Horário | (Texto com redação final.) |
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O SR. PRESIDENTE (Da Vitoria. CIDADANIA - ES) - Sras. e Srs. Parlamentares, caro colega Deputado Félix Mendonça Júnior e prezada Deputada Paula Belmonte — que, com certeza, vai poder participar daqui a pouco, porque tinha confirmado que vai estar presente —, prezados consultores legislativos, demais amigos presentes, bom dia.
Hoje realizaremos uma audiência pública para tratar do tema Controle da Evolução da Dívida Pública Brasileira. Esse tema foi proposto pelo grupo de estudos sobre A dívida pública brasileira: um novo estudo, relatado pelos Deputados Félix Mendonça Júnior e Denis Bezerra.
O objetivo da audiência é avaliar e discutir o controle da evolução da dívida pública brasileira. Foram convidados os Tribunais de Contas, que irão mostrar sua atuação e suas ações nesse controle, a forma como são feitas as auditorias do endividamento.
Esse grupo também tem como foco identificar os grandes detentores da dívida pública, as principais regras fiscais, a evolução do estoque das operações compromissadas e o papel do Congresso Nacional na fiscalização da dívida pública.
Hoje dois palestrantes irão contribuir para o nosso estudo. O primeiro palestrante é o Sr. Celmar Rech, natural de São Marcos, Rio Grande do Sul. Ele é graduado em Economia pela Universidade de Caxias do Sul e em Direito pelo UNICEUB, de Brasília, é pós-graduado em Direito Público pelo Instituto Processus e é mestre em Economia do Setor Público pela Universidade de Brasília. Trabalhou na Secretaria do Tesouro Nacional; em 2008, tomou posse como auditor do Tribunal de Contas do Estado de Goiás; em 2011, tornou-se Conselheiro desse Tribunal; e, em 2015, assumiu o cargo de Corregedor-Geral. Atuou como Vice-Presidente de 2017 a 2018 e, em 2019, foi eleito Presidente. Atualmente, exerce o cargo de Ouvidor.
O segundo palestrante é o Sr. Leonardo Rodrigues Albernaz. Ele é graduado em Engenharia Elétrica pela Universidade Estadual de Campinas — UNICAMP e é especialista em Análise e Avaliação de Políticas Públicas pelo Instituto Serzedello Corrêa, do Tribunal de Contas da União. Foi Gestor de Planejamento e Orçamento, tendo atuado em diversas áreas da Secretaria da Fazenda e na Agência Goiana de Administração e Negócios Públicos. Atualmente, é Secretário-Geral de Controle do Tribunal de Contas da União.
O SR. PRESIDENTE (Félix Mendonça Júnior. PDT - BA) - Obrigado, Deputado Da Vitoria.
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Vi, nas discussões, que parte significativa dos estudos passam pela Dívida Pública Federal. E vou tentar, nesta minha rápida apresentação, falar da importância que o endividamento subnacional representa para a Dívida Pública Federal, as implicações de um endividamento mal estruturado no âmbito das Unidades da Federação e o seu impacto na União.
Também vou usar esta oportunidade para falar um pouquinho da atuação das Cortes de Contas Estaduais com relação ao endividamento das Unidades da Federação. Vou usar aqui a dissertação de mestrado que fiz na UnB, em 2003, que tratou do refinanciamento das dívidas subnacionais, para traçar um pequeno histórico do endividamento público e como se deu a renegociação das dívidas públicas estaduais.
Por fim, vou me atrever a apresentar algumas contribuições que, a meu juízo, o Congresso Nacional pode dar para a questão do endividamento público da nossa Federação.
Senhores, eu já me apresentei rapidamente. Sou Conselheiro aqui no Tribunal de Contas do Estado de Goiás, mas estive na Secretaria do Tesouro Nacional. Antes de nela trabalhar, trabalhei outros 14 anos no Banco do Brasil. Faço essa remissão a ele porque é um banco estatal junto com a Caixa Econômica Federal e o histórico que farei vai passar rapidamente por essas duas instituições.
Os bancos federais acabaram, em algum momento, sendo credores importantes da dívida pública dos Estados, e essa relação acabou levando a União a proceder ao refinanciamento da dívida pública das Unidades da Federação. O impacto disso acabou — e aí já é a primeira relação com a dívida da União — levando à necessidade de se socorrerem os bancos federais por meio de capitalização ou assunção da dívida pública das Unidades da Federação detida pelas instituições financeiras federais. Por isso, faço essa remissão ao Banco do Brasil.
Cheguei à Secretaria do Tesouro Nacional em 1996 e saí de lá em 2008, então, peguei todo o refinanciamento da dívida pública dos Estados. Tenho inúmeros amigos que são hoje consultores da Câmara dos Deputados e do Senado Federal e que participaram também da renegociação das dívidas lá na Secretaria do Tesouro Nacional. Nesse período, tivemos, então, a Lei de Responsabilidade Fiscal, com a tentativa de equacionamento em definitivo dessa questão.
Inicialmente, quero dizer, dando um tom otimista, Deputado, demais membros da Comissão e quem nos acompanha, que a grande verdade é que, até bem pouco tempo, de 1997 e 1998 até 2000, boa parte da dívida pública dos entes subnacionais era absolutamente descontrolada.
Basta rememorar que tínhamos Unidades da Federação com títulos da dívida pública emitidos e jogados no mercado, o que era um absurdo também. Esses títulos eram simplesmente rolados porque não havia nenhuma possibilidade de pagamento, com juros e encargos altíssimos. O mercado simplesmente os comprava porque havia um lastro de dívida pública federal.
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Então, está aí a primeira relação da importância de os entes subnacionais terem a dívida controlada, sob pena de haver um impacto na dívida pública federal por conta da necessidade desse socorro.
Alguns ensaios foram feitos. Não vou me estender nisso por causa do meu tempo. Mas há um capítulo inteiro na minha dissertação que trata desse histórico do endividamento, que vem com pesos e contrapesos, a depender das forças políticas.
O endividamento dos entes subnacionais acabou por desaguar em dois grandes refinanciamentos, os quais, dado o tempo, vou citá-los aqui: a Lei nº 8.727, de 1993, e a Lei nº 9.496, de 1997. A Lei nº 8.727, na verdade, estabelecia que a União tinha o papel de resgatar os créditos que as instituições financeiras, particularmente a Caixa Econômica Federal e o Banco do Brasil, detinham das Unidades da Federação e que eram, de certa forma, impagáveis.
Aí vou fazer uma crítica ao sistema de controle externo, que, até aquele momento, era absolutamente omisso com relação a qualquer atuação efetiva de controle dos entes subnacionais. E a União, objetivando sanear as suas instituições financeiras federais, a Caixa Econômica Federal e o Banco do Brasil, acabou por refinanciar, garantir o retorno dos créditos dos Estados para essas instituições.
Nesse momento, em 1993, acho que se perdeu uma grande oportunidade de se tratar também da dívida pública mobiliária dos Estados. Isso não foi tratado, e a dívida pública mobiliária continuou, os Estados da Federação continuaram, boa parte deles, emitindo títulos da dívida pública estadual.
Quando veio a Lei nº 9.496, de 1997 — acompanhada de todo o saneamento das instituições financeiras estaduais, que também eram grandes financiadoras dos seus Governos Estaduais, com o PROES — nós, de forma absolutamente relevante, equacionamos essa questão dos bancos estaduais. Por conta dessa lei, o equacionamento definitivo naquele momento, para a União, na sua cabeça — e eu estava na União nesse período pré-LRF —, era no sentido de que o refinanciamento da dívida pública contratual e mobiliária das Unidades da Federação seria com um contrato de refinanciamento por 30 anos, renováveis por mais 10 anos, com um subsídio inicial decorrente da forma de cálculo, que retroagiu para o credor do Estado.
Então, o que aconteceu? A União emitiu título da dívida pública federal para pagar os credores das Unidades da Federação. E a Unidade da Federação ficou, então, contratualizada para pagar a sua dívida junto à União por 30 anos, respeitando-se um limite máximo de comprometimento da receita que variou, entre os Estados, de 11,5% a 15%.
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Vou chamar a atenção para um ponto: a LRF, no art. 35, dizia que era absolutamente proibido à União proceder a novos refinanciamentos. Eu cansei de visitar Unidades da Federação para dizer que, uma vez equacionada essa dívida, não haveria mais novos refinanciamentos por parte da União.
Portanto, era importante que o contrato de refinanciamento da dívida trouxesse um programa de ajuste fiscal às Unidades da Federação, de sorte que, ao final de 30 anos ou 30 anos mais 10 anos, a dívida estaria com a União — que é o maior credor das Unidades da Federação, ou era, naquele momento, dado o refinanciamento da dívida —, equacionada de forma definitiva. Se, a partir daí, a Unidade da Federação eventualmente quebrasse, a responsabilidade seria inteira dela, porque a União não mais haveria de promover socorro.
Vou abrir um parêntese, Deputado Félix Mendonça, e o Dr. Leonardo vai lembrar, sobre esse refinanciamento da dívida, que não seria mais reestruturada. A minha dissertação de mestrado tratou exatamente disso, na medida em que, ao final dos 30 anos ou dos 30 anos mais 10 anos, a União teria algum risco de não receber esse recurso. Eu estava no Tesouro, e a minha dissertação foi feita exatamente do ponto de vista do credor. Ela acabou por mostrar que haveria, em quatro a cinco Estados, a necessidade de um esforço adicional para que a dívida pudesse ser integralmente quitada dentro do período previsto. Isso acabou se confirmando. Nós temos o Estado do Rio Grande do Sul, o Estado de Minas Gerais, o Estado do Rio de Janeiro e até o Estado de Goiás, onde hoje eu sou Conselheiro.
Mais à frente, se houver possibilidade, vou tratar desse novo momento, porque nós revisitamos essa legislação, que, em 2000, para nós, era imexível, e a União não mais refinanciaria essa questão.
Algumas Unidades da Federação — e aqui vou citar o Estado do Ceará e o Estado do Espírito Santo — compreenderam a importância de trazer isso para o seu orçamento: equacionaram a dívida, o que compromete uma parte pequena do orçamento e permite novos investimentos. Outros Estados não fizeram isso e cederam a pressões corporativas e reajustes de boa parte da dívida, com o comprometimento do orçamento, que, na verdade, se dá com despesas de pessoal. Isso acabou comprometendo o orçamento das Unidades da Federação da seguinte forma: parte da dívida está equacionada com a União naqueles termos propostos, comprometendo 13% a 15% somente do orçamento; e boa parte do orçamento está comprometido com despesas de pessoal e com o déficit da Previdência.
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Se esse comprometimento, como aconteceu aqui no Estado de Goiás, ultrapassasse 100% do orçamento — na minha concepção, de quem viveu o Tesouro Nacional em 1997 —, a variável “dívida” não seria o problema, porque já se sabia, há muito, que ela iria comprometer 13% da receita e que tinha que se trabalhar nos outros 87%. Mas, por causa das pressões políticas e até do custo político de se mexer nessa parte do orçamento, com despesa de educação, saúde, etc., isso ficou inviabilizado, e acabou-se por afrouxar a legislação federal de forma a permitir um novo refinanciamento da dívida. E agora nós estamos na iminência do Regime de Recuperação Fiscal.
O papel dos Tribunais de Contas nesse processo, Deputado... Estou vendo que o meu tempo está correndo muito rapidamente. Talvez eu deixe parte dessa questão para nós tratarmos no decorrer dos debates.
A verdade é que, embora a nossa Federação garanta autonomia aos entes federados, nesse ponto da dívida e em muitos outros eles sofrem imensa participação da atuação da União. Basta vermos que o endividamento está sujeito, na parte da oferta, ao Conselho Monetário Nacional e, na parte da demanda, a limites definidos pelo Senado Federal e pela Lei de Responsabilidade Fiscal também, de sorte que há sempre presentes questões que se dão no âmbito da União e que têm impacto fiscal no âmbito das Unidades da Federação.
Vou me atrever a citar alguns pontos que impactam e impactarão, possivelmente, a questão fiscal das Unidades da Federação e são definidos no âmbito da União. O teto dos Ministros do Supremo Tribunal Federal é definido por uma lei do Congresso Nacional com aplicação nas Unidades da Federação, nos Poderes Judiciários locais e até mesmo nas Cortes de Contas locais. Isso é definido no âmbito da União, assim como o piso salarial dos professores, porque gera impacto fiscal.
Então, o nosso orçamento, digamos assim, sofre influência da nossa peculiaridade federativa, que, embora garanta autonomia, é sempre muito associada a essa questão de definição no âmbito federal.
Todavia, eu preciso fazer um reconhecimento. Dado esse cenário e dado que a dívida subnacional não é garantida pelos mecanismos de mercado, um eventual não pagamento das Unidades da Federação acaba — ao menos a história tem mostrado — por ser refinanciado pela União. E, como o mecanismo de mercado não funciona, a União participa desse processo salvaguardando as Unidades da Federação, por isso é importante que tenhamos outros mecanismos presentes, entrando aí a Lei Complementar nº 178.
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Preciso fazer um reconhecimento aqui ao Deputado Mauro Benevides e ao Deputado do Rio de Janeiro, que trabalharam na Lei Complementar nº 178, de 2021, que trouxe o novo Regime de Recuperação Fiscal. Os Deputados foram absolutamente sensíveis ao reconhecer que, embora a União precise participar desse processo de ajuste fiscal — e quem vai bancar isso é a União —, porque parte da dívida contratualizada não vai ser paga integralmente. Associar o Regime de Recuperação Fiscal a algumas condicionantes, da forma como está previsto na nossa lei complementar, é fruto de um amadurecimento muito grande do Congresso Nacional ao compreender esse mecanismo e permitir, então, que aquelas Unidades da Federação, que não conseguiram se ajustar aos termos contratualizados agora pudessem se ajustar.
Isso é sempre muito sensível, porque, a bem da verdade, Deputado e senhores que nos acompanham, à medida que a União refinancia as dívidas, ela traz incorporado a isso um desequilíbrio muito grande, porque acaba subsidiando o ente que vai ser beneficiado com o refinanciamento. Basta ver que, na Lei nº 9.496, de 1997, como boa parte da dívida, o benefício se deu em função dos valores envolvidos ao Estado de São Paulo. Com a emissão do título da dívida pública federal e boa parte dele direcionada aos credores do Estado de São Paulo, pela própria grandeza do Estado, há uma concentração de renda da União para os demais Estados, que têm o seu refinanciamento em maiores volumes. Isso é uma verdade.
Do ponto de vista dos Tribunais de Contas nesse cenário, eu penso que eles evoluíram sobremaneira, na forma como olharam esse processo anterior à Lei de Responsabilidade Fiscal. E aqui fiz um mea-culpa ao sistema, dizendo que os Tribunais de Contas eram os grandes ausentes desse processo.
Agora a Emenda Constitucional nº 109, de 2021, traz uma série de novas atribuições às Cortes de Contas, sobretudo ao olhar a trajetória sustentável da dívida. Esse tem sido o grande esforço do sistema de controle externo federativo, assim como, no âmbito da União, do nosso TCU.
Nessa nova rodada de negociação com o Regime de Recuperação Fiscal que traz também um conselho que vai acompanhar esse processo com integrantes do Ministério da Fazenda, com integrantes do TCU e com integrantes do Estado, eu acho que esse processo vem acompanhado ainda mais de uma responsabilidade fiscal que é necessária nesse processo de renegociação da dívida.
Eu penso que a contribuição que o Congresso Nacional poderia dar neste processo seria instituir o nosso conselho de gestão fiscal, Deputado Félix Mendonça Júnior.
O que tem acontecido ao longo destes anos? O Tesouro Nacional tem feito um esforço hercúleo de regulamentação dessa questão que envolve os indicadores da dívida, mas sobretudo outros indicadores fiscais. Mas ao Tesouro Nacional, enquanto órgão da União, falta legitimidade para atuar naquilo que extrapola a consolidação das contas nacionais e ser acatado com tranquilidade pelas Unidades da Federação.
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Então, penso que, se o Congresso Nacional trabalhasse para a instituição do conselho de gestão fiscal de forma definitiva, os conceitos que envolvem a Lei de Responsabilidade Fiscal — tais como estes que nós estamos discutindo de dívida pública — não permitiriam que se criassem, no âmbito das Unidades da Federação, conceitos díspares ou conceitos que permitissem uma leitura mais elastecida daquilo que não merece ser elastecido. Isso aconteceu ao longo desses vinte e tantos anos da Lei de Responsabilidade Fiscal com a despesa de pessoal, que cada Unidade da Federação tratava de forma distinta para poder caber dentro do seu limite máximo de despesa.
Para que isso não aconteça com outros indicadores relevantes, acho que é sobremaneira importante que nós tenhamos isso de forma presente. E o Congresso Nacional pode dar, sim, esta contribuição instituindo o conselho de gestão fiscal, definindo conceitos que são possíveis de serem somados pelas Unidades da Federação, para que nós tenhamos um balanço consolidado no âmbito nacional, sem nenhuma invenção de conceito no âmbito das Unidades da Federação.
O Sistema de Controle Externo Subnacional está atento a isso, cada vez mais caminhando junto com o Tesouro Nacional, discutindo conceitos, para evitar esse tipo de fuga à responsabilidade fiscal.
Portanto, eu nutro uma expectativa muito grande com este novo cenário que se avizinha: do Regime de Recuperação Fiscal das Unidades da Federação que assim precisam, dizendo que o Sistema de Controle Externo Estadual está cada vez mais atento a este processo, para que ele ocorra da forma menos pesada para a União, que é quem está bancando esse novo Regime, para que, de fato, nós equacionemos, de forma definitiva, nos entes subnacionais, a questão da dívida.
Quero dizer mais uma vez que é um grande prazer para o Sistema de Controle Externo estar fazendo parte deste cenário que envolve a dívida pública subnacional com reflexos na dívida pública nacional. Eu estou aqui à inteira disposição dos senhores e agradeço mais uma vez o convite para participar desta nossa relevante e importante discussão.
O SR. PRESIDENTE (Félix Mendonça Júnior. PDT - BA) - Muito obrigado, Dr. Celmar.
Tenho certeza absoluta de que a sua participação vai ser fundamental para todos nós. Quero, desde já, pedir ao senhor que, se puder, mande a sua dissertação de mestrado para os participantes aqui do grupo, pelo menos a parte que fala sobre a dívida pública.
Quero agradecer a presença ao José Eugênio Vieira, Diretor-Superintendente do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas; ao Dr. Luiz Toniato, Diretor de Serviço Brasileiro de Apoio às Microempresas; ao Pedro Rigo, Diretor-Superintendente do SEBRAE; ao Paulo Henrique Lima Brito, do INMETRO; e à Natália Matano, do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações.
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Cumprimento o Deputado Félix, o Deputado Da Vitoria, o Conselheiro Celmar, as autoridades presentes e também os colegas da Consultoria, os analistas, os assessores da Câmara dos Deputados.
Assim como o Celmar, eu queria agradecer muito pelo convite. É uma honra poder participar deste momento e tratar desse tema, um dos mais importantes quando falamos não só sobre finanças públicas, mas também sobre o Estado brasileiro e sua capacidade de garantir a estabilidade macroeconômica e o financiamento das políticas públicas.
(Segue-se exibição de imagens.)
Aqui a ideia é falar sobre as ações de controle realizadas pelo TCU sobre a dívida pública. A contribuição que daríamos nesta audiência, pelo menos em princípio, seria mostrar de que forma o TCU tem atuado na fiscalização da dívida pública, que é um tema bastante questionado na própria sociedade. A ideia é mostrar de que forma temos feito esse trabalho e, a partir dele, trazido para o gestor público, para o Congresso Nacional e para a sociedade informações de qualidade sobre o que temos em relação à dívida pública.
Os tribunais de controle de uma forma geral, como órgãos de fiscalização, realizam três tipos de auditoria, para ser mais específico.
Nós realizamos auditorias de conformidade, em que o objetivo é verificar se os atos administrativos estão conforme a lei. Isso vale para a dívida pública e também para qualquer ato de finança pública. Esses atos precisam ser avaliados quanto a sua conformidade, junto à Constituição, às leis complementares, às leis ordinárias, às leis orçamentárias especificamente, às resoluções do Senado e mesmo a alguns decretos. A ideia é verificar se os atos administrativos, inclusive na gestão da dívida pública, estão em conformidade com a lei. Então, nós temos trabalhos nessa linha.
Também fazemos trabalhos de natureza operacional, em que o objetivo é verificar a qualidade da gestão, ou seja, os aspectos da gestão dos processos, aspectos da governança, aspectos internos. Objetivamos verificar o desempenho da gestão da dívida pública, ou seja, de que forma essa gestão está sendo feita. A partir daí, é possível trazer mais transparência e algumas recomendações baseadas em boas práticas, inclusive internacionais, para que possamos aprimorar o funcionamento das finanças públicas e, mais especificamente, a gestão da dívida.
Temos também auditorias financeiras, cujo objetivo é assegurar, para o usuário da informação, em especial para a sociedade de forma geral e o Congresso, que aqueles números que retratam a dívida pública são confiáveis, que nós podemos olhar para aqueles números e ter a tranquilidade de que eles refletem a realidade financeira da União.
Então, esses são os três tipos de auditoria que nós fazemos atualmente. Embora, no Tribunal de Contas da União, haja uma predominância para auditorias de conformidade, nós conseguimos fazer, ao longo dos últimos anos, também esses outros trabalhos.
Com relação à fiscalização da dívida pública, eu trago este infográfico para mostrar um pouco os dois grandes objetos que podem ser olhados. No fundo, quando estamos falando de gestão das finanças públicas, existem vários objetos que, no final das contas, desaguam na dívida pública. Então, fiscalizamos o Orçamento e a política fiscal e seus resultados, fiscalizamos a renúncia e as diversas operações com ativos públicos, fiscalizamos as operações de crédito de forma geral e de assunção de compromissos futuros, que comprometem parte do que a União vai ter disponível mais à frente, fiscalizamos a forma como são administrados os riscos fiscais ou a forma como as políticas monetária e cambial refletem-se na política fiscal e mesmo na administração da dívida. Todos esses objetos precisam ser analisados quando pensamos que o grande objetivo é garantir a sustentabilidade da dívida pública, ou seja, uma trajetória de dívida pública que seja sustentável.
Mas nós também podemos fazer fiscalizações tendo como objeto a gestão da dívida pública.
E aí, como em qualquer objeto de gestão, nós temos trabalhos específicos: a forma como se planeja; a forma como se estabelecem as regras de governança da gestão da dívida e da emissão de títulos; a forma como se procedem os leilões.
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A partir disso, eu trago alguns exemplos de acórdãos recentes do TCU, que vêm de 2019 para cá, num recorte relativamente estrito de tempo, menos de 2 anos e meio, só para ser exemplificativo de fato.
O primeiro exemplo de acórdão que trago foi um trabalho de inspeção, para verificar a regularidade dos empréstimos concedidos pelo Tesouro Nacional aos bancos públicos federais, mediante a colocação direta de títulos públicos do Tesouro nesses bancos. Eu vou falar, na tela seguinte, um pouco mais desse caso, para exemplificar as relações disso com a dívida, mostrando que nem sempre se está analisando a gestão da dívida em si, mas os fatores que vão impactar a dívida pública. E aí vou fazer uma ligação disso com as regras fiscais.
O segundo exemplo é o acompanhamento para verificar o cumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal ao longo de 2020. Isso é feito também anualmente, em relatórios que vão acontecendo — o de 2021 já começou —, e nós vamos reportando isso sempre ao Congresso Nacional.
O terceiro exemplo é o acompanhamento da gestão da dívida pública. Sobre isso eu vou falar um pouco mais adiante também. A ideia é mostrar que, a partir de 2020, o Tribunal passou a fazer um acompanhamento semestral da dívida pública. Eu vou mostrar a abrangência disso.
Temos um quarto trabalho, bastante importante também, que foi um levantamento para que nós pudéssemos conhecer as bases de dados onde ficam os registros dos leilões da dívida pública, para permitir que nós pudéssemos desenvolver uma ferramenta de análise de dados para o acompanhamento dos leilões da dívida pública, suportado por TI.
O quinto exemplo é uma auditoria financeira que foi conduzida para verificar se os componentes da dívida pública estão corretamente representados no Balanço Geral da União, ou seja, se os números da dívida pública que são registrados nas demonstrações financeiras consolidadas da União são confiáveis, se a sociedade e o Congresso podem confiar naqueles números porque eles retratam a realidade sem distorção relevante.
Então, esses são exemplos do tipo de trabalho que é feito. Aqui temos exemplos de trabalhos de conformidade, de trabalhos operacionais e de trabalhos financeiros, conforme eu tinha dito.
Pegarei o primeiro caso, dos empréstimos do Tesouro ao BNDES. Acho que é importante mostrar um exemplo de como, às vezes, as coisas passam fora dos tipos de controle que temos estabelecido, dos tipos de controle que temos em todos os lugares. O nosso sistema de controle de finanças públicas é muito concentrado na peça orçamentária. E, quando você sai da peça orçamentária, você vai causar um impacto na dívida, sem ter os mesmos mecanismos de controle que teria se seguisse regularmente todo o procedimento.
Este caso é bastante conhecido. Nós sabemos que o Tesouro Nacional colocou mais de 500 bilhões de reais, em títulos públicos, no BNDES. Não cabe aqui nenhum julgamento sobre a qualidade ou não da política, mas sobre a forma como ela foi feita, dentro das regras fiscais ou, no caso aqui, passando por cima das regras fiscais.
Essa política começou em 2008, sendo que, até 2016, mais de 500 bilhões de reais foram colocados no BNDES via recolocação de títulos diretos. Isso representava 41,9 bilhões de reais em subsídios financeiros e 105,8 bilhões de reais em subsídios creditícios.
Por que eu parei em 2016? Nós já poderíamos aumentar esse número, trazendo-o até hoje, mas o ponto é que esses valores só foram conhecidos da sociedade e do próprio Congresso Nacional em 2016, quando a política já tinha sido encerrada, visto que ela se encerrou em 2015. Então, de uma política que se iniciou em 2008 e durou até 2015, a sociedade só conheceu o custo em 2016. Ou seja, nós tivemos uma política sendo realizada sem que a sociedade soubesse que ela gastaria, até aquele momento, 173 bilhões de reais em subsídios.
Então, isso é gravíssimo.
Mas há algo ainda mais grave. Como eu disse, fizemos uma inspeção recentemente. Na verdade, ela já vinha de alguns anos, mas o acórdão em si é recente. Conseguimos enxergar que os problemas eram ainda maiores do que a falta de transparência. Verificamos, inicialmente, além desse problema da falta de transparência, que ela representou uma violação grave à Lei de Responsabilidade Fiscal, porque, ao se forçar a colocação direta de títulos do BNDES, a União fez com que o Banco a financiasse diretamente, e isso é vedado pelo art. 36 da LRF. Não estamos falando exatamente de uma irregularidade menor, estamos falando de uma colocação de 500 bilhões de reais em um financiamento cruzado, que seria vedado pela LRF.
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Outra questão mais grave é o fato de isso ter sido feito fora do orçamento público, porque as receitas e as despesas correspondentes jamais passaram pelo Orçamento ao longo de todos esses anos. Isso é gravíssimo, porque tira o poder que o Congresso tem de controlar o Orçamento e, a partir daí, exercer a sua fiscalização no Poder Executivo e numa base anual para decidir se a política pública deve continuar ou não.
Ao fazer isso fora do Orçamento, você não só desrespeita a Constituição diretamente e desrespeita o Congresso, mas, mais do que isso, foge de todo o regramento fiscal e sai do controle. E aí você consegue fazer operações que seriam impossíveis de serem feitas dentro do regramento normal. A consequência disso são centenas de bilhões de reais que vão desaguar na dívida pública. Então, nem sempre eu estou falando do objeto dívida pública quando falo dos fatores que vão impactar a sua trajetória. Esse é um exemplo.
O segundo exemplo é o das renúncias tributárias. Eu vou ficar só em dois exemplos para nos mantermos o máximo possível no tempo. Nós saímos de 2% do PIB para cerca de 4,5% do PIB. Tivemos um pico no subsídio de forma geral no ano de 2015. De lá para cá, reduziram-se os subsídios financeiros e creditícios, mas a renúncia tributária se manteve maior do que o dobro da que havia em 2013. Estamos falando aqui de praticamente 300 bilhões de reais.
É claro que isso não significa dizer que, se essas renúncias deixassem de existir, 300 bilhões de reais virariam receitas tributárias. Isso não aconteceria. E nem é verdade dizer que nenhuma renúncia tributária se justifica. Há renúncias que, certamente, trazem bons resultados e são importantes, mas sabemos de vários casos e podemos citar alguns deles, como a desoneração da folha do pagamento ou mesmo a desoneração da cesta básica, que trazem perdas de arrecadação da ordem de algumas dezenas de bilhões de reais por ano, ou seja, mais do que um Bolsa Família por ano. Nós perdemos esses recursos. Eles não estão explícitos no Orçamento porque, na verdade, simplesmente aparecem num demonstrativo que acompanha o Projeto de Lei Orçamentária, e isso se perpetua ao longo do tempo. Essa perda de receita primária reflete-se nos resultados e, portanto, reflete-se na trajetória da dívida.
O caso das renúncias é particularmente grave quando vemos que 84% delas são concedidas com prazo indeterminado, ou seja, o Congresso não vai examinar de novo esses assuntos, salvo se houver alguma motivação para voltar na legislação. Portanto, os beneficiários de 84% dessas renúncias (falha na transmissão).
O SR. PRESIDENTE (Félix Mendonça Júnior. PDT - BA) - Dr. Leonardo, parece que o seu som ficou mudo. Não sei se todos estão ouvindo.
(Pausa.)
O SR. LEONARDO RODRIGUES ALBERNAZ - Esses são exemplos de trabalhos que o Tribunal faz sobre fatores que afetam a trajetória da dívida pública.
Quando falamos do objeto em si, lembro que temos uma normativa bem recente, publicada no ano passado, a Resolução nº 322, de 2020, que estabeleceu esse acompanhamento permanente da dívida pública. Na verdade, ela estabeleceu uma periodicidade semestral no mínimo. Os relatórios podem ter prazo mais curto de tempo, se houver algum fator superveniente que mereça um relatório específico, mas a periodicidade é, no mínimo, semestral, e as conclusões são levadas ao parecer prévio quando da apreciação das contas do Presidente da República.
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Aproveito inclusive o momento para falar que amanhã haverá exatamente a sessão em que o Tribunal vai apreciar as contas do Presidente da República relativas a 2020, certamente já alimentado por esse acompanhamento que foi feito no referido ano. Tal acompanhamento alimenta também os julgamentos que o Tribunal faz das contas dos administradores da dívida, que constam ali no rol de responsáveis pelos julgamentos. Isso é regulado por uma instrução normativa específica, uma decisão do Tribunal. Foi citado só para referência, mas são exemplos de como esse trabalho passou a ser feito de forma mais sistematizada dentro do Tribunal.
Outro exemplo de modelo de avaliação, que não é exatamente um normativo interno, é o arcabouço trazido pelo Banco Mundial, que traz uma metodologia de avaliação de desempenho na gestão da dívida pública, que vou compartilhar com os senhores. São 14 indicadores que são referências, e o Tribunal tem a intenção de passar a utilizá-los nos seus trabalhos de fiscalização.
Sobre os dois pontos específicos que falamos, começarei pela Resolução nº 322, que traz um conjunto de fatores que o Tribunal precisa examinar semestralmente. Como eu disse, isso começou no ano passado, e nós já estamos no segundo ciclo, que é o de 2021.
O primeiro ponto é que precisamos examinar todos os fatores que determinam a trajetória da dívida, ou seja, não só simplesmente as políticas e as ações governamentais, mas também um conjunto de fenômenos que envolvem a economia brasileira, os aspectos fiscais, contábeis, patrimoniais, que podem impactar a trajetória da dívida. Esse foi o exemplo que eu dei naquele caso do BNDES, em que uma política de governo impacta a trajetória da dívida pública. Mas outros fatores que não ensejam exatamente políticas de governo também têm algum tipo de impacto.
O segundo ponto é sobre os propósitos de utilidade do endividamento e a aplicação dada aos recursos, ou seja, saber para que o País se endividou. É importante para o órgão de controle contar para a sociedade, por exemplo, que, nos últimos anos, boa parte do nosso endividamento está sendo feita para financiar despesas correntes e não investimentos. Então, nós estamos deixando de herança para o futuro uma dívida maior, sem deixar a contrapartida de ativos que servirão para a sociedade. É mais ou menos claro que isso não é sustentável indefinidamente.
O terceiro ponto é o exame dos controles internos de gerenciamento de risco. Quando olhamos a gestão da dívida em si, estamos falando da manipulação de um conjunto muito grande de ativos. Embora a probabilidade de ocorrer algum evento irregular talvez seja pequena, a materialidade é muito grande. Isso precisa ser examinado e considerado. O risco passa a ser levado em função da materialidade. Se qualquer coisa der errado, serão bilhões de reais para um lado ou bilhões de reais para o outro lado. Então, exige-se um cuidado muito maior inclusive do ponto de vista da estruturação do órgão que trata disso, que é a Secretaria do Tesouro Nacional, para estabelecer controles internos e gerenciamentos de risco que precisam ser avaliados pelo TCU.
Outro ponto que a resolução traz é a avaliação da fidedignidade dos ativos abatidos da dívida bruta para se chegar ao valor da dívida líquida. Quando nós vamos tirar, extrair os ativos da DBGG, por exemplo, para se chegar à dívida líquida, precisamos tomar cuidado para que esses ativos sejam devidamente valorados, precificados, para não termos perda de confiabilidade do valor da dívida líquida.
E, finalmente, há a avaliação das exposições fiscais, ou seja, quais são os fatores externos que podem impactar a trajetória da dívida e que, portanto, merecem a atenção da sociedade. É claro que, quando nós falamos de exposições fiscais, estamos falando pouco de coisas que o Tribunal, em si, poderia resolver, mas a obrigação dele, nesse caso, é contar para a sociedade e especificamente para o Congresso Nacional que esses riscos existem, para que, então, as decisões políticas possam caminhar de forma a lidar com esses riscos.
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Trouxemos aqui o gráfico da dívida bruta, mas eu queria utilizá-lo só como exemplo do tipo de análise que precisamos fazer quando há uma resolução desse tipo, que pede para se analisarem os fatores determinantes. A partir desse gráfico, eu vou fazer um recorte do eixo vertical para vermos mais de perto alguns momentos da evolução da trajetória da dívida bruta. Por exemplo, nós conseguimos enxergar aqui, olhando de 2001 a 2016, alguns pontos de elevação, como em 2002, ano em que tivemos uma forte desvalorização cambial. Tínhamos uma parte grande da dívida pública denominada em dólar e vimos a trajetória da dívida subir de uma maneira muito rápida, num curto período de tempo. Depois, isso se normaliza.
Posteriormente, temos em 2009 a colocação de títulos, principalmente no BNDES, mas também a questão das operações compromissadas.
Apesar disso, nós precisamos olhar o período como um todo. E, quando você olha de 2003 a 2013, percebe uma trajetória com tendência decrescente. E isso é associado certamente ao crescimento da economia, ao crescimento do PIB, que é o denominador.
Mas nós também sabemos que, nesse período, na maior parte dos anos, nós tivemos superávit primário significativo. Quando nós passamos a ter déficits em 2014, tivemos uma inversão da trajetória da dívida. Na verdade, houve uma combinação de duas coisas. Nós temos um decréscimo forte do PIB, a partir da crise econômica que se inicia, pelo menos em termos de indicadores evidentes, a partir de 2014, o que segue muito fortemente até 2016. Combinado a isso com déficits primários, na verdade, déficits nominais na casa de meio trilhão de reais em alguns anos. Nós vemos a trajetória da dívida subindo assustadoramente nesse período, claramente, uma trajetória que se mostrava dificilmente sustentável.
Felizmente, a trajetória não seguiu exatamente nessa inclinação o tempo todo. Mas a ideia é ilustrar o tipo de análise que precisa ser feita. Para os especialistas, isso é mais ou menos evidente. Mas nós precisamos ser capazes de contar para a sociedade e para o Congresso o que está acontecendo, para termos as informações e não simplesmente olhar os números de uma forma fria, sem entender o que está por trás deles.
Volto ao exemplo internacional, do arcabouço do Banco Mundial. Eu queria fazer essa menção de que nós temos no Tribunal de Contas da União uma secretaria especializada em fiscalização das finanças públicas numa perspectiva consolidada, que analisa também as contas do Presidente da República. Essa é a Secretaria de Macroavaliação Governamental, dirigida pelo Alessandro Caldeira, auditor do TCU. E temos dentro dessa Secretaria uma diretoria que hoje é especializada estritamente na fiscalização da dívida pública e nos processos de endividamento, que é dirigida pelo auditor Joaquim Ramalho.
Cito os dois porque são os verdadeiros experts da matéria. Eu espero representá-los bem aqui. Mas eu acho que é importante já deixar os nomes, Deputado Félix, para eventualmente outras participações. Eu acho que eles têm condições de aprofundar muito esses conteúdos.
Um dos pontos que eles nos trouxeram foi essa ideia de que esses 14 indicadores que permitem a avaliação do desempenho do gerenciamento da dívida podem ser boas referências para nós utilizarmos. Isso é algo novo, que nós não vínhamos utilizando. Mas é uma proposta de trabalho para que, a partir desses indicadores, nós tenhamos outros critérios de auditoria com respaldo internacional e utilizados também por outros países, o que ajuda a permitir a comparação mundial em vários pontos.
Eu não vou abrir aqui os 14 indicadores, mas vou só dar exemplos. Nós estamos falando de verificar o arcabouço legal; a estratégia de gerenciamento da dívida; a coordenação com as políticas cambial e monetária; os níveis de endividamento interno e externo; os níveis de concessão de garantias e como isso é feito; as questões de controle interno, como, por exemplo, segregação de funções; a capacidade da equipe que gere isso dentro do Tesouro Nacional; a continuidade dos negócios. Enfim, uma série de aspectos que no conjunto permitem uma avaliação.
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Para fecharmos, há duas últimas telas. Eu vou trazer também alguns exemplos de problemas que foram detectados, nos últimos trabalhos, que merecem a nossa atenção e serão, como mostrarei na tela seguinte, objetos de trabalhos que virão a ser feitos.
Então, entre alguns dos pontos de preocupação, são elencados cinco. O primeiro é termos atenção sempre com a influência das políticas monetária e cambial na política fiscal e na forma como a dívida pública pode ser administrada.
O segundo ponto — e aí o Conselheiro Celmar falou muito bem disso — é o fato de nós vivermos em uma Federação e o nosso federalismo fiscal ter várias características que eu não sei se posso dizer necessariamente que são problemas, mas são desafios. Um deles é que alguns entes têm desequilíbrio fiscal considerável. E o Celmar disse isso muito bem. Em alguns casos, nós vamos ter aqueles que fazem o dever de casa pagando pelos que não fazem e, no final das contas, a União também vai ser eventualmente impactada na trajetória da dívida por isso.
Também há o impacto das demandas judiciais. Nós estamos falando de riscos fiscais na casa de dezenas, em alguns casos de centenas de bilhões de reais, que dependem de decisões dos Tribunais Superiores, mas são dois pontos de acompanhamento bem importantes.
Empiricamente, nós temos demonstrado isso. Se nós olharmos para a História do Brasil, para as últimas décadas, nós veremos que o desequilíbrio fiscal dos entes subnacionais e os impactos das demandas judiciais deságuam na dívida pública da União, na dívida pública federal. Nós precisamos dar atenção a isso.
Há outro destaque aqui são as operações heterodoxas e a dificuldade de enquadrá-las nos conceitos e limites da Lei de Responsabilidade Fiscal. Aqui há uma miríade de formas de se fazer isso, principalmente porque surgem sempre mecanismos pelos quais estão fora do Orçamento público, como eu disse naquele exemplo do caso do BNDES. Quando está fora do Orçamento, está fora de todo o regramento fiscal e não se tem o controle que deveria ter. Embora se escape das regras, não se escapa do mundo real, e, no final das contas, isso deságua na dívida pública. Esse é outro ponto de preocupação.
Por último, há um exemplo aqui — e já não é um risco, é um fato — de que não temos ainda os limites para a dívida pública da União. Existe essa previsão na LRF, mas nós temos essa lacuna ainda, e esse é um ponto de atenção. É claro que simplesmente estabelecer limites com valores absolutos pode ser um problema ainda maior, mas lidar com estabelecimentos de limites pode exigir uma melhor discussão da sociedade sobre até que ponto nós podemos ir ao endividamento e o que nós podemos fazer em função do fato de que estamos chegando perto desses limites. Como nós podemos reagir a isso e voltar a uma realidade fiscal que seja sustentável?
A partir disso, eu termino com essa tela, com as próximas ações do Tribunal, ou seja, em que nós já estamos em curso. Há o acompanhamento permanente da administração da dívida pública relativa ao ano de 2021, que deve soltar um relatório a partir do primeiro semestre e, depois, um relatório para subsidiar as contas do Governo deste ano, que serão julgadas no ano que vem.
A partir do levantamento que nós fizemos sobre a base de dados, está em curso o movimento de uma ferramenta tecnológica que vai permitir o acompanhamento e o controle dos leilões da dívida pública, os leilões que vão acontecer e também algum tipo de análise pregressa sobre os leilões que ocorreram. Mas o foco realmente é olhar para frente, ser mais preditivo.
Há duas auditorias como exemplos aqui, com vistas a avaliarem partes fiscais nesses pontos que eu elenquei como riscos. Há uma auditoria específica para verificar de que forma o relacionamento econômico financeiro entre União e entes subnacionais pode gerar problemas para a gestão da dívida pública e, de novo, demandas judiciais contra a União. Nós estamos falando de dezenas e centenas de bilhões de reais que podem impactar na dívida pública nos próximos anos.
Então, esses são exemplos de algumas das ações que vão ser conduzidas, relativas ao objetivo maior de garantir a sustentabilidade da dívida pública dentro do que o Tribunal se propõe a fazer.
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10:55
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O SR. PRESIDENTE (Félix Mendonça Júnior. PDT - BA) - Dr. Leonardo Rodrigues, muito obrigado pela sua explanação. Daqui a pouco, os nossos consultores vão fazer suas perguntas.
Quero registrar a presença de Maria Clara Oliveira, da CODEVASF; Lauro Freitas, do Ministério Público do Pará; Carlos Alberto Eilert, da CONFEF; e Suzana Silveira, da CNI. Muito obrigado a todos pela presença.
Vou iniciar a fase de perguntas e começar com as minhas. Uma delas é sobre metodologia, como eu tinha anotado. Vi aqui seus 14 indicadores, Dr. Leonardo, e queria perguntar se o TCU tem uma metodologia internacionalmente adotada. Sobre os Tribunais de Contas, a regra é do Brasil ou é uma regra geral? Existe internacionalmente esse conceito?
Queria perguntar tanto ao senhor quanto ao Dr. Celmar sobre o impacto da taxa SELIC quando ela é elevada. Por exemplo, nas últimas três elevações da SELIC, qual foi o impacto direto na dívida pública? E como se comporta o TCU na auditoria de uma elevação da taxa SELIC? Ou ele não se comporta, ele não analisa essa elevação?
Pergunto também se o TCU tem um estudo comparativo quanto à independência do Banco Central em países desenvolvidos e em desenvolvimento. O Banco Central no Brasil é independente, mas ele tem um sistema de controle igual aos bancos centrais da Europa, dos países em desenvolvimento, do BRICS? E se tiver, ele pode formar os componentes de juros, inflação, crescimento do PIB, custos dos créditos que são oferecidos à Nação? Qual sistema de controle o TCU tem sobre o Banco Central? Existe algum sistema de controle sobre o Banco Central ou não?
Como o Congresso Nacional pode ajudar em todos esses impactos da dívida pública? Existem aqui várias ideias. Peço aos senhores que, agora ou depois, mandem suas contribuições, pois, no CEDES, podemos fazer projetos de lei e propostas de emenda à Constituição.
O senhor falou sobre o limite da dívida pública. Ninguém vai limitar a "x" trilhões de reais, mas, por exemplo, quando se alcançar "x" por cento do PIB, é preciso que haja uma autorização do Congresso Nacional, que o estudo seja debatido, que seja explicado por que vai aumentar isso e que — não digo que haja um certo rigor — não se possa aumentar simplesmente a dívida. É preciso que isso venha a público, que venha ao Congresso e que seja debatido como vemos nos Estados Unidos. Às vezes eles param de pagar tudo porque não têm orçamento. E aqui vimos, pela explanação, que todos aqueles empréstimos do BNDES burlaram completamente a legislação. Talvez isso seja muito pior do que as pedaladas fiscais que levaram ao impeachment de uma presidente.
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10:59
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O.k. Deixe-me falar sobre alguns pontos. O primeiro ponto foi uma pergunta sobre metodologia internacional. De fato, o Tribunal de Contas da União faz parte de uma associação que reúne as entidades fiscalizadoras superiores, que nós chamamos de INTOSAI. Dentro dela, nós temos alguns grupos temáticos, sendo um deles o Grupo de Trabalho sobre Dívida Pública. O Alessandro, o Secretário de Macroavaliação Governamental que eu mencionei agora, e o Joaquim já participaram e ainda participam ativamente desse grupo.
A ideia é que nós possamos, ali dentro inclusive, fazer alguns trabalhos conjuntos e ajudar na elaboração de algumas metodologias. Mas essas metodologias não são especificamente de gestão da dívida. São metodologias sobre a apuração da dívida pública ou a fiscalização da dívida pública, ou seja, de que forma o órgão de controle pode atuar e em que espaço ele pode ou não atuar.
É claro que isso vai variar de país para país, porque cada entidade de fiscalização tem um mandato específico. Mas a ideia é mostrar isso mesmo. Nós temos esse alinhamento e participamos inclusive da elaboração de alguns referenciais, para que outros países possam deles se utilizar.
Então, existe esse intercâmbio internacional e o desenvolvimento de algumas metodologias. Esse exemplo que eu trouxe hoje, do caso do arcabouço do Banco Mundial, é um exemplo de caminho nesse sentido. Nós temos utilizado referenciais do FMI e do Banco Mundial sobre o que seria uma gestão da dívida de qualidade para avaliar essa gestão.
Nós podemos fazer a aplicação, por exemplo, da medição dos 14 indicadores, mas não necessariamente eles precisam ser feitos todos ao mesmo tempo. Podemos pegar alguns itens que aparecem naqueles indicadores e utilizá-los como critérios de auditorias e de fiscalizações. Essa é a ideia mesmo.
Nós estamos acompanhando o que há de mais atual no mundo sobre o que se pode fazer sobre isso, respeitando os limites que temos no caso brasileiro.
Em relação à taxa SELIC, Deputado, certamente ela tem impacto na trajetória da dívida. Está sempre presente a discussão sobre a calibragem exata dessa taxa. Há os dois lados dessa história. E é lógico que isso entra em uma discussão de política econômica que excede o mandato do Tribunal de Contas.
O que nós podemos dizer, sem dúvida, é que, por um lado, se você eleva demais os juros, isso certamente tem impacto na dívida. O problema é que, por outro lado, se não eleva os juros na medida necessária, você tem o problema da inflação. E a inflação pode ser muito mais onerosa para o País do que uma elevação da dívida pública. Acho que este é um ponto de atenção: achar o equilíbrio.
É muito importante mesmo que o Congresso tenha essa atenção com esse ponto e que inclusive possa convidar o Banco Central para audiências públicas regularmente sobre isto, sobre essas variações. Acho muito importante haver transparência no modo como essas decisões são tomadas.
Eu acho que o Tribunal fiscaliza, sim, o Banco Central. A minha visão pessoal é de que essa é uma área em que podemos aprofundar a forma como atuamos. De forma geral, as fiscalizações sobre o Banco Central têm se concentrado em relação a aspectos de conformidade, ou seja, verificar se os atos que são feitos pelo Banco Central estão em conformidade com algumas operações decididas por ele como regulador do sistema financeiro. Isso é mais comum do que vermos trabalhos do Tribunal verificando, por exemplo, decisões de política monetária. De fato, essas decisões são discricionárias, são decisões que embutem uma visão de mundo ali. E o Banco tem autonomia para tomar essa decisão.
Então, é difícil nós avançarmos muito, mas precisamos nos preocupar pelo menos em alguns pontos, e eu falo do Tribunal de Contas, do Congresso Nacional e da própria sociedade.
Embora essas decisões sejam discricionárias e se baseiem na autonomia do Banco Central, elas precisam ser muito bem fundamentadas, precisam ser muito transparentes, precisam ser justificadas, precisam ser demonstradas e precisam inclusive ser avaliadas, a posteriori, para serem garantidas e mostrarem que benefícios e custos trouxeram.
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11:03
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Eu enxergo que os bancos centrais, de uma forma geral, são tratados dentro de uma lógica de enxugamento burocrático. É aquela ideia de que eu tenho um grupo de técnicos que vão decidir o que deve ser feito a partir de um direcionamento político. Acho que nós precisamos avançar no sentido de inserir isso dentro da fiscalização que a sociedade faz. Acho que o Congresso e o Tribunal de Contas têm um papel nisto, de garantir o seguinte: "Olha, tudo bem. Você tem o seu espaço de decisão, mas essa decisão precisa estar muito bem fundamentada e precisa ser justificada para a sociedade".
Os erros e acertos precisam ser demonstrados: não só o erro para baixo, quando você deixa a inflação escapar para cima, mas também um excesso de erros, quando você faz com que a inflação fique baixa demais. Você não deve errar a meta para cima, mas também não deve errar para baixo. Quais são as justificativas para isso? Quais são as fundamentações? Eu acho que caminhar para isso é bem interessante.
O SR. PRESIDENTE (Félix Mendonça Júnior. PDT - BA) - Muito obrigado, Dr. Leonardo.
O SR. CELMAR RECH - Eu gostaria só de agregar sobre essa questão do impacto da SELIC no âmbito das Unidades da Federação. De certa forma, as Unidades da Federação estão mais blindadas com a União, porque boa parte das dívidas são contratuais e não têm como indexador a SELIC. Normalmente, o indexador é um índice de preços. Portanto, essa questão não está diretamente relacionada ao impacto da SELIC.
Todavia, as Unidades da Federação também não têm os mecanismos de reparo e de ajuste que a União tem. Por exemplo, na emissão de títulos da dívida pública, boa parte das Unidades da Federação nem sequer têm essa possibilidade de assim procederem.
Portanto, é importante que o denominador dessa equação no âmbito das Unidades da Federação seja a nossa Receita Corrente Líquida, o nosso Orçamento. E aí está a importância de nós termos um Orçamento menos engessado do que o que existe, Deputado. A bem da verdade, parte significativa do nosso Orçamento é indexada.
Vamos olhar as revisões gerais, a pressão por revisões gerais, a dívida vinculada ao IPCA ou, então, como foi historicamente, pelo IGP-DI. Nós temos a receita como denominador dessa equação toda. E não há garantia de que as receitas das Unidades da Federação acompanhem esses índices inflacionários. Essa sazonalidade precisa encontrar ajuste dentro dos orçamentos anuais. E aí entra a importância de nós fazermos uma reflexão profunda sobre a melhor forma de desengessar os orçamentos das Unidades da Federação.
É claro que eu sei que a discussão da vinculação é sobremaneira importante para a saúde, para a educação, mas eu acho que o Congresso Nacional precisa debruçar-se sobre isso e, sobretudo, também sobre a questão de uma reforma administrativa inteligente, para nós definirmos um núcleo estatal que seja, sim, objeto de garantias, tais como uma estabilidade e um lucro que permitam uma flexibilização das Unidades da Federação, para se adaptarem a esses ajustes que o Orçamento precisa.
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O SR. PRESIDENTE (Félix Mendonça Júnior. PDT - BA) - Obrigado, Dr. Celmar.
Antes de passar a palavra ao nosso Consultor João Motta, registro, Dr. Leonardo, que realmente vemos com muita apreensão o aumento da taxa SELIC. O mundo inteiro, a Europa toda está com taxa zero; o Japão, com taxa negativa; os Estados Unidos, com taxa zero. O Brasil está indo lá para os 4% e anunciando que essa taxa pode subir, e o dólar caindo. O que está diferente no Brasil em relação ao mundo? Cada 1% que vemos de aumento na taxa SELIC — na quarta-feira anunciado pelo Banco Central, que se reúne — representa 45 bilhões de reais de custo ao Brasil ao ano; 2% representam 90 bilhões de reais ao ano. Em 10 anos, 900 bilhões de reais representam mais do que toda a reforma da Previdência que foi feita. Então, é um impacto muito grande.
Quando olhamos a lei, vemos que isso está ao contrário do mundo inteiro. Na época da pandemia, em que todo o mundo está reduzindo, colocando a taxa a zero, ficando até negativa, o Brasil está subindo a taxa, sem nenhuma explicação, um controle, só para o dólar cair. O fato de o dólar cair é bom para quem viaja, não é bom para a agricultura, não é bom para a pecuária, não é bom para muita coisa do Brasil. Mas essa é uma visão que vamos discutir à parte.
Por isso, nós precisamos de pessoas que tenham um bom conhecimento, como os senhores, e que possam nos ajudar. Nosso trabalho aqui é mexer no Congresso Nacional, alertar para isso que o Brasil precisa. O que pudermos fazer de bom para o Brasil nós vamos fazer, deixar a nossa contribuição aqui como aquele beija-flor apagando um incêndio na floresta. O que pudermos fazer vamos fazer aqui.
O SR. JOÃO RICARDO MOTTA - Inicialmente, queria agradecer aos Srs. Dr. Celmar e Dr. Leonardo, pela apresentação.
O Dr. Celmar colocou muitas coisas importantes relacionadas às dívidas subnacionais. Nós todos sabemos a luta que foi essa renegociação e, posteriormente, todos os problemas gerados pela indexação e, vamos dizer, o afrouxamento daquelas regras fiscais, bem como o impacto que isso tem também na dívida geral do setor público. É muito importante essa parte. Nós vamos contar com a ajuda do senhor, da sua tese e tudo o mais para que possamos abordar isso com mais profundidade no estudo.
O Dr. Leonardo colocou todo esse processo da auditoria do TCU, de como funciona. E eu notei uma parte muito interessante que o senhor mencionou, pois foi a primeira vez que eu ouvi isso mais abertamente: a questão dos 500 bilhões de reais do BNDES e o impacto em termos de subsídio. Eu prestei atenção numa frase em que o senhor colocou que isso foi feito no período de 2008 a 2016 mais ou menos, sem que se percebesse claramente, ou seja, sem transparência.
Então, eu queria que o senhor abordasse um pouco mais essa questão em particular. Que mecanismos foram esses que passaram despercebidos, digamos assim? Realmente, era uma coisa vista na época como positiva, eu lembro. Primeiro, começou com 180 bilhões de reais, o que era uma coisa importante, porque ia gerar um crescimento econômico e também porque nós estávamos saindo da crise de 2008, que era uma crise de queda de demanda muito grande.
Então, isso foi colocado como uma decisão de política econômica — a nova matriz e tudo o mais. E percebíamos que isso iria resultar em subsídio lá na frente, pois se estava endividando a 13% ou a 14% pela SELIC, enquanto se emprestava a 4% ou 5% pelo BNDES. Havia ativos, e a dívida líquida não mudava. Mas esses ativos do BNDES estavam rendendo menos do que aqueles para os quais se estava endividando. Então, isso iria gerar um impacto.
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11:11
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Acho muito interessante porque esse período teve uma importância muito grande lá na frente no desequilíbrio fiscal que veio em seguida e que, talvez, tenha gerado essa dinâmica negativa que estamos vivendo hoje, da qual é muito difícil de sair, com despesas engessadas e cada vez mais rígidas e com crescimento, digamos assim, estrutural, que vão pressionando de um lado. De outro lado, as receitas, devido à recessão, não têm capacidade de acompanhamento. Assim, vão sendo gerados déficits primários que, a cada ano, pressionam mais a dívida, sendo o fator mais importante dela.
Deixe-me contar um pouco dessa história. Ela tem várias nuances. Você mencionou até o ponto em que ela vista como algo positivo. Estamos falando principalmente do ano de 2009, quando tivemos uma pequena estagnação ou uma pequena queda do PIB, ano em que houve reflexos no Brasil do que vinha sendo a crise do subprime, que começou em 2008. Se olharmos para o momento em que essa história começou, nós a sentimos em 2009, e aí houve esse movimento que era apresentado como uma política anticíclica. Mas, por exemplo, em 2010, quando o PIB do País cresceu em 7%, na verdade o movimento se acelerou. Portanto, não mais parecia ser exatamente uma política anticíclica.
Mas, saindo um pouco dessa questão de política econômica e de escolha de política econômica — isso pode ser feito por qualquer Governo eleito, com as aprovações do Congresso —, a nossa preocupação está em mostrar que, quando se sai do controle orçamentário, perde-se a capacidade de controlar o que acontece. Eu digo que boa parte de nossas brigas, de nossas solicitações é para colocar todo tipo de despesa ou de assunção de compromissos dentro do Orçamento público, porque, a partir daí, a sociedade pode discutir.
Vemos como são as disputas orçamentárias quando o Congresso tem que aprovar a legislação orçamentária, e sabemos que ali há um espaço limitado. E aí se consegue ter um controle feito dentro do Parlamento, para evitar que aquilo cresça além da conta. De alguma forma, a sociedade está olhando, os Parlamentares estão olhando. Quando se sai do Orçamento, não se tem mais nada e o que vai acontecer é o seguinte: a bomba chegará um dia porque, mesmo que você passe das regras, a realidade vai se impor mais cedo ou mais tarde e vai desaguar na dívida pública.
Nesse caso do BNDES, houve vários fatores caminhando juntos. O primeiro fator foi esse: a política começou sem que houvesse sequer uma estimativa de custos. Eu sei porque participei de trabalhos ligados a isso, e um dos pontos que mais queríamos no início era que os custos fossem conhecidos pela sociedade.
Eu me lembro de se chegar ao ponto de o Tribunal ter que determinar que isso fosse calculado e exposto para a sociedade. E o Ministério da Fazenda à época recorreu ao Tribunal para não publicar. Isso foi bastante assustador, pois não se estava pedindo nada demais. O pedido era o seguinte: "Conte para a sociedade o custo disso". E, a partir de uma determinação do Tribunal dizendo isso, o Ministério da Fazenda recorreu e disse: "Não. Eu não quero calcular". E conseguiram levar isso até 2016, quando o Congresso aprovou uma lei exigindo a publicação. Mas aí já tinha terminado a política, que se encerrou em 2015.
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Isso determinaria uma reflexão maior sobre quais eram os subsídios financeiros e creditícios. Havia o subsídio específico — como você mencionou, João — do diferencial de taxa de juros, do custo de captação e do custo de remuneração do Tesouro Nacional, mas também havia o subsídio totalmente explícito e previsto pela legislação do PSI. Então, o montante agregado chegou a 173 bilhões de reais — e estávamos olhando para 40 anos à frente, em razão dos contratos.
Eu me lembro de ouvir, em uma dessas discussões, um agente do Governo — um secretário, à época — dizer assim: "Mas vocês estão pedindo para calcularmos o custo de um contrato de 40 anos? Não tem jeito de calcularmos". E nós respondíamos:
Se não tem jeito de calcular, como você assinou? Como você assina um contrato de 40 anos, se você não sabe o custo? Então, não assine. Essa é a dificuldade. Portanto, como você saiu disso, como você não contou para a sociedade o custo — porque você não colocou no orçamento —, você saiu de todo o regramento, você deixou essa herança para a sociedade. É isso.
Talvez a lição disso — do ponto de vista do órgão de controle — seja: precisamos ser mais rápidos sempre. Acho que essa é uma lição que aprendemos há alguns anos e vimos tentando fazer agora. Precisamos ser mais rápidos, não podemos chegar depois. Devemos estar juntos ao que está acontecendo, para dar a mensagem quando estiver acontecendo. Essa é uma lição que fica.
A outra lição que fica é que essa tentativa de sair do Orçamento e, a partir dessa saída, sair de todas as regras orçamentárias acontece o tempo todo e algumas vezes se infiltra em algumas legislações. Por exemplo, hoje temos legislações que preveem a possibilidade de alguém que ganhou uma concessão fazer investimento cruzado em outro setor que nada tem a ver com a concessão. Isso é uma forma de não se recolher o recurso para o Tesouro Nacional e sair do Orçamento público. Então, temos isso o tempo todo.
Existem mecanismos, atualmente, como o BTS — Built to Suit —, através do qual você estabelece um compromisso para pagar daqui a 5 anos, mas já tem alguém construindo um prédio contratado para você. Vejam que isso é maior do que o horizonte do PPA. Então, esse gasto não estará no PPA, não estará na LDO ou na LOA. Mas, daqui a 5 anos, o Estado vai ter que pagar. Mas onde está esse compromisso? Quem está controlando isso? Não existe quem nem onde.
Então, acho que essa é a grande preocupação: como garantir que as coisas se enquadrem dentro das regras? Cumprir as regras fiscais e garantir que as coisas estejam dentro do Orçamento não é uma formalidade, não é, enfim, para cumprir tabela. Existe um sentido por trás disso: garantir que a sociedade e o Parlamento tenham controle sobre a despesa pública e, portanto, sobre a receita pública também.
O SR. PRESIDENTE (Félix Mendonça Júnior. PDT - BA) - Tem a palavra o Sr. Antonio D'Ávila.
Celmar, foi muito bom ouvir essa faceta quase pouco conhecida ou difundida em relação aos entes subnacionais, mas que é de uma importância extrema na nossa Federação.
Quanto ao Leo, eu o conheço há muito tempo por termos trabalhado juntos no TCU. O Leo foi meu Secretário durante um bom tempo. E ele mostrou hoje a capacidade que tem de apresentar problemas complexos, sistemas complexos, com uma simplicidade muito grande que, de certa forma, nos anima e abre vários horizontes.
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Confesso que, quando vou falar desses assuntos, preciso tomar uma injeção muito grande de ânimo, porque, desde que eu entrei no Tribunal, em 2004, de onde saí, em 2016, para vir para a Câmara, houve uma luta árdua, tivemos que enfrentar vários problemas, várias situações, e na imensa maioria das vezes não obtivemos êxito. Então, é preciso ânimo. Eu, particularmente, e peço que me desculpem por dizer isso, preciso tomar uma injeção de ânimo muito grande para falar desses problemas. Eu lembro que, desde 2008, eu falava sobre tudo isso que o Léo apresentou aí sobre repasses, empréstimos ao BNDES, e desaguou nisso tudo que vivemos hoje.
João, quanto a essa questão dos subsídios que só vieram a público depois, em 2016, eu me lembro muito bem do que o Léo nos falou, eu me lembro dele atuando nesse processo quando ainda era um auditor de mesa — não é, Léo? Lembro-me dele falando sobre o absurdo de você não explicitar o custo de uma política pública. E nós pensamos que isso é um fato isolado, mas não é. Isso tem a ver, por exemplo, quando o Léo fala em fazer auditoria de dívida pública sobre questões monetárias.
Todas essas políticas aí foram bancadas, a partir de 2008, com recursos que vieram do Banco Central, que financiou toda essa política fiscal de 2008 até 2016. Financiou, e financiou muito.
Lembro uma frase que o Deputado Félix Mendonça Júnior colocou há pouco: "Isso é muito maior do que as pedaladas". E eu posso falar de cátedra aqui sobre isso porque estive no centro da auditoria das pedaladas e sei que elas giraram em torno de 50 bilhões de reais a 70 bilhões de reais, e esses empréstimos ao BNDES, ao Banco do Brasil, à Caixa Econômica, aos bancos federais em geral, foram dez vezes maiores do que isso. Se houve alguma coisa irregular e que, de certa forma, contaminou a nossa economia pelos próximos 15 anos ou 20 anos, foram esses empréstimos aos bancos federais, que geraram todos esses custos. Mas, deixando esse mi-mi-mi e passando para questões mais objetivas, eu queria fazer uma pergunta para o Léo, e aí também queria ouvir a opinião do Celmar, pela experiência dos dois no âmbito dos Tribunais de Contas.
Apesar da existência de inúmeras regras fiscais na Constituição, em leis ordinárias, em resoluções, em leis complementares, por que nós chegamos a essa situação? O que aconteceu para que chegássemos a tal ponto de situação fiscal, principalmente de endividamento?
Agora há uma questão que também me aflige porque quero contribuir muito, e talvez seja uma falha minha ainda não ter conseguido enxergá-la no âmbito do Congresso: como o Congresso poderia auxiliar no dia a dia, em termos de interação, em termos de participação um pouco mais ativa, neste processo de controle?
Embora eu seja um consultor da Câmara, como eu já disse para os colegas do Tribunal e até nas aulas que ministro, sou um auditor na essência. Eu sou. Eu não fui nem estive auditor, eu sou um auditor na essência, no meu dia a dia. E, no meu desempenho aí na Câmara dos Deputados, eu sinto falta de espaço para poder contribuir no meu dia a dia com esse controle.
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Como Congresso, Câmara e Senado poderiam atuar mais no dia a dia junto ao controle para que ele se tornasse mais efetivo e para que pudéssemos ajudar a transparecer os efeitos dessas políticas um pouco antes e não depois?
Relacionado a isso, Léo, principalmente no âmbito do TCU, seria possível ao Congresso, digo isso não só para os Parlamentares, mas também para os consultores que lidam mais no dia a dia com esses aspectos de finanças públicas, ter uma forma de acessar os processos que já foram julgados ou que ainda, principalmente, estão em tramitação no âmbito do TCU? Evidentemente, seria mantido o sigilo que é necessário para atuar numa situação dessas, dado que o Tribunal lida muito com direito subjetivo dos gestores públicos.
O SR. PRESIDENTE (Félix Mendonça Júnior. PDT - BA) - Obrigado, D'Ávila.
Antes de passar a palavra ao Leonardo para falar, digo que essa sua aflição é nossa também, é de todos nós aqui e do João Motta. Precisamos estabelecer como podemos atuar, não que venhamos a atuar nos próximos 1 ano ou 2 anos, mas que o Congresso Nacional possa atuar agora, para que tenha reflexo daqui a 20 anos, 30 anos. Para termos um Brasil melhor, nós, com outros Deputados e outros Senadores, precisamos fazer alguma coisa agora. Temos que dar a nossa contribuição agora para as gerações futuras. Nas gerações passadas, sobre esse assunto do BNDES, se não me engano, só falta dizer que esse mesmo dinheiro foi aquele usado para construir portos na Argentina, em Cuba e em outros países.
Vamos lá! Não vamos entrar em política aqui porque isso, para mim, é crime de lesa-pátria, independente de cor partidária, se é vermelha, azul, rosa ou o que for. Temos que dar nossa contribuição para as futuras gerações. Aqui, não fazemos política, não buscamos voto nem nada, só procuramos o que for melhor. Se isso depender de uma não eleição, que não se tenha eleição, mas que façamos o que for melhor para o Brasil. Se isso também depender de ferir alguns grandes ou o Sistema Financeiro Nacional, que fira. O Sistema Financeiro Nacional é composto de cinco bancos apenas que detêm 80% de todos os recursos, enquanto nos Estados Unidos são milhares e milhares de bancos. E também fazem parte desses cinco bancos dois bancos estatais: o Banco do Brasil e a Caixa Econômica. Mas, vamos fazer, vamos dar nossa contribuição.
Eu queria, com suas palavras, D'Ávila, e seu sentimento, dizer que não se desestimule, não. Você tem filhos, netos, sobrinhos. E não estamos fazendo não para nós. Talvez não vejamos os resultados efetivos de tudo isso ou vejamos já com uma idade mais avançada, mas eles vão ter um País melhor de que se orgulhar.
O SR. PRESIDENTE (Félix Mendonça Júnior. PDT - BA) - Agradeço.
Deputado, o D'Ávila desanima, mas logo anima de novo. As injeções de ânimo chegam. Ele tem o espírito de auditor. Eu tive a felicidade de trabalhar com o D'Ávila e foi um grande aprendizado. Posso dizer, com certeza, que é um dos auditores mais brilhantes que já passaram pelo Tribunal de Contas da União.
Para nós foi uma perda enorme. Mas tenho certeza de que aí na Câmara ele está ajudando, sim.
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O SR. PRESIDENTE (Félix Mendonça Júnior. PDT - BA) - É um ganho para nós.
O SR. PRESIDENTE (Félix Mendonça Júnior. PDT - BA) - Isso.
Nós temos um monte de regras fiscais. Acho que uma coisa que sempre afligiu quem trabalha na área, quando entramos na crise de 2014, foi o fato de que temos um monte de regras fiscais. Nós temos os órgãos de fiscalização, o Tribunal de Contas, o Congresso, as carreiras estruturadas na área de Orçamento no Tesouro, no Banco Central. E, mesmo com todo esse arcabouço institucional, não conseguimos impedir os problemas. Então, acho que isso foi uma grande aflição, que ainda continua, porque para mim está totalmente sem resposta.
Com relação especificamente às regras fiscais — e por que, apesar delas, estamos nesta situação —, eu enxergo três grandes problemas, D'Ávila, e o primeiro acho que é básico. Olhando mais para o período recente, acho que as nossas regras têm problemas, pois o desenho delas hoje é completamente desarmônico. Às vezes elas são desenhadas individualmente para não funcionar tão bem, a exemplo da regra de ouro. Se a regra de ouro fosse uma regra para proteger investimento, está desenhada errada, não vai funcionar. E, mesmo que fosse certa, ela bateria com o teto, que está levando o investimento lá para baixo. Então, as regras têm problemas entre si. Acho que essa é uma questão que o Congresso precisa debater.
Nessa linha de sugestões, acho que uma coisa que precisamos discutir mais é qual desenho de regras fiscais precisamos ter um pouco adiante. Talvez ainda tenhamos que sair do estado de pandemia deste ano, dessa situação muito atípica, mas precisamos já discutir qual desenho precisa existir para aquilo que precisamos ter. Eu acho que essa é uma discussão que deve necessariamente ser feita.
Agora, mesmo que as regras fossem perfeitas, mesmo que elas tenham algo de bom — e talvez esse seja o ponto mais grave —, de uma forma geral, elas não têm sido cumpridas. Talvez esse seja o ponto que mais chama atenção. Você poderia ter as regras perfeitas. O fato é que as regras não estão sendo cumpridas na União, nos Estados e nos Municípios. Claro, quando pensamos nas regras fiscais, vemos que hoje a única regra quantitativa que está segurando as coisas, do ponto de vista de crescimento da despesa, é a regra do teto dos gastos. Ou seja, a meta fiscal tem sido tratada com algum descaso. A regra de ouro se resolve com a autorização do Congresso, que já é um ponto de controle, mas também não resolve o problema.
Quando vamos para as regras procedimentais, principalmente as que estão na Lei de Responsabilidade Fiscal, vemos um descumprimento reiterado. É absurda, é enorme a quantidade de renúncias tributárias ou despesas obrigatórias de caráter continuado, que, por exemplo, foram criadas sem cumprir o regramento dos arts. 14, 15, 16 e 17 da Lei de Responsabilidade Fiscal. Quando eu crio, por exemplo, uma despesa obrigatória de caráter continuado, estou descumprindo lá na origem, depois, essas próprias regras.
Tivemos um momento em 2018 em que as despesas obrigatórias representavam 101% da Receita Líquida da União. Ou seja, isso é complicado, porque a própria lei estava pedindo para gastarmos mais do que a Receita permitiria. Isso mostra o tamanho do problema das regras.
Independentemente disso, independentemente da qualidade das regras, o mínimo que precisaríamos é garantir que sejam quais forem as regras, boas ou ruins, sempre possamos discutir para melhorá-las. E acho que isso é um desafio, é uma luta diária, é um dos pontos de aflição do D'Ávila, porque avançamos menos do que gostaríamos. Mas, uma vez que elas existam, a obrigação de todo mundo é cumpri-las e fazer cumpri-las. A obrigação dos gestores de uma forma geral é cumprir. E a nossa obrigação, dos Tribunais de Conta e do Congresso, é fazermos cumprir. Mas, infelizmente, isso não tem acontecido.
Ou seja, reiteradamente temos regras que não são cumpridas.
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Há um terceiro ponto adicional nessa história, que é o fato de que, embora a regra possa ser boa e possa ser cumprida, ainda assim, você tem uma limitação, porque a regra coloca limites à política fiscal, mas não impede a política fiscal. Então, nós vamos ter políticas fiscais que podem ser danosas, apesar das regras boas. Você vai ter sempre mecanismos — e precisa haver mecanismos —, mas o problema é você conseguir controlar as escolhas políticas. E, aí sim, esse papel é muito mais do Congresso, da sociedade. O Tribunal de Contas, nesse caso, é mais um auxiliar de fato, para trazer as informações, para que as decisões possam ser tomadas, e para que o Congresso conheça eventuais problemas nas políticas fiscais em curso.
Do ponto de vista de quem trabalha no Tribunal de Contas, talvez a nossa maior vontade seja garantir que as regras sejam cumpridas. Eu dizia isto lá Secretaria de Macroavaliação Governamental — SEMAG, que fiscaliza as finanças públicas. Qual é o nosso ponto? Nós existimos para quê? Existimos para garantir que as regras fiscais e orçamentárias sejam cumpridas e para garantir que haja transparência e confiabilidade dos números. Se fizermos isso, fizemos o nosso dever de casa hoje. É claro que, no mundo ideal, queremos ajudar na eficiência locativa, na qualidade do gasto, mas temos um dever primário, que é garantir esses dois pontos.
Eu acho que os Tribunais de Contas, ao fiscalizar finanças, têm que olhar para esses dois pontos. Eu preciso garantir que as regras orçamentárias e fiscais sejam cumpridas, sejam quais forem essas regras, gostando ou não dessas regras. Eu não preciso gostar do teto ou da regra de ouro. Eu preciso garantir que as regras sejam cumpridas como estão. Quem pode mudar isso não sou eu. Quem pode mudar isso é o Congresso, quando ele achar que deve.
Então, eu tenho que lutar para que as regras sejam cumpridas e para garantir que haja transparência. Se não houver transparência, e se os números não forem confiáveis, aí estamos perdidos e não temos caminho nenhum para seguir. Então, esse é o primeiro ponto.
O segundo ponto, D'Ávila, é sobre a participação do Congresso, que eu não conheço tanto assim. Mas eu diria que da mesma forma que você se ressente de mecanismos para exercer a atividade de controle — e o controle externo é do Congresso Nacional, em primeiro lugar —, nós sentimos falta do conhecimento que vários de vocês têm. Nós não temos o nível de conhecimento que você tem.
Acho que seria excelente refletirmos sobre maneiras de criar mecanismos de interação mais efetivos, para que a expertise que vocês têm possa ser utilizada para ajudar, mesmo dentro da limitação do próprio Congresso Nacional, mas a partir das informações que temos.
Então, esse ponto que você trouxe eu não sei responder de pronto, mas acredito que haja soluções possíveis, como, por exemplo, discutir de que forma podemos garantir o acesso de processos a vocês, com todo o cuidado que se precisa ter. Isso é fato e isso é feito. Nós já passamos a acessar, este ano, dados da Receita Federal protegidos por sigilo fiscal. O sigilo é transferido, passa a ser nossa a responsabilidade de cuidar do sigilo, mas nós acessamos os dados.
Da mesma forma, vejo como possível que o Congresso Nacional, por meio de seus consultores, tenha acesso aos processos, inclusive se eventualmente estiverem protegidos por sigilo, desde que com o cuidado, com a responsabilidade de assumir também a guarda do sigilo.
Precisamos pensar como fazer. Eu não sei de cabeça, não tenho essa resposta pronta, mas acho que podemos pensar nisso juntos. Acho que pode ser também uma discussão extraída deste debate aqui. Um dos pontos, como sugestão, é acharmos um mecanismo por meio do qual possamos fazer isso. Acho que isso até não é tão difícil, viu D'Ávila? Para os processos encerrados, eu tenho certeza, que é muito fácil. Para os processos em curso, acho que teremos algum desafio, porque, talvez, dependamos de alguma autorização de relator, caso a caso. Eu não sei. Então, precisamos verificar isso. Acho que podemos pensar nisso, sim.
Darei uma sugestão, que é muito aberta, porque realmente eu não conheço bem como é o processo aí dentro. O que eu vejo que no Tribunal de Contas da União faz muito sentido, funciona muito bem? É o fato de, quando um processo vem para mim como auditor, eu me manifesto naquele processo, eu assino aquele processo, e a minha manifestação está ali dentro.
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Depois, ela vai percorrer todo o trâmite que tem que percorrer, um diretor vai avaliá-la e vai dar a opinião dele, um secretário vai dar a opinião dele, mas minha opinião está resguardada. Eu me lembro da primeira vez em que eu entrei no Tribunal de Contas da União, no primeiro mês, quando eu fiquei sabendo disso, eu fiquei muito surpreso, porque eu vinha do Poder Executivo. Aliás, no Poder Executivo você não tem essa autonomia; como auditor, você tem.
Este mecanismo, que permite opiniões de todos os técnicos que participam do processo até que uma decisão política eventualmente seja tomada, acho, é bem importante. Eu não sei se os senhores concordam, mas eu diria que este é um mecanismo que talvez fizesse sentido também para que as manifestações técnicas pudessem estar resguardadas como manifestações de opinião, como se acredita que devam estar registradas. Ninguém precisa concordar com ela, mas a opinião foi registrada.
A vantagem é que se tem uma grande transparência em relação à diversidade de opiniões e sobre quem está decidindo de uma forma ou de outra. Eu acho que este é um caminho interessante, assim como acho interessante o caminho que pensa mais na possibilidade de interação. Nós nos ressentimos um pouco quanto a oportunidades para vir falar no Congresso. Assim, quando nós agradecemos, como eu fiz no início ao Deputado Félix, o agradecimento é muito sincero, não é uma formalidade, porque nós sabemos que nosso trabalho no Tribunal de Contas só é efetivo para valer quando consegue ser canalizado para quem toma a decisão política, e quem toma a decisão política e para quem nós atuamos é o Congresso Nacional.
Portanto, é importante que nós tenhamos mais oportunidades, mais audiências, mas mais obrigações também. É importante que este seja um procedimento regular. Amanhã, por exemplo, haverá a apreciação das contas do Presidente. Talvez não seria o caso de se ter isso como regra ou, depois que se tem isso, duas semanas depois, o Relator ou a área técnica, se isso for autorizado pelo Relator, possa vir ao Congresso e falar para a CMO sobre os principais pontos? Acho que, se nós tivéssemos estas iniciativas com mais frequência, se esta prática fosse institucionalizada, seria um ganho diante de algumas alternativas.
O SR. CELMAR RECH - Eu vou apenas complementar, dando um toque mais federativo aos entes subnacionais, sem particularizar nenhum Estado.
Do ponto de vista do endividamento, o que nós temos de limite definido nas regras das resoluções do Senado Federal foi criado num ambiente em que o endividamento era absolutamente descontrolado. Na verdade, se nós olharmos para as unidades da Federação, na grande maioria, em todos os Municípios, os limites de fluxo e de estoque de dívidas existentes são absolutamente inócuos, na maioria, porque não há mais aquela realidade. Eu penso que visitar aqueles indicadores pode ser uma iniciativa importante, talvez um mecanismo mais inteligente do que uma forma absoluta como a que está posta. Eu acho que talvez uma reflexão do Congresso Nacional, com a participação do Tribunal de Contas da União, dos Tribunais de Contas dos Estados e do Ministério da Fazenda, possa trazer um critério mais inteligente aos limites atuais de endividamento dos entes subnacionais.
Eu aproveito para fazer um registro histórico de que, com o refinanciamento da dívida em 1997, foi associado um programa de ajuste fiscal das unidades da Federação, e novos endividamentos estariam sujeitos aos limites estabelecidos pelo Senado. Ninguém atendia aos limites, porque havia um endividamento muito grande. No entanto, como havia o programa de ajuste fiscal associado ao refinanciamento, se o programa de ajuste fiscal tornasse exceção um eventual novo endividamento, era possível. Foi isso que aconteceu.
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Todo novo endividamento de ente subnacional estava na excepcionalidade do programa de ajuste fiscal porque a trajetória o permitia. Como o limite foi se tornando elastecido, hoje o gestor de plantão, seja o Prefeito, seja o Governador, olha aquele limite da dívida de duas vezes a sua receita, entende que existe uma margem para o endividamento e busca o recurso para fazer um investimento, já que, no seu orçamento, ele não consegue margem para investir — a margem é muito pequena. Assim, ele busca se endividar, ao atender aos limites.
Eu penso que há, neste caso, um espaço para nós trazemos inteligência a este processo, sobretudo quando alguma moeda estrangeira está envolvida. Nós temos endividamentos recentes em que foram contratadas operações por entes subnacionais ao dólar entre 2,80 reais e 3,20 reais. Agora precisam pagar o dólar a 5 reais, e a receita estadual ou municipal não comporta aquele endividamento. Diante disso, é preciso trazer mecanismos como o hedge. É preciso, enfim, olhar estes pontos com um olhar mais contemporâneo.
Eu acho que a CAE pode, sim, fazer audiências públicas como esta para discutir quais são os melhores mecanismos de endividamento de forma responsável pelas unidades da Federação, e os tribunais de contas, acho, podem e devem atentar e contribuir mais para este processo de endividamento dos entes subnacionais.
O SR. PRESIDENTE (Félix Mendonça Júnior. PDT - BA) - Muito obrigado, Dr. Celmar e Dr. Leonardo.
O SR. PRESIDENTE (Félix Mendonça Júnior. PDT - BA) - Perfeito!
O SR. PRESIDENTE (Félix Mendonça Júnior. PDT - BA) - Com a palavra o Dr. Luiz Humberto Veiga, nosso consultor.
Muito obrigado, Deputado. Eu queria agradecer também ao Dr. Celmar e ao Dr. Leonardo as excelentes apresentações que fizeram.
Eu fico vendo o D'Ávila no seu desânimo, digamos, bipolar, mas realmente ele resolveu rapidamente ter ânimo com as palavras do Deputado Félix. Meu caso é um pouco parecido, mas eu fico focado no sistema financeiro. Eu saio um pouco da questão orçamentária, que é bem mais ampla, e olho para a questão do sistema financeiro.
Fazendo um paralelo, se eu voltar para a questão do dinheiro que foi emprestado ao BNDES, eu vejo duas pessoas atuarem: eu vejo o D'Ávila com uma visão de auditor, vejo o Dr. Leonardo com uma visão de auditor, que é forjado na auditoria. Ambos são forjados na auditoria, mas o Dr. Leonardo faz uma manifestação no sentido de entender que ele deve buscar o cumprimento da norma, da lei. Eu vejo outro lado, o lado de que talvez o D'Ávila se ressinta mais: a questão que envolve a elaboração da lei.
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Eu vou fazer este preâmbulo apenas para chegar ao ponto a que eu quero chegar. Esses recursos ou empréstimos que foram feitos e o acordo, a forma do custo orçamentário para lidar com esses empréstimos, que foi, na maioria, a equalização da taxa — eu confesso que não conheço os detalhes de todas as operações —, que era realmente o custo, em que o BNDES fazia a captação a um valor e emprestava a outro valor, emprestava mais barato, foram fruto de uma decisão do Congresso. É lógico que nós podemos questionar o Executivo nisso ou naquilo, mas a decisão foi do Congresso, da mesma forma como se deu em relação à autonomia do Banco Central, da mesma forma como foi, recentemente, a autorização para a recepção de depósitos voluntários remunerados. Hoje já existem os depósitos compulsórios remunerados e os depósitos voluntários remunerados, que foram aprovados nesta semana. Eles ainda não viraram lei por falta de sanção, mas eu não creio que haverá grandes problemas com relação a isso.
Agora vou para o ponto que me aflige um pouquinho. Eu fiquei muito feliz em ouvir a apresentação do Dr. Leonardo. Aliás, eu quero pedir desculpa ao Dr. Celmar porque minha área não é realmente muito a orçamentária, menos ainda a questão dos entes subnacionais, embora, mais uma vez, eu tenha ficado muito feliz com a apresentação dele, ao me trazer este conhecimento. Por outro lado, quando nós vamos falar do Orçamento, nós lembramos que pedimos autorização ao Congresso para realizar gastos. Eu imagino que este seja o ponto principal, o ponto que talvez tenha vindo com aquela medida de empréstimo ao BNDES: "Eu quero a autorização do Congresso para fazer gastos com esta minha política aqui, para beneficiar os setores A, B, C", seja lá qual for a política econômica.
Aí vem outro ponto, enfatizado do começo ao fim pelo Dr. Leonardo: o pedido de autorização ao Congresso para executar determinada política econômica cujo custo, que era a equalização de taxas, deveria ter vindo. Deveria ter vindo a estimativa de custo porque nós sabemos que a previsão orçamentária é pré-requisito para a aprovação de medidas que signifiquem gastos. Neste caso, é preciso ter a previsão orçamentária e tudo mais. Ela é um pré-requisito.
O que acontece hoje? Hoje, para um Parlamentar conseguir, por exemplo, auxiliar determinado Município a fazer uma praça ou um posto de saúde, ele precisa ter uma dotação orçamentária.
Para gastar em um investimento no Estado ou no Município, é necessário que haja uma dotação orçamentária. Por outro lado, nós temos algo que não é de 2008, nem 2009 nem de 2015. É algo bem anterior ao que foi confirmado na Lei de Responsabilidade Fiscal. Refiro-me ao gasto com política monetária e política cambial. Nem a política monetária nem a política cambial têm previsto para elas qualquer orçamento. Aí, é óbvio que alguém vai dizer: "Mas não pode". Tudo bem! Quem quiser entrar nesta discussão que entre. Eu só estou mostrando que existe um tratamento desigual.
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Para fazer política monetária, eu não tenho um limite. Uma coisa é subir a taxa SELIC. Ao subir a taxa SELIC, você afeta, por um lado, a taxa dos títulos públicos e, por outro lado, você vai ter que captar recursos das pessoas. Aí estão as operações compromissadas e agora esta nossa novidade, este nosso novo produto na prateleira do Banco Central: os depósitos voluntários remunerados. Isso, teórica e supostamente, estaria, de um lado, fora do custo da dívida, mas, do lado de cá, estaria gerando dívida e custo.
Eu fiquei muito feliz com esta atenção. Com isso, eu falei da alta da SELIC. E o swap cambial? A partir do momento em que o Banco Central entra numa operação derivativa de um lado cambial, digamos, ajudando na redução da moeda ou na subida da moeda — seja qual for o lado que ele escolher, porque ele pode estar nas duas posições, principalmente com a lei de autonomia do Banco Central que saiu agora —, existe, sim, um custo fiscal.
É óbvio que pode haver o contrário. Imaginem que eu tenha lá uma carteira de dólar adquirida por 2,80 reais. Amanhã esse dólar sobe para 5 reais e gera um benefício, gera um ganho contábil para o País.
Deixe-me comentar, primeiro, um ponto antes da sua pergunta, um ponto na evolução do seu raciocínio. Uma coisa é olharmos como aconteceram as colocações de títulos. Foram emitidas medidas provisórias que depois foram convertidas em lei pelo Congresso. Assim, o primeiro movimento tem a aprovação do Congresso.
Esta questão do rito orçamentário para a autorização de despesa precisaria existir não somente para os subsídios, mas também para a própria receita.
É preciso ter a receita, que vai entrar quando se coloca esses títulos, e é preciso ter a despesa, já que se está emprestando para o banco. Até isso precisa constar, mesmo que seja exatamente no mesmo valor. Pelo princípio do orçamento bruto, é preciso ter as suas receitas e as suas despesas.
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E por que isso é importante? Tem esse sentido da aprovação no Congresso. E essa aprovação orçamentária não é suprida por uma aprovação de lei ordinária. O rito orçamentário é diferenciado, de fato, e ele obriga que, em um determinado momento, todas as possibilidades de avalizar receitas e despesas disponíveis aconteçam.
Então, quando se coloca tudo em um mesmo momento, tem-se um momento em que a questão tem soma zero. Se eu vou ampliar aqui, vou tirar de outro lugar. Posso até escolher fazer mais despesa, mas aí vou ter que fazer mais receita. Isso tudo vai ficar muito mais explícito, e nós vamos ter todo o controle que existe do procedimento orçamentário, que é maior do que o do procedimento de uma lei ordinária.
Um bom exemplo disso é o caso das renúncias, que realmente não passam para o Orçamento. Não tem como passá-las para o Orçamento. Porém, a qualquer momento do ano, é muito fácil passar uma renúncia de receitas. Ela parece não ter custo. No caso dela, é mais evidentemente. E ela está fora da discussão.
Então, o que nós vimos foi o seguinte: sair de dois pontos percentuais do PIB para quatro e pouco em um período de 15 anos mostra como é fácil fazer subir esse mecanismo, quando não se tem o conjunto das regras que, quando está dentro do processo do procedimento orçamentário, se passa a ter.
Por exemplo, no caso do BNDES — e aí, de novo, sem discutir o mérito ou não da política —, imagine qual seria o mecanismo normal. O mecanismo normal seria o seguinte: eu estou autorizado pelo Congresso a colocar 100 bilhões, por exemplo, no BNDES. O que eu vou fazer? Eu vou emitir 100 bilhões em títulos, vou colocar isso em mercado competitivo, vou arrecadar esse dinheiro, vou recolhê-lo à conta do Tesouro, vou colocar essa receita. Essa receita vai aparecer no Orçamento, e eu vou fazer uma despesa. Ao fazer isso, nós ainda temos um outro ganho, além do controle orçamentário em si.
A pergunta que nós podemos fazer é esta: seria realmente possível ter colocado 100 bilhões, 200 bilhões ou 500 bilhões, em 5 anos? O mercado comportaria isso? Qual seria o impacto disso? E aí se perde isso. De uma vez, coloca-se tudo lá e perde esse mecanismo.
Então, o fato de passar pelo Orçamento e de ter um regramento bem estabelecido traz alguns ganhos. Não há um controle só do Congresso, da transparência, da sociedade, mas se cria mecanismos até para as questões econômicas prevalecerem e, enfim, evitarem que se tenha, por exemplo, uma mega-alavancagem para a qual não há o respaldo adequado. Acho que esse é um ponto importante.
E aí, voltando à questão das demais políticas, como eu disse, eu acho que esse é um ponto em que nós precisamos atuar mais. Eu aproveitei que o Conselheiro Celmar fez um mea-culpa e faço isso também.
Eu acho que essa é uma área em que nós atuamos pouco, é uma área em que temos pouca atenção. Eu me ressinto um pouco disso pessoalmente. Acho que nós precisamos pensar. Realmente, o mínimo que precisamos ter...
É aquilo que eu estava dizendo: é muito difícil, porque não é só no Brasil. Quando nós vamos estudar, por exemplo, o insulamento burocrático, o Banco Central é considerado exemplo em qualquer lugar do mundo. Ele é como os órgãos que são teoricamente insulados das influências políticas.
O órgão que vai tomar decisões altamente técnicas e, ao mesmo tempo, altamente sensíveis precisaria, em tese, ser blindado de qualquer influência externa para fazer escolhas, com base na sua autonomia, do que seria o melhor tecnicamente.
O problema desse modelo é que ele pressupõe que quem está lá decidindo sempre vai decidir conforme o interesse da sociedade, e isso é um problema. Nós não temos por que supor isso em lugar nenhum, em nenhuma instituição humana. Então, acho que esse é um grande problema. Nós precisamos pensar em como melhoramos o controle sobre isso.
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Eu não sei se é possível estabelecer limites, mas é fundamental estabelecer pelo menos condições procedimentais mais adequadas, de uma transparência a priori e de um regramento, para garantir que a sociedade possa ter conhecimento e controle, e não simplesmente lidar com os impactos — e digo isso sem nenhum tipo de julgamento sobre o que está acontecendo hoje.
Imaginem que as coisas estejam acontecendo de uma maneira errada, imaginem que nós estejamos eventualmente subindo a taxa de juros muito mais do que deveríamos, ou tomando outras decisões de política monetária ou cambial que vão impactar depois a dívida pública e vão impactar a vida das pessoas. Não faz muito sentido nós chegarmos depois, só para registrar o estrago e tudo bem, não é? Acho que esse é um grande desafio.
Nós não temos no Tribunal nenhum trabalho, Humberto, que eu tenha conhecimento — talvez haja algum —, que estabeleça como nós deveríamos atuar nessa área. E, por isso, eu digo que acho que me ressinto de não termos avanços nessa área. Eu acho que, quando nós olhamos para as finanças públicas, esta é uma das linhas em que nós ainda não avançamos e em que nós precisamos avançar, pensando como o órgão de controle consegue garantir e como é que nós conseguimos ajudar o Congresso a exercer o papel de chamar o Banco Central, chamar os agentes, chamar o Conselho Monetário Nacional, sentar, fazer audiência, explicar as escolhas, explicar o custo... Nós sempre dizíamos isso: "Olha, houve uma discussão recente sobre o nível das reservas internacionais". E aí, havia a discussão: "Mas é bom ou é ruim?" Tem lado bom e tem lado ruim, precisa ser transparente, precisa justificar essas escolhas. Não pode contar, depois, que havia um custo lá e ninguém sabia.
Então, é isso. Acho que, no mínimo, nós precisamos ter um esforço para garantir que haja transparência sobre benefícios e custos, fundamentação das decisões e regras de procedimentos — eventualmente não quantitativas, mas procedimentais —, para que nós possamos ter mais controle. Eu acho que nós precisamos avançar. Talvez, dentro da lógica de sugestões do Deputado Félix, esse seja um ponto em que nós precisemos refletir juntos sobre o que nós precisamos fazer no órgão de controle, em que nós precisamos ajudar o Congresso e trazer para ele, para que nós tenhamos maior controle da política. Mesmo que, pelas suas características, eventualmente, ela não possa estar dentro do Orçamento, temos de garantir que, apesar disso, tenhamos mecanismos robustos que garantam, pela especificidade ou por não ser a atividade fiscal do Estado que se controle via Orçamento, mas que se tenha condições de fazer isso. Acho que é uma ótima proposição. Nós temos pouca coisa sobre isso, mas eu acho que esse é um ponto em que nós podemos avançar sim, Humberto.
O SR. LUIZ HUMBERTO CAVALCANTE VEIGA - Eu queria agradecer e só fazer um comentário. Nós temos uma previsão, na Lei de Responsabilidade Fiscal, inclusive, de apresentação a posteriori dos gastos. Por alguns anos, nem sequer houve a chamada do Presidente do Banco Central para cumprir essa disposição de que era para haver uma reunião conjunta, lá do Banco Central. Nem sequer houve essa participação. Quer dizer, o Banco Central nem sequer participou. Nós entramos em contato para conversar sobre isso, e a justificativa foi de que ele estava à disposição. Ele havia apresentado o relatório e estaria à disposição, esperando ser chamado.
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11:59
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O SR. PRESIDENTE (Félix Mendonça Júnior. PDT - BA) - Sim, D'Ávila, mas eu só quero falar uma coisinha para o Humberto antes.
Humberto, o senhor falou realmente que essas decisões passaram pelo Congresso. Eu vou um pouco mais além: são decisões do povo brasileiro, que elegeu o Congresso. Então, se nós temos o Congresso que temos, é porque a população votou nesses Deputados e Senadores que aí estão ou que aí estiveram no passado. Eu sempre alerto a população que não vote por brincadeira. Este não é o palco para nós conversarmos sobre isso, mas é infelizmente o que representa o povo brasileiro.
O SR. ANTONIO CARLOS COSTA D'ÁVILA CARVALHO JUNIOR - Só por curiosidade, até aproveitando a fala do Humberto, que colocou essas questões cambiais e monetárias que fogem um pouco do controle prévio do Congresso Nacional, há um ponto interessante. E eu tenho um trabalho de 2005 no Tribunal de Contas que alertou sobre isso e, de uma certa forma, 9 anos depois, acabou desaguando até nas causas do processo de impeachment em relação às pedaladas. O ponto é o seguinte: na realidade, quem faz a apuração do resultado fiscal do Brasil é o Banco Central. A apuração do resultado fiscal que é base para que se diga, por exemplo, se pode executar mais ou menos o seu orçamento por intermédio de contingenciamento, é feita pelo Banco Central, que é a autoridade monetária.
Então, o Banco Central, inclusive no aspecto fiscal, detém o controle de uma variável fundamental, que é a apuração oficial do resultado fiscal para fins de cumprimento de metas fiscais da LDO. O que é um negócio meio esquisito, porque, quem deveria ter todo esse ferramental e todas essas informações para apurar um resultado fiscal oficial deveria ser o Ministério da Fazenda, o Poder Executivo, e não o Banco Central, a autoridade monetária.
O SR. PRESIDENTE (Félix Mendonça Júnior. PDT - BA) - Bom, vamos lá. Alguém mais quer fazer o uso da palavra? Se alguém quiser acrescentar algo, fica franqueada a palavra.
(Pausa.)
Não havendo mais o que falar, eu vou declarar o encerramento, mas antes eu gostaria de ouvir as considerações finais do Dr. Leonardo e do Dr. Celmar e dizer que as medidas precisam ser de resposta rápida por parte do Congresso Nacional. Nós vamos buscar soluções para isso. E ainda vamos tentar ver o que nós podemos fazer sobre o que aconteceu no BNDES, mesmo que sejam medidas do Congresso Nacional para trazer esclarecimentos e mesmo que não sejam mais efetivas legal, criminal ou eleitoralmente. O que aconteceu no BNDES foi muito pior do que as pedaladas fiscais, mas vamos tomar medidas em relação a isso e pedir informações.
E, se houver alguma maneira ainda de tomar medidas cíveis e criminais, iremos tomá-las também. No momento em que tomamos conhecimento, nós não podemos só ouvir e deixar isso passar, sem uma atuação nossa.
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12:03
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Então, quero deixar essa informação e falar também sobre o Conselho de Gestão Fiscal — acho que foi uma sugestão do Dr. Celmar. Podemos estudar um pouco como ele funciona e tentar colocá-lo mais ativo, para que, de 3 em 3 meses, tenhamos informações. Podemos buscar algum dispositivo para fazer com que o Banco Central, quando o endividamento chegar a um limite, tenha que ouvir o Congresso Nacional. Ou seja, podemos preparar um conjunto de leis e procedimentos que ajudem o Brasil no futuro. Para isso, contamos com a colaboração dos senhores e dos nossos consultores.
O SR. CELMAR RECH - Muito bem. Quero mais uma vez agradecer e dizer que eu estou absolutamente à disposição da Câmara dos Deputados, do Senado Federal, enfim, do Congresso Nacional. Quero parabenizar V.Exa., Deputado Félix Mendonça, pela visão republicana de médio e longo prazo do que é importante que se faça para o País. Essa visão que grassa no Congresso Nacional é também a minha visão, os Deputados são muitíssimo bem intencionados no sentido de equacionar questões importantes e relevantes de médio e longo prazo para o País. Ao ver o senhor fazer esta nossa sessão aberta e, de uma forma muito franca, dizer que está disposto a receber sugestões de como nós podemos equacionar a questão da dívida pública federal, mas sobretudo a questão dos entes subnacionais que têm impacto na União, eu fico muitíssimo feliz de dar a minha contribuição, com a minha limitação, da minha história tanto no Banco do Brasil quanto no Tesouro Nacional e agora aqui no Tribunal de Contas do Estado.
Mais uma vez, quero agradecer imensamente a todos os senhores que estão aqui nos ouvindo, na pessoa do Deputado Félix Mendonça Júnior. Vemos a assessoria que o Congresso Nacional tem — e aqui, com algum inconformismo, alguns consultores colocam a sua dificuldade. Isso mostra muito claramente o quanto estão dispostos a contribuir para o bem e para o futuro do País. É desse jogo que eu estou participando, e estou sempre à disposição dos senhores.
O SR. PRESIDENTE (Félix Mendonça Júnior. PDT - BA) - Nós que agradecemos ao senhor, Dr. Celmar. Muito obrigado mesmo, de verdade.
O SR. LEONARDO RODRIGUES ALBERNAZ - Obrigado, Deputado. Acho que eu vou fazer coro com o Celmar, acho que o ponto principal dessa minha manifestação é agradecer a oportunidade de estar aqui. Como eu disse, algumas entidades de fiscalização medem e, inclusive, têm como indicador de desempenho a oportunidade de fazer depoimentos no Congresso Nacional. Então, certamente é uma honra poder estar aqui, trazer essas previsões e contribuir, minimamente que seja, para as discussões que são feitas. É uma discussão de extrema importância. Só de termos este momento aqui — não é, D'Ávila? —, já é uma injeção de ânimo para nós também. Ver o Congresso à frente disso, com o Deputado Félix puxando isso, com essa visão, para nós é a injeção de ânimo de que precisamos realmente para enfrentar as dificuldades que temos.
Se eu fosse dizer alguma coisa, Dr. Félix, em relação... Eu acabei trazendo o exemplo do BNDES porque ele mexia muito diretamente com títulos da dívida, e acho que é um exemplo bem eloquente, pelo tamanho que ele tem e pela quantidade de coisas que se movimentaram ali.
Mas eu diria que temos talvez dezenas de casos semelhantes, talvez não da magnitude do BNDES, mas, certamente, são vários casos de dezenas de bilhões de reais. E o Humberto trouxe um ponto: "Olha, isso foi autorizado pelo Congresso". Acho que esse é um ponto de reflexão — talvez o maior — que precisamos ter.
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Nós não chegamos ao ponto de as finanças estarem numa situação muito difícil exatamente porque um Governo sozinho errou. A minha visão sobre isso é a de que talvez a grande reflexão que precisamos fazer é como o conjunto das nossas instituições não foi capaz de impedir que as coisas evoluíssem como evoluíram e chegássemos a uma situação tão ruim do ponto de vista das finanças, do ponto de vista fiscal e do ponto de vista econômico também. Acho que essa é a reflexão.
Pegando o caso do BNDES como exemplo, quais foram os problemas de atuação? Em que o Executivo e os seus órgãos técnicos podem ter errado? Em que o Congresso, eventualmente, poderia ter atuado diferente? Em que o Tribunal Contas poderia ter atuado de forma diferente, com que velocidade, de que forma, com que abordagens? Eu acho que essas reflexões todas precisam ser trazidas.
Então, se eventualmente pegamos um caso, essa é uma reflexão da qual podemos extrair um aprendizado. Como é que podemos melhorar o funcionamento dessas instituições? Eu acho que todas elas melhoraram de lá para cá, ao longo desses anos. Mas, ainda assim, é preciso ter um aprendizado. Será que já melhoramos o bastante? Será que já resolvemos os problemas? Será que casos semelhantes não aconteceriam de novo ou aconteceriam?
Acho que esse é um aprendizado que precisamos ter. Talvez seja uma reflexão bastante boa de se trazer para cá. Acho que é um ponto interessante.
Deputado, agradeço a V.Exa. e aos consultores. É um prazer estar aqui com o Conselheiro Celmar. E fico também à disposição, tanto eu quanto os colegas auditores do Tribunal de Contas da União, as unidades técnicas. Como eu disse, os experts estão lá. Eu estou os representando aqui, mas eles são pessoas que conhecem o tema. Então, sempre que quiserem trazê-los aqui, estamos à disposição para vir, para conversar e para ajudar no que for possível. E fica esse compromisso de eu me reunir com as equipes que lidam com o tema de finanças públicas, inclusive com a fiscalização do Banco Central, e trazer sugestões para que possam ser eventualmente incorporadas nos trabalhos decorrentes desta audiência.
O SR. PRESIDENTE (Félix Mendonça Júnior. PDT - BA) - Agradeço ao senhor, Dr. Leonardo, e a todos aqui presentes.
Realmente, este estudo não tem o objetivo de apenas fazer uma fotografia; ele tem o objetivo de ver a situação atual e propor melhorias de fiscalização e controle, para que tenhamos uma dívida pública mais sob controle. Não vamos dizer que somos contra a dívida pública, não. A dívida pública é boa, porque ela pode... Mas temos que ter controle, saber como é que ela evolui, saber quando ela passa a ser prejudicial à Nação.
Nada mais havendo a falar, declaro encerrada a presente reunião, mais uma vez agradecendo a todos, à Juliana, que coordena a nossa reunião, ao João Motta, ao D'Ávila.
Muito obrigado a todos os presentes e vamos contribuir com a Nação brasileira. Vamos contribuir. Eu não tenho dúvida de que daqui vão sair propostas efetivas, e vamos estar todos nós brigando para que elas sejam aprovadas no Congresso Nacional. Que possamos fazer uma Nação melhor para as futuras gerações brasileiras!
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