Horário | (Texto com redação final.) |
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A SRA. PRESIDENTE (Tereza Nelma. PSD - AL) - Boa tarde. Vamos iniciar a nossa audiência.
Declaro aberta a presente audiência pública conjunta, da Comissão de Defesa dos Direitos das Pessoas com Deficiência e da Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher, atendendo aos Requerimentos nºs 36, de 2022, e 32, de 2022, da Comissão da Mulher, ambos de minha autoria, Deputada Tereza Nelma, para debater o tema Visibilidade das Mulheres com Deficiência no Enfrentamento à Violência.
Esta audiência acontece no âmbito da campanha 21 Dias de Ativismo pelo Fim da Violência contra a Mulher.
Eu farei uma breve autodescrição para as pessoas cegas ou com baixa visão que estejam acompanhando esta audiência e peço que os demais integrantes da Mesa façam o mesmo antes de iniciarem a fala. Sou uma mulher de pele branca e cabelos cacheados, com mechas. Há pouco tempo, eu usava chapéu por necessidade de saúde, agora o meu cabelo já voltou a crescer, e eu retirei o chapéu. Estou usando um blazer rosa-pink, com uma blusa branca por dentro. Uso óculos. Atrás de mim está um banner da campanha 21 Dias de Ativismo pelo Fim da Violência contra a Mulher. Ao meu lado direito está a Bandeira do Brasil. Esta sou eu, a Deputada Tereza Nelma.
Além dos palestrantes, apenas os Parlamentares poderão ingressar na reunião pelo Zoom. Os demais interessados poderão acompanhar o debate pela página da Comissão na Internet, pelo canal da Câmara dos Deputados no Youtube, com janela de tradução em LIBRAS.
Será lançada a presença do Parlamentar que, pela plataforma de videoconferência, usar da palavra nesta audiência pública.
O painel será aproveitado para a reunião deliberativa da Comissão que ocorrerá logo após o encerramento desta audiência.
Como regra geral, peço que todos mantenham os microfones desligados e que os abram apenas quando forem usar a palavra.
Quero dar uma boa-tarde aos convidados: meu querido amigo Claudio de Castro Panoeiro, Secretário Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência, do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos; Ana Paula Marques, para-atleta olímpica de vela e vítima de tentativa de feminicídio; Rosana Lago, fundadora e coordenadora da Frente Nacional das Mulheres com Deficiência — FNMD; e Carolini Constantino, pesquisadora do Grupo de Pesquisa de Design com Enfoque na Pessoa com Deficiência, da Universidade FEEVALE. São esses os quatro convidados.
Os palestrantes farão sua apresentação por 10 minutos, prorrogáveis a juízo desta Presidência. Após as explanações dos convidados, será concedida a palavra, por 10 minutos, à autora do requerimento.
Logo após, as Sras. e os Srs. Parlamentares inscritos poderão falar por até 3 minutos. Oportunamente, será concedida a palavra aos expositores para as considerações finais.
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Eu quero, inicialmente, pedir desculpas pelo atraso. Aqui está muito difícil, são uns dias cheios de reuniões e de decisões muito importantes para o nosso Brasil. Eu faço parte de várias Comissões e de vários grupos, inclusive do Grupo de Transição, e por isso cheguei atrasada. Mas nós vamos tentar, na medida do possível, cumprir a nossa agenda com vocês.
O meu nome é Carolini Constantino. Sou uma mulher com deficiência, graduada em Serviço Social, pesquisadora da área de deficiência e gênero, militante pelo direito das pessoas com deficiência e também pelos direitos das mulheres com deficiência.
Eu vou me descrever brevemente. Sou uma mulher de pele branca e tenho cabelo liso, castanho médio, abaixo dos ombros. Estou usando óculos de grau quadrados e dourados. Os meus olhos são azuis, o meu nariz é fino, a minha boca é mediana, estou usando uma blusa preta e um fone de ouvido branco. Atrás de mim, o fundo está desfocado.
Se me permitirem, eu vou fazer a leitura da minha fala para agilizar o tempo. Antes de mais nada, eu gostaria de agradecer o convite. É uma honra estar aqui para debater um assunto tão necessário.
Gostaria de iniciar este momento apresentando a vocês uma breve análise da realidade das mulheres com deficiência no Brasil. Estimativas apontam que entre 40% a 68% das mulheres com deficiência irão sofrer violência sexual antes dos 18 anos de idade. Essa informação é do Fundo de Populações da Nações Unidas — UNFPA, de 2018.
O Atlas da Violência, elaborado a partir de dados do SUAS, pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, em parceria com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, incluiu, na edição de 2021, pela primeira vez, dados sobre pessoas com deficiência. Esse levantamento comprovou que, a cada hora, acontece um caso de violência contra pessoas com deficiência no País; que 71% das notificações são de mulheres; e que 58% do total dos casos ocorrem no espaço doméstico. Então, podemos dizer, com toda a certeza, que a nossa casa acaba sendo o espaço mais violento para nós.
Para ilustrar ainda mais esse cenário, também quero trazer alguns dados da pesquisa sobre a violência doméstica contra mulheres com deficiência realizada pelo Criar Brasil, em parceria com o Coletivo Feminista Helen Keller, de mulheres com deficiência.
Nessa pesquisa, eles puderam contar com colaboradores de diferentes territórios, idades, raças, etnias e deficiências, dos quais 49,5% responderam que nunca tinham sofrido algum tipo de violência doméstica, ou seja, quase a metade. Mas, quando foram dados vários exemplos de práticas de violência, esse número subiu, e 72,5% afirmaram que já tinham vivenciado algum tipo das violências mencionadas. Portanto, embora uma boa porcentagem de mulheres houvesse respondido que nunca tinha sofrido qualquer situação de violência, elas, de fato, já haviam sofrido.
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Esses dados são alarmantes e também aterrorizantes. Algo precisa ser feito, mas, para tratarmos desse problema em si, precisamos entender a raiz dele. Segundo a pesquisadora Laureane Lima Costa, que também é uma mulher com deficiência, nós precisamos tomar consciência de que não é a condição da deficiência que agrava a subnotificação dos casos de violência contra mulheres com deficiência, mas, sim, as barreiras impostas pela cultura capacitista.
O capacitismo, que é o nome da discriminação contra pessoas com deficiência, materializa-se através de diversos fatores que contribuem para a violência contra mulheres com deficiência, tais como: impunidade dos agressores; medo de denunciar; ideias preconcebidas sobre inferioridade; desvalorização das pessoas com deficiência; omissão de profissionais de atendimento assistencial e da saúde, que não notificam ou denunciam casos de negligência e maus-tratos; e violência social, que ocorre pelo não reconhecimento da pessoa com deficiência como sujeito de direito.
Também temos as barreiras urbanísticas e no transporte. Em uma cidade que não conta com transporte público, que não tem recursos de acessibilidade, como sinal sonoro e piso tátil nas calçadas, será mais difícil de essas mulheres conseguirem chegar até uma delegacia. E muitas delas, quando chegam, geralmente se deparam com delegacias que não são plenamente acessíveis, com falta de uma estrutura física acessível e com uma carência de profissionais capacitados.
Ao mesmo tempo, ainda hoje, as mulheres com deficiência não são reconhecidas por sua identidade de gênero. Isso se dá, conforme Laureane, devido à combinação do que se espera das mulheres na nossa cultura patriarcal e à pressuposição da incapacidade de pessoas com deficiência, o que acaba impedindo que as pessoas reconheçam que, dentro desse grupo de pessoas com deficiência, também existem mulheres com deficiência.
Numa cultura patriarcal, que ainda associa o papel das mulheres à maternidade e ao cuidado, as mulheres com deficiência podem ser vistas como incapazes de exercer o seu papel e não serem, portanto, tidas como mulheres. Então, imaginem: se, em nenhum momento, somos tratadas como mulheres, como nós próprias vamos nos reconhecer?
Esse entendimento ocorre de forma mais tardia para nós. E aqui eu trago também um relato meu, pessoal. Eu só fui me entender enquanto mulher com aproximadamente 23 anos. Só a partir daí, fui conseguindo identificar as violências que já havia sofrido e também passei a conseguir me proteger das que poderiam vir a acontecer. Precisamos transformar essa realidade, pois, se não somos reconhecidas enquanto mulheres, acabamos não nos reconhecendo enquanto mulheres também e, logo, desconhecemos nossos direitos.
No entanto, pensando nas estratégias para o enfrentamento de toda essa violência, há muito o que se fazer, principalmente através das medidas de prevenção e tratamento.
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Em termos de tratamento, é extremamente necessário capacitar todos os profissionais que trabalham em contato com as vítimas; aumentar os canais de denúncia; estabelecer planos de enfrentamento à violência nos âmbitos estadual, municipal e distrital; implementar serviços de notificação de violência contra pessoas com deficiência no âmbito do SUS; construir centros integrados acessíveis e de prestação de serviço às vítimas de violência, com apoio psicológico e social; investir nas adaptações e construções de abrigos acessíveis que acolham vítimas de violência doméstica e que ofereçam não só uma estrutura física adequada, mas também funcionários que auxiliem nas demandas de cuidado de que elas necessitam. Ainda é essencial que haja a destinação de verbas ao orçamento público da segurança, especialmente para execução da Lei Maria da Penha, que ampara também esse grupo de mulheres.
Já como medidas de prevenção, é urgente e imprescindível que ocorra a inclusão das pessoas com deficiência na rede regular de ensino; a construção de campanhas de divulgação sobre os direitos desse grupo; e a produção de dados, pois os que temos não são suficientes para servir de base para as políticas públicas.
Também gostaria de salientar a necessidade de uma política pública do cuidado pessoal, porque, se essas mulheres puderem contar com cuidadores ou atendentes pessoais, contratados pelo Estado para fazer as mediações do cuidado que precisam no dia a dia, terão condições de denunciar algum familiar ou companheiro que tenha cometido uma violência contra elas. Hoje, sem nenhum assistente pessoal, muitas mulheres com deficiência acabam não conseguindo denunciar porque, muitas vezes, esse familiar ou companheiro que as agride é também a única pessoa que cuida delas.
Para finalizar, cito uma frase dita pela nossa amiga e uma das grandes referências da luta pelo fim da violência contra mulheres com deficiência, a Adriana Dias: "O nosso corpo esquecido ou silenciado é deixado na sombra para que os abusos aconteçam em silêncio". Então, peço a colaboração de todos, todas e todes para que tirem nossos corpos das sombras, porque não aguentamos mais ter os nossos direitos violados.
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A SRA. PRESIDENTE (Tereza Nelma. PSD - AL) - Muito obrigada, Carolini. Foi muito importante a sua fala, a sua contribuição.
Temos que combater a violência. Para isso, temos que nos instrumentalizar e nos unir cada vez mais. Além da Lei Maria da Penha, há vários outros marcos legais que precisam sair do papel, para que realmente a mulher seja prioridade. Nós temos dificuldades inúmeras em relação a isso.
Eu gostaria de convidar a Ana Paula Marques, paratleta olímpica de vela, vítima de tentativa de feminicídio.
Ana Paula, um dia eu estava assistindo à televisão e ouvi a sua história. Acho que foi no Bom Dia DF. Você estava falando da sua superação, da sua busca, da sua luta. Eu nunca esqueci isso. Faz mais de ano. Eu dizia: "Um dia vou convidá-la, para dar mais visibilidade à sua história e para conhecê-la". Nós precisamos muito dessas oportunidades.
A SRA. ANA PAULA MARQUES - Boa tarde. O meu nome é Ana Paula Marques. Sou paratleta de vela, como disse a Tereza, mas também de halterofilismo. Faço os dois esportes. Vou fazer uma autodescrição. Tenho a pele morena clara e os cabelos escuros. Estou com uma blusa cinza. Sou uma pessoa com deficiência, uso cadeira de rodas.
Tereza, você já ouviu a minha história, mas vou contar mais um pouquinho dela. Aos 16 anos de idade, conheci uma pessoa e com ela me relacionei. Aos 17 anos, ao ter um filho, eu me tornei mãe. O relacionamento, até então, era tranquilo, normal; mas, aos poucos, foi se tornando abusivo. De dentro do relacionamento, eu não percebia isso. Muitas coisas que iam acontecendo foram se tornando normais para mim. Aos 20 anos, comecei a trabalhar. Meu companheiro não aceitava isso, não queria que eu trabalhasse. Mesmo assim, eu continuei. O relacionamento foi se tornando cada vez pior, com os ciúmes e a perseguição no trabalho. Eu decidi me separar, porque já estava muito desgastante, não estava muito bom. Eu me separei, mas foi ainda pior. Ele ia todos os dias atrás de mim no trabalho e me seguia à noite na escola — eu voltei a estudar. Em qualquer lugar aonde eu fosse, ele ia atrás de mim. Foi quando começou a me agredir fisicamente.
Certa noite, na saída da escola, ele estava me esperando na rua. Minha irmã estava ao meu lado e tentou segurá-lo, mas não adiantou. Ele veio para cima de mim e me agrediu. Quando consegui me separar dele, eu corri. Minha irmã gritou. Ele puxou uma arma e disparou nas minhas costas. Foram dois disparos. No mesmo momento, eu caí no chão, perdendo a mobilidade das pernas. Não senti mais nada, só aquele choque. Caí, e minhas pernas não tiveram mais movimento a partir dali. Eu tinha 20 anos de idade.
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Ali começou a minha luta. Aos 20 anos, como mãe de uma criança de 3 anos, tive que superar uma deficiência que não me permitiria voltar a andar. E o fiz sozinha, porque a minha família não tinha como me apoiar, como me ajudar. Eles tinham os problemas deles. Então, eu comecei a correr atrás de tudo sozinha.
Como eu era do Rio Grande do Sul, eu conhecia a Rede Sarah Kubitschek. Comecei o tratamento aqui em Brasília. Vinha todos os anos para cá. Então, um amigo me convidou para me inserir no esporte. Mas eu ainda estava em luto, tentando entender o que estava acontecendo comigo e com o meu corpo, porque minha vida havia mudado totalmente. Eu não andava, não tinha mais sensibilidade na metade do corpo. Eu tinha problemas de saúde frequentes por causa da lesão que sofri na coluna. Além disso, havia a falta de acessibilidade, o fato de não poder ir a um hospital por não haver ônibus, não haver condução e de ter que viver pedindo ajuda para uma e outra pessoa. Foi bem complicado no início.
Decidi vir para Brasília para ver se eu tinha uma perspectiva melhor de vida. Pela acessibilidade do local, pelas pessoas que eu conhecia aqui, decidi vir para cá. Comecei a fazer o esporte no CETEFE. Fui pulando de esporte em esporte, até que eu parei na vela adaptada. Dali em diante, a minha vida começou a melhorar. Tive outras visões. Conheci outras pessoas. Comecei a viajar para fora do País, a conquistar medalhas de campeonatos mundiais e a cada vez mais a correr atrás das coisas.
Como a Carolini falou, há outros tipos de abuso que nós não percebemos. Dentro do relacionamento, eu não percebia que eu sofria abusos psicológicos e ofensas com palavras. Acontecia muito isso, e eu não percebia. Depois, nós vamos aprendendo. Vamos vendo que realmente não é só a agressão física. Há a agressão psicológica e de outras formas.
Além disso, como pessoa com deficiência e como mulher, eu sofri muitas violências em relação ao transporte público. O motorista dizia que o ônibus estava estragado e que não tinha tempo de parar para me colocar dentro. Em locais como órgãos públicos, como o INSS, como hospitais, ou não há qualquer tipo de acessibilidade, ou as pessoas não têm paciência e nos olham como alguém que vai dar ainda mais trabalho.
Há 2 anos, eu engravidei. Quando fui fazer o pré-natal, no hospital me olharam com cara de: "O que ela quer? Ela está com deficiência, com esse problema, e vai ser mãe de novo? Como assim?" Fui muito maltratada no hospital. Não descobriram o meu caso, o que eu tinha, por que eu estava passando mal. Acabei perdendo o bebê. Naquele momento em que perdi o bebê, eles não me deram nenhuma assistência. Ninguém veio me ajudar a tratar da perda daquela criança. Eles só viraram as costas, ao me dar alta, e me mandaram embora. Acabou ali. Acho que nós sofremos não só com a deficiência. Sofremos com várias violências mascaradas de algumas formas.
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A minha superação é correr atrás de tentar melhorar, mostrar às pessoas algumas coisas que nós sofremos mesmo. Espero superá-las, com faço pelo esporte. Continuo competindo, continuo viajando pelo País, continuo conquistando os meus títulos. Sempre que posso, dou palestras e falo sobre o assunto quando as pessoas querem saber mais um pouco do que pode ser feito.
O que pode ser feito é o que vocês estão fazendo agora, querendo achar uma forma para a violência ser vista e divulgada na mídia e em qualquer lugar, não só a cometida contra a pessoa com deficiência, mas também contra a mulher. Acho que esse é um caminho meio difícil de se percorrer, até porque já vai fazer 20 anos que estou em cadeira de rodas, e eu só vejo aumentar a violência contra a mulher. Vejo que muitas morrem, outras ficam deficientes. Várias coisas acontecem.
Há mulheres que não querem denunciar por medo, por falta de ajuda e de apoio. Depois que se separa, como não tem trabalho, a mulher não tem como cuidar da família e dos filhos. Por isso, ela não faz a denúncia. Várias coisas acontecem. Hoje é bom falar mais, é bom tentar achar uma forma de garantir que, se fizer a denúncia, a mulher terá apoio, ela não será abandonada à mercê da própria sorte, como eu fui. Graças a Deus, eu encontrei no caminho pessoas boas — e não só pessoas ruins —, que me apoiaram e me ajudaram nesse sentido. Hoje eu acredito que, se tivermos formas de ajudar mais, esse tipo de coisa vai diminuir, sim.
A SRA. PRESIDENTE (Tereza Nelma. PSD - AL) - Obrigada, Ana Paula.
Quero cumprimentar a Mesa na pessoa da Deputada Tereza Nelma e parabenizá-la pela iniciativa desta audiência tão importante sobre um tema tão necessário e urgente. Quero cumprimentar o Presidente da Comissão de Defesa dos Direitos das Pessoas com Deficiência, o Deputado Professor Joziel.
Eu sou a Rosana Lago, fundadora da Frente Nacional das Mulheres com Deficiência. Sou Coordenadora da Vida Brasil, uma instituição de direitos humanos. Sou Diretora Nacional de Políticas Públicas para as Pessoas com Deficiência do MDB. Sou uma mulher de pele branca, tenho cabelos castanhos escuros abaixo dos ombros e olhos verdes. Estou vestindo uma blusa branca. Estou sentada em minha cadeira de rodas em um ambiente de sala. Atrás de mim, há uma parede em tom bege, com um quadro. Ao meu lado, há uma cadeira.
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Quero agradecer a oportunidade e o convite para falar mais uma vez sobre esse tema. Nós estivemos aqui no ano passado, também pelos 21 dias de combate à violência contra as mulheres. Então, não há nada mais importante do que falarmos da violência às mulheres com deficiência. Depois de falas potentes que antecederam a minha, como a da Ana Paula Marques, nós vemos o quão urgente é debatermos esse tema entendemos a importância de uma coletividade que levante essa bandeira para nos dar visibilidade. Nós mulheres com deficiência sempre fomos invisibilizadas.
Hoje há um número absurdo de mulheres que sofrem no País qualquer tipo de violência. Nós a tipificamos, através da Lei Maria da Penha, como violência doméstica, patrimonial, sexual, moral, psicológica, de gênero, institucional e outras. Essas violências precisam ser combatidas, e a Frente Nacional das Mulheres com Deficiência veio dar voz, ocupar espaço de fala e trazer representatividade, porque é disso que nós estávamos precisando.
Os dados já apontados pela companheira do Coletivo Helen Keller são gritantes. Eles trazem números também de meninas e jovens que sofrem e têm marcadores sociais que são atenuantes para essa condição de violência doméstica, familiar e sexual. Nós falamos de meninas pretas, pobres, de periferia, com deficiência intelectual. Esses dados, que são apresentados pelo SUAS, embora a pesquisa seja do IPEA, como ela colocou, falam de mulheres com deficiência como as vítimas maiores. Nós somos cinco vezes mais vulneráveis a qualquer tipo de violência.
Então, entendendo o seu papel na coletividade, a frente sempre buscou trazer esse tema à tona. Hoje estamos participando, inclusive, da transição de governo, contribuindo com propostas. Nós entregamos uma carta de contribuição para que medidas efetivas e urgentes aconteçam logo. Sabemos o quanto isto é difícil dentro deste cenário, em que estamos saindo de um desgoverno. A questão orçamentária é um impedimento às realizações, mas é preciso e importante que políticas públicas sejam criadas para um enfrentamento maior e um olhar para essas mulheres que sofrem de forma invisível. São mulheres que estão dentro do ambiente doméstico, convivem com o agressor e não sabem que estão sofrendo uma violência como a patrimonial, por exemplo, quando ele toma o cartão dela, e ela não tem acesso ao BPC. As mulheres, muitas vezes, estão ali naquela condição e são submetidas àquilo porque não têm como recorrer.
A própria falta de acessibilidade, que já foi citada, é o maior entrave, a maior barreira, é o que impede que mulheres denunciem o agressor. Há falta de acessibilidade no transporte e nas próprias DEAMs. Há falta de acessibilidade comunicacional, quando não há LIBRAS ou impressora em braile dentro de uma delegacia especial para que uma mulher com deficiência possa ir lá.
Há falta até mesmo de profissionais capacitados na equipe multidisciplinar para que atendam à mulher revitimizada. É preciso principalmente dar atenção a casos de mulheres que estão em condição de deficiência em decorrência da violência. É um corpo marcado pela própria violência, que, agora, passará a enfrentar todas as dificuldades na condição de uma pessoa com deficiência. Então, é preciso, sim, de iniciativas como essa, de termos hoje esta audiência e de sairmos daqui com um compromisso mais do que importante.
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Eu chamo a atenção de todos que estão aqui nos ouvindo, incluindo os Parlamentares, para que se unam a nós nesse discurso.
No ano passado, eu estive com a Deputada Tereza Nelma em outra audiência, a primeira da qual a Frente Nacional participou — e foi um prazer. Eu pedi a ela para, juntas, assumirmos esse compromisso e levantarmos essa bandeira de luta. Isso perpassa a transversalidade, porque falar de violência doméstica não é só falar de segurança pública; é falar de saúde, porque essas mulheres precisam ser assistidas; é falar de assistência social; é falar de todos os outros direitos que a elas pertencem e da própria interseccionalidade. São mulheres pretas, de povos originários, ribeirinhas, indígenas e LGBTQIA+.
Nós temos o dispositivo da Lei Maria da Penha, mas não é o suficiente, como V.Exa. mesma colocou, Deputada. Precisamos nos unir para termos uma legislação garantidora da defesa desse público. Nós precisamos também do próprio poder público. A gestão do Estado nos nega essa atenção e esse olhar. As políticas públicas são inexistentes e há incipiência de dados. Nós só temos os dados do Atlas da Violência 2021, mas não temos exatamente estatísticas de violência contra mulheres com deficiência. Os próprios boletins de ocorrências não são preenchidos de forma correta, não notificam se aquela mulher tem uma deficiência e qual é o tipo de deficiência. O que isso comunica para as políticas públicas é que nós nem ao menos sofremos violência. E essa violência é cotidiana, essa violência é obstétrica. A própria Ana Paula contou o caso de quando estava esperando um bebê.
A nós mulheres com deficiência é negado até o direito à própria sexualidade, à maternidade, à reprodução. É preciso colocar isso em pauta, para que possamos dizer o quanto esse capacitismo que nos rodeia nos nega. O nosso País tem costumes que são patriarcais e sobrepõem quem deve viver, quem deve ter acesso aos direitos, quem deve ter acesso às políticas públicas. Precisamos reconstruir esse Brasil agora. Nós estamos vindo com a perspectiva de um novo governo, de esperança, de amor, de acolhimento, de oportunidade de igualdades para todas as pessoas. É preciso que se incluam as pessoas com deficiência, que se recorte a mulher com deficiência nessas políticas, para termos um país igual e justo, com mais esperança para todos.
A SRA. PRESIDENTE (Tereza Nelma. PSD - AL) - Eu agradeço, Rosana. Como muito bem lembrado, no ano passado, nós estivemos juntas. Eu tenho sempre essa preocupação de um olhar mais amplo sobre as políticas públicas, onde cabemos todos nós. Eu sempre digo que, no mundo em que eu acredito, cabemos todos nós.
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Uma palavra que acho muito importante e que entendo que deve fazer parte do nosso dia a dia é "respeito". Por que eu vou me incomodar com o colega, com a sua decisão de vida? Vamos trabalhar, vamos nos apoiar. Eu tenho essa visão, que algumas pessoas dizem que é um pouco ingênua, mas eu acredito nesse mundo.
Nós mulheres precisamos muito desse apoio e precisamos muito desenvolver a sororidade entre nós. Quando uma mulher cai, nós precisamos ser solidárias e estar junto a ela para levantá-la. Quando uma mulher é promovida, não devemos fazer a pergunta "por que não eu?", e sim aplaudir e ver que nós poderemos também ter oportunidades. Essa é a compreensão de mundo que eu tenho.
Deputada, eu vou começar a minha fala ressaltando uma palavra que a senhora usou na sua última intervenção, "respeito". Eu acho que é o norte desta audiência, é a palavra que resume o encontro desta tarde.
A primeira diz respeito às intervenções da Dra. Rosana e da Dra. Carolini, que nos apresentaram alguns dados. A Dra. Carolini trouxe dados do Atlas da Violência, do IPEA. Os dados que eu tenho da nossa Secretaria, obtidos em parceria com a Secretaria Nacional de Segurança Pública do Ministério da Justiça e Segurança Pública, foram consolidados de 2011 a 2017.
Esses dados apontam para um número de casos de violência entre pessoas de sexos distintos, no Brasil, em torno de 1 milhão e 429 mil nesse período; dos quais ,116 mil casos dizem respeito a pessoas com deficiência e, desses, 77 mil ocorrências são contra mulheres com deficiência.
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Alguns dados relevantes: dessas 77 mil ocorrências, 39 mil casos são de violência cometida contra mulheres brancas e 30 mil contra mulheres negras; 19 mil casos contra homens brancos; e 15 mil casos contra homens negros ou pardos, isso avaliado por um sistema de autodeclaração. Outro dado relevante, que coincide com o que a Dra. Carolini colocou em sua intervenção: a maior parte dessas violências acontece em ambiente doméstico, sendo muitos dos agressores pessoas do mesmo sexo, ou seja, mulheres agredindo outras mulheres, embora exista também um número significativo de homens que agridem mulheres.
Por que estou dizendo isso? Existe no Brasil, sim, uma dificuldade de se obter dados de modo geral. O que se tentou nos últimos 4 anos — e a Deputada sabe das nossas ações à frente da Secretaria Nacional — foi justamente criar uma política de estruturação de dados para que se possa construir qualquer política pública a partir de uma base sólida, e não sobre uma base empírica que depois pudesse causar problemas, inclusive com os órgãos de controle.
A partir desse dado da realidade, percebem-se dois aspectos fundamentais. O primeiro é que existe uma questão cultural no Brasil de violência contra mulheres, independentemente do fato de serem mulheres com deficiência ou não, mas, no caso da pauta de hoje, contra mulheres com deficiência. A que se deve isso? Alguns atribuem ao discurso de uma cultura patriarcal, de uma cultura machista, de uma cultura opressora. Eu prefiro a ponderação da própria Deputada, que diz que é uma cultura em que existe falta de respeito.
Eu não agrido a minha mulher. Sou casado há 14 anos e a conheço há 16 anos. Nunca levantei a mão para ela em momento algum, e não é pelo fato de ela ser mulher ou ser a minha esposa, mas porque não faço isso com ninguém. Eu divido as atribuições domésticas com ela porque entendo que, se somos casados e vivemos na mesma casa, eu tenho as minhas obrigações, e ela tem as dela. Nós temos um filho em comum, então é meu dever muitas vezes lavar um banheiro, varrer a casa, trocar a roupa de cama. É uma questão de respeito! Então, imagino que o problema fundamental da violência deve-se a um problema de respeito, e não ao fato de o homem ser um macho opressor contra uma mulher.
A pergunta que fica é: o que se pode fazer para enfrentar essa violência? A Dra. Rosana foi bem cirúrgica quando disse: "Esse é um problema que não se resolve exclusivamente com questões policiais". É verdade. E as mulheres com deficiência precisam ir à escola, precisam trabalhar, precisam ir ao hospital.
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A Dra. Ana Paula disse: "Perdi meu bebê por um mal atendimento, que credito muito à questão da deficiência". Ora, isso coloca um aspecto importante: a necessidade de capacitação dos profissionais de saúde das escolas na compreensão do que é o tratamento da deficiência.
Recordo que, em 2020, quando fui Secretário Nacional de Justiça, existia diante de nós uma dificuldade, que era a questão da identificação do tráfico de pessoas, de mulheres que eram vítimas de tráfico, seja o tráfico interno de mulheres retiradas de um lugar para outro no Brasil para a prostituição, seja o de mulheres que eram levadas para fora do Brasil também para a prostituição. Qual é a grande dificuldade? Primeira: que a mulher compreenda que ela está sendo vítima de tráfico e não está sendo levada para outro lugar sob uma proposta de trabalho. Segunda: que essa mulher, ao chegar para um atendimento em uma Unidade Básica de Saúde, consiga ser percebida pelos profissionais como alguém que está sendo vítima de tráfico de mulheres. Como fizemos para enfrentar esse problema? Realizamos um curso de capacitação em parceria com todas as Unidades Básicas de Saúde do Brasil para que todos os profissionais — enfermeiros, médicos e assistentes que nelas trabalham — possam perceber os sinais externos dessa violência do tráfico de pessoas e, a partir dali, possam identificar e denunciar.
Imagino, Deputada, que, nesse caso, o importante seja efetivamente a capacitação dos profissionais. Quais profissionais? Os que estão na ponta e que têm contato com essa gente: os profissionais da escola, da saúde e da assistência social. Então, já que a Dra. Rosana e a Deputada estão na equipe de transição, é necessário que esse tema seja levado à transição para que, na época, invistamos algum recurso nesses profissionais. É necessário que se reserve algo do Orçamento que está sendo votado para investir na capacitação deles.
Do ponto de vista legislativo, a nossa legislação é talvez uma das melhores do mundo. Nós trouxemos de fora a figura do feminicídio. Existe a Lei Maria da Penha, mas talvez falte uma mudança significativa na nossa grade curricular.
A Lei nº 9.394, de 1996, Lei de Diretrizes e Bases da Educação, tem em sua proposta conceitos que já não correspondem mais à realidade, por exemplo: nas aulas de matemática, os alunos são provocados a traçar as medianas e as bissetrizes dos triângulos ou a calcular o seno, o cosseno ou o volume da esfera, com fórmulas como: quatro terços de pi vezes R ao cubo, mas não são instados, por exemplo, a saber fazer operações com cartão de crédito. Nesse caso, trazendo essa realidade para dentro do tema da violência contra a mulher, talvez seja importante trazer situações desse tipo de violência para que as crianças saibam que isso existe, para que sejam estimuladas desde logo a conhecer a política do respeito umas às outras.
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A Dra. Rosana citou a questão relacionada ao atendimento em LIBRAS. O VLIBRAS, que é uma ferramenta que funciona como o Google tradutor, realiza hoje 100 mil traduções por dia de páginas de Internet. É possível a um surdo colocar um arquivo em português dentro do aplicativo do VLIBRAS e ter todo o seu conteúdo traduzido para a Língua Brasileira de Sinais. São 100 mil traduções por dia, o que significa 3 milhões de traduções por mês, 21 mil sinais incorporados à plataforma desde que ela foi criada e 70 mil frases incorporadas.
Do ponto de vista das pessoas cegas, estimulamos, aqui no curso voltado para as delegacias de violência contra a mulher, contra meninas com deficiência, que essa ferramenta seja incorporada ao atendimento. Explico: sabendo-se que um dos problemas da violência contra a mulher se dá na hora do atendimento, ou seja, na hora em que o profissional da delegacia muitas vezes não sabe o que fazer diante de uma vítima de violência doméstica ou de violência contra mulher, violência de gênero, que seja, sobretudo, pessoa com deficiência, criamos, com a Universidade Federal do Maranhão, o curso de capacitação de profissionais.
Esse curso terá duração até outubro do ano que vem. A nossa pretensão é capacitar o máximo de profissionais de segurança. Não me refiro apenas a policiais civis, militares ou federais, mas também a membros do Corpo de Bombeiros dos Estados, para que eles possam ter conhecimento necessário na hora de fazer o atendimento a uma pessoa com deficiência.
O curso não é perfeito. E esse dado já nos chega a partir do seu primeiro ano de implantação. Os profissionais, muitas vezes, queixam-se porque querem um curso mais operacional e menos teórico, algo que diga mais respeito ao seu dia a dia, como: "Se eu recebo uma pessoa surda na delegacia para ser atendida, o que eu devo fazer? A quem devo buscar? A quem devo procurar?"
Essas informações são importantes, esses dados estão sendo trabalhados. Acredito que, na próxima gestão, haverá muitas dessas entregas. E, repito, houve 104 entregas em quase 48 meses, o que equivale a uma entrega para pessoa com deficiência a cada 15 dias e ainda nos gera uma gordura de oito entregas, que podemos distribuir.
Imagino que quem se sentar na cadeira da secretaria na próxima gestão terá uma secretaria toda estruturada, com todos os dados consolidados, para superar o que a Dra. Carolini e a Dra. Rosana colocaram, que nós precisamos de dados. Os dados estão aqui. E a Deputada já tem conhecimento deles, pois já lhes foram passados. Quando aconteceu a última sessão do CONADE, no dia 9 de novembro, eu tive a oportunidade, também como Presidente, de apresentar isso a todos os conselheiros, deixando todos absolutamente conscientes de onde estamos e para onde devemos caminhar.
Essas foram as nossas contribuições para a pauta da pessoa com deficiência. E acredito, Deputada, que a senhora resumiu com uma clareza enorme o problema que temos aqui diante de nós. Nós temos que estimular uma cultura de respeito: respeito da mulher pelo homem, do homem pela mulher. Não podemos, de maneira alguma, fazer com que, na nossa sociedade, homens e mulheres sejam rivais. Não é assim que se constrói. Não é isso o que eu vejo na minha própria família.
A SRA. PRESIDENTE (Tereza Nelma. PSD - AL) - Muito obrigada, Claudio. É importantíssimo você divulgar as entregas. A sua fala vem numa boa hora, numa hora em que nós devemos ter muito claro que, com todo o esforço que você fez, com toda a equipe que você tem, precisamos de mais recursos financeiros, até para ampliarmos mais todas essas iniciativas.
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Nós vamos continuar trabalhando para que realmente, cada vez mais, as pessoas com deficiências tenham os seus direitos concretizados.
Se a violência contra a mulher, de forma geral, já é inviabilizada na nossa sociedade, a violência contra a mulher com deficiência é ainda mais e se soma a outras inúmeras formas de agressão sofridas por essas mulheres no dia a dia.
Em que pese os direitos das pessoas com deficiências serem garantidos por lei, com a promulgação da Lei Brasileira de Inclusão — LBI, que alguns tratam como Estatuto da Pessoa com Deficiência, em 2015, essas mulheres não são amparadas pela estrutura dos serviços públicos, que muitas vezes não dispõem de acessibilidade e até mesmo de mobilidade urbana para que elas cheguem ao local para realizar a denúncia.
Além disso, a falta de autonomia de uma parcela das mulheres com deficiência e a vulnerabilidade inerente a certas deficiências geram violências invisíveis, e isso aumenta a subnotificação das agressões. No Brasil, há cerca de 45 milhões de pessoas com deficiência, e essa população precisa lidar com baixo acesso ao mercado de trabalho, dificuldade para ter acesso à educação e à saúde, dificuldade de mobilidade e, principalmente, dificuldade de denunciar as violências sofridas.
Dados da Organização das Nações Unidas apontam que uma a cada cinco mulheres em todo o mundo tem algum tipo de deficiência. Apenas no Brasil há mais de 10 milhões de mulheres com deficiências, parcela da população que é constantemente vítima de diferentes tipos de violências.
A maior parte dos casos de violência contra as mulheres com deficiência ocorre no ambiente doméstico e familiar, sendo que o agressor, geralmente, é algum familiar, 20%; pessoa próxima, 27%; companheiro ou ex-companheiro, 11%, de acordo com o Sistema de Informação de Agravos de Notificação — SINAN. Na maior parte dos casos, os homens foram os autores, 91%; assim como, em outros tipos de violência, as mulheres negras são a maioria das vítimas, 54%.
Diante desses pontos, o objetivo desta audiência é promover um debate sobre formas de enfrentar a invisibilidade dessas mulheres e, assim, garantir o aprimoramento de políticas de acessibilidade, enfrentamento às múltiplas violências sofridas e aos estigmas que vitimam mulheres com deficiência.
Esta audiência está inserida no âmbito da campanha 21 Dias de Ativismo pelo Fim da Violência contra as Mulheres, promovida pela Secretaria da Mulher, com a liderança da bancada feminina do Senado Federal, além da Comissão dos Direitos da Mulher e da Comissão dos Direitos das Pessoas com Deficiência.
Eu, na qualidade de Deputada, tenho sempre levado esse assunto à pauta de discussões, mas vocês também precisam participar, conversar, discutir novas ideias.
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Em primeiro lugar, quero agradecer o convite. Eu acho que o debate é importantíssimo. Eu acho que pensar em políticas públicas — e eu tenho acompanhado o trabalho da senhora nessas audiências e nos diferentes projetos de lei pelos quais a senhora tem se responsabilizado — não é uma tarefa fácil. Os temas são bastante densos, trazem muita paixão, mas nós precisamos ter o máximo de serenidade possível para construir leis que representam avanços para o nosso País.
Nesse sentido, vou destacar duas ações que eu acho que são de extrema importância. Não sei se foi a Dra. Rosana que colocou isso, quando se referiu à subtração do cartão do BPC. Dra. Rosana, uma das grandes preocupações... Eu não disse, mas digo agora: eu sou cego, eu sou uma pessoa cega há muitos anos. Eu perdi a visão com 10 anos para 11 anos de idade. Eu tenho 49 anos hoje. Então, já se vão quase 40 anos. Eu acredito que uma das formas de afirmação da pessoa com deficiência é o trabalho. E, mais do que qualquer política pública voltada para o nosso segmento, a principal é aquela que nos dá oportunidade de trabalhar.
A Deputada teve oportunidade recentemente de assistir na Câmara dos Deputados a votação do Projeto de Lei nº 2.190, de 2019 — guardem esse número —, que agora tramita no Senado. Esse projeto regulamenta o trabalho com apoio, o que alguns chamam de emprego apoiado, da pessoa com deficiência. Considero esse projeto de lei uma das principais ações para o nosso segmento, porque, na medida em que as pessoas com deficiência tiverem condições de trabalhar com todas as medidas de apoio, com agente facilitador, com tecnologias assistivas, elas vão ganham a independência de que elas tanto precisam para tocar as suas próprias vidas.
Internamente, aqui na Secretaria, eu hoje terminei — e fui eu mesmo que fiz — o parecer de mérito de um decreto presidencial que eu queria aprovar até o final do ano para regulamentar o trabalho com apoio dentro do serviço público federal. Eu já conversei com algumas secretarias municipais, e a ideia é replicar esse modelo, repassando-o para os secretários municipais, que terão mais 2 anos de gestão pela frente e poderão implementá-lo também dentro do serviço público, que acolhe muitas pessoas com deficiência também, seja servidor, seja terceirizado.
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Novamente, quero parabenizar a Deputada. Temos que pensar, a partir de uma audiência como esta, nas alternativas que temos para criar espaços de exclusão dessa violência. Eu acredito que um desses espaços é o trabalho, quando se dá independência e autonomia para a pessoa com deficiência. E considero que um decreto regulamentador para o serviço público e o Projeto de Lei nº 2.190, de 2019, que hoje tramita no Senado Federal, são as duas medidas que talvez possam significar, no ano que vem, um salto de qualidade em termos de independência e autonomia das pessoas com deficiência e, consequentemente, a redução desse espaço de violência que nós enfrentamos.
A SRA. PRESIDENTE (Tereza Nelma. PSD - AL) - Obrigada, Claudio, por essas informações.
A SRA. PRESIDENTE (Tereza Nelma. PSD - AL) - Pode. A Rosana se manifestou primeiro. Depois, passo a palavra a você, Carolini.
Quero dizer da importância de fato, Secretário, do respeito, respeito às mulheres, respeito às diferenças, respeito à diversidade. Eu entendo que, nessa questão da violência contra a mulher com deficiência especificamente, um dos maiores marcadores sociais que impedem essa mulher de sair do ambiente de violência é justamente a condição de vulnerabilidade econômica, a qual você colocou muito bem. Se as mulheres e se a pessoa com deficiência tiverem acesso ao mercado de trabalho, vão ter muito mais autonomia e condições.
Muitas vezes, a mulher fica realmente dentro de casa porque ela tem um marido que a sustenta, ela tem um marido que olha para ela e fala: "Se você voltar para a casa da sua família, eles não vão querer você, ninguém vai querer você". Eu ouvi isto enquanto mulher com deficiência numa relação tóxica: "Ninguém vai querer você depois de mim porque você tem uma deficiência". Então, isso é um peso muito grande para uma realidade de uma mulher que vive no lar de um companheiro — e esse companheiro é seu agressor. Se ela tem acesso ao mercado de trabalho, com políticas que de fato saiam da Lei de Cotas, porque vivemos a própria violência de gênero... Entre homens e mulheres com deficiência, a mulher com deficiência é muito mais discriminada do que o homem. O acesso ao mercado de trabalho para o homem é mais fácil do que para nós mulheres. Então, esse já é um bom caminho.
Eu também defendo a importância de as mulheres estarem onde elas quiserem, principalmente num espaço de poder como a política, porque colocamos em prática a verdadeira democracia, que é aceitar as diferenças. O nosso Brasil é tão plural. E por que não mulheres com deficiência também pertencerem à política? Assim, vamos barrar a própria inconstitucionalidade dessas violações de tantos direitos que nos são de fato negados.
Então, é o momento sim de as mulheres saírem da invisibilidade e de dar visibilidade a tantos outros temas que para elas são importantes, principalmente este, a questão da violência doméstica, familiar, de gênero e tantos outros tipos, porque também temos consequências em outras mulheres, podendo vir a ser também pessoas com deficiência. Eu acho que este é o momento.
Já aproveitando a minha fala final, parabenizo a Deputada Nelma e agradeço pela oportunidade de estar aqui, mais uma vez, falando em nome da frente nacional. Quero agradecer a todo o coletivo de mais de 170 mulheres. Convido aqui as mulheres com deficiência que quiserem fazer parte do coletivo, bem como aquelas que não têm deficiência para que possam também unir-se a nós. Convido as instituições de pessoas com deficiência para também olhar para esse tema com um olhar especial. Ao falarmos disso, falamos de meninas com autismo, falamos de meninas com síndrome de Down, falamos de jovens, falamos de tantos outros tipos de deficiência, mas com um recorte de gênero.
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A SRA. PRESIDENTE (Tereza Nelma. PSD - AL) - Boa tarde.
Acho muito importante você encaminhá-la. Eu tive acesso à carta porque estou na Comissão, Rosana, mas acho importante você nos encaminhar porque podemos encaminhá-la para os outros membros da Comissão de Defesa dos Direitos das Pessoas com Deficiência e também para a Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher. Pode encaminhá-la que eu farei isso.
Lembro que nós estamos agora falando sobre violência, Claudio, e eu estou danada aqui porque não estou próxima de você para te entregar o lacinho branco. Hoje é um dia muito importante. Vocês precisam divulgar e incorporar isso. É o Dia Nacional de Mobilização dos Homens pelo Fim da Violência contra as Mulheres. Aqui na Câmara, nós estamos distribuindo um lacinho branco para todos e todas, desde o porteiro até o Deputado, até o Senador. É muito importante que façamos essa divulgação. É muito importante que se crie uma associação de homens contra a violência à mulher. Precisamos de todos os instrumentos necessários para que se diminua essa violência, que é tão grande entre nós mulheres.
A minha fala vai ser breve. A discussão de hoje foi muito rica, potente, depois de escutar fala de todos os meus colegas de Mesa. Nós tivemos um forte relato, que traz um pouco da nossa realidade, dos apontamentos da colega Rosana e também a fala do Secretário. Eu concordo com ele, não existe liberdade sem liberdade financeira. Porém, antes disso, nós temos que ter acesso à educação inclusiva, o que hoje não acontece e querem a todo custo nos segregar.
Também quero dizer que é muito importante que todos saibam que a luta pelo fim da violência contra as mulheres, especialmente a violência sofrida por mulheres com deficiência, é um problema social, e todos, sejam homens, mulheres, pessoas sem deficiência, têm o poder e o dever de transformar essa realidade.
Novamente, agradeço a oportunidade de estar aqui. Fico muito feliz de participar desta audiência tão importante, que amplia nossas vozes e nos permite trazer visibilidade para questões que são sempre deixadas lado. Saio daqui hoje muito fortalecida, confiante de que nós vamos colher bons frutos, ainda mais com o nosso novo Governo que está chegando aí, que já teve a oportunidade de demonstrar que respeita muito as mulheres e as pessoas com deficiência, que não economizará nem cortará verbas nessa área.
A SRA. PRESIDENTE (Tereza Nelma. PSD - AL) - Obrigada, Carolini.
Não pude estar presente pessoalmente aí porque não deu tempo de chegar, mas, quem sabe, em outra oportunidade, nós nos conheçamos pessoalmente.
Quero agradecer a todos pelas considerações sobre a luta pelo fim da violência contra as pessoas com deficiência, que é uma pauta muito boa para discussão. Espero tentarmos fazer algo para que tudo possa melhorar, para que nós, pessoas com deficiência, tenhamos uma vida melhor. Sei que é difícil, mas temos que continuar lutando. Não dá para desistir, não.
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A SRA. PRESIDENTE (Tereza Nelma. PSD - AL) - Obrigada, Ana Paula. Agradeço muito a você.
Aproveitando todas as falas, eu quero dizer que, além do trabalho, eu acredito muito no esporte como instrumento de inclusão. Eu acho que o trabalho e o esporte são fundamentais e muito importantes para que a acessibilidade e a inclusão se realizem, seja na educação, seja na saúde, seja na moradia.
Eu tenho acompanhado de perto algumas pessoas com deficiência que são paratletas e vejo o quanto são felizes, o quanto buscam soluções, são muito mais rápidas e saem um pouco daquele muro de lamentação e do vitimismo. Nós temos que arregaçar as mangas e ir à luta sempre.
Antes de encerrar, eu quero registrar que participamos nesta semana, com a Luciana Trindade, Coordenadora do PSB Inclusão, e com um grupo de cerca de 120 pessoas, de reuniões on-line. Participamos de uma grande live que também foi realizada pelo PSB Inclusão, com a Rebeca e a Luciana, que estão assistindo a esta reunião pelo Youtube. Quero registrar também a presença da Ana Cláudia Tiburtino, das Alagoas, uma jovem mulher casada, com deficiência, muito consciente do seu papel.
E, na busca dessa dignidade, quero parabenizar todos aqueles que estão assistindo tanto presencialmente, na Câmara, como também através do Youtube. Esta audiência está sendo gravada e poderá ser acessada pelo canal da Câmara.
Quero dizer desse nosso compromisso neste mundo mais inclusivo, mais respeitoso e com mais acessibilidade. Eu digo que depende muito de cada um de nós, da nossa participação, da nossa busca, de sempre levantarmos essa bandeira de mais inclusão, menos violência, mais paz, para que nós voltemos a ser felizes.
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