4ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA 56 ª LEGISLATURA
Comissão de Saúde
(Audiência Pública Conjunta das Comissões CIDOSO e CSSF (semipresencial))
Em 6 de Julho de 2022 (Quarta-Feira)
às 15 horas
Horário (Texto com redação final.)
15:10
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O SR. PRESIDENTE (Dr. Zacharias Calil. UNIÃO - GO) - Declaro aberta a reunião de audiência pública da Comissão de Defesa dos Direitos da Pessoa Idosa, com a participação da Comissão de Seguridade Social e Família, convocada para debater o diagnóstico e o tratamento da obesidade em adultos e idosos, em atendimento aos Requerimentos nºs 23 e 30, de 2022, de minha autoria, pela Comissão do Idoso, e nº 7, de 2022, da Deputada Flávia Morais, pela Comissão de Seguridade Social e Família.
Comunico a todos que o tempo previsto para a exposição de cada convidado será de 10 minutos.
Informo ainda que esta audiência pública é interativa e está sendo transmitida pelo portal e-Democracia.
Comunico que será lançada pela Secretaria a presença do Parlamentar que usar da palavra nesta audiência pública pela plataforma de videoconferência.
Inicialmente, tenho a satisfação de apresentar os seguintes convidados ao debate: Vanessa Pirolo, representante da Associação Botucatuense de Assistência ao Diabético e da Coalizão Vozes do Advocacy em Diabetes e Obesidade; Ediane de Assis, Diretora do Departamento de Assistência Farmacêutica do Ministério da Saúde; Rafael Poloni, Coordenador-Geral do Departamento de Assistência Farmacêutica do Ministério da Saúde; Cintia Cercato, Presidente da Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e Síndrome Metabólica — ABESO; Marcio Mancini, membro do Departamento de Obesidade da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia — SBEM; Luis Fernando Villaça Meyer, Diretor de Operações do Instituto Cordial/Painel Brasileiro da Obesidade — PBO; Antonio Carlos Valezi, Vice-Presidente da Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica — SBCBM; e Elisabete Laurindo de Souza, representante do Conselho Federal de Educação Física — CONFEF.
Apresentados os convidados, concedo a palavra à primeira expositora, Vanessa Pirolo, representante da Associação Botucatuense de Assistência ao Diabético e do Coalizão Vozes do Advocacy em Diabetes e Obesidade, pelo prazo de 10 minutos.
A SRA. VANESSA PIROLO - Boa tarde a todos.
É um prazer imenso estar com vocês neste espaço. Então, primeiramente, antes de colocar minha apresentação, gostaria de agradecer imensamente à Deputada Flávia Morais e à sua assessora Carla, ao Deputado Dr. Zacharias Calil, que conduz esta audiência, e à sua assessora Patrícia, à Deputada Carmen Zanotto — não sei se também participa da reunião, não sei está no plenário — e à sua equipe. Sempre conversamos com ela, uma pessoa que sempre ajuda na nossa causa. E agradeço também a presença de todas as pessoas que o Deputado anunciou no início da audiência.
Deixem-me compartilhar minha apresentação. (Pausa.)
(Segue-se exibição de imagens.)
Nós somos da Coalizão Vozes do Advocacy em Diabetes e Obesidade. Para quem não me conhece, eu sou Vanessa Pirolo. Tenho diabetes tipo 1 há 22 anos, não tenho complicações do diabetes. Nós criamos a Coalizão Vozes do Advocacy no final do ano passado. Representamos todas estas organizações — vocês estão vendo as carinhas das pessoas e os nomes das organizações representadas. São 22 ao todo, de boa parte do Brasil. Gostaríamos de contar com mais de 5.500 organizações no Brasil para dar todo o apoio às pessoas com diabetes. E nós abraçamos a causa da obesidade devido à pandemia. Sabemos da relação do diabetes com a obesidade. A Dra. Cintia Cercato vai falar sobre isso, e outros médicos também, com maestria. Sabemos que na pandemia o índice de obesidade aumentou bastante. Os dados ainda não são conclusivos, mas já sabemos, através das organizações que representamos, através da Coalizão...
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A SRA. CINTIA CERCATO - Vanessa, desculpe interromper, mas a sua apresentação não está sendo exibida. Não sei se isso acontece só aqui. Os eslaides não estão sendo exibidos.
O SR. PRESIDENTE (Dr. Zacharias Calil. UNIÃO - GO) - Coloque no modo "apresentação".
A SRA. VANESSA PIROLO - Por favor, vejam se agora aparece o eslaide "Destaque".
O SR. PRESIDENTE (Dr. Zacharias Calil. UNIÃO - GO) - Sim.
A SRA. VANESSA PIROLO - Nós somos 29.800 brasileiros — houve uma desconfiguração, pelo que vi aqui na apresentação; indiretamente, somos 16 milhões de brasileiros com diabetes e 45 milhões de brasileiros com obesidade. Então, o número é bastante impactante. Nós queremos fazer diferença no número de pessoas com obesidade também.
Agora eu não consigo passar o eslaide. Aguardem só um minutinho que eu vou tentar de outra forma. (Pausa.)
Vocês estão vendo o eslaide sobre o que é a Coalizão?
O SR. PRESIDENTE (Dr. Zacharias Calil. UNIÃO - GO) - Sim, apareceu.
A SRA. VANESSA PIROLO - Vou deixar sem a forma de apresentação. Quem sabe agora consigo passar.
Muitas pessoas não conhecem a Coalizão, não sabem seu significado, então quisemos deixar bem claro. A Coalizão é um acordo ou uma aliança para determinado fim. Então, nós fizemos essa coalizão para unir todas as pessoas, em prol das pessoas com diabetes e obesidade.
Por que nós chamamos esta audiência? É preciso que o protocolo de obesidade seja revisto, devido a alguns fatores. Um deles é o fato de que existe um gap de pessoas que não conseguem ser vistas dentro desse protocolo, que não conseguem ser reconhecidas por esse protocolo. Pessoas com sobrepeso, com obesidade leve conseguem, sim, através da alimentação e da atividade física, reduzir o seu peso; pessoas com obesidade em grau extremo, que têm o IMC maior que 30 quilogramas por metro quadrado, são submetidas à cirurgia bariátrica e metabólica; e, no meio desse caminho, várias pessoas não conseguem ser reconhecidas, não conseguem ter um avanço substancial na perda de peso. Sabemos que, só com a inserção de um medicamento, ela conseguiria realmente ter uma motivação para reduzir esse peso. Há, claro, a questão do custo-efetividade, com as medicações efetivas para isso.
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São 45 milhões de brasileiros com obesidade. É importante destacar isso, porque muita gente acredita que a obesidade é um fator de risco e não uma doença. Precisamos tratar a obesidade como doença, e ela tem uma ligação direta com o diabetes tipo 2. Nós queremos que essas pessoas com obesidade tenham qualidade de vida. Então, é o que nós pedimos nesta audiência.
O meu eslaide foi desconfigurado de novo.
São 16 milhões de pessoas com diabetes, 45 milhões com obesidade. Segundo a Pesquisa Ipsos que foi publicada no início deste ano, 1 em cada 2 brasileiros engordou na pandemia, com um ganho de peso de 6 quilos. E um dado publicado pelo Instituto de Estudos de Saúde Suplementar comentou que 4,8 bilhões de reais dos gastos de planos de saúde, de 2015 a 2021, estavam relacionados à obesidade. Essa é uma informação muito impactante. Os dados de diabetes e de obesidade também são grandes.
Então, se pensarmos em prevenção de diabetes e obesidade, foram gastos 890 milhões de dólares com hipertensão, diabetes e obesidade e 42,9 bilhões de dólares com diabetes no Brasil. Isso é bem impactante.
Só para dar uma pincelada, pois os médicos vão comentar sobre esse assunto, o acúmulo excessivo de gordura corporal provoca resistência insulínica, que, por sua vez, provoca o diabetes tipo 2. Então, uma doença está relacionada diretamente com a outra.
Em relação ao tratamento, não existe somente um protocolo, com acompanhamento médico, alimentação adequada e inserção da atividade física. É muito mais do que isso. Deve-se ter um acompanhamento multiprofissional, e é preciso inserir esse medicamento para termos um protocolo em que as pessoas consigam realmente ser tratadas.
Então, a perda de peso significa melhora do controle do diabetes, e nós sabemos que quanto melhor o controle do diabetes, menos complicações essas pessoas vão ter, entre elas a insuficiência cardíaca, a retinopatia diabética, a nefropatia, a neuropatia diabética, e assim nós teremos também menos internações, menos hospitalizações e menos mortes. É isso que nós queremos.
Já indo para a finalização da minha apresentação, nós queremos sensibilizar a sociedade, pois a obesidade tem várias causas, não somente o sedentarismo e a má alimentação.
O protocolo de obesidade precisa ser revisto.
É preciso solicitar um programa de prevenção da obesidade para evitar as complicações de que eu acabei de falar.
Nós queremos também, aproveitando a presença da Ediane e do Rafael, solicitar uma reunião após a nossa audiência para debatermos sobre o que podemos fazer para modificar esse protocolo que foi publicado em 2020, num período de pandemia. Esse protocolo precisa ser revisto com cuidado — isso é importante — e com a participação popular.
Então, eu quero deixar aqui também as nossas redes sociais. Nós somos o @vozesdoadvocacy. Deixo aqui os meus contatos e o meu agradecimento por este espaço cedido pelas duas Comissões que foram envolvidas. Agradeço também aos Deputados aqui presentes.
Muito obrigada.
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O SR. PRESIDENTE (Dr. Zacharias Calil. UNIÃO - GO) - Obrigado. Agradeço a sua apresentação. São dados realmente alarmantes. O Brasil, realmente, tem 16 milhões pessoas com diabetes e 45 milhões com obesidade. É um dado muito significativo que haja esse número de pessoas passando por isso, que tem a ver com a própria saúde pública também. Além do mais, ainda houve um ganho médio na pandemia de 6 quilos. Essas pessoas ficaram em casa consumindo alimentos extremamente calóricos.
Eu passo a palavra agora ao segundo expositor, a Sra. Ediane de Assis, pelo prazo de 10 minutos.
A SRA. EDIANE DE ASSIS - Obrigada. Boa tarde a todos. Gostaria de cumprimentá-los, agradecer e receber outras informações trazidas. Realmente é um tema de extrema relevância e de importância para a saúde pública, principalmente pelos desdobramentos que essa condição acaba por trazer para os pacientes e para a saúde em geral, para a saúde pública.
Gostaria de ressaltar que o Ministério vem adotando ações. Nós temos um pleito que foi colocado na apresentação de um programa voltado especificamente para isso. Eu considero de extrema relevância. De fato, nós temos ações não assim organizadas como programa, mas existem diferentes iniciativas dentro do Ministério, na área de alimentação, fomentando uma alimentação saudável, na área de exercícios físicos, também iniciativas voltadas para essa questão.
Em relação ao protocolo, nós temos esse protocolo publicado em 2020. No momento da confecção do protocolo foram avaliados dois medicamentos, a sibutramina e o orlistat. O grupo elaborador do protocolo verificou que a inclusão desses medicamentos não traria um benefício. De acordo com a avaliação deles, esses medicamentos não devem realmente fazer parte do protocolo, da avaliação realizada naquele momento. Entretanto, de 2020 para cá, provavelmente nós temos novas vivências, talvez novos medicamentos. Passados 2 anos desse protocolo, realmente já é um momento interessante para fazer uma revisão.
Eu gostaria de ressaltar que a CONITEC é um órgão assessor do Ministério da Saúde, composto por órgãos aqui de dentro do Ministério da Saúde e também por outras instâncias, como ANVISA, Conselho Federal de Medicina, Agência Nacional de Saúde Suplementar. Essa Comissão trabalha sob demanda. Para demandar a CONITEC, qualquer cidadão, qualquer sociedade, qualquer Secretaria Municipal e Estadual podem submeter um pleito, uma solicitação de avaliação, seja de uma nova tecnologia, seja de uma alteração de tecnologia, seja a criação de um protocolo. Isso está totalmente aberto. A CONITEC disponibiliza no site. Inclusive, é um site que tem muitas informações. Eu recomendo a quem ainda não acessou que possa verificar. Lá no site eles colocam todo o caminho das pedras — digamos assim — para submeter uma apreciação para a CONITEC.
Então, já fica desde já colocada essa possibilidade. Provavelmente, os grupos, as associações, as sociedades médicas possuem um consolidado de evidências. Isso pode ser organizado e encaminhado aqui formalmente para o Ministério no fluxo da CONITEC. Isso vai entrar numa via administrativa de avaliação, existe um prazo, segue todo um rito previsto na legislação. Eu acho que é um caminho até mais curto, digamos assim, para conseguir essas avaliações por meio da CONITEC.
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De qualquer forma, também fica aberta a possibilidade de fazermos uma reunião no âmbito ministerial, no gabinete do Ministro, para que nós possamos chamar outras áreas do Ministério, a SAPS, que tem ações relacionadas a este tema, e a SAES. E que nós possamos pensar em algo talvez mais abrangente como um programa e incluir também, quem sabe, a questão do protocolo.
São estas as informações. Eu me coloco à disposição para esclarecimentos de qualquer dúvida ou acréscimo de informações.
Obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Dr. Zacharias Calil. UNIÃO - GO) - Muito obrigado. Eu vou fazer um comentário. Eu vejo que esses medicamentos que foram citados para tratamento tanto da obesidade, quanto do diabetes, nós temos que revê-los realmente. Eu vejo que, para esses medicamentos, a cada dia que passa, existem novas formulações. Por exemplo, a senhora citou metformina e sibutramina, e as pessoas passam a ter uma determinada resistência a isso.
A semaglutida, um medicamento que muita gente está usando para emagrecer, só se consegue através de ações judiciais. Este é um problema no nosso País: judicializar para conseguir determinados medicamentos. É isso que eu critico, não adianta. Por exemplo, a pessoa obesa ou diabética chega a um ponto em que o medicamento não atua mais. Existem novas formulações que têm, sim, que ser utilizadas. Infelizmente, o SUS também não acompanha isso, ele não acompanha a evolução do tratamento do paciente. Então, isso é uma coisa muito preocupante.
Eu mesmo fiz um teste há pouco tempo no Ministério Público do meu Estado. Eu solicitei a compra de um medicamento para mim, um medicamento de alto custo, são 800 reais por mês, e foi negada. Eu entrei com uma ação para reivindicar novamente, ele negou novamente dizendo que o medicamento não estava no rol de procedimentos, não fazia parte do protocolo do SUS.
Então, como é que fica o paciente, engordando o tempo todo? Nós sabemos que as doenças diabetes e obesidade ninguém tem culpa de tê-las, principalmente a obesidade, em que, às vezes, o problema não está só no medicamento e na condução do caso. Nós sabemos muito bem disso. Estas são situações em que nós temos, sim, que tomar providências em relação a esses pacientes.
Passo a palavra agora ao Sr. Rafael Poloni, pelo prazo de 10 minutos.
A SRA. EDIANE DE ASSIS - O Rafael é aqui do Departamento de Assistência Farmacêutica e veio para me acompanhar. A exposição dos dados já foi colocada.
Obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Dr. Zacharias Calil. UNIÃO - GO) - Pois não.
Passo a palavra para a Sra. Cintia Cercato, pelo prazo de 10 minutos.
A SRA. CINTIA CERCATO - Boa tarde a todos. Muito obrigada pelo convite para fazer parte desta audiência pública.
Eu vou compartilhar aqui a minha apresentação.
(Segue-se exibição de imagens.)
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Sou Cintia Cercato, médica endocrinologista, atual Presidente da Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e Síndrome Metabólica — ABESO e também professora da Universidade de São Paulo. Vou falar muito brevemente sobre nós, a ABESO.
A ABESO foi criada em 14 de agosto de 1986. Temos mais de 35 anos de história. Somos membros de várias associações importantes, incluindo a Federação Latino-Americana para Estudo da Obesidade, a FLASO, da qual a ABESO é membro fundador. Atualmente a ABESO também é membro da International Association for the Study of Obesity — IASO, atualmente World Obesity Federation, desde 1996. A Associação é conveniada à Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia, a SBEM, uma vez que a obesidade não é uma especialidade médica. A ABESO tem um convênio com a SBEM, pela qual é representada junto à Associação Médica Brasileira.
Nós temos como missão difundir o conhecimento de que a obesidade é uma doença complexa que precisa ser prevenida, diagnosticada e tratada. Somos fonte de informação correta sobre obesidade e suas complicações e lutamos principalmente pela ética na abordagem do paciente, repudiando práticas não reconhecidas cientificamente.
Ao longo desses 35 anos, pautamo-nos pela ética, pelo conhecimento científico, pelo respeito ao paciente e pela independência. Fomos responsáveis pela publicação Diretrizes Brasileiras de Obesidade, que estão num documento utilizado inclusive pelo próprio Ministério e por diversas universidades. Essas diretrizes são usadas como fonte de referência sobre a obesidade por todos os profissionais de saúde do nosso País.
O dia 4 de março é o Dia Mundial da Obesidade. Eu queria brevemente compartilhar com os senhores uma pesquisa que fizemos com a participação da SBEM sobre obesidade e gordofobia e mostrar o quanto a obesidade é uma doença complexa. Infelizmente, existe um senso comum de achar que o indivíduo é responsável pela sua doença, há um total desconhecimento das raízes que são a base para o desenvolvimento da obesidade. Tivemos a participação de mais de 3.600 pessoas nessa pesquisa. Observem que é uma participação voluntária e quem mais se voluntariou a participar dessa pesquisa foram justamente aquelas pessoas que mais sofrem com o excesso de peso. Tivemos 75% dos participantes com diagnóstico nutricional de obesidade. E vejam os senhores que 37,3% têm obesidade de grau 3, obesidade severa.
É triste constatar que os participantes, infelizmente, sofrem constrangimentos pelo fato de terem esta doença, a obesidade. Vejam os senhores que o principal local de constrangimento é dentro da própria casa, 72% participantes falaram que sofrem constrangimento em casa. Entretanto, o que mais me deixa preocupada é que 60% relataram sofrer constrangimento em serviços de saúde durante consultas médicas, mostrando que temos aí um caminho a trilhar no preparo dos profissionais de saúde para atender o paciente com obesidade. Vejam que, dos participantes que tinham obesidade grave, 98% sentiram-se constrangidos por conta do seu peso, nos mais diversos locais da sociedade.
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Essas pessoas precisam de acolhimento, precisam ser tratadas. Vejam que a grande maioria já tentou perder peso. Mais de 90% já tentaram perder peso, 55% no setor privado e 31% por conta própria. Nós sabemos dos problemas de acesso ao tratamento no sistema público, como podemos ver aí há uma minoria relatando que procurou tratamento no sistema público. E como essas pessoas tentam se tratar? Com dieta e com atividade física, o que de fato é a base do tratamento. Sempre é dito: "Vamos falar de dieta, vamos falar de atividade física". Nós sabemos da dificuldade de acesso a tratamento que essas pessoas têm para uso de um tratamento farmacológico, por exemplo, que faz com que elas recorram frequentemente — vejam que na nossa pesquisa chegam a quase 20% — a terapias consideradas heterodoxas. Infelizmente, há pouco tempo, foram relatadas na imprensa as mortes de duas mulheres jovens que fizeram uso de chás emagrecedores, vendidos livremente pela Internet. Então, nós esbarramos nessa falta de acesso ao que há de tratamento baseado em eficácia, em evidência científica, e as pessoas acabam buscando tratamentos por conta própria e caindo em terapias heterodoxas que colocam suas vidas em risco.
Nós precisamos entender que a obesidade é uma doença complexa, que não é responsabilidade do indivíduo, que existe uma biologia que promove a doença, que é afetada por aspectos psicossociais e pelo ambiente.
É importante entender o papel da genética. Os indivíduos que ganham peso têm um genótipo, uma predisposição para ganhar peso. No sistema nervoso central, há o hipotálamo, uma região do cérebro que controla a fome, a saciedade. Inúmeros fatores podem levar à inflamação do hipotálamo e causar essa desregulação de fome e saciedade. Então, dizer para uma pessoa que ela tem que comer menos, sendo que ela está com o hipotálamo inflamado, não vai fazer o hipotálamo dela desinflamar, e ela passar a ter saciedade e conseguir controlar a sua doença. Além disso, o consumo alimentar depende também do sistema límbico, uma região envolvida em recompensa alimentar. Para que haja a preservação da espécie, nós precisamos comer. Coisas que são fundamentais para preservar a espécie acabam também sendo prazerosas para justamente permitir a vida. O comer também é prazeroso, e nós sabemos que diversas são as condições que levam a alterações nesse sistema. Então, a obesidade não é falha de caráter, não é falta de força de vontade.
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Mais de 80% dos genes relacionados à obesidade são expressos no sistema nervoso central. Por essa razão, os medicamentos acabam atuando no sistema nervoso central para mudar essa regulação ou para permitir um melhor controle de fome e de saciedade. E nós sabemos que essa biologia acaba sendo afetada por fatores ambientais e psicossociais.
Dieta rica em gordura gera inflamação no hipotálamo; dieta rica em açúcar e gordura ativa de forma crônica as respostas cerebrais de recompensa alimentar. Por isso precisamos de fato promover ambientes saudáveis, e a ABESO trabalha com isso a partir de ações que apoiam a rotulagem de advertência frontal, tem buscado avançar na agenda da tributação de bebidas açucaradas, na agenda de proibição de marketing de alimentos ultraprocessados direcionados à criança, agendas essas muito difíceis. Nós também apoiamos o Guia Alimentar para a População Brasileira e uma merenda escolar cada vez com melhor qualidade.
Isso tudo está no nosso âmbito, mas é óbvio que é melhor prevenir do que remediar, sem dúvida nenhuma. No entanto, a prevenção não vem acontecendo. Os números de obesidade só aumentam no nosso País. Um em cada quatro brasileiros hoje tem obesidade. E esses brasileiros precisam ser tratados. Então, nós temos que, além de trabalhar na agenda da prevenção, fazer andar a agenda de tratamento.
Nós sabemos que perder peso pode melhorar comorbidades e não é preciso trazer o indivíduo para o peso normal. Perdas de 2,5%, 5% a 10% já trazem benefícios para a saúde. Então, quando falamos em tratamento, não queremos trazer o indivíduo para o peso normal. Nós queremos que esse indivíduo melhore as suas doenças associadas, e nem sempre precisa ser uma perda de peso tão expressiva para se obter esse resultado.
Então, nós sabemos que a obesidade é uma doença subtratada, fazendo uma comparação, por exemplo, com o diabetes. Estes são dados americanos, mas eu posso assegurar aos senhores que aqui no Brasil essa discrepância ainda é maior. Se olharmos os adultos elegíveis a receber um tratamento farmacológico, 86% o recebem, no caso de diabetes; e menos de 1%, no caso de obesidade.
Nós fizemos uma solicitação à CONITEC, a Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS, para a incorporação de uma medicação, no caso a sibutramina. Infelizmente, essa incorporação foi negada. O PCDT — Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas foi publicado no final de novembro de 2020. Antes disso, na consulta pública, fizemos uma série de contribuições ao PCDT. No entanto, todas as nossas contribuições não foram consideradas, e o PCDT, apesar das nossas colocações, seguiu sem levá-las em conta.
Nós apontamos aqui alguns problemas com a análise para a incorporação e com o protocolo final, como a seleção dos estudos, que foi enviesada, no nosso entendimento. Em relação a colocações com viés de publicação em que se diz que alguns estudos não deveriam ser considerados por conta de financiamento da indústria, vou querer saber qual medicamento para câncer ou para qualquer outra doença não foi financiado pela indústria. Também é dada uma grande importância ao PCDT e à PICS — Práticas Integrativas e Complementares em Saúde, e nós sabemos que o grau de práticas que estão incluídas na PICS é zero em relação ao tratamento da obesidade.
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Nós tivemos uma reunião no Ministério da Saúde com a SCTIE — Secretaria de Ciência, Tecnologia, Inovação e Insumos Estratégicos, com a área de atenção básica, no ano passado, quando foi sugerido que formássemos um grupo de trabalho para discutir o PCDT. No final do ano passado, solicitamos a reunião, mas até o momento não obtivemos resposta. Há 3 meses, nós a solicitamos novamente. Por isso, estou muito satisfeita aqui com a presença do SCTIE, dizendo que vai se reunir conosco para discutir o PCDT.
O período da pandemia realmente foi um período difícil. Nós temos compreensão da pouca possibilidade que houve de discussão, mas queremos contar com o apoio de todos e dizer que a ABESO quer fazer parte da atualização desse protocolo.
Estamos muito contentes com a oportunidade de participar desta audiência.
Muito obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Dr. Zacharias Calil. UNIÃO - GO) - Muito obrigado, Dra. Cintia.
É muito importante saber como isso vem acontecendo. Eu atuo como médico na área de cirurgia pediátrica e recebo no meu consultório crianças obesas. O Brasil de hoje eu considero um país de obesos. O que nos chama atenção também é necessidade, como a senhora mostrou, do estímulo na escola ao consumo de alimentos mais saudáveis. Quando se vai ao supermercado, naquele corredor até o caixa, vê-se que as prateleiras são da altura da criança e estão cheias de guloseimas. Os meninos passam e veem chocolate, bala, bolacha, só alimentos gostosos. Aquilo cria uma situação ruim.
Na semana passada, eu estive na festinha do meu neto, e teve futebol de sabão. Os meninos, em sua maioria, eram magrinhos, mas havia um menino maior. Eu vi que ele estava com sobrepeso e ficava afastado dos outros. Os meninos falaram para ele: "Você é muito grande, muito pesado, vai estragar o jogo". Vemos isso ocorrer com os adultos nas aeronaves, nas filas, em todos os lugares. Realmente, isso cria um constrangimento.
Tenho assistido a uma série na televisão que se chama Quilos Mortais, que mostra pacientes que vivem nos Estados Unidos, chegam a 250 quilos ou 300 quilos e ficam acamados o tempo todo. É uma situação muito complicada tanto para eles quanto para a família. O desgaste para eles é muito grande, não conseguem tomar banho direito nem fazer higiene corporal como deveriam fazer.
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Essas são políticas que temos de trabalhar na Câmara. Nós fomos eleitos para isso, para ajudar a sociedade em geral a ter melhor qualidade de vida. Eu sei que a obesidade muitas vezes começa quando se é criança e vai aumentando, passa pela adolescência e chega à vida adulta. Vemos exames totalmente alterados de pessoas com hipertensão, diabetes, lesões na pele. Tudo isso faz parte de um contexto.
Fizemos esta audiência para identificar a necessidade da população, porque há 45 milhões de obesos no nosso País. Isso sobrecarrega todo o sistema de saúde pública, que já é ruim e ao qual eles não têm acesso, o que piora mais ainda a sua situação.
Passo a palavra agora ao Sr. Marcio Mancini pelo prazo de 10 minutos.
O SR. MARCIO MANCINI - Quero agradecer o convite e cumprimentar o Deputado Dr. Zacharias Calil e todos os presentes.
(Segue-se exibição de imagens.)
Eu sou Marcio Mancini, responsável pelo Grupo de Obesidade da disciplina de Endocrinologia e Metabologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP. Esse grupo foi fundado por uma pessoa que talvez muitos dos senhores tenham conhecido: o saudoso Prof. Alfredo Halpern. Há 30 anos, mais ou menos, eu participo desse grupo e há cerca de 10 anos sou responsável por ele. Eu vim representar o grupo a convite do Presidente da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia, o Cesar Boguszewski.
Como já foi citado, o sobrepeso e a obesidade são definidos como acúmulo de gordura anormal ou excessivo que pode prejudicar a saúde. Por isso, a associação médica americana, desde 2013, considera que a obesidade é uma doença. A ABESO e a SBEM também consideram no documento Diretrizes Brasileiras de Obesidade que a obesidade é uma doença crônica.
Falamos muito que ela acomete uma em cada quatro pessoas, mas os números do País mostram que a obesidade vem aumentando. Esses dados do VIGITEL mostram que o Brasil tem uma prevalência de obesidade de 20,3% em adultos. Eu gosto mais dos números da Pesquisa Nacional de Saúde, por quê? Porque o VIGITEL é um inquérito telefônico feito somente nas capitais, o que muitas vezes leva a uma subestimação dos números. A Pesquisa Nacional de Saúde é mais objetiva. Os indivíduos são realmente pesados, medidos, num número representativo de áreas urbanas e áreas rurais em todos os Estados da Federação.
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Este eslaide mostra — e a última Pesquisa Nacional de Saúde disponível é de 2019 — que 26,8% dos adultos brasileiros apresentam obesidade e 61,7% apresentam excesso de peso. E nós podemos esperar que esse número vai estar próximo de 30% na próxima pesquisa, porque realmente temos muito a fazer para a prevenção e para o tratamento.
Aqui os números são um pouco maiores entre as mulheres. Então, 30% das mulheres adultas apresentam obesidade, 63% apresentam excesso de peso, enquanto 22,8% dos homens apresentam obesidade e 60% apresentam excesso de peso.
Como esta é a Comissão dos Direitos da Pessoa Idosa, eu achei interessante trazer outra visão. Eu peço desculpas porque esses dados não são da última Pesquisa Nacional de Saúde, mas eles têm a mesma tendência. A obesidade está no gráfico de cima e o sobrepeso está no gráfico de baixo. Os homens estão nas colunas mais escuras e as mulheres estão nas colunas mais claras. Nós observamos que os números vão aumentando à medida que o indivíduo passa de uma faixa etária para outra, atingindo um pico por volta dos 55 anos a 64 anos, em que há um número maior de pessoas com obesidade e sobrepeso. Depois, esse número se reduz. E se reduz por que as pessoas perderam peso? Não. Reduz-se porque as pessoas morreram de doenças crônicas associadas à obesidade. Daí a importância de se tratar a obesidade e não somente as doenças associadas à obesidade. É preciso prescrever anti-hipertensivo, antidiabético, remédio para colesterol, observar a apneia do sono, que na maioria das vezes não é tratada.
As consequências da obesidade são muitas. Este é um gráfico resumido, mas se pegarmos uma tabela maior, até o risco de Alzheimer é maior em pessoas com obesidade, além de uma série de outras doenças, como complicações no parto, alteração da função psicossocial. E no hospital vemos a seguinte situação: o paciente não entra na máquina para fazer radioterapia porque tem um peso excessivo; o paciente tem um tumor de hipófise e não consegue fazer uma ressonância magnética para ver como está o tumor porque ele passa do limite de peso que a máquina suporta, que muitas vezes é de 130 quilos, 140 quilos. Então, o problema é bem mais sério do que pensamos.
E como a Cintia colocou, reduções discretas de peso de 5% a 10% melhoram a pressão, melhoram a apneia, melhoram a qualidade de vida e reduzem o risco de diabetes e de doença cardiovascular.
Baseado nisso, tanto a SBEM como a ABESO propuseram, no mês de abril — isso foi publicado nos Archives of Endocrinology and Metabolism, que é a revista da SBEM —, uma nova classificação da obesidade, que está sendo inclusive discutida no Ministério para ser adotada. É uma proposta, como a Cintia falou, cujo objetivo do tratamento não é normalizar o peso da pessoa, não é trazer um indivíduo de 100 quilos para pesar 70 quilos e perder 30 quilos, porque não é uma proposta real de tratamento. Então, do mesmo jeito que, no diabetes, falamos que o diabetes controlado é uma hemoglobina glicada menor do que 7% e o nível não diabético é de 5,7%, na obesidade, também não queremos normalizar o IMC, nós queremos reduzir o risco do indivíduo. Então, nós propomos a classificação da obesidade em obesidade reduzida ou controlada.
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Em relação ao IMC máximo da vida, nós teríamos uma obesidade reduzida de 5% a 9,9% e controlada acima de 10%. Para IMCs mais altos, teríamos propostas maiores, mas, para a maioria dos indivíduos, reduções de 10% a 15% do peso seriam satisfatórias. Então, quando vemos as opções do tratamento da obesidade, a modificação do estilo de vida, em média, leva a uma redução de mais ou menos 3% do peso.
Segundo dados britânicos — dados de 175 mil pessoas —, qual a chance de um indivíduo que tem obesidade normalizar o seu peso? Menos de 1% entre as mulheres e menos de 0,5% entre os homens. Então, espontaneamente, isso não vai acontecer com aconselhamento superficial.
E aí vemos a perda de peso com cirurgia bariátrica. Vamos falar do bypass, que é a principal das cirurgias, mais de 32%. Nós temos um grande hiato aqui, que é o da farmacoterapia junto com a modificação de estilo de vida. São pessoas que não têm um peso para fazer uma cirurgia bariátrica e que também não vão responder somente à modificação de estilo de vida. Então, existe uma lacuna para esses pacientes que não respondem somente às intervenções comportamentais e de estilo de vida e que ainda não são candidatos ou não desejam submeter-se à cirurgia bariátrica. Eles precisam ter opções adicionais de tratamento.
Então, a indicação do tratamento medicamento seria o IMC maior de 30 quilos por metro quadrado, o que representa um quarto da população brasileira, ou maior do que 25 quilos por metro quadrado, com doenças. Aí teríamos um número maior de pessoas.
Quero mostrar um único estudo aqui que foi feito com sibutramina, mas eu o acho muito ilustrativo. Trata-se de um estudo que mostra a importância da associação da mudança de estilo de vida com a medicação. E eu falo de sibutramina por quê? Porque sibutramina custa 30 reais por mês. Eu admito que semaglutida é um excelente medicamento, mas o custo é muito elevado. A sibutramina custa 30 reais por mês. Nós vemos aqui a perda de peso com medicamento isoladamente. Então, só tomar remédio não é a resposta. Vemos aqui o uso de medicamento com uma mudança breve, um aconselhamento breve de dieta e atividade física, que foi tão bom quanto somente uma mudança de estilo de vida intensiva, que é o azul. No entanto, quando juntamos a mudança intensiva com a farmacoterapia, a perda de peso foi de 12 quilos. É diferente de alguns estudos que foram incluídos, como a Cintia falou, na avaliação da CONITEC, que não eram estudos de avaliação de eficácia. Então, a obesidade é uma doença subtratada. Eu não vou repetir este eslaide, mas só quero mostrar aqui que sobrepeso e obesidade representam 60% da população, e só 1% é tratada. Diabetes representa um pouco menos que 10%, mas 86% recebem tratamento medicamentoso.
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E última mensagem: a obesidade é uma doença que precisa ser reconhecida como doença para ser menos estigmatizada. O estigma contra a obesidade e contra a pessoa com obesidade retarda ou inviabiliza o tratamento. A obesidade está associada a diversos riscos para a saúde, e a perda de peso reduz os riscos e diminui a necessidade de tratamento para outras doenças.
Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Dr. Zacharias Calil. UNIÃO - GO) - Muito obrigado, Dr. Marcio.
Eu também penso assim, mas temos de refletir que a obesidade também não está só na parte física, nós temos que ver a parte psicológica e, às vezes, psiquiátrica do paciente. Eu vejo muitos pacientes que são submetidos à cirurgia bariátrica e voltam a engordar. E muita gente fala: "A cirurgia, para mim, não serviu". Isso acontece porque, às vezes, realmente há um quadro de ansiedade ou outras patologias associadas.
Agora, esse ponto intermediário que o senhor citou é muito importante. A pessoa não é programada para a cirurgia e também não consegue emagrecer e voltar ao seu peso ideal. Acho que esse é um dos principais problemas que temos de enfrentar, mudando hábitos, tomando determinados medicamentos. A prática de exercícios é fundamental, principalmente incentivando as crianças.
Ontem mesmo, nós tivemos uma audiência pública aqui com o pessoal do Secretaria Especial do Esporte. Eu até questionei: "Escuta, na época em que eu era estudante, na escola pública, nós tínhamos educação física". Hoje, não há mais educação física nas escolas, principalmente nas escolas públicas. Muitos professores de educação física hoje estão desempregados e sem ter como trabalhar nessa atividade, que é tão importante para a criança e mesmo para o adulto. Ter uma atividade física do esporte ajuda muito, nós sabemos disso.
O SR. MARCIO MANCINI - Deputado Dr. Zacharias, V.Exa. me permite uma última colocação, que eu me esqueci de falar?
O SR. PRESIDENTE (Dr. Zacharias Calil. UNIÃO - GO) - Sim, fique à vontade.
O SR. MARCIO MANCINI - Em relação à indicação de cirurgia bariátrica — e tenho certeza de que o meu colega Antonio Carlos Valezi vai concordar —, para indicar uma cirurgia bariátrica, o indivíduo tem que ter sido submetido a um tratamento clínico e não ter tido sucesso nesse tratamento. Só que o SUS não oferece esse tratamento. O SUS oferece um tratamento com orientações de dieta e atividade física, que, como mostramos, não é eficaz. Então, a maioria dos pacientes submetidos a tratamento com cirurgia bariátrica, pelo menos no SUS, não foram submetidos a um tratamento clínico de fato. Eles foram submetidos a um pseudotratamento.
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O SR. PRESIDENTE (Dr. Zacharias Calil. UNIÃO - GO) - Isso é verdade. Eu acompanhei isso nos hospitais públicos, já vi isso acontecer. Já ouvi paciente reclamar demais de que não tem acesso a esse tipo de tratamento.
Às vezes, a pessoa consegue uma consulta pelo SUS, chega lá e acha que vai ser operada, mas ela não entra no programa enquanto não fizer um tratamento prévio e conseguir baixar seus níveis nos exames e o peso. Mas como ela vai fazer isso se é uma paciente com baixas condições socioeconômicas, que tem grande dificuldade para fazer isso aconteça?
Concedo a palavra agora ao Sr. Luis Fernando Villaça Meyer, que terá 10 minutos para falar.
O SR. LUIS FERNANDO VILLAÇA MEYER - Obrigado.
Eu queria cumprimentar as Comissões e o Deputado Dr. Zacharias Calil.
Obrigado pela oportunidade de falar nesta audiência.
Vou compartilhar a minha tela.
(Segue-se exibição de imagens.)
Primeiro, farei uma apresentação rápida do Instituto Cordial. Ele é um centro de articulação e pesquisa independente que trabalha com ciência de dados, inteligência territorial e articulação intersetorial para fortalecer redes e basear tomadas de decisão públicas e privadas em dados e evidências. Então, trabalhamos com questões complexas que precisam de articulação entre vários atores públicos e privados e trabalhamos com base em conhecimento, com base em evidências, para que consigamos enfrentar esses desafios. A obesidade é um desses grandes desafios. Trabalhamos no Painel Brasileiro da Obesidade, uma iniciativa que tem o objetivo específico de lidar com a multifatoriedade e com a complexidade da obesidade.
É muito bacana ouvir os colegas de Mesa falarem das várias perspectivas e abordagens que precisamos compor para enfrentar esse desafio.
Estamos trabalhando com os nossos parceiros estratégicos e com outras organizações nessa busca pelas várias perspectivas, para identificar essas várias perspectivas, conseguir integrar protocolos e lidar com protocolos mais efetivos, eficazes, para enfrentar esse desafio.
Vou reforçar alguns números que os colegas já apresentaram.
Temos no mundo uma epidemia de obesidade — a obesidade foi considerada pela OMS uma epidemia —, que vem aumentando. Sessenta por cento da população brasileira adulta acima do peso. Como o Deputado reforçou algumas vezes, três crianças de cada grupo de 10 crianças estão acima do peso no Brasil. A obesidade aumentou em 72% de 2006 a 2020, o que também já foi mencionado. Ela é um fator de risco de diversas outras doenças. Então, temos um desafio de saúde gigantesco e um desafio econômico também. Podemos ver que há impacto econômico da obesidade no serviço de saúde. Na relação com outras doenças, ela também vem gerando pressões nos serviços de saúde, pressões muito significativas.
Sendo esse desafio complexo e precisando ser trabalhado de forma articulada, temos uma questão multifatorial. Se nós não lidarmos com essa multifatoriedade, não conseguiremos enfrentar de forma completa esse desafio. Vimos fazendo no Painel Brasileiro da Obesidade o mapeamento das várias perspectivas das várias organizações que lidam com a obesidade e identificamos uma série de núcleos, uma série de organizações, núcleos de organizações que olham a obesidade por várias perspectivas, complementares e diferentes, desde agências internacionais até associações médicas, farmacêuticas, governo, indústria de alimentos, mídias, movimentos de valorização do corpo, saúde suplementar, sociedade civil organizada e a universidade, com os especialistas da academia. Uma série de organizações olha para esse desafio, o desafio da obesidade, por perspectivas diferentes.
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Organizando as perspectivas, é importante mencionar que a pandemia de COVID-19 levou essa questão para outros espaços de discussão, especialmente para ambientes de processo saúde-doença, apresentou a relação da obesidade com essa questão de saúde, mas também a perspectiva econômica, a perspectiva da fase do curso da vida — a obesidade infantil e também o envelhecimento relacionado com a obesidade, como estamos debatendo aqui na Comissão —, a perspectiva da formação dos profissionais em saúde, que também foi mencionada, a questão da genética, que também foi mencionada, a questão social e comportamental, que engloba desde o estigma que a obesidade ainda tem na sociedade até movimentos ligados à valorização do corpo e transtornos alimentares. Todo esse arcabouço de perspectivas forma um quadro complexo de alinhar, para sabermos como vamos lidar com esse desafio.
Nós sabemos que a obesidade é uma doença. Ela foi reconhecida como doença pela OMS há décadas já. Foi mencionado também o tanto que isso vem sendo reforçado nos últimos anos — bons anos já. Ela gera uma série de impactos no corpo — eu não vou reforçar o que já foi dito pelos colegas. Ela foi reconhecida como epidemia global pela OMS, mas ainda há na sociedade uma forma de entender a obesidade, como foi colocado, não como uma doença, mas como uma questão de comportamento da pessoa. Nós sabemos que essa forma estigmatizada de ver a obesidade por quem devia fazer parte do cuidado dela faz com que não consigamos enfrentar esse desafio. Então, nós temos que dar um enfoque ao cuidado das pessoas e à necessária redução do estigma da obesidade, a "gordofobia", especialmente nos serviços de saúde, onde ela devia ser mais acolhida e cuidada. As pessoas com obesidade deveriam ser mais cuidadas. O serviço de saúde tem que dar atenção à linguagem no momento desse acolhimento, até o tratamento cirúrgico ou o tratamento farmacológico e outras recomendações que forem consideradas.
Não somos só nós que integramos esta Mesa que falamos nisso. A Organização Mundial da Saúde, na Assembleia Mundial da Saúde que aconteceu 1 mês atrás, aprovou as recomendações para prevenção e manejo da obesidade ao longo da vida. Alguns pontos muito importantes, que vamos apresentar aqui, reforçam a ideia de que essa linha de cuidado, esses protocolos precisam ser integrados e considerar as várias faces do enfrentamento da doença, inclusive a farmacológica etc.
Primeiro, é importante a abordagem governamental global — os governos precisam abordar isso de forma integrada. Outra recomendação: a abordagem do curso de vida, desde a obesidade infantil até a obesidade na vida adulta e no envelhecimento. Os esforços têm que ser preventivos. Nós precisamos promover o cuidado no tratamento ao longo da vida, quando a pessoa já tem obesidade. Outra recomendação: os serviços de saúde precisam proporcionar o continuum de cuidado, o cuidado permanente nos serviços, tais como promoção de saúde, prevenção de doenças, diagnóstico, manejo, tratamento e reabilitação. Pontuarei dois itens que estão nas recomendações da OMS. São eles:
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20. Proporcionar um continuum de cuidado por meio da implementação da promoção da saúde, prevenção de doenças, diagnóstico, tratamento e manejo da obesidade, como componentes da Cobertura Universal de Saúde. (...)
24. Assegurar que os serviços de manejo de peso sejam oferecidos de forma equitativa (...).
Então, nós estamos falando sobre acesso, conforme foi colocado. Precisamos fazer com que a população tenha acesso a esses tratamentos.
O Painel Brasileiro da Obesidade fez o levantamento das principais linhas de cuidado. Trata-se de um comparativo dose manuais instrutivos no cuidado da pessoa com obesidade das principais referências no Brasil. Vimos que não existe alinhamento, uniformidade nos vários eixos de como lidar com obesidade: equipe multiprofissional não aparece em todos as recomendações; promoção de estilo de vida saudável, uma das questões mais rotineiramente atribuídas, muito importante, evidentemente, é muitas vezes tomada como a forma que precisa ser considerada para tratamento da obesidade, e nós sabemos que ela não esgota esse tratamento; abordagens comportamentais; práticas integrativas complementares aparecem no protocolo do Ministério da Saúde; tratamento farmacológico não aparece em todos os manuais instrutivos; e o tratamento cirúrgico aparece na maior parte deles.
Então, eu queria reforçar, com esse eslaide, que esse continuum que é colocado pela OMS não aparece ainda no Brasil na forma como nós lidamos com a obesidade. Quando nós formos pensar nesses protocolos — e é muito bacana ver a abertura para a revisão e a discussão desses protocolos —, é preciso fazer com que eles considerem esse continuum. As linhas de cuidado não dialogam, as recomendações não dialogam. Nós precisamos ampliar o diálogo entre as recomendações nas linhas de cuidado. Nos eixos, o que aparece em todos os manuais é só a promoção de estilo de vida saudável e o tratamento cirúrgico. Precisamos integrar isso com outros eixos e outras formas de tratamento. O profissional de saúde pode seguir qualquer uma dessas recomendações. Então, isso gera uma certa cacofonia em alguns ambientes de cuidado da pessoa com obesidade, e não é por falta de competência das várias qualidades e das várias recomendações. É preciso dar um passo além, para integrar essas várias formas de cuidado numa linha de cuidado em que essas várias abordagens se complementem.
Vou deixar uma mensagem final, a de que esta não é só uma questão de prevenção ou tratamento, é uma questão de cuidado. Nós precisamos cuidar da pessoa com obesidade e precisamos que essa linha de cuidados seja abrangente e integre todos esses eixos. Precisamos também de um consenso social sobre qual é a linha de cuidado que os profissionais da saúde devem seguir, para que essa linha de cuidado abrangente e coerente seja capaz de fato de integrar o cuidado desde a saúde primária até a terciária, de garantir qualidade de vida às pessoas e de enfrentar o desafio da obesidade.
Eu queria deixar os meus contatos e o endereço do site do Painel Brasileiro da Obesidade, onde esses estudos que nós vimos fazendo também estão disponíveis para quem quiser revê-los.
Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Dr. Zacharias Calil. UNIÃO - GO) - Muito obrigado.
Realmente, a obesidade é uma doença muito complexa. Pelo que o senhor apresentou, ela é uma doença sistêmica, que envolve todo o organismo. A equipe multidisciplinar realmente tem que atuar.
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É importante que o Governo tome providências em relação a isso, para darmos continuidade e melhorarmos os procedimentos nas unidades de saúde. Acho que nem todas as unidades de saúde do Brasil estão preparadas para o atendimento desses pacientes.
Eu me lembro de quando começou a surgir a cirurgia bariátrica. Foi uma loucura. Cirurgia por videolaparoscopia demorava de 8 a 12 horas. Depois o pessoal fez a curva de aprendizado, e hoje uma cirurgia como essa — e vejo o pessoal operar lá no hospital em que eu trabalho — dura em média 4 horas, com toda a programação e os clamps novos e atualizados, sobre os quais o doutor vai falar. Temos que dar continuidade a isso.
Não adianta só operar, porque o paciente vai achar que ficou livre — e alguns continuam ganhando peso. Por isso, a equipe multidisciplinar é muito importante.
Concedo a palavra agora ao Sr. Antonio Carlos Valezi, que terá o prazo de 10 minutos para falar.
O SR. ANTONIO CARLOS VALEZI - Muito boa tarde.
Sou o Antonio Carlos Valezi, Vice-Presidente da Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica, Presidente eleito para o biênio 2023/2024 e responsável pelo ambulatório de tratamento cirúrgico da obesidade na Universidade Estadual de Londrina.
Eu saúdo o Deputado Dr. Zacharias Calil e, na sua pessoa, saúdo todos os presentes a esta sessão. Aliás, agradeço imensamente o convite para participar desta audiência com todos vocês.
Eu preparei um material, mas vou poupá-los da apresentação porque muitos dados serão repetitivos e também porque não quero tomar muito tempo dos senhores.
Quero salientar duas condições apresentadas nesta sessão. A primeira delas é que realmente nós temos a obrigação de passar para o nosso público que a obesidade não é um problema de autocuidado, mas sim uma doença, uma doença de caráter neuroendócrino, e que seu tratamento — este é o segundo ponto que eu gostaria de mencionar, de enfatizar — é transdisciplinar. Há necessidade de uma multidisciplinaridade, para que obtenhamos resultados efetivos.
Como faço parte de uma sociedade cirúrgica, vou apresentar alguns números da parte cirúrgica, já que, como foi mostrado, a obesidade tem caráter epidêmico e está grassando em níveis alarmantes na sociedade toda, tanto nos pacientes idosos quanto, sobretudo de uma maneira mais preocupante, na nossa juventude.
São elegíveis para a cirurgia bariátrica no nosso País mais de 5 milhões e meio de pacientes, sendo que 70% desses pacientes, ou seja, mais de 4 milhões deles, estão no Sistema Único de Saúde. Não conseguimos dar vazão a toda essa demanda. Nós operamos, por incrível que pareça, 0,3% dos pacientes com indicação cirúrgica.
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Mas eu quero fazer um aparte aqui. A indicação cirúrgica existe, sim, para uma série de pacientes, seja por obesidade, seja por diabetes, mas, na verdade, muitos desses pacientes, se tiverem acesso ao tratamento clínico, poderão evitar o tratamento cirúrgico. O tratamento cirúrgico é uma boa ferramenta, mas não é a garantia total para esses pacientes. Nós estamos aqui para ajudar o paciente. Na nossa visão, se for submetido a tratamento clínico prévio, o paciente poderá evitar a cirurgia ou, eventualmente, se for para cirurgia, irá em condições muito mais benéficas para ele, com suas comorbidades melhoradas.
Então, a Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica apoia toda iniciativa, como esta, de oferecer um tratamento clínico para esses pacientes. Nós apoiamos a Coalizão Vozes do Advocacy em Diabetes e Obesidade, na pessoa da Vanessa Pirolo, apoiamos a ABESO, na pessoa da Cintia Cercato, e apoiamos a SBEM, na pessoa do Marcio. O que nós queremos é o paciente obeso tratado e que seja melhorada a sua qualidade de vida.
Era o que eu tinha para dizer.
Agradeço a oportunidade. Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Dr. Zacharias Calil. UNIÃO - GO) - Muito obrigado.
A SRA. EDIANE DE ASSIS - Com licença, Deputado. Desculpe-me por interromper.
O SR. PRESIDENTE (Dr. Zacharias Calil. UNIÃO - GO) - Pois não.
A SRA. EDIANE DE ASSIS - Vou precisar me retirar por causa de outra agenda que surgiu, urgente.
Quero mais uma vez agradecer pela oportunidade e dizer que tomamos nota de todos os encaminhamentos. Vou preparar um material e encaminhá-lo para o Ministro. Eu gostaria de solicitar que as apresentações sejam disponibilizadas, para serem agregadas a esse material.
Permaneço à disposição para os desdobramentos necessários.
O coordenador Rafael vai continuar acompanhando a reunião e tomará nota dos encaminhamentos, para depois me passar.
Agradeço a todos e lhes desejo uma ótima audiência. Obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Dr. Zacharias Calil. UNIÃO - GO) - Não há problema. Muito obrigado.
Foi importante a fala do Dr. Valezi sobre o tratamento clínico dos obesos. Com isso diminuímos muito os custos, inclusive de cirurgias. Acho que é importantíssimo levar essa sugestão. Os hospitais da rede pública, os hospitais gerais, devem oferecer no ambulatório atendimento exclusivo para esses pacientes. Eu sei que isso já existe em vários locais, mas podemos melhorar essa condição.
Passo a palavra agora à Elisabete Laurindo de Souza, que terá 10 minutos para falar.
A SRA. ELISABETE LAURINDO DE SOUZA - Boa tarde a todos.
É um prazer bastante grande participar desta reunião. Obrigada por terem convidado o Conselho Federal de Educação Física para esta audiência. A atividade física está sempre em tela, sempre é citada como um dos fatores importantes para a preservação da saúde, mas é a primeira vez que um grupo tão seleto, em sua maioria médicos, convida-nos para participar de um evento como este e para debater um pouquinho sobre isso.
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Agradeço a oportunidade, em nome do nosso Presidente do Conselho Federal, Prof. Dr. Claudio Augusto Boschi, que me delegou essa tarefa, que eu julgo ser muito importante.
(Segue-se exibição de imagens.)
Eu sou da área de educação física escolar, que é a base, o princípio do comportamento de vida ativa. Isso é desenvolvido lá na escola. Eu sou Secretária Executiva do Conselho Federal, membro da diretoria, portanto. Sou professora de educação física, estou há 37 anos na escola. Nunca larguei a escola porque esse é o meu hábitat natural, do qual eu gosto muito. Sou professora na universidade, palestrante, mestre em gestão de políticas públicas, porque eu sempre fui muito preocupada com as políticas públicas. Eu acho que a maioria da população depende das políticas públicas. E as políticas públicas precisam ser bem pensadas e integradas, para que as pessoas possam usufruir dos benefícios.
Também fui candidata a Vereadora, sou suplente de Vereador. Todos os anos eu assumo o mandato por 1 mês, porque fiquei como suplente. Durante o ano passado, quando assumi o cargo, consegui aprovar, em 1 mês, a lei que cria a obrigatoriedade da atividade física e do exercício físico durante o período de pandemia. Entendemos que, durante o período da pandemia que vivenciamos há pouco tempo, algumas pessoas que eram muito acostumadas a fazer atividade física ficaram doentes. Alguns espaços não precisariam ter sido fechados. Por isso, lutamos e conseguimos alterar isso em alguns Estados e Municípios.
O foco hoje é, de fato, a obesidade. Vocês já apresentaram várias pesquisas. Eu trouxe algumas pesquisas apresentadas na justificativa desse encaminhamento. E quero dizer que fizemos, aqui na nossa cidade — só como um exemplo prático do que é a integração das políticas públicas —, uma pesquisa com as nossas crianças da rede municipal, de 3 a 5 anos. Na verdade, fizemos com crianças de todas as idades, mas a da faixa etária de 3 a 5 anos virou uma pesquisa que inclusive foi publicada em revista internacional.
As nossas crianças de 0 a 5 anos estão com 35% de sobrepeso e obesidade. Aqui na nossa cidade, isso é um fato real. Nós entrevistamos mais de 10 mil crianças e medimos todas elas. Eu pude conduzir a pesquisa encaminhada pela universidade, porque era professora lá, coordenava o curso. E nós, como equipe de professores e acadêmicos, procedemos a essa pesquisa então nas 40 e poucas escolas aqui da cidade.
O resultado dessa pesquisa é alarmante, porque as crianças de 3 a 5 anos já estão obesas e com sobrepeso. Daí vocês imaginem essas crianças com 5 anos a mais. As pesquisas que não foram publicadas, mas que fizemos, demonstravam que os dados de obesidade e sobrepeso das crianças do ensino fundamental, de 7 a 14 anos, eram muito maiores. Então, a tendência é que, de fato, a população fique mais obesa, com um peso acima do ideal. E esse fato foi muito agravado durante o período de pandemia.
Várias pesquisas foram desenvolvidas ao longo desse período da pandemia. A partir delas, constatamos que, de fato — como podemos ver nas pesquisas apresentadas por vários palestrantes aqui —, esse número tem aumentado muito.
Eu trago aqui um questionamento mais para que nós, que somos os stakeholders das políticas públicas e das decisões e tal, pudéssemos pensar. Por que as pessoas obesas não conseguem? Obviamente há vários fatores clínicos, alimentação, atividade física, auxílio psicológico e os medicamentos que estão agregados. Já foi falado aqui bastante sobre as possibilidades, mas eu quero trazer a questão de como nós vamos fazer isso chegar à população. Como a população vai saber o que é uma alimentação saudável, saber qual é atividade física adequada para ela? Como a população vai ter esse auxílio psicológico? O auxílio psicológico é muito difícil para demanda tão grande de pessoas.
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Não conseguimos atender um número tão grande de pessoas, tendo em vista que só na educação, por exemplo, 85% da população de crianças, adolescentes e jovens estão nas escolas públicas, e somente 15% estão nas escolas particulares. Então, como é que nós, no Município, nos Estados do Brasil inteiro, com diferença tão grande de regiões e de características, vamos conseguir alcançar as pessoas?
Esboçamos aqui, junto com esse projeto, o envolvimento do Programa Saúde nas Escolas, que é desenvolvido pelo Ministério da Educação e pelo Ministério da Saúde. Nós conseguimos integrar, então, a Secretaria de Saúde, os médicos, e a Secretaria de Educação, com os professores de educação física, fazendo uma nova engrenagem, para que pudéssemos inserir nas crianças o hábito da prática da atividade física e da alimentação saudável. Houve várias barreiras, desde o que os pais das crianças acreditam e o que de fato é bom — mas que eles não sabem que é bom — e como fazer a criança sair das telas, passar a maior parte do seu tempo fora das telas. Sabemos que o celular hoje na mão das crianças faz com que eles fiquem mais tempo parados, mais tempo na frente das telas. E isso, para nós, é um dos principais fatores de dificuldade. É uma dificuldade muito grande.
O Deputado Dr. Zacharias vai lembrar que lutamos recentemente pela manutenção da educação física na escola. O nosso projeto de lei foi aprovado agora no mês julho para manter os profissionais de educação física sob a tutela do Conselho Federal de Educação Física. Por quê? Porque queremos que os nossos professores deem aulas de qualidade, que essa aula de educação física tenha intencionalidade, que os professores saibam o que estão fazendo. Por isso lutamos tanto pela qualidade nas aulas de educação física e por todas as exigências de capacitação dos nossos professores.
O Deputado Dr. Zacharias falou há pouco que as escolas têm diminuído o número de aulas de educação física. Eu quero dizer para vocês também que para muitas dessas crianças, para 85% delas, a escola é o único ambiente em que ela poderá fazer atividade física de qualidade, com intencionalidade.
Aqui eu quero trazer só os dados da prática de exercícios físicos, das justificativas que as pessoas precisam ter para fazer atividade física, que aumenta a aptidão cardiorrespiratória, a força, a flexibilidade, no caso dos idosos, e a coordenação motora fina, no caso das crianças. As crianças não se mexem mais, portanto não conseguem mais nem andar direito, e esse comportamento sedentário tem tomado conta das pessoas.
Então, o que significa quebrar as barreiras? É fazer com que as pessoas possam ficar menos horas deitadas, sentadas ou deitadas, ou dormindo, enfim. É buscar mecanismos para reduzir esse comportamento sedentário, não só nas crianças, em todas as pessoas. Nós sabemos que as crianças levam para casa algumas experiências bem-sucedidas da escola e fazem com que os pais as pratiquem. Então, se os pais fazem atividade física, os filhos também fazem. O contrário também tem sido verdadeiro: se os filhos criam esse hábito, eles também levam os pais a irem ao parque, a fazerem outras atividades. E esse conjunto de família e escola, que o Luis Fernando citou, que é essa coordenação das instituições profissionais, gestoras, familiares, da sociedade, precisa acontecer para que nós tenhamos resultado.
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Eu trouxe aqui, só como referência, o Guia de Atividade Física para a População Brasileira, que o Ministério da Saúde publicou em 2021, ou seja, no ano passado, que é um documento novo, bem acessível, que nós devemos divulgar e fazer com que ele chegue às pessoas.
Há também o Manifesto Internacional para a Promoção da Atividade Física no pós-COVID: Urgência de uma Chamada para a Ação, que vai servir para a nossa vida inteira. Ele convoca as pessoas, os cidadãos, os governantes, os dirigentes, a fazerem uma divulgação em favor da vida mais ativa e mais saudável, com isso diminuindo o comportamento sedentário.
Eu quero chamar a atenção para as duas questões que eles trazem nesse manifesto: as políticas públicas por meio de programas e projetos, e as ações concretas e articuladas. Nós vimos na apresentação do Luis Fernando o quanto precisamos integrar as nossas ações como política pública, como pessoas que fazem parte desse desenvolvimento das políticas públicas; o quanto elas precisam ainda se integrar; e o quanto elas precisam chegar à base. O Plano de Ação Global em Atividade Física 2018-2030, lançado pela Organização Mundial da Saúde, é muito interessante também.
Então, nós temos os documentos, temos as ideias, temos o que fazer, mas temos que pensar o como fazer para conseguirmos alcançar a população. Uma das ações é o aumento dos estímulos e das oportunidades para o exercício no contexto da escola, que sempre aparecem, porque, quando a criança aprende a praticar atividade física, ela toma gosto e leva isso para sua adolescência e para a sua vida adulta, como uma coisa que já está incorporada. Outra ação é apoiar os grupos com essas manifestações.
Nós temos exemplos de quando fizemos nosso plano integrado no Município. Nós utilizamos todas as praças que estavam desocupadas como espaços que fossem propícios à prática de atividade física, como academias ao ar livre, organizadas e monitoradas por professores de educação física; projetos de academia para a terceira idade, do Ministério da Saúde, aos quais nós também fizemos adesão. Portanto, as quadras que foram feitas e os espaços públicos que foram organizados permitiram que muitas pessoas saíssem de casa e fossem praticar alguma atividade física. Isso já beneficiou muita gente, porque as crianças querem ir para as praças.
Nós também fizemos uma campanha, no início do ano, que eu gostaria de mostrar para vocês, que foi Educação Física Escolar: Nenhuma Aula a Menos, por causa da diminuição das aulas de educação física na educação básica. Nós fizemos essa campanha no Conselho. Tivemos mais de 123 mil pessoas impactadas com essa divulgação, com essa propaganda que acabamos fazendo nas mídias. E fizemos o Abril Verde: Mês de Combate ao Sedentarismo. Então, foi o mês de abril inteirinho falando sobre o sedentarismo, sobre as consequências de as pessoas ficarem paradas e o quanto isso pode afetar as estruturas cerebrais de uma criança ou de um adulto, porque vai torná-los obesos.
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Fizemos uma campanha bastante interessante, já aumentando o número de pessoas impactadas. Eu penso que as mídias são ferramentas maravilhosas para divulgar o nosso trabalho. Eu sempre digo lá no Conselho Federal de Educação Física que não podemos falar a mesma coisa para nós mesmos, essa informação precisa sair do nosso reduto.
Nós tivemos, com essas mídias, 153 mil curtidas, mais de 90 mil seguidores, ou seja, as mídias também são ferramentas importantes para que possamos divulgar o nosso trabalho e fazer com que isso chegue à população.
Poderia falar bastante sobre isso tudo, mas o nosso tempo é curto. Eu quero agradecer a oportunidade e dizer que o Conselho Federal de Educação Física está disposto a integrar essa equipe multidisciplinar, essas pessoas que falam sobre qualidade de vida e atividade física, colocando-se, mais uma vez, à disposição de todos vocês para isso.
Muito obrigada pela oportunidade.
O SR. PRESIDENTE (Dr. Zacharias Calil. UNIÃO - GO) - Muito obrigado.
Eu também vejo a atividade física como importante e sou um exemplo disso. Agora, como Deputado, já diminuí muito minha atividade física, mas pratico esporte desde criança, natação principalmente. Ontem mesmo, estava conversando com o Deputado Luiz Lima, que é medalhista olímpico e está muito ativo no Ministério da Cidadania, que envolve o esporte.
Há poucos dias, eu fiz um teste da importância que é a queima de glicose durante a atividade física. Eu, por exemplo, nado uma média de 2.500 metros a 3.000 metros, só não nado todos os dias porque tenho que estar aqui na Câmara. Mas eu medi a minha glicemia pós-prandial. Tomei café da manhã, por exemplo, às 7h30min, e às 9h30min eu a medi, no aparelhinho, e ela estava 148. Entrei na piscina e nadei de 2.000 a 3.000 metros. Quando eu saí da piscina, minha glicemia estava 73.
A SRA. ELISABETE LAURINDO DE SOUZA - Nossa, que diferença!
O SR. PRESIDENTE (Dr. Zacharias Calil. UNIÃO - GO) - E uma coisa impressionante o tanto que a produção de insulina, ou alguma outra substância diminui com a queima da glicose por meio da musculatura. Então o esporte é fundamental. É uma pena que hoje nas escolas, principalmente nas públicas, não haja atividade física. Na minha época havia jogos, competições com outras escolas públicas, campeonatos, etc.
Eu conheço Brasília há muitos anos, fiz residência médica aqui no Hospital de Base de 1981 a 1985. Brasília é um exemplo clássico, só não pratica esporte quem não quer. Em todas as entrequadras há uma quadra de esporte; há o Parque da Cidade, que é maravilhoso; há o DEFER, o parque aquático — eu nadei lá por muitos anos —, que tem uma piscina olímpica de 50 metros por 25 metros. Em 1981, para se ter ideia, aquela piscina já era aquecida. Tem também uma piscina de saltos. Brasília foi projetada pensando nessas atividades físicas. A qualquer local que você for, você poderá fazer uma caminhada de manhã ou ver muita gente praticando esporte.
O Governo tem que estimular isso. É importante a sociedade, a população em geral, ter estímulo para isso.
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Não é saudosismo, não, mas, quando eu era estudante — sou aluno da escola pública —, nós tínhamos como matéria obrigatória a educação física. Você tinha que ter presença, senão era reprovado, não passava de ano. Se você não quisesse fazer educação física, poderia fazer outra atividade, como participar da banda marcial, uma série de coisas. Ao longo dos anos, isso vem acabando. Mas, segundo o Ministro, eles estão reestruturando para que isso volte a acontecer no Brasil, para tirar principalmente as crianças da rua, porque o jovem precisa ter a informação de que, ao praticar esporte, vai ter maior oxigenação cerebral, maior controle emocional, mais sinapses cerebrais, maior raciocínio rápido, liberação de endorfinas que dão a sensação de prazer, perda de peso e, claro, sempre estará disputando, além de se estimular a participação em campeonatos nacionais e internacionais.
Há mais alguém que queira falar?
A SRA. ELISABETE LAURINDO DE SOUZA - Eu queria um aparte para fazer uma observação da qual me esqueci de fazer.
O SR. PRESIDENTE (Dr. Zacharias Calil. UNIÃO - GO) - Pois não.
A SRA. ELISABETE LAURINDO DE SOUZA - Nós iniciamos uma parceria com a ABESO, na figura do Prof. Marcos Pontes, que é a campanha Escola em Movimento, que busca evidenciar que esse estilo de vida se aprende na escola. E assim é de fato, como o senhor mesmo concluiu com o seu exemplo.
Mas essa Escola em Movimento é muito legal para se retomar uma campanha nacional, porque é importante demais que as crianças aprendam a se movimentar, sobretudo nesse período em que elas estão muito ligadas ao celular, muito ligadas às telas, aos computadores. Elas precisam ir para a rua, precisam se mexer, praticar alguma atividade física.
O SR. PRESIDENTE (Dr. Zacharias Calil. UNIÃO - GO) - Exatamente.
Ontem até comentei: às vezes se descobre um talento na rua. Há uma ginasta olímpica fazendo malabarismo na rua, passa alguém, aquilo chama sua atenção, e ele diz: "Ôpa, essa menina tem talento e pode ser campeã". Como foi. Nós precisamos ter isso na escola.
O SR. MARCIO MANCINI - Deputado...
O SR. PRESIDENTE (Dr. Zacharias Calil. UNIÃO - GO) - Pois não.
O SR. MARCIO MANCINI - Sem querer interrompê-lo, posso fazer uma última consideração em relação aos comentários da Profa. Elisabete?
Ocorreu-me aqui algo. Não conheço bem Brasília, não sabia dessa estrutura toda de atividade física. Isso é muito importante para a prevenção. Mas, para mostrar como a obesidade é multifatorial e precisa muito mais do que isso, o VIGITEL não mostra que Brasília tem menos obesidade do que outras capitais que não têm essa estrutura e essa disponibilidade de lugares para atividade física. Então, a atividade física é importante, nas escolas sem dúvida, mas vai além disso.
Eu queria comentar, Elisabete, algo que vi em uma das suas telas, o porquê de as pessoas obesas não conseguirem. Faz um tempinho, eu dei uma entrevista para a Band News, e uma dupla, agora eu não me lembro dos nomes, acho que uma é Renata Veneri, e a outra é jornalista ou educadora física, fala sobre atividade física. E eu disse a elas: "Olha, você acha que os magros são exemplos de pessoas que comem bem e são ativas fisicamente, e as pessoas com obesidade comem mal e são sedentárias?" Não. Isso acaba sendo um pouco de estigmatização, porque existe muito magro sedentário que come mal, e ele não é julgado quando está no McDonald's comendo um Big Mac com batata frita. Mas, para o gordinho do lado dele com o mesmo lanche eles falam: "Olha, está vendo? Por isso é que ele é gordinho".
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RF
Existe muito magro que não faz nenhuma atividade. É daí que vem aquilo que a Cintia colocou: a biologia. Quer dizer, no mesmo ambiente, há pessoas que ganham muito peso; pessoas que não ganham peso nenhum; aqueles magros constitucionais, que comem 3.500 calorias por dia e pesam entre 49 quilos e 50 quilos — eles são protegidos biologicamente.
Então, nós temos que pensar bem, porque, às vezes, sem querer, acabamos estigmatizando a pessoa com obesidade.
Obrigado, Deputado.
Era isso.
O SR. PRESIDENTE (Dr. Zacharias Calil. UNIÃO - GO) - Muito obrigado.
Essas são contribuições importantes nas quais nós temos que pensar muito bem.
Chegamos ao fim das exposições; tivemos o debate durante as exposições; terminamos o debate; e franqueamos a palavra aos convidados.
Agradeço a presença de todos que nos honraram com suas exposições e esclarecimentos e a presença de todos os demais a esta audiência.
Nada mais havendo a tratar, vou encerrar os trabalhos, antes, porém, convoco Reunião Deliberativa Extraordinária para quarta-feira, dia 13 de julho de 2022, no Plenário 12, às 13 horas, com pauta a ser divulgada oportunamente.
Declaro encerrada a presente reunião.
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