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A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Declaro aberta a presente reunião.
Informo a todas e a todos os Parlamentares e também a todas e a todos os presentes que esta reunião será realizada de forma presencial e via web, através do aplicativo Zoom, ao vivo pela Internet, no site da Câmara dos Deputados e na página desta Comissão de Trabalho, de Administração e Serviço Público, no endereço www.cd.leg.br/ctasp, e, para perguntas interativas, no endereço www.cd.leg.br/e-democracia_2857.
Informo ainda que as imagens, o áudio e o vídeo desta reunião estarão disponíveis para serem baixados na página desta Comissão de Trabalho logo após o encerramento dos trabalhos que estão em curso e que as fotos do evento, se houver, serão disponibilizadas no Banco de Imagens da Agência Câmara, na página da Câmara Federal.
Esta reunião de audiência pública foi convocada nos termos do Requerimento nº 88, de 2022, de minha autoria, a Deputada Erika Kokay, aprovado por esta Comissão, com o objetivo de estabelecermos discussão acerca do assédio sexual no ambiente de trabalho.
Nós temos vários convidados e convidadas para esta audiência. Eu vou ler o nome das pessoas que foram convidadas para esta discussão, e, em seguida, nós faremos a composição da Mesa.
Foram convidados a Dra. Deborah Duprat, Subprocuradora-Geral da República, hoje aposentada, que está participando desta audiência de forma remota; o Sr. Rogério Bimbi, Presidente do Conselho de Administração da Caixa Econômica Federal; a Sra. Rita Serrano, representante eleita dos empregados e empregadas do Conselho de Administração da Caixa Econômica Federal; o Sr. Sergio Takemoto, Presidente da Federação Nacional das Associações do Pessoal da Caixa Econômica Federal; a Sra. Maria Fernanda Ramos Coelho, ex-Presidenta da Caixa Econômica Federal; a Sra. Carolina Lacerda Tostes, empregada da Caixa Econômica Federal; o Sr. Adauto Duarte, representante da Federação Brasileira de Bancos; a Sra. Fernanda Lopes, representante da Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro — CONTRAF-CUT; o Sr. Kleytton Morais, Presidente do Sindicato dos Bancários de Brasília; o Sr. Rodrigo Rangel, jornalista do Portal Metrópoles; a Sra. Thaís Faria, representante da Organização Internacional do Trabalho — OIT; a Sra. Melícia Alves Mesel, representante do Ministério Público do Trabalho — é uma alegria tê-la presente aqui; e, por fim, o Sr. Arnaldo Corrêa de Oliveira, Presidente do SINDCLUBES, de Brasília.
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Eu também gostaria de explicitar que, salvo manifestação explícita em contrário, a participação das e dos palestrantes na Mesa de apresentação e debates deixa subentendida a autorização da publicação, por qualquer meio, em qualquer formato, inclusive mediante transmissão ao vivo ou gravada, pela Internet e nos meios de comunicação desta Casa, e por tempo indeterminado, dos pronunciamentos e das imagens pertinentes à participação nesta audiência pública, realizada nesta data, segundo o art. 5º da Constituição Federal e a Lei nº 9.610, de 1998. Portanto, as pessoas que não autorizarem a divulgação dos seus pronunciamentos e das suas imagens podem fazê-lo explicitamente. Senão, haverá o entendimento de que há autorização para que as imagens, os depoimentos, enfim, as participações nesta audiência pública sejam divulgadas amplamente.
Inicialmente, nós vamos escutar a Sra. Deborah Duprat, que é Subprocuradora-Geral da República aposentada.
Solicito aos convidados que, depois de fazerem uso da palavra, voltem a ocupar qualquer assento neste plenário, para que possamos fazer o rodízio das falas. A Mesa é ampla, e achamos importante que todas e todos vejam de forma clara a participação de todas as pessoas convidadas.
Não está presente o Presidente do Conselho de Administração Caixa. Assim que ele adentrar este recinto para participar desta audiência, nós lhe concederemos a palavra.
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O Claude Lefort, sobre as origens do totalitarismo, chama a atenção para o fato de que a primeira atitude de um líder totalitário, geralmente de perfil autoritário, vai ser ade minar a burocracia estatal, vai ser a de minar o espaço de produção de conhecimento para a elaboração de políticas públicas. Por quê? Porque esse líder chega supostamente encarnando a vontade do povo. Então, não há nenhum espaço institucional que saiba mais do que ele, que é o repositório da história do povo, da vontade do povo, do destino do povo. Por isso, ele vai de uma maneira geral minar a capacidade da administração de gerar respostas públicas e vai também infiltrar um sentimento de desamparo nos servidores, porque nunca sabem se estão fazendo certo ou errado. Porque o certo ou o errado depende da vontade do líder.
Eu acho que, a esta altura, nós não temos dúvida de que Bolsonaro se comporta tal como um líder totalitário, um líder autoritário. Nós talvez tenhamos esquecido o que foi aquela reunião em abril de 2020, em plena pandemia, quando ele, com os seus Ministros, mostrou que quem dominava a máquina pública, a estrutura pública burocrática era ele. Ele dizia que ia fazer interferência na Polícia Federal, reclamava do Diretor do IPHAN — Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico porque estava impedindo uma obra e dizia que ia substituí-lo, falava da Ministra Tereza Cristina, que tinha atendido a vontade dele no Vale do Ribeira, o local onde a família dele mora. O Ministro do Meio Ambiente falava que era preciso prender os Ministros do Supremo Tribunal Federal, e a Ministra Damares Alves falava que ia prender Governadores. Enfim, aquela desfaçatez que foi a reunião mostrou que todos estavam ali muito obedientes e muito servis à vontade do Bolsonaro.
Mais recentemente, uma publicação conduzida pela Associação dos Funcionários do IPEA — AFIPEA, muito importante, mostrou de fato que o assédio é uma estratégia de governança do Bolsonaro e deu o nome de "assédio institucional" a uma série de estratégias que tendem a minar exatamente essa capacidade de resposta administrativa. Uma das estratégias é pessoal, sobre os servidores. São ataques à sua liberdade de expressão, é a inibição da possibilidade de agir daqueles que conhecem o tema. É o caso da morte de Bruno, recentemente afastado de uma missão importante, relativa a índios isolados. Enfim, a estratégia é tirar servidores com conhecimento daquele espaço e colocar no seu lugar pessoas que não detêm qualquer conhecimento técnico. O assédio é permanente, é aquela noção de que, se você fizer a missão institucional, você vai ser perseguido, você vai ser castigado. A outra estratégia é de natureza organizacional. Ou seja, alteram as competências internas do órgão, de tal modo que ele já não se entende mais. Então, setores que eram destinados a coibir desmatamento passam a ser setores que vão liberar atividades de mineração, de garimpo. Essa estratégia é organizacional. Também há uma estratégia orçamentária, que é a de desidratar o órgão, pela incapacidade de ter recursos ou de gerir adequadamente os recursos que lhe foram destinados.
Nós tivemos um exemplo muito claro do que é a atuação do Bolsonaro contra o conhecimento técnico por ocasião do enfrentamento à COVID-19. Foi ele que disse quais medicamentos deviam ser prescritos, quais medidas não deveriam ser adotadas, como a vacina, a máscara. Enfim, ele substituiu o conhecimento técnico pela sua vontade.
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O livro Assédio institucional no Brasil mostra o impacto da gestão do Bolsonaro no Itamaraty, na área da cultura, na Fundação Casa de Rui Barbosa, na FUNAI, no Ministério do Meio Ambiente, todos eles trabalhados para minar, como eu disse, a capacidade própria da instituição, a sua missão, ou constitucional ou legal.
Em termos orçamentários, o livro Assédio institucional lembra o que se passa na área de ciência, tecnologia e inovação, em relação à CAPES — Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior, ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico — CNPq, à Financiadora de Estudos e Projetos — FINEP.
Mais recentemente, outra publicação, intitulada Fundação Anti-indígena, mostrou o que aconteceu no âmbito da Fundação Nacional do Índio — FUNAI. Além de o seu Presidente ser um policial federal que pede aos seus colegas que instaurem inquéritos policiais contra servidores, que persegue lideranças indígenas, no primeiro ano do Governo Bolsonaro ele procurou desorganizar a FUNAI, passando a demarcação de terras indígenas para o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento — MAPA e passando todas as demais atribuições indígenas para o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos. Não conseguiu, porque o Congresso Nacional barrou. No entanto, ele encaminhou todo o orçamento para aqueles órgãos, que não tinham mais atribuição para tocar a questão, ou seja, o orçamento para demarcação de terras indígenas foi para o MAPA e, para as demais questões, foi para o Ministério da Damares. Perdeu-se um orçamento.
O que eu quero dizer com isso tudo, já terminando, porque o meu tempo está se encerrando, é que não podemos ignorar que o assédio sexual ocorrido na Caixa Econômica Federal de fato é um crime, está previsto no Código Penal, mas que ele tem uma dimensão desse assédio institucional, que não pode ser negligenciada. O assédio sexual fala muito de como o Governo Bolsonaro trata a administração pública federal brasileira, fala muito de como o Governo Bolsonaro trata as mulheres. Nós não podemos deixar de lembrar que os estereótipos de gênero compõem a primeira cena simbólica deste Governo: "Meninas vestem rosa e meninos vestem azul".
Eu acho que é muito importante esse movimento dos servidores da Caixa, porque nós vamos ter que fazer, em alguma hora, uma espécie de justiça de transição em relação ao Governo Bolsonaro. Vamos ter que lembrar, para não esquecer e não repetir, o que está ocorrendo na administração pública federal brasileira.
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Dra. Deborah Duprat, nós agradecemos a sua contribuição nesta audiência.
Nesta audiência, nós queremos também discutir mecanismos de prevenção e mecanismos de apuração. Ou seja, quais instrumentos podem ser construídos para que isso nunca mais ocorra ou para que não haja esse manto muito espesso que asfixia a própria democracia, e a lógica republicana seja tecida com os fios da impunidade, ou seja, para que haja responsabilização.
No Código Penal, assédio sexual é crime, e não há dúvidas acerca disso. Não podemos ter nas empresas órgãos que não encaminham as denúncias ou que não apuram com independência e com rigor as denúncias que chegam. Há denúncias de que, na Caixa, as vítimas recorreram à instituição, e a instituição não deu respostas. Portanto, é preciso que haja parâmetros de atuação dos instrumentos de apuração e que haja a possibilidade de responsabilização da empresa que não atuar para combater um crime.
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Aliás, assédio sexual pressupõe a existência de rede ou de redes, de mais de uma pessoa, não apenas da pessoa que diretamente agride, da pessoa que está assediando, o assediador. Existe uma rede, que se constrói, de apoio a essa pessoa. Nós estamos vendo que várias pessoas na Caixa foram destituídas das suas funções, mas assumiram outras funções, às vezes com remuneração maior. Ou seja, não houve de fato a responsabilização das pessoas que cometeram esse crime na Caixa, até o momento.
Nós encaminhamos à Secretaria da Mulher da Câmara dos Deputados a necessidade de que apure ou acompanhe todo o processo de apuração das denúncias de assédio sexual dentro da Caixa. É importante que esta Casa, como representante do povo e como uma instituição que deve fazer valer a nossa Constituição e a nossa legislação, acompanhe o desdobramento de todos esses casos.
Queremos discutir mudanças na legislação. Nós vamos apresentar um projeto sobre assédio de segunda ordem. O que significa isso? É o rompimento do isolamento no qual a vítima muitas vezes mergulha, numa solidão. Muitas vezes há denúncia, mas não há conforto para as testemunhas ou para as pessoas para contribuírem para o processo e testemunharem. Então, a vítima passa a vivenciar uma profunda solidão e abandono. Quando nós falamos de assédio sexual, ou assédio moral, ou crime no ambiente do trabalho, falamos de uma relação que se constrói. Muitas vezes a testemunha teme a perda do seu próprio emprego ou teme ser perseguida, porque testemunha a favor ou consegue expressar o que conseguiu averiguar ou testemunhar. Então, nós estamos criando, estamos construindo esse projeto. Já existe um projeto como esse em Barcelona e em alguns países da Europa, sobre o assédio de segunda ordem. As pessoas são assediadas porque se colocam como testemunhas ou como construtoras da verdade em outro processo, para romper esse isolamento e essa solidão, que é uma solidão que revitimiza.
Alguns dados de uma pesquisa que envolveu 414 pessoas pontuam que apenas 5% das vítimas de assédio têm segurança para fazer denúncias nas estruturas de gestão de pessoas da empresa e que 15% acabam por pedir demissão. Ou seja, a vítima acaba sendo revitimizada e, para resgatar a sua própria saúde e romper com a situação de profundo e contínuo sofrimento, opta por sair da própria empresa. Ou seja, ela é revitimizada. A solidão revitimiza, o abandono revitimiza.
Portanto, reitero a importância de um projeto que assegure a responsabilização do assédio de segunda ordem, ou seja, esse assédio que é feito para que haja isolamento das testemunhas, para que dessa forma as vítimas não consigam ter os elementos comprobatórios necessários, porque as testemunhas se sentem mergulhadas no medo e na solidão.
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Deputada Erika, primeiro quero congratular-me com sua iniciativa. A sua presença constante em debates que são sensíveis aos trabalhadores e às trabalhadoras vem sendo fundamental para que possamos fortalecer nossa organização e tentar revogar medidas extremamente injustas, que retiram direitos. A CGPAR 23, por exemplo, foi iniciativa sua, assim como o debate de hoje, relevante, extremamente necessário para o momento que vivemos no País e, logicamente, para o momento que vivemos na Caixa Econômica Federal.
Quero congratular também o Comitê em Defesa da Caixa, que é um dos organizadores deste evento, e todas as entidades envolvidas: a FENAE, o Sindicato dos Bancários de Brasília, a ADVOCEF e tantas outras entidades, sindicatos e movimentos que se encontram aqui presentes.
Quero também congratular a ex-Presidenta da Caixa Maria Fernanda, que nos orgulha, porque foi justamente na sua gestão que se criou um programa de equidade de gênero, programa inovador para o seu período. Pena que ele foi esquecido e que tenhamos chegado a este estágio.
Bom, com relação a esse processo que nós vivemos de denúncias de assédio sexual atribuído a membros da alta administração da Caixa — não só contra o ex-Presidente da Caixa há denúncias, como também contra outros dirigentes —, primeiro quero destacar que é a primeira vez que isso ocorre na Caixa. A Erika foi funcionária da Caixa. É a primeira vez que há denúncias contra dirigentes do banco por assédio sexual. O assédio moral, velho conhecido, se intensificou nos últimos anos, mas denúncia de assédio sexual é a primeira vez que registramos. E, como disse a procuradora há pouco, a denúncia não é de assédio sexual vinculado a uma relação pessoal, na realidade esse assédio envolve a instituição. Então, como a instituição, como as falhas no processo de governança favoreceram que se chegasse a este estágio? E quais são as influências para que ocorra uma situação como essa?
Eu gostaria de destacar o que disse a procuradora: este é um assédio institucionalizado pelo próprio Governo Federal. Esta é a primeira etapa. A segunda é que esse assédio reverbera por toda a estrutura do Governo, por toda a sociedade, e, logicamente, por todas as estatais. Nós tivemos nos últimos anos um processo de profunda rotatividade nos cargos de direção da Caixa. Cargos de vice-presidente e de diretor já foram trocados oito, nove, dez vezes no período, e isso reverberou em todo o banco, desde as agências até os gerentes gerais. Isso é um modelo de gestão. Esse é um dos causadores do processo de assédio, de perseguição e de intimidação que ocorreu no último período. Aliado a isso, houve um processo de retirada das pessoas que estavam em setores importantes e de governança, e com isso o banco perdeu a sua inteligência, o banco perdeu a sua capacidade de manter os processos ativos.
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Então, houve uma série de ações de desmantelamento da instituição, de desmantelamento da área de pessoas, de governança, das estruturas do banco, até que chegamos a um ponto em que altos dirigentes da empresa estivessem se sentindo à vontade para cometer atos de assédio sexual. E, o que é pior, houve um aumento drástico de assédio moral e de pressão sobre os trabalhadores.
Quero destacar que, logo que essas denúncias vieram a público, em 28 de junho, eu, como conselheira, tomei, de imediato, medidas no sentido de cobrar do Conselho de Administração, do qual eu faço parte, ações para proteger as vítimas: abertura de um processo de apuração rapidamente, contratação de uma empresa de investigação externa para dar idoneidade e independência a esse processo de investigação e afastamento de todos os envolvidos. Isso foi feito logo de cara. E coloquei isso publicamente na imprensa.
Preciso relatar aqui que, nesse período em que sou conselheira — já sou conselheira há algum tempo —, nesses últimos anos, como um procedimento de intimidação por eu ser durante muito tempo a única mulher no Conselho, a única representante dos trabalhadores e, na maioria das vezes, a única com voz destoante, eu também passei por um processo de abertura de procedimentos internos que contestavam a minha legitimidade para apoiar movimentos dos trabalhadores e representar os trabalhadores. Durante 1 ano, dois processos internos questionaram a minha independência e legitimidade para fazer isso. E, agora mesmo, quando fui tornar públicas as medidas que eu estava cobrando da Direção, houve uma tentativa de votação para que eu não pudesse mais falar com a imprensa ou colocar claramente a minha posição. É importante registrar isso, porque trata-se de um processo todo comungado de intimidação, de assédio, de pressão e de perseguição que nós temos que combater.
Os processos foram abertos. Além do Ministério Público do Trabalho, que abriu os processos, temos a Corregedoria do banco, a empresa de investigação externa, que foi contratada e iniciou os trabalhos... Então, os procedimentos necessários para a investigação estão sendo feitos.
Como o meu tempo está acabando, acho importante destacar que se muda isso mudando toda uma cultura que, como já foi dito, tem a ver com um modelo de desmantelamento, de privatização, de incentivo ao armamento, de incentivo à violência que nós vivemos no País. E, além disso, do ponto de vista corporativo, as empresas têm que, de fato, regrar a sua governança e dar capacidade e independência para que as pessoas possam cumprir os atos necessários internamente para coibir esse tipo de prática. Esse é o caminho que nós temos que adotar.
Agora, sem dúvida nenhuma, se não houver denúncia, se não tivermos canais, se as entidades não forem fortalecidas, se nós, os movimentos, não nos fortalecermos para fazer essa cobrança, com certeza, como várias vezes dizem neste Congresso, isso tudo acabará em pizza. Então, o nosso papel é cobrar, é movimentar, é punir os responsáveis e, com certeza, mudar o País, porque essa é a solução.
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A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Obrigada, Rita, pela contribuição.
Quero cumprimentar a nossa colega Deputada Erika Kokay pela iniciativa. A Deputada está sempre presente e sempre atenta aos problemas dos trabalhadores, em especial dos empregados da Caixa Econômica Federal.
Cumprimento minha colega Rita Serrano, Conselheira eleita no Conselho de Administração da Caixa Econômica Federal.
Antes de começar, eu gostaria de citar que estão aqui presentes vários Presidentes de Associações do Pessoal da Caixa Econômica Federal. Hoje tivemos reunião do Conselho Deliberativo Nacional da FENAE. Na reunião do CDN, nós aprovamos uma moção de solidariedade que será assinada por todos os Presidentes das Associações do Pessoal da Caixa Econômica Federal, dos 27 Estados, e pela Diretoria da FENAE, uma moção de solidariedade às empregadas da Caixa que tiveram a coragem e a ousadia de denunciar esse crime de abuso.
Eu gostaria de começar por uma frase que foi dita pela Procuradora Deborah Duprat: "O assédio é uma prática do Governo Bolsonaro". Sem dúvida nenhuma, os números que temos recebido — os números que foram surgindo — demonstram a verdade dessa frase. O site Poder360 trouxe que, em 2022, nós tivemos 77 denúncias de assédio sexual na Caixa Econômica Federal. Em 2015, Maria Fernanda, nós não tínhamos nenhum. Esses dados demonstram que, se o Governo não respeita as mulheres, não respeita os direitos dos trabalhadores, não respeita o ser humano, não respeita a vida e incentiva essas práticas em seus discursos homofóbicos, isso vem à tona. Tivemos 177 denúncias de assédio moral em 2022; em 2015, tínhamos 69. Ou seja, essa prática de assédio moral é uma prática de gestão que este Governo adotou.
Na Caixa, vínhamos percebendo o crescimento de denúncias dessa prática como gestão da empresa. Por isso, na FENAE, fizemos uma campanha, no início de 2019, chamada Não Sofra Sozinho. Vínhamos percebendo que estavam crescendo as denúncias de assédio moral. As denúncias eram recorrentes. Então, fizemos uma pesquisa em 2019, fizemos uma pesquisa em 2020, e fizemos uma nova pesquisa no fim do ano passado, em dezembro do ano passado, para ver como estava o ambiente e a saúde mental dos trabalhadores da Caixa.
Mais de 3.000 pessoas responderam ao questionário. Os dados são terríveis. Os resultados foram assustadores. De cada dez empregados, seis disseram ter sofrido assédio moral no trabalho, ou seja, 60% dos empregados da Caixa sofreram algum tipo de assédio.
Dos empregados da ativa, 56% relataram haver passado por esse tipo de assédio; 77% das pessoas relataram ter visto casos de assédio; e mais de 90% dizem que já sentiram muita pressão ou ansiedade no trabalho. Sem dúvida nenhuma, isso tem reflexo direto na saúde mental dos empregados da Caixa e se reflete na ausência, no absenteísmo no trabalho. Ainda, 42% tiveram problemas de saúde relacionados à atividade na Caixa e 69% disseram que as questões profissionais levaram a tratamento psiquiátrico. Os números mostram que a Caixa estava fazendo mal à saúde dos trabalhadores.
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Quando denúncias surgiram contra o Presidente da Caixa, é evidente que ninguém esperava que o principal gestor da empresa fizesse esse tipo de coisa, tivesse um comportamento como esse. Nós não podemos aceitar, nós não podemos entender isso como normal. Eu compactuo com a frase da Rita: para conseguirmos avançar, minimizar a situação, melhorar a saúde dos trabalhadores, ter um ambiente saudável no trabalho, nós precisamos mudar este Governo. Porque não vai ser possível mudar o comportamento das pessoas, não vai ser possível que os gestores indicados por este Governo tenham comportamento diferente do comportamento do principal líder do País. É reflexo da liderança deste País, é reflexo do Presidente Bolsonaro esse comportamento em que não há respeito às instituições, não há respeito às pessoas, não há respeito aos direitos dos trabalhadores.
Ontem, nós estivemos com a nova Presidente da Caixa. Nós entregamos esse relatório, essa pesquisa, como mais uma forma de denunciar, e também para eles não poderem alegar que não conhecem a realidade do banco. E ela realmente não conhece. É uma pessoa que vem de fora, que vem do mercado financeiro, então pode alegar que não conhece a realidade. Nós entregamos o relatório justamente para ela ter conhecimento e nós podermos cobrar providências. Não é possível que ela faça com que todas as denúncias feitas contra o Presidente da Caixa virem uma peça de marketing para este Governo tentar melhorar a sua imagem, tentar melhorar o seu ibope no eleitorado feminino. Nós não podemos aceitar o uso político da Caixa Econômica Federal. A Caixa está muito acima de qualquer Governo, acima de qualquer política governamental. A Caixa pertence ao povo brasileiro. Isso nós não podemos esquecer e temos que dizer sempre, senão continuará havendo uso eleitoreiro por parte deste Governo.
Então, nós cobramos apuração rigorosa e punição para esse caso. Ele não pode passar em branco. Nós temos que exigir respeito a todos os trabalhadores, principalmente às mulheres.
É por tudo isso que nós dizemos que precisamos mudar este Governo. Como disse a Rita, precisamos de entidades fortes. As pessoas precisam ser acolhidas pelas nossas entidades. A FENAE já se colocou à disposição de todas as trabalhadoras e de todos os trabalhadores, para que possamos, juntos, enfrentar essa política do medo, enfrentar essa política de assédio.
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A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Quero convidar a Dra. Melícia Alves Mesel para compor a nossa Mesa.
A SRA. MELÍCIA ALVES MESEL - Eu dou boa tarde a todas as pessoas que aqui estão e às que nos assistem. Agradeço à Deputada Erika Kokay a oportunidade de debatermos este tema, o assédio sexual.
Deputada, atendendo aos anseios do que a senhora aguarda desta audiência, eu já começo dizendo o seguinte: de janeiro a junho de 2022, nós tivemos 300 denúncias de assédio sexual, ao passo que, de assédio moral, nós tivemos 3.309 denúncias, ou seja, as denúncias de assédio sexual corresponderam a apenas 10%. E aí nos perguntamos: mas por quê? Não está ocorrendo? Está, sim, ocorrendo. O problema, Deputada, é que as vítimas nem sempre denunciam, e há três razões muito simples para que elas não denunciem. A primeira delas é o medo de perder o emprego. A segunda delas é a certeza de que serão "revitimizadas", palavra que a senhora colocou, porque, nos crimes sexuais, sempre a culpa recai sobre a mulher: "Mas é o jeito como se veste", "É o jeito como se comporta", "É a forma como se maquia"... E a terceira razão é que essas mulheres não acreditam no sistema de justiça. Por que não acreditam, Deputada? Elas relatam que, no momento em que vão fazer a denúncia, não se sentem acolhidas, nem naquele momento inicial, quando procuram as delegacias de polícia, as delegacias especializadas, nem depois, no Ministério Público, que é um órgão investigativo — nós nos colocamos também dentro do sistema de Justiça — , nem no âmbito da Justiça, porque as condenações são muito pequenas. Então, o que elas pensam? O esforço é muito grande, eu vou sofrer novamente toda a violência que já sofri, vou perder o meu trabalho ou, no mínimo, vou sofrer perseguição, ou algum tipo de retaliação, e isso não vai dar em nada. É esse desacreditar que faz com que as denúncias ainda estejam em número pequeno. Mas isso é subnotificação.
Daí eu já venho com a minha primeira sugestão, Deputada. Por que é importante a vítima denunciar? Observem que, quando há um caso como o citado, isto é, quando uma trabalhadora denuncia, outras vêm a reboque, outras pessoas que foram vítimas se sentem encorajadas. Não é fácil, Deputada, denunciar. Elas se sentem realmente muito amedrontadas, porque não têm acolhimento, e a cultura... Como a senhora disse, as pessoas têm que se unir.
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O que observamos tanto no campo do assédio moral quanto no campo do assédio sexual? Há um pacto de solidariedade e silêncio que não é consciente. Já dizia a psicóloga francesa Marie-France Hirigoyen que esse comportamento é inconsciente e acaba beneficiando o agressor. O que as testemunhas dizem? "Eu não posso denunciar, senão vou sofrer represália." Quando podiam testemunhar, elas diziam: "Não vou testemunhar porque tenho medo de que o agressor se volte contra mim". Então, quando uma vítima tem coragem e denuncia, outras vítimas sentem-se encorajadas a fazer o mesmo. Por isso, após uma denúncia, observem que, em seguida, surgem dezenas de casos, e a questão toma outra dimensão.
Precisamos falar sobre a violência que é o assédio sexual, que ataca a pessoa no que ela tem de mais precioso: sua intimidade, sua dignidade. São valores que, constitucionalmente, no âmbito interno e externo, cultivamos, porque somos de maior grandeza.
O que acontece quando há essa violência? Tem-se em mente que a vítima é a principal atingida, em todas as suas dimensões. Deputada, a vítima de assédio desenvolve doenças, no campo físico, no campo psíquico, psicossomáticas. Elas têm perda de apetite, perda de peso. Algumas desenvolvem muitos distúrbios, como síndrome do pânico, ansiedade, depressão. É preciso dizer que a OMS já considera a depressão o mal do século. E 20% dos trabalhadores sofrem de depressão. Desse contingente, a maioria tentará, pelo menos uma vez, cometer suicídio. Há, inclusive, estudos que demonstram que, no setor bancário, o trabalhador pensa em cometer suicídio em espaço curtíssimo de tempo. É muito triste essa realidade.
Então, o assédio atinge a vítima no aspecto físico, no aspecto psíquico, no aspecto familiar. Deputada, às vezes, a vítima esconde-se. Ela está sofrendo assédio, mas não tem coragem de compartilhar a situação e de buscar ajuda com os colegas. Também não tem coragem de fazer isso no próprio lar. Especialmente no assédio sexual, o que acontece? Às vezes, quando a vítima relata que está sofrendo assédio, sofre, por parte do companheiro ou da companheira, desconfiança. Verificamos nas investigações que podem acontecer separações e divórcios porque a vítima fica desacreditada no próprio lar. O âmbito social é afetado, porque ela se ensimesma, ela se isola, e, logicamente, também o âmbito profissional, porque a carreira fica completamente prejudicada. Uma carreira é subtraída, tirada de forma prematura, justamente quando acontece um caso de suicídio ou mesmo quando a pessoa desenvolve depressão ou outra doença incapacitante, e daí precisa se aposentar.
Nessa linha, o que colocamos como sistema de prevenção eficiente? As empresas precisam olhar para o problema. Não adianta esconder embaixo do tapete, porque ele vai aparecer em algum momento. Seja empresa privada, seja organização pública, ela será responsabilizada. Sabem por quê? Porque a Constituição diz que a empresa deve exercer função social. Ela diz para a administração pública que ela é responsável pelos atos de seus prepostos. Escolha bem, fiscalize. Então, é preciso criar espaços de escuta, espaços independentes, espaços de acolhimento para que o trabalhador e a trabalhadora possam levar o seu reclamo e obter uma resposta, porque não é aquele problema que precisa ser resolvido, mas todo o âmbito da administração.
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Como o meu tempo está terminando, Deputada, eu quero terminar com duas sugestões. A primeira é intensificar as ações para que o Brasil ratifique a Convenção n° 190, da OIT, que trata de violência e de assédio no mundo do trabalho. (Palmas.)
O assédio sexual é crime e está previsto no art. 216-A do Código Penal. Esse tipo foi inserido ali no ano de 2001. Então, Deputada, ele precisa ser atualizado, porque, infelizmente, para configurar o crime, tem que ter o elemento hierarquia. Sabemos que, na prática, o assédio sexual, claro, é praticado de cima para baixo, em torno de 62% dos casos ou mais, mas ele também é praticado de forma horizontal ou mesmo de baixo para cima.
Encerro com isto: o assédio, seja moral, seja sexual, seja organizacional, é a ponta do iceberg. O que temos que atacar é o que está na base desse iceberg, que é uma sociedade calcada em comportamentos preconceituosos, machistas, misóginos, racistas. Toda essa cultura, lógico, vai reverberar nas organizações e na forma como elas tratam os seus trabalhadores e trabalhadoras.
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Obrigada.
Realmente, constatamos que o assédio é um sintoma, inclusive, de adoecimento das relações. A base do iceberg estaria nessa lógica sexista, patriarcalista, que é tão estruturante das relações humanas, das relações sociais do País.
Portanto, acho realmente importante fazermos a atualização do art. 216-A, que é o que criminaliza ou prevê assédio sexual como crime. É preciso analisar os dados, os quais nos remetem a uma série de ações. Nas investigações finalizadas por denúncia de assédio moral na administração pública — nem todas foram finalizadas —, entre 2008 e 2022, foram instaurados 905 processos para apurar casos de assédio sexual. Desses, 633 foram concluídos e 272 ainda estão em andamento. Dos que foram concluídos, não houve qualquer tipo de punição para 65,7% dos acusados. Houve 41 advertências, 90 suspensões e 95 demissões do agressor.
Aqui já foi dito pelo Sergio Takemoto, e vou apenas reafirmar, que os casos de assédio sexual na Caixa saíram de 3, em 2017, para 20, em 2019; foram 74, em 2021, e 77, em 2022. Houve, segundo a Caixa, 35 procedimentos abertos para apurar as denúncias.
A Caixa não informou quantas dessas denúncias de assédio sexual têm relação com o Presidente da Caixa. O Ministério Público do Trabalho informou que recebeu sete relatos contra Pedro Guimarães por assédio enquanto era Presidente e outros sete foram enviados após a saída dele. Obviamente, como a Dra. Melícia disse corretamente, na medida em que alguém denuncia, outras pessoas sentem-se encorajadas para denunciar.
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Então, ainda que o Código Penal argumente sobre assédio sexual e atinja o gênero masculino e o gênero feminino na legislação, as pesquisas indicam que ele atinge três vezes mais as mulheres. As mulheres são as maiores atingidas, porque é a lógica patriarcal, de donos dos próprios corpos. Portanto, nós precisamos, a partir desse dado, trabalhar com políticas de prevenção, de promoção de um lugar saudável.
Maria Fernanda, que foi Presidenta da Caixa, é bom lembrar que a instituição já foi considerada uma das melhores empresas para se trabalhar. Hoje nós estamos lidando com casos de assédio sexual e assédio moral explícito, desavergonhado, como flexões de gestores em palcos, obrigação de as pessoas descerem de escada 20 andares e tantas outras expressões de assédio moral muito brutos, muito nítidos. O assédio moral sempre é um componente, penso eu, presente no assédio sexual, porque ele atinge a pessoa moralmente. O assédio sexual atinge o domínio sobre os corpos, sobre o querer, sobre o sentir.
Nós já trabalhamos com vários casos de mulheres que nos denunciaram assédio sexual, e levamos um caso para a direção da empresa — não a Caixa, outra empresa estatal. Mas essas mulheres nunca tiveram coragem de falar para seus maridos ou companheiros que estavam sofrendo assédio sexual, porque a relação é de culpabilização. A culpa talvez seja um dos instrumentos mais profundos, porque invisível e porque entranha o corpo de quem é vítima de dominação. A culpabilização, via de regra, é das mulheres, porque são vítimas de assédio, porque são vítimas de violência sexual. Enfim, a culpabilização das mulheres faz com que haja um processo, que eu chamo de solidão do isolamento, de solidão de sofrer sozinha, ou de sofrer sem ter a quem recorrer. Os dados dessa pesquisa do segmento privado pontuam que apenas 5% das mulheres fazem a denúncia nos órgãos das empresas onde estão sendo assediadas.
Antes de passar a palavra para a Maria Fernanda, vou ler algumas perguntas e questionamentos que nos chegam através do portal e-Democracia.
A Roseli diz: "Parabéns à Deputada Erika Kokay pela audiência pública promovida. Assédio sexual é crime. O debate é necessário e criminalizar os culpados, indispensável".
Franci Silva: "Assédio sexual nas Forças Armadas, em respeito às ouvidorias para receber a denúncia. A grande dificuldade da mulher é colocar o problema dela, que não pode se expor, e, segundo ela, corre o risco de sofrer retaliações em razão disso. Tem que ter medidas efetivas, cuidado especial com a vítima".
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Ana: "Assédio é crime, e os culpados precisam responder. Não vamos permitir que essas práticas continuem. As vítimas não podem ter seus depoimentos colocados em dúvida, não podem ser mais expostas; não se trata de 'mágoa institucional', e sim de um crime! Queremos saber: e o andamento das apurações da Caixa?"
Marcelo: "O assédio sexual no trabalho ocorre também em função da omissão e conivência de gestores, chefias, etc. Gostaria que fosse comentado sobre a responsabilização dos superiores que se omitem, não dão a devida atenção às denúncias de assédio sexual".
Bianca Cortês: "Gelzania Santana, BA, em relação ao tema proposto, seria uma boa ideia para explicitar e simplificar as diversas situações que dizem ser elogio ou brincadeira, mas são tipos de assédio no ambiente de trabalho. A confecção de uma cartilha e folder expostos nos setores poderia inibir tal conduta?"
(Intervenção fora do microfone.)
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Então, deixaremos as respostas para o fim.
A Carmem Elisangela diz: "Boa noite, trabalho em uma empresa onde há 'Ouvidoria' e frente de trabalho para 'Integridade/Ética'. Os trabalhadores sentem-se seguros quanto ao tema abordado. Meu questionamento é relativo a 'Canais de Comunicação Públicos' para que funcionários de empresas menores possam denunciar esse assédio".
A SRA. MARIA FERNANDA RAMOS COELHO - Boa tarde a todas e todos, é uma alegria rever muitos colegas, muitas entidades, ADVOCEF, FENAG, sindicato, associações, vários dirigentes das associações do Brasil. É muito importante ter a presença de todas e todos aqui. Isso demonstra o compromisso que cada um tem com o tema. Eu acho que também demonstra solidariedade. Deputada Erika Kokay, como a Dra. Deborah disse, V.Exa. é incansável e tem nossa admiração, nosso respeito.
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Eu fiz uma breve apresentação. Temos alguns dados e números que considero importante trazer neste momento. São quatro lâminas.
(Segue-se exibição de imagens.)
Percebemos a importância de se ter um governo comprometido com políticas públicas com a criação da Secretaria Nacional de Políticas para Mulheres, que incentivou a adoção, nas empresas públicas, de procedimentos que viessem a atuar na questão da diversidade.
O que nós tivemos? No período de 2003 a 2016, várias cartilhas foram feitas por orientação da Secretaria Nacional de Políticas para Mulheres. E é importante dizer isso. A Deputada trouxe um dado, que foi ressaltado por outras pessoas: em 2015, nós não tínhamos nenhuma denúncia de assédio sexual na instituição, que fez 150 anos em janeiro de 2011. Isso significa que a cooperação — primeiro, entre Governo Federal e uma instituição pública, como a Caixa, e, segundo, com orientações claras — é fundamental para se impedir que tenhamos processos como esse.
Agora vou mostrar alguns números. A segunda tela traz exatamente os dados que eu estava comentando. O eslaide anterior mostra as cartilhas que foram lançadas, por meio da parceria com a secretaria. Aqui trago exatamente o que aconteceu na instituição no período de 2019 a 2022.
Este é um gráfico do portal Poder360, que mostra a explosão de denúncias no período de 2019 a 2022, o que eu chamo de escalada do terror no Governo Bolsonaro. A Dra. Deborah disse claramente em sua apresentação: "O assédio institucional hoje permeia todas as instituições do Governo Federal". Então, essa é uma questão que nós vimos de forma muito grave — gravíssima, criminosa — na Caixa.
Vou ressaltar os dados que nós temos hoje: 703 relatos de assédio moral, 171 relatos de assédio sexual, 115 procedimentos abertos para apurar assédio moral e 35 procedimentos abertos para apurar o assédio sexual. É muito importante este dado, os 35, porque, a partir do momento em que 1 mulher, 2 mulheres ou 3 mulheres têm coragem de fazer uma denúncia, nós começamos a perceber que outras mulheres se apresentam e trazem suas dores e as violências das quais foram vítimas no ambiente institucional.
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É necessário entendermos qual narrativa sustenta o assédio institucional. Eu sou aposentada da Caixa, e percebemos, olhando de fora da instituição, que há duas grandes narrativas sustentando o nível de assédio que a Caixa sofreu. A primeira é a justificativa em relação aos resultados: "Olhe, o cara é assim, meio grosso e tal, mas o resultado da Caixa é muito importante". Vejam a falácia dos resultados. Temos representado no gráfico do DIEESE todo o lucro líquido, com o deflator do IPCA do IBGE de dezembro de 2021. Verifica-se, em 2019, 2020 e 2021, que temos um lucro maior. No entanto, esse lucro foi sustentado por pilhagem do patrimônio da instituição, pela venda dos ativos da instituição.
(Palmas.)
A Rita, nossa conselheira, que já falou aqui hoje, foi muito clara sobre a tentativa de cerceamento da representação dos trabalhadores no Conselho de Administração. E aqui vemos o quadro comparativo. Vejam a falácia do resultado da instituição, em cima do lucro líquido. Os senhores observem que, nos eventos não recorrentes, dos 21 bilhões de reais, em 2019, 14 bilhões de reais foram resultado de vendas de ativos da Caixa, como a venda de ações da PETROBRAS e do IRB. Em 2020, tivemos novamente, dos 13 bilhões de reais, 4 bilhões de reais; e, em 2021, dos 17 bilhões de reais, 7 bilhões de reais, que se refere à venda do Banco PanAmericano. A Caixa acabou de anunciar o resultado do semestre. E como foi o resultado do semestre? Por conta do enfrentamento que os empregados vêm fazendo em relação à pilhagem do nosso patrimônio, o resultado hoje é que não há ativo sendo vendido. Não foi por falta de intenção, ou de vontade, ou de proposta de fazê-lo, mas foi muito em função do enfrentamento que foi feito.
O que temos? O segundo conteúdo da narrativa de violências contra os empregados da Caixa é a farsa da meritocracia. E aí eu trago uma frase da entrevista que foi dada por uma das mulheres assediadas. Ela disse: "Que meritocracia é essa que mistura trabalho com sexo?" O discurso da meritocracia na Caixa nada mais serve do que para mascarar as desigualdades. Ainda por cima, o que nós vimos, nos últimos 3 anos, foi um sem-número de retirada de funções sem justificativa, transferências, todo tipo de abuso que se possa ter. Ou seja, era o discurso: "Não, mas eu estou mudando". Não é porque a pessoa tinha dado mau resultado, não é porque tinha atingido as metas. Não! Era para mostrar que precisava se sujeitar, se subordinar ao poder que ali estava instituído, Deputada.
Acho muito importante que nós registremos — este plenário lotado, Deputada, a convite de V.Exa., assim o demonstra — que sempre houve resistência na Caixa. Na década de 90, houve tentativa de privatização da empresa; em 2002, a Caixa estava pronta para ser privatizada. A Caixa foi fortalecida, nós tínhamos quase 30 mil terceirizados, tivemos concurso público. Hoje, nós temos aqui — inclusive com faixas — o Comitê Popular de Luta em Defesa da Caixa, FENAE, instituições e associações.
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Neste momento, precisamos, sem dúvida, de um processo de apuração dos crimes que aconteceram dentro da instituição, para que ela possa voltar a exercer seu papel de banco público, que é um papel de gerador de empregos. Foram quase 20 milhões de empregos formais gerados nos Governos Lula e Dilma, por exemplo, em programas como o Programa Minha Casa, Minha Vida, que a Caixa implementou. Agora, mesmo na crise, na pandemia, o que nós vimos foi a resposta dos empregados da Caixa a isso.
Termino dizendo que o que nós queremos é uma Caixa plural, uma Caixa inclusiva, uma Caixa que respeite a diversidade. Queremos, principalmente, neste momento, a apuração dos desmandos que aconteceram na instituição e a punição dos responsáveis. Nós sabemos que houve um mandante, mas houve muitos outros dentro da instituição que também foram corresponsáveis por atos criminosos que aconteceram.
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Obrigada, Maria Fernanda.
Quero apenas lembrar que talvez seja importante haver uma política de prevenção e combate ao assédio sexual. É necessário que haja também a responsabilização dos gestores que recebem a denúncia e não a conseguem encaminhar, ou não a levam adiante. Estou reafirmando o que foi dito na imprensa: as empregadas assediadas na Caixa tentaram os canais da própria empresa para efetivar a denúncia.
Penso que também seja importante — e isso foi sugerido por alguém pelo e-Democracia — trabalharmos na perspectiva de responsabilização das pessoas que não levam adiante as denúncias de assédio. Particularmente, dizia-me a Procuradora Melícia que, quando o assédio sexual é negado, o assédio moral é intensificado. Então, há um processo de muita violência através do assédio moral, e a legislação deve prever isso também.
O mecanismo da chantagem é muito presente no assédio sexual. Pode haver o favorecimento ou a perseguição a partir da resposta da pessoa que está sendo assediada. Ao mesmo tempo, há os constrangimentos e as intimidações, que podem vir aos poucos ou de forma mais explícita. Portanto, há um componente de assédio moral bem presente, como decorrência da negação e da resistência ao assédio sexual. Obviamente, há um sistema de meritocracia que também esconde as desigualdades, mas um sistema de meritocracia a partir de favorecimentos em função do assédio sexual é absolutamente rompido e coloca sob suspeição todo tipo de ascensão na empresa.
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Os assédios são instrumentos de opressão muito profundos. Eles desconstroem qualquer possibilidade de um bem viver no local de trabalho. A violência no mundo do trabalho tem um componente muito potencializador de desestruturação, porque, muitas vezes, é a atividade mais constante que temos. Em 30 anos, muitas vezes uma pessoa se casa, se separa, tem filhos, os filhos vão embora, enfim, mas você trabalha. Então, há muita permanência no trabalho.
Lembro-me de uma frase do Faulkner que me surpreende. É o fato de, dia após dia, semana após semana, mês após mês, ano após ano, década após década, nós trabalharmos. Isso obviamente vai deixando marcas nas outras atividades da vida. Por isso é tão estruturante o trabalho nas nossas relações. Ele estrutura outras relações.
Então, sofrimento no local de trabalho provoca muita destruição. A remuneração associada ao sofrimento é muito destruidora. Para que eu possa sobreviver e ter uma remuneração, eu tenho que passar por um profundo sofrimento. São situações opostas que se ligam pelo sofrimento, ou seja, a remuneração, que é uma coisa boa, e o sofrimento, para que você consiga a própria remuneração. Há um suplício do corpo, suplício das resistências em função da sobrevivência. E assim vão sendo arrancados os pedaços de toda a resistência e inteireza. Quantas pessoas vão ao trabalho como se estivessem indo para um abatedouro? Elas chegam ao trabalho e apenas buscam se proteger do próprio trabalho, para que possam sair o mais rapidamente possível dali e viver a vida.
Essa é uma atividade muito estruturante na nossa vida. O ser humano trabalha. Trabalhar significa mudar a realidade, mudar a natureza, enfim, é a intervenção humana nas relações que estão postas. Isso é o trabalho. Quando o trabalho é associado ao sofrimento, tem um potencial de desestruturação muito intenso. Então, o trabalho tem que ser o lugar onde nos encontramos, e não onde perdemos as esperanças, os tendões, a dignidade, enfim.
Portanto, todo assédio sexual no ambiente do trabalho, como disse a Procuradora Melícia, mexe com a dignidade, mexe com os sentimentos, mexe com os desejos, mexe com muitas construções internas e mexe com a subjetividade. A subjetividade é muito abalada. Por isso a importância desta discussão e de nós trabalharmos com mecanismos para que possamos, enfim, enfrentar a violência sexual no local de trabalho e a violência sexual em toda sua extensão, particularmente no local de trabalho.
Eu vou chamar agora a Sra. Fernanda Lopes e a Sra. Carolina Tostes, que estão participando de forma remota. Por isso, chamo para compor a Mesa o Sr. Arnaldo Correa de Oliveira, que aqui representa o SINDCLUBES. Chamaria o Sr. Adalto Duarte, mas, como não está presente, chamo o Sr. Kleytton Morais para compor a nossa Mesa.
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Também gostaria de agradecer à Deputada espaço tão importante que está disponibilizando para os empregados da Caixa.
Gostaria de dizer que foi com vergonha que expliquei para os meus colegas de trabalho daqui, no Canadá, que me perguntam: "E aí? Já houve algum retorno? Já houve alguma punição? Já houve algum desdobramento das denúncias?" No Brasil as coisas andam mais devagar e a palavra de dezenas de mulheres ainda vai ser julgada, ainda vai ser colocada em dúvida.
Também gostaria de dizer que o resultado da Caixa não é feito por um Presidente que ficou lá por 2 anos, 3 anos. O resultado da Caixa é feito por quase 90 mil empregados todos os dias. Como a maioria dos empregados da Caixa, eu também sou apaixonada pela empresa, e é com tristeza que relatamos o que aconteceu e nos compadecemos das outras vítimas.
É difícil dizer isso, mas o meu caso, acho, foi o menor deles, foi o menos grave do que ouvimos nos relatos, como pedir para a pessoa levantar, enquanto estava no trabalho on-line: "Levanta aí para eu ver se você está de biquíni". Até isso eu ouvi de colegas minhas falando do ex-Presidente. Ouvimos relatos de chefe que levantava o cabelo da colega e dava um beijinho na nuca. Olhem a que ponto chegamos na Caixa.
(A oradora se emociona.)
Diferentemente da maioria das mulheres, eu tive, sim, apoio total em casa, do meu marido e da minha mãe, para fazer a denúncia. Com medo, eu esperei os outros. Eu esperei ele pedir demissão. E ficamos naquela. Eu acho que as empregadas da Caixa estavam naquela apreensão: cai, não cai, vai cair. “Ai, que bom, vai cair!” Quando caiu, eu falei: “Ai, que bom! Agora eu posso falar”. E isso reflete o medo, realmente, de denunciar, o medo de sofrer retaliação, o medo de sofrer julgamento, o medo da própria exposição e a da família. Não é fácil. O assédio sexual é grave em qualquer esfera, mas nunca vamos esperar isso de uma alta administração, de pessoas altamente qualificadas, estudadas, enfim.
Como feminista que sou, estou satisfeita de dar uma pequena contribuição. Acredito que a Caixa e as empregadas vão ficar livres de assédio sexual por um bom período. Acho que não vamos mais ouvir falar disso. Como dizem em Minas Gerais, os coleguinhas, os superiores hierárquicos vão estufar o olho agora. Então, eu acredito que vá ser uma temporada bastante boa daqui para frente.
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A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Eu quero agradecer a participação à Carolina Lacerda Tostes, que teve a coragem de denunciar e enfrentar toda essa relação de sofrimento.
É bem difícil falar depois do relato da Carolina, mas começo dizendo que somos muito solidários. Quero, mais uma vez, manifestar solidariedade a todas as vítimas, a todas as mulheres, não só da Caixa, mas a todas as mulheres vítimas de violência sexual.
Esse é um tema sobre o qual, para nós mulheres, é sempre muito difícil falar, até porque todas as pesquisas mostram — eu tenho alguns dados para comentar um pouco depois — que a maioria das mulheres já foi vítima de violência ou conhece mulheres que foram vítimas de violência.
Então, toda a minha solidariedade, Carolina, a você e a todas as outras funcionárias empregadas da Caixa.
Quero agradecer o convite, em nome da CONTRAF. Quero agradecer à Deputada Erika Kokay, que está sempre trabalhando em defesa da Caixa, das empregadas da Caixa, dos bancos públicos e dos bancários em geral.
Começo esclarecendo que estamos, neste momento, em negociação na nossa campanha nacional dos bancários. E todas essas denúncias da Caixa vieram neste momento e com uma dimensão que até então não tinha existido, mas já tratávamos de muitos casos de assédio antes dessas denúncias. Então, já tínhamos algumas cláusulas, na nossa minuta de reivindicações da categoria, prevendo questões de assédio sexual. Conseguimos, na última campanha, alguns avanços em relação à violência doméstica e ao assédio sexual, mas precisamos ainda caminhar muito, e esse caso da Caixa deixa muito exposto o quanto precisamos melhorar em todas as empresas, no País e também dentro dos bancos.
A cada dia lemos em jornais — se ligarmos a televisão é pior ainda — sobre um novo caso de denúncia de violência sexual contra mulheres. E isso não vem à toa neste momento. Temos certeza de que esse aumento de casos ocorre em função desse Governo, que, desde o começo, tem colocado as mulheres, sim, como seres inferiores, abrindo essa porteira para que mais homens cometam esse tipo de abuso, esse tipo de crime, esse tipo de violência, com a certeza de que não vão ter a punição adequada.
Então, eu quero dizer o que colocamos na mesa com representantes dos bancos. Eles não estão aqui hoje, mas vamos colocar um pouco do que temos pedido na categoria para que exista a punição adequada, para que as mulheres se sintam fortalecidas e realmente encorajadas a denunciar.
Primeiro, pedimos o treinamento e a formação do quadro de funcionários. As pessoas têm que entender o que é assédio sexual. Elas têm que entender que uma piadinha também é assédio sexual; que se encostar em uma pessoa, seja onde for, sem o consentimento dela, também é assédio sexual. As pessoas precisam passar por treinamento efetivo. Elas precisam entender os limites do corpo da mulher. Não cansamos de falar que o corpo da mulher é dela.
Então, se ela não autorizou a alguém um aperto de mão, essa já é uma violação do corpo dela.
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Segundo, pedimos o acolhimento das denúncias e a apuração efetiva desses casos que acompanhamos aí. Essa não é a primeira vez. O que aconteceu na Caixa já ocorreu em outros bancos também. A funcionária mulher denuncia e não tem a efetiva apuração. Então, o que precisamos é de um canal bipartite. Essa apuração tem que ser feita de forma isenta. Então, a nossa proposta é que ela seja feita em conjunto com o banco e com os sindicatos, para que isso seja tratado por pessoas isentas dessa direção, dessa cúpula do banco, e que essas mulheres sejam realmente acolhidas.
Pedimos também a proteção e a assistência às vítimas. É primordial que essas mulheres se sintam realmente acolhidas. Há até uma pesquisa sobre isso, que foi citada inclusive pela Deputada Erika — se der tempo, vou citá-la também. Mas as mulheres, muitas vezes, não denunciam porque sabem que não vai dar em nada ou porque têm medo da impunidade, do julgamento, de não serem acolhidas. É importante receber esse acolhimento por parte também da empresa, inclusive para que uma denúncia não vire motivo de piada no local de trabalho. A mulher que denuncia, quando não é demitida, muitas vezes é tirada do seu local de trabalho. Então, a mulher, que já sofreu uma violência, é punida novamente, sendo retirada daquele lugar. Falamos dos casos em que ela não queira ser retirada, porque, muitas vezes, a própria mulher quer, sim, sair daquele lugar. E aí o que temos a fazer é que ela, o mais rapidamente possível, seja realocada. Mas não dá para punirmos a mulher, tirarmos o cargo dela ou demiti-la, quando ela já foi vítima e vai levar isso, inclusive no aspecto psicológico, para o resto da vida.
Por último, pedimos a punição efetiva dos culpados. Não dá para dizer que existe uma punição efetiva nos bancos. O que vemos, muitas vezes, é que os bancos fazem uma ata com esse abusador, com esse criminoso. Não há ainda, dentro dos bancos, uma política efetiva de punição desses criminosos.
Sabemos que a lei no Brasil ainda é muito falha. Mesmo que a Lei Maria da Penha seja considerada pela ONU a terceira melhor lei de proteção às mulheres, ainda hoje não há punição efetiva às pessoas que cometem violência contra a mulher. O que acontece é que, se for arquivado um caso desses, os bancos não vão dar a devida punição aos culpados. Muitas vezes, eles acabam, inclusive, retornando ao mesmo local de trabalho, como se nada tivesse acontecido. É algo que não conseguimos aceitar, e não vamos aceitar.
Então, quero tratar, rapidamente, dos dados da pesquisa que a Deputada Erika citou, já que houve 414 respostas. É uma pesquisa da Think Eva com o LinkedIn. O que vemos aqui é que quase metade das mulheres afirma ter sofrido assédio sexual e que, não menos importante, 52% dessas mulheres são negras. Então, temos também um retrato explícito de racismo no Brasil nos números de violência. Do total dessas mulheres, 78% não denunciam em função da impunidade; 64%, em função do descaso ou da diminuição do que aconteceu. Há ainda descrença, medo de ser exposta ou de ser demitida. Então, essa mulher, além de tudo o que ela já sofre, ainda passa por essa violência psicológica. É por isso que elas têm tanto medo de denunciar.
Então, para terminar minha fala, quero dizer que é muito importante debatermos esse assunto, falarmos sempre sobre esse assunto. Quanto mais falamos, quanto mais as mulheres se sentirem fortalecidas para realmente fazer essas denúncias, outras mulheres vão pensar e dizer: "Se ela consegue, eu também consigo. Eu também sou forte".
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A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Agradeço à representante da CONTRAF-CUT, Fernanda Lopes.
O SR. ARNALDO CORREA DE OLIVEIRA - Muito boa tarde a todos. Cumprimento a Mesa e a Deputada por esta grande iniciativa da Comissão. Esta audiência é muito importante, porque sabemos que as denúncias de assédio — o gráfico já foi mostrado aqui pelos nossos palestrantes — ainda são muito poucas. Sabemos que o ramo de serviços não tem aparecido. Por exemplo: o comércio, as academias, os clubes não têm aparecido nessas denúncias, nos gráficos dessas denúncias.
Então, gostaria de parabenizar as mulheres lá da Caixa Econômica pela denúncia que foi feita. Isso foi muito importante. Através da denúncia que veio da Caixa Econômica, vão aparecer outras denúncias. Outras instituições, outras entidades, outras mulheres que estão sofrendo assédio, ao verem essas matérias, podem se encorajar e também fazer suas denúncias.
Nós temos apanhado muitos casos de assédio no ramo de serviços. Em relação aos garis, nós também sabemos que há muitas denúncias, muito assédio, e não vemos nenhum tipo de investigação.
O que foi falado aqui pelas nossas palestrantes e pela procuradora é que há medo de fazer a denúncia. Muitas vezes, não é por não querer que o trabalhador não faz a denúncia, mas por medo de perder o emprego, de sofrer represália.
Então, sobre essa visão, nós temos que conscientizar as trabalhadoras e os trabalhadores. Ela tem que ser mudada. Esta mentalidade — nossa palestrante acabou de falar sobre o assunto — de não dar em nada, de não resolver, de não haver justiça e de não ser apurada tem que ser mudada. Através das denúncias, das pequenas denúncias, das denúncias que acontecerem, pode haver mudanças. A cada vez que formos repreendidos pela chantagem do patrão e das empresas para não fazer a denúncia, nós estaremos sendo omissos por aquele assédio moral que está sendo sofrido.
É muito importante a denúncia que houve junto à Caixa Econômica, uma instituição séria, um dos maiores bancos que existem no Brasil, como a Deputada acabou de falar. Isso dá força para que as outras instituições, o Banco do Brasil, o BRB e outros bancos, os bancos privados também, da mesma forma se abram e façam as denúncias.
Foi muito importante começar por uma instituição grande. Muitas vezes, começam a denúncia em alguma instituição pequena e não dão confiança para que ela continue. É por aí o caminho. O assédio tem que ser denunciado mesmo, tem que ser falado.
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A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Obrigada, Arnaldo, pela sua fala.
Alguém que se comunicou pelo e-Democracia falou sobre essa discussão das instituições pequenas, de como se faz com as instituições pequenas, que não têm a estrutura das grandes instituições de ter uma ouvidoria, de avaliação de clima organizacional, enfim, uma estrutura de verificação. Então, penso que a função do Estado é absolutamente imprescindível para que possamos levar adiante essas denúncias e responsabilizar os culpados.
Antes de passar para o nosso último convidado, o Presidente do Sindicato dos Bancários de Brasília, Kleytton Morais, quero apenas dizer que vamos passar a palavra para até cinco pessoas, por um prazo de 2 minutos cada uma. E, depois, vamos devolver a palavra aos palestrantes para as suas considerações finais, também por um prazo de 2 minutos.
O SR. KLEYTTON MORAIS - Obrigado, Deputada Erika Kokay. Quero saudar V.Exa. pela iniciativa, agradecer a oportunidade, bem como destacar o acolhimento que esta audiência hoje promove para as mulheres da Caixa Econômica Federal e para todas as mulheres que sofrem opressão, que sofrem todo tipo de violência pelo fato de serem mulheres. Então, são fundamentais audiências dessa natureza.
Eu vou começar, Deputada, primeiro com uma linha de argumentação, falando sobre o setor financeiro, sobre o sistema financeiro, o sistema bancário.
A situação é dramática para os trabalhadores e para as trabalhadoras, em especial nos bancos, no sistema financeiro. Há um processo de normalização da cultura de violência como mecanismo de produção de resultados. Essa normalização vai fazendo com que as estruturas de autocuidado, as estruturas de respeito, de autorrespeito sejam minadas. E foi justamente isso que pudemos constatar, ao ver como foi conduzido o processo relativo à tragédia que ocorreu e que permanece a ocorrer na Caixa Econômica Federal.
Inclusive, cito a literatura para apresentar os cuidados que o movimento sindical brasileiro, o Sindicato dos Bancários e Bancárias, tem empreendido para demover esse tipo de prática no setor financeiro.
Vejo aqui alguns companheiros e companheiras que construíram essa linha de atuação do Sindicato dos Bancários e das Bancárias de Brasília, na aproximação com a Clínica do Trabalho, do Departamento de Psicologia Universidade de Brasília, que consagrou mais de 1 década para estudar os efeitos desse malefício da organização do sistema financeiro sobre a saúde das bancárias e dos bancários. Eu vou ler uma lauda muito elucidativa que traz conceitos fundamentais e reveladores para tomarmos providências.
Acho que esta audiência, Deputada Erika Kokay, na próxima legislatura, sob sua liderança inclusive, haverá de tocar em pontos extremamente sensíveis a essa mudança de cultura. Num deles a Procuradora já tocou aqui, que é a atualização da tipificação enquanto crime da prática de assédio sexual.
É preciso avançar na tipificação, ampliando e atualizando a lei, para que, de fato, obtenhamos o seu banimento da sociedade brasileira.
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Então, vamos ao texto, que é uma colaboração, uma contribuição da empresa GEPSAT — Grupo de Estudos e Pesquisa em Saúde do Trabalhador e da Secretaria de Saúde do Sindicato dos Bancários, sob a coordenação da nossa Diretora Vanessa. Vamos lá.
No contexto bancário, as práticas de assédio têm se caracterizado principalmente de forma vertical descendente, como uma forma de estabelecer poder e domínio sobre trabalhadores e trabalhadoras. Essa referência é de Soares & Vilela, 2012.
Em geral, quando há tentativas de dialogar com os assediadores ou de registrar queixas há a intensificação da violência através de retaliações, levando à solidão como estratégia defensiva perante a prática do assédio. Assim, estabelece-se o silêncio e a crença persistente de desamparo perante a violência, o que gera impactos não só individuais e sociais como também organizacionais.
Em estudo clínico contínuo — e aqui vem a contribuição mais específica do Sindicato dos Bancários e das Bancárias de Brasília —, realizado em parceria com a GEPSAT e o Sindicato dos Bancários, em estabelecimentos de crédito de Brasília, entre 2014 e 2021, com 226 bancários e bancárias, os estilos de gestão marcados por abuso e desrespeito por parte da chefia, aliados à sobrecarga de trabalho decorrente do estabelecimento de metas inalcançáveis têm exercido impactos negativos sobre a saúde física e mental de bancários e bancárias. Em suas expressões mais extremas, esses estilos de gestão são caracterizados pela prática do assédio moral e ou sexual como forma de gestão legitimada pelas organizações, dados que coadunam com a literatura acadêmica sobre a saúde mental de bancários e bancárias.
Na literatura técnica sobre assédio moral e trabalho bancário destacam-se marcantes auto e hetero percepções — ou seja, uma autoavaliação daqueles e daquelas que sofreram e daqueles que perceberam a prática do assédio moral no ambiente de trabalho, de ver esse assédio moral no trabalho —, com 58,8% de respostas afirmativas com relação à vivência de assédio no trabalho.
Então, 58,8% dos pesquisados apontam e admitem que sofreram ou perceberam, foram testemunhas da prática de violência de assédio moral no ambiente de trabalho. Enquanto que, na realidade na Clínica do Trabalho, ou seja, daqueles que adoeceram em decorrência do trabalho, esse índice salta, em 2015, de 84,2% para, em 2021, 92,3%.
Nesse sentido, recuperando a fala da companheira Fernanda, nós nos reunimos em mesa de negociação instaurada. Inclusive, nesse momento, Deputada, estamos em negociação com a FENABAN. Estamos requerendo do setor o compromisso de banir a prática de assédio moral e sexual. Não admitir nos quadros dos bancos que haja a prática recorrente do assédio moral como instrumento de concepção de objetivos e alcance de metas. É fundamental. Ao final, Deputada, traremos aqui algumas propostas para o debate coletivo para acumular e, de fato, avançar para uma sociedade livre de assédio moral e assédio sexual.
Sobre o assédio sexual, primeiramente, quanto à tipificação, toda conduta de natureza sexual não solicitada, que tenha um efeito desfavorável no ambiente do trabalho ou que traga consequências prejudiciais no plano do emprego para as vítimas.
Isso pode ser considerado assédio sexual. Deputada, é uma atualização, como já falou a própria Procuradora, desse processo, o que é fundamental.
Indo para as proposições e observações, verificamos que é preciso desconstituir a rede de proteção de acobertamento que ainda permanece na Caixa Econômica Federal. As práticas de assédio sexual e moral, conduzidas na gestão do Sr. Pedro Guimarães, potencializadas e estimuladas por ele, mas não exclusivamente praticadas por ele, continuam ainda a ser protegidas porque há ainda na gestão da atual Presidente da Caixa Econômica Federal pessoas em postos-chaves de comando da instituição que acobertam/perseguem trabalhadoras, sobretudo aquelas trabalhadoras que ousaram denunciar as práticas a que estavam submetidas.
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Nesse sentido, tanto as matérias em jornais quanto programas em veículos televisivos denunciam esse processo, esse link que leva diretamente à influência do Sr. Pedro Guimarães no que se refere a assuntos da Caixa Econômica Federal.
As trabalhadoras e os trabalhadores, em potencial as trabalhadoras da Caixa, permanecem ainda, como diria Dante, no ciclo de análise do inferno submetidos a uma inversão. Enquanto deveriam ser os algozes a estarem ali experimentando o oitavo ciclo — foi o que achamos, Deputada, na literatura que se enquadra com as práticas conduzidas na Caixa Econômica Federal, companheira Rita Serrano — e quem vivencia esse ciclo de terror ainda são as mulheres, e não seus algozes.
Então, é fundamental, Deputada, respeitando o tempo, que façamos algumas proposições. É necessário que venhamos inclusive a esta Casa, também dialogando com o Ministério Público do Trabalho e com o Ministério Público Federal, apontar algumas situações que ainda perduram na Caixa Econômica Federal a saber: na Caixa Econômica Federal existe uma prática chamada "pesquisa de integridade" que os funcionários e as funcionárias da Caixa apelidaram de "KGB".
Essa prática é extremamente desumana. Ela fere a Constituição Federal, desrespeita o direito à privacidade e à intimidade das funcionárias e funcionários da Caixa. Dentre alguns elementos dessa "pesquisa de integridade", destacamos: afiliação ou não partidária dos funcionários e funcionárias da Caixa como requisito para a tal meritocracia; se os funcionários ou funcionárias têm ou não ação judicial. Deputada, trata-se especificamente de uma ação judicial, a Ação nº 384, promovida pelo Sindicato dos Bancários de Brasília, que obteve vitória na defesa dos direitos das mulheres, restabelecendo o direito delas e o pagamento de horas extras devidas que foi negligenciado pelo sistema financeiro. O engraçado é que, apesar de trágico, as companheiras, por meio de acordo que o Sindicato fez com a Caixa Econômica Federal, estejam marcadas e sinalizadas com a proibição de ascender em suas carreiras porque foram beneficiadas por essa ação.
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16:36
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Pessoas ligadas à área de investigação criminal, portanto agentes de espionagem, estão nos bancos para investigar a vida dos bancários e das bancárias, sobretudo das mulheres, porque há um perfil social e psicológico das vítimas abordadas na gestão Pedro Guimarães, possivelmente — e isso é uma hipótese — fruto dessa pesquisa de integridade realizada na Caixa.
Portanto, Deputada, é preciso que seja chamado também para uma audiência a área de gestão de pessoas da Caixa, a própria Presidente da Caixa para descontinuar esse conjunto de mecanismos que ainda estão em curso na Caixa Econômica Federal.
Por fim, é preciso que haja a responsabilização criminal e pecuniária dos assediadores. É fundamental que as instituições representativas e o Ministério Público do Trabalho façam esse processo, inclusive com cobranças subsidiárias, porque a Caixa foi lesada e tem responsabilidade de restituir também os prejuízos causados às bancárias e a todos os trabalhadores que igualmente foram penalizados.
A gestão Pedro Guimarães, inicialmente, normalizou a cultura da violência ao estabelecer léxicos, do ponto de vista de comando da organização, que tornavam comum em reuniões expressões do tipo: "Ou vocês entregam, ou vocês vão ter que usar hipoglós"; "Ou vocês entregam, ou eu vou passar o long dong em vocês". Então, eram expressões extremamente chulas e impertinentes a uma administração ou a qualquer espaço de convivência civilizatória, mas que, no entanto, eles foram tencionando, fazendo com que isso se normalizasse, da mesma forma, companheira Rita Serrano, que a colocação de pimenta no prato dos trabalhadores e o pagamento de flexões na frente dele e em público significavam também testar até que ponto aqueles trabalhadores já não tinham mais autoestima ou autocuidado preservados, ou seja, que poderiam estar suscetíveis a comandos, por mais que esses comandos pudessem ser de lesa-pátria, por mais que esses comandos pudessem ser inclusive de conteúdos ilegais.
Deputada, dentro dessa visão, colocamos em dúvida os processos que ocorreram na Caixa Econômica Federal, Maria Rita Serrano, de abertura de capital, de desmonte das operações relativas a recursos de terceiros. Todos os processos conduzidos de 2019 para cá foram ou não, companheira Maria Fernanda, estabelecidos dentro da boa técnica bancária, porque a cultura de opressão que se deu na Caixa e de silenciamento faz com que sustentemos, Deputada, nesta audiência essas dúvidas.
Por fim, verdadeiramente consagrando aqui o nosso respeito por este Plenário, nesta audiência hegemonicamente formada por mulheres, mas não exclusivamente, Deputada, quero dizer que V.Exa. estava certa e sempre esteve porque está do lado certo da história, porque tem compromisso com as trabalhadoras e com os trabalhadores. Em momentos outros, este Plenário esteve com funcionários e funcionárias da Caixa e aqui V.Exa. trazia e pautava questões relativas a desvio de conduta e comportamental na Caixa. Naquela ocasião, alguns trabalhadores e trabalhadoras, premidos por essa pressão, não deram o reconhecimento da matéria a V.Exa.
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16:40
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A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Obrigada pela contribuição, Kleytton.
Nós impetramos algumas ações. Primeiro, temos o acompanhamento pela Secretaria da Mulher no processo de apuração das denúncias de assédio. Segundo, levamos uma denúncia para o Ministério Público do Trabalho para que possa investigar todas essas denúncias de assédio sexual e de assédio moral. Também fizemos um requerimento de convocação do Ministro da Economia, porque só podemos convocar Ministros, para que explique todos esses desdobramentos.
Além disso, penso — e o Paulo está aqui para anotar — que devemos fazer um requerimento de informação para que possamos saber quais os critérios de avaliação e de investigação para efeitos de promoção, o que é chamado pela Caixa de "KGB". São várias denúncias. Adentra-se nas opções partidárias, adentra-se no círculo de amizades, adentra-se nas comunicações em redes sociais. Isso não pode ser critério para promover ou não uma pessoa. Exercer o direito de buscar a Justiça, que é o direito de ter direitos, quando um direito é violado também não pode ser critério para exclusão num processo de promoção.
Então, vamos fazer um requerimento de informação com esses dados sobre essa discussão, porque a pessoa que estava envolvida nessa rede que possibilitou o assédio sexual vira chefe da Loterias Caixa. Não se sabe ao certo qual era o objetivo senão despregar da Caixa a própria loteria. Enfim, são pessoas que tinham uma função, foram teoricamente afastadas dos seus cargos em função do envolvimento que detinham com essa rede, com essa estrutura assediadora e foram promovidas para a Loterias Caixa, para outros espaços da Caixa com inclusive possibilidade de levar um rol de servidores e servidoras junto, como alguns falam de forma grosseira — porque é grosseiro o ato —, de porteira fechada.
Por exemplo, o atual Presidente da Loterias Caixa, que ocupava a Vice-Presidência de Estratégia e Gestão de Pessoas, foi afastado da Vice-Presidência por ter envolvimentos nos casos de assédio sexual e é Presidente da Loterias Caixa.
Nós temos também uma discussão sobre o atual Presidente da Caixa Cartões, que tem forte apoio inclusive de segmentos aqui deste Parlamento, notadamente os que trocam sua dignidade e o seu voto por um orçamento secreto.
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16:44
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É muito triste nós estarmos numa reunião como esta ouvindo os depoimentos como o de Carolina, tomando conhecimento dessa triste realidade a que as mulheres da Caixa foram submetidas.
A Procuradora Deborah Duprat nos mostrou no início desta nossa audiência a forma de atuação deste Governo no sentido de destruir as instituições públicas. Ela conseguiu descortinar rapidamente todo o processo de assédio institucional na construção do esvaziamento como um método e como uma forma de governo.
Nós nos organizamos como empregados da Caixa a partir de abril para discutir o papel da Caixa e o que queremos, como a nossa Presidenta Maria Fernanda relatou na sua apresentação. Nessa análise, observamos a desconstrução da empresa, pegando um dos dados dos recursos da aplicação do Fundo de Garantia de 2003 a 2016, analisando os dados de 2021. Para vocês terem uma ideia, quando se iniciou o Governo do Presidente Lula, em 2003, o orçamento do FGTS era da ordem de 11 bilhões de reais. Nós chegamos em 2016 com um orçamento da ordem de 90 bilhões. Agora em 2021 o orçamento retrocedeu 34% — reduziu para só 60 bilhões de reais de investimentos. Isso dá uma mostra da desconstrução da empresa na sua finalidade.
E nós nos deparamos com essa situação do assédio. Jamais imaginamos que, numa instituição do porte da Caixa Econômica Federal, um senhor se acercasse com arroubos e submetesse as trabalhadoras à sua ânsia de poder — além de destruir a instituição —, essa ânsia desmesurada de poder a seu bel-prazer.
Por isso só temos a agradecer a essas empregadas que fizeram essa denúncia porque romperam esse processo a que estava a empresa como um todo submetida. Queremos agradecer, Deputada Erika Kokay, a criação desta audiência. Estamos aqui para fazer a denúncia como comitê de defesa da Caixa e pedir que esta Casa acompanhe as investigações que ocorrem, pois, passados mais de 51 dias, não temos um relatório das medidas institucionais que impeçam que esse estado de horror se perpetue.
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16:48
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O que temos visto, após a destituição de Pedro Guimarães, é um anúncio midiático de um novo produto comercial destinado às mulheres para comercialização nas agências da Caixa. Então, viemos solicitar a esta Casa que avance em uma legislação para que esse tipo de processo nunca mais se repita em uma empresa como a Caixa Econômica Federal, ou em qualquer instituição, ou em qualquer empresa. E que esta Casa apoie medidas para que os assediadores sejam responsabilizados civil e criminalmente.
(Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Obrigada, Marcia. Realmente, há 50 dias, por volta de 50 dias, não há nada que se possa assegurar de punição, de processo e de medidas de prevenção. Seguramente, todas nós gostamos muito de bombons. Mas não são bombons sendo distribuídos para as empregadas que vão fazer com que nós tenhamos um ambiente de respeito, respeito de gênero. Que nós possamos ser respeitadas enquanto pessoas.
A SRA. VANESSA SOBREIRA - Oi, Deputada. Eu sou a Vanessa. Atualmente eu estou como Secretária de Saúde do Sindicato dos Bancários. A partir das denúncias que surgiram na mídia, começamos aqui, no sindicato, a receber muito mais denúncias do que já vínhamos recebendo. Essas denúncias são bastante chocantes. Já havíamos ouvido na mídia, mas temos ouvido pessoalmente elas falando, todas elas falam que nunca tinham visto isso na Caixa em tantos anos de empresa.
Há muito tempo, o movimento sindical vem falando sobre um instrumento de gestão que tem sido utilizado na Caixa, chamada GDP. Há muito tempo nós vínhamos falando contra, exigindo o fim dessa forma de gestão. O que nós estamos observando agora é que essas pessoas que estão nos procurando têm reclamado demais desse instrumento. É um instrumento que não exige um consenso nem acadêmico sobre a sua eficácia, muito menos na utilização por uma empresa pública. É uma gestão por resultados e por metas. Dentro da Caixa, ele está sendo utilizado como um instrumento de assédio. Se a Caixa estivesse realmente disposta a resolver o problema de assédio dentro da empresa, ela estaria terminando com a GDP agora, neste momento, mas isso não foi feito.
Para as pessoas que estão sendo submetidas a esses assédios, dentro da Caixa, os gestores colocam uma GDP baixa, para poder justificar a perseguição e a retirada da função. Pessoas apadrinhadas chegaram a Brasília, ou os próprios chamados discos voadores, aquelas mulheres que foram chamadas para Brasília para serem assediadas pelos gestores da cúpula da Caixa, foram retiradas as funções, para colocarem essas pessoas. Para justificar a retirada das funções para incluir essas pessoas, foi utilizada também a GDP.
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Obrigada, Vanessa.
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16:52
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O SR. KLEYTTON MORAIS - Obrigado, Deputada. Mais uma vez, gostaria de lhe agradecer pelo convite e parabenizá-la pela iniciativa.
Finalizando, Deputada, eu pergunto o que esperamos desta audiência e do exercício de acompanhar essas situações. Primeiro, que a Caixa faça de fato um programa efetivo de proteção às vítimas que inclua cuidados para tratar os traumas psicológicos, acompanhamentos terapêuticos, que estimule o ambiente de trabalho, onde os colegas constituam verdadeiramente uma rede de proteção e de acolhimento a essas mulheres. Que haja respeito a competências, aos requisitos de competência técnica que todas elas têm e são demonstráveis pela apreciação no tempo e no espaço. Que haja um ajuste de compromisso que obrigue a Caixa a retomar, atualizar e executar a política de equidade na ocupação dos cargos gerenciais e de direção com metas por plurianuais definidas e difundidas para acompanhamento até que se alcance a igualdade, ou a maioria das mulheres na gestão da empresa. Hoje, a despeito de termos quase 45% de mulheres na Caixa Econômica Federal, elas ocupam apenas 17% dos cargos de direção na empresa. Eu já falei sobre essa questão de acabar com a pesquisa de integridade.
Por fim, deve haver a garantia de participação dos trabalhadores, por meio de suas representações, em todas as instâncias de apuração na Caixa Econômica Federal. Este é um requisito, inclusive, colocado em mesa de negociação.
Deputada, acho que o sistema financeiro inventa uma série de modas, de modismos bons, de responsabilidade, de termos, enfim. Acho que esta Casa, Deputada, na apreciação, também, inclusive dos indicados aqui para gerirem as estatais, deveria se colocar, tanto para o BACEN, anotações de restrição em cadastro específico a ser consubstanciado, no BACEN ou na CVM, de maneira a não admitir o ingresso de doentes, de psicopatas nas instituições públicas e privadas. Da mesma forma, deveria ser estudada nesta Casa a possibilidade de impor a pena banimento ou de suspensão das atividades financeiras daquelas e daqueles condenados pela prática de assédio sexual.
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Obrigada, Kleytton.
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Não vão nos calar com certeza!
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16:56
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A SRA. MARIA FERNANDA RAMOS COELHO - Deputada Erika Kokay, quero ratificar a importância da sua iniciativa, do seu protagonismo, neste momento em que esta Casa faz uma discussão tão importante.
A Caixa é uma instituição com 160 anos de contribuições inestimáveis para o povo brasileiro, para a população brasileira, na geração de emprego, nos programas habitacionais, de moradia. Temos certeza de que o processo de reconstrução do Brasil passa pelo fortalecimento da instituição e, principalmente, pela defesa que hoje nós vimos aqui acontecer nesta Casa.
Novamente, parabéns a todas as mulheres corajosas que tiveram a ousadia. Vimos aqui o quanto esse medo fica entranhado na instituição e também é incorporado nos diversos níveis gerenciais. Quero parabenizar novamente essas mulheres e dizer do nosso orgulho e da nossa alegria de poder ter esta audiência pública aqui nesta tarde. Certamente, agora teremos muito mais condições de ter a punição dos responsáveis por um crime tão absurdo, pelo horror que foi vivido na instituição.
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Muito obrigada à Maria Fernanda.
A SRA. CAROLINA LACERDA TOSTES - Quero só agradecer mesmo. Eu não sou muito boa em falar em público, é um desafio para mim falar em público. Mas eu gostaria de agradecer também a presença da ex-Presidente Maria Fernanda, por quem eu tenho um carinho especial, porque, quando eu tomei posse, ela era Presidente, em 2008. Tenho uma admiração por ela.
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Obrigada, Carolina Lacerda Tostes.
A SRA. FERNANDA LOPES - Acho que fica bem claro que precisamos de uma mudança realmente no País, de uma mudança de pensamento e de uma mudança na gestão do Governo mesmo, para que reduzamos esse número de violências.
Em junho de 2022, os dados do MPT já apontam 63% das violências de 2021. Então, continuamos com os números ainda crescendo.
Quero ressaltar também a importância da ratificação da Convenção 190, da OIT, que trata exatamente de combate à violência e ao assédio sexual e moral dentro do ambiente do mundo de trabalho. Então, é importantíssimo que o Brasil ratifique essa convenção. O Brasil está ficando para trás. Vários países já estão ratificando, e nós, mais uma vez, estamos ficando para trás, mas temos esperança de que isso vá mudar.
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Muito obrigada pela participação, Fernanda Lopes, que é da CONTRAF-CUT.
Eu queria dizer, inicialmente, que as empresas e as organizações têm que ser claras. Não bastam cartas de intenções.
Elas têm que dizer que o assédio moral, o assédio sexual e todo tipo de violência não são tolerados. Isso tem que estar presente na hierarquia completa, da presidência até a última pessoa, em todos os cargos exercidos. Deve-se investir em mecanismos internos e prevenção. É claro que atuamos no aspecto repressivo, mas, quando o mal acontece, Deputada, muitas vezes, ele não pode mais ser reparado, uma vida perdida não pode ser trazida de volta, uma pessoa doente não podemos curá-la. Então, vamos atuar na prevenção, criar uma empresa com mecanismos seguros, primeiramente, com espaços de escutas, com multiprofissionais, psiquiatra, psicólogo, pessoas que possam ouvir o trabalhador, que possam fazer uma escuta ativa, com mecanismos para recebimentos de denúncias, de apuração e de resposta efetiva.
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17:00
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Com relação à vítima, eu digo que sei que o trabalho não pode ser sinônimo de sofrimento. São conceitos antagônicos. Ainda que aquele trabalho lhe seja essencial para a subsistência, para a sua realização, denuncie. Encoraje-se e denuncie. Primeiro, procure a empresa, procure o sindicato da categoria, procure o Ministério Público, cerque-se das provas, busque a solidariedade dos seus colegas. Também eu digo: tenha coragem e confronte o assediador. Em um terço dos casos, quando a vítima diz para o assediador claramente que sabe que aquela conduta é assédio, ele recua, porque sabe que vai ser penalizado.
Antes de terminar o meu tempo, lembro que, às vezes, as pessoas ainda pensam que, para se configurar o assédio, a conduta precisa ser reiterada, repetida. Não, esse sofrimento não precisa se prolongar ao longo do tempo. A Convenção 190 da OIT é bem clara: basta uma única conduta. E é assédio sexual não apenas — eu vi isso em algumas perguntas e algumas falas — quando chega, levanta o cabelo, beija a nuca, pergunta se está de biquíni. Não! Ele pode ser feito de várias formas, praticado por várias condutas: a conduta verbal, que é a cantada, o convite para sair, o elogio malicioso; a conduta não verbal, a olhada, o encaminhamento de mensagens, nudes e vídeos; e a conduta também, evidentemente, física, o abraço, o beijo, a roçada, a apalpada, a batida.
Outro aspecto muito importante que, às vezes, as pessoas ainda não se deram conta é que ele não só ocorre no ambiente físico propriamente dito. A Convenção 190 — e é por isso que eu insisto na necessidade de ratificarmos esse instrumento — alargou isso. Ela nem chama de "ambiente de trabalho". Ela fala "mundo do trabalho", porque ele pode ocorrer no ambiente físico, mas também no percurso casa-trabalho, trabalho-casa, nos treinamentos e nas capacitações promovidos pela empresa e, inclusive, nas atividades festivas, nas festas de fim de ano, nas confraternizações, nos encontros. Então, tudo isso pode ser um espaço onde ocorre o assédio moral, o assédio sexual e todo tipo de violência.
Outra mensagem final é que as empresas precisam espelhar a sociedade. Não podemos, em um País com 51,8% das pessoas formadas por mulheres, termos mulheres em minorias nas empresas, nos cargos públicos, na política. Não, nós temos que espelhar a nossa sociedade. Então, vamos investir, e não é só fazer o mínimo, fazer o faz de conta, é promover mesmo a igualdade, promover a mulher no espaço de trabalho, assegurar a sua promoção, a sua ascensão, a diversidade e o respeito.
Essa convivência respeitosa evita que essas violências aconteçam e faz com que nós tenhamos, enfim, um trabalho digno, um trabalho justo, um trabalho que nos realize e não nos adoeça.
Deputada, a senhora falou que tem gente que diz que ir para o trabalho é como ir para um abatedouro. É uma afirmação triste, mas é uma afirmação que ouvimos. Não podemos permitir que isso aconteça. Ir para o trabalho tem que ser um movimento muito feliz da nossa vida, porque é nele que nós passamos a maior parte do nosso tempo. É por meio dele que nos realizamos e também realizamos os anseios de todos aqueles que estão a nossa volta.
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Muito obrigada pela oportunidade. Quero dizer, em nome do Ministério Público do Trabalho, que as pessoas confiem e façam a denúncia. Confiem no sistema de justiça, porque nós temos o poder e o dever de atuar e de dar uma resposta eficaz a todas as violações que aconteçam com os trabalhadores e com as trabalhadoras, sejam do sistema privado, sejam do sistema público.
(Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Eu queria agradecer muito a presença de todos: Dra. Deborah Duprat, Rita Serrano, Sergio Takemoto, Maria Fernanda Ramos Coelho, Carolina Lacerda Tostes, Fernanda Lopes, Kleytton Morais, Melícia Alves Mesel, a quem acabamos de escutar, e Arnaldo Correa de Oliveira. Agradeço muito pelas contribuições a esta discussão.
Eu entrei na Caixa no começo de 1982 e enfrentei vários governos, várias gestões na Caixa e no Brasil nesse período todo. Houve várias mudanças. Entrei na época da ditadura. Depois houve o processo de democratização, a tentativa de privatização, enfim, muitos ataques à Caixa. Mas eu nunca tinha visto o que estamos vendo agora. Penso que essa é uma forma, uma metodologia. O assédio, o assédio moral e o assédio sexual negam a existência do outro na sua inteireza. E eles se comunicam, porque o assédio moral naturaliza uma violência que depois pode se expressar no assédio sexual. Então, eu diria que são violências institucionais ou violências de uma forma de lidar com os servidores, servidoras, empregados e empregadas públicos.
Como disse a Dra. Deborah, você tem um Estado capturado. Se o Estado está capturado, ele está arrancado da sua função precípua e está a serviço do próprio governante, a serviço da iniciativa privada. Se você tem uma Fundação Palmares que é racista, Ministério do Meio Ambiente que é antiambientalista, uma FUNAI que é anti-indigenista, é um Estado capturado. E o Estado capturado sofre a resistência de servidores e servidoras.
Portanto, tem-se o ataque, o assédio. Há existência de PADs no serviço público, uma profusão de PADs, uma tentativa de fiscalização. O que se chama de KGB na Caixa é fiscalizar as pessoas, as suas relações, os seus posicionamentos políticos, que não dizem respeito ao ambiente de trabalho, que não dizem respeito ao mundo do trabalho, dizem respeito a como as pessoas se comportam e no que elas acreditam. As pessoas não podem ser punidas em função disso. E elas ainda são punidas com o standard de que há uma meritocracia.
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17:08
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O instrumento posto — acho que a Vanessa foi muito feliz ao dizê-lo —, esta avaliação de desempenho tem servido como álibi para que se possa ou favorecer quem não poderia ter esse tipo de promoção, ou, então, perseguir quem tem a indocilidade que a nossa humanidade exige. Aqui também já foi dito dos corpos dóceis. Há a tentativa de fazer com que os corpos sejam dóceis, que é uma tentativa de que os corpos sejam dominados. O que representa um Presidente sair, descer as escadas do vigésimo andar e obrigar todo mundo a ir com ele, a descer a escada? O que faz com que o Presidente obrigue as pessoas, gestores da empresa, de fazerem em um palco flexões, e provocar tantos comentários jocosos, chistes, que não têm inocência nenhuma?
Houve um processo de mando de uma lógica coronelista — de uma lógica também clientelista, mas coronelista. É o coronelismo se estabelecendo: eu domino os seus passos, quero dominar os seus pensamentos e quero que você tenha os corpos à disposição para que possam sofrer como eu quiser. É um pouco como a reunião — a Dra. Deborah falava sobre isso — ministerial que o Brasil inteiro assistiu; ela indica isso. "Eu não vou permitir que persigam meus amigos e os meus familiares." Então, o Estado é que protege os amigos. É o Estado do compadrio, o governo do compadrio, o governo de favorecer quem me serve, ou quem eu quero que seja agraciado. Como dizia Augusto dos Anjos, é o Estado que afaga e o Estado que apedreja. É o Estado que afaga os que fazem parte de um cortejo de submissão e de um cortejo sabujo, eu diria, e, ao mesmo tempo, é o Estado, o Governo que apedreja quem ousa se colocar de forma contrária.
É um absurdo isso tudo que está acontecendo. É um absurdo realmente perdendo a modéstia, como diz Nelson Rodrigues. Para nós que somos da Caixa e que passamos tanto tempo na Caixa, isso nos dá uma revolta muito grande. Essa é uma empresa que tem mais de um século, que participou de tantas etapas da história brasileira, que nasce como o Monte de Socorro. E agora ela está sendo palco disto: sua transformação em palanque. Fizemos vários requerimentos de informação para o Caixa Mais Brasil sobre as viagens, porque as viagens não se justificam. Elas por si só são assediadoras porque, se o Presidente da Caixa tem de ir a um Município que tem gestores e que tem empregados, para saber o que se quer naquele Município, é porque ele está desprezando, ignorando e menosprezando o próprio gestor na sua função de dialogar com a própria comunidade e as necessidades daquele local, daquele espaço, daquele território. Então, quando ele diz que precisa ir para escutar o que se quer, não leva em conta que ali há gestores, uma equipe de empregados e empregadas. Com todos os requerimentos que nós fizemos, soubemos que carros blindados foram contratados, houve reformas feitas na sua casa, a partir das equipes que servem a Caixa. Reformaram a residência onde ele morava — embora alugada, era a sua residência.
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Ao mesmo tempo, compraram todas essas passagens e disseram: "Não, já não queremos mais estas passagens; vamos em outro".
Isso é um desrespeito, sob todos os pontos de vista. Ter uma gestão que coloca sob sigilo a contratação de um locutor de rodeio, que não se sabe ao certo a sua função e a utilidade da propaganda que fez, um locutor de rodeio que foi responsável por algumas peças em mídias sociais — a Caixa colocou isso sob sigilo, sob sigilo! Não se sabe quanto a Caixa pagou, e se supõe que não tenha havido o processo licitatório. É o que se supõe: um amigo do Presidente da República, locutor de rodeios, que não se sabe quando se gastou e em que condições que foi contratado, porque está sob sigilo. Nós, inclusive, entramos na Justiça para quebrar o sigilo. Este é o Governo da clandestinidade, da exposição e da nitidez com que tem estratégias de assédio para quebrar as resistências, para dominar os corpos, para fazer com que os corpos sejam dóceis, para que possam ficar a serviço e à mercê do governante. Esta é a concepção, inclusive, que eles tentaram colocar na Constituição Brasileira, pela PEC 32: o Estado a serviço da iniciativa privada e do governante.
Portanto, este é um processo entranhado na lógica patrimonialista, presente neste Governo; na lógica de que "o Estado sou eu", de Luís XIV — sem o brilho de Luís XIV, e sem o sol de Luís XIV. "O Estado sou eu, a norma sou eu, aqui estou para que esta empresa me sirva e sirva ao meu candidato." Isso é inadmissível!
Os dados todos estão sendo adulterados, falseados — os dados do que dizia a Maria Fernanda, de um lucro em função da perda de ativos, ou de se depredar a própria instituição nos seus ativos, para ter um lucro que justifique inclusive todos estes gastos que foram efetivados e que não se justificam por uma prática de governança.
Vamos ver as seleções, esta rede de proteção. Aqui, tem razão o Kleytton: o assédio moral se dá quando se constrói também uma rede de proteção, uma rede de suporte para o assédio sexual, em particular, porque o assédio sexual — vou repetir —, quando se resiste a ele, vira assédio moral, com muita crueldade. Então, portanto, existe ali uma rede em que as pessoas foram pinçadas, e uma virou Presidente da Caixa Loteria, e outra virou, enfim, e continua esta rede de proteção que é um pacto de silêncio. É um pacto que lembra a máfia dos silêncios, que se constrói para uma proteção comum, para que os crimes não possam ser apurados e não possam ser investigados.
Vamos fazer este requerimento de informações, solicitando inclusive as conclusões objetivas para o processo de apuração do assédio sexual. É preciso e vamos querer fazer uma nova legislação, doutora, para que possamos trabalhar uma atualização, mas também para termos um instrumento mais global, mais amplo de combate ao assédio moral. É importante não só criminalizar, criminalizar é importante e ali está, e é preciso atualizar, mas é preciso ter uma proposição e uma política de combate que também previna, que também possa fazer campanhas.
Que também se possam construir espaços onde seja bom trabalhar, bons espaços para se trabalhar, para que o trabalho não venha carregado por uma dualidade e uma duplicidade de sentidos, carregado de sofrimento.
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17:16
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Então, nós devemos fazer uma proposta global, trabalhando com proteção, com prevenção, com promoção. Eu me refiro à proteção porque a pessoa que denuncia tem que ser protegida imediatamente por uma medida protetiva. A pessoa que denuncia o próprio chefe não pode ficar ali trabalhando com ele, porque ela vai sofrer uma série de tentativas de silenciamento, de quebra da decisão de denunciar.
Isto é um pouco do que nós estamos recebendo de denúncia dos empregados e das empregadas da Caixa: de que as coisas estão muito parecidas com o que era antes; de que há toda uma política de terror que se expressou e que se expressa no assédio sexual; e de que permanece a tentativa de não apuração do assédio sexual.
Portanto, é preciso se fazer uma proposta global para a contenção e para a prevenção do assédio sexual; para a promoção de um ambiente sem assédio sexual; para a proteção das vítimas — num primeiro momento, elas têm que ser protegidas, porque não podem ficar ao lado do agressor, do assediador —; e para a responsabilização do próprio assediador ou do criminoso.
Então, feito isso, nós vamos tentar trabalhar com essa proposição. Devemos fazer outras audiências públicas para discutirmos já uma proposta mais concreta, ou seja, com mais dados. Vamos tentar trabalhar todas essas contribuições que aqui foram postas.
Eu queria, mais uma vez, agradecer-lhes muito e dizer que não podemos nos calar, não podemos naturalizar isso, não podemos permitir que isso caia no esquecimento. Essas ações de produtos específicos para as mulheres — toda uma política de crédito, uma política direcionada ao empoderamento das mulheres — são importantes. Mas há um processo enraizado, imbrincado na instituição, que atentou contra a própria instituição.
É uma irresponsabilidade se ter um Presidente como esse em uma empresa como a Caixa, que é uma empresa secular, com tanta história, tão fundamental para o Brasil, que tem sido utilizada como joguete, como instrumento ou como lócus de toda sorte de crimes que foram denunciados.
Portanto, em defesa da própria empresa, em defesa do seu maior patrimônio, que são os seus empregados e as suas empregadas, nós vamos seguir adiante com o requerimento de informações, acompanhando os desdobramentos de toda esta apuração e, ao mesmo tempo, querendo saber exatamente quais são os critérios, quais são os estudos que embasam um instrumento para se adentrar a vida das pessoas.
Nós temos denúncias, Marcia — eu não sei se procedem ou não —, vindas de pessoas que foram repreendidas porque foram trabalhar com gravata vermelha. Foram repreendidas porque não se pode usar uma gravata vermelha dentro da instituição.
Então, esse nível de assédio e de macartismo que está posto — de se vasculhar a vida das pessoas, de se perseguir as pessoas — nós vamos ver em outros espaços da administração pública.
Há vários espaços da administração pública em que as pessoas estão sendo perseguidas pelo que postam nas redes sociais, pelos seus posicionamentos políticos, inclusive pelos seus posicionamentos pessoais e filosóficos. Elas estão sendo perseguidas por isso.
Então, nós queremos trabalhar com a perspectiva de elaborarmos essa proposição e, ao mesmo tempo, fazermos o requerimento de informações sobre o instrumento de avaliação de desempenho e sobre o embasamento para esse tipo de rompimento da individualidade, de rompimento da privacidade das pessoas que está em curso.
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17:20
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Também queremos que eles respondam ao requerimento de informações sobre quais medidas objetivas foram tomadas. Não basta distribuir bombons ou dizer que agora será decretada outra realidade dentro da instituição, em que as mulheres vão ser respeitadas. Isso se faz com políticas concretas.
A Maria Fernanda também falava sobre isto: uma linha de atuação junto com a Secretaria de Política para Mulheres, o Selo Pró-Equidade de Gênero, metas concretas e objetivas. Aqui também foi falado pela Dra. Mesel que é preciso se apresentar uma proposição com detalhes, com prazos, com responsáveis. Enfim, não se trata de elaborar uma carta de intenções, de distribuir bombons para as empregadas da Caixa. Por mais que sejam bons os bombons, eles são insuficientes para se romper com todo esse nível de terror que foi estabelecido.
A partir das denúncias, a partir de tudo isso, a Caixa seria instada a fazer um termo de ajustamento de conduta, com várias etapas, para dizer o que vai fazer objetivamente, para ter uma ouvidoria sobre a qual não haja desconfiança por parte das empregadas.
Ao que tudo indica — vou repetir —, por algumas vezes, as pessoas que denunciaram não obtiveram resposta. O índice de 5% de denúncias é gravíssimo. Essa pesquisa não é obviamente apenas da Caixa. Mas o percentual de apenas 5% significa que as pessoas não acreditam no Estado Democrático de Direito, não acreditam que vão ser protegidas, não acreditam que não vão ser culpabilizadas, não acreditam que não vão ser hostilizadas, não acreditam que vão romper uma solidão que acomete as pessoas que denunciam. Então, elas fazem uma opção. Como essa pesquisa indica, apenas 5% denunciam e 15% pedem demissão e se afastam do órgão, porque não suportam trabalhar ali. Elas saem do órgão como se elas é que tivessem a obrigação de sair para viver bem, e não a empresa é que tivesse de mudar as suas posturas e tomar as providências necessárias.
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