Horário | (Texto com redação final.) |
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09:37
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O SR. PRESIDENTE (Rogério Correia. PT - MG) - Nos termos regimentais, declaro iniciada a 7ª Reunião da Comissão Externa de Acompanhamento e Fiscalização da Repactuação do Acordo Referente ao Rompimento da Barragem de Fundão, da Mineradora Samarco, que causou impactos severos nos Estados de Minas Gerais e do Espírito Santo, em especial, nas comunidades e nos Municípios da Bacia do Rio Doce.
Esta reunião foi convocada para a realização de audiência pública sobre o tema: Avaliação e Debate sobre o Processo de Repactuação do Acordo Judicial de Mariana, Decorrente do Rompimento da Barragem de Fundão.
Há vários convidados e convidadas. Permito-me anunciar também uma delegação de atingidas de Brumadinho, que hoje também têm uma audiência com a Ministra Cármen Lúcia — nós vamos acompanhá-las — e com o Ministro André Mendonça. A audiência é referente ao caso de Brumadinho, cujo processo está em Minas Gerais para ser julgado, mas a Vale apresentou um recurso, no intuito de repassar todo o processo para a Justiça Federal, o que atrasaria, mais uma vez, o julgamento das responsabilidades do crime em Brumadinho.
Quero lhes dar boas-vindas! Obrigado por reforçarem a nossa audiência de hoje, que, embora o tema seja o caso de Mariana, tem tudo a ver com essas duas tragédias criminosas: primeiro, em Mariana; e, depois, em Brumadinho. Elas são mães e parentes de pessoas que faleceram debaixo da lama em Brumadinho.
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09:41
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Elas estiveram aqui quando nós aprovamos o relatório de Brumadinho. Eu fui o Relator, e os Deputados que estão aqui também participaram da apreciação da matéria. Foi fundamental que elas viessem para que nós aprovássemos, na reta final, o relatório de Brumadinho. Estão aqui de volta, agora solicitando nosso apoio para que seja mantido o julgamento em Minas Gerais, que já está em fase avançada. Decorridos 3 anos e meio, não é possível perder todo o processo de julgamento já realizado pelo Ministério Público Estadual. Esse é também um pedido do Ministério Público.
Sejam muito bem-vindas! Estamos solidários a vocês em seu pleito. Vamos acompanhá-las ao Supremo Tribunal Federal na parte da tarde.
Vou fazer apenas um breve histórico. Também estão aqui conosco os Deputados Leonardo Monteiro, Padre João e Helder Salomão, do Espírito Santo, nosso Relator. Eu sou o Coordenador desta Comissão Externa, representando também a bancada mineira. Nós fizemos aqui uma dupla de Minas Gerais e Espírito Santo, para haver uma representação dos dois Estados atingidos. Nós solicitamos a instalação desta Comissão Externa exatamente para fazer o acompanhamento desse debate sobre a repactuação.
Nós já entregamos o relatório, mas não finalizamos o trabalho da Comissão, exatamente porque somos sabedores de que o acordo ainda não foi assinado, feito pelas empresas, pelos Governos dos dois Estados e também pelo Governo Federal, com o acompanhamento do Conselho Nacional de Justiça, do Supremo Tribunal Federal e dos Ministérios Públicos, tanto Federal quanto Estaduais, além da Defensoria Pública. Então, há um acompanhamento vasto, e a assinatura se dá por parte desses entes do poder público, do Executivo.
Fizemos todo um debate junto com os atingidos. E eu quero também saudar a presença deles aqui, particularmente do MAB, o Movimento dos Atingidos por Barragens, representado pelo Joceli, de Minas Gerais, e também da ABRA, a Associação Brasileira de Reforma Agrária, entre várias outras entidades.
Nós aprovamos, então, o relatório, pelo qual o Deputado Helder foi o responsável. O relatório está completo. Nele são feitas 84 recomendações, tanto ao Supremo Tribunal Federal e ao próprio Parlamento quanto, principalmente, ao Governo Federal, aos Governos dos Estados de Minas Gerais e Espírito Santo e à empresa Samarco, responsável pelo crime em Mariana. Então, o relatório está completo.
Visitamos diversas comunidades no Espírito Santo e em Minas Gerais. O Dr. Bandeira acompanhou, como representante do Conselho Nacional de Justiça, e também fez essas visitas. Então, nós pudemos ver in loco qual era a situação.
Este relatório, aprovado pela Comissão, foi entregue ao Supremo Tribunal Federal, ao Conselho Nacional de Justiça, ao Ministério Público e às Assembleias Legislativas de Minas Gerais e do Espírito Santo.
Eu quero também me congratular com a Deputada Beatriz Cerqueira pela presença. Já está aqui conosco, on-line. O Deputado eleito Leleco veio também, representando os Deputados eleitos agora em Minas. A Deputada Iriny, do Espírito Santo, fez também esse acompanhamento.
São representações também do Parlamento sobre este debate. Sobre este relatório, nós ainda não tivemos uma devolutiva de como andam os debates em torno dessa repactuação.
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09:45
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Deputado Helder Salomão, permita-me rapidamente dizer que nós fizemos um relatório muito completo. Acolhemos sugestões dos atingidos, dos Prefeitos, dos Governadores de Estado. Escutamos amplamente os diversos setores envolvidos e entidades. E sobre o resultado final, nós concordamos que é preciso fazer uma repactuação até para que haja mais celeridade, para que as coisas não fiquem amarradas na Justiça por muito tempo.
E nós ressaltamos que só é possível fazer esse acordo, se ele for um bom acordo para os atingidos e atingidas, para os Estados que foram também vítimas deste crime cometido. Então, tem que ser um bom acordo para esses setores envolvidos. Não tem que ser um acordo que agrade às mineradoras, tem que ser um acordo que agrade àqueles que foram vítimas desse processo criminoso.
Por isso nós listamos um por um daqueles objetivos, daquilo que achamos justo em todas as áreas: infraestrutura, saúde, educação, meio ambiente, além, claro, da recuperação econômica dos próprios atingidos. São várias as sugestões que aqui temos.
Nós não tivemos a devolutiva de como anda esse processo. Havia uma expectativa de que isso pudesse ser assinado no período anterior às eleições, mas, pelo que ficamos sabendo, o próprio Governo de Minas Gerais e também o Governo do Espírito Santo não quiseram assinar esse acordo, naquele período, porque julgavam que as tratativas não eram boas para os Estados, para os Municípios e para os atingidos. Então, os Governos Estaduais optaram por não fazer essa assinatura, na ocasião.
Estando em um período eleitoral, é óbvio que nenhum candidato — os dois Governadores eram candidatos à reeleição e foram, inclusive, reeleitos — queria assinar algum acordo que não fosse defensável do ponto de vista dos atingidos e da população de Minas e do Espírito Santo. Por isso, pelo prazo muito grande que as mineradoras queriam para fazer o pagamento, também sobre o valor e etc., não se assinou o acordo.
É óbvio que, agora com o Governo Federal eleito, que anteriormente era de oposição ao Governo de Jair Bolsonaro, também a comissão de transição quer ter um conhecimento mais aprofundado do que é esse acordo. A Dra. Mariana está aqui representando o grupo de transição. Eu estive pessoalmente também com os dois coordenadores de transição, a Presidenta do PT, a Deputada Gleisi Hoffmann, e também o Aloizio Mercadante. E também participa o Dr. Messias, que faz um tratamento mais jurídico dessa questão. Todos eles estão preocupados, porque ainda não têm conhecimento prévio do que se está planejando no acordo. Portanto, eu os convidei para que também viessem à nossa audiência pública para tomar conhecimento e, conjuntamente, vermos como é que se desenvolve esse processo.
Então, em rápidas palavras, este é o quadro em que nós nos encontramos agora. Nós da Comissão já tínhamos feito esta reivindicação de que, antes de assinar qualquer acordo, nós fôssemos partes também do conhecimento, do significado do acordo, de tudo aquilo que é planejado, que está dentro das tratativas,
ou seja, que não fosse assinado o acordo, antes do seu conhecimento pela Câmara dos Deputados em Brasília e também pelas Assembleias Legislativas de Minas Gerais e do Espírito Santo, bem como pelos atingidos, por meio de suas entidades. Conversamos isso com o Ministro Fux, e ele concordou que nos daria uma devolutiva desse processo, em especial após a entrega do relatório.
Então, Deputado Helder Salomão, eu vou passar a palavra a V.Exa., como nosso Relator, para também contextualizar o objetivo da reunião e, a partir daí, organizamos os nossos convidados. Eu me permito passar a palavra a V.Exa., Relator Helder, que fez um trabalho brilhante. Nós ouvimos muita gente — não foi, Deputado Helder? Há tempos e tempos que a Comissão vem funcionando. Já está há mais de 1 ano funcionando, não é?
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09:49
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O SR. HELDER SALOMÃO (PT - ES) - Há 1 ano, Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Rogério Correia. PT - MG) - Sim, há 1 ano.
Nós pretendemos, evidentemente, dar sequência a ela, na próxima legislatura. Já é um compromisso que nós temos de manter esta Comissão Externa funcionando, para fazer o acompanhamento do que virá, caso esse acordo seja assinado, ou fazer as tratativas para assinatura dele, se for o caso, no início do próximo ano. Esperamos continuar fazendo o acompanhamento, que é uma solicitação também dos atingidos.
O Parlamento acaba dando voz, de maneira mais organizada, àqueles que foram atingidos pelo crime de Mariana. Foi um crime com repercussões internacionais, então, todo o cuidado é pouco, quando se fala em rever o acordo que foi feito, porque até hoje — nunca é demais dizer — nenhuma casa ainda foi entregue aos atingidos, nem de Bento Rodrigues, que foi a primeira comunidade a ser atingida, em Mariana. Ninguém ainda está morando nas casas reconstruídas. Também em Paracatu de Baixo, nenhuma casa, nenhuma residência foi entregue.
Sete anos depois, esse é um quadro que mostra que as coisas não andaram como deviam. O rio continua poluído, Deputado Leonardo Monteiro, de Valadares. Nós visitamos o local, inclusive, fomos a uma ilha. Quando há enchente, é um absurdo o que acontece. O Dr. Bandeira esteve lá. Quando vem a enchente novamente, como o rio está muito assoreado e está estreito, a ilha... O Deputado Helder não foi lá.
O SR. HELDER SALOMÃO (PT - ES) - Eu fui a Valadares, mas não fiz a visita.
O SR. PRESIDENTE (Rogério Correia. PT - MG) - Não foi à visita à Ilha Brava. É impressionante, porque vemos que aquela lama com rejeito adentrou de novo na terra. Há aqueles blocos de rejeito enormes, são blocos de rejeito de minério de ferro puro. Não houve a limpeza mínima das condições no próprio rio, e a região, a bacia não foi agraciada com os recursos.
Aliás, é um dos pontos, Deputado Leonardo, que sempre colocamos e reforçamos muito. Esses recursos têm que ir para a Bacia do Rio Doce, tanto no Espírito Santo, quanto em Minas Gerais, para que seja um acordo que garanta, então, a melhoria das condições nesse local. Esse é o objetivo geral.
Eu passo a palavra ao Deputado Helder Salomão. Em seguida, organizamos para ouvir nossos convidados.
O SR. HELDER SALOMÃO (PT - ES) - Bom dia a todas e todos.
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Infelizmente, depois de 7 anos, vemos ainda muita desolação, muito descaso e muito abandono das comunidades que foram duramente impactadas e afetadas.
Quero saudar o Deputado Leonardo Monteiro, que constitui esta Comissão, e o Deputado Padre João, que aqui também está presente e é atuante na Comissão.
Vou apenas ratificar aqui as palavras do Deputado Rogério Correia sobre a importância do relatório que nós fizemos. O relatório foi apresentado por mim, mas ele foi construído por várias mãos, com a colaboração dos Parlamentares da Comissão e com a colaboração dos representantes do poder público e também da sociedade civil e, em especial, de atingidos e atingidas.
Desde o início, Deputado Rogério Correia, nós dizíamos: este relatório tem que dar voz aos atingidos e atingidas, porque um relatório que não expressasse a verdadeira realidade de atingidos e atingidas seria mais uma peça como tantas outras que tivemos, durante esse processo, que não levaram efetivamente a uma reparação justa.
No início do relatório, eu até fiz questão de consolidar um sentimento que nós percebemos em todas as audiências públicas, em todas as diligências e em todas as conversas que nós tivemos. Nós estivemos em Mariana, em Governador Valadares, estivemos lá em Conceição da Barra, estivemos em São Mateus, estivemos em Linhares. Realizamos audiências públicas em Mariana, na Assembleia Legislativa do Espírito Santo, na Câmara Municipal de Governador Valadares e tivemos conversas com as lideranças e efetivamente com as pessoas atingidas. O que nós vimos e ouvimos foi um grito de socorro, foi um pedido de socorro, mas, ao mesmo tempo, depois de 7 anos, nós vimos que o povo não perdeu a esperança de lutar. O grito de socorro não é o grito de quem jogou a toalha. É de quem continua na luta e de quem tem esperança de que haverá um processo de repactuação que seja minimamente justo para reparar danos econômicos, ambientais, sociais e para a reparação direta a atingidos e atingidas.
Para concluir, eu só quero salientar duas coisas, Deputado Rogério. A primeira delas é que, nas conclusões do relatório — que também é um relatório descritivo, porque ele detalha muitos pontos que nós pudemos colher durante as audiências —, nós apresentamos os pressupostos para a efetivação do acordo. Além das 84 recomendações que foram feitas e aprovadas pela Comissão, nós também apresentamos no relatório 56 eixos norteadores que podem colaborar com o debate, para que nós cheguemos ao entendimento de uma repactuação do acordo que seja justa. Nós já apresentamos esse relatório a todas as autoridades que estão envolvidas nesse debate, inclusive fizemos questão de entregá-lo ao CNJ e o Conselheiro Bandeira de Mello o recebeu ainda em junho deste ano.
Nós também o encaminhamos para governos estaduais, prefeituras e câmaras municipais; encaminhamos para o Ministério Público, para a Defensoria Pública, para atingidos, atingidas, e, quem quiser ter acesso ao relatório, poderá pesquisar na página da Comissão, porque é um relatório público.
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Para minha surpresa, Deputado Rogério Correia, eu estive numa missão oficial em Genebra recentemente, representando a Câmara dos Deputados, para apresentar os resultados do Observatório Parlamentar que está instalado aqui na Casa numa parceria com a ONU, e, lá, algumas pessoas que não moram no Brasil — são brasileiros e atuam no exterior —, vieram me procurar para falar sobre o relatório. Elas acompanharam a apresentação do relatório e acompanham o desdobramento da repactuação. Então, vejam que esse debate gerou muito interesse.
Nós esperamos, Conselheiro Bandeira de Mello e demais representantes aqui, poder efetivamente caminhar para que tenhamos uma reparação justa. Quero ratificar que, mais uma vez, esta Comissão decidiu, quando aprovou o relatório, que não encerraria as atividades, porque a missão da Comissão não terminou quando nós o aprovamos e nem vai terminar, a nosso ver, quando for firmado o acordo de repactuação. Nós vamos acompanhar a execução dos projetos e das ações de repactuação após a finalização desse acordo de repactuação, que nós pretendemos que seja resultado desse esforço de muita gente.
Enfim, o relatório expressa o desejo de atingidos e atingidas de que todo recurso proveniente da repactuação do acordo seja utilizado nas áreas atingidas para reparação e para evitar o que aconteceu, por exemplo, em Brumadinho, onde o processo foi um pouco melhor, mas nós tivemos casos de recursos cuja utilização não foi para atender as áreas atingidas, afetadas e impactadas. É fundamental que se garanta que os recursos possam minorar e melhorar os danos e ser efetivamente utilizados para a sua reparação e para a retomada das atividades que as famílias desenvolvem ao longo da Bacia do Rio Doce.
O SR. PRESIDENTE (Rogério Correia. PT - MG) - Bem, quero agradecer ao Deputado Helder Salomão, nosso Relator.
Deputado Leonardo Monteiro e Deputado Padre João, na hora em que quiserem utilizar a palavra, solicitem-na, mas a ideia era passar inicialmente para os convidados, para que nós fizéssemos nossas falas conclusivas posteriormente.
Eu vou passar a palavra para o Conselheiro Luiz Fernando Bandeira de Mello, que representa aqui o Conselho Nacional de Justiça e acompanhou e é responsável pelo acompanhamento do caso através do Supremo Tribunal Federal, por indicação do Ministro Fux, para que ele possa também fazer suas considerações. O conselheiro já havia me alertado que hoje tem reunião do conselho.
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O SR. LUIZ FERNANDO BANDEIRA DE MELLO - Muito obrigado, Deputado Rogério Correia. É uma honra estar aqui na Câmara dos Deputados.
Eu sou egresso do Congresso Nacional. Sei o valor do trabalho de fiscalização que é feito nesta Casa. Neste momento, estamos exatamente debruçados sobre esse tema com o Congresso Nacional fiscalizando a atuação do Poder Executivo e de outros órgãos nesse assunto, em particular o acordo de Mariana.
Eu queria cumprimentar o Deputado Helder Salomão e elogiá-lo pelo relatório. Eu tive acesso ao relatório, de fato, como V.Exa. falou, em junho. Já o li todo naquela ocasião e posso lhe dizer que, das 84 recomendações, o nosso acordo, a minuta que temos dele, salvo engano, responde a mais de 70 delas, assim como as 56 diretrizes também estão amplamente atendidas no que se pretende realizar como acordo.
Eu quero cumprimentar os meus colegas de mesa: o Dr. Carlos Bruno, incansável defensor da resolução desse problema; e a Dra. Cláudia Garcia, do Ministério Público do Espírito Santo. Eu vejo aqui também o Deputado Leonardo Monteiro e o Deputado Padre João. Queria cumprimentar o Sr. Joceli Andrioli, do MAB. Estivemos algumas vezes reunidos no CNJ. Vejo lá atrás o Dr. Tom Goodhead, advogado britânico. E vejo aqui na primeira fila, na categoria dos amigos pessoais, a Sra. Mariana Cirne, que está pelo gabinete de transição.
Vou tentar, Deputado Rogério Correia, nesse tempo que me foi deferido, passar um pouco de informações do acordo que está se desenhando.
Efetivamente, nós tivemos um período de 18 meses de trabalho de negociação mediada pelo CNJ. Nesse período, eu tive ocasião de ir pessoalmente a dez Municípios da região atingida. Fizemos 12 audiências públicas, porque, além das presenciais, fizemos outras três. Foram nove audiências públicas presenciais — eu visitei ainda um décimo Município — e três audiências virtuais, para que qualquer Município pudesse participar. Eu posso lhe dizer que o relato das pessoas é desesperador, é realmente uma situação dramática. Vejo aqui os atingidos de Brumadinho, que seguramente passaram por situação semelhante — Brumadinho ainda com uma tragédia adicional pela perda de vidas humanas em número bem maior do que Mariana.
Deputado, eu me lembro bem de que, durante as negociações, completamos 6 anos da tragédia. E eu, na mesa de negociação, disse que eu gostaria muito que não chegássemos ao sétimo aniversário da tragédia sem uma solução. E o que mais incomoda é que chegarmos ao sétimo ano de aniversário e a situação ainda não estar resolvida. Ainda não temos pessoas morando nos reassentamentos. Ainda não temos uma situação resolvida para aqueles que dependem da pesca. Não temos ainda o rio em condições desejáveis.
Lamentavelmente, essa é uma realidade dura. Eu preciso dizer de cara: demorará muitos anos para o rio voltar às condições originais dele. Isso é lamentável, evidentemente, mas é uma realidade.
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Quando eu visitei as comunidades em Governador Valadares, por exemplo, Deputado Leonardo Monteiro, eu me recordo de ter visto o que o Deputado Rogério Correia descreveu: a enchente subir e deixar uma camada de uma lama misturada com ferro. Ao se pegá-la e expô-la ao sol, ela brilha, certamente por conter resíduo de ferritina ali dentro. Aquilo é tão pesado que acaba não só com a produção agrícola. Acaba até com a infraestrutura agrícola. Eu visitei fazendas, por exemplo, em que essa lama destruiu o sistema de irrigação que tinha sido instalado.
Então, veja bem, a verdade — e é muito dura essa verdade — é que essa lama que está depositada no fundo do rio, misturada muitas vezes com o solo do próprio rio, e temos uma enorme dificuldade técnica inclusive de tentar removê-la. Se eu colocar uma draga para cavar essa lama, na hora em que eu cavar, primeiro, a própria lama já se dissipa na água. Então, vai bater lá no Espírito Santo. Segundo, na hora em que eu tiro essa lama, eu vou tirar também terra debaixo do rio. Vou afetar o leite do rio, vou tirar a vegetação do leito do rio que alimenta os peixes. Eu posso transformar esse rio num grande deserto, do ponto de vista do bioma.
Ainda que se tire essa lama toda, "Vamos dragar muito, vamos tirar uma quantidade enorme de terra", considerando-se os 40 milhões de metros cúbicos que havia na barragem — um pedaço disso ficou em Candonga e outros 30 milhões, em números arredondados, foram pelo leito do rio e para o oceano —, para tirar essa lama toda, é preciso dragar, seguramente, talvez, três vezes isso. É a estimativa que o perito nos passou. Em caso de draga, somente 25% do que se vai tirar é lama. O resto é terra. Então, na verdade, vamos tirar, talvez, sei lá, 90 milhões de metros cúbicos e onde vamos colocar isso? Vamos colocar onde isso? Talvez, estejamos causando um dano ambiental maior.
O acordo foi construído a partir de algumas premissas: daquilo que é possível fazer e reparar e daquilo que não é possível reparar. Quanto ao que é possível reparar, está sendo determinada uma série de medidas a serem assumidas pelo poder público estadual; outras a serem executadas pela empresa, mas com uma série de indicadores para exigir o cumprimento. E aquilo que não é possível reparar nós temos que compensar: particularmente, a vida das pessoas.
Há pessoas atingidas que perderam casas, sua fazendinha, seu sítio. Estamos falando de uma das regiões mais férteis do Brasil e que, no entanto, hoje têm dificuldade de produção.
Mas eu quero dizer-lhe, Juscelino, que estivemos juntos algumas vezes e eu me recordo das suas colocações. Foi dito "É necessário que o dinheiro vá para o atingido". Eu lembro também que tanto o Deputado Rogério Correia quanto os Deputados Helder Salomão e Leonardo Monteiro disseram que é importante que o recurso fique na bacia atingida. É exatamente isso que foi pensado no acordo.
Senhoras e senhores, estamos falando de um acordo que tem potencial para ser o maior acordo ambiental do planeta, e isso ocorre em uma economia periférica como a brasileira, em uma situação em que precisamos dar uma resposta à população que já está há 7 anos morando numa casinha alugada, porque não teve sua casa devolvida. É isso que queremos alimentar?
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A verdade é que, se não partirmos para a construção de um acordo — eu tenho convicção disso —, em quanto tempo conseguiríamos indenizar essas pessoas através de processos judiciais ordinários? Agora, depois de 7 anos, o processo ainda está na primeira instância. Garanto que demoraria pelo menos mais uns 3 anos, com muita dedicação do Dr. Michael Procópio, para conseguir chegar a uma sentença.
Vejam bem. Depois da sentença na primeira instância, haveria recurso ao Tribunal Regional Federal. Bote aí mais outros 10 anos. Sem dúvida, ainda haveria recurso para o STJ e o STF para discutir alguma questão pontual. Quando tudo isso terminasse, ainda iria entrar com uma ação de execução. Imagine o que é executar um volume de recursos desse tamanho! Fatalmente, iríamos chegar a uma negociação de parcelamento nessa execução. Ao fim e ao cabo, nós iríamos começar a ver a indenização se aplicando a essas pessoas 30 anos depois do drama, da tragédia que foi o acidente de Mariana. Essa é a nossa preocupação central.
Agora, é claro que o acordo não pode ser feito em prejuízo daquelas pessoas que foram atingidas, em prejuízo do interesse público.
Eu lhe diria, Deputado Rogério, que as negociações que ocorreram até pouco antes das eleições andaram muito bem. Os termos do acordo eram muito favoráveis. Eu vou tentar jogar alguns elementos aqui que eu posso trazer ao conhecimento do público.
Basicamente, ele não se concretizou por dois motivos. Primeiro, porque o calendário eleitoral naturalmente mexe um pouco com os ânimos, pelo menos do Poder Executivo, dos que estavam à mesa. Achou-se que ia acabar misturando. Poderia parecer propaganda eleitoral formular um acordo desse às vésperas da eleição. Também o prazo de pagamento não estava satisfatório, notadamente para o poder público estadual. Os dois, Minas Gerais e Espírito Santo, avaliaram que o prazo que inicialmente as empresas propuseram pagar em 30 anos chegou a ser negociado para 20 anos, quando foram suspensas as negociações. Talvez, agora, consigamos melhorar um pouco esse prazo. É para isso que estamos trabalhando.
Aqui eu preciso fazer um pequeno parêntese. Eu não posso entrar em detalhes do acordo por conta de uma cláusula de confidencialidade. Em qualquer acordo desse tamanho existe cláusula de confidencialidade. Imagine, um acordo como esse eu não posso negociar pela televisão. Já há uma série de participantes na Mesa. Do lado do poder público, além da mediação do CNJ, a União; o Estado de Minas Gerais e o Estado do Espírito Santo; o Ministério Público Federal, está aqui o Dr. Carlos Bruno representando; o Ministério Público do Espírito Santo, está aqui a Dra. Cláudia representando; o Ministério Público de Minas Gerais; e as Defensorias Públicas, Joceli, que cuidam exatamente da preocupação dos atingidos também da União, de Minas Gerais e do Espírito Santo. Então, há nove partes do poder público, além de três partes do setor privado: a Vale, a BHP e a Samarco, que é, digamos assim, a pessoa jurídica diretamente responsável.
Mas o recurso desse acordo vai ser distribuído de forma que, salvo engano, 22% desse recurso vão diretamente para os atingidos. Estamos falando de um programa de transferência de renda, do maior programa de orçamento participativo que já se viu na história deste País. Eu sei que isso é uma coisa cara ao futuro Governo que vai assumir.
Estamos falando de um acordo de entregar para a gestão do poder público junto com as comunidades o maior programa de orçamento participativo que já se viu, um valor superior a 4 bilhões de reais. Além disso, um programa de transferência de renda, que é dinheiro diretamente na mão dos atingidos. Não estou falando só da indenização pela casa perdida, pelo terreno perdido não.
Estou falando de programa de transferência de renda, para permitir que essa pessoa se mantenha, por vários anos, associado a um programa de capacitação, caso se interesse, eventualmente, em aprender outro ofício, e ainda a um programa de gestão, pelas próprias comunidades, que vão decidir o que vão fazer desse recurso: se precisam de um cais, para auxiliar a vida dos pescadores; se precisam de uma estação elevatória de esgoto; se precisam de captação de água em outro rio, porque não se têm confiança no Rio Doce; se precisam de uma nova estação de tratamento de água.
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10:13
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A própria comunidade poderá gerir esse recurso. Essas informações que estou passando foram oriundas dos pedidos que eu ouvi das comunidades atingidas, do MAB, desta Comissão, no relatório.
Quando dizem que as comunidades querem ser ouvidas, tenho certeza de que estão sendo ouvidas. Nós fomos lá pessoalmente para ouvi-las e estamos aqui prestando contas. Evidentemente, eu não posso ainda pegar o texto do acordo e distribui-lo, porque eu poderia eventualmente até melar o próprio acordo, se alguma coisa, que não está ainda terminada, gerasse oposição de um dos Ministérios Públicos, de uma das partes de uma das empresas, por exemplo, porque afinal de contas têm seus acionistas e seus conselhos de direção.
Na parte que compete ao poder público há quatro fundos a serem criados. Um deles é o fundo permanente, perpétuo, de saúde, porque precisamos colocar dinheiro na saúde desses Municípios atingidos. Outro, específico, para mitigação dos efeitos das enchentes.
Deputado, o senhor falou há pouco, quando acontece uma enchente, a lama cobre a região, é preciso depois retirá-la, haverá um custo, pois é necessário o uso de trator, de mão de obra, etc. Portanto, haverá um fundo específico para a mitigação desses efeitos.
Haverá um fundo ambiental destinado a implementar ações de saneamento básico em toda aquela região. Estamos falando de mais de 10 bilhões de reais para saneamento básico. É muito recurso.
E, finalmente, o Fundo Rio Doce, de natureza mais empreendedora. A ideia é fomentar economia verde na região, atividades que possam gerar inclusive crédito de carbono, que é uma das pautas relevantes, tanto do atual quanto do futuro Governo, para levar recurso para aquela região. Aquelas pessoas, seja na forma de cooperativa, seja na forma de pequena empresa, que desenvolvem uma atividade que protege o meio ambiente terão um fundo para financiá-la, e ainda se pode vender crédito de carbono no mercado, o que vai levar mais recurso para aquela região.
Outro ponto importante, repasse aos Municípios. Eu recebi do fórum de Prefeitos da região uma demanda de que, salvo engano, 11% dos valores destinados ao poder público seriam distribuídos entre os Municípios da região, para fazer política pública local. Isso está contemplado no acordo. A ideia é a de que os Municípios adiram aos termos do acordo, se desejarem, evidentemente, para isso, desistindo das ações que...
(Intervenção fora do microfone.)
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Além disso, teremos o que nos foi pedido, justamente entre 20% e 25%, nos moldes que ficaram definidos em Brumadinho, de recursos transferidos diretamente para a mão do atingido. Também contemplamos isso. E, pela conta rápida que fiz, deu 22%. Tudo isso é um conjunto de medidas que buscam reparar, ou pelo menos compensar, os danos causados pela terrível tragédia.
Quero dirigir uma palavra especificamente àqueles que têm um cuidado com a futura gestão do Governo Federal, particularmente o gabinete de transição. Cumprimento o Deputado Júlio Delgado.
Eu não tenho essa conta agora porque, na verdade, esse fundo de saneamento básico, por exemplo, será gerido pelos Governos Estaduais. O orçamento participativo vai ter gestão do Governo Federal junto com os Governos Estaduais. Alguns recursos são mistos. Então, confesso que se precisaria definir um critério para saber se conta de um lado ou de outro.
O fundo de saúde também tem gestão tripartite. Então, poderíamos definir alguns critérios antes de poder calcular essa divisão entre o estadual e o federal. Mas, por exclusão, se nós tirarmos a parte dos Municípios, a parte da população, a parte que a empresa gasta diretamente, chegaremos facilmente a uma conta em que, grosso modo, 65% dos recursos serão geridos pela União e pelos dois Estados.
Sobre a transição e sobre o novo Governo Federal, esse acordo que foi desenhado, como lhes disse, por nove instituições públicas — três Poderes Executivos, três Ministérios Públicos, três Defensorias Públicas — não é um acordo desenhado pelo governo de plantão. Isso é muito importante ter em mente. O Ministério Público do Espírito Santo, o Federal ou o de Minas Gerais não iriam assinar um acordo que fosse maléfico àquelas comunidades para atender a um eventual interesse político de um Governo que está saindo. Pelo contrário, se o acordo for firmado, esses recursos aqui serão 100% empregados pelo futuro Governo, que, no caso dos Estados, é o mesmo que foi reeleito. Se o acordo fosse ruim, evidentemente, não o estariam assinando. Estamos falando do mesmo Governo que negociou o acordo, que eventualmente assinará e aplicará esse recurso. Foram reeleitos e, portanto, não estariam assinando acordo se ele não fosse positivo.
Quanto ao Governo Federal, estamos falando em entregar para a gestão do Governo Federal uma quantidade de recursos para o meio ambiente que, segundo relatos que foram divulgados, estão desestruturados e com problemas nas suas funções de fiscalização. Esses recursos serviriam justamente para implementar as políticas públicas ambientais que precisam ser feitas.
Digo mais, acabo de ver que a Comissão de Constituição e Justiça está discutindo agora no Senado Federal a PEC da Transição e que nela, no inciso II de um artigo que agora me foge, está prevista a exclusão do teto para os recursos oriundos deste acordo. Então, se nós estamos discutindo aqui teto, esse dinheiro que é receita não tributária vai entrar fora da conta do Governo Federal para poder executar essa política pública. Então, observem que todos os cuidados estão sendo tomados para que o acordo seja bom e positivo.
Eu entendo a preocupação do gabinete de transição. Realmente, eles não tiveram acesso ainda aos termos da negociação. E eu quero convidar, inclusive, em nome da Mariana, da Presidente Gleisi Hoffmann e também do Dr. Jorge Messias para virem acompanhar as negociações, se quiserem.
Isso é possível, porque, afinal de contas, o que estamos fazendo ali não é para mim, não é para o Carlos Bruno, não é para a Cláudia Garcia, é para os atingidos e para o meio ambiente.
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Peço desculpas porque estourei 10 minutos do meu tempo, mas eu tentei dar uma pincelada geral nos termos do acordo. Eu acredito, estou convencido, Deputado Rogério, de que essa é a melhor solução para os atingidos, sob pena de continuarmos brigando e reclamando que os atingidos continuam fora de suas casas, que o rio continua poluído, que eles não conseguem pescar, durante mais de 30 anos, e não resolvermos nada. Assim, pelo menos, nós teríamos recursos de uma ordem jamais vista naquela região. Há condições de transformar o PIB, a economia e o meio ambiente daquela região do Vale do Rio Doce.
Eu espero ter conseguido esclarecer um pouco essa missão enorme que estamos tentando conduzir. Eu me coloco à disposição, Deputado, para as perguntas que surgirem. Quero alertar apenas que já está em curso a sessão do CNJ, no qual eu tenho assento, e eu vou pedir para me avisarem quando entrar em julgamento o processo do qual eu sou Relator, porque precisarei estar lá mesmo. Enquanto isso, eu sigo à disposição de V.Exa.
O SR. PRESIDENTE (Rogério Correia. PT - MG) - Muito obrigado, Dr. Bandeira, pelos esclarecimentos.
Eu vou passar rapidamente a palavra a outros convidados. Como o Dr. Bandeira ainda pode ficar uma parte do tempo, e ele fez uma exposição mais geral, a minha ideia é escutar alguns que são parceiros e que, certamente, também terão indagações e contribuições a dar em relação a esse período.
Eu vou passar a palavra para os companheiros do Movimento dos Atingidos por Barragens — MAB, que têm acompanhado isso, e, posteriormente, passarei para a Mariana, da Comissão de Transição. Eu sei que são elementos sobre os quais têm que se ter mais conhecimento e, com certeza, poderá haver também questionamentos a serem feitos. Depois, nós vamos repassar para os outros convidados que estão aqui presentes.
Vamos passar para os companheiros do MAB e, em seguida, para a Mariana. Vamos fazendo a nossa lista.
O Deputado Júlio tem sido muito atuante conosco também. Ele tem sido atuante nesse assunto desde a Comissão Externa de Brumadinho, a primeira que nós formamos após o crime de Brumadinho.
O SR. JOCELI ANDRIOLI - Quero cumprimentar o nosso Presidente Rogério Correia, da Comissão Externa; o Relator Helder Salomão; os representantes das instituições de Justiça, o Carlos Bruno, do Ministério Público Federal, e o Bandeira de Mello, do CNJ; a companheira da transição de Governo; os Deputados Padre João, Leleco, Júlio Delgado, Leonardo Monteiro, que estão presentes e que têm acompanhado de perto a luta dos atingidos; a Deputada Estadual Beatriz Cerqueira e as demais pessoas que estão participando on-line; e todos os atingidos que acompanham neste momento esta audiência.
O SR. PRESIDENTE (Rogério Correia. PT - MG) - Joceli, como nós falamos dos Prefeitos, e você citou a Deputada Estadual Beatriz Cerqueira, que também está on-line, permita-me cumprimentar o Prefeito Angelo Oswaldo, de Ouro Preto, que está presente conosco, e o Prefeito Aníbal Borges, de Bom Jesus do Galho. Nós vamos ouvi-los depois também, mas aproveito para anunciar a presença dos Prefeitos.
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Na condição de representante do Movimento dos Atingidos por Barragens — que já completou mais de 30 anos no Brasil, e, no caso da minha Região, a Região Sul do País, 43 anos de movimento social —, lidando com a situação de atingidos por barragens e com projetos; acompanhando os atingidos, nos últimos 17 anos da minha vida, em Minas Gerais; deparando com a situação do crime da Vale e da BHP, em Mariana, e depois, em Brumadinho, temos alguma experiência para contribuir nesse debate.
Quero dizer que é importante a fala do Bandeira quando diz que esse, talvez, seja o maior acordo ambiental do planeta, mas nós não podemos esquecer que a propaganda não é assim. Esse é o maior crime ambiental do planeta, de proporção ainda não medida. Portanto, essa é uma questão fundamental de se levar como premissa de um acordo desse tamanho. A responsabilidade de quem está trabalhando nessa causa é muito grande e não pode ter falhas. Portanto, vamos levantar algumas questões que nos preocupam na formatação desse acordo.
Primeiro, atingido ser ouvido não significa participação e, se o atingido não participar, vai dar errado para a vida dele. Eu tenho certeza disso. Foi assim na história de mais de 40 anos neste País, onde não foi garantida a efetiva participação dos atingidos, que são os melhores sabedores da causa do impacto. E o movimento social, que há 40 anos luta neste País, tem o maior acúmulo de experiências de como tratar isso.
Temos clareza neste momento histórico. E a grande questão deste momento é se se fecha o acordo antes de o Governo novo assumir ou não. A constatação óbvia de todos vocês, que, aliás, foi o motivo de se criar o Observatório no CNJ e no Conselho Nacional do Ministério Público, é que Brasil está despreparado para atuar e lidar com esse tipo de situação. Ele está despreparado.
Então, a grande questão é que esse acordo não prevê a preparação do Brasil para tratar dessa questão, que está se dando nos marcos da lógica atual, em um sistema de justiça que não dá conta e, por isso, precisa fazer um acordo. E o caminho é ficar refém. Mas não se trata de uma correlação de forças que garanta um acordo compatível, como nós conseguimos em várias regiões do País.
Segundo, o Estado está despreparado para essa questão. E vem a grande questão do Governo de transição. O MAB está participando da transição do Ministério de Minas e Energia, do Ministério do Desenvolvimento Agrário, do Ministério do Meio Ambiente, dando pitacos na Saúde. O Estado brasileiro está despreparado para lidar com o maior crime ambiental desse planeta. Se nós não fizermos uma reforma no início desse Governo agora e o grupo de transição não apontar, para dar conta, não adianta ter fundo, porque não se vai operar o fundo.
O Fundo Amazônia no BNDES está lá há quantos anos e não foi aplicado? Inclusive depois, com o Governo que boicotou a política ambiental, não saiu mais. Agora há uma perspectiva de se retomar. O Brasil foi para a COP apresentar um memorando, um protocolo, uma intenção e, dentro dessa intenção, está a questão dos crimes ambientais. Isso quem vai fazer é o novo Governo.
Portanto, se o novo Governo não estiver participando desse acordo e formulando estruturalmente o Estado brasileiro, inclusive para garantir a participação do atingido, esse acordo estará falido, será para inglês ver, será propaganda em nosso País e mais nada. Quem vai pagar a conta são os atingidos na Bacia do Rio Doce. E o povo brasileiro já está pagando a conta, porque, a cada cheia, a cada final de ano, o crime se renova. Então, a proporção desse crime é extraordinariamente maior do que está saindo na imprensa, do que está sendo negociado nas rubricas de 120, 114, e, às vezes, de 70, que apareceram.
Quando nós questionamos o primeiro acordo que foi feito, inclusive já no momento de golpe em nosso País, que foi assinado, instituindo
o Renova em 20 bilhões de reais para um fundo, o MAB foi o primeiro a questionar, foi o primeiro a denunciar no Ministério Público Federal, que abriu uma ação civil pública pedindo 155 bilhões de reais na época, o que, equiparado ao dólar hoje, passaria de 200 bilhões de reais. E está defasado esse valor.
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E a primeira tarefa da AGU que vai assumir o novo Governo é pegar a base técnica do acordo de Brumadinho, que foi insuficiente na avaliação do MAB — inclusive entramos na Justiça em relação a isso. Se pegarmos o que a Vale já acordou em Brumadinho e traduzirmos para o Rio Doce na mesma situação de proporcionalidade, passa de 200 bilhões de reais. Esse é o primeiro dado técnico.
Então, qualquer acordo que seja menor do que isso é falácia. Pode ser um montante de dinheiro de 100 bilhões de reais, mas isso não é o necessário tecnicamente para uma situação similar à de Brumadinho. Não estou falando nem dos grandes impactos de Brumadinho nem das outras questões. Então, isso é fundamental.
Por isso, o Brasil precisa neste momento — e esta Casa é responsável por isso — botar a tarefa em ordem. E a primeira tarefa é o grupo de transição apontar a insuficiência do Estado brasileiro e propor reformas ao sistema, inclusive para ele poder participar desse acordo e o Estado assumir a sua parte.
Hoje nós não temos uma política nacional ainda. Ela está parada no Senado. Lá, em Minas Gerais, nós conseguimos uma política estadual, mas aqui isso está parado no Senado.
Então, ou se aprova isso o quanto antes no Congresso, ou se faz um decreto presidencial — o que compete ao novo Governo, que poderá fazer isso nos 4 anos —, dando uma clara noção de quais são os direitos, de qual é a política, de como tratar a questão. Temos experiência acumulada e sabemos que é possível fazer isso neste momento. Há um compromisso do Lula com o MAB, com os atingidos, para fazer diferente essa situação, para reconhecer uma dívida de 2009, que até agora o Estado não conseguiu pagar. Então, contamos com isso.
Segundo, é fundamental garantir nesse acordo um sistema de governança em que os atingidos participem. E não devem participar só para saber onde o dinheiro vai ser gasto, mas também para saber a consequência que isso vai ter.
Então, as linhas da saúde e do meio ambiente têm que ter um sistema participativo, para não ser o que foi Brumadinho, ou seja, uma carta branca para o Zema fazer o que quisesse com a indenização do Estado de Minas Gerais, para ele fazer um rodoanel de quase 4 bilhões de reais para beneficiar as mineradoras, para atingir mais de 100 mil pessoas, ou seja, sob o interesse da lógica das empresas.
Não temos dúvidas de que temos de fiscalizar, como União agora, todos os passos do que está previsto, o tipo de sistema, para não repetir o que aconteceu com Brumadinho, para não desviar recursos de uma causa para outras coisas que não têm nada a ver com a situação de crimes socioambientais. Inclusive é preciso que haja dinheiro desse acordo para a União fazer o tema de casa, para reformular o Estado, os Ministérios, os operadores, inclusive os fundos, etc.
Então, é preciso que haja dinheiro, sim, para a União, para que esse tema seja discutido nacionalmente, porque não há só Mariana e Brumadinho. O Brasil está à beira de várias situações de desastres socioambientais. Estamos vendo que, a cada dia, as mudanças climáticas só interferem mais nisso. E esta é a grande questão: o Brasil está reconstruindo, na perspectiva de um novo Governo, uma nova política econômica, pensada inclusive nesse viés da questão ambiental e das mudanças climáticas. Essa é uma grande oportunidade para o País ser vanguarda na proposição de como resolver crimes socioambientais do tamanho do que estamos tendo, porque essa vai ser uma situação do mundo inteiro, pela irresponsabilidade do lucro privado dos últimos tempos.
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Primeiro, estamos propondo uma carta conjunta do movimento, das entidades que quiserem assiná-la e da Comissão Externa para oficializarmos a coordenação da transição do Governo, a fim de que não permita que esse acordo seja assinado sem o novo Governo tomar pé da situação, sem o novo Governo se preparar para atuar de forma condizente com a resolução desse problema. Nós apoiamos que esse acordo não seja assinado neste ano, mas também concordamos que não devemos começar tudo do zero. Deve haver um prazo para que o novo Governo assuma de forma célere essa tarefa e tenha participação concreta nesse acordo, assim como deve haver garantia de que a organização de atingidos, que tem experiência nesse rumo, participe das negociações. Nós não conseguimos isso em Brumadinho. Mesmo assim, nós atuamos com as instituições e conseguimos passar por essa experiência em relação a muita coisa no acordo de Brumadinho. Isso foi muito menos aceito no processo de Mariana, quando houve muito menos voz nessa experiência para acumular. Então, um dos encaminhamentos é essa proposta de carta conjunta oficial para o grupo de transição, para o Estado brasileiro ter a responsabilidade de se estruturar e se preparar para dar conta disso.
Segundo encaminhamento. O MAB já oficiou hoje todas as instituições de Justiça envolvidas e lhes fez o mesmo pedido. Esta é uma questão estratégica para o Brasil. "Se vocês assinarem esse acordo, desobrigados do processo sobre o qual nós acabamos de alertar aqui, vocês vão ser cúmplices de uma coisa que nós não gostaríamos de fazer, que é acusar o nosso sistema de Justiça, as nossas tão caras instituições de Justiça, de cometerem um erro neste momento." Oficiamos, alertamos e pedimos que não assinem esse acordo antes de o novo Governo assumir, porque isso é muito estranho. Nós esperamos 7 anos para ter esse acordo. Não é 1 mês a mais que vai mudar tudo. Então, tem que tomar pé da situação o novo Governo e tem que haver a garantia da participação de quem tem experiência para tratar disso no Brasil. Nós constatamos a grande falta de experiência no nosso País. Oficiamos todos. Rosa Weber está sabendo, foi oficiada; o Bandeira de Mello foi oficiado; todos os Ministérios Públicos; o Aras, Procurador-Geral da República... Esperamos que isso seja aceito.
Outro encaminhamento que nós propomos é que o grupo, que a Comissão faça requerimento pautando o acesso. Qual é a metodologia? Quais são os dados? Nós vimos que o relatório apontou lacunas na situação dos atingidos, e o Bandeira disse que várias coisas foram atendidas. Os atingidos não podem ter acesso por causa do sigilo e da confidencialidade, mas vocês, Parlamentares, como representantes, têm acesso. Proponho um requerimento pedindo acesso às rubricas, até porque você, Deputado Rogério, que acompanhou Brumadinho, sabe comparar e ver o que é um bom acordo e o que não é um bom acordo. É preciso ter base técnica, concreta, e saber comparar dados, no primeiro momento, para se ter isso. E também falo da metodologia. Qual é a situação? Está armado um interesse novo de desviar o processo para obras para as mineradoras ou não? Foi assim em Brumadinho. Então, como é que vai ser desta vez? Esse é um requerimento.
Por fim, o MAB se coloca à inteira disposição. Estamos debatendo fortemente a responsabilidade do Brasil neste momento. Queremos mostrar e contribuir com a nossa experiência. Estamos preocupadíssimos com o acordo de Brumadinho, tentando ver alternativas para operacionalizar o que está lá de forma que garanta qualidade e participação dos atingidos e para fazer com que tenham efeito as propostas desse acordo na vida dos atingidos, que estão preocupados.
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Não pode dar certo essa estratégia, Bandeira — você que é do Conselho Nacional de Justiça também —, de a Vale driblar o processo de ser penalizada na instância estadual, como está previsto nesse esquema, com os dois Ministros do Bolsonaro agora no Supremo. Isso é uma vergonha. O processo já poderia ter avançado, já poderiam ter sido punidos os responsáveis pelo crime, porque está comprovado que eles cometeram um crime, que é hediondo inclusive.
Há a lógica de a Vale se apoiar nos Ministros do Supremo que são do Bolsonaro, para atrapalhar o negócio, pedindo vista, enrolando. E agora o Supremo tem que se decidir a votar, para ser célere a punição da Vale lá em Brumadinho. Esse é um pedido também do movimento, reforçando aqui o pedido da AVABRUM, a associação das vítimas e dos familiares das vítimas lá em Brumadinho.
Então, esperamos que não se repitam novos crimes, esperamos que o Brasil cumpra o seu objetivo, que esta Casa ajude o novo Governo a construir, estrategicamente, uma estrutura no Estado brasileiro que garanta uma política de atingidos, que garanta que haja órgãos sérios para acompanhar as ações, que reestruture os órgãos operadores. Precisamos ter uma experiência inovadora no que tange aos crimes socioambientais no nosso País, que traga uma contribuição para o mundo de como evitar isso daqui para frente, o que vai ser, a cada dia, mais normal com o fator das mudanças climáticas e a irresponsabilidade das grandes empresas, que colocam o lucro acima da vida.
O SR. PRESIDENTE (Rogério Correia. PT - MG) - Obrigado, Joceli, que falou aqui representando o Movimento dos Atingidos por Barragem — MAB.
O meu nome é Mariana Cirne e sou Procuradora Federal de carreira e advogada pública. Estou trabalhando na transição desde o primeiro dia, tentando viabilizar e concretizar uma revisão do desmonte das pautas de direito ambiental e de direito à transparência.
O Gabinete de Transição, preocupado exatamente com o momento que estamos vivendo agora, de tentarmos compreender o tamanho do problema desses últimos 4 anos de gestão, incumbiu-me de vir aqui. Como o Presidente Lula falou na COP 27, a nossa ideia é de que o Brasil volte a ser um país socioambiental, que ele escute os movimentos e volte a ser um país que tenha uma pauta ambiental.
Faço, então, um relato do que estamos vivendo dentro do Gabinete de Transição. Estamos debruçados sobre esses últimos 4 anos e com uma tarefa árdua, porque, quanto mais solicitamos informações, mais difícil se torna obtê-las. Nós temos uma dificuldade grande de acesso às informações, os ofícios estão voltando com informações incompletas e insuficientes, faltando os principais blocos do problema.
Uma coisa importante é o motivo pelo qual eu vim aqui — e muitos dos coordenadores do GT não puderam estar presentes: a população foi retirada do processo de decisão da gestão pública federal. Então, nesse momento, os coordenadores tiveram que se subdividir para conseguir ouvir as pessoas. O GT de Meio Ambiente está virando madrugadas, ouvindo as pessoas, fazendo audiências públicas e conversando com os Estados e Municípios, porque esse diálogo não existiu nesse período.
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Nessas oitivas, as devolutivas que temos ouvido dizem respeito às estruturas dos órgãos ambientais, tanto o ICMBio e o IBAMA como o Ministério do Meio Ambiente, à ausência de articulação com os Estados e Municípios e ao problema que foi criado ao se tirar toda a sociedade civil das tomadas de decisão. Eu estou falando que, nas estruturas do meio ambiente, não há mais assento para a sociedade civil.
Diante da fala do Bandeira a respeito do tamanho do desafio, do tamanho do problema que sabemos que existe e que tem 7 anos e todo um sofrimento, nós acreditamos que o Poder Executivo Federal tem que voltar a existir como um braço a contribuir para a solução. Então, eu queria parabenizá-los por esse esforço, porque o problema é gravíssimo.
Anotei aqui todas as observações do Relator Dr. Helder e os detalhes a respeito do Conselho e pretendo inclusive voltar ao CCBB para relatar tudo o que está sendo construído, o esforço do Ministério Público Federal e dos Ministérios Públicos Estaduais. Nós acreditamos que não faz sentido, de fato, voltarmos ao zero, mas a nossa preocupação, nesse momento de transição, é que estamos trabalhando com um cenário de que não teremos clareza enquanto não houver o dia 1, com os Ministros empossados, para vermos o tamanho do estrago. É essa a verdade.
Apresento a nossa proposta de encaminhamento como Gabinete de Transição, sabendo que nós temos agora uma tarefa superárdua, que é mapear os principais alertas de grandes pautas-bombas e grandes problemas a serem enfrentados no dia 1, no dia 30 e nos cem dias de governo. Eu gostaria de propor, então, como encaminhamento, que esse tema do acordo, que já teve toda uma discussão, não seja perdido, mas que, nessa nova gestão — que começa no dia 1 com a esperança de uma perspectiva diferente, como o Joceli falou —, a sociedade civil participe, tenha voz e oportunidade, que possamos colocar esse alerta no próprio relatório final que vai ser apresentado agora no GT de Meio Ambiente.
Nós temos uma preocupação grande com as estruturas de fiscalização, as estruturas de governança, as estruturas de gestão e as estruturas de participação social, que foram desintegradas nesse Governo. Não dá para pensar em organizar e fechar um acordo sem, pelo menos, voltarmos a ter um mínimo de construção e de gestão dessa pauta.
Então, a minha fala aqui é apenas para sensibilizá-los no sentido de que temos consciência de que é muito importante o acordo. A situação é gravíssima, o problema é muito complexo e envolve um diálogo não só em âmbito federal como também em âmbito estadual e municipal e com a sociedade civil sobretudo. Temos clareza disso, já que se trata da nova tônica desse Governo.
Queremos que os movimentos sociais voltem a se sentir fazendo parte da gestão pública. É essa a ideia. Mas nós estamos num momento de tentar mapear o tamanho do problema. Então, fechar um acordo agora — sem termos a definição de quem serão os Ministros e de quem serão os grandes responsáveis por fazer essa gestão e sem termos a clareza de que vamos ter condições de contribuir, de maneira institucional, para uma solução —, parece-nos, talvez, uma tomada de decisão que não caberia neste momento.
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O SR. PRESIDENTE (Rogério Correia. PT - MG) - Muito bem, Mariana! Muito obrigado pela contribuição.
Eu quero saudar o Deputado Rogério Correia, o Deputado Helder Salomão. Para mim, é uma honra estar nesta Casa, na qual eu já estive por várias vezes, em audiências públicas, especialmente ao lado dos dois Deputados, que eu sigo no Twitter e sei que fazem um trabalho excepcional.
Quero saudar também o Deputado Leonardo Monteiro, o Deputado Padre João, que são do meu Estado, Minas Gerais. É uma honra estar com V.Exas.!
Saúdo o Deputado Estadual Leleco Pimentel, o Prefeito de Ouro Preto, o Deputado Júlio Delgado, que é da minha terra — minha filha é nascida em Juiz de Fora. Não quero deixar de saudar ninguém. Quero saudar todas as pessoas aqui presentes. Para mim, é uma honra falar após as três falas que tivemos.
Quero fazer uma saudação especial ao Conselheiro Bandeira de Mello. Eu não tenho a menor dúvida do que vou dizer. Vou dizer o que sinto em relação ao Rio Doce, mas eu já adianto, como fiz na semana passada, que, se há uma pessoa individualmente responsável — as instituições, é claro, são importantíssimas — por termos chegado aqui, em um cenário completamente arrasado, como foi o do Rio Doce, é o Conselheiro Bandeira de Mello. Sem a mediação dele, nós não teríamos chegado aqui. São 18 meses de negociações, negociações árduas!
Faço também meu tributo ao Ministro Luiz Fux, que o colocou na função. Agora a Ministra Rosa Weber o mantém, mas foi o Ministro Fux que o escolheu. O Ministro Fux já falou para o Dr. Aras que tem este acordo no coração, tem este acordo como uma questão importantíssima.
Quero saudar também minha companheira de Mesa, a Dra. Cláudia, do Ministério Público do Espírito Santo, assim como o Ministério Público de Minas Gerais, que têm sido grandes parceiros do MPF na questão ambiental.
Quero saudar meu querido Joceli Andreoli. Nós já conversamos na semana passada na PRMG — Procuradoria da República em Minas Gerais, em Belo Horizonte. S.Sa. sabe como minha visão em relação ao tema parece muito com a dele. Há muita similitude.
Quero saudar a Dra. Mariana, que conheci hoje. Além de coordenador da força-tarefa do Rio Doce, em Brumadinho, eu sou Procurador Ambiental em Minas Gerais, sou um dos quatro procuradores de Belo Horizonte. Nós nos colocamos à disposição dos senhores — sei que falo em nome da PGR e de toda a estrutura do MPF. Tenho certeza de que o novo Governo vem com muitas pretensões em se tratando da matéria ambiental, e os senhores podem saber que eu, pessoalmente, e o Ministério Público Federal somos parceiros na busca de uma melhor condição ambiental, de desenvolvimento sustentável e de economia verde para o Brasil. Eu acho que este é o futuro do nosso País. Nós temos que pensar para a frente, temos que pensar em um mundo melhor. Podem ter certeza de que nós somos absolutamente parceiros, tanto neste caso, como em todas as outras questões. Eu pretendo continuar na função. Podem contar conosco.
Quero saudar a Associação dos Familiares de Vítimas e Atingidos pelo Rompimento da Barragem Mina Córrego do Feijão — AVABRUM e todos os atingidos que estão aqui presentes. São todos absolutamente guerreiros!
Repito o que eu já disse no começo: eu atuo em Brumadinho, nas tragédias e nos crimes relacionados com o Córrego do Feijão e na Barragem do Fundão.
Ambas as tragédias são terríveis, mas eu confesso que o que mais me dói neste momento, além das mortes, sempre gravíssimas, é a situação do Rio Doce. Eu vejo as pessoas do Rio Doce como pessoas invisíveis, transparentes, esquecidas. São 7 anos da tragédia, e, se não tomarmos cuidado, ela vai virar mais uma das tragédias terríveis que ocorrem no Brasil, e nada é feito.
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Ir ao Rio Doce, ir a esses locais — o Dr. Bandeira foi, eu sei que os Deputados também foram — é uma experiência quase sociológica, no sentido de ver como as pessoas são esquecidas, como as pessoas valem pouco, como as pessoas podem ficar à margem da sociedade e ser maltratadas. Ver os pescadores do Rio Doce e do mar territorial do Espírito Santo, ver os agricultores com a terra dura, uma terra que não se consegue mais se irrigar, uma terra cheia de minério, é uma terrível tristeza.
Eu chancelo todas as falas que me antecederam. Apesar de serem contraditórias em algum ponto, eu consigo entender todas as visões. No entanto, o que eu posso colocar nestes minutos que eu vou falar é um pouco do sentimento quanto a esta questão.
Eu entrei neste caso há um ano e meio, exatamente no momento em que se iniciou a negociação. Eu tenho sentimento em relação a essas pessoas, pessoas invisíveis, pessoas esquecidas, pessoas que, se não tomarmos cuidado, vão ser esquecidas para sempre. As estatísticas que o Dr. Bandeira apresentou sobre o leito do rio são reais. Hoje em dia, mais de 70% do leito do rio já não são mais poluídos por minério da tragédia. As poluições são outras, porque, como nada foi feito, o rio continua sendo poluído.
A tragédia do Rio Doce envolve todos nós. Ela vai envolver também o MPF. Neste momento, a tragédia e o fracasso envolvem três fatores. Envolve a Renova, que foi uma boa ideia, mas é de uma completa ineficiência. Segundo dados das empresas, que nem sequer são auditáveis, a Renova gasta ao todo 24 bilhões de reais. Deste total, 7 bilhões são gastos no Novel, um programa indenizatório que não terminou, que não atendeu a ninguém, apesar, é claro, de ter tido boas intenções. No caso da Renova, quando fizeram o acordo no Governo Pimentel, no Governo Dilma, no Governo Paulo Hartung, o TTAC tinha o objetivo de resolver o problema, mas trata-se de um acordo que realmente não resolve a situação.
A Renova gasta 7 bilhões com o Novel, 3 bilhões em AFE, 2 bilhões no reassentamento, especialmente em Bento e Paracatu, principalmente no Distrito de Gesteira. Isso tudo está no site da Renova. Estes dados não são sigilosos. Eu também não vou falar de dados sigilosos, por motivos óbvios. Estes dados estão no site da Renova. Os reassentamentos de Bento e de Paracatu são terríveis, mas pior talvez seja a situação de Gesteira. Talvez Gesteira e Ponte Nova sejam dos grandes casos de racismo ambiental que existem no nosso País. A população é predominantemente negra, possivelmente tem até raízes quilombolas. O Rio Doce era famoso por ter raízes quilombolas. Os escravos tentavam fugir a partir do Rio Doce. Portanto, este reassentamento tem uma situação muito mais precária que o reassentamento de Bento e de Paracatu.
Basicamente 12 bilhões são gastos com todos os outros programas, por meio de uma gestão absolutamente ineficiente, com inúmeros problemas ambientais e socioeconômicos. Doze bilhões de reais, ao longo de 7 anos, divididos por quarenta e tantos programas, significam pouquíssimo dinheiro para cada um dos programas. Então, o cenário da Renova é péssimo!
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Ao mesmo tempo, o cenário do Comitê Interfederativo também tem seus problemas, primeiro porque o TTAC não foi pensado para o Comitê Interfederativo, de alguma forma, dialogar com a Renova. Na realidade, é quase uma conversa de surdos: a Renova faz de um lado, a CIF faz do outro. Ao mesmo tempo, muitas vezes falta no Comitê Interfederativo uma noção da ponta.
O que o Dr. Bandeira falou sobre a retirada de rejeitos... Quem vai ao Rio Doce... Recomendo a todos irem ao Município do Rio Doce, irem à Fazenda Floresta, irem a Candonga, verem o que é aquilo. Aquilo ali é uma tragédia que está ocorrendo agora para as pessoas. Morreram 19 pessoas na tragédia de Mariana, na tragédia do Fundão. Só nos últimos meses, morreram quase 10 pessoas atropeladas pelos caminhões que levam e trazem os rejeitos para a Fazenda Floresta.
Foram retirados pouco mais de 500 mil metros cúbicos de rejeitos em 7 anos. Quem diz que todos os rejeitos vão ser retirados — ainda mais agora que os rejeitos estão embaixo de mais de 70% de outros sedimentos que estão no meio do rio — mente, promete o que não entregará. Os rejeitos não serão retirados, porque não há condições técnicas de serem retirados do rio, ainda mais num prazo curto — os rejeitos não serão retirados.
Às vezes falta também saúde... Dra. Mariana estava falando sobre isso. Eu repito, estou falando de 7 anos. Não quero polemizar sobre um Governo ou outro. Estamos falando que, em 7 anos, nada ocorreu. Os estudos sobre saúde não foram feitos. Não há estudos sobre isso.
Também, para não deixar de botar o dedo na ferida, é culpa do sistema judicial, e, é claro, o Ministério Público Federal faz parte do sistema judicial. As perícias do Rio Doce começam a ser feitas agora. Vou tentar acelerar para terminar. Aí eu também quero falar de Brumadinho. O que está acontecendo nos processos criminais do Rio Doce e Brumadinho é algo terrível. O processo criminal de Brumadinho está entrando em 2023 sem competência definida, sendo que o Ministério Público Federal e o Ministério Público Estadual, em todas as instâncias, dizem que a competência é da Justiça Estadual. No processo criminal do Rio Doce, esse inegavelmente federal, provavelmente tudo prescreverá, assim como todo grande caso criminal no Brasil prescreve. Mas os crimes ambientais já estão prescrevendo. Pensem a situação! Pense, Deputado Helder! No caso do Rio Doce, os crimes ambientais vão prescrever. Não haverá punição dos crimes ambientais por razão de prescrição. Por quê? Porque o sistema legal como um todo, e é uma coisa que teremos que pensar, não se preparou para enfrentar grandes tragédias. Casos de grandes tragédias deviam ser prioridade dentro do sistema judicial, dentro do sistema de justiça. O juiz e o Ministério Público — repito que eu não quero tirar o Ministério Público dessa culpa — deveriam ser obrigados a não fazer qualquer outra coisa antes que esses casos fossem solucionados. Isso deveria ser absoluta prioridade no sistema de justiça. Infelizmente, é um problema para o futuro.
O Ministério Público Federal, junto com o Ministério Público de Minas, tem feito outros acordos na área ambiental. Nesses acordos, em alguns casos, fica alguma verba para o Ministério Público Federal definir sua destinação. Eu chamei a Reitora Sandra da UFMG, já havia chamado os outros reitores, porque o procedimento sobre a retirada de verba das universidades federais em Minas também é do meu gabinete.
Já chamei outros reitores de instituições federais em Minas e estou pretendendo entregar o dinheiro que o Ministério Público tiver desses acordos para as instituições federais de Minas Gerais fazerem os estudos necessários do que é importante para que esses problemas não se repitam.
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10:57
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Joceli, você tem toda a razão. A mudança climática é uma realidade para todos nós. Das 10 maiores enchentes da Região Metropolitana de Belo Horizonte dos últimos 60 anos, 5 foram nos últimos 10 anos. Existem quase 40 barragens em nível crítico em Minas Gerais, todas de responsabilidade do Ministério Público Federal de Belo Horizonte, por uma questão de divisão estrutural. São 40 barragens às quais eu não posso dar nenhuma garantia de que, numa chuva mais forte nesse verão, não vão também romper. Temos visto casos, como houve o caso da Vallourec, agora a rachadura que saiu na AngloGold, todos casos gravíssimos, casos esses que saem na imprensa e dos quais eu posso falar aqui em público, sem contar tudo que eu vejo pela fiscalização. Então, o cenário é realmente, sendo muito sincero, um cenário terrível.
E o pior de tudo: sobre Brumadinho, já começamos a tentar resolver do ponto de vista cível, o acordo não é perfeito. Eu até conversei com o BNDES e tenho muita expectativa de conseguirmos aprovar, com o apoio dos movimentos sociais, um bom projeto de aplicação popular do dinheiro em Brumadinho — já começa aí. Não é um acordo perfeito, mas é melhor do que não ter um acordo. Repito que isso se refere ao cível, porque o criminal, tanto em Brumadinho quanto no Rio Doce, é um cenário muito difícil e muito complicado. Temos como desafio para o futuro as tragédias que podem acontecer e temos essa chaga aberta, porque o Rio Doce é uma chaga aberta, o Rio Doce é uma ferida aberta — e é uma ferida que não conseguimos fechar. E aí, sim, nesses 18 meses de acordo, nesses 18 meses de negociação, o objetivo é tentar, minimamente — minimamente —, fechar essa ferida.
Eu não quero me repetir — acho que o Dr. Bandeira já expôs muito bem as ideias —, mas a ideia é aproveitar o que existe de bom no acordo de Brumadinho, agregar com o que sabemos que há de ruim no acordo de Brumadinho, que não foram ideias tão boas, bem-intencionadas, agregar com todas as observações do MAB, que é um grande parceiro e faz um trabalho excepcional em relação aos atingidos, e o relatório do Deputado Helder — tentar agregar isso.
Nesse sentido, quais foram as ideias pensadas? Eu vou repassá-las de uma forma absolutamente rápida, porque acho que o Dr. Bandeira já falou disso com muita clareza. A ideia é se renovar um projeto de indenização integral, que não é o Novel, porque o Novel virou um sistema de fraudes — infelizmente, virou um sistema de fraudes —, com o apoio das defensorias; é garantir um programa de recuperação econômica que entregue dinheiro na mão das pessoas, com o apoio do Ministério das Cidades. A União é essencial para isso. Eu vou, ao longo da minha fala, porque vi que a preocupação da Dra. Mariana...
(Intervenção fora do microfone.)
O Ministério da Cidadania é fundamental para esse apoio da entrega do dinheiro, no conhecimento das pessoas, o CadÚnico. Temos a possibilidade de um Bolsa Família anabolizado na região do Rio Doce. É uma possibilidade real termos um Bolsa Família anabolizado na região que é a segunda mais pobre de Minas Gerais, só perde para o Vale do Jequitinhonha. A ideia do acordo como um todo é conseguirmos trazer uma revolução para essa região do Rio Doce.
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11:01
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A ideia é, assim como existe em Brumadinho, haver um fundo de iniciativa popular, um dinheiro que a população possa dizer onde vai ser aplicado. E, eu repito, eu acho que nós já estamos criando em Brumadinho as bases para os movimentos sociais terem uma voz importantíssima no momento da aplicação desse dinheiro dos fundos de iniciativa popular. Além disso, no Rio Doce, vamos ter dois fundos. A ideia pelo menos é que também haja um fundo do Rio Doce — um fundo da União, gerido pelo BNDES — e que nesse fundo haja também uma parte significativa para microcrédito, com o apoio da Caixa Econômica Federal. Então, essas são todas ideias que têm a ver com a União.
Há também a ideia de haver um dinheiro para o saneamento básico. A ideia é que todos os Municípios da Bacia do Rio Doce — e não são só os banhados pelo Rio Doce, mas também os do entorno — tenham 100% de saneamento, um completo saneamento. Com isso, há a pretensão de se dar algum descanso para o Rio, para que finalmente esteja limpo.
Eu posso dizer, porque não é segredo — já saiu até na imprensa —, que as perícias atuais não culpam mais as empresas pela poluição do Rio Doce. A perita oficial, que é a AECOM, ainda encontrou nexo causal em relação ao mar territorial do Espírito Santo, mas não encontrou mais em relação ao Rio Doce. O Rio Doce está poluído por outras razões. Está poluído, infelizmente, em parte, por causa da desconstrução da fiscalização no Brasil, como vários outros rios no Brasil estão poluídos.
Então, a ideia é aproveitar esses valores, aproveitar esse dinheiro e tentar transformar o Rio Doce num rio exemplo no País, num rio que vai ter uma limpeza superior à dos outros — ao contrário do que é atualmente, quando ele tem uma limpeza inferior à dos outros rios, ele vai ter uma limpeza superior à dos outros.
Quero falar sobre o fundo de recuperação das enchentes. Como eu falei, tem havido enchente todos os anos. Mesmo quando a enchente não causa o rompimento de barragem, que é a tragédia total, faz as pessoas sofrerem. As pessoas em Brumadinho, no Rio Doce, nos procuram constantemente — procuram o Ministério Público Federal, o Ministério Público Estadual, as Defensorias —, em busca de uma solução. Muitas vezes, não temos como dar essa solução, porque não temos dinheiro. Nós precisamos de dinheiro para dispor desses valores, ou então entrar com as ações que, como sabemos muito bem, demoram muito. Então, a ideia é já haver um valor perene que possamos utilizar para a retirada dos sedimentos, nos casos de enchente.
Nós compreendemos que toda a população do Rio Doce sofreu, mas entendemos que agricultores e pescadores foram especialmente afetados pela tragédia do Rio Doce. Essas pessoas vêm sofrendo no seu jeito de vida por causa da tragédia do Rio Doce e a cadeia produtiva da pesca também. Inclusive, eu sei que esse é um tema importante para o Espírito Santo. A cadeia produtiva da pesca também será, saindo o acordo, prioridade no acordo do Rio Doce.
Como eu disse, saiu recentemente, na Folha de S.Paulo, uma reportagem sobre economia verde. O Brasil tem a possibilidade de revolucionar o mundo com a economia verde. Esse fundo do Rio Doce já foi pensado para ser um fundo de economia verde — e eu repito —, com o comando do BNDES. O Governo Federal vai poder definir como ele vê isso.
Sabe uma coisa em que eu penso muito, Deputado Helder? Penso em fazermos uma indústria de hidrocarbono verde no Espírito Santo com o dinheiro desse fundo.
Isso é absolutamente possível. O hidrocarboneto verde é o combustível do futuro. E, com o Espírito Santo, com (ininteligível), existe uma possibilidade enorme de isso ser feito. Está sendo feito uma agora no Norte do Rio de Janeiro, e nós vamos ter um fundo para financiar isso para o Estado do Espírito Santo.
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11:05
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Então, as possibilidades são enormes com o dinheiro que se vai ter. E é claro que faço minhas as palavras do Joceli. Isso é um acordo. A ação MPF é uma ação que absolutamente se mantém, mas é um acordo. Conseguir o dinheiro por meio do processo judicial — e eu não tenho dúvida em fazer minhas as palavras do Dr. Bandeira — é algo para os bisnetos dos atingidos.
Eu não tenho coragem de olhar no olho das pessoas que estão sofrendo neste momento e dizer que eu não vou conseguir trazer essa reparação para elas. Isso é uma coisa pessoal. Eu poderia tranquilamente dizer que vou fazer o melhor, que vou entrar com uma ação. E faço mesmo! Os resultados estão chegando. Há ATIs no Rio Doce, que ocorrem pelo esforço do MPF também. Há ATIs no Rio Doce, repito. Vão fechar Candonga. Fechando Candonga, nós conseguiremos diminuir a passagem de rejeitos ao longo do Rio Doce, nós conseguiremos voltar a ter produção na usina e será pago o imposto, que ajuda na educação e na saúde — os Prefeitos de Ponte Nova, Rio Doce, Santa Cruz do Escalvado vêm me procurar para pedir isso.
Esses são resultados reais. Mas os resultados vão ser sempre resultados de formiguinha. Por mais que nós o consigamos, o resultado final, infelizmente, por causa do sistema judiciário, do jeito que é hoje, vai demorar muito, independentemente — e faço minhas as palavras — de ter sido um tremendo acerto a criação do Tribunal Regional Federal em Minas Gerais — acho que isso também vai causar uma revolução no caso do Rio Doce — e de o Dr. Mário fazer um ótimo trabalho.
Um interlocutor, ao longo desse processo, me perguntou se teríamos como fechar o acordo só com alguns entes. E respondi que não. O acordo do Rio Doce tem que envolver a todos; tem que envolver a União, o Estado de Minas Gerais, com o Governador Zema, e o Estado do Espírito Santo, com o Governador Casagrande. Trata-se de um acordo que não é possível ser feito pela metade. Fazer o acordo pela metade é, mais uma vez, apostar no fracasso.
Eu até brinquei, ao longo desses 18 meses, que eu quero ver novos erros nesse caso do Rio Doce. Os erros antigos eu já conheço. E um dos erros antigos — e foi um erro no TTAC — foi haver o envolvimento do Executivo, mas não haver o envolvimento de Defensorias e dos Ministérios Públicos, como há agora, entendendo que esse acordo é bom, entendendo que esse acordo pode ser um avanço.
O Fórum de Municípios está, desde o começo, até por muita influência do Senador Rodrigo Pacheco — faço este tributo ao Senador —, presente, e os Municípios também vão ter um valor significativo, até porque, como dizia Ulysses Guimarães, as pessoas não vivem nos Estados ou na União; as pessoas vivem nos Municípios. Isso é fundamental.
A União já fez esses cálculos, e isso é possível. O dinheiro também será gerido pela União e vai haver um fundo perene para auxiliar o SUS no Rio Doce, sem prejuízo de a União, a partir do acordo, ter dinheiro para fazer todos os estudos relativos a danos futuros. Isso, dentro do acordo, sem esconder isso das empresas. Finalmente, a Fiocruz vai ter dinheiro. Os técnicos da Fiocruz vão fazer um grande pool com as universidades federais, que são nosso orgulho, são nosso grande sistema de pesquisa, a fim de fazerem todos esses estudos.
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11:09
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E por último, mas não menos importante, haverá ATI garantida desde o primeiro dia. As Assessorias Técnicas Independentes estarão garantidas dentro desse acordo, além de outros detalhes, como verbas, em especial para Mariana, que vão estar absolutamente dentro desse acordo. Nós entendemos que Mariana é o epicentro dessa terrível tragédia, desse terrível crime, e merece uma atenção especial por tudo. Mas, sem dúvida, a Assessoria Técnica Independente também tinha que ser uma preocupação desde agora, tinha que ser uma preocupação imediata.
Eu sei que fui além do meu tempo, mas achei que esta era uma oportunidade para colocar a minha visão do problema. Eu estou absolutamente à disposição de todos os senhores, do governo de transição, assim como o conselheiro Bandeira, que está aqui também à disposição do Parlamento, da Comissão Externa, que faz um trabalho enorme.
Faço também outro comentário. Assinar um acordo é só o primeiro passo da solução do problema — isso eu vejo em Brumadinho, porque eu não assinei o acordo de Brumadinho, mas eu o executo. E pode parecer muito, porque nós não conseguimos nem fazer acordos, mas é um pequeno passo. Executar, e bem executar, é o grande desafio. E, para isso, sem dúvida, todos nós que estamos aqui — posso dizer sem medo de errar — iremos bem executar o acordo, se Deus quiser, assim que conseguirmos assiná-lo.
O SR. PRESIDENTE (Rogério Correia. PT - MG) - Muito obrigado, Dr. Carlos Bruno, pelo acompanhamento do Ministério Público Federal lá em Minas.
O SR. LUIZ FERNANDO BANDEIRA DE MELLO - Presidente Rogério, quero só tomar a liberdade, com a autorização da Dra. Cláudia, de falar antes dela. Lá no CNJ, a Presidente Rosa Weber já alterou a pauta da reunião duas vezes, para que eu pudesse relatar o caso. Então, eu preciso realmente ir agora.
O SR. PRESIDENTE (Rogério Correia. PT - MG) - Obrigado, Dr. Bandeira.
Eu quero também enaltecer o trabalho que o Dr. Bandeira fez no período de funcionamento da Comissão Externa. Ele foi muito positivo naquilo que assumiu conosco. Fizemos visitas, ele elaborou esse planejamento e tem sido um ardoroso defensor de um bom acordo, que é o que todos, no final das contas, querem que seja feito. Agora é preciso que nós compreendamos o tempo, o prazo necessário para que isso possa ser colocado, até porque muito disso vai depender do Governo Federal, de como é que ele encara isso, como ele se assume como parte desse acordo e o coloca em execução.
Foi um pouco a esse respeito a discussão que nós tivemos também dentro do gabinete de transição, tanto com o Dr. Messias como com a Mariana, com a Presidente Gleisi Hoffmann, que é Deputada e também está por dentro do assunto, e com o Aloizio Mercadante, que é um dos coordenadores. Mas como o Dr. Bandeira já se colocou à disposição, eu acho que seria fundamental que o gabinete de transição pudesse fazer essas tratativas já, até porque, sendo assinado o acordo — e nós preferimos que isso seja feito após o Governo estar formado —, é melhor que já se tenha um conhecimento prévio do que é, porque o que nós vimos aqui é que todos querem que, de fato, isso aconteça o mais breve possível, mas com as melhores condições de ser executado.
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11:13
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Inicialmente, eu quero cumprimentar, em nome do Ministério Público capixaba, de uma forma muito respeitosa, os familiares dos atingidos e as pessoas atingidas aqui presentes.
Hoje nós damos um importante passo nessa longa caminhada, mas sabemos que a reparação não será nunca como deveria, uma vez que, como dizem cartazes que estão aqui, a vida é irreparável. Como a vida é irreparável, nós estamos hoje aqui, nessa caminhada, buscando apenas e tão somente minimizar perdas.
Eu externo o meu agradecimento ao Deputado Rogério, que me deu a oportunidade de representar a nossa Procuradora-Geral de Justiça do Estado do Espírito Santo, a Dra. Luciana Andrade. Nós viemos à noite, chegamos aqui de madrugada. Ela tinha uma agenda mais tarde, e houve uma inversão de pauta, o que a obrigou a ir mais cedo. Então, como eu estou no assessoramento do seu gabinete, eu vim representá-la e espero contribuir com o debate, acrescentando um pouco a tudo o que já foi dito por esta Mesa, por cada um dos senhores e das senhoras que estão nesta plenária.
Ao Deputado Helder Salomão, aqui presente, quero dizer que já li o relatório. Ao longo dos últimos 7 anos, o Deputado vem tendo contato com a Dra. Elaine Lima, a promotora que efetivamente está à frente do gabinete de transição, pelo Ministério Público, mas ela está, neste momento, em outra reunião de repactuação, tratando notadamente das indenizações — buscando contemplar todos os compromissos, estar em todos os espaços, sem nenhum furo do Ministério Público, nós vamos nos dividindo.
Quero parabenizar a Deputada Estadual Iriny Lopes, que está on-line, pelo trabalho feito com o Deputado Helder.
Faço um destaque ao trabalho que está desenvolvendo o Bandeira, que já esteve conosco várias vezes, em que pese ele ter saído desta reunião.
Quero dizer ao Dr. Carlos Bruno que pactuo e comungo de muito do que disse aqui. É uma luta una nessa caminhada.
Estou muito satisfeita por estar aqui com o gabinete de transição, minimizada a falta de paridade agora, não é, Dra. Mariana? Foi peculiar a saída do Dr. Bandeira e a vinda da senhora para cá, para se sentar ao nosso lado. Parabéns por sua fala. Anotei cada colocação da senhora — quando falou o Joceli, eu não estava presente.
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11:17
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Eu vou trazer tão somente algumas questões, alguns pequenos acréscimos a tudo o que já foi colocado aqui, de acordo com as anotações que eu fui fazendo.
Quero agradecer ao nosso Secretário-Executivo Paulo, porque nós sabemos que, para que uma reunião aconteça, é importante todo o trabalho daqueles que, embora nem sempre apareçam, se não existir, a reunião não se efetiva. Portanto, eu agradeço ao Secretário-Executivo Paulo.
Como eu já disse, enalteço, inicialmente, este dia. Nós estamos falando de 7 anos após o desastre. Muitas medidas reparatórias e medidas compensatórias ainda não foram efetivamente implementadas, seja por causa da complexidade do caso, é importante dizermos isso, seja por causa da dinamicidade do caso. O que eu quero dizer com dinamicidade do desastre, do rompimento da barragem? Quero dizer que este evento se perpetua. Todos os dias, o dano está ocorrendo. É importante termos clareza disso. Nós estamos vivenciando os danos diariamente.
No Espírito Santo, nós temos uma preocupação com o mar. Em Minas Gerais, a preocupação é com o rio. O Espírito Santo está sendo muito impactado com os rejeitos que descem do rio. Toda uma extensão da cadeia de pesca está sendo atingida, os pescadores estão sendo atingidos. Esta cadeia produtiva em si está tendo reflexos na parte turística e na parte alimentar. Nosso bem material, no Estado do Espírito Santo, que é a moqueca capixaba, está comprometido devido aos rejeitos. É importante lembrarmos este ponto.
Nosso colega do Ministério Público Federal mencionou a questão de gênero, a questão étnica e o racismo ambiental. É importante lembrarmos que o Porto de São Mateus, onde desembarcou grande parte dos negros escravizados, foi o último no Brasil a receber clandestinamente negros escravizados. Quando nós pensamos que São Mateus está incluído entre os 11 Municípios do Espírito Santo que estão sofrendo com este desastre, nós temos a questão deste porto clandestino, mesmo após o tráfico no Brasil ter sido extinto.
É importante dizermos que são 11 Municípios no Estado do Espírito Santo atingidos, 4 diretamente na calha do Rio Doce, Marilândia, Baixo Guandu, Colatina e Linhares. Nós também temos que voltar nossos olhares para os rios que não estão na calha, que são mais sete, que vão colhendo todos esses danos. Eu quero nomeá-los, em respeito aos nossos munícipes do Espírito Santo. São eles: Conceição da Barra; São Mateus, um dos Municípios onde havia o porto clandestino; Aracruz; Fundão; Serra; Sooretama; e Anchieta, que já sofreu com a Samarco em desastre no passado. Temos, ainda, o Anchieta incluído neste rol.
É importante dizer que o olhar do Ministério Público capixaba está todo voltado para a garantia da reparação aos atingidos — a reparação ambiental. Foi lembrada aqui a ausência da população dos atingidos. Não sei se é do conhecimento de todos, mas nós iniciamos, bem recentemente,
a implementação da assessoria técnica do Estado do Espírito Santo, Deputada. Esta assessoria técnica tem o objetivo de auxiliar realmente os atingidos, que não têm acesso a todos estes dados. É através desta assessoria que nós vamos poder dizer que os atingidos começam a alcançar a paridade, quando eles vão ter as informações, bem como este relatório e estes dados sigilosos, até para melhor entender o caso e pactuar. É importante dizer que a própria comunidade escolheu a assessoria técnica. No Espírito Santo, é uma assessoria técnica única.
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11:21
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Dra. Mariana, não sei se a senhora já tem o contato da Dra. Elaine, mas, como nos falamos antes do início da reunião, a senhora terá o contato dela, que está à frente disso.
Quero dizer que nós sabemos que esta questão dos rejeitos é quase impossível, tecnicamente falando. Portanto, ela não pode ser minimizada. Nós estamos com ações de monitoramento e de reparação de tudo o que vem sendo feito para a biodiversidade marinha. As medidas são mitigatórias — não temos outra expressão. É tão somente mitigatória do mar, através do estímulo da biodiversidade do Rio Doce. É assim que nós vamos conseguir mitigar os danos no Estado do Espírito Santo. Nós temos que melhorar a qualidade do Rio Doce, que vai acabar desembocando no mar territorial do Estado do Espírito Santo.
Finalizo dizendo que o grito de socorro e de esperança aqui trazido é acolhido pelo Ministério Público do Estado do Espírito Santo. Eu fiz questão de pegar no meu celular o número de reuniões em que a Dra. Elaine Lima já esteve presente: exatamente 320 reuniões ao longo desses 7 anos buscando esta repactuação.
O SR. PRESIDENTE (Rogério Correia. PT - MG) - Nós é que agradecemos, Dra. Cláudia, as contribuições. É importante o Ministério Público dar sua contribuição naquilo que já vem fazendo do processo de discussão desta proposta de repactuação.
Eu vou passar a palavra ao Deputado Leonardo Monteiro, que a solicitou. Em seguida, ouviremos o Prefeito Angelo Oswaldo, que está participando virtualmente. Depois, eu vou reorganizar a lista e pedir a S.Exas. a diminuição do prazo para 5 minutos, porque já são 11h30min, pois os oradores inscritos são muitos. Eu acho que nós já avançamos bastante no debate e precisamos ter as conclusões depois dos encaminhamentos.
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11:25
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Eu estou praticamente morando no CCBB já faz alguns dias. Quero me colocar à disposição de todos os que quiserem dialogar e discutir. O gabinete de transição está tendo esta preocupação. Nós temos uma série de audiências a serem ouvidas. No dia 8, há uma audiência geral de oitiva para todos os que quiserem participar desta pauta. Faço este convite a todos e me coloco à disposição.
O SR. PRESIDENTE (Rogério Correia. PT - MG) - Obrigado, Dra. Mariana.
Fica já a aprovação de uma reunião nossa com a comissão de transição, para que nós possamos levar a carta que foi sugerida pelo MAB e fazer as tratativas com o próprio CNJ e o Supremo Tribunal Federal, para aprofundarmos os debates em torno do conteúdo do que é o acordo, do qual nós queremos ter conhecimento. O Governo de transição, obviamente, no nosso entendimento, deve ser quem assina, com os Governos dos Estados, este acordo. Deve ser o próximo Governo.
O SR. PRESIDENTE (Rogério Correia. PT - MG) - Obrigado, Dra. Mariana.
O SR. PRESIDENTE (Rogério Correia. PT - MG) - Pois não, Dra. Cláudia.
A SRA. CLÁUDIA GARCIA - Quando eu falei do relatório do Deputado Helder, eu recebi uma mensagem, mas não concluí minha fala. Nós temos acompanhado o relatório, foi lido com muita atenção por todo o gabinete PGJ. Quero parabenizá-lo, porque é realmente um relatório de fôlego. Eu só queria acrescentar isso.
O SR. PRESIDENTE (Rogério Correia. PT - MG) - Obrigado.
O SR. LEONARDO MONTEIRO (PT - MG) - Eu quero cumprimentar o Deputado Rogério Correia, Coordenador da nossa Comissão.
Quero cumprimentar o Relator Helder Salomão e parabenizá-lo pelo relatório, que foi produzido garantindo a participação popular, a participação dos atingidos. Ele, pessoalmente, esteve junto com o Deputado Rogério Correia visitando toda a comunidade da Bacia do Rio Doce, da Calha do Rio Doce.
Eu quero cumprimentar os demais colegas Deputados que participam desta audiência, como o Deputado Padre João. Eu quero cumprimentar a todos os atingidos que estão participando desta audiência pública e, sobretudo, registrar minha solidariedade a Brumadinho, que sofreu dramaticamente aquela tragédia, aquele crime.
Eu quero pedir desculpas. Não vou citar todas as autoridades, até para poder aproveitar mais o meu tempo, que foi reduzido para 5 minutos.
Eu quero parabenizar o Conselheiro Bandeira de Mello pelo acompanhamento, pelo estímulo à negociação. Com a participação dele e do Ministro Fux, foi possível encaminhar este acordo — nós vemos que está bem encaminhado. Acho também importante concluirmos este acordo, quem sabe, depois de o novo Governo assumir. Sem dúvida nenhuma, faz sentido nós, que já esperamos tanto tempo — no nosso caso, 7 anos —, esperarmos mais alguns dias e alguns meses para concluirmos este acordo.
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11:29
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Eu anotei todas as falas, falas extraordinárias, do ponto de vista da contextualização desta questão do crime em Fundão, em Mariana, das consequências dramáticas que vive a Bacia do Rio Doce, a Calha do Rio Doce, sobretudo nosso Rio Doce.
Eu estou plenamente de acordo com o que disse o Dr. Carlos Bruno. A situação do Rio Doce é dramática. A maioria aqui sabe que a região leste de Minas Gerais, a Bacia do Rio Doce, foi a última região do Estado explorada. Portanto, nós somos a região mais nova do Estado, entretanto somos a região que se encontra num alto processo de desertificação. Nós já vínhamos sofrendo as consequências não só do crime em Mariana, mas também da forma indevida como foi explorada nossa região, a região próxima à divisa do Espírito Santo: Aimorés, Resplendor, Valadares, a região leste de Minas.
Depois, com a introdução da estrada de ferro Vitória-Minas, que se transformou na grande Vale do Rio Doce, houve a destruição da mata, o ataque aos índios que viviam naquela região. Hoje, nós temos resquícios, que são os Krenaks, que ainda estão na região de Resplendor, mas, de uma forma brutal, foi completamente destruída aquela região, matando os índios, tirando a mata que alimentava os índios que viviam na região. A madeira considerada "madeira de lei", entre aspas, foi jogada no rio e levada para o mar, para ser exportada para a Europa. O restante foi queimado nos trilhos e na Maria Fumaça, através das máquinas da Vale do Rio Doce.
Hoje, nossa região é famosa no Brasil inteiro por "exportar" pessoas que vão morar em outros países, até mesmo nos Estados Unidos, porque as pessoas, nossos parentes e nossos vizinhos não suportam mais morar naquela região! Depois, veio o crime em Mariana, que foi o ápice da destruição na nossa região.
Portanto, hoje, a região do Vale do Rio Doce, a Bacia do Rio Doce, precisa de reparação. Nós não podemos abrir mão disso. Eu acho que são importantes os recursos oriundos deste acordo. Aliás, em Minas, eu cresci escutando que mais vale um bom acordo do que, às vezes, uma pendenga na Justiça, seja Estadual, seja Federal, seja Municipal. Para nós, isso é fundamental.
Nós já conseguimos pactuar este aspecto no âmbito da nossa Comissão, em todas as audiências públicas que fizemos, de Mariana ao Espírito Santo. É importante que os recursos decorrentes deste acordo fiquem na Bacia do Rio Doce. Lá, nós temos problemas sérios para resolver, que são justamente a recuperação ambiental, ponto que foi colocado aqui, além de aspectos relacionados com a saúde. Praticamente todas as cidades que estão na Calha do Rio Doce não tomam a água que é colhida no Rio Doce. Em Governador Valadares, por exemplo, uma cidade com 300 mil habitantes, as pessoas compram água mineral.
Quem não tem condição de comprar água mineral, às vezes, busca água numa mina que também pode estar contaminada pelos minérios oriundos da Vale do Rio Doce.
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11:33
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Quanto à capacitação, as pessoas precisam ser preparadas para outra forma de trabalho. Como o próprio doutor colocou aqui, os agricultores familiares não conseguem produzir mais; os pescadores não têm mais como pescar; os areeiros não têm mais areia para tirar do Rio Doce; os índios estão vivendo numa condição difícil na Bacia do Rio Doce. Portanto, precisamos pensar em investimento, em desenvolvimento sustentável, inclusive na questão verde.
Hoje nós temos alguns instrumentos que podem ser aproveitados. A própria universidade federal construiu um embrião lá. A Universidade Federal de Juiz de Fora tem um campus em Governador Valadares funcionando com dez cursos. A nossa proposta no relatório é criarmos a Universidade Federal do Vale do Rio Doce — talvez compreenda os dois Estados, Minas Gerais e Espírito Santo, com sede em Governador Valadares —, para garantir condições de investirmos no desenvolvimento daquela região, com pesquisa, com capacitação dessas pessoas que não podem mais exercer a sua atividade.
Entidades como a MAB e como a Cáritas são movimentos sociais com um papel importante, que têm contribuído muito para essa discussão do novo acordo, da nova repactuação com a nossa Comissão da Câmara dos Deputados. Então, eu queria reafirmar a necessidade de construirmos as condições para que o novo acordo atenda, de fato, à Bacia do Rio Doce e, sobretudo, à Calha do Rio Doce. Não pode ocorrer como em Brumadinho, que dividiu com o Estado todo. Pode ter parecido um acordo importante o de Brumadinho, mas não atendeu, de fato, à bacia do rio que precisava ser atendida.
Portanto, Deputado Rogério, quero parabenizar V.Exa., a nossa coordenação da Comissão, o Deputado Helder Salomão, nosso Relator. Também quero colocar o nosso mandato à disposição para continuarmos as discussões e os encaminhamentos, para que esse novo acordo alcance, de fato, os atingidos pelo crime acontecido na Barragem de Fundão e em Mariana e que, sobretudo, os recursos fiquem na Calha do Rio Doce e na Bacia do Rio Doce.
O SR. PRESIDENTE (Rogério Correia. PT - MG) - Muito obrigado, Deputado Leonardo Monteiro.
Pessoal, eu vou ser mais rigoroso no tempo, porque ainda temos muitos convidados. Vocês nos desculpem por apressá-los, mas temos que fazer os encaminhamentos depois.
Hoje ainda temos uma visita ao Supremo Tribunal Federal para ver o caso de Brumadinho, que é também muito importante. O processo criminal não pode sair de Minas, voltar à estaca zero, para ser tudo julgado de novo na esfera federal. Então, será uma audiência importante. Pretendemos também levar para a Ministra Cármen Lúcia o resultado dessa nossa reunião hoje, solicitando a ela atenção a esse acordo, para que seja assinado com conhecimento público dos atingidos, dos Parlamentares e assim por diante. Trata-se de uma reunião importante, que está marcada para 13h30min.
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11:37
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O SR. ANGELO OSWALDO DE ARAÚJO SANTOS - Muito obrigado, Deputado Rogério Correia. Quero lhe apresentar a nossa saudação, o abraço de Ouro Preto e as congratulações por esta iniciativa tão marcante. Estou aqui com o Chiquinho de Assis, Secretário de Meio Ambiente de Ouro Preto, e com o nosso companheiro Pedro Moreira, da Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Habitação.
Nós estamos empenhados no reconhecimento de Ouro Preto, por via judicial, como Município atingido. Se a Barragem de Fundão está no Município de Mariana, toda a planta da Samarco, a Vila Residencial Samarco, as minas Timbopeba e Germano, da Samarco, acham-se no Município de Ouro Preto, que foi atingido brutalmente no seu quadro socioeconômico e no seu chão minerado e não teve as devidas compensações. Só agora, recentemente, com o reconhecimento da 12ª Vara da Justiça Federal de Belo Horizonte, é que nós passamos a ser considerados e estamos trabalhando juntamente com os demais Municípios da Bacia do Rio Doce, Municípios irmãos de Minas Gerais e do Espírito Santo.
Então, eu quero reafirmar essa posição de Ouro Preto como Município atingido, Município vitimado, Município solidário com as ações municipalistas no sentido dessa reparação. Esperamos contar com o apoio da Assembleia Legislativa, da Câmara dos Deputados, do Ministério Público de Minas Gerais. O Dr. Jarbas Soares tem tido uma ação firme em nosso favor, assim como o Conselheiro Bandeira de Mello, representando o CNJ, que tem também contribuído muito para que haja o esclarecimento da situação e para que nós possamos alcançar um acordo realmente compensador para os Municípios em primeiro lugar, porque o chão atingido é o chão municipal.
Quando se fala desse grande desastre — eu o chamo de desastre da Vale, da BHP e da Samarco, e não de desastre de Mariana —, eu lembro que todos os dias, Mariana e Ouro Preto repetem esse desastre porque jogam diariamente todo o seu esgoto no Rio do Carmo, que é o rio da fundação das Minas Gerais no final do século XVII, que passa por Ouro Preto, por Mariana e que vai desaguar no Rio Doce. Portanto, todos os dias, temos repetido um desastre ambiental de grande monta.
É preciso que esses recursos de reparação venham também contemplar o esgotamento sanitário e o saneamento básico dos Municípios que estão no Alto Rio Doce, como Ouro Preto, Mariana e os demais Municípios da região. É importantíssimo que isso seja devidamente tratado e que essa compensação atinja os Municípios e traga essa recuperação ambiental, social, econômica e cultural, que começa com o saneamento básico da qualidade dos rios da Bacia Hidrográfica do Rio Doce.
Eu quero cumprimentá-lo, Rogério Correia, pelo seu trabalho, assim como toda a Comissão. Quero saudar também o Deputado Leonardo Monteiro, o Deputado Júlio Delgado, o Deputado Helder Salomão, do Espírito Santo, o nosso querido Padre João e o Deputado eleito para a Assembleia de Minas Gerais, Deputado Leleco Pimentel, ouro-pretano, que vai representar Ouro Preto na Assembleia e que tem essa bandeira desde sempre.
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11:41
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Nós esperamos alcançar essas metas o mais rápido possível. Como disse Leonardo Monteiro, nosso Deputado do Rio Doce, é muito importante que esse acordo traga logo esses recursos, que isso não fique se arrastando e que essa compensação seja feita já para alcançar as gerações atingidas pelo desastre de 5 de novembro — aliás, é o Dia Nacional da Cultura — de 2015. Já são 7 anos de expectativas.
O SR. PRESIDENTE (Rogério Correia. PT - MG) - Muito obrigado, Prefeito Angelo Oswaldo. Estamos atentos às questões de Ouro Preto. O Deputado Leleco, também ouro-pretano, já está aqui conosco e atento aos assuntos do Município. Nós sabemos do valor desse acordo para Ouro Preto, que reivindica também uma política de saneamento condizente com a importância que tem o Município. Ouro Preto sofre muito com a ausência de saneamento, o que precisa, inclusive, ser remunicipalizado, conforme o Prefeito já conversou comigo e me lembra aqui o Deputado Leleco. O Deputado Padre João manda um abraço, Prefeito.
Eu fiz questão de convidar os Prefeitos também para vermos a angústia que eles vivem e a necessidade de agilizarmos esse processo e representarmos bem os interesses dos Municípios neste caso do crime que a Vale cometeu. Aliás, o crime foi da Samarco, que é a Vale mais a BHP Billiton, duas das maiores mineradoras do mundo. Isso faz 7 anos e meio, e ainda está sem solução. É realmente algo que machuca, dói. Então, nós temos que cuidar bem dessa repactuação, para que essas mineradoras paguem pelo crime cometido.
Se o Prefeito Aníbal não conseguir entrar agora, nós passamos à frente. Ele está on-line, mas não abriu o microfone. Assim que ele estiver em condições de entrar, é só fazer o contato.
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11:45
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O nosso Município, por exemplo, foi atingido no Distrito de Revés do Belém, onde há 23 lagoas, que são interligadas ao Rio Doce. Hoje nós temos um caso muito sério na questão da saúde. Nós temos mais de 120 crianças com autismo, uma consequência da contaminação da água. O pessoal toma banho no lençol freático das lagoas e, às vezes, bebe da água da lagoa e do Ribeirão do Boi. Gostaríamos que essa indenização fosse uma reparação justa, porque os Municípios pagam caro por isso. Além disso, foram prejudicados todos aqueles que plantavam na margem do Rio Doce.
Parabenizamos o senhor e todos aqueles que estão nesta luta para que essa indenização seja uma reparação justa aos Municípios. Nós precisamos realmente atender a Revés do Belém na questão da saúde. Hoje nós temos muitos problemas. Essa é uma população carente. O Município é próximo a Ipatinga. Ele está a 15 quilômetros apenas de Ipatinga e a 52 quilômetros de Bom Jesus do Galho. Então, a situação é difícil, mas temos que dar todo o atendimento a essa população, com remédios, com assistência. Há o CRAS para pessoas que perderam muitas coisas e muitos recursos. Por exemplo, muitos não podem mais vender o peixe que pescam no Rio Doce. Esse foi um grande prejuízo que a nossa população teve. Então, parabenizamos o senhor por este trabalho.
Queremos apoiar essa reivindicação dos Prefeitos das cidades. Registro o nosso muito obrigado. Desejo que Deus nos abençoe para que o nosso povo possa ter saúde, pelo menos, que é dom de Deus. A vida é o dom maior que Deus nos deu. Queremos fazer parte também dessa briga e dessa luta. Como são 7 anos de sofrimento do nosso povo, foi feita a proposta de pararmos o trem em Valadares, para que a Vale, então, pudesse se sensibilizar com os problemas e os danos causados às cidades, aos Municípios, que ainda sofrem as consequências desse desastre de Mariana.
O SR. PRESIDENTE (Rogério Correia. PT - MG) - Obrigado, Prefeito. Nós é que agradecemos sua contribuição. Mando um abraço para todos os munícipes de Bom Jesus do Galho, da nossa querida Minas Gerais.
O SR. ANÍBAL BORGES - Inclusive, nós tivemos agora uma enchente que inundou Bom Jesus do Galho. Isso foi consequência de todos esses desastres no nosso Rio Doce, que é limite do nosso Município, assim como Marliéria. Nós estamos bem próximos de Ipatinga. Estou aqui perto de Caratinga. Então, nosso Município é muito grande e nos dá muito trabalho. Graças a Deus, já temos o auxílio em nosso Município da CENIBRA, que nos ajudou a limpar a cidade. Nós tiramos mais de 400 caminhões de barro da cidade.
O SR. PRESIDENTE (Rogério Correia. PT - MG) - Nossa!
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O SR. LEONARDO MONTEIRO (PT - MG) - Quero registrar a minha solidariedade, Aníbal. Pode contar conosco.
O SR. PRESIDENTE (Rogério Correia. PT - MG) - É o Deputado Leonardo Monteiro falando, Prefeito.
O SR. PRESIDENTE (Rogério Correia. PT - MG) - Prefeito, pela proposta que foi citada aqui pelo Dr. Bandeira e pelo Dr. Carlos Bruno, do Ministério Público Federal, também seria criado um fundo para que nós pudéssemos socorrer os Municípios nesses casos de enchentes, porque isso vai continuar existindo. A mesma coisa tem acontecido no Rio Paraopeba, lá em Brumadinho, porque o rio fica estreito e raso com essa lama que foi depositada. Então, as enchentes são maiores e têm prejudicado muitos Municípios.
Parabenizo o Deputado Helder e o Deputado Rogério pela organização da audiência, atendendo a um pedido nosso feito lá atrás, ainda no primeiro turno eleitoral. Nós não sabíamos qual seria o resultado eleitoral, mas naquele momento já estávamos preocupados com movimentações apressadas para garantir esse acordo ali nas portas da eleição. É um movimento parecido com o que está sendo feito agora, com uma certa pressa que não se justifica muito.
Quero agradecer e parabenizar todo mundo que está nos acompanhando no Youtube, nas redes sociais, todos os atingidos, especialmente os parceiros e os amigos do MAB.
Eu queria trazer só alguns pontos conjunturais, porque foi falado muito sobre a pressa em fazer o acordo agora no final do ano, mas as mudanças climáticas e os fatos políticos estão aí, e isso altera as coisas. Então, o acordo precisa estar em consonância com isso. Esse acordo vem se rastejando há quase 2 anos, sem a participação dos atingidos. Tivemos várias tentativas de participação — a Comissão Externa é uma delas —, em que todos contribuíram muito, mas o fato é que não existe participação dos atingidos nas mesas, não sabemos os conteúdos para além do que foi falado hoje mesmo. Então, os acordos estão, sim, sendo feitos às escuras. Apesar de aparentemente boa parte da nossa pauta estar sendo contemplada, nós não tivemos de fato poder de participação.
Dito isso, eu queria trazer dois fatos mais recentes. Inclusive, o primeiro é o deste momento em que as enchentes assolam grande parte do Brasil, em especial boa parte da região atingida do Espírito Santo. Aí também quero me solidarizar com todas essas famílias. Segundo o boletim de domingo da Defesa Civil, mais de 4 mil famílias no Estado do Espírito Santo estão desabrigadas ou desalojadas, boa parte no Município de Linhares, tanto no centro de Linhares como em comunidades ribeirinhas da foz do Rio Doce — Regência e Povoação estão perdendo muita coisa —, além de muitas comunidades de Colatina. Inclusive, agora houve o rompimento de uma barragem privada lá que afetou uma comunidade rural.
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Há, então, esse fato das enchentes. Por que estou trazendo isso? Porque, além de a enchente, por si só, ser um problema ambiental e social, nós estamos falando de uma água contaminada, e não de qualquer água. É a água do Rio Doce que está entrando na casa de famílias que, a princípio, não eram diretamente atingidas, mas agora estão sendo. Então, boa parte ou, pelo menos, metade das 4 mil famílias que estão sendo atingidas pelas enchentes vive na beira do Rio Doce. A água que está entrando na casa delas está contaminada por metal pesado.
Eu queria mencionar o estudo mais recente que tivemos, de uma perita judicial. Não é um estudo independente dos atingidos, é bom ressalvar. Não tivemos isso até hoje. As assessorias técnicas que conquistamos agora, depois de muita luta, como já foi dito, ainda vêm podadas por questão da elaboração de produtos. E, justamente por causa disso, seguimos tentando destravar essa questão dos estudos independentes. Estamos também seguindo num diálogo com a FIOCRUZ, que, em conversas recentes conosco, tem apontado preocupação com os resultados desse estudo que citei, que, repito, não são independentes e não são plenamente confiáveis por parte dos atingidos. Não acompanhamos esse processo de elaboração e de execução, mas os resultados são preocupantes.
O mercúrio pode causar problemas cognitivos e neurológicos, em especial, às crianças e às gestantes atingidas. Uma pesquisadora da FIOCRUZ, companheira nossa, disse que, se a gestante ingerir pescado e água com esse mercúrio, esse contaminante ultrapassa a placenta. Ele pode atingir o cérebro do feto e a criança nascer com problemas cognitivos ou neurológicos, desenvolvendo isso no decorrer de toda a vida. Nos adultos pode causar problemas de visão e de audição, perda de sono, aumento de agressividade e perda de coordenação motora.
Estamos falando de famílias ribeirinhas. Elas têm como tradição a cultura da pesca e vivem da pesca. São pessoas que consomem de 50 gramas a 200 gramas de pescado por semana. Elas estão sempre em contato com essa água. Para se ter ideia, quem consome 200 gramas de pescado por semana — quem consome pescado entre 2 e 3 vezes por semana já ultrapassa esse índice — está 8 vezes acima do que é recomendável quando há mercúrio.
Essas são informações novas. Como as portas estão fechadas, não sabemos dizer em que ponto as informações dos contaminantes e das enchentes estão sendo levadas em consideração na mesa da repactuação, que se arrasta há quase 2 anos. Não havia essas informações no ano passado e não havia agora, antes das eleições, quando se tentou fechar esse acordo às pressas. Então, acho que é prudente e de bom tom jogar essa discussão com esses elementos para o ano que vem, a partir das equipes de transição.
É sempre engraçado esse argumento da pressa. Eles sempre têm pressa. Geralmente, justifica-se a não participação do atingido por causa da pressa, mas já se completaram 7 anos do rompimento da barragem, e faz quase 2 anos do último acordo, que é o que mais se arrasta. Temos que torcer para que ele não seja o mais vergonhoso de todos até agora, porque 2 anos é um tempo muito longo. Não viabilizar a participação dos atingidos pelo argumento da pressa, em 2 anos, não dá para acreditar.
Só para finalizar, pois meu tempo já acabou, vou falar da questão da pesca no Espírito Santo, que é fundamental. Nos estudos que apresentei aqui e de que falei rapidamente, constatou-se que boa parte dos mais contaminantes está no litoral. Os mais contaminados são peixes do litoral, que são o topo da cadeia. São peixes, de fato, muito difundidos na cultura do povo do Espírito Santo.
Como tivemos a retomada do Auxílio Financeiro Emergencial — AFE agora, e foi uma luta importante nossa, com o Ministério Público Federal ajudando bastante, eu queria falar um pouco sobre isso.
São mais de 30 mil famílias beneficiadas com essa retomada. Esse auxílio foi cortado pela 12ª Vara Federal durante a pandemia. Agora, nós conseguimos com a luta, com a ajuda das instituições, retomá-lo. Ainda assim, o número de 30 mil famílias não chega nem perto do montante de famílias cadastradas, inclusive reconhecidas pelo Novo Sistema Indenizatório — NOVEL. Isso é muito questionável. Mas, como o NOVEL está abrindo a escala de quem é atingido e de quem não é, é preciso reabrir esse debate também. Essas 30 mil famílias retomadas com o AFE ainda são muito incipientes, comparativamente ao tamanho do todo. A própria Fundação Renova diz que, entre Dano Água, Dano Geral, AFE e NOVEL, ela já pagou mais de 400 mil atingidos, e 30 mil famílias representam pouco mais de 10% disso.
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Quero terminar falando do programa de retomada da pesca, que não foi aplicado de forma nenhuma. É o Programa 16 da Renova, que teve a adesão de 0,5% dos atingidos cadastrados e deve ir de 2015 até 2027. Ele tem uma linha para associativismo em que, nesse período todo, trabalhou apenas com quatro entidades. Há ainda o programa de retomada econômica chamado Cultivando, em que nenhuma unidade produtiva foi implementada. Esse programa todo, ainda assim, sem ter feito nada, aplicou 12% de um orçamento que é de pouco mais de 33 milhões de reais, valor totalmente incipiente. Os Deputados de Minas, as (ininteligível) que atuam no Paraopeba sabem que ali só se fala em bilhões de reais. Os valores são muito maiores para haver uma reparação de fato nesse campo de retomada econômica.
Por que eu estou dizendo isso? Não sabemos se essa questão está sendo discutida na repactuação, mas sabemos que vivemos já há 6 anos sem o Ministério da Pesca. O apontamento é que se vai retomar o Ministério da Pesca ou que se vai retomar a Secretaria Especial da Pesca. O tema da pesca, do ponto de vista econômico, é tão importante quanto a saúde, tão importante quanto as moradias que não foram feitas, tão importante quanto o tema do meio ambiente e da contaminação, porque é a mola econômica do litoral capixaba e da Bacia do Rio Doce que foi afetada.
Eu queria terminar falando sobre esse dado — desculpem-me, Deputado Rogério, Deputado Helder, porque eu passei do tempo —, porque não tem como levarmos à frente uma repactuação séria, sem ter órgãos sérios ligados ao setor da pesca. Não que os técnicos que estavam lá não fossem sérios, mas esses órgãos foram desmontados. O apontamento que nós temos agora é a retomada dos órgãos da pesca, assim como a retomada dos órgãos ambientais.
Então, para termos esses eixos bem consolidados na repactuação — da pesca, do meio ambiente, da saúde —, é preciso ter esses órgãos fortes. E isso nós vamos conseguir a partir do dia 1º de janeiro. O Ministério da Pesca é fundamental, para além do que já foi dito, para os atingidos.
Fazer um acordo de fim de ano sem a participação dos atingidos, depois de 2 anos de acordo, de pandemia, de eleição, é no mínimo vergonhoso. Quem está envolvido não quer essa pecha para si. Vale a pena retomar esse debate com a participação efetiva dos atingidos a partir do ano que vem, acompanhados pelas suas assessorias técnicas e pelo Governo Federal reestruturado.
O SR. PRESIDENTE (Rogério Correia. PT - MG) - Obrigado, Heider, pela participação na direção estadual do MAB do Espírito Santo.
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Nosso cumprimento também às mulheres. Não à toa, a luta começa com o artigo feminino, e a AVABRUM é de mulheres. A nossa saudação às companheiras, que não deixaram de trazer uma fotografia que deve, no mínimo, incomodar, para não dizer constranger. Muitos são cúmplices de um assassinato que continua impune.
Também deixo nossa saudação a D. Vicente, que talvez seja a vítima mais recente dessa coação, da forma desenfreada como a mineração vem atuando no Brasil, em especial, em Minas Gerais. Nós nos solidarizamos e também nos colocamos aqui como voz para ele. Se eles não têm medo de ameaçar com um revólver um bispo, imaginem os que não estão sendo vistos.
Nossa saudação ainda às famílias, a partir de Bento Rodrigues, de onde também trazemos o símbolo maior da morte — e são mais de 100 mortes depois das 19 pessoas que morreram sem ver qualquer reparação ou justiça feita.
A partir das oitivas do relatório do nosso companheiro Helder Salomão, eu fiz questão de trazer uma denúncia da "minerocorrupção", da forma como ela se estende por toda a Bacia do Rio Doce, e, sobretudo, como o crime compensou no Legislativo Municipal, entre Prefeitos e, agora, Deputados. Eu já dizia naquele dia, em Mariana, que o acordo já estava sendo vendido, Joceli — eu deixei para citar você agora —, com valores para candidaturas. Algumas vingaram, em outras, faltou um pouquinho de voto, mas vergonha na cara não faltou.
Então, nós estamos aqui, no pós-eleição, podendo denunciar isso concretamente. Mas eu acho que nós temos que encontrar mecanismos de mensurar o nível de corrupção de que nós estamos tratando aqui. É claro que vemos o modus operandi quando se gasta 2 bilhões de reais em uma obra sem casa. Eu, que sou representante de sem-teto, digo que, com muito menos e por autogestão, nós entregamos casas com 1 ano, 2 anos, feitas pelo povo, sem empresa, com valores de 60 mil reais, 70 mil reais. Eu posso dizer, então, que ali está escancarado o modus operandi que a Renova assumiu como método.
Agora há pouco eu estava vendo uma reportagem, na revista Fórum, sobre a BHP, que pede para ser incluída como partícipe no processo da Vale no Brasil, para ficar livre na Inglaterra. Ela acha que há duplicidade de cobrança e diz que a Renova é o melhor exemplo de que estão sendo pagos aos atingidos os valores e reparado o crime que ela cometeu. Agora nós temos que parar de falar só na Vale, porque parece que, com complexo de vira-lata, só falamos mal de nós, mas temos gente na Europa e no exterior. Essa BHP Billiton é tão bandida quanto a Vale.
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Agora, dizer que o Zema está doido para fechar esse acordo, Rogério? É claro. Um Governador que manda minerar debaixo do Palácio Tiradentes, que destrói os conselhos — e acabamos de ver conselheiros sendo denunciados e indiciados por crime, por corrupção —, eu estou falando dela, da corrupção e da "minerocorrupção" a que nós estamos assistindo atônitos.
Não posso deixar de falar disso. Vi que no relatório consta essa minha fala, querido companheiro Deputado Federal Helder, combativo. A Iriny também está apoiando a luta, assim como a Beatriz, no Estado, e o Rogério, o Padre João e o Leonardo, que estão aqui. E eu queria trazer esse elemento. Nós precisamos de mecanismos na Justiça, porque as denúncias são graves. Recentemente, eu fui ameaçado na Câmara Municipal de Ouro Preto por uma das mineradoras pequenas que são alimentadas pela boca grande da Vale e daqueles que nós nem sabemos o nome, mas que não têm mais pudor, e estão fazendo ameaças nos Municípios. São mais de 60 trabalhadores uniformizados, colocando comunidade contra comunidade. E o modus operandi da corrupção é a ameaça de morte, é quebrar os dentes daqueles que ainda podem falar.
Diante da Mariana, que está na equipe de transição, queria pedir ao Rogério que pudesse fazer uma reunião, talvez, com os Prefeitos que aqui estiveram presentes. O Angelo Oswaldo traz um elemento-chave: se o papel do Estado é desenvolver políticas públicas de saneamento no território, aqui nós trazemos a denúncia de que a privatização da água é um subnegócio do crime da Vale, primeiro, em Mariana, que trouxe essa chaga terrível para o nome da nossa querida Mariana, e, depois, para Brumadinho, porque há um grande negócio que está sendo feito com a outorga da água, que não existe e não há pagamento por isso.
Só na cidade de Congonhas, que é Alto Paraopeba, o número de litros de água que a população consome está sendo levado pela mineração em sete, oito vezes o montante em metragem cúbica — essa é uma denúncia do MAB, e em Ouro Preto também. Agora virou um grande negócio privatizar a água para poder mandar o minério e a corrupção juntos no mineroduto, no trem, por onde sabemos que escorrem bilhões e bilhões que não sabemos nem contar para onde iriam.
Então, eu pediria que fizéssemos um requerimento e que a equipe de transição pudesse, na presença dos Prefeitos, junto com os Deputados, ter uma reunião oficial. É claro que a transição só ocorre até o limite de dezembro. Por isso a necessidade de ser feita. Temos que apresentar projetos de remunicipalização e também apontar a saída nos planos diretores, para que a questão do saneamento, desde o direito humano à água, que tem sido vilipendiado, ignorado, mas também o tratamento do esgoto e, portanto, o saneamento ambiental, possam ser apontados como solução, porque, caso contrário, Zema vai querer alimentar a boca grande daqueles que deram a eleição a ele no primeiro turno em cima de corrupção.
O SR. PRESIDENTE (Rogério Correia. PT - MG) - Obrigado, Leleco. Quero agradecer-lhe a participação aqui na Câmara dos Deputados. Nós vamos estar juntos nessa luta.
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Minhas saudações aos presentes, principalmente às famílias dos atingidos, àqueles que participam de forma on-line — há muitos atingidos participando conosco hoje —, ao Deputado Rogério Correia, ao Deputado Helder Salomão, ao Deputado Leonardo Monteiro, que é do nosso território de Valadares, e aos demais presentes.
Quando nós recebemos o convite para estarmos aqui hoje pensamos duas vezes, até pelo tempo, pelo custo. E avaliando com os atingidos, eles colocaram, assim como algumas entidades também, a importância de estarmos aqui para trazer um recado. Como o tempo é curto, eu reitero as colocações e as propostas apresentadas pelo Joceli.
As entidades trabalham em parceria. Hoje, o fórum permanente é formado por mais de 60 entidades, e essa trajetória nasceu após o crime. A Câmara Técnica também atua conosco no fórum — são a Universidade Federal de Juiz de Fora, o Polo de Governador Valadares, a Universidade Vale do Rio Doce, o Instituto Federal de Minas Gerais — e dá grande suporte na academia, nas lutas que temos lá.
Quero saudar também a Dra. Cláudia e o Dr. Carlos Bruno, que participou do 7º seminário. Mais de 400 atingidos já ouviram a fala dele. Senti um pouquinho a capilaridade, a extensão que o fórum hoje alcançou na região.
Preocupa-nos muito quando vultosos valores são apresentados, assim como os fundos. Eu falo que valores e fundos às vezes afundam muitas as nossas lutas. Nós estamos no território, no dia a dia, com os atingidos, e posso dizer que é uma luta desigual. O fórum e a Cáritas Regional — como conselheiro da Cáritas Regional faço parte dessa rede — investiram, por ano, na luta dos atingidos, em torno de 500 mil reais. Foram mais de 4 milhões de reais investidos por nós, os atingidos. Nós não fazemos propaganda do que fazemos no dia a dia, mas isso traz credibilidade. Pena que ele não está aqui, mas quero que isso chegue ao Luiz Fernando Bandeira, que ganhou a confiança das lideranças atingidas com a sua postura, a forma como se colocou ao ouvir e atender ao pedido dos atingidos, no sentido de que ele escutasse as lideranças e fizesse lá uma audiência pública, e ele exigiu que essa audiência acontecesse. Quem coordenou essa audiência pública foram os atingidos. Com isso ele ganhou credibilidade.
Agora, os atingidos mandaram um recado, e não são poucos. Muitos estão aqui ouvindo e pediram para vir e falar. É o seguinte: se esse acordo sair neste fim de ano, faltando 20 dias para acabar o ano, numa discussão havida nas oitivas, na qual os atingidos puderam falar e as instituições também — essa negociação correu mais de ano, depois se deu por encerrada —, e chegou aos nossos ouvidos, dos atingidos, que foi retomada, se sair agora, em 20 dias, toda aquela credibilidade que o Luiz Fernando conquistou, como também a Justiça e até a Comissão Externa, que tem lutado, tudo cai por terra.
Digo isso porque um acordo fechado na surdina, faltando dias para o término do atual Governo Federal, para nós, não tem credibilidade.
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Nós representamos um fórum com mais de 60 entidades, a Comissão de Meio Ambiente da Província Eclesiástica de Mariana, a Rede Igrejas de Mineração. Eu também participo, com D. Vicente, do Grupo de Trabalho Ecologia Integral e Mineração da CNBB, Regional Leste 2. Digo com toda a convicção que, se este acordo sair até o fim do ano, perde-se a credibilidade com todas estas instituições, com as entidades e os atingidos, que mandaram este recado.
Eu vim aqui para trazer o seguinte recado dos atingidos: se o acordo sair neste fim de ano, vão perder a credibilidade dos atingidos e, tenham certeza, a credibilidade dos movimentos também, pelo que nós temos conversado com eles. Nós somos contra. Gastou-se tanto tempo para discutir esta repactuação, que nós achamos, como o Carlos Bruno e outros manifestaram, que, às vezes, temos que ir pelo acordo mesmo. Se deixarmos correr na Justiça — nós já perdemos mais de cem vidas, sem termos ressarcidas as perdas —, imaginem quantas vidas vamos perder, se estendermos o prazo por mais 2 anos, 3 anos, 5 anos, 10 anos ou 20 anos!
Portanto, que seja feito o acordo, mas um acordo às claras, não às escondidas, não no fim do Governo. Nós não sabemos como isso se dará, nem confiamos nisso. Este é o recado que nós deixamos.
O SR. PRESIDENTE (Rogério Correia. PT - MG) - Obrigado, Wellington, pela contribuição, em nome do Fórum Permanente em Defesa da Bacia do Rio Doce.
O SR. RODRIGO PIRES VIEIRA - Eu sou da assessoria da Cáritas e vou falar em nome das assessorias técnicas. A Cáritas está lá desde 2016, como assessoria técnica. Há 19 territórios, e somente 3 têm assessoria técnica. Como o Carlos Bruno disse, é importante começar.
Quero saudar o Deputado Rogério Correia; o Deputado Helder Salomão; o Dr. Carlos Bruno; a Dra. Cláudia; os representantes dos movimentos; os Deputados que sempre nos apoiam muito — o Leonardo, o Leleco e o Padre João; e, principalmente, os atingidos de Brumadinho. Nós, a AVABRUM, estamos aqui por uma luta muito justa, à espera de um processo criminal que não avançou em Mariana.
Neste processo de reparação, é muito importante não repetir o que aconteceu. Se o que aconteceu fosse criminalizado, poderia haver uma importante salvaguarda para tentar segurá-la. Se não for criminalizado, as empresas vão fazer mais.
Eu queria lembrar uma fala do Papa Francisco para a Cáritas: "Ouvir é diferente de escutar e é diferente de participar". Eu acho que, num acordo como este, por mais que o Ministério Público esteja representando os atingidos, não adianta apenas ouvir por 2 anos. É necessário bater o martelo, é necessário que os atingidos falem, sim, porque o acordo é justamente para eles.
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É preciso lembrar o primeiro acordo em relação ao Rio Doce, acordo que ocorreu sem participação alguma e que nos coloca a Renova muito fortemente no crime que aconteceu. A reparação negociada com as empresas, determinando o que pagar, deixando os criminosos determinar o valor, realmente tem sido um fracasso em toda a Bacia do Rio Doce, como bem lembrou o Carlos Bruno.
Nós temos ouvido a Renova dizer quem é atingido, reconhecer um atingido dentro de uma família e, no mesmo lote, não reconhecer outra família. Ela está colocando as famílias para brigarem, causando conflitos. Nós estamos percebendo algumas ocorrências em Mariana. A Cáritas Assessoria Técnica iniciou um processo para elaborar um cadastro das famílias independente. Trata-se de um conjunto de provas e de uma matriz de danos.
A Renova tem proposto um projeto de negociação extrajudicial com apenas 30% do que isso aponta. Há, digamos, uma matriz de danos ou um cadastro dos atingidos construído com os próprios atingidos. Eles negociam apenas 30%. Se os atingidos não toparem, eles têm que recorrer à Justiça, mas eles não têm dinheiro para entrar na Justiça. Portanto, esta reparação que está acontecendo é muito ruim.
Nos casos de Bento Rodrigues e de Paracatu, como falou o Dr. Carlos Bruno, foram gastos 2 milhões. Estas comunidades eram rurais, e estão fazendo assentamentos como lotes urbanos. As famílias já estão morando na cidade há 7 anos, e, agora, o modo de vida delas será também o urbano. Já morreram mais de 100 pessoas, entristecidas com este modo de vida. As outras vão voltar para um reassentamento que não as representa, além disso, não haverá água bruta no reassentamento. O pessoal criava animais, tinha horta, mas lá não vai haver água bruta. A verdade é que muita coisa está acontecendo.
Na repactuação, a Renova continua dizendo que não colocaria água bruta porque não é possível. A questão não é se é possível ou não. A própria Renova fez um estudo e concluiu que esta iniciativa demandará gasto de dinheiro. Portanto, é preciso recuperar o modo de vida de antes. Eu acho que nós estamos caminhando neste sentido. Esta, creio, é uma coisa com a qual nós temos que nos preocupar neste acordo, pois a Renova deixa de ter a obrigação de fazer para ter a obrigação de pagar. Se ela não fez em 7 anos, ela vai transferir para o Estado esta responsabilidade?
Eu estava em Mário Campos na semana passada, na região da adutora. O pessoal tinha que receber do Estado o saneamento básico. São 10 anos para fazer. Já se passaram 7 anos, e o Estado tem mais 10 anos para fazer.
Para terminar, eu queria reafirmar que fechar o acordo agora, não, de jeito nenhum! Os atingidos de Mariana me pediram que fizesse este anúncio: fechar o acordo agora, de jeito nenhum; fortalecer a carta que o Joceli comentou, para entregar a transição; a reunião de que o Leleco falou. Eu acho que a participação neste processo é fundamental. Quanto mais nós conseguirmos que participem neste momento, mais importante será. Acordo agora, de jeito nenhum!
O SR. PRESIDENTE (Rogério Correia. PT - MG) - Eu agradeço ao Rodrigo Vieira, que representa a Cáritas de Minas Gerais.
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Eu queria fazer dois destaques rapidamente, por conta do tempo, que já está curto. Um deles é muito caro ao Deputado Rogério Correia, a pauta agrária. Assim como o meio ambiente, a pauta agrária tem que ter destaque, tem que ter relevo nos programas da repactuação, por alguns motivos. O primeiro é a representatividade. São 47 assentamentos que representam mais de 3 mil famílias ao longo da calha do Rio Doce. Destes assentamentos, 19 são do MST e 7 estão à margem do rio. Estes assentamentos foram atingidos de maneira muito violenta.
Não se trata, contudo, apenas de representatividade. Se nós pensarmos nos impactos provocados pelos rompimentos, veremos que eles se dão muito mais no meio rural do que no meio urbano. Fazendo coro com o MAB, nós não somos, de maneira alguma, contra a utilização de recursos oriundos de danos difusos para que o Estado se utilize das suas capacidades de recuperação das diversas funções ambientais e sociais que foram comprometidas. Porém, há que se manter, apesar de a legislação não o exigir, o mínimo de nexo entre as causas e aqueles que foram atingidos, bem como suas consequências.
O acordo de Brumadinho gerou uma indignação muito grande entre os atingidos e as atingidas da calha, quando ele se utilizou de recursos do direito difuso, para que o Estado equipasse e fortalecesse seus equipamentos públicos de maneira generalizada, não apenas focados na reparação dos danos da calha, mas também, principalmente, no anexo que trata da mobilidade urbana, que tinha e ainda tem o rodoanel como principal objeto. Os atingidos não entendem isso. Isso é legal, mas há que se perguntar se é legítimo.
Neste sentido, a pauta agrária e, principalmente, a pauta dos Ministérios vocacionados a transformar a agricultura, como nosso saudoso Desenvolvimento Agrário, que agora está sendo retomado com a nomenclatura de Ministério da Agricultura Familiar, da Alimentação Saudável, também têm o condão de atacar a causa do problema, que é a exploração predatória do meio ambiente pelo homem.
É muito louvável, portanto, que se invista nas pautas ambientais, mas, quando se pensa na reparação socioeconômica, talvez nosso locus estatal mais vocacionado para contribuir para esta reparação seja o do desenvolvimento agrário. Eu não sei se isso está previsto nos planejamentos da repactuação. Neste caso, nós vamos para outro problema: a falta de transparência. Eu não vou repetir o que já foi dito em outras falas exaustivas. Nós sabemos que isso provavelmente não é culpa de V.Exas., porque as empresas exigem, principalmente, que se utilize da cláusula de confidencialidade, até porque os servidores públicos estão impostos por força do art. 37 da Constituição Federal, que tem a publicidade como linha mestra.
No entanto, a ausência de publicidade nos traz uma série de questionamentos, especialmente quando vimos na mídia, na semana passada, que o acordo seria retomado e finalizado ainda neste ano.
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Algumas questões foram respondidas aqui, como a dúvida se os pleitos dos movimentos sociais e dos atingidos organizados haviam sido atendidos. A configuração dos anexos, aparentemente, aponta para esta possibilidade, mas ainda restam muitas dúvidas, que ficam sem resposta.
A mensagem que se passa não é boa. A primeira pergunta que vem é a seguinte: o que mudou? De setembro, quando as autoridades e as empresas anunciaram, não há mais a repactuação. De lá para cá, o que mudou? Houve a redução de valor? A redução de algum valor está concentrada na reparação devida ao Governo Federal?
A pergunta se dá porque nós estamos num momento em que a transição identifica um processo sistemático de sucateamento da estrutura do Governo Federal, uma herança maldita, em que já se prevê que o Governo de transição, o atual Governo eleito, vai ter que herdar. Quando se pensa na aceleração do processo de repactuação, esta é a primeira indagação que vem à mente.
Obviamente, o convite que o conselheiro fez à equipe de transição para que acompanhe pode sanar estas questões, mas, para a opinião pública de modo geral, eu tenho certeza de que questões desta natureza chegam para além das fronteiras nacionais. Nós temos aqui a representação, pelo que disseram, dos colegas que representam as vítimas da calha do Rio Doce, não apenas vítimas decisivas, mas também vítimas dos danos socioeconômicos, na Corte inglesa, no processo em que a BHP figura como ré.
Para deixar minha mensagem final, eu acho que instituições como o Ministério Público Federal, que goza, por determinação da Constituição Federal, de independência funcional, são órgãos de Estado, não de Governo, e têm a sobriedade e a capacidade de não se deixarem mover por interesses que são de governos. As pessoas que nós conhecemos têm também esta índole. Porém, nós achamos que até as empresas podem se desinteressar da assinatura açodada e acelerada como está se figurando. Eu imagino que elas se preocupem como as notícias vão chegar à Corte inglesa, se está a se cometer algum tipo de desconto na reparação que havia sido pactuada em setembro. Esta pergunta não foi respondida: por que agora está diferente de setembro, quando se havia suspendido?
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O SR. PRESIDENTE (Rogério Correia. PT - MG) - Agradeço ao Alexandre Chumbinho, que colocou para nós a importante contribuição da Associação Brasileira de Reforma Agrária — ABRA.
Passo a palavra à Sra. Andresa Aparecida Rocha Rodrigues, que representa aqui a AVABRUM. Ela dispõe de 5 minutos, tempo que peço seja cumprido, porque nós teremos uma agenda com a Ministra Cármen Lúcia daqui a pouco e porque nós precisamos almoçar. Afinal, saco vazio não para em pé. A Andresa ficou por último, mas pela importância da sua fala.
Inicialmente, eu gostaria de saudar o Deputado Rogério Correia e o Deputado Helder Salomão; a Dra. Cláudia, que já saiu, mas eu gostaria de fazer o registro; o Dr. Luiz Fernando Bandeira e o Dr. Carlos Bruno. Eu gostaria de fazer uma saudação a todos os que estão neste plenário e a todos os que nos acompanham virtualmente.
Eu quero enfatizar o seguinte: 272 joias presentes! Duzentas e setenta e duas joias presentes! (Manifestação na plateia: Presentes!) São elas que nos trazem aqui. Onde elas não podem entrar, nós também não entramos.
Eu ouvi atentamente a fala de cada um e de cada uma. Quando o Dr. Carlos Bruno faz referência às barragens que correm risco em Minas Gerais, eu acrescento que são 40 barragens que estão em nível crítico, três delas são bombas-relógios, prontas para explodir: a B3/B4, em Nova Lima; a Forquilha III, em Ouro Preto; e a Sul Superior, em Barão de Cocais. Estas estão prontinhas para matar, para assassinar, como aconteceu com a B1, que rompeu em Brumadinho. As mineradoras são sabedoras disso — aqui, a mineradora Vale, já que todas elas são controladas pela Vale. Portanto, nós temos um desafio muito grande. Esta é a luta que a AVABRUM faz diariamente.
Eu sou a Andresa, mãe do Bruno, meu único filho, que foi assassinado no dia 25 de janeiro de 2019, junto de mais 271 joias.
Hoje me acompanham, pela Diretoria da AVABRUM, a D. Jacira, mãe do Thiago; a D. Regina, mãe da Priscila; e a Andreia, esposa do Edgar. Todos são vítimas do crime cometido pela Vale, bem como as demais joias, entre elas, dois nascituros. Em 2015, mataram 20 joias em Mariana. Havia um nascituro também, uma joia que não teve o direito de nascer.
Este é o relatório da CPI, que teve como Relator o Deputado Rogério Correia. (Exibe documento.) Ele traz, na capa, Mariana entregando uma flor a Brumadinho.
Eu passo às mãos do Joceli uma revista da AVABRUM que traz todas as nossas histórias, tudo o que aconteceu, além do trabalho que a AVABRUM faz, para que chegue às mãos dos familiares de Mariana e que estes se juntem a nós, porque, juntos, nós somos mais fortes.
Nossa luta é que nenhum familiar passe a dor que nós passamos diariamente. Espero que chegue às mãos deles o trabalho que a AVABRUM tem realizado, um trabalho que envolve muita luta por justiça, uma luta pelo encontro das quatro joias que seguem soterradas na lama de sangue, uma luta pela memória de todas essas joias.
Aquilo que a memória ama permanece eterno, e é por isso que nós seguimos lutando.
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Em relação à atividade que nós viemos fazer hoje — já agradecemos, de antemão, ao Deputado Rogério Correia, que se colocou à disposição para nos acompanhar —, fazer uma visita aos Ministros do Supremo, a AVABRUM já esteve no Supremo, na 2ª Turma Recursal, levando nosso clamor por justiça. Nós não estamos aqui pautados apenas na dor. Embora a dor já baste, não é ela apenas que nos move. Também nos move o relatório da Câmara Federal, o relatório da CPI da Assembleia Legislativa, bem como o processo da Polícia Federal, em que houve a denúncia de como a Vale sabia dos fatos.
Vejam, em várias páginas, é citada a troca de e-mails feita pelas pessoas que estavam à frente da Vale para proteger, para cuidar dos nossos, sabendo que a barragem iria romper, mas não se interrompeu o processo de mineração. Está aqui, para que todos possam ver. Ter hoje um processo alterado da instância estadual para a instância federal significa zerar tudo o que foi feito e construído sobre a lama de sangue, sobre nossas lágrimas.
Ontem eu ouvi dizerem: "Na calha do Rio Doce, o minério secou o solo e trouxe toda essa dificuldade". Na nossa região — eu sou de Mário Campos —, além de secar o solo, o minério de ferro sobe e vem cheio de sangue, porque lá se derramou o sangue de 272 joias. Infelizmente, a impunidade que consta em Mariana e a ausência da Justiça possibilitaram e potencializaram o crime em Brumadinho. Se nós, neste momento, taparmos os olhos — aqui eu faço um clamor à Justiça —, se nós não fizermos que a justiça aconteça, em pouco tempo, infelizmente, nós poderemos estar diante de um cenário de mais mortes. Mariana matou dezenas, Brumadinho matou centenas. Quem será a próxima vítima?
É este o trabalho que nós fazemos. É este o trabalho que faz a AVABRUM, composta por 11 diretores, a maioria mulheres, e um bendito fruto, que é o Sérgio, que nos ajuda demais.
Dr. Carlos Bruno, alegra-nos muito e nos tranquiliza muito o coração saber — está no documento Memórias, que nós levaremos agora, novamente, ao conhecimento do Ministro André Mendonça — que os Ministérios Público Federal e Estadual reconhecem a instância estadual para que o crime seja julgado e o processo continue.
Nós não estamos pedindo que deem um jeitinho, de forma alguma. Nós queremos, pautados nos preceitos da lei, documentados e muito bem fundamentados, que aqueles que mataram nossos 272 amores sejam responsabilizados.
Deputado, nós trouxemos também um vídeo, mas não será possível passá-lo, em decorrência do tempo. Mas eu deixo aqui a revista da AVABRUM, que traz quem somos, o trabalho que fazemos e o relato das nossas joias. Ao final da capa, a revista traz um vídeo institucional, o resumo de todo o trabalho que é realizado pela diretoria da associação, juntamente com os familiares aqui representados, dia e noite.
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O SR. PRESIDENTE (Rogério Correia. PT - MG) - Agradeço à Andresa, que representa a AVABRUM. São 272 joias presentes! Agradeço a contribuição à nossa reunião.
O SR. PADRE JOÃO (PT - MG) - Faço uma saudação a todas as convidadas e todos os convidados, aos atingidos, aos movimentos sociais e populares, às assessorias técnicas independentes e a seus representantes.
Deputado Rogério Correia, eu já fui bem contemplado. De fato, bate em nós uma grande tristeza. A tristeza maior é a impotência, seja do sistema judicial, seja do Congresso, seja do próprio Poder Executivo. O Estado brasileiro é incompetente quando se trata de reparar, de fato, os danos e promover e garantir a justiça.
Se nós olharmos os três Poderes, percebemos que, na verdade, é o poder econômico que manda. O poder econômico age nos bastidores. Em que pese o reconhecimento da sensibilidade em ser incansáveis em ir a tantas reuniões, a disponibilidade de pôr o pé na lama, a bem dizer, e de ouvir as pessoas do conselheiro, do Ministério Público, nós não conseguimos, de fato, garantir a justiça. Não conseguimos! Sete anos não é pouca coisa! E criminalmente, então? Isso é um escárnio!
Nós temos que ter realmente teimosia. Se formos um pouco frios, nós desanimamos, estará tudo falido, tudo perdido. Quem manda é o capital. É ele que manda e desmanda, protela, impõe.
Nós estamos falando aqui, como bem lembrou o Rodrigo, de atingidos, mas nós temos milhares que, ao longo desses 7 anos, nem sequer foram considerados atingidos. Alguns vão receber o recurso direto, e tal, mas quem vai receber, se até hoje nós não temos, de fato, o cadastro real dos atingidos? Pescadores ficaram de fora. Nós temos muitas lideranças atingidas diretamente que não estão sequer no cadastro. Há 7 anos, estão privadas de receber alguma renda. Sem falar nos que morreram, Dr. Carlos, porque, além dos acidentes, há os que morreram em decorrência de depressão, autoextermínio. Do crime cometido em Mariana, já são mais de cem pessoas que nem sequer viram a justiça acontecer.
Esta situação é, de fato, muito triste. Em que pesem, Dr. Carlos, as leis precárias que nós temos, elas seriam suficientes para punir e garantir a reparação necessária.
O fato de não termos as condições políticas para aprimorarmos a legislação e o Código Penal, tudo o que temos hoje, as falhas, as lacunas, as brechas que poupam os criminosos, os grandes criminosos, tudo isso nos dá uma tristeza enorme. São 7 anos, e nem sequer temos as condições para identificar de fato quais são os atingidos.
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Há muito trabalho pela frente, e eu concordo que é melhor o acordo, o que não significa, no entanto, que deve haver protelação. Se este acordo, que é um acerto, for adiado, qual será a compensação? A participação direta dos atingidos? O controle social na execução de cada ação, uma ação feita seja pelo Governo Federal, seja pelo Governo do Estado, seja pelos Municípios, e os projetos atingidos? Qual é o controle? Eu acho que nós precisamos ter algum ganho nisso.
Eu vejo que é um acerto em relação ao diálogo com o Governo de transição e o encaminhamento, Deputado Rogério Correia. Mas qual é o Governo de transição? Acho que cabe uma intersetorialidade ou uma ação interministerial, porque há uma garantia que vai envolver Ministérios.
Foi citado o Ministério da Cidadania, que vai atender a um público, mas há uma garantia do Ministério da Agricultura Familiar, do Ministério da Pesca. Há a garantia de uma Secretaria que equivale ao Ministério dos Povos Originários. Há a Secretaria da Saúde, que envolve diretamente... Há, portanto, os Ministérios da Saúde, da Cidadania, da Agricultura Familiar, da Pesca, de Minas e Energia e do Meio Ambiente, que vão ter recursos.
Não basta haver uma equipe de transição. É preciso que sejam contemplados os grupos de trabalho, os grupos técnicos, que já apresentaram, no dia 30, várias sugestões. Acho que o prazo para apresentar um documento mais avançado vai até o dia 12. Eu acredito que cabe também esta Comissão dialogar com todos os grupos de trabalho para que haja ganhos que compensem o atraso. Do contrário, mesmo com o novo Governo, com a abertura que nós temos, se não houver um movimento social, se o povo não estiver dentro, infelizmente, nem nós, que temos acúmulo político, mesmo com o Partido dos Trabalhadores, no qual eu acredito, não há um governo para disputar ao longo de 4 anos, e nós sabemos que quem acaba ganhando a disputa é o capital financeiro, infelizmente.
Trata-se de um povo que é punido há décadas, Deputado Rogério. Esse povo foi punido, e até hoje há um desaparecido na construção da usina Risoleta Neves. Não sei se o senhor sabe, Dr. Carlos, mas um atingido está sumido ali. Suspeita-se que ele está dentro do concreto da usina.
Como eu disse, esse povo foi punido, sobretudo os pescadores. Eu pude acompanhar de perto, em Itueta, Nova Itueta e Aimorés. Foram mais de 2 anos sem condições para pescar porque, como não limparam adequadamente o lago, os peixes, embora vivos, estavam podres. Bastava abrir os peixes para ver que estavam doentes, com câncer.
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O povo está sendo punido na Bacia Baguari, por parte das hidrelétricas, que só têm lucro! Elas só dão lucro. Para quem? Para o grande capital! E continuam punindo, excluindo nosso povo, com as commodities.
A Vale teve recordes de lucro, mesmo depois desse crime. Ela teve recordes de lucro, com o apoio do Estado brasileiro e até mesmo desta Casa, que aprovou commodities... Geram emprego na China, os ganhos ficam lá fora. E aqui? Nada! Só buraco e ameaças!
Eu acho que o Bandeira de Mello citou a mineradora AngloGold. Para termos uma ideia, várias barragens continuam torturando nosso povo, dia e noite, até mesmo barragens da própria Vale. Eu digo torturando porque as pessoas não conseguem viver, estão debaixo de barragens, e estas barragens foram para lá depois, como em Bento Rodrigues.
A verdade é que tudo isso nos dá uma grande tristeza, uma revolta, que nós temos que transformar em indignação, para sabermos como aprimorar a legislação.
O senhor citou Barra Longa, não só o Distrito de Gesteira, que pertence a Barra Longa. Eles estão abandonados. Muita gente já morreu. Estão penalizando a todos. Eu acho que nós ainda temos muitas tarefas. Nós temos que unir esforços, mas é triste quando nós vemos o próprio sistema judicial, que deveria ter força para agir. Nós tínhamos que ter poder, Deputado Rogério! Vocês tinham que ter um prazo para entregar as casas. Eu acho que o Ministério Público deveria ter força para isso. Nós temos que estipular um prazo. Como é possível esperar 7 anos?!
O Leleco vem do movimento de moradias. Em Entre Rios, Minas, com menos de 2 anos, a sociedade, por meio do Programa Minha Casa, Minha Vida Faixa 1, para atender aos mais pobres, construiu mais de cem moradias. Há muitos lugares que criaram entidades e, com 1 ano ou 2 anos, construíram mais de 100 ou 200 moradias, com autogestão. É por isso que nós temos que avançar nas políticas.
O SR. PRESIDENTE (Rogério Correia. PT - MG) - Mesmo com 2 bilhões de reais, nada!
O SR. PADRE JOÃO (PT - MG) - Na verdade, esta é uma estratégia de torturar, de dizer não.
Como é que eles já vêm com números? Se existe um cadastro, com matriz de danos, feito de maneira participativa, com a comunidade como protagonista do processo, e, antes de analisarem, dizerem: "Nós vamos atender 30% disso!" Isso é um absurdo!
Eu quis externar aqui minha indignação. Quero dizer o quanto de trabalho nós temos pela frente e o que temos que evitar, a fim de criarmos as condições políticas para aprimorarmos ainda mais a legislação e promovermos a justiça enquanto o povo ainda vive, porque, depois que morrer, não resolve mais.
(Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Rogério Correia. PT - MG) - Deputado Padre João, muito obrigado pela contribuição.
Nós terminamos aqui o período das inscrições. Eu vou fazer os encaminhamentos. Nós vamos exibir o vídeo. Precisamos avançar, porque temos que ir ao Supremo. Os Deputados estão convidados a ir também. Nós vamos ter que sair bem apressados, Andressa.
Foram dadas algumas informações acerca do pretenso acordo de repactuação. Eu digo pretenso porque ele não está fechado, não está assinado. Tanto o CNJ, como o Ministério Público nos passaram os pontos deste acordo que seriam importantes e manifestaram os avanços que já houve em relação a ele.
Isso significa que há, por parte da Comissão, o acompanhamento deste processo e o desejo de que seja assinado um acordo, desde que, obviamente, ele tenha as características do relatório que nós já entregamos. Nós quereremos acompanhar os procedimentos.
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Há um consenso quase geral — eu faço um resumo das falas — de que este acordo seja assinado pelo novo Governo Federal, em vista de uma série de motivos aqui apontados. Pelo fato de nós já estarmos no fim do Governo, não seria justo que outro Governo assumisse, sem o conhecimento mais aprofundado do que é o acordo, ou sem o compromisso do novo Governo com o acordo. Por isso, nós queremos que seja assinado posteriormente à entrada do novo Governo, agora com o Presidente Lula.
O MAB solicitou que nós o ajudássemos a encaminhar uma carta. Os Deputados e os movimentos que quiserem assiná-la poderão fazê-lo. Nós entregaríamos a carta à comissão de transição, para pedir que se apressem para ter acesso aos dados.
Nós solicitaremos à comissão que tome para si a responsabilidade da assinatura do novo acordo, para agilizar os debates com os atingidos e com todos os atores que, até agora, estão envolvidos. Nós vamos, em conjunto com o MAB, que nos convidou, entregar a carta à comissão de transição. Além disso, vamos fazer um ofício à comissão de transição para que, junto com eles e a nossa Comissão — de antemão, convidamos os movimentos aqui presentes —, nós possamos fazer uma reunião do CNJ com a comissão de transição para reforçarmos o entendimento que nós tivemos aqui.
Eu vou solicitá-lo por ofício porque, se eu o fizer por requerimento, nós teremos que convocar uma nova reunião para aprovarmos o requerimento. Se fizermos isso por ofício, nós podemos, como coordenador, fazer os encaminhamentos, com a aquiescência do Relator e dos Deputados aqui presentes.
Portanto, haveria uma segunda reunião, uma reunião importante, da Comissão com o CNJ e a comissão de transição. Nós nos responsabilizaríamos por marcar esta audiência, que já foi solicitada pela Dra. Mariana e pelo Bandeira de Mello, que se colocou à disposição para fazê-lo.
Uma terceira questão consiste em solicitar ao Congresso Nacional que avance na conclusão de duas pautas: uma, sobre a Política Nacional de Direitos das Populações Atingidas por Barragens — PNAB, citada pelo Joceli, que já foi aprovada. Trata-se de um projeto de lei de autoria da Comissão Externa do Desastre de Brumadinho, que cria a Política Nacional de Direitos das Populações Atingidas por Barragens. Ela já foi votada na Câmara e se encontra no Senado.
Mais uma vez, nós vamos solicitar ao Presidente Rodrigo Pacheco que agilize a votação da PNAB. Solicitamos, também, a agilização do tema referente ao crime de "ecocídio". O Dr. Carlos Bruno falou desta questão e da possibilidade de o prazo de prescrição ser muito pequeno. Este projeto de lei, que é também da Comissão Externa do Desastre de Brumadinho, tipifica o crime de "ecocídio", amplia a pena deste crime de 4 anos para 12 anos, aliás, amplia não apenas a multa, mas também o prazo de prescrição.
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Este projeto de lei foi aprovado na Câmara, está no Senado, já foi aprovado nas Comissões, e falta apenas a deliberação da Comissão de Constituição e Justiça do Senado. O Relator é o Senador Fabiano Contarato. Eu vou solicitar a ele, que também é do Espírito Santo, que agilize a aprovação do PL 2.787/19. São os dois projetos principais da Comissão Externa que estão lá. Há outros, mas estes dois são os mais avançados, Deputado Padre João. Nós participamos da elaboração de ambos os projetos na Comissão Externa de Brumadinho. No que diz respeito aos projetos, é isso.
Sobre a transição, o Prefeito de Ouro Preto nos pediu que incluíssemos também uma solicitação para que o Município de Ouro Preto esteja entre os signatários deste novo acordo, de modo a contemplar Ouro Preto. Há uma concordância de nossa parte, mas o Prefeito coloca, principalmente no caso do desenvolvimento econômico, da economia verde, do saneamento, que é uma grande luta que o Município está tendo agora. Nós vamos aprovar também esta proposição.
Fica uma proposta para o conjunto dos Deputados da Comissão, os que fomos reeleitos, no sentido de já solicitarmos, na legislatura que vem, uma nova Comissão Externa para acompanhar não apenas a repactuação do crime em Mariana, mas também o acordo que diz respeito ao crime em Brumadinho. Estas duas tragédias criminosas precisam do acompanhamento de uma Comissão Externa, pois isso facilita a situação dos movimentos sociais e coloca o Parlamento na direção do que o Deputado Padre João mencionou, que haja uma fiscalização do Governo Federal e dos Governos Estaduais da execução das medidas dos dois acordos: o acordo de Brumadinho e o acordo da repactuação. Portanto, que nós assinemos em conjunto e solicitemos a formação de uma Comissão Externa na próxima legislatura para fazer este acompanhamento.
É claro, há algum receio, pois, de acordo com alguns, "o acordo está aí, pode ser feito agora, depois as empresas podem não fazê-lo". Nós não vamos trabalhar com esta chantagem de este acordo não ser feito, mesmo porque as empresas cometeram crimes. A Samarco, a Vale, a BHP Bilinton, além de terem cometido crimes, infringem a lei constantemente. Isso já era para estar resolvido. Até hoje, as barragens a montante não foram descaracterizadas. Isso está na lei de descomissionadas, em Minas Gerais. Foi feito um termo de ajuste com muita boa vontade para elas, mas elas estão fora da lei.
Hoje estas empresas podem receber uma multa que chega a 1 bilhão de reais, multa que pode, havendo reincidência, passar a 2 milhões. Tanto o Estado como a União podem aplicar multa. Estas empresas, que cometeram o crime, não estão tão à vontade para dizerem se assinam ou não o acordo. Nós não podemos ter governos que passem a mão na cabeça de mineradoras. Se assim não fosse, elas já tinham, quem sabe, feito um acordo melhor para os atingidos. A lei prevê, por exemplo, a cassação do direito de minerar, caso estas empresas não cumpram as leis. A mesma coisa acontece, em relação aos Estados, com o licenciamento ambiental.
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Os governos têm que ter consciência de que têm legislações suficientes — e elas foram criadas agora, depois dos dois crimes — que lhes dão, tanto aos Governos Estaduais quanto à União, uma condição de controle maior das mineradoras.
Então, nós não temos que ter esse receio de que, depois, elas não vão assinar o acordo. Se não assinarem, estarão infringindo leis que poderão ter rigor na aplicação. Aliás, já deviam ter tido. Eu acho que é importante dar esse recado a elas também.
Por falar nisso, vamos entregar as notas taquigráficas desta nossa reunião ao Governo de Minas Gerais e do Espírito Santo, aos Ministérios Públicos Estaduais, às Defensorias, ao Ministério Público Federal, aos governos. Também vamos enviar as notas taquigráficas do que discutimos e das deliberações às três empresas, para que elas tomem conhecimento daquilo que nós discutimos, do nosso desejo para a formatação de um acordo que seja justo. As pessoas, Deputado Padre João — V.Exa. tem razão — sofreram muito e continuam sofrendo por esses crimes. E nós não podemos, de forma alguma, ser coniventes com isso.
Quando lembro que, depois de tudo isso, o Governo do Estado quer minerar a Serra do Curral em Belo Horizonte, eu fico pensando o que passa na cabeça de um Governador desse tipo, que parece que não está nem aí. Como o outro que está saindo não estava nem aí para a COVID e transformou a questão em um genocídio, parece que esse também não está nem aí para a dor das pessoas, para propor a mineração em um lugar tão histórico, tão importante para o ecossistema da Capital de Minas Gerais. Então, o nosso recado também fica dado. Nós também temos condições de pressionar, de fazer leis, de exigir o cumprimento das leis.
O SR. PADRE JOÃO (PT - MG) - Eu só tenho uma dúvida.
O SR. CARLOS BRUNO FERREIRA DA SILVA - Eu acho que é possível conseguirmos isso. Certamente, serão todos os Municípios banhados e também os Municípios do entorno. Claro, como tudo tem limitações e economias, não seria nem correto fazer promessas de coisas que não conseguimos fazer. Podemos conseguir essa relação.
O SR. PRESIDENTE (Rogério Correia. PT - MG) - Ótimo.
Vamos solicitar também a documentação. Eu esqueci esse ponto importante. Nesse caso, a Comissão tem que aprovar um requerimento. Nós o aprovaremos na próxima reunião. Já vou pedir ao Paulo que marque uma reunião extraordinária. Se nós não tivermos condições de realizar a reunião extraordinária, ficará via ofício do Coordenador, com a assinatura do Relator, para solicitar toda a documentação. Claro que não aquela que é sigilosa. Como é que chama?
O SR. PRESIDENTE (Rogério Correia. PT - MG) - É, o sigilo negocial.
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Vocês são heroínas. Um dia vai ser contada essa história em livro, filme. É uma coisa maravilhosa o que vocês estão fazendo.
Espero que consigamos ter um bom final. Nós já temos o voto do Ministro Fachin, temos o meio. Basta o STF ter essa sensibilidade. Eu torço muito para que vocês consigam hoje. Isso é um tema essencial. Quanto ao fato de esse processo ir para a Justiça Federal, não é que ela não tenha condições de julgá-lo — claro, a Justiça Federal tem menos costume de fazer júris —, o problema não é esse. O problema é que vai começar do zero, Andresa, como o processo do Rio Doce, que tem 200 testemunhas, e nós não conseguimos ouvir as testemunhas. Isso tem que ser prioridade no Judiciário.
Eu entendo, Padre João, as dificuldades da legislação, mas, talvez, da mesma forma que há prioridade para idosos, para outras categorias, poderia haver prioridade também para esses casos. É uma coisa que talvez valha a pena pensarmos. Isso tem que ser prioridade no Judiciário. E o juiz é o menos culpado ali, porque ele está com vários problemas, várias questões. Isso tem que ser algo legal, que fale: "Essa é a prioridade".
Queria também responder, porque sei que existem esses sigilos, que não houve qualquer desconto de valor. Eu não quis deixar a pergunta sem resposta porque até fica parecendo que eu estou fugindo da pergunta. Garanto que há instituições do Estado realmente lá. Não houve qualquer desconto de valor. Eu não posso falar o valor, mas, basicamente, é o mesmo que já estava sendo discutido desde setembro. Havia um problema de cláusula que não tinha sido ainda discutido com detalhe, e nós conseguimos, nesses 2 meses, avançar nessas cláusulas. Mas eu garanto que não houve qualquer desconto de valor.
O SR. PRESIDENTE (Rogério Correia. PT - MG) - Isso é importante, Dr. Carlos.
Pessoal, é isso. Nós vamos incluir, então, um requerimento ou um ofício também solicitando a documentação daquilo que não for sigilo negocial, para que a Comissão tenha também o conhecimento desses termos. Eles vão avaliar o que pode ser repassado, mas eu acho importante que a Comissão tenha isso, tanto esta quanto a Comissão que vamos criar, na legislatura que vem, para acompanhar os dois crimes, o de Mariana e o de Brumadinho.
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Rogério Correia. PT - MG) - Então, está bem. Vamos passar o vídeo. Depois disso, o Deputado Leonardo encerrará a audiência.
(Pausa prolongada.)
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(Exibição de vídeo.)
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(Exibição de vídeo.)
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(Exibição de vídeo.)
(Palmas.)
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O SR. PRESIDENTE (Leonardo Monteiro. PT - MG) - A nossa homenagem às 272 joias de Brumadinho.
Eu quero, em nome do Deputado Rogério Correia, agradecer a todos os Deputados que estiveram conosco durante os trabalhos desta Comissão: o Deputado André Janones; o Deputado Helder Salomão, que foi o Relator na nossa Comissão; o Deputado Júlio Delgado; o Deputado Leonardo Monteiro, que sou eu; o Deputado Padre João, que está aqui presente; o Deputado Tiago Mitraud; e o Deputado Evair Vieira de Melo, que também compõe a Comissão conosco.
Queremos agradecer, também, à Consultoria da Casa, à Secretaria da Comissão e a todos os assessores que estiveram conosco e contribuíram para que a Comissão alcançasse seus objetivos, inclusive com a produção do relatório, que já foi mencionado aqui.
Como já foi afirmado aqui pelo Deputado Rogério Correia, comunico que esta Comissão não se encerra neste momento. Apesar de estar se encerrando o período legislativo, nós continuaremos, na próxima legislatura, acompanhando os desdobramentos do possível acordo produzido com a contribuição e a participação da nossa Comissão. Será criada outra Comissão, com os mesmos objetivos.
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