3ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA 56 ª LEGISLATURA
Comissão de Educação
(Audiência Pública Extraordinária (semipresencial))
Em 25 de Novembro de 2021 (Quinta-Feira)
às 14 horas
Horário (Texto com redação final.)
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A SRA. PRESIDENTE (Professora Rosa Neide. PT - MT) - Boa tarde àqueles e àquelas que nos acompanham pelos meios de comunicação da Câmara dos Deputados.
Neste momento, declaro aberta a presente reunião extraordinária de audiência pública da Comissão de Educação, atendendo ao Requerimento nº 147, de 2021, de minha autoria, aprovado em 1º de setembro de 2021, para discutir a história e avaliação do Plano de Ações Articuladas — PAR.
Informo que esta reunião de audiência pública é exclusivamente virtual.
A Mesa de debates é composta pelos seguintes convidados: José Henrique Paim Fernandes, ex-Ministro da Educação, professor da Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas da FGV e consultor em educação do Banco Interamericano de Desenvolvimento — BID; Paulo Speller, professor emérito da Universidade Federal de Mato Grosso — UFMT, reitor da UNILAB, de 2010 a 2014, Secretário de Educação Superior e Secretário-Geral da Organização dos Estados Ibero-Americanos para a Educação, a Ciência e a Cultura — OEI, de 2015 a 2018; Silas Borges Monteiro, doutor em educação pela Universidade de São Paulo — USP e professor da Universidade Federal de Mato Grosso — UFMT, membro do Grupo de Estudos e Pesquisas sobre a Formação de Educador e membro do GT de Didática da ANPED. Também temos aqui conosco Romeu Caputo, que também faz parte do quadro da FGV, atuou no Ministério da Educação com diversos projetos e foi Presidente do FNDE.
Inicialmente, cumprimento todos os presentes e, em especial, os senhores expositores, aos quais agradeço muito por terem aceitado o convite de fazer essa avaliação.
Como regra geral, peço a todos que mantenham os seus microfones desligados e os abram apenas quando forem usar da palavra. As câmeras devem, sempre que possível, ficar ligadas.
Informo, ainda, que a reunião está sendo gravada para posterior transcrição.
Destaco que o Plano de Desenvolvimento da Educação — PDE, apresentado pelo MEC em 2007, na gestão do Ministro Fernando Haddad — e sempre com a forte presença do Presidente do FNDE, do Secretário-Executivo e também do Ministro Henrique Paim e de Romeu Caputo, quadro atuante tanto no MEC quanto no FNDE —, fortaleceu a coordenação federativa, a cooperação entre os entes e a avaliação e implementação de políticas para melhoria da qualidade da educação.
A partir de então, de forma absolutamente republicana, os entes federativos passaram à elaboração de seus respectivos Planos de Ações Articuladas, estratégia de assistência técnica e financeira e instrumento de diagnóstico e planejamento estratégico da política educacional, que, formalmente, colabora para a construção de uma agenda instituinte de um Sistema Nacional de Educação. Essa agenda de um Sistema Nacional de Educação foi muito fortalecida no momento em que, estrategicamente, o PAR esteve em ação.
O PAR, observadas as metas, diretrizes e estratégias do Plano Nacional de Educação — PNE, é um planejamento plurianual em que os entes subnacionais elaboram um plano de trabalho para desenvolver ações que contribuam para a ampliação da oferta, permanência e melhoria das condições escolares em todas as suas dimensões.
Nesse sentido, a promoção de uma exposição dialogada sobre como foi a implantação do PAR no País, uma apreciação coletiva sobre o PAR, enquanto macropolítica educacional, pretende atualizar e reposicionar atores das políticas públicas sobre o destino do PAR, a história e sua contribuição para a educação do País.
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Para o melhor ordenamento dos trabalhos, adotaremos os seguintes critérios: será concedida a palavra aos nossos expositores convidados por 10 minutos. Se houver necessidade de prorrogação, a Mesa assim o fará. Talvez faremos dois blocos bastante objetivos, e o Prof. Silas, nosso convidado aqui, que é um dos organizadores dessa atividade, dinamizará por orientações e questões os expositores.
O debate poderá ser aberto ao final das indagações e contribuições. As perguntas entre os debatedores e a Mesa deverão se restringir ao assunto da exposição. Cada Deputado inscrito poderá falar por até 3 minutos. As questões podem ser feitas usando na plataforma o "levantar a mão" no Zoom.
Informo que esta audiência interativa está sendo transmitida ao vivo pela Internet, tendo sido aberto um chat para a participação dos internautas, que poderão enviar suas perguntas aos palestrantes. Os internautas podem votar nas perguntas, e as que forem mais bem ranqueadas, a depender do tempo disponível, também serão apresentadas aos palestrantes.
Vamos passar à nossa dinâmica.
Em primeiro lugar, vou conceder a palavra ao Prof. Silas Borges Monteiro para uma breve e rápida introdução e para apresentar algumas questões aos participantes da Mesa em torno de quatro aspectos: primeiro, concepção do PAR; segundo, avaliação da implementação do plano; terceiro, análise das políticas atuais quanto ao financiamento e aos programas da educação; e quarto, possibilidades e perspectivas de futuro para as políticas educacionais.
Na sequência, através do Prof. Silas, vamos trabalhar com o ex-Ministro José Henrique Paim, com o Romeu Caputo e com o Prof. e Reitor Paulo Speller. Nós vamos tentar fazer, Prof. Silas, em dois blocos. Em razão do limite do tempo do Ministro Paim, nós vamos fazer também de forma que ele possa fazer as suas considerações e aquilo que julgar oportuno no final.
Gostaria, inicialmente, como autora do requerimento, com base nas indagações formuladas pelo Prof. Silas, de passar a palavra ao Prof. Silas para os encaminhamentos, a fim de dar início às nossas atividades.
Sejam todos bem-vindos.
O SR. COORDENADOR (SILAS BORGES MONTEIRO) - Obrigado, Deputada Professora Rosa Neide pelo espaço e por organizar esta audiência pública, retomando questões que julgo que são fundamentais, por certo, a partir de uma experiência subjetiva que vi no PAR, uma das propostas mais racionais e republicanas já feitas neste País em termos de financiamento e articulação dos entes federados. Agradeço muito a possibilidade de organizar esta audiência.
Inicialmente, meus comprimentos à Deputada Rosa Neide, de Mato Grosso, por organizar esta atividade, ao Ministro José Henrique Paim e ao Prof. Paulo Speller.
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Agradeço particularmente ao Alisson Araújo, à Eliana e à Terezinha, que nos ajudaram na organização dessa atividade, e também a um estudante que trabalha comigo do curso de psicologia, o Mateus, que acompanhou todo esse processo.
O meu nome é Silas, eu sou professor da UFMT desde 1995 e, entre as diversas atividades acadêmicas que desenvolvi nesses anos, tive a oportunidade de coordenar pela UFMT a implantação do PAR do ano de 2007 até o ano de 2010. E, como eu disse, para mim foi um dos mais importantes planos de Governo e de Estado e de política de Estado de que tenho conhecimento. Sua proposta era institucionalizar uma estratégia de assistência técnica e financeira aos Municípios, atendendo, desse modo, a todos os entes federados com instrumento de diagnóstico e planejamento de políticas para gerenciar as metas da educação. Especificamente da minha participação, no período de 2007 a 2010, nesse projeto com a UFMT, resultaram três livros, quatro capítulos de livros, quatro dissertações de mestrados e uma tese de doutorado, justamente tendo como foco esse movimento da implantação de uma política pública, ao mesmo tempo combinado com a pesquisa.
A dinâmica que se deu ao PAR, especificamente no universo que me alcançou como coordenador da implementação, se deu por conta do encontro efetivo de três atores ou três instituições que eu gostaria de neste momento trazer um pouco para ouvi-los, por certo: a iniciativa do Ministério da Educação; a intensa e contundente participação da Secretaria de Estado de Educação, naquele momento com a Professora Rosa Neide, como a Secretária; e a universidade, justamente tendo o Prof. Paulo Speller como Reitor.
Então, eu não farei uma exposição, mas gostaria de ouvi-los e, se permitirem, vou intercalando a palavra dentro dessa dimensão.
Inicialmente, eu gostaria de ouvir do Prof. Paim como foi esse processo de concepção e elaboração da implementação do PAR. Pergunto também ao Prof. Paulo Speller como foi o processo de adesão da UFMT ao PAR. Da Professora Rosa Neide, gostaria de ouvir como foi o processo de trabalho internamente pela SEDUC, quais as expectativas iniciais e as dificuldades e o que foi colocado em questão para a implementação.
Então, por favor, se o Prof. Paim puder começar, agradeço.
O SR. JOSÉ HENRIQUE PAIM FERNANDES - Boa tarde a todos.
Eu queria agradecer, em primeiro lugar, o convite, a oportunidade de podermos falar sobre um tema tão importante, tão relevante. Queria cumprimentar especialmente a nossa Deputada Professora Rosa Neide, o Paulo Speller, o Romeu Caputo — o Romeu especialmente foi uma pessoa que trabalhou de forma bastante intensa na formulação do PAR e na operacionalização também.
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Gostaria de cumprimentar também o Prof. Silas Borges Monteiro e destacar que fiquei muito feliz de ouvir esses resultados obtidos dentro da Universidade Federal do Mato Grosso. Fiquei muito feliz quando vemos que há exatamente esse registro.
A iniciativa da Deputada Rosa Neide vai também nessa direção de podermos registrar essas inovações em política pública. Muitas vezes elas são formuladas e implementadas, mas não temos registro. Então, é muito importante que tanto a academia quanto o Congresso Nacional possam fazer esse registro, para que possamos, ao longo do tempo, aprimorar essas políticas públicas, que, é claro, precisam. Como sempre falamos em relação a gestão pública, o processo de melhoria é permanente.
Eu começaria dizendo que, na realidade, o PAR veio a partir exatamente do que foi dito aqui pela Deputada Rosa Neide, que foi a criação do Plano de Desenvolvimento da Educação. O Plano de Desenvolvimento da Educação era um grande plano, que envolvia uma mudança expressiva na educação brasileira, envolvia uma visão sistêmica de educação, com aquela discussão de que deveríamos atender da creche à pós-graduação.
Na educação básica, o objetivo era justamente organizar o processo todo de mobilização e de assistência técnica e financeira do Ministério da Educação. Para fazer isso, era muito importante que tivéssemos um diagnóstico de como era o padrão de relacionamento entre o Ministério da Educação, os Estados e os Municípios.
Quando fizemos isso, vimos o quê? Vimos que, na realidade, a partir do levantamento que tínhamos do IDEB, que, em 2005, começou a ser construído em razão de termos implementado a Prova Brasil... Eu diria que esse levantamento foi um divisor de águas na educação brasileira, porque passamos a ter uma avaliação universal e conseguimos, a partir dessa avaliação universal, criar um indicador combinado com o rendimento escolar. Isso fez com que tivéssemos avaliações por sistemas de ensino e por escolas. Então, essa avaliação por sistema de ensino e por escola é que permitiu que tivéssemos uma verdadeira radiografia da educação básica brasileira, o que se tornou um grande diferencial.
Quando cruzamos os Municípios que tinham menor IDEB com a assistência técnica e financeira do MEC, chegamos a uma conclusão muito ruim: verificamos que aqueles Municípios que mais precisavam de apoio eram os que tinham menos recebido recursos do Ministério da Educação, por uma série de razões, dentre as quais a forma como o MEC se relacionava com os Municípios e com os Estados.
Resolvemos, então, fazer uma mudança importante: primeiro, permitir que as demandas que chegassem ao Ministério da Educação fossem multidimensionais. Como conseguimos enxergar de forma ampla e de forma multidimensional qual era a situação daquele Município? Então, começamos a trabalhar nessa direção, a trabalhar com a ideia de construir um diagnóstico, um bom diagnóstico. Esse diagnóstico partia dessa visão multidimensional.
Na época, lincamos quatro dimensões: a dimensão de gestão, de práticas pedagógicas e avaliação, formação de professores e infraestrutura.
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A partir daí, construímos questionários para identificar quais eram os reais problemas daqueles Municípios e Estados. Esses questionários eram como uma Escala de Likert, ou seja, dependendo da resposta que o Município dava — havia uma escala de 1 a 4 —, a gente via que 1 era o pior e 4 era o melhor. Então, as perguntas traziam sempre essas quatro possibilidades de respostas.
Fomos fazendo isso e, a partir daí, construímos os indicadores do PAR. A partir desses indicadores, começamos a verificar que, para cada questionamento feito e resposta dada, poderia ser definida uma ação potencial que faria parte, depois, do que chamaríamos de plano de ação. Inclusive, o nome do PAR tem muito a ver com isso: Plano de Ações Articuladas. Ou seja, a partir de um diagnóstico feito pelo próprio Município — e a ideia, o incentivo que o MEC dava era que esse diagnóstico fosse feito com um número significativo de pessoas da própria Secretaria ou de várias áreas da Secretaria Municipal de Educação ou Secretaria Estadual de Educação —, teríamos a situação real do Município ou do Estado.
A partir disso, criamos o PAR, que se transformou em um instrumento importante. E conseguimos um objetivo importante, que foi organizar a demanda dos Municípios junto ao Ministério da Educação. Se o Município tinha que responder um questionário e, a partir deste, das respostas que ele dava, definir suas ações, passamos a ter uma qualificação na demanda de assistência técnica e financeira junto ao Ministério da Educação.
Por outro lado, a melhoria dessa demanda junto ao Ministério fez com que o Ministério da Educação também pudesse rever as suas ações de assistência técnica e financeira, porque passamos então, a partir desse diagnóstico e dessas ações que eram definidas, a rever todo o nosso processo interno. E aí se passou também por um processo de planejamento interno, para que definíssemos as ações que seriam mais efetivas para que houvesse um bom atendimento a esses Estados e Municípios.
É muito importante destacar que a nossa preocupação é de que esse plano fosse plurianual, que ultrapassasse as gestões. Era muito importante que ele tivesse um processo participativo e que conseguíssemos de alguma forma — e este é um diferencial — fazer uma pactuação entre o MEC e os Estados e Municípios para aquilo que seria apoiado pelo Ministério da Educação e aquilo que seria apoiado com recursos do Estado e do Município.
E, obviamente, temos que fazer uma separação aqui: no caso das Secretarias Estaduais de Educação, dado o número — estamos falando de 26 e mais o Distrito Federal, ou seja, 27 Secretarias de Educação —, era possível fazer essa pactuação em reuniões no Ministério da Educação.
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Então, fazíamos reuniões com os Secretários de Educação, para fazer essa pactuação, e com todos os técnicos da Secretaria que podiam ir a Brasília. Nós nos reunimos em uma mesa, colocávamos lá todos os secretários do MEC para fazer uma discussão em torno do PAR. Foram reuniões exaustivas — o Romeu participou de todas — e, em alguns casos, chegamos a ficar por 7 ou 8 horas discutindo. O Romeu, depois, até vai lembrar que algumas reuniões duraram quase o dia inteiro. E fazíamos ali uma pactuação.
Depois, com os Municípios, não tínhamos essa possibilidade de fazer reuniões no Ministério da Educação. Então, fizemos o quê? Criamos um Guia Prático de Ações, e a pactuação se dava dentro do próprio sistema. O que ancorou todo esse processo foi um sistema eletrônico.
É importante dizer que estamos falando de 2007 e 2008. Conseguimos construir um processo de inovação na gestão pública importantíssimo porque todo processo era feito eletronicamente e não tinha papel. Desde o preenchimento do questionário, passando pela geração do próprio plano, até o atendimento e a liberação dos recursos por meio do FNDE.
Então, isso foi uma inovação importante.
Concluindo esta primeira parte, uma questão que acho importante ressaltar é que conseguimos fazer uma coisa muito difícil: envolver e aproximar as universidades da educação básica, que foi algo importantíssimo. E, como produto final, conseguimos atender todos os Municípios brasileiros, inclusive aqueles com desempenho menor, do ponto de vista educacional, foram atendidos com prioridade. Então, conseguimos fazer o atendimento a todos os Municípios, a todos os Estados e ainda envolver as universidades nos Estados, que foram exatamente propulsoras da elaboração do PAR nos Municípios.
Então, foi um processo muito rico e que precisa, realmente, ser registrado e digno de nota, como uma inovação na gestão pública.
O SR. COORDENADOR (SILAS BORGES MONTEIRO) - O.k.
Desculpe-me, Ministro, ter interrompido V.Exa. naquela hora.
O SR. JOSÉ HENRIQUE PAIM FERNANDES - Fique à vontade.
O SR. COORDENADOR (SILAS BORGES MONTEIRO) - Eu gostaria de fazer uma pequena mudança, porque eu gostaria de ouvir do Prof. Romeu Caputo — portanto, em vez de ouvirmos agora a Professora Rosa Neide — sobre quais foram os grandes desafios em lidar com as secretarias de educação nesse contexto que o Ministro colocou.
O SR. ROMEU CAPUTO - Boa tarde, Deputada Professora Rosa Neide, Paulo e colegas de MEC. À época, como Paim disse, eu estava na Secretaria de Educação Básica.
Silas, abordando especificamente a sua questão, eu diria que o desafio se deu não só no relacionamento com as Secretarias Estaduais e Municipais, mas com o próprio MEC, porque não tínhamos — como o Prof. Paim colocou — uma cultura de planejamento, de diagnóstico e de planejamento, seja na ação das Secretarias Municipais, seja nas Secretarias Estaduais e no próprio MEC.
Eu gostava sempre de dar como exemplo — e a Deputada Professora Rosa Neide, com a experiência que tem, sabe disto — o que acontecia no MEC até 2007, quando o Ministério colocava ou disponibilizava o que poderíamos enquadrar como editais. O MEC publicava uma resolução pelo FNDE e dizia: "Agora está disponível para os próximos 30, 60 ou 180 dias o financiamento do MEC para reforma de bibliotecas".
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Estou aqui fazendo uma suposição. Ocorre que isso, mesmo internamente no Ministério da Educação, era algo dissociado de um diagnóstico. Alguém ou um conjunto de pessoas imaginava, a partir de um dado do censo escolar ou de um dado do censo demográfico ou muitas vezes até de uma impressão ou de uma matéria jornalística, e dizia: "Olha, precisamos apoiar a reforma de bibliotecas". Só que isso estava desconectado de um verdadeiro diagnóstico.
Podia ter redes, que a coisa mais importante era uma reforma das bibliotecas, mas podia ter redes, sistemas, escolas, que o mais importante, por exemplo, era reformar banheiros de escola ou mesmo adquirir veículos escolares ou formar professores ou o que quer que seja. Então, havia uma desconexão, como o Prof. Paim colocou, entre um diagnóstico da realidade, um diagnóstico individualizado e um atendimento do MEC. Não se tinha um precedendo o outro.
E eu diria que isso gerou, no primeiro momento, quase um estranhamento entre todos os atores — Municípios, Estados e União —, porque havia uma tradição, vamos chamar de tradição, ou uma desconfiança mútua, talvez possamos usar esse termo, em que o MEC não faria o atendimento a partir do diagnóstico, na expectativa de que o MEC atenderia metade ou um terço ou um décimo do que se pedia, e essa era a tradição até então.
As redes estaduais, municipais e mesmo o Ministério da Educação tiveram muito trabalho, neste primeiro momento, de criar essa relação de confiança, eu diria, ou de credibilidade. E abro um parêntese, a Deputada Professora Rosa Neide foi uma pessoa fundamental. Eu me lembro bem desta reunião, a Deputada Professora Rosa Neide, ainda Secretária-adjunta, a Secretária Flávia, que era Secretária de Relação Intergovernamental, se não me engano. Acho que o Paulo e a Deputada Professora Rosa Neide vão saber melhor o nome da Secretaria. Quando estávamos começando, elas procuram o MEC e falam assim: "Olha, precisamos fortemente envolver as Secretarias de Estado da Educação no diagnóstico das Secretarias Municipais e vice-versa". Por quê? Porque estamos falando do mesmo território. Então, precisamos de um diagnóstico territorial, e um diagnóstico territorial passa por um bom diagnóstico de rede estadual e rede municipal. Por sorte nossa que o Paim estava no MEC, e a Deputada Professora Rosa Neide nos procurou ainda muito cedo, e pudemos fazer essa modificação.
O Mato Grosso foi o Estado pioneiro nisso. A Secretaria de Estado do Mato Grosso procurou a Universidade, na época, e criou um comitê, digamos assim, dentro da Secretaria de Estado, para auxiliar os Municípios nesse diagnóstico, e isso foi depois levado para todos os 26 Estados, porque o DF não tem Municípios, e foi uma inovação inicial.
Então, eu diria que uma das belezas também do PAR é que ele foi se moldando e foi sendo modificado. O próprio diagnóstico das redes estaduais foi negociado em uma reunião do CONSED, em Foz do Iguaçu, tivemos uma participação conjunta. Então, ele foi sendo moldado e modificado à medida que estava sendo realizado nos Municípios.
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Então, tivemos o PAR 1, o PAR 2, o PAR 3 e o PAR 4, com evoluções sucessivas. Eu acho que isso, em termos de política pública, é muito bacana. Em especial, vou lembrar ao Prof. Paim, o Paulo Speller estava como Secretário da Secretaria de Educação Superior do MEC. Chegamos a criar uma ação orçamentária nas universidades para apoiar não só a formação de professores, mas também o apoio às redes municipais. Era a primeira vez que tínhamos ali da educação básica, em todas as universidades, porque as ações de educação básica e universidade eram ligadas muito a Colégios de Aplicação ou outras coisas, mas, não, essa era universidade de rede pública municipal e estadual.
O SR. COORDENADOR (SILAS BORGES MONTEIRO) - Obrigado, Professor. Pegando o gancho do senhor e do Ministro Paim também...
O SR. JOSÉ HENRIQUE PAIM FERNANDES - Sr. Silas...
O SR. COORDENADOR (SILAS BORGES MONTEIRO) - Pois não.
O SR. JOSÉ HENRIQUE PAIM FERNANDES - Eu só gostaria de fazer um registro.
O SR. COORDENADOR (SILAS BORGES MONTEIRO) - Claro, pode falar.
O SR. JOSÉ HENRIQUE PAIM FERNANDES - Eu acho que o Romeu levantou um ponto que, na realidade, é essencial nessa questão da discussão com o CONSED, como um todo, mas especialmente com algumas Secretarias de Educação. E, de fato, uma das Secretarias que realmente se destacou nesse processo aí foi a de Mato Grosso, que teve essa visão de exercer esse forte papel de coordenação junto aos Municípios, e eu diria que reforçou muito a questão do regime de colaboração.
E, na realidade, quando ouvimos hoje a discussão do próprio Sistema Nacional de Educação, que a Deputada Professora Rosa Neide participa com muita intensidade no Congresso Nacional, vamos ver que o PAR foi, na realidade, o início de uma preocupação nossa de criar essa organicidade de relacionamento entre a própria Secretaria de Educação e os Municípios. Eu lembro muito bem, na época — contamos com a Deputada Professora Rosa Neide e também com o Deputado Ságuas Moraes — de todo o esforço que era feito por parte do Mato Grosso, e nós conseguimos...
Se não me engano, Romeu, acho que Mato Grosso foi um dos primeiros Estados a ter o PAR de todos os Municípios do Estado.
O SR. COORDENADOR (SILAS BORGES MONTEIRO) - Foi o primeiro.
O SR. JOSÉ HENRIQUE PAIM FERNANDES - Foi o primeiro.
O SR. ROMEU CAPUTO - Foi o primeiro a adquirir, conjuntamente com o MEC, ônibus.
O SR. JOSÉ HENRIQUE PAIM FERNANDES - Exatamente.
O SR. ROMEU CAPUTO - Exatamente. Chegou quase a universalizar o atendimento.
O SR. JOSÉ HENRIQUE PAIM FERNANDES - É no Caminho da Escola, né?
O SR. ROMEU CAPUTO - Foi o primeiro a criar uma rede de cobertura territorial.
Então, a Deputada Professora Rosa Neide participou aí de uma série de inovações, seguramente, e se tornou uma referência, justiça seja feita. E várias dessas ações foram depois implementadas por outros Estados ou Secretarias.
O SR. JOSÉ HENRIQUE PAIM FERNANDES - É importante também, Prof. Romeu, o papel que teve a universidade na época, porque ela viabilizou e deu todo o suporte para que houvesse esse trabalho. Então, na realidade, aí no Mato Grosso, tivemos um grande exemplo.
O SR. ROMEU CAPUTO - A Federal foi a primeira também, justiça seja feita.
O SR. JOSÉ HENRIQUE PAIM FERNANDES - Foi a primeira também.
O SR. ROMEU CAPUTO - O primeiro seminário a ser realizado no Brasil para discutir o PAR foi em Cuiabá. Eu estive presente. Foi o primeiro do Brasil.
Estou aqui agora, sim, rememorando, né, Deputada Professora Rosa Neide? A Rosa Neide era secretária.
O SR. JOSÉ HENRIQUE PAIM FERNANDES - E há o destaque do Prof. Paulo Speller. Ele deu todas as condições para que ocorresse isso.
O SR. COORDENADOR (SILAS BORGES MONTEIRO) - Prof. Paulo, o senhor poderia, então, falar um pouco como foi esse movimento de trabalho conjunto da universidade na implementação de políticas públicas, especificamente nesse caso do PAR?
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O SR. PAULO SPELLER - Boa tarde a todos, Paim, Romeu. Estou vendo que o Romeu está muito feliz hoje. Deve ter alguma outra coisa aí, mas não vamos falar sobre isso hoje, não é, Romeu?
Minha aluna, minha Secretária, minha Deputada Professora Rosa Neide; meu colega Silas, que está aí, firme na ativa; todas as pessoas que nos ouvem, eu fiquei muito feliz de ouvir vocês. Foi até bom porque vocês foram lembrando, e tal, recuperando, não é? Foi um tempo maravilhoso.
Eu me lembro de uma reunião que nós tivemos com o Paim, lá ainda nos prolegômenos do PAR, e nós conversávamos. Eu era reitor, a Flávia estava comigo inclusive e o Paim. Eu tive algumas reuniões, mas nessa reunião, em particular, ainda havia aquela ideia de envolver alguns Municípios. E nós dissemos "Não, em Mato Grosso tem que ser todos", até porque não são tantos. O Estado é muito grande, às vezes assusta, não é? Mas tem uma população muito pequena. O número de Municípios, se não me engano, era 141, alguma coisa assim. São poucos, comparativamente com outros Estados.
Aí nós argumentamos, e aqui há um elemento fundamental, quer dizer, o Paim lembrou bem: o PAR permitiu uma aproximação das universidades com os sistemas de educação. Não é o caso de Mato Grosso porque essa parceria é histórica em Mato Grosso.
Aliás, a universidade, desde que nasce, tem uma ação muito entrosada, com altos e baixos, evidentemente, mas com a Secretaria Estadual e com os Municípios. Nós tivemos outros programas antes, envolvendo a delegacia do MEC — antes havia uma delegacia do MEC em Mato Grosso —, envolvendo o sindicato dos trabalhadores da educação, envolvendo as Secretaria Municipais, as Secretarias Estaduais. Um desses programas, inclusive, foi voltado para a formação de professores para a educação básica, em que lançamos o primeiro programa de educação a distância do Brasil, e o MEC nos apoiou.
Aqui eu quero falar do MEC, quer dizer, o Mato Grosso tinha uma situação privilegiada e o PAR permitiu essa consolidação. Foi uma coisa extraordinária, porque o MEC veio e deu sustentação para essa ação, essa articulação que já existia. E aqui quero recuperar essa ideia, ou seja, qual é o papel de um Ministério da Educação? O MEC cumpria o seu papel de coordenador em nível nacional, coisa que hoje nós não temos. Mas o MEC teve esse papel, e o Romeu chamou bem a atenção porque antes disponibilizavam esses recursos e os Municípios meio que diziam "Ah, eu quero, e tal". E havia um pouco a cultura de "Eu quero tudo". Quer dizer, se tem, eu quero. E o PAR inverteu isso aí. Por quê? Porque fez uma avaliação prévia. Os Municípios disseram e mostraram, com os indicadores que o Paim menciona, que foram construídos, quais são as suas debilidades e do que eles precisam, efetivamente.
O papel da universidade, que já tinha essa articulação, foi fundamental. Não da universidade sozinha, mas da universidade com a Secretaria Estadual de Educação — não é, Deputada Professora Rosa Neide? — e com os Municípios, porque nós já estávamos presentes, através do programa de formação de docentes, através dos programas de formação que mantínhamos, as chamadas licenciaturas parceladas, em que trabalhávamos diretamente com as escolas, com as regiões, com os Municípios na formação de professores, sobretudo nas regiões norte e oeste do Estado. Era um Estado de intensa migração, onde a presença do migrante era superior a 50% da população. Mais de 50% da população do Estado era nascida fora do Estado de Mato Grosso. Muitos já eram nascidos em Mato Grosso, mas filhos de migrantes que vieram de outros Estados. Então havia uma enorme carência de pessoal formado, tanto professores quanto diretores, técnicos, trabalhadores de uma forma geral, e a universidade, já desde a sua criação e cada vez mais intensamente, envolvia-se muito nesse processo.
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Então, é muito bom poder lembrar que o MEC exercia o seu papel de Ministério coordenador das políticas, das demandas e dessa articulação, como o próprio nome do plano indica de forma muito clara.
O PAR também foi lembrado, mas eu queria colocar nesse contexto que ele não se dá isoladamente. Não foi alguém que se sentou um dia e falou assim: "Ah, vamos fazer um PAR". Não! Havia um Plano Nacional de Educação, um Plano de Desenvolvimento da Educação, e o PAR vem na esteira desse processo de construção do Plano Nacional, do Plano de Desenvolvimento, do Plano de Ações Articuladas. E, claro, aí vamos ter uma continuidade inicialmente colocada, porque esse é outro elemento de que carecíamos. O Paim lembrou agora no final também que carecíamos de um sistema nacional, o que era absolutamente um absurdo. Quer dizer, um país com as dimensões do Brasil não tinha um sistema nacional, nada que se aproximasse e com o desafio da colaboração, que sempre se preconizava entre os entes da Federação: Municípios, Estados e União.
O PAR realmente veio suprir esse vazio que havia, no caso do Brasil, mas, infelizmente, não conseguíamos manter a continuidade desse processo.
Se olharmos hoje para os países que têm sistemas robustos, com indicadores positivos e crescentes de qualidade dos seus sistemas de educação, veremos que uma das características mais importantes é essa continuidade dos planos, dos programas, do processo de planejamento e da sua execução, avaliação, retroalimentação. É assim que avançam as finlândias da vida e outros países, é a partir de um aprendizado que se tem com o próprio país, com aquilo que se fez, com as dificuldades aqui, ali, os problemas que aparecem. E o PAR tinha todos os elementos para que isso pudesse se dar. Infelizmente, isso foi interrompido.
A Deputada Professora Rosa Neide sugeriu que falássemos disso num segundo bloco. Não sei se vai dar tempo de um segundo bloco, porque estamos falando mais do que foi previsto inicialmente. Mas eu queria, mais uma vez, falar desse papel tão extraordinário que foi dado à universidade de se consolidar nessa parceria com a Secretaria de Educação. Aliás, não custa lembrar que a própria Secretária fez a sua formação de pós-graduação na Universidade Federal de Mato Grosso. Ela é mestre pelo programa de mestrado da Universidade Federal de Mato Grosso e, por acaso, foi minha orientanda e fez um trabalho brilhante. Ela já desenvolvia um trabalho, traz na sua bagagem, inclusive, uma experiência no interior do Estado, uma região de grandes carências também, Diamantino, com grandes desafios. Então, ela já trazia uma experiência como Secretária Municipal que poucos Secretários têm na sua bagagem. E a Deputada Rosa Neide tinha isso, como o Secretário Ságuas, com a sua experiência também de interior, como médico de interior. Houve ali um casamento de uma série de coisas, de uma série de instituições e demandas que foram colocadas e que, com o apoio do MEC, com esse papel coordenador, nós fomos capazes de costurar, implementar, avançar por cima das diferenças político-partidárias que havia, há e sempre haverá entre os 141 Prefeitos e a Secretaria Estadual.
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Havia uma credibilidade da universidade, e isso foi muito importante, porque todo mundo queria a presença da universidade, todo mundo demandava isso. Os Prefeitos viviam na reitoria da universidade: ou queriam um campus, ou queriam um curso, ou queriam uma licenciatura parcelada, ou queriam... Enfim, sempre queriam algum polo da universidade. A universidade era muito bem reconhecida e bem vista por todos, à direita, à esquerda, ao centro, ao sul, ao norte. Isso também ajudou muito no processo, nessa mediação e nessa presença que a universidade já tinha no Estado.
Eu tenho aqui ainda anotadas duas ou três coisas que eu gostaria de dizer, se houver um segundo bloco, até porque eu já excedi um pouco do meu tempo. Eu queria trazer um pouco da experiência que estou observando da União Europeia, aqui na Europa, de como os países estão reagindo aos impactos da pandemia e quais as perspectivas que eles têm colocado. Eu participei de uma reunião ontem à noite, em que tive o privilégio de ouvir o interlocutor do governo espanhol nesse processo de construção de um ambiente na União Europeia para fazer frente aos desafios. São muitos os desafios aqui também, há muitos problemas. Eu me refiro à própria Europa. Enfim, se houver tempo, vamos entrar nesse assunto para ver as tendências também que se colocam hoje, que têm muito a ver com o PAR, muito, muito, muito mesmo a ver com o PAR. O PAR, realmente, nesse sentido, foi uma iniciativa brilhante, bem pensada, bem articulada e destaco, para fechar, com uma capacidade — e o Paim chamou a atenção para isso —, de escutar os Secretários Estaduais, os Secretários Municipais, as equipes, as universidades, o que raramente se vê na nossa história e na história de muitos países. E isso foi fundamental, quer dizer, essa capacidade de passar ali 5 horas, 8 horas, o dia inteiro ouvindo e absorvendo, porque não se trata só de ouvir, entrar por um ouvido e sair pelo outro, mas de absorver isso no processo de planejamento.
E aí eu fecho minha fala, agora sim, lembrando que a universidade — como foi dito na I Conferência Mundial sobre Educação Superior, promovida pela UNESCO, em 1998 — é estratégica para a construção de sociedades mais justas e solidárias. Está demonstrado com essa experiência que é preciso valorizar mais a universidade pelo que ela faz — e pode muito mais — para avançarmos no nosso País. Obrigado.
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O SR. COORDENADOR (SILAS BORGES MONTEIRO) - Nessa segunda rodada, então, vamos fazer como o Prof. Paulo já sugere.
Prof. Paim, quais são os desafios para institucionalizar uma política pública? Do ponto de vista da estrutura, da tecnologia, parece-me que o PAR reunia todas as condições. Eu vi isso acontecer no Estado de Mato Grosso. Qual é o desafio para que isso se torne efetivamente uma política de Estado?
Primeiro eu queria ouvir o Prof. Paim e depois o Prof. Romeu, por favor.
O SR. JOSÉ HENRIQUE PAIM FERNANDES - Prof. Silas, eu diria o seguinte: desde o início, havia uma preocupação — à época, do Ministro Fernando Haddad e do próprio Presidente Lula — de institucionalizar o PAR. A institucionalização do programa veio, em primeiro lugar, com o decreto que chamávamos de Compromisso Todos pela Educação. Ali se estabelecia como se daria a pactuação do MEC com Estados e Municípios, por meio de metas, através do IDEB, e depois como se daria também esse atendimento. Então, foi feito todo um registro no âmbito do decreto.
Depois, lá em 2012, nós tivemos a oportunidade, já com a Presidente Dilma, de fazer um processo maior de institucionalização, tornando o PAR uma lei. E essa lei permitiu, inclusive, que nós alterássemos, o que foi muito importante, o instrumento de pactuação nos Estados e Municípios através do termo de compromisso do PAR. Isso foi fundamental também, porque tornou muito mais ágil o processo. Eu acho que o Prof. Romeu pode detalhar melhor isso.
Vamos fazer justiça também, já que nós fizemos o primeiro bloco falando de todo esse processo, da importância da universidade e do relacionamento que nós estabelecemos com as Secretarias Estaduais de Educação. Eu diria até que o Prof. Paulo Speller falou do pioneirismo da Universidade Federal de Mato Grosso.
Na dimensão de formação de professores, a Universidade Federal de Mato Grosso teve um papel importante porque ela ajudou muito na formulação da própria Universidade Aberta do Brasil, que tinha como prioridade a formação de professores. Então, é importante destacar isso.
Dentro do Ministério da Educação, nós também tivemos pessoas muito importantes. O Romeu, já falei aqui, foi desde o início a pessoa que conduziu esse processo internamente, fazendo todos os aprimoramentos de que ele falou aqui — PAR 1, 2, 3, 4 —, ouvindo também organismos internacionais. Nós ouvimos muito a UNESCO, o UNICEF, que participou também ativamente desse processo.
Outra pessoa fundamental também dentro do MEC foi a Profa. Renilda, que teve um papel central, tanto que eu sempre falava que era a dupla RR, Renilda e Romeu, porque, na realidade, os dois tinham esse atendimento todo nos Estados e nos Municípios — a Renilda lá no FNDE, e o Romeu na Secretaria de Educação Básica. Depois o Romeu foi Presidente do FNDE também e conseguiu aprimorar mais o processo.
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Também há a questão da transparência. Nós nos preocupamos sempre em ter essa transparência no PAR. E eu diria que essa questão da institucionalidade é fundamental. Com todas as preocupações que foram levantadas pelo Prof. Paulo Speller, com essa ausência, vamos dizer assim, de coordenação que vivemos hoje em torno do Ministério da Educação no apoio a Estados e Municípios, o PAR permanece. A forma de financiar os Municípios mudou. Sabemos que hoje não só o MEC, mas também outros Ministérios perderam o poder discricionário em torno do orçamento, mas o PAR continuou existindo. E esse relacionamento com os Estados e Municípios, inclusive esse instrumento do termo de compromisso, tudo isso se mantém.
Mas realmente eu acho que a questão mais importante é mantermos isso na legislação e, na medida do possível, no âmbito do Congresso Nacional, aprimorarmos essa legislação, ao ponto de tornar o PAR, cada vez mais, uma política de Estado.
O SR. COORDENADOR (SILAS BORGES MONTEIRO) - Obrigado, professor.
Passo a palavra ao Prof. Romeu.
O SR. ROMEU CAPUTO - Eu vou só complementar, Prof. Silas, um aspecto que o Prof. Paim começou. Eu diria que o PAR está suficientemente ou razoavelmente, digamos assim, institucionalizado. Ele tem lei, tem decreto, tem normativos internos. Então, eu diria que esse é seguramente um aspecto muito positivo.
O Congresso Nacional, à época, era extremamente sensível às pautas educacionais. Então, as várias inovações que trouxemos passaram praticamente sem mudanças pelo Congresso. Aliás, quando o Congresso trazia mudanças, eram muito bem-vindas. Isso tem muito a ver com essa articulação de que o Prof. Paulo Speller falou. Nós tínhamos CONSED, UNDIME e diversas vertentes políticas defendendo a política educacional. Nós brincávamos sempre que havia um partido da educação no Congresso Nacional, que era um movimento suprapartidário, que fazia vários temas da educação serem abordados no Congresso e melhorados.
Então, fazendo uma analogia, eu diria que o hardware do sistema federativo está razoável. Agora há o software. Como é que se põe esse hardware para operar? Temos essas dificuldades que o Prof. Paim tangenciou, que são dificuldades presentes, que precisamos muito discutir, pelo futuro da educação brasileira. Como é que colocamos essa máquina de volta nos trilhos?
Das várias inovações, uma delas está presente e é algo que conseguimos mudar. Eu acho que a Deputada Professora Rosa Neide, à época Secretária, vai concordar com isso. O MEC trabalhava num sistema quase de desconfiança mútua. Eu me lembro disso. O Secretário de Estado tinha que apresentar o famoso PTA, e o documento vinha até autenticado. Tinha de haver no MEC para o FNDE uma área burocrática inteira sobre a questão documental para averiguar se a fé pública que o Secretário deve ter — e tem — deve ser seguida ou não. E o PAR inverte isso. Eu acho esse ganho é formidável — de acordo com o Prof. Paim —, que é o ganho da fé pública ser efetiva.
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Possivelmente, depois da lei do PAR, o FNDE deve ter feito aproximadamente uns 40 a 60 mil termos de compromisso, sem que nenhum papel tenha sido tramitado. Estou falando de forma muito ampla, pois não tenho mais acesso a esses números. Mas em grandes números é isso.
Mato Grosso foi o Estado que mais ampliou, melhorou e qualificou o atendimento no transporte escolar por meio de milhares de ônibus. Ao longo desses anos, nós conseguimos transferir recursos para a compra de aproximadamente 50 mil veículos escolares, sem nenhuma tramitação de papel para cá ou para lá. Eu fui com a Deputada Rosa Neide a um evento em Mato Grosso sobre isso. Nós conseguimos criar esse mecanismo que vou chamar de confiança mútua.
A robustez do sistema bancário, especialmente do Banco do Brasil, com a robustez do diagnóstico de Estados e Municípios e a modelagem nos permitiram fazer uma coisa inédita no Brasil, que é simplesmente transferir bilhões de reais do Governo Federal para Estados e Municípios. E esses bilhões de reais se transformaram em produtos e serviços para a educação com um sistema de razoável agilidade, autonomia e confiança. Confiança em quem? No Secretário de Estado, no Prefeito, no executor da política pública.
Dessa forma, nós tínhamos, digamos, uma Brasília coordenadora. Eu não diria menos Brasília e mais Brasil. Nós tínhamos mais Brasil com Brasília. Acho que todos são importantes na formulação e execução de políticas públicas. O Brasil precisa de Brasília, e Brasília precisa do Brasil. E precisamos resolver isso para que essa política pública continue fluindo como gostaríamos que ela voltasse a fluir.
O SR. JOSÉ HENRIQUE PAIM FERNANDES - Prof. Silas, quero só complementar o que o Prof. Romeu disse.
Quando eu falei da qualificação da oferta do Ministério da Educação, várias ações foram formuladas para que tivéssemos êxito. Um dos exemplos de maior sucesso foi exatamente o Programa Caminho da Escola. E sobre isso temos um exemplo interessante: fizemos uma aquisição de veículos com um modelo inovador de compras públicas no qual o Ministério da Educação formatava todo o processo de compra, e Municípios e Estados faziam a adesão a esse processo, que foi o Registro de Preço Nacional. Essa foi uma inovação premiada inclusive pela Escola Nacional de Administração Pública — ENAP. E houve a aquisição — não me lembro se foi em 2014 — de 45 mil veículos escolares.
Até onde acompanhamos, eu e o Romeu, especialmente, não houve uma denúncia de desvio num programa dessa magnitude, porque era um processo muito, muito transparente e que realmente foi um verdadeiro sucesso. Até hoje vemos que essa discussão da renovação da frota de transporte escolar e da modernização da segurança é algo em que obviamente ainda temos algumas dificuldades, mas, com certeza, em relação ao que nós tínhamos em 2007, mudou muito o panorama. Sem dúvida alguma, Mato Grosso é um exemplo com esse programa Caminho da Escola, com certeza, porque o Estado articulou isso também e ampliou o programa, o que foi fundamental.
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O SR. COORDENADOR (SILAS BORGES MONTEIRO) - Obrigado, professor.
A exposição com um pouco da história e da experiência que cada um teve não deixa de ser ao mesmo tempo uma avaliação do que vemos hoje. O Prof. Paulo chama a atenção para algo que gostaríamos de ouvir um pouco mais dessa avaliação e dessa dinâmica, que vamos, talvez, chamar de perspectiva de futuro, mediante esses elementos e singularmente a partir da experiência do PAR.
O SR. PAULO SPELLER - Sim. Olha, eu fui muito privilegiado nesse processo, porque, em 2006 e 2007, fui Presidente da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior — ANDIFES, que é a associação dos reitores de universidades federais. Então, eu estive presente no lançamento do PDE, no Palácio do Planalto, como Presidente da ANDIFES, participei de todo esse processo. Eu assumi a reitoria da UFMT no ano 2000, no Governo Fernando Henrique, ainda com o Ministro Paulo Renato. Então, eu vivi aquela transição, lá atrás, também de todo o início dessa discussão e dessa formulação.
Realmente, o que nós tivemos de 2000 até 2008, quando eu fui reitor da UFMT, é extraordinário. E o que veio depois, que aqui o Paim e o Romeu colocaram já, inclusive no seu processo de institucionalização, é extraordinário.
Eu ontem tive o privilégio de ser convidado para fazer uma conferência na Universidade Católica de Valência, que fica aqui perto, a 2 horas e meia de distância de trem de Barcelona. Eu cheguei agora há pouco inclusive. Falei sobre a educação nos países ibero-americanos, portanto, América Latina, Espanha, Portugal, do intercâmbio de experiências.
Essa experiência do PAR, então, é uma contribuição que nós levamos para a Organização de Estados Ibero-americanos, da qual eu fui Secretário a partir de 2015, por indicação do Governo brasileiro evidentemente, e é uma contribuição extraordinária. As pessoas, os Ministros, as equipes dos Ministérios, as universidades de todos os países da América Latina queriam conhecer mais sobre o PAR, saber como foi, queriam ir ao Brasil para conhecê-lo.
Agora, para minha surpresa, depois da minha conferência, veio a fala de um professor da Universidade Complutense de Madri, o Prof. Javier, que é interlocutor da Espanha num projeto que está sendo construído na União Europeia, em Bruxelas, para fazer frente a toda a problemática vivida na Europa diante da pandemia. Realmente, ontem, ouvindo o Javier falar, parecia que eu estava ouvindo-o falar do Brasil, porque ele teve a oportunidade de falar inclusive como pessoa, como família.
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Ele falou: "Eu vou falar da minha experiência, em Madri, como professor universitário. Eu e minha mulher, em teletrabalho, em casa, com dois filhos, um de 5 anos e outro de 10 anos. Vou falar sobre como nós vivenciamos aquilo, o acesso à Internet, o uso dos equipamentos em casa, os horários".
Enfim, eu não vou falar sobre isso, porque nós já conhecemos essa realidade. Mas eu fiquei assombrado ao ouvir. Parecia que ele estava falando da nossa experiência, inclusive, de classe média. Havia muitas dificuldades de acesso também. E eles estão avaliando isso agora e se conscientizaram da necessidade de fazer o que fizeram para a educação superior na Europa.
No caso da Europa, desde o Tratado de Bolonha, foi criado o Espaço Europeu de Ensino Superior, que está funcionando com trocas, com reconhecimentos mútuos, com colaborações, com altos e baixos. Enfim, estão avançando muito, inclusive, com a sua institucionalização, o que é muito importante. Mas não há nada parecido para a educação básica. Nós estamos falando aqui da necessidade de um sistema nacional de educação em geral, mas para a educação básica principalmente. E eles se deram conta de que não existe isso na Europa.
Quer dizer, a Finlândia está fazendo isso, a Alemanha está fazendo aquilo, a Espanha está fazendo isso e aquilo. Mas nós não trocamos experiências, não nos reconhecemos naquilo que podemos levar de um para o outro. A tendência hoje, de certa maneira, é fazer o que o PAR faz, ou seja, trabalhar com a construção de redes colaborativas, como o Romeu chamava a atenção agora há pouco, como eu chamava a atenção.
O Paim mencionou também a importância da presença de várias instâncias do poder público — Município, Estado, União e Distrito Federal obviamente —, mas também de associações e de instituições que representem os secretários, que representem os prefeitos, que representem os pais de família, que representem os próprios estudantes.
Agora essa presença vem com o aporte muito importante das tecnologias. Esse é outro elemento que está nas entrelinhas das falas do Paim e do Romeu. Eu me lembro de que o MEC construiu — aliás, foi premiado por isso também — um sistema de informação invejado não só no Brasil, mas no exterior, porque tudo o que acontecia dentro do MEC nessas reuniões imediatamente entrava nesse sistema de informação e era disponibilizado para os gestores.
Então, o prefeito e a secretária podiam se ver naquele sistema de informação: "Como é que está o meu Município? Como é que está a minha escola: melhorou ou não? Está assim ou está assado? Qual é o orçamento? Quanto foi colocado aqui? Quantos ônibus foram comprados? O que nós pactuamos com o MEC? Como é que a Secretaria se posicionou em relação a isso?"
Essas tecnologias, de lá para cá, avançaram muito e mais ainda durante a pandemia. Então, a tendência que se coloca agora é da construção, com o avanço que se espera, dessas redes colaborativas no âmbito do país, no âmbito da região, no âmbito das universidades.
Aqui na Espanha mesmo, há um projeto maravilhoso, muito interessante, que se chama 030. É como se fosse uma BR. Então, são todos os Municípios que estão ao longo dessa estrada numa determinada região da Catalunha, na região da Espanha, ao longo dessa 030.
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Então, entram prefeituras, entram universidades, entram associações de empresários, entram sindicatos. Quer dizer, há o PAR, do qual nós estamos falando, e a experiência que nós tivemos antes em Mato Grosso, com o programa de formação de docentes para séries iniciais. Agora eles estão fazendo isso, com o uso intensivo de tecnologia. E o que é mais interessante: esse projeto aqui da Catalunha, que tem outros projetos em várias regiões da Europa, é coordenado pela Universidade Autônoma de Barcelona, uma universidade que tem inclusive um campus nessa região, onde há dois parques de ciência e tecnologia articulados com as demandas das prefeituras.
Quer dizer, a sociedade está dizendo: "Nós precisamos disso, nós precisamos daquilo". Não é o dinheiro, como o Romeu chamava atenção, que é colocado e se pergunta quem quer. Não! Do que nós precisamos? Vamos avaliar isso para construir os projetos por demanda da sociedade, da prefeitura, dos sindicatos, da sociedade civil, etc. E esse projeto faz isso. Ele articula todas essas instâncias e entidades da sociedade numa determinada microrregião ou mesorregião, vamos chamar assim.
Essa é a tendência. É isso o que a União Europeia quer fazer agora, construir o seu espaço europeu de educação básica, que eles não têm, não só para fazer frente à pandemia, mas para poder avançar também sem tantas diferenças, porque há muita desigualdade entre os países, entre as regiões, com toda a problemática agora, por exemplo, do processo migratório, com a presença de imigrantes, de refugiados de países árabes, de países africanos, que é intensa.
Chega gente todo dia, por vários meios, com embarcações precárias, atravessando o Atlântico para as Ilhas Canárias, atravessando o Mar Mediterrâneo, de avião ou da forma possível. Muita gente está morrendo pelo caminho. É um processo violento. Inclusive há menores de idade migrando sozinhos, sem a sua família. A Espanha está cheia de menores espalhados pelo país, e o poder público não sabe muito bem o que fazer.
Isso tudo é parte desse desafio enorme que se está vivendo. E é preciso se organizar para isso, como nós fizemos em Mato Grosso, com aquele processo migratório intenso. Milhares de pessoas chegaram do Sul, do Rio Grande do Sul mesmo. Veio gente do Nordeste, sobretudo para a região nordeste de Mato Grosso, para o garimpo, principalmente para a Região do Araguaia. Enfim, Mato Grosso vivia isso que nós estamos vendo, de certa forma, guardadas as proporções, aqui na Europa.
Eles querem criar o PAR da Europa. Então, esse é o caminho. A Câmara dos Deputados, o Parlamento tem um papel fundamental, como teve ao longo da construção do PAR e da sua institucionalização, que felizmente está mantido como legislação e que agora pode e deve ser aperfeiçoado, na medida em que isso seja avaliado, considerado, encaminhado e pactuado politicamente pelo Parlamento.
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É claro que o Parlamento não independe dos demais Poderes, há uma busca de harmonização desses Poderes. Mas o Parlamento — a Câmara dos Deputados especificamente e a Comissão mais pontualmente — tem um papel fundamental para que se busque preservar o que Romeu dizia aqui.
Isso nós vivenciamos no MEC quando eu fui Secretário. A presença de Parlamentares no MEC, bem como a nossa presença no Parlamento, do Ministro inclusive, era intensa e frequente e independia dos partidos em que estavam esses Parlamentares. Quer dizer, havia uma preocupação de todos, buscando interlocução com o MEC, trazendo demandas, e nós trabalhando na formação de projetos. Mas é importante que haja essa coordenação. Isso é o que é importante. Não é apenas: "Eu quero isso, eu quero aquilo".
Essa coordenação pensada, planejada, construída, isso é muito importante. Não é o Ministro iluminado ou o Secretário ou um Diretor. Não! É uma construção conjunta, ouvindo e traduzindo isso em políticas, em ações, em projetos e em ações concretas, como aconteceu naquele momento e ainda acontece de certa maneira, mas com certeza pode ser muito melhorado.
Eu queria parabenizar a Deputada Rosa Neide por essa iniciativa. É muito importante que isso seja socializado com todo o Parlamento, a Comissão inicialmente e a Câmara, para que vejam que isso deu certo, dá certo e pode ser melhorado, com toda a certeza.
O SR. COORDENADOR (SILAS BORGES MONTEIRO) - Obrigado, Prof. Paulo.
Eu vou concluir a minha participação, devolvendo a coordenação à Deputada Professora Rosa Neide, que preside esta audiência, dizendo...
Há um som...
A SRA. PRESIDENTE (Professora Rosa Neide. PT - MT) - Eu acho que alguém ligou o microfone.
O SR. SILAS BORGES MONTEIRO - Ah! Tudo bem. Desculpe-me.
Eu só vou concluir minha participação, Deputada, contando rapidamente um ponto que julgo que foi de inflexão durante o PAR. Pegou-se os 2 últimos anos de gestão de um prefeito, houve eleição no meio, e pegou-se os anos seguintes. Essa mudança de prefeito foi muito curiosa e é o que eu chamei, nos trabalhos que eu coordenei, de política do nome próprio. Prefeitos queriam o seu nome próprio no planejamento; eles não queriam um planejamento que fosse do Município, mas que fosse deles.
Parece-me que as observações feitas até agora corroboram essa ideia, que tomei de Jacques Derrida, de que há um movimento de uma política do nome próprio em que o gestor público, de certo modo, quer ver seu nome, e não um plano ou um programa que se movimenta.
Enfim, é basicamente isso.
Deputada Professora Rosa Neide, obrigado por ter permitido essa minha participação. Devolvo-lhe a palavra.
A SRA. PRESIDENTE (Professora Rosa Neide. PT - MT) - Eu quero pedir à Mariana, que está nos ajudando, que veja o problema desse som aberto, que acaba sendo transmitido junto com as falas.
Primeiro, eu acho que foi uma memória esse momento. Poder voltar é muito importante, olhando para trás, olhar o presente para que possamos nos retroalimentar do passado e visualizar o futuro.
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Eu ouvi o Silas falando da experiência dele, especialmente representando a Universidade Federal de Mato Grosso na relação com a Secretaria de Estado da Educação. O Prof. Silas foi in loco, acompanhado por estudantes, mestrandos e doutorandos da Universidade Federal de Mato Grosso, junto com a equipe da SEDUC, acompanhado também pela Dra. Flávia Nogueira, que à época era Secretária Extraordinária de Apoio às Políticas Educacionais, uma Secretaria específica aqui no Estado. Talvez seja interessante para os Estados brasileiros, para os Ministérios, ter alguém que faça a interface entre todos os Ministérios ou entre todas as Secretarias naquilo que a educação requer.
Eu vejo preocupação em alguns países. A educação é o centro, mas no que eu dependo da segurança pública, no que eu dependo da saúde, no que eu dependo da cultura, como é que todo mundo faz interface com a escola? Era essa a função da Secretaria. E quando veio o PAR, a Secretaria se dedicou completamente, e nos ajudou fortemente na relação com o MEC, com a universidade e com as prefeituras. O Prof. Silas acompanhou, fez esse trabalho diretamente. Tem uma produção acadêmica — e podemos dar um presente ao Paim e ao Romeu, para que eles possam ter esse material da UFMT em mãos — sobre a história que vocês juntos construíram.
O Prof. Paulo, à época, era Reitor da Universidade Federal de Mato Grosso. E na primeira reunião com o Paim e a Flávia foi assim: "Então, vamos falar com o Paulo". E quem conhece o Ministro Paim sabe a objetividade com que ele trabalha, como é antenado com a totalidade, percebe os canais e as possibilidades e não mede esforços para fazer as coisas acontecerem. Isso foi muito forte, decisivo. Liga para um, liga para outro, toma as iniciativas. Quando saímos de Brasília e chegamos, o Silas perguntou da questão interna da Secretaria. Viramos a Secretaria ao avesso. É uma Secretaria que agora faz o contato com 141 Municípios. Já tínhamos uma relação com os Municípios, mas não tão aprimorada, não tão definida, não estruturada como o PAR ajudou a estruturar, uma política estruturante de fato. O Município planeja, em articulação com a Secretaria de Estado. Tenho a maior honra de ter o Prof. Paulo aqui junto comigo. Ele foi meu orientador de mestrado à época em que eu fui Secretária Municipal de Educação.
E qual era minha problemática o tempo todo? Como é que o Município trabalha rede estadual e rede municipal de forma desconectada? Eu sempre pensei: vou assumir a rede municipal, mas vou assumir pensando na rede estadual. Por que uma cidade tem dez escolas e as dez escolas ficam disputando aluno, espaço, professor, estruturas? Um tem quadra, a outra não tem; uma tem biblioteca, tem laboratório... Fizemos muita coisa juntos, e o Prof. Paulo orientou o Município de Diamantino naquilo que eu fazia lá. E era o meu desejo voltar lá e ver o que Anísio Teixeira e todos os pioneiros da Educação Nova pensaram no âmbito do Município, do território. Anísio Teixeira até dizia que o aluno não tinha escrito na testa: municipal, estadual, federal. O aluno era do território, do Município. Isso sempre fez a minha cabeça, e eu procurei olhar aquele território. E os Prefeitos seguintes do Município de Diamantino falaram: "Aqueles maus costumes que você colocou lá nunca terminaram. Estado e Município não trabalham separadamente".
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Eu acho que o Ságuas, por ter sido Prefeito, e o Paulo, porque era médico, atendia todo mundo — Prefeito de uma cidade do interior ou Deputado Estadual —, também tinham essa clareza. A Dra. Flávia Nogueira, com toda a capacidade de interlocução com a universidade, ajudou muito. E aí encontramos no MEC as pessoas que realmente pensavam a educação brasileira em sua totalidade. Então eram a universidade parceira, o MEC parceiro, a Secretaria de Estado e os 141 Municípios. Nunca houve quem dissesse: "Ah, você é do PT, eu sou do MDB" ou "Eu sou do DEM". Ninguém discutiu isso em momento nenhum. Ninguém fez essa pergunta. E trabalhamos juntos no MEC, onde também não havia essa pergunta. Falei tanto com o Ministro Paim quanto com o Ministro Fernando Haddad. Eu dizia: "Ah, aqui todo mundo é tão igual que eu me sinto excluída. Eu queria ser mais bem atendida, porque o Ministro é do meu partido". Eu brincava, porque não existia isso. Era uma política republicana de fato. Se nós tivéssemos seguido na política republicana até os dias atuais...
E aí faço o nosso fechamento aqui dizendo que, nesta pandemia, quanta falta fez a articulação federativa, quanta falta fez um Ministro ou uma Ministra que olhasse o País como o Ministro Paim olhou, como Ministro Haddad olhou, sem distinção ideológica, fortemente voltado para a educação brasileira, para os seus milhões de estudantes e profissionais, olhando como é que ela pode se articular, o que as universidades e os institutos federais poderiam fazer nesta pandemia apoiando as escolas da educação básica!
Ontem mesmo passei uma mensagem para o Prof. Paulo. Alguns estudantes do Estado do Paraná, Paim, Romeu e Silas, conseguiram com alguém o número do meu telefone e começaram a me passar mensagem: "Deputada, sabemos que a senhora é da educação básica. A senhora poderia ajudar a gente criando uma lei para anular" — olhem o termo — "os anos escolares de 2020 e 2021". E daqui a pouco vinha outro com a mesma coisa, depois outro; e o terceiro que mandou mensagem para anular os anos disse que era presidente do grêmio de uma escola. Eu liguei para ele e perguntei: "Por que vocês estão falando isso?" Aí ele disse: "É porque o pessoal do terceiro ano, em 2020, e do terceiro ano, em 2021, não frequentou a escola, portanto nós não aprendemos. E agora nós não temos direito de estudar mais, porque nós já estamos formados, já concluímos o ensino médio. E agora nós queríamos anular esse período para poder voltar para a escola". Foi por isso que eu fiz uma indagação ao Prof. Paulo. Aí eu falei para eles: "Mas e se vocês tivessem direito a fazer outro curso, alguma disciplina, aquilo que vocês acham prioritário na escola?" E eles responderam: "Ah, não pode. Mas se tivesse alguma coisa assim, a gente queria".
Quando eu estive na Inglaterra, num curso de gestão, eu vi que as escolas faziam uma chamada para aulas, cursos extras — não era na pandemia —, e perguntei por que o faziam. Responderam: "Aqui a gente não reprova os alunos, no final do ano os alunos concluem o curso. Se há alguns que ainda sentem necessidade de aprender mais, então oferecemos curso de férias, oferecemos outras trajetórias. Eles podem vir e fazer a matrícula naquilo que é do interesse deles, se já estão no mercado de trabalho, com pretensão de outra formação. Eles têm as opções aqui na escola". Isso naquelas escolas médias. Então eu fiquei pensando nesses meninos do Brasil, de 16 anos, 17 anos, com tanta responsabilidade, dizendo: "Eu quero voltar para aprender. Eu quero estar na escola".
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Então, por mais que o Parlamento discuta, por mais que o Parlamento tenha iniciativas — e hoje eu vejo a importância, a efervescência, a luta do Parlamento —, falta aquela efervescência que vimos no MEC, que vimos em um Ministro preocupado com o País inteiro, articulando com os Secretários de Estado, e os Secretários se vendo na obrigação de articular com os Municípios, de conversar com os seus Municípios.
Eu lembro o tamanho de Minas Gerais, com mais de 800 Municípios, dividindo o Estado em grupos municipais para que houvesse discussão, Romeu. Minas Gerais não dava conta, tinha que dividir em distritos e regiões para conversar.
Então, nós perdemos muito. Ainda temos o instrumento do PAR no MEC. Eu vejo os Municípios dizerem: "Professora, nós já inserimos lá no PAR". Mas agora, Paim, se um Deputado não fizer uma emenda parlamentar, não se compra um ônibus. Não são 1.400 ônibus como nós compramos. Não há aquela distribuição republicana. E o então Deputado Ságuas fazia conta o tempo aqui: "Agora nós vamos ficar com 70% da frota renovada". Alguém tem dois, e o outro tem 20, mas vai ficar com 70% também. O que se quer é que todo mundo vá ampliando.
Agora, um ônibus, dois ônibus, uma choradeira, uma van. E aí alguém fala: "(Ininteligível), Romeu". E eu falo assim: "Liga para os Deputados e peça um dinheiro para colocar uma emenda aqui, para pagar alguma ação do PAR". Você colocou a ação, mas não tem o financiamento.
As pessoas estão aqui, Prof. Paulo, ainda ansiosas, sabendo, conhecendo o instrumento, entendendo que ele existe e buscando a possibilidade de mantê-lo como um instrumento de planejamento, mas também de financiamento das ações, que é o papel do Governo Federal na colaboração com os Estados e os Municípios.
Nós estamos em plena discussão — o Paim esteve conosco outro dia — do Sistema Nacional de Educação, que pode dar essa estrutura maior para que o Estado brasileiro cuide dos entes subnacionais de forma colaborativa, e que nós estimulemos essa política, para que ela possa continuar crescente.
Acho que valeria muito a pena — o Silas é muito jovem ainda —, se ainda houvesse alguma coisa neste momento, um comparativo mesmo, para que o PAR realmente não fique só como um instrumento para as pessoas planejarem. Ele precisa dar o passo seguinte. E o PAR se aproxima muito de tudo o que nós estamos discutindo na estrutura do Sistema Nacional de Educação. Há pernas e braços organizados nos entes subnacionais nos quais precisamos avançar muito.
E aí, Prof. Paulo, há esse seu olhar do que a Europa está fazendo e do pouco que nós fizemos. Nós precisamos — não neste momento, mas, qualquer dia desses em que o senhor estiver à disposição — fazer uma reunião mais aprimorada com os Parlamentares da Comissão de Educação para discutirmos o pós-pandemia.
Os nossos estudantes ficaram 2 anos fora da escola. O que significa isto na vida escolar deles: ficar 2 anos sem nenhum contato com a vida escolar? Para estudantes de classe média ou de classe abastada, com certeza esse vínculo com a escola permaneceu forte. Os estudantes empobrecidos deste País perderam o vínculo com a escola, e nós sabemos que, para alguns estudantes, a linguagem de casa não é a linguagem da escola. Ele não fez essa travessia e agora ficou descolado e deslocado. Como é que ele faz para dar o passo seguinte? Eu perguntei a muitos: "Por que você não fez a inscrição no ENEM?" E recebi a seguinte resposta: "Para quê? Eu não me preparei. Eu não estava na escola".
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Então, o mundo da academia para ele é o mundo da escola. Ele não o leva para casa, porque em casa ele não tem o que tem na escola. Diferentemente dos filhos que saem da escola e encontram em casa a mesma estrutura que eles têm na escola — ou melhor. São equipamentos tecnológicos, livros, pais bem informados. Os meninos que precisam da escola como única condição de fazer a travessia em suas vidas não tinham isso em casa. A família tinha um celularzinho. Como é que ele assistia às aulas on-line? Então, nós erramos muito enquanto país com as nossas crianças, com os nossos jovens, e precisamos dar o passo seguinte.
Nós recebemos estas pessoas aqui: o Romeu, a quem agradeço muito e sei o quanto a cabeça deve estar fervilhando, com mil ideias de projetos que este País poderia fazer; o Paim, uma pessoa com objetividade, capacidade de pensar e de construir políticas públicas, que vai nos ajudar muito a pensar o passo seguinte.
E nós haveremos de dar o passo seguinte. Parece que ficamos numa areia movediça. Não sabemos bem onde estamos pisando, se conseguimos firmar o próximo passo. Mas haveremos de pisar de forma mais segura. E, para isso, devemos construir alguma coisa agora, neste momento. Eu sei que todo mundo já chama o Paim de professor também, porque ele é um grande professor. E onde você está hoje, Paim, você está fazendo trabalhos pelo País inteiro e vai continuar ajudando. Eu tenho certeza de que você está pensando nos milhões de estudantes, como aquele menino do Paraná, para quem eu liguei. Ele disse para mim: "Nós queríamos aprender". Isso mexeu fortemente comigo, mexeu muito comigo. "Nós queríamos aprender, agora nós não podemos nos matricular de novo porque o ano escolar está fechado." E isso vai também para aqueles e aquelas que defendem que os meninos devem ser reprovados e no cotidiano devem ficar na escola. Eles vão se ater isso para dizer: "Viu? Deveriam ter reprovados os meninos". Não é essa a resposta também, nós sabemos disso.
E recebemos também: o Prof. Paulo, com toda sua capacidade, toda sua formação, toda sua experiência no Brasil e no exterior, que também pode muito nos ajudar nesta reflexão; e o Silas, a quem agradeço pela oportunidade e pela sugestão para esta audiência.
Nós tivemos uma tarde aqui de muita contribuição à educação brasileira. Nós vamos fazer um relatório final, depois das ideias, das mensagens aqui repassadas. Queremos agradecer muito a todos e a todas que nos acompanharam. Vamos deixar nas nossas redes sociais todas as falas à disposição. Quero convidar os quatro participantes para estarem conosco em outras oportunidades, discutindo a educação.
Antes de encerrar os trabalhos, agradeço fortemente aos palestrantes pelas brilhantes falas e contribuições nesta audiência pública, assim como a todos que nos acompanharam. Vi várias pessoas aqui no Youtube mandando mensagens. Estamos aqui prontos também para dar continuidade a esse trabalho.
No próximo dia 29 de novembro, às 9 horas da manhã, haverá audiência pública para tratar da situação institucional do INEP e do ENEM.
Neste momento, encerro a presente audiência pública e deixo novamente os agradecimentos a todos pelas grandes contribuições.
Muito obrigada.
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