Horário | (Texto com redação final.) |
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15:14
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A SRA. PRESIDENTE (Célia Xakriabá. Bloco/PSOL - MG) - Senhoras e senhores, parentes e não parentes, boa tarde.
Declaro aberta a reunião de audiência pública conjunta da Comissão da Amazônia, Povos Originários e Tradicionais e da Comissão de Legislação Participativa destinada a debater a regulamentação da Convenção nº 169 da OIT no Estado de Minas Gerais, com escuta específica de povos e comunidades tradicionais, garantindo as representações territoriais.
Ressalto que a presente audiência decorre da aprovação do Requerimento nº 19, de 2023, nesta Comissão, e do Requerimento nº 16, de 2023, na Comissão de Legislação Participativa, ambos de minha autoria.
Gostaria de agradecer a presença dos membros deste colegiado, dos palestrantes e de todas e todos os que nos assistem.
Informo que este evento está sendo transmitido via Internet e videoconferência e pode ser acessado pela página da CLP, no site da Câmara dos Deputados, e pelo canal da Câmara dos Deputados no Youtube.
Sejam todos bem-vindos. Todos já estão acompanhando pela plataforma. São várias pessoas, povo de luta.
Apresento o Sr. João Carlos Pio de Souza, representante dos Povos e Comunidades de Tradição Religiosa Ancestral de Matriz Africana — PCTRAMA; a companheira Moara Saboia, Vereadora pelo PT de Contagem, no Estado de Minas Gerais; a Sra. Makota Kidoialê, do Quilombo Manzo, de Belo Horizonte; a Sra. Bella Gonçalves, companheira Deputada Estadual pelo PSOL de Minas Gerais; a companheira Edna Correia de Oliveira, representante do N’golo, Federação Quilombola do Estado de Minas Gerais; a Sra. Andréia de Jesus, companheira também Deputada Estadual pelo PT de Minas Gerais; o Sr. Adair de Almeida — Nenzão —, representante de Comunidades Geraizeiras do Vale das Cancelas, de Grão Mogol, no norte de Minas Gerais; a companheira Beatriz Cerqueira, também Deputada Estadual pelo Estado de Minas Gerais; a Sra. Leninha, também companheira do norte de Minas Gerais e Deputada Estadual pelo PT de Minas Gerais; a Sra. Ana Cláudia, Defensora Pública Estadual, especializada em direitos humanos, do Estado de Minas Gerais; o Sr. Duílio Campos, Subsecretário de Desenvolvimento Social da SEDESE do Estado de Minas Gerais; a Sra. Marília, que foi convidada como Secretária de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável — SEMAD, também do Estado de Minas Gerais.
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15:18
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A SRA. PRESIDENTE (Célia Xakriabá. Bloco/PSOL - MG) - Obrigada, meu parente Cacique. Foi assim que diversas vezes fizemos as nossas vozes presentes, enquanto os nossos microfones foram desligados.
Este mês, para nós, povos indígenas, é um mês de importância e de resistência: o Abril Indígena. Completou 1 ano que essa Resolução nº 1, de 2022, da SEMAD/SEDESE foi publicada na imprensa social do Governo do Estado de Minas Gerais, sem qualquer consulta a povos e comunidades tradicionais.
Hoje temos aqui um debate muito importante, que traz o direito dos povos indígenas e tradicionais sobre a consulta prévia informada e a autonomia do nosso território nos casos dos atos administrativos de empreendimento que nos afetam, direito esse que está sendo ameaçado no Estado de Minas Gerais.
A resolução fere principalmente a Norma Internacional da Proteção dos Direitos Territoriais de Povos e Comunidades Tradicionais, que é a Convenção nº 169 da OIT, de 1989, baseada na Declaração Universal dos Direitos Humanos e em vários instrumentos internacionais sobre a prevenção da discriminação, também considerada em um tratado internacional de direitos humanos com a força da norma constitucional do art. 5º da Constituição Federal de 1988.
Pela Convenção nº 169, a consulta aos povos originários e comunidades tradicionais deverá ser prévia, livre, informada e concedida de boa-fé. Esses cinco atributos da consulta aos povos e comunidades tradicionais são inegociáveis e devem ser respeitados por todo o Estado brasileiro.
A partir da Resolução nº 1, o direito da consulta prévia, livre e informada, em forma concedida de boa-fé, está sendo negado ao Estado de Minas Gerais. Um dos pontos mais cruéis é a medida que prevê o caso de desacordo aos empreendedores e às comunidades. Mesmo que haja uma negativa desses povos, o Estado é quem tem a decisão final.
A consulta é prevista na Convenção nº 169 da OIT e precisa ser garantida, independentemente da vontade do Estado. Trata-se de uma convenção que se aplica a todas e a todos. Minas Gerais quer abrir uma brecha, e a brecha que se abrir em Minas Gerais vai ser também uma questão de repercussão geral em todo o Brasil. Por isso, parentes indígenas, povos e comunidades tradicionais de outros Estados que também estão presentes aqui, é um assunto importante.
Denunciamos a urgência da revogação desta resolução e lembramos que, como ela foi criada no mês de abril, seria importante que ela fosse derrubada ainda neste Abril Indígena.
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15:22
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Em audiência realizada no dia 14 de julho de 2022, a partir do inquérito do Ministério Público Federal, representantes do próprio Governo do Estado reconheceram a necessidade da reformulação da resolução conjunta. Estiveram presentes nessa audiência inúmeras autoridades, lideranças de povos e de comunidades tradicionais e entidades representadas. Até hoje não tivemos resposta desse processo.
Na audiência pública realizada na Comissão de Administração Pública da Assembleia Legislativa do Estado Minas Gerais, como as companheiras aqui presentes acompanharam, a Secretária de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável — SEMAD, a Sra. Marília de Carvalho Melo, disse expressamente que a resolução conjunta desagradou tanto as lideranças dos povos e comunidades tradicionais quanto o setor empresarial, especialmente o da mineração.
Diante disso, torna-se ainda mais urgente e relevante este debate, nesta tarde de hoje, aqui na CPOVOS, que inaugura um momento importante para deferir a revogação dessa resolução conjunta.
É importante informar que, hoje, a Comissão de Constituição e Justiça na Assembleia Legislativa de Minas Gerais aprovou um relatório pela legalidade da constitucionalidade do projeto de resolução, que susta os efeitos da resolução da Secretaria de Estado de Desenvolvimento Social — SEDESE neste abril.
É importante o passo da luta contra essa resolução nesta audiência. A resolução conjunta tem inúmeras inconstitucionalidades, anticonvencionalidades e ilegalidades, que serão tratadas ao longo desta audiência com lideranças e comunidades tradicionais.
É uma grande pena — e lamentamos — a ausência nesta audiência das Secretárias de Estado que são as autoras da Resolução Conjunta SEDESE/SEMAD nº 1 de 2022, a Secretária Elizabeth Jucá, da SEDESE, e a Secretária Marília de Carvalho, da SEMAD, mas expressamos aqui a nossa abertura e a nossa alegria com o diálogo com os povos e comunidades tradicionais no protagonismo desta Comissão, bem como a disposição para lutar pela revogação da resolução, assumindo os encaminhamentos que serão propostos aqui a partir de uma discussão conjunta.
É importante lembrar que esta audiência precisa, sim, ter a voz dos povos indígenas, das comunidades tradicionais, dos Deputados Estaduais e da sociedade civil, e que os encantados continuam nos abençoando, porque esta Comissão só existe pela Amazônia, pelos povos originários e tradicionais, que têm mantido a floresta de pé.
Antes de passarmos para o debate, peço a atenção de todos os presentes para as normas internas da Casa.
As Sras. e os Srs. Parlamentares interessados em interpelar os expositores deverão inscrever-se previamente junto à Mesa. O expositor convidado terá o tempo de 4 minutos para a sua explanação; e os Parlamentares convidados, o tempo de 2 minutos.
Gostaria de repetir que o tempo será de 4 minutos, assim conseguiremos ouvir os mais de 14 participantes aqui presentes. É importante honrar com esse tempo de cada um.
Após o encerramento da exposição, o Parlamentar inscrito terá o prazo de 3 minutos para fazer as suas considerações.
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15:26
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Na sua pessoa, eu saúdo e cumprimento todos os presentes nesta sala e os demais que participam virtualmente.
Eu sou João Pio. Eu falo aqui em nome dos Povos e Comunidades de Tradição Religiosa Ancestral de Matriz Africana — PCTRAMA, que é uma articulação de 42 comunidades tradicionais na região em torno do Rio Paraopeba, todas elas atingidas pelo desastre crime da Vale em Brumadinho.
Também sou da Irmandade da Nossa Senhora do Rosário da Comunidade Quilombola dos Arturos, que também será atingida pelo futuro empreendimento que entendemos que não é necessário, o tal do Rodoanel.
Eu estou, junto com os demais companheiros e companheiras das lideranças das comunidades tradicionais, na Comissão das Comunidades Atingidas pelo Rodoanel, dos 13 Municípios que serão atingidos por esse empreendimento.
Como dissemos de antemão, desde o primeiro momento, nós nos colocamos contra a resolução e exigimos a sua revogação. Primeiro, porque não houve consulta. Foi uma decisão do Estado, inclusive, que passou ao largo da discussão com as lideranças e com a Comissão Estadual de Povos e Comunidades Tradicionais de Minas Gerais. É bom dizer que Minas Gerais tem essa importante comissão, que teria o papel de fazer esse diálogo, e que não foi levado em consideração.
Além disso, o Estado de Minas Gerais não está acima da Constituição Federal e não pode legislar sobre uma convenção que tem o seu valor constitucional, qual seja, a Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho — OIT, segundo a qual deverá ser feita consulta prévia, livre, informada e de boa-fé, antes de qualquer empreendimento. É importante dizer isto: as comunidades precisam opinar.
Nós também refutamos qualquer tentativa de tutela do Estado em relação às nossas comunidades. Não é o Estado, não é uma empresa que decide sobre os nossos rumos, sobre aquilo que queremos na defesa dos nossos direitos, dos nossos territórios, do nosso modo de vida, que estão sendo impactados por um conjunto de empreendimentos.
A nossa preocupação — e até porque eu acompanhei essa resolução — é que o Estado deu o indicativo da elaboração da resolução num diálogo que aconteceu com a associação de empresas mineradoras do Brasil; logo, uma semana depois, essa resolução foi publicada. A partir daí, foi estabelecido esse profundo debate, e nós defendemos a revogação da resolução. Não é necessário nem reformulá-la; a Convenção 169, no nosso entendimento, é clara: a consulta é prévia, livre e informada, e quem deve decidir sobre os seus rumos, sobre o que fazer, sobre os empreendimentos a serem implementados e que afetarão as comunidades tradicionais são as próprias comunidades tradicionais, não é o Estado, não é a SEMAD nem a SEDESE, nem mesmo a OIT. O Estado disse que consultou a OIT e disse que não havia nenhum problema. Nem mesmo a OIT deve ser superior às nossas deliberações em relação a esse documento, às nossas decisões.
A consulta deveria ser feita somente a partir dos nossos protocolos, e nós precisamos construir esse protocolo. Eu acredito — o tempo aqui é curto — que já estamos demorando a acionar a própria OIT em relação a essa grande violação de direitos no Estado de Minas Gerais.
Mesmo com essa decisão, hoje, a CCJ da Assembleia Legislativa de Minas Gerais é em defesa mesmo da revogação, na luta pelos nossos direitos e pelos nossos territórios. Aqui nós estamos defendendo o nosso território, mas nós estamos defendendo a vida, nós estamos defendendo o nosso planeta, que é a nossa casa comum, é o nosso destino comum, e contra qualquer empreendimento que nos afete e que destrua o nosso modo de vida.
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15:30
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A SRA. PRESIDENTE (Célia Xakriabá. Bloco/PSOL - MG) - Muito obrigada, companheiro João Pio.
A SRA. MAKOTA KIDOIALÊ - Olá. Saudações ancestrais e aos encantados, a bênção aos mais novos e aos mais velhos. Cumprimento a Mesa na presença da Deputada Federal Célia Xakriabá.
O que me traz aqui hoje, na verdade, é também este questionamento: qual é o sentido de o Estado conceder um licenciamento sem uma consulta prévia e sem respeitar a Convenção nº 169 da OIT?
Entendemos que a Convenção da OIT é a principal normativa e política brasileira que deve ser defendida em qualquer intervenção que possa impactar uma comunidade ou um povo tradicional. Deve ser respeitada pela realização da consulta livre, prévia e informada para proteger essas comunidades, para que elas possam participar ativamente dos processos que possam atingi-las.
O que eu questiono aqui é o licenciamento que tem sido feito, sem que essa OIT seja respeitada. Eu questiono por qual motivo o Estado e o Governador Zema, de Minas Gerais, ignoram a existência dos povos e comunidades tradicionais nesse Estado.
O Quilombo Manzo já vem, há anos, fazendo o enfrentamento da falta de cumprimento desse decreto. Já perdemos a maior parte do nosso território. Já tivemos que romper com os laços afetivos da família. Hoje, a comunidade está em dois territórios diferentes, distantes um do outro, provocando este ano o maior conflito para a manutenção das nossas práticas religiosas, culturais e sociais, uma vez que o licenciamento que o Governador concedeu à Tamisa foi absurdo, ilegal, imoral e é inaceitável!
Acima disso tudo, ele criou um decreto que ausenta o cumprimento da OIT nº 169, tirando totalmente a participação da comunidade em qualquer tipo de intervenção cultural, social, religiosa dentro dos seus territórios. Mais absurdo ainda é que o próprio País cria uma lei, e o Governador interfere e infringe essa lei, mas nada é feito, e ele continua a infringi-la.
Ainda hoje estamos aqui presenciando a mineração ativa, e por mais que a lei venha para nos proteger e para garantir a nossa proteção e a nossa existência, ainda vemos o Estado ilegalmente passar por cima da lei, não cumprir com as suas obrigações, não respeitar os povos tradicionais, ignorar a nossa relação ancestral com o nosso território e nos obrigar, o tempo todo, a estar em uma sociedade da qual nós somos excluídos o tempo todo.
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15:34
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A minha pergunta ao Estado é: com que direito ele cria uma lei que interfere num decreto e quem deu a ele esse poder de se apropriar de todas as terras, inclusive dos territórios quilombolas, ou até mesmo ignorar aqueles que a eles pertencem, que já são certificados pela Fundação Palmares?
Sra. Deputada, são várias as violações dos nossos direitos, e eu preciso sair hoje daqui com essa resposta. O que eu entendo é que, para além de ser uma liderança comunitária, eu também sou um exemplo, uma referência para a minha comunidade e para os meus mais novos, que, a partir da minha luta, entendem qual é o seu direito, o direito da sua existência.
A SRA. PRESIDENTE (Célia Xakriabá. Bloco/PSOL - MG) - Muito obrigada.
A SRA. EDNA CORREIA DE OLIVEIRA - Primeiramente, eu queria pedir licença para manter a minha câmera fechada e, assim, assegurar que eu consiga falar, pois estou na comunidade, e o sinal da Internet aqui é muito ruim, por isso eu corro o risco de perder a conexão.
Primeiramente, quero cumprimentar todos e todas que estão na Mesa presencialmente e àqueles que estão participando virtualmente, na pessoa da Cássia Makota.
Eu acredito que a minha fala vai ser rápida, pelo fato de já ter sido contemplada tanto com a fala da Cássia quanto com a fala do João. Para mim, a resolução SEDESE/SEMAD é, na verdade, uma afronta aos movimentos e um crime contra as comunidades tradicionais quilombolas. Ela fala muito em questão de consulta, mas não consultou os povos tradicionais. Eu acredito que o objetivo dela é atender aos interesses do Governo Zema, desrespeitando a Convenção nº 169 e colocando em risco todo o modo de vida e as suas relações com os nossos territórios e a nossa própria existência, abrindo as portas para os grandes empreendimentos e também para o próprio Estado continuar retirando os nossos direitos.
A federação tem 18 anos e vem lutando pela defesa dos direitos quilombolas, mas nesses últimos anos
a luta está cada vez mais intensa. Houve desde fechamento de escolas até avanço das mineradoras, especulações imobiliárias, o próprio Rodoanel, entre outros empreendimentos que vêm atingindo as nossas comunidades.
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15:38
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Para finalizar, eu peço aos Parlamentares presentes, em especial à Deputada Célia, que também se debrucem sobre a revogação da Portaria Interministerial nº 60, de 2015. Ela também retira os nossos direitos, ela também nos prejudica. Eu entendo que, não mais tendo o Estado de Minas Gerais a resolução, para continuar retirando os nossos direitos, ele vai utilizar essa portaria para nos prejudicar ainda mais.
A SRA. PRESIDENTE (Célia Xakriabá. Bloco/PSOL - MG) - Muito obrigada, companheira Edna.
A SRA. PRESIDENTE (Célia Xakriabá. Bloco/PSOL - MG) - Sim, nós o ouvimos.
O SR. ADAIR ALMEIDA - Nós geraizeiros fomos afrontados, violentados por essa Resolução nº 01, de maio de 2022, do Governo Zema. Nós estamos num processo de retomada do nosso território geraizeiro, que abrange uma área de 228 mil hectares. Noventa mil hectares dessas terras do nosso território foram invadidos durante a ditadura militar, pelo Governo militar, nos anos 70, para a implantação de monocultura de eucalipto. Grandes empresas do agronegócio vieram para cá, jogaram veneno nas nossas terras, mataram o nosso gado, adoeceram (falha na transmissão)...
A SRA. PRESIDENTE (Célia Xakriabá. Bloco/PSOL - MG) - A conexão foi perdida? Fechou o microfone.
O SR. ADAIR ALMEIDA - ... numa situação muito grave, com muitas doenças, como problemas de coração, e muita gente morreu com câncer. A ditadura, depois de muito tempo, foi derrubada pela Constituição Federal, em 1988, mas ela não acabou aqui no Vale do Jequitinhonha, no norte de Minas, porque os empreendimentos e os Governos agem como se fossem fora da lei, não respeitam a Constituição Federal, não respeitam os direitos conquistados pelos povos e comunidades tradicionais.
A Convenção nº 169 é uma conquista do nosso povo, como também a Lei Estadual nº 21.147, de 2014, que é uma política de Estado. O Governo Zema e os outros Governos deveriam respeitar e cumprir a lei,
proteger os territórios, proteger os povos e comunidades tradicionais, demarcar esses territórios e titular, não entregar para a mineração, para as empresas do agronegócio. Essas terras devolutas, terras que sobrepõem o nosso território, deveriam estar (falha na transmissão) que o Governo faça a demarcação, a regularização fundiária dos territórios tradicionalmente ocupados pelo nosso povo.
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15:42
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A situação em que nós nos encontramos no enfrentamento à mineradora Sul Americana de Metais e outras mineradoras é muito grave, mas o mais grave é o Governo atentar contra os direitos coletivos e individuais do nosso povo, violar todas as leis de que já falei e criar um mecanismo, que é essa Resolução nº 01, que afronta totalmente o nosso direito de autoatribuição. Nós não podemos decidir sobre o que queremos. O Governo impôs essa resolução, essas medidas violentas. Nós queremos a revogação dessa resolução e propomos que o Governo ouça o nosso povo, de acordo com a Convenção 169, que respeite os nossos protocolos de consulta. Nós já estamos construindo nossos protocolos de consulta aqui, nos três núcleos do território: no Núcleo do Lamarão, no Núcleo Tingui e no Núcleo de Josenópolis. Nós já fizemos o do Núcleo Lamarão. Falta concluir o dos outros dois núcleos.
A SRA. PRESIDENTE (Célia Xakriabá. Bloco/PSOL - MG) - Muito obrigada, companheiro Nenzão, geraizeiro do Vale das Cancelas, que vem fazendo vários enfrentamentos e recebendo vários ataques também por parte do Estado.
Sou o Cacique Arapowana, do Território Xucuru-Kariri, da Aldeia Arapowã Kakyá, que fica em Brumadinho, território esse em que há 1 ano nós estamos em uma luta grande, batendo de frente com a multibilionária que se chama Vale.
Nós temos protocolo de consulta. Em vez de o próprio Estado tirar os nossos direitos, que estão na Convenção nº 169, ele deveria fazer a reparação ambiental no território. A mineradora Vale fala em todas as instâncias que lá é uma área de compensação ambiental, e em todos os momentos eles estão querendo nos retirar de lá. Somos 17 famílias. Nós vivemos lutando com a nossa autonomia, somos muitas vezes bronqueados, eu falo, mas nós temos que bronquear, temos que quebrar isso aí.
Não é nós, povos indígenas, que temos que ser bronqueados no nosso modo de vida, no jeito que nós nos organizamos dentro do nosso território, não. Mas está aí o Governo: ele dá com uma mão e quer tirar com a outra, se não tivermos cuidado.
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15:46
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Nós temos que nos unir, nós, povos indígenas. Lá também existe a Aldeia Kamakã Mongoió, que é dos pataxós. São quatro aldeias hoje lá no território de Brumadinho: duas ficam em São Joaquim de Bicas, que está sofrendo também. Então, eu quero trazer esse conhecimento.
Para nós xucuru-kariri, o desenvolvimento nosso é de sustentabilidade. Nós temos um protocolo de consulta. Quando entramos lá no território, não estava sendo respeitado, infelizmente. Não estava sendo respeitado o direito de ir e vir. Estavam passando por cima. Isso aí foi na nossa ocupação, do território. Mas, em vez de o Governo sempre estar querendo tirar, ele poderia, como eu estava falando, fazer a reparação ambiental em todas as instâncias. A mineradora Vale fala que lá onde nós estamos, que a área que estamos ocupando é uma área de compensação ambiental, e o próprio Estado tem conhecimento disso — o próprio Estado tem conhecimento disso. Ela está destruindo tudo, sai comprando as fazendas, não cumpre com seu dever social, e o próprio Estado tem conhecimento disso aí. Então, o Estado deveria fazer a reparação ambiental no nosso Estado, senão a água vai acabar. Está lá a Serra do Curral e mais serras. As mineradoras só estão de olho e nos monitorando, nós indígenas. Nós não precisamos ser monitorados, mas, sim, elas.
Então, eu peço, em nome de nosso (manifestação em língua indígena), aos órgãos competentes, às autoridades, primeiramente aos nossos encantados, que vejam a nossa luta — é uma luta honesta — e que respeitem o protocolo de consulta das nossas comunidades.
Eu peço também — faz 1 ano que a resolução está aí para julgamento; não é isso, Celinha? — que, neste mês de abril, agora, que é o mês da resistência indígena, ela venha a ser quebrada. Não é revogar, não, vamos quebrar. Eu peço a todos vocês uma força, uma ajuda, junto com todos os parentes. Nós não temos que revogar, não, nós temos que quebrar isso aí. O protocolo de consulta das nossas comunidades, não só dos indígenas, mas também de nossos amigos e irmãos quilombolas, dos povos tradicionais, onde houver ribeirinho, tem que valer e valer mesmo. Porque está lá dentro das instituições, está dentro das leis federais, e eles sempre querem passar por cima. Então, o Governo, em vez de fazer essas resoluções e de querer tirar nossos direitos, deveria fazer a reparação dentro do próprio Estado.
Aproveito também, porque está dentro de um protocolo de consulta, para dizer que eu sofro muito. Muitas das vezes, há uma escola dentro do meu território, para as nossas crianças, mas que precisa ser aperfeiçoada. Em qual sentido? Por não ser um território regularizado ainda, eu sofro muito, eu sofro muito, junto com o meu povo. Quando eu falo "eu", é o meu povo: junto com meu pai, que tem 65 anos de idade, que é um ancião do território, junto com meus filhos, junto com meus sobrinhos, com meus primos, com minha família, eu sofro.
Eu peço a todos que vejam não só a luta do povo xucuru-kariri de Brumadinho, mas, sim, a de todos, em geral — lá existem quatro aldeias —, e o Estado de Minas Gerais em gerais, gerais em gerais. Eu faço um apelo, por tudo o que for mais sagrado, para que nós venhamos a fazer valer mesmo o nosso protocolo de consulta e que não venham passar por cima, como passam por cima das serras e das águas e só querem destruir. Porque nós povos indígenas não destruímos, não! Nós sabemos plantar, nós sabemos colher. Nós somos árvore, nós somos natureza. Nós somos árvore, que precisa ser aguada para brotar e florir.
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15:50
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A SRA. PRESIDENTE (Célia Xakriabá. Bloco/PSOL - MG) - Muito obrigada, cacique, que veio presencialmente para fazer essa fala tão importante.
Brumadinho foi atingida pelo rompimento da barragem da Vale. Assim como vem ocorrendo com o povo ianomâmi ou com os demais povos, não podemos ter comoção somente momentânea, porque matam rios, matam peixes. Quero dizer da importância dessa fala, do representante de um dos povos que também foram atingidos, e da presença mais ampliada aqui, porque essa resolução vai atingir os demais povos do Estado de Minas Gerais e também pode abrir um precedente, em âmbito nacional e até internacional, porque fere o direito de consulta previsto na Convenção 169, da OIT.
A SRA. DUDA SALABERT (PDT - MG) - Boa tarde, Presidenta.
É triste ver isso. Minas Gerais está sendo um mau exemplo, que tem se reproduzido no Brasil inteiro, como a companheira Célia aqui o disse. Agora, como se não bastasse ser um mau exemplo para o Brasil inteiro, pode repercutir em questões internacionais, de como construir uma antipolítica ambiental e de como destruir os direitos fundamentais de povos tradicionais, de comunidades tradicionais e de povos indígenas.
Minas Gerais já é o exemplo de que vivemos o contexto do fim do licenciamento ambiental. O Governador Romeu Zema conseguiu acabar com o licenciamento ambiental, já que grandes projetos de mineração, grandes projetos de impacto socioambiental não precisam mais de licença ambiental. Conseguem trazer um termo de ajuste de conduta, um TAC, e se instalar, como queriam fazer na Serra do Curral e estão fazendo em outras serras. Então, há um desmonte completo da legislação ambiental, que afeta sobretudo os povos indígenas e tradicionais, que estão aqui representados, a quem agradeço por toda a luta e por toda a resistência.
Reitero que o nosso mandato se coloca em parceria com o da companheira Célia, seguindo as diretrizes que a Deputada Célia e a bancada do cocar apontarem. Nós viemos como parceiras de luta.
Lá na Região Metropolitana de Belo Horizonte, tive contato mais próximo — e em Brumadinho também; no caso, na cidade de São Joaquim de Bicas — com a Aldeia Naô Xohã, e vi o absurdo que lá está acontecendo. O Estado, que deveria na verdade buscar resolver ou diminuir os impactos do crime ambiental, tem aprofundado o crime ambiental ao flexibilizar mais a legislação ambiental.
Temos que lembrar que o que aconteceu em Brumadinho foi resultado do fim da legislação ambiental em Minas Gerais. Fomos palco dos dois maiores crimes ambientais da história deste País, e o Governador Romeu Zema ignora isso,
ignora as vidas envolvidas, impactadas e quer aprofundar mais ainda o ataque à legislação socioambiental.
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15:54
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A SRA. PRESIDENTE (Célia Xakriabá. Bloco/PSOL - MG) - Obrigada, Deputada Duda, companheira que também vem fazendo no Parlamento o enfrentamento à mineração, desde a sua vereança no Estado de Minas Gerais.
A SRA. ANA CLÁUDIA ALEXANDRE - Boa tarde, Deputada Célia Xakriabá, na pessoa de quem cumprimento a todos os presentes.
É muito importante nós pontuarmos, após as falas dos representantes dos povos e comunidades tradicionais, como ressaltado pelo João Pio, que a própria resolução, em si mesma, já demonstra essa atitude contrária à política de desenvolvimento sustentável dos povos e comunidades tradicionais que está em vigor no Estado de Minas Gerais. Foi ali criada a Comissão dos Povos e Comunidades Tradicionais, que sequer foram consultados sobre a resolução. Ainda que a Secretária tenha dito que a resolução incomoda as mineradoras, nós não estamos falando aqui de políticas que têm que fazer consulta às empresas interessadas na mineração ou em grandes empreendimentos, porque nós estamos falando de uma política que antes de mais nada é determinada para o Estado brasileiro pela Constituição e pelas convenções por ele assumidas.
Sobre a Convenção nº 169, da OIT, que está em vigor, quando o Estado tenta levar para esse debate, que aparentemente é jurídico, tentando fragilizar os interesses dos povos e comunidades tradicionais, na verdade, ele está abrindo uma divergência, uma litigância inaceitável com os direitos conquistados pelos povos e comunidades tradicionais, não por vontade de qualquer gestor, mas porque nós estamos falando do nosso patrimônio cultural. Então, nas manifestações do Estado nos processos judiciais hoje, a partir do momento em que isso foi levado para essa instância judicial, ele manifesta que na lei do Estado de Minas Gerais a mineração é considerada uma utilidade pública. Quem tem esse interesse público, então, na visão estatal, mereceria... Isso daria ao Estado o direito de violar os direitos dos povos e comunidades tradicionais.
Em suma, porque o tempo aqui é pouco, a defensoria pública também está, em alguns processos judiciais, questionando a falta de consulta livre, prévia e informada nos procedimentos que hoje estão sendo conduzidos pelo Estado de Minas Gerais e que favorecem principalmente a mineração. Efetivamente por quê? Porque não é uma questão simplesmente de vontade política, ou de conveniência, ou de oportunidade o Estado cumprir a lei.
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15:58
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A política de desenvolvimento sustentável dos povos e comunidades tradicionais, que está na lei federal e na Lei nº 21.147, do Estado de Minas Gerais, fala em política sustentável. Não há sustentabilidade numa política que vai violar direito de povos e comunidades tradicionais. Nós não temos tempo, neste mundo, para dar crédito a empresas que querem passar por cima daqueles que estão ali — são o nosso patrimônio cultural, é a nossa biodiversidade — protegendo, principalmente, o nosso patrimônio, que corre o risco, sim, em tempos de emergência climática, em tempos de questões muito graves contra o nosso meio ambiente, desse tipo de violação. Então, é muito importante que nós levemos o debate para esse contexto, não só nesta minha manifestação, mas também em várias outras. O princípio da sustentabilidade do art. 225 da Constituição Federal obriga toda e qualquer política pública a obedecer a todos aqueles parâmetros de sustentabilidade que estão colocados na lei. Não é preciso isso para resolução, nenhum tipo de decreto, instrução normativa. Não cabe ao Estado, não tem oportunidade, conveniência violar a norma que determina que para as presentes e futuras gerações nós temos que preservar o nosso meio ambiente e garantir a sadia qualidade de vida.
Então, os direitos que nós estamos colocando aqui hoje nesta discussão, Deputada — e é muito importante esta questão —, são os direitos de sustentabilidade de vida, da nossa vida no planeta Terra. Não há como não levar para esse espaço. Proteger o direito dos povos e comunidades tradicionais hoje é proteger a nossa vida no planeta.
Então, efetivamente, não há como levar isso para uma questão jurídica, ainda que em instância judicial ou em qualquer outra, e considerar como válido ferir o direito dos povos e comunidades tradicionais. Estamos, então, defendendo o direito dos povos e comunidades tradicionais e continuaremos defendendo eles tanto no âmbito das instâncias extrajudiciais quanto no âmbito das instâncias judiciais.
Como foi dito aqui pelo João Pio, logo no início, eu acho importante ressaltar essas questões, acredito que a questão não pode se limitar ao Estado brasileiro, porque é violadora de normas internacionais e efetivamente é uma vergonha mesmo, como disse a Deputada Duda, Minas Gerais se lançar contra os povos e comunidade tradicionais, em vez de proteger, um Estado tão rico e diverso, em vez de garantir a proteção desse patrimônio. Esses povos estão ameaçados aqui no nosso Estado, principalmente pelo Estado de Minas Gerais. É uma vergonha.
A SRA. PRESIDENTE (Célia Xakriabá. Bloco/PSOL - MG) - Obrigada, companheira Ana Cláudia, defensora estadual especializada em direitos humanos.
Quero agradecer à companheira Deputada Federal Erika Kokay, que está aqui também, acompanhando a audiência. Na oportunidade, mais uma vez quero agradecer aos parentes indígenas presentes, aos pankararus, aos xucuru-kariri, aos krahô-kalapalo, aos xavantes, aos iauanauás, aos terenas, aos sateré-mawé e aos guajajaras.
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16:02
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Quero saudar a companheira Célia Xakriabá, a Comissão e todos os participantes e parabenizar pela iniciativa.
Aqui está meio corrido. Eu estou presidindo neste momento uma audiência na Comissão de Direitos Humanos, sobre o sistema prisional, uma audiência quente — os problemas são velhos.
Eu quero dizer da importância, Célia Xakriabá e companheiras que aí estão, de estarmos discutindo algo que é muito importante, o olhar internacional para isso.
As comunidades tradicionais, os povos quilombolas, os povos indígenas, o nosso povo tem direito a ser consultado sobre qualquer alteração, mesmo que seja simplesmente administrativa. O que vemos é que o Estado não cumpre isso. O Estado se nega a ouvir as comunidades tradicionais. O pior disso tudo é que nem sequer as comunidades foram consultadas sobre a construção de uma resolução interna do Estado, que lavou as mãos, Célia. Porque nós estamos falando de um Estado que hoje tem mais comunidades quilombolas do que Municípios. Há 853 Municípios, mas muito mais comunidades quilombolas e povos tradicionais aqui. Então, sobre qualquer mudança, principalmente essas que impactam diretamente seus territórios, é preciso a participação direta dos povos.
Eu queria deixar registado que nós aqui fizemos uma audiência logo que soubemos, pelo Diário Oficial, que o Estado tinha feito uma resolução. Essa audiência, muito rica também, serviu para ouvirmos que os povos têm construído o protocolo. Os povos indígenas talvez tenham sido os primeiros a construir os seus protocolos, mas as comunidades quilombolas, como a dos Arturos, uma comunidade quilombola em contexto urbano, estão construindo o seu protocolo. O protocolo precisa ser construído pela comunidade, com a participação da comunidade, mas é imprescindível que seja no tempo da comunidade. O que vemos é o lobby das mineradoras para que se acelerem os processos, o que mais uma vez exclui a comunidade. Criam prazos desnecessários, prazos que não atendem a comunidade, criam impedimentos para as comunidades fazerem o seu processo, no seu tempo, com a sua linguagem e respeitando a demanda que é própria de cada comunidade.
Então, saiba que aqui na Assembleia Legislativa seguimos firmes, orientando o nosso povo sobre o que é um tratado internacional e que qualquer decisão tomada pelo Estado, sem ouvir os povos, é ilegal, imoral e fere um tratado internacional. O Estado brasileiro precisa ser punido por não ouvir as comunidades tradicionais, mas ele segue se preparando. Neste momento, pode ter certeza de que metade das comunidades tradicionais aqui em Minas Gerais está sentada, construindo um protocolo próprio. Enquanto elas não se posicionarem, nenhum empreendimento pode devorar os seus territórios. Eu sigo aqui com as tarefas que são ancestrais. V.Exa. sabe bem disto: o nosso chamado é ancestral. Mas saiba que estamos vivos para garantir os nossos vivos.
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Então, vamos seguir com a tarefa de garantir que, para qualquer protocolo sobre o avanço de regras e de regramentos para adentrar ou mudar qualquer estrutura administrativa, estrutura que venha da comunidade, o Estado respeite o tempo que a comunidade precisa para construir.
A SRA. PRESIDENTE (Célia Xakriabá. Bloco/PSOL - MG) - Obrigada, companheira Andréia de Jesus, pelo convite. Organizaremos isso, sim, na Comissão de Direitos Humanos.
Eu me sinto muito honrado pelo convite para estar aqui nesta oportunidade conversando sobre este tema, que tem trazido muita apreensão para os povos e comunidades tradicionais no Estado de Minas Gerais.
O Estado de Minas Gerais, como foi falado aqui — e eu pego a fala do Nenzão, do Vale das Cancelas, no Município de Grão Mogol, como exemplo, o que se repete em outras partes do Estado de Minas Gerais, inclusive com o seu povo xakriabá, Deputada Célia, no Vale do Jequitinhonha, no norte de Minas, em vários lugares de Minas Gerais —, vive constante violação de direitos humanos, perpetrada pelo próprio poder público. O Estado de Minas Gerais é um grande violador de direitos humanos, quiçá o maior violador de direitos humanos no território do próprio Estado. Dizia que pego a fala do Nenzão porque, naquela região do norte e do nordeste de Minas, na década de 70, no Governo Rondon Pacheco, tivemos uma política de aniquilamento dos povos tradicionais que viviam na região do Vale do Jequitinhonha e em outras áreas. Eles foram, como sempre, invisibilizados, desconsiderados, ignorados, e as terras por eles ocupadas — por quilombolas e indígenas da etnia aranã, da região de Coronel Murta — foram dadas em comodato pelo Estado de Minas Gerais, e nelas foi plantado eucalipto. Justamente as áreas de preservação, as áreas de Cerrado, foram objeto de plantio de eucalipto e pínus, e muitos foram os danos, como a ciência mostra, desse tipo de atividade.
Essa longa invisibilização continua. Agora, por exemplo, os geraizeiros, que já tiveram o seu território amesquinhado pelo eucalipto e pelo pínus, veem-se diante de conflitos com a mineração. É uma questão que se espalha pelo Estado de Minas Gerais. Aquela antiga invisibilização agora foi trocada por outro modo, que é o modo de substituição do Estado, que se coloca e fala no lugar dos povos e comunidades tradicionais.
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Eu digo isso porque o Estado de Minas Gerais já recebeu uma recomendação do Conselho Nacional de Direitos Humanos que aponta a ilegalidade, a inconvencionalidade e a inconstitucionalidade da Resolução SEMAD nº 01, de 2022. Essa recomendação do CNDH — Conselho Nacional de Direitos Humanos é no sentido de que o Estado de Minas Gerais revogue essa resolução.
Ocorreu também a audiência pública, na Assembleia Legislativa, mencionada pela Deputada Andréia de Jesus, e, nada obstante, até o momento o Estado de Minas Gerais, que disse que teria aberto uma consulta pela Internet e certamente não trouxe os elementos relativos a essa consulta, não fez as alterações necessárias, ou seja, a revogação.
Então, em muito boa hora — e eu fico feliz por isto — ouvi a notícia hoje do posicionamento da Comissão de Constituição e Justiça da Assembleia de Minas Gerais pela sustação dessa resolução, mas eu gostaria de observar o seguinte: essa resolução tem que ser considerada um nada jurídico. Ela é totalmente inválida. Porque não cabe nem mesmo, Deputada Célia, a esta Casa, a este Parlamento, regulamentar o direito à consulta. O direito à consulta está previsto numa norma que tem natureza de norma definidora de direitos humanos, previsto na Constituição Federal, no § 2º do art. 5º, que diz que as normas definidoras de direitos fundamentais têm aplicação imediata. Se alguém vai regulamentar o direito de consulta, é o próprio povo tradicional a ser consultado. É aquela história: se eu chego à sua casa, qual é a regra que vale? A regra da sua casa. Eu estive lá no território do seu povo, o povo xakriabá. Eu tenho que saber, quando eu chego ao território xakriabá ou a uma aleia xucuru-kariri, que ali estão os donos da casa. A nossa Constituição prevê, como um dos princípios do Estado brasileiro, o pluralismo jurídico. O que quer dizer isso? É o respeito também ao direito interno dos povos que vivem no Brasil, dos povos originários, dos povos indígenas, dos povos tradicionais. Então, nesse contexto, não faz sentido uma resolução como essa. Esse é um dos elementos de invalidade dessa resolução. Porque não cabia fazer sem ouvir, e, mesmo ouvindo, não cabe ao Estado dispor sobre essa temática.
Esse é um ponto que eu acho que precisa ser bem compreendido. Quando o Estado assim age — e eu falava do Estado violador de direitos humanos —, o Estado atrai para si... ele viola direitos humanos e ele pode vir a ser condenado a reparar esses danos morais causados aos povos e comunidades tradicionais que vivem no Estado de Minas Gerais, que vivem em territórios dentro do Estado. Essa reparação por danos morais nós chamamos, em direito, de dano in re ipsa: pelo simples fato da expedição dessa resolução, o Estado já está incorrendo em mora.
Da mesma forma como o Estado, os gestores querem terceirizar para as empresas...
Nessa resolução, eles terceirizam para o empreendedor a consulta, a realização de consulta, o que é um dos absurdos, além desses outros que são relatados. Quando o Estado vai responder ao Ministério Público Federal, ele terceiriza para os servidores do Estado. Os servidores que estão nos níveis hierárquicos abaixo respondem ao Ministério Público e certamente respondem a outros órgãos. As Secretárias não subscrevem, não assinam nenhum documento defendendo a legalidade desse ato, tanto que o ato não foi expedido pelo Governador. Deveria ser um decreto. Resolução é um instrumento de órgão colegiado. Estranho você pensar numa resolução de órgão não colegiado, de órgãos monocráticos.
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Fechando, cito um ponto importante para o qual devemos atentar: os servidores que vêm assinando essas informações e que dizem que essa regulamentação seria do interesse e a pedido dos próprios povos tradicionais, uma informação que me parece ser inverídica, podem ser responsabilizados por apresentar informações falsas ao Ministério Público ou a outros órgãos. Também as Secretárias do Sr. Governador podem vir a ser responsabilizadas, no caso de uma condenação do Brasil na esfera internacional ou de uma condenação do Estado de Minas Gerais pelos danos morais, na esfera judicial. Esses servidores públicos, esses agentes públicos estatais podem ser responsabilizados, também regressivamente, como nós dizemos tecnicamente. O Estado pode e deve cobrar deles os valores de que o Estado se vir obrigado a dispor para indenizar por esses danos. Então, é muito importante que todos estejam cientes disso, porque estão sendo bem informados da ilegalidade desses atos e podem vir a ser responsabilizados, porque não há dúvida de que se trata de atuação dolosa.
A SRA. PRESIDENTE (Célia Xakriabá. Bloco/PSOL - MG) - Muito obrigada, Dr. Helder, pela ampla experiência e pelo acompanhamento. É importante todo o apanhamento que faz e dizer o que isso significa numa outra linguagem. Este caso, eu sempre falo, é de repercussão geral, pode também acabar sinalizando para o Brasil inteiro. Em outras situações, pode acabar atingindo outros povos e comunidades tradicionais aqui representados.
Atualmente também estou Vice-Presidente da Assembleia Legislativa de Minas Gerais. Isso é muito importante, porque aqui na Mesa nós fazemos essa resistência e manifestamos o compromisso com a nossa luta, que é histórica, desde antes de estarmos Deputada.
Ouvi a fala do Dr. Helder. Muito obrigada. Eu tenho a segurança muito grande hoje de saber que nós temos um novo governo federal, que temos uma Deputada Federal tão articulada, tão conectada com a luta dos povos originários.
Eu sei que o que provocou esta audiência pública de hoje foi uma prática também muito comum neste Governo. Infelizmente, nós temos um governo muito refém das mineradoras, dos grandes projetos, dos grandes empreendimentos no Estado de Minas Gerais.
Esta semana nós tivemos uma grande vitória temporária numa comunidade quilombola do Serro, na Comunidade de Queimadas. Assistimos à invasão dos grandes empresários, fazendeiros, a uma reunião do povo quilombola. Uma audiência que aconteceria amanhã foi suspensa, graças à ação do Ministério Público Federal. É nesse povo que nós colocamos a nossa esperança e a nossa força, para seguirmos em luta.
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Essa resolução conjunta da SEDESE e da SEMAD ameaça de fato a própria existência dos povos e comunidades tradicionais. Por isso, junto com o mandato da Deputada Célia, nós também encaminhamos ao Governo do Estado e aos órgãos competentes requerimento para total revogação dessa resolução.
Como disse o Dr. Helder, não é possível fazer uma consulta on-line com povos que não têm sequer sinal de Internet ou que às vezes nem energia elétrica têm! É impossível criar um mecanismo de consulta com base em condições que nem o próprio Estado cria para as comunidades tradicionais.
Eu lembro que estivemos, desde o início, resistentes a essa resolução, à forma como o Governo a colocou. Enfim, nós estamos aqui para dizer que seguimos juntas e juntos nessa resistência. O nosso mandato segue firme na defesa dos povos tradicionais e dos seus direitos, como sempre fizemos aqui, desde o primeiro mandato. Estamos em via de aprovar a reforma no segundo turno, amanhã, e estamos lutando nas Comissões para não recuarmos, para não termos perdas. Infelizmente, ainda temos uma bancada muito conservadora, que persegue os nossos povos, que persegue o grupo da minoria e da maioria também. Mas nós seguimos juntos nessa audiência, que é muito importante para conseguirmos de fato revogar essa resolução e fazer um processo decente, um processo em que as comunidades sejam ouvidas e sejam construtoras dos seus processos de desenvolvimento.
Na correria, passamos por aqui porque confiamos também no seu trabalho, no seu mandato, como no de outros Parlamentares. Aqui no Estado de Minas Gerais também, você pode contar também com vários mandatos de Deputadas e Deputados. Vamos seguir irmanados para conseguirmos revogar essa resolução do Governo de Minas Gerais, que para nós é um absurdo!
A SRA. PRESIDENTE (Célia Xakriabá. Bloco/PSOL - MG) - Muito obrigada, Deputada Leninha, uma das primeiras mulheres negras a presidir uma Comissão também no Estado de Minas Gerais, um lugar tão importante para as tratativas também do que vem ocorrendo com os nossos povos.
Um salve aos povos e comunidades tradicionais que estão nessa audiência pública e um salve especial à Deputada Célia Xakriabá, minha companheira de luta, que é a primeira mulher do PSOL também a presidir uma Comissão, uma mulher indígena que traz representatividade para o Congresso e força para essa Comissão tão importante.
Eu queria estar aí com vocês. Estou bem apertada nessa luta, mas estamos aqui participando, hoje, para tentar trazer um pouco desse debate, que não é um debate novo, mas é um debate muito sério para o Estado de Minas Gerais.
Primeiro quero saudá-la pela iniciativa de fazer essa audiência pública acontecer em âmbito federal, porque eu sinto que a resolução SEDESE/SEMAD de fato representa uma violação de um tratado que o Brasil assinou — a Convenção nº 169 da OIT — e também uma violação da própria Constituição Federal, ao construir, sem escutar e sem consultar os povos, uma regulamentação sobre como se deve dar a consulta livre, prévia e informada. E, pior, hoje, nessa audiência pública, nós não temos a presença da Secretaria Marília ou da Secretária Elizabeth Jucá, que foram as signatárias dessa resolução pavorosa.
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Nós também faremos uma audiência aqui na Assembleia Legislativa sobre esse tema e não vamos sossegar até que seja revogada a Resolução nº 1 SEDESE/SEMAD. Eu até queria dizer que tivemos uma audiência pública aqui, na Comissão de Meio Ambiente, em que a Secretária Marília comentou sobre a resolução SEDESE/SEMAD. O que ela disse? Ela falou: "Nossa! Essa resolução é tão complicada que ela desagradou todo mundo!". Eu falei: "Secretária, se é uma resolução que desagradou todo mundo, o que precisa ser feito agora é a sua revogação". Mas, até hoje, não tivemos resposta aos nossos pedidos de informação nem tivemos resposta sobre a revogação dessa resolução. Mas eu acho que esta audiência pública contribui para que avancemos nesse sentido.
O que estamos vendo no Estado de Minas Gerais, Deputada Célia e todos demais, é muito grave. Nós temos a Convenção nº 169 da OIT, que nasceu quase junto da Constituição Federal — a Convenção é de 1989 — para poder desconstruir um ideal de desenvolvimento que, na verdade, significava um dilaceramento das comunidades. Minas Gerais é a prova de como esse modelo arruinado de destruição das nossas serras e das nossas águas pode provocar tanta dor. Aconteceram dois dos maiores crimes socioambientais da história, com muitas mortes e com a perda de rios inteiros. E o recurso utilizado para a reparação das comunidades afetadas por esses crimes ambientais, em vez de ir para o que é prioridade para essas comunidades — como o direito à assessoria técnica independente —, tem sido cortado. Por outro lado, mais recursos têm sido utilizados para distribuir grandes obras para os Municípios para fazer grandes empreendimentos, como o Rodoanel, que também, por sua vez, viola novamente a Convenção nº 169 da OIT e viola o direito à consulta livre, prévia e informada das comunidades.
Nós estamos votando aqui na Assembleia Legislativa uma proposta de reforma administrativa do Governo Zema, que é um verdadeiro desmonte ambiental. Nós já tivemos a destruição do Conselho Estadual (falha na transmissão), e agora nós estamos tendo uma destruição também do sistema do meio ambiente, o que faz com que os mecanismos genéricos de participação e consulta das comunidades não sejam efetivos. Eles já não dão conta de representar de fato o direito de as comunidades dizerem "não" ou o direito de as comunidades terem os seus modos de vida preservados. Se os mecanismos gerais já não dão conta da proteção às comunidades tradicionais, que se dirá agora, após a aprovação dessa resolução horrorosa ou da entrada em vigor dessa resolução horrorosa!
A Leninha citou o fato horrível que aconteceu, ontem, na cidade do Serro. A Secretaria de Meio Ambiente, junto com a Prefeitura local, Câmara de Vereadores, fazendeiros, vai submetendo a população quilombola a uma situação de risco ou de ameaça. A audiência pública, que estava marcada para acontecer no dia de hoje, teve uma baixa participação da comunidade, porque 2 dias atrás uma assembleia da comunidade foi invadida pelos fazendeiros, que ameaçaram e agrediram as lideranças do movimento social e também os quilombolas.
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Isso é para dizer que, quando a população tradicional está submetida a mecanismos gerais de participação ambiental que estão sendo desmontados, essa população vai ser massacrada, ela vai ser colocada numa situação de ameaça. Se o direito à consulta livre e prévia informada é violado, essas comunidades ficarão completamente desprotegidas. Ainda bem que a Justiça Federal suspendeu essa audiência, porque ainda vigora no nosso País a Convenção nº 169, e essa resolução não foi considerada legítima, de fato, para esses fins.
Então, é isso. Queria dizer que nós vamos nos manter firmes aqui até a revogação imediata da resolução. É importante que tanto o Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, quanto o Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima e o Ministério dos Povos Indígenas mandem portarias para os Estados no sentido de informá-los de que a consulta livre e prévia informada é feita de acordo com critérios de consulta autodefinidos pelas comunidades e que nenhum Estado pode interferir nisso.
Quero saudar de novo os povos e comunidades tradicionais, que são os verdadeiros guardiões da Amazônia, do Cerrado, das nossas terras e águas. Sem os povos e comunidades tradicionais, o Brasil já seria só cratera. Ainda bem que nós temos lutadores e lutadoras como a Célia, como os caciques aqui presentes e como as comunidades quilombolas.
A SRA. PRESIDENTE (Célia Xakriabá. Bloco/PSOL - MG) - Muito obrigada, companheira Bella, que também está à frente da luta da questão ambiental no Estado de Minas Gerais, fazendo vários enfrentamentos também ao projeto de destruição.
A SRA. ALESSANDRA JACOBOVSKI - Boa tarde a todas e todos. Gostaria de saudar a Mesa, em especial a Deputada Celinha, que tem sido uma grande apoiadora da nossa luta. Quero destacar que essa resolução é uma grave violação de direitos humanos, é um grave precedente que pode ser adotado pelos demais Estados da Federação. Ela trata da consulta e também do consentimento prévio, livre, informado e de boa-fé dos povos de comunidades tradicionais.
Essa resolução apresenta uma série de vícios de iniciativa e materiais. Entre os vícios materiais, eu vou destacar rapidamente alguns, só para nós termos noção do quão grave é essa resolução. Entre esses vícios, há a violação do direito de autodefinição. A resolução determina que quem vai ser objeto da consulta são os povos e comunidades tradicionais certificados pelo Estado, certificados pela Fundação Cultural Palmares, pela FUNAI e pela Comissão para o Desenvolvimento dos Povos e Comunidades Tradicionais de Minas Gerais.
Nós sabemos que o direito de autodefinição é um direito do próprio povo. São os povos e comunidades que definem quem é povo e quem é comunidade tradicional. Esse é um direito que já está muito bem assentado pela Convenção nº 169, pela Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais e pela jurisprudência nacional. Além disso, essa resolução também abre o grave precedente para que o empreendedor realize a consulta.
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Para além disso, o que é mais grave, essa resolução determina um parâmetro único, um procedimento, um roteiro geral de consulta para todos os povos e comunidades tradicionais do Estado de Minas Gerais. Isso é muito grave. Por quê? Porque viola os calendários tradicionais, o calendário para a agricultura, o calendário tradicional para as manifestações culturais e religiosas.
Sabemos que a consulta deve ser realizada segundo os parâmetros dos próprios povos, em seus protocolos de consulta, e são esses protocolos que definem como a consulta vai ser realizada, o local, quem participa, quem não participa, as fases de consulta, e o que é mais importante: como o consentimento deve ser formado. Então, são os próprios povos. Vamos lembrar que o Brasil é referência na construção e na aplicação de protocolos de consulta.
Eu gostaria de destacar que essa resolução também determina que o objeto da consulta vão ser os povos que estão em áreas diretamente afetadas, e a convenção determina que os povos objetos de consulta são aqueles que estão em área diretamente e indiretamente afetada. Isso inclui o quê? Os impactos sociais, econômicos e culturais. Tudo isso deve ser considerado na consulta.
Por fim — depois nossa companheira Layza vai fazer mais algumas observações — é importante dizer que essa consulta abre brecha para, nos casos em que é dispensado o EIA/RIMA, o próprio empreendedor informar se a área do empreendimento tem ou não povos e comunidades tradicionais. Isso é um absurdo. A resolução está dependendo da boa-fé do próprio empresário, ou seja, da parte interessada. Certamente esse ponto vai ser causa de acirramento de conflitos e violações de direitos humanos.
A SRA. PRESIDENTE (Célia Xakriabá. Bloco/PSOL - MG) - Muito obrigada, Alessandra, advogada da Terra de Direitos, que vem acompanhando toda a situação dos enfrentamentos e dos atingidos com essa resolução.
Quero cumprimentar todo mundo na pessoa da Deputada Federal Célia Xakriabá, saudando-a pela iniciativa de realizar esta audiência pública no mês de abril, em que faz 1 ano da publicação da resolução, mês de luta também dos povos indígenas no Brasil. Eu acho que é muito significativo discutirmos hoje esse assunto.
Eu quero pegar um gancho no final da fala da Alessandra quando ela traz a questão da presunção da boa-fé do empreendedor.
A resolução traz que, em procedimentos em que não haja a necessidade de um EIA/RIMA, o empreendedor vai dizer se tem ou não povo e comunidade tradicional, sendo que há uma práxis nos grandes empreendimentos de invisibilizar a existência dos povos e comunidades tradicionais justamente pela necessidade de atropelar o procedimento e fazer com que o empreendimento passe.
A prática de invisibilização e de desconsideração da existência do povos e comunidade tradicionais está na gênese desse processo de desrespeito, inclusive do processo da Convenção nº 169 da OIT. Então, todas essas violações materiais presentes no conteúdo da resolução nos demonstram o objetivo que está por detrás dela. E acho que é importante discutirmos isso. A resolução é restritiva de direito em sua essência. Existe um processo amplo e histórico no Estado de Minas Gerais de violação do direito dos povos e comunidades tradicionais, enfim, de violação do direito de consulta. E a resolução vem no sentido de fortalecer esse processo.
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Uma das justificativas apresentadas pelo Estado foi que a resolução permitiria que eles aplicassem a Convenção nº 169 da OIT. Todavia, o próprio procurador aqui acabou de dizer — e temos dito isso há muito tempo — que ela é um tratado, uma norma de direitos humanos que tem aplicabilidade imediata. Então, a não observação do que está previsto na Convenção nº 169 da OIT é uma ilegalidade que está sendo praticada pelo Estado de Minas Gerais há muitos anos.
Estamos nessa mobilização há muito tempo. Fizemos cartas públicas com mais de 80 assinaturas de povos e comunidades tradicionais e entidades pela revogação da resolução, com diversos pareceres e notas técnicas. Existe uma recomendação do Conselho Nacional de Direitos Humanos pela revogação da resolução, existe uma série de manifestações nacionais e estaduais considerando essa perspectiva para a revogação da resolução. E um elemento que é muito importante e basilar nessa discussão, que diz respeito a esses vícios de iniciativa, vícios de origem, é que a resolução é uma medida administrativa.
A Convenção nº 169 da OIT fala que a consulta é prévia a qualquer medida administrativa ou legislativa que possa afetar os povos e comunidades tradicionais. A publicação dela, dessa forma, sem a consulta, é nulidade absoluta. Não há o que se discutir. Há uma nulidade absoluta no processo de concepção e de publicação da resolução, além do fato de ela legislar e trazer discussões que dizem respeito aos direitos dos povos indígenas e à competência privativa da União em fazer isso.
Então, a matéria em si — o objeto, as cláusulas, os artigos da resolução — tem diversas inconstitucionalidades e ilegalidades, e a própria forma como ela foi construída tem um vício de origem, um vício de iniciativa.
A revogação da resolução e o respeito à Convenção nº 169 da OIT, em consulta aos povos e comunidades tradicionais, diante de várias ameaças que estão acontecendo nos territórios em Minas Gerais, é uma medida que se impõe, a qual estamos aqui defendendo e lutando durante todo esse processo.
Então, eu acho que esta audiência pública é significativa neste momento. Eu acho que as recomendações que saírem daqui devem ser no sentido de encaminhar para órgãos internacionais, para a Comissão Interamericana de Direitos Humanos, para o próprio Estado de Minas Gerais, essa série de violações que ela traz e a necessidade de sua imediata revogação.
A SRA. PRESIDENTE (Célia Xakriabá. Bloco/PSOL - MG) - Obrigada, Layza.
A SRA. ERIKA KOKAY (Bloco/PT - DF) - Deputada Célia, eu gostaria de parabenizá-la pela realização desta audiência pública, porque me parece que essa resolução carrega uma série de violações.
Em primeiro lugar, a Convenção nº 169 da OIT é um instrumento que eles já tentaram retirar aqui. Tentaram retirar o Brasil da condição de signatário da Convenção nº 169. Tentaram, de todas as formas, impedir que ela pudesse representar aquilo que seria absolutamente o procedimento natural, eu diria, até da própria democracia, que é existir uma consulta prévia. A consulta é prévia. Essa não é uma consulta que deve ser formulada em qualquer outro momento. Trata-se de uma consulta prévia às ações dos Poderes, que vai impactar a vida daqueles povos indígenas e tradicionais.
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Inclusive tramita aqui na Câmara o projeto Makota Valdina, que busca estabelecer o marco legal para os povos tradicionais de matriz africana. Nós queremos que as comunidades de terreiro, de matriz africana também tenham o direito de usufruir da Convenção nº 169 da OIT, porque nós estamos falando de povos tradicionais. Portanto, já existe uma violação e um crime, eu diria, quando não se considera isso.
Em segundo lugar, o Estado não pode determinar o que seria determinação dos próprios povos. Ele não pode simplesmente estabelecer quem são os povos atingidos, quem são os povos que acabam por ser, de certa forma, impactados com os empreendimentos.
Então, nós temos aqui o exemplo de uma violação profunda e de um desrespeito imenso ao que o País conquistou e ao que a humanidade conquistou do ponto de vista de respeito aos povos tradicionais. Quem pensa que é o Governador do Estado de Minas Gerais para impor, usurpar, retirar, capturar dos povos tradicionais o seu próprio tempo para consulta, os seus próprios protocolos para consulta e, ao mesmo tempo, a sua própria definição da condição de povo inclusive? Tudo isso está sendo rasgado.
Eu acho que é de uma gravidade imensa. Nós devemos remeter essa denúncia para a Corte Interamericana, mas também para a OIT, para o Ministério dos Direitos Humanos, para o Ministério dos Povos Tradicionais, porque é preciso que nós construamos um grande movimento contrário a essa resolução.
Então, veja, o Estado e os direitos já estiveram encarcerados em período recente da história brasileira. Nós não podemos permitir que aquilo que foi conquistado — e assim repito o que já falei — pela própria humanidade seja usurpado numa lógica autoritária e a serviço em particular das mineradoras.
Eu fico pensando: quem serão os grandes beneficiários dessa resolução? As mineradoras do Estado de Minas Gerais. E nós estamos falando de um Estado cujas tragédias de Brumadinho e Mariana comoveram o Brasil inteiro. É desse lugar que nós estamos falando. E nesse lugar há o Estado sabujo das mineradoras, sabujo do mar de lamas que o Brasil vivenciou, o Estado em posição de arrancar um direito conquistado dos povos tradicionais, os povos quilombolas, os povos indígenas, enfim.
Eu diria que isso merece de nós uma posição — não apenas desta Comissão, mas, sim, a partir desta Comissão, com esta audiência, de várias Comissões aqui da Câmara — contrária a esta resolução. Que nós possamos fazer uma articulação com várias outras Comissões para que também possamos encaminhar para a OIT e entidades nacionais e internacionais nosso posicionamento.
É preciso anular essa resolução, até porque eu que sou eleita por Brasília, estou em Brasília desde 1975, sei do risco que corremos, se isso se consolida, assim se consolidam aqueles que acham que podem arrancar a voz do povo, aqueles que acham que podem calar, silenciar e apagar os povos tradicionais. Esses vão copiar essa ação, que é inadmissível em qualquer Estado Democrático de Direito.
Isso é um descumprimento da própria legislação, da Convenção nº 169, é um descumprimento do próprio direito, é uma usurpação, significa esmagar o direito para que as mineradoras ou os segmentos econômicos possam lucrar com essa violação.
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Portanto, eu queria parabenizá-la, Deputada Célia, e dizer da importância do seu mandato na Câmara e da importância sua presidência nesta Comissão. Enfim, quero parabenizá-la por essa discussão, que extrapola os limites de Minas Gerais. Aliás, é bom lembrar que, em Minas Gerais, em Cordisburgo, nasceu Guimarães Rosa. E Guimarães Rosa disse: "O correr da vida embrulha tudo, a vida é assim: esquenta e esfria, aperta e daí afrouxa, sossega e depois desinquieta. O que ela quer da gente é coragem".
Tenhamos coragem de enfrentar, e coragem tem o povo de Minas Gerais, e coragem tem a nossa Deputada indígena de Minas Gerais, e coragem têm muitas pessoas que estão na terra de Guimarães Rosa para dizer "não" a esta resolução e dizer chega de mandonismo, chega de autoritarismo, chega de desrespeito aos direitos dos povos tradicionais, dos povos indígenas, dos povos quilombolas. E chega...
(Intervenção fora do microfone.)
A SRA. PRESIDENTE (Célia Xakriabá. Bloco/PSOL - MG) - Muito obrigada, companheira Erika Kokay, Deputada Federal por Brasília, que tem a sensibilidade de enxergar o impacto da nacionalidade dessa resolução e barrar essa resolução no Estado de Minas Gerais, barrar um prejuízo que pode ser para o Estado de Tocantins, Maranhão, Mato Grosso do Sul, já que é uma resolução que pode servir como marcadores de um caso de repercussão geral.
Queria cumprimentar a Deputada Célia por esta iniciativa e, em nome da sociedade civil, cumprimentar a Makota Kidoialê, que tem sido uma grande lutadora conosco em várias frentes.
Quero pedir desculpas, porque eu saí e entrei aqui algumas vezes, não consegui ouvir todas as salas, porque também aqui estamos em outra disputa importante, que eu acho que muitos vivenciam, que é o nosso plano diretor na cidade. A turma até deu um sorrisinho, a gente sabe como é uma frente importante.
Gente, esta é uma audiência fundamental. A consulta livre, prévia e informada é o direito de as nossas comunidades dizer "não", de conseguir enfrentar essa sana pelo lucro por parte das grandes empresas. E é o momento, é o único momento, de todo esse processo em que as nossas comunidades podem ser ouvidas e dizer "não" a alguns projetos de destruição. A gente sabe o quanto isso tem um peso aqui em Minas Gerais, não só com relação à mineração, mas temos vivenciado isso no processo do Rodoanel também. Sem dúvida nenhuma, é a consulta que tem feito com que a gente consiga adiar esse processo, com que a gente consiga fazer com que esses processos tenham algum nível de debate com a sociedade, principalmente depois de tantos crimes em nossos Estados.
Os processos do licenciamento e a implantação de novas legislações restringem os modos de vida de comunidades tradicionais, como as leis que tentam proibir o modo de viver dos nossos povos indígenas, dos nossos povos ciganos ou o abate de animais religiosos pelas tradições de matrizes africanas. A garantia da Convenção nº 169 é especificamente o direito de dizer "não".
Então, ela não se reduz à garantia de paz num momento burocrático, mas a um processo de vida das nossas comunidades e à possibilidade de se construírem e de participarem da construção do seu próprio futuro. Tomando como referência o texto da antropóloga Rita Segato, é o direito de cada povo tecer os fios da sua história, as suas cosmologias segundo as suas somas de relação entre si e outros seres. E é assim que tem sido a luta pela revogação da resolução conjunta que regulamenta ou busca regular a consulta prévia e informada em Minas Gerais.
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Então, eu não estou apenas passando aqui para uma saudação rápida, mas para me colocar nessas fileiras e para reforçar a importância dessa Comissão.
Quero parabenizar a nossa Deputada por essa audiência pública e dizer que, em vários momentos, quando o poder econômico ou quando não temos Governadores que sejam aliados, quando temos Governadores que não servem ao seu povo, mas que servem simplesmente ao mercado, a consulta, às vezes, é esse último momento de resistirmos e de tecermos os fios da nossa própria história.
A SRA. PRESIDENTE (Célia Xakriabá. Bloco/PSOL - MG) - Muito obrigada, companheira Moara.
O SR. DUÍLIO CAMPOS - Sra. Presidenta, eu quero iniciar, já que esta audiência pública está sendo transmitida ao vivo para todo o País, fazendo a minha audiodescrição para a acessibilidade de todas e de todos.
Eu sou um homem branco, de barba e cabelo curto. Eu estou vestindo um terno cinza escuro e uma camisa azul clara. Estou à frente da minha mesa de trabalho, e ao fundo há uma parede branca e uma TV.
Quero saudar também Makota Kidoialê, com quem estive recentemente, há pouco tempo; o Dr. Helder, do Ministério Público; demais participantes; Sras. Deputadas; senhoras e senhores.
O Estado de Minas Gerais conta com uma Coordenadoria Estadual de Igualdade Racial, que é responsável pela promoção dos direitos de povos e comunidades tradicionais em todo o Estado. Não por acaso essa Coordenadoria fica na Subsecretaria de Direitos Humanos, que está dentro da Secretaria de Estado Desenvolvimento Social — SEDESE. Eu represento, neste ato, a Sra. Secretária de Estado Elizabeth Jucá.
Por meio dessa Coordenadoria, nas ações dos direitos humanos, percorremos todo o Estado, na articulação com os Municípios e com os diversos povos e as comunidades tradicionais, com os povos indígenas, com os quilombolas e com as demais categorias do nosso Estado, na promoção e na defesa de seus direitos.
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O que a resolução tentou fazer foi transformar essa norma do direito internacional em sentido amplo num procedimento, num rito a ser seguido, ou num roteiro de como fazer a consulta, mas respeitando — e isso consta lá na resolução — os protocolos estabelecidos autonomamente pelas próprias comunidades. Então, o Estado não pretende atropelar esse processo, não pretende interferir no direito da comunidade de ser ouvida nem de estabelecer o seu protocolo; ele apenas dita o rito de procedimento, porque o Estado é movido por rito de procedimentos administrativos internos.
Essa resolução não pretende, em momento algum, legislar sobre a matéria, porque a legislação está posta no direito nacional e no direito internacional. Então, o que nós fizemos foi, com o maior cuidado técnico, com um estudo legislativo, verificando o que existe na doutrina sobre o assunto, tentar estabelecer esse procedimento.
A SRA. PRESIDENTE (Célia Xakriabá. Bloco/PSOL - MG) - Muito obrigada.
O SR. HELDER MAGNO DA SILVA - Deputada, eu fico extremamente preocupado, porque, se o Estado de Minas Gerais fala que visita as comunidades tradicionais e que teria percebido a necessidade que levou à criação dessa resolução, ele deveria informar quais comunidades foram visitadas. Eu sou um Procurador que, desde a atuação do caso do Rio Doce, visito comunidades, mesmo antes do desastre, e eu não me recordo de ter ouvido de nenhuma comunidade essa notícia de ter sido visitada, de ter sido ouvida pelo Estado de Minas Gerais.
Também, no Conselho do Programa de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos, Comunicadores e Ambientalistas — PPDDH, é muito interessante o Estado estar lá presente. Lá o Estado tem ciência de que a maioria ou o grande número das pessoas que estão no Programa de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos é exatamente de lideranças indígenas, de lideranças quilombolas, de lideranças tradicionais geraizeiras, como o Nenzão que aqui está. E o estado de violação a esses defensores de direitos humanos é latente, o Estado tem ciência disso. Quando peço que o Estado, através da Coordenadoria, faça a visita às comunidades quilombolas — e eu tenho em mais de um procedimento essa informação —, o Estado diz que não tem recursos para fazê-lo.
Então, se o Estado diz que não tem recursos financeiros, ou econômicos, para fazer visitas a essas comunidades, para entender sobre o desejo delas de ter a regularização fundiária do seu território, eu fico preocupado com essa informação
de que ainda teria havido uma escuta do Estado através da sua Coordenadoria de Igualdade Racial. Esse é um ponto que me preocupa.
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Mais ainda: sobre essa resolução, se há um rito, teria que ter sido conversado com os donos da casa. Eu não estabeleço rito de como eu faço para entrar na casa de uma pessoa. Então, são situações muito preocupantes. E há quanto tempo, desde a audiência pública ocorrida na Assembleia Legislativa, o Estado abriu essa consulta? O que está pendente para o Estado mudar de posição? Esse é um ponto que precisa ser evidenciado.
A SRA. PRESIDENTE (Célia Xakriabá. Bloco/PSOL - MG) - Muito obrigada.
O SR. DUÍLIO CAMPOS - Presidente, só para esclarecer a confusão que talvez tenha sido causada pela manifestação do Procurador Dr. Helder.
Eu não disse que nós visitamos as comunidades para fazer consulta a respeito da resolução. Eu disse que nós visitamos as comunidades no Estado para fazer a promoção dos direitos dos povos de comunidades tradicionais. Esse trabalho é feito com muita frequência; inclusive, temos um termo de colaboração com o Ministério Público Estadual para executar diversas ações nesse sentido. Temos recursos, sim, direcionados. Mas como foi destacado aqui, em outra parte da audiência, temos mais comunidades tradicionais do que Municípios no nosso Estado. Então, é difícil alcançar todas. Mas, com todo o esforço que a gente faz, a gente tenta chegar à maioria daquelas que a gente consegue.
Quanto à revogação ou não, Deputada, isso está sendo discutido neste momento aqui no Governo, considerando todo esse contexto, e não só o que foi discutido aqui nesta audiência pública, que eu considero extremamente relevante, mas também em outros contextos que a gente tem acompanhado, inclusive nacionalmente. Vale dizer que o Estado de Minas Gerais não é o único a regulamentar a matéria; outros Estados já o fizeram e têm aplicado a consulta. Inclusive, a gente tem acompanhado esse processo.
Por fim, quero dizer que o Estado, em momento algum, quis beneficiar empresas ou mineradoras, como foi aqui suscitado, até porque, em outros momentos aqui da própria audiência, destacou-se que a resolução teria desagradado a ambos os lados. Então, não houve, em momento algum, de maneira alguma, essa intenção de se fazer qualquer tipo de favorecimento. O que se buscou foi justamente assegurar que a consulta ali prévia e informada fosse de fato implementada e realizada aqui no Estado, respeitando os direitos da comunidade.
Então, com total apuro técnico, estudo técnico e legislativo que a gente fez, o estudo passou pela Advocacia-Geral do Estado. A gente tomou esse cuidado ao fazer isso. Agora, se ele se inviabiliza, de alguma forma, nós vamos rever. Estamos discutindo aqui internamente. E, como eu disse agora, essa matéria está sendo neste momento discutida aqui no Governo para que essa decisão seja o mais breve possível anunciada.
A SRA. PRESIDENTE (Célia Xakriabá. Bloco/PSOL - MG) - Obrigada.
Para encerramento e proposta de encaminhamento, desejamos que o Estado receba todas as manifestações. É contraditória uma resolução que diz que vai ser boa para os povos e, no entanto, se escutam mais de 20 povos diferentes, que já estão se manifestando, existe uma carta assinada por mais de 80 entidades com nota técnica também falando dos processos de violência e violação de direitos que essa consulta pode trazer aos povos e comunidades tradicionais, sobretudo porque
a consulta livre, prévia e informada é autoaplicável. Então, não cabe ao Estado regulamentá-la.
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Diante disso, esperamos também a manifestação do Estado, nos próximos dias, e trazemos como encaminhamento algumas propostas: 1º) oficiar o Estado de Minas Gerais para revogar a Resolução Conjunta SEDESE/SEMAD nº 1, de 2022, conforme não só a audiência pública, mas também a recomendação da Comissão Nacional de Direitos Humanos e a reivindicação de mais de 80 entidades e povos que já assinaram a nota pública e o parecer técnico; 2º) a aplicação imediata da Convenção nº 169 da OIT a respeito do processo de consulta livre, prévia e informada, com as pessoas respeitando os procedimentos dos protocolos criados por povos e comunidades tradicionais; 3º) a recomendação de que a Assembleia Legislativa de Minas Gerais aprove o Projeto de Resolução nº 173, de 2022, para sustar os efeitos da Resolução Conjunta SEDESE/SEMAD nº 1, de 2022; 4º) e oficiar as instituições de Justiça para tomada de providência e especialmente a Presidência do Tribunal de Justiça de Minas Gerais e a 6ª Câmara, o Ministério Público Federal do Estado de Minas Gerais, bem como o Supremo Tribunal Federal e a Comissão Interamericana de Direitos Humanos, como o envio das notas também para essa audiência.
Neste momento, estamos diante dessa importante audiência, mas entendemos a importância de ouvir povos, comunidades tradicionais, advogados e o Ministério Público Federal.
Esperamos que, depois de 1 ano de criação da resolução, ainda no mês de abril, seja revogada essa resolução que vai impactar diretamente povos e comunidades tradicionais.
Para finalizar, gostaria de dizer que amanhã é dia 19 de abril e que é dia também de luta. Finalmente podemos dizer que é o Dia dos Povos Indígenas, de onde o Brasil começa. O Brasil começa pelos povos indígenas e pelos povos e comunidades tradicionais.
Trata-se de uma data que, por muito tempo, dizia mais sobre os invasores e sobre o apagamento da nossa história do que sobre os nossos povos. Mas foi nesse chão de luta que ressignificamos o mês de abril, ainda do lado de fora, ainda no ano passado. É o mês da maior mobilização nacional indígena, que será feita na semana que vem.
Mas, nesse dia 19, também quando completa 19 anos o Acampamento Terra Livre, é o momento de ressignificarmos as nossas lutas e as nossas conquistas. É dia de lembrar a nossa história, a nossa força da coletividade.
É dia de lembrar os nossos encantados, aqueles que vieram antes e que foram derrubados e nunca conseguiram falar nesse microfone.
É dia de trazer a nossa cultura para os espaços e de ressignificar o Congresso Nacional e os espaços institucionais, com uma política que traga a cultura para a centralidade do debate. Que estar aqui dentro de uma Comissão, dentro de uma audiência pública, quando entoar o nosso canto, não seja visto como violência, porque violência têm sido os ataques aos processos de negação de consulta livre, prévia e informada.
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É Dia dos Povos Indígenas, mas também deveria ser chamado dia nacional de luta dos povos indígenas do Brasil. Ainda deveria dizer que o Brasil nunca existiu e nunca existirá sem nós.
Quero convidar todos para a sessão solene que iremos fazer no dia 24, às 15 horas, depois de 10 anos de Acampamento Terra Livre, criado para barrar a PEC 215, no plenário principal. Agora queremos entrar pela porta da frente. Queremos entrar com os nossos maracás e pintar este Congresso de jenipapo e urucum.
Estamos aqui com vários parentes xavante, kalapálo, krahô, guajajara, xakriabá, pankararú, xucurú-kariri, sateré mawé, terena.
As mulheres do Cerrado estão presentes aqui também. Elas já pediram a esta Comissão uma audiência específica para tratar das mulheres do Cerrado.
Estamos aqui porque é preciso dizer, no Congresso, que o Brasil não se sustentará mais sem a presença dos povos indígenas.
Antes, porém, gostaria de convocar a Comissão para a reunião de audiência pública conjunta com a Comissão de Direitos Humanos, Minorias e Igualdade Racial e com a Comissão de Legislação Participativa, convocada para o dia 20 de abril, às 10 horas, no Plenário 9, que terá como tema A violência contra adolescentes indígenas no Brasil.
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