1ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA 57 ª LEGISLATURA
Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania
(Reunião de Comparecimento de Ministro de Estado (semipresencial))
Em 31 de Maio de 2023 (Quarta-Feira)
às 15 horas
Horário (Texto com redação final.)
15:14
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O SR. PRESIDENTE (Rui Falcão. Bloco/PT - SP) - Declaro aberta a 22ª Reunião Extraordinária da Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania.
Boa tarde a todos e todas.
A presente reunião conta com o comparecimento da Ministra dos Povos Indígenas, a Sra. Sônia Guajajara.
Agradeço desde já a sua presença, Ministra.
Em apreciação a Ata da 21ª Reunião Deliberativa Extraordinária, realizada no dia 31 de maio de 2023.
De acordo com o Ato nº 123, de 2020, art. 5º, está dispensada a leitura da ata.
Em votação a ata.
Os Srs. Deputados e as Sras. Deputadas que a aprovam permaneçam como se encontram. (Pausa.)
Aprovada.
Informo que não há expediente para esta reunião.
Informo que esta reunião de comparecimento da Ministra dos Povos Indígenas, a Sra. Sônia Guajajara, foi convocada em virtude da aprovação do Requerimento nº 16, de 2023, de autoria da Deputada Caroline de Toni e outros.
Antes de conceder a palavra à Ministra, esclareço rapidamente e relembro quais são os procedimentos para a condução dos trabalhos, acordados na reunião dos coordenadores e devidamente divulgados. A inscrição para os debates é exclusiva pelo aplicativo Infoleg, em lista única, aberta desde as 14 horas, e será encerrada no início dos debates. Inicialmente, será concedida a palavra à Ministra por 30 minutos, prorrogáveis a juízo da Comissão, para a sua exposição, não podendo ser aparteada, conforme estatui o art. 21, caput, § 1º, inciso XIII, e art. 176, §§ 1º e 2º, inciso V, e § 3º. Em seguida, a autora do requerimento disporá de 5 minutos para as suas interpelações, seguindo os preceitos do art. 102, § 2º, do Regimento Interno. Após a fala da Deputada, a Ministra responderá as interpelações também por 5 minutos. Na sequência, os Parlamentares e as Parlamentares usarão da palavra na ordem de inscrição, com prioridade para os membros, em blocos de quatro oradores. Cada bloco será composto por três inscritos da lista de debates e um Líder inscrito para o uso do tempo de Liderança. O tempo previsto para cada Deputado inscrito será de 3 minutos. O tempo de Comunicação de Liderança será proporcional à bancada e poderá ser solicitado e adicionado ao tempo de interpelação, desde que respeitada a ordem de inscrição, não podendo ser usado para obter preferência em relação aos demais inscritos. A Ministra responderá aos questionamentos em 12 minutos, após a manifestação de cada bloco, composto por três Deputados e um Líder, não havendo nem réplicas, nem tréplicas. A reunião terá a duração de até 4 horas — até!
Comunico ainda que esta Presidência seguirá os preceitos regimentais. O Deputado ou a Deputada que não estiver presente no momento em que o seu nome for chamado perderá definitivamente a inscrição. A Ministra somente poderá ser interpelada sobre matéria pertinente ao requerimento objeto desta reunião. O tempo destinado a cada orador será observado para que o maior número de Deputados e Deputadas tenha a oportunidade de se pronunciar.
15:18
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Feitos esses esclarecimentos, passo a palavra à Ministra Sônia Guajajara, para a sua apresentação.
Tem V.Exa. a palavra, por 30 minutos.
A SRA. MINISTRA SÔNIA GUAJAJARA - Boa tarde a todas, todos e todes.
Muito obrigada, Deputado Rui Falcão.
Quero cumprimentar também aqui a Deputada Caroline de Toni, que me fez este primeiro convocatório, depois transformado em convite para eu estar aqui hoje, trazendo as informações sobre as políticas desenvolvidas pelo Ministério dos Povos Indígenas, esse Ministério que é uma conquista histórica para o nosso País, fruto da articulação e mobilização dos povos indígenas.
Cumprimento também o Presidente da Comissão, o Deputado Rui Falcão, bem como a nossa parentíssima Deputada Célia Xakriabá. Na pessoa da Deputada, cumprimento todas e todos os Parlamentares aqui presentes.
Por fim, quero cumprimentar também aqui a parentíssima Joenia Wapichana, Presidenta da FUNAI, a primeira mulher indígena a presidir a Fundação Nacional dos Povos Indígenas. Na pessoa dela, quero cumprimentar todas as pessoas que acompanham esta audiência presencialmente e também através da TV Câmara e pela Internet.
Antes de mais nada, quero iniciar a minha exposição afirmando que a criação do Ministério dos Povos Indígenas é uma enorme conquista não só para os povos indígenas, mas para a sociedade brasileira. Ao criar o Ministério dos Povos Indígenas, o Presidente Lula sinaliza para a Nação brasileira e para o mundo o seu compromisso com os direitos humanos, com a preservação do meio ambiente e, acima de tudo, com a defesa dos povos indígenas. Toda e qualquer pessoa que, minimamente, conheça a história deste País tem o compromisso ético de reconhecer que, desde a invasão desse território, que se deu em 1500, nós povos indígenas somos vítimas de toda sorte de violências e violações de direito, as quais nem preciso mencionar, caso contrário, teríamos que ficar aqui por dias, meses e anos, tamanha a quantidade de situações dolorosas vivenciadas pelos povos indígenas no Brasil.
Todos esses casos de violência retratam a negligência, a omissão e até mesmo o genocídio institucionalizado praticado pelo Estado brasileiro contra os povos indígenas. Contudo, a despeito de todas as tentativas daqueles e daquelas que desejaram e desejam o nosso extermínio, nós povos indígenas resistimos, lutamos, articulamo-nos e estamos aqui. Muitos de nós tombaram na luta, derramaram o seu sangue, perderam seus entes queridos para que hoje eu pudesse estar aqui falando nesta Comissão enquanto Ministra de Estado. Para que outras mulheres indígenas, como a Deputada Célia Xakriabá e a Presidência da FUNAI, Joenia Wapichana, pudessem estar ocupando os cargos que hoje ocupam, muita gente ficou pelo caminho. Nossa luta e nossa resistência valeram a pena. Aldeamos a política e começamos a superar a sub-representatividade em todos os espaços.
15:22
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Não iremos mais tolerar que outras pessoas falem por nós, pensem por nós e decidam o nosso futuro, sem a nossa participação. E digo mais: comecem a se acostumar, pois, cada vez mais, vocês verão a presença dos povos indígenas ocupando os espaços de poder e decisão. É um novo momento e, didaticamente, se faz necessário repetirmos a emblemática frase: “Nunca mais um Brasil sem nós”.
Sabemos que, infelizmente, para muitas pessoas neste País ainda é muito difícil compreender o conceito da dívida histórica. Até mesmo para alguns Parlamentares desta Casa as políticas públicas afirmativas que visam à reparação dessa dívida histórica nem deveriam existir. Ao que assistimos no Senado Federal na semana passada e aqui na Câmara dos Deputados, tanto na semana passada como no dia de ontem, demonstra a triste realidade de um Parlamento que, partindo da postura racista e preconceituosa de alguns de seus membros, não se constrange em aprovar proposituras que ferem o direito constitucional dos povos indígenas. Quero lembrar a todos e todas que a tentativa de legislar contra cláusulas pétreas não faz parte das atribuições dos Parlamentares desta Casa. Uma lei ordinária jamais terá o poder de alterar o texto constitucional.
Aprovar o Projeto de Lei nº 490, de 2007, é uma demonstração clara de postura anti-indígena de alguns Parlamentares desta Casa. Retirar a atribuição do ato demarcatório do Ministério dos Povos Indígenas e transferi-la para a o Ministério da Justiça é uma tentativa óbvia de esvaziamento da Pasta que hoje ocupamos. Além disso, explicita a postura preconceituosa de alguns Parlamentares que insistem em querer tutelar a nós, povos indígenas, como se fôssemos incapazes de conduzir os processos de demarcação dos territórios indígenas. É preciso esclarecer a este Parlamento e à sociedade brasileira como um todo que existe uma legislação vigente que orienta todo e qualquer processo de identificação, delimitação, declaração e homologação de uma terra indígena, conforme o Decreto nº 1.775, de 1996, seguindo critérios rígidos e técnicos que se fundam na Constituição Federal e também na ciência. Todos esses critérios foram e continuarão sendo observados em todos os processos de demarcação que forem encaminhados à Pasta dos Povos Indígenas. Afirmar o contrário, sem apresentar provas ou se fundamentando em teses jurídicas inconstitucionais, como a do marco temporal, é o mesmo que propagar falácias, com o único objetivo de confundir a opinião pública no que tange ao direito territorial originário dos povos indígenas. Entre as ações que o Ministério dos Povos Indígenas vem desenvolvendo podemos destacar: o enfrentamento à crise humanitária enfrentada pelo povo e ianomâmi no Estado de Roraima; a retomada da Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental de Terras Indígenas; a retomada do funcionamento do Conselho Nacional de Política Indigenista, que é um conselho paritário que contempla povos indígenas de todos os Estados e também órgãos do Executivo; a atualização dos processos demarcatórios; a articulação para o cumprimento da ADPF 709, uma decisão do Supremo Tribunal Federal de 2020 que foi negada pelo Governo passado e a qual e nós articulamos neste ano para que seja cumprida; a articulação para a restruturação predial funcional da Fundação Nacional dos Povos Indígenas; o encaminhamento do plano de carreira dos servidores e servidoras da FUNAI e concurso público para contratação de mais servidores, porque hoje o déficit é de 1.700 servidores. Para compensar a perda dos últimos anos, teríamos que ter um total de 3 mil servidores e servidores na FUNAI.
15:26
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Na justificativa do requerimento de convite que me enviou, a Deputada Caroline de Toni, referindo-se aos conflitos que envolvem a territorialidade indígena, afirma que "o princípio constitucional fundamental do direito à propriedade (...) perde notoriedade, predominando, na maioria dos casos, a primazia indígena (...)". Partindo dessa afirmação que a princípio pode parecer factual, quero esclarecer que aquilo que a Deputada chama de "primazia indígena" a Constituição Federal chama de direito originário.
O texto constitucional, no art. 231, reconhece que o direito dos povos indígenas ao território que tradicionalmente ocupam é originário, portanto, antecede a própria Constituição Federal. Posto isso, faz-se necessário lembrar que não podemos jamais separar os direitos territoriais dos povos indígenas dos seus direitos culturais, bem como do seu direito de viver de acordo com os usos, costumes e tradições. Assegurar a posse permanente e o usufruto exclusivo é uma necessidade urgente para que os povos tenham a possibilidade de reprodução física e cultural. Por conseguinte, respeitar o direito territorial originário dos povos indígenas é o mesmo que lhes assegurar condições dignas de vida.
Embora esteja assegurado pela Lei Maior do nosso País, o que temos visto é que o direito dos povos indígenas aos seus territórios tem sofrido inúmeros ataques e enfrenta preocupantes ameaças, como essa trazida pelo Projeto de Lei nº 490, de 2007. Além da violência física e inúmeras violações de direitos que enfrentam cotidianamente em seus territórios, os povos indígenas são obrigados a enfrentar também a violência institucional. Podemos citar os inúmeros processos no âmbito dos Três Poderes que visam limitar e coibir os direitos dos povos indígenas aos seus territórios, bem como outros direitos fundamentais. Nesse sentido, confiando no senso de justiça e no espírito democrático que move aqueles e aquelas que buscam o bem comum, conclamo os Parlamentares desta Casa de Leis a rejeitarem o PL 490/07. O direito dos povos indígenas não começa em 1988. O esforço para assegurar os direitos territoriais dos indígenas é fundamental para que o Brasil se converta em uma Nação que respeita a ordem constitucional. Sem a garantia e a consolidação dos direitos territoriais, nosso País jamais alcançará uma configuração de sociedade pluriétnica, pluricultural e plurinacional, como indica a nossa Carta Magna. Este Parlamento precisa compreender que o programa político do Governo anterior foi derrotado nas urnas. A necropolítica, a politica de morte do Governo derrotado, deu lugar a um programa de governo que respeita e celebra as diferenças de um país pluriétnico, plurinacional e pluricultural.
15:30
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Quero deixar claro que, apesar das investidas deste Parlamento que visam restringir e negar os direitos constitucionais dos povos indígenas, o compromisso do Presidente Lula em garantir as pautas socioambientais e indígenas permanece de pé. Apesar das movimentações do Congresso Nacional para tentar alterar a estrutura organizacional do atual Governo, a política de demarcação das terras indígenas prosseguirá. Inclusive, uma pesquisa recente apontou que a política pública mais aprovada do atual Governo é exatamente a demarcação das terras indígenas.
A sociedade brasileira e o mundo inteiro reconhecem a necessidade urgente de respeitarmos o meio ambiente e os povos indígenas. Acompanhamos nos últimos anos a imagem do Brasil sendo manchada no cenário internacional devido à postura negligente e omissa do Governo derrotado. A conivência do Estado brasileiro em relação às inúmeras violações de direitos sofridas pelos povos indígenas envergonham a sociedade brasileira e colocam o nosso País no rol daqueles que não preservam a sua biodiversidade, bem como negam a sua história e a sua cultura. No mínimo, é uma grande responsabilidade a postura de um Parlamento que atua virando as costas para a opinião pública e para os indicadores que apontam a emergência climática que está em curso no nosso planeta.
No seu requerimento de convite, a Deputada Caroline de Toni também solicita algumas informações sobre as terras indígenas da Região Sul, situações de conflito entre indígenas e proprietários rurais, situações de sobreposição e levanta alguns questionamentos sobre as informações disponibilizadas pelos sites da FUNAI e do MPI — Ministério dos Povos Indígenas.
Com relação à situação das terras indígenas, eu gostaria de esclarecer que apenas 10% das terras indígenas regularizadas estão situadas na Região Sul. No Rio Grande do Sul, em hectares, a ocupação indígena corresponde a 0,40% do território total do Estado; no Paraná, a 0,62%; e no Estado da Deputada, Santa Catarina, a apenas 0,86%. Portanto, na Região Sul, a ocupação indígena não corresponde sequer a 1% do território total de cada um desses Estados.
15:34
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Eu gostaria de convidar a Deputada a fazer um esforço para conhecer melhor o seu Estado visitando esses territórios. Santa Catarina também é terra indígena, Deputada. Percorrer esses territórios vai lhe fazer conhecer melhor as questões indígenas e a realidade indígena nesse Estado. Converse com as lideranças, escute as mulheres, olhe nos olhos das crianças, busque mais informações sobre as dificuldades e as violências que sofrem cotidianamente. Procure conhecer a história de Santa Catarina, que está manchada com o sangue dos povos indígenas, que ao longo dos anos vêm sofrendo e resistindo a diversas formas de violência, inclusive violência institucionalizada.
Não sei se a Deputada conhece a história do terrível massacre que aconteceu em 1904. Naquele ano, em um só dia, 244 indígenas do povo xokleng foram covardemente mortos pelos chamados bugreiros — milicianos contratados para perseguir e matar os indígenas —, com a conivência do Estado. Sem conhecer o passado, jamais construiremos um futuro mais justo e fraterno para todos e todas.
Sobre os conflitos entre indígenas e proprietários rurais, sabemos que eles existem, inclusive aumentaram consideravelmente nos últimos anos. A razão para que esses conflitos não cessem é apenas uma: a morosidade do Estado brasileiro em demarcar os territórios indígenas. Não haverá segurança jurídica no campo sem que todas as terras indígenas sejam demarcadas. Alguns desses conflitos acontecem por conta das sobreposições. Aqui aproveito para esclarecer a Deputada que não são as terras indígenas que estão sobrepostas às propriedades rurais, ao contrário, as propriedades rurais é que avançaram e continuam avançando sobre os territórios indígenas. É importante ressaltar que apenas 18,6% das áreas sobrepostas são utilizadas para a produção agropecuária, sendo 55,6% desse total ocupado por pasto e 34,6% por soja. Entre 2008 e 2021, 46 mil hectares foram desmatados em áreas de sobreposição de fazendas em terras indígenas.
No Município paranaense de Ivaté, no Paraná, ocorre a maior sobreposição da Região Sul pela Fazenda São Francisco, que tem 2.679 dos seus 4 mil hectares, mais da metade da fazenda, incidindo na Terra Indígena Herarekã Xetá, que aguarda a delimitação pela FUNAI desde 2014. Com uma área total de 2.686 hectares, sobrariam apenas 7 hectares para o povo xetá sobreviver, viver, caçar, colher e plantar. O resto do território ancestral serve de pasto, lavoura de café e plantio de cana para a produção de etanol. A monocultura desenfreada forma verdadeiros desertos verdes, e nesses lugares não há espaço para a vida dos povos indígenas.
15:38
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A respeito dos dados disponibilizados pelos sites do Ministério dos Povos Indígenas e da FUNAI, quero informar à Deputada que, apesar de se tratar de uma pasta recém-criada, o Ministério dos Povos Indígenas tem se esforçado bastante para informar aos povos indígenas e à sociedade brasileira como um todo sobre as ações que estão sendo desenvolvidas, tentando recuperar as informações e dados que foram negligenciados, subnotificados e ocultados pela gestão passada.
Nós não somos irresponsáveis de publicar dados que não sejam confirmados ou que não sejam reais. É muito importante que a nossa gestão possa confirmar, atualizar tudo o que vai ser publicado em nossos sites. E, por se tratar de uma Pasta nova, o nosso Ministério não possui orçamento. Todos sabem que o Ministério dos Povos Indígenas é um Ministério de articulação, e nós estamos trabalhando agora o nosso primeiro PPA em articulação com outros Ministérios. Inclusive, quero sugerir aqui, já que a Deputada demonstra tanta preocupação com a comunicação do nosso Ministério, que destine uma emenda parlamentar para que possamos estruturar melhor o nosso departamento de comunicação.
Por fim, eu quero agradecer o esforço e o empenho de todos e todas que corajosamente, para barrar o PL 490/07 neste Parlamento, estiveram do nosso lado, do lado certo da história. Apesar do que assisti aqui ontem, tenho esperança e acredito que os Parlamentares e as Parlamentares comprometidos com a vida irão se empenhar para barrar o projeto no Senado.
Nunca mais um Brasil sem nós!
E estou aqui à disposição para responder a toda e qualquer pergunta ou questionamento.
Muito obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Rui Falcão. Bloco/PT - SP) - Agradeço as palavras da Ministra.
Antes de seguir a ordem das inscrições, concedo a palavra, primeiramente, à autora do requerimento, Deputada Caroline de Toni, pelo prazo de 5 minutos.
A SRA. CAROLINE DE TONI (PL - SC) - Presidente, eu quero que agregue o tempo de Líder do PL ao meu tempo regimental.
O SR. PRESIDENTE (Rui Falcão. Bloco/PT - SP) - Pois não, Deputada.
A SRA. CAROLINE DE TONI (PL - SC) - Muito obrigada.
Quero cumprimentar o Presidente, a Ministra Sônia, também a Joenia, Presidente da FUNAI, e quero começar, Presidente, agradecendo a realização da presente audiência, muito importante para esclarecermos alguns pontos que, para nós, ainda não estão muito claros.
Em primeiro lugar, Presidente, quero informar que eu fiz um requerimento de informação à Ministra para que ela respondesse por qual motivo foi realizado um acordo de cooperação com a Alemanha para proteção e gestão sustentável em terras indígenas na Amazônia Legal.
15:42
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Presidente, olhando esta foto do encontro realizado, ao qual esteve presente a Presidente da FUNAI, Joenia, eu vejo que, fora a Presidente Joenia, não havia nenhum índio sendo representado. Só havia vários homens brancos alemães.
Também gostaria de saber, Presidente, da Ministra Sônia como é que o Brasil vai realizar um acordo com a Alemanha para proteção e gestão das terras indígenas. Isso significa dizer que estamos assumindo que o Brasil — no caso, a FUNAI e o Ministério dos Povos Indígenas — não teria competência nem capacidade para fazer a gestão e a proteção dos povos indígenas. É preciso que um país estrangeiro, que os alemães venham para o Brasil? Afinal de contas, por que a Alemanha vai proteger melhor as terras indígenas do que o próprio Brasil? O que a Alemanha ganha com isso? Qual é o interesse deles nas nossas terras indígenas?
Esse requerimento de informação foi protocolado e já chegou ao conhecimento do Ministério. Decorridos mais de 30 dias, prazo constitucional para ser respondido, não houve resposta. Eu não sei se a Ministra sabe que — mas, na condição de Ministra de Estado, deveria saber —, caso não responda a um requerimento de informação, há o possível cometimento, a configuração de crime de responsabilidade. Foi dada a oportunidade para responder por escrito, com tempo, e não o fez. É por isso que eu estou fazendo esse primeiro questionamento à Ministra, para que ela responda.
Choca-nos saber que queremos defender a nossa soberania nacional, o nosso território, mas está sendo entregue aos alemães essa competência. Isso assusta o Brasil. Temos que entender quais os termos desse acordo. Espero que traga cópia desse acordo, para vermos o que ele abrange, Presidente, porque até agora não pudemos acessá-lo. Inclusive, desde o início do ano, estou tentando acessar o site do Sistema Indigenista de Informação, no qual constam todos os dados em estudo, sobre demarcação, homologação, e não consegui ter acesso.
Tive que fazer uma denúncia ao Ministério Público Federal, porque até o final de abril não estava no ar o site, vinculado à FUNAI. E, logo depois dessa denúncia, misteriosamente o site voltou ao ar, mas só com leiaute, sem os dados. Apenas ontem, quando tentei acessar o site, pude ver que, finalmente, os dados acerca de toda a questão indigenista no Brasil voltaram a ficar disponíveis, então, para acesso público. Por isso, eu gostaria de saber por que uma informação pública de interesse nacional ficou fora do ar por tanto tempo.
Agora vamos falar sobre a coincidência de ontem termos votado, no Plenário da Casa, a questão do marco temporal, o PL 490, para tornar lei os parâmetros de uma decisão do próprio Supremo Tribunal Federal para trazer segurança jurídica, paz no campo e proteção ao direito de propriedade. Então, aprovamos na Câmara Federal, e agora a matéria vai para o Senado.
Só que, a partir do início do mês que vem, nós temos marcado um julgamento no Supremo Tribunal Federal, em que há a possibilidade de derrubada, via decisão judicial, dos parâmetros do marco temporal. Caso o marco temporal caia por decisão do Supremo Tribunal Federal... E eu quero citar uma fala da própria Ministra nesta audiência. Ela afirma e reafirma justamente a teoria indigenista de que, a partir da invasão de 1500, quando os índios eram os proprietários do Brasil, no caso, tem que ser feita essa... Segundo a visão dela, todo o território é dos indígenas. A Ministra continua afirmando isso.
O que eu gostaria de levantar é que, uma vez que o marco temporal caia e percamos esses parâmetros, isso significa dizer que qualquer lugar do Brasil, seja rural, seja urbano, poderá ser considerado território indígena. O que garante que o Centro de São Paulo e a Praia de Copacabana não sejam reivindicados como terra indígena? Então, perderemos justamente a segurança jurídica no País.
15:46
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Eu gostaria que a Ministra respondesse também se realmente acredita que os demais brasileiros que nasceram nesta terra, pois todos somos brasileiros, os que nasceram depois, os que vieram, muitas vezes, sei lá, de fora, imigrantes de outros países que moram aqui... Eu entendo que também têm o direito de viver aqui. O País é um território imenso, o Brasil é um território imenso, onde todos podemos viver harmonicamente. Essa narrativa, que é reiterada, acaba dividindo o povo brasileiro.
Justamente, a Ministra disse que eu deveria estudar os casos de Santa Catarina. Eu fui lá, Ministra, a uma audiência pública, recentemente, no Município de Saudades e Cunha Porã, onde foi feita uma demarcação. Eles questionaram o laudo antropológico, porque, quando aqueles imigrantes foram para lá, há mais de 100 anos, não havia aldeia indígena. E o laudo antropológico foi derrubado na Justiça. Ganharam em primeiro e segundo graus e no STJ. Só que a FUNAI recorreu ao STF, e veio toda essa repercussão geral de outro caso de Santa Catarina. Mas esse processo tem hoje repercussão geral.
Eu vi cinco gerações, senhorinhas de 80 anos — eu queria saber também se a Ministra vai falar com essas pessoas que têm propriedade pequena, porque em Santa Catarina todas as propriedades são de agricultura familiar —, quinta geração, pessoas chorando, dizendo assim: "Nosso único pedaço de terra, onde a gente produz e tira o sustento da nossa família, nós vamos perder. E a gente sabe que nunca teve índio aqui. Desde que nós estamos aqui, não tem índio aqui". E não havia índio lá em 1988. Eles estão desesperados!
Será que essas pessoas também não merecem respeito e proteção? Eles têm a titulação dada pelo Estado, algo legítimo, provado na Justiça. E agora, caso caia o marco temporal, mais de mil pessoas vão perder a pequena agricultura familiar. E não havia índio lá. Por isso, eu digo que temos que olhar caso a caso para não fazer injustiça.
Então, Ministra, essas são algumas questões que eu quero que a senhora responda, mas, ao mesmo tempo, eu tenho outros questionamentos a fazer, aproveitando o meu tempo.
Neste ano foram demarcados mais seis territórios, ou foram homologados pelo Presidente da República. Eu queria saber se a Ministra tem informação sobre quantas famílias serão desapropriadas a partir dessa decisão. E, segundo relatórios da própria FUNAI no site, 117 processos em estudo também vão delimitar novas terras como terras indígenas. Pergunto se a senhora sabe quantas famílias vão ser desapropriadas nesses processos. Parece que está havendo realmente um conflito no campo. A nossa intenção, ao aprovar o marco temporal, é justamente não gerar esses conflitos, até porque nós entendemos...
Com o devido respeito, Ministra, eu quero que a senhora tente visualizar isso que eu estou tentando demonstrar. Santa Catarina inteira corresponde a 1% do território nacional, e lá nós albergamos 7 milhões e meio de catarinenses. O Estado de São Paulo, que é o Estado mais populoso do Brasil, corresponde a 3% do território nacional, e lá moram 46 milhões de paulistas. Segundo o último Censo, temos pouco mais de 1 milhão de índios no Brasil. Esse pouco mais de 1 milhão de índios que existem no Brasil detém já 14% do território nacional. Será que realmente está faltando terra para os índios? Será que não está faltando política pública, acesso à saúde, acesso à educação, vida digna para os povos indígenas?
Então, é isso que questionamos, porque acreditamos que somos todos brasileiros. Não temos brasileiros de primeira e segunda categoria. Nós temos que respeitar a autodeterminação dos povos, mas também a liberdade individual. Por exemplo, nós entendemos que, se os índios parecis querem produzir, ter produção agrícola, eles têm que ter esse direito, e não serem perseguidos por ONGs ou entidades que dizem representá-los. Eles têm que ter liberdade de escolha, inclusive se querem desempenhar uma atividade econômica. Queria que a Ministra falasse sobre o caso dos índios parecis, o que ela pensa de os índios terem produção econômica, tirarem da terra o sustento, porque entendemos que isso também é uma forma de escolha de vida, que devemos respeitar.
15:50
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Há outra situação, Ministra, que eu gostaria que fosse esclarecida. Nós percebemos, ao analisarmos a estrutura da FUNAI e a estrutura do seu Ministério, que existem ali órgãos, departamentos que estão replicados. Há no Ministério um departamento de gestão ambiental e na FUNAI, igualmente, uma coordenadoria de gestão ambiental. Há no Ministério um departamento para mediar conflitos, e na FUNAI também existe um departamento para mediar conflitos, e há também um departamento de etnodesenvolvimento, dentre outros.
Considerando, Ministra, o princípio da eficiência constitucional e que há competências em duplicidade, unidades exercendo o mesmo trabalho, não seria melhor reforçar a atuação do órgão, em vez de criar uma estrutura com funcionário, com despesas iguais, se as competências são as mesmas?
Ademais, Ministra, na sua participação na Comissão da Amazônia, você focou falar sobre demarcação, que é competência do Ministério, que o seu foco de atuação, perdão, é falar sobre demarcação, saúde e educação dos povos indígenas. Entendemos que demarcação é competência exclusiva do seu Ministério, basicamente. Mas, com esse novo substitutivo, ela está para sair da atribuição do Ministério. Ainda que vocês articulem questões de saúde, nós sabemos que existe um órgão específico que cuida da saúde indígena, que é a SESAI, e a educação é realizada pelo MEC. Já que essas políticas são realizadas por outros órgãos e Ministérios, o que o seu Ministério vai executar diretamente ou o que a senhora executou efetiva e diretamente nesses últimos 5 meses, ou, caso seja mudada a questão dos órgãos, vai executar a partir de então?
Eu acredito, Ministra, que, neste momento, eram essas as considerações que eu tinha para realizar e gostaria que a Ministra pudesse responder a todas essas questões.
Muito obrigada pela atenção.
Era isso.
E quero saber se posso compartilhar o tempo restante, Presidente — 1 minuto e 40 segundos —, com a Deputada Coronel Fernanda, pois ela terá que ir a uma audiência no STF.
O SR. PRESIDENTE (Rui Falcão. Bloco/PT - SP) - V.Exa. tem 1 minuto e 40 segundos, Deputada Coronel Fernanda.
A SRA. CORONEL FERNANDA (PL - MT) - Obrigada.
Boa tarde, Ministra. Quando vejo mulheres, principalmente índias, hoje em cargos de poder, eu questiono, Ministra. Eu conheço bem, no meu Estado há várias tribos indígenas. Eu sou amiga de vários índios, inclusive do índio Tserere, que hoje se encontra preso.
Eu gostaria já de começar a perguntar à senhora o seguinte. Existem lá a tribo xavante, que hoje também tem produção agrícola, a tribo pareci, que a Deputada Caroline acabou de citar, e eu vi como foi importante a produção ali de milho, soja. Eu vi muitas índias, principalmente — falo das índias porque existe uma questão tradicional de que o homem índio tem mais poder dentro da tribo do que a mulher índia —, se formarem engenheiras agrônomas, advogadas, médicas, professoras com o custo da produção, melhorando sua qualidade de vida. Nesse sentido, como a senhora e todas as outras que estão aqui, graças a Deus, espero que haja mais. Como a senhora vê, sendo Ministra e tendo uma vida de mais qualidade, morando num imóvel adequado, vivendo uma realidade tecnológica, que se pode fornecer isso para as tribos indígenas?
15:54
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Também fui questionada pelos índios para tratarmos com a FUNAI sobre a questão da saúde, que está faltando muito, principalmente na região de Campinápolis.
(O microfone é desligado.)
O SR. PRESIDENTE (Rui Falcão. Bloco/PT - SP) - Só um esclarecimento. Naturalmente, a Presidência não restringe a palavra dos Deputados e das Deputadas. Entretanto há um regimento, e nas audiências, tanto da parte de Deputados quando dos convidados, deve-se ater ao tema proposto.
As questões foram mais amplas. Então, esclareço à Ministra que, se S.Exa. quiser responder a todas as perguntas, mesmo aquelas que não se cingiam exclusivamente ao requerimento, pode fazê-lo, mas não está obrigada.
Feito o esclarecimento, havia também outros autores do requerimento, o Deputado Capitão Alberto Neto e o Deputado Cobalchini, mas eles estão ausentes no momento.
Então, eu passo a palavra à Ministra, para que ela possa responder às perguntas da autora do requerimento, por 5 minutos.
A SRA. MINISTRA SÔNIA GUAJAJARA - Eu queria pedir permissão para compartilhar aqui o tempo, Presidente, com a Presidente da FUNAI, porque algumas das perguntas feitas competem a ela, e também com o nosso Secretário-Executivo.
Em relação ao acordo de cooperação com a Alemanha, eu gostaria muito de ressaltar um acordo de cooperação que aconteceu com a Alemanha ainda em 1992. Na ocasião da Eco 92, quando o mundo inteiro estava preocupado com a proteção ambiental e com a preservação da biodiversidade, o Brasil não tinha condições de garantir essa proteção sozinho. Então, a Alemanha foi um país que muito colaborou, inclusive para apoiar os processos de demarcação de terras indígenas na Amazônia brasileira. E aqui se formou uma cooperação com a Alemanha e adotou o Projeto Integrado de Proteção às Populações e Terras Indígenas da Amazônia Legal, que garantiu que a Amazônia pudesse avançar com a demarcação das terras indígenas.
Recentemente, a Alemanha demonstrou esse interesse de voltar a apoiar os povos indígenas. Essa cooperação foi firmada com a FUNAI.
Portanto, eu passo a palavra para a Presidenta Joenia, para que possa falar sobre essa cooperação.
A SRA. JOENIA WAPICHANA - Primeiramente, boa tarde. Para mim, é uma honra retornar à CCJ, uma Comissão tão importante para o povo brasileiro, principalmente para os indígenas.
Foram boas as perguntas para tirarmos dúvidas de alguma situação de que não tenham conhecimento.
A nossa legislação brasileira permite termos de cooperação. O primeiro ponto é esse. Todas as parcerias que a FUNAI tem são embasadas, regulamentadas e respaldadas na nossa legislação, que inclusive passam por aprovação desta Casa.
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O segundo ponto é que o termo mencionado na pergunta, o termo de cooperação com o KFW, como vocês disseram, já existe desde 2009, mas, desde 2017, está paralisado por conta da falta de interesse da última gestão em executar alguns programas que viriam fazer a proteção e a recuperação de algumas áreas.
Então, a FUNAI está retornando às suas obrigações institucionais, inclusive as que estavam engavetadas, para proteger terras indígenas. Infelizmente, o quadro deplorável que nós encontramos na FUNAI diz respeito muito a processos não somente de demarcação de terras indígenas, mas também de termos que já tinham sido firmados em outras gestões e que agora estamos fazendo andar.
Então, o termo de cooperação não foi firmado este ano. Havia termos que estavam paralisados e que visam a estrutura da FUNAI, dar a ela uma eficiência mais constitucional para que possa atender os povos indígenas. Eles não estão relacionados a demarcação, e sim a ações de estruturação.
Essa é uma parceria que nós estamos ainda retomando e atualizando. O termo foi assinado, só para afirmar novamente, em 2009 e, desde 2017, está sem ação. Mas agora ele está sendo retornado, para se fazer essa estruturação nas unidades da FUNAI.
Sobre os outros pontos, Ministra, vou aproveitar para responder já. Quero esclarecer novamente que, quando se trata da questão do site da FUNAI, há um questionamento bastante importante, como eu digo. Mas digo novamente que a nossa gestão agora está tentando recuperar uma série de situações que encontramos na FUNAI, inclusive no site. Para nós também é um desafio fazer a recuperação de dados, fazer com que haja maior transparência. E essa também é uma ação em que a FUNAI está se debruçando agora, para retomar essas ferramentas que visam melhores informações para a sociedade brasileira.
Como eu disse, realmente nós tivemos parado esse site, mas isso foi por conta da gestão passada e estamos tentando melhorar. Temos um projeto que já foi encaminhado para o Tribunal de Contas da União e que refaz isso. Se você for verificar o site da FUNAI, verá que ele está com certas publicações, mas atualizações estão sendo acompanhadas e feitas.
Então, a FUNAI já identificou realmente que precisa haver uma atualização rápida. Esse é um projeto que está em andamento e inclusive sendo acompanhado pelo TCU.
Sobre as questões de demarcação das terras indígenas, Deputada e demais Parlamentares aqui presentes, a FUNAI não faz uma expulsão como, muitas vezes, as pessoas falam. Todos os processos de demarcação têm um planejamento. É feito um levantamento conforme a fase da demarcação. Então, se há a identificação de pessoas que estão na área, a FUNAI vai fazer com que haja todo o procedimento legal. Às vezes se fala que as pessoas vão ser removidas, mas, para isso, há todo um acompanhamento. Se foi feita uma benfeitoria de boa-fé, a pessoa vai ser indenizada, é lógico. Então, não há essa forma violenta em que, muitas vezes, as pessoas parecem acreditar.
Quanto à questão relacionada a alguns procedimentos de demarcação de terras indígenas, eles estão em diferentes fases.
16:02
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Sobre essas terras que você mencionou, as seis terras que foram homologadas pelo Presidente Lula, há informações em relação a elas todas nos processos, já a partir da demarcação. Foi apurado se há pessoas nas áreas e se elas vão receber ou não indenização. Então, as informações constam no processo demarcatório.
Quero somente esclarecer que muitas pessoas têm dúvidas relacionadas a esses procedimentos. Os procedimentos de terras indígenas começam desde o momento em que se cria o grupo de trabalho, quando são feitos estudos antropológicos. Então, não é uma forma, digamos, ideológica, tampouco de interesses políticos. São informações que são levantadas tecnicamente por estudos antropológicos, ambientais e fundiários. Durante esses estudos, todos os entes federados são informados e participam dessas etapas do grupo de trabalho.
Logo em seguida, quando há um prazo também para se manifestar, que nós chamamos de prazos de contestação, existe uma nova forma de se pronunciar, não somente para os entes federados, mas para todos que têm interesse em se manifestar sobre o procedimento de demarcação. Para isso, existe um prazo, conforme estabelece o Decreto nº 1.775, de 1996, de 90 dias para que sejam apresentadas contestações, que vão depois subir para outro passo. Depois disso, vai ser feita a declaração, a portaria declaratória para declarar posse indígena. Depois dessa declaração, começa o prazo para georreferenciamento da área e demarcação física. Também já é iniciado, a partir daí, esse levantamento fundiário e de benfeitoria para fins de indenização.
A terra não é indenizada porque a terra indígena tradicional ocupada, digamos assim, segundo fala a nossa própria Constituição, é terra da União. Há muito essa discussão sobre por que não se recebe essa indenização, mas é a nossa Constituição que determina, no art. 231, § 6º, que devem ser indenizadas somente as benfeitorias de boa-fé.
Logo em seguida, vai o processo para homologação pelo nosso Presidente. Como vocês podem ver, são cinco fases até chegar à conclusão desse procedimento de demarcação. Então, é um procedimento que considera todas as informações técnicas, principalmente com a participação dos entes federados, de forma pública e publicada no Diário Oficial da União, para que não reste dúvida nenhuma sobre o procedimento que foi adotado pelos órgãos públicos, a partir da FUNAI, depois pelos Ministérios e, depois, pela própria Presidência.
O SR. PRESIDENTE (Rui Falcão. Bloco/PT - SP) - Haverá tempo também depois, durante as perguntas e tal, para que haja novos esclarecimentos se eles se fizerem necessários.
Agora, no primeiro bloco, eu passo a palavra ao Deputado Helder Salomão.
V.Exa. tem 3 minutos.
Em seguida, falará o Deputado Chico Alencar e, por último, mas não menos importante, o Deputado Tarcísio Motta.
O SR. HELDER SALOMÃO (Bloco/PT - ES) - Presidente, eu peço que some o tempo de Líder à minha fala.
O SR. PRESIDENTE (Rui Falcão. Bloco/PT - SP) - Pois não, Deputado. V.Exa. tem mais 6 minutos além dos 3 minutos. Serão 9 minutos para V.Exa.
O SR. HELDER SALOMÃO (Bloco/PT - ES) - Quero cumprimentá-lo, Presidente, cumprimentar nossa Ministra Sônia Guajajara, já a parabenizando pela exposição aqui no início da nossa audiência pública.
16:06
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Quero saudar também a Ex-Deputada Presidente da FUNAI, Joenia Wapichana, com quem nós tivemos boas batalhas aqui nesta Casa de Leis, e parabenizá-la por essa nova missão. Quero saudar também todos aqueles que acompanham a Ministra nesta audiência pública.
Ministra, primeiro eu quero parabenizá-la pela exposição muito objetiva sobre os trabalhos que têm sido desenvolvidos pelo Ministério. E nós temos muitos desafios. Eu vou colocar aqui alguns desafios, em especial, em virtude do que nós vivemos nos últimos anos. Ao criar o Ministério dos Povos Indígenas, o Presidente Lula enfatizou, demonstrou e reafirmou o seu compromisso com os povos indígenas do nosso País, e também reafirmou o seu compromisso com o meio ambiente, especialmente, num momento em que nós tivemos muitos retrocessos.
Eu acho que aqui todo mundo lembra quem disse esta frase, entre aspas: "Não há demarcação de terra indígena enquanto eu for Presidente". Acho que todo mundo lembra quem disse isto: "Não haverá demarcação de terra indígena enquanto eu for Presidente". De fato, nesse período, além de não ter havido demarcação de terra indígena, nós tivemos muito retrocessos. A FUNAI, por exemplo, deixou de cumprir a sua missão, para servir a interesses que não são os interesses dos povos originários do nosso País.
Também, eu quero lembrar outra frase, dita em abril de 1988. À época, era um Deputado. Ele disse o seguinte, entre aspas, no Plenário da Câmara dos Deputados — prestem atenção: "A Cavalaria brasileira foi muito incompetente. Competente, sim, foi a cavalaria norte-americana, que dizimou os seus índios no passado e hoje em dia não tem esse problema em seu país". O que era Deputado e virou Presidente, hoje é ex-Presidente, tratava assim os povos indígenas do nosso País.
Por isso, o desafio do Ministério e do Governo Lula é um desafio enorme, porque nós temos que reconstruir aquilo que foi destruído nos últimos anos. Eu ouvi algo aqui em que na hora não acreditei. Mas, enfim, eu ouvi. Ouvi dizerem que o nosso território está sendo entregue aos alemães — o nosso território está sendo entregue aos alemães —, por causa de uma cooperação que o Brasil está fazendo com a Alemanha, e está fazendo com outros países. Um país que não percebe a importância das cooperações entre as nações é um país fadado ao fracasso. E o Brasil ficou isolado nos últimos anos. O Brasil foi tratado como pária internacional. O Brasil se isolou do resto do mundo.
16:10
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Agora, eu quero aproveitar esta frase para construir outra frase: a aprovação do marco temporal, aí sim, é entregar as terras indígenas aos grileiros, é entregar as terras indígenas àqueles que querem a exploração ilegal do garimpo. Aprovar o marco temporal é, sim, uma ameaça ao povo brasileiro, aos povos indígenas, aos povos tradicionais, aos povos originários, e, sobretudo, uma ameaça ao meio ambiente.
E é preciso que se diga, com esta atitude irresponsável daqueles que acham que aprovar o marco temporal é o melhor caminho para o desenvolvimento do Brasil, que, primeiro, vamos trabalhar para que isso não aconteça, para que esse retrocesso não aconteça. Temos muitos capítulos nessa história, que não foi apenas o que aconteceu no Plenário da Câmara. Há muita luta pela frente, há muita resistência pela frente.
E, outra coisa, é preciso dizer que, se o Brasil não abrir os olhos e nós quisermos colocar mais uma vez o nosso País na contramão da história, do comércio internacional, das mudanças climáticas, o Brasil vai ter prejuízos econômicos — é preciso ser dito. Então, aprovar o marco temporal é defender interesses externos contra o nosso País. Aí sim, aprovar o marco temporal significa entregar o nosso território àqueles que só querem vir aqui explorar, retirar, suprimir os direitos da nossa gente, especialmente dos povos indígenas.
E há mais, nós poderíamos falar aqui de abril de 2017, quando, ainda pré-candidato, se referiu aos afro-descendentes — entre aspas: "O afrodescendente mais leve pesava no mínimo 7 arrobas". Disse isso, no local que visitou, se referindo aos quilombolas. Nós poderíamos ainda trazer aqui outra questão sobre a FUNAI, que foi fundada em 1967. Está aqui a Presidente Joenia. Na prática, no Governo passado, a FUNAI se transformou num órgão, numa máquina de destruição dos povos indígenas. O papel da FUNAI foi subvertido. E hoje nós procuramos resgatar o papel importante da FUNAI.
Nós não podemos esquecer que, para tentar aprovar o marco temporal, usam-se fake news o tempo inteiro. E usam-se, na verdade, todas as narrativas possíveis para desinformar a população. Por isso, alguns não querem a aprovação do PL das Fake News, como fez a União Europeia recentemente. Aliás, nos últimos dias, a União Europeia aplicou uma multa altíssima à Meta, que é a responsável pelo Facebook, por não cumprir determinações da nova legislação. Regular o ambiente virtual não é iniciativa exclusiva do Brasil. Aliás, o Brasil está atrasado na regulação do ambiente virtual. E não venham dizer que isso é censura. Isso é cometimento de crime, porque há muita gente usando as redes sociais para cometer crime. Aliás, quando se difundem mentiras, comete-se crime.
16:14
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Eu quero aproveitar ainda para falar de outra coisa. O ódio do Governo anterior era tão grande, ex-Deputada Joenia, que o projeto de V.Exa., que mudava o Dia do Índio para o Dia dos Povos Indígenas, foi vetado. Nós tivemos que derrubar o veto do ex-Presidente.
Vejam que é uma coisa visceral, mas o povo brasileiro é maior, os povos indígenas são muito maiores do que tudo isso, e nós haveremos de construir uma pátria livre e com dignidade para toda a nossa gente, especialmente, para os povos indígenas.
O SR. PRESIDENTE (Rui Falcão. Bloco/PT - SP) - Tem a palavra o Deputado Chico Alencar, por 3 minutos.
O SR. CHICO ALENCAR (Bloco/PSOL - RJ) - Boa tarde a todos e a todas.
Farei cinco perguntinhas, querida Sôninha Guajajara, bem objetivas. Eu achei que esta audiência não iria acontecer porque vi que estava convidada a Sra. Sônia Bone de Sousa Silva Santos. Eu a conheço como Sônia Guajajara há mais de 2 décadas. A senhora é a Ministra Sônia Guajajara, assim como há o Deputado Zé Trovão ou o Deputado Delegado Caveira. (Risos.)
É claro que Sônia Guajajara, Joenia Wapichana, Marcos Terena, meu querido e velho amigo Ailton Krenak têm um simbolismo mais generoso e brasileiríssimo.
Primeira pergunta: a senhora atribui a que essa formalidade estranha de colocar um nome tão grande, destituindo-a dessa pertença linda, que é do seu próprio povo? Eu gostaria muito de ser chamado "Chico Carioca".
O absurdo passeia muito pela Câmara dos Deputados ultimamente. A sessão marcada para as 11 horas da manhã não começou. Parece que estão negociando. O céu deve ser o limite no “toma lá dá cá” da política. Segunda pergunta: se o Ministério dos Povos Indígenas for decepado, nesse projeto de conversão da medida provisória, qual será o cenário e como a senhora vê isso?
O Relator do PL 490/07, Deputado Arthur Oliveira Maia, diz que achamos que o Brasil é todo uma terra indígena. Terceira pergunta: quais as iniciativas do Ministério para demarcar como terra indígena Copacabana, Ibirapuera, Morumbi, Itaim Bibi e outros bairros de grandes cidades brasileiras, já que vai tudo virar terra indígena?
Ontem, no debate do PL 490/07, um Deputado disse, atualizando a marchinha carnavalesca em desuso "índio quer apito", que índio quer asfalto, automóvel, celular. Como V.Exa. vê essa afirmação desse Deputado branco?
16:18
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Por fim, sempre se fala que há muita terra para pouco índio. Quais os parâmetros — ajude quem não estudou antropologia nem percebe o modo de viver de povos diferentes dos ditos civilizados, que civilizaram tantos dominados —, de uso e cuidado da terra, da economia capitalista, branca, próspera para a economia agrícola e pecuária dos povos nativos? Explique-nos isso, pois precisamos aprender com vocês.
O SR. PRESIDENTE (Rui Falcão. Bloco/PT - SP) - Com a palavra o Deputado Tarcísio Motta.
O SR. TARCÍSIO MOTTA (Bloco/PSOL - RJ) - Disponho de 20 minutos, Sr. Presidente? (Risos.)
Estou só brincando.
Somos todos seres humanos. Mas, como seres humanos que somos, a diversidade nos torna melhores. Nossa riqueza vem dos nossos corpos, dos diferentes corpos, das diferentes histórias, das diferentes vivências, das diferentes relações que estabelecemos entre nós e com a natureza: alteridade. Quando conheço outro, eu me conheço melhor. Quando conheço aquele que estabelece uma relação que parece diferente daquela relação natural, que naturalizo na minha vida desde a infância, posso desnaturalizar a minha própria relação com o presente e o real e tornar o mundo e as relações melhores. Desnaturalizar é tão importante nesse ponto.
Essa pequena fala, em 1 minuto, é parte de uma aula que eu tenho que dar no 6º ano do ensino fundamental para crianças de 11 e 12 anos. Nós ensinamos a história dos povos indígenas antes que os europeus chegassem aqui e depois, e toda a história de resistência e toda a história de luta, lembrando o tempo inteiro o quanto aquelas crianças precisam, ao chegar à idade adulta, valorizar a diferença, a diversidade, a alteridade; questionar a si mesmas quais são os seus valores; entender que o mundo é feito de diferentes vivências.
Mas o projeto do Estado brasileiro sempre foi negar essa diferença, essa diversidade. O projeto do Estado brasileiro, desde sempre — e para o historiador é difícil falar "desde sempre", nós sempre queremos pensar a mudança —, foi o projeto do colonizador, o projeto que leva ao extermínio físico e ao extermínio cultural dos povos que aqui estavam neste território, quando este território nem era chamado de Brasil. E é bom lembrar isto, que o Brasil é uma invenção do colonizador e do Estado imperial.
Esse projeto acaba fazendo com que muitos de nós internalizemos a própria violência do colonizador na forma de falar "índia" e não "indígena", tentando padronizar, homogeneizar aquilo que é diverso e diferente de nós, tentando dizer que é o meu direito à propriedade, a minha lógica de propriedade que deve prevalecer, desconhecendo aquilo que, nos poucos momentos em que o Estado brasileiro atendeu às reivindicações dos povos indígenas, não foi nenhuma benesse, não veio do céu nem das mãos de nenhuma Isabel, veio da luta de vários povos indígenas, quando na Constituição de 1988 a demarcação das terras indígenas, dos direitos originários dos povos indígenas, foi reconhecida.
Mas, ontem e hoje, nós seguimos ouvindo o colonizador de ontem e o colonizador de sempre internalizados em voz e discursos.
Parabéns, Sônia! Parabéns, Joenia!
Nós estamos juntos na luta pelos direitos de vocês, que também são nossos. Ao reconhecer os direitos de vocês, eu me reconheço neles também.
Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Rui Falcão. Bloco/PT - SP) - Nós fizemos uma organização da fala dos Líderes para compor os blocos. Há alguns Líderes que não estão presentes aqui. Como há o princípio de que o Líder tem direito à fala a qualquer momento, é muito ruim não chamá-los.
Eu vou chamar os Líderes que estão ausentes. Se eles aparecerem depois, nós organizaremos outro bloco para que haja transparência.
16:22
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Então, eu chamo agora o Deputado Guilherme Boulos. (Pausa.) S.Exa. está ausente.
Deputado Evair Vieira de Melo, inscrito como Oposição, mas também inscrito pelo Bloco PP/PSB. (Pausa.) S.Exa. está ausente.
Além do Deputado Evair Vieira de Melo, há ainda a Deputada Tabata Amaral e o Deputado Gervásio Maia, mas todos estão ausentes. Também está ausente o Líder do Governo, o Deputado Alencar Santana.
Nós vamos chamar mais um Deputado para compor o bloco, que é o Deputado Cobalchini. (Pausa.) O Deputado está ausente.
Então, chamo a Deputada Caroline de Toni para compor esse bloco.
S.Exa. tem, agora, 3 minutos.
A SRA. CAROLINE DE TONI (PL - SC) - Certo.
Presidente, eu agradeço a fala da Ministra, mas quero reforçar alguns questionamentos que eu acho que não foram satisfatoriamente respondidos.
Eu perguntei para a Ministra, caso o marco temporal caia, se, segundo a tese que ela mesmo advogava, todo o território brasileiro pode potencialmente, inclusive áreas urbanas, como o centro de São Paulo, Copacabana, ser considerado terra indígena.
Eu fiz um requerimento de informação, cujo prazo constitucional já passou, sobre a questão da cooperação Brasil-Alemanha. Eu gostaria de saber se posso ter acesso aos termos do acordo realizado com a Alemanha. Gostaria que fosse dada transparência e acesso à informação.
(Intervenção fora do microfone.)
A SRA. CAROLINE DE TONI (PL - SC) - Ótimo!
Também quero saber qual a necessidade de terem tirado o site do ar, se nele havia dados consolidados sobre os territórios indígenas homologados e tal. Será que, para rever os dados, eles precisavam ter tirado tudo do ar? Não dava para terem deixado aquilo que era consolidado e só ter arrumado... Trata-se de um meio de acesso público. Trata-se do direito à informação da população brasileira.
Quero só esclarecer também que, quando se expropria alguém da terra, não há direito à indenização, como foi falado aqui. Por mais que se indenizem as benfeitorias, nós entendemos que uma terra para ser declarada território indígena, antes de ser declarada terra da União, ela era, por exemplo, no caso de Santa Catarina, propriedade privada reconhecida pelo Estado com titulações de mais de 100 anos.
Então, quando falamos do respeito ao direito também dessas famílias que vieram depois — todos nós somos brasileiros —, entendo que deva haver consideração por essas pessoas, e não simplesmente tratá-las como invasoras. Muitas vezes, essas pessoas não estavam nem ali, se eventualmente os índios passaram, o que não foi o caso de Santa Catarina, porque foi comprovado que os laudos não eram verdadeiros. Eles ganharam na Justiça.
Inclusive sobre os alemães, eu acho que vai haver um problema internacional, porque a única fábrica montadora de veículos que a BMW tem fora da Alemanha está no Município de Araquari, que é uma das terras demarcadas e ampliadas unilateralmente pela FUNAI. Metade da fábrica vai ser considerada território indígena. Então, esse é um potencial problema que eu gostaria que vocês estudassem, porque está num dos processos lá em Santa Catarina. Eu estou até alertando, porque isso vai gerar um problema internacional, no nosso entendimento.
Nessas áreas estudadas e homologadas este ano, não me foi dito quantas famílias de agricultores vão ser impactadas. Com o devido respeito, sem desmerecimento à atuação do Ministério, caso o substitutivo seja aprovado, não é melhor fortalecer as ações da FUNAI do que ficar tendo órgãos em duplicidade, uma vez que as expropriações vão sair também do Ministério?
Então, eu gostaria que tudo isso fosse esclarecido, porque ainda não fiquei satisfeita com as respostas.
Agradeço a boa vontade da Ministra e também da Presidente da FUNAI, a Joenia, que também esclareceu vários questionamentos.
Muito obrigada.
16:26
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O SR. PRESIDENTE (Rui Falcão. Bloco/PT - SP) - A senhora tem 12 minutos agora para responder.
A SRA. MINISTRA SÔNIA GUAJAJARA - Eu queria começar falando, porque a Deputada afirma que eu defendi a tese de 1500 para estabelecer o padrão de territórios indígenas, que isso quem está falando é você.
Quer que eu repita? Eu falei que toda e qualquer pessoa que, minimamente, conheça a história deste País tem o compromisso ético de reconhecer que, desde a invasão deste território, que se deu em 1500, nós, povos indígenas, somos vítimas — vítimas — de toda sorte de violências e violações de direitos. Foi isso o que eu disse aqui. Portanto, não venha colocar palavra na minha boca. Nós não temos como negar que, em 1500, nós estávamos aqui. Não tenho como dizer algo diferente.
Posso afirmar, ainda, que estudos mostram que nós estávamos aqui. Nem se pode considerar a história de invasão do Brasil e a história do Brasil somente a partir de 1500, porque nós estávamos aqui muito antes de 1500.
(Intervenção fora do microfone.)
A SRA. MINISTRA SÔNIA GUAJAJARA - Questionou que eu defendo a tese para estabelecer padrão de demarcação de terra a partir de 1500, e eu não falei isso.
Hoje, nós temos um mapeamento na FUNAI com todas as áreas demandadas, as áreas já homologadas e as áreas que estão sob análise.
Agora, nós não podemos dizer que quem chegou há 100 anos, há 200 anos tenha o direito sobre aquela propriedade, porque nós temos o direito, sim, originário. Aquilo que você falou de primazia indígena, que eu também falei aqui inicialmente, a Constituição afirma que é direito originário. Então, é disto que nós estamos tratando: de um direito que antecede inclusive a Constituição Federal.
O que não quer dizer, Deputada, que nós estamos aqui reivindicando Copacabana, que nós estamos aqui reivindicando a Avenida Paulista, que nós estamos aqui reivindicando...
O Brasil é, sim, terra indígena. Acontece que, como disse a Deputada Célia Xakriabá, essas terras eram nossas e as dividimos com muita gente. (Palmas.)
É isso que nós estamos fazendo.
Sobre o Ministério dos Povos Indígenas, nós levamos 523 anos para que esse Ministério fosse criado; 523 anos para termos o protagonismo indígena; para indígenas participarem do Poder Executivo.
Ainda teríamos que esperar mais tempo, Deputada? Você que se coloca do lado, como defensora, acha pouco 523 anos para existir indígena compondo esse lugar?
É claro que há ali na MP esse esvaziamento da atribuição do ato declaratório. Mas, pela sua fala, você quer dizer para tirar tudo, não é? Porque a sua fala tem claramente a intenção de acabar com o Ministério.
Então, isso não me surpreende, porque houve sete emendas a essa medida provisória ou para retirar essa atribuição do Ministério dos Povos Indígenas ou para extinguir o Ministério. Esse é o pensamento colonial, colonizador, que quer continuar apagando a presença e reforçando a invisibilidade dos povos indígenas, de nós, que somos povos originários.
E a pergunta do Deputado Chico Alencar, que fala do nome, é parte disso, Deputado Chico. Muitos não se conformam de nos ver nesse lugar. Não se conformam de nos ver aqui com este microfone, ocupando esta Mesa para defender o nosso direito.
16:30
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Assim como você está para defender o direito à sua propriedade, eu estou aqui para defender um direito coletivo. É muito diferente um território de propriedade privada de territórios indígenas. Qual é a diferença? Território indígena é de uso coletivo, de famílias, não é de uma pessoa. Você quer comparar e entender a diferença? E o quanto nós povos indígenas contribuímos não só para o Brasil, mas para todo o planeta?! Compare o que há nos territórios indígenas com o que é há em grandes áreas de monoculturas. Nós temos água limpa, temos alimentação sem veneno, temos árvore em pé, temos a biodiversidade protegida, que, inclusive, é o que garante o ar que você respira. A grande escala de monoculturas, se você não sabe, empobrece o solo e acaba com o regime de chuvas.
É importante que o agronegócio também comece a compreender e ter essa consciência de que o que fazemos com a proteção dos nossos territórios alimenta inclusive as suas grandes lavouras. Nós não estamos aqui para fazer uma disputa de quem tem mais, de quem tem menos. Nós só queremos aquilo que nos pertence por direito: a demarcação dos nossos territórios.
É pouco para você ver indígenas ainda debaixo de lona, na beira da estrada, porque não têm a sua terra para morar? Você fala dos 14%. São 13,8%, em que, inclusive, já estão incluídas aquelas áreas que ainda não estão com o processo concluído, mas que já se somam àquelas que já estão em estudo. São 13,8% do território nacional, e 97% desses 13% estão na Amazônia brasileira. Portanto, o Sul, o Sudeste, o Centro-Oeste e o Nordeste do Brasil continuam com esse passivo de avançar com os processos demarcatórios.
E você disse também que todo o processo de demarcação é de competência praticamente exclusiva meu Ministério. Não é. A demarcação de terras indígenas tem várias etapas. Começa com a FUNAI, com o estudo de identificação e delimitação dessas áreas. Após ser emitido um relatório, o Ministério da Justiça, que anteriormente tinha essa atribuição, faz ali o seu parecer e emite a portaria declaratória. Após essa fase, volta para a FUNAI, para fazer a demarcação física. Depois, vai para a homologação na Casa Civil.
Portanto, o que nós pretendemos neste momento, com a criação do Ministério dos Povos Indígenas, é trazer...
Eu queria que ela prestasse atenção, por favor, porque depois vai me perguntar de novo.
Algumas coisas que eu falei no texto inicial você voltou a me perguntar.
A SRA. CAROLINE DE TONI (PL - SC) - Só um minutinho. É que estão me chamando.
A SRA. MINISTRA SÔNIA GUAJAJARA - Você precisa prestar atenção no que eu estou falando, Deputada, por favor.
A SRA. CAROLINE DE TONI (PL - SC) - Ministra, só um minutinho. É que eles estavam me chamando na CPI do MST, porque eu estou inscrita e sou a próxima a falar. Eu vou perder a vez da minha fala lá.
A SRA. MINISTRA SÔNIA GUAJAJARA - Então, escute. Você já me perguntou, por duas vezes, coisas que eu já tinha dito inicialmente. Então, se não prestar atenção, vai passar a tarde toda aqui perguntando a mesma coisa.
A SRA. CAROLINE DE TONI (PL - SC) - Mas, se for para a senhora me ofender, eu também não vou ficar aqui.
A SRA. MINISTRA SÔNIA GUAJAJARA - Não estou ofendendo. Eu estou pedindo que você preste atenção no que eu estou falando.
A SRA. CAROLINE DE TONI (PL - SC) - Mas eu a tratei com educação, Ministra.
A SRA. MINISTRA SÔNIA GUAJAJARA - Falta de educação aqui é você não estar olhando para mim enquanto eu estou falando. É isso.
A SRA. CAROLINE DE TONI (PL - SC) - Ministra, estavam me chamando.
A SRA. MINISTRA SÔNIA GUAJAJARA - Posso continuar?
A SRA. CAROLINE DE TONI (PL - SC) - Continue. Eu vou perder a vez da minha fala lá para ficar ouvindo a senhora.
A SRA. MINISTRA SÔNIA GUAJAJARA - Claro. Você perguntou. Tem que ficar para escutar, não é? (Palmas.)
É isso. Você perguntou. Tem que ficar para escutar.
A SRA. CAROLINE DE TONI (PL - SC) - Sim, porque eu tenho educação e respeitei a senhora. Então, gostaria que a senhora me respeitasse também, porque eu também sou tão brasileira quanto a senhora. Eu também nasci neste solo.
A SRA. MINISTRA SÔNIA GUAJAJARA - Eu estou respondendo que, se você perguntou, você precisa escutar a resposta.
16:34
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A SRA. CAROLINE DE TONI (PL - SC) - Eu também nasci no solo brasileiro e mereço respeito.
A SRA. MINISTRA SÔNIA GUAJAJARA - É exatamente o que eu estou fazendo.
A SRA. DANDARA (Bloco/PT - MG) - Presidente Rui Falcão, peço que garanta a fala da Ministra.
A SRA. MINISTRA SÔNIA GUAJAJARA - Para mim, isto é educação: se perguntou, fique até o fim para escutar a resposta. Isso, para mim, é educação, e não sair enquanto eu estou falando ou ficar de conversa paralela.
Nós temos aqui dados da FUNAI que trazem 764 terras indígenas existentes no Brasil, sendo 483 delas já homologadas e 281 sob análise. Então, para nós, esse é o parâmetro atual das terras que estão em andamento, para que tenham os seus processos concluídos. E nós estamos trabalhando para isso. Do mesmo jeito que você vem aqui para defender o seu interesse, eu também assumi este Ministério para defender aquilo que diz respeito aos povos indígenas.
E nós temos tantas outras atribuições. A medida provisória vai tirar o ato declaratório, que é uma etapa de todo o processo demarcatório, vai fazer voltar para o Ministério da Justiça, que é onde ele estava. E eu tenho plena confiança em que, com o Ministro Flávio Dino, que hoje ocupa esse lugar, esses processos não serão paralisados. Estamos trabalhando conjuntamente para que o Ministério dos Povos Indígenas possa ter essa participação nessa etapa do ato declaratório.
Você falou do site, repetiu. A Joenia respondeu, dizendo que estão atualizando. Ela fez a primeira resposta. Pegamos tudo ali espalhado. Os dados não estavam consolidados. O site estava fora do ar. Assim a FUNAI recebeu esse site, já estava fora do ar; agora já está em funcionamento, porque nós queremos, sim, trabalhar com toda a transparência, diferente do Governo passado, que inclusive retirou do ar o site que publicava as vacinas. Muita gente ficou prejudicada, ao não poder nem viajar, porque não conseguia ter o comprovante de vacinação. E nós não vamos repetir isso. Queremos que todas as nossas informações sejam, sim, publicizadas no nosso site.
Acho que respondi ao Deputado Chico a questão em relação ao ato declaratório, que permanece ali.
Você falou também que muitos afirmam que indígena de celular deixa de ser indígena, ou que usa televisão. Nós queremos, sim, usufruir de tudo o que está disponível, das novas tecnologias, mas nós queremos que o nosso direito ao território seja respeitado. Que nós possamos, sim, utilizar tudo o que está disponível, que possamos ter acesso, porque temos direito a esse acesso.
Agora, se fôssemos considerar quem usa uma coisa que não lhe pertence originariamente, teríamos que questionar muita gente. Inclusive aqueles que chegaram ao Brasil depois de nós teriam que ser questionados sobre, de fato, serem brasileiros se o indígena deixa de ser indígena quando usa celular.
Uso sim, com muito gosto, e quero que muitos indígenas tenham acesso e possam ter a oportunidade que eu tenho. Quero, sim, que muito mais indígenas possam ter um nível superior, assim como aumentou a presença de indígenas nas universidades a partir de uma política afirmativa do Governo Lula e do Governo Dilma. Por meio das cotas e das bolsas-permanência, nós indígenas pudemos acessar o nível superior.
Quero lhe dizer também, Deputada, que o povo pareci tem ali a sua produção, vários outros povos têm a sua produção, e nós não estamos questionando a produção de ninguém. Agora, não se pode estabelecer um padrão único de produção para todos os povos. Somos povos diversos. Você sabe quantos povos indígenas têm o Brasil? Nós somos hoje 305 povos indígenas no Brasil, conforme o último censo do IBGE. Não temos o censo de 2020, porque não havia interesse do Governo de atualizar essa população, o que dificulta inclusive a organização e a elaboração de políticas públicas.
16:38
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Então, nós temos 305 povos e 274 línguas. Esses povos precisam ter seus modos de vida respeitados. (Palmas.)
A SRA. CAROLINE DE TONI (PL - SC) - Agradeço à Ministra. Vou me retirar porque estou sendo chamada na CPI.
Muito obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Rui Falcão. Bloco/PT - SP) - Obrigado, Deputada, por sua presença e participação.
Tem a palavra agora o Deputado Luiz Couto, por 3 minutos.
O SR. LUIZ COUTO (Bloco/PT - PB) - Sr. Presidente, Sra. Ministra, é importante perceber a nossa história. O Brasil, que era Pindorama, que tinha nome, que tinha a sua religiosidade e sua cultura foi invadido. Agora os brancos estão dizendo que vocês estão tomando as terras. As terras todas são dos índios. Aí vem a entrada de bandeiras que foram invadindo, levando, destruindo tudo; matando, estuprando, violentando, e nada acontecia. Nada acontecia por parte do poder dominante. É importante perceber até o desrespeito com a religiosidade de vocês, com a cultura, com a organização. Tudo isso é fundamental, e não se respeita.
Alguns dizem: "Esses índios estão invadindo as nossas..." Invadindo o quê? Vocês invadiram, porque as terras deste País eram já de diversos grupos, em vários locais, inclusive alguns que ainda não foram identificados, mas são comunidades indígenas que devem ser consideradas.
Os portugueses vieram, tomaram as terras dos índios e criaram as terras que eram divididas entre os grandes proprietários.
Quanto à questão da saúde, nós verificamos que há uma matéria em que Bolsonaro, enquanto mandava carne para os militares, mandava cabeça de galinha ou de galo para vocês, demostrando desrespeito.
Por isso, para nós, o Ministério dos Povos Indígenas deveria ser o principal Ministério do nosso País para recuperar tudo aquilo que foi tirado.
16:42
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Então, nesse sentido, quero parabenizar a comunidade indígena e dizer que vamos continuar a luta. Se eles querem definir tempo para fazer, vamos cobrar que o Brasil deveria ser todo feito para as comunidades indígenas.
Um abraço a todos. Que nós estejamos juntos.
O SR. PRESIDENTE (Rui Falcão. Bloco/PT - SP) - Tem a palavra o Deputado Marcos Pollon. (Pausa.) Ausente
Tem a palavra o Deputado Orlando Silva. (Pausa.) Ausente.
Tem a palavra o Deputado Lindbergh Farias, por 3 minutos.
O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco/PT - RJ) - Ministra Sônia Guajajara, Sra. Joenia Wapichana, Presidente da FUNAI, quero trazer a nossa solidariedade. O que aconteceu ontem aqui foi muito grave, pois sabemos das consequências da aprovação desse PL 490/23. Mas eu queria também tranquilizá-las. Se há um projeto inconstitucional é esse. Acho que foi muito importante o resultado da votação porque eles não atingiram 308 votos, foram 280 e tantos. Isso deixa claro, quando for julgado no Supremo Tribunal Federal, que eles não tinham maioria para aprovação de uma emenda constitucional.
Isso é uma aberração jurídica. Na verdade, Presidente Rui Falcão, nenhuma emenda constitucional poderia alterar o art. 231. Nós estamos falando de cláusulas pétreas. Inclusive o voto do Ministro Edson Fachin no Supremo Tribunal Federal deixa isso muito claro.
No entanto, acho sinceramente que nós temos que mobilizar a sociedade, temos que mobilizar o povo, marcar manifestações. Parece-me que o que aconteceu ontem não é um fato isolado.
Espero que hoje, na sessão da Câmara, votemos a medida provisória que trata sobre a organização dos Ministérios.
Eu quero fazer uma reflexão também, Presidente, sobre um tema que tem a ver com a CCJ. Refiro-me à separação e harmonia entre os Poderes, que também está nas cláusulas pétreas. No caso de criação dos Ministérios, Ministra Sônia, a senhora sabe que é competência privativa do Presidente da República, bem como de leis que criem e extingam Ministérios e órgãos da administração direta.
Quando eu falava de separação dos Poderes, não é preciso ir lá atrás, em Montesquieu. Em O Espírito das Leis ele fala, na verdade, muito dos freios e contrapesos entre os poderes. Eu digo em relação à retirada da demarcação de terras indígenas do Ministério, da transferência para outro Ministério.
Há um jurista, um dos maiores constitucionalistas do mundo, vivo, português, que diz que "Limitar funções e competências do Poder Executivo, com base em critérios arbitrários do Congresso, é ultrapassar o freio constitucional do Congresso ao Presidente da República". É uma violência o que foi feito. Na verdade, nunca houve uma alteração tão profunda em nenhum governo. No Governo de Fernando Henrique não houve, no Governo Lula 1 não houve, no Governo Lula 2 não houve, no Governo Dilma não houve.
É preciso que se diga que há um Presidente da República que foi eleito com um programa, e esse programa tem que ser respeitado. Nós vivemos no presidencialismo, não vivemos no semipresidencialismo, como talvez queiram uns.
Eu lamento o que fizeram aqui esta semana. Tentaram criar um semipresidencialismo na prática. E nós não vamos aceitar isso.
16:46
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Então, eu quero parabenizar V.Exas., Ministra e Presidenta da FUNAI. Contem conosco.
Eu acho que é muito importante fazer este debate e mobilizar a sociedade brasileira.
O SR. PRESIDENTE (Rui Falcão. Bloco/PT - SP) - Tem a palavra a Deputada Tabata Amaral. (Pausa.) Ausente.
Tem a palavra o Deputado Ricardo Ayres. (Pausa.) Estava aqui, mas saiu.
Tem a palavra a Deputada Julia Zanatta. (Pausa.) Ausente.
Tem a palavra o Deputado Felipe Francischini. (Pausa.) Ausente.
Tem a palavra o Deputado Fabio Garcia. (Pausa.) Ausente.
Tem a palavra a Deputada Erika Kokay. (Pausa.) Ausente.
Tem a palavra o Deputado Rubens Pereira Júnior. (Pausa.) Ausente.
Tem a palavra o Deputado Alencar Santana. (Pausa.) Ausente.
Tem a palavra o Deputado Jorge Goetten. (Pausa.) Ausente.
Tem a palavra a Deputada Coronel Fernanda, por 3 minutos.
A SRA. CORONEL FERNANDA (PL - MT) - Boa tarde novamente!
Ministra, eu vou tentar ser mais prática. Muito se fala, na teoria, sobre o povo indígena, mas, quando se visita e se conhece a realidade...
No meu Estado de Mato Grosso, nós temos vários povos indígenas. Eu conheci, convivi com muitos deles e vi a sua realidade dentro das aldeias. Há falta de saúde pública, de condições de transpor as estradas, de ponte, de uma educação adequada que proporcione aos povos indígenas não só manutenção da sua cultura, mas também formação de profissionais, como enfermeiros, médicos, advogados, trazendo-os para a nossa realidade.
Nós temos exemplos de dois povos indígenas que estão fazendo a cultura do milho, da soja e trazendo qualidade de vida para o seu povo. Com o recurso dessa cultura, eles estão trazendo formação acadêmica, mestrados, doutorados, dando oportunidade, principalmente para as índias.
Diante disso, como a senhora vê essa situação da produção? Há liberdade para a produção desse tipo de cultura? O que se defende, na prática, é a produção apenas de subsistência.
Como a senhora mesma falou, depois de mais de 500 anos, criou-se um Ministério para defender o direito dos índios. O índio Serere, da tribo Xavante, do Município de Campinápolis, se encontra preso por questões políticas. A senhora faz a defesa dos povos indígenas ou a defesa de Governo? Independentemente de quem seja o Presidente, nós estamos falando da defesa do direito dos índios. Qual é a política aplicada pelo Ministério e pela FUNAI, para desenvolver, no âmbito geral, melhor qualidade de vida?
Como eu falei, acho tão importante a participação seja de índio, branco, negro. Há oportunidade de esta Casa ter representantes de todas as categorias, de todos os povos. Qual é a atividade do Ministério, para desenvolver a parte política entre os povos indígenas? Na época das eleições, nós vemos muitos índios se venderem por 50, 60 reais. Então, eu gostaria de saber qual é a política que está sendo empregada, para que os índios entendam a importância do seu papel político, de serem políticos, entenderem a política.
16:50
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Por último, eu gostaria de saber o que está sendo feito para que as mulheres indígenas sejam realmente respeitadas e possam progredir na sua vida social e na sua tribo.
Obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Rui Falcão. Bloco/PT - SP) - Passo a palavra para a última oradora do bloco, a Deputada Sâmia Bomfim.
V.Exa. tem 3 minutos, Deputada.
A SRA. SÂMIA BOMFIM (Bloco/PSOL - SP) - Boa tarde, Presidente.
Boa tarde, querida Ministra Sônia Guajajara. Eu quero cumprimentá-la pelo excelente trabalho que vem tocando à frente do inédito Ministério dos Povos Indígenas, sobretudo pela ação exemplar nas terras ianomâmis depois da irresponsabilidade e do genocídio premeditado do último Governo.
Eu quero também cumprimentar a Joenia, minha amiga, colega de bancada, que está à frente da FUNAI, e o Eloy Terena, que são excelentes lideranças do movimento indígena no Brasil.
No dia de ontem, infelizmente, a Câmara dos Deputados aprovou um projeto criminoso que visa retroceder na demarcação das terras indígenas e que pode autorizar inclusive construção de hidrelétricas em locais que são de preservação ambiental e do povo indígena.
Ontem, na tribuna, eu disse e repito agora que atacar os direitos dos povos indígenas é atacar o nosso próprio futuro, porque são os principais defensores do meio ambiente. E nós vivemos uma verdadeira emergência climática. Então, desrespeitar demarcação das terras e assassinar lideranças dos povos indígenas significa que o meio ambiente está em crise.
E o Brasil está no centro da atenção mundial, Deputado Tarcísio, justamente pela sua responsabilidade de preservar os seus biomas diante dessa crise climática por ser um país rico em biodiversidade.
No dia de ontem, os indígenas do território Jaraguá, na cidade de São Paulo, fecharam a Rodovia dos Bandeirantes para protestar contra o absurdo Projeto de Lei nº 490. E, no dia de hoje, a Polícia Militar está cercando o território Jaraguá, que vocês conhecem bem. As lideranças estão acuadas, sendo assediadas e ameaçadas.
Aproveito esta oportunidade para trazer isso para vocês, porque eu acho que é gravíssimo que forças policiais atuem para tentar conter um direito constitucional de luta, de organização. Aliás, isso é algo que diz respeito à essência, ao DNA dos povos indígenas no Brasil, que lutaram muito e, por isso, conseguiram chegar até aqui, sobreviver.
Eu queria perguntar para vocês de que forma nós do Parlamento podemos corrigir um pouco as distorções que foram feitas no dia de ontem, ou seja, de que forma podemos apoiar mais políticas públicas de proteção aos povos indígenas.
Aqui, nós temos a honra de ter a Deputada Célia na nossa bancada do PSOL, que muito nos ensina, conduz e lidera nesses temas. E nós sabemos que um dos pontos mais preocupantes, muitas vezes, é a ausência de recursos para pastas que são tão fundamentais. Então, de que modo, ao longo desta Legislatura, nós podemos batalhar juntas para que haja, de fato, uma estruturação dessas políticas públicas do Ministério, da FUNAI?
Obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Rui Falcão. Bloco/PT - SP) - V.Exa. tem 12 minutos para responder às questões que lhe foram apresentadas.
A SRA. MINISTRA SÔNIA GUAJAJARA - Neste bloco, eu quero começar registrando a descortesia da Deputada Caroline de Toni, que fez o convite para que eu pudesse estar aqui hoje e não permanece no plenário para escutar todas as informações que estamos prestando aqui. Então, eu quero deixar registrada aqui essa descortesia. (Palmas.)
16:54
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O SR. PRESIDENTE (Rui Falcão. Bloco/PT - SP) - Ministra, antes de sair, ela se desculpou. Ela tinha uma CPI para participar, pediu licença. Isso costuma acontecer aqui na Casa.
A SRA. MINISTRA SÔNIA GUAJAJARA - Tudo bem, mas eu queria só registrar, porque ela deveria ter se organizado para permanecer aqui até o final.
Eu vou também agora falar para a Deputada Fernanda, começando até pelo indígena Serere e o chamando de indígena, porque nós somos indígenas. Os termos índios e índias, Deputada, não são mais utilizados. (Palmas.)
Esses termos já estão superados. Eles soam para nós como pejorativos. Eu estou corrigindo, porque fazemos isso em todos os lugares.
A SRA. CORONEL FERNANDA (PL - MT) - Eu agradeço a correção.
A SRA. MINISTRA SÔNIA GUAJAJARA - Vai haver tréplica? Informaram-me que não teria.
A SRA. CORONEL FERNANDA (PL - MT) - Eu estou só agradecendo a correção, mas esse é um hábito nosso lá, por conta da nossa amizade. Os meus índios, que são próximos a mim, nunca me corrigiram.
A SRA. MINISTRA SÔNIA GUAJAJARA - É um hábito preconceituoso, Deputada. (Palmas.)
A SRA. DANDARA (Bloco/PT - MG) - Pelo amor de Deus! É preconceituoso demais.
(Intervenção fora do microfone.)
A SRA. MINISTRA SÔNIA GUAJAJARA - Gente, a nossa presença aqui é inclusive para isso.
A SRA. DANDARA (Bloco/PT - MG) - É indígenas que se fala. Se são seus amigos, trate-os decentemente.
(Intervenção fora do microfone.)
A SRA. MINISTRA SÔNIA GUAJAJARA - Eu vou querer meu tempo depois também.
A SRA. DANDARA (Bloco/PT - MG) - Trate-os como querem ser tratados, se são seus amigos de fato.
A SRA. MINISTRA SÔNIA GUAJAJARA - Gente, eu posso retornar? Estou no meu tempo. Não dá para ficar agora batendo boca, Deputada. Desculpe-me.
Faço mais uma correção. Não é um mal entendido. Se você falou que é um hábito, é um hábito preconceituoso. A partir de hoje, é para você corrigir. É só para não repetir. Está bom? É só para não repetir mais.
Não é índio, não é índia e não é tribo também. Quando você se referir a povos indígenas, a pessoas, você pode falar indígena. Se você quer falar de uma localização onde nós estamos ou à qual nós pertencemos, você pode falar território, aldeia ou comunidade. É assim que comumente nos tratamos.
Então, eu quero muito que este Plenário e que esta Casa possam também já ir superando esses termos que ainda hoje soam para nós como pejorativos, colonizadores. É por isto que nós estamos aqui, para provocar também essa mudança de tratamento. Como eu estou aqui, a Deputada Célia Xakriabá está aqui todos os dias ensinando nesta Casa. Então, essa é uma das nossas missões.
Quando lançamos a nossa iniciativa de aldear a política, é exatamente para começar quebrando esse racismo impregnado que está na sociedade, é para começar conscientizando sobre essa nossa presença. Então, eu queria começar chamando atenção a isso, para você e para todos que nos assistem para não cometerem mais essas falhas tão graves para nós.
Em relação ao indígena Serere, ele foi preso pelo Supremo Tribunal Federal. Já foi pedido habeas corpus, que não foi aceito. Não cabe a mim, eu não sou advogada, muito menos juíza — até gostaria de ser —, a decisão de soltar o indígena Serere, Deputada. E não estou aqui dizendo isso porque, como você falou, estou defendendo o Governo. Claro, eu estou defendendo o meu povo, a causa pela qual que me foi conferido esse lugar. Ele, sim, estava lá defendendo o Governo. Ele estava lá defendendo um Presidente. Aquela era uma luta que não era compartilhada naquele momento com todos os povos indígenas.
16:58
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Então, se ele cometeu um erro... Nós não vamos aqui passar a mão na cabeça de ninguém. Não sou eu que vou dizer que ele está certo ou errado. Não cabe a mim dizer que ele está certo ou errado. Não sou eu que vou decidir. Ele está lá e a Justiça é que vai decidir sobre a soltura ou não dele.
Portanto, não cabe a mim trabalhar nessa função.
Quanto à pergunta sobre o que nós estamos fazendo para desenvolver uma política para os povos indígenas, quero informar — nós também falamos isso aqui no início, e você estava aqui presente — que nós lançamos este ano, no Acampamento Terra Livre que aconteceu ali, em que inclusive o Presidente Lula esteve presente, a Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental de Terras Indígenas, que foi assinada no dia 5 de junho de 2012. Começamos a trabalhar; criamos o comitê gestor; fizemos o Plano Decenal de Políticas Públicas para os Povos Indígenas, integrado com os Ministérios, mas essa política foi totalmente arquivada na gestão passada.
Então, acho que cabe questionar à gestão passada por que não foi implementada essa política de gestão ambiental e territórios para os povos indígenas, que garante a produção conforme iniciativas próprias, o fortalecimento cultural, a restauração de áreas degradadas e a restauração de nascentes, como também a produção de tantos outros eixos existentes nessa política.
Eu sugiro também que você busque mais informações para conhecer a PNGATI, porque ali está uma das políticas que o Ministério dos Povos Indígenas, em conjunto com a FUNAI, está agora desenvolvendo.
Você falou também das mulheres. Nós estamos aqui, orgulhosamente, com a presença de mulheres amigas, como a Braulina Baniwa, que é Diretora Executiva da Articulação Nacional das Mulheres do Brasil, e a Shirley Krenak, que também faz parte da Articulação Nacional de Mulheres Indígenas.
Nós estamos aqui nesse protagonismo. Hoje a maioria desses espaços estratégicos são ocupados por mulheres indígenas. Nós avançamos e continuamos articulando para que mais mulheres possam chegar a esse lugar e compor a bancada do cocar. A bancada do cocar tem esta iniciativa no movimento indígena: ocupar lugares de poder e decisão.
Nós estamos aqui hoje não para sermos as únicas, como a Deputada Joenia dizia quando estava aqui atuando. Ela dizia: "Eu sou a primeira, mas não quero ser a única". E nós estamos aqui dando continuidade à nossa presença neste Parlamento, à nossa presença no Executivo. E continuamos abrindo caminhos para que outras mulheres possam chegar também a esse lugar.
Estamos, literalmente, conversando, dialogando e trabalhando de forma conjunta, para que as mulheres alcancem cada vez mais esses espaços e assumam o protagonismo da nossa própria história.
Nos demais intervenções, Presidente, não houve muitas perguntas ou afirmações.
Eu quero agradecer a todos e a todas as Parlamentares que estão aqui...
(Intervenção fora do microfone.)
A SRA. MINISTRA SÔNIA GUAJAJARA - Desculpe-me!
Isso é porque eu falei na hora em que você não estava presente. Eu respondi para a Deputada Caroline de Toni essa mesma pergunta. É que todo mundo que hoje compartilha esse agroindígena traz o povo pareci como um exemplo, um modelo a ser seguido.
Deputado, eu falei isso aqui também, agora há pouco, nós somos 305 povos indígenas no Brasil. Falamos 274 línguas. Nós estamos em todos os Estados da Federação brasileira. E nós temos modo diverso de produção. Não se pode adotar um modelo, um padrão único de produção para todos os povos. Nós respeitamos a livre iniciativa.
17:02
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Ninguém, nem a FUNAI, nem o movimento indígena, nunca impediu ou proibiu ninguém de produzir, de plantar. Isso nunca foi proibido. O que nos falta são condições. O que nos faltou até agora são condições para que possamos fazer gestão sobre os nossos próprios territórios.
Agora, o que nós não queremos aceitar mesmo é o arrendamento desses territórios, é a exploração por terceiros. Nós queremos apoiar as iniciativas próprias de cada povo. Quanto aos parecis que têm essa produção, que vocês usam como exemplo, eu quero registrar que não há consenso sobre isso entre o povo pareci.
O SR. PRESIDENTE (Rui Falcão. Bloco/PT - SP) - Há um convite que a Deputada fez. E eu já vou passar a palavra à Deputada.
Outro bloco. Tem a palavra a Deputada Célia Xakriabá, por 3 minutos.
A SRA. CÉLIA XAKRIABÁ (Bloco/PSOL - MG) - Boa tarde, companheiros, companheiras, Parlamentares, nossa parentíssima Ministra Sônia Guajajara, que é também da Casa — fomos eleitas e fazemos parte da bancada do cocar —, companheiras da ANMIGA, que é a Articulação Nacional das Mulheres Indígenas Guerreiras da Ancestralidade, e parentíssima Joenia Wapichana, a primeira mulher indígena do Congresso Nacional.
Quero dizer que nós não temos medo da Justiça; nós temos medo da injustiça. O PL 490, aprovado ontem, significa este Congresso da injustiça. Não conseguiram nos matar na totalidade na época da invasão do Brasil. Não conseguiram nos matar na totalidade na ditadura militar — registro que a Shirley Krenak está aqui. No Reformatório Krenak, torturaram mais de 8.350 indígenas. Não conseguiram nos matar na totalidade com a aculturação. Agora, o Governo anterior tentou nos matar por meio de um projeto de agriculturação, tentou nos impor um modo de ocupação do território que não era o nosso.
Nós não somos contra a economia, nós somos a favor dela e fazemos bioeconomia.
Dizem que o PL 490 é civilizado. Nesse dito projeto civilizado, na verdade, nós nos vimos lesados, porque as terras devolutas se devem à luta dos povos indígenas do Brasil.
Dizem que é preciso pensar esse modelo produtivista. Já deu! As questões climáticas estão aí, e nós precisamos pensar em transição energética, em transição econômica e em transição humanitária.
Eu queria aqui compartilhar o debate desse tema com outras mulheres. Queria que não estivéssemos em pé de guerra, porque pensar uma política de bem viver e pensar um país do progresso é pensar um projeto de política em que as mulheres estão junto.
A Deputada companheira que se encontra aqui ao lado perguntou para mim e para a Ministra como nós nos sentimos ocupando estes lugares, se agora temos uma vida melhor e se pensamos que as outras pessoas também deveriam ter as mesmas oportunidades. Como nós nos sentimos? Eu me sinto revoltada, porque o Brasil demorou 523 anos para ter seu primeiro Ministério dos Povos Indígenas e colocou só agora um indígena na Presidência da FUNAI, uma mulher. Além disso, ontem, quando chegamos a esta Casa, fomos ameaçadas por Parlamentares que estão aqui a responder a processo no Conselho de Ética.
Ter ética, para mim, é respeitar mulheres de territórios indígenas, onde o Brasil começa e onde nós somos as primeiras. Ter ética é fazer a demarcação dos territórios indígenas. (Palmas.)
Quero dizer ainda neste momento que nós queremos construir o Brasil do futuro. E, nesse Brasil do futuro, os povos indígenas sempre estiveram aqui.
Quando nos perguntam "Vocês querem demarcar o Rio de Janeiro?", "Vocês querem demarcar São Paulo?" e "Nos territórios indígenas são os homens que têm mais poder?", digo que nós não fazemos lutas separadas, nós fazemos lutas unificadas, junto com a juventude, as mulheres, os nossos caciques e as lideranças. Quem é a mulher que é Ministra dos Povos Indígenas do Brasil? Quem está ocupando a Presidência da FUNAI não é uma mulher? Quem está no Parlamento hoje, representando também os povos indígenas, não é uma mulher?
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Vamos ao art. 16, da alteração de traços culturais tratada no PL 490 de ontem. Como querem falar de alteração de traços culturais — vou concluir, Sr. Presidente — se, na verdade, houve uma política de miscigenação? E a miscigenação não foi pacífica, ela matou 4 milhões de indígenas no Brasil.
Já para concluir, quero dizer que não dá para pensar num país do futuro se matar um país do passado.
Muito obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Rui Falcão. Bloco/PT - SP) - Tem a palavra a Deputada Dandara, por 3 minutos.
A SRA. DANDARA (Bloco/PT - MG) - Sr. Presidente, aqui na CCJ, há o debate sobre terras indígenas, com a extrema direita querendo constranger a Ministra Sônia Guajajara. No auditório ao lado, no plenário ao lado, há o debate da CPI do MST, e trouxeram para cá ex-pessoas do movimento achando que, assim, iriam constranger e expor as contradições do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra. Não conseguiram o que queriam lá e também não estão conseguindo aqui.
O problema é que a extrema direita não está conseguindo entender que nós já vencemos a batalha das urnas e que houve um projeto político eleito. O Presidente da República escolhido pela maioria do povo brasileiro luta e acha que é importante a demarcação de terras indígenas. O Presidente do Brasil devolveu articulações e aspectos importantes ao Ministério do Meio Ambiente. O Presidente do Brasil, neste momento, recriou o Ministério da Cultura, por exemplo. O Presidente do Brasil colocou uma indígena à frente da FUNAI.
Nós precisamos frear, neste Congresso, o estelionato eleitoral que estão tentando construir. Estão tentando enfiar uma agenda de retrocessos goela abaixo. Tem gente que precisa ir lá naquele aplicativo Resultados e atualizá-lo, para ver, novamente, que há um Presidente que consta lá como não eleito, que é o ex-Presidente do Brasil. E essa não é mais a agenda prioritária.
Há uma perspectiva, Ministra Sônia, de fato colonizadora, porque os espaços de poder não foram feitos nem pensados por nós. No século 21, ainda estamos lutando para abrir caminho, para que muitas possam vir depois de nós. Mas não é pouca coisa o que nós estamos construindo hoje no Brasil. E eu quero parabenizar o trabalho da senhora à frente desse Ministério. A senhora travou uma grande batalha logo no início, para frear o genocídio dos povos indígenas ianomâmis, travou e ainda está travando uma batalha contra o garimpo ilegal.
Eu já disse e vou reafirmar que tem que se ter muita coragem para colocar o dedo na ferida dessa exploração predatória que acontece nos quatro cantos do nosso País. Eu venho de um Estado onde a mineração está destruindo várias regiões. Queria chamar atenção para a região do Jequitinhonha e do Vale do Lítio, onde o desrespeito a comunidades de povos tradicionais está correndo solto. Mas agora não, pois o Brasil está de volta e tem Ministérios...
(Desligamento do microfone.) (Palmas.)
17:10
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O SR. PRESIDENTE (Rui Falcão. Bloco/PT - SP) - Tem a palavra a Deputada Fernanda Melchionna, por 3 minutos.
A SRA. FERNANDA MELCHIONNA (Bloco/PSOL - RS) - Presidente, eu quero cumprimentar a Ministra Sônia Guajajara, cumprimentar o Secretário-Executivo Eloy Terena, cumprimentar a nossa Presidente da FUNAI, a Joenia Wapichana, com quem tive a oportunidade de batalhar muitos anos, aqui nessa CCJ, inclusive contra o PL 490, e cumprimentar a querida Deputada Célia Xakriabá, que nos comanda, como bem disse a Deputada Sâmia Bomfim, nessas lutas.
Quero lamentar profundamente o ocorrido na noite de ontem, Ministra Sônia Guajajara. É evidente que há um movimento articulado da bancada do atraso, que quer apagar uma dívida histórica diante do genocídio que os indígenas, infelizmente, viveram na história da invasão do nosso País, ao atacar a Constituição de 88. Não há só a tentativa de apagar essa história, que é marcada por violências, barbáries, remoção de território, assassinatos de 4 milhões — como bem falou a Deputada Celinha —, há sobretudo as poucas medidas de reparação, morosas, é verdade, porque precisamos acelerar o processo de demarcação, para garantir essas reparações históricas.
Mas, num conluio, eles tentam retroceder de forma ilegal — e quero começar por aqui. Esse projeto é inconstitucional, Ministra Sônia Guajajara, porque nenhuma lei ordinária pode passar por cima da Constituição Federal. E, na calada da noite de ontem, comandada pelo Presidente Arthur Lira, tivemos essa votação vergonhosa de 285 votos que, na verdade, é um novo genocídio indígena em pleno 2023.
Agora, eu tenho a convicção de que se, por um lado, isso é inconstitucional, por outro lado existe essa bancada do atraso que quer retroceder, apagar o passado e as reparações históricas e destruir o futuro. Quando nós falamos de demarcação de terras indígenas, quando nós falamos de justiça e de reparação histórica, estamos falando de futuro, estamos falando de preservação do meio ambiente num país que perdeu, nos últimos 4 anos, 13 mil quilômetros quadrados de floresta diante da devastação financiada e fomentada pelo Governo criminoso do Bolsonaro.
Falo de um Presidente que colocou, à frente da FUNAI, um representante dos ruralistas que tirou a proteção que havia, o que levou ao assassinato do Dom e do Bruno. O que nós vimos foi uma escalada de assassinatos de indígenas nos últimos anos, fomentada pelos grileiros e pelo garimpo ilegal. E esse delinquente teve a cara de pau de ir a um garimpo ilegal e fomentar o ódio. O que nós vivemos foi uma crise, um crime contra a humanidade, cometido contra os ianomâmis e fomentado pelos garimpeiros, com a negligência, a omissão, a prevaricação e a conivência dos que estavam no poder no Governo Bolsonaro. Foram 540 crianças indígenas que perderam a vida.
Eu peço só 30 segundos para concluir, Presidente Rui, pela deferência à nossa saudade da CCJ.
Todo esse espírito de luta que nós aprendemos com os 523 anos de resistência das mulheres e dos homens indígenas precisa prosperar agora. Nós conquistamos liberdades democráticas para seguir a luta e, numa ampla mobilização, derrotar o Bolsonaro nas urnas. Agora é preciso derrotar o bolsonarismo nas ruas e nas esferas de poder. E eu tenho certeza de que vocês nos inspiram e que nós temos uma tarefa histórica de seguir mobilizados para derrotar a bancada do atraso. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Rui Falcão. Bloco/PT - SP) - Tem a palavra o Deputado Joseildo Ramos, por 3 minutos.
O SR. JOSEILDO RAMOS (Bloco/PT - BA) - Obrigado, Sr. Presidente.
No fundo, no fundo, Ministra, eu esperei esse tempo todo para lhe agradecer. O ineditismo desse Ministério é superimportante para nós, porque nos ensina e é, acima de tudo, um processo inicial de reparação por tudo o que os povos indígenas passaram desde 1500 até hoje.
17:14
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Algumas perguntas que eu iria fazer já foram feitas pelos que me antecederam. Algumas falas me incomodaram.
A saúde, a educação, a produção, o lazer e a cultura do indígena são insubstituíveis, e tudo isso tem que evoluir conforme a vivência do povo indígena, a sua cultura, o seu entretenimento na floresta, onde quer que seja, na sua comunidade.
Não podemos compactuar com a violência legislativa contra os povos indígenas. Vou fazer coro com quem falou sobre esse ponto, de tão importante que é. Essa medida é inconstitucional. Certamente, o Supremo Tribunal Federal vai barrá-la em favor do povo brasileiro, que inclui os povos indígenas. É importante que fique clara a história do site de vocês, que está fora do ar por conta da negligência de um passado não muito distante.
Enfim, desejo sucesso! A nossa bancada vai estar aqui para compor com vocês em tudo aquilo que puder para que a afirmação dos direitos dos povos indígenas seja algo efetivo entre nós.
Um grande abraço.
A SRA. ERIKA KOKAY (Bloco/PT - DF) - Permite-me um aparte?
O SR. JOSEILDO RAMOS (Bloco/PT - BA) - Permito, sim.
A SRA. ERIKA KOKAY (Bloco/PT - DF) - Rapidamente, quero saudar a Ministra, o Eloy Terena, a Joenia e toda a equipe.
Nós temos hoje uma mulher indígena na Presidência da FUNAI, que sofreu tanto assédio, assédio institucional, assédio organizacional, que teve tanta resistência dos servidores e servidoras para que a sua função pudesse ser cumprida, a função de defesa dos direitos dos povos indígenas. E temos também uma mulher no Ministério.
Um dos momentos mais belos deste correr da vida, que o poeta diz que às vezes embrulha tudo, foi ter presenciado a posse da Ministra Sônia Guajajara, indicando que definitivamente nós estamos reconhecendo os direitos dos povos indígenas.
Mas o que esta Casa viu nesta semana de violência contra os povos indígenas seguramente não perdurará, porque as injustiças não perduram. Não vamos permitir a eterna ressignificação de toda a violência que os povos indígenas sofreram. Defesa dos povos indígenas é defesa deste Brasil.
Parabéns a toda a equipe!
O SR. PRESIDENTE (Rui Falcão. Bloco/PT - SP) - O último inscrito, que pediu para usar o tempo de Líder agora, é o Deputado Guilherme Boulos.
V.Exa. dispõe de 3 minutos.
O SR. GUILHERME BOULOS (Bloco/PSOL - SP) - Obrigado, Presidente.
17:18
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Quero saudar aqui a minha companheira e amiga Ministra Sônia Guajajara, o nosso querido Eloy Terena, Secretário-Executivo do Ministério, e a nossa querida Joenia Wapichana, Presidenta da FUNAI, e dizer do orgulho que tenho, compartilhado por muita gente aqui, de ver a nossa Sônia Guajajara como a primeira Ministra dos povos originários deste País — o Presidente Lula criou esse Ministério, após ter proposto isso na campanha.
A Sônia tive o privilégio de conhecer como companheira de chapa em 2018, e a tenho como amiga. A Sônia me levou outro dia para conhecer a aldeia dela, no território indígena Arariboia, no Maranhão, onde passamos 3 dias e de onde voltei, caro Presidente Rui, absolutamente deslumbrado com o aprendizado que tive lá.
Uma Deputada, antes de eu chegar, falou sobre machismo nas aldeias. Na aldeia aonde fui não existia um cacique, existia uma cacica, a cacica Maria Guajajara, que nos recebeu e nos acolheu lá. Naquela aldeia eu vi que há guardiões guajajaras. Alguns foram assassinados no Governo Bolsonaro. Esses guardiões cumpriam o papel que deveria ser dos fiscais do IBAMA, que é proteger a floresta, combater os madeireiros, combater as queimadas. Faziam eles próprios esse papel, porque lamentavelmente o Governo anterior desmontou o IBAMA. Lá eu vi não só a preservação da terra, a preservação das águas, a preservação da natureza e da biodiversidade, como também a preservação da cultura e das tradições.
Eu acho que esta Comissão, assim como qualquer outra do Congresso, deveria convidar a Ministra Sônia, o Eloy e a Joênia não para apresentar dúvidas capciosas, mas para homenageá-los pelo bem que fazem a este País, e não só aos povos originários, pelo papel dos povos originários na preservação do meio ambiente.
Eu tenho certeza, minha querida Sônia, de que hoje é um dia difícil para a luta dos povos indígenas, por conta da aprovação do PL 490 ontem, como dissemos da tribuna. Ontem ouvi o discurso incrível da minha querida colega, que nos orgulha muito, Célia Xakriabá, de que eles podem ter ganhado essa batalha aqui na Câmara. Tenho dúvidas se vencerão no Senado, e, ainda que vençam no Senado, tenho mais dúvidas ainda se vencerão no Supremo, porque não estamos falando de recurso, estamos falando de constitucionalidade. É básico que um projeto de lei não pode alterar a Constituição. Por isso, apesar de ainda estarmos com um gosto amargo na garganta pelo que foi a votação de ontem, eu tenho certeza de que uma batalha perdida não vai ser nada perto de uma guerra ganha, e o Ministério dos Povos Indígenas representa isso.
Parabéns a vocês que estão fazendo história, construindo isso! Parabéns, minha querida companheira Sônia Guajajara! Contem sempre conosco aqui no Congresso Nacional! (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Rui Falcão. Bloco/PT - SP) - Ministra, passo-lhe agora a palavra para que responda a eventuais questões e acrescente suas considerações finais, por favor.
17:22
RF
A SRA. MINISTRA SÔNIA GUAJAJARA - Quero agradecer aos Parlamentares e às Parlamentares que ficaram aqui até o final.
Deputado Guilherme Boulos, muito obrigada. Muito me orgulha estar contigo nesta caminhada. Seguimos juntos!
Deputada Fernanda, muito obrigada pela parceria. Companheirismo sempre!
Deputado Tarcísio Motta, Deputado Chico Alencar, Deputado Luiz Couto, Deputada Célia Xakriabá, agradeço muito todo esse apoio, esse reforço que trazem aqui.
O Ministério dos Povos Indígenas é, de fato, um Ministério inédito. Não é só novo, mas também inédito. Nunca na história do Brasil houve um Ministério dos Povos Indígenas. É uma forma de reduzir danos ou iniciar uma reparação histórica da negação de direitos e da invisibilidade dos povos indígenas até aqui.
Estar aqui hoje, para nós, é sinônimo de muita resistência. Estamos aqui com: a Célia Xakriabá; a Joenia; o Dr. Eloy Terena, Secretário-Executivo do Ministério dos Povos indígenas; a Joziléia Kaingang, Chefe de Gabinete do Ministério dos Povos Indígenas; a Ceiça Pitaguary, lá do Nordeste, nossa Secretária de Gestão Ambiental e Territorial Indígena; o Marcos Kaingang, nosso Diretor de Mediação e Conciliação de Conflitos Fundiários Indígenas; e a Janete, Diretora de Proteção Territorial da FUNAI. Nós estamos trabalhando conjuntamente, com informações compartilhadas, sempre primando pelo diálogo.
Foi tratada a questão da saúde e foram pedidas informações sobre a precariedade da saúde indígena no Mato Grosso. Mas eu queria lembrar que o Governo passado reduziu em 60% o orçamento da saúde indígena. Como conseguiríamos garantir uma saúde de qualidade logo no início, quando assumimos? Mesmo assim, conseguimos garantir na PEC da Transição a reposição desse orçamento, inclusive através de emendas da Deputada Joenia, quando aqui ainda estava. Nós conseguimos crédito extraordinário, inclusive por conta da crise que ocorreu no início do nosso Governo, a crise humanitária que envolveu o povo ianomâmi.
Nós seguimos ainda com ações para que possamos tirar o povo ianomâmi dessa situação de calamidade. Continuamos com as nossas articulações com os outros Ministérios para que possamos tirar, de uma vez por todas, o garimpo ilegal do território ianomâmi, tirar os invasores que ali ainda estão, para garantir um atendimento de saúde de qualidade ao povo ianomâmi. Se dependesse da gestão passada, hoje teríamos 60% a menos do que temos hoje, valor insuficiente no ano passado. Estamos trabalhando agora no próximo PPA, para que possamos aumentar esse orçamento e garantir essa saúde de qualidade como a gente planeja.
17:26
RF
Eu também gostaria de reafirmar que nós não precisávamos de um requerimento de urgência para se aprovar aqui o marco temporal. O que precisamos é de urgência e de uma compreensão para medidas que possam reduzir essa crise climática no mundo. E, aqui no Brasil, nós reunimos todas as condições necessárias para reduzirmos as emissões, uma vez que as emissões no Brasil são causadas pela degradação ambiental, pelo desmatamento, pelas queimadas e pela grilagem de terras.
Nós temos agora um Governo que tem o compromisso de acabar com esse desmatamento, de zerar o desmatamento ilegal no Brasil. Estamos juntos e juntas com o Presidente Lula para que possamos, sim, reconstruir este País.
De qual forma vocês podem apoiar? A pergunta da Deputada Sâmia, que não está mais presente, foi: "Como podemos ajudar?" Para nós, vocês já estão contribuindo muito. É uma bancada combativa, forte, que está sempre ao lado dos povos indígenas. Então, devem continuar apoiando as nossas pautas, continuar bloqueando, evitando, votando contra medidas que diretamente nos afetam.
E eu gostaria de dizer aos demais, se aqui estivessem, para também designarem medidas para fortalecer o nosso Ministério, já que estão tão preocupados. Infelizmente, não ficou nenhum aqui até o final.
Agradeço muito a todos e a todas vocês por estarem aqui até agora. Agradeço ao Presidente Rui Falcão. Agradeço à Patrícia, que está ajudando a condução da Mesa.
Muito obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Rui Falcão. Bloco/PT - SP) - Quero agradecer muito a presença da Ministra Sônia Guajajara, da minha colega Joenia Wapichana, Presidente da FUNAI, do Secretário-Executivo do Ministério Eloy Terena e também de toda a equipe da Ministra que a acompanhou, por terem garantido esse debate democrático entre representantes do Poder Executivo e do Poder Legislativo.
Agradeço também a presença de todos e todas que acompanharam o debate, inclusive daqueles que nos acompanharam pelas redes sociais.
Tem a palavra a Deputada Joenia, por 1 minuto.
A SRA. JOENIA WAPICHANA - Obrigada, Sr. Presidente.
Uma pergunta que eu achei bastante interessante foi a que os Parlamentares fizeram: "No que podemos ajudar?" Aprovem os PL positivos! Nós temos uma série de projetos de lei aqui para apoiar o avanço dos direitos constitucionais de povos indígenas, para proteção das terras indígenas. Há a questão da segurança climática, a questão da educação escolar indígena, a questão do rastreamento do ouro, que vai combater o garimpo ilegal em terras indígenas. Façam com que haja um orçamento condizente com a realidade dos povos indígenas! Possibilitem a atuação do Ministério dos Povos Indígenas e da FUNAI quando chegar aqui o Orçamento! Essa é a forma parlamentar como a Casa pode ajudar os povos indígenas. A partir do respeito ao direito de consulta prévia, livre e informada dos projetos de lei, que são atos legislativos, façam esse exercício de sempre consultar os povos indígenas! Então, esse é o mínimo que esta Casa pode fazer para ajudar.
E nunca devemos perder, digamos assim, a esperança de que nós vamos derrubar todos esses projetos anti-indígenas inconstitucionais. Nós contamos com toda a força de vocês, seja dos nossos Parlamentares, seja dos partidos políticos que sempre estiveram ao lado dos povos indígenas.
Muito obrigada, Presidente. (Palmas.)
17:30
RF
O SR. PRESIDENTE (Rui Falcão. Bloco/PT - SP) - Nada mais havendo a tratar, vou encerrar os trabalhos. Cancelo a Reunião Deliberativa Extraordinária convocada para amanhã e convoco Reunião Deliberativa Extraordinária para terça-feira, dia 6 de junho, às 14h30min, para a apreciação da pauta a ser divulgada em momento oportuno.
Está encerrada a reunião.
Boa tarde a todos e a todas.
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