1ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA 57 ª LEGISLATURA
Grupo de Trabalho (GTSTN) destinado a analisar e debater a PEC n. 45/2019, que altera o Sistema Tributário Nacional e dá outras providências
(Audiência Pública e Deliberação Extraordinária (semipresencial))
Em 15 de Março de 2023 (Quarta-Feira)
às 14 horas e 30 minutos
Horário (Texto com redação final.)
15:29
RF
O SR. PRESIDENTE (Reginaldo Lopes. Bloco/PT - MG) - Havendo número regimental, declaro aberta a 5ª reunião do Grupo de Trabalho destinado a analisar e debater a Proposta de Emenda à Constituição nº 45, de 2019, que altera o Sistema Tributário Nacional e dá outras providências.
Encontra-se à disposição na página da Comissão na Internet a ata da 4ª reunião, realizada no dia 14 de março de 2023.
Fica dispensada sua leitura, nos termos do parágrafo único do art. 5º do Ato da Mesa nº 123, de 2020.
Não havendo quem queira retificá-la, coloco em votação a ata.
Os Deputados e as Deputadas que a aprovam permaneçam como se encontram. (Pausa.)
Aprovada.
Quero convidar o Exmo. Relator, Deputado Aguinaldo Ribeiro, para compor a Mesa.
O resumo do Expediente encontra-se publicado na página do Grupo de Trabalho na Internet.
Vamos passar à Ordem do Dia.
A Ordem do Dia de hoje está dividida em dois momentos: audiência pública e deliberação de requerimentos. Vamos fazer uma inversão de pauta, pois nós temos quórum para a votação dos requerimentos.
Há três requerimentos pautados, numerados de 36 a 38, de 2023. Consulto o Colegiado se podemos votá-los em grupo, ressaltando apenas que temos um aditamento do Requerimento nº 37, para incluir os seguintes convidados para a audiência pública que tratará da reforma sob a perspectiva da administração tributária: Carlos Ari Sundfeld, professor titular da Escola de Direito de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas; Unadir Gonçalves Júnior, representante da Federação Brasileira de Sindicatos das Carreiras da Administração Tributária da União, dos Estados e Distrito Federal — FEBRAFISCO; e também Marcus Vinícius Bolpato da Silva, representante da Pública Central do Servidor.
Em votação os Requerimentos nºs 36 a 38, de 2023.
Os Deputados que aprovam os requerimentos com o aditamento proposto permaneçam como se encontram. Os contrários queiram se manifestar. (Pausa.)
Aprovados.
Daremos início agora à nossa audiência pública sobre o tema Melhores Práticas Internacionais de Tributação sobre o Consumo.
Esclareço que esta audiência cumpre a decisão do Colegiado, em atendimento aos Requerimentos nºs 9, 12, 17 e 22, de 2023.
Vamos compor a nossa Mesa.
Encontram-se presentes os seguintes convidados: a Sra. Rita de La Feria, professora de Direito Tributário da Universidade de Leeds, da Inglaterra, que participará pelo Zoom; o Sr. Francisco Javier Sánchez Gallardo, Conselheiro de Finanças da Embaixada da Espanha no Brasil, que participará presencialmente e a quem chamo para compor a Mesa (palmas); o Sr. Marcos Aurélio Pereira Valadão, advogado, pós-doutor em Direito e membro da Comissão da Reforma Tributária da OAB do Distrito Federal (palmas); a Sra. Melina Rocha, Diretora de cursos na Universidade de York, no Canadá (palmas); o Sr. Ricardo Varsano, ex-economista sênior do Fundo Monetário Internacional — FMI e consultor em política tributária, que vai participar pelo Zoom; o Sr. Isaías Coelho, pesquisador sênior do Núcleo de Estudos Fiscais da Fundação Getúlio Vargas — FGV, também pelo Zoom; o Sr. André Mendes Moreira, livre-docente em Direito Tributário pela Universidade de São Paulo — USP e professor de Direito Tributário da Universidade Federal de Minas Gerais — UFMG, que vai participar também pelo Zoom; o Sr. Paulo Gil, auditor-fiscal da Receita Federal e Diretor do Instituto Justiça Fiscal — IJF, que também vai participar pelo Zoom.
15:33
RF
Por 10 minutos e com a tolerância de 5 minutos, vamos começar pela nossa convidada Rita de La Feria, professora de Direito Tributário da Universidade de Leeds, Inglaterra, que vai falar pelo Zoom.
A SRA. RITA DE LA FERIA - Boa tarde.
Muito obrigada pelo convite para estar aqui presente.
Quando eu estava fazendo a preparação para esta audiência, verifiquei que se passaram quase 3 anos desde a última vez em que tive o prazer de estar no Congresso, numa audiência pública também. Verifico que efetivamente o debate no Brasil adensou-se muito, intensificou-se muito durante esse período. Houve uma evolução muito grande nesses últimos 3 anos.
Eu espero ainda ter alguma coisa de novo para dizer, mas penso que a minha contribuição hoje é muito diferente daquela que fiz há 3 anos e vai se centrar em alguns mitos, em algumas discussões que têm ocorridas no Brasil, nesse último período dos 3 anos, entre a audiência que tive o prazer de participar em 2020 e esta.
Vou começar a partilhar o meu ecran. Espero que consigam ver.
(Segue-se exibição de imagens.)
Sem perder mais tempo, gostaria de falar brevemente sobre cinco mitos. Primeiro, que o IVA é um imposto velho; segundo, que o IVA é um imposto desatualizado; terceiro, que o IVA é um imposto fraudulento; quarto, que o IVA não é compatível com sistemas federativos; e finalmente o mito de que os melhores IVAs do mundo têm regimes diferenciados.
Primeiro mito: o IVA é um imposto velho. Tenho ouvido dizer bastantes vezes, nos últimos meses e até anos, que o IVA é um imposto antigo, velho, um imposto europeu, que já está totalmente desatualizado. Na verdade, ele tem origens europeias, nos anos 1954, quando foi primeiro introduzido na França, mas é um imposto que tem sido implementado no mundo inteiro até os últimos 2 anos.
Portanto, há países que ainda estão neste momento no Oriente Médio a implementar IVAs. É um imposto que não é tão antigo como outros impostos. O Imposto de Renda, por exemplo, é muito mais antigo do que o IVA, contudo, não vejo grandes discussões relativas ao Imposto de Renda.
15:37
RF
O IVA tem se espalhado no mundo todo nesse período porque é um imposto com grande sucesso e extremamente popular. Essa popularidade mundial tem a ver com as suas características intrínsecas. É um imposto muito eficiente, que coleta bastante receita, mas com baixo custo administrativo e é um imposto neutro, portanto não cria distorções de mercado, não cria distorções ao investimento etc. Daí esta percepção de que é um imposto antigo, porque todos já o têm. O mundo inteiro tem implementado esse imposto num espaço de 60 a 70 anos, porque é um imposto tecnicamente superior à maioria, na verdade, dos outros impostos que temos.
Segundo mito: o IVA é um imposto desatualizado. Esse é um mito que também tenho ouvido falar bastante no processo da reforma tributária brasileira, nas discussões que têm sido feitas. Na verdade, a globalização da economia e a digitalização da economia têm apresentado desafios muito grandes aos sistemas tributários, é verdade, em qualquer nível, com qualquer imposto. Mas, se nós olharmos para esses desafios, veremos que o IVA tem sido o imposto que melhor tem lidado com esses desafios. Se olharmos para as discussões que têm sido feitas neste momento sobre a tributação internacional da renda em sede da OCDE, veremos que os princípios do IVA estão muito na base das reformas propostas hoje pela OCDE. Se olhamos para o pilar 1, por exemplo, sobre a nova alocação nos direitos tributários em sede de imposto sobre a renda, verificaremos que são princípios do IVA que estão subjacentes.
O modelo do IVA na Europa, implementado para adaptação à economia digital, tem sido tão bem sucedido que está sendo copiado para impostos sobre a renda. Portanto, é um imposto que, como todos os outros, tem sofrido desafios, mas as adaptações que têm sido feitas ao IVA para lidar com a economia digital têm sido extremamente eficazes — aliás, acima do previsto. Posso dizer que a Comissão Europeia tem ficado surpreendida com o nível de receita que tem sido possível obter da economia digital através das reformas do IVA. Portanto, o IVA não é um imposto desatualizado. É o melhor imposto que temos para lidar com a economia global e digital.
Terceiro mito: o IVA é um imposto fraudulento. Eu ouço muitas vezes dizerem que o IVA tem um problema enorme de fraudes na Europa. Na verdade, o IVA tem problema de fraude como todos os outros impostos têm problema de fraude. Nenhum imposto é perfeito, e quem diz isso não está dizendo a verdade. Todos os impostos são suscetíveis a problemas, mas o IVA tem características que o fazem especialmente impermeável à fraude. E essa impermeabilidade à fraude é a razão pela qual o IVA tem sido tão popular. O elemento multifásico distribui o risco de fraude através da cadeia de produção. Os créditos plenos e a não-cumulatividade do imposto criam um incentivo ao pedido da fatura. E há a remissão de imposto por terceiros, ou seja, quem envia o imposto para o Estado ou para o Tesouro não é a mesma pessoa que está pagando o imposto, não é o consumidor. Isso limita grandemente o incentivo, o conluio para fraudar o imposto.
Quarto mito: o IVA não é compatível com sistemas federativos. Também ouço muitas vezes esta frase: "Ah, muito bem, ele participa de muitas formas, mas ninguém tem um sistema federativo como nós temos aqui no Brasil". Na verdade, nos sistemas federativos que utilizam o IVA, uns têm o IVA Único, como é o caso da Índia ou da China; outros têm o IVA Dual, como é o caso do Canadá. Mas, não só isso, há também regiões que, à semelhança da União Europeia, estão implementando um IVA Harmonizado, nos moldes europeus, como é o caso da SADC, no continente africano, e como é o caso de países do continente asiático.
15:41
RF
Portanto, não só sistemas federativos com um país único, mas sistemas federativos de integração econômica avançada, como é o caso da União Europeia e como é o caso, mais incipiente, da SADC e da Ásia.
É também corrente dizer que os melhores IVAs têm, como o IVA europeu, regimes diferenciados. Esse é o mito final que eu gostaria de comentar. Na verdade, nós sabemos que os regimes diferenciados criam grandes problemas, grandes dificuldades: perda de receita, obviamente, mas principalmente problemas interpretativos e distorções à concorrência e à cadeia produtiva, além de problemas de fraude e elisão tributária, muitos custos de conformidade e custos administrativos. Portanto, há uma série de elementos negativos.
A pergunta, então, que se faz é: por que a Europa ainda tem os sistemas diferenciados, se eles estão, assim, tão mal? Por que os europeus ainda os têm? A resposta sincera é que os europeus têm sistemas diferenciados porque são IVAs antigos, ou seja, das décadas de 50 e 60. Quando os IVAs europeus foram implementados, não sabíamos, como sabemos hoje, dos grandes problemas que os regimes diferenciados criariam. Não tínhamos ainda esse conhecimento técnico sobre o imposto que existe hoje. Atualmente sabemos que ele criou todos esses problemas, mas já é tarde, porque se criou aquilo que se chama, na ciência comportamental, de path dependence, em que temos um caminho e não conseguimos sair dele.
Já houve várias tentativas de se alterar essa situação na Europa, mas não têm sido bem-sucedidas. Os IVAs modernos, a partir das décadas de 80 e 90 para frente, são todos IVAs com alíquotas únicas, com o mínimo de isenções e sem regimes especiais para as setoriais, ou seja, o setor agrícola ou o setor das pequenas e médias empresas. Esses IVAs mais modernos — muitas vezes são apelidados de goods services tax, ou seja, impostos sobre bens e serviços — são impostos em que se aprendeu com a experiência europeia e em que não se cometeram os mesmos erros que nós cometemos.
Então, o conselho que eu daria, e assim acabo a minha participação, é que os erros no IVA são muito difíceis de serem corrigidos. O meu apelo é para que façam o melhor possível nesta primeira fase, porque pensar em fazer agora um imposto menos bom e, daqui a 5 anos, o alterar, a experiência europeia diz que isso não irá acontecer.
Mais uma vez agradeço a atenção e a grande honra de, como estrangeira, ser convidada para participar desta audiência pública no Congresso Nacional. Espero ver muitos dos senhores pessoalmente em maio, quando planejo fazer uma visita presencial ao Brasil.
Muito obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Reginaldo Lopes. Bloco/PT - MG) - Muito obrigado, Profa. Rita de La Feria, Professora de Direito Tributário da Universidade de Leeds.
Vamos passar a palavra agora ao segundo convidado, o Sr. Francisco Javier Sánchez Gallardo, Conselheiro de Finanças na Embaixada da Espanha no Brasil, por 10 minutos.
15:45
RF
O SR. FRANCISCO JAVIER SÁNCHEZ GALLARDO - Boa tarde a todos.
Gostaria de começar agradecendo a indicação para estar aqui hoje. Também sou estrangeiro. Da mesma forma que é uma honra para a Profa. Rita de La Feria, para mim também é uma grande honra ter a possibilidade de falar nesta Câmara dos Deputados.
Ao mesmo tempo, eu gostaria de me colocar à disposição das senhoras e senhores aqui presentes. Estou na Embaixada da Espanha no Brasil, aqui em Brasília, insisto, à completa disposição para qualquer coisa.
Na minha fala eu vou tentar aprofundar um dos princípios básicos de operação do IVA, que é o princípio da não cumulatividade, um contrapeso que acho muito importante na generalidade do imposto. Fala-se muito, e é verdade, que o IVA é um imposto abrangente, um imposto no qual as mercadorias e os serviços são taxados. Mas essa abrangência do IVA tem que ser completada com o princípio da não cumulatividade ou o direito à dedução. Explicaremos como funciona o princípio e veremos como é sua efetividade na atividade econômica. Também veremos como isso funciona no tempo e no espaço. E, finalmente, vamos indicar algumas questões adicionais que acho que valem a pena termos na cabeça, nas discussões desta Câmara dos Deputados, deste Congresso Nacional.
O princípio da não cumulatividade, na Diretiva Europeia do IVA, que é a lei que faz a harmonização do IVA na União Europeia, está no artigo 1.
No artigo 1 da Diretiva já se estabelece que é uma obrigação para os Estados da União Europeia que o IVA seja aplicado às mercadorias e aos serviços, mas também com direito à dedução os empresários de todo o IVA que eles pagarem aos fornecedores quando venderem a eles as mercadorias e os serviços que estão usando na atividade.
Esse é o sistema de dedução financeira que se aplica na União Europeia, um sistema básico, que precisa ser bem compreendido, porque, da mesma forma que tem o IVA abrangência, tem o direito à dedução — é o princípio da não cumulatividade.
15:49
RF
Há um princípio de dedução financeira que faz com que a dedução seja imediata e geral, como vamos ver. O Tribunal de Justiça Europeu já colocou isso em inúmeros acórdãos que foram aprovados, e eu fiz questão de colocar vários deles aqui. Se as senhoras e os senhores prestarem atenção, verão que o primeiro existe há quase 40 anos, é de 1985; o último é de 2022, ou seja, é muito mais recente. O princípio, contudo, sempre é o mesmo. O propósito é desonerar completamente os empresários. Quando os empresários estão comprando mercadorias e serviços, eles têm que ser completamente desonerados no tempo, no espaço, no conceito e sem exceção.
Como eu disse, a apresentação que estou usando está à disposição no site da Câmara dos Deputados e, certamente, os senhores podem consultá-la quando o quiserem.
O princípio da não cumulatividade, o direito à dedução, é muito importante na operação do IVA na União Europeia. Há o princípio da neutralidade, que reduz ao mínimo as isenções, que estão nas leis europeias do IVA, e o princípio da generalidade, em que tudo é taxado e, ao mesmo tempo, tudo gera esse direito à dedução.
Há nesse desenho a operação do IVA. Acho que dá para ver isso. As senhoras e os senhores poderão ver como o produtor de madeira vai passando o IVA para o produtor de mesas, que vai passando o IVA para o atacadista, que vai passando o IVA para o varejista de mesas. Não fica IVA no caminho. Essa é a ideia...
O SR. PRESIDENTE (Reginaldo Lopes. Bloco/PT - MG) - O pessoal do apoio técnico pode verificar o som? Está muito baixo.
O SR. FRANCISCO JAVIER SÁNCHEZ GALLARDO - Assim estão me ouvindo melhor?
O SR. PRESIDENTE (Reginaldo Lopes. Bloco/PT - MG) - Melhorou.
O SR. FRANCISCO JAVIER SÁNCHEZ GALLARDO - Obrigado. Vamos ver se assim se escuta melhor. Desculpem-me.
Esse é o esquema geral, e esse é o princípio, que, depois, vamos completar. É importante dizer — e acho conveniente as senhoras e os senhores verem — que o direito de dedução, portanto o princípio da não cumulatividade, não faz distinção, ou seja, podem ser despesas diretas, despesas indiretas e até investimentos — não há diferença. E isso é exatamente o que se mostra nesse segundo gráfico que eu preparei.
Não vamos repassar os números porque achamos que não vale a pena, isso está à disposição das senhoras e dos senhores, mas os conceitos podem ser interessantes. Há um fabricante de mesas de madeira que está comprando madeira, está comprando maquinário, está comprando um imóvel, está fazendo investimentos, mas também está comprando serviços, está comprando o transporte, está comprando publicidade, está gastando com serviços de advocacia ou até com despesas gerais, que podem ser mercadorias ou serviços, tanto faz. Não tem diferença, não tem distinção. O direito ao crédito tributário é imediato, é geral e não é demorado no tempo.
Há um número aqui embaixo, não sei se dá para enxergar bem, mas depois as senhoras e os senhores podem ver. Esse crédito tributário que o fabricante de mesas de madeira tem vai poder ser efetivado em semanas e vai poder ser efetivado por completo. Não tem que esperar, não tem que financiar o IVA, que é o propósito dessa desoneração completa que eu acabei de explicar.
Como se faz ao longo do tempo? Essa seria a segunda parte. Há outro artigo da Diretiva, que é o art. 183, que estabelece duas possibilidades para os Estados da União Europeia: o reembolso, praticamente na hora em que a apuração do imposto for apresentada, ou a transposição, levar esse direito ao crédito tributário para o mês seguinte, para o período da apuração seguinte. Vamos ver no seguinte gráfico. Acho que se pode ver melhor aqui.
15:53
RF
Temos nesse gráfico o nosso fabricante de mesas de madeira. Ainda estamos com o mesmo empresário que teve todas essas despesas e investimentos e que tem um crédito tributário por IVA a favor dele de quase 180 mil reais — euros, sei lá, tanto faz, não coloquei uma moeda.
Esse crédito tributário que foi gerado no mês de janeiro, no mês 1, pode passar para o mês 2, no máximo. Também poderia ser reembolsado no mês 1, mas o máximo que os Estados da União Europeia podem fazer é passar o crédito tributário para o mês 2. E, se no mês 2, o IVA que ele gerou são 5.600 reais, euros, mesmo assim conserva ainda um direito ao crédito tributário de quase 180 mil euros, que a administração tributária tem que devolver — tem que haver uma devolução.
Isso aí é o princípio que estabelece o art. 183. Até houve esses dois processos que eu destaquei aqui. O primeiro deles é polonês, e o segundo é húngaro, se não me engano. São processos nos quais o Tribunal Europeu disse que o que estava se fazendo nesses países não era adequado. Então, tem que ser uma devolução completa e rápida, imediata, conforme determina o artigo. É importante que se conheça isso.
O que acontece, observando-se esse eslaide? Nesse espaço, tem que se completar o esquema que eu estou explicando. Na União Europeia, o princípio geral é de que o IVA é tributado no consumo, no estado de destino. Tanto para mercadorias quanto para serviços, em caráter geral, são tributáveis no estado de destino, não no estado de origem. Ou seja, se temos uma empresa que está em Madrid, na Espanha, comprando mercadorias e serviços de fornecedores da Itália, da França ou da Alemanha, o normal é que essa empresa pague IVA na Espanha, porque não tem IVA pago nos outros países da União Europeia. Não é muito frequente que tenha IVA pago nos outros países, mas pode acontecer, por exemplo, se a empresa tem dois empregados que vão a um evento em Milão, na Itália. Aí o serviço de hospedagem teria que ser tributado... (Pausa.)
O SR. PRESIDENTE (Reginaldo Lopes. Bloco/PT - MG) - Vamos fazer silêncio para ouvir o nosso convidado. Quem não estiver interessado no debate é só se retirar.
O SR. FRANCISCO JAVIER SÁNCHEZ GALLARDO - Muito obrigado, Deputado.
Eu queria dizer que o serviço de hospedagem seria tributado na Itália, porque ele acontece na Itália. Mesmo assim, os empregados de uma empresa espanhola que estão assistindo a um congresso na Itália têm direito a crédito tributário.
E como é que isso funciona? Isso se faz por meio do sistema de balcão único. Balcão único na Europa tem muitas variantes. Uma delas tem a ver com o princípio da não-cumulatividade. O direito a crédito tributário permite que o empresário espanhol encaminhe a solicitação para a administração tributária alemã por meio da administração tributária italiana.
Então, o empresário espanhol não vai ter que se relacionar com a administração tributária italiana. Ele pode apresentar a solicitação no site da agência tributária, que seria o equivalente à Receita Federal, e a receita federal espanhola, ou seja, a agência tributária encaminhará o pedido para a administração tributária alemã.
Há algum limite? Há dois limites, que são os básicos. O primeiro é o consumo privado. Às vezes as empresas têm despesas que realmente não são despesas empresariais, mas despesas privadas. O que se chama muitas vezes de "o vinho do sócio". No escritório de advocacia, o sócio ou a sócia que está comprando um vinho, mas que é para uso privado, não é para uso da empresa. Aí os Estados da União Europeia têm a possibilidade de dizer: "Esse IVA não gera crédito tributário. Esse IVA fica com a gente, fica com a administração tributária, porque não é uma despesa realmente empresarial". Esse é o primeiro limite.
15:57
RF
O segundo limite é o mais difícil de aplicar acho que em todos os países do mundo: é a luta contra a sonegação tributária. É o limite mais difícil e que gerou muitos problemas na União Europeia. Mas o princípio geral, o princípio da proporcionalidade, é de incomodar os empresários que agem de boa-fé o mínimo possível. Evidentemente o desafio é fazer a distinção entre os empresários que agem de boa-fé e aqueles outros que não agem.
Essa é a minha apresentação quanto ao direito à dedução e quanto ao princípio da não-cumulatividade. Há muitas outras matérias sobre as quais poderíamos conversar, mas não temos tempo para isso.
Só para fazer um relatório muito breve, o princípio da generalidade, do qual a Profa. Rita de La Feria já falou, com a limitação e com o máximo das isenções, tudo que seja para sair do esquema geral tem a ideia — que é o que se procura, mas nem sempre se consegue — de reduzir ao máximo.
O princípio da tributação no destino, que cada vez mais é conseguido, já expliquei no gráfico que apresentei. Eu insisto, a apresentação está à disposição das senhoras e dos senhores.
Há o tratamento especial às pequenas empresas. Também não é fácil, às vezes, exigir toda essa documentação, todas essas coisas dos pequenos empresários.
Existem as situações específicas, também na Europa evidentemente: falei aqui do agronegócio, da educação, da saúde, do setor financeiro e das atividades turísticas.
E, finalmente, as obrigações de fornecimento de informação. A administração tributária está cada vez mais eletrônica e, evidentemente, surgirão obrigações para os empresários que as estão discutindo, porém a harmonização na Europa não é completa.
Isso é tudo. Muito obrigado. Desculpem meu portunhol desenvolvido. Acho que consegui me explicar mais ou menos.
Obrigado, mais uma vez. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Reginaldo Lopes. Bloco/PT - MG) - Muito grato, Francisco Javier Sánchez, Conselheiro de Finanças da Embaixada da Espanha no Brasil — muito obrigado.
Com a palavra, por 10 minutos, o próximo convidado, o Sr. Marcos Aurélio Pereira Valadão, Advogado, Pós-Doutor em Direito e membro da Comissão da Reforma Tributária da OAB de Brasília.
O SR. MARCOS AURÉLIO PEREIRA VALADÃO - Boa tarde a todos e a todas.
Cumprimento o Deputado Reginaldo Lopes, que está presidindo a Mesa e, na pessoa dele, todos os Deputados presentes a esta sessão; cumprimento os prezados colegas de painel que estão participando de forma presencial ou pelo Zoom, a distância.
Eu vou fazer uma apresentação — o tempo é meio limitado — em que vou tentar passar aos senhores algumas impressões, algumas considerações em virtude da experiência internacional de boas práticas vis-à-vis o que há no Brasil.
16:01
RF
(Segue-se exibição de imagens.)
Este é o roteiro da apresentação, os tópicos com os quais vamos trabalhar. Vamos contextualizar. É sempre bom passar de novo alguns pontos. Depois eu vou falar sobre a questão mesmo da tributação, como as propostas de reforma podem ser impactadas por alguma dessas considerações e o que acontece em outros países.
Todo mundo que está participando desse processo tem ciência — é quase consenso — da complexidade da tributação do consumo e do problema que gera cumulatividade, inclusive questões de dificuldades de devolução do tributo contido nas exportações, um problema que o IVA, se bem ajustado, resolve.
Ainda temos quatro tributos indicados tecnicamente como consumo, mas o IOF também faz às vezes de tributação do consumo, especialmente nas operações sobre seguros e câmbio. O ISS é cumulativo e tem problemas conceituais. O PIS/COFINS é um pretenso IVA geral, mas, na verdade, é um tributo bem estranho, porque só quem apura pelo lucro real tem não cumulatividade. Esse é um conceito, inclusive, difícil de explicar para os estrangeiros, que não conhecem o sistema brasileiro a fundo. O IPI foi uma das primeiras experiências de IVA do mundo, no final da década de 1950. Ele era imposto de consumo, mas a Lei nº 4.502, de 1964, consolidou a legislação do imposto de consumo, que depois se transformou no IPI — o Brasil teve essa experiência, mas não aprimorou a legislação ao longo do tempo, e no ICMS, que todos nós conhecemos e que é um IVA parcial descentralizado.
Um problema apontado reiteradamente é a regressividade do sistema. Há algumas propostas para resolver isso, como o cashback, a redução das alíquotas do consumo básico ou mesmo uma reforma estrutural do sistema. Mas nós vamos nos concentrar aqui na tributação do consumo.
Novamente, tributar as bases de renda, patrimônio e consumo. É bom nós sempre nos lembrarmos de que consumo, na verdade, vem da renda. O consumo é a renda menos a poupança, a riqueza adquirida naquele período é consumida, o que sobra é poupança. Esse conceito é importante porque, economicamente, tributação do consumo também tem a ver com tributação da renda, do ponto de vista de consumo em si.
Então, temos bem tangíveis, serviços, seja lá o que o conceito englobe — isso é um problema —, e outras operações econômicas, como aluguéis, operações com direitos.
Em relação ao problema conceitual do ISS, eu vou falar um pouco mais sobre isso, porque realmente essa é uma questão importante que nós temos que — é até uma sugestão — implementar, se for possível.
O que diz a diretiva do IVA europeu sobre isso, sobre serviços? Esta é uma cópia da diretiva: "Art. 24. Entende-se por prestação de serviços qualquer operação que não constitua entrega de bens", ou seja, se não é uma operação com bem tangível, é serviço, é aluguel. Está definido como serviço.
Nas propostas atuais, a PEC 45, por exemplo, para resolver o problema, lista algumas dessas operações em que há dificuldade de entender como serviço. Por exemplo, aqui está a lista da PEC: intangíveis, cessão de licenciamento de direitos, locação de bens — não é obrigação de dar, é uma obrigação de fazer —, importações de bens tangíveis, intangíveis, serviços e direitos.
16:05
RF
É muito mais simples, como foi na PEC 233/08 — eu trabalhei na elaboração da PEC 233, com Bernard Appy em 2007, 2008 e 2009. Naquela época, nós pensamos em trazer mais ou menos o conceito que consta na diretiva europeia: "Relativamente ao imposto previsto no inciso VIII" — que é o Imposto sobre Bens e Serviços —, "considera-se prestação de serviço toda e qualquer operação que não constitua circulação ou transmissão de bens", ou seja, está tudo englobado. Eu não preciso ficar discutindo se locação é serviço ou não. Essas discussões todas são superadas.
Esse é um problema que, nas redações atuais propostas, parece-me que pode persistir. Não é muito difícil achar uma operação que não se enquadre em nenhuma destas — ABCD — e suponha que ela não estaria tributada.
Na prática da tributação internacional do consumo, há o IVA, que é o imposto geral — já foi falado isso aqui muitas vezes. Realmente é o imposto que tem problemas, mas de tributação geral é o mais eficiente. Isso é quase consenso. Só faço um alerta. Nós estamos acostumados a ver o IVA — tributação do ICMS e IPI com crédito financeiro destacado na nota fiscal —, mas há outros métodos. Eu só acrescentei aqui que há outros métodos para fazer isso: o método da adição, o método de subtração. O PIS/COFINS parece com o método da subtração, que são todas as receitas menos todas as despesas que geram crédito, e aí se aplica a alíquota. Porém, o mais usado mesmo e mais eficiente por questão de controle é o que há no ICMS, IPI e o que é proposto no IVA europeu mesmo.
Em relação à questão da presença física, para efeito de cobrança de tributo — eu estou falando de operações de Internet —, é bom destacar que nos Estados Unidos, que são uma federação e têm tributação de consumo, a tributação é feita no varejo. Muitas vezes eles fazem o sales tax ou mesmo o use tax, basta você usar aquele produto no Estado que você é tributado. Lá havia uma vedação, jurisprudência da Suprema Corte, nas operações interestaduais. O sujeito comprava um produto por Internet ou pelo correio, mas não era tributado, porque era uma operação interestadual, e a Suprema Corte entendia que essa tributação seria uma afetação no comércio interestadual, o que é vedado pelos Estados.
Em 2018, o caso South Dakota versus Wayfair reverteu toda a jurisprudência anterior da Suprema Corte e entendeu que, na importação via Internet, sem presença física, é tributado no Estado onde o bem ou o serviço é consumido. É mais ou menos o que fizemos com a Emenda Constitucional nº 87, de 2015, permitindo que os Estados, com uma partição, no período de transição, onde o bem foi importado via Internet, ficassem com a receita. Esse problema federativo tem que ser resolvido com a tributação no consumo, no destino mesmo.
Imposto sobre Vendas a Varejo, que é um ponto importante, aí há algumas variações, e os impostos especiais de consumo, sobre os quais se fala pouco e estão sendo pouco discutidos, mas é um importante.
Eu vou até pedir à Presidência um pouquinho de tempo a mais para tratar desse ponto.
Há outra forma de tributar o consumo, que é o chamado cash flow tax. É pouco usado, há uma tentativa aqui e ali, mas é baseado naquela questão da renda consumida. Então, tributa-se a renda consumida, o consumo, e cada cidadão tem uma faixa de consumo diferente, e mantém-se alíquotas progressivas. É possível fazer isso também, mas é pouco utilizado na prática.
16:09
RF
Está aqui é uma questão importante de se falar, que são as alíquotas do IVA — é até um exemplo da Espanha. O IVA tem que ser geral, com o máximo de crédito possível. Isso está bem claro. Mesmo na União Europeia, com creditamento amplo — há casos que chegam à Corte Europeia para serem decididos; o apresentador anterior falou até de alguns casos —, existem quatro padrões de alíquota que podem variar.
Há Estados cuja alíquota máxima é de 25%; outros, de 27% — acho que, na Hungria, chega a 27%. Mas são quatro faixas. Em qualquer país, há quatro faixas: zero — isenção —; alíquota menos reduzida; alíquota mais reduzida; e alíquota máxima. E, aí, eles podem trabalhar em função destes produtos — produtos de primeira necessidade, hospitais, etc. —, com tributação diferenciada.
O SR. MAURO BENEVIDES FILHO (PDT - CE) - Então, não é nenhum absurdo nós falarmos em duas ou três alíquotas aqui no Brasil.
Essa é uma experiência europeia, é isso?
O SR. MARCOS AURÉLIO PEREIRA VALADÃO - Isso.
A competência para tributar é um tema constitucional que vai impactar a tributação do consumo.
Nos Estados Unidos, com exceção para os impostos de importação e exportação, a competência é concorrente. Existe a tributação de consumo pela União, pelos Estados, pelos Municípios. Lá, ela é completamente concorrente. Existem umas variações disso, mas é completamente concorrente.
No Brasil, há uma distribuição rígida. Existem Constituições que fazem um misto disso aí. Há vantagens e desvantagens. Nós temos que olhar, também, para como essas Federações foram construídas. São processos históricos.
Mas o Imposto sobre Vendas a Varejo, fora o IVA geral, é uma possibilidade. Nos Estados Unidos, embora não exista IVA — na verdade, existe um Estado onde há IVA: Michigan —, é bem especial o jeito como eles cobram esse imposto lá.
Então, o IVV pode ser uma alternativa à venda a varejo. O IVV não incide em transações entre empresas, só varejo. Por isso é que ele não tem um efeito cascata dentro dos Estados Unidos. Uma transação entre empresas não tem tributação de consumo, é só o varejo mesmo final.
E há os chamados Impostos Especiais sobre o Consumo, muitas vezes chamados de sin taxes — impostos do pecado —, que incidem pesadamente sobre álcool e tabaco, mas também incidem sobre outros produtos — eles podem incidir sobre energia elétrica, combustíveis —, têm efeito extrafiscal e, também, efeito arrecadatório. (Pausa.)
A apresentação não está funcionando. Saiu do modo de apresentação? O que está acontecendo?
Eu peço à Presidência 2 ou 3 minutos para concluir, por favor. Estou sendo impedido aqui.
O SR. PRESIDENTE (Reginaldo Lopes. Bloco/PT - MG) - Sim.
O SR. MARCOS AURÉLIO PEREIRA VALADÃO - Este é um detalhamento dos impostos especiais sobre o consumo. É importante nós prestarmos atenção nisso, em face da experiência internacional. Isso tem sido pouco comentado.
Talvez pela importância do tema destes impostos e do IVV, eu peço um pouco mais de tempo, mais 2 ou 3 minutos.
16:13
RF
Nos Estados Unidos, por exemplo, existe uma agência especial que derivou do IRS, que é a ATF, que cuida de tributação e fiscalização exclusiva de álcool, tabaco, armas, munições e explosivos. Essa agência é especializada nisso, ela fiscaliza e cobra esses tributos. É onde o Eliot Ness trabalhava.
Na União Europeia, isso está na Diretiva nº 112, entende-se por produtos sujeitos a impostos especiais de consumo os produtos energéticos, bebidas alcoólicas e o tabaco manufaturado. Isso é tributação especial, não é IVA, é um imposto que incide uma vez só, alíquota ad rem, por litro ou quilo, mais uma alíquota ad valorem. No Brasil, nas duas PECs que nós estamos considerando, há a previsão de imposto especial de consumo. Então, estamos alinhados aqui.
No art. 153 da PEC 110, há um escopo mais amplo. E na PEC 45, há um artigo exclusivamente extrafiscal, ou seja, não teria caráter arrecadatório. Claro, sempre arrecadatório, mas a função seria extrafiscal, ou seja, uma tributação mais pesada sobre tabaco, bebidas alcoólicas, talvez bens com efeitos deletérios para a natureza. Pode haver esse tipo de incidência também para controlar a emissão de poluentes, por exemplo.
Nesse sentido, dentro do âmbito dos impostos especiais de consumo e para os Objetivos do Milênio até 2030, dentro do escopo da programação dos países no âmbito da ONU, esses impostos especiais se encaixam perfeitamente para prevenir doenças não transmissíveis derivadas do uso de tabaco e álcool, reforçando a prevenção e capturando mais receita para o Estado.
E aqui uma coisa interessante que pode ser pensada para esses impostos especiais, que está no item 3-C da Agenda 2030 da ONU, é a vinculação da receita desses impostos especiais para setores específicos. Então, tributar tabaco e álcool com vistas à preservação da saúde da população, essas receitas ou parte delas seriam diretamente direcionadas à saúde, vinculadas aos gastos com saúde e prevenção em relação a esses produtos. Essa é uma ideia que pode ser colocada também.
Por fim, encerrando, Sr. Presidente, esta é uma proposta que não está na PEC 45 nem na PEC 110. Não faço uma provocação às propostas colocadas, pelo contrário, é um complemento, baseado inclusive em experiência de sucesso de uso do imposto de venda no varejo. Reitero, esse é um imposto simples que não gera efeito cascata, porque é só no varejo, não existe tributação, ele não onera a empresa adquirente e ele pode substituir o ISS. Vejam, o ISS tem problemas conceituais. O ISS tem uma base restrita. O IVV não tem problemas conceituais, porque a base é ampla. Na verdade, ele é muito simples de ser aplicado, porque pode ser colocado juntamente com o futuro IBS, só é uma alíquota a mais acrescentada ali.
16:17
RF
E os Municípios podem fazer o que quiserem com essas alíquotas, podem inclusive dar isenções. Eles viram donos do seu tributo, eliminando um viés, parece-me procedente, em relação à autonomia dos Municípios. E também ele possibilitaria a redução do timing da transição, porque os Municípios ficariam com um instrumento importante de receita do varejo, que é algo em torno de 2,7 trilhões de base. É claro que as alíquotas não podem ser muito altas. É bom que regulada uma alíquota máxima em lei complementar, ou mesmo na Constituição, com ocorre hoje.
Eram essas as minhas considerações. Estendi um pouco o tempo. Espero que eu tenha colaborado com a discussão e apresentado algumas possibilidades para os nossos modelos que estamos discutindo.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Reginaldo Lopes. Bloco/PT - MG) - Grato, Dr. Marcos Aurélio Pereira Valadão. Muito obrigado.
Passo a palavra à nossa próxima convidada, a Sra. Melina Rocha, diretora de cursos na Universidade de York, no Canadá.
A SRA. MELINA ROCHA - Bom dia a todos.
É uma satisfação estar aqui.
Agradeço ao Deputado Reginaldo Lopes e ao Relator, o Deputado Aguinaldo Ribeiro, pelo convite. Também gostaria de agradecer ao Senador Roberto Rocha por ter me chamado nos últimos 2 anos para colaborar com a equipe técnica dele na elaboração do Relatório da PEC 110. Fiquei muito honrada com o convite para participar deste debate.
Deputado, hoje eu quero falar sobre uma questão muito importante para a reforma, que é a questão da administração compartilhada ou integrada dentro desse modelo de IBS único, tal como proposto pela PEC 45, ou de IVA dual, tal como proposto na PEC 110. Eu acho que esse tema é central — todos aqui acompanham o tema há muito tempo e sabem disto —, principalmente porque o conflito federativo entre União, Estados e Municípios é o que tem emperrado a reforma até então. Desde 1988, passando pelo Governo Fernando Henrique, até a PEC 233 do Governo Lula, sempre as reformas não foram aprovadas, por conta do conflito federativo.
Deste modo, Deputado Aguinaldo Ribeiro, eu acho que essa questão da administração integrada, centralizada e compartilhada é uma questão fundamental, que eu acredito que deva estar na Constituição e no Relatório da PEC que o senhor apresentar.
Apenas faço um breve comentário com relação ao que está previsto hoje nas duas PECs. No Relatório do Deputado Aguinaldo Ribeiro, muito bem escrito lá na Comissão Mista, o Deputado preferiu delegar essa questão da administração compartilhada para a lei complementar. No Relatório da PEC 110, que desenvolveu um pouquinho mais as discussões com os Estados, no último Relatório do Senador Roberto Rocha, foi acolhida a previsão de um conselho federativo por meio do qual os Estados e Municípios, de forma compartilhada, iriam administrar e arrecadar esse tributo. Esse conselho federativo pode perfeitamente ser colocado também no modelo de IVA único, junto com a União. Então, é disto que eu quero tratar: a importância da previsão desse conselho federativo.
Antes disso, quero tratar de uma questão muito debatida. Dizem que o IVA não é um tributo para federações, e isso é uma inverdade. Primeiro, o IVA é o tributo implementado por 174 países dos 195 países do mundo. Pela ONU, nós temos 195 países. Destes, 174 países, quase 90% dos países do mundo adotam o IVA. Então, eu discordo aqui do Prof. Valadão, que fala tanto do IVV. Mas, na verdade, o país mais relevante onde ele é implementado são os Estados Unidos. Das 31 federações do mundo, 23 adotam o IVA. Somente os Estados Unidos e outros países muito pequenos, como Micronésia, Iraque, Malásia, Sudão do Sul e Somália, não têm o IVA. Então é uma inverdade falar que o IVA não é um tributo para uma federação.
16:21
RF
Agora, há duas federações peculiares, que, a meu ver, têm uma característica semelhante à do Brasil, que são o Canadá, onde eu moro há 7 anos — fui para lá para estudar o IVA dual canadense —, e a Índia. Por que esses dois países adotaram o tal do IVA dual? Por um motivo simples, que também temos na nossa Federação: a Constituição desses países compartilha a tributação sobre o consumo, a competência para tributar o consumo. Tanto a União, federal, quanto os entes subnacionais, que são os Estados, na Índia, ou as Províncias, no Canadá, têm a competência compartilhada para tributar o consumo. Isso é o que acontece no Brasil, não é, Deputado Aguinaldo Ribeiro? Nós temos a competência de Estados, União e Municípios para tributar essa base de consumo, que aqui no Brasil foi repartida. A meu ver, esses países são muito parecidos com o Brasil. Eles tiveram que fazer adaptações ao IVA para adotar o IVA dual. E tanto os entes subnacionais quanto a União têm competência e têm IVA próprio.
Na maioria das federações do mundo de que eu falei aqui, por exemplo, a Alemanha e a Austrália, o IVA é um IVA federal. Não há essa competência compartilhada com os entes subnacionais. Então, só nesses três países — Brasil, Canadá e Índia — há esse compartilhamento constitucional.
Na Austrália, por exemplo, há uma única legislação, federal. É a Receita Federal, é a administração federal que arrecada, mas toda a receita do IVA vai para os Estados. Então, o que há lá é o compartilhamento da receita, é a destinação dela aos Estados.
Eu acredito que aqui no Brasil há de ser feita uma adaptação ao IVA. Por mais que se trate de um IVA único, com uma legislação única, a administração tem que ser, de alguma forma, compartilhada. Por mais que tenhamos um IVA único, tal como diz o relatório do Deputado Aguinaldo Ribeiro, a administração vai ter que ser compartilhada entre a Receita Federal, os Estados e os Municípios.
Como é que se dará isso? Por que precisa haver uma administração compartilhada? E por que é preciso que ela seja por um conselho federativo, uma agência ou outro nome que se dê a isso, que seja centralizada em alguma entidade?
Quando a operação ocorre dentro do Estado, não há problema nenhum: o Estado arrecada, fica com o dinheiro, e está tudo bem. O problema todo, no caso de compartilhamento, ocorre quando há uma operação interestadual. Por quê? Porque a alíquota vai ser no destino. Então, se eu sou um fornecedor que está em São Paulo e vou remeter para Bahia, eu vou ter que recolher no Estado de São Paulo com a alíquota da Bahia. E aí? Como é que eu vou fazer? São Paulo vai ter que transferir esse dinheiro para a Bahia? Pergunto isso porque a alíquota é da Bahia, o dinheiro é da Bahia, princípio do destino. Vai ter que transferir? Como é que a Bahia vai assegurar os créditos? O adquirente lá na Bahia vai ter direito aos créditos. Mas como é que a Bahia vai assegurar os créditos, se foi São Paulo que recolheu? Então, vejam essa dificuldade nas operações interestaduais.
Há várias soluções para isso, e eu vou relatar as soluções da Índia, do Canadá e da União Europeia.
A União Europeia, de certa forma, podemos considerar uma federação em que há operações intracomunitárias. Qual foi a solução da União Europeia? A União Europeia, inicialmente, aplicou nas transações intracomunitárias, entre os países, a alíquota zero, como se fossem exportação. Então, eu, Estado de origem São Paulo, não arrecado nada. Agora, quem está comprando, o meu adquirente na Bahia, vai ter que fazer um recolhimento desse imposto para a Bahia. O adquirente o faz por meio de reverse charge mechanism. Foi essa a solução da União Europeia em operações entre fornecedores. Em operações com o consumidor final, a União Europeia passou por um período de mudança com relação a isso. Inicialmente, era o Estado de origem que arrecadava. Nunca a União Europeia teve o princípio do destino integralmente aplicado. Ao longo do tempo, eles foram passando essa tributação ao consumidor final para o Estado de destino, mais ou menos o mesmo que aconteceu com a PEC do comércio eletrônico aqui. Foi mais ou menos isso o que aconteceu na União Europeia. Essa foi a solução da União Europeia. Eles nunca tiveram um sistema centralizado de administração, de arrecadação em que uma entidade supranacional administraria todos esses recursos. E há muitas dificuldades nessa questão, porque nunca o princípio do destino foi implementado de forma integral.
16:25
RF
A solução do Canadá foi a seguinte: no Canadá, o Governo Federal faz as vezes dessa agência centralizada. No Canadá, existe o IVA federal. Algumas Províncias harmonizaram esse IVA federal, ou seja, elas têm uma alíquota junto com o IVA federal — 5% é do IVA federal, 10% é das Províncias. Mas quem faz toda a administração, toda a legislação, toda a regulamentação é o Governo Federal. Vejam que o modelo canadense teve uma grande centralização e perda de autonomia das Províncias. As Províncias abriram mão de tudo: "Governo Federal, arrecade por mim, através da sua Receita Federal. Só me dê o dinheiro. Eu tenho a alíquota, eu defino a alíquota. Só me dê o dinheiro". Então, o modelo canadense não é o modelo ideal, Deputado Aguinaldo Ribeiro, porque existe essa predominância do Governo Federal, existe essa centralização no Governo Federal e as Províncias não têm autonomia nenhuma para administrar o tributo. Eu acho que isso não é o que queremos com a nossa reforma. Pelo contrário, nós queremos garantir a autonomia de Estados e Municípios.
A Índia, que é meu último exemplo, adotou um sistema que foi muito discutido aqui na reforma do Governo Fernando Henrique, cujo autor é o Varsano, que vai falar daqui a pouco. Vejam, temos um brasileiro que criou esse modelo que foi implementado na Índia, que é o modelo do barquinho. Não sei quem estava presente naquelas discussões — não é, Deputado? Quem estava se lembra muito bem.
O que é o modelo do barquinho? Nas operações interestaduais, aplica-se uma alíquota, que vai ser uma alíquota do Governo Federal. Então, operações internas têm alíquota do Estado, o IVA do Estado. Foi isso o que a Índia fez, e o Estado recolhe. Em operações interestaduais, é uma alíquota fixa. Então não é com base no destino que se paga para o Governo Federal. Esse é o barquinho.
Por que esse modelo barquinho não é ideal? Porque, de novo, é o Governo Federal que estará encarregado de, em operações interestaduais, fazer a destinação desse dinheiro. E Estados e Municípios perdem autonomia porque está muito centralizado no Governo Federal. É por isso que o modelo da Índia, do barquinho, que foi proposto lá no Governo Fernando Henrique, também não é o ideal agora.
Por que essa proposta, que foi criada pelos Estados de forma consensual, até o ano passado, e foi colocada na PEC 110, que trata da administração compartilhada, centralizada e integrada, é o melhor modelo?
Eu acredito, e espero que o Deputado Aguinaldo Ribeiro concorde, que esse seja o melhor modelo para a nossa reforma tributária.
16:29
RF
O que se propõe é uma administração centralizada, um ente único, separado de qualquer Tesouro municipal, estadual ou federal. Trata-se de uma entidade que vai ter representantes, de forma paritária, de Estados e Municípios. Há um detalhamento do funcionamento disso no debate com a sociedade civil. Essa entidade ficaria responsável em arrecadar todo o IVA, tanto em operações estaduais quanto em operações interestaduais, e faria a distribuição do dinheiro conforme o destino. Então, uma vez recolhido, vai ver para onde foi a mercadoria; se for venda ao consumidor final, paga... Só depois que chegar ao consumidor final, vai pagar para São Paulo, para a Bahia. Essa entidade vai assegurar o crédito dos contribuintes. Como tudo é arrecadado por essa entidade, ela vai fazer o creditamento quando se tratar de operação entre fornecedores, porque o fornecedor vai ter direito a crédito. Então, trata-se de uma entidade que vai garantir o efetivo creditamento ou a devolução de créditos acumulados, sem que isso vá ao Tesouro Nacional e nunca seja pago aos contribuintes. Essa entidade dá uma maior garantia da devolução dos créditos acumulados e dá efetividade à não cumulatividade, porque, hoje, se esse dinheiro entra para os Estados ou para a União, nunca mais se vê a cor desse dinheiro quando se acumula crédito.
As nossas exportadoras, Deputado, têm bilhões em créditos acumulados e nunca veem esse dinheiro porque ele entrou no caixa, e aí o Estado não tem mais caixa para pagar! Mas não é o dinheiro deles, não é o dinheiro dos Estados. É por isso que essa administração ou essa entidade independente vai garantir que esses créditos sejam devolvidos de forma mais eficiente.
Além disso, garante-se autonomia, porque você não está sujeito ao Governo Federal, como no modelo do Canadá ou no modelo da Índia. Você está sujeito a uma entidade independente, que é administrada de forma paritária pelos entes. Isso garante a autonomia dos entes para administrar esse tributo, para regular e interpretar a aplicação desse tributo.
Então, a meu ver, esse é o melhor modelo. Ele é imprescindível se quisermos garantir a autonomia de Estados e Municípios e se quisermos garantir a efetiva devolução de crédito acumulado aos contribuintes. Trata-se de um ganha-ganha, a meu ver, porque tanto o contribuinte está acreditando nessa entidade quanto Estados e Municípios terão uma participação paritária.
Por fim, quero falar só de uma questão para a qual eu queria chamar atenção, com relação às alíquotas.
Fala-se muito no debate público que uma alíquota de 25% do IVA é muito alta ou que os países não têm alíquota tão alta. Eu queria deixar muito claro, também neste debate, que o que está sendo discutido e proposto nas PECs é que a alíquota vai ser calibrada para manter a carga tributária atual ou a arrecadação tributária atual. Então, por exemplo, se hoje arrecadamos entre 700 milhões de reais a 1 bilhão ou a 1 trilhão de reais, vamos ver qual será a alíquota necessária para arrecadar a mesma quantidade de dinheiro, ou seja, não se trata de aumento de carga tributária; se será uma alíquota de 25% que vai arrecadar o mesmo montante, quer dizer que hoje nós já pagamos esse montante! Então, é muito importante falarmos isso.
O último recado é que o IVA é importante, o IVA nasceu na União Europeia, mas o IVA da União Europeia, em termos de legislação, é um IVA muito antigo, que sofreu uma série de remendos! Então, muita gente fala aqui do IVA, como a Profa. Rita, o Javier e o próprio Valadão, mas eu acredito que há modelos mais modernos de legislação, que são os IVAs criados a partir da década de 1990, como o IVA da Nova Zelândia, do Canadá, da África do Sul e da própria Índia.
Então, essa regulação de que o Valadão acabou de falar, dos intangíveis, na União Europeia, a meu ver, é ultrapassada.
16:33
RF
A União Europeia coloca os intangíveis como se fossem serviços. Nesses IVAs mais modernos, ao se olhar a legislação, os intangíveis estão separados dos serviços. Isso traz uma série de implicações. Com isso, eu quero dizer que se trata de um IVA mais moderno e que seria mais adequado no relatório que foi adotado na PEC 110. E, já que vamos criar um tributo novo, que isso seja feito conforme as legislações mais novas de IVA, e não seguindo o IVA europeu, que é antigo, remendado e com muitos problemas, inclusive, o das alíquotas diferenciadas, Deputado, como o senhor levantou.
A alíquota diferenciada existe na União Europeia por conta de um path dependence. Foi o passado que fez isso, mas os IVAs mais modernos realmente têm uma preferência por uma alíquota única e pela devolução do tributo.
O SR. MAURO BENEVIDES FILHO (PDT - CE) - Só queria falar rapidamente que, agora, o diretivo do IVA na Europa foi modificado. Em 6 de abril de 2022, eles criaram várias faixas de redução, com mais alíquotas ainda das que estavam previstas. E isso é moderno, é de 2022!
A SRA. MELINA ROCHA - Exatamente!
Por isso, eu acho que a União Europeia tem muito desse histórico, que nos IVAs mais modernos já foi resolvido, por saber justamente das consequências que isso criou, como a Profa. Rita acabou de falar.
Então, eu só queria deixar claro que existem IVAs mais modernos, com menos alíquotas. Mesmo na União Europeia, o setor de serviços como um todo não tem uma alíquota menor. São sempre alguns serviços, como de saúde, de educação — eles constam de uma lista! Aliás, também é outra inverdade que o setor de serviços quer uma alíquota própria menor. Isso não existe nem na União Europeia!
Já passei do meu tempo, e espero ter contribuído para o debate.
Muito obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Reginaldo Lopes. Bloco/PT - MG) - Muito grato, Melina Rocha, nossa Diretora de Cursos na Universidade de York, no Canadá.
Passo a palavra, de forma virtual, para o Antônio Lício, consultor em economia.
Ele vai utilizar um vídeo de 13 minutos. Aliás, eu acho que tem 12 minutos e 22 segundos.
O SR. ANTÔNIO LÍCIO - Boa tarde a todos.
É um prazer e uma honra participar dessa apresentação junto ao Grupo de Trabalho da Reforma Tributária do Brasil de 2023. Desde 1966, esta é a quarta tentativa de se implantar uma reforma tributária no Brasil! A única que foi feita especificamente e com sucesso foi a de 1966, com a implantação em 1967, que resultou na atual estrutura tributária do Brasil. No Governo Sarney e depois no Governo Collor, houve duas novas tentativas de implantação de reforma tributária, que não vingaram. Eu participei de ambas.
Rapidamente eu vou falar sobre o meu perfil profissional. Eu sou economista, formado, em 1968, pela Universidade Federal de Minas Gerais. Em 1969, eu participei de uma seleção para continuar os estudos em nível de mestrado e doutorado, PhD, nos Estados Unidos, na Vanderbilt University, voltando ao Brasil em 1974, com uma área de concentração em finanças públicas e tributação. Ingressei na UFMG, por meio de concurso, como professor, mas, já no final de 1974, pedi licença para vir a Brasília e ingressar no novo Governo do Presidente Geisel, que se instalou em março de 1974.
16:37
RF
Nós vamos falar sobre um tema que desafia governantes há praticamente 40 anos, sem sucesso. No Governo do Presidente Bolsonaro, em 2019, houve nova tentativa de implantação da reforma tributária. Eu fui chamado pela Frente Parlamentar da Agropecuária, mais especificamente pela Associação Brasileira dos Produtores de Milho, pelo Presidente Alysson Paolinelli, com quem eu tinha trabalhado na década de 70 no Ministério da Agricultura, para fazer uma proposta de reforma tributária.
Fizemos essa proposta, e o Presidente da FPA, o então Deputado Alceu Moreira, conseguiu transformá-la numa PEC substitutiva, que viria substituir a PEC 45. Nós todos fomos notificados, democraticamente, pelo então Presidente da Câmara dos Deputados, o Deputado Rodrigo Maia, de que só iria levar a cabo a PEC 45. Todas as demais iniciativas seriam descartadas, iriam para o lixo. Assim foi feito, e a nossa tentativa de reforma tributária, a partir da Frente Parlamentar da Agropecuária, foi para o lixo.
Coincidentemente, houve outra tentativa, dessa vez simultaneamente iniciada pelo Deputado Luiz Philippe de Orleans e Bragança, que tinha as mesmas estruturas básicas da nossa proposta. Já em 2020, o Deputado Luiz Philippe conseguiu transformá-la numa PEC, que veio a ser a PEC 7/20, sobre a qual nós vamos falar, comparando-a com a atual PEC 45 e com a PEC 110, que estão em discussão.
Para não falar somente empiricamente, chamo a atenção para alguns princípios de tributação. Vou começar falando de impostos diretos e de impostos indiretos. Os tributos diretos são aqueles que incidem sobre a renda e a propriedade; e os indiretos são aqueles que incidem sobre uma operação de compra e venda.
Enfatizo que os trabalhos de reforma sobre os impostos diretos, os que incidem sobre renda e propriedade, são muito simples, são muito fáceis e não devem tomar muito tempo desta Comissão. Por quê? Porque todo imposto tem um impacto, uma transferência e uma incidência. O primeiro ponto de impacto não necessariamente é a incidência sobre o setor ou sobre o produto. Aquele impacto se espalha através das cadeias produtivas. Mas, no caso da tributação sobre a renda e a propriedade, não há transferência de impacto. Portanto, a incidência é igual ao impacto. Então, se a Comissão de reforma tributária decidir aumentar ou diminuir a carga tributária através de alíquotas referentes a imposto sobre renda ou sobre a propriedade, é simples. Até por decreto isso pode ser feito. Já quando se trata de impostos indiretos sobre as vendas, aí é que nascem as complicações, o caos tributário e o manicômio tributário que o Brasil vive atualmente. E, claro, vou me deter nesse ponto daqui para frente.
16:41
RF
Os impostos indiretos hoje no Brasil são basicamente o ICMS, que é o maior de todos, o IPI, o PIS/COFINS, o ISS, enfim, todos que incidem sobre operações de compra e venda, em relação aos quais a PEC 45 e a antiga PEC 110 têm propostas concretas. Qual delas é melhor? Os impostos indiretos podem ser cumulativos, podem ser sobre valor agregado e podem ser sobre consumo.
Temos um conflito, porque a PEC 45 trata da criação de um imposto sobre consumo, mas, ao mesmo tempo, de um imposto sobre valor agregado. Aí há um erro: um erro de concepção, um erro de nomenclatura, um erro básico. A PEC 45 não cria imposto sobre consumo. Ela cria imposto sobre produção, porque, no caso, o IVA — Imposto sobre Valor Agregado incide sobre todos os elos das cadeias produtivas. O imposto de consumo incide somente sobre o último elo da cadeia produtiva, que é o caso da proposta do Deputado Luiz Philippe. Esse imposto também é chamado de sales tax, em inglês, nos Estados Unidos, para diferenciar dos impostos sobre valor agregado.
Então, eu vou me referir, daqui para frente, a imposto sobre consumo e a Imposto sobre Valor Agregado — IVA. São duas coisas completamente diferentes. Qual é a vantagem de um e de outro? Desde a discussão das PECs 45 e 110, tem se falado que o mundo todo se utiliza dos impostos sobre valor agregado, e não dos impostos sobre consumo ou sales tax. É verdade. O mundo todo usa os impostos sobre valor agregado, mas somente os países que têm Estados centralizados, não países com Estados federativos. Por quê? Porque, nos Estados federativos, as vendas de um Estado para o outro, ou mesmo de um Município para o outro, são tributados diferentemente. E, nos Estados centralizados, não temos essa característica. Portanto, grandes países, como Brasil, Estados Unidos, Canadá, Alemanha, Índia, China, Rússia, Austrália, deveriam ter e têm impostos sobre consumo, incidindo somente sobre o último elo da cadeia produtiva. "Ah, mas a Alemanha tem o Imposto sobre Valor Agregado — IVA". Sim, mas, embora a Alemanha seja um Estado federativo, em se tratando de impostos e tributação, é um imposto sobre consumo, somente incidindo sobre o último elo da cadeia produtiva. Quanto à Índia, que é outro Estado, um país grande e federativo, eu sugiro, a quem se interessar, procurar na Internet "Value-Added Taxation in India", para ver o caos tributário que está acontecendo lá, pior do que no Brasil, causado pelos mesmos impostos sobre valor agregado. Portanto, chamo veementemente a atenção para o fato de que o caos tributário no Brasil, o manicômio tributário que foi instalado no Brasil tem uma única raiz: Imposto sobre Valor Agregado, principalmente ICMS. Quem não sabe disso é quem nunca trabalhou com administração tributária nem com aplicação de tributos sobre os seus produtos.
16:45
RF
Qualquer empresário, por menor que seja, sabe da dificuldade em calcular o imposto quando vende de um Município para outro Município em outro Estado ou quando faz exportações. É impossível saber qual vai ser o resultado final da carga tributária. Se for a mais e ele não pagar, será multado. Se a diferença for para o lado dele, a seu favor, ele jamais terá o crédito in totum. Ele terá que entrar numa fila para absorver esse crédito.
Enfim, os famosos créditos de exportação, créditos interestaduais, créditos presumidos, substituições tributárias e, em cada Estado, pautas tributárias, isso é o que resulta no inferno tributário no Brasil. Portanto, as PECs 45 e 110, mantendo os IVAs, vão manter o inferno tributário no Brasil. Chamo a atenção de todos os senhores para que observem a proposta que simplesmente transforma os impostos indiretos — impostos sobre produção — em impostos sobre consumo, sobre o último elo da cadeia produtiva somente.
Obrigado.
16:49
RF
O SR. PRESIDENTE (Aguinaldo Ribeiro. PP - PB) - Por delegação do nosso Coordenador, convido o próximo expositor, o Sr. Ricardo Varsano, ex-economista sênior do Fundo Monetário Internacional — FMI e consultor em política tributária, que falará pelo Zoom.
O SR. RICARDO VARSANO - Muito obrigado. Foi uma honra ter sido convidado para esta audiência.
Eu gostaria de falar algumas coisas que já foram ditas pela Profa. de La Feria e pela Profa. Rocha. Queria também conversar um pouco agora sobre o que acabou de falar o Dr. Lício.
O IVA é um imposto que, como disse já a Profa. Rocha, foi adotado no mundo por 174 países, e todos eles são adeptos de impostos sobre o consumo, porque o IVA pode ser um imposto tanto sobre o consumo quanto sobre a produção. Ele incide sobre o consumo quando se adota o que nós fizemos no Brasil para o ICMS e adotamos para o ICM, que é o método de crédito fiscal. Ele incidiria sobre produção se fosse adotado como foi, inicialmente, tipo PIS/COFINS, o método de subtração. Nesse caso, sim, teríamos um imposto sobre o valor adicionado por cada produtor.
No caso do IVA como método de crédito fiscal, não. O que nós temos é um imposto que vai sendo calculado sobre o valor adicionado ao produto, e não pelo produtor. Daí, no final das contas, com a cadeia de débito e crédito, acaba sendo um imposto de consumo sobre o valor total consumido. Então, esse é um ponto fundamental, sobre o qual não cabe discussão mais, porque são 174 países que o adotaram ao longo desses anos.
A outra coisa que eu queria dizer é sobre algumas alegações de que o projeto não está maduro e de que precisamos discuti-lo mais. Nesse caso, o que posso dizer é que o projeto tem por base toda a literatura do IVA. A primeira vez em que se falou de imposto não cumulativo sobre movimento econômico foi há mais de 100 anos. Isso foi instituído pela primeira vez na França há 75 anos exatamente, em 1948. Depois, então, evoluiu ao longo do tempo.
Como disse a Profa. Rita de La Feria, não é um imposto velho. Ele pode ser antigo, assim como é o Imposto de Renda, mas ele não é um imposto velho. Ele é um imposto que foi se renovando aos poucos. Também já foi dito pela Profa. Milena Rocha que o IVA europeu é de uma estirpe antiga, é um IVA de segunda geração. Na primeira geração, está o imposto franco de 1948, que foi reformado em 1954, e está também o ICMS, o ICM na época. O ICMS continua sendo o ICM nesse ponto. A primeira geração apareceu quando a França e a Dinamarca, na mesma época em que foi feito o ICM, incluíram os serviços na base do IVA, já que ele não era incluído até então.
16:53
RF
Então, passamos a ter um IVA completo, que considera os serviços. E esse é o IVA que tem se adotado no mundo desde então. Já o IVA europeu é esse antigo, da década de 60, quando se adotou mais de uma alíquota. Era uma alíquota standard, com tarifas reduzidas. Também se fez um IVA que tinha bastantes isenções. Isso foi se agravando ao longo do tempo. Todo imposto, à medida que vai envelhecendo, agrava-se. Mas o IVA em si não envelheceu, ele foi mudado.
A partir da década de 90, começaram a surgir IVAs mais modernos, como o do Canadá, da Austrália, da Nova Zelândia, da África do Sul e outros. Então, aproximadamente, o que existe hoje são IVAs que tendem a ser mais simples. Eles têm muito poucas isenções, têm uma ou muito poucas alíquotas e têm uma estrutura mais simplificada.
Se olharmos os IVAs muito recentes, como aqueles da comunidade do Golfo, de Angola ou das Bahamas, veremos que eles são IVAs muito mais simples do que o europeu e mais simples do que os da década de 90. Eles têm poucas isenções, uma taxa só, uma alíquota só e praticamente não há mais nenhuma outra coisa que atrapalhe a administração do IVA.
Então, essencialmente, são esses os pontos. Eu acho que nós já discutimos bastante esse tipo de reforma. A PEC 45 é de 2019. Portanto, são 4 anos de discussão. Mas essa PEC não apareceu do ar, ela foi uma evolução da PEC 175/95, que também não apareceu do ar, porque foi a evolução do que se pensava desde que o ICM foi criado, em 1967, com duas deficiências básicas. Uma era a não inclusão do setor de serviços, segundo o princípio de origem no comércio interestadual.
Já que a Melina Rocha citou o meu nome, deixem-me dizer que hoje eu tenho uma ideia diferente. Na época, eu propus o modelo barquinho. Como ela disse, ele foi adotado na Índia, com algumas modificações, e não com a minha participação. Na Índia, eu não participei da reforma que eles fizeram. Hoje eu acho que o sistema de compensação, semelhante a uma compensação de cheque, pode funcionar perfeitamente. Hoje nós temos informática suficiente para fazer isso. Na época, em 1995, ainda não tínhamos.
Então, são essas as minhas considerações. Mais uma vez, eu agradeço o convite para ter participado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Reginaldo Lopes. Bloco/PT - MG) - Obrigado, Ricardo Varsano.
O próximo orador é o Isaías Coelho, pesquisador sênior do Núcleo de Estudos Fiscais da Fundação Getúlio Vargas, que terá o tempo de 10 minutos.
O SR. ISAÍAS COELHO - Muito obrigado, Deputado. É um prazer estar com os senhores para discutir temas tão importantes.
Fico feliz de ver que a reforma tributária está avançando e que as iniciativas da Câmara e do Senado estão se aperfeiçoando. Um consenso se forma em todo o País de que a hora é esta, de que chegou o momento. Estamos maduros para dar esse passo importante. Essa reforma é transformadora e trará muitos bons frutos. Estou certo disso.
16:57
RF
Não estamos a dar um salto no escuro, porque o IBS, uma forma de IVA, não é novidade: é um produto já bastante testado, é um produto de prateleira. Basta fazermos as coisas certas. Quanto ao ajuste de legislação que precisa ser feito, naturalmente, o Congresso, esta Comissão, este grupo de trabalho aplainará o caminho para chegarmos a uma forma viável, aceitável, boa para o País.
Nas discussões neste fórum e em outros, pelo assunto estar tão em voga nesses dias — há muitos artigos na imprensa sobre isso —, vemos que há muita desinformação. Há muitos temores, muitos dos quais não justificados. Alguns mitos que circulam por aí vão muito além daqueles que a Profa. Rita de La Feria enumerou. Então, há um trabalho muito importante de desarmar os espíritos e de mostrar que estamos caminhando para algo relativamente simples, factível e beneficioso.
Temos, no Brasil, a peculiaridade de que o SIMPLES Nacional abrange 90% das empresas. O fato desses 90% do universo empresarial não estarem incluídos no projeto — não vai se aplicar a eles o novo imposto — simplifica bastante, porque os pequenos negócios não vão sofrer alteração. Se houver alguma alteração, ela será para diminuir a sua carga, porque hoje eles pagam ICMS, pagam o ISS e pagam PIS/COFINS. Como esses impostos desaparecerão, eles não terão que pagá-los. A norma internacional é isencional: não tributar os pequenos negócios. Então, isso facilita muito, sobretudo porque as empresas de serviços pessoais são de pequena dimensão. Então, elas não terão que se preocupar com o novo imposto.
Colocado em ação onde interessa, o novo imposto vai melhorar o clima de negócios indubitavelmente; vai melhorar a relação entre os entes federativos, com a eliminação da guerra fiscal, da guerra dos portos, de todas essas práticas que não trazem benefício para o País; vai melhorar a relação entre o Fisco e o contribuinte, com a redução do contencioso; e vai melhorar, sobretudo, a competitividade do País
A competição estrangeira não se enfrenta lá fora, enfrenta-se aqui dentro. O produtor brasileiro tem que lutar contra o produto estrangeiro dentro do Brasil. Lá fora, o produto não tem resíduo de imposto na cadeia: ele vem limpo de IVA. Então, nós temos que limpar o imposto também aqui, deixá-lo somente no último estágio, através de um crédito amplo que realmente desonere toda a cadeia produtiva. Acho que esse é o princípio que forma o novo imposto.
Vejam que a base do IBS, em linhas gerais, é o PIB: é a soma do pagamento aos fatores. Há outros impostos que tributam parte do PIB. As contribuições sociais tributam a parte dos salários. Então, ele discrimina o trabalho. Ele torna mais caro o trabalho. Ele incita a informalidade trabalhista. O capital, por sua vez, paga o IRPJ — Imposto de Renda Pessoa Jurídica e a CSLL — Contribuição Social sobre o Lucro Líquido. Portanto, esse é um imposto parcial só sobre esse fator. Ele ainda é parcial do parcial, porque não tributa todos os rendimentos de capital. Tributa só o do capital empresarial, porque o capital de empréstimo escapa à tributação. Os juros não se incluem nessa tributação. Não se trata de um imposto sobre toda a renda do capital, somente sobre a renda do capital do empresário.
17:01
RF
Já o IBS vai tributar tudo, vai tributar sem discriminar o que é capital e o que é trabalho — o produto deles. Então, isso vai ser distinto do Imposto de Renda, apenas porque a renda também tributa as poupanças. No caso, nós vamos tributar somente a parte da renda que é consumida.
Então, logicamente, esse é um imposto inteligente, bem estruturado. Com as administrações tributárias sofisticadas e com os sistemas informáticos avançados que nós temos, não há dúvida nenhuma de que isso vai ser um grande alívio para o contribuinte em termos de descomplicação e de que vai ser muito produtivo para os fiscos em termos de arrecadação.
O mais importante é que, pela natureza dos projetos que estão na Câmara e no Senado, não se trata de aumentar a carga tributária. Essa é uma coisa inaudita nas reformas tributárias no Brasil. Nós estamos fazendo uma reforma para melhorar a qualidade do imposto, trocando um imposto ruim por um imposto bom, sem aumentar a carga tributária. Portanto, haverá uma diminuição do peso morto, que são os custos em que se incorre para controlar, para dar informação, para uma série de coisas, que não representam arrecadação para o Fisco, mas representam custo para o contribuinte.
Há muitos aspectos particulares que descendem do imposto e que eu gostaria de comentar, mas obviamente o tempo é limitado. Então, eu encaminhei ao grupo de trabalho uma nota com essas considerações complementares. A assessoria do grupo de trabalho, que é muito eficiente, já postou isso no site, no portal do GT. Portanto, já está à disposição dos senhores e do público também essa parte.
Senhores, eram essas as considerações que eu tinha a fazer. Temos acompanhado, no Núcleo de Estudos Fiscais da FGV, de São Paulo, esse desenvolvimento; temos estudado esses problemas; e temos nos deparado certamente com dificuldades, como tributar certas coisas, como dar um tratamento adequado para as transações digitais.
Como colocou a Profa. Rita de La Feria, a esperança de tributar adequadamente a economia digital está no IVA, está no IBS. Vejam a luta que é enquadrá-lo no Imposto de Renda com esses contratos escorregadios. Por quê? Porque o IBS vai aonde está o consumidor. Ele segue o dinheiro. Ele segue o dispêndio.
17:05
RF
É possível separar o que ocorre dentro do País e o que ocorre fora. Então, o consumidor brasileiro vai ser tributado, na sua inteireza, pelo Governo Federal, em cada Estado. O Estado-membro da Federação vai tributar os seus cidadãos. Não será como hoje, que um Estado tributa o cidadão de outro Estado. Quem compra um carro em Campina Grande está pagando imposto para o Estado de São Paulo, está pagando imposto para São Bernardo do Campo. Isso acaba, porque o princípio do destino vai levar esse imposto para Campina Grande, para a Paraíba e para o Brasil como um todo. Mas termina essa história que acontece hoje no ISS e no ICMS, essa confusão federativa.
Então, por tudo isso, o trabalho que esse GT, em boa hora, está empenhado em trazer, com a consideração das duas Casas legislativas, do Parlamento brasileiro, reveste-se de uma importância enorme para o Brasil, para a economia brasileira, para a prosperidade dos brasileiros.
É isso o que eu queria dizer. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Reginaldo Lopes. Bloco/PT - MG) - Muito bem.
Obrigado, Isaías Coelho, pesquisador sênior do Núcleo de Estudos Fiscais da Fundação Getúlio Vargas.
O próximo orador é o André Mendes Moreira, livre-docente em direito tributário pela Universidade de São Paulo — USP e professor de direito tributário da Universidade Federal de Minas Gerais, a grande universidade dos mineiros.
O SR. ANDRÉ MENDES MOREIRA - Boa tarde a todas e a todas.
Quero inicialmente registrar a minha satisfação em estar aqui virtualmente na Câmara dos Deputados, a Casa de todos os brasileiros.
Quero cumprimentar o grupo de trabalho que debate a reforma tributária, inicialmente na pessoa dos meus conterrâneos que a integram, o Presidente Reginaldo Lopes, o Deputado Newton Cardoso Jr e o Relator Aguinaldo Ribeiro.
Quero também parabenizar todos os palestrantes que me antecederam, nas pessoas da Profa. Melina Rocha e do Prof. Isaías Coelho, com os quais já tive a oportunidade de debater o presente tema em mais de uma ocasião.
A minha fala será dividida em dois momentos. Num primeiro momento, irei demonstrar por que hoje, no Brasil, não se tem verdadeiramente um imposto sobre valor agregado nos moldes do exposto pela Profa. Rita de La Feria ou nos moldes do existente na Europa ou em qualquer lugar do mundo. Num segundo momento, eu irei demonstrar que é fundamental — para não dizer imprescindível — que se modifique o texto da PEC 45 ou da PEC 110 para que efetivamente se implemente um IVA no Brasil. Em que pese estar embasado nas teorias mais modernas, o que está escrito na PEC hoje não implementa no Brasil nenhum imposto sobre valor acrescido. Eu vou trazer também uma sugestão de redação que soluciona esse problema de modo bastante singelo.
17:09
RF
Tenho mais de 2 décadas de experiência não apenas na docência em matéria tributária, mas, especialmente, na produção acadêmica em matéria de ICMS, IPI, PIS e COFINS e também do IVA europeu, e mais de 2 décadas de advocacia tributária em todos os Estados do Brasil. Portanto, conheço a fundo os problemas que o ICMS, o IPI, o PIS e a COFINS trazem, seja sob o prisma teórico, seja sob o prisma prático.
Com isso, passo à primeira parte da minha fala, que, obviamente, será breve, dentro dos 10 minutos.
(Segue-se exibição de imagens.)
Nessa primeira parte, eu queria lembrar que o IVA não é novo. O IVA foi pensado inicialmente em 1918, na Alemanha, pelo engenheiro Carl von Siemens, que propôs ao Parlamento alemão da época a adoção de um novo modelo de tributação plurifásica não cumulativa. Sua proposta não evoluiu porque von Siemens era opositor do Partido Nacional Socialista, mas, ainda assim, ele publicou um livro, que existe hoje em raras bibliotecas no mundo, do qual tenho uma cópia, em que ele traz em poucas dezenas de páginas a sua proposta de tributação não cumulativa.
O IVA foi criado na França em 1948, porém de forma plena em 1954, por Maurice Lauré, que criou uma fórmula de tributar chamada tributo de pagamento fracionado, significando que se cobra um pouquinho em cada etapa, para que, ao final, o todo esteja dividido entre as diversas etapas, desde a produção até a venda final.
No Brasil, essa sistemática foi inicialmente adotada no imposto sobre o consumo, em 1958, e posteriormente na Constituição modificada em 1965 para o ICMS e o IPI.
Qual é a grande vantagem desse imposto? É a neutralidade concebida como o fato de a carga tributária ser a mesma, independentemente do número de etapas entre a produção e a venda ao consumidor final. Portanto, se alguém importa um bem para consumo final ou se alguém compra esse mesmo bem no território nacional, após ele ter passado pela indústria, pelo distribuidor e pelo varejista, a carga tributária tem que ser a mesma. Isso é um ganho, em termos de princípio de igualdade tributária, falando de forma mais ampla, muito expressivo.
Qual é a desvantagem? É a complexidade. Por trabalhar com o mecanismo de créditos e débitos, esse imposto é de mais difícil apuração e, portanto, de fiscalização.
Com essas palavras, o que quero dizer até o momento é: vale a pena, em prol da neutralidade, suportar a neutralidade do IVA, desde que se alcance essa neutralidade. Se o IVA não for neutro, é melhor, então, adotar o modelo que vigorava na Alemanha até 1918, que vigorava na França até 1948, que é o da tributação plurifásica cumulativa com alíquotas baixas, como era o PIS e a COFINS cumulativos no Brasil. Tributa-se sobre o valor cheio da venda com uma alíquota baixa, com fiscalização fácil, com controle fácil, porém que não é neutro.
O que aconteceu no Brasil? Este é o problema central. No Brasil, a jurisprudência evoluiu de modo a não permitir o alcance da neutralidade no ICMS e no IPI. Embora concebido como imposto sobre valores acrescidos, hoje ocorre uma situação na qual um comerciante, um dono de supermercado não tem direito a ser creditado o ICMS suportado na energia elétrica por ele consumida, o que é algo inconcebível em qualquer um dos 170 países onde se adota o IVA.
17:13
RF
Portanto, o ICMS é um meio IVA, assim como o IPI é um meio IVA. Estamos no meio do caminho entre a antiga tributação cumulativa, que vigorava na Alemanha e na França e que foi verdadeiramente substituída por um IVA, e o IVA efetivamente considerado.
Nesse cenário, o que ocorre? Na Europa, todos os custos, inclusive aqueles indiretos, geram crédito do IVA. Trarei aqui um exemplo do Tribunal de Justiça da Comunidade Europeia. Uma empresa aérea chamada Ryanair em 2018 fez uma aquisição de uma concorrente. Posteriormente, a aquisição dessa concorrente foi vetada pelo CAD europeu, por razões concorrenciais, e a compra teve que ser desfeita. Nessa operação, a Ryanair contratou consultores, que pagam IVA, contratou advogados, que pagam IVA. Em que pese essa operação de compra não ter sido concretizada por razões concorrenciais, em que pese ela não ter gerado saídas tributadas pelo IVA, a Ryanair teve o direito assegurado pelo Tribunal de Justiça europeu de se creditar do IVA que foi suportado por todos os seus contratantes — advogados, assessores financeiros, etc. — para realizar essa operação que pretendia ampliar a base de aviões de empresa, a base de clientes da empresa, mas não conseguiu.
Na Europa, tudo que indiretamente repercute no preço gera crédito. No Brasil, apenas alguns custos diretos geram crédito, de modo que não é correto dizer que hoje no Brasil nós temos IVA. Nós tínhamos a pretensão de ter, mas, lamentavelmente, não o temos hoje.
Com essas palavras, eu passo à segunda e última parte da minha fala, na qual eu irei propor uma modificação nos textos das PECs que estão sob análise, para que efetivamente nós possamos criar um IVA no Brasil, momento a partir do qual todas essas discussões — se é o IVA do país A, B ou C — passam finalmente a fazer sentido. Permito-me trazer a proposta que projetarei.
Indago se V.Exas. conseguem ver os eslaides. (Pausa.)
Muito bem, obrigado.
Qual é o problema? Hoje nós não temos IVA no Brasil porque a Constituição diz que o ICMS ou IPI será não-cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação com o montante cobrado nas anteriores. Ao ler esse enunciado, o Supremo Tribunal Federal disse que o legislador pode, se quiser, restringir o crédito da forma como desejar. Essa é a verdade, e, pelas necessidades de caixa, sejam da União, sejam dos Estados, o crédito foi restringido no IPI, no ICMS, no PIS e na COFINS. Por isso, nós não temos um IVA.
17:17
RF
Qual é a redação tanto da PEC 45 quanto da PEC 110 para adotar o IVA? É idêntica à da Constituição de 1988. A reforma, nesse ponto — e digo isso muito respeitosamente —, não reforma, só que aqui se trata do coração do imposto. Se eu não mudo o coração do imposto, eu não mudei nada. De modo que não adianta sustentar que a lei complementar resolverá, porque hoje a lei complementar poderia resolver no ICMS, e não resolve. Hoje a lei ordinária poderia resolver no IPI, no PIS e na COFINS, e não resolve.
Portanto, para que essa proposta avance como uma proposta que irá verdadeiramente implementar o IVA no Brasil — o que nunca se conseguiu —, é preciso que se mude a redação da Constituição, o que nem a PEC 45, nem a PEC 110 fazem no ponto mais fundamental desse imposto.
Qual é, então, a solução? Modificar a Constituição, fazer uma reforma que efetivamente traga para o texto constitucional brasileiro a neutralidade tributária garantida pelo IVA, que justifique a sua adoção como um tributo efetivamente complexo, de difícil controle e de difícil apuração.
Sugestão aqui trazida: adotar a redação baseada na diretiva IVA europeia, porém atualizada, para não tenhamos os problemas que a Europa enfrentou. Qual seria a redação? Seriam dois parágrafos para substituir o texto que está sendo mantido, reitero, idêntico ao da Constituição de 1988. E o Supremo Tribunal Federal já leu, já interpretou e disse que aquilo ali não garante nenhum tipo de IVA, garante um imposto medianamente não-cumulativo, o que não é o que se almeja, creio eu, por ninguém que aqui está.
Primeira parte: é preciso fixar o princípio reitor do IVA. O princípio reitor do IBS, no caso, é o da neutralidade vertical, pelo qual o montante devido a título de tributo será exatamente proporcional ao preço final do bem ou serviço, independentemente do número de etapas existentes entre o início da prestação ou da produção até a efetiva aquisição pelo consumidor final.
Nesse primeiro ponto, anuncia-se um princípio: qual é o fim a ser alcançado. No segundo e último ponto, diz-se qual é a regra, como será alcançado o fim. Em cada operação, o Imposto sobre Bens e Serviços é exigível somente após prévia dedução do montante do imposto que tem incidido sobre todas as aquisições que impactem o preço desse bem ou serviço, estejam tais aquisições direta ou indiretamente relacionadas com a atividade empresarial. Adotando-se essa redação, traremos um grande avanço para a Nação, que é ter, pela primeira vez em sua história, um imposto sobre valor acrescido, que até hoje não conseguimos ter e que não foi trazido pela atual redação da PEC 110 ou da PC 45.
Nesse sentido, vem a minha contribuição trazida de forma muito respeitosa, porém com base em toda a experiência que tenho sobre o assunto.
Com essas palavras, agradeço a V.Exas. a atenção e me coloco à disposição da Comissão. (Palmas.)
17:21
RF
O SR. PRESIDENTE (Reginaldo Lopes. Bloco/PT - MG) - Obrigado, Prof. André Mendes Moreira, que foi indicação do nosso querido Deputado Newton Cardoso Jr.
O último orador é o Sr. Paulo Gil, auditor-fiscal da Receita Federal e Diretor do Instituto Justiça Fiscal, por 10 minutos.
O SR. PAULO GIL - Eu agradeço à Comissão o convite. Cumprimento todas e todos presentes.
Começo dizendo que eu estou aqui representando o Instituto Justiça Fiscal, que é uma associação civil sem fins lucrativos, criada com a finalidade de contribuir com o aperfeiçoamento do sistema fiscal, a fim de torná-lo mais justo e assim contribuir com as desigualdades sociais e regionais.
É importante dizer também, para começar o debate, que nós somos financiados apenas com contribuições dos nossos próprios associados. Não recebemos financiamento de corporações empresariais.
Há uma dificuldade em tratar da tributação de bens e serviços isoladamente, mesmo quando fazemos comparações internacionais, mas vamos fazê-las, porque eu acho importante avaliar isso também, não só os mecanismos, que foram muito bem discutidos aqui com as diversas posições, mas qual é a carga de tributos sobre bens e serviços no mundo. Eu acho que isso ninguém abordou ainda, e nós consideramos de extrema importância.
Na OCDE, a média da carga tributária é de aproximadamente 33%. Há que se considerar que essa média já leva em conta o ingresso dos países que entraram, por exemplo, após a dissolução da União Soviética, países do leste europeu que têm baixa tributação sobre a renda e elevada tributação sobre o consumo. Então, essa média da OCDE, — se tomássemos a média dos países fundadores, que seriam os países desenvolvidos — possivelmente, atingiria de 20% a 30%, abaixo dos 32%, podendo chegar a 27% ou 28%.
O Brasil tem uma carga tributária sobre o consumo de quase 50%, segundo os critérios da OCDE, mas os critérios da OCDE não levam em conta, por exemplo, a contribuição previdenciária. No critério da OCDE, a contribuição previdenciária dos empregadores está em "outros", mas é inegável que a contribuição previdenciária do empregador é repassada aos preços e, portanto, repercute sobre o consumo das pessoas, sobre o consumo de bens e serviços.
A nossa carga tributária sobre a renda é de 21%, incluindo pessoas físicas e jurídicas. Sobre pessoas físicas ela é em torno de 3,2% da arrecadação total e do PIB, 3,2%. E a média da OCDE, considerando o que eu disse do ingresso tardio de alguns países que têm baixa tributação da renda, está em torno de 8%. A média da tributação da renda dos países fundadores da OCDE está próxima de 10%.
17:25
RF
É importante trazer isso para o debate, porque não dá para tratar da carga tributária sobre o consumo sem tratar da distribuição da carga.
Eu gosto muito de uma fala atribuída a Lester Fitton, do MIT, que diz o seguinte: "O segredo das reformas tributárias é empurrar o ônus de uns para outros". Noam Chomsky também diz a mesma coisa: "Nos últimos 40 anos, nos Estados Unidos, a carga tributária foi empurrada das costas dos mais ricos para o ombro da classe média e dos mais pobres". Thomas Piketty fala a mesma coisa.
Essa questão precisa entrar no debate. Quem é que paga a conta? Como é distribuída a carga tributária? Ao fim e ao cabo, todo tributo, não importa qual seja, repercute sobre uma pessoa natural, de carne e osso. Nós tratamos de setores econômicos e até de consumidores, mas todo tributo vai repercutir sobre uma pessoa de carne e osso.
Eu creio que todos nós vamos concordar aqui, todos e todas, que o consenso é que nosso sistema é regressivo. Se ele é regressivo — e o principal percentual é a tributação sobre o consumo —, se considerarmos, por exemplo, não o critério da OCDE, mas incluirmos, como eu disse, a contribuição previdenciária e talvez mais alguma coisa, para ser mais preciso, pode-se chegar a 55% ou próximo de 60%. Como é que nós não vamos tratar de reduzir essa tributação?
Para reduzir a tributação sobre o consumo no Brasil, é preciso saber como é que ela atingiu essa participação relativa na carga nacional. É preciso lembrar que o nosso sistema tributário tem boas bases. Na sua origem, ele tem a previsão de que os impostos devem recair preferencialmente sobre as pessoas, que deve haver a capacidade contributiva, seguindo o princípio da igualdade, que significa tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais.
Existe uma previsão de tratamento desigual entre contribuintes que se encontram em situação equivalente. Isso é vedado. É proibida qualquer distinção em razão de ocupação profissional ou função por eles exercida. Acho que todos conhecemos bem isso.
Existe a previsão da seletividade em relação ao IPI e ao ICMS. Eu não estou dizendo que o ICMS não mereça uma reforma nem que não se possa mexer no IPI, mas que o princípio da seletividade, em função da essencialidade dos bens ou serviços, é um princípio importante. Por natureza, a tributação indireta é regressiva, e a seletividade funciona como um freio dessa regressividade.
Como é que nós chegamos a esse estado, a uma tributação regressiva tão elevada? Nós tivemos uma reforma tributária silenciosa nos anos 90. A expressão "reforma tributária silenciosa" é do Secretário da Receita Federal da época. Ele dizia: "Nós fizemos uma reforma do sistema sem ter uma PEC, sem ter alterações constitucionais". Houve a desoneração da tributação, da renda do capital, como nós bem lembramos. O Lula diz que é preciso incluir o rico no Imposto de Renda porque há isenção dos lucros e dividendos desde 1996; é o juro sobre capital próprio. O maior contribuinte do Imposto de renda em 2020 declarou 2,75 bilhões de reais e teve uma alíquota efetiva próxima a 1% ou 2%. Ora, ao desonerar a renda do capital nos anos 90, qual foi a contrapartida? Qual foi o movimento que configurou essa reforma tributária silenciosa? Foi o aumento de alíquotas para a classe média no Imposto de Renda; o congelamento da tabela do Imposto de Renda; o aumento e a ampliação das bases de cálculo de tributos como PIS, COFINS e CPMF. A arrecadação deles cresceu mais ou menos 110% no período. A arrecadação do ICMS e do ISS pouco cresceu nesse período, se olharmos a participação em relação ao PIB e à arrecadação nacional como um todo.
17:29
RF
Então, é preciso atacar o problema onde ele existe. Na nossa visão, na visão do Instituto de Justiça Fiscal, nós deveríamos agora trilhar o caminho inverso, ou seja, primeiro recuperar a tributação progressiva sobre a renda e olhar o que há de errado na tributação sobre o patrimônio — porque as rendas mais elevadas e o grande patrimônio pagam muito pouco imposto —, e, segundo, reduzir relativamente a tributação que repercute sobre o consumo de bens e serviços. É preciso reduzir essa tributação, relativamente.
E nós somos muito céticos em relação a que haja essa redução. Quando se fala em neutralidade, cada um dos debatedores fala em um sentido. Alguns falam de uma neutralidade que não altera a carga específica do tributo. Nós somos muito céticos com relação a isso. Por quê? Porque não há estímulo para a redução da carga dos entes subnacionais com as propostas que estão apresentadas. Qual Prefeito ou Governador vai querer perder arrecadação? Nenhum. De outro lado, há estímulo para aumentar e recompor receitas, porque o Estado social brasileiro foi muito atacado, as políticas públicas foram muito fragilizadas.
Então, nós não temos dúvidas de que há uma tendência de aumento de carga tributária indireta. A conta não fecha. O Vice-Presidente Geraldo Alckmin disse: "Olha, as Prefeituras vão ganhar, vão arrecadar mais". Quem defende as PECs diz: "Ninguém vai perder". Isso não existe! Essa conta não fecha. Haverá uma corrida, sim, para aumentar alíquotas e haverá um aumento de carga tributária indireta, se a reforma passar.
O outro sentido da neutralidade, que é o sentido mais teórico, usado pelos liberais, é o de que, pela neutralidade, não haveria uma alteração da posição dos agentes econômicos, considerado o momento antes e depois da incidência do tributo. Ora, é claro que haverá! Se nós mantivermos um sistema tributário regressivo, haverá essa alteração.
17:33
RF
Então, na verdade, a neutralidade pressupõe não haver distorções. Essas distorções, na teoria, seriam provocadas pela intervenção do Estado. É preciso que se diga isso. É o que diz a neutralidade da teoria liberal. Ela remete à não intervenção do Estado. E como nós teremos uma tributação redistributiva que converse com o desenvolvimento nacional sem a intervenção do Estado? Então, essa neutralidade aponta para o não protagonismo do Estado. Nenhum dos conceitos de neutralidade — nenhum deles — vai se verificar e não pode se verificar.
Já vou para o encerramento.
O Instituto Justiça Fiscal vê com grande preocupação que se deixe para um segundo momento a reforma do Imposto de Renda, e nós vamos dizer por quê. Essa reforma pode aumentar a arrecadação sobre a renda. Pelos nossos cálculos, ela pode aumentar, potencialmente, em 200 bilhões. Depende da tabela progressiva que se vai adotar, evidentemente, mas, se nós tributarmos o topo da pirâmide social e revogarmos as isenções esdrúxulas de dividendos e de juros de capital próprio, mesmo desonerando a parte de baixo da tabela, teremos condições de arrecadar uns 200 bilhões a mais. Isso cria espaço para posterior redução da tributação sobre o consumo. Isso cria espaço para haver uma nova partilha no sistema tributário. Pelas nossas contas, serão mais 80 bilhões para Estados e Municípios.
Então, a reforma indireta, em primeiro lugar, cria um problema político, porque há muita chance de ela interditar o debate mais importante para a justiça tributária e para o próprio desenvolvimento. O desenvolvimento brasileiro não precisa dessa coisa de ambiente de negócios. Não há evidências de que essa reforma vai trazer crescimento. O que que diz Keynes? Keynes diz que quem tem maior propensão marginal ao consumo é que dinamiza a economia, não é isso? Agora, a reforma sobre tributos que incidem sobre o consumo não mexe nisso. Quem vai mexer nisso é a reforma do Imposto de Renda.
A discussão sobre a reforma está em andamento, mas registro a nossa posição neste debate democrático: a resistência à aprovação de uma reforma tributária dos tributos indiretos historicamente é grande e não vem apenas dos entes federados. Ela vem também dos que temem, com razão, a desorganização do financiamento das políticas de proteção social e dos que veem, com razão, uma carga maior sobre o setor de serviços. A resistência vem também, com razão, das maiores Prefeituras, que temem perder arrecadação, sem falar dos potenciais prejudicados, que não têm nem terão voz neste debate.
Eu agradeço a oportunidade de falar aqui em nome do instituto. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Reginaldo Lopes. Bloco/PT - MG) - Muito grato ao Paulo Gil, Auditor Fiscal da Receita Federal e Diretor do Instituto de Justiça Fiscal.
Continuando o debate, vamos passar a palavra, primeiro, ao nosso Relator, o Deputado Aguinaldo Ribeiro.
O SR. AGUINALDO RIBEIRO (PP - PB) - Quero agradecer a todos os expositores que estão participando deste debate de forma presencial ou de forma virtual.
Eu vou focar muito no tema da nossa discussão.
17:37
RF
Eu vou fazer um apanhado geral. Achei extremamente positiva a contribuição dada aqui e não vou entrar em questões que não estão mais em discussão. Respeitamos a posição de quem quer que seja, mas vou focar o debate. Não vou fazer como Sambalate fez quando Neemias estava reconstruindo os muros de Jerusalém. Sambalates são pessoas que dizem que aquilo não vai dar certo, que não pode ser feito, que não se vai conseguir construir. Nós estamos focados, vamos olhar para o nosso foco, e, a despeito de todo esse "mas", "mas", "mas", desse argumento de que não é hora de fazer, de que primeiro se tem que fazer a reforma do Estado para depois tratar de reforma tributária, de que primeiro temos que fazer renda para depois fazer a reforma, nós estamos aqui com uma missão e vamos cumprir essa missão que nos foi delegada pelo povo brasileiro, que nós aqui representamos — estamos aqui para representar esse povo —, e pelo Presidente da Casa, que me designou como Relator no Plenário e como Relator neste Colegiado.
Junto com V.Exas., estamos participando da construção de um texto que enfrenta as mazelas daquilo que já é consenso aqui. Não ouvi ninguém aqui defender o sistema tributário atual. Mesmo assim, às vezes, ficam dizendo que não é hora de tratar disso. Não me venham com essa conversa, porque nós já passamos dessa fase. Agora, estamos focados. Eu estou focado no tema.
Então, eu vou me reportar a quem tratou do tema. Eu acho que foi muito proveitoso o debate, a contribuição dada foi muito grande tanto na tarde de hoje quanto ontem. Quero parabenizar a todos pelo debate que nós estamos fazendo, que tem qualidade, que contribui, que é focado.
Presidente, apelo a todos os Parlamentares e a quem estiver vindo para os debates para que contribuam com o tema. Podem até firmar posição, mas tragam também contribuições. Acho importante a crítica específica, mas não o questionamento sobre fazer ou não fazer o debate, porque nós já o estamos fazendo. Não vamos nos desviar do nosso foco.
Quero felicitar os nove participantes desta Mesa e fazer alguns comentários que considero muito importantes para o nosso debate.
A primeira questão que eu considero relevante foi trazido pela Profa. Rita de La Feria e depois foi comentada por vários expositores. Vários de nós estamos fazendo a mesma pergunta: o que é melhor, IVA único ou IVA dual? Acho que essa discussão é técnica, embora tenha a ver com a política. Nós vimos que uma federação como a China tem um IVA único. Eu quero aproveitar e jogar essa avaliação para a professora e para todos que queiram contribuir com esse debate. Qual é o melhor caminho?
17:41
RF
A Dra. Melina Rocha trouxe uma parte desse caminho, ao comparar algumas nações com o Brasil. Alguns adotaram o modelo do IVA dual não por causa da melhor técnica do imposto, mas pela condição política, pela condição da federação de implantar esse imposto. Por isso, optaram pelo IVA dual. Eu deixo essa pergunta para que possamos estreitar essas decisões que haveremos de tomar mais à frente.
Outra coisa muito relevante que foi tratada aqui pelo Dr. Francisco Javier Sánchez foi a exemplificação de devolução versus autoridade tributária — AT, como estava na apresentação. A Dra. Melina Rocha também faz menção à autoridade tributária, e esse tema também foi tratado ontem pela Dra. Mary Queiroz, que mencionou que aquilo não estava no meu texto. Foi uma opção minha retirar esse termo. Talvez esse seja o grande debate.
Às vezes, transfere-se o debate real. Esse é um ponto que emperrou durante anos a reforma tributária, porque há uma disputa de poder dentro da Federação. Nós temos que atacar o ponto onde ele está. Nenhuma autoridade tributária municipal, estadual ou federal quer perder poder. Esse é o ponto. Por isso, o termo "autoridade tributária" virou palavrão quando se iniciou esse debate. As pessoas me pediam para não falar mais nesse negócio de autoridade tributária. O texto inicial estava propondo ATN. Querem transferir a responsabilidade para o poder econômico e para o poder... Mas o que emperra o processo é a grande briga das corporações pelo poder dentro das três esferas da Federação.
Essa é uma reflexão que nós temos que fazer com a maior tranquilidade. Esse comportamento é legítimo. Cada um defende seu interesse. Nesta Casa discutem-se interesses. Cada um está aqui para defender seu interesse. Nós vamos defender o interesse do cidadão, que é aquele que vai pagar essa conta. No final de tudo que ouvimos e de tudo que colhemos durante todo esse debate, quem paga a conta é o cidadão. Não é o contribuinte; é o cidadão brasileiro que está lá na ponta que vai tirar a carteira — até mesmo aquele que nem carteira tem. Ele vai receber o benefício e vai pagar o imposto também. Nós temos que ter clareza daquilo que estamos enfrentando.
Melina, este debate é muito importante para que nós possamos decidir tecnicamente, sem entrar nesse jogo de disputa por poder e sem desviar nosso foco. Temos que ter foco.
17:45
RF
Eu trago uma questão para o debate. A Profa. Melina, ao tratar da administração tributária, sugeriu um conselho federativo, que, na verdade, seria uma entidade única, independente e autônoma, com integrantes dos Estados, dos Municípios e da União, com gestão compartilhada. Esse é o ponto para reflexão.
É engraçado como a visão... É uma questão cultural, Profa. Melina. Nós brasileiros somos patrimonialistas. Às vezes as pessoas se apropriam de algo como se fosse seu patrimônio.
Eu queria colocar o tema, para que o enfrentemos com muita clareza. O que a professora trouxe foi um debate que nós tivemos lá atrás, mas que foi interditado por conta dessa disputa de poder. A ideia não é contestar a autonomia de Municípios e Estados. Pelo contrário, nós estamos mantendo a autonomia dos entes federados em todas as discussões que tivemos até hoje — nunca se ousou ferir a autonomia contratada na nossa Constituição Federal. O que se está propondo é, como o Prof. Javier apresentou... Eu não entendi muito bem. Queria uma explicaçãozinha. No início, eu pensei que o professor estivesse falando do crédito financeiro, algo semelhante ao que nós estamos discutindo, mas depois, quando eu vi, do primeiro para o segundo mês, um prazo para requisição da devolução até o terceiro mês, eu imaginei que talvez se tratasse de uma entidade para onde toda a arrecadação iria, para depois ser distribuída. Não sei se é isso. Estou falando aqui para depois nós...
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. AGUINALDO RIBEIRO (PP - PB) - Mesmo assim, eu entendi que, passados o primeiro e o segundo meses, no terceiro se requereria a devolução e, no quarto mês, efetivamente, aconteceria a devolução. É isso?
O SR. FRANCISCO JAVIER SÁNCHEZ GALLARDO - Obrigado, Deputado.
No primeiro mês, o empresário tem a despesa, e é gerado o crédito tributário. Aí, há duas opções, a depender do Estado. Alguns Estados entendem que o empresário tem direito à devolução e fazem a compensação no mês seguinte. Outros entendem que o empresário tem um crédito, porque o IVA das vendas é menor do que o IVA das compras, como estava na minha transparência. Por exemplo, a Espanha tem um sistema de devolução rápida. No final do mês, o contribuinte entra com uma solicitação de devolução e, em algumas semanas, recebe o dinheiro. Eu coloquei os dois esquemas. Na pior das hipóteses, o que se garante é que em 4 meses desde que teve a despesa e pagou o IVA para o fornecedor o empresário recebe em uma conta o dinheiro que pagou.
O SR. AGUINALDO RIBEIRO (PP - PB) - Muito obrigado.
17:49
RF
Nós também tratamos da questão das alíquotas. A Profa. Melina tratou do IVA. Estamos buscando referência para o IVA brasileiro. Eu queria estimular os nossos companheiros de GT a ousarem. Nessa construção, quem sabe não deixamos de ser aquele que busca referência para virar a referência, inovando naquilo que nós podemos fazer. É assim que nós somos — o Brasil tem muita posição de ponta. Como Relator, eu estou totalmente aberto para que venhamos a construir isso juntos. Se as melhores referências de IVA agora são Nova Zelândia, Canadá e outros, vamos tentar ser uma referência para o mundo. Acho que isso é possível.
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. AGUINALDO RIBEIRO (PP - PB) - É como o Pix.
Nosso sistema financeiro hoje tem uma proteção muito grande. Os acontecimentos dos últimos dias nos Estados Unidos que o digam.
Essa é uma questão que considero central. Eu queria provocar o debate, Melina. Muitas pessoas perguntam como se dará. O Ricardo Varsano tratou de um sistema de compensação, uma câmera de compensação, com a gestão compartilhada de todos os entes. Para mim, essa é que é a diferença daquilo de que nós estamos tratando.
Talvez por isso eu tenha colocado primeiro o IVA dual. Não é que o IVA dual seja melhor do que o IVA único ou o IVA único seja pior do que o IVA dual. É um pouco daquela ideia: "Eu quero e vou administrar o meu tributo". E a grande discussão não tem a ver com quem vai administrar o tributo. O que nós estamos discutindo é como proceder à modelagem de arrecadação e distribuição do tributo. Alguns países, por decisão política, vamos dizer assim... Não deixa de ser decisão política, até porque nós temos um modelo de concentração na União — mais de 50% da arrecadação hoje fica com a União.
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. AGUINALDO RIBEIRO (PP - PB) - Pronto! São 67%; mais do que 50%. (Risos.)
É uma concentração muito grande, e essa concentração já está dada, delegada. O grande debate a ser feito pelo Parlamento é a desconcentração da arrecadação na União. Nós temos que enfrentar isso. Nós somos uma federação. É complexo; talvez demore mais 50 anos. Há 50 anos nós estamos tratando da reforma tributária. Vamos ficar nela por enquanto.
17:53
RF
Eu estou fazendo essa provocação porque acho que nós precisamos pensar nisso. Nós estamos discutindo o sistema para alcançar a eficiência, e essas são as práticas que se estão adotando. Então, nós temos que fazer o bom debate entre nós. Como disse o Prof. Isaias Coelho, nós temos, na verdade, muita desinformação. O papel daqueles que não querem reformar é promover a desinformação. Quanto mais desinformação, melhor para quem não quer que o sistema tributário seja reformado no Brasil. E há todo tipo de desinformação. Aliás, nós estamos na era das fake news. Então, é muito comum que isso aconteça.
Para não me alongar mais, eu queria focar o debate, pelo menos de parte da relatoria, em como construir o IVA — se ele será único ou dual — e na câmara de compensação ou no conselho federativo. Como nós discutimos isso? Acho que veio a calhar — quero até fazer um elogio —, porque os temas estão numa sequência. Na próxima semana, nós vamos tratar de administração tributária. Este debate também já ajuda.
Vamos tratar também de pacto federativo, Deputado Mauro. Ele já ajuda a embasar a discussão da próxima semana.
Há aquela história da compensação, há nossa preocupação com o crédito financeiro, com a forma de se compensar, com a forma de se operacionalizar isso. Acho que tudo isso tem a ver com aquilo que foi colocado aqui como modelo internacional, como prática internacional que nós podemos tomar como referência para adotar ou não ou para melhorar ainda e customizar, ou, como diz sempre quem importa para cá, tropicalizá-la no Brasil.
Basicamente, meu Presidente, Deputado Reginaldo Lopes, eu queria focar o debate nisso. O IVA eu acho que já é uma discussão que tem apenas uma consideração aqui: 195 países integram a ONU. Desses 195 países, 174 adotam o IVA.
Quero ressaltar também uma coisa importante que aqui foi destacada por muitos. Nós não podemos, jamais, relevar o debate que foi feito ao longo dos anos por todos os que o fizeram. Todos deram uma contribuição importante. Estamos discutindo há mais de 40 anos. Aquele tempo tornou-se importante para que nós chegássemos a este momento de discussão de reforma tributária. O mesmo aconteceu, por exemplo, com a reforma da Previdência, que muitas vezes não se aprovou. Ela foi maturando a partir da exaustão da discussão, do aprofundamento do debate. Eu acho que estamos chegando a este momento.
17:57
RF
Então, Presidente, queria felicitar a todos os que participaram com suas opiniões. As opiniões divergentes enriquecem o debate, e é bom que as tenhamos. Mas, da parte da nossa relatoria, eu queria ver, Profa. Melina, como adaptamos, inovamos ou até melhoramos os modelos internacionais. Temos o nosso IVA não só por conta da circunstância. A circunstância se dará na construção de texto com o Plenário. Aqui nós vamos ter sempre a limitação do voto. O voto é que vai determinar o que vai ser possível. Talvez nós até tenhamos... Talvez, não; podemos ter. Mas eu acho que nós temos que ousar, para, quem sabe, algo além do que estamos pensando e para sairmos destas amarras históricas que temos ou daqueles que desejam sempre impedir o debate usando os mesmos argumentos ultrapassados e conhecidos por todos nós.
Muito obrigado, Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Reginaldo Lopes. Bloco/PT - MG) - Obrigado, Relator.
Passo a palavra ao primeiro Deputado inscrito, o Deputado Vitor Lippi.
O SR. VITOR LIPPI (Bloco/PSDB - SP) - Eu quero cumprimentar todos os palestrantes.
Cumprimento também nosso querido Relator Aguinaldo Ribeiro e o Presidente Reginaldo Lopes e, nas pessoas de V.Exas., cumprimento todos os Deputados e todos os presentes.
Novamente, o debate foi bastante proveitoso. Este é um papel de aprendizado.
Eu até costumo dizer, Melina, que, se fosse fácil, já teria sido feito. Então, nós sabemos que existe um esforço conjunto coletivo para que possamos tomar a decisão.
Mas o mais importante disto tudo são duas questões. A primeira é que há, realmente, o consenso de que nós temos praticamente o pior sistema tributário do mundo e que ele tem trazido muitas dificuldades ao Brasil, que tem muitas vantagens comparativas, mas acabou sendo um dos países que menos cresce no mundo, o que é injustificável.
Nós temos problemas de toda ordem por conta das nossas opções pelo sistema tributário atual. Ele já recebeu muitos apelidos, como manicômio, tragédia, e assim por diante. Nós sabemos que os dados do nosso sistema tributário atual são impressionantemente negativos. Além de ser praticamente o pior do mundo, ele é de cinco a dez vezes mais caro dentro da empresa para ela tentar conseguir pagar o imposto. Ele cria no Brasil um custo burocrático superior a 400 bilhões de reais — metade disso as empresas tentam pagar, metade os Governos tentam arrecadar. Não obstante isso, é o que tem o maior contencioso fiscal, que hoje é de quase 60% do PIB ou 5,4 trilhões de reais.
O Brasil não consegue crescer. Nós estamos desindustrializando o Brasil, apesar de termos um mercado muito forte, com a quinta maior população do mundo. Não conseguimos ser competitivos. Acabamos exportando imposto. Isso não acontece no resto do mundo, mas acontece aqui.
18:01
RF
Também há a distorção de termos um tributo muito elevado sobre o consumo. Além de penalizar as famílias mais pobres, que acabam pagando os impostos com mais de 50% do seu salário, ele ainda faz com que os produtos sejam mais caros. E, quando os produtos são mais caros, logicamente, o consumo das famílias diminui. Além disso, quando os nossos produtos são mais caros, eles perdem competitividade e cheguem produtos mais baratos de fora, o que acaba destruindo as nossas indústrias — nos últimos 10 anos, nós perdemos 10% das indústrias e milhões de empregos.
Então, todos nós estamos muito convencidos de que esse é o maior problema das empresas atualmente. Quando as empresas de fora chegam aqui, elas ficam muito assustadas, não conseguem entender nada. É uma confusão muito grande. Nós temos informações de empresas japonesas — que estão entre as mais bem administradas, com melhor capacidade de gestão, com produtos de muita qualidade — que vêm para cá e ficam no vermelho. E elas só não vão embora porque não querem perder o mercado brasileiro, que é a quinta maior população do mundo.
Portanto, está claro que nós precisamos ter um ambiente melhor para as empresas poderem crescer, ser mais competitivas e para aumentarmos a nossa exportação, sermos mais justos com quem consome e simplificarmos essa confusão tributária que nós temos.
Eu acho que há um sentimento muito forte de que chegou a hora de nós decidirmos isso. Nós temos dito: "Não adianta dizer que o Brasil é ruim". Não, essa é uma responsabilidade do Parlamento brasileiro e, obviamente, do Governo brasileiro. Mas estamos juntos, estamos alinhados. Inclusive em relação às duas PECs, nós já temos falado aqui, Melina, que agora é PEC 155. Vamos parar de vaidade, vamos ver o que é bom, no que uma complementa a outra, e juntar a PEC 110 com a PEC 45. O Governo criou uma secretaria especial extraordinária para aprovar essa PEC. O Presidente da Câmara quer aprovar a PEC, o Presidente do Senado quer aprovar a PEC. As pesquisas internas com os Deputados mostram que a grande maioria dos Deputados quer aprovar essa PEC. Então, agora nós vamos aprová-la, felizmente para o Brasil.
Existem dúvidas, que são naturais, porque não temos entre os Parlamentares muitos especialistas. Há apenas alguns especialistas e, inclusive, entre eles, está aqui um especialista em sistema tributário. Mas eu gostaria que a Melina tirasse algumas dessas dúvidas, até por ela ser, há alguns anos, uma estudiosa dos IVAs no Canadá, na Europa, no mundo.
Como aconteceria, na prática, quando um produto saísse, por exemplo, de Minas Gerais e fosse vendido no Paraná? Como aconteceria, na prática, essa movimentação desse creditar? Esse recurso final iria para onde? Iria para esse comitê central ou já ficaria lá no Estado? Como você acredita que seria isso, pela sua experiência do que acontece lá fora?
Eu também queria saber se isso, depois de criado esse comitê e de se terem definido as alíquotas e uma lei nacional, poderia, depois, ser mudado por influência política ou não. Eu me lembro de um Senador muito importante do Estado de São Paulo que contribuiu muito para este País e era contra uma reforma tributária. Ele dizia: "Hoje, com o ICMS, os Estados têm autonomia. Se isso for para algum lugar, pode haver uma influência política, e nós não sabemos o que pode acontecer com os Estados".
Essas são perguntas que certamente nós também recebemos. Então, é bom conversar com os especialistas para que possamos entender a argumentação de quem defende o IVA.
Agradeço, mais uma vez, a oportunidade.
Obrigado.
18:05
RF
O SR. PRESIDENTE (Reginaldo Lopes. Bloco/PT - MG) - Obrigado, Deputado Vitor Lippi.
Tem a palavra o próximo orador, o Deputado Jonas Donizette.
O SR. JONAS DONIZETTE (PSB - SP) - Boa tarde, Presidente.
Boa tarde aos convidados, aos Deputados, à imprensa.
Quero dizer ao Relator que me senti muito contemplado com a fala dele. Eu já havia feito a inscrição, mas muito do que eu penso foi dito por ele, principalmente a respeito dessa questão do acúmulo de outros trabalhos que foram feitos. Eles não tinham as ferramentas que temos hoje. Há 40 anos, não existia Internet, não existiam as soluções digitais que temos hoje. Cada um trabalha com a realidade da sua época.
Mas quero fazer um resumo breve das duas audiências, dos dois dias, ontem e hoje.
Na audiência de ontem, vimos que do jeito que está não dá para continuar. Esse é o resumo do dia de ontem. Temos um péssimo sistema de arrecadação tributária, penalizando principalmente os mais pobres. Na audiência de hoje, vimos uma unanimidade no sentido de que o IVA é a melhor solução — adequando-o, é claro, às correções que foram feitas. Nós também podemos elaborar o melhor IVA aqui e, mais para frente, pode ser que precise de correção, porque a vida é dinâmica, a economia é dinâmica. Mas nós temos que aproveitar o tempo que temos hoje para fazer esse trabalho.
Novamente, há a questão da renda, que surgiu ontem também, e essa desconfiança de que não vai haver uma segunda etapa, que vai ser mexer na renda. Eu acho que não há motivo para se ter essa desconfiança. O nosso convidado que citou isso disse que saiu da boca do então candidato e hoje Presidente, o Lula, essa questão de cobrar mais Imposto de Renda de quem tem uma faixa de renda maior e diminuir a tributação para as camadas de rendas menores. Inclusive ele chegou a usar uma frase sobre quem ganha 6 mil reais de salário e paga um certo tanto de aluguel. Isso até virou meme, porque ele errou a conta de somar do aluguel com o que sobrava. Mas ele fez uma demonstração de que esse realmente é o espírito do Governo que ele quer implementar. Então, acho que, neste primeiro momento, a discussão dessa reforma mostra que o IVA é o caminho, da melhor maneira que nós o pudermos implantar.
As perguntas do Deputado Vitor Lippi foram muito pertinentes. Vamos apresentar esse trabalho. O Relator concluiu muito bem, dizendo que nós vamos fazer o nosso melhor e vamos para o voto em plenário, porque é ali que vamos decidir qual é o Brasil que queremos: um Brasil mais justo, que penaliza menos as pessoas de baixa renda, que redistribui a riqueza e que dá oportunidade de o País crescer, gerar emprego, gerar renda para a nossa população.
Obrigado, Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Reginaldo Lopes. Bloco/PT - MG) - Obrigado, Deputado Jonas Donizette.
Tem a palavra o Deputado Mauro Benevides Filho.
O SR. MAURO BENEVIDES FILHO (PDT - CE) - Nobre Coordenador e Presidente, Deputado Reginaldo Lopes, hoje, por onde andamos, vemos o reconhecimento da maneira hábil com que V.Exa. tem conduzido essa questão.
O Deputado Aguinaldo Ribeiro, de tanto falar de PEC, de falar de junção, de tanto falar de compartilhamento de novas ideias, já virou doutor nessa matéria. E isso é importante para todos nós que fazemos aqui o grupo dos 12. Aqui estão nos chamando de " Os 12 apóstolos", Dr. Javier. O pessoal está cognominando o nosso trabalho. (Risos.)
18:09
RF
Enfim, primeiro, quero agradecer a todos que afluíram para cá hoje à tarde e à noite. Tivemos aqui muitos especialistas. Obviamente, eu quero cumprimentar a todos, mas quero abraçar a Dra. Melina.
Nós temos um grupo, Deputado Reginaldo, Deputado Aguinaldo Ribeiro, do qual participam 236 economistas e advogados do mundo inteiro. Lá os debates são acalorados, mais intensos. Eu tenho aprendido muito naquele grupo. Aliás, esse grupo existe há muitos anos. Dele participam o Prof. Isaias, que está aqui também, e também o Fasano. São pessoas que têm contribuído com o Brasil. E eu espero que este momento seja realmente o de encontrar esse caminho.
Vamos lá!
Gestão compartilhada.
Primeira pergunta: o CARF dos Estados e o CARF dos Municípios. Vai ser um CARF só no Brasil inteiro? Compartilhamento é um nome bonito; acho legal esse negócio de compartilhar; mas vamos para a prática, vamos perguntar o que será compartilhado. Nós vamos acabar com todos os contenciosos administrativos gerenciais de todo o País? Vamos fazer um só?
Precisamos entender também que hoje a Justiça Estadual tem o seu papel de dirimir questões relativas a tributos municipais e estaduais, e a Justiça Federal tem o papel de dirimir o CARF como tributo federal.
Prof. Valadão, se é compartilhado, como funciona? Vai ficar tudo num canto só ou vamos preservar essas decisões? E como nós vamos harmonizar isso? Nós vamos ter uma autoridade que pode até harmonizar no sentido da fiscalização, já que os auditores estão preocupados. Como o auditor da Receita vai fiscalizar? Ele deve ter um entendimento, o auditor do Estado vai ter outro entendimento, o do Município vai ter outro entendimento. Então, realmente, essa autoridade tem que ter muita força, tem que ter princípio. A União terá que se submeter a ela, bem como Estados e Municípios, para padronizar um entendimento, mesmo que os auditores interpretem a norma tributária de maneira diferenciada. Nós temos que pensar muito sobre a força que essa autoridade deverá ter para que depois não se gerem incongruências de interpretações — com certeza isso vai chegar.
Quanto ao IVA, hoje, na Europa, eu recebi um comunicado da Ernest & Young dizendo que estão tão sofisticadas as regras do IVA que eles estão contratando, agora, especialistas para compreenderem como se registra no IVA a representação disso na estrutura, como se determinam as obrigações que o IVA exige das empresas, como se preenche o pedido de obtenção desses retornos, como se prepara para uma auditoria em relação ao IVA. É uma parafernália de exigências tributárias. Eu já estou me lembrando do ICMS de hoje, já que há tanta dificuldade de se fazer tudo isso.
Eu estou só levantando esses pontos para nós refletirmos, porque quanto mais simplificado, melhor para as nossas empresas, que se tornam mais competitivas, o que é importante, já que concorrem com o mercado internacional.
O IVA não é esse sonho tão grande como pintamos aqui. Na verdade, eu procurei pesquisar sobre o assunto e aprendi muito com os colegas e com os expositores e fiquei preocupado.
18:13
RF
Segundo, ficou claro que 99 países do mundo não têm alíquota única, mas duas alíquotas, três alíquotas, quatro alíquotas. Nós não podemos é transformar isso num mundo de... Nós temos até — vejo que o Relator está realmente preparado para a matéria — isenção de produtos dentro do IVA. Não é isso, Profa. Melina? Depois a senhora vai me corrigir no que eu estiver errado. Temos até isenção, meu caro companheiro amigo Deputado Ivan Valente.
Portanto, não é essa coisa toda assim tão diferente como imaginamos e tudo o mais. Isso não deve ser igual ao Brasil, em que há hoje as isenções tributárias, as desonerações tributárias, os regimes especiais, os termos de acordo que são feitos com o Fisco, que hoje representam 4% do PIB. Nós estamos falando de 400 bilhões de reais para um PIB de 10 trilhões de reais. Temos que ter muita cautela, para isso não...
A mesma coisa que temos hoje no ICMS passará a haver, meu caro companheiro e amigo Reginaldo, no IVA, que não é muito interessante.
Então, alíquota única, temos que padronizar esse entendimento em âmbito nacional, com as experiências internacionais que foram trazidas para nós. Temos que ver como é que vamos tratar isso, até para não espalhar muito. Mas, com certeza, vamos ter que avaliar saúde, educação e transporte coletivo. Nós vamos ter que dar uma pensada nessa questão.
Terceiro ponto — com esse eu me preocupo, e muito. Pelo que eu li sobre o IVA, não existe país nenhum do mundo onde, para se creditar da etapa anterior, o IVA tenha que estar pago, o crédito financeiro, como nós estamos propondo aqui. Não existe essa experiência, meu caro Deputado Lippi, no mundo inteiro. Pode ser que tenha em um país ou outro que eu não conheça, mas a regra, mesmo na União Europeia, não é essa, não há essa exigência. Como é que eu vou adivinhar se o cara, no passado, na minha etapa anterior, pagou ou não o IVA?
Enfim, a essa questão do creditamento e do recebimento posterior nós precisamos também estar atentos, porque essa exigência não é prática internacional do IVA colocada por aí afora.
Quinto ponto, o Fundo de Desenvolvimento Regional. Nós vamos acabar com todas as isenções e manifestações de redução de carga que existem no Brasil. Acabei de dizer que isso representa 400 bilhões de reais. Como é que nós vamos fazer isso? Os Estados, os Municípios, a própria União, como é que nós vamos tratar disso? Isso desaparece 100%? Ou os Estados, por exemplo, com a SEFAZ, pedem que haja um Fundo de Desenvolvimento Regional — FDR e que, através de um excesso de arrecadação do IVA, isso possa ter um adicional que venha irrigar, vamos dizer assim, esse novo fundo?
Aí eu não entendo. Se é para preservar a arrecadação, eu vou preservar. Se é para ter dinheiro para o fundo, então eu vou ter que calibrar mais ainda a alíquota do IVA para dar dinheiro para o fundo? Eu também, tecnicamente, não consigo compreender como é que eles vão fazer isso.
Dentro dessa questão setorial, que nós vamos discutir aqui especificamente, vem a questão do agro, que sempre vem à tona. Quanto à questão da desoneração da exportação, está claro, isso hoje já não existe. Mas a grande preocupação do agro é que ele tem crédito presumido para definir o seu valor pago na etapa subsequente. Ele abate o valor desse crédito presumido. Ele se exaurindo, nós vamos ter que encontrar uma maneira de o agro ser contemplado, para não gerar nenhuma preocupação, já que ele alega que em compra de muitos CPFs, como diz o Coordenador Reginaldo, não se emite nota fiscal. São 180 mil que não emitem nota fiscal. Em não emitindo nota fiscal, não se tem ideia de quanto se vai poder creditar. E o agro teme perder a competitividade em relação a essa questão.
O SR. VITOR LIPPI (Bloco/PSDB - SP) - E a questão do cashback?
O SR. MAURO BENEVIDES FILHO (PDT - CE) - Como é que é, cashback? Chega me dá um tremelique aqui! (Risos.)
18:17
RF
Mas, enfim, quanto ao cashback, ou nós descobrimos — vamos conversar lá com o amigo do Hauly, do Paraná, que tem um nome mágico, inclusive eu já conversei com ele, o Miguel Abuhab — uma maneira na hora de fazer o pagamento: 100 reais, 75 reais é o preço, 25 reais... Se for a alíquota que vai ser estabelecida, Ave Maria! Eu não vou falar mais 27%, não, porque o Appy já me deu aqui um... Enfim, 25%, então, na hora da compra, o módulo fiscal vai ter que se comunicar com o CADÚNICO e alimenta o CPF. Está no CADÚNICO? Está. Então, ele não paga na hora. Aí, com certeza, nós teremos um sistema funcionando, para que o aumento da cesta básica, que vai sair de zero de PIS/COFINS, de 4% ou 5% de ICMS, porque a alíquota de ICMS é reduzida de 18% para 7%, de 18% para 4%, enfim, depende do Estado... Mas, de uma hora para outra, essa redução de carga não pode virar 25%.
"Ah, não, eu vou devolver depois." É o que eu sempre digo, temos que ter muita cautela, porque, senão, o pobre no Brasil vai ter que ter capital de giro, pagar primeiro para receber depois. Isso não faz muito sentido. "Ah, mas há o exemplo do Rio Grande do Sul". O Rio Grande do Sul estimou, pela POF, o nível de renda até 2 ou 3 salários mínimos e estipulou 100 reais por mês. Não tem a menor condição, esse modelo não funciona!
Eu tive a oportunidade de ir ao Rio Grande do Sul conversar com todo mundo e percebi que realmente esse não é o modelo. Nós temos tecnologia, Presidente, para fazer isso.
Por último, bancos. Aí eu vou fazer uma ponderação aos nossos expositores: nunca se aborda uma experiência internacional do sistema financeiro. "Ah, o sistema financeiro, Ave Maria! Pelo amor de Deus!" Ninguém pode tratar desse assunto, tem que ser um tratamento especial. Tudo bem. Eu só quero entender como é o tratamento especial no mundo nas práticas internacionais e como é essa tributação aqui no Brasil. Nada mais.
O SR. PRESIDENTE (Reginaldo Lopes. Bloco/PT - MG) - Lucros e dividendos.
O SR. MAURO BENEVIDES FILHO (PDT - CE) - Na renda. Mas eu já vou deixar isso para depois.
O SR. PRESIDENTE (Reginaldo Lopes. Bloco/PT - MG) - O.k.
O SR. MAURO BENEVIDES FILHO (PDT - CE) - Então eu quero enfatizar, Presidente, concluindo, que, sobre essa questão do sistema bancário, nós temos que pedir aos nossos expositores que tragam para nós um pouco dessas experiências, para que possamos fazer isso com muita isenção, sem nenhum processo raivoso ou o que quer que seja. Mas eu acho que essa matéria é relevante para nós discutirmos.
Desculpe-me, porque eu me estendi.
O SR. PRESIDENTE (Reginaldo Lopes. Bloco/PT - MG) - Obrigado, Deputado Mauro Benevides.
Ao sistema tributário, a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido não vai ser incorporada. Então, continua-se com os 21% que são cobrados hoje. E, imaginem, quem possui pessoa jurídica, também 15%. Então, eles pagam 36%.
O SR. MAURO BENEVIDES FILHO (PDT - CE) - Eles não pagam, viu, Presidente? Lá eles têm o seguinte: o que está provisionado para a CAT liquidação? Abate. O que está juro sobre capital? Abate. A alíquota efetiva do banco pela receita é 18%.
O SR. PRESIDENTE (Reginaldo Lopes. Bloco/PT - MG) - E o gritante, na verdade, é não pagar sobre o lucro e dividendos, porque nós não podemos também tributar o empréstimo.
O SR. MAURO BENEVIDES FILHO (PDT - CE) - Isso é mais gritante ainda.
O SR. PRESIDENTE (Reginaldo Lopes. Bloco/PT - MG) - O cara já está quebrado, está buscando empréstimo, e nós vamos fazer então uma tributação do empréstimo? No mundo, não sei se essa é uma boa prática. Mas nós vamos abrir um debate sobre esse sistema no setorial para discutir.
Eu quero registrar aqui que a Dra. Rita mandou-nos um texto, que diz: "Infelizmente, tenho que deixar a audiência devido à diferença de horário e também a obrigações familiares. Fico à disposição do GT para qualquer esclarecimento posterior. Obrigada, mais uma vez, ao Relator e ao GT pelo convite. Dra. Rita de La Feria".
Muito obrigado.
18:21
RF
Nós queremos agradecer à senhora, da Universidade de Leeds, da Inglaterra.
Eu quero passar a Presidência para o Deputado Mauro Benevides Filho, para que possa convidar o Deputado Newton Cardoso Jr. a usar a palavra.
Eu preciso só anunciar a criação da Frente Parlamentar Mista em Defesa dos Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia, e depois eu volto para cá.
O SR. IVAN VALENTE (Bloco/PSOL - SP) - O Relator não está aí?
O SR. PRESIDENTE (Reginaldo Lopes. Bloco/PT - MG) - O Relator está presente.
Com a palavra o Deputado Newton Cardoso Jr.
O SR. NEWTON CARDOSO JR (Bloco/MDB - MG) - Deputado Reginaldo, V.Exa. vai fazer falta! Eu ia falar de V.Exa. agora, mas eu falo na volta!
O SR. PRESIDENTE (Mauro Benevides Filho. PDT - CE) - Neste momento, eu passo a palavra ao extraordinário Deputado Newton Cardoso Jr, que, com certeza, contribui de maneira muito efetiva para este grupo de trabalho!
O SR. NEWTON CARDOSO JR (Bloco/MDB - MG) - Muito obrigado, Presidente, pelas palavras, pela gentileza. É um exagero de V.Exa. diante de nossa amizade!
Eu quero cumprimentar mais uma vez o nosso Presidente Reginaldo Lopes, que acaba de sair, e o nosso ilustríssimo Relator, o Deputado Aguinaldo Ribeiro, que vem fazendo um trabalho fundamental e que é, de fato, um grande agregador do conhecimento que está sendo trazido por brilhantes expositores.
Eu peço desculpas por não ter participado de todas as palestras de hoje. Mas, pelas falas que pude acompanhar — e sendo de Minas Gerais, eu não poderia falhar! —, pelas falas de V.Exas., eu vi que as apresentações foram muito qualificadas e fundamentais para a nossa discussão.
Eu acho que o Deputado Vitor Lippi fez uma comparação muito própria, e V.Exa., com intenção, mais ainda. Nós devemos fazer no Brasil o que vou chamar de Pix do IVAs! É a inovação que estamos perseguindo, para mostrar para o mundo que temos condições de fazer essa grande inovação. Essa deve ser a nossa mentalidade, e o grupo está unido, Deputado Mauro, para que isso possa se transformar em realidade.
Dentro do princípio daquilo que nós temos discutido em cada reunião administrativa ou mesmo dentro das palestras, devemos perseguir a simplicidade na escrita e a simplicidade nos conceitos. Muitas vezes, aquilo que é óbvio na vida não é simples. Aliás, o simples é óbvio, mas é difícil chegar a ele. É difícil chegar à obviedade, e a obviedade aqui é muito clara: é a simplicidade da escrita.
Se nós quisermos atingir a não cumulatividade plena e a neutralidade tributária plena, conforme relatou de forma muito objetiva e muito clara o Dr. André Mendes Moreira, a quem quero parabenizar e agradecer a menção à minha pessoa também... Ele foi meu colega de escola no Marista, nos anos 90. Ele já era brilhante desde então, e trouxe para o restante da carreira dele isso.
Mas, de fato, a simplificação do texto cabe a nós como missão para que o comando constitucional seja, de fato, o caminho para, nas leis complementares, nas leis ordinárias e em toda a legislação afim, conseguirmos que essa neutralidade, essa não cumulatividade e o acesso de todos a um novo regime tributário do consumo seja viável. Esse é o pensamento que eu trago.
18:25
RF
Também trago uma situação que é um alerta para minha análise. V.Exa., Deputado Mauro, mencionou muito bem o agro. Não há como afetar o agro nessa reforma. Não há como tratar o agro como um player, um stakeholder nessa reforma, de forma que não tenha da nossa parte a admissão. Já temos assimilado que ele não pode ser trade-off. Ele não pode ser compensação para nenhum outro aspecto do texto, para nenhum outro tipo de concessão eventualmente construído, nem se podem pesar outros setores para viabilizar o agro. Temos que partir da premissa de que o agro é necessário para a condução econômica do Brasil. É preciso que ele tenha um tratamento tal como está hoje ou melhor, se for possível encontrar um regime melhor para tratar o agro. Creio que temos recebido isso de forma muito positiva por parte dos membros do grupo, mais ainda pela visão das apresentações muito qualificadas que têm chegado mostrando a importância disso.
De outra parte, Sr. Presidente, quero também destacar que temos visto setores importantes que representam grandes arrecadações da tributação sobre o consumo — cito dois aqui, algum setor de bebidas ou de óleo e gás, que têm uma participação muito relevante na cadeia produtiva nacional, mas têm arrecadações muito relevantes sobre o consumo —, apresentando sugestões como a monofasicidade de fato da tributação desses produtos ligados e também a cobrança dos tributos pela modalidade ad rem, ou seja, em cima de valores fixos, em cima de bases pré-calculadas. São sugestões interessantes, mas é importante que na nossa discussão — que inclusive está muito bem encaminhada para um workshop que faremos na próxima semana, na próxima terça-feira, para discutir os cenários, os caminhos e os impactos que acontecerão — tenhamos todas essas oportunidades em mente.
E, novamente, eu jogo de volta para o colo do nosso Relator essa situação, porque caberá a ele, ao Deputado Aguinaldo, com a paciência que já lhe é peculiar e a habilidade, mais ainda, fazer a condensação disso tudo, a construção disso tudo, de forma que possamos contemplar essas mudanças, mas — de novo — sem precisar abrir mão da premissa de que a mudança tem que acontecer. Nós não podemos mais nos dar ao luxo de continuar no Brasil com tal regime, seja ele agora o IVA único, seja ele o IVA dual.
Eu pergunto, Deputado Aguinaldo, se não seria o caso de levar mesmo essa questão para uma decisão política. O IVA dual com a administração compartilhada entre Governo Federal e Governos Estaduais e Municipais, na minha opinião, poderia ser muito mais uma decisão política. Poderia ser interessante tratar isso como decisão política, até, Deputado Vitor Lippi, para trazer o máximo apoio possível, trazer a condição máxima de participação dos entes federados a favor da aprovação desse texto. Aí o sentimento é de controle sobre a arrecadação ou não. Se o IVA dual for permitir essa condição, que, de repente, essa decisão política possa ser adotada por este Plenário, pelos membros deste grupo e, consequentemente, por V.Exa., em seu texto.
18:29
RF
Mas agradeço aqui mais uma vez aos participantes tão diversos pelas grandes apresentações. Agradeço inclusive aos que vieram de mais longe, que puderam participar da reunião e contribuir muito para a nossa análise.
Vamos acelerar cada vez mais a discussão para que, até o mês de maio, tenhamos a aprovação da reforma tributária no Brasil.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Mauro Benevides Filho. PDT - CE) - Muito obrigado, Deputado Newton Cardoso Jr, pela exposição e colaboração de sempre.
Nós temos agora inscrito para falar o Deputado Ivan Valente, mas o Deputado Zé Silva me pediu a palavra por 1 minuto, rapidinho, porque os nossos expositores estão querendo expor e responder a algumas perguntas que aqui foram colocadas.
O Deputado Ivan Valente tem a palavra.
O SR. IVAN VALENTE (Bloco/PSOL - SP) - Eu queria cumprimentar todos os palestrantes, que nos deram esta demonstração de apreço e conhecimento e trouxeram suas contribuições; o Relator, Deputado Aguinaldo Ribeiro; e o agora Presidente, Deputado Mauro Benevides Filho.
Eu queria começar minha fala de hoje me dirigindo ao Relator.
Deputado Aguinaldo, eu gostei do fato de que V.Exa. hoje comentou a fala de cada debatedor. Foi importante. Mas eu tenho sentido falta de algo. Como V.Exa. vai fazer o relatório final, eu não quero um relatório que pareça meio pronto. Então, na medida em que comentamos e expomos as divergências aqui, V.Exa. vai delineando um relatório, e nós vamos formando uma opinião. Hoje V.Exa. falou mais do que nos outros dias. Então, peço até que V.Exa. sempre seja o primeiro a falar depois dos debatedores. V.Exa. é o Relator, tem tempo disponível e pode nos inspirar também.
Quero dizer uma segunda coisa. Quando V.Exa. se refere à ideia de foco na reforma, eu não sou contra focar a questão da reforma. Mas existem maneiras diferentes de ver o foco principal de uma reforma tributária, e essa é a questão, entende? Então eu queria delimitar um pouco a nossa atuação aqui, porque entendo que, quando se adotou essa posição de atacar por meio de PEC a questão do consumo, fez-se uma escolha política. Existem outras escolhas políticas. Alguns dizem: "Mas a renda nós vamos ver depois". O próprio Deputado Jonas Donizette disse: "Está garantido, porque o Lula falou que vai ter".
O meu problema não é o Lula, o meu problema é o Congresso Nacional, se eles vão querer mesmo tributar renda e patrimônio aqui. Depois. Depois, porque hoje nós estamos tratando de uma coisa que quem pressiona são os de cima. Então, fala-se do agronegócio, fala-se de serviço, a indústria se beneficia, ou então os entes federados... Esses têm poder de pressão, força etc.
18:33
RF
Eu quero sempre aqui ser porta-voz, Deputado Lippi, dos de baixo, como diria o Florestan Fernandes. Eu sou meio Carlos Drummond de Andrade: "Vai ser gauche na vida". Eu prefiro sempre questionar o seguinte: como os pobres entram nessa reforma?
Quando nós entramos num debate técnico que tem uma complexidade desta forma, quando nós vamos discutir os sistemas no mundo todo, quando nós vamos discutir os modelos no mundo todo, logicamente existe muita tecnicidade. E nós temos aí Deputados que têm mais especialização, que são empresários, que manejam o sistema tributário. O Deputado Mauro Benevides foi Secretário e tal. Mas eu vou pela política, então quero definir, de cara, que a reforma tributária não é técnica, ela é política, então tem um resultado político, e esse resultado político vai ter beneficiários, e eu não tenho certeza...
Concordo com alguns debatedores que falaram e peço desculpas adiantadamente a debatedores que não pude ouvir, porque tive que estar na formação de Comissões.
Na verdade, existem várias maneiras de ver a problemática. Eu quero dar um exemplo e vou começar pelo seguinte: um país como o nosso tem uma carga tributária de pouco mais de 33%, dos quais 45% são sobre o consumo. Então, ela atinge os mais pobres: o consumo atinge os mais pobres porque eles gastam 90% da renda no que nós sabemos, as primeiras necessidades, seja o alimento, o vestuário, o combustível. O Relator sabe perfeitamente disso. E eu pergunto: 26% é uma alíquota razoável para um país como o nosso?
Segundo, quando nós vamos fazer a comparação com os países europeus, eu acho que não é correto falarmos só do IVA para o consumo, temos que falar dos impostos globais. Não tenho dúvida de que a tendência mundial é ter um imposto unificado. Então, se ele simplifica, se ele dá transparência, se ele cria mais eficiência e tal, teoricamente vamos caminhar para esse modelo. Mas eu vejo que não é verdadeira a ideia de que nós vamos ter um IVA, pois vamos ter vários IVAs. E não é só aqui que vai haver vários IVAs, no exterior também.
O próprio Appy colocou que não pode haver muito vazamento. Isso quer dizer o seguinte: ele vai negociar com um montão de setores, que são os que vão conseguir pressionar. Por exemplo, nós estamos discutindo bastante essa questão do cashback, que hoje nem apareceu muito. Quanto era o imposto sobre a cesta básica? Era 8% e vai para 26%?
18:37
RF
O SR. PRESIDENTE (Mauro Benevides Filho. PDT - CE) - A cesta básica não tem incidência do PIS/COFINS, mas tem incidência do ICMS. Ela varia: cai de 18% para 7%, de 18% para 4%, a depender do Estado brasileiro.
O SR. IVAN VALENTE (Bloco/PSOL - SP) - Mas o que eu quero dizer é o seguinte: de qualquer forma, está se fazendo uma compensação, a que se dá aqui o nome de cashback, porque já é evidente que os de baixo estão perdendo nessa história da unificação.
Eu tenho uma visão um pouco diferente quando se fala em focar. Francamente, eu vou lutar até o fim, mesmo que seja uma posição minoritária, mesmo que seja uma posição perdedora. Aliás, o Deputado Lippi sempre fala: "Poxa, o Lira está apoiando!" E eu estou achando que as pessoas falam que, se o Lira teve 400 votos para a Presidência, então essa reforma tem 400 votos já. Certo? É a base do Lira, que eu não sei muito bem como foi construída. E vou dizer como foi: tem muito orçamento secreto nessa base aí! A maioria dos Deputados inclusive não conhece reforma tributária, não tinha experiência anterior. Há 240 novatos aqui.
Mais do que isso, existe um lado que até V.Exa. mesmo, Deputado Lippi, colocou no começo — e com razão, nesse caso —, dizendo o seguinte: "Se fosse fácil passar as PECs 45 e 110, elas já teriam passado". Então, está havendo uma mágica aí e, de repente, chegou-se a um novo consenso que ainda não está bem delimitado. Por quê? Porque existe uma sequência que agrada àqueles que não querem perder, Deputado Mauro. Esta é a questão: os de cima não perdem. Então, se você não faz algum grau de concomitância, como votar leis complementares concomitantes com a PEC, ou você não adianta a questão da tributação sobre o patrimônio e renda — estou insistindo nessa tese e vou continuar —, mostrando para a sociedade que os que têm mais podem e devem pagar mais...
Eu acho que nós temos que abrir esse debate, senão ele vai ficar hermético demais, por mais que tenhamos experiências e capacidade, como os colaboradores aqui no nosso debate, que têm experiência em reforma tributária e tal.
O SR. PRESIDENTE (Mauro Benevides Filho. PDT - CE) - Peço que conclua, Deputado Ivan Valente, por favor.
O SR. IVAN VALENTE (Bloco/PSOL - SP) - Eu queria deixar para o Deputado Aguinaldo essa preocupação.
Quero dizer que nós vamos continuar aqui nos debates, que devem ser abertos para a sociedade civil também. Ainda há muito de insatisfatório. Eu reconheço que estou aprendendo aqui, estou estudando e tentando compreender os sistemas.
A questão da OCDE interessa-me particularmente. E finalizo com uma observação, Deputado Mauro, que até um dos debatedores colocou bem. Como é a formação da OCDE? No primeiro momento, você forma a OCDE com países extremamente desenvolvidos, e depois vai absorvendo países periféricos, do Leste Europeu, etc. Esse engendramento tem a ver com a nossa realidade regional na prática, Deputado Aguinaldo, com as disfunções regionais do Brasil. Talvez haja um aprendizado aí também.
18:41
RF
Eu queria deixar registradas essas preocupações e agradecer a tolerância.
Obrigado, Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Mauro Benevides Filho. PDT - CE) - O último inscrito é o Deputado Zé Neto, a quem concedo a palavra.
O SR. ZÉ NETO (Bloco/PT - BA) - Serei bem rápido.
Hoje pela manhã, estivemos com o Ministro Haddad e com o pessoal da frente do empreendedorismo. Estavam conosco os Deputados Lippi, Marco Bertaiolli e Passarinho, os Senadores Amin e Sidney e duas Deputadas que fazem parte daquela frente, da qual sou secretário. Fomos com a direção da frente conversar com o Ministro Haddad, e ele confirmou que no próximo dia 4 almoçará com a frente. Deixo aqui o convite aos Deputados que participam do debate sobre reforma tributária para que compareçam e participem. Não será só um almoço, como hoje não foi só uma conversa. Hoje, conversamos com ele longamente sobre vários aspectos.
Deputado Aguinaldo, uma situação me chamou atenção: hoje, vivemos num ambiente que nunca tivemos. Os outros momentos acumularam situações que nos deram uma projeção sobre o que fazer, tanto negativas quanto positivas. Para completar, o Ministério da Indústria e do Comércio foi recriado e está aberto a discutir, a dialogar. O Alckmin é um bom interlocutor, um bom mediador, o que é importante para esse processo. Estou falando de Governo. Eu também cito o Ministro Haddad e o Appy, que estava com ele hoje. Eles têm sido extremamente abertos para conversar com a Casa, com este grupo de trabalho.
Lembro que muita coisa está sendo acumulada nesse movimento, tanto daqui quanto das frentes. Agora, com as Comissões, acho que isso vai ter uma resolutividade melhor.
Quero sugerir duas tarefas importantes. Uma é técnica, porque temos que fazer conta e trazer comparativos, como muitas vezes o Deputado Mauro faz. Isso é técnico, administrativo, mas tem um viés político. Muita coisa não vai para a emenda, mas sem acertar o baba, como dizemos na Bahia, não vai rolar emenda.
O SR. PRESIDENTE (Mauro Benevides Filho. PDT - CE) - Sem acertar o quê?
O SR. ZÉ NETO (Bloco/PT - BA) - Chamamos assim na Bahia, significa "sem acertar o jogo".
O Deputado Ivan estava manifestando algumas de suas preocupações.
Eu queria dizer o que é acertar esse jogo. Reajustar o SIMPLES, por exemplo, não vai para o texto, mas é uma peça importante no jogo com o setor empresarial, com o setor comercial.
Além disso, para falarmos com o setor de serviços é preciso lembrar a desoneração da folha. Desonerar a folha depende da criação de uma compensação. Em vez de não onerar apenas os 17 setores que já estão sem oneração, vamos desonerar todos. Mas, para desonerar todos, precisamos botar no lugar o que vamos perder. Vamos perder alguma coisa.
Aí, vem o imposto eletrônico. Isso vai para o texto? Não.
Eu queria sugerir ao Deputado Aguinaldo o seguinte. É preciso fazer uma montagem política paralela à montagem do grupo de trabalho para acumular essas demandas e botar numa mesa de diálogo político. Assim, poderemos juntar as pontas soltas, como é o caso do setor de serviços. É importante juntar essas pontas. Há coisas que não vão para o texto, mas que precisam ser resolvidas para ajudar na construção do texto.
18:45
RF
Deputado Lippi, vimos hoje de manhã que é possível fazer isso.
Deputado Aguinaldo, sugiro que juntemos essas pontinhas que estão ficando soltas e que não vão para o texto, mas que servem para negociar com o setor de serviços, por exemplo. Existem questões que precisam ser negociadas? Sim. A questão da folha e outras precisam ser aprimoradas, mesmo não indo para o texto, como o Deputado Ivan falou, porque dão garantias para elaborarmos saídas, em leis ordinárias, para que possamos levar o texto ao Plenário e conseguir a aprovação dessa reforma com conforto.
Era isso.
O SR. PRESIDENTE (Mauro Benevides Filho. PDT - CE) - Muito obrigado, Deputado Zé Neto.
Vou passar a palavra ao Deputado Aguinaldo Ribeiro, que vai comentar as ponderações dos expositores.
Quero lembrar ao Deputado Zé Neto que, com a desoneração da folha, vamos ter que encontrar um imposto alternativo de 400 bilhões de reais. Portanto, não é uma discussão tão fácil.
O SR. ZÉ NETO (Bloco/PT - BA) - O imposto eletrônico, o e-commerce e essa política internacional. Sabemos o que alguns países estão fazendo. Vendem para cá 25 camisas, e cada uma chega num envelope, porque, quando dividem, não pagam. Temos que ter o pé no chão para saber que, para compensar essa situação, precisamos nos debruçar sobre uma matéria lateral à reforma tributária, mas que precisa ser resolvida. Senão, não teremos como sentar à mesa com uma moeda de troca — num bom sentido — para negociar com o setor de serviços e com outros setores que, às vezes, trazem demandas que podem ser resolvidas ordinariamente, numa articulação política. Precisamos ouvir essas demandas e trazê-las para esta Casa, para fazermos as coisas rodarem.
O SR. PRESIDENTE (Mauro Benevides Filho. PDT - CE) - Registro a presença do Senador Eduardo Girão na nossa Casa. Agradeço a S.Exa. a presença.
Concedo a palavra ao Deputado Aguinaldo Ribeiro.
O SR. AGUINALDO RIBEIRO (PP - PB) - Registro também que o Deputado Evair nos brinda com sua presença. E vai trazer café. (Risos.)
Deputado Ivan Valente, vou comentar rapidamente suas considerações, porque ainda quero ouvir a Profa. Melina sobre aqueles dois temas a que me referi.
V.Exa. falou sobre falar mais. Nos primeiros dois debates, eu fiz exposições sobre os temas que serão tratados. Como eu era expositor, não me senti... Acho que naquele primeiro debate eu tive a missão de apresentar o tema. O debate de ontem foi muito proveitoso, com um tema muito relevante.
Eu falei sobre o foco porque fomos designados para discutir um tema. Nada impede que discutamos nossas crenças, mas temos muito pouco tempo. Como eu elaborei o plano de trabalho, estou me esforçando para que ele seja cumprido. Eu enfatizo a necessidade de ter foco porque aprovamos os temas que vão compor cada discussão. Tanto é que eu aqui coloquei as minhas posições e as minhas convicções sobre aquilo em que eu acredito, inclusive sobre temas de folha de pagamento ou outros temas, porque são discussões que eu acho que nós como País temos que fazer mesmo. Não estou fechando nem interditando a discussão.
18:49
RF
Quando me referi ao foco foi porque hoje nós tínhamos o foco do nosso seminário, e eu não quis fugir desse foco para não perdermos a oportunidade de ouvir aqueles com quem estamos debatendo. Se eu venho discutir que devemos ter uma reforma sobre a renda, preciso estar focado nesse debate. Mas ninguém está dizendo que não deva ser discutida uma reforma sobre a renda, quando o próprio Governo admite que isso deveria ser discutido. Eu queria colher aqui algumas soluções que precisamos ter, como essa questão de administração tributária, que surgiu nas práticas internacionais e que vamos discutir no próximo seminário, da semana que vem.
Os temas do próximo seminário vão ser a questão federativa e a administração tributária. Na terça-feira nós vamos discutir a questão federativa e, na quarta-feira, a administração tributária. Esses temas são um elemento importante para conhecermos, porque, assim como V.Exa., eu quero aprender, para ver o que temos de melhor e como poderemos aproveitar melhor a parte técnica.
E eu me referi a V.Exa. exatamente para podermos pegar essa prática. Na minha fala, eu disse que, no fim de tudo, quem vai decidir é a política, porque esta é uma Casa política, e podemos ter a melhor técnica. Mas isso não impede que possamos ousar para trazer — e foi isto que eu disse — o que há de melhor.
No debate das PECs, nós falamos muito em patrimônio. Inclusive já temos isso no meu texto. Quem teve o cuidado de ler o meu texto na Comissão Mista sabe disso. Eu não estou colocando na emenda constitucional, mas nós discutimos lá com o Senado. Quando eu apresentei no Senado o meu texto, evidentemente muita coisa não pude colocar porque foi interditado o debate também.
À época, o Ministro Paulo Guedes se posicionou e disse: "Vamos discutir depois questão de fundo de desenvolvimento regional". Eu disse o seguinte que iria endereçar isso no meu texto e que iríamos discutir qual é o formato desses fundos, depois, na Comissão Especial. Mas depois não aconteceu a Comissão Especial, e nós não tivemos a oportunidade de trazer para cá o texto que iria partir desse tema.
Então, quando eu me refiro a foco, é só para dizer de forma muito clara que temos de aproveitar ao máximo o momento, que temos que aproveitar o conhecimento trazido pelos participantes. Aí não me cabe chegar aqui e dizer: vamos discutir agora a renda.
Na nossa Comissão, nós podemos discutir como trazer a renda — o que é importante —, mas, na PEC que nós vamos discutir, seja na PEC 45, seja na PEC 110, nós não temos debate da renda, ou não temos atribuição para falar sobre isso, até porque não se trata nem de PEC o instrumento ou o veículo para discutirmos isso.
Agora, do ponto de vista conceitual, foi dito aqui — e eu acho que este é outro debate que devemos fazer no nosso País, porque isto foi colocado hoje também — que nós temos uma base de arrecadação concentrada no consumo. Isso, inclusive, foi comparado com outros países. Eu concordo que para se mudar essa base é preciso tributar no outro lugar, porque nós temos o contrato fiscal e vamos ter que fazer frente ao compromisso fiscal que temos.
18:53
RF
Uma mudança como esta precisa ser discutida de forma muito clara: como se vai tributar na renda para compensar o consumo? Essa discussão é possível? É. Acho que temos que discutir mesmo, mas do nosso ponto de vista temos uma atribuição que eu considero muito mais efetiva como estamos tratando hoje, ou seja, ajustar o nosso sistema de tributação indireta, porque é até mais fácil para termos clareza.
Deputado Ivan Valente, do jeito que está hoje não temos nem clareza dessa carga. O Deputado Eduardo Fleury fez uma análise de carga setorial, mas sequer temos a clareza disso com a transparência que precisamos. Com o IVA vamos trazer essa transparência, essa clareza. Dessa forma, de maneira muito efetiva, teremos a tranquilidade para até demonstrar ao Brasil e para as pessoas possam saber.
Por exemplo, o nosso amigo Paulo Gil fez uma pergunta interessante em relação à distribuição da carga: Quem paga a carga? Sabemos que é consumo, mas quem paga mais no consumo? No final é o consumidor, mas nessas cadeias quais estão mais oneradas? Precisamos estar tecnicamente embasados para decidirmos politicamente. A minha preocupação é essa. V.Exa. me conhece e sabe que o meu estilo é de ouvir muito, falar pouco e buscar sempre o diálogo para essas construções.
Quanto ao que foi dito aqui, acho relevante dizer que temos uma discussão efetiva aqui. No IVA foi colocada como referência a questão da câmara de compensação. Sei lá o nome que se dê aqui, ou era Conselho Federativo, que é o que estava tratando. No meu texto eu tirei esse nome, porque na época virou até palavrão. Pedi para tirarem esse nome, porque as pessoas estavam indignadas, pois se havia colocado autoridade tributária nacional. Não era o meu texto, era o que tinha sido apresentado na PEC. Inicialmente eu o considerei, depois retirei e disse para refletirmos melhor sobre esse tema. Vai ser a hora de discutirmos isso e decidirmos politicamente. Será uma entidade autônoma, independente, que vai fazer a arrecadação?
Melina, você poderia explicar melhor para todos nós como isso pode funcionar no Brasil: adequar ou customizar a nossa realidade. Eu acho que seria interessante para enriquecer o juízo de valor de cada um de nós, inclusive o meu.
O SR. IVAN VALENTE (Bloco/PSOL - SP) - Permita-me um aparte, Deputado Aguinaldo, só para finalizar?
O SR. PRESIDENTE (Reginaldo Lopes. Bloco/PT - MG) - Sim, mas temos um compromisso com o Ministro Padilha.
O SR. IVAN VALENTE (Bloco/PSOL - SP) - Agradeço a sua deferência.
Estamos num GT e eu não sei qual mecanismo vamos usar para destacá-lo. Quem vai redigir o relatório é você. Por exemplo, você cria um dispositivo que taxa os de cima e consegue baixar o IBS, digamos assim. Quem pode introduzir isso é você. Eu posso apresentar uma emenda? Existe essa possibilidade? Dentro do projeto é que eu estou falando.
18:57
RF
Estamos num grupo de trabalho que não tem as formalidades regimentais de uma Comissão Especial, em que temos de fazer todos os encaminhamentos e os destaques e, aí sim, vão ser votadas determinadas propostas que podem ser vencedoras ou perdedoras. Por isso, é preciso ter o seu convencimento. Existe uma concentração de poder nessa questão. Eu estou querendo socializar o poder.
O SR. AGUINALDO RIBEIRO (PP - PB) - Ele está socializado, Deputado, porque em nossas conversas do GT decidimos construir isso juntos.
Quanto a debater se vamos tratar de renda, temos de voltar à conversa que tivemos com o Ministro Haddad para fazer desse debate, se esta for a decisão do grupo. Eu sou Relator, nós vamos aqui discutir a matéria. O Governo se posicionou, dizendo que vai enviar um projeto, no segundo semestre, para tratar da renda.
Eu estou me dispondo a dar continuidade ao que nós já discutimos na Comissão Mista e na PEC 110, que é avançar no patrimônio. Eu acho que há questões que têm de estar na Constituição.
E quanto à renda, aí é uma questão de conta, Deputado Ivan Valente. Acho até que, na próxima reunião administrativa do GT, que é o fórum mais adequado para isso, podemos fazer essa discussão, inclusive para ver como o grupo se posiciona em relação a esse ponto.
De nossa parte, quando eu falo em foco, é porque estamos com um foco delimitado pela designação que nos foi dada.
O SR. PRESIDENTE (Reginaldo Lopes. Bloco/PT - MG) - Relator e Deputado Ivan Valente, às 19 horas teremos uma reunião com o Ministro Padilha.
Na verdade, esse tema sobre a renda e sobre o patrimônio... O patrimônio está bem colocado nesta PEC, porque o que não tem previsão constitucional vai ter comando constitucional para ser regulado em lei complementar.
Em relação à renda, estivemos hoje com o Vice-Presidente Alckmin e vamos receber a Ministra Tebet; estamos conversando com a Minoria, com o Colégio de Líderes de toda a Casa; conversamos no Senado também com os Líderes da Maioria e da Minoria. Em síntese, estamos fazendo um trabalho de alinhamento político.
E o alinhamento político que construímos significa que nós vamos tratar, na primeira etapa, do imposto sobre o consumo. E proposta para o imposto sobre a renda será enviada pelo Governo para fazer a modernização do nosso sistema. Esse é o alinhamento político. Acho que vamos ter que conversar novamente, se for o caso, na nossa reunião administrativa, mas se perdemos o alinhamento político, vamos perder energia, força e capacidade de aprovação. Então, tem que ficar bem objetivo o que nós queremos, o que nós vamos fazer.
Neste primeiro momento, vamos fazer a reforma em relação à tributação sobre o consumo, o que, na minha opinião, é um grande ato revolucionário, é um avanço. Não tenham dúvida de que para fazermos justiça social, justiça tributária, desonerar os mais pobres, a médio e longo prazos, isso passa necessariamente por fazer um sistema em que o pobre vai ter a certeza de que ele sabe que paga imposto, porque hoje ele não sabe o quanto paga de imposto. Acho que esse é o grande ganho desse sistema todo. Isso sem falar que nós podemos dar a esse sistema indireto algum tipo de progressividade, a partir da devolução para os mais pobres, mesmo com alíquotas diferenciadas. Pode haver tratamento diferenciado e também devolução para os mais pobres.
19:01
RF
Dando continuidade, nós vamos combinar o prazo de 3 minutos, mas com tolerância para os expositores.
Tem a palavra a Sra. Melina Rocha.
A SRA. MELINA ROCHA - Obrigada, Deputado Aguinaldo, pelas perguntas. Eu vou responder às suas perguntas com relação ao IVA único e ao IVA dual.
O IVA único, Deputado, é um IVA cuja legislação é de um só ente, por exemplo, uma legislação federal, e é arrecadado por um só ente, mesmo que esse ente reparta toda a receita para os entes subnacionais, Estados e Municípios. Desse modo, estamos falando do IVA único. Veja que, mesmo nos IVAs duais, como eu citei o exemplo do Canadá e da Índia, Deputado, a legislação é harmonizada.
O Canadá tem uma legislação federal. Mesmo Quebec, que tem um imposto separado, o IVA separado, harmonizou completamente a legislação com a legislação federal, de modo que, mesmo tendo um IVA dual, é uma só legislação. Na Índia, é a mesma coisa. Aquele país tem o IVA dual, e cada Estado tem uma legislação mais ou menos como a do nosso ICMS. Se olharmos a legislação de cada Estado — e eu abri para ver —, veremos que a legislação é idêntica, porque eles têm um conselho federativo que harmoniza a legislação, harmoniza as alíquotas que todo mundo vai aplicar para todos os produtos e serviços. Lá, infelizmente, eles fizeram um livrinho de 40 páginas com alíquotas. Infelizmente, eles tomaram essa decisão errada, a meu ver. Porém, a legislação do IVA indiano, tanto federal quanto estadual, é totalmente harmonizada por esse conselho federativo, com a participação de todos os entes. Então, vejam: IVA dual, com legislação única.
Não foi possível na PEC 110, infelizmente, fazer uma legislação única, mesmo para um IVA dual, porque, como o senhor falou, havia uma grande resistência do Governo Federal naquela época. Então, eles queriam uma CBS — Contribuição Social sobre Bens e Serviços separada, com legislação separada. Então, o que se tentou fazer ali no relatório da PEC 110 foi colocar, no mínimo, as regras básicas da CBS e do IBS de maneira mais ou menos igual, para que as legislações de cada ente não fossem tão diferentes.
Eu acredito, Deputado, que uma legislação única complementar, de caráter nacional, para ambos os tributos, tanto a parte do IBS quanto a parte federal, seria o ideal tecnicamente e também seria mais simplificado do que duas legislações separadas, com interpretações separadas, como foi feito no último relatório da PEC 110. Então, pode ser uma legislação única, com administrações separadas. Então, se a Receita Federal quiser continuar recolhendo a parte federal, nós pagaremos para a Receita Federal, e não será preciso se juntar com Estados e Municípios. Então, haverá uma administração separada, com legislação única.
Em relação à parte estadual e municipal, como eu falei, é preciso haver algum tipo de administração compartilhada. Quando chamamos, internacionalmente, de câmara de compensação, clearing house, queremos dizer que ela é diferente de uma administração centralizada, porque nessa câmara de compensação o contribuinte continuaria a recolher basicamente para cada Estado, e esses Estados repassariam para o destino. Então, essa câmara de compensação seria só para fazer o repasse para o destino.
Há muita crítica com relação a esse modelo, Deputado, porque, primeiro, há que haver uma confiança muito grande de que os Estados vão ficar repassando um para o outro, sem que isso entre no Tesouro. Segundo, perde-se o incentivo de fiscalizar o contribuinte que está naquele Estado. Por que eu vou fiscalizar e investir na minha fiscalização se o dinheiro vai todo para o destino? Eu estou arrecadando para repassar para o destino, e não há esse incentivo. Então, há muita crítica internacionalmente. A União Europeia já tentou pensar nesse modelo, mas houve muita crítica. E mesmo a União Europeia nunca adotou esse sistema de câmara de compensação.
19:05
RF
Esses países que têm o IVA dual adotaram uma arrecadação centralizada, mas centralizada no Governo Federal. Então, é isso que se quer evitar aqui, ou seja, que Estados e Municípios fiquem reféns da União para arrecadar de forma centralizada e repassar para o destino. É por isso que esse conselho federativo, agência tributária, vai fazer as vezes de um Governo Federal para garantir autonomia a Estados e Municípios e para que ninguém fique refém do Governo Federal para qualquer repasse. Então, unicamente é isto: haverá uma entidade única, o contribuinte vai arrecadar para essa entidade, e essa entidade, com a participação paritária, vai fazer a coordenação das fiscalizações de Estados e Municípios. Então, ninguém vai acabar com a administração tributária estadual e a administração tributária municipal. O que vai haver é uma coordenação por conta desse conselho, e esse conselho vai fazer as vezes do Governo Federal para arrecadar essas operações interestaduais e repartir o dinheiro para o Estado de destino. Eu acho que essa proposta é muito melhor do que delegar isso para o Governo Federal, porque, aí sim, Estados e Municípios vão perder autonomia.
Ressalto que essa agência tributária é para garantir justamente a autonomia de Estados e Municípios, para que ninguém fique refém de ninguém e para garantir ao contribuinte também a devolução dos créditos acumulados, porque vão estar lá e não vão para o caixa de nenhum Estado, de nenhum Município. E o contribuinte vai ter a garantia dos créditos acumulados.
Eu queria só dar uma palavrinha — acho que o Deputado Ivan Valente perdeu a minha apresentação — sobre a alíquota de 25%. O que eu estou vendo aqui no debate, o que foi proposto pelo menos nas PECs, é que a alíquota vai ser calibrada de modo a garantir a manutenção da arrecadação atual. Então, se hoje arrecadamos 700 bilhões de reais, 1 trilhão de reais com base nesses impostos, vamos ter a alíquota necessária para garantir essa mesma arrecadação. Então, se a alíquota vai ser calibrada a 25%, significa que já arrecadamos isso e a carga tributária já é essa, só não é transparente. Não sabemos quanto pagamos, tamanha a confusão que temos hoje no nosso sistema tributário, como a cumulatividade.
Então, Deputado Ivan Valente, a sua preocupação é a mesma do Deputado Reginaldo Lopes com relação aos mais pobres. Eu não tenho a mínima dúvida de que essa reforma vai beneficiar mais os mais pobres. Primeiro, porque a arrecadação vai ser no destino. A arrecadação no destino faz com que as cidades e os Estados mais pobres sejam mais beneficiados. Hoje, há uma concentração de riqueza em São Paulo, Minas e Rio, os Estados produtores. A passagem para o destino automaticamente vai beneficiar os mais pobres. Acho que, na semana que vem, vamos ter aqui o Gobetti, que vai apresentar esses números para vocês. Eu aconselho fortemente todo mundo a ver esses números.
Segundo, Deputado Ivan Valente, o pobre consome mais bens, e esses bens atualmente são os mais tributados, como no setor de telecomunicações. Temos uma tributação muito maior nos bens que são consumidos mais pelos mais pobres. Então, quando temos uma equalização da carga tributária entre bens e serviços, nós vamos ter uma vantagem maior para os mais pobres que vão pagar menos pelos seus bens, já que essa equalização da carga vai beneficiar quem mais consome bens, que é o caso dos mais pobres. Com relação à cesta básica, a desoneração é regressiva porque se está beneficiando mais os mais ricos, que consomem mais a cesta básica. Está se deixando de arrecadar dos mais ricos! É por isso que o cashback, que é a devolução personalizada, é muito mais eficiente e benéfica para os mais pobres. Vai-se arrecadar dos mais ricos, devolver para os mais pobres e ter mais dinheiro no caixa para devolução em termos de políticas públicas, saúde e educação. Há inúmeros estudos internacionais que mostram que esse sistema é mais eficiente.
19:09
RF
E há uma última questão. A alíquota reduzida — há muitos estudos empíricos nacionais e internacionais — não é repassada no preço. Quando há uma redução de alíquota de ICMS, um terço ou metade é repassada no preço. O que quer dizer isso? O resto é embolsado no lucro do fornecedor. Abaixa-se 10% do ICMS, mas o preço não abaixa 10%. Para onde está indo essa diferença?
Nós temos muito a discutir, e eu não tenho dúvidas disso. Estudos empíricos e econométricos no mundo inteiro e no Brasil dizem que essa reforma vai beneficiar muito mais os mais pobres. Posso passar todos os estudos para o senhor.
O SR. IVAN VALENTE (Bloco/PSOL - SP) - Eu lhe agradeço. Notei que você está bem convencida.
A SRA. MELINA ROCHA - Estou bem convencida, porque eu li todos os estudos.
O SR. MAURO BENEVIDES FILHO (PDT - CE) - Ela até já convenceu o Deputado Ivan!
O SR. IVAN VALENTE (Bloco/PSOL - SP) - Agora eu teria que falar meia hora também para rebater.
A SRA. MELINA ROCHA - Mando tudo para o senhor.
O SR. MAURO BENEVIDES FILHO (PDT - CE) - Eu senti o Deputado Ivan convencido agora!
Eu senti, Deputado Ivan, que V.Exa. está convencido.
O SR. IVAN VALENTE (Bloco/PSOL - SP) - Eu não estou convencido, não.
O SR. PRESIDENTE (Reginaldo Lopes. Bloco/PT - MG) - Obrigado, Melina, pela belíssima participação.
Vou passar a palavra para o Francisco Javier...
O SR. IVAN VALENTE (Bloco/PSOL - SP) - Presidente Reginaldo, peço só 5 segundos, em deferência à nossa convidada.
O SR. PRESIDENTE (Reginaldo Lopes. Bloco/PT - MG) - Pois não, Deputado Ivan Valente.
O SR. IVAN VALENTE (Bloco/PSOL - SP) - A primeira questão é a seguinte: nós já fizemos essa discussão em parte aqui. Veja que a carga continua sendo alta, e ela vai se manter alta. Essa é uma primeira questão. A segunda questão é sobre a discussão da compensação, que você está colocando. O Appy esteve aqui, e nós fizemos a ele uma pergunta muito incisiva. Até agora, não desenrolou. Como se diz, ninguém explicou o que é, quanto vai ser, etc. Terceira questão: a questão que você colocou sobre a desigualdade está correta, mas dentro de uma transição muito longa.
Então, nesse debate, se a discussão sobre a renda e o patrimônio for feita antes, alivia-se muito mais do que começar por uma PEC no consumo. E esse é o debate que eu estou colocando.
Agradeço muito a sua colaboração, e podemos aprofundar esse debate.
Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Reginaldo Lopes. Bloco/PT - MG) - Tem a palavra o Conselheiro de Finanças na Embaixada da Espanha no Brasil, o Sr. Francisco Javier Sánchez Gallardo, por 2 minutos, para as suas considerações finais.
O SR. FRANCISCO JAVIER SÁNCHEZ GALLARDO - Muito obrigado, Presidente.
Simplesmente, além de agradecer a possibilidade de estar hoje aqui, eu gostaria muito de chamar a atenção das senhoras e dos senhores sobre a efetividade do princípio da não cumulatividade.
Eu já tentei explicar que o IVA é um imposto muito abrangente. Acho que a compreensão adequada da mudança do sistema que existe hoje no Brasil... Eu faço questão de não falar dele, porque há uma questão na Embaixada que não me permite fazer isso. Para entender bem a mudança do que existe hoje para o que existiria, na hipótese de adoção do IVA no Brasil, acho que é muito importante ter na cabeça esse princípio da não cumulatividade e como ele funciona.
19:13
RF
No segundo dos gráficos que eu apresentei, havia aquela empresa fabricante de mesas de madeira comprando muitas coisas. De repente seria interessante — e eu deixo como sugestão para as senhoras e os senhores que estão me ouvindo — pensar e pesquisar qual seria a situação dessa empresa no sistema tributário brasileiro que existe hoje, dia 15 de março de 2022. Acho que pode ser ilustrativo.
Sem essa ideia de direito a crédito tributário imediato que desonera a empresa, não se pode entender o que significa o IVA.
Obrigado, Sr. Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Reginaldo Lopes. Bloco/PT - MG) - Obrigado, Francisco Javier.
Passo a palavra para o Dr. Marcos Valadão.
O SR. MARCOS AURÉLIO PEREIRA VALADÃO - Parece que o IVA, em termos de conceito tributário, está como a democracia. E aí me lembro do Churchill: ela é um sistema ruim, mas é o melhor deles.
O IVA da tributação do consumo parece que está nesse status. Ele é cheio de complexidades, mas é o melhor sistema de tributação do consumo. Agora, em termos de implantação de IVA em países federativos, a legislação tem que ser única, seja um IVA dual, seja um IVA centralizado. Isso é fundamental! As experiências internacionais mostram isso. Se há variação de legislação, isso gera discrepâncias. Depois, a questão da autonomia também vai gerar problemas com as alíquotas.
Eu vou pegar um tema que o Deputado Mauro Benevides colocou. Provavelmente, nós vamos para um IVA dual, que é um sistema que preserva o pacto federativo de maneira mais forte, mas teremos problemas de contencioso. Isso foi muito bem colocado. É bom pensarmos nessa questão, porque vamos ter o contencioso estadual e o contencioso federal. Vamos ter Fisco estadual e Fisco federal atuando no mesmo tributo, na mesma direção, mas com interpretações diferentes.
No passo seguinte de aprimorar a legislação, vai ser preciso criar um contencioso comum ou um tribunal fiscal especializado no IVA para resolver as questões e harmonizar as decisões. Isso é fundamental para resolvermos a questão, se tivermos o IVA, mas creio que ele vá evoluir para um IVA dual, com um contencioso estadual e outro federal. Depois haverá um órgão acima deles para harmonizar as posições. É relevantíssimo começar a pensar nisso. O Deputado Mauro Benevides colocou esse ponto, e ele conhece bem o tema. Eu também o conheço, porque fui Presidente da 1ª Seção do CARF por 6 anos e convivo com legislação tributária há muito tempo. É importante ter essa perspectiva.
Só para finalizar, há um ponto que a Profa. Melina Rocha colocou. Nem tudo que é novo é bom! Falo dos IVAs novos, dos que sucederam o europeu. A questão de usar conceitos para segregar receita quando há um IVA amplo é um mau negócio legislativo. Por quê? Você vai começar a ver nessas categorias exceções não tributárias.
Na verdade, o IVA geral incide sobre transações onerosas e pronto, sejam elas com bens, serviços, intangíveis ou o que for. Se eu começo a segregar... E essa é uma discussão importante. Eu coloquei isso... A solução que a União Europeia deu ao IVA europeu é excelente, do meu ponto de vista, e qualquer outra novidade me parece que regride, não evolui, com todo o respeito à posição da Melina. Por quê? Ela gera contencioso, o que não temos ou podemos evitar. O que é serviço? O que é intangível? O que é um aluguel? Como eu classifico isso? Ainda que se categorize tudo isso na lei, cada vez surge uma operação nova. Isso é infinito. Modalidades operacionais surgem todo dia. Na hora em que uma não for categorizável, posso pensar: “Opa, a minha operação não paga tributo, pois não está na lei”. Temos de fugir disso. O IVA geral é sobre transações onerosas e pronto, bens e outras coisas, serviços etc. Acho que isso não é evolução. Como a União Europeia fez, o IVA com esse conceito de serviço amplificado é a melhor solução legislativa para esse caso. Este ponto é para ficar bem clara a minha posição: nem tudo que é novo é melhor do que o antigo.
19:17
RF
Com isso eu encerro. Agradeço o convite. Tenho esperanças, como cidadão, de que a reforma saia e que possamos, em um segundo momento, discutir uma reforma da base de tributação da renda e do patrimônio, que realmente se faz necessária, inclusive para harmonizá-la com que o resto do mundo faz.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Reginaldo Lopes. Bloco/PT - MG) - Obrigado, Dr. Marcos Valadão.
Quero passar rapidamente a palavra aos nossos expositores que estão participando pelo Zoom, para considerações finais.
Passo a palavra ao ex-Economista Sênior do Fundo Monetário Internacional — FMI, Ricardo Varsano.
O SR. RICARDO VARSANO - Obrigado.
Eu quero só falar alguma coisa sobre o que parece ser a grande preocupação tanto do Sr. Relator como do Deputado Mauro Filho, que é essa entidade administradora do imposto. Eu quero dizer que, na PEC 175/95, falava-se nisso, mas nós não tínhamos técnica mesmo, não tínhamos muita ideia de como seria isso. Esse é um ponto que eu acho que os senhores têm que abordar imediatamente e tentar resolver: mostrar o que será isso, como vai atuar e o que vai fazer.
Quanto ao que eu estava falando de câmara de compensar, era essa entidade servir como câmara de compensação, fazer a compensação e distribuir o dinheiro para os Estados, o que hoje é possível via tecnologia. Na época, não se podia fazer.
Outro ponto da lista de pepinos que o Deputado Mauro Filho apresentou é a questão da alíquota única. Hoje, na margem, os IVAs estão sendo feitos com alíquota única. Eu estou dizendo que os novos IVAs têm alíquota única ou que a maioria deles têm, não todos. É muito difícil chegar a uma alíquota única, mas esse tem que ser um objetivo para podermos ficar, no máximo, em duas ou três alíquotas e quase nenhuma isenção. Esses são pontos importantes.
Eu agradeço a oportunidade de participar deste debate, que foi excelente, e me despeço dos senhores.
O SR. PRESIDENTE (Reginaldo Lopes. Bloco/PT - MG) - Muito obrigado, Ricardo Varsano.
Concedo a palavra ao Sr. Isaías Coelho.
O SR. ISAÍAS COELHO - Muito obrigado, Deputado, pela oportunidade de participar desta tão importante discussão.
Quero me referir apenas à questão do IVA uno ou dual levantada pelo Deputado Agnaldo. Realmente, do ponto de vista técnico e operativo, o IVA único é preferível, porque é essa a experiência que se tem tido. A Alemanha conseguiu fazer esse IVA uno entregando aos Estados länder o poder tributário e transferindo mais ou menos metade da arrecadação para a União. O México conseguiu unificar a legislação estadual e delegar ao poder central a administração desse imposto. A Austrália tem uma legislação nacional, com todo o IVA entregue aos Estados. Portanto, não há esse problema. Já a Rússia e a China são países grandes, com bastantes elementos de descentralização, e também têm o IVA em nível nacional. Quando isso acontece, as coisas são mais fáceis, porque cada unidade administra as receitas que recebe dessa fonte única.
19:21
RF
Nem sempre isso é possível, como mostra a experiência do Canadá e da Índia, onde o IVA é dual. Eles têm IVA dual pela dificuldade política. Talvez essas dificuldades políticas acabem forçando a que nós também tenhamos IVA dual no Brasil. A grande dificuldade, no nosso caso, parece ser a questão da administração. Quem vai tomar conta desse IVA? Há uma certa desconfiança de Estados em relação à União, da União em relação a Estados e tal. Então, coloca-se a questão administrativa como predominante. Certamente as próximas audiências devem trazer luz a esses pontos.
De qualquer forma, haverá necessidade de haver uma câmara de compensação ou um conselho federativo. Mesmo que seja dual a questão da tributação entre Estados — o Deputado colocou muito bem há poucos minutos —, quando há uma venda de Minas Gerais para São Paulo, o imposto é de São Paulo, mas a mercadoria sai de Minas Gerais. Como se faz? Tem que haver um mecanismo que faça com que esse dinheiro arrecadado em Minas Gerais chegue ao Tesouro de São Paulo, para poder tornar efetivo o princípio do destino.
Eu acho que o ideal seria que esse organismo não fosse uma agência tributária nacional, como se falou lá atrás, mas quase um software, um sistema de grande proporção que não fosse muito pesado, não tivesse toda uma maquinaria, um corpo funcional gigantesco, que não substituísse os Fiscos federal, estadual ou municipal. Mas isso é algo que ainda está ser desenvolvido. Espero que haja progresso nesse ponto.
É mais fácil haver um IVA único em termos de legislação, porque a lei é única. Enquanto que, se houver o IVA dual, essa lei será replicada e, quando tiver que ser feito um ajuste no futuro, será um pouco mais complicado. De qualquer forma, quaisquer dessas configurações têm um nível de simplicidade muito mais alto do que o que nós temos no Brasil, que é um sistema realmente muito complexo. É difícil até entender qual é a situação atual do IVA no Brasil.
Era isso.
O SR. PRESIDENTE (Reginaldo Lopes. Bloco/PT - MG) - Obrigado, Isaías Coelho.
Passo a palavra ao último expositor, Paulo Gil, por 2 minutos.
O SR. PAULO GIL - Eu quero novamente agradecer e enfatizar algumas reflexões que nós trouxemos. Sabendo que o Congresso vai discutir amplamente o assunto, a nossa primeira ideia é que não se deixe de pensar sempre, em todas as ocasiões, na redistribuição da carga, mesmo que a discussão seja sobre a tributação do consumo, porque a tributação de uma base guarda relação com a das outras bases. Isso deveria ser feito preservando as fontes de financiamento da seguridade social, ou melhor, aperfeiçoando as fontes, se fosse possível.
19:25
RF
A segunda ideia é que seria importante pensar como reduzir a carga de tributos sobre o consumo, principalmente a que repercute sobre os mais pobres. Será necessária uma compensação para isso. Uma alternativa cabível, mesmo que a discussão fique só em torno de alterações constitucionais, é pensar contribuições sociais que incidam sobre outras bases que não o consumo. Se pensarmos, afinal, o próprio financiamento da seguridade social é regressivo, com um peso muito grande de PIS e COFINS. Isso pode ficar mais regressivo ainda se não houver mais a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido.
Nesse sentido, uma proposta dentro desse debate seria separar a unificação dos impostos da racionalização do PIS e da COFINS. Então, separar impostos de contribuições sociais poderia ser uma boa solução, que seria o que estão chamando de dual. Melhor ainda seria separar a esfera federal, pelos motivos que o Deputado Mauro Benevides e muitos outros apontaram, das demais esferas.
É importante que qualquer tributo sobre o consumo mantenha a seletividade. Ele é um freio à regressividade. Uma alíquota única certamente vai ser a pior situação. Ela agrava a regressividade, por definição, na tributação do consumo.
Para terminar, não quero deixar de falar de duas questões pontuais que foram mencionadas aqui. Uma é a questão da simplificação. Eu acho que têm que dizer qual é essa simplificação.
Chamo a atenção para o fato de os estudos do Banco Mundial sobre custos de empresas, que é o tal do relatório Doing Business, ter resultado na saída do Economista-Chefe do Banco Mundial, o Paul Romer. Ele denunciou que o relatório era manipulado. Admitindo que haja dificuldades das empresas, não vamos nos apoiar nesse documento, nesse relatório.
Para a simplificação das obrigações tributárias, que pode ser a principal tarefa dos Fiscos, hoje há tecnologia suficiente como mostra, por exemplo, a declaração pré-preenchida do Imposto de Renda Pessoa Física. E vejam que se trata de um imposto de alguma complexidade. Então se poderia trabalhar também essa questão, porque a simplificação, posta como ela deveria ser, não diz respeito a uma alteração constitucional.
Quanto ao maior contencioso fiscal, que foi dito aqui — o debate do CARF está na praça, e houve mesmo um seminário no Congresso —, ele não ocorre por conta de uma suposta complexidade da tributação indireta. As grandes causas discutidas no CARF são as reorganizações societárias, são economia de imposto em torno de Imposto de Renda Pessoa Jurídica e Contribuição Social sobre o Lucro Líquido. Não são classificações fiscais, como dizem, e outras questões. Isso tem pouco a ver, no volume, no montante do crédito tributário, com a tributação indireta. Eu agradeço a oportunidade e manifesto que o instituto debate sobre a tributação.
19:29
RF
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Reginaldo Lopes. Bloco/PT - MG) - Obrigado, Paulo Gil.
Para concluir as considerações dos expositores, tem a palavra o Prof. André Mendes, por 2 minutos.
O SR. ANDRÉ MENDES MOREIRA - Muito obrigado, Sr. Presidente. Serei muito breve.
Em 1965 o Brasil fez uma reforma tributária, esse Congresso Nacional a aprovou, e nela a redação do direito ao crédito do ICM e do IPI é idêntica à redação que se propõe, pela PEC 45 ou pela PEC 110, para o direito ao crédito. O que aconteceu de 1965 para cá? Vou demonstrar muito brevemente.
De 1965 para cá, o Supremo Tribunal Federal entendeu que a Constituição de 1988, assim como as Constituições anteriores, garantiriam apenas o crédito físico, ou seja, que apenas alguns custos diretos gerariam crédito. Em outro extremo, a jurisprudência do Tribunal de Justiça europeu garante que todos os custos diretos e inclusive custos indiretos geram crédito. A jurisprudência europeia está um degrau acima do que se chama de crédito financeiro, que é o crédito sobre todos os custos diretos. E a jurisprudência brasileira está um degrau abaixo do crédito financeiro.
Dado o abismo existente entre Brasil e Europa, não me parece que se possa perder a oportunidade histórica que temos hoje de positivar, na Constituição da República, uma regra verdadeira de tributação sobre o valor acrescido.
Mark Twain já dizia que a história nunca se repete, mas frequentemente rima. Nós não podemos deixar que o erro cometido em 1965, ao se delegar ao legislador ordinário ou complementar o direito de fixar os limites da não cumulatividade, seja repetido em 2023. Que aprendamos com o erro e que evoluamos baseados nos melhores modelos globais!
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Reginaldo Lopes. Bloco/PT - MG) - Eu que agradeço.
Quero agradecer a todos os expositores e declarar encerrada a nossa reunião de hoje, convocando as próximas para o dia 21 de março, quando, às 10 horas, na sala 175-B, haverá uma reunião administrativa do GT, e, às 14h30min, haverá uma audiência pública em relação à reforma tributária sob a perspectiva do pacto federativo. Na quarta-feira, dia 22 de março, a audiência pública será sob a perspectiva da administração federativa.
Uma ótima noite para todos e todas!
Muito obrigado.
Voltar ao topo