4ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA 56 ª LEGISLATURA
Grupo de Trabalho (GTSISGOV) destinado a analisar e debater temas relacionados ao sistema de governo semipresidencialista
(Audiência Pública e Deliberação Extraordinária (semipresencial))
Em 27 de Abril de 2022 (Quarta-Feira)
às 14 horas
Horário (Texto com redação final.)
14:06
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O SR. PRESIDENTE (Samuel Moreira. PSDB - SP) - Declaro aberta a 5ª reunião do Grupo de Trabalho destinado a analisar e debater temas relacionados ao sistema de governo semipresidencialista.
Encontra-se à disposição dos Srs. Deputados a ata da 4ª reunião, realizada no dia 13 de abril de 2022. Fica dispensada a sua leitura, nos termos do Ato da Mesa nº 123, de 2020.
Não havendo quem queira retificá-la, coloco em votação a ata.
Os Deputados que a aprovam permaneçam como se encontram. (Pausa.)
Aprovada.
A Ordem do Dia de hoje prevê a realização de audiência pública, em atendimento ao Requerimento nº 1, de minha autoria e da Deputada Margarete Coelho, e aos Requerimentos nºs 16 e 17, com o objetivo de debater o tema Sistema de governo semipresidencialista, e a deliberação de requerimentos.
Informo que participarão desta audiência pública os seguintes palestrantes: a Dra. Lara Mesquita, pesquisadora do Centro de Política e Economia do Setor Público da Fundação Getulio Vargas, que se encontra presente aqui conosco no plenário; o Dr. Nelson Juliano Cardoso Matos, professor da Universidade Federal do Piauí, por videoconferência; e também a Dra. Marina Costa Lobo, investigadora principal do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa.
Esclareço aos Srs. Parlamentares, aos senhores membros do Conselho Consultivo e aos senhores expositores que a reunião está sendo gravada e transmitida ao vivo pela Internet. Todo o conteúdo permanecerá disponível na página do Grupo de Trabalho por tempo indeterminado e poderá ser utilizado pelos serviços de comunicação da Câmara Federal, na sua íntegra ou em parte, para a produção de reportagens, documentários e afins.
Para o bom andamento dos trabalhos, cada expositor terá até 15 minutos, prorrogáveis, evidentemente a juízo deste Coordenador, não podendo ser aparteado. Após todas as exposições, abrirei a palavra aos Parlamentares e aos membros do Conselho Consultivo por até 3 minutos, seguindo a ordem dos inscritos, intercalando-se a fala entre Deputados e membros do Conselho.
Os Deputados poderão se inscrever pelo aplicativo Infoleg. Os membros do Conselho Consultivo poderão se inscrever em lista disponível na Secretaria, se presentes no plenário, ou pelo chat da plataforma Zoom, se presentes virtualmente. Será facultada a manifestação de representantes de entidades da sociedade civil organizada em todas as audiências, desde que a solicitação seja encaminhada ao e-mail do colegiado: gt.semipresidencialista@câmara.leg.br, com antecedência de pelo menos 2 horas do horário marcado para a reunião. A manifestação pela plataforma Zoom será limitada a três entidades por audiência, pelo prazo de até 2 minutos.
Informo ainda que a presente audiência pública é interativa pela plataforma e-Democracia, disponível no sítio da Câmara dos Deputados. Assim, qualquer cidadão cadastrado poderá dirigir perguntas ou sugestões aos expositores e a este colegiado, que poderão ser selecionadas para serem lidas ao vivo ou respondidas posteriormente. Ao final, os expositores poderão responder ou comentar as interpelações.
Feitos esses esclarecimentos, vamos dar início à nossa audiência.
Gostaria de chamar para compor a Mesa conosco a Dra. Lara Mesquita, da Fundação Getulio Vargas.
14:10
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Encontra-se conosco também o Deputado Marcel van Hattem. Obrigado pela presença.
Passo a palavra para a Dra. Lara Mesquita, por 15 minutos.
A SRA. LARA MESQUITA - Eu gostaria de iniciar agradecendo o honroso convite e cumprimentando os nobres Deputados, os membros desse Grupo de Trabalho, os meus colegas, o Prof. Nelson Juliano e a Profa. Mariana Lobo, e todos que nos acompanham.
Entre os especialistas, tanto na ciência política, meu campo de estudo, quanto no direito, não existe um consenso sobre a superioridade absoluta de sistemas de governo nem sobre a superioridade no que diz respeito a dar mais estabilidade à democracia em relação a um sistema ou outro. Nós temos casos de transições, rupturas democráticas, ocorrendo sobre qualquer um dos sistemas de governo que nós conhecemos: o presidencialismo, o parlamentarismo e também os sistemas semipresidencialistas. Acho que os casos das repúblicas do Leste Europeu são bons exemplos para termos em mente.
Não vou ser repetitiva para não sobrepor demais a minha fala à do Prof. Octavio Amorim, mas é sempre bom lembrar que, quando falamos em regime semipresidencialista, estamos falando de duas coisas diferentes.
Como qualquer instituição, o diabo mora nos detalhes. Adotamos um nome único para uma nomenclatura, mas existem variações internas. É muito importante que tenhamos clareza dessas diferenciações e das consequências esperadas em cada um destes sistemas: o sistema em que o Primeiro-Ministro e o gabinete prestam contas tanto ao Presidente quanto ao Parlamento, que é um sistema um pouco mais conflituoso porque fortalece demais o Presidente; e o sistema em que a prestação de contas, a fidelidade e a dependência se dão apenas com relação ao Parlamento. Esse é o sistema português, que a Dra. Mariana poderá apresentar com muito mais competência do que eu, por isso não vou me alongar sobre ele.
A grande questão que temos que pensar é: qual é o arranjo que se propõe debater no Brasil? E mais do que isso: por que precisamos de uma reforma do sistema de governo?
O Deputado Samuel, em diversas ocasiões, já disse que acredita que isso aumentará a responsabilização do Parlamento sobre as políticas públicas. Resumindo, talvez essa seja a principal justificativa, mas corremos um sério risco de caminhar para um sistema que acentue ainda mais os problemas de governabilidade que já experienciamos sob o regime presidencialista, dada a excessiva fragmentação partidária presente no Legislativo brasileiro.
14:14
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A minha fala hoje pode ser resumida na seguinte frase: vamos esperar a consolidação da última reforma eleitoral, que tende a diminuir a fragmentação partidária, e entender como o nosso sistema vai responder a um Parlamento menos fragmentado que possibilite ao Executivo a formação de coalizões menos heterogêneas.
Com isso, precisamos fazer um diagnóstico: a nossa democracia respondeu bem a essa reforma? Essa é uma reforma que está sendo implementada de forma bastante cautelosa, aumentando a cada ano. Começamos com a cláusula de desempenho, temos o fim das coligações. E há um debate importante para ser feito sobre a inclusão do fundo eleitoral na cláusula de desempenho, porque hoje ele está fora dessa cláusula. Isso é importante para contribuir nessa diminuição da fragmentação legislativa.
Aí, sim, vamos poder pensar: ainda cabe essa discussão sobre um redesenho institucional do nosso sistema de governo? Se sim, qual é o modelo mais adequado para a realidade do Brasil naquele momento?
Todo debate público fala em uma mudança de sistema apenas a partir de 2030. Então, vamos desenhar um arranjo institucional sem saber exatamente qual o contexto no qual ele vai ser implementado, porque o nosso sistema está passando por uma série de mudanças por conta das reformas eleitorais que ainda não estão consolidadas. Pode ser que desenhemos instituições agora, com tanta antecedência, que não sejam as melhores, as que respondam de maneira mais adequada à realidade que estaremos vivendo daqui a 8 anos.
Por isso, acho que este debate é relevante, merece ser feito e não pode ser interditado. Mas ele deveria ser feito a partir de um momento de maior estabilidade, tanto estabilidade democrática e de confiança nas instituições democráticas, quanto estabilidade da composição parlamentar.
Tudo indica que vamos passar por esse processo de maior racionalização e diminuição da fragmentação parlamentar nos próximos anos, o que é algo positivo e muito desejado — pelo menos do ponto de vista de nós analistas da ciência política.
Nós acreditamos que a diminuição dessa fragmentação é importante tanto do ponto de vista do Executivo, de formação, de coalizão e de implementação de agenda, como do ponto de vista do eleitor, de compreender quem são seus representantes, o que eles defendem e qual é o alinhamento político deles. Isso vai ajudar a diminuir essa massa de políticos e de partidos que o eleitor não consegue entender muito bem para que lado vai.
É claro que numa democracia consensual — para citar um termo do Prof. Lijphart, como é geralmente classificada a democracia brasileira — sempre vamos ter partidos políticos que estão no centro do espectro e que tendem a compor todos os governos e garantir uma certa continuidade. Não é esse o problema, e não há nenhuma crítica de fundo nisso.
14:18
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Acho que a questão é aumentar a racionalidade para o eleitor, para a sociedade, para o andamento dos trabalhos legislativos e também para o funcionamento do Executivo. Qualquer que venha a ser esse Executivo mais à frente ele vai ser beneficiado de um Legislativo menos fragmentado.
Reforçando o meu ponto, a questão é desenhar uma instituição agora que vai operar sob um desenho que não está consolidado. Ainda não temos clareza do que vai ser o Poder Legislativo em 2030, quando a cláusula de desempenho chegar a 3%, quando o fim das coligações já estará operando em algumas eleições. Espera-se que tenhamos um contexto mais racionalizado.
Há ainda dois pontos importantes para abordar, antes de finalizar, e eu posso fazê-lo de maneira bastante rápida, porque já foram apresentados por este Grupo de Trabalho.
Primeiro ponto: ainda que adotemos um sistema em que a prestação de contas do Primeiro-Ministro e do Gabinete se dê ao Parlamento, se cabe ao Presidente da República, eleito diretamente pelo voto, a chefia das Forças Armadas — num contexto histórico e atual em que as Forças Armadas se arvoram como os defensores da democracia e respondem ao Presidente —, isso pode empoderar sobremaneira o Presidente da República e gerar um conflito institucional. Em consequência, pode não haver o apaziguamento que se espera com a adoção do semipresidencialismo. Eu posso ter um Presidente excessivamente fortalecido por ser o chefe das Forças Armadas.
Essa não é uma questão menor no contexto brasileiro, dada a nossa experiência histórica e o que temos visto acontecer recentemente no País. Devemos pensar qual é o ganho para a nossa democracia e para a pacificação de conflitos a adoção de mais uma camada de poder de veto.
Hoje temos o sistema de freios e contrapesos, com o Executivo, o Legislativo e o Judiciário, que está atuando cada vez mais como um ator de veto poderosíssimo. Sabemos que o Supremo, atualmente, é acionado a todo momento como um ator de veto, para interferir na implementação de políticas públicas, na validação de decretos-leis, de leis aprovadas muito mais do que víamos quando a Constituição de 1988 foi desenhada. Na experiência inicial da democracia brasileira, tem aumentado o protagonismo do Judiciário como poder de veto. E agora vamos ter mais uma instância de poder de veto, que é esse Executivo dividido em duas cabeças.
Então, o quanto essa mudança pode ter uma consequência contrária, um efeito contrário ao desejado em vez de contribuir para pacificar as relações entre o Executivo e o Legislativo e tornar o sistema mais fluido, sem aumentar uma esfera de conflito?
14:22
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Para finalizar, o derradeiro ponto é: em se avançando o debate sobre a mudança de sistema de governo, precisamos pensar qual é o desenho institucional que vamos adotar para evitar grandes crises institucionais devido a governo de coabitação.
Sabemos que existem sistemas multipartidários com partidos majoritários ou com partidos muito grandes. Esse não é o caso do Brasil, que tem um sistema multipartidário sem nenhum partido majoritário. Existe uma grande probabilidade de a regra ser governo de coabitação: os eleitores elegendo um Presidente de um partido, e o Legislativo aprovando um Primeiro-Ministro. Por mais que este seja indicado pelo Presidente, o Presidente só pode indicar alguém que tenha apoio da maioria legislativa. Temos as experiências de Portugal e da França, que nos ensinam muito sobre isso.
Qual é o nosso mecanismo de proteção para evitar rupturas institucionais em decorrência da alta probabilidade de governo de coabitação? Nós vamos cair num cenário de paralisia institucional? Vamos passar longos períodos sem conseguir indicar um Primeiro-Ministro, como acontece na Bélgica, que é um país parlamentarista, não semipresidencialista? Essa é uma experiência que precisamos olhar com atenção. Vimos recentemente Israel também com muita dificuldade de formar governo. E o nosso sistema multipartidário está mais próximo desses casos.
Portanto, se formos caminhar para essa mudança institucional, precisamos que o desenho institucional, de alguma maneira, reflita uma forma de solucionar esse impasse e não fazer com que a instabilidade, a dificuldade de formar governo contribua mais para uma ruptura institucional do que para a pacificação dos conflitos.
É sempre bom lembrar que é ótimo olharmos para Portugal e França, mas não podemos nos esquecer do caso do Peru. Talvez o caso peruano se aproxime muito mais da realidade e da experiência democrática brasileira do que as experiências francesas e portuguesas, que são sempre referências na literatura quando vamos estudar o assunto. Mas o Peru está aqui do nosso lado e evidencia que esse sistema nem sempre dá certo e pode, sim, gerar crises institucionais muito graves.
Com isso, encerro a minha fala. Acho que respeitei o tempo.
Agradeço, mais uma vez, o convite e a oportunidade de estar aqui.
O SR. PRESIDENTE (Samuel Moreira. PSDB - SP) - Nós é que agradecemos. Muito obrigado, Dra. Lara.
Quero agradecer também a presença dos Deputados Enrico Misasi, Marcel van Hattem e Silvio Costa Filho, que estavam conosco.
Vou passar diretamente a palavra, por 15 minutos, ao Dr. Nelson Juliano Cardoso Matos, que vai participar por videoconferência.
O SR. NELSON JULIANO CARDOSO MATOS - Boa tarde.
Muito obrigado, Deputado Samuel Moreira, pelo convite. Estendo este agradecimento à Deputada Margarete Coelho.
14:26
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Quero parabenizar a Presidência da Câmara, o Deputado Arthur Lira, pela iniciativa de criação desse Grupo de Trabalho. Queria também fazer uma saudação à Profa. Lara, à Profa. Marina, ao Ministro Jobim e à equipe do Grupo de Trabalho que, de forma tão eficiente, acolheu minha chegada.
Fiquei muito feliz com a exposição da Profa. Lara e compartilho das preocupações apresentadas por ela, sobretudo quanto à cautela e à prudência na hora de modificarmos o sistema de governo.
Não se pode esquecer — como muito bem apresentado pela Profa. Lara — que, por si só, não temos nenhuma garantia de sucesso com o parlamentarismo, o presidencialismo ou o semipresidencialismo. As Américas, de maneira geral, têm larga experiência presidencialista, ou quase nenhuma experiência parlamentarista, ou estão muito distantes do ponto inicial do presidencialismo, ao contrário da Europa.
Neste mesmo sentido, é importante destacar como é o semipresidencialismo na Europa, que é o que geralmente usamos como referência de comparação. Nesse continente, eles migram do parlamentarismo para o semipresidencialismo procurando corrigir problemas que consideram ser do parlamentarismo.
Uma proposta de adoção do semipresidencialismo ou mesmo do parlamentarismo no Brasil tem a pretensão inversa: resolver os problemas da nossa longa experiência presidencialista. Digo isso exatamente para ressaltar a cautela que precisamos ter ao usar a experiência europeia, seja portuguesa, seja russa, seja francesa, para o nosso caso, já que os objetivos lá eram outros. Por exemplo, o fortalecimento do Presidente nesses países é uma ação em oposição às consequências instáveis de um Presidente fraco.
O que aqui se quer — pelo menos quando se discute semipresidencialismo — é o movimento oposto, o movimento de enfraquecimento presidencial. E é merecida cautela, na medida em que não sabemos se o que foi pensado e o que está sendo proposto efetivamente se aplicará.
Eu não preciso citar exemplos tão comuns aqui no Brasil de que as propostas e os desenhos estabelecidos e aprovados não acontecem como foram pensados. A nossa habilidade de reconstruir tudo isso mostra que nem sempre, ao não se combinar com os inimigos ou com os adversários, o resultado é o que parece.
Queria também ressaltar alguns aspectos que parecem atrapalhar um pouco o debate.
14:30
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O nosso apego aos nomes, que vou chamar de problema semântico, às vezes atrapalha demasiadamente. Vejam que o presidencialismo é desenhado nos Estados Unidos sem ser presidencialismo. A teoria veio depois, a classificação veio depois, a sistematização veio depois. Ele estava ali para resolver problemas reais. E mais: problemas reais projetados para durar no tempo.
O outro modelo, o parlamentarismo, no caso inglês, também primeiro acontece e depois que é classificado, depois que é caracterizado, depois é que se dá nome para ele.
O mesmo acontece com o semipresidencialismo. Não por outra razão, o semipresidencialismo não tem originalmente essa tipologia. Originalmente — talvez para muitos ainda hoje —, ele é parlamentarismo ou uma variação do parlamentarismo, mas ainda assim é parlamentarismo.
Quero dizer isso porque o nosso apego com os nomes, de sair de um e entrar no outro, parece que causa mais problemas do que solução. Resolvemos o problema do ponto de vista teórico, mas, quanto ao que nos interessa, que é do ponto de vista prático, não nos serve.
É com isso que a academia contribui. Esse Grupo de Trabalho e os pesquisadores convidados são valiosos. Mas quem tem experiência política, quem sabe como o jogo funciona, quem tem o espírito de estadista é que tem que decidir qual é o desenho preciso. A academia, por um distanciamento normal, natural, geralmente, não é capaz de fazer o desenho perfeito.
Além disso, as interseções são tantas que muitas vezes nem na academia se consegue devidamente classificar. São tantas variações de parlamentarismo, tantas variações de presidencialismo, tantas variações de semipresidencialismo que elas se sobrepõem constantemente.
Tudo isso foi para lhes dizer que os detalhes é que importam.
Há uma passagem muito interessante num texto famoso de Tobias Barreto sobre o poder moderador em que ele dizia: "Esta discussão não faz sentido. O que se chama de poder moderador é o que os ingleses fazem há muito tempo, e eles chamam lá de parlamentarismo. Vamos lá listar as atribuições".
Repetindo a expressão que a Profa. Lara mencionou, são os detalhes que importam. E vou ressaltar alguns para vermos a dimensão da controvérsia sobre a mudança do nosso sistema.
Há várias experiências na América do Sul do que geralmente se chama de presidencialismo atenuado. Há elementos parlamentaristas para corrigir ou aperfeiçoar, de forma muito precisa, o presidencialismo, e resolver problemas reais nossos.
14:34
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Precisamos definir qual é o nosso problema. O nosso problema é a instabilidade política? O nosso problema é a hipertrofia do Presidente da República? O nosso problema é um incentivo a eventuais relações de permuta, de clientelismo, ou coisa assim? Porque depende do problema que queremos resolver a solução que iremos encontra.
Vou trazer aqui três aspectos do que eu chamei de presidencialismo atenuado. O primeiro deles é este: termos um primeiro-ministro e um gabinete, ainda que não sejam demissíveis, ainda que não precisem de um voto de censura do Congresso, distancia o governo do presidente, e o presidente tem facilidades para trocar o governo. Esse distanciamento lhe permite fazer mudanças na política sem traumas maiores. Temos a experiência chilena, a experiência uruguaia, a experiência argentina, com cargos similares ao do primeiro-ministro, o que seria um parlamentarismo sem moção de censura, ou um semipresidencialismo sem moção de censura. Podemos ainda ter uma moção de censura, sim, isolada, com maioria qualificada, sem necessariamente trazer todo o jogo para uma mudança tão radical no regime.
Lembro, mais uma vez, e por isso fiquei muito feliz com a fala que me antecedeu, que não podemos esquecer os exemplos recentes de instabilidade política no parlamentarismo, e uma eventual incorporação do semipresidencialismo, a depender da sua variante, também corre riscos. O exemplo recente da Espanha, o exemplo recente da Itália, o exemplo recente de Portugal, antes dessa última votação, o exemplo um pouco mais distante de Israel, de instabilidade política decorrente basicamente de uma incapacidade de produzir maiorias, devem ser repensados. Seria uma experiência que nunca enfrentamos, então é preciso ter isso em conta.
Mas vamos nos ater ao semipresidencialismo. Vou listar uma infinidade de perguntas. Aliás, na verdade, umas poucas perguntas. Vou apenas começar essas perguntas, que se atêm a detalhes, não à fórmula semipresidencialismo, que parece que é o importante.
O presidente da República será eleito pelo voto direto? Parece que isso é até consensual. Mas qual será o seu mandato? Será um mandato longo? Será um mandato curto? Será um mandato coincidente com o dos deputados? Vejam o caso francês, onde há uma eleição parlamentar imediatamente depois da eleição presidencial. Isso induz a uma maioria presidencial. Quando isso não aconteceu, nós tivemos os episódios da coabitação, e não sei, por exemplo, se a primeira coabitação na Presidência Mitterrand realmente valeu a pena.
Os mandatos coincidentes são bons, ou mandatos diferentes são melhores? Os ministros devem ser deputados? Os ministros não podem ser deputados? Os ministros que pedem licença do Congresso têm o direito de frequentar o Congresso, de participar dos debates, ou não? Há uma infinidade de questões como essas.
14:38
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Preocupa-me enormemente a coabitação, se teremos a capacidade da segunda coabitação dos franceses. A primeira coabitação não sei se teve um desenho eficiente. Como o presidente pode conviver com um primeiro-ministro inimigo seu? Ele vai aceitar isso? Ele vai reagir? O primeiro-ministro pode ser demitido pelo presidente, ou só pelo Congresso? É preciso ter o voto de investidura, ou só vamos vigorar com o voto de desconfiança? Eu sei que é muito comum que se guarde um tempo no qual o gabinete não pode cair. Mas a Itália participou de um evento desses, logo no início ou no final, que produziu a falta de governo exatamente por conta desses detalhes. A confiança tem que vir das duas Casas, ou só Câmara Baixa, ou do Congresso reunido com deputados e senadores? Esses detalhes fazem toda a diferença. Lembrem que, no modelo imperial parlamentarista, o Senado tinha sua estabilidade. Mesmo a Câmara parada para as eleições, o Senado continuava intacto.
Enfim, nos 30 segundos que me restam, eu queria ressaltar a ideia de Giovanni Sartori, que não pode ser ignorada, a ideia de pêndulo. Sartori tinha uma enorme desconfiança do parlamentarismo nas Américas. Mas ele achava que, quando o sistema da Assembleia, o sistema do Parlamento, não funcionava, nós podíamos nos acudir num retorno ao sistema presidencial.
Estando no fim o meu tempo, vou enfatizar o que me parece ser o mais importante: cautela, etapas. Talvez a proposta não precise ser executada imediatamente, integralmente, mas experiências possam ser sucessivamente incorporadas. Dou o exemplo da lúcida proposta — agora não me recordo do nome do autor — de termos um ministro coordenador durante um tempo, enquanto nos adaptamos ao sistema, e ainda poderíamos descobrir que o sistema pode não dar certo, e voltar atrás.
Eu agradeço novamente a honrosa oportunidade de falar. Não disse tudo que eu queria, porque organizei mal o tempo, mas parabenizo novamente o Deputado Samuel Moreira e o Presidente Arthur Lira por esta iniciativa.
O SR. PRESIDENTE (Samuel Moreira. PSDB - SP) - Muito obrigado, Dr. Nelson Juliano Cardoso Matos, por sua exposição. Com certeza teremos a oportunidade de ouvi-lo mais uma vez durante o debate. É um prazer ouvi-lo.
Passo agora a palavra à Dra. Marina Costa Lobo, que é Investigadora Principal do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa.
14:42
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A SRA. MARINA COSTA LOBO - Boa tarde.
Muito obrigada, Deputado Samuel Moreira. Para mim, é um gosto, é uma honra estar aqui convosco, ainda que virtualmente. Tenho pena de não poder estar presencialmente aí em Brasília, mas é uma honra este convite e poder partilhar convosco algumas considerações sobre o sistema semipresidencial.
Eu preparei um Power Point para me organizar brevemente, portanto, deixem-me só compartilhar a tela.
(Segue-se exibição de imagens.)
Eu tenho quatro objetivos nesta breve apresentação. Em primeiro lugar, vou apresentar brevemente o semipresidencialismo, sua definição e a forma como ele se propagou nas últimas décadas enquanto sistema de governo; depois, vou entrar na questão da governabilidade, que foi muito abordada pelos palestrantes anteriores que estão nesta audiência comigo; em seguida, vou focar o caso português do semipresidencialismo, que foi aqui bastante falado como um caso de sucesso, mas que tem as suas particularidades; e, enfim, se eu consegui lá chegar, vou comentar brevemente a proposta do Deputado Samuel Moreira que foi apresentada e à qual tive acesso.
Já foi aqui dito que o semipresidencialismo é difícil de definir. Ele começa por ser definido pelo Duverger e depois pelo Sartori, de um ponto de vista funcional. É só com o Robert Elgie, infelizmente já falecido, que se chega a uma definição estritamente constitucional. Ele propõe que se defina o semipresidencialismo como um sistema de governo em que exista um presidente da república eleito de forma direta e que partilhe o poder com um primeiro-ministro, num governo em que se está dependente do Poder Legislativo.
Esta é uma definição consensual, mas dentro da qual cabem muitos sistemas de governo, com uma grande variabilidade do ponto de vista de funcionamento. E aí três fatores são chaves para explicar as diferenças nesse funcionamento: a forma como esse regime semipresidencial nasceu, as suas condições genéticas, e cada caso é um caso; os poderes constitucionais das principais instituições, nomeadamente os de presidente da república, e isso é absolutamente central; e o contexto político, o contexto partidário, o sistema partidário, que já foi muito falado aqui pelos meus colegas, e a relação que um presidente tem com essa maioria parlamentar, com esse sistema partidário.
Por ser um sistema que tem grande variabilidade, o semipresencialismo tem sido muito escolhido nesta terceira vaga da democratização, na Europa em especial, sobretudo a partir da queda do Muro de Berlim e da democratização da Europa do Leste, mas não só, pois ele tem surgido realmente como uma escolha preferencial de sistema de governo em muitos países.
14:46
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Sobre os estudos de ciências políticas existentes que olharam para a governabilidade nos três grandes tipos de regime — presidencialismo, parlamentarismo e semipresidencialismo —, tal como já foi referido pela primeira colega a falar, a Profa. Lara, de fato, quando comparamos os regimes, não há conclusões inequívocas. Mesmo assim, é bom dizer que há uma inclinação de que o presidencialismo é um sistema de governo mais instável do que o parlamentarismo. Quando se comparam esses dois grandes sistemas de governo, de fato é no presidencialismo que se encontra o maior número de derrubes democráticos e também o maior número de crises políticas e bloqueios institucionais. Quando se compara o presidencialismo com o semipresidencialismo, aí já não há tantas certezas, mas é globalmente considerado que o semipresidencialismo, segundo estes estudos aqui citados, não se distingue verdadeiramente do presidencialismo.
Por que isso ocorre? O que explica a variabilidade de governabilidade do semipresidencialismo? São dois fatores essenciais além da questão da genética: os poderes presidenciais e o contexto partidário. O chapéu de chuva do semipresidencialismo é muito variado, e temos que pensar que há semipresidencialismos que têm mais tendência para a crise política e que há outros que têm mais tendência para a estabilidade.
Focando esta questão dos poderes presidenciais, que é algo que já foi também referido, penso eu, pelo Prof. Octavio Amorim Neto, um poder em particular é muito importante, que é a relação entre presidente da república e primeiro-ministro. Tal como os colegas disseram, realmente o diabo está nos detalhes, então, no caso, a relação entre presidente da república e primeiro-ministro pode passar pelo fato de o chefe de Estado demitir livremente o chefe de Governo. Quando a Constituição oferece essa possibilidade, estamos perante um regime presidente-parlamentar. Quando isso não é permitido, quando o chefe de Estado não pode demitir o primeiro-ministro, estamos num regime premier-presidencial — eu me enganei aqui ao colocar a questão da governabilidade. Portanto, aqui estão os regimes em que um presidente não pode demitir um primeiro-ministro que tenha melhor governabilidade.
Essa capacidade de um presidente da república demitir ou não um primeiro-ministro e um governo é definidora da natureza do semipresidencialismo porque vai determinar o padrão da autoridade que existe nas relações entre chefe de Estado, chefe de Governo e Assembleia.
Quando existe uma dupla dependência do Governo, que tanto responde perante o Primeiro-Ministro como responde perante o Parlamento, a Assembleia da República, cria-se uma ambiguidade em relação ao padrão da autoridade. Em primeiro lugar, não se sabe quais são as eleições que verdadeiramente determinam a formação do Governo, que pode ser a Assembleia, mas também pode ser a Presidência. Em segundo lugar, criam-se incentivos para que o próprio Presidente da República aumente o seu poder demitindo um governo para formar outro que seja mais do seu agrado.
Portanto, vai haver aí um bloqueio institucional ou não? A Constituição não diz nada sobre isso. O contexto partidário é que vai definir se vai haver um bom entendimento entre presidente e governo ou não. Mas o poder presidencial de demitir um governo já é em si um incentivo a que essa relação não seja melhor. E aí o caso português realmente entra nessa história por quê? O caso português é interessante porque a nossa Constituição de 1967 começa por ser do tipo presidencial-parlamentar e depois evolui para um modelo presidencial. Eu vou aqui rapidamente passar uma lista dos poderes presidenciais em 1976, quando tínhamos, e temos, um Presidente eleito por sufrágio universal direto, existia um Conselho da Revolução que era constituído apenas por militares e que funcionava como um tribunal constitucional, e que também tinha poderes executivos sobre quaisquer temas militares. Isso foi um legado da revolução da democratização portuguesa. E o Presidente tinha amplos poderes de veto legislativo, tinha poderes de nomeação vários e tinha poder de demissão do Primeiro-Ministro e do Governo, desde que estivesse em causa o regular funcionamento das instituições. Também tinha poderes de dissolução da Assembleia da República. E esta dependência do Primeiro-Ministro da confiança do Presidente da República criou esta dupla dependência. Apesar de o Governo ter também poderes, houve também uns artigos que protegiam o Governo de um Parlamento fragmentado. Como? Não era necessário o Parlamento aprovar o programa de Governo, ele apenas não tinha que ser rejeitado. Isso protegia um Governo minoritário do Parlamento.
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Esse período de 1967 a 1982 é caracterizado por grande instabilidade governativa e por medir conflitos institucionais entre o Presidente da República, que era um militar, e os governos partidários. Desse modo, dá-se uma revisão constitucional, cujo objetivo era explicitamente diminuir os poderes do Presidente. A revisão constitucional foi consensualizada pelos maiores partidos portugueses e envolveu a extinção do Conselho da Revolução, o tal conselho dos militares, que era presidido pelo Presidente da República, ele próprio também um militar. Foi muito importante que o Presidente deixou de estar politicamente responsável.
Reformulou-se o artigo que estipulava quando o Presidente podia demitir o Governo, e ele passou a apenas assegurar o regular funcionamento das instituições. Os poderes de veto do Presidente foram reforçados, e os poderes de envio de diplomas ao Tribunal Constitucional, mantidos. O Tribunal Constitucional foi criado em substituição ao Conselho da Revolução.
Quais as consequências da revisão de 1982, que é muito importante? Muitos autores dizem que houve, de fato, um declínio dos poderes presidenciais, por causa destes poderes que eu agora acabei de elencar e que de fato se reduziram. Mas isso não quer dizer que nós tenhamos um Presidente irrelevante do ponto de vista político. Não é esse o caso. E o que nós tivemos também foi um aumento da estabilidade governativa devido a mudanças no sistema partidário que reforçaram o poder do Parlamento e também reforçaram o Primeiro-Ministro.
O que nós vimos do ponto de vista da estabilidade governativa? De 1976 a 1985, houve 11 governos. Nenhum deles cumpriu o mandato. Portanto, a partir do momento em que houve a Revisão Constitucional de 1982, a estabilidade governativa aumentou substancialmente.
O nosso Presidente da República é considerado um moderador e um árbitro. Portanto, ele intervém nos assuntos políticos, mas ele não governa. Ele intervém politicamente através do veto, através do envio de diplomas para o Tribunal Constitucional, e também pode ser decisivo em momentos de instabilidade política, porque tem o poder de dissolver a Assembleia da República. Por exemplo, muito recentemente, o Governo não conseguiu aprovar o orçamento na Assembleia da República, e o Presidente da República dissolveu a Câmara e convocou novas eleições, que aconteceram. Portanto, ele tem uma intervenção em caso de crise política, mas ele não governa. Ele é moderador e árbitro.
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O chefe de governo é o Primeiro-Ministro. O Primeiro-Ministro depende do Parlamento e depende das maiorias que existem no Parlamento. E aí o contexto partidário é a chave. Eu diria que a União Europeia, que também ocorre de 1986 em diante, também é muito importante para explicar a mudança que ocorreu no sistema partidário e que vai consolidar a figura do Primeiro-Ministro.
Portanto, eu não atribuo esse aumento da estabilidade partidária em Portugal a partir de meados dos anos 80 exclusivamente à Revisão Constitucional de 1982. A Revisão Constitucional de 1982 é um fato importante, mas não é suficiente para explicar a evolução partidária positiva e a estabilidade governativa que se foi adquirindo em Portugal, até porque nós temos vindo a assistir agora mais recentemente a uma fragmentação maior do sistema partidário em Portugal, que tem levado por vezes a governos fracos, a governos que caem, etc., independentemente de termos que continuar com o sistema semipresidencial que temos.
O que eu fiz, tendo agora já explicado um bocadinho de forma extremamente sucinta aquilo que é a experiência portuguesa no contexto semipresidencialismo e como ele tem sido estudado? Eu olhei para a proposta que me foi enviada, do Deputado Samuel Moreira, a proposta que está em mão e que está a ser discutida, até porque penso que, na Comissão, foi dito que gostariam muito que se fizesse um comentário a essa proposta.
Em particular, o que me interessou? Ver a tal relação entre Presidente da República e Primeiro-Ministro, que está plasmada na proposta. E o que eu encontrei? Encontrei, por exemplo, no art. 84, que discute as competências do Presidente da República, essa ideia de que o Presidente pode propor uma moção de censura ao Primeiro-Ministro, depois tem que ser deliberada pelo Congresso. O que eu encontrei, numa brevíssima leitura que fiz sobre o tal documento que está a ser agora discutido, é que há certa ambiguidade que transparece na relação entre Presidente da República e Primeiro-Ministro.
Portanto, não é claro se o Primeiro-Ministro depende, de fato, só da Câmara dos Deputados, ou se também depende da confiança do Presidente, mas a breve leitura que fiz do documento sugere que exista a tal dupla dependência, porque o Presidente pode censurar o Governo e o Primeiro-Ministro, embora depois também se diga que o Primeiro-Ministro e o Conselho de Ministros repousam na confiança das duas Câmaras do Congresso, e não fala do Presidente. Mas diz também que, quando o Primeiro-Ministro é nomeado, tem que apresentar ao Presidente da República o programa de governo, e é o Presidente da República que aprova o programa de governo. E depois, o programa de governo é apenas comunicado ao Congresso Nacional, o que sugere, mais uma vez, uma dependência do Primeiro-Ministro em relação ao Presidente. Depois, encontrei essas barreiras, essas balizas temporais do ponto de vista da capacidade do Presidente da República de censurar o Primeiro-Ministro. Portanto, só pode acontecer depois de 1 ano da posse do Primeiro-Ministro. E também há essa ideia de a moção de censura ser construtiva, porque tem que haver uma solução de apresentar um novo Primeiro-Ministro num prazo muito breve. Ou seja, não sei se estou a perceber bem, mas acho que é um Presidente... Este documento que eu li muito brevemente sugere-me mais um modelo presidencial-parlamentar do que premier-presidencial. E tendo em conta aquilo que eu sei sobre o modelo de dois tipos de semipresidencialismo, sugere, realmente, esta proposta alguma cautela. Em suma — e este é o último eslaide —, eu queria reforçar a ideia de que a relação entre Presidente da República e Primeiro-Ministro é absolutamente chave para a governabilidade do sistema semipresidencial. O caso português ilustra as vantagens de um Presidente da República com poderes que são importantes, mas de quem o Primeiro-Ministro não depende. Portanto, eu queria, de fato, enfatizar essa questão.
14:58
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Em terceiro lugar e finalmente, o contexto partidário é fundamental para compreender o funcionamento deste sistema semipresidencial, e também, concordando com os colegas, não me parece que haja panaceias, não há balas de prata, soluções mágicas para transformar um sistema político. E aí, o contexto partidário é absolutamente central para o seu funcionamento.
Obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Samuel Moreira. PSDB - SP) - Eu que agradeço, Dra. Marina Costa Lobo. Muito obrigado.
Nós vamos agora ouvir os Deputados e os membros do Conselho Consultivo. Nós estamos propondo 3 minutos para cada Parlamentar e cada membro do Conselho, para que possam ir fazendo as perguntas. Depois, faremos uma rodada dos palestrantes para eles responderem às perguntas e às considerações.
Eu quero passar, então, inicialmente, a palavra ao ex-Ministro Nelson Jobim, Presidente do nosso Conselho Consultivo, se ele quiser fazer alguma consideração, alguma pergunta.
O SR. NELSON JOBIM - Por enquanto, não pretendo fazer uma intervenção, só observar que ao Conselho Consultivo cabe, eu entendo que caberia a nós, fazer um elenco dos problemas que podem surgir, para que a decisão seja tomada. É bom ter presente que um sistema político não se altera a partir da academia, como disse o Prof. Nelson Matos. Um sistema de governo se cria através das contingências políticas do momento da votação. E aí é que surge... ou seja, inclusive os sistemas eleitorais não são invenções da academia, a academia analisa-os depois e cria a nominação. Eu gostei muito da expressão do Prof. Nelson Matos quando ele mostra, digamos, a sua posição não realista da linguagem, ou seja, semipresidencialismo não é uma coisa do mundo. Mas é um nome que se deu para efeito só de catalogação, não tem mais nenhum desenho disso tudo.
15:02
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Isso lembra muito bem a posição da filosofia analítica e Wittgenstein nisto, dizendo que não temos nada que ver, o mundo não tem a ver com este assunto. Eu creio que é importante. E ainda diria mais ao professor: esta exposição da Profa. Marina Costa Lobo nos dá um caminho para exatamente identificar os problemas básicos que há. O resto é problema que se vai resolver no debate político. Mas teriam que ser estabelecidos determinados parâmetros, para que os partidos pudessem se decidir.
Agora, também há o problema de que nós não podemos aguardar uma reforma eleitoral. Lamento discordar da professora, da primeira professora, porque senão nós vamos ficar naquela coisa de não acontecer nada, porque a reforma eleitoral vai surgindo progressivamente dentro do processo da dinâmica política, e não a partir de uma visão meramente reformatória a posteriori ou a priori.
Então, são essas as observações iniciais, Deputado Samuel Moreira.
O SR. PRESIDENTE (Samuel Moreira. PSDB - SP) - Muito obrigado, ex-Ministro Nelson Jobim.
Eu quero fazer algumas considerações.
Eu também acho que foram três palestras muito boas, e quero destacar, inclusive, a questão da prática, da conjuntura e do exercício da prática da atividade política no Brasil. Os sentimentos que temos são de, realmente, trazer... Nós sentimos no Orçamento, no dia a dia, um descolamento entre o presidencialismo, o poder monocrático absoluto, em que se constroem alternativas para governar... Evidentemente, não há uma bala de prata. E também acredito que pessoas com perfil adequado, de repente, vão bem em qualquer sistema. O importante é haver sistemas que travem, que diminuam o efeito de uma má escolha, de alguém que possa corroer o sistema democrático.
Então, eu entendo que essa dependência, inclusive, que foi colocada aqui para a nossa transição, no momento do presidencialismo, para um sistema dual, com o Parlamento sendo responsável, um sistema compartilhado... Nós também estabelecemos, como foi dito aqui também pela Dra. Marina Costa Lobo, na nossa proposta, uma série de forças ainda do presidencialismo, do Presidente da República com poder de veto, do Presidente da República nomeando os Ministros indicados pelo Primeiro-Ministro, ou seja, o tempo todo há uma sinergia entre o Presidente eleito pelo povo e o Primeiro-Ministro, que depende da confiança do Presidente e da confiança do Parlamento, para que haja realmente entendimento. Esta é a grande virtude do processo: entendimento.
Nós estabelecemos um processo de estabilidade ao Primeiro-Ministro no primeiro ano, nos últimos 6 meses. Então, há 2 anos e meio aí em que podem ocorrer instabilidades, mas com um voto de desconfiança, uma censura construtiva, a exemplo do que ocorre na Alemanha, na Espanha, onde o novo Primeiro-Ministro já é escolhido antes da derrubada do Primeiro-Ministro, para que não fique sem um governo.
Mas eu queria colocar que a grande questão é a governança, nós entendermos. E está nesse ponto mesmo do equilíbrio entre o Presidente e o Primeiro-Ministro, atribuições e responsabilidades, toda essa dinâmica. O que sentimos na prática do dia a dia? Sentimos que o Parlamento... E eu acho isso um atrativo, como foi dito aqui recentemente também por um dos conselheiros, para que o eleitor sinta interesse nesse voto. Ele vota no Presidente da República com uma expectativa. E no Deputado? Ele vota com quais expectativas? Hoje ele elege um Deputado com atribuições diferentes das do Presidente. O Presidente da República é eleito com programa de governo, e o Deputado é eleito com outras atribuições.
15:06
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Há um descolamento em que o Parlamento — a maioria, lógico, que se compõe para governar — não tem responsabilidade com a qualidade do governo. É muito comum o Parlamentar não ser responsabilizado perante seu eleitor pela qualidade da execução de um governo. O Parlamentar se afasta dessa responsabilidade, porque ele é eleito, em princípio, pelo desejo do eleitor até para outras atribuições, cada vez mais fortes. Falo de levar recursos para a sua região, de defender a sua corporação, quer dizer, ele está cada vez mais distante, por exemplo, das responsabilidades de governar, da qualidade do governo. Então, essa dissociação nos preocupa bastante.
Percebemos a necessidade de trazer o Parlamento para o processo e responsabilizá-lo. Eu, enquanto eleitor, devo votar num Deputado que eu sei que é responsável pelas atribuições que eu desejo dele, seja de representação, levando recursos para a região, para a cidade — que é até legítimo —, seja defendendo uma categoria, uma classe, um tema, um Deputado temático dessa questão ambiental, por exemplo. Seja como for, eu quero saber se ele é Governo ou se ele não é Governo. Eu quero saber se ele votou no Primeiro-Ministro e acompanha a execução de um programa de governo, se ele tem responsabilidades pelo governo, para que eu possa cobrá-lo pela inflação, pelo desemprego.
Do ponto de vista prático, eu penso que é uma vantagem para o eleitor ter algo a mais no seu Deputado a cobrar. Hoje, Deputados da própria base ou que se dizem da própria base do Governo, quando há uma matéria difícil, uma contradição entre aumentar gasto público e segurar gasto público para conter inflação ou reformas, não têm compromisso com aquela execução. Eles não têm essa responsabilidade, fora todas as outras questões. Evidentemente, considero que as soluções de crise são mais rápidas, considero que haja mais entendimento, que haja mais transparência.
Tem que saber realmente o que é Centrão. Fala-se do Centrão, e eu não estou aqui fazendo juízo de valor, pelo contrário. Fui Relator da reforma da Previdência e confesso que muitos que compõem o Centrão nos ajudaram a aprovar, a avançar. Não é esse o aspecto. Mas quem são? Quem é essa base que apoia o Governo? Quais são esses partidos? Quais são esses Deputados que votaram para compor o Governo, que participam legitimamente e de maneira transparente perante a sociedade, que participam do Governo, que indicam Ministros, como indicam hoje, que participam do Governo? Eu sei quem são. Eu sei quais são os responsáveis, como um eleitor. Como um eleitor, eu sei quais são. É essa transparência, essa relação de confiança, esse compartilhamento das responsabilidades no sistema.
Não vou explicar aqui todas as vantagens, mas eu estou muito seguro de que há necessidade de um avanço, evidentemente ajeitando esses detalhes. Acho que todos aqui colocaram questões muito relevantes. Para a coabitação, por exemplo, há uma previsão? Como nós vamos fazer uma previsão? Como foi feito em Portugal — aliás, na França —, acho que duas ou três semanas depois de eleito o Presidente, há eleição parlamentar. Acho que, no nosso sistema, nós temos que fazer um sistema para o Brasil, evidentemente. Temos que fazer um sistema brasileiro de semipresidencialismo, no qual o Presidente da República, ainda que não tenha responsabilidades administrativas e de execução de um governo, tenha responsabilidade política sobre o governo. O eleitor tem que poder responsabilizar politicamente o Presidente, porque é o Presidente que indica o Primeiro-Ministro e é ele também que apresenta ou não o voto de censura no Parlamento. Tem que haver esse equilíbrio de forças e essa necessidade de entendimento. Não pode haver um poder absoluto e monocrático, coisa a que nós já assistimos há 133 anos no Brasil. É lógico que as pessoas devem estar em primeiro lugar, mas como disse a Profa. Lara, há outros exemplos ruins de semipresidencialismo. Por exemplo, a Rússia é semipresidencialista. Lá há um Presidente da República que está variando e está há 23 anos no poder.
15:10
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Então que mecanismo devemos usar? Nós colocamos na nossa PEC que a pessoas só podem ser eleitas em duas eleições, alternadas ou consecutivas. Evidentemente, um governo com um Primeiro-Ministro que está andando pode ficar. O Primeiro-Ministro é da base, é questão de confiança. Se estiver bem, fica; do contrário, troca-se. A alternância de poder é que é fundamental.
Nós temos a grande oportunidade de pensar sobre isso com cautela. Acho que os partidos irão diminuir no decorrer do tempo, até porque a nossa cláusula de barreira é escalonada até 2030, quando chega ao ápice, com a exigência de 3% dos votos válidos em um terço das Unidades da Federação, e ainda vigora o fim das coligações. Esses são passos que vão diminuir o número de partidos. Mas, evidentemente, nós não devemos esperar uma reforma dos partidos, que, por sinal, estão também completamente desconectados da responsabilidade de governar. Há partido que não quer nem ter candidato a Presidente. Ele não quer governar, não. Ele quer participar do governo depois. E, na maioria das vezes, está preocupado com o tempo de TV, com o Fundo Partidário, com o fundo eleitoral. Ele não quer ir buscar votos, ele não quer assinar plano de governo, coalizão formal e ter que votar e se responsabilizar por um Primeiro-Ministro. Ele não quer isso. Ele prefere ficar, evidentemente, como está.
São esses ajustes, esses equilíbrios dosados que podemos fazer, aproveitando as experiências que nós temos do ponto de vista internacional e, sobretudo, a prática do dia a dia no Brasil, como é o Brasil hoje no seu dia a dia. A experiência acadêmica, para nós, é fundamental. Ela é muito importante. Mas estão aí o dia a dia, a prática, o exercício efetivo, as mazelas do presidencialismo. As mazelas do nosso presidencialismo estão aí.
Fiz aqui só algumas considerações. Evidentemente, nós vamos debater um pouco mais o tema, com o maior prazer. Há várias outras coisas que foram colocadas, como a realização ou não de plebiscito. A nossa previsão é para 2030. Nós estamos seguros de que, trabalhando para 2030, poderíamos caminhar sem contaminar o processo eleitoral de hoje. O Brasil está em processo eleitoral neste ano. Enfim, temos muito a debater. Acho que as intervenções dos três palestrantes hoje foram extraordinárias, muito boas e colaboram demais para que aprimoremos, cada vez mais, a proposta.
A nossa proposta está em pleno andamento. Nós estamos em discussão para poder aprimorar o máximo possível a proposta e construir algo que seja bom, até porque não há uma bala de prata, como já foi dito aqui.
Passo a palavra para o Deputado Federal Enrico Misasi.
O SR. ENRICO MISASI (MDB - SP) - Cumprimento o Deputado Samuel Moreira, a Profa. Lara, os demais palestrantes que estão conectados virtualmente, o Ministro Jobim, os demais membros do Conselho Consultivo e o Prof. Jorge Galvão, que está aqui também.
Queria fazer uma observação que se transforma em pergunta, uma vez feita, sobre um ponto específico que sempre vem à tona, principalmente nas falas dos acadêmicos: a questão da coabitação como uma possível maximizadora de crises políticas, se adotado o sistema semipresidencialista.
15:14
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O que eu vou fazer é mais uma provocação, Deputado Samuel Moreira. Não sei qual é a sua opinião, mas acho que vale muito o que nós passamos aqui dentro e o que vivemos na prática também. É importante sentir o que os Deputados percebem.
Parece-me que já existe uma coabitação silenciosa e informal porque, nas últimas décadas, houve mutações constitucionais informais também que colocaram o Presidente da Câmara dos Deputados, principalmente, com um protagonismo político capaz de fazer frente ao Presidente da República.
Já existe uma coabitação informal desses sistemas no Brasil. O Presidente da Câmara dos Deputados hoje está muito acima dos Líderes partidários na capacidade de negociação com o Governo.
Os problemas típicos da coabitação em sistemas semipresidencialistas são sentidos, ainda que camufladamente, ainda que do ponto de vista informal, no nosso atual sistema presidencialista, com a projeção institucional do Presidente da Câmara. Isso foi profundamente reforçado nos últimos anos com a questão das emendas de Relator — e não vamos julgar isso moralmente —, com a influência do Parlamento e, em última instância, com a influência pessoal da Presidência da Câmara dos Deputado na definição da destinação de importantes fatias orçamentárias.
Então, a minha provocação é justamente esta, Prof. Jorge Galvão: até que ponto não estamos vivendo tensões camufladas de uma espécie de coabitação? De fato, não seria melhor que houvesse uma coabitação às claras, que houvesse, sim, um Primeiro-Ministro acordado entre a maioria do Parlamento e o Presidente da República? Mesmo que eles sejam de forças políticas diferentes, não seria melhor que ficasse às claras a formalização de um contrato de coalizão, com o voto de confiança da maioria, para que se chegue a um acordo em que eles coabitem, em vez de se deixarem as coisas um pouco na informalidade, como eu acredito que estão hoje?
O SR. PRESIDENTE (Samuel Moreira. PSDB - SP) - Eu vou passar a palavra agora ao Prof. Jorge Galvão. Em seguida, vou intercalar as falas e chamar o Deputado Marcel van Hattem, que está inscrito. Depois eu faço uma rodada com os palestrantes.
Permitam-me fazer um aparte ao que o Deputado Enrico Misasi colocou, só para dizer que uma evidência dessa coabitação que temos hoje é o crescimento dos gastos por emendas parlamentares. O gasto é crescente. De 6 bilhões de reais, em 2015, nós estamos em 36 bilhões de reais gastos em emendas parlamentares. Ou seja, nós estamos praticamente vivendo um orçamento parlamentarista em um regime presidencialista. Há uma influência muito forte do Parlamento, que está desconectado. Acho que é um pouco isso o que o Deputado Enrico Misasi quis dizer.
Prof. Jorge Galvão, o senhor está com a palavra.
O SR. JORGE GALVÃO - Boa tarde, Deputado Samuel Moreira, coordenador deste grupo de trabalho. Cumprimento os demais Deputados aqui presentes, na pessoa do Deputado Enrico Misasi. Cumprimento também o Ministro Nelson Jobim, Presidente do Conselho Consultivo do qual eu faço parte. Cumprimento ainda os três expositores desta reunião: a Profa. Lara Mesquita, o Prof. Nelson Matos e a Profa. Marina Lobo.
Nesta intervenção, gostaria de focar algo bem pontual que diz respeito a uma questão que sempre aparece nas apresentações — e me parece muito presente hoje nas apresentações da Profa. Lara e do Prof. Nelson Matos —, no que diz respeito ao momento adequado para se fazer esse tipo de debate a respeito da reforma do sistema político.
15:18
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A mim parece que nunca haverá um momento adequado, porque nós estamos hoje no final de um governo de 4 anos e temos uma indefinição no cenário político sobre quem será o vencedor nas eleições de outubro. A partir do ano que vem, nós teremos um Presidente eleito, com 4 anos de mandato, possivelmente com perspectiva de reeleição. E, no próximo Governo, obviamente, essa discussão não vai se colocar pelo menos nos primeiros anos de governo ou, se o Governo for forte, em qualquer momento do Governo subsequente.
Na verdade, agora nós estaríamos em um plano um pouco distante das forças políticas existentes para discutir essa questão, porque o que me parece — e o Deputado Samuel Moreira foi muito preciso nisso — é que nós temos um diagnóstico irrefutável. O incremento dos gastos decididos pelo Parlamento, como o Deputado mencionou, chega a 36 bilhões de reais em emendas, que servem para fazer a composição da maioria na Câmara dos Deputados e no Senado Federal. Essa composição poderia ser feita mais às claras, como disse o Deputado Enrico Misasi, com a definição de um plano de governo, com a maioria do Parlamento endossando esse programa de governo e assim caminhando junto com responsabilidade nos gastos.
Deve-se dissociar essa imagem de que o Deputado tem duas funções. Ele é responsável. O Deputado que é do Governo é responsável pelos gastos públicos, pelo aumento de determinada categoria. Ele tem que ter esse cálculo em mente porque, se o Governo for bem-sucedido, ele também é bem avaliado. Agora, do jeito que nós estamos hoje...
Outro ponto, Deputado, está relacionado à defesa da tese de se aguardar os efeitos da Emenda Constitucional nº 97, de 2017. Parece-me que a Emenda Constitucional nº 97 só agrega a um sistema semipresidencialista. Então, não precisaríamos aguardar os seus efeitos, a não ser que o argumento seja o de que o presidencialismo seria governável, como um palestrante já mencionou aqui, contra todas as evidências empíricas que nós temos. Ou seja, a menos que se diga que o sistema de governo presidencialista é superior, se houver mudança no sistema eleitoral, o que não me parece ser verdadeiro, principalmente a partir das explanações da Profa. Marina Lobo na distinção entre os sistemas presidencial-parlamentar e parlamentar-presidencial, não há necessidade de aguardar esses efeitos.
São essas as considerações, Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Samuel Moreira. PSDB - SP) - Obrigado.
Nós vamos ouvir agora o Deputado Federal Marcel van Hattem. Registro a presença da Deputada Margarete Coelho aqui conosco.
Deputado Marcel, tem V.Exa. a palavra.
O SR. MARCEL VAN HATTEM (NOVO - RS) - Boa tarde, Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Samuel Moreira. PSDB - SP) - Boa tarde, Deputado Marcel.
O SR. MARCEL VAN HATTEM (NOVO - RS) - É uma satisfação participar mais uma vez de uma reunião produtiva deste grupo de trabalho.
15:22
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Quero saudar o Presidente do Conselho Consultivo, o ex-Deputado e ex-Ministro Nelson Jobim.
Eu achei muito interessante no nosso encontro de hoje tanto a menção a possíveis detalhes e problemas que nós possamos enfrentar com a implementação da PEC do Semipresidencialismo como a asseveração de que de fato o que quer que nós façamos por meio de proposta de emenda à Constituição fatalmente encontrará desafios na realidade política.
Quero aproveitar a presença da Profa. Marina para tratar de dois temas relacionados ao caso português que podem ser utilizados no Brasil como parâmetros. O primeiro tema é a relação entre Parlamento e orçamento. Nós sabemos que é função precípua do Parlamento aprovar o orçamento. Mas, no caso brasileiro — e talvez a professora não esteja tão familiarizada com o que acontece no Brasil —, conforme algumas manifestações que foram feitas em relação às emendas de Relator e ao tamanho do orçamento discricionário, esse orçamento hoje está nas mãos dos Parlamentares, e não mais nas mãos do Chefe de Governo e de Estado, que, no caso brasileiro, é a mesma pessoa. Nós vemos assim uma disfunção no orçamento da República. É isso que eu percebo hoje no Brasil.
O segundo tema é a vinculação política. Algo que normalmente vemos é que, no sistema parlamentar de governo ou semipresidencial, em geral, o Presidente da República tem menos vinculação com o partido e com a ideologia, ao passo que o Chefe de Governo tem mais vinculação, até porque é ele que vai aplicar o programa partidário ou da ampla coalizão vitoriosa na eleição.
Como conciliar as duas coisas? No Brasil, mudando de um sistema puramente presidencialista para um sistema semipresidencialista, não me parece que jamais haverá uma figura de Presidente da República de união nacional, em comparação com a figura que temos hoje ou que tivemos ontem — não importa o partido no Governo —, o que acaba gerando muitas emoções políticas, porque o Presidente da República tem filiação a uma partido, tem coloração partidária, e, obviamente, no sistema semipresidencialista ou parlamentarista, essa tendência é de diminuição do papel ideológico e programático do Presidente.
Presidente Samuel Moreira, são essas as minhas considerações, no momento, para respeitar o tempo. Deixo meus questionamentos, se quiser porventura endereçá-los.
Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Samuel Moreira. PSDB - SP) - Obrigado, Deputado Marcel van Hattem.
Nós vamos então voltar a palavra aos expositores pela ordem inversa.
Profa. Marina, a senhora está preparada para fazer as suas considerações? (Pausa.)
Depois, falarão o Prof. Nelson e a Profa. Lara, que está aqui ao meu lado, e fará as últimas considerações.
Antes eu queria fazer uma pergunta para a Deputada Margarete Coelho: V.Exa. quer fazer uma consideração agora? Posse lhe conceder a palavra entre as falas dos expositores também.
15:26
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A SRA. MARGARETE COELHO (PP - PI) - Eu vou acompanhando por aqui.
O SR. PRESIDENTE (Samuel Moreira. PSDB - SP) - Está bem. Quando V.Exa. quiser falar, eu lhe concedo a palavra.
Concedo a palavra à Sra. Marina Costa Lobo.
A SRA. MARINA COSTA LOBO - Estou pronta, com certeza, com todo o gosto.
Eu agradeço pelas questões que foram colocadas e por esta oportunidade para conversar e trocar ideias convosco nesta sessão.
O que eu gostaria de dizer? Primeiro, a questão da coabitação é de fato apontada como um problema no semipresidencialismo. Mas eu acho que a questão da coabitação é problemática quando o Presidente da República quer tutelar, de alguma forma, o Governo e o Primeiro-Ministro, quando esses dependem politicamente do Presidente da República, porque nessa altura surgem os problemas.
Por exemplo, na França, Macron foi eleito. Agora, se houver eleições legislativas e, por hipótese — as sondagens não indicam isso —, Marine Le Pen tiver maioria absoluta, ou o seu partido tiver maioria absoluta, ela formará o Governo e será a Chefe de Governo, e Macron ficará com os seus poderes muito reduzidos. Por quê? Porque Macron é um líder partidário, e ele quer acumular a chefia do Estado com tutela da chefia do Governo.
No caso português, essa questão não se coloca. Por quê? Nós temos o Presidente da República Marcelo Rebelo de Sousa, que não é líder partidário, que não se candidatou, enquanto líder partidário, a Presidente da República. Ele é um político partidário, mas já não era líder quando se candidatou. O líder partidário António Costa é o Chefe de Governo e Primeiro-Ministro. Portanto, nós temos hoje essa coabitação e temos tido coabitações.
No regime parlamentar-presidencial em que o Primeiro-Ministro não depende da confiança do Presidente da República, essa coabitação não é problemática, porque é muito claro que o Chefe de Governo é o Primeiro-Ministro e que ele depende da confiança da Assembleia da República. Inclusive, a coabitação, nessa situação, é positiva. Por quê? Porque os portugueses votam para a Presidência da República e para o Parlamento. E os portugueses de direita veem-se representados no Presidente da República, e os portugueses de esquerda, do partido socialista e outros mais à esquerda, veem-se representados no Governo. Então há uma representatividade maior. Essa coabitação não é problemática porque não há vontade do Presidente da República de governar através do Primeiro-Ministro. Por isso eu foquei tanto, na minha apresentação, a relação entre Presidente da República e Primeiro-Ministro.
Faço um parêntese para dizer que no caso francês não é que a Constituição francesa seja tão diferente da Constituição portuguesa. A questão é que, do ponto de vista genético, a Presidência da República foi sempre o lugar das lideranças partidárias. De Gaulle imprimiu esse funcionamento e assim tem continuado. Portanto, tem bastante a ver com a evolução do sistema partidário e o lugar dos líderes partidários no sistema semipresidencial. Essa é para falar sobre a questão da coabitação.
15:30
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Em relação à questão do orçamento, eu entendi pela vossa discussão que há uma grande necessidade de racionalizar o trabalho do Congresso, da Câmara dos Deputados, até por conta da questão das emendas ao orçamento, do aumento do déficit etc. Essa é uma questão importante.
Portugal tem tido graves problemas orçamentais e de finanças públicas. Inclusive, tivemos que pedir um empréstimo ao FMI muito recentemente, como sabem, em 2011. Nós estamos inseridos no Programa de Estabilidade e Crescimento, pois fazemos parte do Euro, como sabem. Existe uma regra de ouro que tem que ser supostamente respeitada. Essa regra obriga que não haja déficits, que o orçamento não seja deficitário. Essa regra de ouro tem sido violada em Portugal por várias razões. Mas essa regra foi imposta, digamos assim, no contexto da nossa pertença da Zona do Euro, que vincula os grupos parlamentares a uma certa contenção do ponto de vista orçamental. Essa é uma realidade que existe, salvo erro, desde 2004. Pelo menos é uma realidade do ponto de vista do enquadramento. A realidade no sentido da prática pode, depois, variar.
Em relação à vinculação política ou ideológica do Presidente da República, eu já disse que nós temos tido coabitação em Portugal e que isso é visto com normalidade, até positivamente, porque não há luta em termos de poderes entre o Presidente da República e o Primeiro-Ministro. A vinculação ideológica do Presidente da República é sempre encarada como tendo que ser mais abrangente do que a do Primeiro-Ministro. O Presidente da República tem que ser eleito por maioria absoluta dos portugueses, e, se não for eleito à primeira volta, organiza-se uma segunda volta, em que se apresentam dois candidatos, para que um deles seja eleito pela maioria dos portugueses. O Chefe de Governo é o líder partidário do partido mais votado, mas pode não ter uma maioria absoluta do seu partido no Parlamento — e muitas vezes não o tem, porque temos governos minoritários ou temos governos de coligação. A lógica de posicionamento ideológico do Primeiro-Ministro em Portugal é mais partidária e também tem a ver com o fato de se comprometer com políticas públicas concretas, enquanto o Presidente tenta ser o mais abrangente possível, sobretudo no primeiro mandato, porque está em busca da reeleição. Este precisa ser eleito com a maioria absoluta e, depois, quando busca a reeleição, quer aumentar essa maioria e, portanto, tenta ser o mais abrange possível.
Obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Samuel Moreira. PSDB - SP) - Eu que a agradeço.
Agora eu vou passar a palavra à Dra. Lara Mesquita, para que também faça suas considerações. Quero lembrar que o prazo são 5 minutos. Podemos ter uma tolerância, mas são 5 minutos. Logo após, nós ouviremos o Dr. Nelson Matos, que fará suas considerações.
Quero lembrar também que, sempre após as audiências públicas, fazemos uma reunião de Deputados e conselheiros. Nós fazemos uma reunião específica para avaliar toda a audiência pública.
15:34
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Com a palavra a Dra. Lara.
A SRA. LARA MESQUITA - Vou começar do final, só para reforçar um ponto mencionado pela Dra. Marina Lobo.
Parece que o que está sendo desenhado na proposta do Deputado Samuel Moreira é a principal questão da coabitação. Pelo que pude compreender da proposta que eu vi, estamos desenhando um sistema em que a responsabilidade da prestação de contas do Primeiro-Ministro e do gabinete de Ministros é dividida entre o Presidente e o Parlamento. E aí, sim, você tem um problema: a coabitação pode gerar paralisia e instabilidade institucional.
Talvez seja o caso de repensar esse desenho ou repensar a adoção de alguns instrumentos, como é o exemplo da experiência francesa. Depois de seguidos governos de coabitação, decidiu-se fazer uma reforma política mudando o tempo dos mandatos e criando um desenho que favorecesse governos unipartidários e não de coabitação, justamente porque governos de coabitação, como o Deputado falou, dependem da boa vontade ou da personalidade de quem exerce o governo. Se temos figuras comprometidas com a democracia e com o desenvolvimento social e que, mesmo pertencendo a forças políticas diferentes, grupos ideológicos diferentes, sendo oposição, entendem que podem colaborar, podemos, sim, ter um governo de coabitação que funcione bem. A França tem experiências disso. Mas depende muito das figuras. Se queremos um mecanismo institucional que barre figuras inconsequentes, essa é uma preocupação que temos que levar em conta.
O Deputado Enrico Misasi disse: "Nós já não vivemos num sistema de coabitação informal?" Eu diria que não, porque, por mais poderoso que seja o Presidente da Câmara, ser Presidente da Câmara é diferente de ser Primeiro-Ministro. Os papéis são diferentes. E a grande questão aqui é esta: mudar o sistema de governo vai resolver os problemas que estamos identificando?
Algumas perguntas que o Prof. Nelson Juliano fez são fundamentais para responder a isso. Quem serão os Ministros? Serão os Deputados? Nós vamos ter um sistema como o inglês, em que os Ministros estão o tempo todo no Parlamento discutindo com os seus colegas as leis que estão sendo aprovadas e a agenda de governo? Se não for assim, não muda nada, o sistema de governo não resolve. A captura — não sei se esta é a palavra adequada —, o aumento do controle do orçamento pelo Congresso e, mais do que isso, a falta de transparência na execução orçamentária podem continuar existindo em qualquer sistema de governo. A mudança de governo não resolve esse problema.
Então, eu preciso pensar qual é a solução para o problema que eu de fato quero resolver. E não é menor essa questão da decisão de quem são os Ministros e se eles continuam exercendo o seu papel de Parlamentar ou não, se queremos pensar nessa efetiva responsabilização do Parlamento sobre a agenda, sobre o sucesso e sobre a execução orçamentária.
15:38
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Eu ainda tenho aqui 1 minuto e meio. Quero registrar que o principal problema quando nós fazemos uma reforma institucional é que ela traz consigo consequências não previstas. Ela não ocorre assim: "Ah, eu vou mudar o sistema de Governo, e isso só vai alterar a forma como se relacionam o Executivo e o Legislativo". Isso não é verdade. Nós sabemos que toda alteração institucional traz consigo consequências não previstas.
Então, de uma maneira geral, o consenso, não entre os políticos, que são os efetivos reformadores, mas os analistas de reformas, é de que só se faz uma reforma se estiver claro que ela vai trazer uma solução e uma condição melhor que a atual. Se eu vou mudar para o semipresidencialismo só para ficar mais confortável com a situação que já está operante, qual é o ganho que tenho com isso, dadas todas as consequências imprevistas que a mudança pode trazer? Eu acho que essa é a pergunta. Agora, se nós temos um sistema bem desenhado e um diagnóstico benfeito e temos a clareza de que essa solução vai de fato nos deixar em uma situação melhor que a atual, tudo bem.
Mas as questões apontadas aqui não me parecem que são solucionadas com a mudança do sistema de governo. Eu estudo sobretudo o sistema eleitoral, com o qual isto acontece o tempo todo: é feito um diagnóstico de um problema e é proposta uma mudança institucional que não resolve o problema que está sendo diagnosticado.
Então, este é o principal desafio de V.Exas., nobres Deputados e Senadores, que vão analisar isso: fazer uma análise muito cautelosa e cuidadosa, sim. Quais são os nossos problemas e quais sãos os mecanismos presentes nos artigos dessa proposta de emenda constitucional que vão de fato solucionar esses problemas? Será que eu estou apenas fazendo uma grande reforma para prestar contas, seja porque é preferência individual de alguém, seja porque acho que vai apaziguar a relação com a sociedade? Se for assim, no fundo, as coisas vão continuar exatamente como estão.
Obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Samuel Moreira. PSDB - SP) - Vamos passar a palavra ao Dr. Nelson Juliano.
O SR. NELSON JULIANO CARDOSO MATOS - Obrigado, Deputado Samuel Moreira.
Eu queria fazer uma saudação aos demais Deputados presentes, pois não a fiz no início: o Deputado Enrico, o Deputado Marcel e, especialmente, a Deputada Margarete Coelho, que está aqui conosco.
Quero ponderar alguns aspectos. Nós estamos praticamente discutindo sobre coabitação, mas registro que esta ênfase na coabitação é um aspecto do problema, que é muito complexo e tem vários aspectos. Ficamos atentos a esse aspecto apenas porque o tempo é reduzido. Eu acho que as duas outras palestrantes vão concordar comigo que isso é só um aspecto da questão, pois há vários outros elementos que não trouxemos à mesa, mas que, é claro, em outra oportunidade, será possível trazê-los.
15:42
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Eu queria enfatizar a questão dos detalhes ponderando dois momentos, imediato e longo prazo. Vamos imaginar que adotemos o modelo semipresidencialista. Que efeitos ou problemas já teríamos no primeiro momento? Eu apostaria que a população brasileira, muito acostumada com o presidencialismo, muito acostumada com o Presidente, estranharia ter um presidente mais fraco que um primeiro-ministro, especialmente um presidente eleito. Eu apostaria que as nossas primeiras experiências seriam experiências de um governo de coabitação, em que o Primeiro-Ministro seria rival do Presidente, ou de uma aliança, em que há uma coalizão fluida entre o Primeiro-Ministro e o Presidente da República.
Então, o primeiro problema que eu vejo é: se nós adotarmos, por exemplo, o voto de investidura, podemos ter a primeira crise no primeiro dia de Governo, com a incapacidade de termos um primeiro-ministro, porque não teremos um consenso entre a maioria parlamentar e o Presidente da República. Então, como é muito comum a impossibilidade de dissolução do Parlamento no primeiro ano ou mesmo a demissão do Primeiro-Ministro no primeiro ano, nós podemos ter uma crise sem solução institucional, porque teríamos que aguardar o prazo para isso. Essa é a razão da minha cautela com os detalhes.
Portanto, de forma imediata, nós teríamos um presidente que quer exercer o seu poder, porque foi eleito por voto direto, e que, provavelmente, se sentirá superior a um primeiro-ministro, que não foi eleito. Esta tensão será inevitável.
Vamos pegar o caso português. À distância em que estou, parece-me que, hoje, o Presidente da República em Portugal é eleito sabendo que não vai governar, sabendo que não vai entrar nas questões menores e não querendo entrar nas questões menores, porque ele é o que está acima dos conflitos.
No Brasil, nós teremos um presidente que, mesmo que a Constituição diga que não, vai querer mandar. Na verdade, é um teste. Parece que a nossa regulamentação tem que prever esta possibilidade.
E o caso francês? Se os senhores olharem com atenção a primeira coabitação francesa, que é a coabitação da Presidência Mitterrand, verão que ela não foi bem solucionada. Vai haver uma solução um pouco mais aceitável na segunda coabitação, que é a coabitação da Presidência Chirac, mas porque o Partido Socialista destruiu eleitoralmente o partido de Chirac. Portanto, havia uma maioria claramente consolidada para tudo isso.
Nos 30 segundos que me restam, eu queria também ponderar em termos de longo prazo. Vamos imaginar um semipresidencialismo que de fato enfraqueça o Presidente. Com o enfraquecimento do Presidente, nós teremos um ponto de força, que é o Primeiro-Ministro com maioria parlamentar. Imaginemos um sistema de poucos partidos, em que o Primeiro-Ministro é o presidente de um deles, que não tem mandatos para terminar e é dono de partido porque tem o controle partidário. Então, no lugar de um presidente forte — estou pensando em longo prazo, daqui a 10, 20 ou 30 anos —, nós teremos o inverso, um primeiro-ministro extremamente forte, sem ter um Parlamento para lhe opor, sem ter um presidente para lhe opor, porque os Poderes Executivo e Legislativo estão concentrados numa coalizão entre presidente, partido e Parlamento.
15:46
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Eu não estou sendo, de forma alguma, contra o semipresidencialismo, estou como advogado do diabo, antecipando eventuais problemas que possam acontecer.
Queria muito parabenizar a proposta do Deputado Samuel Moreira, especialmente o art. 2º, que foi a parte que mais me impressionou. Se vamos adotar o semipresidencialismo, temos que preparar o caminho, e o art. 2º é uma ideia muito bem engendrada para atingirmos isso.
Deputado, desculpe-me por ter me estendido no prazo, mas estou bastante satisfeito com o debate e com a qualidade dos Parlamentares que estão aqui conosco.
O SR. PRESIDENTE (Samuel Moreira. PSDB - SP) - Nós é que agradecemos.
Deputada Margarete, V.Exa. quer fazer alguma consideração? (Pausa.)
O SR. NELSON JOBIM - Deputado Samuel, eu poderia fazer uma observação?
O SR. PRESIDENTE (Samuel Moreira. PSDB - SP) - Lógico. O senhor está com a palavra.
O SR. NELSON JOBIM - Deputado Samuel, nós precisamos ter cautela na análise de objeções. Isso me faz lembrar o Prof. Albert Hirschman, quando ele dizia que as reações às reformas surgem da tese da perversidade, ou seja, de que a reforma irá exacerbar a situação que se deseja remediar, ou da tese da futilidade, de que todas as reformas acabam sendo infrutíferas porque se mantém tudo igual.
Eu creio que nós precisamos experimentar. Não podemos pretender antecipar consequências. Não temos condições de dizer que esta solução vai ser a ótima. A solução ótima surge do processo político, o qual é exatamente uma forma de conseguir consenso na solução de dissensos. E é isso que vai avançando na situação política.
As exposições de hoje foram excelentes no sentido das advertências. Eu apenas acho que precisamos ter cautela para satisfazer as advertências e não recebê-las como impeditivas de um processo de reforma.
Obrigado, Deputado Samuel Moreira.
O SR. PRESIDENTE (Samuel Moreira. PSDB - SP) - Agradeço muito a sua consideração, Sr. Nelson Jobim.
Eu iria fazer uma consideração exatamente nesse sentido. Nós analisamos o nosso sistema presidencialista com os seus graves problemas. Nós já tivemos Presidente que se suicidou, tivemos Presidente que renunciou, tivemos períodos de ditadura, tivemos Presidentes sem votos, Presidentes que não foram eleitos pelo povo nos regimes de ditadura, tivemos, recentemente, dois pedidos de impeachment de Presidentes, tivemos um certo desejo, várias vezes, por alguns golpes. O nosso presidencialismo, o poder monocrático acaba ou se fragilizando demais para ser golpeado ou se fortalecendo demais para dar o golpe. Então, isso é muito monocrático.
15:50
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Os números hoje mostram o aumento de vetos e o aumento da derrubada de vetos. Há um distanciamento do Parlamento.
Vejam o número de alterações de Ministros. Só neste Governo, foram alterados 28 Ministros, uma coisa em ebulição.
O Orçamento é feito praticamente com a força do Parlamento, é um Orçamento parlamentarista em um regime presidencialista.
Então, nós temos absoluta convicção e segurança de que o nosso sistema não se trata só de que governo será. Temos que ter cuidado realmente. Por exemplo, na nossa proposta, não há alteração na nomeação de Ministros, sejam quais forem, Ministro de Pasta ou Primeiro-Ministro. Não há objeção: o Presidente indica o Ministro, desde que ele tenha mais de 35 anos de idade, sem precisar ser um Parlamentar necessariamente.
Não se trata de quem será Ministro, mas, sim, de modelo de governança, de como podemos criar um sistema de governança melhor do que este que está aí, sem qualquer receio de dizer que há necessidade de mudança e de buscar modelos como perspectivas e como alternativas ao presidencialismo. Nós não acreditamos mais que o presidencialismo consiga superar um país com 213 milhões de habitantes. Não acreditamos mais nessa possibilidade.
Não temos receio nenhum de acertar nas decisões, desde que façamos isso com perspectiva, com os pés no chão, com esperança de que nós vamos realmente melhorar a nossa governança, vamos ir para um modelo que vai melhorar a nossa governança sobretudo.
Então, quais serão as consequências? Serão de melhoras, o que nós temos que prever. "Ah, mas as consequências podem não estar previstas." Então, vamos prevê-las. Evidentemente, em todas as reformas, temos que prever as consequências e fazer, necessariamente, melhoras no processo no decorrer do tempo.
Como acabou de explicar a nossa expositora, a Dra. Marina Costa Lobo, Portugal evoluiu para poder conter outros problemas que ocorreram no processo. A França também buscou melhorias para resolver a questão da coabitação. Com todos esses exemplos, nós estamos tendo a possibilidade de ver e verificar um sistema semipresidencialista, que é novo, é do século passado. Nós estamos assistindo à evolução da governança de pouco para cá, em vez de ficarmos com o nosso sistema de 133 anos, com tantas crises e tantos problemas.
Enfim, o objetivo não é retomar a discussão, mas agradecer demais aos palestrantes e todos que participaram aqui conosco. Acho que esse foi um dia muito especial para nós, pois pudemos observar e refletir sobre todas as questões pontuadas por todos. Agradeço muito a presença de vocês.
Vou dar sequência à nossa reunião, pois iremos passar à deliberação de alguns requerimentos constantes da pauta.
Eu queria pedir à Deputado Margarete Coelho que assumisse a Presidência. Temos apenas três requerimentos que serão apreciados e, depois, vamos partir para o encerramento.
Mais uma vez, agradeço muito mesmo à Dra. Lara Mesquita, ao Dr. Nelson Juliano e à Dra. Marina Costa Lobo.
15:54
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Muito obrigado, Dra. Marina, por sua participação aí de Portugal.
Nós agradecemos demais aos três convidados pelas palestras e pelas considerações. Muito obrigado.
A SRA. PRESIDENTE (Margarete Coelho. PP - PI) - Passamos, então, à deliberação dos requerimentos constantes da pauta.
Item 1. Requerimento nº 23, de 2022, de autoria do Sr. Deputado Luiz Philippe de Orleans e Bragança, que requer que seja convidado o Sr. João Henrique Hummel Vieira, Diretor da Action Relações Governamentais, para a audiência pública que irá debater o sistema de governo semipresidencialista no Brasil.
Eu não sei se o nobre Deputado está conosco. Se estiver, S.Exa. tem a palavra por 3 minutos, para fazer o encaminhamento de sua solicitação. (Pausa.)
Não estando presente S.Exa., eu submeto o requerimento à votação.
Os Srs. e as Sras. Parlamentares que o aprovam permaneçam como se encontram. (Pausa.)
Aprovado.
Item 2. Requerimento nº 24, de 2022, de autoria do Sr. Deputado Samuel Moreira, que requer que seja convidado o Sr. José Levi Mello do Amaral, professor da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, para a audiência pública que irá debater o sistema de governo semipresidencialista no Brasil.
Passo a palavra a S.Exa. para que possa encaminhar a votação do seu requerimento.
O SR. SAMUEL MOREIRA (PSDB - SP) - Presidente, esta é só mais uma sugestão de nome que nós gostaríamos que os Deputados apreciassem.
A SRA. PRESIDENTE (Margarete Coelho. PP - PI) - Submeto, então, à votação o requerimento do Sr. Deputado Samuel Moreira.
Os Srs. Deputados e as Sras. Deputadas que o aprovam permaneçam como se encontram, os que forem contrários queiram se manifestar, por favor. (Pausa.)
Aprovado.
Item 3. Requerimento nº 25, de 2022, também de autoria do Sr. Deputado Samuel Moreira, que requer que seja convidado o Sr. Marcelo Leonardo Tavares, professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, para a audiência pública que irá debater o sistema de governo semipresidencialista no Brasil.
Examino se o autor pretende encaminhar. (Pausa.)
Como o encaminhamento se prende exatamente à oportunidade de ouvirmos o Prof. Marcelo Leonardo, eu submeto o requerimento a votação dos Srs. e Sras. Parlamentares.
Os Deputados e as Deputadas que o aprovam permaneçam como se encontram, os contrários queiram se manifestar. (Pausa.)
Aprovado.
Devolvo, então, à Presidência dos trabalhos ao Sr. Deputado Samuel Moreira, para o encaminhamento dos feitos.
O SR. PRESIDENTE (Samuel Moreira. PSDB - SP) - Nada mais havendo a tratar, vou encerrar os trabalhos, antes convocando reunião extraordinária para a próxima quarta-feira, dia 4 de maio, às 14 horas, para debate de uma possível implantação do sistema de governo semipresidencialista com o Conselho Consultivo deste Grupo de Trabalho. Trata-se de uma reunião do Conselho Consultivo.
Mais uma vez, agradeço especialmente a presença da Dra. Lara, do Dr. Nelson e da Dra. Marina.
Quero dizer da nossa expectativa muito tranquila, sem atropelar nada e fazendo bons debates. Com muita tranquilidade, queremos debater um novo modelo de governança, um novo sistema de governo para o nosso País.
Até a próxima reunião.
Muito obrigado a todos.
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