Horário | (Texto com redação final.) |
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O SR. PRESIDENTE (Fernando Monteiro. PP - PE) - Havendo número regimental, declaro aberta a 7ª Reunião Extraordinária da Comissão Especial destinada a proferir parecer à Proposta de Emenda à Constituição nº 32-A, de 2020, do Poder Executivo, que altera disposições sobre os servidores, os empregados públicos e a organização administrativa.
Encontra-se à disposição na página da Comissão na Internet a ata da 6ª Reunião, realizada no dia 7 de julho de 2021.
O tema da audiência de hoje é Concurso público e vínculo de experiência. Esclareço que esta audiência cumpre decisão do colegiado, em atendimento aos Requerimentos nºs 3, 4, 5, 8, 13, 15, 29, 34, 38, 49, 50, 54, 57, 66, 91 e 102.
Agradeço, desde já, a presença aos nossos convidados. Informo que, para seguirmos as normas necessárias, o distanciamento social, cada convidado presencial virá à mesa apenas no momento da sua fala.
Os convidados de hoje são: Felipe Drumond, consultor da Frente Parlamentar Mista da Reforma Administrativa; Luís Antônio de Araújo Boudens, Presidente da Federação Nacional dos Policiais Federais; Lademir Gomes da Rocha, Presidente da Associação Nacional dos Advogados Públicos Federais; Fernando de Souza Coelho, professor de Administração Pública da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo; José Celso Pereira Cardoso Júnior, Presidente do Sindicato Nacional dos Servidores do IPEA; e Max Leno de Almeida, economista da subseção do DIEESE na Confederação dos Trabalhadores nos Serviço Públicos Federal.
Para o melhor andamento dos trabalhos, esclareço que adotaremos os seguintes procedimentos. O tempo concedido aos convidados será de 15 minutos. O Relator será o primeiro a usar da palavra para as perguntas. Cada Deputado inscrito pelo aplicativo terá 3 minutos para as perguntas. O tempo de Liderança poderá ser utilizado pelos Vice-Líderes desde que com a devida delegação, sendo vedada a divisão de tempo entre Vice-Líderes. A cada inscrição, será concedida a palavra pelo tempo de Liderança. O tempo de Liderança poderá ser acrescido ao tempo dos inscritos, respeitada a ordem de inscrição.
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O SR. GERVÁSIO MAIA (PSB - PB) - Presidente, eu gostaria de saber de V.Exa. quais são os Deputados que já estão com o registro no sistema para falarem pela Liderança?
O SR. PRESIDENTE (Fernando Monteiro. PP - PE) - Para falar pelo tempo da Liderança?
O SR. GERVÁSIO MAIA (PSB - PB) - Sim.
O SR. PRESIDENTE (Fernando Monteiro. PP - PE) - Primeiro, o Deputado Rogério Correia; segundo, o Deputado Tiago Mitraud; terceiro, V.Exa., Deputado Gervásio Maia, que também está delegado para falar pela Oposição. V.Exa. é o primeiro dos inscritos.
O SR. GERVÁSIO MAIA (PSB - PB) - Obrigado, Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Fernando Monteiro. PP - PE) - V.Exa., hoje, falará no começo! (Risos.)
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Fernando Monteiro. PP - PE) - V.Exa. será o segundo. Vou adotar a mesma ordem. Eu vou abrir uma exceção para V.Exa. Será a mesma ordem. V.Exa. vai falar, primeiro, como orador?
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Fernando Monteiro. PP - PE) - Como primeiro orador, S.Exa. Como segundo, pela Liderança, vai ser...
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Fernando Monteiro. PP - PE) - Deputada, nós adotamos uma ordem de procedimentos para os Líderes não ficarem falando e não deixarmos os inscritos por último. Fala um orador e um Líder, um orador e um Líder. Quando for a vez de o orador falar, caso S.Exa. tenha a delegação da Liderança, pode juntar-se. S.Exa. não pode se juntar quando é Líder e é orador, no fim.
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Fernando Monteiro. PP - PE) - Já vejo a inscrição de V.Exa.
Meu muito obrigado ao Deputado Tiago Mitraud, que fez o requerimento para solicitar minha presença, e, igualmente, ao Presidente da Comissão pelo convite.
Começando nossa apresentação, primeiro, quero me apresentar. Meu nome é Felipe Drumond. Sou servidor público no Governo de Minas Gerais e me formei na Fundação João Pinheiro. Eu tive 4 anos de formação para, depois, ingressar na administração pública do Governo de Minas Gerais. Posteriormente, eu segui carreira trabalhando como consultor em diversas organizações.
Sobre o tema que nós vamos discutir, eu queria, de início, dizer que nós podemos fazer a discussão da PEC sob vários prismas, mas há três que estão em destaque. Um é a discussão sobre a diminuição dos privilégios e das distorções, ponto que está bem relacionado às férias de 60 dias ou à aposentadoria compulsória como forma de punição. Outro ponto se dá sob o prisma fiscal, que tem, sim, um impacto na discussão, por exemplo, sobre as regras previdenciárias que estão sendo alteradas também no bojo da reforma. Existe, também, uma discussão sobre os benefícios e os impactos que são trazidos para a reforma administrativa.
Por fim, há aquilo de que nós vamos falar e que, para nós, é o mais importante: a discussão, de fato, sobre a eficiência da gestão pública em relação ao que é entregue para a sociedade. Aqui, nós falamos principalmente dos vínculos. Estamos falando dos vínculos de cargos típicos, de concurso público, de estágio probatório, enfim, de todos esses vínculos.
Para começar, eu quero dizer por que fiquei muito feliz com o convite para estar aqui hoje com os senhores. Este tema sobre o qual nós vamos discutir, o concurso público e o estágio probatório, se for, de fato, trabalhado, traz resultados, ao contrário de outros temas que, muitas vezes, são o foco da discussão.
(Segue-se exibição de imagens.)
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Nós temos um exemplo: o desligamento de servidores nos Estados Unidos ou em outros países. A verdade é que, no caso de vários países que trabalham com o desligamento de servidores, até por desempenho, os números são muito pequenos.
Eu tenho uma análise, de 2018, do Washington Post, que diz que, na administração federal americana, que tem mais de 2 milhões de pessoas, ou seja, é 3 vezes maior que a do Governo Federal brasileiro, são pouquíssimos os servidores que são desligados. É por isso que eu indago: esta é uma discussão que nós temos que fazer na reforma? Temos, mas nós não cremos que fazê-la vai trazer os melhores resultados e a modernização efetiva do serviço público brasileiro.
Nós trazemos também dados ou números em relação ao Canadá e ao Reino Unido quanto ao desligamento de servidores, que é muito pequeno. Por isso, nós não temos, necessariamente, que focar nisso. Precisamos fazer uma discussão sobre o acesso, que é mais importante. Tenho certeza de que, se nós melhorarmos o acesso, se modernizarmos os concursos e o estágio probatório, nós vamos conseguir, sim, um serviço público melhor e com melhores pessoas. Isso é muito mais eficiente. Se temos melhores pessoas no serviço público, temos menos preocupação com o desligamento dos profissionais.
Antes de entrar nesta discussão e de falar um pouco dos nossos problemas, antes de dar mais uma visão geral da área, eu quero destacar que nós temos partido do princípio de que nós fizemos avanços importantes no Brasil. Quando colocamos o concurso público como universal na Constituição de 1988, nós demos um grande salto. No contexto da América Latina, o Brasil, hoje, tem várias dificuldades, como vamos mencionar, mas o País é uma referência.
Ter concurso público e regras de proteção do servidor público que o protejam de perseguições políticas é um grande avanço e é algo, até no contexto latino-americano, diferencial. Quando nós pensamos na América Latina, vemos que vários países próximos a nós, como o Chile e a Argentina, ainda têm muitos temporários e muitos problemas.
Portanto, quero dizer que ter o serviço público que nós temos hoje no Brasil, baseado em concurso público e em proteções para o servidor, é um grande avanço, é um destaque, em qualquer análise internacional sobre o tema. Porém, é claro, nós precisamos avançar, temos que modernizar nosso Estado. Aqui, nós trazemos alguns temas que pensamos ser essenciais.
Em se tratando da discussão sobre os concursos em si, uma das falas que será feita pelo Prof. Fernando Coelho, que vai discutir muito sobre a modernização dos concursos, é fato que nós temos que avançar neste ponto hoje. Os concursos são universais, não tendem, em hipótese alguma, a privilegiar ninguém, mas precisam ser modernizados, para que tenhamos o melhor perfil das pessoas.
O estágio probatório é também um tema muito importante e precisa ser trabalhado, como nós vamos falar mais à frente, com mais detalhes. O fato é que, hoje, ele não funciona. Conforme dados dos estágios probatórios no Governo Federal, 99,98% dos servidores são aprovados. Há alguma coisa aí, portanto, que nós precisamos trabalhar.
Há outros três pontos. Um diz respeito ao cargo de direção, um ponto muito importante, que representa um avanço da PEC. Ele pode ser aproveitado como um avanço.
Em diferentes países de referência, a livre nomeação adentra os escalões e os níveis de hierarquia dos Ministérios, das Secretarias, das Prefeituras e de todos os órgãos da administração pública, o que nos distancia muito dos países de referência no tema. Este ponto precisa ser discutido agora.
Por fim, entram outros dois temas. Um deles é o próprio sistema de carreiras, que é uma gestão de desempenho em si, algo que vai além da discussão sobre desligamento e desempenho. É preciso que se preocupem em melhorar o desempenho da organização do servidor. Isso é muito mais importante do que desligar o funcionário por desempenho em si.
Falando um pouco sobre o estágio probatório, nós queríamos destacar que a grande diferença, talvez, entre o modelo brasileiro hoje e os de outros países que nós queríamos como referência é que, no lugar de avaliar apenas ao fim do estágio probatório, eles avaliam durante o estágio probatório, ou seja, o servidor é avaliado periodicamente, e a avaliação é bem baseada na chefia. É claro que nós estamos falando de países nos quais as chefias têm uma indicação técnica e passam por um processo seletivo — não se trata de livre nomeação. O fato é que, ao longo do estágio probatório, essas chefias têm muito mais capacidade para poder desligar o servidor por questões de desempenho.
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Hoje, no Brasil, o desligamento do estágio probatório é feito, ao final, por uma comissão independente, muitas vezes formada por pessoas que nem conviveram e, só ao final de 3 anos, o profissional já é de casa. Há uma dificuldade muito grande de isso funcionar. No entanto, quando olhamos a proposta do Governo, nós vemos algo diferente. Não existe comparação com a proposta que foi feita na PEC 32, na qual haveria uma seleção por desempenho, e os profissionais seriam classificados por desempenho. Um exemplo: entraram cem pessoas no estágio probatório, e será definido no edital do concurso que só 70 serão aprovadas neste período de experiência. Então, elas vão ser classificadas de acordo com o desempenho e serão selecionadas. Trata-se de uma curva forçada, uma forma de obrigar o funcionamento do estágio probatório. No entanto, nós temos que avaliar também os impactos que isso vai causar.
Eu trago uma questão. Hoje, o vínculo de experiência vai ter outras atribuições para o servidor público efetivo. É muito difícil que isso venha a ser executado. Hoje, na prática, quando o servidor é nomeado, ele assume uma série de responsabilidades e uma série de desafios. Pensando na carreira, por exemplo, de um delegado federal que vai participar desta audiência conosco hoje, perguntaríamos como esse profissional vai dizer que está num vínculo de experiência e não pode assumir as atribuições daquela função. Este é um desafio que nós temos que discutir.
A segunda questão é que este vínculo, novo, será uma etapa do concurso. Logo, ele vai ter que ser regulamentado no edital do concurso público, o que vai gerar também uma judicialização. Há uma série de desafios, hoje, na judicialização dos concursos.
A terceira questão é a classificação por desempenho. Hoje nós temos muitas dificuldades para implementar a avaliação de desempenho, principalmente nos Estados e nos Municípios. Pensar que nós vamos conseguir classificar pessoas que vão ingressar no serviço público através dessa avaliação vai ser também muito difícil. Portanto, é inegável que a proposta apresentada funciona, mas nós temos que discutir a que custo.
Nós trouxemos algumas análises e algumas sugestões de encaminhamento. Nós entendemos que é muito importante destacar a análise das 59 emendas que foram apresentadas. O quinto ponto mais apresentado e mais destacado foi o ajuste do período do vínculo de experiência. Este é um tema que já está em destaque, um tema que a própria Casa já percebeu que tem que ser mais bem trabalhado e aprimorado.
Neste sentido, como contribuição que nós trazemos aqui, nós acreditamos que bastaria simplesmente a inclusão na Constituição das avaliações ao longo do estágio probatório, por meio de uma lei geral, de uma lei complementar, que vai trabalhar em prol da melhor gestão. Não é preciso, talvez, dar este salto de criar um vínculo de experiência. Basta trabalhar para a melhoria do estágio probatório atual. Um ajuste mínimo na Constituição já pode proporcionar este ganho. Nós cremos que é razoável dar este passo no momento, comparado com nossas experiências no Brasil.
Por fim, quero apenas destacar que não adianta a melhoria do estágio probatório se não começarmos a profissionalização dos cargos de chefia de médio escalão. A chefia é fundamental para que toda avaliação de desempenho possa funcionar. É claro que existe a avaliação 360 graus e é claro que a equipe pode participar! Hoje, infelizmente em muitas situações, a chefia pode ser uma indicação política que não tem relação com aquele ambiente. Isso pode ser utilizado como forma de perseguição. Em nenhum daqueles países citados, a chefia é indicada de forma política, no que se diz respeito à avaliação de desempenho. Existem indicações políticas para Ministros, para assessores, que são cargos do alto escalão, mas não existem para cargos de baixo escalão no Brasil. Portanto, nós precisamos profissionalizar este grupo de servidores, o grupo de cargos e de posições, que está ali imediatamente ligado, para que, assim, seja feita uma avaliação de desempenho do estágio probatório que não seja punitiva e, posteriormente, que se busque o melhor para a organização pública.
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O SR. PRESIDENTE (Fernando Monteiro. PP - PE) - Obrigado, Felipe Drumond, por sua participação.
O SR. LUÍS ANTÔNIO DE ARAÚJO BOUDENS - Boa tarde, Deputado Fernando Monteiro. É um prazer estar aqui com vocês. Agradeço o convite para participar deste debate. Desejo boa sorte ao Relator, o Deputado Arthur Maia, nessa matéria que já traz por si só grande expectativa e também complexidade ao que se propõe.
Nós sabemos que o Brasil é um país de muitas dívidas sociais, históricas até. O concurso público e o estabelecimento de um vínculo estatal com esse serviço público foram bem definidos pela Constituição Federal, até como forma preventiva e modernizadora também do serviço público no Brasil.
Na área de segurança pública e nas áreas afetas à defesa do Estado, à arrecadação, às fiscalizações em geral, como auditorias públicas, nós percebemos que há uma enorme expectativa nessa tramitação. Primeiro, porque nós vimos, no texto inicial proposto pelo Governo, a figura do trainee como "vínculo temporário estabelecido com o serviço público". Nós sempre trazemos a nossa realidade para analisar e contribuir com essa discussão. O Governo não manteve uma discussão anterior a esse encaminhamento. E nós sabemos que há uma tentativa repetida de enfraquecimento das entidades sindicais, representativas, infelizmente. Em outros países elas contribuem com o funcionamento da própria máquina estatal, elas são parceiras em vários momentos, sem abandonar a prerrogativa de defender essas categorias, mas no Brasil há um movimento persistente de tentar enfraquecer essas entidades. Eu acho isso uma grande perda, justamente neste momento importante de debate. Nós poderíamos contribuir ao máximo, com o funcionamento diário das nossas instituições, dos órgãos públicos, com esta discussão, para não parecer simplesmente uma defesa corporativista ou uma defesa de privilégios, como, em discussões anteriores, vimos acontecer.
Para nós da segurança pública a figura do vínculo temporário é inconcebível. Nós sabemos que as primeiras lotações, por exemplo, de policiais federais acontecem em regiões de fronteira, onde justamente cuidamos de questões de segurança nacional, de imigração, de transposição de mercadorias, importação e exportação, juntamente com a Receita Federal. Então, nós temos muita dificuldade de conceber o vínculo temporário, quando, desde o primeiro dia após nossa posse, já assumimos responsabilidades, com autoridade concedida pelo Estado, para exercer um mister público que nos dá toda a responsabilidade e nos cobra por isso. No nosso caso, o nosso regime disciplinar ainda é o da Lei nº 4.878, de 1965, contemporânea do AI-2. Além disso, temos a Lei nº 8.112, que já é fruto da regulamentação da Constituição de 1988.
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Para nós pesa sobremaneira não vermos o debate ser feito justamente no alcance e nas perspectivas avassaladoras de um vínculo temporário para algumas categorias, como a nossa, a de segurança pública. Eu falo também em nome da União dos Policiais do Brasil. Não são só os policiais federais que têm essa preocupação; os policiais civis, os rodoviários federais, as guardas municipais, a nova polícia penal brasileira, tanto na esfera federal como estadual, os peritos estaduais e federais também. Todo esse conjunto de discussões tem preocupado muito as categorias policiais como um todo, desde os policiais penitenciários, como eu disse, até os policiais da área de investigação.
Então, qual é o maior problema que nós entendemos existir hoje? Outros países já optaram, numa imagem de evolução da sua estrutura estatal, por uma forma de contratação múltipla. Inclusive, em vários países onde há polícias e fiscalizações de sucesso sequer existe concurso público da forma aberta como há no Brasil. Claro que nós atendemos a alguns comandos constitucionais que, creio, são importantes para o Brasil ainda nessa fase — já estamos com mais de 30 anos de Constituição e, portanto, acho que essa questão já está muito consolidada.
O concurso público no Brasil representa o mais amplo conceito de isonomia que podemos estabelecer para os brasileiros. Qualquer um que sonhe com a carreira pública, em tese, tem condições de fazer as provas e atender os requisitos de um edital e ser aprovado e passar a fazer parte de uma carreira pública bem estabelecida. Essa é uma questão.
A outra questão é que nós ainda, por incrível que pareça, inclusive na Polícia Federal, não temos as carreiras sequer estabelecidas em leis orgânicas. Nós temos várias carreiras sem campo de atribuições ainda delimitado. Aí vem o segundo ponto que eu acho muito interessante, além da questão do vínculo temporário ser complexo. Nós temos várias carreiras que ainda disputam o espaço interno dentro dos órgãos por falta de uma lei orgânica que defina, que delimite as suas atribuições. Isso ocorre na Polícia Federal, e nós sabemos de casos na Receita Federal também.
Eu acho que essa preparação dos órgãos públicos para receber uma reforma administrativa dessa monta deveria ser um pré-requisito obrigatório. Não desmerecendo nenhum trabalho da Comissão, mas acho que a preparação das estruturas de Estado deve ser feita anteriormente à definição de como vai ser estabelecido o vínculo dela com o Estado, de como elas vão ser cobradas por qualquer tipo de falha e de erro decorrente dessa relação estabelecida. Em outros países, mesmo sem o concurso público, a forma de punição é mais célere; há avaliação das chefias, os gestores são escolhidos de forma diferente, como muito bem disse o Dr. Felipe no início deste debate. Apesar de não haver concurso público, há uma preocupação muito grande em ter profissionais formados em gestão, com conhecimento de administração pública, para assumir certas funções. No caso de polícias, definem-se as chefias por experiência, por tempo dedicado à polícia e por avaliação da experiência acumulada durante anos de carreira.
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No Brasil, nós ainda temos pessoas recém-empossadas no cargo assumindo posições estratégicas de comando, de chefia, apenas com o conhecimento que trouxeram como pré-requisito para o concurso público, não para exercerem uma função de gestor.
Então, nós ainda temos algumas falhas que precisavam, na nossa visão, ser corrigidas antes de partirmos para esse debate. O caso da avaliação periódica durante o estágio probatório é um exemplo. Chefes despreparados não têm como avaliar, de forma precisa, os comandados. E o caso de os comandados serem 10 anos, 20 anos ou até 30 anos mais experientes do que o novo chefe gera uma discrepância muito grande, gera uma distorção em que a avaliação do servidor vai ficar submetida a um profissional que ainda não tem conhecimento de tudo o que acontece no órgão, de todas as funções, e principalmente que não tem como cobrar, do seu comandado, uma eficiência dentro dos padrões estabelecidos, por exemplo, na Lei nº 8.112.
Há critérios que aparentemente são objetivos, mas, com uma rápida análise — como já vimos representantes do Governo trazerem os dados —, muitas avaliações são feitas no percentual máximo, na avaliação máxima. Isso é feito em lotes até. É um risco para o serviço público, porque o grande filtro que é o concurso público também não garante que aquele profissional tem o perfil adequado, tem a vocação necessária para assumir aquela função com o compromisso realmente público. Isso nós percebemos diariamente dentro das nossas instituições.
Os concursos públicos são pensados e formatados por um grupo de gestores dentro dos órgãos. Dali em diante, é estabelecido o perfil que vai ser exigido do brasileiro, do cidadão comum, para que ele assuma aquela função pública. Se você submete esse cidadão... Claro que ele se dedicou, que estudou, que fez o concurso público. A questão individual não está em voga aqui. O que nós estamos discutindo é o interesse público e a adequação desse servidor para trabalhar em um órgão em que ele vai ser cobrado. E não será individualmente. Ele vai ser cobrado como participante de um órgão público em sua efetividade, na entrega de um serviço de qualidade ao cidadão brasileiro.
Na justificativa da proposta do Governo, nós vemos muito estes termos aparecerem: Como cobrar eficiência? Como cobrar um trabalho adequado desse cidadão que se dispôs a concorrer a uma vaga sem dar a ele a estabilidade? E aí já entra a terceira questão que, junto com o vínculo e também com o concurso público, está atrelada a essa discussão, que é a estabilidade.
Nós tivemos exemplos recentes e no passado — eles não são de agora —, em vários Governos, de servidores públicos sendo expostos por conta das providências que tomaram dentro das suas esferas de atuação. Diga-se de passagem, dentro de um parâmetro de correção muito grande, atuando de forma garantidora e até de forma legalista em várias situações que já analisamos.
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E nós não conseguimos imaginar que o servidor, à medida que sua coragem aumenta, junto com o seu conhecimento, também passe a ser acuado ou ameaçado na essência daquilo que estabelecer para o Estado, em um vínculo permanente com o Estado brasileiro.
Então, são distorções que, até a Constituição de 1988, vislumbravam que estavam sendo corrigidas. E agora, nessa proposta, nós entendemos que elas estão sendo colocadas sob risco.
Por fim, Deputado Fernando Monteiro e Sr. Relator, Deputado Arthur Oliveira Maia, eu quero chamar a atenção dos senhores para uma questão muito específica. Nós temos, já no texto constitucional, por obrigação do Parlamento brasileiro, por pura obrigação, estabelecer quais são as carreiras essenciais, quais são as carreiras típicas de Estado. Não podemos, Deputados, deixar essa discussão para leis posteriores.
O Congresso Nacional, na fase seguinte — caso a PEC 32 não defina, de forma organizacional, o que o Governo pensa ou o que o Congresso pensa como Estado brasileiro —, tem que estabelecer quais são as carreiras que define como típicas, se vai abarcar o bolo da educação, da segurança pública, das áreas de fiscalização. E isso o Governo ainda não fez.
O Governo está protelando uma discussão para o futuro. Isso vai complicar muito os trabalhos no Congresso. Esta Casa tende a virar um palco de grandes batalhas para que inclusive, dentro de alguns órgãos, cargos diferentes busquem o reconhecimento como carreira típica de Estado.
Então, nós entendemos que, já no texto constitucional, deveria vir o conceito de carreira típica de Estado ou de carreira essencial ao funcionamento do serviço público. Esse é um complicador que nós, que já atuamos aí no Congresso há vários anos defendendo as nossas categorias, percebemos que é um complicador que vai acontecer.
E eu creio que a Câmara agora, já no relatório da Comissão Especial... Caso não haja recuo na PEC 32 para uma rediscussão das questões básicas — como eu disse, das questões preliminares, que são pré-requisitos para uma reforma dessa monta —, que nós partamos para uma estruturação lógica da reforma administrativa.
A primeira delas é definir o que é essencial para o Estado funcionar e o que é privativo do Estado, indelegável. Nós inclusive, aqui na Polícia Federal, sofremos com a terceirização, que era uma medida temporária e acabou se tornando efetiva. E já tivemos, por exemplo, nos aeroportos brasileiros, uma atuação questionável, até porque o terceirizado não tem o vínculo que o policial ou o servidor administrativo tem com a Polícia Federal.
Ele acaba sendo ligado a uma empresa e tendo uma punição maior em caso de erro, a demissão da empresa privada. E nada impede que ele saia da Polícia Federal e vá trabalhar em um outro órgão público vinculado à mesma empresa. Nós já vimos isso acontecer também.
Então, certas atividades que nós realizamos devem ser ligadas. Nós não devemos aceitar uma delegação para a iniciativa privada, sob pena de termos, em funções importantes, a atuação política ao invés de uma atuação de Estado, como autoridade, com esse mister concedido pela lei para que atuemos como mandatários do Estado para fiscalizar, para investigar seja qual for a atividade que nos é delegada.
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Já estou frisando que a nossa primeira intenção é que essa PEC seja recolhida e que haja um recuo para rediscutir os dados básicos que fomentaram o encaminhamento dela. Depois, caso isso não venha, que nós partamos para uma discussão mais profícua e mais profunda do que são as carreiras pensadas por esse Governo para ocupar funções públicas, dentro desse quadro de concurso público, de estabilidade e de um vínculo permanente protegido de todo tipo de ataque que o servidor pode sofrer, caso cumpra a sua missão.
O SR. PRESIDENTE (Fernando Monteiro. PP - PE) - Obrigado, Luís Antônio de Araújo Boudens, Presidente da Federação Nacional dos Policiais Federais.
Primeiramente, é uma honra estar aqui. Quero agradecer ao Deputado Fernando Monteiro, ao Deputado Arthur Maia e aos Deputados e Deputadas que integram esta Comissão e apresentaram os requerimentos para que eu pudesse aqui, em nome da ANAFE — Associação Nacional dos Advogados Públicos Federais, apresentar nossas considerações sobre a PEC. Então, na qualidade de advogado público, servidor público e também representante de servidores públicos, advogados públicos, estou aqui.
(Segue-se exibição de imagens.)
Estruturei a presente apresentação em três partes: na primeira, os aspectos e as críticas gerais à PEC 32/20; depois, como assunto específico, concurso público e vínculo de experiência; e, por fim, atendendo até o desafio feito pelo Deputado Arthur Maia, algumas propostas para uma reforma administrativa republicana no Brasil.
Sem mais delongas, o Brasil, de fato, precisa de uma reforma administrativa. Nós não negamos isso. E o sentido semântico da palavra "reforma" equivale a avanço institucional. Porém, nós temos algumas considerações sobre a PEC. Primeiro, ela não veicula propriamente uma reforma, mas uma contrarreforma no Estado, no sentido da fragilização institucional do Estado brasileiro. Ela não está amparada em estudos, em dados, em projeções que tenham sido previamente apresentadas. Na verdade, elas vieram a público depois da apresentação da proposta, e até com certa ambiguidade. Ela desgasta mesmo a ideia de permanência da Constituição, na medida em que trata e constitucionaliza temas que deveriam ser tratados em legislação ordinária. Ela é seletiva, porque efetivamente não atinge, na sua proposição original, pelo menos, os privilégios que diz combater; concentra poderes legislativos na mão do Presidente da República, enfraquecendo o sistema de freios e contrapesos no Brasil; e aumenta, no caso específico das funções essenciais à Justiça, a disparidade de armas, na medida em que dá tratamento diferenciado e institucional a essas funções.
Eu gostaria de fundamentalmente destacar que ela também — e esse é um aspecto que precisa ser destacado separadamente — fragiliza, em lugar de fortalecer, o sistema de freios e contrapesos no Brasil, na medida em que estiola, enfraquece a administração pública em padrões weberianos; e, no que toca à questão finalística, em lugar de aprofundar, ela compromete a universalidade, a equidade e a integralidade do serviço público, no sentido de, às vezes, não ter isso como um foco principal de suas preocupações.
Quais seriam as bases conceituais para uma reforma administrativa republicana no Brasil? Primeiro, pressupostos. O Estado não é subsidiário na relação da prestação do serviço público.
Embora o princípio da subsidiariedade tenha sido retirado da proposta, nós continuamos vendo, pela formatação da PEC, que ela concede um caráter ou um papel subsidiário ao Estado brasileiro. O cidadão é um usuário do serviço e não um cliente. A crítica do modelo privado para o âmbito público traz vários problemas, inclusive a ideia de universalidade do acesso aos serviços públicos. Igualdade não equivale à equidade. A igualdade geral de acesso ao serviço público tem que ser temperada com medidas de equidade. Nós já temos isso na Constituição, por exemplo, quando trata da reserva de vagas para pessoas portadoras de deficiência. Teremos que aprofundar essa discussão. E essa discussão não é trazida, por exemplo, na PEC 32.
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A defesa de interesses difusos requer mecanismos específicos de confiança. O que eu quero dizer com isso? Que, às vezes, a atividade do público não é uma atividade simpática. Ninguém gosta de ser multado. Ninguém gosta de ser punido. Mas alguém precisa fazer isso em nome do Estado. E os mecanismos de proteção institucional buscam justamente esse alinhamento entre interesse público e o comportamento do agente público na execução de suas atribuições.
Por fim, nós temos que pensar que os serviços públicos requerem fontes múltiplas de financiamento. Podemos usar o exemplo do Sistema Único de Saúde no Brasil, que concentra a ideia de múltiplas fontes. Esse é um debate também que deveria ser travado, um debate em torno das fontes de financiamento do serviço públicos como elementos essenciais à realização dos direitos fundamentais.
Há fragilidades específicas na PEC 32/20 que mereceriam também uma reflexão detida. Felizmente, a Comissão está reservando espaços específicos para se discutir cada um desses sistemas. O que poderíamos apontar aqui? O fim da estabilidade para o conjunto dos servidores públicos e se discutir qual o modelo de estabilidade mais adequado para cada função; a escavação interna da própria estabilidade do serviço público para quem permanecer estável; a indefinição conceitual em torno dos cargos típicos de Estado e a diferenciação que se estabelece a partir disso. Na ANAFE, nós defendemos que é necessário, sim, se discutir o que é cargo típico de Estado e diferenciá-lo dos demais cargos, mas não no sentido da exclusão das garantias constitucionais extensíveis aos demais servidores públicos. O problema dos cargos de liderança e assessoramento, que já foi identificado pela Comissão. Saúdo a Comissão por isso. É uma CR, sem dúvida, e uma matéria que precisa ser revisada. E o esvaziamento do concurso público como fórum republicano de acesso aos cargos públicos no Brasil juntamente com o vínculo de experiência, que são os dois tópicos que vão ser analisados mais especificamente na sessão de hoje.
Vou agora para a segunda parte da minha apresentação. Desculpem-me pela rapidez, mas preciso dar conta da apresentação.
O fundamento republicano do concurso público. O concurso público é uma conquista republicana e precisa ser preservada na nossa tradição. Ele equilibra igualdade, equidade de acesso aos cargos públicos no Brasil, sendo, portanto, uma manifestação concreta do princípio da igualdade. Ele estabelece a seleção de candidatos com vistas a maior vantajosidade para o interesse público, ou seja, seleciona princípios mais qualificados para o cargo, e ele tem um elemento importante ao princípio republicano, que é a transparência, a possibilidade de auditoria, de objetividade dos critérios da seleção. Portanto, é uma conquista institucional que precisa ser incrementada e não caminharmos no sentido de sua involução. Da mesma forma, os fundamentos republicanos da estabilidade que está ligada ao princípio do concurso público.
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Primeiro, a estabilidade favorece o alinhamento entre interesse público é a conduta do agente. Aquilo que nós falamos, não estamos necessariamente oferecendo uma mercadoria ao mercado. Alguém precisa atuar no sentido da defesa de interesses que não estão redutíveis àquele que provavelmente está recebendo a prestação do serviço público. Quem faz a fiscalização ambiental certamente faz uma atividade antipática. Quem faz o serviço de educação necessariamente não está ligado à satisfação do aluno ou dos pais, porque a escola sequer é do aluno, ela pertence ao conjunto da sociedade. Esses elementos precisam ser defendidos em termos de preservação do interesse público.
Por fim, a estabilidade é relativa. Ela não é uma trava impossível de afastamento daqueles agentes públicos que não são fieis ao interesse público. Se um agente público se envolve em atos de corrupção, se ele é ineficiente no sentido de avaliações objetivas, ou se ele, por exemplo, armado pelo Estado, conspira contra a democracia, por certo, não será a estabilidade ou menos a estabilidade na Constituição que irá protegê-lo.
Em que sentido, se estou falando aqui que a proposta estiola, esvazia, enfraquece o princípio do concurso público ou do concurso público como mecanismo republicano de acesso aos cargos públicos?
Primeiro, pela ampliação desmedida das possibilidades de nomeação de cargos de liderança e assessoramento para exercer funções estratégicas, gerenciais e técnicas no Estado brasileiro. Aí já é uma fratura na ideia de concurso público.
Segundo, pela sonegação da proteção institucional da estabilidade para parcela significativa dos servidores que ingressarem por concurso público, aqueles que não forem definidos como cargos típicos de Estado.
Por fim, pela inserção de um vínculo precário no próprio concurso público, que é o vínculo de experiência, que não oferece as garantias necessárias para proteção do interesse público. Vou entrar em mais detalhes na sequência.
Por que o vínculo de experiência apresenta problemas? Primeiro, pela precariedade exacerbada desse vínculo. Segundo, pelo irrealismo do processo de avaliação, que não vai se dar durante o vínculo de experiência nas mesmas condições a partir da efetivação do vínculo. Se isso ocorrer, nós teremos outros problemas de alinhamento de interesse público. Terceiro, pela ambiguidade dos incentivos. A que avaliador esse agente estará destinado a agradar para ser efetivado? Ao avaliador do concurso ou isso se dará nas mesmas condições do vínculo efetivo? Risco de subjetivismos e viés cognitivos. Haverá o risco inclusive de diferentes avaliadores fazerem a avaliação dos agentes públicos em condições diversas. E nós não podemos ignorar o risco de favorecimento. Vamos imaginar que, na fila da nomeação, na fase do concurso, esteja alguém que o gestor público tem interesse em que ele seja promovido. Ele pode passar na fila no processo de avaliação. Nós não estamos falando de problemas hipotéticos na República brasileira. Nós temos casos de patrimonialismo muito enraizados na nossa tradição. Incompatibilidade do vínculo de experiência com as ideias de independência técnica e autonomia funcional. E, por fim, a insegurança jurídica com relação à validade dos próprios atos praticados pelos agentes públicos durante o vínculo de experiência.
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Então, nós teríamos a situação em que o servidor seria ou um trainee, um ainda concursando, ou, então, um servidor precarizado, a quem se atribuiriam responsabilidades que seriam incompatíveis com a natureza do vínculo que ele estaria estabelecendo com a administração.
Haveria também aquele problema que se argumentou: "Olhe, em um escola privada ou em um hospital privado, há um monitoramento". Qual é a diferença? A diferença é justamente a titularidade do interesse. O gestor público não é titular do interesse que ele está representando, diferentemente do que ocorre na esfera privada, em que o dono da escola é o dono da escola. Aqui nós temos um problema em que o verdadeiro titular do interesse público, que é a população, não tem como monitorar diretamente o desempenho do agente público e precisa de outros agentes públicos para fazer isso. E aí entra a questão de quem avalia o avaliador.
E nos parece que isso é uma transposição acrítica de um modelo privado, que pode dar muito certo em uma seleção de trainees em uma empresa privada, mas que tem inúmeros problemas de compatibilidade com a lógica de funcionamento do serviço público.
Nós teríamos, no caso específico dos cargos típicos de Estado, dois riscos de captura: a captura pelo mercado — e, portanto, até o trânsito de informações privilegiadas e estratégicas e a captura do agente público pelo interesse privado — e a captura política, pelo patrimonialismo, pelo favorecimento à improbidade e pela vinculação desse agente aos interesses imediatos políticos e não aos interesses estruturais de longo prazo da administração pública brasileira. Então, esses dois riscos são exacerbados. São riscos já presentes na administração pública brasileira, mas que são exacerbados à medida que nós favorecemos o vínculo de experiência, que é um vínculo de natureza precária.
Com relação, especificamente, à advocacia pública, se me permitem falar sobre isso, nós temos o risco, sim, a partir do vínculo de experiência, do uso privado da advocacia pública, do uso político da advocacia pública — e aí estou falando de interesses políticos menores — e também há uma quebra de paridade de armas entre a advocacia pública e, por exemplo, o Ministério Público, que não vai ter essa forma de ingresso no serviço público, ou seja, continuará sendo um ingresso previsto de ser estabelecido diretamente no cargo público.
Por fim, a terceira parte: quais seriam as bases — se me permitem, Deputados e Deputadas, apresentar algumas sugestões — de uma reforma republicana dos serviços públicos, cumprindo aqui o desafio que nos foi apresentado pelo Deputado Arthur Oliveira Maia.
Parece-me que são dois eixos estruturais, o eixo de governança das estruturas públicas, e, portanto, uma questão focada nos meios, e outra questão focada na finalidade do serviço público, que é a universalidade, a equidade e a integralidade dos serviços públicos para a população brasileira.
E eu me permito aqui, Deputados, dizer que eu vou falar muito pouco sobre a atividade-fim, porque eu pertenço a uma carreira de atividade meio, uma carreira muito mais voltada a questões relacionadas à governança das estruturas do que propriamente à questão da prestação finalística ou lá na ponta do serviço público. E, se me permitem a sugestão, é necessário ouvir o pessoal que atua nessa área. É necessário ouvir o pessoal da educação pública, da saúde pública, que presta serviço de assistência social, porque me parece importante que essas pessoas também tenham a sua voz ouvida e apresentem suas preocupações específicas e suas sugestões para o aprimoramento da reforma administrativa no Brasil.
Aí entra a questão de adequação do concurso público às responsabilidades do cargo, inclusive no tocante a requisitos prévios, o que me parece ser uma questão de legislação ordinária, e há até projetos muito interessantes em tramitação nesta Casa que tratam dessa matéria;
adoção de critérios de equidade na seleção — parece-me que selecionar profissionais de educação para os índios, por exemplo, é diferente de selecionar para a educação em geral; foco nas necessidade dos usuários; e um possível curso de formação como etapa do concurso para os cargos de maior responsabilidade institucional, que seriam os cargos típicos de Estado, a inserção dessa etapa dentro do concurso público.
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Vou apresentar rapidamente: a eliminação do vínculo de experiência como forma de ingresso no serviço público; estabilidade e sistema de responsabilização adequados ao nível de responsabilidade do ocupante do cargo de provimento efetivo; avaliação de desempenho adequada, estrutural e focada em resultados do serviço público; definição de níveis de autonomia institucional (administrativa e orçamentária) ajustados à finalidade de cada órgão ou entidade pública; mandato e quarentena para os dirigentes das instituições de Estado, que me parece uma evolução importante que precisa ser feita no Estado brasileiro — se houver alguma dúvida sobre isso, talvez eu possa depois responder; participação e controle dos cidadãos na avaliação dos serviços públicos; controle externo dos órgãos de Estado, inclusive o controle externo dos órgãos que ainda não têm esse mecanismo de controle — eu citaria, por exemplo, a própria advocacia pública; e a observância do teto remuneratório constitucional como forma de enfrentamento do argumento do privilégio. Há inclusive o Projeto de Lei nº 6.726, de 2016, que trata dessa matéria.
Desculpem-me a fala um tanto quanto açodada, mas eram vários tópicos a apresentar. Eu espero que tenha contribuído.
O SR. PRESIDENTE (Fernando Monteiro. PP - PE) - Obrigado, Sr. Lademir Gomes da Rocha, Presidente da Associação Nacional dos Advogados Públicos Federais.
O SR. FERNANDO DE SOUZA COELHO - Boa tarde, Deputado Fernando Monteiro. Inicio agradecendo a esta Comissão Especial o convite para dialogar com os senhores nesta audiência pública. Cumprimento, então, o Deputado Fernando Monteiro, Presidente desta Comissão, o Deputado Arthur Oliveira Maia, Relator, e o Deputado Tiago Mitraud, Vice-Presidente e autor do requerimento para o meu convite, a quem agradeço, e estendo o cumprimento a todos os Deputados e Deputadas que estão nos acompanhando, aos colegas desta sessão e aos servidores públicos.
Eu farei uma breve apresentação. Sou professor e pesquisador da área de administração pública na Universidade de São Paulo, há 10 anos trabalhando com o tema do concurso público, trabalho esse que, inclusive, iniciou em 2012, a convite da Escola Superior de Administração Fazendária — ESAF, que foi fundida em 2019 com a Escola Nacional de Administração Pública — ENAP. E, como os senhores e as senhoras muito bem sabem, a ESAF, em âmbito federal, realizava muitos concursos públicos. E havia uma discussão no âmbito da ESAF, na oportunidade, com a Secretaria de Gestão Pública, de como modernizar o instituto do concurso público a partir da sua instrumentalização gerencial.
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É a partir desse trabalho, que venho realizando nos últimos 10 anos, igualmente com Governos Estaduais e Municipais e algumas organizações públicas, que trago alguns subsídios ao debate. Parte do que eu vou dizer está publicado em um artigo na Revista do Serviço Público, da ENAP, em 2018, intitulado A quantas anda a gestão de recursos humanos no setor público brasileiro? Um ensaio a partir das (dis)funções do processo de recrutamento e seleção — os concursos públicos.
Eu inicio fazendo um apontamento que reforça o que colegas que me antecederam discursaram. Se você observar a questão do concurso público pelo processo de recrutamento e seleção, nós devemos analisar as nomeações para os cargos em comissão, bem como analisar e reanalisar os cargos ou empregos temporários, por prazo determinado, ou cargo ou emprego sujeito a provimento compartilhado, com particulares.
Nesses casos, havendo o avanço no âmbito da PEC desses aspectos, devemos considerar, sim, os critérios de competência, conhecimentos, habilidades e atitudes, bem como critérios de equidade e diversidade na ocupação desses cargos. Afinal, o serviço público deve ser representativo da diversidade da população brasileira. Então, o binômio competência e diversidade é fundamental na ocupação desses cargos públicos, tal como nós temos ações afirmativas no âmbito dos concursos públicos.
No que se refere aos concursos públicos, é muito importante, talvez, na emenda da PEC, considerando a Constituição de 1988 e o avanço do instituto jurídico do concurso público, que se organiza por prova ou prova e título... Nós temos tido um experimentalismo de algumas etapas adicionais em concursos públicos no Brasil, nos três níveis de governo, que adicionam aferição de algumas competências, considerando habilidades. Muitas vezes as provas objetivas conseguem mobilizar a aferição de um conhecimento, mas não conseguem ir além.
É claro que isso depende da especificidade, da natureza e da complexidade de cada cargo de carreira no setor público, mas, talvez, até para inovarmos, no instituto jurídico do concurso público, para além de provas objetivas, seja importante prever uma etapa adicional, que pode ser opcional, de acordo com a natureza e complexidade do cargo e do emprego público.
Por mais que a discussão não esteja relacionada diretamente com a PEC, mas indiretamente, nós temos na Câmara dos Deputados, desde 2003, o Projeto de Lei nº 252, com 19 projetos apensados, que se encontra na CCJ, discutindo um estatuto do concurso público no Brasil, que é fundamental para termos uma lei infraconstitucional para mediar a relação entre o que está na Constituição e o edital dos concursos públicos.
Esse estatuto eu chamo para a questão, além da segurança jurídica dos candidatos. Às vezes fazemos muito a discussão pela segurança jurídica, que é fundante, mas temos que pensar igualmente a forma de aprimorarmos a garantia do interesse público no concurso público, fazendo com que os resultados se aproximem do interesse público, considerando o perfil das pessoas aprovadas e a sua vocação para o serviço público.
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Eu complementaria afirmando que não tenho ideias, do ponto de vista jurídico, porque não sou um jurista, sou alguém da área de administração e gestão pública. Temos que dialogar com juristas da área de Direito Administrativo para pensar nesse equilíbrio entre o instituto jurídico do concurso e a sua instrumentalização gerencial.
Mas venho afirmando que, para além do concurso como instituto jurídico, é fundamental pensarmos nas políticas públicas de gestão de pessoas, porque não podemos restringir a reforma administrativa a uma emenda constitucional que não seja implantada de forma coerente e consistente com uma política pública de gestão de pessoas.
E eu posso aqui fazer uma afirmação para vocês no que se refere ao concurso público: muitas vezes o concurso público é tratado de forma isolada, como um ritual processualístico, como se fosse tão somente uma prova, e não pensamos a relação do concurso público com os diversos subsistemas de recursos humanos no nível macrogovernamental — para todo o Governo — ou em cada uma das organizações públicas.
(Segue-se exibição de imagens.)
Nas investigações que temos realizado na Universidade de São Paulo — com colegas e os nossos alunos de pós-graduação — , temos partido das disfunções do concurso público no Brasil, como eu afirmei, muitas vezes tratado essencialmente como instituto jurídico isolado, com foco exacerbado no tempo, nos custos e no ritual processualístico.
Às vezes, entre o tempo de aprovação do concurso e a sua realização não há um tempo necessário para um processo de planejamento. E essa insuficiência ou ausência de planejamento impacta os resultados do concurso público.
Precisamos repensar o concurso público a partir das suas relações com sistema de ingresso no serviço público porque, tal como ele se apresenta, muitas vezes, os resultados do certame são indesejáveis. É o que nós temos afirmado a partir de diálogos com muitos gestores de pessoas de organizações públicas brasileiras, que vão apontar que o perfil de pessoas aprovadas, considerando os seus conhecimentos, as suas habilidades ou mesmo seus valores, a partir da relação com a vocação para o serviço público, está distante do almejado.
Então, o nosso argumento é que a reforma administrativa precisa estar integrada com o processo de políticas públicas de gestão, isso é, a relação entre o instituto jurídico e a instrumentalidade gerencial.
Quais são os problemas recorrentes que termos encontrado nos concursos públicos no Brasil?
O predomínio de provas objetivas. Muitas vezes, os concursos têm única fase e são baseados em questões de múltipla escolha que não necessariamente conseguem aferir conhecimento e ficam muito aquém da aferição de algumas competências, como habilidades. Muitas vezes há uma vantagem para quem tem tempo e recursos para se preparar, independente da vocação para o serviço público.
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Há uma noção de mérito, em alguns casos, relacionada à aprovação no certame. Mas, após o ingresso, muitas vezes a discussão de mérito é esfriada por um tabu isonômico ou mesmo por pressões corporativistas que eu, como servidor público inclusive, reconheço.
Temos um aumento dos litígios e da judicialização dos certames. Isso está muito relacionado com a indústria do concurso público no Brasil, na relação com a preparação. Candidatos vão se preparar e, às vezes, até o cursinho oferece toda a base para eles apresentarem ou interporem recursos às provas e às questões. E todo esse processo tem levado a uma inibição à inovação nos concursos públicos, com uma excessiva simplificação das provas para se evitar problemas.
Mas o principal problema que temos observado é o desalinhamento entre as diversas etapas do concurso público, considerando o sistema de ingresso, tal como eu ilustro para os senhores e para as senhoras neste instante.
Quando pensamos o concurso público a partir de um sistema de ingresso e relacionado com políticas públicas de gestão, ele envolve pelo menos quatro fases ou etapas.
Quanto ao planejamento da força de trabalho, muitas vezes definimos vagas em concursos públicos a partir de números cabalísticos ou interferências políticas que não levam em consideração o planejamento da força de trabalho. Muitas vezes temos editais que não são revisados e são republicados sem levar em consideração as atribuições e funções do cargo em uma relação entre o presente e o passado, mas não em uma relação entre presente e futuro. Paremos e pensemos: em 2030, quais serão as funções e atribuições de muitas dessas pessoas que estão sendo aprovadas em concurso público e o que elas vão realizar no seus cargos ou carreiras?
Então, o planejamento da força de trabalho macrogovernamental e organizacional é fundante para uma boa organização do concurso público.
Um segundo item é recrutamento e seleção. Há toda a necessidade de pensarmos na elaboração de um edital a partir de itens multidimensionais com diferentes racionalidades; de pensarmos em um edital para além da abordagem jurídica, mas como instrumento gerencial.
Outro aspecto é a forma pela qual o concurso público é elaborado, envolvendo Inclusive a contratualização de uma organização terceira. Se não houver o devido alinhamento, a prova se distancia do ideal do edital. E devemos pensar em um processo de divulgação para além do ato da publicidade do concurso no Diário Oficial. Organizações públicas ativamente devem divulgar os concursos públicos buscando que essa divulgação seja ampla, mas que também atinja pessoas que tenham essa vocação. Por que não divulgar um concurso de professores, por exemplo, nas Faculdades de Educação e Pedagogia? É uma falha de gestão.
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Outro item é: decorrido o concurso, a forma com que falhamos em governos e organizações públicas na incorporação dessas pessoas. Às vezes, as pessoas são incorporadas sem um devido processo de socialização: a alocação não leva em consideração as competências que essa pessoa tem, a partir da sua vida pregressa ou da sua trajetória profissional; não realizamos um mapeamento de competências dessas pessoas para fazer essa devida alocação. E aqui é fundamental destacar o papel das escolas de governo, porque são essas escolas de governo que vão fazer o processo de treinamento e desenvolvimento das pessoas aprovadas, considerando os gaps de competência que uma prova muitas vezes não consegue aferir. Então, é muito importante pensarmos a incorporação, o treinamento e o desenvolvimento.
Por fim, como o colega Felipe Drumond apontou durante a apresentação que realizou, devemos pensar na gestão do desempenho vinculada ao estágio probatório. O estágio probatório se tornou no Brasil uma ficção. Então, fico imaginando pensarmos esse vínculo de experiência tal como a PEC propõe. Se não conduzimos bem o estágio probatório, será que vamos conduzir bem um vínculo de experiência? Como, então, podemos avançar com o estágio probatório?
Compartilhando a minha apresentação, para finalizá-la, eu quero então afirmar que é fundamental pensarmos a PEC a partir de emendas constitucionais, mas elas têm que estar integradas em políticas públicas de gestão macrogovernamental ou organizacional. No Brasil, na última década, as políticas públicas de gestão foram secundarizadas, porque a dimensão se tornou a econômico-financeira e não administrativa-gerencial diante da crise econômico-financeira, sobretudo nos últimos 5 anos. Então, as políticas públicas de gestão não estão na agenda como deveriam estar em todos os níveis de governo — claro que, com ressalvas e exceções.
E, para finalizar, eu quero fazer uma afirmação: por mais que, às vezes, no Governo Federal, tenhamos carreiras muito bem organizadas — e são mais de 300 carreiras, em torno de 700 mil funcionários públicos —, essa discussão precisa considerar a realidade da gestão pública subnacional, dos Estados, das 27 unidades da Federação e dos 5.568 Municípios no Brasil.
Em alguns Estados e, sobretudo, nos Municípios — e temos aqui Deputados e Deputadas que conhecem muito bem a realidade municipal, a partir da sua base política eleitoral, inclusive Deputados e Deputadas que já foram Prefeitos e Prefeitas —, devemos jogar luz, porque nos Municípios, muitas vezes, não temos essa área de recursos humanos, é onde a área de recursos humanos se restringe ao Departamento de Pessoal, que age um foco operacional e sem uma inteligência para essas políticas públicas de gestão. Os Municípios ainda continuam fazendo concursos públicos para carreiras de especialistas, que é uma modelagem do século XX, não pensando em carreiras amplas, que é uma modelagem do século XXI.
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Se não trabalharmos essa colaboração federativa, vamos continuar tendo nos Municípios brasileiros, sobretudo nos de pequeno e médio porte — que representam 90% dos Municípios brasileiros e têm até 50 mil habitantes —, muitos problemas na área de recursos humanos.
O SR. PRESIDENTE (Fernando Monteiro. PP - PE) - Obrigado, Fernando de Souza Coelho.
(Segue-se exibição de imagens.)
Eu quero iniciar a minha apresentação a partir de um texto que acabei de fazer sobre o assunto, intitulado Concursos Públicos, Profissionalização Burocrática e Desempenho Institucional, no qual faço um contraponto entre aquilo que chamo de princípios gerais de uma reforma administrativa que estão contidos na Constituição de 1988 versus algumas propostas sore o assunto que estão na PEC 32, que são de natureza antagônica, como vou tentar mostrar.
Eu queria começar, então, por três comentários rápidos que considero importantes e que chamo de Preâmbulos Ético-metodológicos.
Primeiro, quero lamentar o fato de que essa discussão e a própria tramitação legislativa em curso estejam acontecendo em meio à pior crise sanitária, humanitária, econômica, social e, inclusive, político-institucional da história do Brasil.
Claramente, isso já foi dito em outras ocasiões nesta Comissão, a prioridade nacional do momento é outra: é vacina no braço e comida no prato.
E a PEC 32, da forma como está proposta, não resolve nenhum desses problemas que estamos vivenciando hoje e muito menos nenhum dos problemas estruturais do Estado brasileiro. Eu diria mais: tende a fazer piorar e até mesmo criar novos e mais graves problemas para o futuro.
Em segundo lugar, quero lamentar que esse assunto tão importante e complexo, como é a reforma do Estado, esteja sendo debatido por esta Casa a partir da PEC 32. Como já mencionado nesta Comissão e mesmo na Comissão de Constituição e Justiça, trata-se de uma peça de péssima técnica legislativa, na qual há ausência completa de diagnósticos e de fundamentação empírica, teórica e histórica acerca das proposições que contém. E tampouco contém essa PEC projeção de impacto sobre as mudanças radicais, abruptas e inconstitucionais — diria eu — que promete ou pretende implementar, supostamente, a partir de sua aprovação.
Ou seja, não é um tema que vem sendo debatido a partir da explicitação ou da explicação situacional necessária para trazer a lume os quatro problemas históricos e institucionais do Estado brasileiro, que eu apenas vou ter tempo aqui de mencionar os quatro, ou seja, o autoritarismo, o burocratismo, o fiscalismo e o privatismo encrustados na história de formação do Estado brasileiro que permanecem entocados e que serão, evidentemente, exacerbados se essa PEC for aprovada.
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Em terceiro e último lugar, como parte dos preâmbulos, eu queria lamentar o fato de que os temas escolhidos pela Comissão Especial, fatiando a PEC em temas específicos, ainda que temas importantes e necessários, da forma como estão sendo tratados, impedem uma visão de conjunto acerca dos imensos problemas e dos riscos institucionais da PEC. Destaco aqui apenas três: o caráter autoritário da PEC, que já foi demonstrado, possuindo vários dispositivos inconstitucionais; a natureza abertamente antirrepublicana e antidemocrática, tanto na forma de formulação da PEC quanto na forma de tramitação que vem sendo conduzida de modo célere, sem a participação efetiva da sociedade; e o caráter fiscalista, ou seja, ela se chama PEC da reforma administrativa, mas, a bem da verdade, o núcleo duro dela consiste numa reforma trabalhista de índole precarizante das relações de condições de trabalho no setor público e tem o mesmo perfil que a reforma trabalhista, igualmente precarizante, que já foi aprovada, em 2017, por este Congresso.
A eliminação ou o enfraquecimento do estatuto do concurso público, que é o tema de hoje, como meio principal de acesso ao setor público, o fim do RJU e da estabilidade funcional para a maior parte dos servidores ou dos futuros funcionários, a flexibilização das formas de contratação, remuneração e demissão, tudo isso somado vai precarizar a ocupação no setor público e deteriorar a qualidade, a cobertura e a tempestividade das políticas públicas. Então, esse tema de hoje se insere justamente nesse contexto de uma reforma trabalhista de índole precarizante das condições e relações de trabalho no setor público. Eu acho que isso já foi também apresentado em outros momentos durante a Comissão Especial.
Por fim, essa PEC tem um caráter privatista, abertamente privatista, antagônico aos princípios e diretrizes da Constituição de 1988. A partir dela, se aprovada for, vai se estabelecer uma verdadeira PPP, que, nesse caso, vem a ser a promiscuidade público-privada, a volta do Brasil ao Estado liberal, patrimonial e oligárquico, que vigorou no País durante a Primeira República, de 1889 a 1930, ou seja, no período pré-DASP da Era Vargas, quando começa o processo lento, gradual e não determinístico, contraditório, etc., de profissionalização, de institucionalização da função pública.
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Primeiro, o concurso público como principal mecanismo de contratação e de acesso aos cargos públicos, que evidentemente necessita de aprimoramentos institucionais na linha do que sugeriu o Prof. Fernando. Mas os problemas relativos ao concurso, tais como temos hoje, nenhum deles será enfrentado e resolvido pela PEC 32 tal como está redigida.
Segundo, o RJU — Regime Jurídico Único como modelo de contratação adequado à natureza e aos objetivos da função pública é uma inovação institucional importante da Constituição de 1988.
Terceiro, a estabilidade relativa dos servidores após cumprimento de estágio probatório como etapa eliminatória dos certames realizados. Essa etapa é necessária à ambientação dos novos concursados ao ethos, ao espírito, à vocação pública. Isso também já estava previsto na Constituição de 1988 e veio sendo aperfeiçoado de lá para cá. Os fundamentos ainda carecem de aperfeiçoamento, mas estão ali presentes.
Quarto, as diretrizes e os princípios gerais de atuação e conduta contidos nos códigos de ética e na própria Lei nº 8.112, de 1990, e outros desdobramentos que vieram desde então, configuram um processo de construção e de aperfeiçoamento institucional no que diz respeito à gestão dos recursos humanos do Estado.
Por fim, o quinto. Fazem parte da Constituição de 1988 princípios e diretrizes de uma gestão democrática, participativa, deliberativa, no âmbito de gestão de pessoas e da própria administração pública como um todo.
Não precisamos rasgar ou jogar no lixo a Constituição de 1988, como pretende ou propõe a PEC 32, colocando no seu lugar instrumentos frágeis do ponto de vista jurídico e deletérios em termos das implicações que trará para o serviço público e para a própria provisão de bens e serviços públicos ao conjunto da população.
Eu quero mencionar o fato de que todos esses temas — concurso, estágio probatório, Regime Geral, Regime Jurídico Único, estabilidade funcional — são aspectos interconectados. Eles devem ser vistos como parte de um conceito que eu uso: o ciclo laboral no setor público. Esse conceito está muito bem explicitado e desenvolvido em documento produzido e publicado pelo FONACATE. Refiro-me ao Cadernos da Reforma Administrativa nº 2, de autoria dos colegas Luiz Alberto dos Santos e Antônio Augusto de Queiroz, que perpassa essas cinco dimensões do ciclo laboral no setor público, entre as quais se destaca a própria seleção meritocrática, ou seja, o concurso público como critério dominante de ingresso no setor público.
Há um detalhe importante aqui. Muito se fala sobre meritocracia, sobre incentivar o mérito no setor público para progressão e mesmo para seleção, mas pouco se diz sobre as precondições sociais, econômicas, políticas necessárias para a meritocracia funcionar adequadamente no País.
A meritocracia é um princípio fundamental de organização e estruturação do Estado, desde que esteja ancorada, o máximo possível, em homogeneidade econômica e social, em republicanismo político e em democracia social. Sem isso, o concurso público acaba servindo, como vem acontecendo no Brasil, em vários casos, em vários setores, como peça de exacerbação ou de confirmação das desigualdades históricas da sociedade brasileira.
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Isso precisa ser enfrentado, mas não o será por meio apenas de aprimoramentos formais no âmbito do concurso em si. Depende-se de um conjunto de iniciativas de governos que atuam na produção da equidade e igualdade de condições no próprio mercado de trabalho, no âmbito da sociedade como um todo. Porém, a seleção meritocrática, ainda assim, no caso brasileiro, impede que o Estado seja ocupado ou capturado, como bem disse o Lademir aqui, do ponto de vista econômico ou político, por indicações político-partidárias, por apadrinhamento político etc.
O concurso, ou a seleção meritocrática, é apenas uma das primeiras etapas do ciclo laboral no setor público, que vem a ser complementado pela segunda etapa: os processos necessários de qualificação ou escolarização elevada desde a entrada e a capacitação permanente ao longo do ciclo laboral, para o qual são importantes as escolas de governo, algo que também vem sendo destruído pela PEC 32.
A terceiro etapa refere-se a processos condizentes de alocação funcional aderentes às vocações do servidor e, ao mesmo tempo, aos interesses da administração.
Quarta, processos de remuneração ou políticas remuneratórias adequadas, isonômicas e previsíveis ao longo do ciclo laboral estão ao nosso alcance, efetivamente, para realizar, em vez de se trabalhar com uma completa insegurança em relação a isso.
Essas etapas que constituem o ciclo laboral do servidor no setor público precisam ser olhadas conjuntamente, para configurar uma verdadeira política de gestão de recursos humanos no setor público, em que os concursos, por meio da seleção meritocrática, acabam desempenhando um papel crucial.
No documento que eu citei do Luiz Alberto e do Antônio Queiroz, há um quadro que traz uma série de propostas de aperfeiçoamento para todas essas etapas do ciclo laboral. Vou destacar as mais importantes com relação aos próprios concursos: manter o estatuto do concurso público, mas evidentemente aperfeiçoá-lo, no sentido de buscar maior aderência entre candidatos aprovados e perfis necessários e desejados no setor público. Esse dispositivo complementa-se com o regime estatutário dos servidores, o RJU, assim como com a manutenção e o aperfeiçoamento do estatuto da estabilidade, e por aí vai.
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É preciso dizer — e já falei a respeito disso — que vem sendo proposta uma mudança, inclusive de nomenclatura, no estágio probatório. Mas ele tem de ser visto como parte integrante do concurso e deve ser usado como momento de ambientação e de avaliação do concursado, sem representar nem efetivação automática nem transferência de responsabilidades integrais, evidentemente. Isso precisa e pode ser aperfeiçoado sem mudança constitucional, evidentemente.
O mesmo vale para os concursos. Como já foi dito, para além de se avaliar conhecimentos gerais e competências específicas necessárias a cada cargo, carreira ou função, é preciso que os concursos sejam capazes de selecionar servidores com atributos pessoais, emocionais e psicológicos perfilados ao ethos, ao espírito público, bem como aos objetivos fundamentais do desenvolvimento do País, e não apenas a objetivos corporativos, que muitas vezes enfraquecem e atrapalham a própria gestão de pessoas e o próprio desempenho institucional no setor público.
Os dados que coloquei na apresentação estarão disponíveis para os senhores. Eles demonstram que está em curso, justamente desde a Constituição de 1988, um processo de profissionalização da função pública e da própria burocracia pública. Basta ver que houve um aumento de quantitativo de servidores, mas um aumento pequeno, tal como demonstrado aqui pela barra do gráfico, relativamente ao aumento de emprego geral da economia. A barra azul representa o crescimento no emprego privado e a barra verde diz respeito ao crescimento no emprego público. Vejam que não há explosão em termos de quantitativo de pessoal no período que vai de 1986 até 2018. E, nesse processo de crescimento lento do emprego público no Brasil, há mudança de composição interna importante. E destaco algumas informações rápidas, para concluir.
Houve aumento mais do que proporcional do emprego público no âmbito municipal, justamente em áreas de atendimento direto à população, tais como: saúde, educação, segurança, assistência etc. Houve ainda aumento impressionante de escolaridade no setor público, justamente por conta do estatuto da estabilidade, da instituição do concurso como porta única ou dominante de entrada. Basta ver o que nos mostra a barra em cor verde no gráfico, que representa os trabalhadores do setor público que têm apenas o ensino fundamental, os quais estão praticamente desaparecendo em todos os níveis da Federação — esse é um ganho —, ao contrário de trabalhadores com escolarização superior, inclusive de pós-graduação. Isso vale para os Estados, para os Municípios e para as áreas finalísticas da atuação governamental, como saúde e educação, que estão demonstradas no gráfico.
Não é à toa que houve um desempenho satisfatório do Governo ou das funções públicas no período recente, na primeira década de 2000, em que se combinou virtuosamente um ganho de renda per capita, representada no gráfico pela linha em cor preta, quando saltou de 19 mil para 29 mil reais a renda per capita média do brasileiro, ao mesmo tempo em que houve uma queda da desigualdade no âmbito do mundo do trabalho, medida pelo famoso índice de Gini, que caiu de 0,55 para 0,49 no período de praticamente 10 anos. Esse não é um fenômeno isolado, não é um resultado aleatório do processo de desenvolvimento. Muito pelo contrário, ele está fortemente ancorado em um trabalho coletivo e concomitante das diversas políticas públicas que têm no servidor público com estabilidade, remuneração, capacitação e condições de trabalho adequadas o esteio desse resultado.
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Esse resultado, basta dizer, é uma exceção, e não a regra, na história republicana brasileira. A combinação virtuosa entre aumento da renda per capita e, ao mesmo tempo, a redução da desigualdade só foi obtido na história republicana brasileira nesse período entre 2004 e 2014.
Os dados recentes do gráfico já mostram uma reversão das duas curvas, o que demonstra a necessidade de se avançar na profissionalização da função pública, com base nas diretrizes contidas na própria Constituição de 1988, e não na sua destruição.
O SR. PRESIDENTE (Fernando Monteiro. PP - PE) - Obrigado, Sr. José Celso Cardoso Júnior, Presidente do Sindicato Nacional de Servidores do IPEA.
O SR. MAX LENO DE ALMEIDA - Boa tarde, Deputado Fernando Monteiro. Também quero externar a minha saudação ao Deputado Arthur Oliveira Maia e a todos os Parlamentares presentes a esta audiência pública.
Agradeço imensamente a oportunidade de estar aqui para trazer o nosso ponto de vista a respeito da PEC 32, no sentido de que este debate traga elementos de reflexão tanto sobre o tema, especificamente, mas, sobretudo — assim como todos os palestrantes anteriores o fizeram —, a respeito do aspecto mais geral. Conforme dito pelo expositor anterior, José Celso, que esteve presente em algumas outras exposições, esse tema não pode ser visto de forma isolada e, ao mesmo tempo, em contexto mais geral no qual a PEC está sendo proposta. Refiro-me não apenas às mudanças constitucionais, mas também as que podem vir a acontecer no âmbito da sociedade em relação a vários direitos sociais previstos na Constituição Federal. Foi muito bem lembrado o papel que os Municípios desempenham, em especial, no atendimento desses direitos sociais à população de forma geral e, principalmente, no que diz respeito ao papel econômico.
O Estado está sendo revisto não só na PEC 32, mas também por intermédio de uma série de outras iniciativas em que uma questão mais geral acaba sendo desconsiderada quando temas específicos são tratados. Isso, claro, é importante. Mas é também de suma importância que, nas próximas audiências públicas, as questões mais gerais que envolvem a PEC estejam presentes, para que todos os que estão participando das reuniões e os que estão nos vendo possam ter a dimensão do que isso pode trazer em termos de consequências.
E isso não só do ponto de vista das contratações ou dos novos vínculos, mas também de como tudo isso vem sendo apresentado. Pode acontecer, de fato, uma reformatação do serviço público, tanto em relação à gestão de recursos humanos como em relação a várias outras questões já apontadas pelos expositores anteriores, no que diz respeito à estabilidade, à gestão de desempenho e ao próprio concurso público.
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Estou aqui representando o Secretário-Geral da CONDSEF — Confederação dos Trabalhadores no Serviço Público Federal e não poderia deixar de fazer as considerações iniciais a respeito desse tema sem antes tratá-lo de forma mais geral. O concurso público e o vínculo de experiência, sem dúvida alguma, não podem ser vistos, como já foi dito, de forma descolada do contexto mais geral dessa PEC.
Sem dúvida alguma, pelas várias interpretações, após várias audiências públicas que já aconteceram e análises que vêm sendo feitas por especialistas dos mais diversos campos, do ponto de vista da PEC — jurídica, econômica, social, entre outras —, percebe-se claramente que há pretensão de se remodelar o Estado brasileiro. Há um forte componente de ajuste fiscal não só na PEC 32, mas também em uma série de outras iniciativas que vêm sendo apresentadas e apreciadas no âmbito do Congresso, as quais fortalecem a iniciativa inclusive de responsabilização dos servidores públicos como um dos elementos constitutivos de fortalecimento desse ponto do ajuste fiscal brasileiro.
Isso vem sendo aprofundado não só por essa PEC, mas por outras iniciativas já aprovadas no âmbito do Congresso, como é o caso da Emenda Constitucional nº 95, de 2016, além de uma série de outros instrumentos que já foram apresentados e até discutidos — a própria reforma da Previdência, a Lei Complementar nº 173, de 2020, que têm rebatimento forte nos Estados —, e que têm justamente esse caráter, à luz de uma mudança estrutural que supostamente vem acontecendo na base econômica e tecnológica. Muitos alegam que isso também está ocorrendo fortemente no âmbito do setor público.
O diagnóstico e, ao mesmo tempo, as questões que estão sendo abordadas para tratar desse tema especificamente consistem em desmontar inclusive o papel do Estado, repassando muitas das suas tarefas, por intermédio inclusive das interpretações da própria PEC, para supostas iniciativas que venham a ser desenvolvidas no âmbito do setor privado.
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Não resta dúvida de que uma das contextualizações importantes a respeito não só do tema, mas também de forma geral, é o que a PEC apresenta como exposição de motivos. Sem dúvida alguma, muitos pontos apresentados na exposição de motivos são pautados em uma série de estudos encomendados de instituições que tentam reforçar essa redução do papel do Estado, por intermédio inclusive da responsabilização dos servidores públicos pela situação em que a economia brasileira se encontra. Algumas alegações são extremamente questionáveis, sem dúvida alguma, bastante provocativas e, por que não dizer, inverídicas, por tratarem não apenas da temática que estamos aqui debatendo e da PEC como um todo, no sentido de mencionar, por exemplo, que o Estado é obsoleto e pouco dinâmico, e que o serviço público está distante da realidade do País.
Como foi reforçado, os Municípios vêm representando um papel importante, inclusive sob o ponto de vista das economias locais. Foi muito bem mencionado que o Brasil é constituído por mais de 5.550 Municípios e que os servidores públicos acabam desempenhando o papel não só de dinamizadores das economias locais, mas, por intermédio desses instrumentos, e do próprio concurso público, principalmente, esse processo acaba se fortalecendo, tendo em vista que os números, como muito bem apresentados pelo José Celso, demonstram que os patamares no setor público vêm melhorando nos últimos tempos não apenas quanto aos seus aspectos remuneratórios, mas também educacionais. Então, tudo isso, sem dúvida alguma, reforça o papel que os servidores públicos, de forma geral, inclusive por intermédio desses instrumentos, desempenham nos entes federativos: a União, os 27 Estados, incluído o Distrito Federal, e os próprios Municípios.
Cabe reforçar, conforme muito bem dito pelos expositores, que estamos passando por um momento crítico e extremamente delicado da pandemia. Coube justamente a um setor importante da saúde desempenhar o papel do Estado presente na vida das pessoas, no sentido de fazer com que esse lado do aspecto fiscal pudesse ser amenizado, como um dos principais objetivos das sucessivas legislações e PECs que vêm sendo apresentadas com esse caráter, com esse intuito.
Vale lembrar que, no âmbito da PEC, estão apresentadas não só a polêmica extinção do chamado Regime Jurídico Único, assunto muito bem explorado pelo José Celso, principalmente como elemento que traz uma série de fatores para essa discussão que estamos desenvolvendo no âmbito da questão que relaciona concurso público à experiência, como também alguns elementos abordados de forma bastante generalista, que remetem a uma série de legislações que não requerem quóruns tão qualificados. Despreza-se a importância que esses temas têm, como, por exemplo, a análise de desempenho, o estágio probatório e muitas questões relacionadas à definição dos cargos típicos de Estado, conforme já foi muito bem abordado por um dos expositores anteriormente.
Dessa forma, nesses novos vínculos previstos na PEC 32, verifica-se que há uma série de diferenciações do ponto de vista de serem temas extremamente estratégicos, tanto em relação à gestão de recursos humanos quanto no âmbito do setor público: a forma de ingresso, a própria estabilidade, a questão relacionada ao regime de Previdência e também os instrumentos previstos no âmbito da PEC que dizem respeito à perda do cargo.
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Vale lembrar, inclusive, que, no âmbito do chamado vínculo de experiência, a forma de ingresso é uma das etapas do concurso público e, de acordo com a interpretação da PEC, a estabilidade pode ser dispensada. Também há a questão da incerteza no que diz respeito ao próprio regime de Previdência — se regime próprio ou se regime geral. É trazido também como ponto polêmico o vínculo de experiência remeter-se a uma legislação específica, que estará dispondo sobre eventuais possibilidades de perda de cargo no âmbito dessa questão.
Na própria interpretação da PEC 32, o vínculo de experiência é uma das etapas do concurso público para dois tipos de cargos — no caso, o cargo típico de Estado —, em que a PEC remete também a uma legislação específica para tratar quais são especificamente tais cargos, e também o cargo com vínculo por prazo indeterminado. Quer dizer, o servidor que ingressar na administração pública, por meio de concurso, para um cargo com vínculo por prazo indeterminado, terá de cumprir no mínimo 1 ano de vínculo de experiência, e o servidor que ingressar em concurso para cargo típico de Estado vai ter que cumprir 2 anos de vínculo de experiência. Ou seja, em ambos os casos, o servidor que não atingir, durante esse vínculo de experiência, um desempenho satisfatório poderá vir a perder o cargo, inclusive por intermédio de legislações posteriores que eventualmente surgirão por intermédio dessa nova modalidade, desse novo vínculo empregatício previsto no âmbito do setor público.
Percebe-se que o próprio vínculo de experiência já desfigura o instituto da estabilidade, alicerce importante do setor público brasileiro, amparado na própria Constituição Federal. E isso é feito sem que haja definições próprias de critérios que estabeleçam, de forma bastante clara, evidente e objetiva, de que maneira essa perda de cargo efetivamente poderá acontecer nesse instituto, nesse vínculo de experiência previsto no âmbito da PEC 32.
Outro fator importante em relação ao tema do vínculo de experiência e a própria questão do concurso público é o instrumento do concurso tornar-se cada vez menos atrativo, porque os candidatos ao cargo só terão praticamente o processo de ingresso finalizado após o término desse vínculo de experiência. O que se percebe que pode vir a acontecer é que, na contramão do que foi apresentado quanto aos números, os candidatos, cada vez mais bem preparados, não terão estímulo para participar do processo por não terem clareza dos critérios e dos objetivos, e até mesmo critérios impessoais. Isso também está previsto nos princípios que são inerentes à própria questão do setor público, que poderá implicar uma série de aspectos negativos para os servidores que tenham interesse de fazer parte do setor público.
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Sem dúvida alguma, há algumas outras consequências no que diz respeito ao vínculo de experiência, diante dos vários estudos que vêm sendo feitos e das análises a respeito não só da PEC, como também dos aspectos relacionados a esses novos vínculos.
Então, há possibilidade do aumento expressivo da rotatividade no âmbito do setor público, algo presente no setor privado, mas que, pela legislação pertinente ao setor público, se tenta evitar, no sentido de que não se fragilize a continuidade dos serviços públicos. Esse também é o ponto de vista da possibilidade de que não se tenha custos adicionais com treinamento ou até mesmo com a troca de profissionais. Então, nós percebemos que o vínculo de experiência tem como algumas das suas principais consequências trazer esse nível de insegurança no âmbito do setor público de forma geral.
Como bem dito pelo José Celso, nós não podemos desconsiderar uma alteração recente, ocorrida em 2017, por intermédio da Lei nº 13.467, a chamada reforma trabalhista, que trouxe uma série de alterações ao sistema de relações de trabalho no Brasil, inclusive sob o ponto de vista dos vínculos que foram criados, muitos deles precários. E as interpretações vão muito no sentido de que todas as alterações, principalmente no que diz respeito aos novos vínculos, especificamente no que estamos tratando, que é o vínculo de experiência, poderão trazer uma série de precarizações também ao âmbito do setor público, algo que efetivamente aconteceu nos últimos anos por intermédio dessa legislação que tratou da reforma trabalhista.
Outra questão que se traz, quanto à interpretação da PEC no que tange ao vínculo de experiência, é que a própria proposta não explicita o período máximo para essa passagem do vínculo de experiência para o vínculo efetivo. Sem dúvida alguma, isso traz uma série de alterações e pode provocar futuras discussões de cunho previdenciário, tendo em vista que poderá acarretar queda tanto na arrecadação do regime próprio e provocar impactos na questão previdenciária em âmbito geral.
Outra preocupação no âmbito do concurso público, tema desta audiência pública, também externalizada pelos demais expositores, é de que maneira os instrumentos de cooperação, mesmo não havendo o princípio da subsidiariedade — ele não faz mais parte da PEC, no entanto, a proposta traz uma série de componentes —, que reforça esse instrumento de cooperação, no sentido de possibilitar, por intermédio desses instrumentos, que a prestação do serviço público se dê de maneira diferente, com o Estado não mais atuando na vida das pessoas, nós destacamos como processo de iminente privatização dos serviços públicos. Isso pode acontecer por intermédio desse instrumento de fortalecimento dos chamados instrumentos de cooperação, que, de certa forma, como consequência, também trarão a redução dos futuros concursos públicos e do número de pessoas que ingressem em determinadas carreiras no âmbito do próprio setor público.
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Sendo assim, eu gostaria de concluir minha fala dizendo também que, do ponto de vista qualitativo, conforme já foi muito bem explorado pelos números apresentados, as evidências acabaram mostrando que, nos últimos anos — os números apresentados são bem enfáticos quanto a isso —, o que observamos foi que os movimentos mais recentes em relação a formas de contratação, os concursos públicos e também as modalidades atualmente presentes no âmbito da Constituição Federal de 1988 trouxeram maior dinamismo para a contratação de servidores em atividades-fins.
Verifica-se ainda que houve incremento na produtividade agregada do setor público, porque ela está muito vinculada também à questão do aumento da escolarização, não só da população brasileira, mas especificamente no setor público como um todo. E o que percebemos é que essas formas de contratação mais recentes, principalmente relacionadas à vinculação estatutária, em detrimento do padrão celetista, que nos últimos anos também vem sendo contaminado pelas questões da reforma trabalhista, trouxeram uma série de direitos e deveres, e também a própria estabilidade, podendo tornar a administração pública mais condizente com o papel que ela deve desempenhar no âmbito da Constituição Federal, sobretudo no que se refere à qualidade do serviço público, que é o que a população de forma geral pleiteia, seja na esfera municipal, seja na esfera estadual, seja na esfera federal.
Quero agradecer mais uma vez a oportunidade de estar aqui, também contribuindo com os debates na Comissão Especial. Coloco-me à disposição para esclarecer as questões que porventura surjam relacionadas aos temas que foram tratados, especificamente os concursos públicos e os vínculos de experiência. Mas sempre reforço o fato de que a PEC deve ser entendida como um todo, no sentido das consequências e das mudanças que estão sendo pretendidas em relação ao papel do Estado brasileiro na vida da sociedade de forma geral.
O SR. PRESIDENTE (Fernando Monteiro. PP - PE) - Obrigado, Sr. Max Leno de Almeida.
O SR. ARTHUR OLIVEIRA MAIA (DEM - BA) - Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados, senhores palestrantes que aqui vieram na data de hoje dar uma contribuição para esta Comissão, eu tenho ouvido com muita atenção a fala de todos que aqui têm se posicionado e penso que realmente as pessoas deveriam trazer propostas mais objetivas e oportunas para este debate.
Eu não posso me conformar, primeiro, com a ideia de que não seja oportuna uma reforma administrativa. A Câmara dos Deputados, o Congresso Nacional, que não tem a iniciativa de lei de uma reforma administrativa, está tendo neste momento a oportunidade, que não ocorre há mais de 20 anos, de debater a estrutura dos serviços públicos e a estrutura administrativa do Estado brasileiro. Não houvesse a iniciativa do Poder Executivo, não poderíamos estar aqui procedendo a este debate.
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Agora, se o texto que veio do Poder Executivo não nos satisfaz, se não concordamos com ele, se não traz aquilo que, de fato, nós achamos que seja apropriado para modificar o serviço público brasileiro, isso é outra história. E temos aqui toda a liberdade para podermos colocar no bojo da lei aquilo que nós entendermos como sendo um caminho para melhorar o serviço público brasileiro.
Mas, realmente, seria imensa mediocridade e grande demonstração de incapacidade deste Parlamento nós simplesmente dizermos que a reforma não presta e que nós não temos nenhuma capacidade inventiva de apresentar ao Brasil uma alternativa para melhorar os serviços públicos brasileiros. Muitas coisas precisam ser feitas. Algumas coisas que estão na PEC, eu entendo que são oportunas; outras tantas, eu entendo que não. Mas precisamos, sim, avançar no sentido de modernizar o Brasil, modernizar os serviços públicos brasileiros. E é com esse sentimento que eu apresentarei o meu relatório.
Então, eu quero dizer, até para os próximos debatedores que aqui virão, que eles estarão contribuindo muito mais com a PEC se, em vez de virem aqui simplesmente tratar dos interesses de cada categoria que representam, vierem trazendo propostas, porque não faz sentido a mera crítica, a mera fala dizendo que, por estarmos em momento de pandemia, nós não podemos exercer o nosso trabalho legislativo. Imaginem o absurdo. Então, posições como essa obviamente não estão contribuindo, porque, queiram ou não queiram, apresentaremos um parecer, e esta Casa haverá de dar uma resposta ao Brasil, apresentando, ao final do processo legislativo no Congresso Nacional, na Câmara e no Senado, uma proposta e uma lei que de fato possam melhorar o serviço público brasileiro.
O SR. PRESIDENTE (Fernando Monteiro. PP - PE) - Obrigado, Relator, Deputado Arthur Oliveira Maia.
O SR. GERVÁSIO MAIA (PSB - PB) - Presidente, eu começo dizendo que, a cada reunião em que discutimos a PEC 32 — a "deforma" administrativa, porque de reforma não tem nada —, com as participações que estão sendo feitas, nós chegamos à conclusão de que ela representa um retrocesso gigantesco.
Eu não sei se o Relator estava prestando atenção nas falas ou se ele tem acompanhado tudo o que tem sido dito ao longo da tramitação da PEC 32, inclusive na Comissão de Constituição e Justiça, mas eu tenho que dele discordar. O Relator disse, na sua fala agora, que precisa de propostas mais objetivas. Mais claro do que isso, só desenhando, Presidente. Disse que considera uma imensa mediocridade afirmar que a reforma não presta. Eu prefiro dizer que medíocre é o Presidente Jair Messias Bolsonaro, que não dá conta sequer de governar o País.
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Ele fala em modernizar o serviço público e diz que a mera crítica não está construindo uma ajuda propositiva no relatório. Aqui, nós não estamos discutindo a crítica pela crítica. Nós estamos aqui ouvindo diversas autoridades que chegaram ao serviço público não pelo favor político, mas porque estudaram, viraram noites, queimaram as pestanas para chegar lá. São esses que estão debatendo conosco aqui. Não é, então, a crítica pela crítica. São preocupações profundas com a desconstrução de conquistas celebradas na nossa Carta, na nossa Constituição de 1988.
O Ministro Paulo Guedes esteve novamente aqui. Dessa vez, ele ficou um pouco mais de tempo. Contudo, ele não tem justificativa e não objetiva a discussão em torno dos pontos nevrálgicos do texto encaminhado a esta Casa. Ele não objetiva saídas que possam sanar os prejuízos que estão sendo alegados pelas autoridades que estão aqui debatendo conosco. E não é a crítica, Sr. Relator, pela crítica. É a preocupação com o futuro do nosso País, com o futuro da nossa Nação.
Veja só, o Presidente da República e o seu Ministro da Economia querem enxugar a máquina administrativa, atacando os servidores públicos. Na outra ponta, eles assinam a Portaria nº 4.975, de 2021, o teto dúplex, que beneficiou mais ou menos mil servidores. Dentre eles, quem foi beneficiado? O Presidente da República e o Vice-Presidente da República — a nata do serviço público.
O que significa o teto dúplex? Para quem não sabe, significa que alguns deles estão recebendo mais de 60 mil reais por mês. Qual é a autoridade que este Governo tem para propor uma reforma administrativa, sem discutir honestamente o que se está questionando aqui o tempo todo?
Sr. Presidente, Sr. Relator, quero dizer que o vínculo de experiência é o famoso jeitinho brasileiro. É o jeitinho brasileiro para fazer com que haja interferência política para que determinado servidor que se está submetendo ao concurso público chegue lá mais facilmente. Os questionamentos que foram trazidos deixam muito claro que o vínculo de experiência estabelece um risco gigantesco de favorecimento político. Isso é fato. Tanto é fato que V.Exas. não estão conseguindo justificar a importância, a tal importância que, de importante, não tem nada...
O SR. ARTHUR OLIVEIRA MAIA (DEM - BA) - Deputado Gervásio Maia...
O SR. GERVÁSIO MAIA (PSB - PB) - O tempo é meu, e eu não o estou concedendo neste momento.
O SR. ARTHUR OLIVEIRA MAIA (DEM - BA) - Deputado Gervásio Maia...
O SR. GERVÁSIO MAIA (PSB - PB) - Em relação ao vínculo de experiência...
O SR. ARTHUR OLIVEIRA MAIA (DEM - BA) - Deputado Gervásio Maia...
O SR. GERVÁSIO MAIA (PSB - PB) - Sr. Presidente, eu peço...
O SR. ARTHUR OLIVEIRA MAIA (DEM - BA) - Acho que o Presidente pode até lhe dar mais um tempo. Eu só quero contribuir mesmo com o debate.
O SR. GERVÁSIO MAIA (PSB - PB) - Mas aí V.Exa...
O SR. ARTHUR OLIVEIRA MAIA (DEM - BA) - Se V.Exa. puder me responder...
O SR. GERVÁSIO MAIA (PSB - PB) - V.Exa. tem o tempo suficiente. Eu não estou aqui para responder a V.Exa.
O SR. ARTHUR OLIVEIRA MAIA (DEM - BA) - Tudo bem, Deputado. Eu iria tentar... Mas tudo bem. Desculpe-me. Desculpe-me.
O SR. GERVÁSIO MAIA (PSB - PB) - V.Exa. que tem que responder aos questionamentos que estão sendo feitos aqui o tempo todo.
O SR. ARTHUR OLIVEIRA MAIA (DEM - BA) - Perfeito, Deputado. Está certo.
O SR. GERVÁSIO MAIA (PSB - PB) - Sr. Presidente, peço que meu tempo seja restabelecido e que eu não seja interrompido, principalmente, porque o Relator tem prerrogativas em relação ao tempo de fala.
O SR. PRESIDENTE (Fernando Monteiro. PP - PE) - O tempo estava parado, Deputado Gervásio Maia.
O SR. GERVÁSIO MAIA (PSB - PB) - Sr. Presidente, sei que causa inquietação, quando falamos que o vínculo de experiência é uma gambiarra — não sei se V.Exas. sabem o que significa gambiarra — que se coloca no texto, para facilitar a vida de alguns que certamente participarão do jeitinho brasileiro, para passar na frente de concursados que obtiveram uma nota maior.
O vínculo de experiência em resumo é isso. E não é só esse ponto, há outros pontos extremamente graves que foram citados e que também não foram respondidos até o dia de hoje.
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Eu falo, por exemplo, da questão dos cargos privativos. Os cargos privativos, Sr. Presidente, estão sendo entregues a pessoas que não têm absolutamente nada a ver com o serviço público — absolutamente nada a ver. Está-se abrindo um espaço de preenchimento de cargos por pessoas estranhas ao serviço público. Somente na União, no Governo Federal, fala-se em, mais ou menos, 100 mil cargos. No Brasil é, mais ou menos, 1 milhão de cargos, Sr. Presidente.
Pergunto: o que nós teríamos a acrescentar, com a introdução no serviço público de pessoas inexperientes, que não têm a vivência do dia a dia, que não chegaram lá por seus estudos, que chegaram lá por indicação política? O que isso acrescenta? O que isso melhora na tal reforma, que de reforma não tem nada?
Não melhora, Sr. Presidente. Não há argumentos para isso. É a famosa volta do trem da alegria. Voltaremos para antes da Constituição de 1988, sem concurso público, e a política preenchendo todos os espaços dos Poderes. Isso precisa ser retirado da PEC 32/20, porque representa um retrocesso.
Nós estamos aqui recebendo telefonemas e mensagens o tempo inteiro de pessoas que querem saber quais são as categorias que estarão inseridas nas carreiras típicas de Estado. Quais serão? Há PEC para lá, emenda para cá, emenda para tentar dizer quem representa carreira típica de Estado.
Sr. Presidente e Sr. Relator, é um agachamento muito grande aprovar a PEC 32/20, transferindo prerrogativas do Poder Legislativo e entregando essas prerrogativas ao Poder Executivo.
É para que um Presidente, completamente desorientado, Deputado Fernando Monteiro, por decreto, com uma simples canetada, possa fazer as alterações que achar convenientes, sem o debate e sem a participação da Casa das Leis, a Casa do Povo, a Câmara dos Deputados. Esse é outro tema que, cá para nós, representa um retrocesso gigantesco.
Nós apresentamos a Emenda nº 41. Se está faltando proposta objetiva, Sr. Relator, aqui vai uma: a Emenda nº 41. Essa emenda retira o caráter de etapa do concurso público o vínculo de experiência. Então, o vínculo de experiência será um período de 2 anos, a contar da efetiva investidura no cargo, e o servidor estará sujeito à avaliação quanto às suas competências e aptidões para o exercício do cargo.
É claro, tem-se que levar em consideração fatores como assiduidade, disciplina, capacidade de iniciativa e produtividade. A nossa emenda, Sr. Relator, restabelece os critérios do estágio probatório já existentes, melhora um pouco mais a previsão constitucional, com segurança jurídica sobre as hipóteses que poderão resultar em eventual exoneração dos servidores públicos que não reunirem condições de prestar um serviço público eficiente.
Esta é a discussão que se quer. As emendas estão aí. Numa luta danada, Deputado Fernando Monteiro, nós conseguimos as assinaturas mínimas para protocolar a nossa Emenda nº 41.
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Eu tenho certeza de que o Deputado Arthur Oliveira Maia vai acatar a nossa Emenda nº 41 para desmontar essa excrescência que é o vínculo de experiência. Pelo amor de Deus, isso é uma piada, é um retrocesso. Nós queremos mais qualidade no serviço público, mais concursados no serviço público, mais cargos privativos para servidores efetivos. É isso que nós queremos.
Há pouco, falou um dos representantes da Advocacia-Geral da União, o Sr. Lademir Gomes da Rocha, da ANAFE. Eu queria que ele tivesse dito que a AGU, em 2020, devolveu 630 bilhões de reais aos cofres da União. Com certeza, enfrentaram poderosos! E só enfrentam porque têm estabilidade, Deputada Erika Kokay. Só enfrentam porque eles têm as prerrogativas que sabiamente o Constituinte lhes assegurou na nossa Carta de 1988.
Eu quero pedir ao Deputado Arthur Oliveira Maia que seja mais objetivo em sua fala, sem encher linguiça, porque não podemos ficar aqui consumindo o nosso tempo.
O SR. PRESIDENTE (Fernando Monteiro. PP - PE) - Obrigado, Deputado Gervásio Maia.
Vou conceder a palavra ao Deputado Rogério Correia, somando o tempo de Liderança do PT com o tempo de inscrito, por até 13 minutos.
Antes, porém, quero esclarecer que estão inscritos para falar, como Líder, o Deputado Tiago Mitraud, e, na sequência, como oradores, o Deputado Rui Falcão, o Deputado Professor Israel Batista, a Deputada Alice Portugal, o Deputado Camilo Capiberibe, a Deputada Erika Kokay, o Deputado Leonardo Gadelha e o Deputado Samuel Moreira.
O SR. ROGÉRIO CORREIA (PT - MG) - Presidente, quero dizer que nós, do Partido dos Trabalhadores, junto com a Frente Parlamentar Mista em Defesa do Serviço Público, a Servir Brasil — e está aqui o seu Presidente, o Deputado Professor Israel Batista —, e partidos de oposição, apresentamos emendas substitutivas globalmente a esta proposta de emenda à Constituição e gostaríamos que o Relator as examinasse. Elas vão num sentido muito oposto à proposta de emenda à Constituição enviada a esta Casa pelo Governo Bolsonaro.
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No nosso entendimento, a reforma de que nós precisamos e que nós apresentamos vai democratizar as relações do serviço público e vai, ao mesmo tempo, melhorar a qualidade, modernizar o serviço público. Então, esse é que deve ser o sentido de uma reforma administrativa.
Mas não é o que ocorre com esta reforma que, na prática, é uma "deforma". Ela não constrói, ela não melhora o serviço público; ela o desmancha. É como se você fosse fazer uma reforma em casa e derrubasse as paredes. Cai tudo. Se cai tudo, não é uma reforma. É o desmanche daquela edificação. E é isso que pretendem o Governo Bolsonaro e o Ministro Paulo Guedes.
O Ministro esteve aqui. Eu fico comparando o debate que nós fizemos agora com os expositores e a vinda do Ministro Paulo Guedes aqui, que não nos trouxe absolutamente nada. O Ministro não trouxe um gráfico; não trouxe um dado dizendo como ele espera ter uma recuperação do serviço público. Ele fez conjecturas sobre o que acha do servidor público — e, geralmente, ele não acha muita coisa boa do servidor público — e falou de outros assuntos, mas não trouxe uma análise real do que é a reforma que ele propôs.
Nós chegamos a perguntar, inclusive, se ele havia lido o que enviou para cá. Mas não é essa a preocupação, porque a preocupação é a "deforma", é a desconstrução.
Os Constituintes de 1988 estudaram muito. Isso foi feito a partir de análises técnicas, teóricas, com a academia, com quem tem a experiência também ali, no dia a dia do serviço público. Não foi algo fácil. A Constituição de 1988 não pariu um rato; pelo contrário, ela fez todo um estudo acadêmico, teórico e prático, acerca do que seria a vida do povo brasileiro, com a prestação melhor do serviço público.
Isso significa que, eternamente, tem que ser o mesmo? Não. Mas vamos estudar o que precisa ser feito em reforma e o que precisa ser aperfeiçoado.
Então, Presidente e Relator, em primeiro lugar, eu queria dizer isto: o Ministro Paulo Guedes precisa nos dar respostas. Nós temos vários requerimentos. Quando eu me refiro ao Ministro Paulo Guedes, eu quero me referir ao Governo Bolsonaro. Mas o Presidente, sinceramente, anda só soluçando, com insônia, com muitos problemas, está rezando para não cair. Então, não podemos ter com ele nenhuma expectativa de que possa acontecer algo de bom.
Além disso, o Presidente Bolsonaro é muito desqualificado. Os termos chulos que ele anda usando atualmente pioram ainda mais a situação do Brasil. Hoje, lá no cercadinho dele, ele falou em cocô. Que ele é mais ou menos o cocô das pessoas que estavam lá. Então, quando um Presidente desses fala em fazer uma reforma administrativa, nós nos assustamos! A qualidade dele, infelizmente, é essa.
É claro que isso tem a ver também, na conjuntura em que nós vivemos, com um debate sério sobre um assunto tão sério como é a melhora da qualidade do serviço público. E isso todos nós queremos e é do que o povo precisa.
Então, o Ministro Paulo Guedes precisa responder aos nossos requerimentos. Presidente, os requerimentos ainda estão com a Mesa, ainda não foram sequer encaminhados ao Ministério da Economia. Eu pediria ao Presidente para agilizar esses requerimentos que chegaram à Mesa, mas ainda não foram, muitos deles, pelo que me consta, encaminhados ao próprio Ministério.
Nós não podemos votar uma reforma administrativa antes de ter esses dados. E em relação a isso, o próprio Ministro se comprometeu conosco. Eu já faço essa observação ao nosso Presidente.
Mas, enfim, faço outra observação sobre algo que já tenho dito há mais tempo, e um dos palestrantes aqui também nos colocou isto: nós precisamos ouvir as áreas fim. Qual o impacto na educação? Digo isso porque nós queremos melhorar o serviço público, então precisamos saber. Na educação, na saúde, na segurança pública principalmente, qual o impacto da reforma? Esse é que é o objetivo. Nós queremos melhorar a prestação de serviços e não destruir o serviço público.
Talvez essa seja a diferença brutal que temos com esta proposta de emenda à Constituição.
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Nesse sentido, eu estou apresentando ao Relator um calendário que inclui escutar a educação, os professores e professoras, os demais trabalhadores; escutar o SUS; escutar a segurança pública, que não está na programação, mas o Relator já disse que vai atende-nos neste objetivo. Eu já tenho um cronograma, um calendário a apresentar ao Presidente e ao Relator.
Bem, nós vimos outro problema. Às vezes, parece que estamos só criticando, mas o problema é que não existe quem venha fazer uma defesa da PEC como ela está. E nós vimos isso hoje. O Felipe, que está aqui, consultor da Frente Parlamentar Mista da Reforma Administrativa, lá do Governo, do NOVO, tem uma diferença ideológica de enxergar o mundo, por exemplo, mas ele foi muito claro. Falou que estágio probatório tem que ter avaliações permanentes, com o que eu concordo. E é verdade, eu concordo, precisa haver um estágio probatório que tenha avaliação mais condizente. Mas isso não é reforma administrativa. Isso é aprofundar o que é o estágio probatório.
O Luís Antônio — e eu não vou fazer um resumo do que ele colocou — falou com muita propriedade da questão da estabilidade.
O Dr. Fernando falou da gestão de pessoas. Eu concordo com ele. Concurso público, hoje nós temos que analisar que tipo de concurso público nós fazemos para cada área. Não precisa ser um concurso público, eminentemente, de títulos e de provas. Se você vai depender do concurso público, você vai precisar de outros vínculos de experiência que têm de ser testados, isso sim. Mas isso não é reforma administrativa, isso é aperfeiçoamento de um sistema, em que o concurso é fundamental e é peça básica.
Agora, quando a proposta vem, Relator, com o fim do concurso público para a grande maioria dos servidores, aí realmente se está destruindo o serviço público, e não construindo um concurso melhor. Então os vínculos serão completamente precários.
O Lademir também colocou essa questão importante, assim como o José Celso. E o Max fez uma crítica mais da essência, do desmonte, da privatização. Mas todos têm a preocupação com a melhoria do serviço público, e não veem na PEC uma forma de defesa. Até hoje eu não vi quem chegasse aqui e conseguisse fazer a defesa da PEC enviada pelo Governo. Ninguém! Nem o próprio Paulo Guedes, aliás, esse eu acho que não leu o que havia ali.
Nesses dois assuntos que discutimos hoje, o vínculo da experiência, por exemplo, é um retrocesso em relação ao estágio probatório. Se o estágio probatório precisa ser aperfeiçoado, precisa ter um acompanhamento mais constante, o vínculo de experiência é o contrário. Ele vai criar uma subcategoria de servidores públicos durante 2 anos, que depois não vão continuar lá. E o objetivo é que não continuem, Deputada Erika Kokay, porque é um número diminuto que vai continuar no serviço público.
Então abre-se uma concorrência e não o aperfeiçoamento de quem passou no concurso, Deputado Professor Israel. Isso é uma excrescência! É o contrário do que nós precisamos fazer, esse tal vínculo de experiência. Isso tem que ser eliminado. O concurso público tem que ser a base.
E aí não adianta dizer que vai haver concurso público só para carreiras exclusivas. Por quê? Professor não tem que ter concurso público? E a liberdade de cátedra? Isso é fundamental, está na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Nós vamos retirar os professores? Para o pessoal do SUS não vai ter mais concurso público? Serão contratados com vínculos por tempo determinado ou indeterminado, para haver precarização?
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Não vou nem falar do cargo de liderança e assessoramento porque quanto a isso o próprio Relator já se comprometeu a retirar. Mas é pouco, Deputado Arthur Maia, é muito pouco. É uma excrescência, realmente, substituir o servidor público por quem é indicado por políticos. Isso nós não vamos permitir que seja feito aqui. E esse vínculo de experiência, a ausência do concurso público para a imensa maioria, isso também desmancha o serviço público, e é o que está na proposta de Paulo Guedes. Não estou dizendo que é a proposta do Relator. Espero que não seja. Estamos aqui para debater, escutar, convencer e ser convencido. Mas a crítica que eu faço a esse procedimento é realmente muito grande. É nisso que o Governo está trabalhando.
Em política não se faz apenas a análise técnica. Política é também a disputa das ideias, do posicionamento. Aqui se disputa que tipo de Estado e que tipo de serviço nós queremos e quem dever prestar o serviço. Na nossa concepção, o Estado deve prestar o serviço — saúde, educação, assistência social, moradia. Esses direitos constitucionais conquistados em 1988 precisam ser mantidos. Não é isso que pensam, por exemplo, o Ministro Paulo Guedes e o Governo Bolsonaro. Eles trazem uma visão neoliberal, em que o mercado é quem primeiro oferece o serviço, e o Estado, se possível, oferece em qualidade menor, em quantidade menor, depois, se o mercado não conseguir, ou onde não conseguir.
Essa concepção — eu falei com o Ministro Paulo Guedes, e ele não quis responder — foi a que prevaleceu no Chile. Não deu certo. O Chile agora elegeu novos constituintes. Vai fazer uma constituição muito mais parecida com a nossa, de 1988, do que com a privataria que o Paulo Guedes fez lá, ele também, dentro Chile.
Então, as concepções são distintas. E essas concepções, Deputado Professor Israel, são objeto de disputas normais, democráticas de pensamento na sociedade.
Por isso, eu quero chamar a atenção dos servidores públicos no sentido de entenderem que essa disputa precisa ser travada nas ruas. Está sendo convocada por todas as centrais sindicais uma mobilização geral para derrotar a reforma administrativa.
Relator, é justo que os servidores queiram derrotar a proposta que veio, porque ela realmente vai destruir, como eu disse, o serviço público brasileiro.
Estão marcando, para os dias 29 e 30 de julho, um encontro nacional de todos os trabalhadores e trabalhadoras do setor público, municipais, estaduais e federais, porque todos são atingidos por esta reforma administrativa, com exceção do estrato superior do serviço público — esse, como eu já chamei atenção, não está na PEC. Os promotores, os procuradores, os magistrados, os militares foram retirados. Mas os de baixo estão na PEC, serão atingidos. Eles precisam se mobilizar.
Foi marcada para o dia 24 uma grande manifestação no Brasil. É preciso que as pessoas levem faixas com os dizeres: "Não à PEC 32!" É preciso que os Deputados entendam que o eleitor está de olho vivo em quem vai votar a favor de uma proposta que destrói o serviço público, que retira dele o direito de ter acesso a uma educação pública e a um Sistema Único de Saúde de qualidade. E que o eleitor reivindique que nós todos tenhamos propostas para a melhoria do serviço público, e não a sua extinção.
Aos servidores cabe, inclusive, mostrar à população brasileira que isso não é um problema do servidor público, Deputada Erika; isso é um problema do serviço público, é um problema de País. Essa disputa vamos travar aqui dentro desta Comissão também, com qualidade, com conteúdo, com respeito.
Mas acho fundamental que, afinal de contas, não o permitamos, em especial num momento como este. O problema não é só a pandemia e o genocídio, mas também o Governo, que está caindo aos pedaços, se desmanchando.
Trata-se de um Governo fraco, e agora cheio de corrupção, e de um Presidente que não tem a menor condição de corrigir os rumos políticos do Brasil.
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O SR. PRESIDENTE (Fernando Monteiro. PP - PE) - Obrigado, Deputado Rogério Correia.
Eu vou mais uma vez relembrar que o Congresso Nacional é soberano em fazer as leis e modificar iniciativas do Executivo, como PECs e projetos de lei. Então, nós temos que trabalhar. Independentemente do Governo, o Congresso Nacional é que faz as leis. É por isso que se instalam as Comissões Especiais, para termos o amplo debate.
Quando debatemos sobre qualquer tema, temos que ter respeito à opinião do próximo, temos que ter maturidade para debater. Não se trata de destruir, e sim de construir, junto com o Parlamento brasileiro, uma coisa diferente, para que possamos trazer um serviço público de qualidade.
Eu indago à população brasileira — aproveitando que as pessoas estão nos assistindo — se estão satisfeitas com o serviço público atual. Essa é a pergunta que eu queria fazer, porque quem anda pelos rincões sabe as dificuldades, quem anda pelos rincões sabe como é o serviço público lá. Isso não se deve somente ao servidor; isso se deve a um conjunto de fatores: local de trabalho adequado, legislação adequada, motivação do servidor público. Toda vez que eu escuto uma palestra, eu procuro entender e me faço só uma pergunta bem simples: o serviço público é de qualidade? O cidadão brasileiro tem um serviço público adequado? Perguntas como essas eu me faço toda noite, porque eu procuro sempre ser justo.
Como eu disse desde o começo aqui na Comissão, debater a PEC 32/20 é apenas o primeiro passo para trazermos o Brasil ao século XXI, para trazermos a modernidade ao serviço público. Isso passa não somente pela PEC 32/20; precisamos ver as leis adequadas, precisamos ver as condições de trabalho e principalmente a motivação do servidor.
O SR. ARTHUR OLIVEIRA MAIA (DEM - BA) - Sr. Presidente, com imensa satisfação, eu comunico a todos que foi aprovado agora, por aclamação, no Plenário desta Casa, o PL 6.726/16, que é justamente a lei do extrateto. Com isso, estamos acabando com uma prática abusiva que tem persistido por muito tempo neste País, a de funcionários públicos, valendo-se de artifícios absolutamente inapropriados, ganharem muitas vezes acima do teto salarial estabelecido em lei.
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17:04
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A forma como isso era feito, sem dúvida, era um acinte não só para o serviço público brasileiro, mas para todos os servidores, todos os trabalhadores do Brasil, sejam eles da iniciativa privada, sejam eles do serviço público. Era inaceitável!
Vemos, como acontece até hoje, denúncias de que determinadas figuras do serviço público ganhavam 300 mil reais, 400 mil reais. As últimas informações que constam na imprensa dizem que cerca de 8 mil servidores públicos, no serviço público federal, recebiam acima do teto salarial. Imaginem os senhores essa realidade quando ela é levada para Estados e Municípios, onde, muitas vezes, os desmandos são ainda maiores.
Portanto, nós temos que aplaudir esta Casa, embora tenhamos demorado muito para aprovar essa lei. É lamentável que o ex-Presidente da Casa não tenha colocado esse projeto para votação imediatamente, no momento em que o recebeu, lá atrás. Mas o Presidente Arthur Lira procedeu a esta ação importante para o Brasil de colocar o projeto em pauta. Nós aprovamos a urgência na semana passada, e acabamos de aprovar, neste momento, a lei do extrateto.
Portanto, é um momento de comemoração, Deputada Erika Kokay. É um momento de comemoração para o Parlamento brasileiro, independentemente de partido político. Foi uma votação por aclamação. Todos os partidos e, consequentemente, todos os Deputados, já que foi por aclamação, aprovaram e apoiaram essa medida que, sem sombra de dúvidas, é uma medida moralizadora, é uma medida exemplar e necessária para o nosso País.
Eu quero dizer que foram feitas algumas modificações. O projeto retorna ao Senado para votar essas mudanças que foram feitas no brilhante relatório do Deputado Rubens Bueno, a quem eu aproveito a oportunidade para parabenizar. Mas mesmo para a nossa Comissão aqui, que está discutindo a reforma administrativa, é fundamental que tenha sido aprovada essa lei.
Eu, pessoalmente — quando fui anunciado como Relator, numa reunião com o Presidente Arthur Lira, o Presidente Fernando Monteiro e os Líderes da base —, disse que seria extremamente abusivo nós levarmos este projeto, a reforma administrativa, para o Plenário da Casa e deixarmos de votar a lei do extrateto.
O SR. PRESIDENTE (Fernando Monteiro. PP - PE) - Obrigado, Deputado Arthur Maia.
Eu queria passar a palavra ao Líder inscrito, o Deputado Tiago Mitraud, mas S.Exa. não está presente.
A SRA. ALICE PORTUGAL (PCdoB - BA) - Presidente...
O SR. PRESIDENTE (Fernando Monteiro. PP - PE) - Pois não, Deputada Alice.
A SRA. ALICE PORTUGAL (PCdoB - BA) - Boa tarde, Presidente. Eu só gostaria de asseverar que deve ter chegado também a minha inscrição como Líder.
O SR. PRESIDENTE (Fernando Monteiro. PP - PE) - Boa tarde, Deputada. Chegou sim.
A SRA. ALICE PORTUGAL (PCdoB - BA) - Obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Fernando Monteiro. PP - PE) - V.Exa. será a próxima Líder a falar. Há ainda dois oradores, e V.Exa. também vai falar como oradora. Então, a V.Exa. falará como Líder e como oradora.
A SRA. ALICE PORTUGAL (PCdoB - BA) - Muito obrigada, Sr. Presidente
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O SR. PRESIDENTE (Fernando Monteiro. PP - PE) - Só um minutinho, Deputados. Os próximos oradores são: o Deputado Professor Israel Batista; em seguida, a Deputada Alice Portugal; depois, o Deputado Camilo Capiberibe e a Deputada Erika Kokay.
O SR. PROFESSOR ISRAEL BATISTA (PV - DF) - Sr. Presidente, eu quero cumprimentar V.Exa., o Relator Arthur Maia e todos os colegas.
A votação do projeto do extrateto é muito importante para a Frente Servir Brasil e para todos os Parlamentares que trabalham aqui com a questão do serviço público.
É importante lembrar que apenas 3% de todos os servidores brasileiros ganham mais do que 20 mil reais. É importante lembrar que esses servidores que recebem aquelas boladas que eventualmente causam escândalo na imprensa são uma minoria percentualmente insignificante. Mas isso não tira a importância da aprovação de hoje, porque é uma importância moral. De modo algum, Sr. Relator, podemos usar esses casos para justificar uma reforma administrativa que é voltada para professores, enfermeiras, servidores de base, como é a esmagadora maioria dos servidores dos Municípios brasileiros.
A Servir Brasil indicou para a audiência de hoje o nosso querido Lademir, que representa a ANAFE, a Associação Nacional dos Advogados Públicos Federais, e ele trouxe, Relator Arthur Maia, sugestões importantes. A reforma administrativa é essencial, deve ser uma constante, mas nós estamos debruçados sobre o texto enviado pelo Sr. Presidente da República, é com ele que trabalhamos.
O que vai sair daqui eu espero que seja muito diferente do texto que chegou a esta Casa, porque é um texto ruim. E é ruim, Excelência, porque não trata da qualidade do serviço público, não trata da desigualdade no serviço público, não trata da transparência no serviço público e não trata da democracia no processo decisório. Todas as entidades membros do Conselho Curador da Servir Brasil, inclusive, a ANAFE, trouxeram objetivamente sugestões.
Hoje, nós apresentamos a sugestão de mandato e quarentena para a chefia dos órgãos típicos de Estado; apresentamos a sugestão de regulamentação do texto constitucional sobre desigualdades no serviço público; apresentamos a sugestão de ampliação dos Conselhos de Controle Externo dos órgãos de Estado, que se referem à democratização; apresentamos a sugestão de ampliação dos mecanismos de participação e controle da população na prestação de serviços, trata-se de democratização; apresentamos a sugestão de definição de níveis de autonomia institucional para os órgãos; apresentamos a sugestão de avaliação de desempenho; apresentamos a sugestão de regimes de responsabilização adequados ao nível de responsabilidade dos ocupantes de cargos efetivos. E, por último, para encerrar, Sr. Presidente, apresentamos a sugestão de aperfeiçoamento metodológico do concurso público e vínculo de experiência.
O SR. PRESIDENTE (Fernando Monteiro. PP - PE) - Obrigado, Deputado Professor Israel Batista.
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A SRA. ALICE PORTUGAL (PCdoB - BA) - Sr. Presidente, Srs. Deputados, senhores palestrantes e convidados, primeiro, eu gostaria de falar sobre a importante contribuição que nos é dada por todos aqueles que nos visitam.
Quero destacar esta Mesa de hoje sobre o estágio probatório, o período de experiência. Sem dúvida alguma, esse período do estágio probatório já com a nova normatização é algo que ainda não foi discutido aqui talvez de maneira mais completa. O RJU — Regime Jurídico Único já foi modificado muitas vezes. Nós tivemos modificações muito profundas no Regime Jurídico Único dos servidores da União, e isso com rebatimento para todas as outras esferas do setor público.
Durante todos esses anos do estabelecimento de uma visão de Estado mínimo, que a rigor prevaleceu e apareceu em todas as etapas dos últimos Governos, infelizmente, nós percebemos que esse regime foi considerado um regime incômodo, um regime anacrônico para alguns, como se fosse possível constituir a convivência de diversos regimes no setor público.
Eu quero dizer que o objeto do debate de hoje, na verdade, é pinçado como um dos elementos da reforma, mas que, mais do que nunca, é necessário dizer que esta reforma está se dando, como muito bem disse o nosso querido José Celso, em um período absolutamente atípico de uma pandemia, quando, mais do que nunca, os servidores, aqueles considerados de carreira de Estado e os não considerados como carreira de Estado, estão dando provas da sua absoluta necessidade para o estabelecimento de funções do Estado brasileiro.
Então, insisto no formato da emenda que eu e o Deputado Rogério assinamos e encabeçamos. De fato, é muito difícil definir quem é ou não típico de Estado, especialmente num momento como esse. O que define mesmo? É a carreira arrecadatória? É a possibilidade de auditar contas? Mas não é também altamente necessário estar na cabeceira do leito de um paciente com COVID? Estar mantendo o Sistema Único de Saúde de pé?
Eu quero realmente mergulhar neste debate. E o prazo que nos está sendo dado para tratar da PEC 32/20 é absolutamente exíguo e num momento completamente crítico da economia, do mundo do trabalho e da política nacional. Diga-se de passagem que estamos vivendo uma instabilidade política sem precedentes, com o Governo Federal envolvido em denúncias de corrupção por um membro do Poder Legislativo e um servidor público de carreira.
Esse servidor não é de carreira típica de Estado, mas foi capaz de identificar tamanho equívoco, que sacode a República. Ele tem estabilidade. Se não tivesse, estaria demitido, estaria respondendo a PAD. Aliás, parece que há segmentos que influenciam inclusive a imprensa e desconhecem que o servidor público responde a processos administrativos e pode ser demitido, se for considerado culpado, se tiver agido com dolo contra o Erário, se tiver adotado atitudes contrárias ao rigor do seu compromisso como servidor, estabelecido depois da aprovação em concurso público e de juramento na hora da posse no cargo.
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17:16
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O servidor não assina um contrato, nobre Relator, o servidor toma posse, assume o cargo. Nós, Deputados, também tomamos posse. O nosso é ocupado por meio de eleição, e o do servidor, por meio de concurso. Efetivamente, essa é uma questão que não se pode relegar a um plano inferior. Para onde irá o Estado brasileiro? Para a pulverização, para a pulverização entre pequenas empresas, a pulverização de funções do Estado que não são consideradas nobres, para que sejam exercidas através de empresas de amigos, de alguns reformados, de aposentados, após licitações de que não teremos conhecimento ou até mesmo após a liberação de licitações? Não se sabe. Vejam o caso da Covaxin.
Senhores, a nossa compreensão é de que esta reforma se dá por meio de uma PEC fiscalista, mal conduzida tecnicamente, mal preparada tecnicamente, que desnormatiza o serviço público, atropela regras da Constituição e vem em má hora, porque é sobretudo num período de pandemia que o Estado precisa estar estável para assistir à população. É nesta hora, porém, que se instabiliza o trabalho do servidor.
Mentem os guardiães da proposta quando dizem que ela não atinge o atual servidor. É claro que atinge, congelando carreiras, impedindo ascensão nas carreiras, infelizmente congelando salários, ao lado da Emenda Constitucional nº 95, mexendo no regime previdenciário vindouro. Quem for de carreira típica de Estado vai estar no sistema próprio de previdência, e quem não for vai estar no INSS. Vão existir dois regimes previdenciários e vai haver múltiplos regimes de contratação, muitas portas de entrada, o que é sinônimo de descontrole ético e financeiro.
Sr. Presidente, esse estágio probatório como elemento que se inclui no processo do concurso é algo que certamente levará a personalismos. Deveríamos raciocinar de acordo com o que está acontecendo no Brasil sobre o prazo de análise desta reforma.
Conseguimos, com a anuência de V.Exa. e a solidariedade do Presidente da Casa, dos Srs. Líderes, incluir emendas para que fossem debatidas. Esperamos que daí, com as sugestões que foram aqui colocadas, venhamos a avançar inclusive em elementos de análise sobre o que é o serviço público brasileiro e a maneira como funciona. A nossa compreensão é de que a reforma vem num momento muito ruim e de forma absolutamente inadequada.
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Agradeço a oportunidade. Saúdo os palestrantes. Vamos seguir com nossas audiências públicas. Espero que não cheguemos ao dia em que se bata o martelo contra o Estado nacional e não se analisem os prejuízos que poderão ser causados à vida dos servidores públicos e dos brasileiros e brasileiras como um todo.
O SR. PRESIDENTE (Fernando Monteiro. PP - PE) - Obrigado, Deputada Alice Portugal.
A SRA. ERIKA KOKAY (PT - DF) - Presidente, estamos discutindo elementos que são bastante sintomáticos e emblemáticos com relação a esta PEC e a quem ela serve.
Estamos vivenciando um momento em que o Governo busca se apropriar do Estado. Há várias experiências nesse sentido e várias expressões desta intenção, a de se apropriar do Estado, muitas vezes para que ele exerça uma função que responde aos seus interesses e não ao interesse, inclusive precípuo, dos órgãos que foram construídos por este País. Estamos vivenciando, portanto, uma deformação do Estado, considerando-se o que está previsto na Constituição brasileira, como o Estado de proteção social e seus princípios fundantes. A dignidade humana foi um dos princípios considerados em toda a elaboração da Constituição de 1988, que foi uma tentativa de fazermos o luto de um período muito traumático da história brasileira, o período das salas escuras de tortura, que deixou marcas não apenas em corpos de pessoas, mas também na alma e no corpo da Nação.
Busca-se enfrentar essa concepção e, de acordo com todas as lógicas autoritárias, sempre se buscam inimigos imaginários. Busca-se apresentar como inimigos da Nação servidores e servidoras, como se os problemas do serviço público se concentrassem em servidores e servidoras. Ao mesmo tempo se distorce a necessidade, que está posta neste País, de se aprimorar o planejamento e a gestão. O TCU já pontuou que os problemas do serviço público dizem respeito à própria gestão.
Vejam o que significa demissão por avaliação de desempenho. A avaliação de desempenho — tem razão Felipe Drumond — tem que ser um instrumento permanente de aprimoramento do serviço público. Para tanto, é necessário que se estabeleçam as missões órgão a órgão, que se discutam processos, que se planeje o atendimento, função precípua do serviço público. A partir daí se constroem mecanismos com que se possa, de forma dinâmica, dar respostas fundamentalmente à sociedade. Aqui, porém, se procura constitucionalizar a demissão relacionada a desempenho e não um instrumento de aprimoramento da própria gestão. A avaliação de desempenho já está prevista na Constituição
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A narrativa que se constrói é a que nega os fatos. Eu diria que o negacionismo que atinge o Governo hoje não é um negacionismo pontual, circunstancial, é um negacionismo estrutural. Nega-se a própria realidade.
Existem várias interpretações da realidade. Essas interpretações diferentes da realidade possibilitam a discussão democrática, a elaboração de síntese e a evolução da inteligência e do pensamento humano, mas, quando se constrói uma narrativa para substituir os fatos, nessa narrativa só cabe quem está de acordo com ela. Então, anula-se a discussão democrática.
Se vamos discutir avaliação de desempenho, não podemos fazê-lo com flexibilização do concurso público. Propõe-se uma flexibilização. Criam-se cinco vínculos, e, em relação à maior parte desses vínculos, não se prevê concurso público. Amplia-se o processo de terceirização, amplia-se o comissionamento, permitem-se as contratações temporárias, o que já está previsto na Constituição. Estabelecem-se vínculos que significam domínio sobre o pensamento e domínio sobre a atuação do próprio serviço público. Quem assumir cargo de chefia comissionado num governo de compadrio é que vai avaliar o servidor? Existe hoje, portanto, no que está posto, uma distorção.
Presidente V.Exa. dizia que é preciso respeitar o outro. Sim, é preciso respeitar o outro, mas está na Presidência da República alguém que só encara o outro como outro quando ele é o seu próprio espelho, quando vê sua mesma forma de ser, suas mesmas ideias, suas mesmas formas de pensar. Então, nós estamos vivenciando essa lógica arbitrária que procura criar inimigos imaginários e não ataca os problemas que precisam ser atacados neste País.
Aliás, o que dizia Celso Furtado? Para que serve o Estado? O Estado serve para enfrentar os problemas do país. Por isso, Felipe tem razão de novo quando diz que não estamos falando de clientela, que não estamos falando de Estado bancário, como no caso da educação bancária a que se referia Paulo Freire. Estamos falando de usuários de serviços públicos. A propósito, deveria haver a reconstrução dos conselhos que avaliam a qualidade das políticas públicas e, ao mesmo tempo, elaboram de maneira mais democrática as políticas públicas.
O que está dizendo esta PEC? Que o chefe comissionado, num Estado em que a estabilidade está rota e foi arrancada do cotidiano dos servidores, vai avaliar o outro servidor, com subjetividade, porque não haverá critérios e se flexibilizará o concurso público. Isso é um processo de desenvolvimento da meritocracia? Primeiro, a meritocracia é falsa quando não há igualdade de oportunidades. É preciso haver igualdade de oportunidades para que ela se estabeleça. O que há de mais meritocrático, dentre as relações que vivenciamos, do que o próprio concurso público? Ele está sendo ferido! E falam em meritocracia, falam em modernização do Estado?
Querem modernizar o Estado fazendo voltar a lógica do compadrio, a lógica da República Velha, a lógica do mandonismo, rompendo princípios que estão postos na própria Constituição, que estabelece o concurso público como forma de ingresso, e rompendo a impessoalidade?
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O que é demissão por avaliação de desempenho? Recentemente, um servidor do Ministério da Saúde denunciou pressões da chefia dele para que ele fizesse um malfeito, favorecendo um profundo esquema de corrupção. Será esse chefe que está pressionando um servidor e que tem na mão a caneta para demiti-lo que vai analisar o desempenho dele?
Nós temos que falar com muita seriedade sobre o que está acontecendo neste País, sobre o que representa esta PEC! Além disso, como é possível atribuir ao Estado uma postura subsidiária? Ainda que tenha havido mudanças na CCJ, pretende-se que tenha o Estado uma postura subsidiária com relação à iniciativa privada.
A função do Estado não é dar lucro. A função do Estado é assegurar o desenvolvimento social, propiciar que façamos o luto das casas grandes e senzalas, seja no aspecto literal, seja no aspecto metafórico, o luto das colonialidades, que estão postas todos os dias nas nossas vidas.
Nós precisamos, sim, fazer uma discussão para que tenhamos mecanismos para aprimorar a gestão, definindo missões para estimular a democracia, a participação da população na elaboração das políticas públicas. Mecanismos referentes a isso estão sendo absolutamente varridos do nosso cotidiano por este Governo, que, como todos os psicopatas, como todos os autoritários, não tem empatia e quer se apropriar do que não lhe pertence.
O SR. PRESIDENTE (Fernando Monteiro. PP - PE) - Obrigado, Deputada Erika Kokay.
A Frente Parlamentar Mista da Reforma Administrativa é uma frente suprapartidária de Senadores e Deputados. Ela é presidida pelo Deputado Tiago Mitraud, do NOVO, mas tem uma visão suprapartidária e favorece o diálogo.
Estamos muito satisfeitos de ver quanto as emendas convergem. Nós tivemos várias reuniões com o FONACATE, com a ANESP, com outras entidades e chegamos a vários consensos. Quando vêm aqui debater e há convidados indicados por essa frente, vemos que as ideias são parecidas, porque existe uma visão comum sobre a forma de organização do Estado, de maneira razoável e segura. Creio que isso está em andamento. Temos visto, em vários debates, diversos consensos.
Aproveito a oportunidade, já que estamos falando sobre diferentes temas aqui, até sobre a nossa Constituição, para comentar dois pontos. A Constituição veio num contexto em que ela precisava trazer a impessoalidade como um valor acima de tudo. Ela precisava estabelecer um Estado universal. Só com a Constituição de 1988 assumimos que universalizaríamos políticas públicas, que teríamos uma educação universal, uma saúde universal.
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Isso trouxe na esteira outras características também. O próprio concurso público veio com essa visão universal, às vezes até muito rígida, com provas, com provas e títulos — isso está previsto na própria Constituição —, para que não desse margem a que aquilo não funcionasse, não fosse universal, não fosse acessível a todo mundo. Foi um avanço muito grande para o País. O Brasil se aproximou de países desenvolvidos. Construiu um serviço público com garantia para o servidor público, com proteção para o servidor público, que foi selecionado por mérito.
Agora a discussão sobre esta PEC é uma grande oportunidade para, talvez, modernizar isso. Algumas das emendas apresentadas trouxeram a possibilidade de colocação de mais provas e provas de títulos, a possibilidade de flexibilização. Eu penso que essa é uma inovação, é uma possibilidade interessante de ser aprovada e incluída no texto da Constituição, já que estamos aqui discutindo o que pode, sim, trazer oportunidade de melhoria desse instrumento. É claro que devemos manter a impessoalidade, mas é hora, sim, de pensarmos cada vez mais em gradativos avanços.
Também queria comentar um pouco sobre o modelo de regulamentação, o que acaba inclusive tocando na discussão sobre o estágio probatório. Uma das grandes questões — acho que a Constituição fez isso contra a centralização de poder que estava em voga — é a da criação de um modelo muito descentralizado, em que os Municípios são considerados como entes federados, onde inclusive acontece a maior parte das contratações desde então na administração pública.
Eu acho que um ponto importante a ser comentado por nós é que um efeito negativo disso é a existência de muita autonomia, até regulamentadora. Hoje, uma Prefeitura, não importa o tamanho dela, não importa a região dela no Brasil, tem que criar um estatuto do servidor, tem que criar um processo de estágio probatório próprio, tem que criar uma lei de desempenho própria. É muita carga regulamentadora, é muita autonomia, é muita responsabilidade para quem, muitas vezes, ainda não tem capacidade. Estamos discutindo a melhoria do concurso público, a modernização dele, e muitas Prefeituras ainda têm dificuldade de implementar essa agenda da Constituição de 1988, de impessoalidade.
Creio que há uma oportunidade gigante, na discussão que está sendo feita em relação a esta PEC, de prever normas gerais. Faltou muito isso no desenho da Constituição. Faltou muito isso até na reforma de 1998. De alguma forma, isso até veio para a questão do desempenho. Mas esta é a hora de pensar na administração pública brasileira como um todo.
Segundo dados do Atlas do Estado brasileiro, hoje 8,6% dos servidores estão no Governo Federal. Mais de 60% do funcionalismo público está em mais de 5.500 Municípios. Se não pensarmos em regulamentações que atinjam a todos, tenho certeza de que não vamos conseguir, de fato, modernizar o Estado brasileiro para que ele chegue aonde, de fato, é mais necessário.
Eu creio que esta PEC é uma oportunidade de se discutir a melhoria do Estado brasileiro e, sim, prever normas gerais que sejam aplicáveis a todos os entes brasileiros, a todos os servidores públicos, como é o caso da lei sobre os supersalários. Ela instituiu regras para todo o serviço público.
É sim um grande avanço. É sim um grande salto que podemos dar. De fato, é uma revolução pensar num Estado que se preocupa em criar regras para todos e não deixa todo mundo fazer o que quer, da forma como quer.
Encerro aqui a minha participação. Agradeço. Creio que, de fato, temos uma grande oportunidade neste debate, nesta Casa. Parabenizo todos vocês pela aprovação do PL sobre a regulamentação referente a supersalários. Esse é um avanço gigante. Acho que nunca foi feita discussão sobre uma reforma administrativa acompanhada de redução de privilégios e de benefícios, que são, sim, concentrados. São poucos os servidores que os recebem, mas os recebem. Isso tem que ser combatido. Os gastos, inclusive, são altos.
Para mim, isso foi uma grande abertura para que membros de Poder sejam incluídos na PEC. Existem vedações na PEC — férias de mais de 30 dias, aposentadoria compulsória — que estão mais relacionadas a quem hoje não é alcançado por essa PEC. Então, faço um apelo a esta Casa para que esses profissionais sejam incluídos.
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O SR. PRESIDENTE (Fernando Monteiro. PP - PE) - Obrigado, Felipe Drumond.
O SR. LADEMIR GOMES DA ROCHA - Primeiramente, eu reitero o agradecimento. Em nome da ANAFE, dos advogados públicos, quero agradecer por poder debater o assunto na perspectiva republicana e não necessariamente na forma centrada.
Procurei trazer essa abordagem não centrada especificamente nas questões corporativas da advocacia pública, embora a minha experiência, como procurei destacar, está muito mais relacionada à dimensão de governança do Estado do que propriamente à prestação de serviços, sem ignorar que uma parte desses serviços são prestados não diretamente a um indivíduo identificado e sim à população como um todo, o que é justamente a defesa do interesse público não imediatamente redutível a um beneficiário específico.
Eu quero parabenizar todos os debatedores, pelo caráter republicano do debate. Creio, Deputados, que conseguimos trazer algumas propostas de aperfeiçoamento do Estado brasileiro. Parece-me que a feição inicial da PEC, que continha algumas tragédias, eu diria, está sendo realmente mudada. Reconheço isso e parabenizo os Deputados. Isso só foi possível pelo caráter público e republicano do debate. Mas ainda há muitos elementos em relação aos quais é preciso avançar em termos de aperfeiçoamento. Vou procurar encaminhar, inclusive, as propostas que sugerimos aqui.
Nós nos ressentimos ainda de melhores mecanismos de governança principalmente dos órgãos públicos. Não há um aperfeiçoamento no sistema de controle e dos papéis que devem ser atribuídos aos conselhos. Parece-me que um elemento importante seria o de repensar o caráter normativo desses conselhos superiores de órgãos públicos. Questiono se não seria o caso de subtrair alguns poderes normativos, principalmente no que se refere à definição de direitos e vantagens de natureza pecuniária. Precisamos caminhar em relação a isso, porque a advocacia pública, por exemplo, hoje se ressente de não ter um conselho superior, com participação da sociedade, com participação de outros atores institucionais importantes, e de não ver implementado o caráter transversal da advocacia de Estado no plano federal.
Gostaria de considerar também que precisamos avançar na regulamentação dos cargos típicos de Estado. Parece-me que é uma definição que precisava ter sido feita desde a reforma constitucional anterior, mas não no sentido, como afirmei aqui, de eliminar os vínculos de estabilidade. Parece-me que um dos erros da PEC é jogar tudo em uma perspectiva de tudo ou nada, como se tivéssemos diante de nós apenas a escolha de haver estabilidade ou não, e deixar de considerar, digamos, modulações do instituto da estabilidade, adequando, como eu disse, a necessidade, a responsabilidade, as atribuições específicas de cada órgão.
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Da mesma maneira temos muito a avançar em termos de regulamentação do concurso público. Acho que o instituto do concurso público precisa de uma lei nacional regulamentadora, que estabeleça alguns parâmetros importantes a serem observados. Eu até diria que essa é uma tarefa do legislador ordinário. Nós estamos nesta Casa discutindo esta reforma constitucional, mas estamos a dever uma regulamentação nacional. Há projetos muito interessantes no sentido de emprestar maior capacidade de controle aos concursos públicos, maior transparência, assegurar inclusive direitos subjetivos aos participantes dos concursos. Uma parte disso vem sendo construída através da jurisprudência, mas eu diria que essa é fundamentalmente uma tarefa do legislador.
Os concursos públicos devem ser ajustados à natureza dos próprios cargos. Uma coisa é o concurso para os chamados cargos típicos de Estado, para essas funções mais de governança, outra é aquele concurso mais focado na prestação de serviço público. Parece-me que disciplinas adequadas a esses dois tipos de ingresso no serviço público precisam ser estabelecidas, assim como regimes de avaliação de desempenho, de estágio probatório mais adequados.
O que eu poderia dizer, em síntese, Srs. Deputados e Sras. Deputadas, é que me parece que uma parcela das tarefas que estão sendo atribuídas à PEC 32, à reforma administrativa, já poderiam ser feitas no cenário atual, economizando, de certa maneira, a Constituição, no sentido de não desgastá-la excessivamente por reformas que vão exigir um novo processo de interpretação e aplicação por parte do Supremo Tribunal Federal, na medida em que a mudança semântica da Constituição implica nova necessidade de interpretação e outorga de segurança jurídica através do papel do intérprete autorizado da Constituição, que é o Supremo Tribunal Federal.
O SR. PRESIDENTE (Fernando Monteiro. PP - PE) - Obrigado, Lademir Gomes da Rocha.
O SR. LUÍS ANTÔNIO DE ARAÚJO BOUDENS - Presidente Fernando Monteiro, quero lhe agradecer novamente, em nome dos policiais federais brasileiros, esta oportunidade.
Quero frisar a nossa percepção sobre esta PEC. Realmente há um descompasso entre o que é anunciado como previsão de melhoria e o texto da PEC. Uma leitura atenta já mostra que há esse descompasso.
Também identificamos a necessidade de uma base de dados melhor. Foram abordados alguns aspectos da falta de prerrogativas, de pré-requisitos, de base de estudos que confirmem o que é pregado pelo Governo como solução através desta proposta de emenda à Constituição.
Eu acho que duas coisas são muito relevantes quanto a esse aspecto, para que se retome a base dessa discussão, para que o Governo envie seus representantes a esse debate, que é muito importante nesta Comissão, a fim de que o Governo traga respostas a todos esses questionamentos que formulamos, já na Comissão de Constituição e Justiça. Essas respostas devem ser direcionadas para as áreas de segurança pública, educação, saúde, entre outras, as de auditoria, de fiscalização, de advocacia pública, como vimos aqui. Todas essas áreas precisam de respostas diretas, consistentes, que comprovem que o texto proposto busca realmente uma melhoria na qualidade do serviço público brasileiro.
Nós já deixamos cravados aqui o que é importante que conste da PEC, até para evitar divisões futuras, para evitar que o Congresso Nacional tenha que fazer um retrabalho, discutir a questão das carreiras típicas de Estado. No texto desta PEC, após o trabalho de relatoria nesta Comissão, devem ser indicadas quais são, na visão do Governo e do Congresso Nacional, as carreiras essenciais do serviço público brasileiro.
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Criadas essas colunas fortes do nosso funcionalismo público, as estruturas essenciais, aí sim partiríamos para a discussão sobre o que pode ser delegado pelo Estado, do que pode ser terceirizado, do que pode passar por processo de escolha fora deste precioso princípio, o do concurso público no Brasil.
Enquanto estivermos na fase ainda de pagamento de dívidas sociais acumuladas há pelo menos 2 séculos, acho que não podemos fazer atropelos. O Congresso tem agora uma oportunidade. No que depender dos policiais federais brasileiros e da União dos Policiais do Brasil, entidade pela qual eu também falo, podem contar conosco nesse debate.
O SR. PRESIDENTE (Fernando Monteiro. PP - PE) - Obrigado, Luís Antônio. Eu queria só tirar uma dúvida. A federação nacional reúne delegados e agentes ou existe outra entidade de delegados?
O SR. LUÍS ANTÔNIO DE ARAÚJO BOUDENS - A nossa federação congrega os 27 sindicatos estaduais e representa todos os cargos. Existem associações menores, que representam individualmente escrivães, delegados, peritos, mas a federação congrega todo o sindicalismo na Polícia Federal através dos 27 sindicatos. A federação é o órgão que reúne todos, Deputado.
O SR. PRESIDENTE (Fernando Monteiro. PP - PE) - Obrigado.
O SR. FERNANDO DE SOUZA COELHO - Muito obrigado, Deputado. Quero iniciar agradecendo novamente pelo convite, pela oportunidade de exposição e de interlocução com todos os colegas e pela interação com os Deputados que nos sucederam após as apresentações: o Deputado Gervásio Maia, o Deputado Rogério Correia, o Deputado Israel Batista e a Deputada Alice Portugal. Creio que tivemos muitos insights para que sejam considerados nas emendas que os senhores farão a respeito da PEC 32/20.
Eu gostaria de apontar algumas ressalvas. Em primeiro lugar, no que se refere a nomeação para cargos em comissão, é fundamental pensarmos a respeito de qual é o percentual de cargos em comissão em relação ao de cargos públicos autárquicos e de empregados públicos. É fundamental haver um limite, considerar quais são os critérios de competência, bem como de diversidade e equidade, para ocupação desses cargos de livre provimento.
O mesmo se aplica aos cargos e empregos por prazo determinado ou mesmo compartilhados com particulares. Nesse caso, é muito importante a regulamentação, se isso for aprovado, relativa a quais são de fato as atividades a que cabem esses cargos temporários e compartilhados e qual é o limite do uso desse instituto em discussão.
No que se refere ao concurso público, reforço a minha apresentação. Concurso público no Brasil está previsto desde a Constituição de 1934. Obviamente, com a Constituição de 1988, e com a ampliação na federação, iniciamos um processo de profissionalização na administração pública, sobretudo em âmbito subnacional. No caso dos Municípios, havia 2 milhões e meio de funcionários públicos em 1987, e hoje há em torno de 7 milhões de funcionários públicos.
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Muito do aumento dessa força de trabalho decorreu das competências administrativas conferidas aos Municípios pela Constituição de 1988. O concurso é muito importante como instituto, mas é fundamental modernizá-lo no que se refere a sua aplicação. Cabe pensá-lo como instituto jurídico, como elemento de instrumentalização gerencial, que está relacionada com as políticas públicas de gestão de pessoas, e como um instrumento dentro de um sistema de ingresso.
O SR. PRESIDENTE (Fernando Monteiro. PP - PE) - Obrigado, Fernando de Souza Coelho.
O SR. JOSÉ CELSO PEREIRA CARDOSO JÚNIOR - Deputados e Deputadas, eu queria mais uma vez agradecer a oportunidade, o convite.
Como o tempo é curto, vou me concentrar em propostas, como foi sugerido pelo Deputado Fernando Monteiro e pelo Deputado Arthur Maia, que sempre têm mencionado a necessidade de trazermos propostas.
A primeira proposta é evitar o pior, ou seja, na dúvida, manter a Constituição de pé. Apesar dos problemas e insuficiências que a Constituição de 1988 certamente tem, ela é o que de melhor foi produzido no Brasil em termos institucionais e civilizatórios desde 1889, desde a Proclamação da República. Nada do que veio depois de 1988, das mais de cem emendas constitucionais aprovadas desde então, substitui em qualidade e em essência os princípios e as diretrizes fundamentais da Constituição. Ali estão as bases institucionais necessárias, ainda que insuficientes, à implementação de um processo gradativo e virtuoso de construção do Estado nacional, de construção de uma burocracia profissional, de construção das condições mínimas necessárias para fornecer políticas públicas de modo adequado ao conjunto da população brasileira, por todo o território nacional. Então, preservar a Constituição é melhor do que dilapidá-la.
A segunda proposta é realizar uma ou mais audiências públicas, no âmbito desta Comissão Especial, especificamente sobre propostas. Temos propostas para outro desenho de Estado e para outra configuração de reforma administrativa. Cito dois exemplos. Quanto ao primeiro exemplo, publicamos recentemente dois livros em que há propostas sobre uma reforma administrativa de natureza republicana, democrática e conectada com os objetivos do desenvolvimento nacional, tais como os apregoados pelo próprio art. 3º da Constituição. Esses dois livros estão à disposição. Inclusive, já foram entregues à grande maioria dos Parlamentares. Um dos livros foi publicado pelo FONACATE e se chama Rumo ao Estado necessário.
Aponta bases para uma reforma republicana e democrática, visando ao desenvolvimento nacional. O outro livro, publicado pela AFIPEA — Associação dos Funcionários do IPEA, vai na mesma direção e reúne um conjunto de propostas bastante interessantes, progressistas e, obviamente, opostas ao espírito da PEC 32.
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O segundo exemplo vem das próprias emendas que estão agora presentes na Comissão Especial. Eu destaco duas delas: a proposta de emenda substitutiva global apresentada pela Frente Parlamentar Servir e a proposta de emenda substitutiva global apresentada pelo Partido dos Trabalhadores. Eu conheço apenas essas duas do ponto de vista mais amplo, global. Essas propostas minimizam os estragos conhecidos e reais da PEC 32 e preservam a essência da Constituição de 1988, que é, como eu já disse, o que temos ainda de melhor em termos de princípios e diretrizes para o Estado e para a administração pública brasileira.
A terceira e última proposta que eu gostaria de registrar aqui diz respeito à seguinte ideia. Assim como o Senado Federal criou o Instituto Fiscal Independente para tratar das questões ligadas às finanças públicas, a Câmara dos Deputados deveria criar — poderia pensar seriamente sobre isso — um instituto fosse voltado para a reforma ou o aperfeiçoamento do Estado brasileiro e operasse de modo permanente, conectado a esse grande objetivo de aperfeiçoamento do Estado e da administração pública brasileira. Esse é um tema permanente na nossa história, é um tema que não deixará de estar presente em nenhuma legislatura, é um tema que requer aprofundamento de diagnósticos, de bases de dados, de proposições teóricas, de estudos de caso etc.
Apresento aqui essa proposta, para que, no lugar da PEC 32, esta Casa Legislativa deixe como legado para o Estado e para a sociedade brasileira um instituto voltado especificamente para a tarefa do aperfeiçoamento incremental, paulatino, gradativo e permanente do Estado e da administração pública. Acho que essa seria a melhor e a maior contribuição possível desta Casa ao debate sobre este tema.
O SR. PRESIDENTE (Fernando Monteiro. PP - PE) - Obrigado, José Celso Pereira Cardoso Júnior.
O SR. MAX LENO DE ALMEIDA - Deputado Fernando Monteiro, quero também agradecer pela oportunidade de estar presente nesta Comissão Especial, trazendo esses elementos críticos, que evidentemente acabaram se constituindo em pontos importantes para a reflexão como um todo sobre a PEC, sem dúvida alguma relacionados com a temática de hoje, tendo em vista que o vínculo de experiência e, evidentemente, a questão do concurso público estão interligados e são pontos centrais e nevrálgicos da PEC como um todo.
Como estou aqui representando Sérgio Ronaldo, o Secretário-Geral da Confederação dos Trabalhadores no Serviço Público Federal, eu queria parabenizar a Comissão Especial por abrir este espaço para as entidades que estão
desenvolvendo uma série de atividades em nível nacional, reunindo tanto os três Poderes quanto várias entidades relacionadas aos entes federativos, os Municípios, os Estados e a União, nesse trabalho não só de esclarecimento, mas também de mostrar o que de fato está por trás da proposta e o que representa a PEC na vida corporativa e sobretudo na vida da sociedade brasileira.
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Por isso, eu gostaria neste momento de exaltar esta possibilidade que vem sendo dada pela Comissão Especial. Esperamos que as próximas audiências públicas permitam que várias entidades do setor público também estejam aqui presentes, diante desse quantitativo enorme de atividades que estão sendo realizadas, para trazer suas efetivas contribuições não apenas em relação a esta temática que foi tratada hoje, como também em relação à PEC como um todo e aos demais temas previstos no plano de trabalho inicialmente estabelecido no âmbito desta Comissão.
Nós das entidades sindicais nos colocamos à disposição para participar dessas atividades com o propósito de trazer contribuições não apenas sob o ponto de vista da realidade do setor público como também do que vem sendo discutido no âmbito das centrais sindicais, das próprias confederações que reúnem servidores, dos próprios sindicatos e de todos os entes e Poderes, que de certa forma terão suas vidas funcionais efetivamente alteradas com a PEC 32.
Lembro que esses pontos polêmicos, sem dúvida alguma, têm sido muito debatidos e reforçados nessas atividades, como a questão das consequências dos novos vínculos que estão sendo criados e mais especificamente dos vínculos de experiência, que mudam toda a forma de ingresso, a questão da estabilidade, o próprio regime de previdência, e remetem a uma legislação que disporá sobre a provável perda de cargo.
Salienta-se também que a subsidiariedade deixa de existir na PEC original. Os termos de cooperação podem se constituir numa forma de precarização do setor público, da mesma forma como aconteceu no âmbito do setor privado, com a alteração da sua legislação trabalhista, que mexeu com o sistema de relações do trabalho por completo. Há uma série de debates efetivamente acontecendo em âmbito nacional, envolvendo as mais variadas entidades do setor público, que podem de fato trazer uma série de contribuições para as várias atividades que estão sendo previstas ainda no âmbito da Comissão e de outras atividades que estão sendo pensadas para discutir essa temática.
O SR. PRESIDENTE (Fernando Monteiro. PP - PE) - Obrigado, Sr. Max Leno de Almeida.
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