Horário | (Texto com redação final.) |
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O SR. PRESIDENTE (Carlos Veras. PT - PE) - Bom dia a todos os senhores e as senhoras.
Declaro aberta esta audiência pública da Comissão de Direitos Humanos e Minorias, destinada a tratar das recomendações recebidas pelo Brasil no âmbito da Revisão Periódica Universal — RPU sobre instrumentos internacionais, Tribunal Penal Internacional e crimes de segurança.
O evento é consequência da aprovação do Requerimento nº 14, de autoria deste Presidente, e subscrito pelos Deputados Bira do Pindaré, Erika Kokay, Frei Anastacio Ribeiro, Joenia Wapichana, Padre João, Sâmia Bomfim e Sóstenes Cavalcante.
Trata-se da quinta audiência pública do Observatório da RPU, sediado nesta Comissão, fruto de parceria entre a Câmara dos Deputados e o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos. A RPU é uma avaliação mútua entre os países que compõem as Nações Unidas quanto à situação de direitos humanos, ao tempo em que gera um conjunto de recomendações. A metodologia detalhada, o conjunto de recomendações em exame e mais informações podem ser encontrados no portal www.camara.leg.br/observatoriorpu.
Os expositores falarão por 5 minutos, e os Parlamentares inscritos poderão usar a palavra pelo tempo de 3 minutos.
O SR. MINISTRO ADRIANO SILVA PUCCI - Bom dia, Sr. Deputado Carlos Veras. Em nome do Chanceler Carlos França e de toda a instituição, eu gostaria de saudá-lo e de cumprimentar os demais Parlamentares e outros representantes que participam deste momento de exercício da democracia e do diálogo parlamentar neste foro.
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O Itamaraty considera este exercício valioso e buscará recolher as sugestões, as impressões e as preocupações dos Parlamentares brasileiros e de outros órgãos do Governo e da sociedade civil, no sentido de alinhar nossas percepções e promover externamente as conclusões deste debate.
Hoje nós temos cinco recomendações sob exame. A este respeito, eu gostaria de apontar a presença, aqui, de dois especialistas nos temas que serão tratados. Primeiramente, o Ministro Marcelo Araújo, Chefe da Divisão de Direitos Humanos do Itamaraty, que se ocupará da explanação dos itens 21 e 22 desta pauta; e o Diplomata-Secretário Pedro Sloboda, da Divisão de Nações Unidas, que também dará sua contribuição e fará sua análise sobre os itens 18, 19 e 29.
Muito embora a organização do Itamaraty seja de competências difusas, de forma que a minha representação neste momento não esgota todo o escopo das competências que estes questionamentos suscitam, eu fiz questão de estar presente com os colegas, não só para apresentar uma resposta, mas também para sinalizar a importância que nós concebemos aos insumos e às contribuições que os Parlamentares possam trazer para esta reflexão.
O SR. PRESIDENTE (Carlos Veras. PT - PE) - Muito obrigado, Sr. Adriano.
Em tempo, quero agradecer aos consultores legislativos David Carneiro, Eduardo Granzotto, Marcelo de França, Mariana Barreiras, que elaboraram o relatório preliminar que está em discussão nesta audiência. Em nome da Comissão de Direitos Humanos e Minorias, muito obrigado pela elaboração deste relatório preliminar, que subsidia, inclusive, este debate nesta audiência pública.
Eu sou o Chefe da Divisão dos Direitos Humanos no Itamaraty e é com grande satisfação que participo desta sessão. Fico muito honrado por estar aqui para participar desta iniciativa do Observatório Parlamentar, iniciativa que eu gostaria de saudar, iniciada no fim de 2019, com o apoio do Escritório do Alto Comissariado da ONU para Direitos Humanos.
Eu vou tentar me ater ao tempo de 5 minutos e tratarei especificamente de duas recomendações que temos na pauta da sessão de hoje. A primeira delas diz respeito à Recomendação nº 21, feita pela Costa do Marfim, que pede ao Brasil que reforce sua cooperação produtiva, frutífera, com os organismos dos Órgãos de Tratado das Nações Unidas.
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Muito rapidamente, vou dar uma ideia do que são os Órgãos de Tratado das Nações Unidas. Trata-se de comitês formados por especialistas, peritos independentes, que monitoram a implementação dos 9 tratados internacionais de direitos humanos: 2 pactos sobre direitos civis e políticos e de direitos econômicos e sociais e 7 convenções, que dizem respeito à eliminação do racismo, aos direitos das mulheres, aos direitos das crianças; contra a tortura, contra desaparecimentos forçados; aos direitos das pessoas com deficiência e aos direitos dos trabalhadores migrantes. Dos 9 tratados, o Brasil apenas não ratificou o último que eu mencionei — direitos dos trabalhadores migrantes. Todos os demais nós ratificamos. Embora sejam 9 os tratados fundamentais, são 10 os comitês. Há um subcomitê específico referente ao protocolo da convenção contra a tortura, que acompanha os mecanismos nacionais de combate à tortura, mecanismos também independentes, mas criados em âmbito nacional para atender aos requisitos desse protocolo, que o Brasil também ratificou — nós temos o nosso —, para fazer visitas a estabelecimentos penitenciários e garantir que não haja tortura.
O Brasil mantém uma relação muito produtiva com os Órgãos de Tratado das Nações Unidas e estamos empenhados em sempre reforçá-la. Esta relação se concretiza na prática, sobretudo, pelo cumprimento das nossas obrigações convencionais, que são estabelecidas nesses tratados que eu mencionei. Eles exigem, por exemplo, que o Estados-partes apresentem relatórios periódicos sobre o cumprimento dos direitos que são protegidos por cada um desses tratados. Os comitês existem em grande parte para avaliar o contínuo cumprimento das convenções e dos pactos pelos Estados-partes. O Brasil tem cumprido essas obrigações convencionais e apresentado seus relatórios periódicos.
Durante o Governo do Presidente Bolsonaro, nós honramos o compromisso de apresentação de relatórios atualizados, um trabalho que envolve diversas pastas, diversos órgãos, sob a coordenação do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos. Como eu disse, nos últimos 2 anos, desde 2019, nós apresentamos diversos desses relatórios, alguns após muitos anos de mora. Agora, o Brasil está quase em dia com a apresentação de todos eles. Isso não é um feito menor, pois apenas 15% dos Estados-partes cumprem a obrigação de reportar, segundo dados do próprio secretariado da ONU. O exame desses documentos pelos comitês exige tempo, já que os relatórios são longos.
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A própria ONU reconhece que há um atraso na avaliação dos relatórios apresentados, que toma tempo. Após a apresentação do relatório, o que acontece? Os comitês devem examinar todos os dados e as informações que os Estados apresentaram e, depois, convidar o Estado a fazer a defesa do relatório perante os peritos de cada comitê.
O Brasil apresentou, nos últimos 2 anos, os relatórios iniciais da Convenção sobre Desaparecimento Forçado e do protocolo facultativo à Convenção dos Direitos da Criança sobre Tráfico de Criança. Apresentou, também, os relatórios periódicos de cumprimento do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos e do Pacto de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, além dos relatórios da Convenção para Eliminação da Discriminação Racial e da Convenção dos Direitos das Pessoas com Deficiência.
A próxima etapa será a defesa do relatório perante os peritos dos comitês. Será preciso também todo um esforço de coordenação com os órgãos nacionais competentes. O Itamaraty, no entanto, jamais poderia fazê-lo sozinho. Geralmente, quando ainda não havia a situação de pandemia, as reuniões aconteciam em Genebra, e o Brasil enviava uma delegação multiministerial, muitas vezes chefiada por Ministro de Estado.
A delegação vai responder a perguntas dos peritos e ter a oportunidade de fazer os esclarecimentos necessários. O próximo relatório examinado que o Brasil apresentou será o do Comitê sobre Desaparecimentos Forçados. Eles já nos anunciaram, o Secretariado da Alta Comissária já comunicou formalmente ao Brasil, que nós deveremos participar deste diálogo construtivo com o comitê na próxima sessão do comitê, que deverá realizar-se em setembro deste ano.
Além da apresentação dos relatórios, nossa relação com os comitês e a importância que nós damos também são sinalizadas pela participação de brasileiros em alguns desses comitês como peritos independentes. São peritos independentes do Governo, mas eles contaram com o apoio do Governo para sua eleição.
Nós temos a honra de ter a Senadora Mara Gabrilli no Comitê de Direitos das Pessoas com Deficiência. No Comitê de Direitos Econômicos Sociais e Culturais, nós temos o Prof. Renato Zerbini Leão, que foi reeleito em 2018, e, no Comitê para Eliminação da Discriminação Racial, nós temos o Embaixador Sílvio de Albuquerque.
Como o tempo é curto, eu quero passar para a segunda recomendação que eu ia abordar, que se refere ao pedido de que o Brasil reforce ainda mais seu envolvimento ativo com a comunidade internacional para promover os direitos humanos em todas as áreas. Foi uma recomendação apresentada por Mianmar, uma recomendação bastante genérica, mas nós estamos trabalhando para reforçar este envolvimento com a comunidade internacional.
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Isso se dá de duas maneiras: nos fóruns multilaterais, no Conselho de Direitos Humanos, na Assembleia Geral da ONU, pelo contato com as outras representações permanentes junto às Nações Unidas, pela participação ativa em diversos grupos que copatrocinam resoluções sobre variados temas, tanto na Assembleia-Geral das Nações Unidas, como no Conselho de Direitos Humanos; e no âmbito bilateral.
No âmbito multilateral, eu queria destacar, mais uma vez, a reeleição do Brasil em 2019 para o Conselho de Direitos Humanos. Este é o quinto mandato que o Brasil exerce no órgão, mandato que se prolonga até o ano que vem, em 2022. Isso comprova o compromisso permanente do País com os direitos humanos e nossa opção pela continuidade de um papel ativo na área nos fóruns multilaterais. O Brasil teve expressiva votação, a maior do grupo latino-americano, com um número de votos superior ao obtido na eleição anterior, em 2016. Nós também já lançamos nossa candidatura para o próximo mandato. O Brasil, por requerimento do regulamento do Conselho de Direitos Humanos, não pode ser reeleito ou se candidatar à reeleição em 2023. É necessário que o País, após uma reeleição, passe 1 ano distante do conselho. Assim, nós já lançamos nossa candidatura para 2024 e estamos trabalhando nisso no Itamaraty.
No âmbito bilateral, que eu mencionei, nós temos diálogos sobre os direitos humanos com a Suíça e com a União Europeia. São diálogos anuais de alto nível, no nível de Vice-Ministros, em que se aborda toda uma agenda referente aos direitos humanos. Consideramos especialmente importante o diálogo com a União Europeia, que tem uma seção dedicada à sociedade civil. Recebe-se um input de organizações não governamentais, brasileiras e europeias, que são convidadas a participar. A última reunião aconteceu no início de dezembro do ano passado e foi precedida por um seminário da sociedade civil entre a União Europeia e o Brasil, no fim de novembro, se não me engano. Foram discutidos diversos temas, entre eles os direitos das pessoas vulneráveis, dos povos indígenas, das mulheres, bem como as liberdades fundamentais e toda a agenda dos direitos humanos.
Nós estamos trabalhando para reforçar nosso envolvimento com a comunidade internacional. Agora, com a administração do Presidente Joe Biden, nos Estados Unidos, nós queremos retomar o diálogo com os americanos. Estamos trabalhando com nossa Embaixada em Washington para propor esta retomada. Houve, no passado, um grupo de trabalho sobre direitos humanos com os americanos, criado em 2015, mas que deixou de reunir-se há bastante tempo. A última reunião foi realizada em 2016.
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Portanto, nós queremos retomar o diálogo, de forma a buscar desenvolver posicionamentos comuns, cooperação em políticas públicas, intercâmbio de experiências, uma série de iniciativas nos fóruns multilaterais, na ONU e na Organização dos Estados Americanos, de que o Brasil e os Estados Unidos participam. Nós achamos que este é o momento oportuno para isso, tendo em vista a prioridade que a administração de Biden e do Secretário de Estado Blinken tem conferido ao tema direitos humanos. Nós já temos mantido um contato estreito em Nova York e em Genebra, entre nossas missões, para tratar também de cooperação nesta área.
O SR. PRESIDENTE (Carlos Veras. PT - PE) - Muito obrigado, Sr. Marcelo, pela contribuição. Nós conseguimos ouvir toda a sua apresentação, Marcelo. Houve um problema no nosso som, e vocês não estavam conseguindo nos ouvir. Muito obrigado pela apresentação.
Eu gostaria apenas de colocar, numa visão panorâmica e sob uma perspectiva, estes três itens da pauta, para situar o Brasil no âmbito do tema tribunal penal internacional como um todo e assinalar que o Brasil, desde 1998, é membro participante, ativo, dinâmico e construtivo dos trabalhos deste tribunal. O País não só assinou o Estatuto de Roma, em 1998, como o internalizou ainda naquele ano. O Brasil também é signatário das Emendas de Kampala.
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Nós temos uma trajetória no Tribunal Penal Internacional. A Juíza Sylvia Steiner integrou esse tribunal de 2003 a 2012 e hoje faz parte do Comitê Consultivo para as nomeações. O Brasil também integra a Mesa Diretora do Tribunal Penal Internacional, onde são tomadas as mais importantes decisões na área de governança e de métodos de trabalho desse tribunal.
Antes de passar a palavra ao Secretário Pedro, quero lembrar que este processo de plena implementação interna desta legislação envolveu, no arco do tempo, vários governos. Trata-se, de uma ação de Estado que, vale lembrar, retroage ou remonta, no caso das Emendas de Kampala, a 2010 e, no caso da imprescritibilidade da convenção, a 1968.
Nossa posição, de modo amplo, em relação a esta audiência pública é de convergência, visando a recordar que a jurisdição do TPI é subsidiária à brasileira e que ele intervém nos casos em que o Estado não possa ou não queira aplicar estas disposições com o consentimento do Estado-parte, o consentimento original, de forma que, muito embora a regulamentação ou positivação dessas normas seja desejável, isso não prescinde a aplicação pela legislação nacional.
Presidente, nós temos na pauta de hoje três recomendações no âmbito do atual Mecanismo de Revisão Periódica Universal que são da alçada do Departamento de Nações Unidas. A primeira delas é a Recomendação nº 18, feita por Liechtenstein, para que o Brasil ratifique as Emendas de Kampala ao Estatuto de Roma.
Como o Ministro Adriano bem colocou, o Brasil teve um compromisso com o Tribunal Penal Internacional desde o início. Nós fomos negociadores ativos tanto do Estatuto de Roma, em 1998, como das Emendas de Kampala, em 2010. Aliás, nosso compromisso com o Tribunal Penal Internacional se encontra na nossa própria Constituição, no § 4º do art. 5º, inserido pela Emenda Constitucional nº 45, em 2004.
As Emendas de Kampala, de 2010, basicamente tipificam o crime de agressão, o que não foi possível fazer na Conferência de Roma, em 1998, porque agressão é basicamente o uso da força pelo Estado de forma ilícita, e o Tribunal Penal Internacional julga apenas os indivíduos. Em 1998, não foi possível chegar a uma definição deste crime que atribuísse ao indivíduo uma conduta que é típica do Estado. Isso foi feito em 2010, na conferência de revisão que aprovou as Emendas de Kampala, atribuindo-se como indivíduo basicamente aquele que tem condições de preparar ou de dar início a um ato que signifique uma agressão armada por parte do Estado.
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O Brasil é signatário das Emendas de Kampala, emendas que se encontram em processo de ratificação. No momento, as emendas, os textos autênticos, os textos autenticados das Emendas de Kampala, com a respectiva tradução para a língua portuguesa e a exposição de motivos, encontram-se no Gabinete do Ministro de Estado das Relações Exteriores para que sejam assinados e enviados à Casa Civil e posteriormente submetidos a este Congresso Nacional.
A segunda recomendação no âmbito do Mecanismo de Revisão Periódica Universal atinente ao Departamento de Nações Unidas na pauta de hoje é a Recomendação nº 19, da Armênia, que consiste em ratificar a Convenção sobre a Imprescritibilidade dos Crimes de Guerra e dos Crimes contra a Humanidade. Esta convenção foi adotada no âmbito das Nações Unidas em 1968 e entrou em vigor no âmbito internacional em 1970. Ela tem hoje 9 signatários e 56 Estados-partes propriamente ditos.
O Brasil não chegou a assinar esta convenção, muito menos chegou a enviá-la para o Congresso ou ratificá-la. Esta convenção basicamente determina a imprescritibilidade, como o nome já diz, dos crimes de guerra, dos crimes contra a humanidade e dos crimes de genocídio. O Brasil reconhece a imprescritibilidade destes três crimes, parte no Estatuto de Roma, e o art. 29 do Estatuto de Roma determina exatamente a imprescritibilidade de todos os crimes do tribunal que incluem especificamente estes três crimes.
Além disso, a própria convenção sobre a imprescritibilidade desses crimes, de 1968, refletia o costume internacional, o direito internacional costumeiro, vinculando já naquela época o Brasil. Isso ficou muito claro em 2018, quando a Corte Interamericana de Direitos Humanos, no caso Herzog, afirmou exatamente que o Brasil já se encontrava vinculado por estas normas da imprescritibilidade desses crimes graves em razão do direito costumeiro da época.
É claro que é necessário analisar a conveniência de se aderir a esta convenção. Por mais que, num primeiro momento, ela possa parecer redundante neste termo substantivo, ela tem dispositivos que determinam a regulamentação da imprescritibilidade em âmbito interno. Portanto, parece conveniente analisar esta possibilidade, conforme recomendado pela Armênia, tendo em vista uma maior segurança jurídica que haveria caso o Brasil aderisse a esta convenção.
Por fim, Presidente, a Recomendação nº 29, feita pela Estônia no atual ciclo de revisão periódica universal, alinha plenamente a legislação nacional com todas as obrigações decorrentes do Estatuto de Roma e do Tribunal Penal Internacional.
Com relação a esta indicação, eu gostaria de chamar a atenção para o Projeto de Lei nº 4.038, de 2008, de autoria do Poder Executivo, que basicamente regulamenta o Estatuto de Roma. Isso parece ser absolutamente essencial e já se encontra, naturalmente, no Congresso Nacional, em análise desde 2008, porque o Brasil hoje não tem regulamentados os crimes da competência do Tribunal Penal Internacional, à exceção do crime de genocídio, que nós regulamentamos pela Lei nº 2.889, de 1956, depois que nós aderimos, em 1952, à Convenção para a Prevenção e a Repressão do Crime de Genocídio, adotada em 1948.
Aqui eu gostaria de chamar a atenção para um ponto que o Ministro Adriano também comentou, que é o fato de que a jurisdição do Tribunal Penal Internacional é complementar às dos Estados e que os Estados-partes, como o Brasil, têm a obrigação de cooperar com o tribunal.
Isso significa, por um lado, que o tribunal não pode julgar nenhum indivíduo se algum Estado já o tiver julgado, ou se tiver interesse em julgá-lo. Uma das condições de admissibilidade de um caso no TPI é justamente a ausência de vontade ou de capacidade dos Estados-partes ou dos Estados com jurisdição sobre os crimes para analisar aquele caso. Se o Brasil não tem regulamentados os crimes da jurisdição do TPI, a rigor, ele não teria competência ou, no mínimo, teria dificuldade para julgar os crimes de competência do tribunal, isso aliado à obrigação de cooperar com o tribunal, prevista no Estatuto de Roma, e, inclusive, de eventualmente entregar indivíduos ao tribunal.
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Mesmo que nós fôssemos adotar, Presidente, uma visão monista, segundo a qual o Estatuto de Roma é lei no Brasil, ou seja, tem força de lei no Brasil, e se for entendido como um tratado de direitos humanos, tem força até mesmo supralegal e, se nós formos entender que desta forma esses tipos penais são tipos penais no Brasil, o que ainda seria polêmico à luz do princípio da legalidade estrita no âmbito do direito penal, ainda que fôssemos adotar esta interpretação, não existe pena prevista no direito brasileiro para cada um destes crimes. Certamente, não seriam as penas previstas no próprio estatuto, de modo que parece absolutamente essencial a regulamentação, com a brevidade possível, do Estatuto de Roma.
Esta regulamentação se daria por meio, notadamente, da aprovação deste projeto de lei de 2008, que já tem os tipos penais e a regulamentação, também, da cooperação do tribunal, que não está regulamentada neste momento. O Supremo Tribunal Federal já foi chamado a responder sobre isso e teve que aplicar institutos como a analogia a outros institutos de cooperação jurídica internacional justamente por causa da ausência de regulamentação clara do Estatuto de Roma.
O SR. PRESIDENTE (Carlos Veras. PT - PE) - Obrigado, Sr. Pedro.
O SR. MILTON NUNES TOLEDO JUNIOR - Obrigado, Sr. Deputado Carlos Veras. Peço permissão para cumprimentar todos os presentes nesta reunião, os Srs. Parlamentares, os membros do Governo, os representantes de outros órgãos públicos e a sociedade civil. Muito bom dia a todos.
Peço perdão pelo problema na conexão. Não consegui estar presente desde o início da reunião, cheguei quando o Ministro Marcelo Araújo já estava na metade da sua apresentação, mas pude perceber que os representantes do Itamaraty já fizeram um excelente trabalho ao reportar o status, o andamento da nossa atuação na condição de representantes do Poder Executivo para o fiel e integral cumprimento das recomendações relacionadas à ratificação ou mesmo à adesão às normas internacionais, objetos desta audiência pública.
Deputado, V.Exa. tem acompanhado as audiências públicas e sabe que esta é a minha quinta participação como Chefe da Assessoria Especial de Assuntos Internacionais do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos.
Eu tenho tomado o cuidado de acompanhar e de participar pessoalmente de cada uma dessas audiências públicas convocadas pela Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados, por uma razão bastante simples: compete à Assessoria Internacional do MMFDH a promoção do cumprimento interno das obrigações internacionais exaradas por órgãos de tratados, por foros internacionais de direitos humanos, o que inclui especialmente as recomendações da Revisão Periódica Universal.
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Eu tenho feito discursos sobre a metodologia e a natureza deste exercício, chamando a atenção para o quão rica é esta experiência de avaliação mútua e recíproca dos países. Por isso mesmo, este relatório da RPU é muito benquisto, muito valorizado, muito prestigiado pela sociedade internacional, porque as recomendações dadas por Estados para Estados são recomendações entre pares, diferentemente de uma série de outros mecanismos a que nos submetemos, prestando informações, prestando contas da implementação de nossas obrigações internacionais de direitos humanos, em que a avaliação é feita por um comitê de peritos, por um relator especial, por técnicos de maneira geral. Este exercício da RPU, no entanto, tem sua legitimidade por conta do engajamento dos Estados.
Eu sempre faço questão de lembrar, Sr. Deputado, que, quando nós vemos 242 recomendações expedidas para o Estado brasileiro, este número que, para os não iniciados, pode parecer demasiado e pode significar muitas feridas a serem pensadas no sistema brasileiro, na verdade, demonstra o engajamento dos Estados e uma relação de confiança. Ninguém faz recomendação no ambiente internacional para Estados que não se mostram comprometidos e engajados com a temática dos direitos humanos.
Esta é, portanto, a mensagem que nós temos reverberado para reiterar nosso comprometimento. Esta é a perspectiva do Poder Executivo. Sei que, neste ponto, falo também em nome do MRE, mas, em nome da Ministra Damares, que previa participar desta audiência pública, mas, por compromissos outros de agenda, pede desculpas por não conseguir acessá-la, não sei se ela conseguirá fazê-lo até o fim da reunião, quero reiterar nosso compromisso e comprometimento com a implementação integral das recomendações da RPU.
Em socorro da técnica, é importante dizer que nós temos prazo. Nosso próximo relatório é devido em julho de 2022. Então, nós temos um prazo que já não é tão longo, de pouco mais de ano, mas que merece ser observado, para que possamos contar com a colaboração dos membros do Congresso, dos Srs. Deputados e Deputadas membros desta Comissão de Direitos Humanos e Minorias, e, assim, uma vez submetidas as convenções à aprovação do Congresso, ter um engajamento também dos nossos Parlamentares para uma rápida tramitação.
As outras duas recomendações que eu acho que me compete mencionar dizem respeito a um maior engajamento com as Recomendações nºs 21 e 22, que falam em reforçar a cooperação produtiva com os Órgãos de Tratado das Nações Unidas, fortalecer ainda mais o cumprimento do compromisso ativo para a comunidade internacional promover os direitos humanos em todas as áreas.
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Apesar de eu ter mencionado isso em oportunidades anteriores, nós fizemos o exercício já no primeiro ano do Governo, no primeiro ano da nossa gestão, em 2019, de zerar o passivo de relatórios internacionais de direitos humanos que não eram apresentados havia mais de década.
Para aqueles que não estavam presentes nas reuniões anteriores, o relatório mais antigo não era apresentado pelo Estado brasileiro desde 2003. Nós zeramos este passivo e hoje simplesmente cumprimos todos os prazos, numa demonstração muito clara de compromisso e de engajamento particularmente com os Órgãos de Tratado das Nações Unidas, de modo que podemos dizer, com serenidade e tranquilidade e, por que não, com bastante orgulho, que estamos em fiel cumprimento das Recomendações nºs 21 e 22.
O SR. PRESIDENTE (Carlos Veras. PT - PE) - Muito obrigado, Sr. Milton Nunes, pela contribuição.
Queria, inicialmente, em nome do Conselho Nacional dos Direitos Humanos, agradecer à Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados, na pessoa do Deputado Federal Carlos Veras, Presidente.
Gostaria de registrar uma saudação especial ao Deputado Bira do Pindaré, um dos que solicitou a realização desta audiência, e uma saudação especial aos demais Deputados e Deputadas que compõem a Comissão de Direitos Humanos e Minorias e a todas as entidades aqui presentes.
A aproximação entre o Conselho Nacional dos Direitos Humanos, que ora tenho a honra de presidir, e a Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados é algo que, pensamos, fortalece muito a luta pelos direitos humanos nos planos nacional e internacional. Em específico, são extremamente relevantes as audiências voltadas à Revisão Periódica Universal.
Esta revisão é um parâmetro muito seguro para o Brasil do caminho a ser trilhado, sobretudo pautado em não retrocessos, visando ao fortalecimento dos direitos humanos. Nisso, a Câmara dos Deputados tem tido um protagonismo, Presidente Veras, como V.Exa. sabe, muito relevante. O próprio Observatório Parlamentar é uma demonstração do empenho e do protagonismo do qual eu falei da Câmara dos Deputados na pauta dos direitos humanos no Brasil.
Sobre as recomendações às quais estamos hoje dedicando a audiência pública, o Conselho Nacional dos Direitos Humanos gostaria de reforçar algumas. Eu serei bem sintético, de fato, em respeito ao tempo que me foi disponibilizado.
Duas delas, acho, são complementares, embora toquem em questões um pouco diferentes: a Recomendação nº 21, da Costa do Marfim, e a Recomendação nº 22, de Mianmar.
A primeira prevê o reforço e a cooperação com os organismos do Órgão de Tratados das Nações Unidas; e a segunda, o reforço ainda maior no envolvimento ativo com a comunidade internacional para promover os direitos humanos em todas as áreas.
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Como já citado aqui por aqueles que tomaram assento nesta audiência pública anteriormente ao CNDH, a ONU, toda vez que ela edita um tratado, prevê um órgão, um colegiado responsável pelo seu monitoramento, pela sua implementação, obviamente, nos direitos previstos nesses tratados. E há, nessas recomendações, duas palavras-chave, a de fortalecimento e a de cooperação exatamente desses órgãos, desses mecanismos para implementação dos tratados da ONU.
É muito importante que o Brasil, no plano internacional — e aí incumbe sobretudo ao Poder Executivo o fortalecimento e a cooperação internacional —, seja visto como um país que se aproxima desses parâmetros internacionais e não como um país que se afasta de regras, de normas do plano internacional voltadas à defesa dos direitos humanos.
E aqui fica, de fato, a crítica mais direta à forma como o Brasil vem, nos últimos anos, conduzindo essa política no plano internacional, que parece, aos olhos do Conselho Nacional de Direitos Humanos, uma política bem menos voltada a essa aproximação, a esse fortalecimento e a essa cooperação e parece muito mais um ingresso num tipo, numa dinâmica de atuação que não agrega e que não une o Brasil a esses organismos. Então, por si só, esse é um ponto que diz respeito diretamente a essas recomendações, que é importante aqui pontuar.
Eu queria também destacar a Recomendação nº 29: "Alinhar plenamente a legislação nacional com todas as obrigações decorrentes do Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional — TPI", uma recomendação, como aqui foi citado, da Estônia. Eu faço isso, Deputado Veras, exatamente porque, quanto a essa matéria, como aqui também já foi citado, o Poder Legislativo Federal tem um papel extremamente importante. Eu penso que este Observatório Parlamentar inclusive deve ser protagonista neste ano.
Nesse aspecto, é relevante fazer esse destaque, porque o Observatório Parlamentar deve exatamente levar a cabo aquilo que falta para o Brasil de fato aderir... Não é aderir. O Brasil já ratificou o Estatuto de Roma. Há um tratado promulgando essa ratificação. Entendo, pelo CNDH, que o Brasil fez isso de forma bem relevante, a partir do momento em que tentou se afirmar no plano internacional em favor dos direitos protegidos pelo Estatuto de Roma, mas ainda há a pendência, de fato, dessa implementação no plano nacional. E nisso o Poder Executivo Federal, a Câmara dos Deputados e o Senado Federal têm um papel fundamental.
Aqui já foi citado o Projeto de Lei nº 4.038, de 2008, que é uma importante referência para o tratamento adequado de delitos de genocídio, crimes contra a humanidade, crimes contra a administração da justiça do Tribunal Penal Internacional.
Eu encerro a minha fala ressaltando que esses instrumentos são extremamente relevantes a essa implementação. Isso se evidencia, por exemplo, agora, no caso Gomes Lund, relativo à Guerrilha do Araguaia, no qual o Brasil foi condenado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos.
Ali fica claro que o Brasil não tem ainda instrumentos adequados para regulamentar, para tipificar essa conduta de desaparecimento forçado.
Eu acho que é um caso que, além da sua relevância histórica no plano nacional e internacional, demonstra o quanto nós precisamos ainda avançar e o quanto o Legislativo — e este Observatório é um palco muito relevante para levar isso a cabo — deve dedicar atenção a essa implementação, a essa regulamentação, a essa harmonização legislativa interna do Estatuto de Roma.
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O SR. PRESIDENTE (Carlos Veras. PT - PE) - Obrigado, Sr. Yuri Costa, inclusive pela parceria nas audiências públicas com o Conselho Nacional de Direitos Humanos.
Inicialmente, cumprimento o Presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias, o Exmo. Deputado Carlos Veras, o Exmo. 1º Vice-Presidente, a 2ª Vice-Presidenta e a 3ª Vice-Presidenta. Cumprimento os expositores, os Deputados e as Deputadas. Senhoras e senhores, muito bom dia.
O Observatório apresenta algumas recomendações contidas na Revisão Periódica Universal de 2017, como já foi aqui colocado. E a primeira indagação que eu vou fazer e vou explanar é como a Defensoria Pública da União tem contribuído e pode contribuir para que o Brasil cumpra essas recomendações.
Eu vou partir inicialmente da Recomendação nº 22, feita por Mianmar, no sentido de reforçar ainda mais o envolvimento ativo do Brasil com a comunidade internacional para promover os direitos humanos em todas as áreas.
Aqui nesse tópico, excelências, eu vou separar em três importantes atuações da Defensoria Pública da União. A primeira delas são incontáveis acordos bilaterais com organismos internacionais e Estados estrangeiros, que demonstram essa intenção e já essa atuação multilateral, esse multilateralismo da Defensoria Pública da União e, em última análise também, do Estado brasileiro. O segundo ponto que eu vou abordar é sobre a atuação cada vez maior da Defensoria Pública da União perante o Sistema Interamericano de Proteção dos Direitos Humanos, em especial perante a Comissão e a Corte Interamericana. O ponto três, ainda aqui neste tópico, na Recomendação nº 22, refere-se às opiniões consultivas. A DPU tem sido instada por organismos internacionais a emitir diversas opiniões consultivas sobre matérias de direitos humanos, o que tem feito com bastante frequência.
Voltando ao ponto um, os acordos bilaterais com organismos internacionais, eu posso citar, por exemplo, o memorando de entendimentos que firmamos em matéria de assistência penal gratuita com o Estado da Guatemala. Recentemente, em 24 de novembro de 2020, firmamos um memorando de entendimento com o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos — ACNUDH, com o objetivo de viabilizar capacitações, atuações em conjunto, intercâmbio de documentos e outras atividades de interesse comum, como estudos, reuniões, seminários.
Aqui eu cito, excelências, por exemplo, o curso de capacitação sobre o Sistema Internacional de Direitos Humanos, realizado entre os dias 10 e 14 de maio de 2021, com palestrantes do ACNUDH, entre eles o Dr. Jan Jarab, Diretor do Escritório Regional do ACNUDH na América do Sul, e a Dra. Angela Pires, Assessora Nacional de Direitos Humanos.
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Esse curso ocorreu no Sistema Internacional de Direitos Humanos, inclusive também com a participação do Professor Renato Zerbini, Diretor do Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais das Nações Unidas.
Aliás, agora, entre 26 e 31 de maio, também houve outro curso em parceria com o PNUD (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento) sobre direitos humanos para povos tradicionais com esses palestrantes e também com a líder comunitária Juruna.
Posso citar aqui um caso muito interessante de promoção, de conscientização de direitos humanos nas nossas bases, na educação de base. Trata-se de um projeto-piloto da Defensoria Pública da União, criado em 2017, mas agora já em parceria com o Escritório Nacional do Alto Comissariado das Nações Unidas para Direitos Humanos e também a UNESCO, que se refere a um concurso de redação. A título de exemplo, no ano de 2017, nós captamos mais de 43 mil alunos de escolas públicas e privadas de todo o Brasil, que produziram mais de 23 mil redações sobre matérias e direitos humanos, incluindo alunos provenientes do sistema carcerário do País, adolescentes em cumprimento de medidas socioeducativas.
Então, vejam que aí há uma demonstração clara de parcerias com a comunidade internacional para, na educação de base, promover os direitos humanos. O último tema, aliás, foi relacionado ao racismo.
Temos aqui a também a agência ACNUR — Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados, sobre efetivação e promoção de direitos de solicitantes na condição de refúgio, apátrida, e outras matérias no âmbito do ACNUR.
Cito também o memorando do protocolo de intenções que a DPU firmou com Moçambique com o objetivo de trocar experiências no aperfeiçoamento de recursos humanos, intercâmbio de informações, como promover assistência jurídica gratuita, inclusive do nosso sistema de assistência jurídica integral e gratuita, com o objetivo de compartilhar essas experiências.
E aqui, já em relação a esses acordos bilaterais, cito também o acordo com o Timor-Leste, por meio também de memorando de entendimentos que se refere a boas práticas para apoiar a construção da Defensoria Pública no Estado de Timor-Leste. Existem outras tantas, como no Chile e Colômbia, mas eu já vou me adiantar.
Quanto à atuação da Defensoria no Sistema Interamericano de Proteção dos Direitos Humanos, cada vez mais, ela submete, quando necessário, à admissibilidade da Comissão Interamericana de Direitos Humanos e, no caso, quando não há o cumprimento voluntário dessas decisões, à Corte Interamericana de Direitos Humanos, nas hipóteses de violação de direitos previstos na Convenção Americana de Direitos Humanos, no Pacto de San José da Costa Rica.
Cito como exemplo dois casos apenas: o caso da favela Nova Brasília, o fatídico episódio de 1994/1995, ocorrido no Estado do Rio de Janeiro; e o Massacre da Sé, no Brasil, que também que teve atuação da Defensoria, caso ocorrido em 2004, relacionado à agressão às pessoas em situação de rua no centro de São Paulo.
Seguindo o terceiro ponto estrutural, as opiniões consultivas. A Defensoria Pública da União foi instada a se manifestar, por exemplo, pela Divisão de Combate ao Crime Transnacional, perante o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime, para que emitisse opinião consultiva sobre alternativas existentes no sistema de justiça brasileiro, quanto a ponderação ou penalização de pessoas com transtorno mentais, incluindo aquelas ponderações decorrentes do uso de droga.
E aí questionaram também o papel dos diferentes órgãos do sistema de justiça em várias etapas do processo criminal, tanto na fase que antecede a prisão quanto na fase de julgamento, na fase de sentença e de pós-sentença.
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A Defensoria Pública apresentou, então, a sua opinião consultiva. A Assembleia Geral das Nações Unidas, em maio de 2016, exarou recomendações ao Estado brasileiro, às empresas privadas e estatais e à própria sociedade civil sobre o tema Empresas e Direitos Humanos.
Em 2018, a Defensoria foi também instada por um dos órgãos da ONU a apresentar subsídios para respostas a essas recomendações sobre crimes contra direitos humanos, tendo sido apresentado um minucioso relatório. A título de exemplo, Excelências, cito apenas a assistência jurídica aos impactados pelo vazamento em barragem de rejeitos da empresa Hydro Alunorte, em Barcarena, no Pará; o acompanhamento da remoção e reassentamento humanizado de famílias atingidas pelas obras do Anel Rodoviário, em Belo Horizonte, na BR-381; o acompanhamento dos impactos da poluição por arsênio, não somente sobre comunidades quilombolas, mas também sobre toda a população do Município de Paracatu. E, para não me alongar, eu cito a assistência aos pescadores impactados com a construção da usina hidrelétrica em Salto da Divisa, no Rio Jequitinhonha.
Então, Excelências, em razão do tempo, eu não vou me ater às Recomendações Gerais nºs 18 e 19, embora a Defensoria seja favorável à ratificação das emendas e da convenção dentro do processo legislativo democrático interno.
E, para finalizar, em relação a Recomendação Geral nº 29, rapidamente, a DPU tem atuado no sentido de dar amplo cumprimento, em última análise também no Brasil, ao Estatuto de Roma, do Tribunal Penal Internacional, mostrando mais uma vez esse multilateralismo. A DPU expediu, recentemente, nota técnica e recomendação ao Governo brasileiro para ratificação do Acordo de Escazú, o Acordo Regional sobre Acesso à Informação, Participação Pública e Acesso à Justiça em Assuntos Ambientais na América Latina e Caribe. Vejam, Excelências, que isso guarda intimidade, proximidade com as obrigações previstas no Estatuto de Roma.
O SR. PRESIDENTE (Carlos Veras. PT - PE) - Obrigado, Sr. André Ribeiro. Sua fala agora no final me lembrou uma preocupação muito grande da população do meu Estado de Pernambuco, mais ali na região de Itacuruba, com a possibilidade da construção de uma usina nuclear na região. É uma preocupação muito grande daquela região, e, com certeza, caso venha a se concretizar essa possibilidade, será fruto de audiência pública nesta Comissão de Direitos Humanos e Minorias desta Casa.
O SR. GUSTAVO HUPPES - Bom dia a todas e a todos. Eu gostaria de cumprimentar, na pessoa do Deputado Carlos Veras, as autoras e os autores do requerimento de convocação desta audiência pública, assim como os demais membros da CDHM. Queria também cumprimentar os meus colegas desta audiência e os espectadores que estão nos assistindo na transmissão ao vivo.
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Eu queria, primeiro, começar com um rápido comentário sobre as recomendações relacionadas ao Tribunal Penal Internacional — TPI. Como foi disposto anteriormente, o Brasil faz parte do Tribunal Penal Internacional, e temos visto recentemente muitas denúncias sendo apresentadas ao TPI, principalmente por ações cometidas pelo Presidente Bolsonaro recentemente.
A Conectas, em parceria com o CEPEDISA — Centro de Estudos e Pesquisas de Direito Sanitário da Universidade de São Paulo, lançou, ao longo do ano passado, uma série de boletins informativos sobre direitos na pandemia. E um desses boletins, se eu não me engano, o Boletim nº 5, que posso depois compartilhar com a Secretaria da CDHM, traz justamente um levantamento de todas essas denúncias que foram apresentadas ao TPI contra o Presidente Bolsonaro.
Mas eu gostaria, na verdade, de focar a minha contribuição, nesta audiência, principalmente nas Recomendações Gerais nº 21 e 22. A Recomendação nº 21 é sobre a cooperação frutífera com os organismos dos Órgãos de Tratados das Nações Unidas, feita pela Costa do Marfim, e a Recomendação nº 22, feita por Mianmar, para reforçar ainda mais seu envolvimento ativo com a comunidade internacional para promover os direitos humanos em todas as áreas.
Segundo o Coletivo RPU (Revisão Periódica Universal), que é um grupo de entidades da sociedade civil, da qual a Conectas faz parte, que realiza periodicamente o monitoramento das recomendações feitas no âmbito do processo de revisão do Brasil, o País tem não apenas descumprido mais da metade das recomendações mas também, em quase 30% dos casos, tem retrocedido nessas recomendações realizadas nos últimos anos. E, levando isso em consideração, não podemos assumir que existe atualmente uma cooperação frutífera com os organismos dos Órgãos de Tratados das Nações Unidas e, no sentido mais amplo, no próprio cumprimento das obrigações internacionais em matéria de direitos humanos por parte do Estado brasileiro.
Como foi mencionado, se eu não me engano pelo Milton, o Brasil de fato apresentou os relatórios que estavam atrasados há mais de anos aos Órgãos de Tratados das Nações Unidas, mas muitos desses relatórios apresentados já não condizem com a realidade que vivemos atualmente na situação de direitos humanos em nosso País. Muitos desses relatórios parecem que estão bem descolados da realidade do que temos vivido no Brasil ultimamente.
E, para citar dois exemplos relacionados a essa falta de cooperação e retrocesso, na verdade, no cumprimento dessas duas recomendações, eu gostaria de começar e focar também na intervenção em temas relacionados ao enfrentamento da violência institucional, que são temas com os quais a Conecta trabalha. Um deles é o Sistema Nacional de Prevenção e Combate à Tortura, que foi criado em 2013 e promulgado a partir da ratificação, pelo Estado brasileiro, justamente do Protocolo Facultativo à Convenção da ONU contra a Tortura, o OPCAT, que tem sido alvo de retrocessos e desmonte por parte do Governo Federal e, em muitas unidades federativas, como São Paulo, sequer é aplicado.
Em 2019, por meio de um decreto emitido pela Presidência da República, todos os membros do Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura foram exonerados. Esse decreto também acaba inviabilizando a existência e a atuação do órgão, que tem justamente como atribuição verificar as condições em que se encontram submetidas as pessoas privadas de liberdade no País e prevenir a tortura e os maus tratos. O decreto atinge justamente a autonomia funcional e financeira do Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura,
violando não só a lei federal mas também todas as obrigações internacionais assumidas pelo Estado brasileiro em matéria de direitos humanos e contrariando também diversas recomendações desses órgãos de tratado das Nações Unidas.
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O Subcomitê da ONU para a Prevenção da Tortura já expressou inclusive sua preocupação, afirmando que essas ações do Governo Federal contrariam justamente o progresso que foi alcançado anteriormente na implementação dessas obrigações no âmbito do OPCAT, o Protocolo Adicional à Convenção contra a Tortura, e isso acaba sendo um revés para o Brasil justamente no cumprimento de suas obrigações internacionais.
Além disso, esse retrocesso vai contra outras recomendações feitas no âmbito da Revisão Periódica Universal no Brasil, realizada em 2017, as Recomendações Gerais nºs 62, 63 e 64, que, provavelmente, devem ainda também ser fruto de debate aqui nesta Comissão.
Um segundo tema que gostaria de trazer também leva em consideração essa falta de cooperação ou até de cumprimento das obrigações internacionais do Brasil — também já foi trazido aqui pelo Ministro Marcelo. Trata-se da passagem do Brasil na revisão do Comitê sobre Desaparecimentos Forçados.
Como foi mencionado, o Brasil vai ser avaliado em setembro de 2021. Na nossa avaliação, o relatório apresentado pelo Brasil e as respostas às perguntas já feitas pelo comitê recentemente não condizem com o que temos vivido em torno do tema de desaparecimento forçado no Brasil. Um dos exemplos que refletem isso é que o Brasil, apesar de ter promulgado a Convenção Interamericana sobre o Desaparecimento Forçado de Pessoas e a Convenção Internacional em 2016, ainda não tipificou o crime de desaparecimento forçado.
Além disso, justamente por não haver essa tipificação de crime, reconhecendo-o como crime permanente, acabamos não investigando, não trazendo reparação, não trazendo direito à verdade, à memória e à justiça. Isso acaba sendo uma barreira à persecução do delito e à responsabilização, assim como toda a reparação que deve — deveria, pelo menos — ser conduzida por parte do Estado brasileiro.
Ainda neste âmbito do descompasso no cumprimento das obrigações internacionais do Brasil, principalmente no que se refere à matéria do desaparecimento forçado, o movimento Mães de Maio, a Defensoria Pública de São Paulo e a Conectas apresentamos, neste mês, uma denúncia sobre desaparecimentos forçados acontecidos em maio de 2006 que, mesmo após 15 anos, permanecem ainda sem qualquer resposta estatal. Na denúncia, além dos casos de 2006, ainda são apresentados outros casos de desaparecimento ocorridos em todo o território nacional, o que demonstra essa prática institucionalizada pelas forças de segurança, que merecem atenção do Legislativo e das cortes internacionais e dos órgãos de tratado, que devem fazer o monitoramento do cumprimento das obrigações internacionais pelo Brasil.
Meu tempo acabou, mas eu gostaria de salientar a recomendação até pela própria CDHM, reforçando o papel do Observatório e a necessidade de fazer esse monitoramento ativo da implementação das
obrigações internacionais do Brasil, no sentido de estar mais próximo desse processo de monitoramento, de promover audiências públicas como esta, para que nós possamos debater justamente esse descompasso entre as ações do Estado e as suas obrigações internacionais.
Mais uma vez, gostaria de agradecer o convite. Também fico aqui à disposição para o debate em seguida.
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O SR. PRESIDENTE (Carlos Veras. PT - PE) - Muito obrigado, Gustavo.
O SR. RODRIGO DEODATO - Muitíssimo obrigado, Sr. Presidente desta audiência pública e da CDHM, Deputado Carlos Veras. Saúdo as demais autoridades e membros desta Mesa presentes.
Eu sou Rodrigo Deodato. Sou professor da Universidade Católica de Pernambuco, consultor jurídico para a área internacional. Aqui represento o Gabinete de Assessoria Jurídica às Organizações Populares do GAJOP e o Coletivo RPU Brasil.
Ao tempo em que agradeço o convite para compor este espaço de reflexão sobre o monitoramento de recomendações internacionais voltadas ao Estado brasileiro, eu gostaria de reforçar a atuação internacional do GAJOP.
Trata-se de uma ONG com sede em Recife, Pernambuco, que, desde os idos de 1999, tem atuado em matérias de acesso à justiça, segurança, debate sobre violência, gênero, racismo institucional, além da realização de denúncias de violações recorrentes no sistema socioeducativo, realidades presentes não somente em Pernambuco, mas em todo o território nacional brasileiro, infelizmente.
Além disso, também pontuo a atuação do Coletivo RPU Brasil, coalizão composta por mais de 30 entidades da sociedade civil brasileira, também já pontuada pelo Gustavo Huppes, da Conectas. Criada em 2018, tem incansavelmente realizado monitoramento de direitos humanos no País através das recomendações da RPU.
É importante colocar que, em 2019, o Coletivo RPU elaborou o seu primeiro Relatório de meio período, no qual avaliou 163 recomendações das 242 aceitas pelo Brasil no terceiro ciclo. Dessas, um total de 142 foram consideradas descumpridas; 20 parcialmente cumpridas; e apenas 1 efetivamente cumprida.
Em 2020, em razão da pandemia do novo coronavírus, que ainda assola terrivelmente a nossa população, o coletivo RPU optou por elaborar um novo relatório, intitulado Relatório da sociedade civil — Revisão Periódica Universal dos direitos humanos no contexto da COVID-19.
Neste relatório, 190 recomendações foram avaliadas; 47 foram consideradas em parcial cumprimento; apenas 1 cumprida, e a maioria de um universo de 142 recomendações foram consideradas não cumpridas pelo Brasil.
Dessas, o Coletivo RPU Brasil ainda considera que 64 recomendações estão na delicada situação de retrocesso. Significa que, além de não estarem sendo cumpridas mais da metade das recomendações, o Estado brasileiro está na contramão do cumprimento em pelo menos 26,44% do total de recomendações do terceiro ciclo da Revisão Periódica Universal. Não basta acatar simplesmente as recomendações. É preciso cumpri-las efetivamente. É importante afirmar isso.
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A primeira é reforçar a cooperação frutífera com os organismos dos Órgãos de Tratados das Nações Unidas, emitida pela Costa do Marfim, e reforçar ainda mais o envolvimento ativo com a comunidade internacional para promover os direitos humanos em todas as áreas, emitida pelo Estado de Mianmar.
O Estado brasileiro, historicamente, assumiu um discurso de respeito aos direitos humanos, evocando o cumprimento do art. 4º, inciso II, da Constituição Federal. Contudo, atualmente tem adotado uma posição extremamente contrária à prevalência dos direitos humanos, com que o Brasil tem se posicionado em votações importantes, até mesmo no Conselho de Direitos Humanos da ONU, aqui já citado — vide a abstenção, em julho de 2020, diante de possíveis retrocessos aos direitos das mulheres e, em 2019, o País votou a favor da alteração de resoluções para eliminar garantias aos direitos sexuais e reprodutivos.
Abster-se no cenário internacional ou mesmo votar contrariamente em resoluções importantes para o avanço dos direitos humanos não dialoga, em nenhum nível, com o envolvimento ativo com a comunidade internacional para promover os direitos humanos em todas as áreas, como sugere a recomendação de Mianmar.
Ademais, a cooperação internacional com órgãos e tratados das Nações Unidas deveria, sobretudo, se refletir no cumprimento integral das convenções e das recomendações emitidas por tais órgãos de monitoramento de tratados em seu mais elevado grau, diante de um visível genocídio da população periférica, negros, negras, jovens, indígenas, ribeirinhos e quilombolas, seja com a ausência de uma estratégia efetiva de combate à pandemia de coronavírus, seja com o aprofundamento das ações e discursos de ódio e perseguição, que encontram seu ápice na chacina de Jacarezinho. O Estado brasileiro tem assumido uma postura extremamente preocupante e contrária à garantia de direitos humanos prevista nas convenções internacionais. Não basta ratificar uma convenção. É necessário implementá-la e assumi-la como pedra de toque da efetivação de direitos em diálogo com a sociedade.
Por fim, Sr. Presidente, estamos em um momento que, pela primeira vez na história, um Presidente da República Federativa do Brasil se encontra em caso de avaliação preliminar de jurisdição, no âmbito do Tribunal Penal Internacional, por crimes contra a humanidade e por incitar o genocídio e promover ataques sistemáticos contra povos indígenas no Brasil.
Diante disso, este espaço de monitoramento de recomendações se debruçar sobre recomendações que evocam o cumprimento de pautas que são afeitas à temática do TPI, com toda a certeza, é digno de nota.
Instamos o Estado brasileiro a buscar efetivamente conduzir as suas relações internacionais pela prevalência dos direitos humanos de todas e todos e, no âmbito interno, a apurar e a julgar, com celeridade, os responsáveis pelas atrocidades ocorridas, sobretudo pelos desmandos de agentes do Estado, para fortalecer desde mecanismos de prevenção e combate à tortura até políticas públicas concretas de proteção a defensoras e defensores de direitos humanos.
O SR. PRESIDENTE (Carlos Veras. PT - PE) - Muito obrigado, Sr. Rodrigo.
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A SRA. ERIKA KOKAY (PT - DF) - Sr. Presidente, Deputado Carlos Veras, e todos os que se pronunciaram, primeiramente deixo minha saudação a todas e todos que estão compondo esta audiência pública e que estão compondo esta avaliação do cumprimento das recomendações.
É muito preocupante o que está acontecendo no Brasil neste momento, porque temos não apenas o não cumprimento — e não há sentido acatar resoluções se não for para colocar o Estado brasileiro em condições de efetivar os instrumentos necessários para o seu cumprimento —, não apenas o não cumprimento, repito, mas estamos vivenciando no País retrocessos em várias medidas.
Temos um sistema carcerário medieval, absolutamente medieval. O Estado sabe disso, o Estado sabe que convive com um método de implementação de cumprimento de sentenças com tortura. Ele sabe disso, tem consciência disso e desconstrói, ou enfraquece, ou asfixia os instrumentos que a sociedade construiu, sempre com muita dor, mas também com muita fé, com muita esperança, na perspectiva de coibir a lógica de suplício do corpo, a lógica medieval que perpassa tantas unidades neste País.
Há também uma violência institucional, não tenho nenhuma dúvida. Neste País, estamos com o Ministro do Meio Ambiente sendo investigado, com quebra, inclusive, de sigilos, busca e apreensão, em razão de crimes ambientais. Estamos falando de um Ministro do Meio Ambiente investigado por crimes ambientais. Há denúncias que dizem respeito a um Estado mancomunado com práticas de extração ilegal de madeiras — enfim, tudo isso que o Brasil está vivenciando.
Estamos vivenciando, para além disso, uma espécie de autorização que sai do Poder Executivo e que sai através dos discursos. Não há inocência em discurso. Discursos são pontes entre pensamento e ação. Discurso se transforma em bala, discurso autoriza as práticas de ódio e as práticas de mentiras.
Temos o avanço sobre os territórios indígenas por um Presidente que, em 1998, disse que deveríamos ter agido como a cavalaria estadunidense e que o Brasil deveria ter exterminado os povos indígenas. Há um genocídio em impulso, e práticas milicianas estão se apoderando do próprio exercício governamental.
O momento que estamos vivenciando é extremamente grave. Estamos com mineradores acossando territórios indígenas de forma extremamente violenta e, ao mesmo tempo, há uma autorização, pelo discurso, pela narrativa e pela postura da Presidência da República, do Governo Federal, para que este tipo de ação possa ser perpassado.
O País que estamos discutindo aqui, nesta audiência pública, sob a luz da Revisão Periódica Universal, é o País de Jacarezinho; é o País onde temos o ataque, de forma absolutamente contundente, aos defensores de direitos, em que se utiliza das estruturas do Estado para que elas se coloquem em movimento contra os próprios direitos.
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Este é um País de uma profunda gravidade. Então, neste sentido, vivemos um momento de muita gravidade e um genocídio que não pode ser escondido, não apenas pelas mais de 450 mil mortes que nos enchem de dor — enchem a gente de dor! — e que provocam muitas lágrimas neste País; temos tantas mortes que poderiam ter sido evitadas se tivéssemos uma postura nesse sentido; mas também há o genocídio contra os povos originários, o genocídio contra a ciência, o genocídio contra a consciência crítica e a própria liberdade.
É gravíssimo o momento que estamos vivenciando. Ele exige desta Comissão, a partir desta construção com o Observatório RPU, que possamos, enfim, denunciar o genocídio que ostenta a faixa presidencial neste momento, o genocídio que veste paletó e gravata e o genocídio que precisa ser desnudado, denunciado e eliminado.
Portanto, deixo a minha saudação a todas essas audiências que têm sido feitas neste sentido, para que possamos dizer: "Deixem-nos respirar!" Deixem-nos respirar, para que possamos tirar este joelho opressor, este joelho do arbítrio, este joelho de uma violência institucional que oprime e que está sobre a garganta do povo brasileiro.
O SR. PRESIDENTE (Carlos Veras. PT - PE) - Obrigado, Deputada Erika Kokay.
Antes de encerrar a nossa audiência pública, quero agradecer a todos os expositores que contribuíram com este debate, a todos e todas que construíram nosso relatório preliminar para subsidiar o debate desta audiência pública.
Quero aqui fazer uma proposta de encaminhamento. Considerando as contribuições, acredito que devemos trabalhar para votar e aprovar a Convenção Internacional sobre a Proteção dos Direitos de Todos os Trabalhadores e Trabalhadoras Migrantes e Membros de suas Famílias, que neste momento encontra-se aguardando a constituição de Comissão Especial pela Mesa da Câmara. Acredito que o conjunto dos Parlamentares podem fazer uma atuação na Mesa Diretora da Casa para que instale esta Comissão Especial.
Por fim, quero, nesta audiência pública, como Presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara Federal, prestar a minha solidariedade ao povo do meu Estado de Pernambuco, em especial os da Região do Agreste. Hoje, no Brasil, passamos de 460 mil mortes pela COVID-19. São 460 mil vidas perdidas. No meu Estado de Pernambuco, foram mais de 16 mil mortes pela COVID-19. A Região do Agreste se encontra com muitas dificuldades, precisando, inclusive, de oxigênio.
Hoje, de manhã, recebi o contato do Prefeito do Município de Pesqueira, Sr. Sebastião Leite, mais conhecido como Bal de Mimoso, que está em desespero pela falta de oxigênio no Município de Pesqueira, na Região do Agreste, assim como dos Secretários Cacique Marquinhos e Gleybson, que pediram para que pudéssemos ajudar neste processo junto com as autoridades competentes.
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10:32
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Hoje de manhã, tive a oportunidade de conversar com o Secretário de Saúde do Estado de Pernambuco, André Longo, que está ajudando a socorrer o Município, tomando essas providências. Vamos também encaminhar ofício requerendo ao Ministério da Saúde, ao Ministro Queiroga, o envio de cilindros de oxigênio extras para o Estado de Pernambuco para ajudar especialmente a região do Agreste no Município de Pesqueira, que inclusive fez contato com esta Presidência e a quem prestamos nossa solidariedade.
É muito importante que as autoridades competentes deste País — Prefeitos, Governadores, Presidência da República — possam ter mais consciência do que estamos passando neste momento e reforcem as medidas necessárias. Usar esta máscara o tempo todo não é algo confortável, mas é necessário. Ela salva vidas e pode salvar a sua vida. O isolamento social não é algo confortável, mas é necessário para evitar a contaminação, para salvar a sua vida. Tem que sair de casa quem realmente está precisando ir ao trabalho e, às vezes, até ao próprio hospital atrás de socorro médico. Essas são medidas importantes.
Além disso, nós precisamos vacinar a população. Não é hora de relaxar com as medidas, não é hora de achar que essas medidas não devem ser adotadas na sua plenitude. É hora de defender a vida, é hora de todos nós fazermos uma grande corrente de união pela vida da população brasileira. Então, é importante que as medidas sanitárias de combate à COVID-19 sejam respeitadas e adotadas pela população e, acima de tudo, pelas autoridades públicas constituídas, que têm a obrigação de cuidar da vida da população brasileira.
Quero novamente agradecer a todos os expositores que participaram desta audiência pública, à Deputada Erika Kokay, aos demais Parlamentares e a todos que nos acompanharam pelas redes sociais.
Não havendo mais nada a tratar, encerro a presente audiência pública, antes convocando para as seguintes reuniões: audiência pública cujo tema é Conflitos agrários em terras públicas, que se realizará nesta próxima quarta-feira, dia 2 de junho, às 13 horas; e audiência pública que tratará sobre propostas de alteração no Marco Civil da Internet, nesta quarta-feira, dia 2 de junho, às 15h30min.
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