, temos áreas muito antigas na produção de arroz, mas bem localizadas, temos alguns pontos de agricultura no norte do Pantanal, inclusive com plantios de cana e algumas áreas de silvicultura, mas muito no limite entre o Pantanal e o Cerrado ou no limite entre o Pantanal e a Amazônia. Recentemente, identificamos plantios de soja na planície, o que é muito problemático. Então, a atenção hoje está voltada para isto: não queremos soja na planície. Na verdade, não se recomenda isso. Existe todo um processo de aptidão agrícola. O Pantanal não é apto para culturas anuais. Nós precisamos ter um pouco dessa consciência, de que a agricultura não deve ser estabelecida em qualquer lugar, em qualquer ambiente.
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Vou mostrar algumas fotos, para termos um pouquinho de noção sobre a situação do planalto.
Há áreas extensas de agricultura nesse padrão. Nós temos praticamente poucas vegetações naturais.
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. EDUARDO ROSA - Está bem. Já se passaram 10 minutos? Então vou acelerar. Vou passar só mais algumas fotos para tentar ilustrar um pouco a situação do Pantanal.
Nós temos muitas áreas de pastagem degradadas. Temos que tentar ter domínio sobre essas áreas para recuperar essas áreas. Nós precisamos ter como foco de recuperação no planalto as áreas de pastagem degradadas e as áreas de APP.
O que nós vemos em termos de APP é que, em muitas dessas áreas, só há uma beirinha do rio com área de preservação de vegetação, e, às vezes, o que acontece praticamente é isto aqui: a nascente já está represada, e há outra represa na sequência, e outra represa na sequência. Isso acaba matando o rio e a nascente. Também há áreas com voçorocas no próprio rio. Então, essa questão do uso do solo e das pastagens degradadas é muito complicada, principalmente no planalto.
O que acontece? O Rio Taquari é um exemplo de assoreamento que vem se estabelecendo no planalto, mas, quando o Rio Taquari chega à planície, ele também está assoreado. Então, o que nós temos como algo emblemático no Rio Taquari é a transposição do Rio Taquari. O que aconteceu no Taquari? Um processo possivelmente natural de transposição dele, só que ele foi acelerado pelo aumento de sedimentos vindos do planalto. Então, é um processo natural, só que foi acelerado em função do aumento do transporte de sedimentos que vêm do planalto para a planície. Essa é uma imagem de satélite, a base da nossa classificação, de 1985. O Rio Taquari está representado justamente nessa área de cor mais escura. Em 2020 ele mudou, ele praticamente secou — 150 quilômetros de rio —, e a área onde ele alagava também mudou. Então, o Taquari é um exemplo de que o assoreamento pode trazer mudanças que modificam muito o sistema no Pantanal.
Eu vou voltar a um eslaide para mostrar como o Pantanal está hoje. Os 83% estão preservados, mas ele teve uma perda de 16% de vegetação nativa. Ao enfocarmos o Pantanal, nós vemos que há um processo de conversão de áreas naturais muito mais recentes, principalmente áreas que alagam menos. Nós tivemos uma perda de quase 2 milhões de hectares de vegetação nativa no Pantanal, sendo 1 milhão de hectares basicamente de florestas e savanas e 1 milhão de hectares de campos naturais convertidos em pastagem exótica. Então, nós precisamos ressaltar que a aptidão para a pecuária do Pantanal é sobre os campos naturais. As áreas de pastagem exótica que estão sendo abertas no Pantanal são áreas de pastagem degradadas, é um solo arenoso.
10:51
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Vou contar uma história. Pessoas abriram áreas no Pantanal há 30 anos, e a pastagem está hoje do jeito que estava antes. O ambiente do Pantanal em si, com solo arenoso, não se regenera com facilidade. Essa conversão de áreas de floresta e de savana em pastagem exótica gera um ambiente degradado.
Temos aqui, pensando nos alertas — e ontem tivemos o lançamento dos alertas —, esse dado histórico. O Alerta Mapbiomas começou a funcionar em 2019. De 2019 a 2022, pegamos todos os alertas de conversão de vegetação nativa em área antrópica e validamos esses alertas em imagens de alta resolução. Para cada evento de desmatamento fazemos um laudo com imagem de antes e depois do desmatamento e mostramos realmente o que está acontecendo naquela área e cobramos alguma atividade do poder público, das instituições ambientais. Esse é o resumo do Pantanal em 2022: 266 eventos de desmatamento, mais uma área total de 31 mil hectares desmatados. Então, são poucos eventos de desmatamento, porém são muito grandes. Temos eventos no Pantanal de 2.800 hectares de remoção de vegetação nativa. Em termos de fiscalização, é difícil a locomoção ali no Pantanal, mas hoje em dia, por imagem de satélite, conseguimos saber exatamente onde está havendo desmatamento, quem é o proprietário, onde ele desmatou na propriedade dele, e fazemos um laudo para cada desmatamento que acontece.
Também temos um processo de verificação dessas áreas de desmatamento, o Monitor da Fiscalização: até que ponto esses desmatamentos tiveram autorização e se essas autorizações são legais. O que estamos vendo é que não há transparência nessas autorizações. Então, o que queremos cobrar também é que essas autorizações sejam transparentes, para que possamos entender o que está sendo autorizado.
O que aprendemos um pouco com isso foi que, às vezes, o pessoal dá autorização para limpeza de pasto. Aí o cara vai lá e, em vez de fazer só a limpeza de pasto, coloca para baixo, desmata cordilheiras florestadas, áreas de savana, retira a vegetação lenhosa, usa o que tem de vegetação lenhosa para carvão e depois faz a limpeza, enleira, junta, faz a limpeza e bota fogo, e aquela área se transforma em pastagem exótica.
De novo, reforçando: as pastagens exóticas do Pantanal geram um ambiente degradado, são solo exposto. Se o proprietário não fizer um manejo muito adequado daquela área, ele não vai ter uma área produtiva ali. A área produtiva e a pecuária tradicional do Pantanal são desenvolvidas sobre os campos naturais, sobre gramíneas naturais, e não sobre essas áreas que estão sendo convertidas.
Temos, em termos de vegetação que está sendo convertida, 30% de formação campestre, que são áreas de campos naturais que estão sendo convertidas em pastagem exótica; 40% de formações savânicas, que são áreas de campos naturais com árvores esparsas, que estão sendo removidas também para a implantação da pastagem; e 20% de florestas que estão sendo desmatadas e convertidas para pastagem.
O vetor é a pastagem exótica, é o desmatamento para a implantação de pastagem exótica, que, no Pantanal, tem que ter um manejo muito adequado, para que ela se torne produtiva e gere um ambiente que não seja degradado.
Aqui vemos um exemplo do laudo que fazemos. Pegamos a imagem de antes e depois. Aqui também vemos mais um exemplo de outro laudo. Vemos aqui as cordilheiras florestadas que são desmatadas. A mesma área do laudo que apareceu na imagem anterior em janeiro estava completamente natural, mas demorou 3 meses para ser desmatada. Então, os desmatamentos no Pantanal vão nesta linha: eles demoram, às vezes, 3 ou 4 meses para ocorrerem. Esse é o tipo de ação em relação à qual, se houvesse fiscalização em campo, seria possível alguém tomar alguma atitude, embargar a área, ver se realmente o proprietário está fazendo o que está habilitado a fazer com a licença. É preocupante o tamanho das áreas que vemos no desmatamento, e mais preocupante ainda é a inação, a falta de ação dos órgãos que têm a competência de tomar alguma atitude e frear esse tipo de desmatamento.
10:55
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Vou apresentar um pouco mais de fotos para mostrar a realidade.
O natural ali é a área de savana, são áreas esparsas com gramíneas. Antrópica é essa área aberta, desmatada, com solo exposto. São muitas as áreas assim. Esse mapeamento que vemos à direita mostra as áreas de pastagem degradada.
O Mapbiomas também classifica as áreas de pastagem em graus de degradação, que são degradação severa, degradação moderada e áreas sem degradação. No Pantanal, a maioria das pastagens abertas estão com sinais de degradação.
Voltando: se o proprietário não fizer um manejo muito adequado dessas áreas que estão sendo convertidas, ele vai gerar um ambiente degradado, quase que partindo para a desertificação dessas áreas.
Aqui mais algumas fotos, para mostrar a realidade de campo. Depois que ele desmata, ele faz uma aração, um trabalho para implantar essa pastagem exótica, e o resultado é uma pastagem... Essa pastagem está com um nível de conservação boa, mas não é em todas as pastagens que o proprietário consegue fazer esse manejo, até porque, quando o Pantanal enche, quando tem esse pulso de inundação, na cheia, ele mata essa pastagem exótica, essa gramínea exótica. Ela não tem resistência para continuar no ciclo de inundação do Pantanal.
Aqui estão algumas fotos que ilustram um pouco a realidade do campo: depois de a área ser desmatada, ela fica com o solo exposto. Essa é uma área completamente limpa. Não faz sentido, para a manutenção do Pantanal, esse tipo de conversão. Nessa área observamos exatamente a cicatriz da cordilheira que foi retirada e a qualidade da pastagem que vem para essas áreas. Se o proprietário não fizer nada, essa área ficará assim por anos, porque a capacidade de regeneração dela é muito pequena. Eu fiz questão de colocar algumas fotos de campo para tentar ilustrar um pouco. Nem todo mundo conhece a realidade do Pantanal. Então, as fotos mostram a realidade de campo, diferentemente do que estamos mapeando.
Esse eslaide é muito emblemático. No nosso acompanhamento, além do uso da terra, mapeamos o pulso de inundação do Pantanal: a água e os campos alagados do Pantanal. Essa linha na cor preta que vocês estão vendo no gráfico inteiro é a medição em campo da régua do Rio Paraguai em Ladário. Então, o Rio Paraguai tem uma correspondência com o pulso de inundação do Pantanal — começa em 1955 e acaba em 2022. Vemos ali uma queda. Quanto mais baixa estiver a linha preta, mais quer dizer que secou. O Pantanal já ficou muito seco de 1960 a 1970. Muitos proprietários contam a história de que o Pantanal estava muito seco, e o pessoal entrou com o gado nas áreas mais secas, e de repente começou a vir a cheia. Muitos proprietários perderam o gado, porque não conseguiram tirá-lo da cheia, e o Pantanal voltou a ter esse pulso de inundação, que é o que está sendo mapeado desde 1985, um pulso de inundação bem abrangente no Pantanal. Então, ele retomou esse pulso de inundação. Essa linha na cor azul que vocês estão vendo mostra o máximo e o mínimo de inundação. O que acontece? De 1988, quando ocorreu o máximo de inundação, a 2018, quando ocorreu o último pico de grande inundação, houve uma diminuição muito grande. Os mosaicos em cima, as imagens do Pantanal ali, os mosaicos de imagem, como o chamamos, as áreas mais pretas, são áreas úmidas. Então, se compararmos o mosaico, na parte de cima, que é o mosaico úmido, de 2022, veremos que ele é quase igual a uma área seca que havia em 1988. O Pantanal que encheu em 2021, praticamente no auge da seca, não encheu nem o quanto secou em 1988. Essa mudança no ciclo de pulso de inundação do Pantanal hoje é muito preocupante. Estamos passando hoje por um momento de seca extrema. Houve um alagamento um pouco maior em 2022, um pouco maior em 2023, mas não chegou ao que mapeamos em 2018. A nossa grande dúvida é: estamos passando por um período seco agora? Quanto tempo vai demorar: 5 ou 10 anos? Possivelmente, vai ser igual ao que passou na década de 60 e 70. O grande problema é que temos um planalto muito diferente do que tínhamos 50 anos atrás, com menor quantidade de nascentes, com menor quantidade de vegetação natural. Então, pensando na Bacia do Alto Paraguai, como o Pantanal está preparado para receber essa chuva que cai no planalto, em função das mudanças climáticas, dos extremos? O Pantanal vai conseguir retomar esse pulso de inundação que retomamos depois do período de grande seca de 1988?
10:59
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Exemplifico aqui a diminuição, comparando o pico de cheia de 1988 com o de 2018. Houve uma queda de 29%, e uma área alagada passou de 7,2 milhões de hectares para 5,1 milhões de hectares. Esta é a nossa preocupação: até que ponto o Pantanal vai conseguir retomar?
Bom, exemplifico aqui como o Pantanal é sensível a esse pulso de inundação. No mesmo ano ele enche e seca. Esse pulso é necessário para a renovação do Pantanal. Há estudos que dizem que o Pantanal tem que alagar pelo menos 2 meses por ano, para que a vegetação se renove, para que os ambientes aquáticos se renovem, a flora e a fauna se renovem e consigam sobreviver. Então, esse pulso de inundação é muito importante.
Cito mais um exemplo em relação à amplitude desse pulso de inundação, a como ele vem mudando. Esse mapeamento é mensal. Nós o fazemos desde 1985. Então, em 1988, nas épocas de grande cheia, havia uma amplitude muito maior entre o que era inundado e o que era seco. No final da série, nos últimos 10 anos, essa amplitude é muito menor. Então, ele alaga menos e seca, ele alaga menos e seca. Há também a questão do período em que ele fica alagado. Ressalto essas diferenças entre o ano inicial e o ano final e mostro o tempo que ele fica alagado. As áreas alagadas por mais de 3 meses no ano apresentaram tendência de redução. Em 1988, o Pantanal ficava debaixo d´água por 6 meses e, em 2021, o Pantanal alagou praticamente uma vez, de forma um pouco mais amena. Então, o Pantanal está alagando em menores áreas e por menos tempo. Esta é a nossa preocupação: até que ponto o planalto está preparado para receber de novo o processo de chuvas? Se ele vir, como virá? Resumindo, para fechar: há vários outros fatores, além do uso do solo, que são preocupantes. A questão da conversão de áreas naturais na planície e no planalto, a questão do assoreamento, da mineração, principalmente na região de Cuiabá. Em relação às barragens, temos 182 barragens e PCHs previstas, algumas já em implantação no limite entre a planície e o planalto. Então, também é uma preocupação como o fluxo de água entre a planície e o planalto pode ficar, se vai ficar mais complicado ainda em função dessas barragens. Drenos artificiais e estradas estão sendo abertos no Pantanal. Eu vou ressaltar as estradas e os acessos que estão sendo abertos em Nhecolândia, principalmente em 2022 e em 2023. Com esses alertas recentes de desmatamento, em 2023 estamos identificando grandes áreas que estão sendo abertas nesse padrão de abertura do Pantanal, no entorno das estradas. Então, no mesmo modelo da Amazônia, cujas estradas são portas para o desmatamento, no Pantanal isso também está acontecendo, e não só essa estrada em Nhecolândia. Há outras estradas previstas ali. No interior, na borda das estradas, quando se abrem acessos para o Pantanal, estão sendo abertos acessos e portas para o desmatamento.
11:03
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Pensando na questão climática, sobre a qual não temos tanta interferência a curto prazo — eventos climáticos nós não prevemos, tentamos simplesmente fazer o acompanhamento —, o que nos preocupa são os períodos de seca, principalmente no Pantanal, porque aumenta possibilidades de incêndios. A questão da atitude a ser tomada em relação a isso é muito importante.
Para finalizar, do que precisamos, a meu ver, pensando basicamente na questão do uso do solo? Precisamos melhorar o manejo das áreas consolidadas, das áreas de pastagem, principalmente das áreas agrícolas; precisamos de manejo com técnicas adequadas de conservação dos solos; precisamos de tecnologia e de aumento de produtividade nas áreas já produtivas, para que não precisemos desmatar mais áreas para produzir. O planalto já está bem antropizado. Então, o processo de conversão hoje é muito melhor do que no Pantanal. Então, como o Pantanal está muito preservado, a pressão hoje está na planície, em termos de desmatamento, mas a necessidade de recuperação está no planalto. No Pantanal já existem algumas atitudes em termos de recuperação da vegetação que vem sendo degradada, em função do fogo também.
Além disso, precisamos da proteção de remanescentes de vegetação nativa, da recuperação de áreas de APP de rios e nascentes, principalmente no planalto e de uma legislação específica para o Pantanal. Para o Pantanal, principalmente para Mato Grosso do Sul, não há uma legislação de proteção das áreas de vegetação nativa.
Acho que era isso, pessoal.
Eu agradeço a possibilidade de estar aqui. É um prazer. Estou à disposição de vocês.
11:07
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O MAPBIOMAS faz questão de mostrar os dados para a sociedade, porque são dados públicos. Estamos aqui para tentar conduzir um pouco a forma como vamos adequar as políticas públicas para manter o Pantanal mais preservado e sustentável ao longo do tempo.
É isso.
Obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Chico Alencar. Bloco/PSOL - RJ) - Obrigado, Eduardo Rosa.
O SR. BANDEIRA DE MELLO (Bloco/PSB - RJ) - Eu queria, em primeiro lugar, parabenizar o meu xará Eduardo Rosa pela excelente apresentação de um assunto extremamente preocupante. Mas o que eu queria mesmo era chamar a atenção para o seguinte fato. Não sei quantos de nós, brasileiros, temos a dimensão, a consciência da excelência do trabalho do MAPBIOMAS. Isso é um patrimônio que nós incorporamos, nos últimos anos, que é incomensurável.
Eu militava nessa área ambiental no BNDES há algum tempo. Depois, dei uma parada por razões esportivas. Retomei agora, recentemente. É impressionante a evolução. É impressionante como hoje temos uma visão clara, transparente, precisa dos nossos biomas. E esse trabalho que o MAPBIOMAS está fazendo realmente merece todos os elogios. Isso é informação, é ciência. O que eles estão trazendo é irrefutável. Não dá para ninguém disfarçar e dizer: "Não, não é bem assim. Antigamente era pior." Não! Está tudo lá, de 1985 para cá, pixel a pixel. Então, isso é impressionante.
Portanto, eu queria parabenizar o Eduardo Rosa e parabenizar o MAPBIOMAS publicamente. Eu já tinha essa noção há algum tempo, mas é impressionante o serviço prestado. O Eduardo mostra uma visão preocupante e baseada em informações, em fatos. Não dá para contestá-la.
O SR. PRESIDENTE (Chico Alencar. Bloco/PSOL - RJ) - Obrigado, colega Deputado Bandeira de Mello.
Agora vamos ouvir o Luciano Loubet, Vice-Presidente da Associação Brasileira dos Membros do Ministério Público de Meio Ambiente e Promotor de Justiça do MP do Estado de Mato Grosso do Sul.
O SR. LUCIANO FURTADO LOUBET - Bom dia.
Primeiramente, queria agradecer o convite da Câmara para poder falar em nome da Associação Brasileira dos Membros do Ministério Público de Meio Ambiente. Temos integrantes do Ministério Público de todos os Estados do Brasil, do Ministério Público Federal, do Ministério Público Estadual.
Eu sou Vice-Presidente dessa associação. Represento aqui o nosso colega Alexandre Gaio, que é o Presidente. Também sou promotor de Justiça do Ministério Público de Mato Grosso do Sul e trabalho no núcleo ambiental. Nossa função aqui é apoiar todos os promotores de Justiça nessa área do meio ambiente. Por isso, conhecemos um pouco do Pantanal. Sou daqui de Mato Grosso do Sul. Sou nascido em Campo Grande, mas criado nas bordas do Pantanal, na região de Porto Murtinho. Conheço também o Pantanal em razão da minha vida privada, por ter andado bastante no Pantanal, especialmente nessa região peripantaneira.
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Após agradecer esse convite, eu queria passar, primeiramente, a visão do que nós temos no Pantanal hoje. Primeiro, está muito claro para nós aqui que o Pantanal está mudando de mãos. O homem convive em harmonia com o Pantanal há centenas de anos. Convive com a pecuária extensiva, na área da planície, na pastagem nativa. Mas hoje vemos que aquele pantaneiro tradicional está saindo do Pantanal, muitas vezes, por falta de capital, e estão entrando outras pessoas que não têm a visão de como atuar no Pantanal, como produzir no Pantanal da forma tradicional, como era feita, da forma harmônica, como era feita. Então, esse é o primeiro ponto que percebemos de forma muito latente aqui.
O segundo ponto, que foi abordado pelo nosso colega Eduardo Rosa, do MAPBIOMAS, é essa interface do planalto e da planície. Tudo o que acontece no planalto, especialmente nas nascentes, reflete lá embaixo na planície, como, por exemplo, os agrotóxicos que são aplicados.
Nós vamos enviar para esta Comissão uma nota técnica que a ABRAMPA fez especificamente sobre o que está acontecendo no Pantanal, especialmente sobre essas questões de desmatamento. E vários estudos apontam essa questão dos agrotóxicos e de outras ameaças ao Pantanal.
A questão do desmatamento eu acho que já foi muito bem apontada pelo Eduardo Rosa, através do MAPBIOMAS. Então, eu queria chamar mais a atenção para a situação do Mato Grosso do Sul. Ao contrário de outras regiões do Brasil, onde o INPE ou os órgãos estaduais ambientais fazem o controle do desmatamento por satélite, aqui no Mato Grosso do Sul, por uma circunstância de falta de estrutura do órgão ambiental no momento adequado, não se fazia esse controle. Quem iniciou e faz até hoje esse controle do desmatamento por satélite no Mato Grosso do Sul é o Ministério Público, através do nosso Núcleo de Geoprocessamento. E eu tenho a tranquilidade de falar para os senhores o seguinte: não passa um palmo de desmatamento no Mato Grosso do Sul sem que esse núcleo constate.
O que acontece muitas vezes — e eu vou contar esses números para os senhores — é que os órgãos ambientais não conseguem chegar a campo para fazer essa fiscalização. Então, todos os alertas do MAPBIOMAS que são emitidos são analisados e revalidados ou não pelo Ministério Público do Mato Grosso do Sul, até porque nós fazemos isso desde 2008. Quando surgiu o MAPBIOMAS, isso facilitou muito para nós. Era um trabalho muito manual que os nossos técnicos faziam. E agora, com esse trabalho que o MAPBIOMAS já faz, nós otimizamos muito o trabalho, tanto que nós reduzimos o prazo de fiscalização de 2 anos em 2 anos para de 4 meses em 4 meses. Então, a cada 4 meses, nós constamos todos os desmatamentos, conferirmos se são legais ou ilegais e remetemos os laudos para a polícia ambiental, para o IBAMA ou para o IMASUL, que é o nosso órgão estadual, para fazerem a fiscalização de campo.
Nos últimos anos de levantamento do Programa DNA Ambiental para o Pantanal do Mato Grosso do Sul, houve o desmatamento de 98 mil hectares. Desse total, 73 mil hectares eram com licença e 25 mil hectares sem licença. Então, grande parte do desmatamento que acontece no Pantanal é licenciado. Se ele é legal ou ilegal, se essas licenças deveriam ser emitidas da forma como estão sendo emitidas, é outro detalhe. Mas é muito raro aqui, pelo que constatamos, pegarmos um desmatamento grande que a pessoa realmente tenha feito sem qualquer licença. A grande maioria dos casos que nós constatamos aqui são desmatamentos que têm licença em que há extrapolação, desmatamento em local inadequado, a exemplo de um caso que aconteceu recentemente que passou no Globo Rural em que a pessoa extrapolou a autorização.
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Para vocês terem uma ideia, só 64% dos laudos de desmatamentos ilegais que nós mandamos são fiscalizados. Por quê? Por falta de condições dos órgãos ambientais de fazerem essa fiscalização em campo.
Um outro ponto, que já foi apontado pelo MAPBIOMAS e o nosso Núcleo de Geoprocessamento levantou também, é a informação de que há 18.599 hectares de monocultura no Pantanal em 675 propriedades rurais. Esse avanço da monocultura no Pantanal é extremamente preocupante e nós temos que verificar como vamos tratar essa situação daqui para a frente.
Então, o que nós percebemos hoje é que, em todo o Estado de Mato Grosso do Sul, houve um aumento das florestas plantadas de eucalipto, um aumento de soja, um aumento de cana. Isso pressiona a pecuária, que estava no planalto, a ir para a planície. Pressionando a pecuária na planície, há a mudança de mãos e a busca de aumento de produtividade dentro do Pantanal, com desmatamento e substituição de pastagens nativas por exóticas.
Esse é o contexto fático que eu queria trazer do que está acontecendo no Pantanal na nossa visão.
O principal contexto jurídico é que, apesar de estar no artigo 225 da Constituição Federal que o Pantanal será regulamentado conforme a lei, assim como a Mata Atlântica e a Amazônia, nós não temos essa lei federal do Pantanal. Isso faz com que nós tenhamos regulamentações estaduais no Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, que, inclusive, muitas vezes são divergentes. Por exemplo, há três datas distintas para a piracema, ou seja, num mesmo período, no Pantanal, num Estado se pode pescar e no outro não.
Isso acontece também na questão do desmatamento, por exemplo, nas matas de cordilheiras. Para quem não está familiarizado com o Pantanal, matas de cordilheiras são aquelas pequenas elevações no Pantanal em que há uma vegetação arbustiva. Essas vegetações são essenciais para a proteção do Pantanal, tanto no período de seca quanto no período de enchente, para a proteção do próprio gado, da fauna. E as matas de cordilheiras não são protegidas no Mato Grosso do Sul e são protegidas no Mato Grosso.
Outro exemplo, no Mato Grosso do Sul nós temos um decreto que permite até 60% de desmatamento no Pantanal. É por isso que nós vemos licenças de 20 mil, 15 mil hectares serem expedidas pelo órgão ambiental estadual, no entender do Ministério Público, de forma equivocada. E nós já entramos com ações e conseguimos, inclusive, suspensões dessas licenças na Justiça. Mas nós ainda temos essa questão, porque temos um decreto que permite isso. E esse decreto, que deveria ser embasado em estudos técnicos, conforme o artigo 10 do Código Florestal, foi embasado num estudo encomendado pela Federação da Agricultura e Pecuária do Mato Grosso do Sul, e que, supostamente, era da ESALQ — Escola Superior de Agricultura "Luiz de Queiroz" —, mas, ao ser consultada, e essa informação nos chegou há pouco tempo, a ESALQ disse que aquilo não reflete o posicionamento daquela instituição. Então, esse decreto contraria as normas técnicas da EMBRAPA e foi avante baseado num estudo que não é de um órgão oficial. É o Decreto Estadual nº 14.273/2015, que embasa essas autorizações de supressão vegetal no Mato Grosso do Sul. Fui informado de que eram 15 minutos de fala e eu marquei aqui 15 minutos. Mas são 10 minutos, Deputado? Se for, eu já vou para o encerramento.
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O SR. PRESIDENTE (Chico Alencar. Bloco/PSOL - RJ) - Pode encaminhar para o encerramento, apesar da riqueza das suas informações.
O SR. LUCIANO FURTADO LOUBET - Ótimo. Então, há essa divergência.
E aí eu queria trazer para o encaminhamento final a questão de as normativas serem muito soft law. Nós temos um zoneamento ecológico-econômico, no Mato Grosso do Sul, para o Pantanal que é soft law: não proíbe nem permite nada, ele só recomenda. Para quem é operador jurídico isso é dificulta muito o trabalho, e eu queria chamar atenção para isso. Fala-se em projetos de lei do Pantanal e os projetos de lei federal que eu conheço do Pantanal são todos soft law. Nenhum estabelece: "Olha, não pode monocultura; tem que diminuir o desmatamento; não pode desmatar tal e tal parte". Então, são todos principiológicos. E fazer uma lei simplesmente principiológica, sem instrumentos práticos, sem uma regulamentação prática, é algo preocupante, porque se trabalha anos na discussão de uma lei e na hora em que essa lei for aplicada pelo operador do direito, ela não vem com nada de concreto que efetivamente diga: "Aqui pode, aqui não pode".
Ninguém é contra a produção. O Pantanal é o maior exemplo da convivência do homem, da produção com o meio ambiente. Essa produção tradicional deveria ter uma forma de ser reconhecida e remunerada, como, por exemplo, os programas de pagamento por serviços ambientais. No Mato Grosso do Sul temos a possibilidade de compensação de reserva legal dos outros biomas dentro do Pantanal, que é um outro instrumento econômico em que a pessoa pode continuar produzindo ali, mas também arrendar aquela área para quem desmatou fora do Pantanal, arrendar ali dentro e ter a valorização. Nós precisamos buscar instrumentos econômicos de incentivo para que aquele produtor pantaneiro possa produzir e ter um retorno financeiro, mas de forma ambientalmente correta.
O último ponto que eu queria trazer é que no Ministério Público nós temos o Programa DNA Ambiental, para a questão do desmatamento; o Programa Pantanal em Alerta, que é um programa preventivo e repressivo para o problema em relação aos incêndios. Todos os proprietários podem cadastrar o Cadastro Ambiental Rural e receber, de hora em hora, por SMS ou e-mail, informação sobre eventual foco de calor na propriedade. Isso é aberto para a sociedade. Foi um programa produzido pelo Ministério Público do Mato Grosso do Sul, juntamente com o Corpo de Bombeiros, e está funcionando hoje. Em relação às nascentes, nós temos um programa chamado SOS Rios, que trabalha na recuperação das nascentes e atende a mais de 4 mil propriedades.
E um outro ponto que eu acho importante e necessário avançar é a questão do embargo remoto. Já que os órgãos ambientais não conseguem fiscalizar todos os desmatamentos, e, hoje em dia, por satélite, é tão fácil constatar esse desmatamento, se ele é legal ou ilegal, nós deveríamos ter um trabalho intensivo dos órgãos ambientais na questão do embargo remoto dessas áreas desmatadas.
Agradeço novamente o convite e me coloco à disposição dos senhores para qualquer esclarecimento.
O SR. PRESIDENTE (Chico Alencar. Bloco/PSOL - RJ) - Muito obrigado, Promotor Luciano, pelas colocações importantíssimas que o senhor nos trouxe. Que bom que há agentes públicos que resistem à devastação.
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O que me veio à mente, quando o senhor falou da legislação insuficiente, meramente sugestiva e contraditória, muitas vezes, é que os legisladores do Brasil, no âmbito municipal, estadual e federal, na sua maioria são bancados, na sua vida pública, ou influenciados, digamos — quem quiser pode colocar aspas e cifrão em algum "s" dessa palavra —, pelos que não têm essa concepção do cuidado ambiental, pelos vinculados ao produtivismo e ao ganho como princípio. É um problema de educação política, ao fim e ao cabo.
A educação política tem aspectos positivos, tanto que trouxe para cá, pelo voto do povo de Minas Gerais, uma representante da gente xakriabá, dos povos indígenas no Brasil, Presidente da Comissão recém-criada dos povos indígenas, que é a nossa querida Deputada Célia Xakriabá e que pediu uns minutinhos para falar. Seja bem-vinda.
V.Exa. tem a palavra. (Palmas.)
A SRA. CÉLIA XAKRIABÁ (Bloco/PSOL - MG) - Obrigada, Sr. Presidente, companheiro de luta. Eu venho do Estado de Minas Gerais, do Cerrado, do pequi, que também é vizinho do Pantanal. Sou Deputada Federal do Cerrado, do Pantanal, da Amazônia, da Mata Atlântica, do Pampa, pensando na importância desses biomas.
E quando eu cheguei aqui as pessoas perguntaram quantos anos eu tinha, se eu era anciã. Eu falei: "Eu não sou anciã, mas sou 'onciã', porque nós viemos para 'oncificar". E a onça é também desse lugar, do Pantanal. E quando chegamos, nos perguntaram: "O que vocês vão poder fazer nessa bancada?" A bancada do cocar, a bancada pela terra, a bancada das águas e a bancada pela vida. "O que vocês vão fazer, se vocês são tão poucas?" E falamos que, embora poucas, somos necessárias.
Digo a vocês que neste local do território, no Mato Grosso do Sul, no Pantanal, está a segunda maior população indígena. Para quem não conhece, a Terra Indígena Kadiwéu é o único território no Brasil cujos donos são os povos indígenas, porque o ganharam na Guerra do Paraguai. E hoje se discute nesta Casa, e passou a medida provisória, o mercado de carbono, enquanto o território kadiwéu representa o maior estoque de carbono da esfera para pensar esse Brasil. Nós precisamos não vender o direito de poluir, mas tratar esses territórios, que têm significativos estoques de carbono, com importância e potência.
No Mato Grosso do Sul vive não somente o povo terena, que é uma das maiores populações, mas também vivem o povo guató, o povo kinikinau, o povo atikum e o povo kadiwéu, um povo emblemático que participou também da Guerra do Paraguai.
Já estive no território do Mato Grosso do Sul este ano, na oportunidade, junto com a parentíssima Ministra Sonia Guajajara, com o Weibe Tapeba e com a parentíssima Deputada Joenia Wapichana, tentando pensar e resolver os conflitos territoriais. Mato Grosso do Sul não pode mais ser lembrado — dizem que o Governador está aqui na Casa, e, na época, nos sentamos também com o Governador — como um dos Estados onde mais se matam indígenas. O povo guarani-kaiowá, a cada vez que estamos aqui reunidos, tem as suas casas de reza... Assim como o Pantanal queima, também as casas de reza das mulheres guarani-kaiowá. No ano passado, estive com a Naranda em nossa campanha, lá no Estado de Minas Gerais, e quando ela retornou para o seu território, a sua mãe tinha sido queimada viva. Essa a realidade. Ainda, em 2020, o povo guató teve quase 80% do território queimado.
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Neste momento, quando falamos de queimadas no Pantanal, muita gente diz assim: "Mas morreu alguém? Que bom que não morreu ninguém!" Quer dizer que queimar onças não é queimar a biodiversidade? Quer dizer que queimar a vegetação, a flora e a fauna não é queimar a biodiversidade? Enquanto nós não sentirmos na pele que queimar o território...
E ainda há um problema muito grande no Pantanal — eu vivo na região do Bioma Cerrado, que tem também a vegetação de buritis — e quando incendeia o Pantanal, o fogo é subterrâneo, e fica em torno de 1 mês, 2 meses queimando ali por baixo. É o fogo subterrâneo. Então, o Pantanal é um dos biomas de mais difícil regeneração, porque quando há queimada, o fogo também queima embaixo da terra. A espécie do buriti está sob ameaça de extinção. Então, estamos aqui para falar dela.
Vários expositores, inclusive o último companheiro, falaram do enfraquecimento da legislação e da importância de haver uma legislação específica no âmbito federal para o Pantanal. Então, contem com os nossos mandatos, que são pela proteção. Estamos aqui também fazendo pelo Pantanal, porque entendemos sua importância. A Amazônia, por si só, não vai salvar a humanidade. É preciso reconhecer a importância da regulação do clima pelo Pantanal, pelo Cerrado e pela Mata Atlântica.
Já para finalizar, quero dizer que estamos na Comissão da Amazônia e dos Povos Originários e Tradicionais, mas entendemos a importância de aqui trazer aqueles de que trata a Convenção nº 169, sobretudo os impactados nos processos de consulta na região do Mato Grosso do Sul, onde, infelizmente, avança a plantação da soja. Infelizmente, muitas mães guarani-kaiowás têm seus filhos mortos ainda no útero, porque a diversão de muitos filhos de latifundiários e fazendeiros é despejar veneno sobre os territórios indígenas.
Então, se a sociedade, o Planalto e o Parlamento não se sentem sensibilizados porque não estão sujeitos a morrer pelos conflitos territoriais, como todos nós indígenas estamos sujeitos a morrer, nós vamos morrer por um mal em comum, que é o veneno que chega à nossa mesa. Então, precisamos pensar que alimentação não significa adoecer, que alimentação não significa ter câncer e que alimentação não significa adoecer o útero das mulheres indígenas.
Entendemos a importância de estar neste Parlamento e entendemos, principalmente — já vou finalizar, Presidente —, que pautas ambientais, como a defesa do Pantanal, do Cerrado e da Mata Atlântica, não precisam ser tratadas somente como pautas progressistas. São pautas humanitárias.
O problema da humanidade é a destemperança. A cada dia o planeta fica mais aquecido, mas a cada dia a humanidade fica com o coração mais gelado. Nós temos o importante desafio de desaquecer o planeta e aquecer o coração. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Chico Alencar. Bloco/PSOL - RJ) - Muito obrigado, Deputada Célia Xakriabá.
Vamos prosseguir agora com o Leonardo Gomes, Diretor do Instituto SOS Pantanal.
O SR. LEONARDO GOMES - Bom dia a todos e todas.
Agradecendo o convite, primeiro quero saudar os nossos companheiros da Mesa, na figura do Deputado Chico Alencar. Eu conheço o trabalho dele há mais de 20 anos, meu domicílio eleitoral era no Rio de Janeiro até alguns anos atrás e conheço bem a trajetória dele. Agradeço-lhe o apoio e por estar presidindo a Mesa.
Saúdo o Deputado Bandeira de Mello, de quem também conheço um pouquinho do trabalho. Eu comentava agora há pouco que deixou um legado muito difícil para todo brasileiro que não torce para o Flamengo. Então, essa é uma dificuldade que passamos, principalmente lá no Rio de Janeiro.
O SR. PRESIDENTE (Chico Alencar. Bloco/PSOL - RJ) - É propositivo, para ser imitado...
O SR. LEONARDO GOMES - Pelo belo trabalho que foi feito e a ser imitado pelos outros clubes também.
Saúdo a Deputada Célia Xakriabá, nossa guerreira, a quem agradeço a presença, a participação e a atenção para o Pantanal. Nós estamos precisando muito desse olhar. E quero lembrar que o Pantanal também é terra indígena. Muitas vezes, nós ficamos muito focados na discussão puramente ambiental, como se fosse possível discutir a conservação ambiental sem os seus guardiões.
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Eu queria pedir ao Deputado que eu pudesse falar por 13 minutinhos, porque há 3 minutinhos do vídeo que vão ser muito elucidativos aqui para esta fala. É um vídeo com o trailer de um documentário que vai ser lançado hoje, uma parceria do MAPBIOMAS, SOS Pantanal e Documenta Pantanal, que fez a produção desse vídeo. Depois, eu entro por 10 minutinhos na fala. Pode ser?
O SR. PRESIDENTE (Chico Alencar. Bloco/PSOL - RJ) - Pois não. Não há nenhum problema.
Eu apenas informo que, caso a reunião da nossa aguerrida Federação PSOL/REDE comece, ela está marcada para 11 e meia, eu passo a Presidência dos trabalhos para o Deputado Bandeira, e, tão logo acabe lá, nós voltaremos.
Eu estou muito interessado, estou aprendendo muito, perdi o medo das onças (risos), e até mesmo, suponho, na realidade, já temos um convite para visitarmos o Pantanal. Não deixem de fazê-lo. Eu vou com prazer.
O SR. LEONARDO GOMES - Então, vamos levar a bancada toda logo. (Risos.)
(Exibição de vídeo.)
O SR. LEONARDO GOMES - Travou.
(Falha na exibição.)
Nós vamos para a apresentação. No final, nós o encaixaremos, se der.
O SR. PRESIDENTE (Chico Alencar. Bloco/PSOL - RJ) - Leonardo, por favor, eu quero só dar uma informação de interesse geral.
Esta audiência está sendo transmitida pela Internet e o vídeo pode ser acessado pela página da Comissão de Legislação Participativa, no site da Câmara dos Deputados, e pelo Canal da Câmara, no Youtube. Então, não somos só nós aqui neste evento. E estas informações importantíssimas terão a publicização necessária.
O SR. LEONARDO GOMES - Perfeito. Vamos dar sequência.
O SR. PRESIDENTE (Chico Alencar. Bloco/PSOL - RJ) - Não recuperou o vídeo? Eu ia ficar esses 2 minutinhos que restam.
O SR. LEONARDO GOMES - Se houver oportunidade, nós o exibiremos no final para eu não perder o tempo da fala. Eu vou falar daqui, porque eu não tenho toda essa visão que o Edu teve aqui no reflexo do espelho.
O vídeo trazia de maneira muito vívida as questões de seca e cheia e tudo o que nós temos vivido no contexto — acaba ilustrando um pouco da fala do Eduardo Rosa —, mas nós vamos ter a oportunidade de exibi-lo no final ou de enviar o link para todos.
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Vou falar um pouquinho do bioma. Muito já foi falado, então, eu vou cortando alguns pontos aqui.
O Bioma Pantanal está inserido na Bacia do Alto Paraguai e compreende os Estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul e também a Bolívia e o Paraguai. Trata-se do menor bioma brasileiro — estamos falando de 15 milhões de hectares mais ou menos — e também, proporcionalmente, do mais bem conservado.
Esse é um bioma ecótono, no qual encontramos basicamente várias fitofisionomias do Cerrado, da Mata Atlântica e da Amazônia dentro dessa bacia. As espécies de fauna e flora também são representativas desses quatros biomas e também do Chaco, que é o segundo maior bioma sul-americano e, talvez, o primeiro bioma a ser extinto no Brasil, antes mesmo de ser reconhecido como tal.
Provavelmente, o Pantanal é o melhor lugar do mundo para se observar a fauna no Brasil, na América do Sul, certamente, nas Américas. Então, quem não o conheceu ainda, presencialmente, eu recomendo fortemente.
Eu vou para a parte institucional do Instituto SOS Pantanal.
Nós já trabalhamos há 13 anos com política pública, tanto ajudando na elaboração com insumo técnico, quanto acompanhando a execução dessas políticas públicas. Fazemos a promoção do Pantanal, criando conteúdo, engajando as pessoas em campanhas, tanto fora quanto dentro do bioma, em programas de campo, na formação de brigadas de incêndio florestal. Nós temos um dos maiores programas de brigadistas de incêndio florestal no Brasil com 24 brigadas, uma área muito grande e protegida, e também uma rede regional, que hoje já chega a 1 milhão de hectares protegidos por brigadas voluntárias e comunitárias no bioma. Nós trabalhamos com restauração e reflorestamento, inclusive em terra indígena — é um dos primeiros projetos nesse sentido —, e também com o monitoramento da qualidade de água, da contaminação.
Eu vou deixar à disposição esse material sobre o programa de brigadas de incêndio. Esta é uma forma de mostrar que é possível fazer esse programa, em aliança com a União, os Governos Estaduais, as agências locais de resposta ao incêndio florestal, a sociedade civil e as comunidades tradicionais, ribeirinhas. Ele foi muito importante na redução de focos de calor e de área queimada nos últimos 3 anos. Em 2020, houve aquela tragédia que todos viram, em que mais de um quarto do bioma foi queimado e, agora, houve uma redução significativa muito por conta desse instrumento de mitigação e adaptação às mudanças climáticas.
Nós precisamos ter estratégias no território para que as populações deem conta disso junto com os Estados e com a União. Não dá para fazer um controle central só ou o comando e controle sem ter isso capilarizado no território.
Vou falar um pouquinho do contexto regulatório do Pantanal. O Dr. Luciano já explorou muito bem esse tema, eu vou só pegar o gancho dele para introduzir outros elementos.
O que diz a Constituição? Como alguns colegas já falaram muito bem, basicamente, o Pantanal precisa de uma legislação como patrimônio nacional. Então, o Pantanal, a Mata Atlântica e a Floresta Amazônica precisam de uma legislação. Só a Mata Atlântica tem uma legislação, que, constantemente, vem sendo ameaçada na tentativa de ser modificada em um e outro termo, e o Pantanal não tem uma legislação federal.
Uma vez que não há legislação, o Código Florestal versa sobre isso e diz que os Estados deverão fazer seus regulamentos e que esses regulamentos deverão ser embasados em recomendações técnico-científicas dos órgãos oficiais de pesquisa.
Qual é a realidade que nós temos a partir disso? Não existe uma lei federal, e isso gera uma série de questões de insegurança jurídica, inclusive já existem algumas ações diretas de inconstitucionalidade. O exemplo mais recente foi este em que o Procurador-Geral entrou com uma ADO pedindo que fosse aplicada a Lei da Mata Atlântica enquanto não houvesse uma lei federal. Isto ainda está em julgamento, o que mostra uma das consequências de não haver uma legislação federal, a confusão que isso gera.
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Quando nós falamos de Mato Grosso especificamente, é um caso mais preocupante em relação à regulamentação. Existe um decreto — não é uma lei estadual — de 2015, o Decreto nº 14.273, que é embasado em três estudos. Um estudo é sobre a delimitação do bioma em si. No IBGE, é basicamente pacificado esse tema sobre os limites do Pantanal. O outro estudo é da EMBRAPA Pantanal, que fala sobre uso sustentável, integridade do bioma e conciliação com o uso econômico. E o terceiro é um estudo da ESALQ — Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, que não está disponível publicamente, que fala sobre o uso econômico.
O que nós temos como resultado disso? Como o estudo da ESALQ é puramente econômico, nós tivemos acesso à parte de ofício, Ministério Público, Lei de Acesso à Informação. Ele fala puramente da questão econômica, inclusive nas palavras do próprio autor, não fala nada de conservação ecológica ou coisas do tipo. Fala em alguma coisa entre 50 e 60% de supressão para viabilidade econômica, com base em estudos de algumas propriedades do Pantanal.
A EMBRAPA, que tem uma nota muito mais completa em relação ao equilíbrio ecológico, traz alguns limites para a supressão. A primeira nota falava em 15%. Esse estudo foi contestado e realizado um segundo estudo. Ela fala que poderiam ser suprimidos até 35% da fitofisionomia cerrado, 36% de florestas, 45% de campos mais elevados e 45% de campos inundáveis, colocando a consideração de que precisam ser feitos mais estudos. Ainda não é um estudo conclusivo sobre campos inundáveis. Esse estudo precisa ser refeito a cada 5 anos, porque a dinâmica do Pantanal muda, e nós precisamos revisar isso daí.
O que o decreto diz? Que podem ser suprimidos 50% da vegetação nativa arbórea e 60% da vegetação nativa não arbórea. Isso não foi baseado em estudos técnico-científicos. Foi baseado muito mais no processo político de construção desse decreto em critérios puramente econômicos. Inclusive, o decreto de Mato Grosso do Sul e a lei estadual de Mato Grosso, de 2008, revisada ano passado pela Assembleia Legislativa de Mato Grosso, permitem, sim, que você faça uso, por exemplo, de pastoreio de gado em área de preservação permanente e reserva legal.
Essa é uma questão a ser discutida. Não estou colocando se é possível, se é viável ou não, mas isso já vai contra o Código Florestal, por exemplo. As legislações estaduais vão contra o Código Florestal, assim como a do Mato Grosso, especificamente, pelo fato de não ter embasamento técnico-científico com relação à conservação ambiental.
O que aconteceu depois desse secreto ser aprovado? O desmatamento dobrou. Não por coincidência, o desmatamento licenciado e aprovado em Mato Grosso do Sul dobrou, de acordo com dados do NUGEO, do Ministério Público do Estado de Mato Grosso do Sul.
A regulamentação de Mato Grosso é mais consistente e foi flexibilizada no passado. Existe um estudo da EMBRAPA sobre isso. Então, pode-se suprimir até 40% agora. Há também alguns elementos que vão flexibilizar o uso de área de preservação permanente e reserva legal. Ela ainda é um pouco mais restritiva, mas vem sendo também flexibilizada nos últimos anos.
Existem vários desafios do Pantanal, alguns já foram comentados aqui. Temos o desafio muito imperativo da seca. A pior seca dos últimos 60 anos foi a de 2020. O ano de 2021 vinha caminhando para isso também, mas uma chuva fora de época ajudou bastante.
Nós estamos entrando agora na fase do El Niño. Para o Centro-Oeste, talvez ajude nesse sentido, mas a perda de superfície de água, do MapBiomas, se comparados os picos de cheia em 1988 e 2018, foi de 29%. Pantanal é basicamente água. É impossível pensar na dinâmica ecológica, social e econômica do Pantanal sem água. É isso que nós estamos presenciando com esse cenário, essa perda considerável.
Estudo do CEMADEN, do pesquisador José Marengo, diz que o Pantanal pode sofrer um aumento de 5% a 7% na temperatura média até o final do século. As mudanças climáticas podem ser inclusive mais intensas, com consequências mais graves para o Pantanal. E pode haver 30% de redução de chuva até o final do século. Esse é um dos cenários divulgado em uma publicação razoavelmente recente do José Marengo com vários outros pesquisadores. O desafio de incêndios florestais, como já foi comentado, não é só ecológico e social, mas também econômico. Um estudo da Confederação Nacional de Municípios revela que Mato Grosso, em 5 anos, de 2016 a 2021, perdeu aproximadamente 500 milhões de reais devido somente a incêndio florestal. Então, é um argumento econômico. Preservar, prevenir e responder a incêndio florestal também tem um argumento econômico muito forte.
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O desafio do desmatamento. O Pantanal perdeu 17% da cobertura vegetal. O MapBiomas publicou ontem uma atualização desse estudo. Essa perda foi na planície. No planalto e na bacia foi 57% de supressão, sendo que 70% a 80% da água vêm do planalto. Então, é especialmente preocupante mantermos as cabeceiras e as nascentes que vêm do planalto.
Sobre o desafio do avanço da monocultura, o Eduardo já comentou bem. A coleção 7 trazia mais de 18 mil hectares de monocultura no Pantanal, o que, em geral, demanda muito em termos de agroquímicos e uso de produtos. O Pantanal não vai ter esse turbilhonamento, é uma planície alagável, então esse veneno vai ficar lá por muito tempo, tendo consequências inestimáveis. Não é necessário, por exemplo, fazer uma declaração, um licenciamento específico, de acordo com a resolução vigente no Mato Grosso do Sul. A soja, por exemplo, vem avançando. Essa foto é nossa de sobrevoo. Qual seria a consequência de ter espécies adaptadas ao Pantanal ou possivelmente com drenagem, nesse cenário de seca intensificada? Provavelmente catastrófica.
Desafio de unidades de conservação. O Pantanal é o segundo bioma que menos tem unidades de conservação no Brasil. Apenas 4,6% do Pantanal encontram-se protegidos por unidades de conservação. Quando nós olhamos a unidade de proteção integral, aquelas que vedam e são mais destrutivas, elas correspondem a apenas 2,9% do território. Estamos falando de Metas de Aichi, que propõem 17%, de COP 15, no valor de 30%. Nós estamos em 4,5%. Uma boa parte do Pantanal é privada ou de uso sustentável, com regras mais flexíveis. Eu estou colocando todas as referências. Esse material vai ficar à disposição, e o próprio eslaide tem referência de todos os artigos com esses dados.
Desafio de hidrovias e portos. Hidrovia é um tema antigo do Pantanal. Já existem três portos licenciados em andamento no Pantanal. É possível conectar de Cáceres até Porto Esperança e Corumbá, agora com a Rota Bioceânica, em Porto Murtinho. A nossa preocupação é que a ambição em torno disso cresça e nós possamos ter um movimento muito grande de minério e outras commodities de soja do Mato Grosso até Porto Murtinho e, por consequência, Chile, China e por aí vai. É um projeto antigo, mas para viabilizar isso seria necessário, provavelmente, dragar o rio e retificar os seus meandros. É inviável economicamente fazer essa rota hoje com um volume que justifique esse uso. Há várias recomendações da Secretaria de Meio Ambiente sendo ignoradas nesse sentido, e as obras continuam.
Desafio das centrais hidrelétricas. Existe uma nota técnica da ANA, de 2018, se não me engano, em que foram pagos 3 milhões de reais para fazer esse estudo. Ela mostra qual a situação em relação aos projetos de centrais hidrelétricas, quais delas não deveriam ser feitas, quais deveriam ser feitas com medidas mitigatórias e quais seriam boas de se fazer, considerando, principalmente, o estoque pesqueiro e o impacto econômico disso. Esse foi o principal parâmetro utilizado nesse estudo. Pelo menos 44 projetos hidrelétricos já estão em funcionamento e há previsão de mais 126 projetos. Estão aí todos os dados também.
A Bacia do Alto Paraguai corresponde a pouco mais de 1% do potencial de geração de energia hidrelétrica do País. Estamos falando do comprometimento de uma atividade econômica e cultural e também de todo o ciclo migratório e reprodutivo de peixes, por conta de 1% do potencial de geração e represamento da água, por consequência disso também. Isso impediria o fluxo de água e secaria ainda mais o bioma. Desafios de estradas e colisões com fauna. Quase 1 bilhão de reais está sendo investido pelo Estado de Mato Grosso do Sul em estradas, sem medidas de mitigação de colisão de fauna. Uma das estradas que mais mata animais no Brasil é a BR-262. Esta é federal, mas há muitas estradas estaduais que também precisariam ter medidas de mitigação. O que pedimos aqui é que haja o cuidado e, realmente, essa observância de boas práticas. Já existem projetos e estudos que embasam isso. Já se confirmou também que, economicamente, isso se paga ao longo de alguns anos. Em termos de acidente, com perda de vidas, danos materiais e humanos, isso se paga no longo prazo. Não é possível que haja esse avanço todo logístico, que é necessário, mas sem esse tipo de cuidado com a fauna local, que é um dos grandes tesouros do Pantanal.
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Há também a oportunidade de avanço. Eu falei de um monte de desafios aqui, de problemas a serem superados, mas o contexto que estamos vivendo no Brasil e no mundo suscita — e a Luciana falará melhor — alguns aspectos de oportunidade.
Pela primeira vez, provavelmente, vai haver uma política pública federal de grande porte, com muita relevância para o Pantanal, em termos de conciliação da conservação com o desenvolvimento econômico. A sigla está por ser definida, mas é o equivalente ao PPCDAm, que foi feito da Amazônia. Já foi anunciado por Secretários do Meio Ambiente, como o Secretário André Lima e o Secretário Capobianco, e pela própria Ministra que essa metodologia vai ser estendida também para outros biomas. Hoje ela já existe na Amazônia e no Cerrado, mas precisa ser feita para os demais. Poderia ser, talvez, a sigla PPCDPan.
Essa poderia ser uma oportunidade de discutir isto tudo, como incentivar a bioeconomia, segurar o desmatamento, criar alternativas para esse desmatamento, recuperar pastagens degradadas. Temos um conhecimento incrível na EMBRAPA Pantanal sobre semente de gramínea nativa. Imaginem um bioma que tem dezenas de gramíneas nativas, que capturam mais carbono do que a braquiária, que têm mais proteína e mais palatabilidade para o gado. Esse é um tesouro para a pecuária extensiva, tradicional e pantaneira. Se um proprietário hoje quiser fazer uma invernada de mil hectares de gramínea nativa, não há como. São experiências pequenas que não vingam. Então, tira-se tudo e coloca-se braquiária. Hoje, essa é a realidade que estamos vivendo. Há gramíneas que fazem melhor esse papel de suporte econômico e ecológico do Pantanal, e não existe incentivo para que isso aconteça em larga escala. Como há vários outros produtos, deveríamos ter na EMBRAPA o recurso para fazer isso acontecer.
Fortalecimento da bioeconomia. Há várias vocações do Pantanal: a pecuária de baixo carbono e de carbono zero; a integração ao Programa Fazenda Pantaneira Sustentável, da EMBRAPA; a cadeia do baru, de outras sementes e castanhas do Cerrado, que estão no entorno do Pantanal — são pouquíssimas as iniciativas que têm alguma escala no Pantanal —; o mel do Pantanal, que tem certificação de origem.
Para tudo isso, poderíamos ter um desenvolvimento em sistemas agroflorestais, sistemas que geram renda, conservam e mantêm as pessoas no solo, com qualidade de vida. Na Amazônia, já há algumas iniciativas exitosas; no Pantanal, estamos alguns passos atrás.
Fundos internacionais direcionados ao bioma. A Ministra Marina dizia que o Fundo Amazônia vem cumprindo bem o papel de implementar a política pública e garantir as condições básicas de governança e política pública. Agora ela está pensando mais em bioeconomia e em outros fatores. Digo que o Pantanal precisa do que o Fundo Amazônia foi alguns anos atrás. Estamos uns 20 ou 30 anos atrás da Amazônia, talvez, em termos de governança, incentivos, política pública, participação. Precisamos de implementação das unidades de conservação, de programas de arranjo produtivo local, de sociobiodiversidade. Essas são questões ainda muito defasadas no Pantanal.
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O manejo integrado do fogo está em acordos finais para votação. É uma política muito importante. No mundo inteiro, o manejo correto do fogo é feito para evitar justamente incêndios catastróficos, e comprovadamente isso reduz emissões no Cerrado, na Amazônia, em diversos outros países. Está para ser aprovado. Nós precisamos dessa aprovação para termos esse respaldo no bioma inteiro.
Fortalecimento da atuação do IBAMA regional. Quero saudar a colega Joanice, Superintendente do IBAMA, que está aqui nos ouvindo on-line. O IBAMA voltou nacionalmente e voltou também no Mato Grosso do Sul pelo trabalho incrível que vem sendo feito. Esperamos que assim continue, com autonomia, com recursos e apoio para que faça esse trabalho exemplar no Mato Grosso do Sul novamente.
Legislação federal no Pantanal. Esse item eu deixei por último porque realmente acho que é um ponto que precisa ficar na cabeça de todos. Não dá mais para ficarmos com soluções paliativas, remendos, decretos, revisão de decretos. Nós precisamos discutir isso nacionalmente com os dois Governos, com Parlamentares, enfim, com a Casa, com as diversas bancadas para avançarmos nesse sentido.
Finalizo com uma foto nossa da Brigada de Incêndio Florestal.
Lembrem-se do Pantanal!
Nós ficamos aqui para mais esclarecimentos, se necessário.
Obrigado. (Palmas.)
(Exibição de vídeo.)
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O SR. LEONARDO GOMES - Ao final, a apresentação estará disponível na íntegra.
Obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Bandeira de Mello. Bloco/PSB - RJ) - Obrigado, Leonardo Gomes, pela excelente apresentação.
É bom sabermos o que o Instituto SOS Pantanal vem fazendo e monitorando, sempre alerta, para tentar minimizar essa tragédia que parece estar em via de assolar.
Ele deixou um recado aqui para todos nós, um dever de casa, que devemos cuidar da legislação específica do Pantanal e dos outros biomas também. Como ele bem falou aqui, só a Mata Atlântica tem esse privilégio, e assim mesmo ela vive ameaçada pelos predadores.
Então, sem mais delongas, eu vou passar a palavra à Sra. Luciana Leite, Defensora do Clima e da Biodiversidade pela Environmental Justice Foundation.
A SRA. LUCIANA LEITE - Boa tarde. É um prazer estar aqui.
Agradeço ao Deputado Bandeira de Mello e ao Deputado Chico Alencar, que precisou sair um pouquinho mais cedo. Cumprimento também os colegas expositores de Mesa.
Apesar de brasileira e de ser também uma apaixonada e defensora mais do que da biodiversidade e do clima, mas também do Pantanal, eu hoje fui incumbida de trazer um pouco da perspectiva global do que tem sido pensado e repensado sobre o Bioma Pantanal por outros países, para além Brasil. Isso se deve muito diante do que aconteceu em 2020 e em 2021 com o bioma, o que infelizmente deixou claro para outros países que talvez o Brasil ainda não estivesse numa posição de proteger os seus recursos naturais como era esperado no mundo.
Eu vou falar um pouquinho de alguns instrumentos legais que surgiram como consequência de alguns anos de destruição ambiental e de um estrangulamento de um bioma que é de relevância internacional por múltiplas questões.
Obviamente, enquanto brasileira, eu ecoo a preocupação dos colegas de Mesa, esses abismos jurídicos que ainda temos hoje no País, mas vou trazer um pouquinho da perspectiva internacional e, sobretudo, de um instrumento legal recentemente aprovado pela União Europeia, que é a lei de produtos livres do desmatamento, que tem sido já discutida por esta Casa, mas ainda não no âmbito do Pantanal.
Eu tenho o privilégio de conseguir pescar um pouquinho da tela da apresentação. Então, vou dar sequência sentada mesmo.
(Segue-se exibição de imagens.)
Antes de qualquer coisa, brevemente apresentando a EJF, que é essa Fundação pela Justiça Ambiental, nós somos uma organização do terceiro setor, hoje atuante em 16 países, sempre com essa preocupação de onde acontecem as interseções entre os crimes ambientais e as violações de direitos humanos, tentando sempre parcerias com organizações locais que já têm um histórico de advocacy e defesa tanto dos recursos naturais quanto de povos tradicionais.
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Por que falamos tanto de 2020? Eu acho que é muito importante falarmos que 2020 está logo ali, que as condições que levaram a 2020 persistem no Pantanal — em alguns casos se agravaram. Há o medo por parte da sociedade civil organizada, de especialistas e acadêmicos de que essa tragédia que aconteceu em 2020 se repita.
É importante pensarmos que até 2020 o Pantanal era pouco conhecido internacionalmente e, quando conhecido, era conhecido como esse símbolo de biodiversidade, de possibilidade de encontros com a vida silvestre e, obviamente, como a maior planície alagável do planeta.
Em 2020, infelizmente o Pantanal passa a ser noticiado em todo o mundo com uma relevância global, com uma tragédia, mais uma evidência do colapso climático que temos vivenciado, quando esta área úmida queima em cerca de 26% do bioma. Obviamente, pensando em mudanças climáticas, temos, somente nesse ano, uma estimativa da NASA de que foram emitidas mais de 115 milhões de toneladas de carbono apenas pelos incêndios do Pantanal em 2020. Para vocês terem uma noção, isso corresponde à emissão da Bélgica em 2021. Então, de nada adianta os países europeus estarem investindo milhões de euros, dólares e libras na diminuição de suas emissões se as mudanças climáticas não reconhecem fronteiras. Eles estão de alguma forma — e nós veremos isso hoje — indiretamente ocasionando também essas tragédias, esses incêndios que ocorrem em outros países.
Além disso, temos a emissão de mais de 500 mil partículas que são danosas à saúde humana, levando à vulnerabilidade maior de cerca de 11 mil indígenas que habitam a planície por doenças infectorrespiratórias. Então, começamos a ter uma preocupação global não apenas com a perda de biodiversidade, com a perda de um bioma relevante, mas como isso transborda fronteiras e traz uma ameaça significativa em nível global. Temos cerca de 17 milhões de vertebrados silvestres, incluindo espécies endêmicas ameaçadas. Mais uma vez, temos perdas que, se ocorridas no bioma, representam uma perda global.
A Deputada Célia Xakriabá já teve aqui um momento de fala para salientar o que isso representa para os povos tradicionais indígenas, mas acho que é importante relembrarmos que, durante esses incêndios, um dos povos mais emblemáticos do Pantanal, os guatós, têm mais de 80% do seu território queimados. Cicatrizes de fogo indicam que esses incêndios foram iniciados em propriedades privadas adjacentes a esses territórios indígenas.
Então, as comunidades indígenas que têm notoriamente sido conhecidas pelo seu potencial de guardar e resguardar a biodiversidade têm os seus territórios e a sua saúde, o seu bem viver e a sua capacidade de subsistência afetados por incêndios iniciados em propriedades privadas adjacentes. Como ela falou, o Estado do Mato Grosso do Sul é o Estado com a segunda maior população indígena do Brasil e um dos principais palcos hoje de conflitos e de genocídio indígena.
Acho importante salientar que não foi mencionado ainda, no contexto do Bioma Pantanal, que o Pantanal é notoriamente conhecido pela pecuária extensiva. A pecuária no Brasil hoje, infelizmente, é uma das indústrias que mais desmata e também que mais escraviza. Hoje também já temos relatos, evidências e relatórios de violações graves de direitos humanos que ocorrem na planície, para além da violência indígena, também falando de pessoas que são submetidas a trabalho análogo à escravidão, incluindo, apenas na indústria da pecuária, mais de 3 mil pessoas resgatadas na última década em âmbito nacional — isso, diante de alguns anos em que sabemos que houve uma supressão na fiscalização. Então, esses dados possivelmente são muito maiores do que hoje conhecemos.
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Aí nós temos alguns casos emblemáticos, como o de um paraguaio que ficou escravizado em uma propriedade rural no Pantanal por mais de 20 anos.
Então, o Pantanal tem essa relevância global. Depois de 2020, ele passa a ser mais pesquisado, estudado e entendido pela comunidade internacional, que entende o bioma como relevante na luta contra o colapso climático e como casa de espécies ameaçadas.
Eu trago um conceito que é muito discutido lá fora e pouco ouvido ainda em âmbito nacional que é o conceito de extinção da experiência. O Pantanal é muito conhecido pela possibilidade do encontro com a vida silvestre, por esse local das onças, das antas, da fauna, da megafauna carismática, como chamamos, que possibilita o encontro de seres humanos com um dos últimos refúgios silvestres do Brasil e do mundo.
Quando temos uma perda absurda em termos de volume de espécies que ocorrem no bioma, isso ameaça também a possibilidade de experiência de gerações futuras. Então, quando falamos apenas de saúde, quando falamos de biodiversidade, quando falamos de mudanças climáticas, também nos esquecemos às vezes de falar do que está, talvez, além do mensurável, que é essa questão da experiência e da possibilidade de gerações futuras vivenciarem um bioma como o Pantanal.
E hoje temos relatos de muitas pessoas que foram ao Pantanal em 2020 e após 2020. Elas dizem que foram ao Pantanal e não o encontraram lá, justamente porque o Pantanal tem sofrido mudanças tão severas que aquele lugar idílico, que fazia parte do imaginário coletivo, está sendo perdido.
Obviamente, como eu falei, há o entendimento de que as populações indígenas e tradicionais estão cada vez mais vulneráveis e que o Governo brasileiro ainda não tem a capacidade de proteger os seus biomas e os povos originários. Então, há organismos internacionais e outras nações se perguntando: "Estamos vivenciando uma tragédia. E qual é a nossa fatia de responsabilidade dentro do que está acontecendo?" Aí, evidentemente, recaímos na questão do apetite atual e mundial sobre commodities baratas.
Hoje, grande parte das nossas commodities, soja e carne, é produzida para exportação. E, obviamente, o mercado internacional tem um papel em fomentar ou uma pecuária destrutiva ou uma pecuária sustentável, a depender de quais instrumentos jurídicos legais forem adotados e também de quais acordos internacionais forem firmados entre os blocos econômicos com o Brasil.
A União Europeia, que é o bloco econômico no qual a IGF mais atua, em termos de advocacy, esse diálogo com Parlamentares europeus, em 2020, também é impactada por um relatório lançado pelo Greenpeace que indica que pelo menos 15 propriedades responsáveis pelos inícios dos incêndios em 2020 exportavam carne, via JBS, Marfrig e Minerva, para o bloco europeu, para a União Europeia. Então, a União Europeia, que já vem nesse momento — vamos falar um pouco sobre isso — discutindo instrumentos legais capazes de livrar as suas commodities do desmatamento, da violação de direitos humanos, descobre, em uma tragédia de proporções globais, que é consumidora da carne vinda diretamente das fazendas que colocaram fogo no Pantanal dentro de um período proibitivo, após julho, em 2020, e que levaram à perda de uma área maior do que Cingapura, em termos de área queimada e, além das suas propriedades, outras áreas tanto de unidade de conservação como de territórios indígenas. Esse relatório torna-se, de alguma forma, um marco nessa questão da responsabilização do mercado internacional também pelo que acontece nos biomas brasileiros.
Concomitantemente, está sendo discutida na União Europeia uma legislação que foi debatida e foi instrumento de advocacy de diferentes instituições e setores da sociedade civil organizada, que é a lei de produtos livres de desmatamento. Como eu disse, essa lei vem sendo discutida até com comissões que vêm da União Europeia para dialogar com Parlamentares brasileiros, porque ela é de relevância nacional, sendo a União Europeia o segundo maior bloco econômico, em termos de valores, que faz negociações de importação e exportação com o Brasil.
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Então, a lei já estava sendo discutida em 2020 e foi finalmente aprovada em 2023. Mas essa lei traz um marco muito importante nessas negociações entre blocos econômicos, com países que são considerados de alto risco de desmatamento, incluindo o Brasil, a Indonésia e a Malásia, com a possibilidade de impactar de uma maneira muito inédita o modo como essas transações ocorrem.
Eu vou trazer alguns dados aqui só para aqueles que não estão familiarizados. Essa lei basicamente proíbe a União Europeia de importar commodities que tenham, na sua cadeia produtiva, sinais de desmatamento. Por que ela é inédita? Ela não fala apenas de desmatamento ilegal, ela fala de qualquer desmatamento. Ou seja, a União Europeia entendeu que, nos últimos anos, o Brasil terminou com o desmatamento ilegal tornando-o legal. Então, o que a União Europeia faz? Diz: "Eu não quero mais saber se você, Brasil, considera esse desmatamento legal ou ilegal. Temos um entendimento global de que não podemos mais desmatar as nossas florestas. Portanto, eu não quero mais nenhuma dessas sete commodities vinculadas ao desmatamento".
Isso é um marco legal revolucionário em termos globais. E a União Europeia não só é o segundo maior mercado consumidor, importador, mas também normalmente inspira outros mercados a adotarem medidas jurídicas e processos semelhantes. Então, a União Europeia, em 2021, passa a discutir o Forest Act com o mesmo intuito, e outros blocos econômicos começam a despertar para essa questão de como que se consegue regular o mercado internacional a partir de instrumentos legais.
Outra revolução dessa legislação é que ela traz uma data retroativa. Em 2023, é aprovada uma lei na União Europeia que diz: "Eu não quero mais nenhum desmatamento que tenha acontecido a partir de 2020". Ela traz esse aspecto retroativo, diante da premissa de que, em 2020, todos nós já tínhamos um entendimento de que o desmatamento precisava ser combatido. Ela inclui nas suas commodities não só a soja, de extrema relevância para o bioma Pantanal, visto que a soja já começa a adentrar a planície pantaneira, e também tem um alto impacto na bacia do Alto Paraguai. O gado é hoje a principal commodity produzida na planície, mas também a madeira, o café, o cacau, o óleo de palma e a borracha.
De novo, a União Europeia inova ao determinar quais são os países de alto risco e lista o Brasil entre esses sete países, incluindo aí outros países, como já foi dito, a Indonésia e a Malásia, como um país de alto risco de desmatamento diante das taxas absurdas que temos verificado nos últimos anos.
Como eu disse, a União Europeia é o segundo maior mercado mundial em termos de valores, ultrapassando os 16 trilhões de dólares comercializados anualmente. E ela também é o segundo maior exportador e importador, atrás apenas dos Estados Unidos e da China.
E, como eu disse, a lei começa a inspirar outras potências e blocos econômicos a adotarem posições semelhantes. É claro que essa lei, falando especificamente do Pantanal, traz algumas fragilidades que já estão sendo combatidas e analisadas. A primeira delas é que ela determina a proteção de ecossistemas florestais.
Alguns colegas falaram aqui sobre o modo como o Pantanal muitas vezes vem vivenciando essa morte silenciosa, muito à sombra da Amazônia, que ganhou já os olhos do mundo e, de fato, precisa ser uma preocupação global. Mas, quando essa lei é aprovada, foca em ecossistemas florestais de acordo com a definição da FAO de floresta. Então, isso inclui apenas a Mata Atlântica e a Amazônia. E o bioma Pantanal, sendo esse grande ecótono, esse mosaico de diferentes coberturas vegetais, fica exposto ao que chamamos de deslocamento de desmatamento.
Então, o que acontece? Quando a União Europeia determina que não vai mais importar commodities oriundas do desmatamento na Amazônia, esse desmatamento tende a ser deslocado para biomas adjacentes, incluindo o Pantanal. Nós já vivenciamos isso com a moratória da soja, que elevou as taxas de desmatamento no Cerrado. Isso já foi percebido, inclusive pela própria União Europeia, como uma falha nessa legislação. E a União Europeia começou, no dia 1º de junho deste ano, o seu processo de revisão da própria legislação aprovada, já para incluir outros biomas, incluindo principalmente o que eles chamam de "other wooded land", que é o nosso Cerrado, e também muito devido à advocacy, à pressão do terceiro setor relativa a áreas úmidas, para que nós consigamos proteger o Pantanal. Só para vocês terem uma noção, este foi um estudo comissionado pelo próprio Parlamento europeu para saber quanto outros biomas brasileiros estariam expostos ao desmatamento se a legislação fosse aprovada com o viés apenas dos ecossistemas florestais. Apenas cerca de 24% da área total do Pantanal estariam protegidas pela legislação, como cordilheiras e florestas. Uma área maior, 70%, ficaria ainda exposta a esse spillover, a esse deslocamento do desmatamento.
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Então, hoje nós temos feito esse advocacy muito forte. Eu saliento inclusive o lançamento desse relatório que já foi feito no âmbito do Reino Unido e da União Europeia, justamente para ajudar a chamar a atenção dos membros do Parlamento europeu, para que incluam outras áreas úmidas e o Cerrado brasileiro, que nós temos visto, inclusive com dados deste ano, que tem sofrido muito ainda com o desmatamento. E nós não podemos falar em conservar um bioma e expor outros. Ou nós entendemos que eles dialogam e são necessários para a conservação como um todo ou nós vamos acabar protegendo a Amazônia e acabar com o Cerrado.
Outras questões que são criticadas — mas, como eu disse, nós já adentramos um período de revisão e isto deve mudar em breve — são a falta de aprofundamento em relação à violação dos direitos humanos e, também, a questão das outras commodities que precisam ser incluídas. Eu já anuncio, para a alegria de alguns e desespero de outros, que o milho está sendo considerado como uma das commodities a ser incluída neste ano de revisão. Nós sabemos que o milho e a soja brasileira, infelizmente, têm sido responsáveis por grandes taxas de desmatamento nos diferentes biomas.
Para nós não falarmos só desse instrumento regulatório, eu acho que é importante também todos ficarem cientes de que a União Europeia e outros blocos se encaminham para excluírem de suas cadeias de suprimento tanto a violação de direitos humanos quanto o desmatamento, seja ele legal, seja ilegal, através de outros instrumentos também.
Existe a diligência obrigatória para direitos humanos e meio ambiente, que também está sendo discutida no âmbito da União Europeia. Nós temos a diretriz de diligência para sustentabilidade corporativa, então, exigindo que as empresas tragam a verificação, em suas cadeias de suprimento, de haver ou não violação de direitos humanos e desmatamento ou degradação ambiental em suas cadeias.
Agora uma legislação específica sobre o trabalho forçado está sendo discutida. E, mais uma vez, eu saliento as inúmeras evidências e números de trabalhos análogos à escravidão que nós ainda temos, principalmente na indústria da pecuária brasileira, que é hoje a indústria que mais escraviza no Brasil. E nós sabemos que esses dados são extremamente subestimados, porque nós infelizmente ainda temos um esforço baixo de fiscalização.
Em meio a essa discussão internacional sobre instrumentos legais para frear o desmatamento e a violação de direitos humanos no Brasil e em outros países, nós temos o acordo do MERCOSUL sendo revivido pela União Europeia e Brasil. Mas é importante nós lembrarmos que qualquer commodity que faça parte desse acordo ou que seja facilitada por esse acordo estará sujeita a esses instrumentos legais estabelecidos pelo bloco.
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Então, assim, de nada adianta haver uma expectativa de aumento de comércio e faturamento e mercado livre entre os dois blocos se houver ainda, nas nossas commodities, essa mancha da violação aos direitos humanos e do desmatamento, porque a União Europeia não quer mais esses produtos. E o Brasil é identificado como um país de alto risco, o que quer dizer que, pelo menos, 10% de todo produto brasileiro vai ser verificado. E eles esperam que o Brasil tenha — esta é outra coisa que precisamos discutir — informação satelital de onde essas commodities estão sendo produzidas, para que consigamos checar, com o auxílio de tecnologias, se nesses locais houve ou não desmatamento, se eles estão em algumas das listas sujas de fazendas e propriedades que ainda sujeitam seus funcionários a situações degradantes.
Eu acho que é importante falarmos também que não só é esperado um aumento da pressão internacional, mas que vivemos agora uma transição de Governo Executivo, que, para a União Europeia, é de fato um Governo mais simpático e com possibilidade de diálogo maior, mas é importante lembrarmos que a política internacional tem sido cada vez mais focada em resultados.
Então, muitas promessas de campanha foram feitas, há legisladores nesta Casa que se alinham com a pauta do Executivo. Enquanto sociedade civil, eu sempre relembro que o meu papel é ser oposição, independentemente do Governo que esteja eleito. E a União Europeia, assim como nós, cidadãos brasileiros, está focada em resultados, não apenas em promessas, mas de fato no quanto o Brasil vai conseguir diminuir as suas taxas de desmatamento, implementar as políticas públicas necessárias e já discutidas aqui pelos colegas, para a proteção do Pantanal e de outros biomas e também terminarmos, por fim, com a violação de direitos humanos.
Eu trouxe o seguinte número em relação à pecuária: mais de 3 mil trabalhadores foram resgatados de situações análogas à escravidão. Vale lembrar que, se considerarmos outras CNAEs, outras atividades econômicas, esse número passa de 50 mil brasileiros que já foram submetidos a essas situações. Então, só para relembrarmos que isso não é exclusivo da pecuária, não é exclusivo do Bioma Pantanal, e os olhos do mundo estão focados também nisso para além da destruição ambiental.
Já estou terminando, acho que já superestourei o meu tempo. Em âmbito nacional, obviamente, a Environmental Justice Foundation, representada aqui na minha pessoa, e eu também, enquanto brasileira, ecoamos algumas das demandas que já foram feitas pelos colegas. É importante para o Brasil, diante dessa pressão internacional, antes de qualquer coisa, tomar as rédeas da conservação do bioma, porque ou vamos assumir esse bioma enquanto patrimônio majoritariamente brasileiro, apesar de trinacional, e cuidar da sua conservação e da proteção de seus povos, ou vamos ficar suscetíveis a essa pressão internacional de outros países nos dizerem o que é preciso ser feito para estarmos em negociação e em comércio com esse blocos econômicos, ou vamos entender, diante de todos os dados que temos, inclusive os produzidos nacionalmente, o que é preciso ser feito e tomar as rédeas da conservação.
Então hoje, a EJF, através desse relatório, também ecoa algumas das preocupações e pede, principalmente aos legisladores brasileiros, que finalmente caminhemos para a criação de uma legislação federal para o bioma, respeitando a Constituição e o Código Florestal, e que estabeleçamos mecanismos de rastreabilidade. Esse bloco econômico, a União Europeia e outros blocos que virão, quando exige que comprovemos que as nossas cadeias de suprimento estão livres de desmatamento, de destruição ambiental e de violação de direitos humanos, exige que tenhamos mecanismos de rastreabilidade e transparência, no que o Brasil hoje ainda é extremamente incipiente.
Então, acho que, em paralelo a essas legislações específicas do Pantanal, precisamos falar do Guia de Trânsito Animal, precisamos falar de transparência, precisamos falar de como até mesmo eu, consumidora brasileira, vou ter certeza de que a carne que eu como no almoço não está vinculada à sangue indígena, à violação dos direitos humanos, ao desmatamento legal e ilegal. Esse é um direito meu enquanto consumidora. E esses blocos estão cada vez mais entendendo que é um direito deles também, enquanto importadores, terem acesso às informações.
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Obviamente, como o Leonardo já salientou, nós precisamos de políticas de manejo integrado do fogo em âmbito nacional, também, abarcando os dois Estados nos quais o Pantanal se distribui; de prevenção e combate ao desmatamento, que foi, com alegria, uma promessa desse Ministério e que estamos aguardando ansiosamente; do apoio à criação de novas unidades de conservação; do fortalecimento da bioeconomia, incluindo a pecuária de baixo carbono; e, por fim, da recuperação e restauração do que já foi perdido.
O MapBiomas traz, na sua nova coleção, taxas alarmantes de perda de vegetação nativa. De 1985 para cá, um bioma foi queimado em 26% em apenas 1 ano. Como Leonardo trouxe, não existe hoje um banco de sementes para gramíneas nativas e fica até a dúvida de como recuperar um bioma degradado se nem sequer, hoje, há o respaldo e o apoio da ciência e tecnologia na produção dessas sementes, desses bancos de sementes que estão sendo perdidos.
Então, eu encerro a minha fala por aqui. Deixo os meus contatos também para quem precisar ou quiser falar comigo para avançar um pouco nesse debate. Agradeço mais uma vez a presença de todos. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Bandeira de Mello. Bloco/PSB - RJ) - Muito obrigado, Luciana. Foi uma excelente apresentação. É uma pena que precisemos ainda de pressão internacional para fazer o nosso dever de casa, mas você pode ter certeza, pode levar isso lá para o pessoal da EJF, de que nós vamos fazer o dever de casa e esse Governo vai avançar muito. As receitas que você deu são semelhantes às do Eduardo, do Leonardo. O Pantanal precisa de uma legislação específica. Vem aí o PPCDPan também. Tudo isso já está encaminhado.
Então, espero que você volte aqui algum tempo depois para constatar que nós estamos avançando.
Agora eu vou passar a palavra para a Joanice Lube, Superintendente do IBAMA, Mato Grosso do Sul. Ela participará por videoconferência.
A SRA. JOANICE LUBE - Vamos lá. Bom dia a todos. Agradeço o convite. Estou aqui representando o IBAMA. Em nome do Presidente do IBAMA, Rodrigo Agostinho, eu cumprimento os colegas da Mesa, os demais colegas e agradeço pela oportunidade de poder repassar as ações do IBAMA no Bioma Pantanal.
O IBAMA tem um histórico de atuações em todos os biomas: Mata Atlântica, Cerrado, Amazônia e Pantanal. O IBAMA é executor das políticas ambientais do Ministério do Meio Ambiente.
Em relação ao Bioma Pantanal, o histórico de atuações vai desde o PrevFogo, em combate aos incêndios florestais, ao licenciamento ambiental federal e fiscalização. Em relação aos incêndios florestais, as brigadas federais atuam diretamente nas áreas indígenas, nas áreas da União, em assentamentos rurais e têm executado um trabalho em conjunto, interagências, com o Corpo de Bombeiros e também com outras instituições parceiras.
Em relação ao licenciamento ambiental federal, houve uma avanço muito grande da mineração na região. Recentemente houve uma audiência pública em Corumbá, da qual a Superintendência do IBAMA participou, acerca do impacto que a mineração hoje tem gerado no bioma também, em relação à BR-262, ao atropelamento de fauna, cuja competência de fiscalização é federal. A BR é licenciada pelo IBAMA, e há também a questão do DNIT — Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes, que é o responsável pela manutenção e recuperação da rodovia.
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Em relação à fiscalização, o IBAMA atua de acordo com a Lei Complementar nº 140, de 2011. Então, até 2011, havendo atividade irregular sem licença ambiental, a competência é comum aos órgãos ambientais; a partir de 2011, no caso de atividades licenciadas, a competência é do órgão licenciador, ou seja, havendo a informação de um desmatamento irregular com licença ambiental, compete ao IBAMA comunicar ao órgão licenciador para que atue na área. É claro que no Pantanal existe uma grande dificuldade na fiscalização pela questão de logística.
Até 2018, nós realizamos, em conjunto com o Ministério Público Estadual, a fiscalização dos polígonos de desmatamento, independentemente ou não da competência, com o apoio de aeronaves, porém muitas dessas áreas já estavam licenciadas pelo órgão estadual, ou seja, há a competência primária do órgão licenciador. No caso específico de atuação, hoje atuamos em áreas remanescentes de floresta de Mata Atlântica. Então, falou-se muito em cordilheiras, capões, no avanço da supressão dessas áreas. Há polígonos de aplicação da Lei da Mata Atlântica no Bioma Pantanal, um mosaico de vegetação, e a competência é do IBAMA. Então, temos focado as ações nas áreas florestais e em áreas que não têm autorização, em que a competência é comum.
Em relação às demais ações, a questão do avanço hoje é clara, vemos o avanço da soja, da monocultura. Hoje há plantação de arroz, de milho no Pantanal e, com isso, há a preocupação com o uso de agrotóxicos ilegais. Há um avanço no Planalto Central e na área de planície da monocultura, com o uso de agrotóxico ilegal, cuja competência de fiscalização é da União. Então, são atividades em conjunto com os demais órgãos de regulação. Há a prioridade nas ações de combate ao uso do agrotóxico irregular, ilegal. Fazemos fronteiras com a Bolívia e o Paraguai, onde há uma grande facilidade de entrada de produtos ilegais. Esse é um dos grandes problemas associados à monocultura no Pantanal.
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Também como uma das grandes ameaças, hoje vemos associada à monocultura a introdução de espécies exóticas — cuja competência de fiscalização é federal —, como o javali, que tem sido uma preocupação até aqui da EMBRAPA Pantanal no caso das zoonoses. Então, há de ser feito um controle. E, com isso, com a introdução de espécies exóticas, há também a preocupação com o aumento da caça ilegal no Pantanal. Verificamos recentemente a divulgação de matérias acerca de caça, por isso a nossa preocupação.
Eu agradeço a oportunidade e coloco a necessidade realmente de fortalecimento do IBAMA.
Hoje o IBAMA tem mais autonomia, tanto no planejamento quanto na execução. O Bioma Pantanal está localizado em Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. Os dois Estados atuam em conjunto. Recentemente foi lançado o Programa Nacional de Manejo Integrado do Fogo. A Coordenação Regional de Manejo do Fogo, Prevenção e Combate está aqui na Superintendência do IBAMA no Estado de Mato Grosso do Sul.
A Superintendência se coloca à disposição para a discussão das políticas e reforça a necessidade de uma legislação específica para o bioma, considerando que, apesar de ele estar na Constituição, no art. 225, nós, como órgão federal da União, aplicamos as penalidades com base no art. 225, no caso como área de especial proteção. Nós também embargamos as áreas. O embargo é eficiente, restringe o uso da propriedade até a sua regularização. Então, o embargo é extremamente importante para coibir o avanço do desmatamento no Pantanal. E também coloco a questão hoje do avanço dos agrotóxicos. Há necessidade de restrição da monocultura na planície.
Enfim, agradeço a oportunidade e parabenizo a Comissão pela audiência extremamente importante nesse contexto de preocupação com o Bioma Pantanal. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Bandeira de Mello. Bloco/PSB - RJ) - Muito obrigado, Joanice.
Agradeço também ao Presidente Rodrigo Agostinho, do IBAMA, que foi durante muito tempo Parlamentar aqui, Deputado Federal, do meu partido, o PSB, e continua fazendo seus gols de placa, agora no IBAMA.
Encerramos aqui as apresentações.
Não sei se alguém gostaria de se manifestar. (Pausa.)
Não havendo nenhuma proposta de manifestação, eu vou encerrar a presente reunião.
Antes, porém, gostaria de convocar as Deputadas e os Deputados membros deste Colegiado para o Seminário Patrimônio Verde, o Produto da Vocação do Brasil, desta Comissão de Legislação Participativa, a ser realizado amanhã, quarta-feira, dia 14 de junho, às 10 horas, no Auditório Nereu Ramos.
12:31
RF
Aproveito também para fazer o comercial do lançamento da Frente Parlamentar para Modernização do Futebol Brasileiro, que vai acontecer na quinta-feira, às 11 horas.
Para quem gosta de futebol, para quem projeta alguma coisa melhor para o nosso futebol mais na frente, inclusive os tricolores aqui presentes, estão todos convidados para esse evento.
Um grande abraço! Saudações! Até a próxima. (Palmas.)
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