3ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA 56 ª LEGISLATURA
Comissão Especial destinada a proferir parecer à Proposta de Emenda à Constituição nº 32-A, de 2020, do Poder Executivo, que "altera disposições sobre servidores, empregados públicos e organização administrativa"
(Audiência Pública e Deliberação Extraordinária (semipresencial))
Em 3 de Agosto de 2021 (Terça-Feira)
às 15 horas
Horário (Texto com redação final.)
15:11
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O SR. PRESIDENTE (Fernando Monteiro. PP - PE) - Havendo número regimental, declaro aberta a 9ª Reunião Extraordinária da Comissão Especial, destinada a proferir parecer à Proposta de Emenda à Constituição nº 32-A, de 2020, do Poder Executivo, que altera disposições sobre servidores, empregados públicos e organização administrativa.
Encontra-se à disposição na página da Comissão na Internet a ata da 8ª reunião, realizada no dia 14 de julho de 2021.
Fica dispensada a sua leitura, nos termos do parágrafo único do art. 5º do Ato da Mesa nº 123, de 2020.
Não havendo quem queira retificá-la, em votação a ata.
Os Deputados que a aprovam permaneçam como se encontram. (Pausa.)
Aprovada.
Informo que a sinopse do expediente recebido encontra-se à disposição na página da Comissão na Internet.
A Ordem do Dia está dividida em audiência pública e deliberação de requerimentos.
Peço licença aos convidados e indago aos membros se podemos dar início à reunião pela deliberação do requerimento da pauta, já que a Ordem do Dia do Plenário pode começar em breve. (Pausa.)
Em votação o Requerimento nº 113, que requer a realização de audiência pública.
Os Deputados que o aprovam permaneçam como se encontram. (Pausa.)
Aprovado.
O tema da audiência pública de hoje é sobre carreiras típicas de Estado e servidores contratados por prazo indeterminado.
Esclareço que esta audiência cumpre decisão do colegiado em atendimento aos Requerimentos nºs 4, 16, 22, 26, 28, 40, 47, 57, 64, 78, 85, 110 e 112.
Agradeço desde já a presença dos nossos convidados.
Informo que, para seguirmos as normas necessárias ao distanciamento social, cada convidado presencial virá à mesa apenas no momento da sua fala.
Os convidados de hoje são: Rosilene Corrêa Lima, Secretária de Finanças da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação; Edvandir Felix de Paiva, Presidente da Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal; Cibele Franzese, Professora da Fundação Getúlio Vargas; Rudinei Marques, Presidente do Fórum Nacional Permanente de Carreiras Típicas de Estado, que se encontra presente; Unadir Gonçalves Junior, Presidente da Federação Brasileira de Sindicatos das Carreiras da Administração Tributária da União, dos Estados e do Distrito Federal — FEBRAFISCO; e Pedro Fernando de Almeida Nery Ferreira, Consultor Legislativo para Economia do Trabalho do Senado Federal.
Passo a palavra à Sra. Rosilene Corrêa Lima, Secretária de Finanças da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação, por até 15 minutos.
A SRA. ROSILENE CORRÊA LIMA - Boa tarde a todos e a todas. Boa tarde, Presidente, Deputado Fernando Monteiro. Cumprimento todos e todas que estão compondo a Mesa comigo e todos que estão nos acompanhando.
Nós ainda não conseguimos fazer com que o debate da PEC 32 chegue a toda a população. Nós estamos aqui discutindo carreiras de Estado e serviço público, mas, na verdade, nós estamos discutindo mesmo é o serviço que continuará ou não a ser prestado para toda a população. Então, a PEC 32, de fato, não pertence a nós, do ponto de vista do interesse direto, mas a toda a população. Nós precisamos ter muito em mente é que ela não consiga transformar isso em uma disputa entre servidores, que vão ficar numa condição que inclusive, num cenário caótico como este, pode ser entendida como um privilégio.
15:15
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Acho que devemos ter muito em mente a nossa capacidade de articulação, de mobilização, para combatermos a PEC 32, porque ela será, se aprovada, um grande mal para nós servidores e servidoras. E o será duplamente, porque eu serei prejudicada como cidadã, usuária do serviço público, mas também como trabalhadora, portanto, como servidora de carreira no serviço público do magistério.
Neste debate que estamos fazendo nesta audiência também não podemos nos descuidar da questão central que nós estamos discutindo aqui, que é a possibilidade de a PEC abrir portas para terceirização e contratação de forma muito precária, ou seja, a precarização dos serviços com essas condições. E quando falamos da contratação por tempo determinado e indeterminado, na verdade quando falamos em abrir mão daquilo que foi um grande ganho para o Brasil, para o serviço público, que está previsto na Constituição de 1988, nós estamos literalmente abrindo mão disso. Nós tivemos essa conquista que é a forma universal, ou seja, universalizamos a forma de contratação. Eu mesma sou prova disso. Eu fui contratada no serviço público de Goiás, em 1982, ainda sem concurso. Houve demissão em massa na mudança de Governo. E foi um caos para nós trabalhadores que ficamos reféns da vontade, do desejo de um novo Governador. Então, quando a Constituição nos garante isso e dá uma outra lógica ao serviço público, nós não podemos permitir que nos dias de hoje, em pleno século XXI, o Brasil sofra um retrocesso como esse, que é o desmonte do Estado através da aprovação dessa PEC.
Nós entendemos que a PEC 32 tem dois objetivos muito claros. Ela quer, na verdade, desresponsabilizar o Estado, porque à medida que ela provoca mudanças, que incentiva a privatização e a mercantilização, no caso da educação, o Estado transfere as suas responsabilidades, fazendo, inclusive, com que isso gere lucro para alguém em detrimento do atendimento e das condições que nós temos de prestar o serviço e também das nossas condições de trabalhadores.
O que chama muita atenção é que, em momento algum, quando se fala da necessidade das reformas, o debate da dívida pública é trazido para esta discussão. Ele está sempre sendo poupado. Esse ponto foi simplesmente poupado em todas as reformas aprovadas até aqui. Então, há uma distorção em toda essa lógica da necessidade de se aprovar mais uma reforma que certamente será mais danosa até, eu avalio, do que a reforma da previdência.
Quando vemos as consequências disso, falamos também do desmonte da condição dos atuais servidores. Nós teremos as nossas carreiras atacadas e restrições aos nossos direitos. Não é verdade que ela vai atingir apenas os novos concursados, até porque são muito poucos. Os atuais também serão fortemente atacados nos seus direitos, nos seus planos de carreira, portanto. E a forma da nova contratação é literalmente um oba-oba no serviço público, uma volta ao clientelismo e às nossas contratações. Sabemos muito bem como isso funcionava tempos atrás e estamos assistindo aqui a uma tentativa de volta a essas condições. Portanto, eu fico imaginando a corrida que será para a ocupação dos cargos que hoje são ocupados por servidores de carreira. Esses cargos poderão ser ocupados, pura e simplesmente, por um crivo político. Isso é muito grave.
15:19
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O que nós estamos colocando em debate aqui é uma mudança na estrutura do Estado brasileiro de forma profunda. Como eu disse, não é só dos nossos direitos, mas das consequências disso para o serviço que é prestado e deve continuar sendo prestado, o quanto isso vai comprometer. As carreiras típicas e os cargos com vínculo indeterminado correm esse risco enorme. Quando falamos de cargos e vínculos, perguntamos: vínculo com quem? Acho que essa é a pegadinha. O servidor passa a ter vínculo a quê, ou melhor, com quem? Vai ficar refém de que crivo? Qual será a sua avaliação? Ao pensarmos no novo formato, em que ele vai passar por esse período de avaliação e vai ser avaliado a partir de alguns critérios, quem é o gestor, qual o critério que esse gestor vai adotar para a avaliação e permanência ou não no serviço público? Tudo isso não está claro. E isso com certeza não trará nenhum benefício ao serviço público.
Falamos de uma reestruturação. Na verdade, não é o que se está pretendendo. A reestruturação pretendida, na verdade, é o desmonte, é a retirada de direitos. Mudar a forma dessa contratação para a forma a que assistimos hoje, de rachadinhas nos gabinetes, é estender isso para todo o serviço público, para todas as instâncias do serviço público e para as suas três esferas. Não há que se pensar em uma reforma dessa natureza.
Havendo acordo com qualquer carreira que seja do serviço público, a própria Previdência fica ameaçada, porque, com uma nova forma de contratação cujo vínculo não é com a carreira, não haverá contribuição para as previdências, vai para o INSS. Portanto, isso compromete também quem já está, porque não haverá como sustentar isso também. Então, são várias as consequências que colocam em risco seríssimo a sobrevivência do serviço público.
Por isso trazemos essa preocupação. Sei que nós teremos outras audiências. Não podemos deixar de aprofundar, na verdade, o debate das questões das pegadinhas que estão previstas nessa proposta da PEC 32. Nós precisamos aprofundar muito esse debate, mas de forma transparente.
15:23
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Acho que o Parlamento tem uma responsabilidade muito grande com isso, uma responsabilidade não só com servidores, mas com toda a população. É preciso que V.Exas., Parlamentares, falem a verdade para as pessoas. Não se pode fazer um discurso como se estivesse tendo responsabilidade, principalmente atribuindo uma responsabilidade ao próprio usuário. Não se trata só dos servidores, mas do próprio usuário. Desde que temos no Brasil a retomada de um projeto em que não cabe o pobre no orçamento, então, ao tratar o serviço público como algo a ser repensado porque custa muito, na verdade, nós estamos aqui discutindo a exclusão da assistência daquele que mais necessita. Esse é o debate central que o Parlamento brasileiro precisa fazer.
O que, de fato, está em jogo? Atendendo a quem o Parlamento estará, ao atuar, ao aprovar uma PEC nas condições apresentadas, a PEC 32? Na verdade, essa PEC não é para atender à população, muito pelo contrário, é para reduzir o papel do Estado e tirar a sua obrigatoriedade daquilo que ele precisa atender.
Quando falei que precisamos ter o cuidado para não tratarmos, de alguma forma, de não caracterizar que algumas carreiras ficarão com caráter de privilégio, é isso. Porque algumas continuarão com sua estabilidade, com seus planos de carreira próprios, em detrimento de outros. Como isso vai ser tratado? Alguns podem perder direitos conquistados e outros não? Como nós teremos uma realidade de serviço público em que se tem... Claro que temos as excepcionalidades, não estamos falando que somos todos iguais na função. Porém, temos sim regras únicas. Somos todos servidores.
Temos países que trabalham exatamente numa lógica de dar condição de equalizar essa relação no serviço público, numa lógica de valorizar e fazer com que atenda bem. E aqui nós estamos na contramão disso. Então, acho que não ajuda esse debate quando fazemos distinções no nível que nós estamos tendenciosos a fazer. Acho que temos que buscar outro caminho a fim de não tomarmos nenhuma medida para hierarquizar o serviço público, porque hoje já temos algumas carreiras que, em alguns momentos, parece que se descolam do restante dos servidores públicos.
Eu estou aqui como trabalhadora da educação, pedagoga, para reafirmar que nós, educação e saúde, representamos mais de 50% do serviço público no Brasil. E posso garantir a vocês, conhecendo vários Municípios do Brasil, Nordeste afora e outras regiões, aqui mesmo, em alguns Municípios de Goiás, em que nós temos uma média salarial que talvez não chegue a 3 mil reais. Essa também é a realidade da saúde.
Então, é uma farsa dizer que é preciso moralizar o serviço público retirando direitos dos seus trabalhadores. Nós precisamos, sim, de uma reestruturação do serviço público com mais investimento para atender bem ao nosso público. Certamente, o caminho não é retirar direitos conquistados e muito menos mudar a forma do ingresso no serviço público. Isso, sim, será desmoralizar. Isso, sim, será deixar de servir o povo brasileiro, conforme seu direito constitucional. Isso, sim, será um retrocesso e será termos de volta uma realidade, inclusive para nós mulheres, em que lidamos com situações de assédio no ambiente de trabalho, onde eu vou ter que me submeter a algumas regras impostas pelos homens, pelos coronéis do serviço público, que se acham donos do Estado. Eu vou ter que me submeter a isso, especialmente se eu quiser ter uma trajetória na minha carreira de ocupar cargos de chefia, porque era a isso que nós infelizmente assistimos, e que o serviço público, a partir do concurso, a partir da Constituição, corrigiu muito.
15:27
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Esse Brasil não nos serve. Esse modelo de serviço público não nos serve. Por isso, "não" à PEC 32!
Muito obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Fernando Monteiro. PP - PE) - Obrigado, Rosilene Corrêa Lima.
Passo agora a palavra para o Edvandir Felix de Paiva, Presidente da Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal — ADPF, por até 15 minutos.
Boa tarde, Edvandir.
O SR. EDVANDIR FELIX DE PAIVA - Boa tarde, Presidente. Obrigado. É um honra de participar dessa audiência pública.
Eu represento a Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal, que é a voz dos delegados da nossa querida Polícia Federal.
A primeira preliminar que eu gostaria de abordar é o momento para a tramitação dessa reforma. Eu já falei isso na CCJ e tenho que repetir agora para o nosso querido Relator Arthur Oliveira Maia, com quem tivemos muitas interlocuções já na época da PEC da Previdência do Governo Temer. Durante a reforma da Previdência do Governo Bolsonaro, nós conversamos bastante também, porque ele é um interessado na matéria. Nós já dizíamos, naquela época, que o momento para se fazerem as reformas tem que ser um momento em que se possa fazer um debate bem amplo sobre o assunto. Eu sei que estamos aqui tentando fazer esse debate, mas não é a mesma coisa. Hoje nós não conseguimos fazer o corpo a corpo com os Deputados por conta da pandemia. Está na cabeça de cada brasileiro muito mais um instinto de sobrevivência, de sair desse período tenebroso do que tratar de uma reforma tão profunda no Estado brasileiro, uma reforma que pretende alterar a maneira como o próprio brasileiro enxerga a prestação do serviço público.
Essa reforma é baseada em dados secretos — hoje mesmo li na imprensa que vão decretar sigilo dos dados que embasaram a reforma administrativa. Nós já sabíamos que a reforma administrativa é uma casa construída sobre um pano, em que não existe fundação. Por isso é muito difícil, Deputado Arthur Oliveira Maia, atender aos seus apelos para que proponhamos mudanças no texto para que ele fique mais adequado. Nós não encontramos nada bom nesse texto que possa ser modificado. As bases são muito ruins.
A base principal desse texto, Deputados, Parlamentares e colegas que estão acompanhando, é a demonização do servidor público. Parte-se da premissa — isso não são palavras minhas nem dos servidores, mas palavras do próprio Governo — de que o servidor público é um inimigo, é um parasita, é um mal, é o principal mal da economia e dos problemas sociais do Brasil.
15:31
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Se nós construirmos uma reforma com base nessa premissa, o que nós vamos aproveitar? Nós sabemos que não somos o mal da sociedade. Muito pelo contrário, agora no momento da pandemia nós somos o elemento que está salvando vidas, o elemento que está protegendo a sociedade e que está colocando a própria vida em risco, como é o caso dos policiais, para proteção da sociedade em um momento tão difícil como esse. Acho que não poderia haver um momento tão emblemático para demonstrar a importância do servidor público.
O texto da reforma vem com premissas de que ela é a modernização do Estado, de que ela vai trazer uma economia de custos. Os números não são apresentados, e, quando são apresentados, são alguns chutes. Só para fazer um paralelo, durante a reforma da Previdência, o Governo apresentou vários números que ora superestimava, quando eram a favor do Governo, e ora subestimava, para afastar as argumentações contra o Governo. Agora, recentemente, o TCU apresentou uma apuração que diz que os números estavam errados. Então, como nós vamos acreditar nesses números que são chutados pelo Governo Federal? Quais são os números? O que embasa a reforma administrativa? Por que a reforma administrativa é importante para o País? Nós não temos essas respostas, e vamos fazer uma reforma com base em uma situação em que não há respostas, modificando profundamente o serviço público brasileiro?
Digo serviço público brasileiro entre aspas, porque uma reforma que pretende reformar apenas parte do serviço público não é possível de se entender. Vários e vários setores do serviço público não estão sendo atingidos pela reforma. Esse é outro ponto da PEC 32 que é praticamente impossível de se resolver. Hoje mesmo vimos uma reportagem em que o Presidente da Câmara dos Deputados dizia que o Poder Judiciário não poderia participar da reforma porque seria inconstitucional. Então eu digo o seguinte: por que não foi feito um pacto entre os Poderes para se fazer uma reforma ampla, que realmente combatesse algum tipo de privilégio? Essa reforma não combate privilégio nenhum. Todos os direitos que estão ali no inciso XXIII do art. 37 falam de direitos que o Poder Executivo não tem mais há muito tempo, e os outros Poderes não estão entrando na reforma. Então, ela é parcial.
Quando uma mudança que pretende combater privilégios não atinge todos os setores, ela não passa de uma peça publicitária. Está se dizendo à sociedade brasileira que há uma PEC para combater privilégios, mas isso não é verdade. A PEC 32 não combate privilégios. A PEC 32 é apenas uma peça publicitária para demonstrar que está sendo feita uma alteração profunda na estrutura do Estado, mas que vai permitir — e isto é o que nos preocupa mais em relação à estabilidade e à criação de vínculos — um apoderamento do poder político sobre os cargos públicos. Isso nos preocupa bastante.
A Polícia Federal hoje está vulnerável. Nós falamos, há mais de 11 anos, que a Polícia precisa de algumas proteções, precisa de um mandato para o Diretor-Geral, precisa de uma escolha por lista, precisa de autonomia administrativa. Há vários anos nós falamos isso. A PEC 32 piora essa situação. Por quê? Porque ela dá ao Presidente da República um poder de decreto muito maior do que ele tem hoje. Imaginem um Presidente da República que possa modificar a estrutura de um órgão de Estado como a Polícia Federal!
15:35
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Eu não estou querendo fulanizar a situação nem estou falando sobre o Governo atual, embora vários e vários exemplos que já vêm sendo citados há mais de 1 década estejam aí presentes. A questão é que nós estamos fazendo mudanças na Constituição Federal que vão valer para governos, governos e governos. Então, todo governo vai poder fazer uma alteração na estrutura dos órgãos de Estado, órgãos como a Polícia Federal, podendo inclusive mudar critérios para a assunção de cargos de chefia dentro da Polícia Federal por decreto. A polícia estará mais ainda exposta, mais ainda vulnerável a qualquer tipo de intervenção. É isso que a PEC 32 está fazendo. É por isso que nós a chamamos de PEC da destruição do serviço público e dos órgãos de Estado, como a Polícia Federal.
A PEC 32 é a pior notícia que nós tivemos nos últimos tempos sobre aquilo que mais interessa a nós integrantes da Polícia Federal, que é ser um órgão de Estado que não protege nem persegue ninguém, que faz o seu trabalho para além de interesses do governo da vez, porque é isso que os princípios republicanos do Estado Democrático de Direito exigem. Na PEC 32, nós estamos piorando uma situação que já não é boa, de vulnerabilidade de um órgão de Estado.
Eu falo da Polícia Federal porque é o meu órgão, é a minha casa, é onde eu trabalho há mais de 1 década e meia. Então, me preocupa muito que meu órgão esteja desse jeito. Mas me preocupa também que tantos outros órgãos de Estado e tantas outras posições no serviço público sejam precarizadas, sejam vulnerabilizadas, não somente com a perda da estabilidade.
Por que nós falamos da perda? Eles dizem assim: "Ah, mas os integrantes da Polícia Federal não vão perder a estabilidade". Onde é que está escrito isso? As carreiras típicas de Estado não estão definidas na Constituição Federal. Nessa PEC, não há sequer um conceito. Ainda que houvesse um conceito, conceitos são interpretados e ficam muito voláteis. Este é um assunto sério. O servidor público não pode ter estabilidade numa hora e noutra não. Estabilidade não é privilégio, estabilidade é uma garantia da sociedade. Então, o texto não diz quais são os cargos típicos de Estado. Ele fala em cargos, não fala em carreiras. Vai haver dentro de órgãos pessoas com estabilidade e outras sem, permitindo-se que pessoas que podem ser demitidas a qualquer momento façam parte de um órgão como a Polícia Federal. Como é que essas pessoas terão tranquilidade para fazer um serviço tão delicado, que esbarra no poder público, no poder político e econômico mais forte, a todo momento?
Mais uma vez, ressalvo que eu estou dando o exemplo da Polícia Federal porque é a minha casa, mas todos estamos preocupados com a estrutura do serviço público brasileiro. Qual será a vantagem de cargos cujos ocupantes poderão ser demitidos a qualquer momento, de vínculos de tempo indeterminado?
15:39
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Foi dito que, dando-se mais poder ao decreto do Presidente, ele teria mais flexibilidade. Mas quem disse que o Governo tem que ter flexibilidade para mexer em órgãos? Eu custo a imaginar, Relator e Presidente, que a Câmara dos Deputados, que o Parlamento brasileiro vá abrir mão do controle constitucional, que inclusive não é só da Constituição. É um princípio do Estado Democrático de Direito, vigente nas sociedades mais organizadas e mais desenvolvidas, que um órgão fiscalize o outro, que um Poder fiscalize o outro, que se estabeleçam entre os Poderes e órgãos os freios e contrapesos. Então, o Parlamento brasileiro vai abrir mão de aprovar, de discutir as medidas, vai deixar que o governo da vez mexa em órgãos do Poder Executivo, vai dar um cheque em branco permanente na Constituição Federal para o governo da vez?
E não é verdade que o governo fica amarrado, porque o governo tem as medidas provisórias. Muitos governos governam por medidas provisórias, e as medidas provisórias passam pelo crivo da Casa. Agora não vai mais acontecer isso. Nem medida provisória vai haver mais, haverá apenas um decreto. Tudo bem, o decreto pode ser sustado, mas isso não está dentro do processo legislativo. A sustação vai depender do momento político da vez, das alianças que forem feitas. Nós não queremos que o serviço público fique assim, a Polícia Federal muito menos. Haverá uma destruição. Por isso, mais uma vez digo que nós chamamos essa proposta de PEC da destruição da Polícia Federal e dos órgãos.
Há outros pontos, como o vínculo de experiência. Eu imagino um delegado trainee, um delegado que vai conduzir investigações enquanto ainda compete com outras pessoas pelo cargo. Que condições esse delegado terá para exercer as suas funções? Que condições um policial federal ou mesmo os ocupantes de outros cargos, como os agentes, escrivães e papiloscopistas, terão para exercer seus cargos com tranquilidade?
Então, a reforma não me parece ser um instrumento para fazer as mudanças nem as alterações que nós imaginamos ser necessárias. Fala-se de avaliação de desempenho, mas a avaliação de desempenho já está prevista na Constituição há anos e nunca foi regulamentada. Por que não estamos trabalhando para regulamentar a avaliação de desempenho? Nós somos favoráveis a uma avaliação de desempenho efetiva, bem-feita, transparente, republicana, com que possamos separar os melhores, a instrumentos de gestão dentro dos órgãos para que possamos ter o reconhecimento dos melhores, para que haja uma competição entre os servidores pela excelência na prestação do serviço público.
Tudo isso pode ser feito sem uma PEC como essa, que, mais uma vez eu digo, é uma peça publicitária para o mercado. E eu acredito que nem esse efeito ela terá, porque essas peças baseadas em dados secretos já perderam a credibilidade. Essa terceirização que querem fazer talvez só atenda a alguns setores privados que estão interessados nesse mercado tão importante, que hoje é ocupado pelo serviço público. Mas é ocupado pelo serviço público porque isso é a garantia de que principalmente o mais pobre, o mais necessitado terá aquele serviço público. Com essa PEC, a população corre o risco de perder qualidade na prestação de serviço, ao contrário do que dizem que ela busca fazer. Terceirização não vai resolver problema nenhum.
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Então, nós temos muitos problemas, e o nobre Relator Arthur Maia, com quem já temos certa vivência e que entendo ser uma pessoa bastante bem-intencionada, bastante interessada em evoluções na prestação do serviço público, recebeu uma missão terrível, que é construir algo em cima de um alicerce muito ruim, de premissas muito ruins. A nossa reforma está sendo feita no momento errado e da maneira errada, então não tem como dar certo. Os resultados vão ser muito ruins. Eu não sei nem como salvar alguma coisa no texto. Não há como proteger as instituições de Estado da maneira como o texto está. Eu não sei se o Relator irá construir um novo texto, se ele vai começar uma nova proposta. Quando o relatório vier é que nós vamos saber.
Pedimos, nobre Relator, a oportunidade de conversarmos a respeito disso mais detidamente, para que, se não for possível engavetar essa proposta muito ruim, possamos discutir um texto totalmente diferente, porque esse aí não serve para nada, é um atraso para o Brasil e um castigo injusto para os servidores públicos do País, que demonstram toda a sua importância neste momento de pandemia.
Encerro a fala por aqui.
Agradeço ao Presidente, ao Relator e aos ouvintes e espectadores pela participação da voz dos delegados de Polícia Federal. Muito obrigado. Boa tarde.
O SR. PRESIDENTE (Fernando Monteiro. PP - PE) - Obrigado, Edvandir Felix de Paiva.
Agora, tem a palavra Cibele Franzese, professora da Fundação Getúlio Vargas, por até 15 minutos.
Boa tarde, professora.
A SRA. CIBELE FRANZESE - Boa tarde, Deputado. Boa tarde a todas e todos os que acompanham a sessão. É um prazer estar aqui para debater com vocês.
Eu trouxe alguns apontamentos, na verdade, alguns dados, para conversarmos sobre eles. Vi que vocês estão fazendo uma abordagem bastante abrangente da PEC. Vou falar apenas sobre os cargos por tempo indeterminado, não vou falar sobre outro tema. Acho bem importante haver um debate bastante aberto e democrático. Estou bastante feliz de poder participar desta discussão e trazer uma visão mais acadêmica, com o objetivo de contribuir para o debate.
Vou compartilhar minha tela com vocês.
(Segue-se exibição de imagens.)
A primeira questão que eu quero trazer é o panorama internacional. Existe uma divisão entre vínculo estatutário e vínculo contratual em outros países. Então, podemos observar que existe mais de um tipo de vínculo em outros lugares.
15:47
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Eu trouxe alguns exemplos da OCDE. Na Alemanha, há 40% de vínculo estatutário e 60% de vínculo contratual. O que chamamos de estatutário são no Brasil os vínculos do nosso Regime Jurídico Único. Na Espanha, essa divisão é mais ou menos meio a meio, parecida com a da Alemanha, mas com maioria de vínculo estatutário e uma ligeira minoria, praticamente igual, de vínculo contratual. Na Irlanda, que é um país mais flexível, há um sistema mais de posição e menos de carreira, com 12% de vínculo estatutário e 88% de vínculo contratual. Na Itália, há 15% de vínculo estatutário e 85% de vínculo contratual. Na França, em que há um sistema bastante rígido de carreiras, mais semelhante ao do Brasil, há 80% de vínculo estatutário e 20% de vínculo contratual. No Reino Unido, há só 8% de vínculo estatutário e 92% de vínculo contratual. Na Suécia, é praticamente tudo contratual, há pouco vínculo estatutário.
Eu trouxe esses dados só para mostrar que o panorama é bastante diferente nos outros países. Aqui, como sabemos, existe só um tipo de vínculo. Então, o Brasil seria praticamente o contrário da Suécia: 100% de vínculo estatutário e quase nada de vínculo contratual.
Estes dados são do Atlas do Estado Brasileiro, do IPEA. O que está em azul-claro é o que temos de vínculo estatutário, o que está em verde é o que temos de vínculo temporário e o que está em vermelho é o que temos de CLT. O que a Constituição permite é que o da CLT seja o das empresas públicas e empresas de economia mista. Então, a grande maioria no Brasil são os estatutários, isso porque temos o Regime Jurídico Único. A Constituição diz que nós teremos um único regime para todos os servidores da administração direta, autárquica e fundacional, para todas as funções exercidas pelo Estado, e que as funções, no caso brasileiro, são organizadas em carreira.
Então, a primeira coisa que eu queria destacar é que não precisaríamos ter carreiras ou cargos típicos de Estado, poderíamos ter funções ou atividades típicas, porque no Brasil, assim como na França, por exemplo, temos muita fragmentação de carreiras. Temos às vezes mais de uma carreira para o exercício do mesmo tipo de função. Portanto, o que é típico ou não do Estado seriam funções, e não carreiras. No Brasil, isso importa porque temos um único regime para todas as funções, o que, como vimos, não é comum em vários países. Vários países administram mais de um tipo de vínculo, o que poderia ser o caso do Brasil, se assim nos interessasse. Vejo, pela opinião dos que me antecederam, que essa não parece ser uma alternativa oportuna. E é isso que eu queria trazer para refletirmos.
Aqui temos um dado do CONASS — Conselho Nacional de Secretários de Saúde que fala sobre o número de trabalhadores lotados nas Secretarias Estaduais de Saúde por vínculo. Ele traz que metade desses servidores são estatutários. A outra metade tem diversos tipos de vínculo. Podem perguntar: "Mas como, se temos um regime jurídico único, pela Constituição?". Na verdade, temos um tipo que também é estatutário, mas tem função gratificada, temos um tipo que é comissionado, então está dentro da Constituição, mas temos um tipo que já é celetista. Isso é uma coisa um pouco estranha, porque um servidor da saúde ser celetista é uma coisa não tão esperada. Um servidor da saúde deveria ser da administração direta. Temos também uma porcentagem de terceirizados, que não é um número desprezível: 8,5%. E uma função da saúde terceirizada não é de se esperar. Temos ainda um tanto que é de prestador de serviços, o que também não é de se esperar, um tanto que é de fundações estatais, um tanto que é de organizações sociais, um tanto que é de municipalizados, o que é de se esperar, porque a saúde é bastante municipalizada — mas esse tanto não é muito grande: 3,9% —, um tanto que é de servidores federais cedidos para Secretarias Estaduais de Saúde, que também é pequeno e, por fim, um tanto que é de outros tipos. Mostro isso tudo para dizer que, apesar de termos um vínculo, o Regime Jurídico Único, Estados e Municípios já fazem muitas coisas que poderíamos chamar, se entendermos que o único tipo vínculo que merece o nome de vínculo meritório é o estatutário, de precarização, e todas elas dentro de alguma legislação. Então, já há tipos de regimes jurídicos escondidos ou subterfúgios que acontecem na prestação dos serviços sociais, portanto o vínculo estatutário não é o único tipo que acontece nos serviços sociais.
15:51
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Eu não tenho o mesmo dado para a educação, infelizmente, porque a educação não tem isso organizado no CONSED, mas sabemos que isso acontece fortemente nas creches. No ensino fundamental, não, mas, nas creches, isso acontece fortemente, com o Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil — MROSC, não por meio das organizações sociais, mas por meio das OSCs. Então, isso já acontece.
Este dado é do Atlas do Estado Brasileiro. Sabemos que a média salarial dos servidores do Governo Federal, aliás, dos servidores do nível federal, porque isso envolve o Judiciário e o Legislativo, é bem maior do que a média dos Estados e dos Municípios. A Rosilene chamou atenção para isso. E os serviços sociais são prestados principalmente por Estados e mais ainda por Municípios, que estão na ponta. A média salarial está em 2.800 reais, muito diferente dos 9.100 reais do Governo Federal. Os principais serviços para a população estão aqui, e esses serviços não seriam, à primeira vista, os serviços a serem encaixados nas carreiras típicas de Estado.
Aí, a pergunta que eu faço é: podemos ter um novo tipo de vínculo? Será que é oportuno termos esse novo tipo de vínculo, considerando-se que essa nova regulamentação recairia justamente sobre os profissionais que já recebem os menores salários? Então, deixo aqui mais essa reflexão. Nós já temos hoje, no art. 41, a regulamentação do estágio probatório e da estabilidade, que se adquire após 3 anos de efetivo exercício. Então, durante o estágio probatório, já existe a possibilidade de demissão desses servidores, embora isso, no Brasil, hoje, seja muito pouco efetivado. Já existe também a possibilidade de perda do cargo por avaliação periódica de desempenho. Aí eu queria trazer uma questão: será que o cargo por tempo indeterminado nos possibilitará atacar o problema do desempenho? O problema do desempenho, sim, é um problema grave no Brasil.
15:55
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E aí eu trago outra reflexão. A questão do desempenho pode ser enfrentada, mas não com a demissão. A demissão é o último recurso para um problema de desempenho. O problema do desempenho pode ser enfrentado com dirigentes competentes, comprometidos com resultado, que respondam a metas, que respondam a uma gestão por resultados e que vão trabalhar junto à sua equipe com uma gestão cotidiana do desempenho, com gestão de metas, com gestão por competências, com feedback e com uma avaliação periódica que tenha consequências. As consequências da avaliação podem ser uma capacitação, uma formação, uma realocação do servidor. Podem ser diversas as consequências, sendo o extremo delas a demissão. Mas a demissão em si não é nunca o primeiro remédio para uma insuficiência de desempenho. Ela é a última das alternativas.
Então, a perda do cargo não é o primeiro remédio para uma insuficiência de desempenho. Se for, ela pode ser regulamentada por lei complementar, como já diz o art. 41 da Constituição. Portanto, em tese, eu não preciso do cargo por tempo indeterminado para efetivar uma demissão por insuficiência de desempenho; eu posso fazê-lo dentro do cargo com estabilidade.
Para terminar, porque o meu tempo já está acabando, vou falar sobre o cargo por tempo indeterminado. Vários países têm desses cargos, e o Brasil também poderia ter. Porém, nós não sabemos se isso traz condições de precarização ou não ao tipo de trabalho que nós já temos, principalmente com a preocupação sobre os cargos que prestam serviços sociais. Eu digo isso porque nós não temos o pacote de regulamentação para saber como tudo se dará. Como será a previdência desses cargos por tempo indeterminado? Eles vão ter a previdência do INSS, manter Fundo de Garantia? Como vão ser as condições do cargo por tempo indeterminado? Nós não temos uma proposta detalhada do que acontecerá.
Ele, certamente, não é o remédio para o baixo desempenho. O baixo desempenho precisa de uma gestão do desempenho, e não de uma possibilidade de demissão. E ele não fortalece as áreas sociais, que são hoje os serviços essenciais para a melhoria da qualidade de vida dos cidadãos brasileiros. Nesse sentido, ele acabaria fortalecendo mais ainda as carreiras de Estado, que hoje já são as carreiras de elite do serviço público brasileiro, que já são as carreiras mais bem remuneradas, e nós precisamos fortalecer as carreiras que prestam serviços sociais para a população. Isso não significa que precisamos enfraquecer as outras carreiras. Não é isso, mas precisamos olhar para as carreiras que prestam serviço em áreas como educação e saúde, que têm indicadores sociais que precisam ser melhorados para aumentar a qualidade do serviço para a população. Termino por aqui, deixando, então, alguns apontamentos para reflexão.
15:59
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O SR. PRESIDENTE (Fernando Monteiro. PP - PE) - Obrigado, Cibele Franzese.
Convido para tomar assento à mesa o Sr. Rudinei Marques, Presidente do Fórum Nacional Permanente de Carreiras Típicas de Estado — FONACATE, que fará uso da palavra por até 15 minutos.
O SR. RUDINEI MARQUES - Boa tarde, Deputado Fernando Monteiro, Deputado Arthur Oliveira Maia, Deputado Rogério Correia, Deputado Rui Falcão, Deputado Professor Israel Batista, demais Deputados aqui presentes, senhoras e senhores.
Eu falo aqui em nome do Fórum Nacional Permanente de Carreiras Típicas de Estado. Nós estamos há exatamente 11 meses debatendo a PEC 32. Desde que ela foi encaminhada pelo Governo ao Congresso, no dia 3 de setembro de 2020, nós começamos a discutir esse assunto, tentando entender do que se tratava. Produzimos 22 cadernos sobre a reforma administrativa. Os 17 primeiros foram condensados no livro Rumo ao Estado necessário. O 22º caderno será lançado agora, na quinta-feira.
Pois bem, depois de 11 meses de debates com todo o espectro político e econômico, com especialistas da academia, ninguém, até o momento, conseguiu mostrar exatamente, de forma inequívoca e com base em evidências, como a PEC 32 melhora o serviço público — ninguém! A Profa. Cibele falou agora dos vínculos. Em que a mudança de vínculos melhora a prestação de serviços públicos? É isso que tem que ser dito. Pelo que se fala, parece que a PEC vai resolver o problema do serviço público brasileiro; nós mostramos que não, que ela vai piorar o serviço público; e os defensores da reforma não conseguem mostrar em que medida ela aprimora o Estado. Então, este é um debate que, nesses 11 meses, tem se revelado completamente esquizofrênico. Afinal, o que nós estamos discutindo, pessoal? O que nós estamos discutindo?
16:03
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O Ministro Paulo Guedes esteve aqui nesta Comissão. Ele admitiu que a estabilidade é um instituto importante; que, se não fosse a estabilidade, as denúncias de corrupção não viriam à tona; que os órgãos têm que ser preservados. Bom, em contrário senso, a PEC destrói a estabilidade.
Nós estamos vendo como, realmente, a estabilidade é importante, pois neste momento percebemos um assédio institucional sem precedentes na história da República. O Assediômetro da AFIPEA Sindical já registrou quase 900 casos de assédio institucional. E nós estamos vendo isso em vários órgãos, inclusive na Polícia Federal. Falou há pouco aqui o Presidente Paiva, da ADPF, e nós vimos o que aconteceu com o Delegado Alexandre Saraiva.
Eu mesmo sou auditor da CGU. Olhem, francamente, eu me envergonho quando vejo que a CGU, que já teve, no passado, o papel de promotora da transparência pública, do enfrentamento à corrupção, que é o principal órgão de combate à corrupção do Executivo Federal, agora parece ter virado uma avalista das posições de Governo.
Nós não podemos aceitar esse tipo de coisa, e a estabilidade para isso é fundamental. O Ministro Guedes veio aqui e disse que ela é fundamental. No entanto, a PEC vai em outra direção.
O Ministro também disse que nós temos que rever aquela história dos cargos de liderança. Bom, trata-se de um loteamento, de um aparelhamento total da máquina pública por indicações políticas. Na União, passariam de 6 mil para 90 mil os cargos de indicação política. Não dá para aceitar isso.
O Ministro também disse que nós temos que combater os altos salários. Bom, então, não disseram a ele que isso não está na PEC 32, está no PL 6.726/16, que foi aprovado aqui na Câmara, depois de já ter sido aprovado no Senado.
Ele disse também que a PEC traz a digitalização do serviço público, com o uso intensivo de novas tecnologias. Isso não está na PEC; isso está no PL 14.129/21, que foi sancionado agora em março.
Ele disse que temos que mexer na avaliação de desempenho. Bom, publiquei um artigo no Estadão, na semana passada, falando justamente da gestão de desempenho no setor público e mostrando que esse tema passa longe da PEC 32.
O Ministro também afirmou que o Presidente Bolsonaro disse, desde o início, que a PEC não pode afetar os direitos do funcionalismo atual. Bom, a Frente Servir Brasil encaminhou um expediente para o Presidente da Câmara, Arthur Lira, trazendo oito pontos em que a PEC atinge diretamente os atuais servidores. Ela por exemplo, facilita as demissões, retira dinheiro da previdência. Quer dizer, lá na Emenda Constitucional nº 103 já foi prevista uma contribuição extraordinária que vai além da alíquota progressiva, e agora estão esvaziando os recursos previdenciários, porque, se entrar menos gente no Regime Próprio, será tirado dinheiro da previdência, será criado, artificialmente, um desequilíbrio atuarial. Para que isso? Para lá na frente instalar mais uma contribuição para os servidores. As alíquotas, que hoje já vão até 22%, vão chegar a quanto? A 40%?
Então, a PEC atinge não só os servidores atuais ativos, mas também os aposentados. A PEC afeta todos eles. Ela acaba com o Regime Jurídico Único, deixa os servidores numa insegurança jurídica, sem saber a que regime estarão submetidos.
Por fim, alega-se economia, não é? Eu me lembro de que o Deputado Rui Falcão cobrou o Ministro Guedes, que ora falava em 300 bilhões de reais, ora em 400 bilhões de reais, ora em 800 bilhões de reais. O TCU agora está oficiando à Casa Civil pedindo que se mostre onde é que está a economia, porque isso não foi demonstrado em nenhum momento. Quer dizer, de que economia está se falando? Depois vou falar um pouco mais sobre isso à luz das reformas administrativas que ocorreram na Europa pós-crise norte-americana, todas elas orientadas por austeridade fiscal e todas com os mesmos problemas, que estão sendo repetidos aqui. Temos um caderno especificamente sobre isso, o Caderno 22, que será lançado agora, na quinta-feira.
16:07
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O que deveríamos estar discutindo neste momento? O futuro que nos aguarda. Meus caros, vamos viver, na saúde, um colapso nos próximos anos, porque o Ministro Guedes já disse que há reposição de só 26% dos servidores que se aposentam, e a pandemia vai deixar um resquício de sequelas físicas e psicológicas que vão ter que ser tratadas pelo SUS. Nós não estamos pensando nisso.
Na educação, há 5,5 milhões de alunos que estão completamente afastados da educação pública e 4 milhões de alunos que não receberam nenhuma atividade neste período da pandemia, em virtude da exclusão digital. Estamos pensando nisso? Estamos pensando em um Estado melhor, para dar mais educação? Não. Estamos pensando que talvez a reforma administrativa vá trazer economia fiscal, e nem isso foi demonstrado nos documentos que embasam a proposta.
Na área social nem se fala. Há 19 milhões de pessoas que acordam sem saber o que vão ter para comer. A Comissão Econômica para a América Latina — CEPAL já mostrou que no pós-pandemia teremos um incremento na pobreza extrema em toda a América Latina. E aqui no Brasil quem dá conta de toda essa situação é o Estado, mas o Estado vai fazer menos e pior, pelo o que está na PEC, quando deveria fazer mais e melhor.
Por fim, a Nota Técnica 69, do Senado Federal, já deixou claro — para mim isso é evidente, já que atuo na área de enfrentamento à corrupção há 20 anos, por conta da CGU — que a PEC 32 vai incentivar a corrupção no Brasil, por vários motivos, seja pelos contratos de gestão, seja pelos vínculos precários, seja pelo vínculo de experiência. São várias as situações, e não vou ter tempo de me alongar. A PEC é um verdadeiro marco de instauração de um vale-tudo na área pública, o que não podemos permitir.
Dos Cadernos da Reforma Administrativa que lançamos mais recentemente, vale falar um pouquinho do Caderno 18. O que ele mostra? Que as outras reformas que foram feitas em outros países nem sempre se prestam para comparações com o que está sendo feito no Brasil. Alguns especialistas dizem: "Não, mas a reforma administrativa em Portugal...". Portugal tem 10 milhões de habitantes, e nós temos mais 200 milhões. As metodologias utilizadas nesses outros países são diferentes e muitas vezes incomparáveis. Portanto, esses números têm que ser utilizados com cautela.
O Caderno 19 fala do que está no pano de fundo da reforma administrativa, que é o trabalho sob demanda. Trata-se do que fizeram na reforma trabalhista. Com isso, pode-se contratar um professor universitário para assumir uma disciplina por 6 meses e, depois, mandá-lo embora. Já foi dito pelo próprio Governo muitas vezes que não querem trabalhador na folha de pagamento por 50 anos. Então, assumam isso. Assumam! Se é esse o propósito da reforma administrativa, assumam que querem precarizar as relações de trabalho e deixar o pessoal ao deus-dará, sem uma cobertura previdenciária na sua aposentadoria, porque é isso que querem.
16:11
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Então, trabalho sob demanda, contratação sob demanda é o que aguarda o servidor público. Trata-se da lógica da gamificação. Falam tanto da gamificação do trabalhador privado, e é isso que está sendo trazido para dentro do setor público, uma lógica privada contratualista, e não a lógica do interesse do direito público.
Bom, sobre a militarização do serviço público eu nem vou falar. Nós passamos de 960 militares em cargos civis, no primeiro Governo Lula, para, agora, mais de 6 mil. Isso é um abuso. Os militares são bons, têm que ser respeitados, têm que ser valorizados, mas nas Forças Armadas, não no setor público. Talvez isso esteja um pouco na gênese de todo esse caos que nós vivemos no País.
Como eu já falei, vai ser lançado agora, na quinta-feira, um caderno sobre as reformas administrativas no pós-crise norte-americana de 2008. Foi um abuso as sete maiores economias do mundo terem gastado 1 trilhão de dólares para pôr as conta em dia no sistema financeiro, fazendo, por outro lado, economia com serviços públicos, com investimento público e com despesa para atender, muitas vezes, aqueles que mais dependem do Estado.
Vou correr um pouco para tentar entrar no tema aqui.
O art. 247 da Constituição fala de garantias especiais para a perda do cargo pelo servidor público estável que, em decorrência das atribuições do seu cargo efetivo, desenvolva atividades exclusivas do Estado. Quer dizer, a Constituição já fala disso, mas isso nunca foi regulamentado. Nós estamos, desde 1998, desde a Emenda nº 19, sem a regulamentação dessas atividades.
Quais são as atividades cujos servidores teriam garantias adicionais em caso de demissões por insuficiência de desempenho ou de demissões por conta das leis fiscais, decorrentes dos arts. 41 e 169 da Constituição? Por que esses servidores precisam de garantias adicionais? Eu nem precisaria, talvez, entrar tanto nesse tema, porque é óbvio, em função de tudo isso que estamos vivendo, que há áreas sensíveis, estratégicas, que precisam ser protegidas.
O Paiva falou há pouco tempo da Polícia Federal. O Delegado Alexandre Saraiva representou contra um Ministro de Estado. Como é que ele não vai ter uma proteção adicional, para evitar que a avaliação desempenho seja utilizada como retaliação, para evitar que, por corte de despesas, mandem embora esse servidor? Esse raciocínio vale para todas as áreas sensíveis.
Quando se fala em carreira de Estado, nós tão falando da própria existência do Estado. Não tem sentido cortar servidores nessas áreas, isso seria o mesmo que dizer: "O Estado está abdicando da sua atuação em relação aos objetivos fundamentais da República". Então, essas atividades precisam ter garantias adicionais para quem quer que exerça esses cargos.
O fortalecimento das instituições estratégicas de Estado confere ao Estado de Direito previsibilidade, confiança, moralidade sistêmica, blindagem institucional — é isso que nós não estamos vendo, muitos órgãos estão sendo aparelhados, lembremos que o COAF foi punido por exercer em plenitude as suas funções, foi transferido para o Banco Central; como é que nós não vamos proteger esses servidores? —, independência quanto a ingerências políticas e quanto a interesses escusos, proteção institucional quanto a capturas pelo mercado, resistência contra assédio institucional e perseguições ideológicas.
16:15
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Enfim, para tudo isso, nós precisamos de garantias adicionais, o que não afeta a responsabilização civil, administrativa e regressiva desses servidores. Isso já se aplica às carreiras de magistratura, do Ministério Público, da Advocacia Pública e da Defensoria, conforme o CPC, arts. 143, 181, 184 e 187.
Quando o Governo criou lá atrás as agências reguladoras, ele tentou, até por meio da Lei nº 9.986, de 2000, contratar servidores por regime celetista. O STF, à luz da ADIN 2.310, disse que ele não podia fazer isso. Então, temos que ter cuidado também para não querer aqui reinventar a roda e ter problemas lá na frente.
Entrando aqui rapidamente no que nós do fórum consideramos atividades exclusivas do Estado, buscando não ser exaustivo, mas exemplificar quais as áreas a que nós precisaríamos dar uma proteção adicional, cito: segurança pública e perícia oficial de natureza criminal; inteligência de Estado e defesa; diplomacia; controle interno e externo; correição; transparência; ouvidoria; auditoria governamental; prevenção e combate à corrupção; política monetária e cambial — como não proteger esses servidores?—; administração financeira e finanças públicas; gestão da dívida pública — como não proteger os 5 trilhões de reais da dívida pública? Como colocar, por meio do vínculo de liderança, com o qual se pode exercer qualquer função, inclusive funções técnicas e estratégicas, alguém diretamente na gestão da dívida pública, alguém nomeado ontem, para gerir 5 trilhões de reais? Com muito menos, já se faz um estrago —; regulação e supervisão do sistema financeiro nacional; emissão e distribuição do meio circulante; regulação, fiscalização e controle do mercado; planejamento e orçamento federal; regulação e fiscalização agrária e agropecuária; administração tributária — pensem na Receita, nem a Receita Federal ficou a salvo de ingerências políticas, não é? Têm que ser protegido esses servidores —; fiscalização aduaneira; gestão de políticas de comércio exterior; gestão governamental e políticas públicas; regulação e fiscalização das relações de trabalho; planejamento e pesquisa aplicada; atividades-fim de jurisdição; legislação; Ministério Público; Advocacia Pública; Defensoria Pública; segurança jurídica; assistência jurídica aos necessitados; desenvolvimento econômico e social; magistratura; Ministério Público; Legislativo.
Bom, por fim, vou às sugestões. O Relator Deputado Arthur Maia sempre tem pedido sugestões, não é?
O SR. ARTHUR OLIVEIRA MAIA (DEM - BA) - Eu diria para você que, se não estivermos 100% ajustados nisso aí, estamos 99%. Garanto-lhe isso.
O SR. RUDINEI MARQUES - Olha, excelente.
O Relator está dizendo que temos acordo em boa parte das...
O SR. ARTHUR OLIVEIRA MAIA (DEM - BA) - Não, boa parte, não. (Risos.) Olhe o que eu falei: 99%.
O SR. RUDINEI MARQUES - Bom, 99%, que é quase tudo.
Só para finalizar, permita-me, Relator, falar das sugestões.
Em primeiro lugar, à luz do que eu falei no início — esses são nossos sentimentos, eu estou sendo bem franco aqui —, não vemos em que a PEC 32 melhora o serviço público. Então, ela é desnecessária.
O SR. PRESIDENTE (Fernando Monteiro. PP - PE) - Rudinei, em respeito aos outros convidados, concedo-lhe mais 1 minuto para concluir.
O SR. RUDINEI MARQUES - Ah, sim.
Se for para corrigir, Deputado André Figueiredo, por conta da Servir Brasil, composta por Parlamentares que estão aqui conosco, como o Deputado Professor Israel Batista, a Emenda nº 7 tenta corrigir o incorrigível.
Sobre as carreiras de Estado, há uma emenda, que é a Emenda nº 6, do Deputado Lincoln Portela, que julgamos razoável, porque ela preserva os cargos que já são descritos na Constituição e diz que podem ser acrescentados aqueles que ainda vierem a ser regulamentados como tal.
Quanto às outras emendas, nós achamos que, por serem muito abrangentes, elas esvaziam um pouco o conceito.
A Emenda nº 59 nos pareceu muito restritiva, porque ela se circunscreve às forças de segurança.
16:19
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Então, meus caros, obrigado pela atenção.
Fico por aqui, à disposição.
O SR. PRESIDENTE (Fernando Monteiro. PP - PE) - Obrigado, Rudinei Marques.
Agora passo a palavra ao Sr. Unadir Gonçalves Junior, Presidente da Federação Brasileira de Sindicatos das Carreiras da Administração Tributária da União, dos Estados e do Distrito Federal — FEBRAFISCO, que dispõe de até 15 minutos.
O SR. UNADIR GONÇALVES JUNIOR - Boa tarde, ilustre Presidente Fernando Monteiro, ilustre Relator Arthur Maia, demais Deputados, aos quais cumprimento na pessoa do Deputado Rogério Correia, da Frente Parlamentar Mista do Serviço Público, e demais convidados que aqui nos ladeiam.
Gostaria de dizer que estou aqui representando a FEBRAFISCO, uma entidade que representa a administração tributária nos âmbitos estadual e federal, entidade filiada à CONACATE — Confederação Nacional das Carreiras e Atividades Típicas de Estado, e também à Pública Central do Servidor.
Nós agradecemos imensamente aos Deputados da Frente Parlamentar Mista do Serviço Público, que nos proporcionaram estar aqui neste importante debate, discutindo este tema importantíssimo para os servidores públicos, que é esta PEC 32, uma PEC que, como podemos observar pela fala de todos que nos antecederam, não traz nada para beneficiar o povo brasileiro, traz é prejuízo para os jurisdicionados.
O povo foi colocado em último lugar quando foi pensada essa PEC. Na verdade, como tem se demonstrado aqui, ela nada mais é do que uma tentativa de atender aos anseios do mercado pelas tais ditas reformas. Ela ataca um dos principais pilares do Estado brasileiro, que é o Estado de bem-estar social, previsto na Constituição Federal de 1988.
Há outras reformas muito mais importantes que poderiam ser colocadas na fila do Congresso Nacional para que pudessem, sim, reformar o Estado brasileiro naquilo que é necessário. Falo principalmente da reforma tributária, que também está aí no Congresso Nacional, mas, exatamente por solicitação desses que estão pedindo a reforma administrativa, fica empacada, não é? Ela não consegue seguir.
Há também a reforma do Imposto de Renda, muito tímida, que foi encaminhada pelo Governo Federal e, assim que chegou ao Parlamento, foi torpedeada pelo mercado. Foi dito que ela iria quebrar os empresários. Na verdade, nós sabemos que a principal sugestão, que é a tributação dos dividendos, não tem nada a ver com tributação de empresa. A tributação de dividendos trata de recursos de pessoa física, dos donos das empresas, que não pagam nada, 0%, enquanto o servidor público paga 27,5% de Imposto de Renda, além da sua contribuição previdenciária.
16:23
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Então, nós precisamos fazer com que tudo isso venha à luz. E esta audiência pública é importante para isso, para que coloquemos o debate da reforma administrativa no lugar certo. Nós precisamos de uma reforma administrativa que pense no que é necessário para que o povo tenha um serviço público melhor, para que o Estado de bem-estar social pensado na Constituição Federal de 1988 seja colocado em prática, e não o inverso, não o desmonte.
Eu trouxe uma pequena apresentação. Os nossos colegas praticamente esgotaram o tema, mas eu vou fazer alguns pequenos comentários, e no final acredito que possamos enriquecer o debate de forma mais apropriada.
(Segue-se exibição de imagens.)
O Presidente da República apresentou a PEC 32, através do Ministro Paulo Guedes, como se ela combatesse os serviços caros e ineficientes vendidos ao povo, o que é um engodo, porque nós não temos nada disso. Alguns serviços são ineficientes, sim, mas caros certamente não. Tratou-se também da necessidade de flexibilizar normas da administração pública, que é um dos motores dessa PEC.
A PEC busca flexibilidade com a extinção do Regime Jurídico Único, que seria substituído por cinco novos vínculos: vínculo de experiência; vínculo de prazo determinado; cargo de liderança e assessoramento; vínculo de prazo indeterminado; e cargo típico de Estado. Os dois últimos nós estamos trabalhando aqui hoje.
O cargo típico de Estado, como alguns já colocaram muito bem, não traz o tratamento de carreiras típicas de Estado, que seria o mais adequado considerando que o Estado tem atividades e funções típicas de Estado que são exercidas muitas vezes por carreiras, e não por determinado cargo específico. Então, isso é uma impropriedade que, mesmo demonstrada por diversas entidades sindicais, continua sendo levada adiante pela proposta do Governo.
16:27
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A reforma, em tese, aprofunda a terceirização das responsabilidades do Estado através do fortalecimento dos instrumentos de cooperação com a iniciativa privada. Por esses mecanismos, seria possível a transferência de execução de serviços públicos ao particular, com finalidade lucrativa ou não, com a utilização de instalações públicas e força de trabalho particular.
Vejam bem, com a PEC, ficam viabilizados contratos em que seções e órgãos inteiros da administração pública possam ser colocados sob gestão de particulares — bens públicos, criados com recursos públicos, colocados sob a administração de particulares, e, logicamente, com um viés totalmente fora daquilo que nós entendemos para a administração pública e para a finalidade para a qual ela existe, que é para atender à sua população. Não é para ter lucro; isso é exatamente o que acontece quando algum dirigente da iniciativa privada vem para a administração pública. Ele acha que o Estado tem que dar lucro, que no final do mês tem que ter reserva de caixa, essas coisas. E o Estado não tem que dar lucro. O lucro que o Estado tem que dar é para a sua população em serviços públicos de qualidade.
Retornando aos vínculos, registro que a proposta avança duramente sobre duas bases do serviço público: concurso público e estabilidade. Das cinco novas formas, o concurso é exigido apenas para o vínculo de experiência, e será a etapa para o acesso aos cargos de tempo indeterminado e aos cargos típicos de Estado. A estabilidade, que é tão cara hoje ao serviço público, é reservada apenas aos cargos típicos de Estado, sem qualquer menção aos demais. E mesmo essa estabilidade colocada para os cargos típicos de Estado vem mais enfraquecida, porque permite algo que hoje não é possível, a demissão por decisão apenas de órgão colegiado. Sabemos que hoje isso só seria possível com decisão judicial transitada em julgado. Então, isso enfraquece muito a força da estabilidade, inclusive para o cargo típico de Estado.
Quanto ao cargo típico de Estado, o primeiro destaque a ser feito é a ausência proposital de um conceito. Já foi dito que a PEC não traz com clareza esse conceito. A exposição de motivos divulgada pelo Ministério da Economia traz apenas uma menção, uma definição vaga do que seriam cargos típicos de Estado. Ela diz que os critérios para a definição dos cargos típicos serão estabelecidos em lei complementar federal. Também já foi dito aqui que nós não sabemos o que estará na lei complementar federal. Até o momento, nós não temos a indicação de quais seriam esses cargos. Inclusive, a lei complementar federal trará uma norma geral, cabendo aos entes estatais definirem esses cargos, o que pode causar muita disparidade pelos entes federados por aí afora.
16:31
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No mais, a proposta define que o ingresso em cargo típico de Estado é precedido de, no mínimo, 2 anos de vínculo de experiência; o servidor será estável somente após a aprovação em estágio probatório de 1 ano depois desse vínculo de experiência; não pode haver redução proporcional de jornada e remuneração para esses cargos; suas atividades não podem ser objeto de instrumento de cooperação; é o único vínculo a permanecer necessariamente no Regime Próprio de Previdência Social; é vedado ao Presidente da República transformar esses cargos vagos e alterar a estrutura dos cargos ocupados.
O único conceito normativo que a PEC oferece sobre o cargo típico de Estado é que seria o conjunto de atribuições e direitos dispostos a um servidor, definido em lei ordinária, de acordo com os parâmetros de legislação complementar, acessível mediante concurso público, passível de alcançar estabilidade após vínculo de experiência e estágio probatório, parcialmente responsável pela atuação do poder extroverso do Estado.
Este conceito é absolutamente insuficiente para a compreensão da temática, pois não oferece qualquer parâmetro constitucional a diferenciar as atividades que serão protegidas pela estabilidade do concurso público; oferece proteção constitucional insuficiente ao exercício da função pública nos demais vínculos, ao não determinar parâmetros mínimos de impessoalidade, eficiência e moralidade na seleção e no desenvolvimento dos servidores.
O conceito de cargo típico de Estado pode ser comparado aos conceitos de atividades exclusivas de leis e PECs anteriores, nos quais esses cargos são contrapostos a empregos públicos, sem estabilidade e admitidos sem concurso público. Isso aumenta o personalismo na gestão de servidores públicos e é uma ferramenta essencial do patrimonialismo, do clientelismo e do autoritarismo, medidas incompatíveis com nosso Estado social e democrático da nossa Constituição. O concurso público e a estabilidade são expressões do devido processo legal, da igualdade perante a lei e do princípio republicano da impessoalidade e da legalidade. São cláusulas pétreas, que não poderiam ser revogadas pela proposta em debate. Nesse sentido, o cargo típico de Estado como única forma de vínculo estável e selecionado perde sua razão constitucional de ser. Ele deveria, em nosso entendimento, ser ampliado para todas as categorias.
Já finalizando, em um Estado Democrático e social de Direito, considerar típicas ou exclusivas de Estado apenas atividades ligadas à segurança interna, externa, arrecadação e controle é desrespeitar e desatender às demais incumbências que a Constituição atribui ao Estado brasileiro e levará ao desatendimento dos objetivos da República de erradicar a pobreza, reduzir a desigualdade, promover o desenvolvimento e o bem-estar geral.
16:35
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Eu ainda falaria um pouco sobre o cargo com vínculo por prazo indeterminado, mas, como o nosso tempo está terminando, eu deixo para fazer esse comentário ao final, quando pudermos retornar.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Fernando Monteiro. PP - PE) - Obrigado, Sr. Unadir Gonçalves Junior.
Passo agora a palavra ao Sr. Pedro Fernando de Almeida Nery Ferreira, Consultor Legislativo para Economia do Trabalho do Senado Federal, por até 15 minutos.
O SR. PEDRO FERNANDO DE ALMEIDA NERY FERREIRA - Boa tarde a todos.
Quero cumprimentar o Presidente Fernando Monteiro e o Relator Arthur Oliveira Maia. Agradeço o convite da Comissão, em especial do Deputado Kim Kataguiri. Cumprimento os demais colegas que já falaram.
Eu vou fazer uma apresentação um pouquinho diferente do que já foi colocado, porque eu acho que as críticas à PEC e os riscos que estão associados à proposta já foram bem elencados pelos colegas. Então, vou começar minha apresentação e não vou demorar muito.
Eu tenho pensado muito nas vacinas. Acho que todos nós ficamos muito orgulhosos quando percebemos que, bem ou mal, o Brasil conseguiu produzir duas vacinas aqui. Essas vacinas foram liberadas por organizações públicas — como sabemos, o Butantan, no caso da Coronavac; a FIOCRUZ, no caso da vacina de Oxford, AstraZeneca. E eu fiquei me perguntando como conseguimos produzir isso com qualidade — são boas vacinas — e com rapidez, para atender na pandemia. Nós caminhamos nos próximos meses para finalmente conseguir chegar perto do que os países desenvolvidos estão fazendo em termos de cobertura. E me impressionou a ideia de que conseguiríamos fazer isso de forma tão rápida, sendo que o Estado é tão associado à ineficiência e à lentidão. Então, eu queria ver o que o Butantan e a FIOCRUZ têm que outros órgãos não necessariamente possuem.
Há um barulho de obra aqui, vocês estão ouvindo? Dá para continuar? (Pausa.)
Vou continuar. Então, o que fica claro nessas duas instituições é que existe uma mistura de vínculos efetivos com vínculos típicos do Direito Privado. Então, há pessoas que são contratadas como celetistas, sem concurso público, mas ainda com algum tipo de seleção, não têm estabilidade, não se aposentam por regime próprio, que é algo que custa muito no vínculo atual. Na parte de contratação, esses institutos não necessariamente adotam licitações. O emprego dessas regras de Direito Privado não impediu que o resultado fosse a vacina, que é um serviço público, como vemos, gratuito, universal e de qualidade. Então, a provocação que eu quero fazer aqui é como podemos conceber um novo sistema, não necessariamente na PEC, ou talvez alterando a PEC, para que tenhamos serviços públicos universais, gratuitos e de qualidade, ainda que haja uma participação maior de regras do Direito Privado.
O caso do Butantan e da FIOCRUZ não é fácil de replicar. Essas duas entidades têm espécies de entidades sombra. Vamos ver que elas fazem uso de fundações de Direito Privado que podem ser usadas, no caso da ciência e tecnologia, mas que têm um certo gigantismo em relação a esses órgãos. O Instituto Butantan usa muito a Fundação Butantan, privada, do Direito Privado, não de Direito Público como o Butantan, e a Fundação Oswaldo Cruz tem a FIOTEC, que hoje em dia se anuncia como fundação de apoio à Fundação Oswaldo Cruz, e que é regida por normas de Direito Privado. Então, esses dois órgãos públicos usam entidades para ajudá-los, que, às vezes, são bem maiores em algumas atribuições do que o próprio órgão. Nós não podemos imaginar que todo órgão público brasileiro tenha um órgão sombra, como eu o chamo, um órgão paralelo maior para usar regras mais eficientes.
16:39
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Só uma amostra da força desses órgãos: no caso do Butantan, quem comprou a vacina foi a Fundação Butantan, então, uma entidade de Direito Privado. Esses recursos não passaram pelo orçamento do Governo do Estado de São Paulo, por exemplo. E para dar uma ideia do tamanho da FIOTEC, ela foi, no ano passado, a maior prestadora da União, segundo o Portal da Transparência, pelas contratações que a FIOCRUZ fez para ela, quer dizer, a FIOCRUZ dá dinheiro para a FIOTEC, que se aproveita de regras mais flexíveis para conseguir esse fim público.
De novo, funcionários da Fundação Butantan e da FIOTEC não fizeram concurso público, não estão no Regime Jurídico Único, não contribuem para regime próprio de Previdência e não são estáveis.
E uma provocação é: ainda que esse modelo não seja replicável, se ele é considerado eficiente, por que outros órgãos não podem usá-lo? Como é que nós caminhamos para algo nesse sentido? A PEC 32 tem essa ideia, que está sendo discutida ao longo desta tarde, que é a de separar os servidores entre dois grupos. Um grupo basicamente de carreiras de Estado, e outro em formatos sem estabilidade, com outras formas de contratação. E eu acho que isso pode servir para aproximar do modelo vitorioso do Butantan e da FIOCRUZ, mas existem outras alternativas. Essa divisão entre carreiras típicas de Estado e outras formas eu acho que decorre de algo sobre o que nós não conversamos tanto, porque acho que, na prática, nós queremos misturar os que estão associados a cada forma.
Os colegas aqui falaram muito bem sobre o risco de pessoalidade, que nós perdemos quando trocamos o vínculo efetivo, pressões de governantes, pressões do setor privado, que passam a afetar as atribuições, o dia a dia dos servidores públicos; e o outro risco, que é mais associado a essa contratação, é a ideia de que, se o servidor tem estabilidade, ele pode não ser tão responsivo quanto o trabalhador da iniciativa privada, porque ele tem o incentivo de não ser demitido. Então eu acho que nós precisamos acolher essa sutileza, que já existe no modelo atual. Não são todas as pessoas que trabalham dentro do Estado que têm vínculos efetivos, existem os trabalhadores terceirizados, trabalhadores de outras empresas, enfim. Então a minha provocação é a de nós imaginarmos que existe um espectro de possibilidades para as ocupações no setor público. Num extremo, nós temos o risco de ineficiência, se nós dermos garantias demais e poucos incentivos; e no outro, o risco de pessoalidade, quer dizer, de interesses privados serem atendidos, se dermos garantias de menos.
O risco sempre vai existir, mas existem trabalhos em que consideramos o risco de ineficiência mais tolerável. Por exemplo, um delegado, um auditor da Receita, não se cogita de o colocarmos para trabalhar sem estabilidade. Então, nós aceitamos que, tudo bem, pode acontecer de um servidor com esse tipo de vínculo não ser supereficiente, mas nós toleramos esse risco. Da mesma forma, nós não contratamos, não sei, vigilantes com vínculo efetivo porque, na visão atual, não valeria suportar o risco de ineficiência neste caso, não haveria necessidade de muitas garantias, então eu acho que vale essa sutileza.
A PEC 32, nesse arcabouço, concebe carreiras de Estado como algo em que nós toleramos mais o risco de ineficiência, e para as outras carreiras nós não toleraríamos, nós deixaríamos isso de lado.
Feita essa reflexão, eu queria lembrar que não existe muita novidade nessa divisão, como alguns colegas até já mencionaram antes. Eu vou trazer aqui dois modelos que já foram discutidos no Congresso há bastante tempo, um do Ministro Bresser Pereira e outro do Presidente Lula. O modelo do Ministro Bresser Pereira, que foi Ministro da Reforma do Estado no Governo Fernando Henrique, eu acho interessante nós resgatarmos, porque o Prof. Bresser é hoje um intelectual mais próximo do trabalhismo, do próprio presidenciável Ciro Gomes, do PDT, e, pelo que eu vejo das entrevistas recentes dele, ele não rejeita as ideias de reforma administrativa dele dos anos 90. Então, eu acho que esse é um exercício interessante de se resgatar. Uma das publicações principais daquele período traz essa divisão entre as atividades do Estado. O Prof. Bresser, então Ministro, dizia que algumas unidades deveriam ser privatizadas, quer dizer, aquelas em que o Estado está atuando diretamente produzindo bens de mercado (falha na transmissão) mas deveriam ter uma flexibilidade, dificuldades principais, que eles chamam aí de core, atividades de Estado (falha na transmissão). Então tem muito a ver com o que estamos falando aqui.
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Outro modelo que acho interessante é o da proposta, que foi polêmica (falha na transmissão) pelo Presidente Lula, no seu segundo mandato, em 2007, que chegou a ser aprovada nas Comissões, não sem controvérsia, teve voto em separado, e já está até pronta para a pauta em plenário. O que era esse PLP 92, de 2007? Quer dizer, não PEC. Era um projeto que regulamentava uma parte da Constituição, que já está colocada, prevendo as fundações de Direito Privado. Tem muito a ver com o de que estamos falando aqui. Quer dizer, haveria áreas do setor público que não contratariam concursados, contratariam por CLT.
Na proposta do Presidente Lula, as ações seriam obtidas para todas estas áreas: saúde, assistência social, cultura, desporto, ciência e tecnologia, meio ambiente e previdência complementar do servidor público, turismo e comunicação, incluindo os hospitais universitários. Então, essa discussão que o Rudinei colocou agora há pouco sobre o que é carreira de Estado ou não é mais ou menos isso que está colocado ali. Contrataríamos celetistas, sem estabilidade, podendo ser demitidos, contribuindo para o INSS nesse modelo do PLP do Presidente Lula.
Aqui ele traz a questão dos hospitais universitários federais. Essa é uma questão um pouco resolvida em vários entes. Ainda sem reforma, foram criadas as estatais, não estatais com finalidade lucrativa, mas estatais para que se aproveitem das regras mais típicas de Direito Privado que há ali. No caso da União, há a EBSERH. Há um caso interessante do Governador Flávio Dino, no Maranhão, que não é nenhum neoliberal, que é a criação da EMSERH para a administração de hospitais locais.
Então eu acho que, se baixarmos um pouco a bola, da Direita à Esquerda, vemos boas tentativas de melhorar a prestação de serviço público, mantendo o regramento mais rígido para carreiras consideradas de Estado ou algo análogo e com o regramento mais flexível, mais destinado por eficiência, a incentivos típicos do setor privado para outras carreiras.
E gostaria de trazer uma questão que eu acho importante para a Comissão. A PEC não precisa tratar apenas de matéria constitucional. Ela pode tratar de matéria típica de legislação ordinária, inclusive para temas que ela trata como sendo dessa forma. Vimos muito isso na reforma da Previdência, com aquela Emenda nº 113, que é tão grande porque tem uns 20 artigos para regras temporárias. Quer dizer, a emenda constitucional insere na Constituição a previsão de que algo vai ser regulamentado por lei, mas ela não espera que essa lei venha. Ela própria traz um dispositivo com força de lei, que pode ser alterado por nova lei. Por exemplo, avaliação do servidor público. A PEC pode tratar sem constitucionalizar esse assunto, dizendo que, até que uma nova lei venha, vai ser assim ou assado, porque existe uma crítica de vários setores de que a PEC não é, digamos, ambiciosa o suficiente, não tem efeitos em curto prazo, porque ela não regulamenta vários temas, deixa para lei, e não pensamos assim. A PEC 32, ou eventualmente outra proposta, pode, sim, ter efeito em curto prazo; pode, sim, regulamentar temas, sem que isso provoque constitucionalização, e ela poderia ser inclusive mais efetiva se fizesse isso.
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Se concordamos que é muito difícil delimitar o que é carreira de Estado, se isso é muito polêmico, se não for possível mexer em qualquer desses temas por PEC, existem alternativas para melhorar o sistema atual, na busca de mais eficiência, não passando por PEC, não passando por criar fundação privada, nem nada. Uma é manter o sistema atual, mas instituir a avaliação do servidor público. Como já foi colocado aqui, isso já está previsto na Constituição desde a última reforma administrativa, e um fato curioso é que o PLP 248, de 1998, já foi inclusive apreciado na Câmara e no Senado, já voltou para a Câmara e está pronto para ir ao plenário. Poderia até ter, em curto prazo, um efeito mais significativo, lembrando que a Constituição já prevê que o servidor, mesmo o servidor estável, pode ser desligado em caso de uma avaliação de desempenho insatisfatória. Faltou lei regulamentar. Então isso pode ser feito.
Mantendo o sistema atual, podemos rever a legislação ordinária para algo de que pouco se fala, e que é muito importante principalmente para as atividades em que existe atendimento ao público, como educação, saúde, previdência social, que é rever o limite de faltas. Pouca gente sabe disso, mas a Lei nº 8.112 permite, de certa forma — não é que ela permite, mas o limite que está colocado lá é muito flexível —, que o servidor falte muito mais do que seria tolerável no setor privado, sem que isso provoque seu desligamento ou sua substituição. Então, são permitidos 30 dias seguidos ou 60 intercalados em 1 ano. Somente nesses casos extremos é que se observa o que a Lei nº 8.112 chama de abandono do cargo ou de inassiduidade habitual, o que justificaria o desligamento do servidor.
Então hoje é permitido faltar até esses limites sem justificativa. É claro que pode haver desconto da remuneração, mas, se o cara falta 20 dias seguidos, o médico ou o professor, ou 40 dias, 50 dias intercalados em 1 ano, a administração não tem direito de demiti-lo, ainda que o pessoal fique na mão, haja fila em hospital, as crianças fiquem sem aula de matemática. Acho que essa é uma alteração simples e teria amplo apoio, inclusive das categorias. Eu acho.
Outra mudança mais simples, que eu acho que pode ser efetiva em corrigir eventuais fragilidades do nosso modelo atual de estabilidade, é ampliar o alcance do Portal da Transparência. Há uma lei fantástica aprovada pelo Parlamento e sancionada pela Presidente Dilma na década passada, que é a Lei de Acesso à Informação. Ela melhorou muita coisa. Temos um dos modelos mais transparentes do mundo, e eu acho que o Portal da Transparência pode ser aprimorado para incluir não só questões como remuneração, que já foi um tabu que foi derrubado, mas também informações sobre jornada dos profissionais, eventuais faltas, dados de produtividade, até avaliações de desempenho. Podemos avaliar desempenho ainda que não haja uma nova lei prevendo o desligamento nesse caso, e isso ampliaria o controle social. Então, cria-se um estímulo, um desincentivo a uma atuação mais desidiosa do servidor, sem mudar a lei. Eu estou falando: "Olha, eu vim aqui ao posto, vou ao Portal da Transparência ver. Aqui está falando que o médico está aqui, mas eu sei que o médico não está aqui". Então provoca esse tipo de resposta. Ou então a professora do meu filho faltou, mas o site não está registrando, ou estou vendo aqui que o funcionário que me atende não sei onde tem uma produtividade baixa, e eu estou vendo que ele não está indo para o trabalho. Portanto, esse tipo de controle, via Portal da Transparência, utilizando a tecnologia, é uma alternativa, se for considerado muito drástico mexer na Constituição.
Por fim, eu acho que, independentemente do modelo, uma fragilidade que a PEC tem é que ela não traz o sistema de cotas para a Constituição, que seria algo muito desejável. Está se discutindo muito no Brasil, até em programa trainee, as cotas, e eu acho que, se não for possível alterar o sistema atual, então é melhor que, pelo menos, o provimento dos cargos públicos seja mais inclusivo do que é hoje.
Esse modelo atual de estabilidade permite que nós servidores, principalmente na União, recebamos mais do que os nossos contrapartes na iniciativa privada, que esse chamado prêmio salarial seja mais bem distribuído entre gênero e raça, também permitindo que o servidor seja mais parecido com a pessoa que ele serve.
16:51
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Vale lembrar que hoje nós temos mais brancos entre os servidores públicos do que entre os celetistas. O concurso público, a estabilidade são instrumentos um pouco elitizados. Se nós constitucionalizássemos as cotas, elas poderiam passar a valer para todos os entes, todos os poderes, inclusive para os militares. Nós poderíamos ampliar os mínimos, incluir cotas de gênero. Acho que essa é uma iniciativa que vale a pena.
Então, as minhas considerações finais são de que existe um potencial enorme em reformas administrativas para se combater a desigualdade se nós pensamos que o Estado gasta muito mais com educação e saúde do que com transferência de renda. Nós podemos ter regras que beneficiem os mais pobres, mas típicas das usadas para os mais ricos. E é essa a comparação que eu faço com as vacinas. Nós podemos ter um serviço público melhor mesmo com regras de Direito Privado.
Essa é a minha contribuição. Agradeço a atenção.
O SR. PRESIDENTE (Fernando Monteiro. PP - PE) - Muito obrigado, Pedro Fernando de Almeida Nery Ferreira.
Eu ia passar agora a palavra para o Relator Arthur Maia, mas ele não está presente.
Então, vamos começar com um orador inscrito e um Líder. O primeiro orador inscrito é o Deputado Pompeo de Mattos, que não está presente. O primeiro Líder inscrito é o Deputado Rogério Correia, mas ele vai querer juntar... O segundo membro inscrito é o Professor Israel Batista, que eu consulto se vai querer juntar com o tempo de Líder.
O SR. PROFESSOR ISRAEL BATISTA (PV - DF) - Eu quero juntar sim.
O SR. PRESIDENTE (Fernando Monteiro. PP - PE) - O Deputado Professor Israel Batista tem a palavra por até 6 minutos.
O SR. PROFESSOR ISRAEL BATISTA (PV - DF) - Muito obrigado, Sr. Presidente, Deputado Fernando Monteiro.
Eu quero primeiro agradecer a todos os que participaram da audiência hoje trazendo informações importantes, trazendo dados relevantes, para que esse debate seja um debate de alto nível. As audiências públicas servem para que o Congresso tome pé da situação. As audiências públicas servem para que nós nos informemos sobre o assunto, porque os Deputados não são obrigados a saber de todos os assuntos o tempo inteiro. Nós temos 37 mil projetos de lei em tramitação no Congresso Nacional, e é humanamente impossível que saibamos de tudo. Por isso, nós Parlamentares dedicamos esse tempo para ouvir, dedicamos esse tempo para entender os processos, os projetos com os quais nós nos envolvemos.
E hoje, todos os que aqui fizeram suas apresentações fizeram apresentações que seguem no mesmo curso de outras apresentações de especialistas convidados pela Frente Parlamentar em Defesa do Serviço Público, pela Frente Servir Brasil, pela Frente Parlamentar da Reforma Administrativa, liderada pelo Deputado Tiago Mitraud. E todos foram unânimes, Sr. Presidente. Todos até agora foram unânimes em apontar que o texto não traz um direcionamento, o texto não traz melhorias para o nosso serviço público.
E o texto ataca uma coluna, um pilar de sustentação do nosso modelo de serviço público que foi longamente debatido, desde a Assembleia Constituinte iniciada em 1987. Esse debate sobre estabilidade é muito importante. Quando nós dos movimentos de representação dos trabalhadores dissemos, lá no início dessa discussão, ainda em setembro, que a estabilidade era inegociável, era porque nós compreendíamos que, de todos os aspectos nefastos dessa proposta, o pior aspecto era justamente atacar essa base de sustentação do nosso serviço público.
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Presidente Fernando Monteiro, eu digo que outros países se diferenciam do Brasil porque adotam modelos de estabilidade um pouco diferentes do nosso modelo. Mas há uma regra geral sobre estabilidade. E não podemos desconsiderar que, no Brasil, os problemas que a estabilidade visa resolver se apresentam de forma mais aguda, mais grave do que em outros países.
Se queremos mesmo melhorar o serviço público, não deveríamos estar debatendo esse aspecto. Imagine que os servidores das carreiras que hoje manterão a estabilidade, os atuais servidores que talvez não sejam afetados por todos os efeitos maléficos do fim da estabilidade vão conviver com novos servidores não estáveis, vão conviver com novas carreiras diferentes, voltando a um estado de desordem jurídica que vivíamos antes da aprovação do Regime Jurídico Único, quando um professor universitário entrava na sala de professores de um curso na universidade e encontrava colegas que eram regidos por até cinco regimes diferentes embora exercessem o mesmo papel dentro daquela instituição pública.
A estabilidade é essencial não só para algumas carreiras, não só para os atuais servidores. Ela é essencial, Presidente, para as equipes de serviço público. Um auditor da Receita precisa ter um administrativo estável também, porque nós estamos criando nas equipes elos fracos. É o auditor vai colocar uma multa e é um administrativo que vai colocar a multa no fundo da gaveta, porque recebeu a ligação do Governador. É disso que estamos falando.
E me preocupa muito a posição do Deputado Arthur Maia de dizer que a estabilidade ou o fim da estabilidade para todas as categorias é o seu ponto de honra, porque não podemos ficar marcando posições aqui.
Todos os especialistas que estiveram nesta Comissão, nesta audiência pública foram unânimes nesse aspecto. Alguns defenderam que aplicássemos certas reformas. Alguns trouxeram novidades, inovações. E escutamos com muita atenção.
Mas me parece que a posição da Mesa tem sido hermética, Presidente Fernando. E eu quero aqui protestar. A posição do Relator, do Presidente não pode ser hermética, porque, senão, as audiências públicas serão um mero enfeite, serão apenas algo pró-forma. O Congresso Nacional, numa audiência pública, faz uma consulta aos especialistas, a quem estuda o tema há muito tempo. A Frente Servir Brasil, com o apoio do Fonacate, de outras entidades, do nosso conselho curador, já apresentou 22 estudos, todos com base técnica e apoio de grandes universidades brasileiras –– todos.
E, por isso, queríamos que essas audiências calassem fundo na tomada de decisões. Esta Comissão é o lugar mais especial, porque é aqui que vamos entender o assunto profundamente. E lá no plenário os nossos colegas vão pedir a nossa opinião. Nós nos tornaremos a referência. É para isso que serve a Comissão Especial.
Então, eu pediria ao Presidente Fernando Monteiro, ao Relator Arthur Maia, com quem eu pretendo conversar ainda esta semana, que levassem em consideração o fato de que todos os especialistas convidados por todas as frentes têm a mesma impressão de que o debate sobre a estabilidade é um debate perigoso, um debate infrutífero.
16:59
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Não podemos nos esquecer de que, neste momento, o Governo brasileiro é prodigioso no bullying institucional, nos ataques aos servidores, na tentativa de calar a liberdade de expressão. Neste momento, o Governo brasileiro impõe um duro estresse às instituições democráticas.
Não é prudente, Presidente Fernando Monteiro, fazer uma alteração dessa profundidade na composição e no formato de entrada no serviço público nesse momento de tempestade contra a democracia que o nosso País está vivendo.
O SR. PRESIDENTE (Fernando Monteiro. PP - PE) - Obrigado, Deputado Professor Israel Batista.
Esta Comissão é democrática. Inclusive, muitas vezes, aqui temos convidados que falam mais contra do que a favor. O Plenário é soberano para votar ou não o relatório do Relator, para aprová-lo ou não. Que isso fique bem claro.
Fico aqui indignado porque, com o maior respeito que eu tenho ao serviço público, parece que no Brasil está tudo bem. As pessoas subestimam aqueles que ficam na fila da saúde, aqueles que não têm educação. E o dever do político é transformar a vida das pessoas. Quando eu vejo as pessoas na fila, quando as pessoas têm um mal atendimento... isso não é uma crítica ao servidor público, isso é uma crítica muitas vezes à falta de estrutura do serviço público, à falta de leis competentes.
Mas me deixa triste, me deixa indignado, ver que o serviço público do Brasil hoje não é na qualidade que a população espera e precise. Sinto que temos dificuldade de debater com respeito ao próximo.
Eu fico indignado quando vejo as filas nos hospitais, quando vejo as crianças querendo estudar, quando vejo, na pandemia, que muitos alunos não tiveram condições de ter aula porque não tinham Internet nas suas casas ou, muitas vezes, não tinham computadores, tablets ou smartphones. Com isso eu fico indignado. Não podemos ter um debate achando que tudo está uma maravilha. Então, era só essa a minha palavra.
Agora passo a palavra ao Deputado Rogério Correia, inscrito como Líder, por até 13 minutos.
O SR. ROGÉRIO CORREIA (PT - MG) - Presidente, em primeiro lugar, eu queria dizer que o Relator, se levar em consideração o fruto do debate até hoje, irá alterar profundamente a PEC porque o conjunto de especialistas que ouvimos aqui, são especialistas mesmo, convocados pela Esquerda, pela Direita, pelo Centro, mas que fazem o estudo de como anda o serviço público e o que fazer para melhorá-lo.
Todos são unânimes em dizer que esta proposta de emenda à Constituição não resolve o problema do serviço público brasileiro. Nós estamos discutimos é esta PEC.
Tomara que o Relator, ouvindo esses especialistas, possa fazer uma modificação bastante ampla nela porque aí, sim, vamos passar a discutir como melhorar o serviço público.
17:03
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O problema, Sr. Presidente Fernando Monteiro, é que o Ministro Paulo Guedes, que aqui esteve, assim como o Governo Bolsonaro, não pretendem melhorar o serviço público. Não é isso que está na PEC. O que está na PEC é desmanchar o serviço público. Por isso ela não pode ser chamada de reforma administrativa, porque não é reforma. A reforma é para melhorar. Se você vai reformar a sua casa, você faz um puxadinho, aumenta um quarto, porque teve uma criança a mais, você faz uma pintura, melhora o azulejo na cozinha, melhora o banheiro. Isso é fazer uma reforma. Todos nós somos favoráveis a reformar sempre o serviço público e tudo.
Mas o que o Governo pretende fazer com essa PEC é derrubar a casa. Nesse sentido é uma "deforma". Esse é o debate que nós estamos fazendo. A pergunta que V.Exa. faz precisa de uma reposta. O que o povo acha do Congresso Nacional? Ele está funcionando a contento? Não. Nós precisamos de uma reforma política? Precisamos. Vamos derrubar a democracia? Não. Serve, portanto, esse exemplo, como contraexemplo em relação ao serviço público: vamos reformar.
Nós apresentamos na Frente Parlamentar Mista do Serviço Público, também a Frente fez isso, uma proposta alternativa completa à PEC do Governo. A nossa é de reforma. Ela vai democratizar o serviço público; vai valorizar o servidor, e não retirar os seus direitos; e vai, portanto, melhorar para o Brasil, no nosso entendimento, o que será o serviço público que, diga-se de passagem, não é lá tão ruim quanto alguns dizem, não. As pessoas antigamente não tinham acesso à escola pública.
O Ministro Paulo Guedes esteve aqui, como já disse, falando que estudou no Pandiá Calógeras, uma escola estadual lá na Praça da Assembleia Legislativa de Minas Gerais. A minha filha também estudou lá. Quando o Paulo Guedes estudou lá, Deputada Erika Kokay, era uma escola que acolhia as elites de Belo Horizonte, embora fosse estadual, porque eram muito poucas as escolas. Lá estudavam os acolhidos da elite, porque era preciso fazer um exame da admissão, e nesse exame de admissão só eram aproveitados aqueles que vieram de melhores condições, etc. O restante não tinha escola. Se não passasse naquele exame, e não tivesse recursos para pagar uma escola privada, ficava sem estudar. Funcionava assim. Hoje, não. Hoje, graças à Constituição de 1988, essa que o Paulo Guedes quer destruir, e quer fazer algo semelhante ao que existe no Chile, as crianças estudam. Hoje elas tem acesso da creche à universidade. E nós viemos melhorando isso. Primeiro, com o FUNDEF, que era o Fundo de Desenvolvimento da Educação Fundamental, no Governo Fernando Henrique; depois, no Governo Lula com o FUNDEB e, posteriormente, com o acesso ao ensino superior. Nós melhoramos a escola pública. Ela está muito melhor do que era na época de Paulo Guedes, sabem por quê? Porque ela hoje é também para negros, para pobres. Ela não é uma escola só da elite.
Então, essa é uma diferença grande. Eu aplaudo a escola pública, e também as servidoras, as professoras, as trabalhadoras da educação. São heroínas nas escolas de periferia.
Outro dia o Relator disse algo sobre a educação que eu quero debater com ele. Ele disse: "Olha, se uma sala de aula vai mal, troca a professora, porque não se pode trocar os alunos". Não é assim, não. Eu conheço professoras que dão aula em escolas particulares e em escolas públicas. As condições de uma e de outra escola, Rudinei, são completamente distintas. Eu já dei aula em cursinhos e já dei aula em escola pública, na Grande Belo Horizonte.
17:07
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Eu comecei dando aula numa escola no Morro Alto. Na época, houve uma enchente, e as pessoas afetadas por aquela enchente foram para essa escola no Morro Alto. Ela funcionava em condições extremamente precárias. Não era ainda uma escola, era um galpão. Mas ali, eu que dava aula em escola privada, também dava aula lá. É óbvio que as condições eram diferentes. Bastava me trocar, caso não houvesse um desenvolvimento como até eu pretendia? Não. Podia entrar ali qualquer professor, que teria dificuldades naquelas condições, porque a escola sequer tinha sido montada, equipada. Então, Deputado, é muito distinta uma condição e outra.
Entrando agora no tema, pergunto: esses trabalhadores em educação precisam de estabilidade? É claro que sim. A regra é que ele tenha estabilidade, que ele possa, de forma perene, fazer as melhorias na educação e na pedagogia, e que o Estado lhe dê condições para isso, com formação profissional, com tudo o mais, algo que a PEC liquida, colocando isso como algo descartável, não dando continuidade. A quebra da estabilidade será nociva à educação pública brasileira, com toda a certeza. Por isso eu insisto muito em fazermos uma discussão específica sobre o impacto dessa PEC na educação pública brasileira. Do jeito que ela está, vai destruir o serviço público da educação.
Aliás, diga-se de passagem, já falei isso, leiam o art. 37-A, eu sempre falo dele, porque ali está a alma dessa PEC, que é o que quer o Sr. Paulo Guedes. Ele fala em fazer uma cooperação, onde o recurso, que hoje é público, irá para a iniciativa privada, com fins lucrativos, que ela, sim, vai fazer o gerenciamento da escola, que deixará de ser pública, portanto, privatizou-se.
Eu trouxe um exemplo novo para cá. Eu estive, neste recesso, com a Prefeita Marília Campos, de Contagem. Marília foi Deputada Estadual comigo, durante determinado período, e foi Prefeita em Contagem por dois mandatos; retornou agora. E lá foi feita uma experiência extremamente negativa na área de educação, conforme ela viu agora. O que fizeram com a escola pública que era gerenciada pela Prefeitura? Fizeram uma parceria público-privada com parte da educação de Contagem. O recurso foi entregue a essa iniciativa privada. Sr. Presidente Fernando Monteiro, eu convido V.Exa. a ir lá. Foi um desastre completo. A educação foi para o buraco. A Prefeita agora está fazendo uma intervenção para que se retorne, e se retire essa parceria público-privada, essa escola privada, com fins lucrativos, e que se estabeleça novamente o ensino a partir da Prefeitura de Contagem. E ela me mostrou, juntamente com a Secretária Estadual de Educação, os exemplos do fiasco que foi isso. Agora, imaginem isso em escala nacional, terminando com as escolas públicas, e as entregando para as escolas privadas, se isso vai resolver. Lá não resolveu.
Trago outro exemplo de lá relativo à saúde pública. Aí é com as OSCIPs. O antigo Prefeito fez a mesma coisa. Entregou para uma OSCIP — Organização da Sociedade Civil de Interesse Público. Inicialmente, por 350 milhões; não deu conta, aumentaram para 450 milhões. O Hospital Municipal de Contagem estava caindo aos pedaços, havia um buraco no teto, os médicos estavam sem receber, e religiosamente receberam os recursos do SUS, mas gerenciaram pessimamente. Não tinham a expertise que tem o público e o SUS.
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Quando criticam o SUS, há que se comparar a quando não existe o SUS; quando se critica a escola pública, há que se comparar a quando não existe a escola pública e em que condições. Ou vocês acham que vai haver escolas nas favelas, nas periferias, como as que existem na zona sul da cidade, escolas para as elites, do mesmo estilo? Não. Não serão essas as escolas. Assim como não existirão hospitais como o Albert Einstein em todos os Municípios brasileiros na periferia. O SUS tem a característica de ser para todos, a escola pública tem a característica de ser para todos. Por isso, a estabilidade, neste caso, é muito importante, e quebrá-la será um desastre para o Brasil.
Cito ainda outro exemplo também de PPP. Este eu vou citar o nome, porque merece. Na época do PSDB, eles fizeram uma parceria público-privada com o Mineirão, o estádio Mineirão. E entrou lá uma empresa da Minas Arena. E essa parceria público-privada é feita com uma empresa que quer lucro. Mas o contrato feito foi o seguinte: se essa empresa não tiver um lucro de 7 milhões todo mês, o Estado compensa a empresa, para que ela tenha o lucro. Sabe como chamamos isto lá em Minas, PPP do PSDB? De "O Povo Paga o Pato". E todo o mês, agora, com esta pandemia, saem do Estado 7 milhões, para que o Mineirão fique com essa Minas Arena, que é uma entidade privada. "O Povo Paga o Pato": esse é o nome da PPP.
E isso é tido como solução posta aqui pelo Ministro Paulo Guedes, que, aliás, até hoje não nos mandou as respostas sobre que economia é essa de 800 milhões. Estamos esperando, não chegaram até hoje. Podem perguntar à assessoria, porque não chegaram até hoje. Aliás, se o Relator fizer um relatório sem as respostas do Paulo Guedes — e são muitos os questionamentos que fizemos —, será um absurdo, um cheque em branco para o Paulo Guedes. Ele não sabe que economia é essa. Ele mente, ele chega aqui e cita um número. Ele quer, na verdade, agradar o mercado.
Aliás, não é só ele, não. Sinceramente, quando olhei a pauta da Câmara agora, no retorno do recesso, me deu tristeza. O povo passando fome, precisando resolver as questões, e nós estamos aqui discutindo privatização dos Correios. Vai resolver o problema? Os Correios estão dando lucro, funcionam bem. Para que vai privatizar, se é esse o argumento?
Reforma administrativa, para desmanchar o serviço público; reforma tributária regressiva. O Rudinei falou bem. Por que a reforma tributária não vai taxar os ricos? Não. Sabe por quê? Porque os ricos querem a reforma administrativa, para não haver mais Estado e eles não terem que pagar imposto. É assim que funciona a cabeça dessa elite brasileira, que não pensa no pobre que está ganhando osso lá no Mato Grosso, porque não tem o que comer. E nós não estamos resolvendo isso.
E agora vem aí uma minirreforma tributária — termino em 27 segundos — na Medida Provisória nº 1.045, em que o Relator colocou jabutis para colocar jovens para trabalhar sem direitos. E ele fala: "É melhor o jovem trabalhar sem direitos do que o jovem não trabalhar". Esse é o Brasil das elites brasileiras. Mas o Brasil do povo precisa do serviço público, e é ele que nós defendemos.
Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Fernando Monteiro. PP - PE) - Obrigado, Deputado Rogério Correia.
É importante sua fala. Se V.Exa. quiser conhecer um pouco do trabalho e do que pensa o Presidente desta Comissão, é só nos acompanhar, porque vai de encontro a muitas questões.
Mas volto a afirmar: o povo brasileiro não está satisfeito com o serviço público brasileiro, e por vários motivos. Eu tenho o maior respeito ao servidor público. E, quando eu falo de serviço público, falo da condição de trabalho, que é fundamental. A legislação do momento é fundamental e a motivação do servidor público é fundamental.
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Então, basta conhecer o que pensa o Presidente desta Comissão Deputado Fernando Monteiro sobre serviço público e a admiração que eu tenho tanto é que, toda sala que eu faço, eu dou parabéns e tenho orgulho do Banco Central brasileiro quando criou o Pix, quando modernizou o serviço público. E são servidores públicos.
Tem a palavra o Deputado Milton Coelho, por até 3 minutos.
O SR. MILTON COELHO (PSB - PE) - Presidente, demais membros desta Comissão, a cada sessão que participo, fico mais preocupado com o avanço nesses debates acerca da PEC 32. E me assusta mais ainda quando me vem um palestrante ou alguns Parlamentares que defendem a aprovação da PEC dizer que vão dar uma abordagem acadêmica. Não há abordagem acadêmica. Se houvesse abordagem acadêmica, o direcionamento dessa PEC seria em outro sentido.
A abordagem acadêmica tem sido apresentada aqui em diversas ocasiões pelos Parlamentares, pelas entidades que apresentam estudos profundos de experiências do serviço público brasileiro, que caminham para o lado oposto ao que traz essa PEC.
Essa PEC é muito superficial, propositalmente superficial, Presidente, porque ela não pode apresentar às claras as suas reais intenções. Não se pode dizer ao povo brasileiro que queremos voltar à educação no Brasil há 40 anos. Não se pode dizer ao povo brasileiro claramente que o que se pretende é acabar com o SUS. Eu vejo o entusiasmo com que os defensores dessa PEC falam que se gasta com o serviço público 1 trilhão de reais. E ainda é pouco. Querem tirar esse trilhão do serviço público para quê? Para destruir o que se construiu até aqui?
E V.Exa. é de um Estado, assim como eu, que tem uma experiência em educação — na próxima vez, pedirei o tempo de Líder para poder explicar aqui e mostrar os dados aos nobres Deputados — que era a 21ª pior educação do País e hoje está entre o primeiro e segundo lugar no ranking do IDEB. E isso não foi à toa. V.Exa. acompanhou. V.Exa. conhece a experiência de Pernambuco. Sabe que foi investindo na formação de professores, foi fortalecendo a carreira dos professores e servidores públicos de educação, foi dando suporte ao aluno para ir à sala de aula que se transformou a educação de Pernambuco num exemplo para o Brasil.
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E essa PEC, Presidente, caminha em direção contrária à nossa exitosa experiência. O meu tempo já se esgota e eu quero dizer o seguinte. Presidente, vamos interromper o curso dessa reforma administrativa enquanto há tempo, para que V.Exa. nem o Relator, o Deputado Arthur Maia carreguem, na sua biografia, na sua história, ter feito a reforma que o Paulo Guedes queria, que o Bolsonaro deseja para o serviço público no País.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Fernando Monteiro. PP - PE) - Obrigado, Deputado Milton Coelho.
Tem a palavra a Deputada Erika Kokay, por até 3 minutos.
A SRA. ERIKA KOKAY (PT - DF) - Presidente, eu acho que todos os membros desta Comissão, do Parlamento e da sociedade brasileira querem a melhoria do serviço público. Essa PEC não propõe isso. Atribuir a esta PEC o instrumento para melhorar o serviço público é reafirmar uma metodologia de fugir da verdade, que tem sido assumida particularmente pelo Governo Federal.
Essa PEC não fala sobre isso. Essa PEC muda a concepção de Estado. O Estado passa a não ser mais um instrumento de proteção social com as políticas públicas, que são necessárias para que façamos o luto das casas grandes e senzalas neste País.
Essa PEC busca transformar o Estado em propriedade do governante. E é esse o sentido que tem o rompimento da estabilidade, que é rompida os vínculos, Rudinei. Inclusive, nos cargos e carreiras típicas de Estado, haverá o vínculo de experiência, que de certa forma é um rompimento da própria estabilidade. Construir uma demissão por avaliação de desempenho é exatamente colocar o rompimento da estabilidade nos servidores que já estão hoje atuando no serviço público. A avaliação de desempenho é fundamental para aprimorar a gestão, mas ela não pode ter a finalidade de um processo de demissão. A avaliação de desempenho tem que avaliar o contexto, tem que avaliar as condições, tem que fazer uma avaliação que inclusive conte com a participação dos destinatários do próprio serviço público.
As experiências que nós temos na educação de gestão democrática, do sentimento de pertencimento, de territorialidade que são postos são fundamentais para avaliar os caminhos necessários ao desenvolvimento da própria política de educação, assim como em outras políticas.
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A política de saúde mental, Rudinei, que parte de um histórico de genocídio e holocausto que são os hospícios, é fundamentalmente um instrumento de democracia, em que aqueles que são beneficiários da saúde mental, os profissionais e os gestores discutem qual é o projeto terapêutico a ser desenvolvido.
Portanto, não é esta PEC que vai fazer com que nós tenhamos a melhoria do serviço público. Esta é a PEC da República Velha. Esta é a PEC do compadrio. Esta PEC foi absolutamente traduzida pelo Presidente da República, de forma muito honesta, no seu "sincericídio", como aquela que vai possibilitar que o prefeito demita e contrate quem queira! A estabilidade assegura a independência funcional. Ela assegura que o compromisso esteja com a própria política pública e a população, não com o gestor.
Esta PEC submete o Estado aos interesses privados e à lógica do governante. Nós vimos isso no Ministério do Meio Ambiente, que desconstruiu o conselho de ética. Havia um processo que exigia vínculo com funcionários de carreira, que exigia processo seletivo de avaliação, e se retirou tudo isso e se colocaram os amigos do Ministro, que está respondendo por crime ambiental.
Então, vamos ser honestos na discussão. Vamos fazer a discussão como tem que ser feita. Achar que você vai melhorar o serviço público punindo os servidores e as servidoras e, ao mesmo tempo, fazendo com que o gestor possa determinar quem vai ocupar o espaço público é achar que não há inteligência nem nesta Casa nem no País. Mas há inteligência neste País. As pesquisas indicam isso.
O SR. PRESIDENTE (Fernando Monteiro. PP - PE) - Obrigado, Deputada Erika Kokay.
Passo a palavra, por 3 minutos, ao Deputado Pompeo de Mattos.
O SR. POMPEO DE MATTOS (PDT - RS) - Cumprimento V.Exa., Sr. Presidente, todos os debatedores, todos os Deputados e todas as Deputadas.
Sr. Presidente, eu venho acompanhando esta PEC desde a Comissão de Constituição e Justiça. Ela vem exatamente para demonizar o servidor público e para tornar o serviço público um inferno. É isso o que ela pretende. Não é outro o foco senão esse, ou seja, o desmonte contra o professor, a professora, o policial civil, o policial militar, o pessoal da saúde. Agora, na pandemia, qual é a razão de ser do ataque aos servidores públicos? Por quê? A que ponto chegamos!
A PEC é algo inusitado, que já não contou com o nosso apoio lá e não conta com o nosso apoio aqui.
Eu pego como exemplo a carreira dos policiais civis, dos delegados de polícia. Atacam os delegados de polícia de tal forma que o delegado de polícia que substituir o colega em outra delegacia não pode receber uma complementação pela substituição; não pode receber um adicional, uma indenização, enfim, não pode receber absolutamente nada. Isso é muito injusto. Aliás, ele vai trabalhar para o Estado e vai dar um enriquecimento ilícito para o Estado, o que é ilegal. Ele vai trabalhar de graça. Não, não! Desculpem-me: ele vai pagar para trabalhar, porque vai ter que ir a outra delegacia para substituir, vai ter que pagar para ir lá trabalhar. É uma coisa inusitada!
Na verdade, esse mecanismo da substituição traz facilidade para o Estado, porque, se um delegado de polícia, por exemplo, saiu de licença para tratar da saúde; ou tirou férias; ou, por outra razão, enfim, o lugar está vago, alguém pode substituí-lo com competência. E é muito mais barata a substituição do que a nomeação de alguém por uma eventualidade.
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Então, é uma coisa errática, é uma coisa absurda — o Estado vai ser penalizado pela burrice, pela maldade dos seus gestores — o delegado não poder acumular função, não poder receber a remuneração por substituir alguém. É uma coisa muito injusta, muito inadequada.
Eu conversei com delegados aqui do Rio Grande do Sul, da Associação dos Delegados de Polícia do Rio Grande do Sul — ASDEP, e fiquei impressionado com as colocações deles.
Vejam outra coisa inusitada. A carreira policial, com base no art. 144 da Constituição Federal, a exemplo de outras carreiras de Estado, tem que ser regrada pelo seu próprio estatuto, no seu ente federado, na sua esfera de abrangência, ou seja, os Estados regulam isso. Não, eles querem fazer de cima para baixo, para que os delegados fiquem sob o tacão — uma coisa absurda! —, eu diria, para que alguém com o poder da caneta domine a baioneta. Sabemos que a caneta na mão errada já decretou ditaduras, fez cair a noite escura sobre o sol da liberdade. Tiranias, torturas, atrocidades, essa caneta sustentou. Mas a mesma caneta assinou o fim das perseguições. A caneta mudou de mão, e o povo se libertou.
O que nós esperamos é que esta PEC não avance, que a caneta mude de mão e que não permitamos que deem um canetaço, que empurrem a baioneta, em forma de caneta, para o servidor público e para o serviço público. A maneira de aviltar o serviço público é atirar na alma e na essência do serviço público, que são quem? Os seus servidores. Assim, atiram nos delegados, nos inspetores, nos policiais militares, nos policiais civis, nos professores, nas professoras, nas enfermeiras, nos enfermeiros, nos médicos — não vai sobrar ninguém. Mas não com o apoio do PDT, não com o nosso voto, não sem a nossa reação e não sem a nossa indignação, porque isso não é reforma. Isso se chama "deforma". Apropriaram-se indevidamente da palavra "reforma", que soa algo positivo, novo, renovado, melhorado. Na verdade, a tal reforma passou a ser "deforma". Nós vamos ter que colocar um neologismo no dicionário de português. Apropriaram-se da palavra "reforma" para fazer a reforma da Previdência, a reforma trabalhista, a reforma do serviço público. Tudo isso é desmonte, não é outra coisa que não a "deforma", a deformação do processo. Mas, como disse, não com o nosso apoio, não com o nosso voto, não sem a nossa reação, não sem a nossa indignação, Presidente.
É como vejo, como penso, como reajo e como me posiciono. O PDT tem lado, e o nosso lado não é o lado do outro lado do lado de lá; o nosso lado é do lado de cá, respeitando o servidor. Se há problema, vamos corrigir o problema. Se é preciso fazer ajuste, vamos fazer os ajustes. Mas não é fazendo o desmonte, o desmanche do serviço público que nós vamos melhorá-lo.
É assim que penso, Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Fernando Monteiro. PP - PE) - Obrigado, Deputado Pompeo de Mattos.
O próximo Líder a falar é o Deputado Alencar Santana Braga, que não está presente.
A Deputado Joenia Wapichana não está presente.
O Deputado Felício Laterça não está presente.
O Deputado Bira do Pindaré não está presente.
A Deputada Alice Portugal não está presente.
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O Deputado Camilo Capiberibe não está presente.
Encerrada a lista de Deputados inscritos, passo a palavra, para as considerações finais, por até 5 minutos, à Sra. Rosilene Corrêa Lima.
A SRA. ROSILENE CORRÊA LIMA - Obrigada.
Quero fazer um destaque e cumprimentar o Deputado Rogério Correia e o Deputado Professor Israel Batista, que é aqui do Distrito Federal, nosso companheiro bastante atuante, sem desmerecimento nenhum dos demais.
Quero também fazer uma observação ao jovem Pedro. Para a educação e a saúde, ainda que fossem gastos, é muito pouco o que se faz. Nós precisamos, na verdade, de um investimento muito maior, e não só em tempos de pandemia. Isso ficou muito escancarado. Todo o mundo fala muito disso, algo que é real. Precisamos ter responsabilidade com a educação e com a saúde.
O Deputado Fernando falou sobre quem fica na fila aguardando atendimento. O que nós estamos discutindo aqui é a possibilidade de nem haver atendimento e nem fila, talvez; é a possibilidade terem que pagar para receber esse atendimento; é a possibilidade de voltar a existir nas escolas — eu também fui para a fila e assisti a muitas mães passarem a noite nessa situação — fila para conseguir uma vaga, como quando não havia escola para todo o mundo. Eu fiz exame de seleção para fazer a 5ª série numa escola pública, porque não havia vaga suficiente. Para o meu irmão, que não conseguiu passar, meu pai pagou uma escolinha particular. Foi possível pagar, mas nem todo o mundo consegue.
Eu disse, na minha primeira intervenção, qual é o tamanho da responsabilidade de cada Deputado, de cada Deputada, de cada Senadora e de cada Senador deste País. V.Exas. terão que mostrar de que lado estão. O Governo tem um projeto que tem se mostrado um projeto de destruição. Mas isso só acontece porque o Parlamento o apoia. Sozinho, ele não conseguiria.
É muito grande a responsabilidade de V.Exas. Desculpem-me, mas é isso. Nós estamos diante de um quadro de sucessão de reformas que não trouxeram nenhum benefício para o País, em aspecto nenhum. Quero que me provem onde é que está o benefício das reformas feitas até aqui.
Quero também aproveitar esses últimos minutos para dialogar rapidamente com a Cibele. Comparar o Brasil com outros quadros de países mundo afora é muito complicado. Basta ver em que país nós estamos, especialmente nos dias atuais, e que projeto de país nós temos.
Eu vou falar da educação. Muitos países que são referência, por exemplo, não precisam ter uma lei que obriga a aplicação do mínimo na educação. Não precisam, porque há o entendimento natural, na população, no Parlamento, de que é preciso investir na educação. Aqui nós temos que obrigar esse investimento. E há governantes que querem burlar essa lei. Há Parlamentar defendendo, como ocorreu na discussão sobre o FUNDEB, a desvinculação dos recursos da educação, tamanha a falta de compromisso com a educação pública deste País.
Eu não estou me referindo aqui — de novo — apenas aos nossos direitos, à nossa condição de trabalhador, trabalhadora, que é legítima. Eu estou falando do que é oferecido e é obrigação do Estado oferecer ao povo.
Por isso, essas comparações, às vezes, não são muito cabíveis. Há esse aspecto: de que Brasil nós estamos falando? Que compromisso de quem tem o poder nós temos aqui no Brasil para com o povo?
Nós dissemos que a saúde tem várias formas de contratação de servidores. Lamentavelmente, é o que ocorre, porque que tem havido uma sucessão de mudanças: reforma trabalhista, terceirização, OSs — nós a combatemos há anos.
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Tiago, quanto ao que o Lula propôs, nós também não concordamos. Faremos a mesma luta, independentemente de quem esteja governando, porque vieram para contrariar, por exemplo, as creches conveniadas. Nós da educação temos uma posição contrária. Entendemos a necessidade de as creches funcionarem, mas o que é de domínio público não devemos entregar para o privado.
Para encerrar, precisamos debater, com muita seriedade, o modelo de Estado que a PEC 32 está propondo. Que Estado brasileiro nós queremos? O que cada um votar vai dizer qual Estado brasileiro está defendendo.
Também dói na alma quando chego a uma escola em que não há merenda; uma escola em que a professora tem que comprar material para trabalhar; uma escola à qual os estudantes vão de bicicleta ou a cavalo porque não têm transporte escolar. Eu falo isso porque conheço uma região onde a pessoa que trabalha como motorista de transporte escolar pega criança de 8 anos de idade, às 2 horas da manhã, para ir à escola, que é distante da casa dele, para conseguir chegar para a aula das 7 horas. A criança vai dormindo no colo do motorista. Deita no banco da caminhonete e vai dormindo.
É desse Brasil que nós estamos falando. É dessa educação que estamos falando. É de salários de professores Brasil afora, de trabalhadores de saúde e de outros tantos que estamos falando.
Aqui, na Capital, no Distrito Federal, nós temos hoje uma realidade de 40% — mais de 10 mil professores — em regime temporário.
O SR. PRESIDENTE (Fernando Monteiro. PP - PE) - Peço que conclua, Rosilene Corrêa Lima, por favor.
A SRA. ROSILENE CORRÊA LIMA - Isso já é precarização. Isso já é antecipação da PEC 32. Todas as outras funções dentro das escolas já estão terceirizadas também. É com esse quadro de desmonte que nós não podemos concordar.
Fica aqui um apelo da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação ao Parlamento brasileiro.
Vamos aprofundar o debate e promover uma reforma, sim, mas para modernizar, para fortalecer o Estado brasileiro e a máquina pública. É essa a responsabilidade que todos nós devemos ter.
Muito obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Fernando Monteiro. PP - PE) - Obrigado, Rosilene Corrêa Lima.
Passo a palavra para a Profa. Cibele Franzese, por até 5 minutos, para as conclusões finais.
A SRA. CIBELE FRANZESE - Eu queria agradecer, mais uma vez, a oportunidade do debate.
Eu não sei qual vai ser a decisão tomada pelo Congresso. Acho bem importante que haja o debate e que todas as posições sejam ouvidas. Existe uma responsabilidade muito grande nessa regulamentação e nisso tudo que está sendo dito. Eu respeito muito a opinião das pessoas que estão discutindo. Acho importante olhar para os outros países, apesar das diferenças, e customizar o que temos para o caso brasileiro.
Volto a falar da responsabilidade da regulamentação. É importante combater aquilo com o que não se concorda. A Profa. Rosilene falou em combater as OSs, em combater aquilo com o que não concorda, combater a precarização do trabalho temporário, enfim, aquilo com o que os sindicatos não concordam. Mas existem hoje milhões de alunos e alunas que têm aula com professores temporários, que têm aula com professores de creches conveniadas. Milhares de brasileiros são atendidos por médicos contratados por organizações sociais.
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Acho que o Congresso precisa ter a responsabilidade de regulamentar o que está acontecendo no País. Se for aprovado o vínculo determinado, eu quero deixar o alerta: isso precisa ser bem regulamentado. A regulamentação não passa só por saber quem vai ser e quem não vai ser carreira de Estado. Alguém vai ficar de fora dessa definição de carreira de Estado. É preciso saber o que vai acontecer com essas outras carreiras e qual vai ser a regulamentação desses serviços. Muitas pessoas no País vão ser atendidas por pessoas que não serão de carreira de Estado, e nós precisamos pensar na qualidade desse serviço público.
Eu fiz uma pesquisa sobre a educação. Há Estados em que mais da metade dos professores são temporários. Nós tivemos, no Congresso Nacional, a oportunidade de votar uma medida provisória para a regulamentação do trabalho por tempo determinado, e não foi votada, porque não se quer discutir o trabalho por tempo determinado, porque a postura é rechaçar o trabalho por tempo determinado, enquanto muitas pessoas no Brasil são atendidas por professores que trabalham por tempo determinado.
Então, o Congresso Nacional tem a responsabilidade de regulamentar isso, porque não adianta nós negarmos que essas coisas existam, porque os brasileiros estão sendo atendidos por profissionais que trabalham por tempo determinado e que não têm direitos constitucionais. Há professoras contratadas por tempo determinado que não têm licença-gestante e que precisam entrar na Justiça para ter esse direito, simplesmente porque a legislação federal existente hoje é obsoleta, não é respeitada, e Estados e Municípios não fazem uma legislação de acordo.
Qualquer que seja a decisão que esta Casa tome, pró-vínculo por tempo determinado ou não, se ela aceitar o tempo determinado, regulamente-o. Espero que não haja só a preocupação de saber que carreiras vão ficar dentro ou que carreiras vão ficar fora da estabilidade, porque os cidadãos brasileiros merecem um serviço público de qualidade.
Quem trabalha para o Estado brasileiro, quem é gestor vai ter que gerenciar toda a força de trabalho: a força de trabalho estável, a força de trabalho não estável, a força de trabalho por tempo determinado e a força de trabalho celetista. Todos esses servidores devem ter bom desempenho. O cidadão que está do outro lado não quer saber se quem é contratado é estável, não é estável, é contratado por PPP, é contratado por OS, é contratado por OSC. Ele quer um serviço público de qualidade. Quem tomou a vacina não sabe se a vacina foi produzida aqui ou nos Estados Unidos; não sabe se foi comprada por um contrato superfaturado ou não superfaturado. A pessoa quer ser vacinada. Então, o cidadão quer uma entrega tempestiva e de qualidade. Cumpre a nós que estamos do lado da gestão pública fazer com que esse serviço chegue ao cidadão.
Eu acho que falta a parte da regulamentação, que não está discutida ainda, que não foi apresentada pelo Governo. Falta essa parte para nós tomarmos decisões. Eu acho que o Congresso precisa cobrar e fazer com que isso entre no pacote.
Esse é o recado que eu queria deixar. O caminho que for escolhido tem que ser muito bem discutido e regulamentado. Não basta saber quem fica dentro e quem fica de fora da estabilidade.
O SR. PRESIDENTE (Fernando Monteiro. PP - PE) - Obrigado, Profa. Cibele Franzese.
Passo a palavra, por até 5 minutos, ao Rudinei Marques, Presidente do Fórum Nacional Permanente de Carreiras Típicas de Estado — FONACATE, para as suas considerações finais.
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O SR. RUDINEI MARQUES - Para concluir a minha fala, Sr. Presidente, eu quero dizer que nós realmente temos acordo sobre a ideia de que o serviço público precisa ser aprimorado. No entanto, como mostrou a Profa. Cibele e como eu tentei mostrar na minha fala inicial, em nenhum momento nós conseguimos ver que a PEC 32 faz alguma coisa nessa direção. Aliás, ninguém que foi chamado até esta Comissão para defender a PEC 32 mostrou, de forma inequívoca, com base em evidências, como a PEC vai melhorar o serviço público. Ninguém mostrou. Como nós vamos mudar a Constituição, fazendo uma alteração dessa magnitude, sem ter a certeza de que a mudança é para melhor? No nosso entendimento, essa não é uma mudança para melhor. A nota técnica do Senado já mostrou isso.
Eu atuo num órgão de combate à corrupção há 20 anos. Sou auditor da Controladoria-Geral da União. Um dia desses, eu dei uma palestra mostrando dez pontos em que a PEC 32 escancara as portas da corrupção no Brasil, mais ainda do que já estão escancaradas. Nesses 20 anos em que eu estou na CGU, já vi o pessoal desviar da educação, já vi o pessoal desviar da infraestrutura, já vi o pessoal vender remédios vencidos para prefeituras. Eu já vi muita coisa, mas nunca tinha visto o pessoal desviar ou querer desviar dinheiro de vacina, porque é a vida das pessoas que está em jogo. A PEC 32 legitima esse tipo de bandidagem contra os brasileiros, em vários sentidos, na medida em que ela permite um aparelhamento absoluto dos cargos em comissão, em Prefeituras, em Governos dos Estados, na União. Na União, nós saltaríamos de 6 mil para 90 mil cargos de livre indicação. Não dá para aceitar esse tipo de coisa.
Encerro fazendo um apelo àqueles que realmente têm um compromisso com o interesse público, com o Estado, com a sociedade brasileira, com a nossa população. Nós sabemos que, no pós-pandemia, vamos precisar de mais e melhores serviços. Não é isso que a PEC 32 entrega. Ela entrega o contrário — e entrega o contrário na linha de várias reformas administrativas que foram feitas pós-crise global de 2008.
Neste caderno que nós vamos lançar agora, traçamos os exemplos de reformas administrativas na Croácia, na Estônia, na França, na Alemanha, na Grécia, na Hungria, na Irlanda, na Letônia, na Lituânia, nos Países Baixos, em Portugal, na Romênia, na Espanha, no Reino Unido e na Suécia. Sabe o que aconteceu em todos eles? Menos serviço público, precarização das relações de trabalho, menos investimento público e mais sofrimento para a população. É isso que nós estamos entregando se a PEC 32 for aprovada como está.
O SR. PRESIDENTE (Fernando Monteiro. PP - PE) - Obrigado, Rudinei Marques.
Com a palavra, por até 5 minutos, para as considerações finais, o Sr. Unadir Gonçalves Junior.
O SR. UNADIR GONÇALVES JUNIOR - Obrigado, Presidente. Obrigado, Srs. Deputados que, conosco, participaram deste debate, juntamente com os técnicos e os especialistas aqui presentes.
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Foi muito importante ouvir todos, porque foi possível termos uma visão ampla de todos os aspectos que compõem essa nefasta proposta de reforma, que, como foi dito aqui, de reforma não tem nada. Ninguém reforma algo para piorar. Todo mundo que se propõe a reformar algo quer melhoria, quer evolução, e neste caso tudo que está proposto nesta PEC é algo do atraso, é algo do retrocesso, é algo que vai voltar ao século passado, quando as indicações políticas eram o que permeavam a administração pública. Vai voltar àquela época em que, quando um prefeito era eleito, ele trocava todo mundo, mandava todo mundo embora, os bons e os ruins. Não importava o desempenho do servidor, importava qual cor de camisa ele havia vestido na campanha eleitoral. Isso é inaceitável numa democracia igual à do Brasil. Esperamos que ela cresça, que floresça e se fortaleça, e não que tome o rumo que vem tomando, o rumo do retrocesso, o rumo do atraso.
Esta PEC 32 é nefasta porque não prejudica apenas os servidores públicos, não ataca só os servidores públicos. Ela precariza o Estado brasileiro, o Estado de Bem-Estar Social, que foi comemorado na promulgação da nossa Constituição Cidadã, em 1988, por Ulysses Guimarães. Isso é algo por que nós temos que lutar.
E eu parabenizo esses bravos Deputados que estão sempre aqui na Comissão da reforma administrativa, lutando, batalhando, trazendo informações, trazendo especialistas, debatendo, mostrando, mesmo que os que precisam ouvir não estejam aqui e prefiram fugir do debate. Fogem do debate num momento em que poderiam estar aqui fazendo o seu contraponto, trazendo as suas informações para, ao menos — se não aderirem à corrente que admite a rejeição da PEC, como é a nossa corrente, a corrente da FEBRAFISCO, a corrente da CONACATE, da Pública Central do Servidor —, tentarem trazer algumas de suas ideias e, de repente, melhorar, aprimorar isto que está sendo apresentado por nosso sinistro Paulo Gudes, que não apresenta nada. Nunca apresentou um projeto que realmente valesse a pena, que melhorasse este País.
A reforma tributária, que é algo da sua alçada, ele não a apresenta. E, quando os outros apresentam, ele se apresenta para atrapalhar, para prejudicar, para impedir que avance a discussão da reforma tributária, da taxação das grandes fortunas, da taxação de lucros e dividendos, do deslocamento da tributação sobre o consumo para o patrimônio e a renda. Isto é que ele deveria propor, isto é que deveria preocupá-lo: cuidar do que não se arrecada, da sonegação, que campeia neste País. Isso ele não faz. Ele vem fazer proposta de algo que não entende, porque nunca foi administrador de nada. Nunca administrou nem uma Prefeitura na vida. E pega logo o Ministério mais importante da República, ainda com outros Ministérios aglomerados a esse Ministério. Trata-se de um superministério, para alguém que não tem capacidade alguma de administrar nada.
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Nós lamentamos demais a situação em que o nosso País se encontra e as pessoas a que o Estado brasileiro foi entregue. Essas pessoas estão deixando o nosso País arrasado, terra arrasada, com 550 mil mortos, pela incompetência daqueles que deveriam estar preocupados com a aquisição da vacina, a proteção dos brasileiros, a difusão das medidas sanitárias necessárias para que a pandemia não se alastrasse. Nós não vimos nada disso. Nós só vimos propostas para tentarem se reeleger, se manter e continuar fazendo esse desmonte do Estado, a que eles se propuseram. Estão propondo agora 40 bilhões de reais para tentar salvar esse Governo da impopularidade que dele tomou conta, mas não vão salvá-lo.
Portanto, pedimos a todos que se ombreiem a estes grandes Deputados que aqui estão e rejeitem essa PEC 32, que é nefasta para o povo brasileiro.
O SR. PRESIDENTE (Fernando Monteiro. PP - PE) - Muito obrigado, Sr. Unadir Gonçalves Junior.
Para concluir esses 5 minutos, o Sr. Pedro Fernando de Almeida Nery Ferreira tem a palavra, para suas considerações finais.
O SR. PEDRO FERNANDO DE ALMEIDA NERY FERREIRA, - Obrigado, Sr. Presidente. Quero agradecer, mais uma vez, o convite e o debate com os meus colegas. Eu acho que todos sonhamos com um País muito parecido, embora tenhamos discordância sobre como chegar lá.
Uma última reflexão que eu queria provocar, e foi um pouco da motivação da apresentação, quando eu falei das vacinas, é a seguinte: o servidor público é bem remunerado. Quando eu preciso de um médico, não vou ao SUS. Quando eu preciso de educação, não levo para a escola pública, porque tenho condição de pagar a escola privada que, pelo menos onde eu moro, parece melhor. Então, todos nós podemos pensar, nós que consumimos serviços privados de saúde e de educação, mas nos manifestamos frequentemente contra a reforma administrativa, é por que esses serviços públicos e privados são tão diferentes?
É claro que uma parte tem a ver com recurso. Às vezes, tem a ver com recurso. O professor da iniciativa privada não se aposenta com as mesmas regras, o professor da iniciativa privada não tem licença-prêmio, não tem a mesma possibilidade de faltas, enfim. Recurso pode ser uma possibilidade, mas outras regras têm a ver, como a regra de contratação por concurso público, que é uma regra pouco flexível; a regra da estabilidade, que, para muitos servidores, mas não todos, provoca desincentivo, infelizmente; outras regras que não estão sendo contempladas na reforma administrativa, por exemplo, de contratação de insumos. Uma escola privada que precisa se adaptar para a pandemia compra o que precisar. Uma escola pública tem que licitar, e esse processo pode ser lento e judicializado.
A reflexão que temos que fazer é esta: como é que aproximamos esses dois universos? E aqui eu estou considerando que o privado tem uma qualidade superior ao público. Nem sempre é assim, mas às vezes ou com frequência é, vamos ser francos. E não porque ideologicamente tivesse que ser, não necessariamente precisaria ser, mas porque amarramos o Estado e o colocamos para competir com a iniciativa privada, que não está também com as mãos amarradas. Depois vamos dizer que o Estado não é eficiente. Ora, o Estado não é eficiente porque ele não foi feito para ser eficiente. Ele foi feito, em boa medida, para ser impessoal, com regras de seleção de servidores que prestigiam, acima de tudo, a impessoalidade. Todo mundo tem que poder tentar o concurso, sem vieses, porque é concurso público. Há a questão da estabilidade. Há a questão da licitação também. Todo mundo que quer prestar serviço ao Estado tem que poder prestar. Então, de certa forma, tanto quem critica quanto quem é contra as críticas tem que reconhecer que o Estado não foi feito no desenho ideal para ser eficiente.
17:55
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Então, acho que a provocação é esta: como é que podemos caminhar para que o Estado proveja melhores serviços públicos, contemplando todas as preocupações que foram aqui colocadas quanto à precarização, especialmente num momento tão difícil como o que vivemos, em que, sem dúvida, ficou clara a perseguição a diversos servidores que estavam exercendo suas funções de maneira nobre? Eu acho que temos que buscar esse caminho comum.
Eu falei aqui de algumas coisas, e eu acho que todo mundo concorda que poderíamos tentar mudar o regime de regras de falta. É preciso mesmo que alguém tenha 60 dias intercalados ou 30 dias seguidos de falta para ser substituído? Isso é justo com o usuário? Isso é justo com quem quer prestar concurso, com quem quer prestar serviço e não tem oportunidade porque existe ali alguém que não está fazendo jus ao título de servidor? Portanto, eu acho que são essas as regras em que podemos pensar. Temos que pensar também numa forma de avaliar que não seja persecutória e que inclua, como a Deputada Erika Kokay colocou, o próprio usuário. Eu acho que temos que fazer uma discussão franca sobre essas questões.
Eu torço para que a PEC, se for aprovada, seja um veículo para essas mudanças. Eu confio na Câmara, no trabalho do Relator, no trabalho da Comissão. Eu acho que podem ser incluídos projetos que já estão em tramitação. Como eu disse aqui, não precisamos focar em mexer em questões constitucionais. A PEC pode tratar de temas de legislação ordinária. E eu acho que temos que pensar em como a educação pode ser melhor, em como a saúde pode ser melhor, em como a assistência pode ser melhor, em como o Legislativo pode ser melhor, enfim, mudando as regras e os incentivos que são colocados para todos nós que trabalhamos no serviço público, que somos apaixonados pelo serviço público.
Enfim, esta é minha consideração.
Eu peço desculpas à Profa. Rosilene se, de alguma forma, o que eu falei mereceu o desagravo dela à categoria mais nobre de todos nós do serviço público, que é a dos professores e das professoras.
Obrigado, Presidente.
Era o que eu tinha para falar hoje.
O SR. PRESIDENTE (Fernando Monteiro. PP - PE) - Obrigado, Pedro Fernando de Almeida Nery Ferreira.
Já encerramos as considerações finais, mas acabou de chegar ao plenário da Comissão o Deputado Alencar Santana Braga, portanto vou passar a palavra a S.Exa. pelo tempo de Liderança da Minoria, por até 8 minutos.
O SR. ALENCAR SANTANA BRAGA (PT - SP) - Obrigado, Sr. Presidente, por me ter cedido a palavra neste momento.
Quero cumprimentar todos os colegas presentes, os que estão nos acompanhando on-line e todos que falaram durante a audiência.
Foi dito aqui, há pouco, que os convidados — ou a maioria, mesmo os convidados por parte da base do Governo — não defenderam a proposta, o sentido dela, o sentido apresentado. De fato, está difícil encontrar alguém que defenda essa proposta com clareza, com transparência e honestidade, falando tête-à-tête com qualquer servidor público numa unidade de saúde, numa escola municipal ou mesmo aqui na Câmara, com os servidores concursados da Câmara Federal ou de algum órgão público no Governo Federal. Quem minimamente tenta defendê-la não encontra argumento e, caso tenha, não tem coragem de falar claramente ao servidor público que ele perderá direito e, mais do que isso, que haverá uma mudança profunda na concepção do serviço público previsto na Constituição de 1988. É um crime o que está sendo feito.
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Está sendo discutido no Plenário um projeto que garante a regularização fundiária de grandes lotes ocupantes de áreas públicas. E não é sobre o pequeno produtor, aquele que luta por um pedacinho de terra, uma família que não possui posse nenhuma e que faz uma ocupação. Este, pelo Governo, é para ser tratado debaixo de bala, como diz o post publicado pelo próprio Governo na semana passada, no Dia do Agricultor.
E o que tem a ver uma coisa com a outra? É porque, de fato, a boiada está passando. Há uma vontade de votar esta PEC, a reforma administrativa, ainda este mês, assim como a privatização dos Correios. O Governo e os Deputados da base do Governo sentem que o fim está logo ali e que é preciso fazer a maldade, entregando serviços a outros interesses econômicos que manipulam também esta Casa. E com a reforma administrativa não é diferente. É um sucateamento do serviço público, uma fragilização do serviço público, que interessa tão somente ao mercado, cuja lógica é outra.
E comparar o serviço público com o privado é até cruel e desigual, primeiro porque o privado atende muito menos; e, segundo, quem diz que a qualidade é sempre excelente? E quem diz que o privado atende a todo momento?
Presidente, basta acompanharmos e percebermos o que aconteceu esse ano, durante a pandemia. Quem socorreu, na ponta, não foi o hospital privado. Este socorreu poucos, alguns ainda com tratamento caríssimo aos que podiam pagar, aos que podiam pagar! Não foi a benevolência do serviço privado que salvou vidas, foi justamente o SUS, que tem a missão de tentar colher o máximo possível, de socorrer todo mundo, sem qualquer tipo de discriminação.
É por isso que esta PEC fragiliza o Estado brasileiro, fragiliza o serviço público e, lá na ponta, atinge justamente a camada mais pobre do País, a camada que de fato precisa da unidade de saúde, que precisa da escola pública, que precisa de uma unidade policial, que não conta com segurança privada.
E em acabando a estabilidade, que é tema de hoje também, nós estaremos praticamente tornando o Estado brasileiro refém: refém de uma política do atraso, que é a mesma política que no Plenário vai aprovar essa regularização que beneficia poucos no nosso País, e justamente quem não precisa.
O Brasil desta PEC é o Brasil da máquina de escrever, é o Brasil que defende o distritão aqui nesta Casa, a serviço do Presidente. Em vez de o Brasil discutir novas modernidades, enquanto o mundo discute o 5G e se prepara para o 6G, o Brasil do Presidente atual quer voltar para a máquina de escrever.
Portanto, é lamentável o que vivemos. E, sem dúvida alguma, se aprovada, esta reforma também simbolizará um atraso no nosso País, um retrocesso sem precedentes. Deixaremos de ser um Estado independente, deixaremos de ter um serviço público com suas autonomias, com suas possibilidades de ação, independente de Governo de plantão, um serviço público que tem que agir com base na lei, na garantia. E aquela garantia de estabilidade não é uma garantia individual do servidor público. Não é a ele que é dada a garantia, mas à sociedade brasileira, para ela saber que o servidor público tem as suas garantias para que possa prestar um bom serviço público, para que ele não esteja sujeito a ameaças do Governo de plantão. Vejam, senhoras e senhores, nas agências reguladoras há mandato, há um tempo. Não é simplesmente contratar ou ser aprovado aqui e poder ser demitido ali. Em outros órgãos, como a cúpula do Poder Judiciário, ocorre a mesma coisa. Por que no serviço público, lá na ponta, não tem que ser assim? Pode ser um guarda, um fiscal, um enfermeiro, uma auxiliar ou outro servidor. Mesmo que alguns, eventualmente, considerem a função dele sem grande importância, no mínimo ela acumula um histórico de informação que é fundamental para o órgão, às vezes uma pequena Prefeitura de um Município distante, um Município mais pobre, às vezes um departamento ˜x˜, onde aquele acompanhamento, aquela informação do servidor é importante não só para ele, mas para que ele possa depois, compartilhando isso com os demais, aquele histórico do poder público, prestar um bom serviço adiante e não ter que se repetir eventualmente aquilo que já foi feito.
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Portanto, é lamentável esse critério, essa concepção que querem mudar completamente no nosso País, alterando a Constituição de cabeça para baixo. Como disse o Deputado Patrus Ananias — conversávamos há pouco —, há a um novo método de alteração constitucional, mudanças profundas. Se as Constituições foram promulgadas em determinado momento, outorgadas em outro, hoje a Constituição é alterada, de maneira radical — o que, por uma concepção, não poderia ser feito —, por dentro, sob supostos argumentos que encontram uma ressonância em determinado setor político.
Ora, senhoras e senhores, repito aqui que, se esta reforma de fato é tão boa — tão boa! —, por que o Governo não faz para os servidores atuais? Eu nunca vi um Governo querer fazer algo bom que vai atingir os servidores públicos e dizer que só valerá para os próximos! Ah, com certeza, aí tem, senhoras e senhores! E o que tem é uma maldade, é uma crueldade, é mais um retrocesso praticado por esse Governo e seus apoiadores nesta Casa. É por isso que nós não podemos permitir que a reforma avance.
Obrigado, Sr. Presidente e demais colegas.
O SR. PRESIDENTE (Fernando Monteiro. PP - PE) - Obrigado, Deputado.
Tem a palavra o Deputado Felício Laterça, por até 3 minutos. Depois, eu encerrarei a sessão.
O SR. FELÍCIO LATERÇA (PSL - RJ) - Sr. Presidente, muito obrigado pela colocação. Por causa da grande atribulação que vivemos aqui na Câmara dos Deputados, hoje não foi possível acompanhar tudo, apesar de o nosso requerimento ter entrado para fazer parte desta audiência pública.
Eu queria apenas fazer um registro, para dar uma satisfação sobre o meu requerimento e sobre o acordo de procedimentos que foi feito aqui e o entendimento que foi trazido. Registro que nós vamos tentar, vamos ver se é possível. Eu sei do esforço de V.Exa., como Presidente, e também das suas atribuições e atribulações, mas precisamos debater à exaustão este tema, pois, como vemos, está causando grande polêmica em todo o Brasil.
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Meu requerimento, o Requerimento nº 110, de 2021, entrou no bojo desta audiência pública. Eu tinha convocado sete instituições para falar: a Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal, a Federação Nacional dos Policiais Rodoviários Federais, a Federação Nacional dos Policiais Federais, a SISGUARIO, que é o Sindicato dos Servidores da Guarda Municipal do Rio de Janeiro, o SINDELPOL, que é o Sindicato dos Delegados de Polícia do Rio de Janeiro, e o SINDPOL, que é o Sindicato dos Policiais Civis do Estado do Rio de Janeiro. Houve um consenso. Salvo engano, os senhores até elegeram um representante. Pelo fato de eu ser Delegado de Polícia Federal e estar na função de Deputado Federal — eu não pude participar dessa escolha —, os senhores convidaram o Presidente da Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal. Quero já deixar o meu pleito para que, em outra oportunidade, tenhamos, de fato, essas pessoas presentes aqui.
Peço até a V.Exa. que permita que o Vice-Presidente assuma a Comissão, em razão dos afazeres de V.Exa., para que possamos deixar registrada a luta dessas entidades, a fim de que elas coloquem as suas individualidades e as suas peculiaridades, em especial, por exemplo, a Guarda Municipal, que ainda hoje não está devidamente inserida na segurança pública. E nós entendemos a necessidade da municipalização da segurança pública. É importante trazer isso ao debate, trazer segurança jurídica, porque sabemos que a questão de carreiras típicas de Estado tem que ser, de fato, aprofundada e discutida. Não dá para ficar num segundo plano.
Apesar de minha pouca experiência, pois este é o meu primeiro mandato, eu cheguei aqui e vi que muitas vezes se aprova algo para depois se fazer uma legislação, lei complementar ou lei ordinária. E sabemos que isso, às vezes, leva 10 anos ou 20 anos. Infelizmente o nosso Congresso Nacional não anda na velocidade que precisamos. É necessário entendermos que isso vai mexer muito, e profundamente, na vida dos servidores públicos. E estamos aqui para mostrar isso para os senhores.
Agradeço, Sr. Presidente. Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Fernando Monteiro. PP - PE) - Obrigado, Deputado.
O convidado Edvandir Felix de Paiva foi indicação de V.Exa., foi indicado pelo gabinete de V.Exa.
Esta Comissão debateu e discutiu democraticamente. Três pessoas são escolhidas por um lado, e três são escolhidas por outro lado. E cada partido teve o direito de indicar os membros de cada bancada para, assim, participarem dos debates.
Entendo que muitas pessoas queiram falar, mas nós vamos atingir, no final das audiências públicas, mais de 90 pessoas que vieram e falaram. Isso mostra que o diálogo, a democracia e principalmente o respeito à opinião do próximo vão ser sempre a tônica nesta Comissão.
Por isso, agradeço mais uma vez aos nossos convidados, ao público que nos acompanha e aos Deputados membros desta Comissão.
Nada mais havendo a tratar, conforme já comunicado, reforço a convocação da reunião extraordinária virtual para amanhã, quarta-feira, 4 de agosto de 2021, às 9 h30min, no Plenário nº 2, para a realização de audiência pública.
Está encerrada a presente reunião.
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