3ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA 56 ª LEGISLATURA
Comissão de Direitos Humanos, Minorias e Igualdade Racial
(Audiência Pública Extraordinária (virtual))
Em 7 de Maio de 2021 (Sexta-Feira)
às 9 horas
Horário (Texto com redação final.)
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A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Declaro aberta esta audiência pública da Comissão de Direitos Humanos e Minorias, para debater o tema Recomendações sobre Participação Política das Mulheres, e o faço desejando bom dia e bons trabalhos para todas, todos e todes nós.
É uma alegria estarmos aqui fazendo esta discussão sobre um tema tão importante para a construção da democracia, da cidadania e, por que não dizer, para romper uma desumanização simbólica que também dialoga com a desumanização literal que nós vivenciamos quando há uma subalternização das mulheres e uma desigualdade de direitos ou uma não equidade de gênero.
Este evento está acontecendo porque nós aprovamos o Requerimento nº 14, de autoria do Deputado Carlos Veras e subscrito pelos Deputados Bira do Pindaré, por mim, Erika Kokay, Frei Anastacio Ribeiro, Joenia Wapichana, Padre João, Sâmia Bomfim e Sóstenes Cavalcante.
Esta é a segunda audiência pública que nós fazemos do Observatório da Revisão Periódica Universal, que está sediado nesta Comissão, fruto de uma parceria entre a Câmara Federal e o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos. É um fato inédito nós termos aqui, sediado nesta Comissão, um observatório para que nós possamos avaliar a implementação das recomendações sobre direitos humanos. Portanto, é uma alegria imensa nós estarmos aqui nessas condições, inclusive, de realizar esta segunda audiência pública a partir da instalação desse observatório.
A Revisão Periódica Universal — RPU é uma avaliação mútua entre os países que compõem as Nações Unidas quanto à situação dos direitos humanos e gera um conjunto de recomendações. No terceiro ciclo de revisão, realizado em 2017, o País recebeu 246 recomendações, das quais 242 foram aceitas. A metodologia detalhada, o conjunto de recomendações em exame e mais informações que qualquer pessoa queira adquirir podem ser encontrados no portal www.camara.leg.br/observatoriorpu.
Nesta audiência, nós vamos examinar o estágio de cumprimento de duas recomendações, a Recomendação nº 197: promover uma maior participação das mulheres na política e no Governo — Timor Leste —; e a Recomendação nº 198: implementar medidas efetivas de inclusão das mulheres em todos os níveis dos processos de tomada de decisão — Bélgica.
Portanto, esta reunião de hoje guarda uma importância imensa. Agradeço muito ao Presidente desta Comissão, o Deputado Carlos Veras, a oportunidade de eu estar presidindo esta discussão tão relevante e tão estruturante para que possamos fazer o luto de uma lógica patrimonialista que alimenta o patriarcalismo deste País.
Feita essa abertura, eu informo que, atendendo aos Atos da Mesa nºs 179, de 2021, e 191, de 2021, apenas poderão ingressar no recinto do plenário Presidentes e Presidentas das Comissões, Líderes e funcionários e funcionárias em serviço.
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Os expositores falarão por 5 minutos. Após suas exposições, os Parlamentares inscritos poderão usar a palavra por 3 minutos.
A audiência está sendo transmitida pela página, no endereço www.camara.leg.br/cdhm, pelo perfil da Comissão de Direitos Humanos e Minorias no Facebook, o @cdhm.camara, e pelo canal da Câmara dos Deputados no Youtube. Você também pode acompanhar nossas notícias no Instagram pelo @cdhm.cd. As pessoas podem apresentar contribuições através do portal e-Democracia.
Nós vamos, então, dar início à nossa audiência com os nossos convidados e as nossas convidadas para discutir essas recomendações que dizem respeito à equidade de gênero e à igualdade de direitos, que são determinações ou condições absolutamente imprescindíveis para que nós possamos romper uma lógica que ainda dialoga com a barbárie de sermos o quinto país no mundo em feminicídio e termos esse nível de violência. E são tantas as violências impostas, inclusive a violência política de gênero, que, por muito tempo, não foi identificada enquanto tal, porque a naturalização das violências impede que nós possamos identificá-la e, a partir daí, enfrentá-la.
Nós temos muitas paredes e muitos tetos de vidro que, ao serem invisibilizados, não nos possibilitam enfrentá-los. E, ao mesmo tempo, ao serem invisibilizados, as desigualdades passam a ter uma culpabilização das pessoas que são vítimas delas. Por isso, é importante estarmos fazendo esta audiência pública no dia de hoje.
Eu começo chamando para fazer uso da palavra a Sra. Cristiane Britto, que é Secretária Nacional de Políticas para as Mulheres, do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos.
Tem a palavra, portanto, por 5 minutos, a Sra. Cristiane Britto.
A SRA. CRISTIANE BRITTO - Bom dia a todos.
Eu gostaria de cumprimentar todos os Parlamentares, na pessoa da Deputada Erika Kokay, e aproveitar esta oportunidade também para agradecer ao Deputado Carlos Veras o convite formulado ao Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos para participar desta reunião.
Temos hoje a oportunidade de prestar contas à sociedade das iniciativas que o Governo Federal tem adotado, relacionadas ao tratamento das recomendações desse terceiro ciclo da Revisão Periódica Universal, sendo também uma oportunidade de dialogar com representantes dessa pauta, que nos une e que tem um potencial de transformação social realmente incrível.
Gostaríamos de pontuar que a RPU é compreendida por nós como uma ferramenta fundamental para o avanço das políticas públicas de promoção dos direitos humanos, pois temos a oportunidade de avaliar as nossas iniciativas sob a perspectiva de outras nações de forma construtiva. E foi nesse espírito que trabalhamos e entregamos, pela primeira vez, um relatório de meio período, em 2019.
Vimos uma oportunidade, já que o espaço não é limitado em volume de informações, de sorte que pudemos falar um pouco sobre o novo Governo e nossos planos de trabalho.
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De 2019 para cá, nós tivemos progressos na pauta da participação das mulheres na política, alguns deles, inclusive, desenvolvidos em parceria com esta Casa Legislativa. E são esses progressos que queremos apresentar aqui nesta manhã.
Eu não posso seguir este diálogo sem fazer um parêntese e registrar que, quando assumimos a gestão da Secretaria Nacional de Política para Mulheres, em 2019, não tínhamos um único projeto devidamente instituído que tratasse da participação das mulheres na política. Então, foi preciso iniciar o trabalho praticamente do zero, e o nosso desafio era transformar as eleições de 2020 em uma eleição de oportunidades reais para as mulheres. E, nesse sentido, temos orgulho do nosso caminhar.
Foi nesse cenário que lançamos o Projeto Piloto Mais Mulheres no Poder, por meio da Portaria nº 2.027, de 2020. A primeira fase do projeto, sem dúvida, ficou por conta do incentivo à participação das mulheres na política. O projeto abarcou uma série de iniciativas, com o objetivo de eliminar barreiras, que, sabemos, afastam as mulheres da política.
No sentido de contribuir para o melhor desempenho das campanhas das candidatas que disputaram o pleito de 2020, oferecemos um curso gratuito, na modalidade EAD, coordenado pelo Instituto Federal do Espírito Santo, para candidatas e interessados.
Ainda durante o período eleitoral, realizamos oficinas semanais on-line com especialistas em diversas áreas que norteiam uma campanha eleitoral. E fomos além da nossa pauta. Na realização do projeto, engajamos as mais variadas organizações atuantes no Brasil na iniciativa, como a Câmara dos Deputados, a ONU Mulheres, a União dos Vereadores do Brasil — UVB, a União Nacional dos Legisladores e Legislativos Estaduais — UNALE, o Conselho Nacional do Ministério Público, partidos políticos, entre outros.
Adequamos o canal de denúncia da Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos, o Ligue 180, que recebe mais de 1 milhão de ligações por ano, para, pela primeira vez na história, acolher e encaminhar os registros de violência política contra a mulher. Lançamos também um selo publicitário, em parceria com a ONU Mulheres, para estimular a divulgação do canal de denúncias e disseminar o conceito de violência política contra a mulher. Lançamos uma campanha de conscientização sobre violência política contra a mulher e participamos, também, de uma campanha promovida pela parceira ONU Mulheres.
Em 2020, levamos a temática da violência política a aproximadamente 30 eventos públicos, com o objetivo de sensibilizar a sociedade e disseminar o conceito desse tipo de violência. Chamamos os partidos políticos para o diálogo e celebramos, com 18 deles, um pacto, um compromisso pela ampliação do espaço político para as mulheres e pelo combate à violência política, principalmente a violência política econômica, conhecida também como candidatura fraudulenta ou candidatura laranja.
Enfrentamos o problema da violência política contra a mulher de forma vigilante, isso porque entendemos que a violência política é uma das principais causas da sub-representação feminina na política. E é válido aqui destacar que, inclusive, provocamos os órgãos do sistema de Justiça e a Ouvidoria Nacional dos Direitos Humanos para a adoção de providências em alguns casos de violência que tiveram repercussão na mídia nacional e nos demais casos que chegaram ao nosso conhecimento por outros meios. Fato é que o Poder Executivo, diante dessa temática, não ficou inerte.
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Dando continuidade às nossas ações, no mês de março deste ano, avançamos mais um pouco ao incluir, no Mais Mulheres no Poder, uma parceria estratégica com a Defensoria Pública do Paraná, para a realização do Programa de Capacitação e Fortalecimento das Procuradorias Municipais da Mulher — PROCURAME. Trata-se de iniciativa que visa incentivar a instituição das Procuradorias da Mulher nas Casas Legislativas, por meio de capacitação destinada às Vereadoras eleitas no pleito de 2020. E, sobre essa ação, preciso agradecer à Deputada Leandre Dal Ponte pela aproximação, o que nos proporcionou e permitiu essa parceria.
No momento também estamos em tratativa com o INTERLEGIS para viabilizar, nos próximos meses, um curso que visa auxiliar as Vereadoras no exercício do mandato. Afinal, precisamos apoiar e estimular aquelas que venceram o desafio das eleições 2020. E também, ao longo dos últimos 2 anos, contamos com o apoio a Secretaria Nacional da Juventude, que promoveu ações de incentivo à participação das jovens na política.
Então, apresentadas rapidamente as iniciativas do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, eu peço permissão para aqui compartilhar alguns dados sobre a participação das mulheres na política que indicam, sim, avanços a despeito, infelizmente, do cenário de sub-representação que ainda persiste no País.
As eleições municipais de 2020 foram marcadas pelo recorde de participação feminina no Brasil. Foram 187.023 mulheres candidatas em todo o País, ou seja, 28.573 candidatas a mais do que nas eleições municipais de 2016. E, no resultado final das eleições de 2020, também tivemos mais mulheres eleitas. Foram 658 Prefeitas eleitas, contra 641 em 2016.
Já para o cargo de Vereadora, as mulheres conquistaram aproximadamente 1.400 novas vagas nas Câmaras Municipais de todo o País. Em 2016, eram 7.803, e hoje são 9.196 eleitas. Além disso, também caiu a taxa de representatividade em mais de 300 Municípios. Na eleição de 2016, quase 1.300 Câmaras Municipais não contavam com uma única Vereadora. Agora são 948 Câmaras Municipais nessa condição. E, no contexto das eleições de 2014 e 2018, é importante observar, ainda, que o número de Deputadas Estaduais cresceu em todo o País. Em 2014, foram eleitas 120 Deputados Estaduais e Distritais. Em 2018, foram eleitas 173, ou seja, 43 Deputadas a mais.
Para a Câmara dos Deputados, em 2018, foram eleitas 77 Parlamentares, um aumento de 51% em relação ao último pleito, quando foram escolhidas 51 mulheres para a Casa.
Não houve alteração, infelizmente, no número de Governadoras eleitas entre 2014 e 2018. E, no Senado, tivemos uma queda, o que sinaliza que precisamos, sim, fazer um trabalho quanto aos cargos eletivos no Senado.
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Peço que conclua, por favor.
A SRA. CRISTIANE BRITTO - Estou concluindo, Deputada.
Há um componente interessante que, antes de finalizar, gostaria de compartilhar com os senhores.
Quando considerada a faixa etária dos candidatos das eleições de 2020, percebe-se que das candidaturas na faixa etária mais jovem, entre 18 e 19 anos, as mulheres são a maioria, representando 55% do total de todos os candidatos, e, na faixa etária de 20 a 24 anos, elas representam 46,3% do total de candidatos. Eu chamo a atenção para o fato de que esses dados podem apontar, felizmente, o indício de uma mudança geracional. Diante desses dados, podemos concluir que houve, sim, um avanço, ainda que tímido.
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Eu queria dizer ainda que, no âmbito desta Secretaria, temos o Programa Pró-Equidade, que propõe a elaboração de um plano de ação individual para instituições que tiverem adesão voluntária. O objetivo é desafiar a empresa a promover, a cada ciclo, ações que estimulem de fato a equidade, levando mulheres a alcançar cada vez mais postos de liderança.
Por fim, Deputada, gostaria de encerrar, reafirmando o compromisso do Governo Federal com as mulheres, especialmente no enfrentamento de todas as formas de violência, bem como na promoção de ações que gerem condições justas para que as mulheres possam ocupar os espaços que lhes foram negados de forma sistemática por uma sociedade que ainda não compreende o tamanho e a força da mulher brasileira.
Muito obrigada, Deputada.
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Obrigada, Sra. Cristiane Britto, pelos dados e pela contribuição.
Eu aproveito para agradecer à Sra. Fernanda Ribas, consultora do Escritório das Nações Unidas para os Direitos Humanos, que elaborou o relatório preliminar sobre a participação das mulheres na política, o qual foi enviado com antecedência para todas que aqui participam desta audiência.
Mais uma vez agradeço à Sra. Cristiane Britto, que representa a Secretaria Nacional de Política para Mulheres do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos.
Quero apenas dizer que, como há dezenas de pessoas convidadas para fazer esta discussão, nós vamos anunciar quando o tempo estabelecido estiver vencido. Obviamente, a nossa intenção é escutar ao máximo o conjunto das pessoas que aqui estão.
Passo a palavra ao Sr. Milton Toledo, Assessor Especial de Assuntos Internacionais do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos.
Sr. Milton, o senhor tem o prazo de até 5 minutos para fazer a sua exposição.
O SR. MILTON TOLEDO JUNIOR - Bom dia, Deputada. Como eu estou presencialmente na mesma sala da Secretária Cristiane Britto, por conta de questões técnicas, os senhores poderão ver a minha imagem em uma câmera, mas o meu som virá do microfone da Secretária Cristiane.
Gostaria, em nome do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos e na condição de Chefe da Assessoria Especial de Assuntos Internacionais, de fazer coro à mensagem que a Secretária Cristiane Britto transmitiu ao Parlamento, a todos os presentes, querendo fazer apenas uma nota em socorro da técnica. Lembro que nós estamos diante de um momento histórico na atuação internacional do Estado brasileiro, particularmente na atuação deste que é o Ministério que cuida da pauta dos direitos humanos.
Quando nós recebemos a missão de conduzir a atuação internacional do MMFDH, deparamo-nos com um cenário nada menos do que tenebroso no que diz respeito à prestação de contas à sociedade internacional. Nós tínhamos um histórico de inúmeros relatórios internacionais atrasados. Para as senhoras e os senhores terem uma ideia, o relatório que não era apresentado há mais tempo não o era desde 2003. Então, uma das primeiras diretrizes que transmiti a minha equipe, seguindo o comando da Ministra Damares Alves, foi a de zerarmos esse passivo de relatórios. Isso fizemos ainda ao longo do ano de 2019. De modo que hoje temos o orgulho de dizer, de cabeça erguida, que o Brasil está em dia com todos os foros em que temos a obrigação, o compromisso de prestar contas sobre os avanços e mesmo sobre as dificuldades que ainda enfrentamos na temática dos direitos humanos.
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Dito isso, este exercício da RPU não é desses relatórios atrasados. É importante que se diga isso, em socorro da justiça. Nós estamos no terceiro ciclo de avaliação, e o que houve, sim, de inovação da nossa gestão foi a apresentação desse relatório de meio período. O último relatório tinha sido apresentado em 2017, Sra. Deputada. Nós teríamos, então, que apresentar um relatório em 2021, que seria o relatório de ciclo. Por conta da pandemia da COVID-19, o cronograma de todo o Sistema ONU, no exercício da RPU, foi ajustado, e o nosso prazo agora é julho de 2022.
Não obstante, pela primeira vez na história brasileira, nós apresentamos um relatório de meio período, como a Secretária Cristiane ressaltou. Essa foi a oportunidade de não contarmos com as amarras do relatório que acontece a cada 4 ou 5 anos e falarmos um pouco mais do progresso da nossa atuação internacional no Estado brasileiro.
Nós estamos diante de duas recomendações muito importantes da RPU em debate nesta audiência pública. Essas duas recomendações são de todo relevantes. E é com muita serenidade e senso de responsabilidade que o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos comparece para travar esse debate com as Sras. Deputadas e com os ilustres representantes da sociedade civil. Quero, no entanto, lembrar que essas recomendações são para o Estado brasileiro, para a República Federativa do Brasil.
Sra. Presidente, nós estamos nos referindo à obrigação que é imposta aos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, enfim, para todos os entes da Federação. Então, nós estamos falando de recomendações que são trazidas para a União, os Estados, os Municípios e o Distrito Federal. Esse é um exercício muito importante e bastante desafiador. Nós contamos com a participação da Câmara dos Deputados.
Vamos lembrar que, quando falamos, por exemplo, de efetividade de medidas a cargo do Estado brasileiro relacionadas à colocação de mulheres em mais espaços de poder, nós estamos falando também da necessidade de incremento e atualização da legislação nacional. Contamos, para isso, com as nossas nobres Deputadas, com os nossos nobres Deputados. Estamos aqui, da parte do Governo Federal, à disposição das senhoras e dos senhores.
Muito obrigado.
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A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Agradeço ao Sr. Milton Toledo, Assessor Especial de Assuntos Internacionais do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, a exposição.
Estamos analisando duas recomendações: promover maior participação das mulheres na política e no Governo e implementar medidas efetivas de inclusão das mulheres em todos os níveis dos processos de tomada de decisão. Entendemos que as discriminações não são solitárias. Uma discriminação sempre leva a outra discriminação, assim como a reparação de direitos também abre estrada para que possamos reparar outros direitos violados.
Passo a palavra neste momento à representante da ONU Mulheres Brasil, a Sra. Ana Carolina Querino.
A SRA. ANA CAROLINA QUERINO - Bom dia, Deputada Erika Kokay. Bom dia, Secretária Cristiane Britto.
Em primeiro lugar, eu gostaria de agradecer o convite que foi feito para a ONU Mulheres participar desta importante audiência pública, desta importante discussão.
Além de saudar nossas parceiras no Governo e da sociedade civil que estão aqui, quero cumprimentar a Deputada Celina Leão e as demais Deputadas Federais que compõem a bancada feminina na Câmara dos Deputados.
Eu sou Ana Carolina Querino, Especialista de Programas do escritório ONU Mulheres, responsável pelas atividades programáticas do escritório. ONU Mulheres é a entidade das Nações Unidas dedicada ao tema de igualdade de gênero e empoderamento das mulheres. Temos um mandato triplo, que corresponde ao normativo; à coordenação interagencial, em que trabalha com todas as agências na implementação dessa que é uma desigualdade que se manifesta nas mais variadas áreas de vida das mulheres; e também ao componente programático.
Em relação ao componente normativo, ele dialoga mais diretamente com o ciclo e o processo da RPU. Como já foi muito bem tratado aqui, a RPU acaba se diferenciando de outros instrumentos por ser um diálogo entre pares, um diálogo entre os Estados-membros das Nações Unidas, abrangendo a amplitude da pauta universal e indivisível dos direitos humanos. Várias dessas recomendações estão conectadas com os direitos humanos das mulheres, em sua diversidade. Na ONU Mulheres, sempre trabalhamos conectando essas recomendações da RPU com as recomendações da CEDAW, que é a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher.
O último ciclo da CEDAW destaca algumas recomendações que se conectam diretamente com a participação das mulheres na vida pública e na vida política. Entre essas recomendações estão o fortalecimento da legislação que vise, de fato, permitir o aumento da participação das mulheres na vida pública, que está relacionada com cotas, com medidas temporárias e com campanhas. Nesse período, desde o último ciclo da CEDAW ao que estamos atualmente, várias medidas foram tomadas, e elas conectam-se com as recomendações específicas da RPU que discutimos hoje. Sempre que nos referimos ao aumento da participação e à redução das barreiras, devemos ter um olhar mais atento para identificar quais são as barreiras que as mulheres enfrentam tanto para chegar quanto para permanecer nesse espaço.
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Nós sabemos que o desafio que as mulheres enfrentam para a participação efetiva na vida pública não se restringe ao período eleitoral. Ele começa antes desse processo, na forma como essas mulheres estão engajadas e participam nos partidos políticos, na vida comunitária, nas disputas que elas acabam enfrentando para se tornarem candidatas. No Brasil, mesmo com a lei de cotas, apenas em 2018 chegou-se perto de 30% de candidatas mulheres, o que corresponde à cota, mesmo depois de 25 anos da criação dessa legislação. Existem aí barreiras.
Outros fatores também contribuíram para que a participação das mulheres aumentasse, como o financiamento. Essas medidas são importantes, mas sempre que novas medidas surgem e facilitam o processo, reduzindo as barreiras e os desafios que as mulheres enfrentam para participar da vida politica e da vida pública, outros se desvelam. Entre eles está a violência contra as mulheres nas eleições, o que nos traz aqui.
Esse tema tem recebido muita atenção da ONU Mulheres, junto com seus parceiros do Governo, da Secretaria Nacional de Políticas para Mulheres, do Tribunal Superior Eleitoral, da Defensoria Pública da União e diversas organizações da sociedade civil. Trabalhamos numa campanha conjunta, para que possamos destacar o tema da violência e desenvolver ações em resposta. Visando isso, devemos publicar nos próximos meses uma newsletter com boas práticas adotadas nos países da América Latina e a versão em português de um guia de enfrentamento à violência contra as mulheres nas eleições.
Em função desses 25 anos, ocorrerá em Paris o Fórum Geração Igualdade, quando os Estados-membros e diversos outros atores assumirão os compromissos pelos próximos 25 anos em torno de 6 coalizões de ação, e uma delas é a liderança e a participação política dessas mulheres. Trabalhamos para que possamos estabelecer medidas concretas para que, nos próximos 5 anos, estejamos em outro patamar nessa questão.
Quero mais uma vez agradecer o convite para participar desta audiência. A ONU Mulheres está à disposição tanto do Parlamento quanto do Governo para apoiar o processo de elaboração dos relatórios, caso seja demandado.
Muito obrigada e bom dia a todos.
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Muito obrigada.
Agradeço à Sra. Ana Carolina Querino, que aqui representa a ONU Mulheres, a participação.
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Agradeço ainda a presença ao Deputado Ossesio Silva e ao Deputado Helder Salomão, que já presidiu esta Comissão. Foi sob a Presidência de S.Exa. que se estabeleceu esse convênio, sediado aqui, para que possamos organizar um observatório de verificação das recomendações e fazer, portanto, a revisão periódica. Agradeço também a presença ao Deputado Roberto de Lucena.
Registro a presença da Ministra Damares, que está em nossa sala. Se a Ministra quiser fazer uso da palavra, basta apenas nos comunicar, assim como os Parlamentares. Aqueles que desejarem fazer uso da palavra serão intercalados com as nossas convidadas e com os nossos convidados.
Passo a palavra à Sra. Julia Rocha de Barcelos, integrante da Comissão TSE Mulheres. Em seguida, será a vez do Deputado Roberto de Lucena.
A SRA. JULIA ROCHA DE BARCELOS - Boa tarde a todas e a todos.
Gostaria primeiramente de cumprimentar a todas que estão aqui participando da audiência, a Dra. Ana Carolina Querino, representante da ONU Mulheres, a Deputada Erika Kokay, a Secretária Cristiane Britto e todas as representantes da sociedade civil.
Agradeço à Comissão o convite para que pudéssemos participar deste debate. Parabenizo-a desde já pelo relatório parlamentar que foi disponibilizado.
Podemos todos concordar, pelas falas que tivemos até agora, que houve, sim, alguns avanços tímidos, principalmente ligados, como a Dra. Ana Carolina falou, à questão da garantia de financiamento para além das cotas de candidatura. Mas a conclusão do relatório é clara — e com isso eu concordo — ao determinar que as metas não foram cumpridas, infelizmente, nesse período de 2017 até agora.
Eu vou tratar bem objetivamente de três pontos que são mais ligados ao Tribunal Superior Eleitoral.
O primeiro diz respeito às ações do TSE que constaram do relatório. O incentivo à participação feminina na política é uma prioridade da gestão do Ministro Luís Roberto Barroso. Em nossos eixos principais de campanhas de comunicação estamos sempre tratando da participação feminina na política. Eu já me comprometo a submeter uma lista completa com as ações da Comissão do tribunal, para não me alongar muito na fala, que incluem exposições, eventos, campanhas tanto internas, voltadas a servidoras e servidores do Tribunal, quanto externas. Também me comprometo a submeter mais algumas decisões de relevo para além daquelas que já constaram de garantia de recursos, de garantia também de tempo de TV e rádio a mulheres e homens negros. E considero importante submeter ao relatório algumas outras decisões no âmbito jurisdicional.
Outra questão é a própria formação do Poder Judiciário. Nós pudemos ver que, embora o Poder Judiciário seja o que tem maior porcentagem de mulheres, o número de mulheres reduz-se cada vez mais à medida que vamos observando os órgãos de cúpula. Nesse ponto, a Justiça Eleitoral é um órgão sui generis em dois aspectos. A formação da Justiça Eleitoral se dá pelos outros órgãos do Judiciário, no que diz respeito à formação dos Tribunais Regionais Eleitorais e do Tribunal Superior Eleitoral. Há uma rotatividade maior nos cargos, o que garante também uma possibilidade de renovação maior.
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Eu gostaria de aproveitar meus últimos 2 minutos para abordar uma questão que está na pauta do dia, que é a reforma política em discussão na Câmara dos Deputados. O relatório deixou claro que as cotas de candidaturas são insuficientes. No nosso modelo de lista aberta, só a garantia de cota de candidatura, de fato, não converte essas candidaturas em cadeiras. Na verdade, acho importante termos, como solução ou talvez alternativa, as cotas de vagas, mas precisamos dar alguma atenção a retrocessos. Sabemos que as obrigações legais têm sido abordadas não como patamar mínimo, a partir do qual se deve promover a participação feminina na política, mas talvez como patamar máximo, a partir do qual já se pode lavar as mãos dessa responsabilidade. É importante partirmos dessas cotas de candidatura como uma base mínima, que já alcançamos, para, a partir delas, construirmos outras medidas, principalmente agora, quando essas cotas de candidatura foram convertidas em cota de recursos.
Outro ponto para o qual eu gostaria de chamar a atenção é a importância da interseccionalidade nessa pauta. É lógico que a participação feminina está sendo observada de forma mais ampla, mas o próprio relatório já destaca questões relacionadas a mulheres negras, mulheres indígenas, mulheres trans. Qualquer medida legal, de campanha ou de participação, tem que ficar muito atenta a essa questão da interseccionalidade.
Também deixo o Tribunal Superior Eleitoral à disposição para parcerias, para ação conjunta, para debates. Agradeço, mais uma vez, o convite. Com isso, já encerro a minha fala e a minha contribuição.
Muito obrigada.
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Nós que agradecemos, Sra. Julia, as contribuições. Sei que ainda não atingimos as metas, que ainda temos um longo caminho a percorrer. Reconhecemos que é muito importante preservar as conquistas, preservar os 30% do fundo, os 30% da nominata. Mas nós queremos assegurar um percentual de cadeiras já estabelecidas, e não apenas um percentual no que diz respeito às nominatas, ao fundo, ao tempo de comunicação. Ontem mesmo aprovamos um projeto para assegurar a discussão contra a violência que atinge as mulheres dentro das escolas. Temos aqui trabalhado a política de gênero, que se estabelece e se expressa na sub-representação, mas também determinados comportamentos. Por exemplo, quando as mulheres conseguem alçar um poder que foi pensado para ser dominado pelo gênero masculino, é como se quisessem nos silenciar. Assim, estabelecem-se, todos os dias, posturas agressivas que impõem um recado, como se estivessem nos dizendo todo o tempo que nós não deveríamos estar aqui. Mas nós estamos aqui, vamos permanecer aqui e queremos que mais mulheres adentrem este espaço para romper esse certo pacto de cartolas, de casacas e também de bengalas que existe no Parlamento.
Passo agora a palavra ao Deputado Roberto de Lucena, para suas considerações, por um prazo de 3 minutos.
O SR. ROBERTO DE LUCENA (Bloco/PODE - SP) - Eu quero cumprimentá-la, minha amiga Deputada Erika Kokay. V.Exa. é Vice-Presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias. Nós temos militado e atuado juntos aqui, no Parlamento, já ao longo de 11 anos, período suficiente para crescer a minha admiração e o meu respeito por V.Exa., pelo seu comprometimento com a agenda dos direitos humanos e com a agenda do empoderamento feminino.
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Eu quero cumprimentar V.Exa. e esta Comissão, que realiza uma importante audiência pública. Desejo também saudar a Ministra Damares, que há pouco registrou presença na sala da audiência conosco. A Ministra Damares tem orgulhado todos os brasileiros que defendem as mulheres e defendem a família. Cumprimento ainda a Secretária Cristiane Britto, cuja exposição eu estava há pouco ouvindo atentamente, que tem feito um belíssimo trabalho à frente da Secretaria Nacional de Políticas para Mulheres.
Deputada Erika Kokay, como Presidente da Frente Parlamentar em Defesa dos Direitos Humanos, eu venho aqui para apoiar essa pauta, essa agenda voltada para o empoderamento da mulher na política, reconhecendo o trabalho que tem sido feito pelo Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos e pela Secretaria da Mulher desta Casa.
O nosso trabalho neste momento é muito mais importante do que em qualquer outro tempo ou em qualquer outro momento. O Brasil está vivendo uma verdadeira guerra. Nós estamos num ambiente adverso, com muitos desafios. Por isso, mais do que nunca, é importante termos consciência de que a recuperação do País passa pela mulher, com a sua sensibilidade, com a sua capacidade de liderança, com a sua compreensão de mundo. É muito importante que haja esforço das lideranças conscientes para que nós possamos ter cada vez mais a participação e a presença das mulheres na política, trazendo a sua contribuição, o seu olhar e a sua percepção de mundo e de vida.
Portanto, a minha presença nesta Comissão dá-se com o objetivo de apoiar essa pauta, de aplaudir a Secretaria da Mulher e de cumprimentar a Deputada Erika pelo trabalho nesta audiência pública.
Muito obrigado.
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Agradeço ao Deputado Roberto de Lucena a participação.
Mais uma vez, informo aos Parlamentares que acompanham esta audiência, que, se desejarem fazer uso da palavra, iremos intercalar as falas de S.Exas. entre a dos convidados e convidadas.
Antes de passar a palavra à Sra. Caroline Maciel, quero informar a todos que iremos realizar uma reunião com o Presidente do TSE, quando serão apresentados os relatórios sobre violência na política da Justiça Global, da Terra de Direitos, do Instituto Marielle Franco e da ANTRA — Associação Nacional de Travestis e Transexuais. Marielle Franco é uma expressão bastante aguda, triste e doída de violência política de gênero, uma violência que não era identificada, mas, ao ser identificada, nós conseguimos percebê-la de forma muito contundente em vários aspectos.
Passo a palavra à Sra. Caroline Maciel, do Grupo de Trabalho Mulher, Criança, Adolescente e Idoso: Proteção de Direitos, da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão — PFDC.
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A SRA. CAROLINE MACIEL - Bom dia a todas e a todos. Eu saúdo todos os presentes na pessoa da Deputada Erika Kokay e da Ministra Damares Alves. Agradeço o convite feito ao Ministério Público Federal, através da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão, ao tempo em que parabenizo os autores do requerimento, bem como os membros e membras da Comissão de Direitos Humanos e Minorias desta Casa pelo evento. Agradeço também ao Procurador Federal dos Direitos do Cidadão, Dr. Carlos Alberto Vilhena, pela oportunidade de representá-lo em evento tão relevante quanto o presente.
As autoridades que me antecederam enfrentaram diversos aspectos de extrema relevância, tornando minha participação bem mais singela. A questão da baixa participação das mulheres na política, como costumo dizer, não é um problema das mulheres, mas um problema da democracia, e ele precisa ser superado.
Apesar dos avanços já alcançados na legislação e na jurisprudência, no que diz respeito às candidaturas femininas, cota de candidaturas, percentual mínimo de recursos, que inclusive tiveram importantes atuações do Procurador-Geral da República e do Procurador-Geral Eleitoral, a verdade é que o percentual de mulheres eleitas ainda está muito abaixo do ideal. A violência sofrida pelas mulheres na esfera política, certamente, como já dito pelos colegas que falaram antes de mim, é ponto central para esse número ser tão baixo.
O primeiro registro histórico de violência política contra a mulher que se tem registro no Brasil ocorreu no meu Estado, o Rio Grande do Norte, tendo por vítima aquela que foi a primeira Prefeita eleita no Brasil, Alzira Soriano, em 1928. Ela foi candidata a Prefeita quando as mulheres sequer podiam votar no Brasil. Seus adversários diziam sem constrangimento, entre outras coisas, que mulheres que almejavam a vida pública deveriam ser comparadas a prostitutas.
É preciso também que seja desconstruído o mito de que as mulheres não se interessam por política. Nós nos interessamos, sim. O que acontece, como já dito aqui, é que para nós as barreiras são muitas e têm natureza histórica, cultural, social, dentre outras. Podemos mesmo dizer que há uma violência estrutural impedindo que as mulheres ocupem mais espaço na arena política. Nesse contexto, é urgente que se garanta às mulheres um ambiente acolhedor, e não um ambiente cada vez mais hostil, que se renova desde a época de Alzira Soriano, em 1928.
As práticas violentas contra as mulheres acontecem baseando-se normalmente em desigualdades preexistentes ao cenário eleitoral. O que ocorre é que a disseminação desses discursos de ódio, muitas vezes proferidos, infelizmente, por altas autoridades do nosso País, feita principalmente na esfera on-line, contribui para reforçar noções que sustentam a hierarquização entre homens e mulheres.
Os homens candidatos são criticados pelo que fazem ou por suas omissões. Nós mulheres somos criticadas pelo que somos, por nossas vidas privadas. As mulheres temos sido alvos permanentes de práticas como ofensas morais, gordofobia, ameaças com o intuito óbvio de nos distanciar da esfera pública, ou seja, com a noção de que somos intrusas na esfera pública e que o lugar correto para nós é o ambiente doméstico. Essa noção tem sido permanentemente recriada e reforçada.
A violência política tem subtraído de nós mulheres o direito fundamental ao exercício da cidadania de forma plena. Estamos exaustas de assistir mulheres candidatas e no exercício de mandato sendo xingadas, violentadas e até mortas.
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Nesse contexto, registro, como bem dito pela colega Julia, que me antecedeu, que o Ministério Público Federal concorda que deve haver a cota de cadeiras. As cotas de gênero surgiram no movimento internacional e são essenciais ao fortalecimento da democracia. Afinal, como podemos falar de democracia se quase 52% da população ocupa em média de 10% a 15% dos cargos eletivos? Sem cotas teríamos que aguardar indefinidamente que a cultura das relações de gênero mudassem naturalmente ou que os homens, espontaneamente, dividissem adequadamente os espaços de poder, o que certamente não vai ocorrer.
Finalizo dizendo que o Brasil, com suas instituições, precisa se comprometer com essa pauta. Mais uma vez, elogio a iniciativa deste evento. Não há outra maneira de o País se tornar uma verdadeira democracia. Cada vez que uma mulher é excluída politicamente, todas nós somos vítimas. Que sejamos todos e todas, homens e mulheres, agentes de promoção de uma política não violenta, inclusiva e igualitária.
O Ministério Público Federal, pela Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão, está atento à questão e se coloca à disposição de V.Exas. e de toda a sociedade civil para colaborar no que for necessário para a real concretização da democracia.
Obrigada.
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Obrigada pela contribuição, Dra. Caroline Maciel, que aqui representa a PFDC.
Realmente, a sub-representação é a expressão de um histórico que antecede a própria disputa eleitoral, que é, diria, extremamente desigual. Temos as mulheres dedicando-se mais às tarefas domésticas, uma lógica e uma construção de gênero que estabelece locais específicos e restritos, que seriam, digamos, as portas de vidro que estabelecem locais domésticos para o exercício das atividades de ser feminina. Vamos ter as mulheres com mais atividades femininas, ganhando em média menos 25,3% do que os homens. E há outro recorte, que é o étnico, pois mulheres negras ganham menos ainda.
Portanto, entendemos que a sub-representação é a expressão de um histórico de patriarcalismo, na tentativa de subalternizar as mulheres, que precisa ser rompido para que possamos vivenciar a democracia. Aliado a isso, temos milhões de mulheres que têm medo de voltar para casa, porque ali serão vítimas de violência. Esse patriarcalismo vai deixando marcas na pele, na alma, doloridas, não apenas nos corpos femininos, mas na própria democracia e na cidadania.
Passo a palavra à Vereadora Ana Lúcia Martins para que possamos dar continuidade a nossa audiência pública. (Pausa.)
A Vereadora está na sala, mas está tendo dificuldades de conectar-se com esta reunião.
Vamos passar para a próxima convidada, a Vereadora Carolina Iara.
Em seguida, assim que a Vereadora Ana Lúcia adentrar para ter o espaço de fala nesta audiência pública, passaremos a palavra a S.Exa.
Com a palavra a Vereadora Carolina Iara.
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A SRA. CAROLINA IARA - Bom dia a todas, todos e todes. Eu sou a Carolina Iara, Covereadora da bancada feminista do PSOL, em São Paulo, a sétima candidatura mais votada na cidade na eleição de 2020, compondo um mandato coletivo junto com Silvia Ferraro, Dafne Sena, Natália Chaves e Paula Nunes, tendo, inclusive, como plataforma principal o feminismo, em especial o feminismo popular.
Pegando um gancho na fala da nobre Deputada Erika Kokay, por quem eu tenho uma grande admiração, e também saudando todos os presentes, pedindo licença para falar aos Parlamentares, ao Governo, a toda a sociedade civil, eu gostaria de chamar a atenção para a interseccionalidade do meu corpo dentro da política, por ser uma mulher trans, uma mulher negra e uma mulher intersexo, ou seja, aquilo que se chamava antes de hermafrodita, uma mulher com aspectos biológicos dos dois sexos, e por estar na arena política, o que coloca corpos como o meu numa situação privilegiada de banalidade da violência política. Hannah Arendt falava nisso, na banalidade do mal. E é muito banal verificarmos assassinatos de pessoas trans no Brasil. No ano passado, 175 mulheres trans e travestis foram assassinadas, este ano estamos ainda em maio e já ultrapassamos o número de 50 mortes de pessoas trans. E muito me admira que parte significativa da direita e da extrema-direita, que inclusive está aqui hoje representada, tenha apresentado em seus Legislativos estaduais, e também no federal, projetos de lei que excluem as mulheres trans e travestis dos projetos de proteção contra a violência política, como aconteceu com o projeto de lei que queria instituir proteção às mulheres, candidatas e eleitas, no âmbito da violência política, algo que foi bastante veiculado nos meios de comunicação, com protesto de indignação inclusive da própria Deputada Erika Kokay.
No Legislativo paulista, na ALESP — Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo, onde estou, acaba de ser barrado projeto de lei que queria proibir a disseminação de propaganda LGBTQI+ para menores de 18 anos. Quer dizer, eu sou pornografia, eu não sou uma cidadã de direito. Eu fico muito abismada com esse tipo de narrativa e com o quanto isso é banalizado, com o quanto isso é comum.
É lugar comum soltarem uma bomba na frente da minha casa, eu ter que sair corrida de lá e ficar por isso mesmo. Isso é normal porque é uma travesti preta, da periferia, então é normal que a casa dela seja alvo. Talvez não fosse normal, se eu tivesse nascido em Higienópolis, bairro nobre da cidade de São Paulo, se eu fosse branca e não fosse uma mulher trans. As tratativas relacionadas ao caso em si, no qual eu fui alvejada, e também as inúmeras violências simbólicas de que eu fui sendo alvo desde o começo, lá atrás, na pré-candidatura para a vereança de São Paulo, até agora, seja com vídeos, seja com piadas, seja com comentários transfóbicos, misóginos, nudes que não são requisitadas e que chegam às minhas redes sociais, tudo isso é de uma violência absurda.
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Concluindo, eu rogo para que possamos verificar a diversidade do que é ser mulher no Brasil. Não dá para se apegar a um aspecto, a uma categoria política da mulher universal, que não é concreta, que é uma mulher abstrata. É o mesmo quando se fala de defesa da criança: uma criança abstrata, uma criança sem cor, uma criança sem gênero, uma criança sem território. Não! Nós precisamos de uma visão concreta da realidade das mulheres brasileiras que interseccione classe, que interseccione território, que interseccione essas nuanças dos gêneros, se ela é cisgênero, se ela é trans, se ela é LGBT, se ela é heterossexual, cristã, enfim, tudo isso deve ser verificado para permitir o aumento da participação das mulheres na política, senão o que vai ocorrer é os homens mais velhos e ricos continuarem nas cadeiras caçoando, fazendo meme com as Parlamentares novas que chegam. É isso que vai continuar acontecendo, e nós não queremos.
Agradeço e concluo a minha fala.
Axé para todas, todos e todes. Axé para as Vereadoras, as Parlamentares, todas as mulheres que estão aqui presentes.
Muito obrigada, Deputada.
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - São corpos que rompem a lógica da exclusão. E aqui, disse bem a Vereadora Carolina, há uma série de identidades e um caráter que estabelece não só os corpos femininos, mas também que há que se considerar como se agudizam as discriminações, a exclusão, a tentativa de excluir do mundo político e dos espaços de poder os corpos trans, as mulheres trans, as mulheres negras. Enfim, há muitos recortes que precisam ser considerados. E nós agradecemos muito a fala da Vereadora Carolina Iara.
Passamos então a palavra à Vereadora Erika Hilton, para que possa fazer a sua manifestação.
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A SRA. ERIKA HILTON - Obrigada, Deputada Erika Kokay. Bom dia a todas, todos e todes.
Quero dizer que é uma alegria poder estar aqui, nesta manhã, discutindo este tema que é tão pertinente. As minhas companheiras que me antecederam já pincelaram muitas coisas pelas quais eu gostaria de passar. Então, vou ser bem breve para fazer algumas considerações acerca não só da participação das mulheres na política brasileira, mas também da violência que essas mulheres sofrem. É importante compreendermos o universo das mulheres na política e as violências que são sofridas por elas de uma forma não heterogênea, porque as mulheridades não são singulares.
Dizer mulher não é dizer de um grupo específico igual, repetido. A mulheridade tem muitas diversidades, muita pluralidade e existe um universo muito diferente deste que representantes do Governo Federal apresentaram aqui para as mulheres pobres, para as mulheres indígenas, para as mulheres do campo, para as mulheres travestis e transexuais, para as mulheres com deficiência. O universo das mulheres é um universo muito interseccional e, em cada mulher, a violência, o ódio, o preconceito e a intolerância são atravessados de forma diferente.
Eu também queria chamar a atenção de quem acompanha esta audiência e dos que estão aqui presentes para este Brasil que foi trazido aqui pelos representantes do Governo Federal e que está longe da nossa realidade, está longe da nossa compreensão, de nós compreendermos quais são essas políticas e aonde chegaram essas políticas. Vendo os relatórios e acompanhando as eleições — e eu fui eleita como a mulher mais bem votada do Brasil em 2020 —, isso não é reflexo, nem a minha eleição e nem a eleição das inúmeras outras mulheres pobres, pretas, travestis que se elegeram em 2020, as Câmaras Municipais do Brasil não são reflexo de políticas públicas ou de ações que permitam que as mulheres tenham maior participação na política. Isso é reflexo da persistência. Isso é reflexo da perseverança. Isso é reflexo da insistência na ruptura de uma bolha excludente cis, hétero, branca, masculina, classista que vem ocupando os lugares na política de pai para filho, de filho para neto e assim sucessivamente.
E nós, as mulheres das bases, as mulheres das periferias, as mulheres que sentimos na pele a dura realidade de ser mulher na sociedade brasileira e de ser mulher na política brasileira, uma política que é estruturalmente misógina, estruturalmente patriarcal, quando os nossos corpos chegam aos lugares que nós estamos ocupando, compreendemos a violência com que somos recebidas. Eu fui constantemente ameaçada. Tentaram invadir o meu gabinete dentro da Câmara Municipal de São Paulo, dando um recado de que o meu corpo — e o meu corpo representa um corpo de mulher travesti, de mulher negra, de mulher vinda da periferia — não é um corpo bem-vindo na política brasileira.
Então, eu convidaria os representantes do Governo Federal a mostrar para nós, de forma mais aprofundada, em um momento oportuno, quais são essas ações, como essas ações chegam à ponta e como essas ações permitem, de forma efetiva, que as mulheres possam ter uma maior participação na política e uma participação na política não tokenizada, mas uma participação ativa, uma participação efetiva, uma participação que permita que essas mulheres tenham voz, que essas mulheres possam pautar com segurança e legitimidade aquilo que elas estão pensando.
Nós precisamos discutir o universo da mulheridade de uma forma ampla, de uma forma interseccional, passando e levando em conta todas as especificidades de cada grupo social. E ao que nós temos assistido, infelizmente, é um aumento da violência contra as mulheres de um modo geral, não só as mulheres na política brasileira, mas também as mulheres na sociedade, porque têm faltado políticas de combate ao machismo, de combate à misoginia. E nós temos também percebido uma hipervalorização de uma ideia retrógrada, de uma ideia que coloca a mulher numa condição subalterna e desumana.
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É também importante que o Governo e esta Comissão, a partir desta audiência, possam pensar em mecanismos que protejam as mulheres. O Instituto Marielle Franco tem uma pergunta muito, muito importante: quem protege as mulheres negras eleitas? Quem garante que as mulheres negras eleitas vão ter a continuidade de suas vidas, ao exercerem um mandato popular e um mandato público?
A nossa presença ainda não é benquista se somos negras, se somos travestis, se somos pobres. Quanto mais demarcadores de opressão são colocados contra os nossos corpos, mais vulneráveis e mais violentadas nos tornamos ao ocupar um lugar na política.
É preciso discutirmos esses temas com profundidade, é preciso que o Governo Federal olhe para relatórios que estão sendo produzidos e analise os números, analise os dados, analise a realidade.
Uma coisa que também me preocupa, já para concluir, é com relação a como vamos garantir que mais mulheres, desde a infância, adolescência, possam se ver como políticas, possam se sentir representantes da vida pública. Nós precisamos trabalhar isso nas raízes mais profundas também.
A discussão do tempo de TV, a discussão do fundo eleitoral, a discussão de os partidos tratarem o debate de gênero, a paridade de gênero como uma pauta central é importante, mas a construção de uma sociedade que valorize a participação das mulheres na política, que estimule a participação das mulheres na política é fundamental para que possamos fazer um enfrentamento efetivo a essa onda de ódio, de misoginia, de violências, ataques, ameaças de morte e perseguições contra as mulheres que se atrevem a romper um lugar que foi sentenciado e a ocupar um lugar na política, como é legítimo e nosso por direito.
Agradeço à Deputada Erika Kokay pelo convite e agradeço à Comissão de Direitos Humanos.
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Muito obrigada. Foi uma fala bastante contundente e bastante lúcida sobre os desafios que estão postos.
O SR. VINICIUS CARVALHO (Bloco/REPUBLICANOS - SP) - Sra. Presidente, Deputada Erika Kokay, perdoe-me pela interrupção. Agora falará a nossa Ministra. Eu peço a V.Exa. que me permita falar por 2 minutos apenas, após a fala da Ministra.
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Sem nenhuma dúvida, Deputado Vinicius Carvalho. Inclusive iríamos anunciar a presença de V.Exa., como também a presença do Deputado Julio Cesar Ribeiro e da Deputada Lauriete.
Nós temos informado que os Parlamentares que queiram fazer uso da palavra devem se inscrever, para intercalarmos as falas com as dos nossos convidados e convidadas.
Eu pergunto se a Ministra quer fazer uso da palavra. (Pausa.)
A Ministra está acompanhando com muita atenção, exercendo o seu ofício.
Deputado Vinicius, eu vou passar a palavra para a próxima convidada, a Sra. Adriana Valle Mota, da Articulação de Mulheres Brasileiras. Depois, eu lhe concederei a palavra.
O SR. VINICIUS CARVALHO (Bloco/REPUBLICANOS - SP) - Muito obrigado pela gentileza de sempre, Deputada.
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Não há problema.
Reafirmo que os Parlamentares e as Parlamentares que queiram fazer uso da palavra apenas busquem se inscrever para que possamos intercalar as falas.
O Deputado Roberto de Lucena já fez uso da palavra.
Agora passo a palavra à Sra. Adriana Valle Mota, da Articulação de Mulheres Brasileiras. Em seguida, falará o Deputado Vinicius Carvalho.
A SRA. ADRIANA VALLE MOTA - Bom dia a todos e todas. Agradeço à Comissão de Direitos Humanos e Minorias, na pessoa da querida Deputada Erika Kokay e do Deputado Carlos Veras, que é o Presidente, pelo convite para a participação nesta audiência pública. Cumprimento todas as pessoas aqui presentes e quem está nos assistindo pelas redes sociais também.
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Sou Adriana Mota, da Articulação de Mulheres Brasileiras, um movimento feminista antirracista, anticapitalista, antipatriarcal e não partidário. Lutamos, entre outras coisas, pela democratização radical do Estado brasileiro e da vida social, com mais participação das mulheres nos espaços de poder e decisão.
Nesse sentido, nós nos alinhamos com os argumentos que já foram colocados aqui e que reiteram uma profunda falha na democracia brasileira decorrente da desigualdade de gênero e também da desigualdade de raça, de etnia, de orientação sexual, de identidade de gênero, que permanece sendo um grande fator para impedir a cidadania plena das mulheres brasileiras.
As desigualdades de gênero se expressam de várias maneiras e têm tido efeitos perversos na vida das mulheres, com pequenos avanços pontuais que já identificamos. E uma das áreas que permanece impermeável a avanços significativos é a área da representação política das mulheres no Brasil. Os espaços de poder permanecem hegemonicamente masculinos e brancos. Há décadas isso se repete, com um perfil que já é conhecido por todos aqui.
Uma das expressões mais contundentes das desigualdades de gênero é a violência contra as mulheres, que tem, na violência política de gênero, uma das suas manifestações. Reitero o que já foi colocado aqui anteriormente, que é importante reconhecer a especificidade da dinâmica da violência política a que são submetidas as mulheres e que não se restringe às agressões físicas, aos assassinatos, embora esses sejam, claro, as suas expressões mais graves.
No Brasil, colecionamos episódios emblemáticos de violência política de gênero, em que mulheres foram vitimadas, mas ainda não contamos com uma legislação específica, o que faz com que essa prática siga sendo bastante naturalizada, pouco reconhecida como uma violência, embora países vizinhos, como a Bolívia, já contem com uma legislação desde o ano de 2012. A Bolívia é um país de referência nessa legislação sobre violência política de gênero.
Em setembro de 2020, as organizações Terra de Direitos e Justiça Global divulgaram o relatório intitulado Violência Política e Eleitoral no Brasil: Panorama das violações de direitos humanos de 2016 a 2020. Eu já escutei a Deputada Erika Kokay mencionar que esse relatório será também apreciado pelos Parlamentares da Comissão. Esse estudo denuncia que, a cada 13 dias, é registrado pelo menos um caso de violência política no Brasil. A pesquisa mapeou 327 casos de violência política que aconteceram nesse período. O Rio de Janeiro, de onde falo, foi o Estado que concentrou o maior número de casos graves, como assassinatos e atentados. E o caso de Marielle Franco, já citado aqui, está entre esses casos.
Neste momento, eu queria fazer um parêntesis para clamar a esta Comissão de Direitos Humanos por justiça para as famílias de Jacarezinho. Este vai ser o Dia das Mães mais triste na favela em anos, pela violência e também pela péssima gestão para enfrentar a COVID no Brasil. Então, eu me solidarizo com as famílias das vítimas do Estado, pela má gestão seja na saúde, seja na segurança pública.
Seguindo com o nosso tema, esse levantamento da Terra de Direitos e da Justiça Global aponta que as mulheres são vítimas preferenciais de ofensas, chegando a 76% dos casos. Também são as mulheres as que mais sofrem violência por parte dos seus pares, ou seja, outros políticos, assim como ameaças virtuais massivas. A dignidade das mulheres é o principal alvo do ataque por parte de homens e seus colegas. É hora de termos uma legislação específica para esse tema da violência política.
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O segundo e último tema que trago aqui para ressaltar diz respeito à paridade na política. Eu me refiro aqui às diferentes possibilidades de paridade entre homens e mulheres que têm carreira política ou querem ter: a paridade na composição das nominatas dos partidos políticos, no acesso a cadeiras no Parlamento, no uso do tempo de rádio e TV para propaganda, no acesso aos recursos para o financiamento da campanha eleitoral, na participação nas instâncias internas dos partidos políticos, na composição das mesas diretoras das casas legislativas e nas CPIs. Vejam, por exemplo, o recente caso da CPI da COVID, para a qual nenhum partido político indicou mulheres e onde a voz das mulheres Senadoras tem encontrado obstáculos para se fazer ouvir.
A política de cotas, como já foi dito, conseguiu fazer alguns avanços na candidatura de mulheres, mas ainda é pouco. Nós ainda não chegamos a uma representação de mulheres no Parlamento que faça jus à nossa contribuição como mulheres na sociedade brasileira.
(Não identificado) - A cidade hoje é dominada pela bandidagem. O Rio de Janeiro chegou a um ponto que ninguém sabe qual é a solução...
A SRA. ADRIANA VALLE MOTA - Eu gostaria de terminar a minha fala.
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Há uma interferência. Peço às pessoas para desligarem o microfone, para que escutemos a fala da oradora.
Pode continuar, Sra. Adriana.
A SRA. ADRIANA VALLE MOTA - Já estou concluindo, Deputada.
Eu queria apenas ressaltar, portanto — e, de fato, o Rio de Janeiro é um caso de extrema violência, mas volto aqui para o cenário nacional —, que nós tivemos alguns avanços com relação à representação das mulheres na última década: um incentivo, um investimento nas campanhas de mulheres; a reforma política de 2015; a ação direta de inconstitucionalidade julgada em 2018 pelo STF, que determinou o mínimo de 30% de candidatas, com, no mínimo, 30% dos recursos. Contudo, isso ainda é pouco, frente ao desafio de tornar mais diversa e mais representativa a nossa democracia. Então, já é hora de avançarmos na reserva de vagas para as mulheres nas casas legislativas. As cotas são importantes e necessárias, mas mulheres com mandatos é fundamental. E já existem projetos que atendem a esse apelo.
Eu queria também dizer que é preciso continuar pressionando partidos políticos para que não deixem de cumprir aquilo que já é lei, o que a lei já preconiza com relação a candidaturas de mulheres. Sem compromisso efetivo dos partidos políticos nesse sentido, nós não teremos avanços maiores.
Finalizo dizendo que as mulheres são imprescindíveis à democracia. Sem as mulheres, nenhum espaço de poder pode ser, de fato, legítimo ou representativo, porque é com a diversidade das vozes, dos corpos, das vidas, das existências das mulheres de todas as raças, religiões, orientações sexuais, procedências, diferentes idades, identidades, gêneros — mulheres no plural — que poderemos ter mais democracia. Perseguir as metas desse relatório da Revisão Periódica Universal é urgente, e é possível. Dias mulheres virão!
Obrigada.
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Dias mulheres virão!
Vou passar a palavra ao Deputado Vinicius Carvalho e, em seguida, à Sra. Sandra Carvalho, da Justiça Global. Logo após a Sandra, nós vamos ouvir a Ana Lúcia Martins, que nós já chamamos e, agora, parece-me que está em condições técnicas de participar desta audiência.
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Tem a palavra o Deputado Vinicius Carvalho.
O SR. VINICIUS CARVALHO (Bloco/REPUBLICANOS - SP) - Sra. Presidente, Deputada Erika Kokay, antes de tudo, quero agradecer, mais uma vez e sempre, a cordialidade de V.Exa. para com este colega, dado que eu pegarei estrada agora e o sinal ficará ruim.
A temática desta audiência pública, cujos idealizadores estão de parabéns, é de grande importância. Precisamos falar sobre este tema.
Em seu nome, Deputada Erika, em seu nome, Ministra Damares Alves, em seu nome, Cristiane Britto, nós parabenizamos todas as mulheres que se fazem presentes nesta audiência pública, juntamente com os meus pares, os meus colegas que estou vendo aqui, o Deputado Julio Cesar Ribeiro e o Deputado Ossessio Silva, e os demais que não estou vendo na tela, mas se fazem presentes.
De forma objetiva, Sra. Presidente, convidados e convidadas, nesta semana, tive conhecimento de uma violência contra uma mulher. Estou falando de algo dos idos de 1935 a 1940. Minha mãe, falecida em 2009, era semianalfabeta. Eu não sabia o grau de escolaridade dela e sempre dizia: "Mamãe é semianalfabeta". E minha irmã, há coisa de uma semana, disse-me que nossa mãe foi tirada da escola pelo pai, porque ela estava aprendendo a escrever — fazia a segunda série — e colocou o nome de um primo num caderninho. Ela escreveu o nome do primo, e, naquela ignorância machista, o pai a tirou da escola.
Naquele momento, os meus olhos se encheram de lágrimas. Vejo que hoje, passadas décadas, temos o mesmo tipo de violência moldada com a evolução social. Nós, cidadãos, homens, mulheres, conscientes, com senso médio, devemos trabalhar e nos unir para que práticas como essas — psicológicas e físicas — sejam exterminadas da nossa sociedade.
Quando a temática é sobre mulheres, não só na política, mas também sobre a proteção das mulheres, dos direitos das mulheres, isso me faz sempre querer estar junto nesse debate. Este não é um tema só de mulher, não é um tema só feminino, é um tema da sociedade. Não é um tema, a meu ver, de direita ou de esquerda, não. É um tema de pessoas conscientes, que sabem a importância da mulher na nossa vida, na nossa sociedade.
Se nós não tivéssemos a maioria de mulheres na nossa sociedade — embora não representativamente, nesse sentido, sendo ali, demonstrada —, nós teríamos uma sociedade muito pior, muito pior. Mas nós temos as mulheres, que nos fazem refletir e nos fazem pensar além do que nós homens pensamos, que é a nossa caixa. E isso é verdade.
Já concluo aqui a minha fala, Presidente Erika Kokay, e parabenizo V.Exa. pelo trabalho que desenvolve na Câmara dos Deputados, juntamente com todas as Deputadas Federais, e cito as nossas Deputadas Rosangela Gomes, Tia Eron, Aline Gurgel e Maria Rosas, que se encontra internada, se cuidando por causa da COVID. E que Deus a abençoe para que ela saia logo dessa situação e esteja conosco para continuar nessa luta.
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Encerrando esta fala, Deputada Erika Kokay, eu digo a V.Exa. que o Partido Republicanos brasileiro não tem as mulheres como uma cota, ele reconhece a mulher como necessidade na política para o desenvolvimento social e também para uma sociedade melhor. Conte sempre conosco!
Muito obrigado.
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Obrigada, Deputado Vinicius Carvalho.
Quero registrar que está conosco a Deputada Aline Gurgel e que o nosso Presidente, o Deputado Carlos Veras, também está acompanhando esta audiência pública. A qualquer momento que queiram, S.Exas. podem fazer uso da palavra, porque nós vamos intercalando as falas dos Parlamentares com as convidadas e convidados.
Vou passar a palavra à Sra. Sandra Carvalho, da Justiça Global, e em seguida, para a Vereadora Ana Lúcia Martins, que, no momento em que foi chamada para fazer o uso da palavra, teve problemas para entrar, mas os problemas já estão sanados.
Tem a palavra a Sra. Sandra Carvalho, da Justiça Global. (Pausa.)
Então, passo a palavra à Vereadora Ana Lúcia Martins.
Vereadora, seja bem-vinda.
A SRA. ANA LÚCIA MARTINS - Bom dia a todos e todas. Espero que agora eu tenha conseguido resolver o problema e que todos me ouçam.
Primeiramente, eu gostaria de parabenizá-los por mais uma reunião em que se discute a importância da participação política das mulheres e também por esta ação. Espero que essas reuniões sejam constantes, porque elas são necessárias, mas que nós possamos ter, a partir dessas reuniões, o início de ações concretas para que se mude a realidade que nós ainda continuamos tendo no nosso dia a dia, nos nossos Municípios, nos nossos Estados.
Mas quero, antes de mais nada, aproveitar este espaço aqui na Comissão de Direitos Humanos para pedir justiça pelo que aconteceu ontem no Jacarezinho, no Rio de Janeiro. Foi uma chacina. Sem nenhuma dúvida, esse é o termo que nós temos que usar para dizer, para denunciar o que aconteceu ontem, em Jacarezinho. Foi chacina!
Muitas mães, como já foi citado aqui pela colega que falou antes de mim, estarão chorando por seus filhos nesse domingo. De nada adianta nós garantirmos os nossos espaços para mulheres na política, se não erradicarmos do Brasil o racismo que estrutura este país, que estrutura esta sociedade, que continua eliminando as nossas crianças, os nossos jovens e as nossas mulheres.
E falando disso, falo da importância de que essas reuniões e relatórios que estão sendo produzidos de fato possam criar políticas, estratégias, práticas, para que a nossa ação no Parlamento seja, de fato, prática e segura.
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De nada adianta garantirmos cotas para a participação nas disputas políticas, de nada adianta garantirmos cotas para a participação nos partidos, se a nossa participação efetiva, que deveria ser garantida, ainda não está garantida com a mesma liberdade e com a mesma democracia que homens, em sua maioria brancos, têm garantida.
Então eu acho que as denúncias todas já foram feitas. As mulheres que me antecederam já pontuaram todas as violências que nós ainda continuamos sofrendo, mas o que eu realmente desejo é que ações práticas, leis que nos protejam, mas que também venham inibir — quem sabe até impedir — que homens brancos continuem a nos impedir de exercer a nossa democracia como nosso direito.
Talvez assim se possa — e esqueci o nome da companheira que falou antes de mim — garantir que, nas câmaras municipais, nas assembleias estaduais e federais, seja garantido esse percentual de participação das mulheres, quem sabe assim nós possamos avançar.
Enquanto nós pedimos que o nosso direito seja respeitado, é preciso que os homens se sintam intimidados a continuar exercendo as suas práticas misóginas, racistas, homofóbicas. É disso que nós precisamos falar. As leis estão aí para serem cumpridas, mas esses sujeitos continuam se sentindo livres nos espaços, nas assembleias, ou fora delas, a partir de suas assessorias, de seus apoiadores, eles continuam livres para nos atacar.
E é isso que precisa ser impedido, isso que precisa ser combatido. Nós mulheres, mulheres nas nossas subjetividades, mulheres nas nossas interseccionalidades, precisamos ser respeitadas como sujeitas de direitos iguais, em qualquer espaço, em qualquer lugar. E é isso que nós precisamos impedir que se reproduza.
Até hoje nós ainda não sabemos quem matou Marielle Franco. São inúmeras reuniões, são inúmeras ações, e nós continuamos sem resposta. Será garantido um número de participação das mulheres, ampliará o direito das mulheres à participação, mas para a pergunta que o Instituto Marielle Franco faz nós não temos resposta.
Quando chegamos a esses espaços, quem cuida das nossas vidas? Essas perguntas precisam ser respondidas. Reuniões como esta precisam — precisam! — dar respostas práticas para essas perguntas. Reuniões como esta, espaços como este precisam responder quem matou Marielle Franco. Espaços como este precisam garantir que as nossas Parlamentares não deixem as suas cidades, não deixem seus Estados para poderem dar continuidade àquilo que lhes é direito conferido pelo voto e pela participação popular. É disso que nós precisamos falar. As denúncias estão registradas. Nós precisamos de respostas.
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Assim, eu concluo pedindo justiça às famílias de Jacarezinho. Que mais esse crime, que mais essa chacina não fique impune, diante dos nossos olhos e da Justiça deste País.
Muito obrigada.
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Muito obrigada, Vereadora Ana Lúcia.
Obviamente, uma operação que deixa 25 pessoas mortas não pode ser considerada uma operação de sucesso. Trata-se de uma operação que nos mostra que, em grande medida, nós temos uma violência sendo institucionalizada, e o braço armado do Estado está atuando para ferir sempre os mesmos corpos. Registro a nossa solidariedade às mães.
E ontem a Deputada Benedita da Silva fazia um discurso, que dizia: "Mães, mães e mães". Ninguém larga a mão de ninguém, mas há muitos úteros negros que choram e muitas mãos das mães que choram pelos seus filhos perdidos pela violência e, ao mesmo tempo, choram com as mãos solidárias.
Por isso, é muito importante que nós possamos, por meio desta Comissão, acompanhar o que aconteceu em Jacarezinho, porque nós não podemos naturalizar a violência.
E aqui, Vereadora Ana Lúcia, nós já escutamos que somos Deputadas histéricas, portanto, "deputéricas". Nós já escutamos: "Mulher que não age como mulher tem que apanhar como homem"; "gaiola das loucas". É a patologização das nossas ações.
Além de superar todos os desafios de uma sociedade patriarcal, misógina, e chegarmos a espaços que pensaram que deveriam ser apenas para a masculinidade e desenvolvem uma masculinidade tóxica, há a tentativa cotidiana de nos calar, de nos estabelecer limites de atuação na nossa vida parlamentar.
Por isso, espero que nós possamos apurar isso com muito rigor. Que nós não permitamos que alguém suba a uma tribuna e coloque um paletó, um button de Parlamentar para aplaudir 25 mortes.
Dando continuidade a nossa audiência, eu passo a palavra à Bruna Benevides, da Associação Nacional de Travestis e Transexuais — ANTRA.
A SRA. BRUNA BENEVIDES - Olá! Bom dia a todas as pessoas que estão participando desta audiência. Deputada Erika, querida, um forte abraço.
Eu gostaria de dizer que é um prazer estar aqui, mais uma vez, nesta Casa, falando em nome da sociedade civil, mas, especialmente, das travestis, mulheres trans, homens trans e demais pessoas trans que estão sendo insistentemente negligenciadas e sofrendo tentativas de apagamento das suas existências, na forma de atuar, principalmente pelo Estado brasileiro e seus representantes.
Nós estamos discutindo a violência política contra as mulheres, mas, imaginem discutirmos sobre essas mulheres, que, sequer, são reconhecidas como mulheres pelo Estado.
10:38
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Eu gostaria aqui de honrar o legado de Kátia Tapety, a primeira travesti eleita para um cargo político no País, em 1992, e a memória de Madalena Leite, de 64 anos, que foi assassinada há poucos dias. Ela foi primeira Vereadora travesti de Piracicaba.
Nós estamos falando de um momento em que as disputas políticas e algumas narrativas que são postas publicamente têm, sim, de certa forma, direcionado o alvo para os nossos corpos. Falar sobre mulheres não inclui mulheres trans e travestis, especialmente na prática.
E aqui eu gostaria de solicitar às pessoas que firmassem um pacto de que é preciso assumir uma posição pública sobre a defesa das nossas vidas e a possibilidade de estarmos nos reconhecendo nesses espaços de forma segura. Até então, os espaços institucionais, os espaços e as Casas Legislativas, não são seguros para os nossos corpos.
Eu gostaria de ressaltar que, quanto aos dados do TSE sobre nome social e aos dados de pesquisa sobre cadastros eleitorais e candidaturas, nós temos feito uma discussão, em reunião com o TSE, no sentido de que possamos melhorar essas metodologias, visto que os dados sobre candidaturas e pessoas trans eleitas foram feitos pela instituição da sociedade civil, por essa pesquisadora que fala com vocês. E o Estado, nesse sentido, precisa assumir o seu papel. Estamos cansadas de fazer o trabalho do Estado.
É importante ressaltar que, em recente audiência na Comissão de Direitos Humanos, nós denunciamos o Estado brasileiro com diversas representações, não só de instituições da sociedade civil, mas também de Parlamentares cis e trans ameaçadas, entre elas, a minha querida Ana Carolina, que acabou de falar. E ficou nítido o descaso do Governo brasileiro com essas mulheres, especialmente as mulheres trans e travestis que representam.
Dentre as 30 que foram eleitas, em 2020, 30% delas foram vítimas de violência política durante as eleições e após o resultado –– isso é muito sintomático quando nós fazemos um recorte, uma pesquisa direta com essas pessoas eleitas ––, e 80% afirmaram que não se sentem seguras para o exercício do seu cargo.
É importante ressaltar, ainda, que aos casos que envolveram violência política contra essas mulheres agregaram-se fatores simbólicos e psicológicos, no ambiente virtual, contra candidatas, durante o período eleitoral. Houve xingamentos de cunho transfóbico; intimidação inferiorizante da condição trans, como incapacitante para cargos políticos; racismo transfóbico; deslegitimação da identidade de gênero dessas vítimas; comentários maldosos sobre a transição e atributos físicos; assédio sexual; ódio cristão, religioso, antitrans, direcionado a essas pessoas; disseminação de fake news degradantes das candidatas; e invasões coordenadas de atividades virtuais de campanha, a fim de prejudicar o seu andamento, gerando um ambiente inseguro, o que, em alguns casos, gera a interrupção por conta de questões de segurança virtual.
Gostaria de ressaltar e lembrar que a Erica Malunguinho, a primeira Deputada trans, negra, eleita na história do Brasil, em 2018, talvez, a única do mundo, foi ameaçada por um Deputado dentro da ALESP nos seus primeiros dias de mandato.
Gostaria de enaltecer a resistência de Duda Salabert, Linda Brasil, Filipa Brunelli, Samara Sostenes, Carolina Iara, Erika Hilton, Benny Briolly, Mariana Franco, Ariane Sena e de tantas outras mulheres trans e travestis por esse Brasil que estão constantemente sendo ameaçadas ao se colocarem nessa disputa.
10:42
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Eu gostaria de apontar um erro grave que nós temos identificado, principalmente sobre os projetos e o andamento do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, quando em recente atividade a Secretária Nacional da Família, a Sra. Angela Gandra, afirmou em um evento que teria sido retirada de circulação uma cartilha que supostamente estaria auxiliando pais a incentivarem crianças a mudar de sexo aos 2 anos de idade; que o Governo teria tomado providência para retirar de pauta um projeto que visaria incluir a ideologia de gênero no Plano Nacional de Educação; que supostamente o Governo promoveria a proteção de pessoas LGBTI contra a violência, mas sem promover artificialmente uma realidade que ontologicamente é um ataque ao ser humano; que teria tido ciência de supostas promoções de toques sexuais e tudo mais em crianças dos 4 aos 11 anos de idade, entre outras afirmações à comunidade internacional, enquanto representante do Estado brasileiro — todas essas, obviamente, desprovidas de qualquer comprovação que lhes dê sustento.
Após denúncias das instituições da sociedade civil, e a ANTRA, que eu represento, foi uma delas, a Dra. Gandra resolveu, então, soltar uma nota, fazendo um pedido de desculpas.
E vejam bem:
A fala da Dra. Ângela Gandra — no pedido de desculpas — não pode ser vista como uma retratação, pois falou em desculpas "se cheguei a ofender alguém", o que é uma forma tradicional de não reconhecer que ofendeu, mostrando não entender ou não querer entender a ofensa que proferiu. E, principalmente, embora reconhecendo que "a abordagem possa não ter sido adequada", fez novas acusações sem provas, quando disse que "há efetivamente uma preocupação dos pais com a ideologia de gênero. Mas esta não se refere, de forma alguma, à discriminação com relações a pessoas transexuais, e sim a uma promoção artificial e precoce da diversidade sexual, realizada especialmente nas escolas e sem o devido acompanhamento dos pais, o que pode causar conflito para as crianças em desenvolvimento". Ou seja, reafirmou acusação que fez já fala inicial, novamente sem provas.
Já me encaminhando para finalizar, é importante ressaltar:
A narrativa político-religiosa contra a existência de uma suposta “ideologia de gênero”, publicamente disseminada, aceita e incentivada com aval de grupos políticos religiosos, também tem grande impacto sobre a violência política. A interferência na política de representações de fundamentalistas religiosos tem potencializado a organização de discursos de ódio em nome de uma (...).
(Não identificado) - Não estourou o tempo, não, Presidente?
A SRA. BRUNA BENEVIDES - Não, eu o estou contando, falta 1 minuto. Eu gostaria de não ser interrompida, inclusive.
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Conclua, por favor, Bruna.
A SRA. BRUNA BENEVIDES - "Promovem-se — assim — ataques e ameaças diretas aos direitos e à própria existência da população trans (...)".
Última frase: insistir na falaciosa narrativa de uma suposta ideologia de gênero leva ao assassinato, especialmente por representantes do Estado.
Não podemos admitir ou aceitar que projetos que pretendem institucionalizar a transfobia ou a LGBTfobia sejam aceitos.
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Conclua, por favor, Bruna.
A SRA. BRUNA BENEVIDES - Seus impactos em nossas vidas são imensuráveis. E isso inclui a violência política. O País que mais elege pessoas trans não pode continuar sendo o que mais mata.
Muito obrigada.
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Obrigada, Bruna.
Apenas quero informar aos Parlamentares que nós estamos controlando o tempo. As pessoas podem ficar tranquilas acerca disso. É muito ruim que tenhamos que pontuar o término dos tempos, mas temos que fazê-lo, porque dezenas de pessoas querem fazer uso da palavra.
10:46
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A SRA. BRUNA BENEVIDES - Deputada Erika, eu queria só pedir às pessoas não envolvidas no controle do tempo que não interferissem nas falas, porque inclusive atrapalham nosso raciocínio. É muito ruim ser intimidada a isso por alguém que não sabe...
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Está ótimo. Nós estamos dizendo que esta Presidência está controlando o tempo, e, obviamente, se as pessoas caminham para o final, não há por que interrompê-las. Mas, na medida em que o tempo se esgota, nós o temos anunciado a todas e todos os que estão participando da audiência, sem qualquer tipo de diferenciação.
Eu quero anunciar que houve uma reunião aqui na Comissão de Direitos Humanos que tirou algumas deliberações sobre violência contra os corpos trans. Nós tivemos uma reunião também na Presidência da Comissão de Direitos Humanos sobre a violência política contra as mulheres. Nós tivemos muitas expressões de violência política contra as mulheres: contra mulheres negras, contra mulheres trans. Enfim, nós temos pelo menos oito casos de violência política contra mulheres e pessoas trans. E esta Comissão encaminhou ofícios às Secretarias de Estado da Segurança, aos Procuradores-Gerais de Justiça, ao Conselho Nacional do Ministério Público, aos Presidentes das respectivas Casas Legislativas, à Polícia Federal, bem como enviou requerimento de informação à Ministra dos Direitos Humanos, Damares Alves.
Eu, pessoalmente, estive com o Diretor-Geral da Polícia Federal, pontuando alguns casos de violência, ainda no ano passado, porque houve muitos ataques. Tem sido alimentada uma cultura de ódio, uma cultura para destituir de humanidade, ignorar e anular os que não são espelho daqueles que professam essa cultura de ódio. Então, há também uma tentativa de articulação para se encaminhar ao Presidente da Casa, o Deputado Arthur Lira, uma pauta, para que nós possamos combater a violência de política de gênero e, inclusive, assegurar os direitos da população LGBTI e da população trans.
Obviamente se constroem conceitos inexistentes, como ideologia de gênero. Não existe ideologia de gênero. Existe uma determinação de fazer valer aquilo que está na Declaração Universal dos Direitos Humanos: todo ser humano nasce livre e igual em direitos.
Nós estivemos atuando com esta Comissão na tentativa de coibir expressões de violência como estas: atentado a tiros contra a residência da covereadora Carolina Iara, no dia 29 de janeiro deste ano, do que aqui já foi falado –– ela esteve aqui conosco fazendo o seu depoimento; ameaças de morte e ataques virtuais à Prefeita de Cachoeira, na Bahia, Eliana Gonzaga — ela viu dois correligionários que atuaram em sua campanha e uma sobrinha serem brutalmente executados no final de 2020; planejamento de atentado contra a Deputada Federal Talíria Petrone, por um grupo miliciano ligado ao Escritório do Crime, em novembro de 2020, denunciado em reportagem da revista Veja; ameaças de morte contra a Deputada Estadual, do PSOL do Rio de Janeiro, Renata Souza, na Internet, em que citavam o assassinato de Marielle e Anderson; ameaças de morte e ataques racistas na Internet contra as Vereadoras Ana Lúcia Martins, do PT de Santa Catarina, que aqui já fez uso da palavra, e Ana Carolina Dartora, do PT do Paraná, no final de 2020; ameaças transfóbicas, racistas, machistas, por meio da Internet, contra a Vereadora Erika Hilton.
10:50
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Nós também tivemos 175 assassinatos de travestis e mulheres trans no Brasil, segundo a ANTRA. Em números absolutos, São Paulo foi o Estado que mais matou a população transexual e travesti em 2020. O Brasil é o país com maior quantidade de registro de crimes letais contra pessoas LGBT, segundo o Grupo Gay da Bahia. Em 2018, foram registradas 420 mortes violentas.
Aqui nós temos 4.094 mulheres negras que foram eleitas, das quais 3.555 são pardas e 539 negras, pretas, totalizando 6% do total de eleitos nas eleições de 2020, conforme dados disponíveis no site do TSE. As Prefeituras serão chefiadas por mulheres em 12,1% dos Municípios. Teremos Prefeitas, destas 32% são mulheres negras, 66,5% brancas, 1,8% amarelas, 0,15% indígenas, 0,15% sem qualquer tipo de informação. E nas eleições para Vereadoras, 16% dos cargos foram ocupados por mulheres, das quais 39,3% são negras e 59% brancas, segundo levantamento do Instituto de Estudos Socioeconômicos.
E aqui nós temos uma subnotificação dos crimes contra as pessoas LGBTQI. E a impossibilidade de regras do programa para atividades parlamentares foi o que impediu Carolina Iara, que é uma covereadora, de ter a proteção daquela Casa Legislativa.
Portanto, são muitos desafios. Nós queremos fazer essa discussão. Como disse, haverá uma reunião com o Presidente do TSE. E nós vamos continuar fazendo o acolhimento das denúncias e buscando interferir para que nós não tenhamos que conviver com esse nível de violência política de gênero. Eu repito: nós chegamos a aprovar nesta Casa um projeto de enfrentamento à violência política de gênero, que é uma violência que se expressa na sub-representação e também em inúmeros ataques que as Parlamentares sofrem no seu dia a dia.
Nós tivemos na Assembleia Legislativa de São Paulo uma Deputada que foi assediada sexualmente no plenário. Então, não é possível admitir esses tipos de ataques, de violências. Eu reafirmo que as violências não são solitárias. E, se você descaracteriza, desumaniza simbolicamente, abre caminho para a desumanização literal.
Eu queria, dando continuidade à nossa audiência, registrar a presença da Deputada Leandre Dal Ponte e passar a palavra para o nosso Presidente, Deputado Carlos Veras, que tem feito uma gestão absolutamente importante e louvável nesta Comissão. Em seguida, vou passar a palavra para alguns dos nossos convidados e para o Deputado Julio Cesar Ribeiro, depois de intercalarmos.
Eu vou passar a palavra agora para o nosso Presidente, Deputado Carlos Veras. Em seguida, nós voltaremos a falar com os nossos convidados. Passaremos a palavra para a Antônia Cariongo, da Coordenação Nacional de Articulação de Quilombos, escutaremos mais duas convidadas e passaremos para o Deputado Julio Cesar Ribeiro — pode ser assim, Deputado? Passaremos, então, para o Deputado Carlos Veras; depois, para a Antônia Cariongo, para a Célia Xakriabá e para a Giovanna Pinto Lemos, que são convidadas...
10:54
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O SR. JULIO CESAR RIBEIRO (Bloco/REPUBLICANOS - DF) - Cada convidado falará por 10 minutos?
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Serão 3 minutos, Deputado, para cada Parlamentar. Serão 5 minutos para os convidados e convidadas, e 3 minutos para os Parlamentares, conforme o tempo determinado em nosso Regimento.
O SR. JULIO CESAR RIBEIRO (Bloco/REPUBLICANOS - DF) - Obrigado. Indaguei apenas para eu me controlar, pois vou ali e já volto, em 15 minutos.
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Deputado, apenas para que V.Exa. possa se organizar, digo a V.Exa. que vou passar a palavra para o Deputado Carlos Veras, Presidente desta Comissão; em seguida, passo a palavra para três convidadas e para V.Exa.
O SR. JÚLIO CESAR (Bloco/PSD - PI) - Muito obrigado.
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Passo a palavra ao Presidente desta Comissão, o Deputado Carlos Veras.
Em seguida, falará Antônia Cariongo, da Coordenação Nacional de Articulação de Quilombos.
Com a palavra o nosso Presidente.
O SR. CARLOS VERAS (PT - PE) - Bom dia a todos os convidados e convidadas, a todos os Parlamentares, a todos aqueles que acompanham esta importante audiência pública.
Cumprimento a Ministra Damares, que está participando sempre das nossas audiências públicas de forma on-line e acompanhando todo o debate através das audiências da nossa Comissão de Direitos Humanos e Minorias, em parceria com o Observatório da ONU.
Quero cumprimentar a Deputada Erika Kokay, Vice-Presidenta desta Comissão, por ter aceitado a missão de hoje coordenar e presidir esta audiência pública, que trata da participação das mulheres na política. Não poderia haver outra condução que não a de V.Exa., Deputada Erika Kokay, à frente desta audiência pública. V.Exa. é uma referência para todos nós, para todas as mulheres, para todos os segmentos, de um mandato empoderado, um mandato de luta, em defesa das causas sociais e em defesa da participação das mulheres, com uma participação efetiva neste Parlamento.
Como V.Exa. já mencionou na sua fala, a participação das mulheres na política teve um tímido aumento, mas ainda precisa avançar, e avançar muito. A participação de todas as companheiras tem sido valorosa. Reconhecemos a necessidade do avanço da participação das mulheres na política.
Quero registrar também que tem ocorrido uma participação das mulheres negras na política, e isso tem provocado uma reação patriarcal e tem provocado uma reação racista. Nós não podemos aceitar que o ambiente da política seja um ambiente onde seja expressado o machismo, o racismo, a homofobia. Nenhum tipo de preconceito nós podemos admitir na política, porque este é um espaço de participação de todos e todas. E tem que ser. Nós temos que lutar para que isso possa acontecer neste espaço.
10:58
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Inclusive, teremos uma reunião, na terça-feira, com o Presidente do Tribunal Superior Eleitoral — TSE, o Ministro Barroso, para a qual levaremos todas as demandas, todo esse debate aqui apresentado nesta Comissão, com as demandas aqui apresentadas, as questões levantadas, nós as levaremos para a reunião com o Presidente do TSE, o Ministro Barroso. É importante que essas reivindicações estejam presentes na reunião com o Ministro Barroso.
Quero colocar que, da Comissão Especial que foi instalada da Reforma Política, nós, da Comissão, os Parlamentares da Comissão de Direitos Humanos e Minorias, precisamos participar efetivamente. E, como Presidente desta Comissão, participarei efetivamente da Comissão Especial que vai analisar a reforma política, para que as ditas minorias possam ser incluídas nesse processo. Nós não podemos ter um processo de mudança do sistema eleitoral que exclua as ditas minorias. Nós precisamos de um processo de reforma eleitoral e de reforma política que inclua a participação das mulheres, dos negros e negras, dos indígenas, da comunidade LGBTQIA+, para que todos possam ter condições mínimas, em pé de igualdade, de participar da política.
Que não seja transformada a participação das mulheres na política em laranjal, em fazer com que as mulheres sejam usadas como laranjas. Nós não podemos admitir isso de maneira alguma, porque isso não ajuda na democracia nem no avanço do sistema democrático da participação política. Por isso, é importante a nossa atuação na Comissão Especial que analisará mudanças no sistema eleitoral.
Quero desejar uma boa audiência pública para todos e todas e dizer à Deputada Erika Kokay que confiamos plenamente na sua condução e no seu trabalho. É uma grande honra, para nós, termos V.Exa. presidindo esta audiência pública no dia de hoje, e não só presidindo esta audiência mas também assumindo o comando da Comissão de Direitos Humanos e Minorias
Vou acompanhar a audiência.
E repito: na terça-feira, teremos uma reunião com o Presidente do TSE, o Ministro Barroso, em que levaremos as reivindicações desta audiência pública.
Desejo uma boa audiência para todos e todas! Contem sempre com a Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara Federal!
O SR. OSSESIO SILVA (Bloco/REPUBLICANOS - PE) - Deputada Erika Kokay, quando houver oportunidade, eu gostaria de falar também.
Obrigado.
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Quem está falando?
O SR. OSSESIO SILVA (Bloco/REPUBLICANOS - PE) - É o Deputado Ossesio.
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Deputado Ossesio, nós estamos intercalando os convidados com os Parlamentares. Então, nós vamos passar para alguns convidados.
O SR. OSSESIO SILVA (Bloco/REPUBLICANOS - PE) - V.Exa. me inscreva. Depois, quando V.Exa me chamar, eu estarei aqui. V.Exa. pode ficar tranquila.
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Está ótimo!
O SR. OSSESIO SILVA (Bloco/REPUBLICANOS - PE) - Eu quero me inscrever.
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Obrigada, Deputado.
O SR. OSSESIO SILVA (Bloco/REPUBLICANOS - PE) - Obrigado.
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Eu vou passar a palavra para Antônia Cariongo, da Coordenação Nacional de Articulação de Quilombos — CONAQ e, depois, para Célia Xacriabá, da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil — APIB.
Com a palavra Antônia Cariongo.
A SRA. ANTÔNIA CARIONGO - Bom dia para todos! Primeiramente, eu gostaria de agradecer o convite e eu queria fazer só uma pequena correção: eu sou do Comitê Quilombola. Eu sou quilombola, sou mulher negra, feminista, quilombola, nasci em um quilombo, vivo em um quilombo. Neste exato momento, estou no quilombo em que eu resido. Sou do Maranhão, do Município de Santa Rita. Sou filiada ao PSOL, por isso estou nesta discussão política, que, para mim, é extremamente importante.
11:02
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Os dados do Governo chamaram muito minha atenção, porque buscamos essas companheiras e não as encontramos. Eu falo pelo próprio Município onde eu resido, onde houve quase 50 mulheres inscritas na campanha passada, e nem 5% delas disputaram as eleições. Então, sempre perguntamos se vamos continuar servindo apenas para preencher cota para homem branco ser político, porque, dentro da minha cidade, do Município onde eu moro, os políticos eleitos são homens brancos. As mulheres servem de chacota, quando entram para disputar a política. Além de sermos minoria neste País, quando aparecem esses dados, observamos que os dados estão servindo apenas para fortalecer ainda mais o homem na política, e não de fato para fortalecer a mulher.
E aí eu me pergunto onde é que está a política pública que vem para orientar as mulheres, para instruir essas mulheres e dizer para elas que não é assim — se você vai entrar na política, tem que disputar espaço —, e para tirar essa visão que a sociedade tem e que nos passa também, principalmente para nós que estamos nas cidades mais distantes, nos Estados mais distantes, nos interiores mais distantes, de que política é espaço de homem, e não de mulher — e, com um detalhe: para aquele que tem dinheiro. Quando você vê uma mulher negra, quilombola, que vive na zona rural, que não tem um emprego bom, que não está inserida em nenhum cargo de Governo, quando ela se candidata, qual é a visão que o povo tem? "Ah, você vai votar nessa daí para quê?" Então, é preciso que haja política pública, uma política de conscientização e de formação dessas mulheres que de fato as instrua e faça com que elas consigam entender pelo menos um pouco de política, antes mesmo que aceitem preencher uma cota para fortalecer os homens na política.
O número do Governo é um número que precisa ainda ser estudado passo a passo. Por que está aparecendo ali? Essas mulheres de fato concorreram às eleições? Onde estão essas mulheres? Quem são elas? O que nós vemos nas cidades em que vivemos, em nossos Municípios e Estados, é totalmente diferente.
Queria parabenizar a Erika Hilton pela fala dela, uma fala maravilhosa, que nos defende, a nós mulheres, uma fala que está de acordo com a pauta. Realmente, nós não somos reconhecidas, principalmente as mulheres negras. Ninguém fala das mulheres quilombolas, que são violentadas todos os dias, psicologicamente, fisicamente, de todas as formas.
E quero dizer que a sociedade precisa entender que nós somos donas de nossos corpos, que nós é que devemos dizer o que queremos que seja feito deles, que eles pertencem a nós. Por exemplo, eu sou mãe por opção minha, mas, se eu não quisesse ser mãe, eu também tinha que ter direito de dizer se queria ou não ser mãe. E não temos política pública que nos oriente. Se existe, que me desculpem a Ministra e os Governos, mas elas não estão chegando. Elas não chegam ao Município; se estão chegando ao Estado, está muito precário, que não vemos uma movimentação, não vemos uma articulação.
As articulações que temos, que são articulações que orientam ainda essas mulheres, são das instituições, das ONGs, como CONAQ, CCN, o Comitê Quilombola, no qual atuo. Mas nós não temos recursos para chegar até as últimas companheiras, que estão nas comunidades mais distantes, isoladas de informação de todas as formas. Então, é preciso que haja uma política pública que realmente atue dentro dessas comunidades, que acompanhe essas companheiras, para que tenhamos um número do qual realmente possamos dizer que é maravilhoso. Que possamos dizer que as companheiras realmente estão na política, que as companheiras realmente estão disputando os espaços políticos. As companheiras precisam realmente estar nesses espaços, porque nós não nascemos para estar apenas dentro de casa, esquentando a barriga no fogão, lavando, passando e cozinhando. Não, nós devemos ocupar os espaços políticos, todos os espaços da sociedade. Temos que ocupar, sim. Somos merecedoras deles, somos trabalhadoras, temos competência para isso. Portanto, queremos, sim, mais política pública, uma política que realmente nos atenda. Queremos que o Governo atue de tal forma que, já que não há uma comissão que vá a essas comunidades fazer um trabalho, pelo menos fortaleça as instituições que lá estão, fazendo esse trabalho sem nenhum recurso.
11:06
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Era o que eu tinha a dizer. Agradeço o espaço.
Muito obrigada ao Deputado Carlos Veras. Eu já tive oportunidade de estar em outros espaços com ele, nos quais ele defendeu muito bem os nossos direitos, o direito dos negros e quilombolas do Maranhão. Muito obrigada!
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Muito obrigada, Antônia Cariongo, pela contribuição. Antônia é do Comitê Quilombola.
Como disse a Erika Hilton, nas mulheridades há muita diversidade. Então, nós temos vários recortes que buscamos contemplar nesta audiência pública.
É por isso que é uma alegria chamar Célia Xakriabá, da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil — APIB.
Em seguida, eu passarei a palavra ao Deputado Julio Cesar Ribeiro.
A SRA. CÉLIA XAKRIABÁ - Bom dia, companheiras e companheiros! Bom dia a todas, todos e todes.
Sou Célia Xakriabá, aqui na representação, junto com nossa companheira Sonia Guajajara, da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil. Mas sou também da ANMIGA — Articulação Nacional das Mulheres Guerreiras da Ancestralidade.
Agradeço à nossa companheira Erika Kokay e também Ao Observatório da ONU por essa parceria com a Comissão de Direitos e Minorias.
Quero dizer que não sou exatamente parlamentar, mas nós temos feito uma luta efetiva, não somente pela demarcação de nossos territórios, porque nós também queremos, como potência que somos, demarcar também o território da política, porque nós queremos também lutar com borduna do Parlamento. É muito urgente pensar esse lugar do poder, e o poder das mulheres indígenas.
Antes do Brasil de partido, direita, esquerda, centro, na verdade nós éramos o Brasil da inteireza, nós não éramos esse Brasil repartido. E, antes de pensar também nas cores do partido, existem as cores da nossa tradição. Então, nós falamos que essa Pátria é grande, mas na verdade a mátria é gigante. Não existe amor à pátria sem respeito às originárias da terra, às originárias do território, porque não existe democracia sem a presença efetiva das mulheres indígenas. Nós queremos ser uma potência não somente do paramentar, da voz, da vestimenta, do canto, da ancestralidade. Nós também somos uma potência parlamentar. E nós queremos ver e escutar a nossa voz ativa também nesse espaço de discussão.
E, cada vez que as pessoas falam que são a favor da causa indígena, nós nos perguntamos quantos corpos indígenas os votos seguem matando, porque não dá para alguém dizer que é a favor dos povos indígenas, da causa indígena, da luta indígena, e ao mesmo tempo sempre votar numa bancada conservadora, que mata nosso direito, que permite a boiada passar por cima de nossos territórios, por cima de nossos direitos.
11:10
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E nós consideramos a estrutura dos Poderes — Executivo, Legislativo e Judiciário —, mas nós reconhecemos e precisamos reconhecer esta potência da luta como um quarto poder, porque este quarto poder da luta é que vai definir a representatividade indígena nesses espaços de discussão.
Acompanhei diretamente a nossa companheira Sônia Guajajara nas eleições de 2018, a nossa companheira Joenia Wapichana, as nossas companheiras (ininteligível), Telma Taurepang, Chirley Pankará, que é co-Deputada Estadual também no Estado de São Paulo, e quero dizer o quanto foi importante toda a mobilização dos povos indígenas naquele período, em que tivemos uma mobilização, no Abril Indígena, por um abril e por um Parlamento mais indígena.
Em setembro do ano passado, realizamos também o Demarcar as Urnas, para pensar na presença dos corpos indígenas, porque nós não podemos curar o mal com a mesma enfermidade. Nós não podemos curar o mal com a sub-representatividade histórica. Por que só foi eleito Juruna desde o processo da Constituinte e somente, agora, com Joenia Wapichana, nas eleições de 2018, concretiza-se a primeira mulher indígena a ocupar esse espaço? Ter a primeira mulher indígena não nos dá a presença, mas, na verdade, dá a obrigação redobrada de questionar o porquê de, em pleno século XXI, somente agora estarem chegando as primeiras.
Então, em 2018, nós tivemos 131 candidaturas indígenas. Não é porque nós não nos candidatamos, é por causa da desigualdade e do processo da criminalização, sobretudo com o nosso (ininteligível), da intolerância política que tenta não somente o assassinato dos corpos das mulheres indígenas na participação política, mas também e principalmente por causa da perseguição, da criminalização e da intolerância política, como é o caso da nossa companheira Sonia Guajajara, que vem sendo alvejada para tentar calar não somente os nossos corpos, como espaço de direito, mas também, sobretudo, a nossa voz ecoante e atuante nesse espaço da política.
Então, na campanha de 2020, em setembro, nós realizamos o Demarcar as Urnas, e foram eleitos 236 indígenas na campanha do ano passado: 174 Vereadores, sendo 40 mulheres desses 174; 9 Prefeitos; na verdade, 1 Prefeita mulher indígena; 9 Vice-Prefeitos; e 3 Vice-Prefeitas mulheres indígenas. As mulheres eleitas somaram o total de 44, e os homens, 194, somando esta representatividade um total de 19%.
Hoje, no Brasil, nós somos 448 mil mulheres indígenas. Então, nós precisamos reconhecer não somente a nossa capacidade poética e ancestral do canto da ancestralidade: nós queremos ser reconhecidas por nossa capacidade política também.
E nós estamos por defender o planeta, numa pauta muito cara para nós, povos indígenas, que é a questão também das mudanças climáticas, que é a questão da respiração do mundo. Em um lugar onde não haja a política do projeto de bem-viver pautada, nós precisamos, pelos corpos das mulheres indígenas, pautá-la, para que não seja a política da morte.
Então, é preciso pensar nessa garantia de lutar com borduna do Parlamento, porque nós queremos um Parlamento de mais mandatos, de mais presença das mulheres indígenas. Nós não temos mulheres indígenas no Ministério, mas nós temos mulheres indígenas que têm um mistério, porque nós lutamos com uma caneta, mas nós lutamos também com a sentença do maracá, com a nossa força ancestral.
E nós entendemos que é urgente pensar a garantia de direitos, porque nós não pensamos, infelizmente, nós não pensamos na democracia com cor. Mas, se nós formos pensar a democracia com cor, veremos que ela tem que ser diversa, tem que ser, no mínimo, colorida. Não existe democracia no Brasil sem a demarcação dos territórios indígenas.
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Eu peço a V.Sa. que conclua, por favor.
A SRA. CÉLIA XAKRIABÁ - Pensar hoje a demarcação dos territórios indígenas e a representatividade indígena no espaço Legislativo é pensar em um bem prestado à humanidade, para se pensar a política do bem-viver, para se estar junto com a bancada combativa, junto com a nossa companheira da Minoria também, e combater, e principalmente não deixar a boiada passar por cima de nossos direitos, por cima de nossos territórios ancestrais.
Nós já decidimos que, se for para continuar a luta, é para que estejamos falando. E nós queremos falar não somente no espaço da luta, nós queremos também falar no Parlamento porque nós acreditamos que os povos indígenas originários do Brasil precisam não somente existir, nós precisamos principalmente ser escutadas.
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Nós temos um compromisso importantíssimo de indigenizar o Parlamento, de indigenizar o Legislativo para pensar a participação efetiva das mulheres indígenas.
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Conclua, por favor.
A SRA. CÉLIA XAKRIABÁ - Quero dizer que nenhum Governo vai calar a nossa voz, nenhuma política vai calar a nossa voz porque a nossa potência é judicial, mas a nossa potência é parlamentar, a nossa potência também é ancestral.
Nesse compromisso, quero dizer que nós não somos mulheres somente, nós somos mulheres sementes, somos essas mulheres do brotar, da nossa resistência.
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Conclua, por favor.
A SRA. CÉLIA XAKRIABÁ - A FUNAI também não pode criminalizar e perseguir as mulheres indígenas, em uma tentativa de intimidação, porque perseguir mulheres indígenas é uma intolerância política, sim.
E nós precisamos fazer eco às nossas vozes porque não existe democracia quando tentam silenciar e calar a voz das mulheres indígenas.
A pátria é grande, mas a mata é gigante! Nós precisamos ter um compromisso de sociedade, da Comissão de Direitos Humanos para pensar a indigenização do Parlamento.
Muito obrigada.
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Muito obrigada, Célia Xakriabá, pela fala. As mulheres indígenas querem as canetas e os microfones, sem abrir mão dos maracás. Foi muito boa a sua fala, Célia.
Passo, então, a palavra ao Deputado Julio Cesar Ribeiro. Depois falará Giovanna Pinto Lemos, do Projeto Elas por Elas.
O Deputado Julio Cesar Ribeiro tem a palavra. (Pausa.)
Parece-me que o Deputado Julio Cesar Ribeiro está com dificuldade para se conectar. Eu pergunto se o Deputado Ossesio Silva pode fazer uso da palavra para intercalarmos as falas dos Parlamentares com a dos nossos convidados.
O SR. OSSESIO SILVA (Bloco/REPUBLICANOS - PE) - Posso, Deputada.
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Deputado Ossesio Silva, V.Exa. está com a palavra por 3 minutos.
O SR. OSSESIO SILVA (Bloco/REPUBLICANOS - PE) - Obrigado.
Em primeiro lugar, eu quero saudar a todos e a todas nesta audiência pública que eu considero de suma importância pelo momento que nós estamos passando em nosso País, que é a questão da pandemia e de tantas coisas. Uma audiência pública como esta é muito salutar por discutir a questão da mulher, a qual apoio totalmente.
Deputada Erika Kokay, eu serei breve. Talvez não gaste os 3 minutos que me concedeu.
Eu quero saudá-la pela condução serena e tranquila que faz nesta audiência pública. Já a conheço do Parlamento, a maneira como se posiciona em defesa da mulher, das pessoas mais carentes, das pessoas menos favorecidas. Quero parabenizá-la pela condução.
Quero saudar também a minha amiga, Ministra Damares, uma guerreira que praticamente luta 24 horas por dia em favor das crianças, dos jovens, dos idosos, das mulheres, enfim, da família.
Quero saudar também a Cristiane Britto, Secretária de Política para as Mulheres, pelo trabalho magnífico que faz; a Cecília Leão, Secretária importante; e os nossos Parlamentares, como a Deputada Aline Gurgel, outra guerreira em defesa da mulher, com um trabalho magnífico na Câmara dos Deputados e no Estado dela, no qual luta muito. O Deputado Vinicius Carvalho nos trouxe uma palavra maravilhosa, uma palavra que englobou todos.
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Esta é uma pauta brasileira, uma pauta mundial. Esta não é uma pauta separada, mas uma pauta de todos nós, de todos os brasileiros, de toda a sociedade brasileira. Nós temos que estar envolvidos nesta pauta em defesa da mulher.
Ainda ontem, como a Deputada Erika colocou, nós aprovamos um projeto em defesa da mulher aqui na Câmara. Naquela ocasião, Deputada Erika, eu coloquei uma emenda, que eu pedi que fosse específica, porque sou Secretário Nacional dos Idosos Republicanos, do meu partido. Eu tento colocar a força específica, e a Deputada atendeu ao meu pedido e também colocou as mulheres idosas, para ficar bem especificado que as mulheres idosas também têm vez. Então, foi aprovado esse projeto. E V.Exa. o aprovou também. Quero parabenizá-la por isso.
Temos o Deputado Júlio Cesar — agora tomei o lugar dele —, todos os participantes e o meu amigo pernambucano. Fomos eleito pelo mesmo Estado, mas por partidos diferentes. É um Deputado fantástico, o Carlos Veras, que está sempre trabalhando muito em favor das pessoas menos favorecidas do nosso Estado de Pernambuco. Quero parabenizá-lo por ser o autor desta audiência pública. Também parabenizo todos os participantes.
Presidente, eu disse que vou ser breve. Queria saudá-los e dizer que trago o meu apoio. Sempre lutei em favor das mulheres, das que buscam seus espaços. Sou um homem negro e não foi fácil chegar a ser Deputado Federal. Para terem uma ideia, quem me antecedeu falou das mulheres negras — várias mulheres falaram, mas eu gostei muito da Paula e da Antônia Cariongo — e das dificuldades por que os negros passam.
Como negro que sou, não foi fácil chegar a Deputado Federal. Sou de família pobre e oriundo do Rio de Janeiro. Para os senhores terem uma ideia, Deputada Erika e todos os que estão nos ouvindo agora, das 25 cadeiras da bancada de Pernambuco, eu sou o único negro. Depois de quase 40 anos, um negro foi eleito. Participar da política e disputá-la, todos fazem. Eu tive esse privilégio que Deus me deu. Na bancada de 25 Parlamentares pernambucanos, sou o único negro eleito, com quase 70 mil votos.
Então, eu quero deixar o meu apoio a esta audiência e às mulheres, Deputada Erika. A única coisa que me incomoda um pouco, por eu ser um homem evangélico — sou pastor evangélico —, é quererem dizer que somos fundamentalistas. Eu não sou.
Sou um pastor de mente aberta. Sou um pastor que congrego, navego, ando com todo tipo de pessoas — tipo no bom sentido —, com a juventude, com os idosos. Eu me dou bem com pessoas de várias outras denominações e credos religiosos. Sou um Parlamentar e luto pela vida.
Eu sou do Rio de Janeiro, mas fui eleito por Pernambuco. Lá atrás, conheci bem aquela vida. Ontem, lamentei e continuo lamentando. Fiz orações pela dor da saudade dos entes queridos, daqueles que foram ali assassinados. Eu acho que a Justiça tem que apurar o que aconteceu e realmente punir, com o rigor da lei, aquele que tem culpa no cartório.
Então, deixo o meu abraço a todos. Quero parabenizar o Deputado Carlos Veras. Quero parabenizar V.Exa., Deputada Erika Kokay, que conduziu a reunião de maneira muito maravilhosa. Parabenizo todos os participantes. Só queria deixar esta palavra: não somos fundamentalistas. Nós somos homens e mulheres de Deus, que lutam pelas almas. Então, amo todos. Como o próprio Cristo disse: "Dar todo o amor ao próximo". Amo todos, porém escolhi essa carreira, escolhi essa estrada, escolhi esse caminho. Então, acho que devemos respeitar uns aos outros.
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É salutar e é importante esta audiência pública. Vou até o final ficar com os senhores, aplaudindo, porque é muito importante lutar. A mulher tem o seu espaço, sim. Se depender de mim, estou aqui para ajudá-la a conquistá-lo.
Contem conosco. Deixo meu abraço.
Muito obrigado por esta oportunidade, Deputada Erika Kokay.
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Muito obrigada, Deputado Ossesio Silva.
Quero apenas dizer da importância de outro recorte que V.Exa. faz no que diz respeito à nossa "mulheridade", eu diria, que é o recorte etário das mulheres idosas. Também a Deputada Leandre tem uma militância grande em defesa dos idosos e das idosas. Há também a Deputada Lídice da Mata, que presidiu a Comissão dos Idosos. Esse é outro recorte.
O SR. OSSESIO SILVA (Bloco/REPUBLICANOS - PE) - Importante.
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Até porque nós sabemos que é dentro do espaço doméstico que mais acontece a violência contra crianças, adolescentes, mulheres e também idosos. Portanto, parabenizo V.Exa. pela preocupação com esse outro recorte, que é o recorte etário.
Vou passar a palavra para a Sra. Giovanna Pinto Lemos, que é do Projeto Elas por Elas. Depois pergunto se o Deputado Julio Cesar Ribeiro já se encontra na sala para que possa também se posicionar.
O SR. JULIO CESAR RIBEIRO (Bloco/REPUBLICANOS - DF) - Estou aqui. Estou aqui agora.
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Passo a palavra para a Sra. Giovanna, ou V.Exa. quer falar agora, Deputado?
O SR. JULIO CESAR RIBEIRO (Bloco/REPUBLICANOS - DF) - Deputada, se V.Exa. permitir e também a Sra. Giovanna conceder, eu gostaria de falar agora, pois estou em outras atividades. Só se puder, é claro, e se a Sra. Giovanna assim o permitir.
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Está ótimo.
Nós o chamamos, e V.Exa. teve dificuldades de se conectar.
Passo a palavra agora a V.Exa., com a permissão da Giovanna. Depois passo a palavra para a Sra. Giovanna e para a Sra. Ieda. A Giovanna é do Projeto Elas por Elas.
Então, tem a palavra o Deputado Julio Cesar Ribeiro.
O SR. JULIO CESAR RIBEIRO (Bloco/REPUBLICANOS - DF) - Muito obrigado, Deputada Erika Kokay. Quero também parabenizar V.Exa. neste momento pela condução dos trabalhos nesta audiência.
Quero agradecer à Giovanna, que permitiu que pudéssemos falar neste momento. Quero cumprimentar, de forma muito especial o Deputado Carlos Veras, que foi o autor desse requerimento e traz esse assunto em boa hora. Estamos a quase 1 ano e alguns meses da próxima eleição. Realmente, precisamos debater esse tema de mulheres na política.
Quero também, de forma bem especial, cumprimentar a nossa queridíssima Ministra Damares, que vem fazendo um trabalho belíssimo à frente do Ministério. Nós temos que realmente reconhecer todo o esforço, toda a luta, toda a dedicação que ela vem tendo em relação a todos os temas pelos quais é responsável neste Governo.
De forma muito especial, cumprimento a Dra. Cristiane Britto, que é a Secretária Nacional de Políticas para Mulheres e também vem fazendo um trabalho belíssimo, inclusive aqui no Distrito Federal. Logo mais, eu irei falar sobre isso.
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Enfim, cumprimento todos os Deputados que se fazem presentes: Deputada Aline Gurgel, Deputado Ossesio Silva, Deputado Vinicius Carvalho, que participou da reunião.
Para mim é uma alegria grande poder estar aqui participando da discussão deste tema. Eu li o folder e vi o tema Mulheres na Política. Isso me fez lembrar do meu partido, do partido ao qual sou filiado, o Republicanos, e da fala do nosso Presidente, o Deputado Dr. Marcos Pereira. Sempre ele tem dito — até dias atrás, era a nossa Secretária, mulher, a Deputada Rosangela Gomes, e hoje o cargo é ocupado por outra pessoa, a Tia Ju — que a mulher na política não é uma cota, mas, sim, uma necessidade.
Então, o Republicanos vê a mulher como uma necessidade. Precisamos, sim, aumentar a bancada das mulheres. Aqui no Distrito Federal, pela primeira vez, salvo melhor juízo — a Deputada Erika Kokay está aqui e pode falar sobre isso —, nós temos cinco mulheres e três homens. Isso prova realmente que algumas coisas já estão mudando.
Mas eu queria enaltecer também o trabalho que o Ministério vem fazendo. Eu tomei conhecimento, porque tenho acompanhado, e isso aconteceu desde o ano passado, do diálogo feito entre os partidos políticos, juntamente com o Ministério, para construir um conjunto de iniciativas de inserção da mulher na política. Só no ano passado, foi assinado um pacto com 18 dos 23 partidos. Conseguiu-se que 18 assinassem esse pacto. Isso é um trabalho que o Ministério vem fazendo.
Quero também enaltecer a criação do canal do Governo Federal para receber denúncias de violência na política. Então, um canal foi aberto em relação a este tema.
Queria também enaltecer o número de Casas da Mulher Brasileira que vêm sendo abertas no País. Neste Governo, já foram abertas oito, sendo uma em Ceilândia. Houve até a participação da Primeira-Dama. A Ministra Damares esteve lá, assim como a Cristiane Britto.
Lembro que, em 2014, até participei da inauguração da Casa da Mulher Brasileira na Asa Norte, mas, infelizmente, ela só abriu, houve só o momento de festa, mas não houve continuidade, o que é uma pena. O dinheiro ficou parado, mas o trabalho da bancada federal fez com que pegássemos tudo aquilo que foi feito na Asa Norte e colocássemos na Ceilândia.
A nossa bancada, e a Deputada Erika também tem nos ajudado, conseguiu alocar recursos para mais três Casas da Mulher Brasileira: em Recanto das Emas, Sobradinho e também em Ceilândia. Eu apresentei uma emenda individual de quase 2 milhões de reais para outra Casa da Mulher Brasileira, em São Sebastião. Eu vejo que a mulher está tendo uma valorização, mas precisamos fazer muito mais.
Quero deixar aqui os meus agradecimentos à Ministra Damares por tudo aquilo vem fazendo pelo nosso País, pelas mulheres; à Dra. Cristiane Britto, que vem fazendo muito esforço, conversando com as Secretárias Nacionais. Somente com muito diálogo, em audiências como esta, promovida pelo nosso querido amigo e Deputado Carlos Veras e conduzida pela nossa Deputada Erika Kokay, é possível encontrarmos soluções. Só assim vamos encontrar caminhos para as soluções para o nosso País.
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No mais, quero agradecer a oportunidade. Que possamos, no futuro próximo, ver muitas coisas boas acontecendo com o nosso País.
Obrigado, Deputada Erika Kokay. Obrigado a todos. Foi um prazer estar com V.Exas.
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Muito obrigada, Deputado Julio Cesar Ribeiro.
Como disse, nós somos oito Parlamentares representando o Distrito Federal na Câmara dos Deputados. Foram eleitas cinco mulheres e três homens. Agora, como houve o afastamento de uma mulher para assumir um cargo no Executivo, nós temos a paridade de quatro a quatro.
Portanto, que o Brasil inteiro possa se expressar e que nós coloquemos a maioria da população brasileira, que são... Nós não somos minorias, nós somos minorizadas, e menorizadas, mas nós somos a maioria do povo brasileiro, como também o povo preto é a maioria neste País.
Eu vou passar a palavra para Giovanna Pinto Lemos, do projeto Elas por Elas. Em seguida, eu a passarei para a Iêda Leal, da Coalizão Negra por Direitos e do Movimento Negro Unificado.
Tem a palavra Giovanna Pinto Lemos.
A SRA. GIOVANNA PINTO LEMOS - Boa tarde aos presentes.
Cumprimento a todos e todas na pessoa da Deputada Erika Kokay.
Meu nome é Giovanna e estou representando aqui o Projeto Elas por Elas, uma iniciativa da Secretaria Nacional de Mulheres do PT. A nossa Secretária Anne gostaria muito de estar presente aqui neste momento, mas teve um voo de caráter emergencial e pede desculpas pela ausência.
Primeiro eu queria louvar aqui a iniciativa do Deputado Carlos Veras de fazer esta audiência pública e também louvar as recomendações aqui colocadas pelo Observatório. É fundamental essa ação do Observatório.
Primeiro, eu queria dizer que o Partido dos Trabalhadores foi o primeiro a estabelecer a obrigatoriedade de paridade nos cargos de direção. Isso é fundamental para a garantia da nossa participação na política interna do partido. Dos partidos progressistas, nós fomos o partido que mais elegeu mulheres negras e jovens e aumentamos a participação de mulheres em 25% em relação à eleição anterior. Em 2020, tivemos aproximadamente 10 mil candidaturas femininas pelo nosso partido.
Entendendo todas as problemáticas que se dão no processo eleitoral, a Secretaria criou o Projeto Elas por Elas, um projeto de abrangência nacional que fomenta a participação e a formação política das candidaturas femininas. São diversas as oficinas, palestras, cursos, que contam com as equipes jurídica, contábil e de comunicação, tudo isso para fazer com que as mulheres disputem para valer, para que não haja mais mulheres "laranjas", para que as mulheres disputem as vagas de verdade. Muitas mulheres, no decorrer deste projeto, observamos que nem sequer sabiam prestar contas ou fazer posts nas redes sociais. Então, vimos a extrema necessidade dessas oficinas, desses cursos para orientar e empoderar as mulheres.
Dentro do projeto, também tivemos projetos específicos para as mulheres negras, para as mulheres jovens e para as mulheres LBT, porque entendemos que nós mulheres somos muitas, somos diversas e que é necessário esse olhar interseccional para as opressões que agem sobre nós. Não podemos universalizar as mulheres e achar que só um tipo de mulher, só uma cor de mulher, só uma classe social de mulher no Parlamento é suficiente. Queremos mais mulheres negras, mais mulheres trabalhadoras, mais mulheres LGBT, mais mulheres jovens.
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Dito isso, apesar dessa iniciativa significativa, nós do projeto nos preocupamos muito com a violência política que as mulheres continuam sofrendo depois da eleição. A violência política está presente em todo o processo, durante e após a eleição. Ocorreram casos bem graves com Vereadoras nossas, inclusive com a Ana Lúcia, que falou aqui anteriormente. Há casos de ameaça de morte, de intimidação, de silenciamento, inclusive após a eleição, depois que a mulher vira Vereadora, vira Parlamentar, o que mostra que só eleger não é suficiente.
Ontem, a CPI da COVID mostrou isso. Diversas Senadoras tiveram muita dificuldade para falar, para expor o que pensam. Isso é muito significativo.
Então, daí vem a grande importância desta audiência pública e de estamos sempre discutindo isso. Só a participação não basta, precisamos de segurança, precisamos garantir a nossa saúde física e mental nesses espaços, para que não sejamos intimidadas e para que a nossa luta continue.
Como último ponto, mas não menos importante, as mulheres do PT aqui deixam a nossa solidariedade a toda a comunidade do Jacarezinho, especialmente às mães que vão passar o Dia das Mães sem seus filhos graças a essa brutal ação policial que aconteceu no Rio de Janeiro.
Muito obrigada, Deputada Érica e todos os presentes.
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Eu que lhe agradeço, Giovanna.
Quero apenas lembrar que é muito correto que a violência política de gênero não apenas impede que nós adentremos os espaços do Legislativo, mas também persiste durante o exercício dos mandatos. Nós fomos chamadas de portadoras de vagina, de, como eu disse, gaiola das loucas, patologizando a nossa condição feminina. Portanto, nós sofremos constantemente com tentativas de nos calar, de nos acorrentar e de estabelecer espaços específicos para nossa atuação dentro do próprio Poder Legislativo.
Mas continuamos dizendo que não nos calarão e nem nos intimidarão, porque a felicidade das mulheres é uma felicidade muito guerreira; é uma felicidade de quem constrói todos os dias os espaços necessários de enfrentamento desse patriarcalismo que é tão estruturante das relações sociais. Nós temos o racismo estruturante, agora temos o negacionismo estruturante, emanado pelo próprio Palácio do Planalto, e temos também um sexismo e um machismo estruturantes.
Passo a palavra neste momento à Iêda Leal, que é da Coalizão Negra por Direitos e do Movimento Negro Unificado, agradecendo-lhe muito pela sua participação como educadora que é — aqueles que lutam por uma sociedade justa são educadores e são educandos, porque o ato de educar é sempre trançado, é sempre construído a partir dos próprios diálogos e do reconhecimento da inteireza do outro.
Com a palavra, então, a Sra. Iêda Leal.
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A SRA. IÊDA LEAL - Bom dia, quase boa tarde, quase boa noite. Esta é a expressão que eu gostaria de falar para todas as pessoas em um País diferente: bom dia, boa tarde, boa noite, boa vida.
Infelizmente, nós amanhecemos com um resultado muito ruim para nós brasileiros e brasileiras.
Quero aqui, em primeiro momento, saudar todas as mulheres presentes, todas, na pessoa da nossa Deputada Erika Kokay. E que todos os homens se sintam abraçados, também na pessoa dessa mulher que está tocando esta reunião hoje. Obrigada pela oportunidade.
O relatório nos dá números, traduz a realidade do povo do nosso País, a realidade das mulheres negras e das mulheres não negras deste País. Então, ser do Movimento Negro Unificado e estar representando aqui hoje a coalizão é de uma responsabilidade muito grande.
Quero agradecer à Ana Carolina, representante da ONU, que deu algumas pistas, e a todas as outras mulheres que foram falando sobre como o Brasil consegue naturalizar o nosso afastamento de lugares absolutamente importantes.
A violência tem que acabar. Para isso, nós temos que radicalizar em alguns pontos. Nós precisamos repactuar, jogar fora algumas questões que estão muito dentro de nós. As desigualdades ferem nossa alma, assim como feriram a alma das mais de 20 pessoas mortas na execução de Jacarezinho.
É desumano o que aconteceu. O Estado pode agir, mas não pode determinar quem vive e quem morre. Não morreram só um policial e vários criminosos, morreram seres humanos. Nós precisamos preservar vidas.
Há 400 mil mortos. A pandemia mata. A fome está matando.
Nós estamos aqui falando de direitos, de conquistas. E hoje nós vimos, com a tradução dos números que o relatório dá, que não são muitas as conquistas das mulheres, vimos a desumanização que sofremos nós, povos indígenas, negros, mulheres não negras, mulheres trans deste País. Então, neste dia nós precisamos dizer que esses números vão nos levar a outro pacto, para acabar com a perversidade, o que o Estado ainda não dá conta de fazer, porque se nega a abrir os olhos para algumas questões. Nós, do Movimento Negro, temos que, em uma audiência, ser porta-vozes de 56% da população.
O Estado brasileiro historicamente pesquisa, sabe da nossa luta, sabe da participação das mulheres não negras deste País, da participação das indígenas, sabe que é importante ter cotas. Nós já falamos isso, nós já fizemos pesquisa. Ninguém que está nesta sala não sabe o quanto é importante ter oxigenada a universidade, todos os espaços, com as presenças das pessoas que representam este País.
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O que estamos querendo dizer aqui? Nós precisamos dizer que, na vida pública e na vida política, nós mulheres precisamos estar representadas de forma adequada, com base naquilo que nós significamos nos números pesquisados e colocados no País. Então, haver cotas é necessário, e essa é uma posição radical.
A cota vai nos ajudar a fazer tudo isso de que todo mundo falou aqui. A cota vai fazer com que as mulheres, de verdade, não apenas concorram a um cargo, mas sejam colocadas no cargo porque aquele cargo público pertence a elas.
Nós não podemos só concorrer; nós temos que assumir. Nós não podemos só pensar que, se concorrermos, alguém virá e nos matará; nós precisamos que nos defendam. Como já foi dito, para nós, concorrer já é um problema, e ganhar é outro, porque as pessoas querem destruir as nossas vidas. Então, nós precisamos ter proteção.
Portanto, para nós, ações de normalização dessa invisibilidade das mulheres têm que ser enfrentadas. A visibilidade das mulheres se dará a partir da ocupação dos nossos espaços. Nós não podemos ser só números para a campanha; nós temos que ser números assentados nas cadeiras.
Os direitos não podem ser violados. Nós temos que ter casa, emprego, transporte, saúde e assistência à nossa saúde, educação, atendimento adequado quando fazemos as nossas denúncias nas delegacias. Nós precisamos radicalizar no apoio às ocupações em todos os espaços das nossas vidas. É isso o que recomenda, no meu entendimento, no entendimento do Movimento Negro Unificado, esse documento do Observatório Parlamentar da Revisão Periódica Universal, que está dizendo: "Esses números têm que ser superados".
Nós recomendamos um decreto para dar apoio claro às iniciativas de ocupar os espaços. São nossos espaços, e nós não vamos negociá-los com mais ninguém. As cadeiras do Parlamento são nossas. Os assentos nos conselhos são nossos.
O acesso à direção de órgãos federais, estaduais, municipais tem que se dar por cotas, para dar visibilidade para as mulheres, mulheres negras, indígenas, trans. Precisamos dar visibilidade. E damos visibilidade quando, ao percebemos os números, os alertas todos, temos a capacidade de nos soltar de todo racismo, machismo e preconceito que existem e dizer: "A participação da mulher na política tem que acontecer de forma radical".
Muito axé! Muito obrigada. Parabéns, Deputada Erika.
Todos estamos aqui para ocupar. O nosso lema agora é: ocupar! E, para nós ocuparmos, nós queremos cotas, que, se não forem ocupadas por mulheres, por todas as representantes das quais já falei, não serão ocupadas por ninguém.
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Muito bem, Iêda. Agradecemos a sua contribuição. Você nos lembra de que nós não somos números, como também não são apenas números aqueles que se vão em função da pandemia, que está tirando tantas vidas no Brasil.
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Aqui eu lembro Clarice Lispector, que diz: "Não. Você não é um número. Nem eu. Porque há o inefável. O amor não é um número. A amizade não é. Nem a simpatia. A elegância é algo que flutua. E se Deus tem número; eu não sei. A esperança também não tem número". Mais adiante, ela diz: "Morte é inefável. Mas a vida também o é. Inclusive ser é de um provisório impalpável".
Nós podemos dizer que não somos números. Não são números os que foram vítimas da chacina que aconteceu em Jacarezinho. Não são números as mais de 411 mil pessoas que foram embora. Não somos números. Nós somos pessoas e queremos viver como pessoas, na inteireza da condição de sermos pessoas, que pressupõe a nossa humanidade, a existência da afetividade, o fato de sermos donas do nosso querer, do nosso saber, do nosso pensar, do nosso sentir e, ao mesmo tempo, a liberdade.
É em nome da liberdade que estamos aqui fazendo esta discussão sobre uma política para que exista equidade de gênero neste País, em todos os espaços, particularmente nos espaços de poder, que nos têm sido negados. E há uma discussão que nós vamos sempre enfrentar: como as paredes e os tetos são de vidro, não se combate o que não se vê e nega-se que existam paredes e tetos. Ao mesmo tempo, como as paredes e os tetos são de vidro, quando nós mulheres e tantos outros segmentos de vítimas mais agudas de violações de direitos não chegamos aos espaços a que qualquer ser humano tem o direito de chegar porque isso nos foi negado, tendem a nos responsabilizar por isso e a nos impor uma culpabilização. Eu já escutei — isso também já foi falado aqui — que as mulheres não estão nos espaços políticos porque não gostam de política. Portanto, responsabilizam as mulheres, e não a sociedade desigual, que é pedaço da lógica colonialista.
Em todos os momentos traumáticos da nossa história, seja no colonialismo, na escravidão, seja na própria ditadura, nós tivemos uma violência que atingiu o conjunto da sociedade, atingiu a nossa condição de estabelecermos marcos civilizatórios, mas atingiu de forma mais cruel as mulheres, a nossa negritude, a população LGBTI, e é preciso que isso seja reconhecido.
Dando continuidade, nós vamos escutar agora a Junéia Batista, que é da Secretaria da Mulher Trabalhadora da Central Única dos Trabalhadores e das Trabalhadoras. Em seguida, nós escutaremos a Covereadora Samara Sosthenes.
Com a palavra a Sra. Junéia Batista, da Secretaria da Mulher Trabalhadora da CUT.
A SRA. JUNÉIA BATISTA - Cumprimento as companheiras e os companheiros.
Obrigada, Deputada Erika Kokay.
Obrigada, companheiro Carlos Veras.
Eu me inscrevi porque eu queria lembrar que a violência contra as mulheres e a participação política se dão em todos os campos.
Gostaria de lembrar bem o que a Giovanna trouxe: assim como o PT, a CUT tem paridade nos espaços de poder, mas nós queremos ir além disso. E, como uma companheira também falou no início, não bastam apenas as cotas, nós queremos ocupar as cadeiras principais.
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Para isso, nós precisamos ser ouvidas como mulheres, como fomos ouvidas na época da criação da Lei Maria da Penha, quando se criou um consórcio do movimento feminista para o Governo ouvir a opinião das mulheres. Então, o que nós queremos é que o Governo, as pessoas que estão à frente do poder, representando as mulheres, nos ouçam também, porque nós temos muitas coisas para falar.
Eu tive que sair no meio da audiência e, no carro, acabei não ouvindo o que foi dito. Não sei se falaram sobre a violência praticada contra a nossa Prefeita Margarida Salomão, de Juiz de Fora, que foi ameaçada só pelo simples fato de querer disputar a eleição e ser a Prefeita de uma cidade brasileira.
O que eu estou querendo dizer aqui é que a participação política tem que se dar com respeito, com combate à violência contra as mulheres. Principalmente, as pessoas que estão nos representando nos espaços de poder, no Executivo, no Legislativo, têm que ouvir a voz do povo, porque uma hora isso vai ser cobrado, e de modo muito feio. A exemplo do que aconteceu no Chile, na Bolívia, na Argentina e do que agora está acontecendo na Colômbia, nós, povo, vamos nos revoltar, porque um dia nós vamos parar de usar máscara e, aí, vamos para a rua.
Agradeço muito ao Deputado Carlos Veras, à companheira Erika Kokay, a todas e todos vocês que proporcionaram esta audiência.
Eu queria que também fosse feita outra audiência, para discutir o direito das mulheres em situação de vulnerabilidade de usarem contraceptivo. Esse direito tem que ser discutido com as mulheres.
Era só esse recado que eu queria deixar.
Obrigada, Deputada Erika. Você é sempre maravilhosa.
Obrigada a todas e a todos.
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Obrigada, Junéia.
Eu quero compartilhar que acabo de ler a notícia de que a nossa Deputada Maria Rosas saiu da UTI. Nós ficamos muito felizes com isso, muito felizes.
Desejamos muita força, muita energia e uma pronta recuperação para a nossa Deputada Maria Rosas, que, como aqui foi citado, estava sofrendo na UTI, mas, conforme a notícia que recebemos, acabou de sair de lá.
Vou passar a palavra para a Covereadora Samara Sosthenes e, em seguida, para Marcelle Decothé, do Instituto Marielle Franco.
Com a palavra a Covereadora Samara Sosthenes.
O SR. SAMARA SOSTHENES - Bom dia a todas, a todes. Eu sou a Samara Sosthenes, Covereadora da mandata coletiva Quilombo Periférico.
Fico muito feliz por estar aqui com todas vocês fazendo este debate, estas reflexões. Fico muito feliz pela minha construção como mulher Parlamentar, como mulher trans. Fico feliz por, finalmente, termos na Câmara Legislativa de São Paulo três mulheres transocupando um cargo e por ver mais mulheres, inclusive mulheres negras, ao nosso lado. Fico muito feliz também por ter Elaine Mineiro encabeçando esse Quilombo Periférico. Estão sendo muito interessantes as nossas construções, principalmente no que diz respeito às mulheridades.
Eu vim do movimento social, do movimento de moradia e do movimento de educação popular. O que me forja nesses movimentos é a luta e a resistência das mulheres. Há 6 anos eu comecei minha vida política de militância, dentro de um acampamento do MTST, e é com a força das mulheres que se constroem essas ocupações, que se constroem as lideranças.
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Foi ao ver mulheres em cargos de liderança, tanto nos movimentos de moradia quanto nos movimentos de educação, que comecei a perceber que eu também poderia ser uma mulher de liderança e que eu poderia liderar outras mulheres e ser liderada por elas também.
A minha construção como mulher trans se dá a partir desse momento, a partir de rodas de conversas de mulheres pretas na UNEAFRO, o que muito me engrandeceu. E eu fico muito feliz de ainda continuar participando dessas construções.
Eu lembro de que, quando eu estava na Câmara, antes de se decretar o lockdown, quando começamos os trabalhos, eu entrei num hall, e havia ali vários quadros dos ex-Presidentes da Câmara. Aí me veio uma indignação por não ver nenhuma ex-Presidente da Câmara mulher, nas 18 legislaturas da Câmara. E me questionei: por que ainda não houve uma Presidenta da Câmara mulher? Por que a nossa primeira Presidente da República mulher sofreu um impeachment da forma como sofreu?
Todas essas questões nos revoltam, mas também acendem essa vontade de militar cada vez mais. Tenham a certeza de que nós mulheres, juntas, vamos muito mais longe e vamos, de fato, conseguir fazer com que o nosso País avance de uma maneira mais assertiva.
O nosso olhar, a nossa força e a nossa resistência têm sido, cada vez mais, vistas pelos movimentos sociais, mas ainda é pouco, ainda é muito pouco. Precisamos nos reerguer ainda mais e estar unidas, independentemente de sermos mulheres trans, não negras, indígenas, travestis. Acho que isso é muito importante.
Eu queria aproveitar e falar sobre uma questão que, atualmente, chegou para nós. Eu também fui Coordenadora do Núcleo de Educação Popular, no Laura Vermont, que agora fica na região da Luz e que, em tempos de pandemia, fez várias ações. Entregamos cestas básicas a mulheres travestis e transexuais profissionais do sexo.
Lembro que muitas de nós fomos tiradas da família, expulsas da família, expulsas da escola, e, como único recurso para nos alimentar, sobra a prostituição. Apenas 5% de nós mulheres travestis têm trabalho formal. Então, isso também é uma denúncia.
E, neste tempo de pandemia, além das cestas básicas entregues para essas pessoas trans e travestis, também há uma procura intensa de cestas básicas na região da Luz por mulheres cis profissionais do sexo. A região da Luz é onde há a concentração de mais mulheres que trabalham como profissionais do sexo em São Paulo. São mulheres, muitas delas, idosas. São cerca de 200 a 300 mulheres que sobrevivem dos seus corpos, por conta da negligência do Estado. Acho que precisamos pautar, sim, isso. E, neste momento de pandemia, elas estão sofrendo ainda mais.
Eu queria, então, ressaltar esse aumento da procura de cesta básica por essa classe de mulheres. Elas não têm acesso a nada e, principalmente, elas não conseguem o auxílio que o Governo dá. Elas não conseguem outras condições, por conta de estarem na posição em que estão.
Eu queria encerrar a minha fala pedindo que olhemos para essas mulheres, que olhemos para as mulheres trans, que, infelizmente, em tempos de pandemia, estão sofrendo cada vez mais vulnerabilidade por conta da negligência do Estado.
Encerro aqui a minha fala.
Muito obrigada a todos.
11:58
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A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Agradeço à Covereadora Samara Sosthenes, que traz uma discussão fundamental com os vários recortes que a nossa mulheridade carrega, inclusive as mulheres trans.
Aqui estamos para organizar a Frente Parlamentar em Defesa das Vidas Trans, porque é fundamental que nós possamos ter a liberdade de identidade e, ao mesmo tempo, que tenhamos assegurados direitos. São lutas que combinam. Quando nós falamos aqui da equidade de gênero, nós estamos falando dos vários recortes que são temas de debates bastante recorrentes. E esta audiência foi construída para que tenhamos, sim, os vários recortes, para que nós possamos perceber que, como eu já disse e repito, pela segunda vez, as violências não são solitárias. Elas partem do pressuposto de anular o outro, porque o outro não corresponde à condição de ser do seu próprio espelho.
Passo agora a palavra para Marcelle Decothe, do Instituto Marielle Franco. Em seguida, falará a Mazé Morais, da Marcha das Margaridas, Secretária de Mulheres da CONTAG.
A SRA. MARCELLE DECOTHE - Obrigada, Deputada.
Bom dia a todas, todos e todes que estão aqui. Saúdo todos os presentes na pessoa da Deputada Erika Kokay.
Primeiro, eu acho que algumas coisas que eu tinha para falar já foram bem abordadas pelas outras colegas e lideranças que estão aqui discutindo este tema tão importante.
Eu acho que devo reforçar a solidariedade às 25 famílias que hoje choram aqui no Rio de Janeiro a perda dos seus entes.
Particularmente, desde o início da manhã de ontem, tenho recebido mensagens de socorro, mensagens de desespero, principalmente de mulheres negras, que são as chefes, as lideranças e as pessoas que cotidianamente estão enfrentando a pandemia e as desigualdades e também lutando para ocupar a política institucional.
Eu acho que devo reforçar isso e aproveitar este espaço para dizer que hoje, às 5 horas da tarde, vai acontecer um ato por justiça, com todas as restrições e cuidados possíveis por conta da pandemia. Mas nós não poderíamos estar em outro lugar senão na rua para cobrar justiça e para dizer que uma operação com 25 mortos não é uma operação, é uma chacina. E é mais uma chacina que marca a história não só do Rio de Janeiro, mas também do Brasil de forma geral, da população negra brasileira, que mais uma vez está na ponta, sofrendo com a violência do Estado.
Eu estou como Coordenadora de Incidência Política no Instituto Marielle Franco, uma organização que nasceu de um episódio bárbaro, que já foi lembrado aqui, o assassinato da Marielle e do Anderson. Foi uma violência política que principalmente expôs as fragilidades do que chamamos de democracia brasileira. O caso da Mari e do Anderson representou esse abismo de vulnerabilidades a que mulheres negras defensoras de direitos humanos engajadas na política institucional estão expostas no Brasil, quando decidem disputar um espaço de poder e quando estão exercendo um cargo para o qual foram eleitas.
Eu gostaria de saudar mais uma vez este espaço e de dizer que as recomendações da RPU não foram implementadas, e há anos os grupos da sociedade civil e movimentos organizados vêm envidando esforços na promoção de debates e disputas no que estamos chamando de política institucional, mas uma política que tenha mais a cara da população brasileira. E essa cara é formada por mulheres negras, indígenas, quilombolas.
12:02
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O racismo e o machismo estrutural são desafios impostos há mais de 500 aos neste País e requerem um esforço e um compromisso maior das instâncias que estão aqui presentes, do Estado brasileiro que está aqui representado e também dos órgãos que compõem o sistema político brasileiro, como o Congresso, o TSE e o Ministério Público Federal, que são responsáveis pela proteção da vida dessas mulheres e por assegurar o direito à vida dessas mulheres, que está no art. 5º da nossa Constituição.
O vírus, a fome, a desigualdade e a violência se tornaram fenômenos constantes no nosso cotidiano e cortam diretamente o tema com que trabalhamos hoje.
Quero reforçar tudo o que já foi dito aqui sobre a condição das mulheres. Não podemos dizer que uma das metas da RPU é mais mulheres na política se não qualificarmos o que significa ter mais mulheres na política. Precisamos discutir a condição da permanência e da disputa competitiva dessas mulheres num cenário político-eleitoral, o que não existe.
Nós do Instituto Marielle Franco, um instituto que nasce da violência política, que nasce do assassinato da Mari — ainda perguntamos quem mandou matar Marielle Franco, porque o Estado ainda não nos deu essa resposta —, ano passado fizemos uma pesquisa chamada A Violência Política contra Mulheres Negras. Dialogamos com 142 mulheres que foram candidatas nas eleições passadas. Identificamos que 98% das candidatas entrevistadas sofreram algum tipo de violência política.
Eu quero fazer um recorte para falar da violência política institucional. No universo pesquisado, 75% das mulheres disseram que a violência vem dos partidos, vem dos companheiros de bancada, vem das pessoas que estão do seu lado na política, cotidianamente. Esse é o tipo de situação que precisamos analisar para produzir antídoto.
Eu ressalto a importância deste debate. Esta Comissão e esta Casa Legislativa precisam tomar a frente das iniciativas de combate à violência política.
Em dezembro do ano passado, fizemos uma audiência nesta Comissão e sugerimos a criação de uma Subcomissão para investigar a pauta de violência política no cenário brasileiro, principalmente no Congresso Nacional. Reforço mais uma vez a necessidade da criação dessa Subcomissão para debater esse assunto e pensar em saídas para a violência política no Brasil. Não há democracia se não conseguirmos combater essa violência que impede que mulheres, especificamente mulheres negras, ocupem e permaneçam na política institucional.
É isso.
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Obrigada.
Vamos apresentar um requerimento para criar uma Subcomissão ou um grupo de trabalho nesta Comissão de Direitos Humanos para discutir a violência que atinge as mulheres.
A violência política de gênero que atinge o exercício do mandato parlamentar se caracteriza como uma violência no mundo do trabalho também, porque nós trabalhamos na Câmara, esse é o nosso local de trabalho, e sofremos assédio moral, com todas as consequências do assédio sobre os corpos, sobre as pessoas.
Nesse sentido, é muito importante que discutamos a violência política de gênero, que é uma violência institucional, numa Subcomissão a ser estabelecida. E aprovamos um projeto sobre isso aqui.
Uma das expressões mais profundas de violência institucional se deu com o caso que chocou o conjunto da sociedade, chocou a democracia, chocou a liberdade. Refiro-me ao caso Mariana Ferrer, que continua sendo vítima de uma sorte imensa de violências que precisam ser identificadas e combatidas.
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É preciso identificar as diversas violências. Nós chegamos a aprovar aqui um projeto contra a violência institucional, contra a violência política. Ontem, aprovamos um projeto para que no mês de março as escolas, com a autonomia que lhes é peculiar, como centro de articulação de redes, de articulação territorial, discutam a violência contra as mulheres. São inúmeras as violências, inúmeras! Então, é importante que possamos fazer essa discussão aqui sobre as diversas violências que se agregam, que se engancham umas nas outras e que potencializam essa lógica de desumanização simbólica.
Lembro que Marielle, num seus últimos discursos, disse: "Eu não serei interrompida". Uma expressão aguda da violência política de gênero é o extermínio da Marielle Franco. Alguns achavam que isso ia impedir a continuação das suas ideias e que isso iria interrompê-las. Elas não foram interrompidas, nem com as balas, porque as ideias, a liberdade, a cidadania são imunes às balas e também às grades.
Parabéns pela fala!
Vou passar a palavra em seguida para a Mazé Morais, da Marcha das Margaridas, Secretária de Mulheres da CONTAG. E a última oradora será a Sônia Coelho, da Marcha Mundial de Mulheres. Ela será a última convidada a fazer uso da palavra nesta audiência.
Tem a palavra Mazé Morais.
A SRA. MAZÉ MORAIS - Obrigada, Deputada Erika Kokay. Estou muito agradecida a você e ao Deputado Carlos Veras pelo convite para estar aqui neste momento.
Primeiro, eu quero parabenizar a Comissão de Direitos Humanos e de Minorias por uma iniciativa como esta, que é sempre muito importante. Este é um espaço que promove o debate político, e acho que abrir esse debate ao público, à sociedade civil, só qualifica o debate e o trabalho da Comissão. Eu me sinto imensamente agradecida pelo convite para estar neste lugar como Secretária de Mulheres da CONTAG, representando as mulheres do campo, da floresta e das águas, agricultoras familiares, e como coordenadora da 6ª Marcha das Margaridas.
Este debate sobre a participação da mulher na política é importantíssimo e urgente, sobretudo em um contexto político de forte ameaça à democracia e aos direitos conquistados, em que as desigualdades se intensificam. Essa urgência é evidente quando nos deparamos com os resultados apresentados pelo relatório. Grosso modo, o relatório conclui que o Estado brasileiro não cumpriu as duas recomendações feitas na Revisão Periódica Universal: a de promover maior participação das mulheres na política e no Governo; e a de implementar medidas efetivas de inclusão das mulheres em todos os níveis do processo de tomada de decisão.
Sabemos que as relações sociais construídas ao longo da história produziram uma hierarquia que colocaram as mulheres numa posição de menor valor em relação aos homens. Por isso, foi preciso criar mecanismos que alterassem as bases dessa desigualdade. E, assim, foi pautada a necessidade de implementação de ações afirmativas, como as cotas, a paridade e outras, que promovessem maior participação política das mulheres.
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Isso provocou mudanças no movimento sindical, do qual eu sou parte; nos partidos políticos; até mesmo no sistema político-eleitoral, com o estabelecimento da cota de no mínimo 30% de candidaturas de mulheres a cargos de Deputado Estadual, Distrital, Federal, Vereador, e a destinação de 30% de recursos do Fundo Eleitoral para as candidaturas de mulheres, aprovada pelo Tribunal Superior Eleitoral em 2018.
Mesmo assim, os dados apresentados pelo relatório mostram que a atuação das mulheres é pouco expressiva no cenário político-institucional. No Congresso Nacional, as mulheres não são nem 15% dos Parlamentares. Só existe uma mulher entre as 30 pessoas que assumiram os Governos nos Estados, e 12% do total de Prefeitos no Brasil são mulheres. Na última eleição, a de 2020, segundo os dados do relatório, 66% das pessoas eleitas foram homens — 34% foram mulheres. Desse percentual de mulheres, 65% são brancas, 32% negras, 1% amarela e 0,15% indígena. Provavelmente, o percentual seria ainda menor se considerássemos as mulheres da agricultura familiar que foram eleitas. Aliás, não temos nenhuma representação no Congresso, no Senado, apesar de sermos protagonistas da maior ação coletiva de mulheres rurais no mundo, a Marcha das Margaridas.
E os motivos para a baixa representação feminina apresentados no relatório são: o machismo, a sobrecarga de trabalho, o sistema político-partidário e a imagem negativa na política. O machismo se manifestou de uma forma muito forte, nessas últimas eleições, na violência política contra as mulheres, que veio a público em 2020. As mulheres enfrentaram ameaças nas redes sociais, invasão de privacidade, exposições, constrangimentos, difamações, etc. Como isso é pouco debatido, ainda não se tem a compreensão de que é, de fato, uma violência. Não existem meios de se proteger... No Brasil, não existem leis que criminalizem especificamente essas práticas.
O machismo também se expressa com violência institucional: mulheres recebem menos recursos no partido ou não recebem recursos financeiros para a campanha; mulheres são insultadas, difamadas e intimidadas para aceitar determinadas condições partidárias ou para desistir das próprias candidaturas; sofrem discriminações, assédios, etc. Não basta garantir os nomes das mulheres e não garantir a efetiva participação delas no processo eleitoral.
Bom, se não houver uma reforma no sistema político brasileiro, com a participação das mulheres, nós continuaremos excluídas desse sistema, apesar de termos muitas formas de fazer política, de realizar nossas lutas e de pautarmos nossas reivindicações no debate público.
12:14
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Nós apostamos numa reforma estrutural da política que mude a forma como o poder é exercido no Brasil. Acreditamos na transformação pela luta e pela disputa política. Continuaremos na luta. Continuaremos resistindo. Continuaremos sendo resistência.
Desculpem se eu passei do tempo. Muito obrigada, Deputada Erika Kokay.
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Obrigada, Mazé, pela fala. Você tem razão. Como diz Michelle Bachelet, quando uma mulher entra na política, muda a mulher. Mas, quando muitas mulheres entram na política, muda a política.
Aqui é bom lembrar as falas, que nós já tivemos no dia de hoje, de que os ataques às mulheres são ataques muito extensivos à sua família, ao seu próprio corpo, à sua própria vida, ao seu ser. Não atacam necessariamente as ideias delas. Atacam também a forma de ser delas. São ataques à própria existência delas.
A SRA. ALINE GURGEL (Bloco/REPUBLICANOS - AP) - Presidente Erika, V.Exa. pode fazer a minha inscrição também? É a Deputada Aline Gurgel.
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Ah, com certeza, Deputada. A senhora quer falar agora ou quer falar depois da nossa última convidada a fazer uso da palavra?
A SRA. ALINE GURGEL (Bloco/REPUBLICANOS - AP) - Eu posso aguardá-la. Muito obrigada.
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Está ótimo, Deputada Aline.
Então, eu passo a palavra para a Sônia Coelho, da Marcha Mundial das Mulheres; em seguida, para a Deputada Aline Gurgel, que será a última pessoa a fazer uso da palavra.
A SRA. SÔNIA COELHO - Obrigada, Deputada Erika Kokay. A Marcha Mundial das Mulheres agradece-lhe a participação e, na sua pessoa, cumprimenta a todas as pessoas presentes nesta tão importante audiência.
Eu quero tocar em dois pontos do relatório. Ele fala que, desde 2014, há uma estagnação no número de organismos de políticas para as mulheres. Nós vimos isso se intensificar depois do golpe de 2015. Vimos esse desmonte da política para as mulheres no Brasil e a falta de recursos. Outro ponto no relatório fala que, em maio de 2019, o Governo apresentou um orçamento inferior a 1% para o Ministério da Damares.
Eu citei isso para dizer que não se faz política para as mulheres sem recursos. Isso é absolutamente impossível! Não é falando, fazendo blá-blá-blá, que se faz política para as mulheres. Não há como reduzir desigualdades de raça e de gênero se não houver investimento do Estado.
Isso mostra bem a situação que nós estamos vivendo. E não é à toa... Eu gostaria que a Damares estivesse aqui para dizer na frente dela... Infelizmente, ela não está. Uma pessoa que se diz Ministra vir a audiência pública tão importante como esta e não ter uma palavra para dizer, que se retira da audiência sem utilizar a palavra, é porque, de fato, não tem feito nada em função e em benefício das mulheres neste País. Então, eu queria deixar registrado aqui o meu repúdio a esta que não considero Ministra das Mulheres no Brasil. É o Ministério da Damares. Não é Ministério da Mulher, porque o que nós temos visto é retrocesso.
12:18
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E há outra situação: todo o Governo Federal tem construído uma imagem negativa das mulheres neste País! Eu quero citar, por exemplo, o Projeto de Lei nº 130, de 2011, que prevê a igualdade salarial entre homens e mulheres. Esse PL foi votado na Câmara e no Senado, e o Presidente Bolsonaro, para não sancioná-lo, justificou dizendo que as mulheres perderiam o emprego, se ele mantivesse esse projeto com multas para as discriminações. Isso é muito degradante! Esta é uma reivindicação histórica de luta das mulheres: salário igual para a mesma função.
Nós sabemos que as desigualdades entre homens e mulheres e o racismo têm uma base fundamental, que é a base material. Não é uma questão cultural. É uma questão que tem base material e que se expressa na pobreza, que se expressa exatamente em salários menores, em trabalho precarizado.
Então, é esse o tipo de coisa, é esse o tipo de postura de um Presidente que vai construindo essa imagem negativa das mulheres. Nós dizemos que as cotas são fundamentais, mas elas são insuficientes para mudar essa situação da participação política das mulheres, da violência que as mulheres enfrentam, se não tivermos políticas nacionais de enfrentamento à violência, políticas nacionais de promoção da igualdade e de enfrentamento ao racismo, coisa a que este Governo não se propõe. Ele só propõe retrocesso, machismo e racismo.
Eu termino a minha fala dizendo: é urgente que esta Câmara vote o impeachment deste Governo criminoso, porque há quase 70 pedidos de impeachment denunciando os crimes deste Governo. Esperamos que isso seja votado, porque é a única forma de nós realmente reconstruirmos a democracia, reconstruirmos este País com democracia, com enfrentamento ao racismo e às desigualdades entre homens e mulheres.
Obrigada.
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Muito obrigada, Sônia Coelho, que aqui representa a Marcha Mundial das Mulheres. Nós parabenizamos a atuação da marcha, que tem sido importante como instrumento de mobilização e de luta. Isso traz uma discussão muito importante, que é a discussão sobre o Orçamento.
Eu penso que a proposta orçamentária de um governo é o strip-tease do próprio governo, das suas intenções, o raio-x das prioridades do próprio governo. Nós tivemos uma proposta orçamentária que, ainda que tenha sido reformulada em alguns aspectos, retira dinheiro de despesas obrigatórias, como aposentadoria e abono salarial, para contemplar Parlamentares e construir uma base de apoio ao Governo. Isso é um raio-x das intenções do Governo. Se você quer uma sociedade com políticas públicas de qualidade, essas políticas têm que estar no Orçamento. É preciso colocar os direitos das mulheres no Orçamento. Nós não podemos ter essa esqueletização do Orçamento para as mulheres e a não execução de algumas proposições.
12:22
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Eu falo com a Deputada Aline Gurgel, que é uma Deputada bastante atuante aqui na Casa. Nós precisamos fazer uma discussão, nós, mulheres, na Secretaria da Mulher, sobre a proposta orçamentária para o próximo ano. Precisamos colocar as mulheres e os direitos das mulheres no Orçamento.
Passo a palavra para a Deputada Aline Gurgel, que é a última inscrita para falar nesta audiência pública.
A SRA. ALINE GURGEL (Bloco/REPUBLICANOS - AP) - Bom dia. Bom dia a todas as convidadas. Bom dia à nossa Presidente, a Deputada Erika Kokay, que conduziu este debate com muita sabedoria, com muito respeito a todas as opiniões. Isso é importante. Nós precisamos manter este diálogo respeitoso em todas as circunstâncias, porque assim vamos continuar avançando. Todas as falas que eu pude ouvir, Presidente, trataram de justiça para as mulheres, mais direitos, igualdade e outras situações que todas nós defendemos.
Eu também quero cumprimentar o nosso Deputado Carlos Veras. Fico muito feliz quando vejo homens fazendo com que este debate aconteça, porque uma sociedade justa e igualitária só vai existir quando homens e mulheres estiverem unidos.
Também quero cumprimentar a Antônia Cariongo, mulher quilombola, negra. Ela está representando aqui várias entidades, que já tiveram fala.
Quero cumprimentar ainda a Sônia Coelho, que é representante da Marcha Mundial das Mulheres, e a Cristiane Britto, Secretária Nacional de Políticas para as Mulheres, a quem quero fazer uma referência especial. Desde que a Cristiane tomou posse, ela não mediu esforços para manter um diálogo constante e permanente com este Parlamento, e, para nós conseguirmos avançar, precisamos ter esse diálogo permanente. Ainda que às vezes as nossas ideias não convirjam, é no debate e no campo das ideias que nós vamos avançar. A Cristiane tem feito isso permanentemente com a bancada feminina, consultando-nos sobre todos os tipos de políticas públicas que a Secretaria Nacional de Políticas para as Mulheres tem realizado. Eu tenho acompanhado isso. Sou uma grande ativista defensora da causa das mulheres. Apresentei várias emendas para políticas públicas voltadas para mulheres. Conseguimos 5 milhões e meio de reais, juntamente com o Senador Davi Alcolumbre, para a construção da Casa da Mulher Brasileira no meu Estado do Amapá. Precisamos capacitar essa rede e fortalecer seus mecanismos.
Tive também a honra de participar com a Cristiane — agora falo de violência política — do lançamento do selo Não à Violência Política, do Ministério da Mulher. Mais de 300 atendentes foram treinadas e estão capacitadas a receber no Ligue 180 qualquer tipo de denúncia. Há uma interlocução permanente com os Ministérios Públicos Federais e um pacto sendo construído com instituições de todos os Poderes para enfrentarmos o feminicídio e toda forma de violência contra as mulheres.
12:26
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Sobre a Cristiane Britto eu posso falar com conhecimento de causa, porque conheço o seu papel de advogada, de defensora das crianças, de defensora das mulheres, sei da interlocução que ela tem feito com o Ministério. A Ministra Damares participou da reunião. Uma grande líder tem a característica de ouvir todas as partes, de ouvir para propor soluções. É isso que ela precisa fazer. O Ministério da Mulher precisa propor soluções.
Eu me coloco à disposição de todos vocês. E quero propor aqui um exercício, Presidente Erika Kokay: que possamos abrir esse diálogo, assim como fez a Frente Parlamentar da Primeira Infância, coordenada pela Deputada Leandre, um diálogo com os Prefeitos, para que eles insiram nos seus planos de governo, eles que entraram agora, um orçamento para as mulheres, assim como fizeram um orçamento voltado à primeira infância. Se não conseguirmos aumentar esse orçamento — e este Parlamento atua para fazer com que Prefeitos, com que o Presidente, com que diversas entidades alojem recursos em políticas públicas para as mulheres —, nós caminharemos lentamente.
Finalizando, quero propor esse exercício de abertura de uma linha de diálogo também com a Relatora da PEC da reforma política, uma mulher, a Deputada Renata Abreu. Vamos abrir uma frente com todas as falas que nós ouvimos sobre violência política e unir esforços para alterar legislações que vão ser construídas agora.
Eu me coloco à disposição. Eu gosto de ação, gosto de atitude. Respeito todas as falas que ouvi aqui. Às vezes eu não concordo com alguma.
Finalmente, quero fazer um comentário sobre a fala da última oradora, a Sônia. Ouvi muito na Câmara pedirem o impeachment da Dilma, agora o impeachment de Bolsonaro... Acho que temos que unir forças, tomar atitudes, criar soluções. Nós precisamos nos unir neste momento tão difícil que o País enfrenta e dar respostas à população, apresentar soluções à população. Uma Presidenta já sofreu impeachment no passado, e continuamos: "Impeachment! Impeachment! Impeachment! Genocida!".
Respeito, mas eu acho que nós devemos agora unir forças para aprovar legislações que nos ajudem a enfrentar, a combater o feminicídio, que mata a cada hora. No tempo desta audiência pública, quantas mulheres já se foram?
Deixo aqui o meu agradecimento. Muito obrigada. Contem comigo. Contem com a Deputada Federal Aline Gurgel, Vice-Presidente da Comissão da Mulher da Câmara.
Muito obrigada, Presidente.
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Obrigada, Deputada Aline Gurgel.
Aqui fizemos um bom debate, e um debate que precisa ter continuidade, até porque eu concordo com a necessidade de nós arrancarmos, de nós desconstruirmos uma faixa presidencial que está no peito estufado do sexismo, do machismo...
12:30
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Acho que os discursos não são inocentes. O discurso que açula a violência, o discurso de ódio, está sempre se transformando em estatísticas. O discurso misógino, o discurso sexista, o discurso machista, ele contribui para o processo de desumanização simbólica. É preciso que tenhamos uma vigilância permanente sobre as políticas públicas necessárias para que possamos romper uma realidade que é ainda muito dura e muito cruel para as mulheres.
Tem razão Simone de Beauvoir quando diz que uma crise atinge todo mundo, mas atinge mais determinados corpos. Ela atinge de forma mais profunda as mulheres. Por isso é muito importante fazer o recorte de gênero em todas as proposições. Eu não tenho nenhuma dúvida de que uma reforma administrativa que acaba com o concurso público em grande medida e assegura apenas dois vínculos com concurso público, de cinco, além de, ao mesmo tempo, tirar a estabilidade, ela atinge o conjunto do País e o conjunto dos servidores e servidoras, mas atinge mais as mulheres, porque somos as maiores vítimas de assédio moral, as maiores vítimas de assédio sexual.
Espero que possamos aqui continuar acompanhando as recomendações, fazendo a revisão periódica, que é fundamental, e continuar trabalhando nesses dois itens que nos dedicamos a discutir no dia de hoje: promover a maior participação das mulheres na política e no governo e implementar medidas efetivas de inclusão das mulheres em todos os níveis de processo de tomada de decisões.
É óbvio que a sub-representação das mulheres nos espaços de poder, no próprio Parlamento, é consequência de um processo de construção sexista, patriarcal, que não pode ser estimulado particularmente por quem ocupa a Presidência da República. Não se pode estimular isso. Sob hipótese nenhuma podemos permitir que alguém diga que uma pessoa não merece ser estuprada, como se o estupro fosse um prêmio. Em momento nenhum podemos permitir a consolidação dos discursos LGBTfóbicos, racistas, enfim, dos discursos sexistas e machistas, porque uma discriminação alimenta outras discriminações, elas não são solitárias. É bom que consigamos perceber isso. Elas não são solitárias. Elas desconstroem juntas a noção de humanidade. O racismo desconstrói a diversidade, e a diversidade é intrínseca à própria humanidade. Por isso é importante que não estejamos trabalhando para naturalizar as discriminações, para naturalizar uma construção de gênero que provoca a discriminação. Não é porque somos mulheres, porque nascemos mulheres, que nós somos discriminadas, mas porque houve uma construção de gênero que estabeleceu lugares subalternos para as mulheres na sociedade e estabeleceu espaços de atuação femininos, que são espaços no próprio lar. A mulher adentra o espaço público, mas a sociedade exige, numa verdadeira ditadura das perfeições, que ela continue perfeita como, por exemplo, dona de casa. Enfim, é como se a sociedade dissesse: "Ocupe teu espaço público! Mas sua casa não pode estar desarrumada, seu filho não pode adoecer". Você tem que estar sempre exercendo as funções que essa construção de gênero impôs às mulheres.
12:34
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É preciso que nós entendamos que a sub-representação, que essas duas recomendações nos reportam à necessidade de atuarmos com o conjunto de políticas públicas. Nesse sentido, aprovamos ontem a Semana Escolar de Combate à Violência contra a Mulher, na perspectiva de enfrentamento e discussão do conjunto das violências que nos atingem.
Portanto, é importante, para que possamos analisar as recomendações, não apenas que possamos constatar que há uma sub-representação, que é muito fácil de se constatar. A participação feminina no Parlamento brasileiro é muito próxima à de países onde as mulheres usam burcas, para mostrar que nós temos nossas burcas invisibilizadas e nossas mordaças invisibilizadas. É importante constatar que estamos muito distantes da construção de uma equidade. Na avaliação do conjunto dos países que são analisados, nós temos uma vergonhosa posição. O Brasil tem uma vergonhosa posição.
Mas é importante também que nós possamos compreender que a sub-representação é fruto — e, como todo fruto, também é semente — de uma série de discriminações que não podem ser repetidas, reproduzidas e fortalecidas por autoridades públicas ou pelo próprio Presidente da República.
Para que se tenha uma ideia, estudo publicado recentemente em um órgão de imprensa aponta que, de 149 países pesquisados na questão de paridade de gênero, o Brasil ocupa a 95ª posição; na questão de participação da economia e equidade de salários, o Brasil ocupa a 132ª posição; na dos afazeres domésticos, mais de 91% das mulheres se dedicam aos afazeres domésticos, enquanto que em outros é muito menor o percentual de homens que ganham mais do que as mulheres.
Muitas desigualdades que se concretizam e que se originam pela dupla, pela tripla jornada, pela subalternização construída na lógica sexista e patriarcal, produzem uma sub-representação. E porque há uma sub-representação nos espaços de poder, particularmente nos espaços legislativos, nós vamos tender a perenizar as próprias discriminações.
Então, fruto e semente, num processo dialético da vida, sempre são parceiros, eu diria. O que é fruto vai virar semente, e o que é semente tende a virar um fruto. A cada tese, uma antítese e uma síntese; e, a partir daí, outra, que se transforma em outra tese e outra antítese, enfim.
Portanto, parabenizo o Deputado Carlos Veras por esta discussão, por todas as discussões que a Comissão de Direitos Humanos e Minorias fará, a partir dessa iniciativa que foi construída durante a gestão do Deputado Helder Salomão. Refiro-me ao convênio que foi firmado, de forma inédita, aqui na história brasileira entre o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos e a Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados, para que nós pudéssemos estar aqui nessa construção de um observatório para fazer a revisão periódica universal e avaliar as nossas recomendações e o seu cumprimento. Portanto, agradeço, sobremaneira, a participação de todas e de todos; agradeço a todas as nossas convidadas; ao nosso convidado — porque houve apenas uma voz masculina nesta audiência —, mas a todas as vozes, com todas as contribuições, com toda a riqueza e toda a diversidade que nós tivemos aqui no dia de hoje.
12:38
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Por isso, parabenizo, sobremaneira, o nosso Presidente da Comissão, Deputado Carlos Veras.
Nada mais havendo a tratar, antes de encerrar os trabalhos desta audiência pública, gostaria de convocar os Parlamentares e as Parlamentares que fazem parte desta Comissão para as reuniões de audiência pública cujo tema é Incentivos à agricultura familiar e Cúpula dos Sistemas Alimentares da ONU, que ocorrerá na próxima quarta-feira, dia 12 de maio, às 14 horas; e, também, audiência pública que ocorrerá na sexta-feira, dia 14 de maio, às 9 horas, para tratar das recomendações sobre Direitos da população negra e combate ao racismo.
Com isso, mais uma vez, agradeço a todas e a todos.
Declaro encerrada a presente audiência pública.
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