1ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA 56 ª LEGISLATURA
Comissão Parlamentar de Inquérito com a finalidade de investigar as origens das manchas de óleo que se espalham pelo litoral do Nordeste, bem como avaliar as medidas que estão sendo tomadas pelos órgãos competentes, apurar responsabilidades pelo vazamento e propor ações que mitiguem ou cessem os atuais danos e a ocorrência de novos acidentes
(Audiência Pública Ordinária)
Em 5 de Dezembro de 2019 (Quinta-Feira)
às 9 horas e 30 minutos
Horário (Texto com redação final.)
10:02
RF
O SR. PRESIDENTE (Herculano Passos. Bloco/MDB - SP) - Havendo número regimental, declaro aberta a presente reunião da Comissão Parlamentar de Inquérito com a finalidade de investigar as origens das manchas de óleo que se espalham pelo litoral do Nordeste, bem como avaliar medidas que estão sendo tomadas pelos órgãos competentes, apurar responsabilidades pelo vazamento e propor ações que mitiguem ou cessem os atuais danos e a ocorrência de novos acidentes, a CPI Óleo, convocada para a realização de audiência pública com a participação de especialistas relacionados ao tema objeto desta CPI.
Encontram-se à disposição dos Srs. Deputados cópias da ata da 3ª reunião, realizada em 4 de dezembro de 2019.
Pergunto se há necessidade da leitura da ata. (Pausa.)
Fica dispensada a leitura da ata, a pedido do Deputado João H. Campos.
Indago se algum membro deseja retificar a ata. (Pausa.)
Não havendo quem queira retificar a ata, coloco-a em votação.
Os Deputados que aprovam permaneçam como se encontram. (Pausa.)
Aprovada.
Esta Presidência informa que o Requerimento nº 36, de 2019, de autoria do Deputado João H. Campos, foi retirado da pauta da reunião realizada em 3 de dezembro corrente a pedido do autor, por tratar-se de proposição destinada a outra Comissão. Por esta razão, o Requerimento nº 33 será arquivado nesta CPI.
Esta audiência pública conta com a presença de especialistas.
Foram convidados e encontram-se presentes os Srs. Clemente Coelho Junior, Professor do Instituto de Ciências Biológicas da Universidade de Pernambuco — UPE, em atendimento ao Requerimento nº 13, de 2019, do Deputado João H. Campos e do Deputado Rodrigo Agostinho; o Sr. Daniel Brandt Galvão, Engenheiro de Pesca, Coordenador do Salve Maracaípe e Professor da Universidade Federal de Sergipe — UFS, em atendimento ao Requerimento nº 13, de 2019, dos Deputados João H. Campos e Rodrigo Agostinho; o Sr. Humberto Alves Barbosa, responsável pelo Laboratório de Análise e Processamento de Imagens de Satélites da Universidade Federal de Alagoas — UFAL, em atendimento aos Requerimentos nºs 1, de 2019, da Deputada Alice Portugal, e 13, de 2019, do Deputado João H. Campos e do Deputado Rodrigo Agostinho.
Solicito a atenção de todos para o tempo destinado à exposição dos convidados e aos debates dos Srs. Parlamentares.
Cada convidado disporá de 20 minutos para proferir sua fala, não podendo haver apartes.
10:06
RF
Os Deputados interessados em interpelar os convidados deverão inscrever-se previamente e poderão usar da palavra por 5 minutos, ao fim da exposição, podendo haver réplica e tréplica.
Feitos esses esclarecimentos, vamos dar início à audiência.
Passo a palavra agora ao Sr. Clemente Coelho Junior, Professor do Instituto de Ciências Biológicas da Universidade de Pernambuco — UPE, a quem convido para fazer parte da Mesa.
O SR. CLEMENTE COELHO JUNIOR - Bom dia a todos.
Bom dia, Deputado Herculano Passos.
Bom dia, Deputado João H. Campos.
Primeiramente eu queria manifestar que foi necessário um esforço um pouco grande para estar aqui, porque fui requisitado para outro evento, em Sobradinho, região que eu não conhecia. Trata-se de evento para a criação do projeto pedagógico para a zona costeira. Mas eu consegui, vamos dizer assim, uma saidinha para estar aqui.
Na minha fala eu vou traçar alguns apontamentos e contar um breve histórico do evento.
Nós do Estado de Pernambuco sentimos por duas vezes o petróleo chegar ao nosso litoral. O fato foi noticiado pela imprensa só a partir da notificação do IBAMA, no dia 2 de setembro, mas o petróleo havia chegado no dia 30 de agosto. E ele teve toda uma dança, um ritual, que chamou a atenção, primeiro, é claro, da sociedade, da opinião pública.
À exceção do Deputado João H. Campos, eu acho que todos nós pisamos em piche quando meninos. Talvez o Deputado João H. Campos não tenha pisado tanto em piche, mas certamente seu pai o fez. E foi um susto que nós levamos quando vimos as manchas, porque esse negócio de pisar em piche era algo que nossos avós, nossos pais ou eu tínhamos por hábito fazer, infelizmente. Eu sou de São Paulo e moro em Recife há 20 anos, e isso acontecia sempre. Eu lembro que quando eu saía da escola e ia para a praia, minha mãe descobria que eu não tinha ido para escola porque o meu pé estava preto. Aquilo era exatamente um sinal de como era a indústria do petróleo e de como era tratada a nossa questão ambiental. Fazia-se a lavagem dos tanques de petróleo. Isso vem de muito tempo.
A imprensa notificou, então, no começo de setembro, a chegada das manchas como sendo decorrentes de uma lavagem de tanques, e durante um bom tempo todos nós ficamos pensando nisso.
No dia 8 de setembro exatamente, eu pisei em óleo. Eu estava em Porto de Galinhas e pisei no piche.
10:10
RF
Brincando, eu até comentei com amigos que o único protocolo real e existente no Brasil era limpar o petróleo com óleo de cozinha.
Mas começou a chamar atenção a quantidade de petróleo. Teria que ser um tanque lavado muito próximo à costa e que estivesse subindo com a corrente. Esse óleo que subiu, então, começou a vir em maior quantidade, com manchas maiores, atingindo o litoral nordestino, rumando a norte. E veio, então, a questão: não é uma lavagem de tanque; é um acidente. Trata-se de alguma movimentação de embarcação, e houve esse acidente.
Logo nessa época, já em meados de setembro, eu entrei em contato com o professor Luiz Paulo Assad, da COPPE — Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, para pedir uma orientação a respeito daquilo, porque parecia que não ia parar tão cedo. Já fazia pelo menos 15 ou 20 dias do acidente, e o óleo subia em direção ao litoral norte do País. Ele, então, disse que possivelmente era um acidente com um navio petroleiro, e exatamente na Corrente Sul Equatorial.
Muitos já devem ter ouvido falar da Corrente Sul Equatorial, porque a imprensa tomou posse dessa corrente — e que bom! —, além de ela estar estampada nos livros do ensino médio: é a principal corrente do nosso Oceano Atlântico, e ela deriva. Ela está, mais ou menos, na latitude entre Alagoas e Paraíba, vindo da África. Depois ela deriva ao norte e depois, ao sul. Então, isso estava muito claro. Esse professor disse: "É a Corrente Sul Equatorial. Só precisamos saber qual é o local".
Na época ele não fez essa modelagem, porque é um trabalho razoavelmente grande. Ele ficou, então, só acompanhando, e nós ficamos dias e dias conversando sobre isso. Um pouco do baile desse óleo, quando chegava ao litoral, tinha a ver com as condições climáticas locais, que nós chamamos de deriva. Então, quando atingia um determinado trecho do litoral, começava a derivar em função dos ventos naquele dia. Para se calcular de onde veio, utiliza-se então a matemática computacional.
A Corrente Sul Equatorial é a mesma que trouxe o Amyr Klink para o nosso litoral na remada. É a mesma que traz o plástico no qual eu recebi a água agora. Vocês estão usando copos de plástico. Esse plástico aí, produzido com derivado de petróleo, é jogado nas nossas bacias hidrográficas e nas bacias hidrográficas do mundo inteiro, vai para o oceano, pega as correntes e chega ao nosso litoral também, vindo de outros oceanos, como da África e de outras regiões. A mesma corrente que o traz trouxe o óleo.
Quando ficamos "livres" — entre aspas — do óleo lá no Estado, veio então a notícia mais assustadora: a de que as manchas estavam, mais concentradas, chegando ao litoral sul de Alagoas, em meados de 4 de outubro.
Então, passamos alguns dias, uma semana, mais precisamente — eu até anotei aqui: do dia 2 de setembro até o dia 7 de setembro —, em Pernambuco, e o óleo subiu até o litoral do Maranhão e, depois, no fim de setembro, apareceu no litoral sul de Alagoas, em Sergipe, na Bahia e começou a subir de novo.
10:14
RF
Foi um baile. E isso se dava por causa da Corrente Sul Equatorial e das características climáticas locais.
No dia 4 de outubro, Deputado, eu liguei para o Secretário de Meio Ambiente de Tamandaré — acho que o Prof. Daniel se lembra desta história. Foi no dia 4 de outubro, Daniel — e para o Secretário de Meio Ambiente de Japaratinga, em Alagoas — Tamandaré é em Pernambuco; Japaratinga é em Alagoas —, dizendo: "O óleo vai chegar". Ele dizia: "Mas como? Você fez o modelo? Calculou isso?". Eu falei: "Não. São os ventos. Vão trazer esse óleo".
No dia 17 de outubro o óleo chegou fortemente ao litoral norte de Alagoas.
No dia 18, fim de tarde, eu saí com o meu carro até Maragogi, para a Praia de Peroba, no Rio Persinunga — consegui chegar no fim da tarde —, e, infelizmente, vi o óleo atravessando do Estado de Alagoas para Pernambuco. Eu tenho essas filmagens, que posso disponibilizar para vocês. E realmente não era uma questão de se ter uma bola de cristal. Era algo que deveria ter sido monitorado com mais seriedade. Isso é algo que deveria ter sido feito. Não havia bola de cristal nenhuma. Havia, na verdade, a previsibilidade na nossa mão. Com ela, poderiam ter sido adotadas medidas para minimizar o impacto.
A partir desse momento, ao que nós assistimos no Estado de Pernambuco foi correr atrás do óleo o tempo todo. O tempo todo estávamos correndo atrás do óleo.
Eu acompanhei esse óleo até o litoral norte. Em todos os momentos eu vi as ações do Governo do Estado, que tomou frente para fazer esse combate, essa ação que deveria ser feita pelo Governo Federal.
E muitas vezes nós víamos que faltava informação também. Os próprios técnicos, quando o óleo atingiu a Costa dos Corais — e, aí, havia analistas ambientais do IBAMA, do ICMBio, da CPRH —, as conversas eram na praia. As pessoas conversavam: "Para onde o óleo vai? Onde eu tenho que colocar a barreira?" "Essa barreira funciona?" "Como fica?". Eu até brincava com alguns dos analistas ambientais do órgão ambiental do Estado, que eu conheço — alguns foram meus alunos —, dizendo: "Qualquer medida agora tem que ser feita. O óleo está chegando. Ninguém está combatendo o óleo em alto mar".
O óleo, então, atingiu fortemente o nosso litoral de Pernambuco e a APA Costa dos Corais, de Barra de Santo Antônio até Maragogi — a APA da Costa dos Corais, para quem não sabe, é a segunda maior unidade de conservação marinha do Oceano Atlântico Sul. Tem uma importância fundamental para a pesca e para o turismo. E ela foi atingida.
Quando chegou a Tamandaré, mais precisamente, ao que nós assistimos — e eu estava lá, na Praia dos Carneiros, às 5h30min — foi um monte de pessoas saindo da sua casa, da pousada, a pedido dos donos das pousadas, para meterem a mão no óleo, limparem, sem qualquer critério técnico ou qualquer proteção mediante o uso de EPIs — Equipamentos de Proteção Individual. Eu tenho isso fotografado, tenho isso filmado, tenho isso registrado.
10:18
RF
Foi quando Salve Maracaípe, PE sem Lixo, as meninas da Xô Plástico começamos a nos articular nas redes sociais, avisando: “Olha, tem que usar EPI, pois o óleo é extremamente tóxico”. E vieram então as primeiras ações conduzidas pelo Salve Maracaípe — acredito que Daniel deve contar um pouco dessa história —, com alguma ajuda do Governo do Estado e principalmente de doações.
Eu recebi doações — que passei para o pessoal do Salve Maracaípe — de equipamentos, luvas maiores e também orientação para o uso de roupas que protegessem a nossa pele e máscaras, que era o principal. Cada máscara custa — estou falando das máscaras ideais —, para vocês terem uma ideia, em torno de 200 a 300 reais. Nós estávamos usando aquelas máscaras compradas na farmácia. Isso começou a ser feito de uma forma mais interessante.
No evento de que eu estou participando há alguns colegas da Bahia e algumas pessoas que eu conheci agora, e, apesar de estar acompanhando, eu lhes perguntei: como foi lá? “Lá nós utilizamos EPIs.” Eu falei: que bom! Mas de onde vocês tiraram isso? “Do exemplo que vocês deram lá em Pernambuco. Nós vimos o desespero de vocês.”
Todos aqui devem ter visto a foto de um menino, um guri de 12 anos, desesperado. Aquilo não é uma montagem. O menino estava desesperado porque a mãe tem uma barraquinha na Praia de Itapuama e sobrevive disso. Ele entrou no mar com saco plástico colocado no corpo, enrolando plástico na mão, para tirar o óleo, e estava todo manchado de óleo. E ele falava: “Eu preciso limpar. Este é o ganha-pão da minha mãe!”
Isso se deu durante muitos momentos. No dia 19, havia uns 3 ou 4 dias que eu estava no litoral sul. Então, eu voltei para casa para tomar um banho, me alimentar, pegar meu carro e ir para Suape, porque o óleo tinha chegado lá. Entrei no manguezal achando que eu seria o único ser humano que estaria ali olhando o óleo chegar — o manguezal é o ecossistema mais sensível e, ao mesmo tempo em que é o mais sensível, é aquele que garante a segurança e soberania alimentar das comunidades tradicionais. E eu entrei.
Quando eu entrei no mangue, o que eu vi foram pessoas saindo da sua casa, da sua comunidade, totalmente despreparadas, principalmente mulheres marisqueiras, com seus filhos pequenos, para limpar o óleo. E eu no meio do mato, com cinco luvas que tinha dentro do carro, as quais consegui passar para cinco marisqueiras. O resto meteu a mão.
O que eu fiz foi ligar para Capitania dos Portos, ligar para Suape, para receber assistência, porque era incontrolável — incontrolável! O óleo chegou a todo o nosso litoral nordestino. O tempo todo nós seguimos correndo atrás do óleo.
Quando um pesquisador fez um alarde sobre o óleo, alertando para uma enorme mancha no oceano — acredito que vocês tenham visto isso —, foi exatamente no final de outubro, começo de novembro. Ele deu esse alarme: “Vai chegar uma enorme mancha, que vai atingir Abrolhos.”
10:22
RF
Eu rapidamente entrei em contato com o pessoal do COPPE e perguntei: é verdade? Essa mancha está muito estranha. Uma mancha desse tamanho, gigantesca... Ela vinha com manchas grandes; às vezes, manchas do tamanho desta sala. Era uma mancha de quilômetros. “Não; é um falso alvo”, eles chamaram.
Por causa desse falso alvo, a Marinha colocou oito navios em Abrolhos. Nós estamos falando de 64 dias depois do derramamento de óleo. Foi quando a Marinha tomou providência.
E aqui eu queria entrar em um detalhe. Vamos continuar correndo atrás do navio que possivelmente derramou esse óleo. Eu acho que nós não temos que pensar em fazer muitos cálculos para saber que isso realmente se deu em áreas internacionais. O óleo veio de um navio que possivelmente não foi rastreado — possivelmente não foi rastreado, repito, porque tudo corre em sigilo, e nós não temos essas informações.
Esse óleo chegou, e nós não sabemos nem a quantidade! Foram tiradas 6 toneladas da praia. Mas quantas estão ao fundo? O óleo, quando migra, passa por um processo de decomposição — ou de intemperismo. Tecnicamente chamamos de intemperismo físico-químico —, em que inicialmente ele volatiliza e solta as moléculas, inclusive as mais nocivas para o ser humano. Se nós imaginarmos que o derramamento foi a mil quilômetros, ele veio já perdendo massa e ficou um pouquinho mais pesado, veio em subsuperfície e chegou ao nosso litoral, o cálculo é de que esse óleo derramado no início de julho. Isso significa que, a mil quilômetros, vindo até o nosso litoral, atingiu todos os ecossistemas marinhos e costeiros, sem exceção.
E agora chegou ao Rio de Janeiro. Então, nós temos 877 localidades e 127 Municípios atingidos, conforme o último relatório do IBAMA.
Bem, acontece que eu posso falar para vocês que existe todo um histórico em relação aos acidentes de óleo; existe muita informação, não só na literatura científica, que mostra o quanto é nocivo o petróleo, não só para o meio ambiente, mas para a saúde humana. Dois casos foram resgatados pela imprensa, e eu até mesmo provoquei isso, que foram o caso do Prestige, em 2013, e o caso da British Petroleum — BP, no México, em 2010.
Para vocês terem uma ideia de como a situação é complicada, o primeiro trabalho — e o mais pesado, mais forte — para falar do impacto do óleo no meio ambiente, no caso da BP, no México, foi publicado no mês passado. E os resultados são assustadores: toda a cadeia alimentar foi prejudicada, houve um impacto gigantesco em todos os organismos marinhos daquela região, e os pescadores que trabalharam na limpeza e os voluntários também estão sendo monitorados há 9 anos quanto à saúde deles.
10:26
RF
Agora vou dizer para vocês que, em outubro de 2013, nós criamos um plano chamado Plano Nacional de Contingência, no qual existe uma Comissão Executiva, que é responsável pela operacionalização do Plano e que prevê desde o monitoramento da chegada desse óleo até a forma como eu tenho que chegar para fazer a medida, a fim de o óleo não atingir a costa brasileira, passando pelas medidas de limpeza. Além disso, ele trata dos estudos que devem ser feitos e do monitoramento da saúde dos ecossistemas e das pessoas. E nós só ouvimos falar do Plano Nacional de Contingência no dia 8 de outubro.
Existe um grupo chamado Grupo de Acompanhamento e Avaliação — do qual eu faço parte agora; fui convidado pela Marinha — que faz parte de todo o organograma do Plano Nacional de Contingência. Ele foi acionado exatamente 3 meses depois do acidente.
Eu não quero me estender porque o Daniel vai falar, e questionamentos podem vir, mas uma das maiores preocupações que nós temos hoje é com a saúde da população. Eu estive na comunidade de pescadores do Rio Una, do Rio Massangana, conversei muito com salvaguardas de Ipojuca, de Porto de Galinhas, que trabalharam na limpeza das praias. Tenho alunos que participaram — meus alunos eu não permiti que participassem. Eu disse: "Não. Vamos deixar, porque chegará um momento no qual o Plano Nacional de Contingência entrará com toda a sua técnica". Isso consistiu em acionar, então, brigadistas do IBAMA, do ICMBio, da Marinha e do Exército. No dia 18 de outubro, o Exército chegou para limpar a praia de Mambucaba, em Tamandaré. No dia 18 de outubro! Eram meninos jovens, de 18 anos de idade, recém-alistados, com camisetas, bermudas, descalços e com as mãos livres.
Leiam um pouco sobre o impacto na saúde humana, publicado agora pelos sanitaristas como, por exemplo, a Dra. Lia Giraldo, da FIOCRUZ, que, inclusive, indico para vir conversar com vocês. Ela foi a primeira pesquisadora a trabalhar com o impacto dos hidrocarbonetos na saúde humana, no caso, numa região de que vocês já ouviram falar: o Vale da Morte, em Cubatão. Ela, que faz isso desde 1985, diz que o impacto não é apenas de contato, com uma alergia na pele, mas, sim, com graves problemas de saúde, que podem levar até ao câncer.
Essas pessoas não foram assistidas ainda! Não se sabe o grau de contaminação dessas pessoas. O Governo ainda não deu recursos para salvar essas pessoas. E o mais assustador: elas estão passando fome. Eu fui à comunidade do Una, composta de marisqueiras e pescadores, levar para eles cesta básica, e eles disseram: "Professor, nós não temos dinheiro para comprar comida. Sabe o que a gente está comendo? O peixe que as pessoas não querem comprar". E sabem como possivelmente está este peixe? Contaminado.
10:30
RF
Querermos descobrir de onde veio o óleo não adianta. Nós temos é que assistir essas pessoas. Elas pertencem à cadeia alimentar, como todos nós, e estão passando fome. Nós vamos ter um problema sério para o futuro. Lembrem que até 80% dos animais da produção pesqueira, de espécies de importância econômica, são espécies que se reproduzem adivinhem onde? Nos manguezais, onde estão localizadas as comunidades tradicionais. E no nosso Nordeste 80% da produção pesqueira advém da pesca artesanal. Isso é uma equação que vai mostrar que nós não vamos ter um futuro muito legal pela frente. Nós vamos ter problemas sérios, sejam sociais, sejam de saúde pública. Nós estamos diante da maior tragédia ambiental da história do litoral brasileiro e, possivelmente, do mundo, e não podemos ficar calados e não podemos ficar parados, o que é mais importante. Nós vamos ter que nos movimentar. E vamos ter que assistir essas pessoas.
Se vocês me perguntarem — porque eu sou biólogo e oceanógrafo; talvez as perguntas possam vir: "Professor, e o impacto para o fitoplâncton e para o zooplâncton? Vamos falar sobre isso?" Hoje a minha preocupação é com a saúde das pessoas. Eu digo para vocês que a natureza vai dar conta. As medidas que estão sendo feitas são paliativas. Não se consegue limpar 100% do ecossistema. Logo que o óleo chega, chegam partículas tão pequenas, tão pequenas que um cientista da Oceanografia da universidade federal pegou areia da praia, levou para o microscópio e viu que aqueles microrganismos que são a base da cadeia alimentar já têm óleo na sua barriguinha. E não é um óleo qualquer, não é um fragmento; é um composto de moléculas nocivas.
Isso está presente, gente! Não adianta chegar, falar e só querer apontar para o turismo, que está tendo prejuízo. É claro que está tendo prejuízo! Na APA Costa dos Corais, os jangadeiros, que fazem turismo de base comunitária, também não estão recebendo dinheiro. E para eles o turismo é a alternativa para a pesca. Eles não têm o que comer, não têm peixe para vender e ainda não têm turista. Não é a grande indústria, como a de Porto de Galinhas, que vai conduzir o que nós devemos fazer. O que nós devemos fazer é pela comunidade.
Eu acabei de ver este painel maravilhoso que há aqui do lado, que mostra pessoas e animais, todos sorrindo. Logo imaginei que, sem os animais, os personagens daquele quadro não estariam sorrindo. Estariam tristes, e é isso que está acontecendo no nosso litoral.
O SR. PRESIDENTE (Herculano Passos. Bloco/MDB - SP) - Quero agradecer ao Sr. Clemente Coelho Junior o depoimento.
Quero fazer uma consulta aos Deputados. Nós vamos interpelar cada palestrante, ou ouvimos os três e fazemos as perguntas gerais?
Vocês concordam em ouvir os três palestrantes e depois nós...
O SR. JOSEILDO RAMOS (PT - BA) - Vamos ouvir os três.
O SR. PRESIDENTE (Herculano Passos. Bloco/MDB - SP) - Então vamos passar para o segundo palestrante, porque daí o debate fica até melhor. Faremos as perguntas aos três oradores.
10:34
RF
Quero convidar para compor a Mesa o segundo palestrante, Sr. Humberto Alves Barbosa, responsável pelo Laboratório de Análise e Processamento de Imagens de Satélites, da Universidade Federal de Alagoas, em atendimento ao Requerimento nº 1, de 2019, da Deputada Alice Portugal, e ao Requerimento nº 13, de 2019, do Deputado João H. Campos e do Deputado Rodrigo Agostinho.
O SR. HUMBERTO ALVES BARBOSA - Bom dia a todos.
Eu quero agradecer ao Deputado Herculano Passos e ao Relator João H. Campos o convite para participar desta importante audiência pública.
Cumprimentando o Deputado Herculano Passos, cumprimento todos os membros da Mesa.
Qual é a ideia principal? Mostrar o esforço da Universidade Federal de Alagoas, por meio do Instituto de Ciências Atmosféricas, e do Laboratório de Análise e Processamento de Imagens de Satélites — LAPIS. Esse é um esforço conjunto de vários professores, exclusivamente colaboradores e alunos do LAPIS.
A ideia principal de monitorar o óleo no litoral do Nordeste do Brasil partiu de um desafio inicial. Qual foi o desafio inicial? Saber qual é a importância dessas manchas e como elas poderiam ser monitoradas por satélites.
Essa é a minha competência. A minha formação é em Meteorologia. Eu tenho mestrado e doutorado na área ambiental. Isso foi importante para tratar dessas questões. A minha competência é em satélites. Trabalho há mais de 20 anos com satélites. A minha formação foi no Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, no mestrado, trabalhei com satélites, e, no doutorado, utilizei ferramentas de satélites.
(Segue-se exibição de imagens.)
Esse foi o primeiro desafio. Por que foi o primeiro desafio? As autoridades disseram claramente que as imagens de satélites não poderiam detectar, ou registrar, as manchas de óleo. De certa forma, essa questão chamou a atenção do Laboratório. A nossa competência nos últimos 20 anos é trabalhar com informações satelitais. Ali, já nos chamou a atenção, e foi importante tratar desse desafio, porque havia um questionamento interno no sentido de que, sim, as imagens de satélites poderiam detectar manchas de óleo. Isso já acontece internacionalmente. Há informações e exemplos claros de como as imagens de satélites podem registrar, nesse caso, detectar — eu vou tentar evitar o jargão —, essas informações.
10:38
RF
Então, foi nesse contexto que nós entramos nessa questão, independentemente do monitoramento do derramamento de óleo.
O LAPIS tem mais de 15 anos de experiência com imagens de satélites. São recebidas diariamente mais ou menos 10 gigabytes de dados diários de um sistema de recepção direto. Essas são as imagens que vocês estão vendo. Desde 2008, essas imagens são recebidas diariamente, o que nos permite competência, desenvolvimento de metodologias, utilizando diferentes satélites ambientais e meteorológicos.
Por causa da minha formação de meteorologista, eu trabalho com satélites geoestacionários e também trabalho com satélites ambientais, e isso, de certa forma, facilita a minha interpretação. Foi nesse sentido que nós tentamos atender esse desafio internamente.
Nós já temos experiência e competência em desastres. Atuamos especificamente no voo da Air France 447; na parte geológica do afundamento de três bairros em Maceió; no acidente aéreo do cantor Gabriel Diniz; e, nos últimos anos, no monitoramento de secas, colocando produtos e informações para as Prefeituras, para os usuários de uma forma direta, rápida e de modo que a comunicação possa ser mais facilitada na interpretação dessas informações. Então, há uma competência, uma experiência já com desastres.
Nesse sentido, o que nós estamos fazendo aqui é não só mostrar o que foi feito durante esses meses em relação ao derramamento de óleo, mas também propor ações. E uma ação que já está em curso é o monitoramento de óleo na costa leste e nordeste do Brasil.
O que nós estamos propondo basicamente — ainda é um protótipo — é uma integração que vai desde as dutovias dos poços de perfuração às rotas marítimas. Há um pouco de modelagem marítima ali, onde vocês estão vendo o rascunho na área internacional em alto mar, aquela área hachurada, e informações do satélite Sentinel. Isso é uma plataforma de integração de informações que permite que eu ou qualquer pessoa — não precisa ser um especialista — acesse essas informações e, de certa forma, interprete alguns resultados. Obviamente, há informações técnicas; porém, isso não impede qualquer usuário interessado de analisar as informações.
Então, foi nesse contexto e é nessa situação que nós do LAPIS estamos propondo uma ação concreta. Esse esforço de colocar essas informações já vem há um mês. Há especialistas no grupo com vasta experiência na parte de integração de dados, e nós mostramos pela primeira vez qual é o protótipo de monitoramento de derramamento de óleo na costa brasileira.
É importante nós destacarmos que, desde o início, o LAPIS teve não só a preocupação de entender a origem do derramamento, mas de buscar mecanismos, ferramentas... E nós sempre batemos numa tecla de que esse derramamento de óleo tem várias causas, tem várias origens. Isso não é achismo; isso é uma conclusão obtida a partir de evidências formuladas e de questionamentos em cima de dados.
O nosso dado que trouxe muito questionamento é o do satélite Sentinel-1A. É um satélite europeu que nos permite de certa forma trabalhar com essas informações, independentemente das condições atmosféricas e das condições de dia e noite. Ele utiliza uma informação de micro-ondas para fazer essa varredura e permitir definir assinaturas que possam caracterizar algum derramamento ou poluição por óleo.
10:42
RF
Então, foi nessa primeira etapa que nós selecionamos o Sentinel, exatamente por atuar independentemente das condições atmosféricas. Ou seja, eu posso varrer durante o dia e à noite.
Essa é a nossa plataforma, que está em desenvolvimento.
A ideia desse sistema de vigilância é desenvolver, programar, aplicar, homologar e disseminar, no laboratório da Universidade Federal de Alagoas, um sistema, um aplicativo web de monitoramento colaborativo contínuo de derrames de óleo no litoral brasileiro no ambiente da plataforma Google Engine App.
Esse foi e tem sido o esforço do LAPIS de sugerir uma proposta concreta do que poderia facilitar para os especialistas e não especialistas poderem ter acesso a essas informações de uma forma rápida, contínua e operacional.
É importante destacar que a operacionalidade e a automatização de sistema são fundamentais. Embora reconheçamos a importância do PNC — o Prof. Clemente colocou claramente isso —, desde 2013, pela formulação de metodologias, uma resposta a um desastre nesse nível tem que ser muito rápida. Seja qual for o nível do impacto de um desastre, o monitoramento, as ações, as respostas têm que ser muito rápidas. Não é o caso do que aconteceu no litoral nordestino.
Então, surgiu esse interesse do LAPIS. As autoridades afirmaram não ser possível identificar o vazamento de óleo por satélites. Nós mostramos que o Sentinel tem essa capacidade, tem essa característica de mapeamento que permite isso.
Um dos desafios iniciais era a ausência de um padrão definido. O que quer dizer isso? Quando começamos a fazer essa varredura das possíveis áreas onde poderia estar o centro, ou seja, a região onde seria o maior vazamento, nós não tínhamos um protocolo. No LAPIS, nós começamos a fazer essa varredura aleatória buscando padrões espaciais e temporais, mas, sobretudo espaciais, utilizando o Sentinel e olhando alguma assinatura: como seria essa mancha? Ela teria características que, de certa forma, deveriam ter tido uma colaboração, através das imagens de satélite, com a validação em campo, a validação in loco — porque esse padrão é fundamental para que tenhamos um registro dessa assinatura, para a que comparemos a outros acidentes que possam acontecer.
Era uma assinatura muito específica, embora exista uma assinatura padrão de vazamento de óleo. Mas, dadas as características do que aconteceu no nosso litoral, esse padrão fugiu um pouco daquele modelo clássico de vazamento que costumamos ver na TV, na mídia ou mesmo nos trabalhos científicos. Então, perdemos o momento de validar isso e fizemos um esforço retroativo para identificar esses padrões.
Portanto, o primeiro inicial do laboratório foi identificar, a partir da ausência de um padrão, qual seria esse padrão, como monitorar esse vazamento, e a descontinuidade das imagens de satélites.
Existem várias imagens de satélite: satélites ambientais, satélites geoestacionários, cada um com a sua limitação.
A combinação de satélites pode permitir uma melhor análise desses resultados, dada a complexidade. Porém, existe um ponto na seleção do Sentinel, que é a frequência desses dados.
10:46
RF
Ele é ótimo para fazer essa varredura, porque não depende das condições atmosféricas; eu posso fazer a resolução espacial durante o dia ou durante a noite; estamos falando de centímetros, de 20 a 10 centímetros. Essa é uma forma muito preciosa para quem quer determinar um padrão de assinatura.
Porém, o tempo que ele precisa para voltar para mesma região são 12 dias. Existem segmentos que são paralelos, mas limitam que eu tenha um monitoramento, uma observação contínua dessas informações. A tecnologia SAR — Radar de Abertura Sintética é cara, e os países que desenvolvem essa tecnologia ainda precisam colocar mais satélites para melhorar essa vigilância, que é importante. No caso do Brasil, dependemos desses satélites, no caso, o Sentinel-1A, para fazer esse monitoramento. Ou seja, é uma tecnologia europeia. Existem várias tecnologias SAR desde 1978, mas, no momento, aplicado para desastres naturais, a Agência Europeia tem colocado o Sentinel à disposição dos usuários.
Esses foram os desafios iniciais E lembramos sempre que colocamos como ponto principal a PETROBRAS e a Universidade da Bahia. Elas fizeram análises independentes, mostrando que o petróleo encontrado, ou seja, o piche encontrado nas nossas praias, não eram explorados ou produzidos no Brasil. Isso eliminou também outras análises que estávamos avaliando nas imagens de satélite.
Eu não mencionei, mas a imagem do Sentinel-1A não só localiza a mancha de óleo, como também localiza o navio. E o navio é exatamente a assinatura mais característica do Sentinel. Eu diria que até muito mais intenso do que o vazamento é assinatura do que o satélite Sentinel-1A caracteriza ou registra nas suas informações, a localização do navio.
Aqui, por exemplo, logo no primeiro desafio, não tínhamos o padrão espacial de que estávamos buscando e como buscar. Então, fizemos uma varredura, começamos aleatoriamente do litoral do Maranhão, varrendo toda a costa do litoral Nordeste do Brasil e estendendo até o Espírito Santo, para ver se a gente encontrava alguma assinatura de vazamento nessas imagens.
O que vocês tão vendo ali são as imagens do Sentinel, são várias datas, recorremos a datas retroativas para tentar encontrar manchas de óleo.
Bom, a primeira mancha — como a gente começou no sentido do Maranhão, aleatoriamente, o Sentinel, no dia 24 de julho de 2019 — apresentou essa característica que vocês estão vendo aqui: uma mancha de óleo de grande extensão e um ponto branco ali, bem paralelo à seta azul ali, que destaca exatamente a localização do navio. Essa mancha estaria associada a essa mancha de óleo.
Primeiramente, a gente ficou muito preocupado quando vimos essa informação. Queríamos compartilhá-la com os nossos colaboradores europeus para ter certeza do que estávamos avaliando. Realmente, era uma mancha de óleo associada a um navio que foi registrado pelo Sentinel-1A.
Então, mandamos isso para a EUMETSAT, que é uma agência espacial para a exploração de satélite geoestacionário, que tem a colaboração com a ESA, que é a Agência Espacial Europeia, e eles nos enviaram outro material complementar para analisarmos essas informações, especificamente as informações do Sentinel.
Guardamos essa imagem, não a divulgamos para a imprensa, não a divulgamos para as autoridades brasileiras, porque precisávamos ainda de confirmação e de continuar a fazer a varredura.
10:50
RF
Então, seguimos fazendo a varredura, de forma independente e aleatória, buscando marcas, assinaturas ou registros de informações.
Aqui, novamente, a gente recorreu a outros satélites para ver a mesma mancha. O Aqua-Modis e o NOAA-20 registraram a mesma mancha.
O SR. PRESIDENTE (João H. Campos. PSB - PE) - Só um minutinho. O senhor pode mostrar onde está a mancha, por favor?
O SR. HUMBERTO ALVES BARBOSA - Ela está bem aqui. Esta é a linha dela aqui. E neste ponto são navios. Há três navios registrados aqui.
Esta linha desaparece em algum ponto, mas continua se estendendo. No entanto, o segmento da imagem termina aqui. Haveria uma continuação, o que não foi possível porque naquela data, naquele horário, ou seja, dia 24 de julho, às 8 horas da manhã, o satélite levou 8 minutos para fazer a varredura e estava programado para fazê-la em uma faixa específica de 250 quilômetros. Então, esta área aqui não estava prevista para aquele horário de varredura. Porém, o satélite foi feliz naquele momento.
Outro ponto. Buscamos saber, com vários outros especialistas, quais ruídos poderiam estar associados a isso, se seria um nível de ruído que podia ser interpretado como falso sinal.
Há uma característica nessa região. Como sou meteorologista, já trabalhei ali próximo, em uma fundação no Ceará denominada FUNCEME, nessa época do ano, há os ventos de brisa. E as brisas são muito mais intensas neste período, entre agosto e outubro, que é o tempo dos ventos nesta região. Então, o que vocês estão vendo aqui é exatamente a formação de uma brisa, mas isso aqui não tem nenhum sinal associado à perturbação que seja interna do oceano. Neste horário, o oceano é relativamente calmo. Não há variações entre a temperatura do ar e a temperatura da superfície. Na Região Nordeste do Brasil, a temperatura das águas pode ser 26, 27 graus, podendo chegar até 28 graus Celsius nessa época do ano. As temperaturas do ar e da água, nas primeiras horas, são muito próximas. Não haveria ruído. Então, analisamos todas as fontes possíveis de ruído para chegar à conclusão de que havia um bom sinal.
Como vemos isso aqui? Vou tentar evitar o jargão, já que há mais outras transparências. Quanto mais escuro significa que a tensão entre essas superfícies faz com que a viscosidade... Isso poderia ser um fitoplâncton, mas discordamos de algumas características. Vamos olhar no tempo da tensão superficial. O óleo diminui essa tensão e deixa a superfície menos rugosa. Mesmo que eu tenha movimentação da água, o satélite Sentinel é muito sensível. As ondas de Bragg são ondas que permitem que essas movimentações do retroespalhamento que vão de volta ao satélite sejam vistas. Essas ondas permitem que, quando ocorrem as movimentações naturais das correntes, haja mais onda e, consequentemente, mais brilho. Se eu tivesse a parte oceânica aqui, isso não seria tão escuro. Seria claro exatamente por haver mais movimentação ondulatória, mais rugosidade, o que resultaria em um sinal mais claro. Quando se aumenta o nível de tensão superficial, ou seja, com o óleo, essa rugosidade diminui e isso faz com que o sinal dele, principalmente nesta região, seja escuro em função de esta rugosidade ser mais lisa.
Há uma parte aqui onde há submersão, como se a parte do piche ou óleo tivesse submergido, deixando a movimentação da onda mais branca, pelo retroespalhamento, fazendo com que ela desaparecesse. Mas ela volta com mais intensidade aqui.
10:54
RF
Outra questão também de oceanografia importante. Os ventos de 2 a 12 metros por segundo são os ventos ideais para você fazer esse monitoramento. Quando os ventos caem abaixo de dois metros por segundo, as áreas ficam escuras na imagem do Sentinel, ou acima de 12 metros por segundo.
Então, percebe-se que essas eram as primeiras horas. Não tem interferência também de informações de ventos que pudessem causar uma pequena faixa específica abaixo de 2 metros por segundo provocar um sinal que poderia estar associado a um derramamento de óleo.
Há um outro ruído — eu estou perdendo um pouquinho mais de tempo, embora sejam questões técnicas. O navio gera turbulência que pode provocar movimentação, e com isso você aumentar as ondas e dar um brilho maior em cima desse sinal e parecer que é. Na verdade, a turbulência gerada pelo navio... Mas a gente está falando de uma extensão de 90 quilômetros, onde a intensidade do sinal até na borda é muito maior do que no meio. Seria muito suspeito — e a extensão e a largura chegam quase a 1 quilômetro por 90 de extensão — que a hélice de um navio conseguisse sustentar por tanto tempo assim.
Seguindo rapidamente, a mancha de 24 nos norteou. Foi a primeira pergunta se haveria alguma associação com o navio Bouboulina, já que o Bouboulina teria passado ali no dia 26, e aquela mancha foi do dia 24. O Bouboulina passou 2 dias após aquela mancha. Então, começamos a analisar os dados do Bouboulina por um serviço de inteligência marinha internacional. A partir dessas informações, descartamos o Bouboulina por vários pontos. Não só a trajetória, que não tinha nada irregular, mas também levando em consideração as imagens do Sentinel. As imagens do Sentinel não cobrem áreas a uma distância de 400 quilômetros da costa do Nordeste brasileiro. São poucas as imagens do Sentinel que poderiam estar disponíveis nessa região de 733 quilômetros.
Então, isso dificulta ainda mais as análises. Então, a gente descartou, baseado nas imagens do Sentinel e também nas informações de vigilância marinha da Marine Traffic. Descartamos também os quatro navios gregos baseado nos dados da Marine Traffic, ou seja, um dado de vigilância marinha. Não havia nenhuma anormalidade. Encontramos algumas questões específicas como um transponder que havia sido desligado. Enfim, outras informações, mas nada em termos de datas que pudessem nos nortear em relação àquela grande mancha encontrada.
Uma outra segunda mancha, depois de buscar todos os padrões de assinatura pelo Sentinel, foi no dia 19 de julho, em um segundo monitoramento, olhando isso já associado com um padrão que havia sido visto no dia 24. Encontramos uma grande mancha ali próxima da costa da Paraíba. É essa linha que vocês estão vendo aqui destacada, de forma mais ampliada, no dia 19 de julho. Foi a nossa segunda mancha. A segunda, dia 19; a outra, 24. Foram essas duas manchas.
Tentamos encontrar, já que o Sentinel e outros satélites geoestacionários ou satélites ambientais não dispunham de informações do dia 25. No dia 24, apareceu aquela grande mancha, mas, infelizmente, o Sentinel não tinha dados no dia 25. Encontramos no CBERS uma possível mancha, mas ainda está sendo analisada com outras informações satelitais.
10:58
RF
Este é o quebra-cabeça. Havia duas manchas, a do dia 24 de julho, a do dia 19 de julho, e também, no dia 25, um possível arrastamento dos ventos, ou de correntes, levando essas manchas para alto-mar. Então, os dados de Inteligência da Marinha, da Traffic Group Marine, foram importantes. Nós selecionamos 117 navios, com base nessas duas manchas, a mancha do dia 19 e a mancha do dia 24, que nos nortearam em termos de monitoramento, ou seja, fomos buscar os navios-tanques que pudessem ter passado nessas duas datas, nessas duas regiões, que pudessem ter alguma anomalia. Recorremos novamente aos dados da Marine Traffic para saber se havia alguma anomalia, se havia alguma irregularidade dessas informações.
E dos 111 navios que passaram naquelas datas e naquelas regiões, o único que apresentou, que era um navio-tanque que, por acaso, também passava pela Venezuela, era o Voyager. E essas informações são exatamente dos dados do Voyager que baixamos. Aqui vocês podem vê-los visualmente. Há suspeita de ele estar indo completamente fora do itinerário, da trajetória dele, que é uma trajetória que vai diagonalmente do Rio Grande do Norte até a África do Sul, mas vocês veem ele indo em direção aos Estados Unidos, depois contornando, ali na região do Atlântico, e depois indo para Serra Leoa, e o sinal desaparece, e ele aparece na Índia, novamente.
Questionamos essas informações à Marine Traffic, depois de a Voyager ter colocado uma nota de que o navio estava parado na Índia, e a Marine Traffic reviu as informações, e novamente colocou essa posição aqui, que era a posição já no final de julho e agosto, ou seja, o navio estava o tempo todo parado. De fato, vimos uma conexão da mancha 24, aqui, e dia 28, o Voyager estava aqui, o Voyager faz uma movimentação estranha, que normalmente ele ficaria só por aqui, e depois ele volta para cá. Então, a Marine Traffic corrige, e muda todo o sistema deles, e coloca que o Voyager sempre esteve aqui parado, em julho e em agosto. Isso após a Voyager ter colocado uma nota, depois de termos questionado e pedido a alguém em Londres que visitasse o escritório da Marine Traffic, e pegasse essas informações. Houve a participação de uma pessoa que esteve diretamente na Marine Traffic questionando essas informações e, depois de 2 semanas, mais recentemente há uns 5 dias, a Marine Traffic fez a correção, e daí a suspeita do Voyager 1 foi eliminada, em função o do que a Marine Traffic fez, com correções, e isso tirou a suspeição do Voyager.
Também detectamos pequenas manchas utilizando o Sentinel. E aí tivemos a colaboração de jornalistas da Gazeta, que é a TV local, dois jornalistas estavam participando de mutirões com o Exército e com voluntários, e aí pedimos para que a imprensa nos informasse o que estava encontrando. Ao olharmos as imagens do Sentinel, conseguimos detectar, com a ajuda deles, o que eles tinham visto na praia, se era realmente o que estávamos vendo nas imagens. Isso, sim, deveríamos ter feito desde o início. Esse foi o maior erro: não ter feito essa validação juntamente com a Marinha e as informações de vigilância, de monitoramento e de observação: olhar o padrão, se realmente a informação que estava chegando batia com algum padrão que pudesse ser observado em imagens de satélite, ou outra informação que estivesse disponível. Então, faltou essa validação das informações.
Aqui, mais uma vez, quando fizemos a varredura de todo o litoral do Nordeste brasileiro encontramos outra evidência que nos chamou muito a atenção. Aqui vocês podem ver que há muitas informações técnicas. Seria muito difícil entrar em detalhes. Mas parece que tem um monte de fio de cabelo dançando ali no meio. Há várias coisas acontecendo. Isso está bem ali na região do sul da Bahia, mais em direção ao alto-mar. Você vê alguns slicks e manchas. Em função dos ventos e das correntes oceânicas, faz com que esses slicks dancem, parecendo um balé desorientado. Aquelas listas que vocês estão vendo e manchas mais concentradas.
11:02
RF
Aquelas manchas mais concentradas podem ter outra interpretação. Podem ser essas manchas que eu estou falando para vocês. Nessas mais escuras pode ser que o vento esteja abaixo de 2 metros por segundo. Mas eu poderia ter manchas também um pouco mais consistentes misturadas com os ventos mais fracos.
Estas linhas que vocês estão vendo aqui são um modelo clássico já registrado pelo Sentinel em outras regiões de vazamento de óleo. Porém, esse vazamento pode ser de origem natural, ele pode ser por poluentes de navio, ele pode ser por poços de exploração de petróleo. Então, desde o início, a partir das imagens do Sentinel em evidências, achávamos que esse vazamento não só tinha origem em navios. Ele pode ter outras origens. E levantamos informações sismológicas. Por isso que na nossa plataforma entra também informações de sismologia.
Em julho tivemos muitos abalos sísmicos na região do Atlântico, tanto na Bacia do Atlântico Norte quanto na Bacia do Atlântico Sul. E no sul da Bahia está registrado, bem na área de exploração de petróleo, um abalo sísmico de 4,9 na escala Richter. Esses pontos também mapeamos. E estamos olhando um pouco mais tecnicamente o que esses abalos podem relacionar com as imagens do Sentinel, por exemplo, com essa imagem. Também pode ter fendas no subsolo do oceano que podem liberar, naturalmente, algum poluente ou mesmo descargas de rios que podem estar levando poluição, que podem provocar isso. Então, há várias interpretações. Não são simples, mas é importante destacar que o Sentinel viu isso em outras regiões, e lá foram detectados como derramamento de óleo ou poluição de poluentes por navios.
A pergunta é: os nossos mares estão seguros? O Brasil ainda não dispõe de um sistema. Apesar do PNC, a gente sempre remete ao que aconteceu com o PRODES, em 1988. O PRODES foi um sistema de monitoramento de desmatamento da Floresta Amazônica que nos ajudou a estabelecer políticas públicas muito claramente. Ou seja, o PNC seria, de certa forma, uma regularização de como é preciso estabelecer a segurança e a vigilância na nossa costa, de jurisprudência brasileira, ou seja, nas águas nacionais. Não temos. Estamos desprovidos de um sistema de monitoramento que possa detectar ou possa estar olhando o que está acontecendo para que medidas sejam tomadas de uma forma muito rápida, porque em um desastre a ação é fundamental. A rapidez dessa ação determina o sucesso de você evitar um desastre maior.
Aqui tivemos um caso, no dia 23, no Rio de Janeiro. A ANP, a Agência Nacional do Petróleo, está lá. A Agência coloca essa informação. Qualquer pessoa pode pegar essa informação, e a ANP coloca na Bacia de Campos, no Campo Espadarte, um vazamento de 400 litros no mar. Houve um plano de contingência, tudo foi controlado. Está bem claro como o plano de contingência da PETROBRAS funcionou neste caso para evitar uma situação mais grave. Isso aí está registrado.
Isso coloca ainda uma outra situação que vimos nas imagens de satélite. No Espírito Santo e, em parte da Bahia, vimos pequenos vazamentos associados a navios. Encontramos vários, principalmente entre julho e agosto.
11:06
RF
Esse é um caso claro, notificado pela ANP. O Prof. Clemente também destacou como o óleo tem agentes poluentes e de como ele, em função do intemperismo, de como é o comportamento dele no fundo do oceano, até ele submergir superficialmente, de forma que essa deposição fica concentrada também na região. Estamos olhando de uma forma natural, mas o processo que aconteceu na nossa praia, certamente, segue um modelo conceitual muito parecido com o que vocês estão vendo.
Conseguimos fazer um contato com a Woods Hole, que é um centro de oceanografia em Massachusetts. Eles são especialistas. Compartilhamos algumas informações, eles nos enviaram esse modelo conceitual. E, desde o início, também partimos de que poderia haver alguma influência do subsolo marinho em algumas áreas.
Essa aqui é a parte do sistema que estamos adotando. Ali o que vocês estão vendo são as áreas de exploração de petróleo. Vocês veem as dutovias. Ali é onde encontramos a primeira mancha. São duas imagens de satélite de épocas distintas, mas aqui é a localização do Rio Grande do Norte. Aqui são os poços de exploração do petróleo. Essas são as dutovias. Há diferentes tipos de exploração de petróleo nessa região. Aqui foi a imagem do Sentinel. Estes são os três navios. Esses pontos brancos são a assinatura mais clássica do Sentinel para detectar navios. Com isso, eu sei a localização, eu sei a profundidade dessa região aqui, utilizando as imagens do Sentinel. Nessa imagem eu sei exatamente qual é a profundidade do oceano e sei exatamente a localização desse navio, e há uma suspeita de uma mancha aqui associada a eles.
Desses navios, um deles não estava registrado no sistema de vigilância da Marine Traffic. Não se viu essa localização para essa mesma época. Não havia registro desse navio. Daí foi colocado muito na imprensa de navios fantasmas.
Estou chegando à conclusão. Acho que a ideia geral das mensagens eram propor, pela universidade, um sistema de monitoramento contínuo baseado nessa experiência, que é a que temos tido nos últimos meses de monitorar, através de imagens de satélites, esse derramamento de óleo.
Recentemente encaminhamos uma proposta para a CAPES para implementar e envolver alunos e outros colaboradores para aperfeiçoar esse sistema de monitoramento. Fica muito claro, desde o início, a grande dúvida, a grande pergunta. Bom, a primeira pergunta foi respondida. As imagens de satélite são, sim, possíveis de detectar, registrar manchas de óleo. Precisamos validar essas informações. E há várias técnicas de validação, desde coleta de dados em campo, desde espectrometria, utilizando espectrorradiômetro, que vai de 0,4 micrômetros a 2,5 micrômetros. Você tem uma assinatura espectral. E é importante ter essa assinatura espectral para validar as imagens, mas também uma colaboração de navios indo para verificar o que está sendo visto. Há um padrão de assinatura espacial nas imagens de satélite.
Destacando também os impactos — acho que ficou muito claro aqui com o Clemente. Não vou entrar mais em detalhes, já fugi bastante do tempo —, os pescadores, principalmente os pescadores artesanais, são os mais impactados nessa cadeia. Coincidentemente, antes mesmo de o acidente acontecer, o procedimento é logístico, já havíamos feito contato com eles, sobre essa questão da brisa marítima, para que entendessem a importância dela. Depois, quando voltamos a conversar com eles, foi na época da fase do derramamento de óleo. Era outro cenário, completamente caótico, até porque eles passam por uma situação muito crítica.
11:10
RF
Então, esta é a minha principal mensagem. E deixo aqui, claramente, que a universidade tem interesse em colaborar e que existem outros grupos envolvidos, internamente, nessa parte referente ao óleo.
Mais uma vez, muito obrigado. Eu agradeço ao Deputado Herculano Passos e ao Relator, o Deputado João H. Campos. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Herculano Passos. Bloco/MDB - SP) - Agradeço ao Prof. Humberto Alves Barbosa, responsável pelo Laboratório de Análise e Processamento de Imagens de Satélite — LAPIS, da Universidade Federal de Alagoas, o pronunciamento.
Vou passar a palavra agora ao último orador, o Sr. Daniel Brandt Galvão, Engenheiro de Pesca, Coordenador da Salve Maracaípe e Professor da Universidade Federal de Sergipe, em atendimento também ao Requerimento nº 13, de 2019, dos Deputados João H. Campos e Rodrigo Agostinho.
O SR. DANIEL BRANDT GALVÃO - Bom dia. Primeiramente, quero agradecer ao Presidente, o Deputado Herculano Passos, e ao Relator, o Deputado João H. Campos, o convite. Ficamos muito honrados por estarmos aqui.
É a terceira vez que o Movimento Salve Maracaípe vem a Brasília para contribuir com o desenrolar deste desastre ambiental, o maior desastre ambiental da história do litoral brasileiro, como já foi dito aqui. A primeira vez, fomos ao Senado, numa audiência pública, a segunda vez, fomos à Câmara e agora estamos aqui nesta audiência da CPI do Óleo, que já é uma luta que vimos travando desde o início. Estamos muito felizes com os Deputados de Pernambuco, que têm feito um grande papel nisso, ao colocar para frente esse assunto e não deixá-lo cair no esquecimento.
Hoje eu vou falar um pouco mais sobre a origem do óleo, ou, pelo menos, acreditamos que seja. Nas últimas duas audiências de que participamos nós contextualizamos mais, falamos sobre como o óleo estava se espalhando pelo Nordeste. Vou trazer um pouco sobre essa contextualização e também de alguns outros assuntos, que se especula pode ser a origem do vazamento.
Vou me apresentar. Meu nome é Daniel, como já foi dito. Sou professor da Universidade Federal de Sergipe, também sou aluno de doutorado de oceonografia física da Universidade Federal de Pernambuco, onde sou bolsista CAPES, com muito orgulho, e sou o Coordenador do Movimento Salve Maracaípe. Também sou formado em engenharia de pesca e sou oficial também da Marinha Mercante. Então, já trabalhei alguns anos a bordo de navios petrolíferos e pude ganhar alguma bagagem neste assunto.
Hoje estou representando principalmente não só todas essas áreas em que eu me formei, mas, principalmente, o Movimento Salve Maracaípe, que é um movimento voluntário, ambiental, original do Estado de Pernambuco, mais especificamente do Município de Ipojuca, da Praia de Maracaípe.
(Segue-se exibição de imagens.)
11:14
RF
O primeiro alerta que recebemos ocorreu no dia 26 de agosto, quando houve o vazamento da Refinaria Abreu e Lima, no Estado de Pernambuco. Foi um vazamento amplamente divulgado pela imprensa, o qual foi tratado normalmente, sem nenhum problema. E, nessa primeira ocasião, nós que moramos em Maracaípe — o nosso grupo é originário de lá — já ficamos alerta, porque a Refinaria Abreu e Lima está muito próxima do Porto de Galinhas, de Ipojuca. Então, já ficamos alerta. E, por coincidência, quando chegamos ao final do mês de agosto, lá pelo dia 30, e também no mês de setembro, dias 1º e 2, começaram a aparecer manchas na praia.
A princípio, cogitamos a possibilidade de ser o vazamento da Refinaria Abreu e Lima. No dia 3 de setembro, um fotógrafo registrou a primeira mancha de petróleo dessa história toda que está acontecendo. Nós, por meio do nosso Instagram, repostamos essa imagem. A partir daí, começamos a perseguir, a caçar, literalmente, o petróleo por todo o Nordeste. A Praia do Paiva foi a primeira a ser observada, fica no litoral sul de Pernambuco. Lá foi onde tivemos o primeiro registro no Brasil de aparecimento de mancha de petróleo. Por coincidência, foi meu pai que fez a foto. Ele é fotógrafo, estava na praia nesse dia e fez a imagem — ele tem o Instagram também de fotografia. Nós vimos a foto e a repostamos. E lá, naquele momento, cogitamos a possibilidade de ser da refinaria. Sem acusar, claro. Nunca é o nosso papel acusar, mas tentar entender o que está acontecendo. Então, cobramos do Governo do Estado, que, prontamente, fez um comitê de crise, envolvendo também professores, a CPRH e membros da Secretaria do Meio Ambiente. E começaram a dar satisfações sobre o vazamento nas praias, exatamente para tentar diferenciar o que era vazamento da refinaria e o que era esse outro tipo de vazamento. Então, fomos acompanhando essa investigação também do Governo, que foi muito bem conduzida.
Após esse primeiro vazamento, nessa primeira semana, já começaram a aparecer alguns rastros de destruição: apareceram golfinhos e até cachorro melados por óleo e tartarugas. Lógico, sempre também deixamos claro que tanto golfinho quanto tartarugas que aparecem mortos precisam passar por uma necropsia, para, de fato, dizermos que a morte foi causada por contaminação do petróleo; não simplesmente porque estão sujos de petróleo — é o que a gente imagina. Temos que fazer uma necropsia para investigar.
A partir do dia 12 de setembro, começamos a ver umas imagens mais graves. Eu passar esse vídeo aqui.
(Exibição de vídeo.)
O SR. DANIEL BRANDT GALVÃO - É importante que essas imagens sejam mostradas, para que tenhamos, de fato, a dimensão do impacto que esse petróleo causou às pessoas e também aos animais — esta foi no Rio Grande do Norte, em Jacumã. Seguindo a corrente norte do Brasil, impulsionada também pela meteoceanografia local da deriva litorânea, o petróleo — estou adiantando, porque, nesse tempo que temos, não consigo mostrar tudo — chega lá no Maranhão também com bastante força.
11:18
RF
(Exibição de vídeo.)
O SR. DANIEL BRANDT GALVÃO - Bom, eu vou adiantar para ganhar tempo. Desde o dia 3 de setembro, quando fizemos a primeira postagem sobre o óleo, começamos a avisar, através do nosso Instagram — é lógico que, por sermos um grupo pequeno, não temos muita visibilidade —, que o petróleo estava subindo. Escutamos, principalmente na primeira audiência de que participamos, e o Presidente do IBAMA estava presente, que houve dificuldade de previsão de onde esse óleo ia chegar. Achamos isso um pouco vergonhoso ou até ridículo, porque qualquer ensino básico de oceanografia, em que pega a corrente subequatorial e a divisão dela, a CNB, junto com as forçantes meteoceanográficas locais, você sabe para onde esse óleo está indo. Naquela fase ainda de setembro, é comum os ventos do Sudeste estarem somados a correntes oceânicas e estavam fazendo essas manchas de petróleo subir. Isso é basicão, sem surpresas.
Nós o tempo todo estávamos pedindo às autoridades competentes, no caso IBAMA e Marinha, que enviasse embarcações ou, no mínimo, boias de contenção, para as áreas mais sensíveis: mangues, entradas de estuários, recifes de corais. Nada disso foi feito. Eu sempre escuto o Governo falar que estava lá desde o dia 2 de setembro atuando. Se eu fosse o Governo, eu nem falaria isso, porque, se o Governo fala que estava desde o dia 2 de setembro atuando, e nós, hoje, segundo o último relato do IBAMA, temos 876 localidades atingidas, 7 quilômetros de petróleo dentro do mangue de Cumuruxatiba, na Bahia, então toda a operação do Governo foi falha. É melhor o Governo assumir que começou a trabalhar com mais de 40 dias e pedir desculpas, pois falharam no início e depois tentou botar a força tarefa em campo. O Brasil foi atingido, o Nordeste foi todo atingido. Eu acho que não é digno falar que estava lá desde o início trabalhando. Os voluntários, sim, estavam lá desde o início trabalhando. Os voluntários estavam lá abordando as manchas de petróleo 24 horas por dia, esperando elas chegar. Eu vou mostrar isso aqui.
Falando já dessa bifurcação do petróleo, ele chega no Maranhão, no primeiro momento, na primeira volta do óleo, lambe o litoral norte de Alagoas, Pernambuco, Paraíba e chega com força no Rio Grande do Norte, Ceará, Delta do Parnaíba e Maranhão. Depois, paralelamente, quando ele chega ao Maranhão, a segunda bifurcação do óleo da corrente sul-equatorial, que é a CB, que é a Corrente do Brasil, já começa a levar o óleo para o Sul. No dia 19 de setembro, o óleo, seguindo o fator da corrente, bifurca e já começamos a ter uma virada de ventos, Nordeste, e o óleo já começa a descer para o Sul. Ele chegar ao Estado de Alagoas e, posteriormente, a Sergipe e à Bahia.
11:22
RF
Não vou mostrar todas as imagens, senão vamos passar o dia todo aqui. Mas a corrente é básica e bifurca mais ou menos naquela variabilidade espacial de Aracaju, mais ou menos entre 9 a 11 graus, variando um pouco, conforme seja verão ou inverno. Isso é básico.
Falou-se muito qual a origem do vazamento com a fonte. Discutiu-se muito pouco isso, eu acho. Primeiramente, houve aquela questão de se falar da Venezuela, o que, eu acho, já jogou uma cortina de fumaça em todo o contexto, porque estamos vivendo um momento político extremo. Então, fala-se de Venezuela e já fica uma briga de política, em vez de haver soluções ambientais. Falou-se em navio fantasma. Falou-se em acidente em operações ship-to-ship. Colocou-se um tambor da Shell na praia e falou-se em naufrágio. Nunca acreditamos, pelo menos em Salve Maracaípe — todo mundo tem direito a especular, e estamos especulando também —, que fosse isso.
Questionamos ao Governo por que nunca cogitaram ser poço de petróleo. Ficamos sem entender isso. Por que nunca investigaram os poços de petróleo? Se fosse poço petróleo, e o Governo soubesse desde o início, será que ele fez tudo para esconder poços de petróleo, por causa do leilão do pré-sal? São só perguntas. Não são acusações. Deixo claro que esses questionamentos não são acusações, apenas tentativas de colaborar com as investigações das autoridades. Nós somos um grupo pequeno e não queremos problema com ninguém. Só estamos tentando entender o porquê que não se cogitou, desde o início, ser poço de petróleo.
A primeira vez — e hoje eu estou mais à vontade para falar disso, porque isso é uma teoria do Salve Maracaípe —, que a mancha chegou em Alagoas, e, depois, quando começou a ir só para o Maranhão, pensamos que poderia ser de navio. Até ali eu ainda acreditei que pudesse ser e todo mundo ainda cogitou, mas, a partir do momento em que ela bifurca para Alagoas e começa a ir para Sergipe e Bahia, opa! Há ainda a questão do tempo também, 30, 40 e 50 dias. Se fosse uma mancha de navio, imaginamos que ela iria chegar de uma vez só ou durante 10, 20 dias. Mas já são 90 dias chegando petróleo. Havia alguma coisa pulsando por ali e não entendemos.
Ficamos à vontade exatamente quando da última audiência da Câmara — acho até que V.Exa. estava lá, e o Deputado Daniel Coelho perguntou sobre essa possibilidade — V.Exa. falou tecnicamente o que poderia ser. Não sei se foi V.Exa., posso estar me confundindo. Mas o representante do Ministério do Ambiente, na ocasião, falou que tecnicamente poderia ser poço petróleo.
Por que poderia ser um poço de petróleo do pré-sal? Os poços de petróleo do pré-sal estão localizados exatamente na variação espacial da corrente sul-equatorial. Então, a corrente sul-equatorial por sua vez transforma em duas correntes, que é a CNB e a CB, ou seja, são as duas correntes que bifurcam, tanto para norte quanto para sul. A CNB foi responsável por levar o petróleo do poço até o Maranhão, e a CB, responsável por levar o petróleo do poço até à Bahia. Só isso? Não. Como já disse, a meteoceanografia local e costeira vai ajudar a impulsionar essas correntes oceânicas.
11:26
RF
Por isso, com o poço ainda vazando, o óleo chegou novamente, por exemplo, a Estados como Alagoas e Pernambuco. Repito, tudo especulação.
E uma coisa também que nos ajudou a pensar que poderia ser poço de petróleo foi uma nota do próprio Governo, que também se especulava que, após os leilões do pré-sal, o Governo começaria a cogitar os poços de petróleo mais à vontade. E foi exatamente o que aconteceu. Por sorte, por coincidência nossa teoria bateu, com esta nota da Marinha que foi publicada no dia 15 de novembro de 2019, enfim, uma nota que vocês que estão acompanhando já devem ter lido, que coloca quatro opções de linhas possíveis de vazamento.
Uma delas, pela primeira vez, em todo este vazamento, com quase 85 dias — nota do Governo, já não é mais o Salve Maracaípe falando —, o Governo começa a falar que pode ser exsudação envolvendo poço ativo ou rompimento de poço, eventualmente perfurado e atualmente desativado. Foi o Governo mesmo que falou. Daí ele diz que isso é uma remota probabilidade, enfim, que a partir de agora vai começar a ver com a ANP essa possibilidade, blá-blá-blá.
Daí ele coloca mais outras três possibilidades: afundamento recente ou antigo de navio — ele aí praticamente descarta isso; c) tambores — aqueles que apareceram, ele mesmo descarta isso também, e aí vocês podem ficar à vontade para ler; afundamento de navios antigos; c) tambores de petróleo; e quarta, que seria a letra D, que ele cogitou como mais possível, a do petroleiro. Eu sei que, na mesma nota, ele fala que, de todos os navios que foram investigados, só sobrou um, porque só este levava o óleo cru. De todos os mil e tantos navios que ele pesquisou, que ele afunilou, deram 30, depois sobraram três, depois sobrou um. Este um foi o grego, o Bouboulina. E o Bouboulina já disse: "Não tenho nada a ver com isso". Então, na verdade, só sobrou isto aqui: a) nota do Governo.
Voltando às correntes, um conhecimento básico sobre as correntes poderia fazer com que tivéssemos maior preparo para receber esse petróleo. Acabamos não nos preparando e o petróleo chegou em todas essas localidades sem ser contido. Essas é a crítica também que fazemos.
Quem estava de prontidão para receber este petróleo quando ele chegou nas praias? As crianças, os voluntários, os pescadores, a comunidade. A comunidade estava lá de prontidão para receber esse petróleo.
(Exibição de vídeo.)
11:30
RF
O SR. DANIEL BRANDT GALVÃO - Esse aí foi um dos monitoramentos que nós fizemos. Quando o óleo deu a segunda volta, quando ele chegou ao norte de Alagoas, com muita força, no dia 17 de outubro, como o Prof. Clemente já falou, eu repassei praticamente ao vivo esse vídeo. Eu estava lá na audiência do Senado, com a Profa. Beatrice, e antes da minha fala, já na mesa, recebi esse vídeo. Eu consegui, com o pessoal da mesa, passar o vídeo ao vivo.
Então, nós começamos a nos preparar. Entramos em contato, dessa vez, com o Governo do Estado, que, na primeira vez, não tinha dado muita voz para nós, mas que, na segunda vez que o óleo chegou, fez um bom trabalho. O Secretário Bertotti inclusive, hoje em dia, já virou nosso amigo — o cara realmente deu muito sangue para conseguir minimizar os impactos. Mas na primeira vez o Governo não levou muito a sério o que estava acontecendo. Infelizmente, o óleo chegou com muita força ao Estado de Pernambuco pela segunda vez.
Esse foi um monitoramento que fizemos. Estávamos há quase 48 horas sem dormir e flagramos o exato momento em que o óleo chegou à praia de Porto de Galinhas, às 3h40min da manhã, no estuário do Rio Maracaípe.
(Exibição de vídeo.)
O SR. DANIEL BRANDT GALVÃO - Aproveito para falar que, nessa ocasião, o pessoal de Maracaípe estava bastante mobilizado e mobilizando o Estado, e nós conseguimos com o Porto de Suape essa boia de contenção. A boia de contenção ajudou a evitar que entrasse mais óleo para dentro do estuário, para dentro dos mangues. Era esse o nosso pleito desde o início.
Isso é uma coisa relativamente simples. Nós somos uma das maiores indústrias petrolíferas do mundo, temos condições de colocar boias em todos os estuários do Nordeste, em todos. Mas isso não foi feito.
Vou mostrar mais algumas imagens.
(Exibição de vídeo.)
O SR. DANIEL BRANDT GALVÃO - Sabem o que é isso? Isso é uma imensa mancha de óleo que os pescadores de Ipojuca foram para o mar tirar, sem proteção, sem nada. Mas estavam lá.
O tempo todo nós falamos, Deputado: "Cadê as embarcações?". Mas não eram 1, 2, 3, não. Deviam ser 100, 200 embarcações.
Ali estão os pescadores mostrando que é possível minimizar os danos.
(Exibição de vídeo.)
O SR. DANIEL BRANDT GALVÃO - Olhem quem estava buscando o petróleo dentro do mangue. O pessoal mergulhava e abraçava as manchas, para as manchas não irem para dentro do mangue. Isso ocorreu dentro do estuário já.
(Exibição de vídeo.)
O SR. DANIEL BRANDT GALVÃO - Esse é o local onde, 3 dias atrás, infelizmente morreu um peixe-boi.
(Exibição de vídeo.)
O SR. DANIEL BRANDT GALVÃO - Essa aí já é a Praia de Itapuama.
(Exibição de vídeo.)
11:34
RF
O SR. DANIEL BRANDT GALVÃO - A segunda volta do óleo a Pernambuco foi bastante agressiva. Junto com o Salve Maracaípe, junto com os movimentos socioambientais de lá, junto com pessoas como o Prof. Clemente, estávamos de prontidão lá 24 horas por dia. Essa praia, a Praia de Itapuama, que para nós foi uma das mais atingidas, na escala de toxicidade de 1 a 5, atingiu o nível 5, o máximo. Só dessa praia nós tiramos, em menos de 1 semana, mais de mil toneladas de petróleo — em menos de 1 semana. Nós conseguimos colocar nessa praia mais de 5 mil voluntários, que por lá rodaram durante 1 semana.
Todas as imagens estão viradas. Então não está muito bom para ver.
(Exibição de vídeo.)
O SR. DANIEL BRANDT GALVÃO - Só em 1 dia de trabalho, dos mais críticos, nós tínhamos mais ou menos 2 mil voluntários, facilmente, rodando por lá o dia todo.
Quero fazer um questionamento aos Deputados que estão à frente disso, tanto da Oposição quanto da Situação: os voluntários estão sendo reconhecidos de fato? Nós falamos tanto em dinheiro. Eu quero perguntar quantos milhões de reais foram economizados com a eficiência, a proatividade e a rapidez com que os voluntários retiraram o óleo dos ecossistemas. Quem está fazendo essa conta? Estou curioso para saber o resultado dela. Qual seria o prejuízo para o turismo, para o social, para o ambiental e para a economia, se o óleo fosse retirado em 1 mês, em vez de 5 dias? É importante que esta Casa faça essa conta.
De que forma fizemos isso? Basicamente, colocamos no Instagram o seguinte: "Precisamos de voluntários na Praia de Itapuama"; "Urgente: praia de Itapuama. Precisamos de assistência médica, EPI, baldes e sacos de ráfia"; "Precisamos de assistência de saúde para os voluntários".
O Salve Maracaípe, junto com o PE sem Lixo, o Xô Plástico, o Meu Mundo Mais Verde, professores, Governo e Prefeitura do Cabo, que também fez um bom trabalho, nós conseguimos fazer uma mobilização e conseguimos nos tornar, eu acredito, o Estado referência hoje no combate ao óleo.
Depois disso, nós fomos para a Bahia, para fazer uma expedição solidária. Eu liderei um grupo de oito voluntários. Fomos em dois carros até a Bahia. Chegando lá, encontramos uma situação também desesperadora. Levamos EPI e a sabedoria que tínhamos na ocasião. Também aprendemos muito na Bahia. Fomos até o sul, até a Península de Maraú, que estava sofrendo bastante. Então, foi uma experiência bem interessante também.
Em Pernambuco, em Cabo de Santo Agostinho, montamos essa base de apoio. Lá nós tínhamos um setor de inscrição de voluntários, a quem dávamos uma pulseira de identificação; o setor de entrega de EPI; o setor de alimentação; o setor de saúde; o setor de descontaminação e uma base de trabalho. Tudo isso foi possível graças a doações de materiais que fomos recebendo. Aí vemos a localização de cada um desses setores da base.
Como resultado desse trabalho, retiramos mais de mil toneladas de óleo em menos de 1 semana. Estou falando apenas de uma praia, de apenas uma praia. Foi feito todo um trabalho também nas praias do litoral norte de Pernambuco, que também foram fortemente atingidas.
Sugestões de investigação: nós aqui sugerimos — e mais uma vez eu digo que nós não acusamos, nós sugerimos — que se passe o pente-fino em todos os poços de petróleo da bacia do pré-sal de Sergipe e adjacências e se verifiquem, com todas as embarcações e tripulações, se há informações sobre alguma desordem em poços no período de vazamento. Mas eu sugiro que se verifique a partir de janeiro, não de junho e julho. Não. Vamos fazer uma varredura desde janeiro. Está tudo certo com os postos de petróleo? Então, vamos voltar a ver os navios. Mas vamos ver os postos de petróleo. Não custa nada.
11:38
RF
Aqui temos uma imagem do Marine Traffic, do local sugerido. Mas também devemos verificar as adjacências.
E agora?
A curto prazo, ou seja, de imediato, é preciso destinar recursos para os institutos de pesquisa, para que tenham condições robustas para estudar e avaliar os primeiros impactos do óleo, o que o Prof. Humberto tem feito de forma excelente. Eu tenho acompanhado o trabalho dele e da equipe dele. Eles precisam de recursos para continuar trabalhando, assim como o Prof. Clemente e as demais universidades. Isso felizmente está acontecendo. Esse foi um pleito na nossa primeira audiência. Nós ficamos muito felizes, porque pouco tempo depois a FACEPE — Fundação de Amparo à Ciência e Tecnologia do Estado de Pernambuco liberou 2 milhões e meio para pesquisas. Isso foi algo digno que o Governo fez. Agora, recentemente, a CAPES também liberou recursos. O Governo Federal também fez isso de forma acertada. E até empresas privadas, como a Uber, liberaram recursos para isso.
Para médio e longo prazos, o Governo precisa criar um fundo específico para investimento em pesquisa sobre os impactos do óleo no Nordeste. Isso não pode acontecer por apenas 3 ou 5 meses ou 1 ano. Isso que está sendo feito agora tem que durar 5 anos, 10 anos, 20 anos. Então, um fundo específico para isso é importante. Quando aconteceu aquele acidente, aquele crime cometido pela Vale, foi criada a Fundação Renova. Mas neste caso aqui não pode ser uma fundação como a Renova, porque a Renova é da Vale. Vamos criar um fundo público.
Além disso, precisamos criar um centro de monitoramento de vazamento de óleo, um centro de inteligência, de interação de pesquisadores, onde possam trabalhar e ficar prontos para eventuais acidentes.
Considerações finais.
As autoridades precisam reconhecer oficialmente o trabalho dos voluntários e dos grupos que lideraram o combate ao óleo, que colocaram sua saúde em risco e ajudam a minimizar impactos ainda mais profundos, gerando com isso uma economia aos cofres públicos, além de minimizar todo o impacto social, ambiental e no turismo. Não queremos só um "obrigado". Eu queria deixar esta sugestão para a Mesa. Os movimentos socioambientais no Nordeste não querem só um "obrigado". Eles querem ser reconhecidos.
Queremos também proteção jurídica e segurança aos grupos ambientais. Acho que vocês não falam muito disso, mas muitos de nós fomos ameaçados, direta e indiretamente, principalmente por divulgar a ocorrência de vazamento de óleo. Muita gente nos ameaçou por causa disso: "Vocês vão acabar com o turismo!". O problema não é nosso. Nós precisamos divulgar o que está acontecendo para conseguir atuar. Então, gostaria de saber onde encontrar essa proteção jurídica.
É preciso também dar condições para os grupos, para que continuem atuando no combate ao óleo e na recuperação socioambiental. Muitos desses grupos são pequenos, não têm muitas condições para trabalhar. Nós queremos continuar trabalhando e precisamos de condições para isso.
Era isso.
Obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Herculano Passos. Bloco/MDB - SP) - Quero agradecer ao Daniel Brandt Galvão, Engenheiro de Pesca, Coordenador do Salve Maracaípe e Professor da Universidade Federal de Sergipe.
Eu quero fazer um comunicado aos presentes e aos que nos acompanham pela TV. Todo esse material apresentado aqui está na página da CPI. Se alguém quiser acessar, está disponível. Qualquer pessoa, qualquer cidadão, qualquer Parlamentar, qualquer órgão do Governo pode ter acesso a essas apresentações. Vai ser assim até o fim desta CPI.
Agora queria passar a palavra ao nosso Relator, o Deputado João H. Campos, para o seu pronunciamento e os seus questionamentos.
11:42
RF
O SR. JOÃO H. CAMPOS (PSB - PE) - Eu quero agradecer a presença dos professores, que conseguiram estar aqui esta semana.
Nós instalamos na semana passada a Comissão. O Deputado Herculano Passos foi eleito Presidente, e eu fui designado Relator. Como vem um recesso parlamentar pela frente, tanto eu quanto o Deputado Herculano temos o desejo de fazer as atividades o quanto antes.
Então, quero agradecer a presença de vocês. Na terça-feira nós conseguimos fechar a nossa agenda, e vocês estão aqui hoje.
Nós ouvimos primeiro a apresentação do Prof. Clemente Coelho Junior. Eu acho que o professor poderia ter um item importante, que é o da previsibilidade. Foi um item comum da apresentação dos três. Eu acho que nós poderíamos colocar em debate os instrumentos de previsibilidade, o que podemos construir para ter a previsibilidade como uma ferramenta de acompanhamento perene disso, e a dificuldade de prever a movimentação.
Quando eu estudava engenharia, fiz 1 ano de iniciação científica e trabalhei só com modelagem. No caso, com fenômeno de cheia, com modelagem hidrológica dinâmica. Quando temos um modelo, sabemos perfeitamente qual é a previsibilidade. É assim também, imagino, na oceanografia, quando se coloca vento, maré e corrente. Você bota as variáveis ali e gera um modelo previsível. Mas não saber a origem dificulta a previsibilidade. Então, como é que você constrói essa previsibilidade sem saber a origem? Acho que essa pergunta talvez seja expressa no caso apresentado. Acho que todos podem falar um pouco da previsibilidade.
Prof. Clemente, pela sua especialidade, pergunto-lhe qual é o impacto real que esse óleo pode ter nos organismos e nos microrganismos, enfim, em toda a fauna e a flora? Pergunto isso para que nós tenhamos consciência do que deve ser feito, não para menosprezar, nem para superlativar o que vem pela frente. O que cabe a nós? É importante fazer a análise de amostras de água de todas as praias? Pernambuco chegou a fazer isso. Mas é também preciso analisar amostra de coral, amostra de areia? Enfim, o que devemos ter como obrigação exigir do Estado brasileiro, dos Estados e Municípios, para quantificar e ter como ação pela frente, em relação ao impacto disso na fauna e na flora?
Para o Prof. Clemente também faço a última pergunta. Nós vemos, pela natureza e densidade, que o óleo é pesado. Muito foi dito que não haveria tecnologia ou mecanismos, formas, ferramentas para recolher esse óleo na água. Houve divergências entre especialistas, inclusive no caso de Pernambuco. Eu sei que isso foi público. O Estado de Pernambuco defendia que o óleo fosse o máximo possível recolhido na água antes de chegar à costa, antes de fazer o toque na costa. Havia especialistas — eu acho que eram do IBAMA — que falavam, à época, que o óleo deveria chegar à costa para ser recolhido, porque não havia como fazer isso antes. Criou-se um mecanismo com o que havia. Em Pernambuco, vimos que o Porto de Suape e o Porto do Recife colocaram alguns barcos para recolher aquelas manchas dentro da água e conseguiram. Mas onde é que existe tecnologia? De quem podemos ir atrás? Eu custo a crer que no mundo ninguém saiba como trabalhar com óleo pesado. Há países em que a maior parte da extração é de óleo pesado. Então, aonde os professores sugerem que a Câmara dos Deputados vá, que a CPI vá, para descobrir se existe tecnologia para trabalhos com vazamento de óleo pesado?
11:46
RF
Prof. Humberto, ficamos aqui com uma dúvida, que eu acho que pode ser geral. Vemos que há um trabalho feito a partir de um satélite, o Sentinel-1A, que é de domínio europeu. Para entendermos de maneira bem clara, pergunto se existe uma cadeia internacional de compartilhamento de dados, enfim, de informações de satélites, e por que o Brasil deve ter a sua própria rede. Ou o Brasil deve ter uma rede própria, um sistema próprio de satélites, uma tecnologia própria para isso? Já existe alguma internacional? E o que há de carência? Podemos não saber, mas talvez haja satélites ainda melhores, que não podem ser compartilhados, que são de uso restrito. Por exemplo, de soberania americana ou das Forças Armadas. Então, o que o Brasil deveria fazer para ter à disposição imagens ou material de alta qualidade, no que chamamos de monitoramento de satélites? Como funciona essa cooperação de uso de dados? Há uma restrição? Há um limite? Vimos que há uma área que não foi coberta naquele dia. Se fosse um satélite próprio brasileiro, haveria cobertura todos os dias, para facilitar, no caso, uma investigação como esta?
Em relação à forma como funciona o satélite Sentinel-1A, que é por micro-ondas, eu ouvi de alguns especialistas, e aqui também foi relatado, que pode haver imprecisão. Se o mar estiver com vento baixo e estiver mais plano, sem muita ondulação, pode haver interferência, assim como a presença de plâncton, de alga. Então, quanto aos mecanismos de validação dessas imagens, de que forma conseguiríamos ter mais segurança de que de fato se trata de óleo, e não de algumas interferências?
Em relação à possibilidade, que o senhor levanta também, de o vazamento ter mais de uma origem, quais seriam as origens? Como enfrentamos essas origens? E qual é a probabilidade de haver várias origens diferentes ao mesmo tempo? Seria uma coincidência possível. Porém, a possibilidade de vários eventos acontecerem simultaneamente torna-se mais remota. Em relação a sua apresentação, Daniel, eu quero ouvir a sua opinião sobre uma futura legislação que esta Casa pode vir e deve vir a construir, porque é um dos objetivos desta CPI.
11:50
RF
Eu também falo enquanto pernambucano, enquanto alguém que conhece todas essas praias. Conversei com muita gente e conheço o sentimento do pernambucano. O pernambucano tem uma mania boa de achar que tudo do nosso Estado é o melhor, é o maior, é o mais qualificado. (Riso.) É também um sentimento de pertencimento e de proteção. Acho que, quando o óleo chegou a Pernambuco, quando ele bateu num coral ou na areia, o sentimento do pernambucano era de que estava batendo nele, não na fauna e na flora. Então, criou-se um sentimento muito grande de mobilização, um sentimento bonito, verdadeiro, justo. Vimos pessoas fazendo aquilo com um sentimento de justiça.
Mas vamos olhar pelo lado do Estado, seja da Câmara Federal, seja da Assembleia Legislativa, seja do Governo Estadual, seja do Governo Municipal, seja do Governo Federal. Temos que ter cuidado com o meio ambiente, com a fauna, com a flora e com as pessoas. Então, será que, numa legislação sobre desastres com óleo, cabe-nos também incluir instrumentos claros de participação de voluntariado? É uma ideia que eu levanto e quero ouvir a sua opinião. Porque podemos organizar a atuação dos voluntários, podemos usar o desejo, a força, a vontade, a experiência dos voluntários. No seu caso, por exemplo, o senhor é um ativista, mas também é um especialista. Podemos fazer isso de maneira articulada, dentro da lei. Instrumento como esse que foi criado lá, do núcleo de ações, do centro em que havia vários setores, pode ser uma ideia interessante de discutir, pode ser um modelo a ser criado em casos de desastre em que há um interesse grande de participação popular. Você tem que organizar a forma como as pessoas vão ajudar. Então, eu quero ouvir a sua opinião sobre isso. Talvez, assim como há o Plano Nacional de Contingência para Incidentes de Poluição por Óleo em Águas sob Jurisdição Nacional, possa haver a participação de voluntários em desastres naturais.
Até pela capacidade de mobilização, as redes sociais podem ajudar, e muito, nisso. Se tivermos uma estrutura legal que se organize dentro da legislação, acho que pode ser uma contribuição importante. Eu quero ouvir a sua opinião sobre isso.
O SR. PRESIDENTE (Herculano Passos. Bloco/MDB - SP) - Tem a palavra agora o Deputado Rodrigo Agostinho.
O SR. RODRIGO AGOSTINHO (PSB - SP) - Presidente Herculano Passos, Relator João H. Campos, eu acho que as apresentações de maneira muito clara nos mostraram hoje, mais uma vez, a gravidade desse acidente, mostraram que nós não estamos preparados para enfrentar situações semelhantes a esta. O Brasil quer ser um grande player, um grande explorador de petróleo no mundo. Vemos os números e toda a tradição da PETROBRAS, mas, de maneira muito clara, mostramos um despreparo total no enfrentamento da situação.
Nós temos todo um sistema de monitoramento por satélite no Brasil estabelecido pelo INPE. Nós temos, enfim, toda uma estrutura da Marinha, do IBAMA, do ICMBio, e nenhuma dessas estruturas de fato funcionou, nem do ponto de vista de detecção, nem do ponto de vista do monitoramento, nem do ponto de vista do suporte à população. Eu acho que isso corrobora com tudo o que vimos até aqui.
11:54
RF
O Brasil precisa se preparar. O Brasil fica discutindo como vai gastar os bilhões oriundos da exploração do pré-sal, sem que nós paremos um pouco para enfrentar a crise de sustentabilidade que vemos hoje no mundo.
Eu acho que é um desafio enorme e acho que esta CPI vai, sim, conseguir cumprir com boa parte dos objetivos estabelecidos no seu plano de trabalho.
Eu quero fazer apenas uma pergunta. Sintam-se à vontade para responder ou não, vocês que estiveram lá na ponta, vocês que são da área, que são especialistas e acompanharam isso desde o começo. Qual é a sua percepção sobre a forma como o Governo agiu desde o começo em relação a isso? Eu falo dos Governos Municipais, Estaduais e Federal. De maneira muito clara, pergunto: o Governo realmente demorou para agir? "Não, o Governo estava lá desde o começo." Quem estava lá desde o começo eram apenas servidores da ponta, dos escritórios do IBAMA, mas que não tinham qualquer possibilidade de mando, de comando, para organizar algo maior? Enfim, eu gostaria de saber qual foi a percepção de vocês. Vocês ficaram sozinhos por quanto tempo? O que esses órgãos poderiam ter feito e deixaram de fazer?
Eram essas as minhas indagações.
Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Herculano Passos. Bloco/MDB - SP) - Obrigado, Deputado Rodrigo.
Bom, grande parte dos meus questionamentos já foi feita pelos Deputados que me antecederam, mas eu queria fazer algumas perguntas simples e objetivas.
Eu queria saber se, analisando o material, o óleo, há possibilidade de constatar que pode ter havido algum vazamento de plataformas da PETROBRAS, se esse óleo pode ser nosso ou não. Essa é uma pergunta.
Pelo monitoramento de satélite, a suspeita maior é a de que tenha havido vazamento de um navio. Existe a possibilidade de identificação desse navio ou dos mais suspeitos, para que nós possamos tentar ir atrás?
Por último, a questão do dano ambiental, na flora e na fauna marinhas. O dano já foi feito. Nós temos que ver como podemos corrigir esse dano, o que é muito difícil. A própria natureza vai se recompor. Não temos acesso a tudo isso. Já aconteceu o desastre. Seus efeitos continuam ou pararam? Em relação às praias do Nordeste, eu quero saber, até para dar uma resposta para o turismo, se estão aptas para o uso, após o desastre. Queremos dar uma resposta à questão turística da região.
11:58
RF
Eram esses os meus questionamentos.
Eu acho que os senhores já notaram que não há mais Deputados para se manifestarem. Então, nós vamos começar pelo Prof. Clemente, que tem a palavra para responder às perguntas.
O SR. CLEMENTE COELHO JUNIOR - Deputado João H. Campos, essa questão da previsibilidade foi uma coisa que nós levantamos o tempo todo.
Foi colocada bem pelo Prof. Humberto e por você, Daniel, a possibilidade, sim, de nós termos meios para descobrir ou meios para atingir a previsibilidade. Bem colocou o Prof. Humberto um bom papo com um pescador. Talvez o Daniel possa falar, porque passou por isso prestando atenção a uma pessoa que conhece o mar, que conhece a natureza marinha e costeira. Nós sabíamos qual era o vento quando estávamos em campo.
Foram utilizados até o momento — é claro que agora praticamente só temos o ruído do petróleo — modelos matemáticos e computacionais, não para a previsibilidade. Eles foram utilizados para descobrir o ponto de onde saiu o óleo. E respondo já a uma parte da pergunta do Deputado Herculano Passos, sobre onde ele se originou. Isso é chamado de tecnologia reversa. Utilizam-se as datas da chegada do óleo, os dados climáticos daquele dia e dos dias anteriores e se traça ponto por ponto a trajetória reversa, invertendo o sentido do óleo. Aí é criado um polígono. Acho que você mostrou no eslaide, Daniel. E foi esse polígono que entrou na investigação do Prof. Humberto também.
Em relação à previsibilidade, então, olhando para a frente, todos nós que estávamos em campo sabíamos a que hora ia chegar o óleo porque tínhamos o horário da maré e a velocidade do vento. É claro que não tínhamos dados oceanográficos. Nós não estávamos com o equipamento oceanográfico, mas esses dois componentes são fulltime. Está acontecendo, e nós tínhamos essa informação. Você pega o aplicativo, o "Windive"...
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. CLEMENTE COELHO JUNIOR - É, esse de ventos e de ondas, usado por quem surfa. Não é, Daniel? Você vê o tamanho da onda, a que hora vai haver onda, a direção do vento, o horário. Isso é suficiente para você se antecipar, como aconteceu em relação ao Rio Maracaípe. Quando nós estávamos recebendo óleo em Tamandaré, às 6 horas da manhã, às cinco e pouco da manhã eu estava na praia, e às 8 horas chegaram as "brigadas", entre aspas, chegaram técnicos, analistas ambientais da CPRH, do IBAMA e do ICMBIO. Ali fizemos uma reunião. Eles falaram: "Professor, vamos colocar boias no Rio Formoso. Você ajuda a escolher os lugares?". Eu falei: "Olha, já entrou o óleo. Coloquem em Maracaípe". Eu nunca mais esqueço isso. (Riso.) Eu falei: "Vão para Maracaípe. Eu nem estava sabendo que vocês estavam atrás de boias, mas coloquem em Maracaípe". Eram 9h30min da manhã. Essas boias chegaram às 9h30min da noite. Não faltou previsibilidade, faltou logística.
12:02
RF
Então, sim, poderia ter havido menor impacto. Ele mostrou um vídeo. O pescador se antecipou e foi lá.
Infelizmente, eles certamente ficaram intoxicados, Daniel. Eu conversei com muitos pescadores lá em Ipojuca também. Muitos foram parar no SUS.
Eles se anteciparam. O Governo do Estado chegou a disponibilizar helicóptero da Secretaria de Defesa Social — SDS. Eu lembro que estava com o Secretário de Meio Ambiente de Tamandaré, no dia 18, à noite, numa reunião de gabinete, para conversar sobre o óleo. Nós não imaginávamos que ele chegaria tão pesado à Praia dos Carneiros, que é um ponto turístico — você sabe, Deputado — precioso. E durante uma ligação perguntaram: “Mas é preciso mesmo subir um helicóptero?”. O Secretário disse: “É claro que sim. É preciso, sim, subir um helicóptero". E ele conseguiu um helicóptero particular. Depois a SDS apareceu, porque o óleo chegou à Praia dos Carneiros.
Então, essas coisas realmente poderiam ter sido resolvidas, se acreditassem um pouco na voz da ciência ou das pessoas que estavam vivenciando isso. Eu acho que o tempo todo nós estávamos prevendo, sem bola de cristal, o que poderia acontecer.
Com relação ao impacto, Deputado, nós dividimos, o que é clássico na literatura, em impacto agudo e impacto crônico. Saibam todos aqui o que o óleo faz, quando chega aos ecossistemas: ele recobre os corais, ele recobre o solo do mangue, ele recobre as raízes, ele recobre os galhos, ele recobre as praias. Esse é o impacto agudo. O recobrimento é impacto direto, assim como a mortandade de fauna e flora. Vai ficar embaixo.
O que nos deixa um pouco preocupados é o que nós chamamos de impacto crônico. E aí respondo em parte também à pergunta sobre se as praias estão limpas. Os fragmentos existem. Eles estão ainda pequenos, mas estão ali no sedimento. Esses fragmentos ou o óleo que não foi limpo vai continuar se decompondo, liberando moléculas tóxicas, hidrocarbonetos, benzenos e metais pesados. Por quanto tempo? Décadas: 10 anos, 20 anos, 30 anos. O mais preocupante é que isso é cumulativo. Ele pode ter um efeito já, direto, de toxicidade, e matar organismos — e isso nós vimos; pegamos peixes mortos, crustáceos mortos — e pode ter efeito cumulativo, que se transfere para a cadeia alimentar. O que eu falei aqui na minha apresentação foi, que, no topo da cadeia alimentar, não está o tubarão somente, está o ser humano. Essa é uma preocupação. Por isso é que no México se monitoram as pessoas que foram atingidas há 9 anos. Monitora-se a saúde dessas pessoas.
Agora o nosso Estado se organizou. A Universidade de Pernambuco e, principalmente, a FIOCRUZ, organizaram-se para cadastrar essas pessoas, Daniel — para cadastrar as vítimas. Os voluntários foram também vítimas, infelizmente. Organizaram-se para cadastrar essas pessoas.
Temos que acionar a Secretaria de Educação, Deputado João H. Campos, para que possamos realmente efetivar o estudo da contaminação nessas pessoas.
12:06
RF
Para finalizar, as medidas que devem ser tomadas a partir de agora. Nós vimos, principalmente na APA Costa dos Corais, o que também responde a parte da pergunta, quem agiu de fato na hora. O que nós vimos em relação às ações? Vou contextualizar: se não me falha a memória, no dia 10 de novembro o Ministério Público Federal disse que não tinha sido acionado o Plano Nacional de Contingência. Dez pontos mostraram que não foi acionado o Plano Nacional de Contingência. O que aconteceu então naquele momento? Quem agiu? No caso da APA Costa dos Corais, analistas ambientais, pesquisadores, principalmente os ligados ao CEPENE, à Universidade Federal de Pernambuco, à Universidade Federal de Alagoas, à Universidade de Pernambuco, à qual eu pertenço, e voluntários, como bem já mostrou o Daniel.
Como agiram? Agiram em conjunto? Não. Eles não agiram em conjunto. Eles tomaram, muitas vezes — o Daniel e eu sabemos disso —, ações praticamente... Como eu posso falar? Únicas. Mataram no peito a bola e disseram: "Eu toco isso aqui". Eu ouvi discussões sobre um dos rios mais atingidos, o Rio Mambucaba, dentro da APA Costa dos Corais — presenciei isso —, às quais estavam presentes o Governador, o Secretário de Meio Ambiente Bertotti, o Secretário de Meio Ambiente de Tamandaré e o Prefeito de Tamandaré. Eram discussões, bate-bocas a respeito de quem era a responsabilidade por limpar o Rio Mambucaba. O Rio Mambucaba pertence a uma unidade de conservação federal, a APA Costa dos Corais. Quem o limpou primeiro foram voluntários. Depois, o registro do impacto foi feito por mim. Mas quem entrou lá e começou a limpar foram os voluntários. Depois foram os pescadores, voluntários, que começaram a cortar as raízes. Depois vieram analistas ambientais do ICMBIO e disseram: "Não cortem as raízes". E depois de muito tempo, passado praticamente 1 mês do impacto no Rio Mambucaba, o IBAMA lançou uma cartilha sobre como fazer a limpeza no manguezal. Na verdade, foi 70 dias depois do acidente, porque outros manguezais foram atingidos. Eu estou falando do caso do Rio Mambucaba, porque foi sobre ele que bateram cabeça.
Agora uma questão com a qual lhe respondo. Realmente, o plano não foi acionado até esse momento. De forma desarticulada aconteceram ações. No território da APA Costa dos Corais, realmente o IBAMA e o ICMBIO criaram uma brigada, que começou a funcionar direitinho, que começou a funcionar razoavelmente, inclusive dando certa orientação para os voluntários na região. Mas em outras regiões não existem unidades de conservação. Por exemplo, o Município de Japaratinga. Eu contei a história: no dia 4 de outubro, eu liguei para o Secretário de Meio Ambiente e o que ouvi do Secretário de Meio Ambiente foi o seguinte: "Professor, eu fui exonerado". Não havia gestão ambiental no Município de Japaratinga naquele momento. Quando chegou o óleo, muito menos. Para o azar desse Município, o óleo se prendeu nos corais. Eu havia conversado sobre isso com você aqui, em paralelo. Faz exatamente 1 mês que o óleo chega, todos os dias, à Praia do Boqueirão — todos os dias. Bate vento aqui, bate vento acolá, nordeste, leste, e saem as manchas pequenas que estão no fundo, que vão parar na Praia do Boqueirão.
12:10
RF
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. CLEMENTE COELHO JUNIOR - Japaratinga.
Vou finalizar.
Eu acho que foi uma percepção. É claro que não há um estudo sobre isto, mas, como trabalho com políticas públicas na área de meio ambiente, e sou professor de gestão ambiental, políticas públicas e planejamento ambiental, eu digo: Municípios bem estruturados em termos de gestão sofreram menos.
Nós temos o Sistema Nacional de Meio Ambiente — SISNAMA, que patina, por incrível que pareça, desde a década de 80. Quantos Municípios, Deputado João H. Campos... Lá no nosso Estado, nós temos Secretaria de Meio Ambiente, conselho e, consequentemente, um fundo, para ter uma estrutura mínima com funcionários. É muito pouco. O nosso litoral é um pouco melhor.
Então, eu me arrisco a dizer que Municípios que não têm gestão, como é o caso de Japaratinga, foram os que mais sofreram — consequentemente, a sociedade toda.
O SR. PRESIDENTE (Herculano Passos. Bloco/MDB - SP) - Obrigado, Clemente.
Quero passar a palavra agora ao Prof. Humberto Alves Barbosa, responsável pelo Laboratório de Análises e Processamento de Imagens de Satélites — LAPIS da Universidade Federal de Alagoas, para responder às perguntas.
O SR. HUMBERTO ALVES BARBOSA - Deputado Herculano Passos e Deputado João H. Campos, eu agradeço mais uma vez o convite.
Senhoras e senhores, a primeira ferramenta de um pesquisador é uma pergunta. A primeira questão a ser feita é esta: o que é importante para o País? Tecnologia ou formação de recursos de alto nível? Essa sempre foi uma questão que eu fiz e que continuo fazendo para mim, para o meu laboratório. O que é mais importante? Ter tecnologias, as quais eu posso adquirir, desde que eu tenha recursos? Mas, se não tenho formação de recursos humanos suficiente para gerar informações e gerar conhecimento, vou ser mero usuário potencial de uma ferramenta.
Então, este momento é extremamente importante para a academia e para as organizações governamentais. Um país em desenvolvimento precisa articular, criar pontes, criar sinergia de colaboração. Não podemos nos dar ao luxo de depender apenas da tecnologia para resolver nossos problemas. Temos que adaptar muito a tecnologia existente hoje no País à nossa realidade, à nossa situação, seja ciência, seja tecnologia.
Essa é a primeira grande pergunta.
Agora eu vou começar a responder ao Deputado João H. Campos, ao Deputado Herculano Passos e ao Deputado Rodrigo Agostinho.
Bom, falado isso, o que temos hoje, em termos de formação de recursos humanos, na parte de monitoramento de óleo? O que temos hoje, em termos de metodologia? As universidades têm capacidade de desenvolvimento de metodologias e de recursos humanos. Isso ainda não é explorado ao máximo. Há uma descentralização. Precisa-se de maior coordenação. A CAPES, de certa forma, e o CNPq, nas suas competências, tentam colocar essa base para que as universidades possam responder ações como a que está acontecendo no País. Mas isso é uma articulação, precisa também passar por agências governamentais, que passam por problemas. Recursos humanos estão chegando a se exaurir. Todo o nosso sistema de reposição de cientistas e pesquisadores é complexo. Precisamos rever isso e não depender apenas de uma tecnologia ou das tecnologias. As tecnologias são complementares.
12:14
RF
Entro então mais especificamente nessa questão de cooperação técnica. Vem uma segunda pergunta para o País: o que é importante? Se não temos recursos, se não temos as ferramentas necessárias, do que precisamos? Estabelecer planos de cooperação.
Houve uma tentativa, antes do PNC, ou depois do PNC, estabelecida com a Europa, de melhorar essa sinergia entre os nossos cientistas brasileiros e representados por instituições governamentais, embora as universidades não estivessem presentes, e essa é minha maior crítica. As universidades têm que participar desse processo, e este é o papel das universidades: gerar metodologias. Então, houve um primeiro esforço na tentativa de desenvolver uma plataforma de monitoramento de óleo. O Sentinel foi cogitado naquela época, e houve uma colaboração dos dois lados. Não sei se o nome correto é câmara setorial, na área do Ministério da Ciência e Tecnologia, que estabelece essa ponte entre os cientistas brasileiros e os cientistas europeus para se fazer esse monitoramento. Por volta de 2008, já havia sinais de colaboração nesse sentido. Não foi dado andamento a isso, e, em algum processo, aconteceu de isso não ter sido concretizado.
Em termos de tecnologia hoje, há disponibilidade para usuários de uma infinidade de informações. Em termos de imagens de satélite, hoje a comunidade internacional compartilha esses dados com o usuário. Eu, por exemplo, sou usuário e tenho acesso hoje a mais ou menos 10 gigabytes de dados diários recebidos no sistema do LAPIS, do sistema de recepção, que utiliza uma antena parabólica. Nossa infraestrutura é muito limitada, mas os usuários podem ter acesso a essas informações.
Mas o mais importante, digo mais uma vez, não sendo repetitivo, é não só ter acesso aos dados. Por exemplo, eu levo 5 anos para formar um recurso humano de alto nível para que ele possa trabalhar essas informações. Muitas vezes, no nosso sistema, não temos um programa de doutoramento, o que não permite que eu continue com esse aluno, formando isso. Ele tem que se deslocar para outro centro e talvez não continue com as mesmas competências que foram designadas a ele.
Temos que começar a olhar bem esse modelo que temos hoje em termos de formação de recursos humanos para ver se ele realmente responde às necessidades do País. Essas responsabilidades e essas necessidades estão aumentando, e isso vai trazer, de certa forma, um exercício para que o País tenha que começar a repensar a formação de recursos humanos.
Abro então o primeiro parêntese para o Deputado João H. Campos.
João H. Campos, precisamos mapear os cérebros deste País. Eles estão aí. Por exemplo, em função do monitoramento do óleo, tive contato com um colega, que não conhecia, extremamente autônomo, especialista em processamento de imagens, em processamento de dados. Precisamos saber onde estão essas pessoas. Quando o País precisa, ele não precisa primeiro da tecnologia, precisa de recursos humanos, capacidades, competências. E, a partir dessa base de competências, estabelecem-se diretrizes e prioridades.
12:18
RF
Talvez nesse sentido tenha havido uma descoordenação por parte das autoridades brasileiras, porque se centraram nas competências específicas e possivelmente em algumas tecnologias e se esqueceram dos especialistas dessa rede, que precisam estar concentrados. Na hora em que surge uma crise num país em desenvolvimento, não temos as mesmas ferramentas que têm os países desenvolvidos, mas nós temos os cérebros. Esses, sim, podem estabelecer o que é prioritário em termos de ações e desastres. Não basta só criar um centro de desastres. É preciso criar uma estrutura de formação de pessoas para desastres.
É nesse sentido que eu acho que respondo que a colaboração internacional e a colaboração regional são extremamente importantes. Sabemos que o País tem competências regionais que poderiam ser melhor exploradas. Nesse sentido, fica a minha primeira questão.
Volto à questão da tecnologia, especificamente ao Sentinel. Ele só foi possível porque o laboratório tinha competência em vários satélites para definir qual seria o satélite mais adequado, não necessariamente o que encontraria o problema. Mas possivelmente definiria o mais adequado e a metodologia necessária para procurar onde poderia estar a origem.
O SR. JOÃO H. CAMPOS (PSB - PE) - Se temos acesso ou não, é outra questão, mas existe no mundo alguma tecnologia pronta melhor do que essa?
O SR. HUMBERTO ALVES BARBOSA - Deputado João, eu diria que a PETROBRAS até pode ter essa tecnologia hoje disponível.
O SR. JOÃO H. CAMPOS (PSB - PE) - A tecnologia de satélite.
O SR. HUMBERTO ALVES BARBOSA - A tecnologia de satélite. Hoje, o Sentinel é um dos melhores para detectar manchas de óleo e fazer a localização de navios, embora existam outras tecnologias SAR que estão disponíveis, mas que tem duas componentes: a componente de investigação científica e a componente comercial. Talvez essa seja uma sinergia que tenhamos que olhar também.
O SR. RODRIGO AGOSTINHO (PSB - SP) - Dr. Humberto, o Governo brasileiro está utilizando tudo o que vocês levantaram, tudo o que vocês fizeram? Vocês têm sido requisitados pelo Governo brasileiro?
O SR. JOÃO H. CAMPOS (PSB - PE) - Quero acrescentar uma pergunta. Quanto às investigações oficiais, no Ministério Público, na Polícia Federal e no Ministério do Meio Ambiente, há um compartilhamento oficial de material entre o seu laboratório e os órgãos oficiais?
O SR. HUMBERTO ALVES BARBOSA - Bom, vou responder diretamente o que eu posso dentro da minha alçada. Primeiro, fomos sim procurados pela Polícia Federal, fizemos um contato com a Polícia Federal. Há um grupo muito capacitado da Polícia Federal, da geomática. Fizemos uma reunião rápida, de 2 ou 3 horas. Digo que foi rápida porque precisaríamos de mais tempo, mas foi o suficiente para vermos alguns pontos importantes. Eles também estão olhando essa situação.
Houve um convite da Marinha, mas ele não foi confirmado, não foi oficializado. Sabemos que existem agências governamentais que têm formação de recursos humanos suficiente para atender essa questão de utilização de imagens SAR, que são imagens de radar de abertura sintética. O INPE — Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais tem grupos formados na área de SAR, obviamente, com aplicações quanto ao desflorestamento da Amazônia, por exemplo. O PRODES utiliza tecnologia SAR.
Mais uma vez, portanto, a questão é de coordenação de núcleos de excelência e competência para se trabalhar com essas informações. Eu acho que faltou um pouco mais dessa integração entre esses grupos de pesquisa. Mais uma vez, vou ser repetitivo e falar das universidades.
12:22
RF
Obviamente, Prof. Clemente, nós estamos aqui as representando e conhecemos bem os dilemas e as dificuldades que as universidades hoje enfrentam, e o maior asset delas, vamos dizer assim, é a formação de recursos humanos, são as metodologias que são desenvolvidas. Isso leva 20 anos. Há professores que têm mais de 20 anos de universidade. Não se pode colocar a questão de forma que eles não possam também contribuir, sobretudo se considerarmos as dificuldades que um processo como esse apresenta.
Nesse sentido, Deputado João H. Campos, há domínios hoje de especialistas e competência em tecnologia SAR, mesmo dentro das agências governamentais. Nós não sabemos o nível de coordenação e de protocolos, levando-se em conta como isso poderia ter sido colocado dentro do problema.
De certa forma, Deputado Rodrigo, há uma demora. Isso custou caro para nós, do ponto de vista científico. Aqui não há conotação política. Do ponto de vista científico, precisávamos que houvesse uma validação logo nos primeiros dias das manchas, para se saber qual tecnologia poderia fazer a detecção. O uso de espectroscopia, por exemplo, é uma forma também de se utilizar uma informação que vai ficar resgatada e que pode melhorar o nosso banco de dados e de mapeamento em imagem de satélite. Os drones também podem e devem ser utilizados nesse tipo de problema. Então, trata-se de um problema multidisciplinar e interdisciplinar.
O SR. JOÃO H. CAMPOS (PSB - PE) - O senhor pode repetir o termo? Não há validação...
O SR. HUMBERTO ALVES BARBOSA - Vou dizer isso numa linguagem mais simples. Por exemplo, quando eu acesso o meu celular, posso...
O SR. JOÃO H. CAMPOS (PSB - PE) - Não, pode dizer, eu só não escutei o termo. Não há validação científica ou não há validação para a investigação...
O SR. HUMBERTO ALVES BARBOSA - Deputado, o que aconteceu foi exatamente o seguinte. Nós ainda estamos atrasados, deveríamos estar fazendo levantamento dessas manchas in loco, com informações de espectrometria, por exemplo, e outras informações laboratoriais. Eu não sou especialista na área de petróleo, mas, na parte de imagem de satélites, precisaríamos coletar amostras tanto no mar quanto na superfície, utilizando espectrorradiômetro, que vai de uma varredura de 0,4 micrômetro a 2,5 micrômetros, o que nos dá refletividade. Assim se tem características de que componentes, dependendo dessas amostras, podem ter maior ou menor reflectância. Com isso, com as imagens de abertura sintética, informações de reflectância, de emissão de temperatura, eu posso auxiliar também. Isso se complementa.
Perdemos análises. Deveríamos continuar fazendo as análises dessas amostras. Como disse o Prof. Clemente, o intemperismo traz uma degradação, e essa degradação tem que ser levantada, para validar outros modelos, sejam modelos gerados por informações numéricas, sejam modelos conceituais gerados por imagem de satélite.
Essa é a parte técnico-científica, de que sentimos mais falta, e esse atraso custou caro do ponto de vista científico. É um desastre único que ocorreu no País, e ele pode ser utilizado pelo País como referência mundial de como atuamos tecnicamente e cientificamente. Ou seja, isso é uma biblioteca, com informações extremamente importantes, que pode nortear questões futuras em termos de monitoramento de poluição e derramamento de óleo por navios ou que tenha outras origens.
Entro então nessa questão das origens, Deputado João H. Campos. Não trabalho com achismo, eu trabalho com evidências. Algumas evidências são limitadas e algumas vezes podem ser refutadas. É assim que a ciência trabalha. Não há absoluta certeza, mas há uma questão que tem de ser respondida. A nossa primeira questão foi esta: as imagens de satélites, amplas, podem detectar as manchas? Com competência de mais de 20 anos trabalhando com imagens, foi um insulto escutar que não havia claras informações técnicas, científicas que nos dissessem que não. Esse foi o motivo pelo qual o LAPIS entrou. Pela nossa competência em imagens de satélites, sentimos que essa afirmação poderia comprometer o nosso trabalho. O nosso trabalho vem sendo realizado há mais de 15 anos com imagens de satélites. Aquilo foi uma provocação. Entramos então num processo independente, sem querer apontar culpados, mas sim análises técnico-científicas. Elas podem sim fazer a detecção. Em 1 semana, já tínhamos a resposta.
12:26
RF
Elas podem fazer a detecção sim. E eu preciso também fazer a confirmação em campo? Preciso validar isso? Sim, mas eu precisava de uma estrutura de laboratório que me permitisse pegar um navio ou que a Marinha pudesse ter usado um navio e validado essas informações.
O SR. JOÃO H. CAMPOS (PSB - PE) - Acho que esse ponto da validação é um ponto decisivo. A validação não pode ser feita depois? Não podemos validar a característica da imagem para um evento posterior? Nós faríamos uma expedição, e a Marinha iria com laboratório identificar uma grande mancha de algas, por exemplo. Identifica aquilo e depois vai ver como está a imagem de satélite. Cria-se uma validação posterior para poder identificar aquela que foi anterior, porque seria impossível fazer uma verificação. Se você faz a descoberta 15 dias depois, consulta a imagem e vê que havia mancha, seria impossível voltar no tempo para medi-la. Nós rodávamos muito isso nos modelos hidrológicos e hidrodinâmicos também, fazendo a validação pela régua de altimetria do rio. Validava-se dessa forma, posteriormente, o modelo que se tinha desenhado, a qualidade da imagem, tudo isso. Não seria o caso, portanto, de fazer uma validação a partir de agora?
O SR. HUMBERTO ALVES BARBOSA - Deputado João H. Campos, a resposta é sim. É melhor que seja feita agora do que nunca. Obviamente, o tempo corre contra quando se trabalha com informações que se precisa validar, porque existem outros processos que alteram toda a composição físico-química do que se está monitorando, dependendo do grau de precisão e de informações que se pode ter. Por exemplo, no caso do petróleo, o tempo é desfavorável, porque há processos físico-químicos, como o de salinidade de água, que podem alterá-lo e, na parte de resposta de reflectância ou da parte de radiometria, é preciso olhar isso enquanto a amostra sofre menos interferência do tempo ou de outros fatores externos. Obviamente, seria essa a situação ideal.
Não sendo a situação ideal, é importante que seja feito quando possível o levantamento dessas informações e que elas sejam catalogadas com datas, para que possamos compará-las e recorrer a informações retroativas. Essas informações vão nortear outros dados que possam aparecer, mas é importante a informação em campo. Ela é o mais valioso para se consolidar um modelo preditivo, um modelo observatório ou uma ação de resposta de um desastre. Quanto mais rápido, melhor. Isso não quer dizer que, se não for possível, se deixe de fazer a coleta dessas informações. Eu me atrevo a dizer que acho que a Polícia Federal está fazendo esse trabalho de levantamento de informações de campo, que pode ser muito importante para a pesquisa e principalmente para o processo de validação.
12:30
RF
Gostaríamos de ter acesso a esses dados, para que pudéssemos também utilizá-los em outras análises, tanto para a formação de recursos humanos como para a criação de metodologias. O mais difícil, Deputado Campos, é criar metodologias. Para se criar metodologias, precisa-se de dados. Esses dados precisam gerar informação, que precisa de conhecimento, e isso, Deputado Rodrigo, passa também pela formação de recursos de alto nível. Isso não depende só de tecnologia. Isso depende de como olhamos para a formação de recursos humanos neste País. É importante tirarmos lições de que não é só tecnologia, não são só centros, são pessoas. Temos que ficar um pouco atentos a isso.
Sobre as origens, Deputado, isto foi outra coisa que nos chamou muito a atenção: as evidências. A primeira pergunta foi respondida. As imagens de satélite podem detectar as manchas. A segunda pergunta: essa quantidade que está sendo encontrada se justifica? Em todos os processos de correntes oceânicas, de ventos de superfície, essa seria uma quantidade que encontraríamos só por derramamento de navios? Não sou especialista e não tinha evidência quanto a isso, mas eu tinha as imagens do Sentinel que mostravam características de processos distintos de formação de áreas por derramamento de óleo ou poluição de óleo. O sul da Bahia tinha padrões, assinaturas, DNAs diferentes do que os que eu vi nas imagens do Sentinel na região da costa de Pernambuco, de Alagoas e um pouco mais para a Paraíba, onde foi encontrada, em 30 de agosto, a primeira mancha. Isso foi o que mais me chamou atenção, embora, naquele momento, todos buscássemos saber. Navios realmente eram a causa da origem do derramamento do óleo? Realizamos esforços, mas, desde o início, havia um questionamento interno, entre mim e os meus colaboradores — entendam colaboradores como estudantes —, sobre se realmente a quantidade de petróleo encontrada era só por derramamento de navio ou se haveria outras evidências, como nós estávamos percebendo nas imagens do Sentinel.
Continuamos e fizemos levantamento de diferentes dados — dados de sismologia, dados de localização dos poços de perfuração e exploração de petróleo e também das dutovias e das rotas marítimas e de cabotagem — que também foram utilizados no sistema para integrar todas as informações que permitissem aos nossos especialistas e também a outros especialistas realizar a análise. O mais importante não é a tecnologia, é o acesso a essas informações pelos especialistas. Muitos deles não tiveram acesso a outros dados que poderiam ser importantes.
Eu acho que respondi, Deputado Rodrigo. Para nós, houve sim uma demora do ponto de vista técnico e científico. Sempre esperamos a melhor condição. Quanto mais rápido tivermos respostas das autoridades confirmando o que encontraram, melhor. Faltou um pouco mais de abertura de informações das autoridades responsáveis pelo monitoramento. Isso poderia ter ajudado a rede de especialistas a ter acesso a esses mesmos dados. Eu não tive acesso aos dados que a Marinha ou outros órgãos estavam ou estão utilizando. Isso compromete também a análise de forma independente das informações.
Não queríamos, igualmente, que a nossa pesquisa tivesse influência de outra. Então, sempre agimos de forma independente e responsável. Não nos valemos do achismo, consideramos as evidências. Algumas delas foram refutadas, como as do caso do Voyager. Mas tivemos que pedir a alguém que fosse para Londres...
12:34
RF
O SR. JOÃO H. CAMPOS (PSB - PE) - Esse seria o último questionamento. Quanto a esse erro da Marine Traffic, é comum acontecer uma correção como essa?
O SR. HUMBERTO ALVES BARBOSA - Não é comum.
O SR. JOÃO H. CAMPOS (PSB - PE) - Eu vi ali que eram quatro pontos que eles colocavam numa rota. Então você lança uma suspeita, e ele reposiciona o navio, dizendo que ele não estava lá. É comum uma revisão desse nível por parte desse acompanhamento?
O SR. HUMBERTO ALVES BARBOSA - Deputado João H. Campos, não é, porque, em princípio, ficamos preocupados em divulgar o Voyager. Nós seguramos até que tivéssemos contato com as autoridades...
O SR. JOÃO H. CAMPOS (PSB - PE) - Eu pergunto se é comum não por parte de vocês, mas sim da Marine Traffic.
O SR. HUMBERTO ALVES BARBOSA - A Marine Traffic foi uma forma independente que o LAPIS encontrou. E essas informações são cobradas. Existe um serviço aos usuários para se ter acesso a essas informações. Optamos por tê-las, pela ausência. Precisávamos de outras informações. É por isso que eu digo da importância de essa rede de especialistas ter acesso aos dados. Esses dados devem estar disponíveis para que possamos colocar de uma forma as metodologias e as perguntas.
Então, Deputado Herculano, tive que buscar em um serviço fora do País informações para que eu pudesse validar uma informação de derramamento de um navio. Usando tecnologia que não era do País, chegamos à conclusão de que havia uma anomalia. De 111 navios-tanque que passaram naquela região, naquela data, levando óleo cru, apresentou-se um único navio. Não havia registros dele passando naquela região. Só apareceram registros dele 4 dias após a mancha, numa rota irregular em direção aos Estados Unidos, fazendo uma manobra pelo oeste da África. Depois, o sinal desaparecia.
Deputado Rodrigo, houve uma cobrança da mídia para que divulgássemos isso. Participamos de uma outra audiência, em que divulgamos o nome do navio de que suspeitávamos e as evidências em que nos baseávamos. A nota internacional da Voyager, que recebemos, afirmava que ela tinha provas de que o navio estava parado na Índia e que todas as nossas evidências não faziam sentido nesse contexto. Daí pedimos que um representante em Londres fosse ao escritório e dissesse: "Olhe, a Marine Traffic foi a nossa base de dados para colocar o Voyager I como suspeito". Durante alguns dias ficamos nos comunicando, outra pessoa estava fazendo isso internacionalmente, até que eles corrigiram essa localização do Voyager, Deputado João H. Campos. Fizeram a mudança até no sistema deles.
De certa forma, é um sistema pago, e isso poderia ter certa vulnerabilidade quanto à informação. Qual a confiabilidade do sistema? Deputado Campos, é por isso que eu acho que temos de ter... O sistema de vigilância, monitoramento e observação da nossa região costeira está fragilizado, por falta de informações, por falta de uma rede de especialistas que possam colaborar e, de certa maneira, passar essa segurança internacional.
É nesse sentido que eu faço esse complemento, Deputado João H. Campos. Não sei se deixou de ser respondida alguma das perguntas que foram feitas pelos colegas.
Agradeço mais uma vez.
12:38
RF
Como há professores aqui, quero reforçar a importância das universidades, de algumas de suas competências que podem ajudar o País em momentos de crise. Temos visto, porém, que as universidades não têm sido colocadas como integrantes de um plano colaborador e participativo das agências governamentais. Estamos todos dentro de um mesmo governo, o Governo Federal. Eu sou pago pelo Governo Federal.
O SR. JOÃO H. CAMPOS (PSB - PE) - Ficou claro, Prof. Humberto.
Quero parabenizar a todos os professores pela apresentação.
Fui estudante de uma universidade pública, a Universidade Federal de Pernambuco, e participei de grupos de pesquisa. Então, entendo e defendo não só o fortalecimento e o reconhecimento da pesquisa no Brasil mas também a integração. Eu dizia como estudante e repito agora como Deputado que é muito mais motivante e atraente, para o professor e para o aluno, se o que for pesquisado e construído dentro de uma sala de aula ou dentro de um laboratório tiver uso efetivo por parte da sociedade.
Então, se conseguíssemos criar uma metodologia de compartilhamento de informações com os centros universitários, que mostraram grande eficiência e agilidade nas investigações, colocando-se desde o início na linha de frente, para que eles façam parte dos comitês, não trabalhando apenas de boa vontade, seria de grande valia para toda a sociedade. Certamente, vamos estudar junto com a nossa equipe o fortalecimento da integração dos centros universitários, dos centros de pesquisa com os comitês de investigação oficiais.
O SR. PRESIDENTE (Herculano Passos. Bloco/MDB - SP) - Quero agradecer ao Prof. Humberto Alves Barbosa as explicações, as respostas.
Passo a palavra a Daniel Brandt Galvão, para que dê suas respostas e faça suas considerações finais.
O SR. DANIEL BRANDT GALVÃO - Obrigado, Deputado. Obrigado, João.
Vou tentar ser bem breve. Tenho uma dúvida, talvez o Deputado João também a tenha. Não precisa ser dada a resposta agora, talvez nas considerações finais. Existem mais imagens a que o senhor não tem acesso? Eu queria só saber se existem ou não. Essa é uma dúvida minha. Existem mais imagens talvez privativas do Governo dos Estados Unidos ou da Rússia, por exemplo? Isso não ficou claro para mim.
Eu queria saber também se já se esgotou toda a pesquisa a se fazer em relação a navios e satélite ou se ainda há muita coisa para ser feita.
O SR. HUMBERTO ALVES BARBOSA - Sim, há várias imagens que se complementam, há metodologias e há vantagens e desvantagens. É necessário um conhecimento técnico sobre essas imagens para que elas sejam utilizadas. Está faltando recurso humano para completarmos algumas análises. Algumas imagens trazem evidências de outras fontes que precisam ser analisadas com outros dados auxiliares.
O SR. DANIEL BRANDT GALVÃO - Perfeito. Então, dá para encontrar ainda outra coisa. Não se esgotou ainda o trabalho de imagem. Show de bola! Essa era uma dúvida que eu tinha havia um tempo, pelo fato de o Governo praticamente não falar mais tanto em navio.
Vou responder à primeira pergunta que o João fez aos três, sobre previsibilidade versus origem. João falou de um modelo hidrodinâmico. Era o Delft3D, João, que você usava?
O SR. JOÃO H. CAMPOS (PSB - PE) - Não, fazíamos a modelagem pelo ArcGis.
O SR. DANIEL BRANDT GALVÃO - Pode ser também. Show!
Quanto aos modelos, o Prof. Clemente já respondeu, dá para se fazer uma espécie de reanálise e, de fato, encontrar a origem do óleo, dessa forma. Mas, de fato, perdeu-se o timing. A perda do timing dificultou bastante a descoberta da origem.
12:42
RF
Eu sou da oceanografia física. Então, trabalho com dados de onda, vento e maré. Todos os dias faço essa verificação. Temos uma parceria, por meio do nosso laboratório de física, com o Porto de Suape, que tem um dos melhores equipamentos de medição meteoceanográfica em tempo real. Através desse convênio, conseguimos ter acesso aos dados, em tempo real, de ventos. E eu também sou um cara do mar, como o Sr. Clemente falou. Sou surfista, sou mergulhador, sou da área de náutica. Então, todos os dias, analiso o vento, e não por causa do óleo. Faço essa análise porque tenho que fazer mesmo, por questão de trabalho. Em conversas com meus amigos lá do grupo, sentávamos e dizíamos: "Amanhã o óleo estará em tal lugar. No dia seguinte, em tal lugar. No outro, em tal lugar". E deu tudo certinho. Eu até brinquei com uma amiga minha lá de Salvador. Começamos a fazer correspondência. Quando o óleo estava para chegar lá, eu disse a ela: "O óleo vai chegar aí tal dia a tal hora". E ela: "Como você sabe?" Ficamos nessa brincadeira, e tudo aconteceu.
A previsibilidade só ficou difícil depois que o óleo deu a segunda volta em Pernambuco, depois de quase 60, 70 dias, porque aí bifurcou de vez. Agora estamos num momento de vento norte, norte e nordeste. Primeiro, o vento começa a mudar, leste e sudeste, e fica muito forte; depois; leste; em seguida, norte e nordeste. Agora está norte. O óleo não está mais chegando à costa porque, na verdade, está sendo levado para fora pelo vento. Se forem fazer uma varredura em alto-mar, ainda conseguirão encontrar alguma coisa, possivelmente.
Digo isso só para responder essa questão do timing. De fato, o Governo perdeu o timing. Ficou difícil, mas, nos primeiros 50 dias, dava para achar tranquilamente de onde o óleo estava derivando e dava para se preparar com barreiras de contenção, embarcações, navios e até mesmo chegar com recursos federais para os pescadores e lhes dizer: "Vocês não estão podendo pescar, não. Tomem esta grana aqui e vão tentar conter as manchas de óleo". Com certeza, eles iriam conseguir. Os caras são muito safos. Se botassem essa missão na mão deles, com o incentivo de recursos financeiros, eles iriam conseguir, com certeza.
Tecnologia para trabalhar com óleo pesado certamente o Brasil tem, o mundo tem. Já chegamos até Marte. Já furamos o pré-sal, a profundidade chegou a 5 quilômetros. Com certeza, temos tecnologia. Há a nossa especulação de o vazamento ter ocorrido em poço de petróleo. O que pode ter acontecido foi que o poço furou, ficou lá vazando, e o vazamento de um poço não é muito forte, porque o produto precisa de pressão para sair. Então, vai vazando aos poucos. Não encontraram onde era o poço, a princípio. Depois, encontraram, pegaram um navio de manutenção de poço, tamparam, e agora está legal, mas, até conseguirem tampar o poço, vazou um bocadinho — essa é a nossa especulação. Por isso não dava para encontrar a mancha de óleo tão fácil, porque ele fica à deriva na vertical, mas não em ângulo de 90 graus. Ele tem uma deriva mútua. Pode ser dinâmica aquela deriva. Muitas vezes, ele só aflora próximo da costa, assim como agora pode estar aflorando também em outras regiões, no sentido da África. Mas tecnologia existe. Hoje em dia, os próprios navios da PETROBRAS que trabalham com contenção têm radares para detectar óleo abaixo da camada de superfície. Isso é antigo. Essa tecnologia existe facilmente.
Legislação para atuação de voluntários eu acho ótimo. Inclusive, o Sidney, que também é voluntário e coordenador do Salve Maracaípe, sempre diz, nas entrevistas dele, algo que sempre reforçamos: nunca queremos romantizar o trabalho do voluntário. "Ah, estávamos lá às 3 da madrugada esperando!" Não achamos isso certo. Achamos que seria bom ter a prontidão lá do Exército, da Marinha. Falando em Exército e Marinha, reforçamos que não temos uma crítica. Não somos políticos aqui. Somos um grupo ambiental totalmente apartidário, até porque a política nunca fez bem ao meio ambiente, independentemente de esquerda ou direita. Esse não é um problema só do Brasil, é um problema global. Ainda não conseguimos harmonizar desenvolvimento com natureza; o Brasil, muito menos. Existem Governos piores ou melhores para a natureza, mas bons, infelizmente, são poucos. Sabemos que, dentro da política aqui, existem Deputados e Senadores conscientes e sempre queremos encontrá-los para trabalharmos juntos. Também estamos caminhando para um mundo melhor, ambientalmente falando. Temos essa esperança, essa utopia.
12:46
RF
A legislação para voluntários, com certeza, é algo que temos que construir. Mas falta uma coisa, João. Vou falar exclusivamente de Pernambuco. Somos um Estado rico em fauna e flora, mangues, corais, temos pesquisadores de ponta, de reconhecimento internacional, e temos uma base marítima, uma base oceanográfica na beira do mar. Essa era uma das coisas a respeito da qual queria lhe falar quando cheguei aqui. Temos ali uma área do Coqueiral de Maracaípe onde era o Instituto Agronômico de Pernambuco — IPA. Naquele instituto só estão agora os escombros da construção. Vamos construir ali um instituto de ciências marinhas? Ali podemos também formar recursos humanos para combater diversas tragédias ambientais marinhas.
O Governo agiu ou não? Não. Com certeza, não. O IBAMA estava lá na primeira semana. O IBAMA chegou — isso está na imprensa —, e o Governo disse: "É mancha órfã". O IBAMA disse: "É mancha órfã. Tchau e bênção". Daí não fez mais nada. De quem é a responsabilidade de mancha órfã? Do Governo Federal. Enquanto não se descobre o culpado, é do Governo Federal. Quem acompanha o nosso Instagram sabe que em nenhum momento falamos de Governo Federal. Falamos do Governador Paulo Câmara, falamos do Governador do Rio Grande do Norte, do Governador de João Pessoa, pedimos para todo mundo agir. Só viemos falar do Governo Federal quando a coisa já tinha tomado outra proporção. Seguramos muito para falar do Governo Federal, até por causa dessa coisa política. "Ah, não, vocês são de esquerda!" Não somos. Só botamos isso na conta do Governo Federal quando a coisa realmente tinha tomado outra proporção. Mas o Governo não agiu. O Governo começou a agir tempos depois e, como disse aqui o Prof. Clemente, colocou lá militares totalmente despreparados. Isso está documentado no nosso Instagram. Demos EPIs e comida para os caras da Marinha. Esperávamos que eles fossem chegar lá megapreparados, para enfrentar uma guerra mesmo.
No âmbito municipal, tivemos uma boa experiência com a Prefeitura de Ipojuca, com a Prefeitura de Paulista, com a Prefeitura do Cabo. O Governo Estadual — posso falar só do de Pernambuco — demorou um pouco para agir. Na primeira rodada do óleo, eles não agiram. Fizemos bastante crítica a isso. Na segunda rodada do óleo, eles não se prepararam, embora estivéssemos falando nisso. Quando o óleo chegou e o bicho já estava pegando, ele agiu. Hoje em dia, estamos tendo uma relação muito boa, com o Governo do Estado tentando construir soluções.
Quanto ao Governo Federal, sempre nos colocamos à disposição. Nas minhas duas audiências aqui, eu disse ao IBAMA e ao representante que estávamos à disposição. O Salve Maracaípe está cheio de informação. Ninguém no Brasil, hoje, tem mais informação de toda a dispersão do óleo do que o Salve Maracaípe. Nós nos colocamos à disposição, mas, até hoje, o Governo Federal não se colocou, enfim... Estamos aqui, disponíveis, e eu reforço isso aqui pela terceira vez, aqui em Brasília. Estamos disponíveis para colaborar com soluções, para mitigar danos ambientais ou sociais que já aconteceram.
12:50
RF
"Como estão as praias hoje?" Essa pergunta é do Deputado Herculano. Tecnicamente, cientificamente falando, nós temos que analisar amostras de sedimento e água. Considerando o aspecto visual, estão boas, exceto algumas praias como Itapuama, que foi uma das mais atingidas do Brasil. Ainda há muitas manchas de petróleo nas suas pedras. O Deputado João deve conhecer bem essa praia. Fizemos neste final de semana um monitoramento naquelas pedras...
O SR. JOÃO H. CAMPOS (PSB - PE) - A balneabilidade foi atestada pela agência estadual. No caso, foi feita a análise, não foi? Esse é até um ponto importante. Sabe se isso foi feito em outros Estados?
O SR. DANIEL BRANDT GALVÃO - Sim, estão sendo feitas análises...
O SR. JOÃO H. CAMPOS (PSB - PE) - Análises de água para autorizar a balneabilidade?
O SR. DANIEL BRANDT GALVÃO - Estão sendo feitas, mas, como não temos ainda em Salve Maracaípe a nossa estrutura de laboratório — um dia queremos tê-la —, só estamos acompanhando os resultados. Confiamos nos resultados.Com base nos resultados, o que estamos vendo é que as praias estão aptas para banho.
Quanto ao consumo de pescados, saiu a notícia, também no Estado de Pernambuco, de que as pesquisas recomendaram que duas espécies não sejam consumidas. As demais, sim, podem ser consumidas.
Tudo isso, no entanto, como disse o Prof. Clemente, precisa ser trabalhado por 10, 20 anos, porque há todo um problema de bioacumulação.
Era isso, até para não me estender mais.
Nós nos colocamos aqui à disposição.
O Deputado Rodrigo perguntou se o Governo agiu ou não, não é isso?
O SR. RODRIGO AGOSTINHO (PSB - SP) - Vocês estão vendo funcionar o plano de contingência, desde aquele momento até agora?
O SR. DANIEL BRANDT GALVÃO - Veja, o Plano de Contingência Nacional já começou a funcionar fora do timing. Eles também se atrapalharam muito. Quem está coordenando as ações nas praias, in loco, no caso do Governo também, são os voluntários. Quando eles chegam lá, nós os orientamos: "É mais aqui, é mais ali". Nos grupos da Bahia, estou vendo que a presença dos militares é ainda maior do que foi em Pernambuco. Eles estão em grupos de WhatsApp. Eu participo de uns três grupos de WhatsApp da Bahia, e os militares também estão nesses grupos. É legal, eu acho legal isso, o pessoal está interagindo lá. Muitas vezes eles perguntam: "Oi, gente. E aí, como está a situação hoje?" E o pessoal dá uma orientada lá, diz como se deve agir.
Considerando-se então a questão de limpeza de praia, vejo que hoje eles estão agindo, mas de maneira muito aquém. Esta é uma estimativa, um chute: para cada militar da Marinha ou do Exército, há cem voluntários disponíveis para trabalhar. Há muitas praias ainda com vestígios de petróleo, e eles não estão nelas. Eles estão deslocados, porque há poucos homens, e o Governo sempre abre a boca para dizer: "Botamos 5 mil militares no Brasil para trabalhar". Nós colocamos 5 mil pessoas numa praia só. Então, falta muito ainda. Tinham que pegar militares de todo o Brasil. Agora não tanto, porque a situação de emergência já passou.
É isto que estou falando também: o plano veio muito tarde. Na hora da emergência, conforme as imagens que eu mostrei, precisávamos deles, e só havia alguns gatos-pingados.
Veio então esta CPI. Elogio a coragem de vocês, pela disposição de botar para frente esse assunto, porque sei que internamente existe muito enfrentamento.
Eu acho que o Governo Federal, a Situação, a Oposição têm que se unir para buscar as soluções, ver o que está de fato acontecendo, e não ficar nessa picuinha política. Estamos tratando aqui não de direita ou de esquerda e sim de soluções ambientais e sociais.
12:54
RF
O pessoal do turismo também sofreu bastante, e muitas vezes fomos atacados por ele por divulgarmos o que aconteceu. Mas muitas outras pessoas do turismo chegaram até nós para nos agradecer também. Donos de resorts, de pousadas, de hotéis nos mandam mensagens para nos agradecer, porque tiramos de forma rápida aquele petróleo de lá. Então, há duas vertentes. Logo que esse petróleo chegou às praias, houve aquele lobby: "Não, as praias estão limpas. Estão limpas!" Isso aconteceu em Porto de Galinhas. O Secretário de Turismo disse, pela Internet, que não havia mancha de petróleo e que estava tudo certo. O Ministro do Turismo foi lá, e depois o óleo chegou com mais força ainda. Então, tem que se ter cautela, tem que se ter cuidado.
Esta é outra coisa que dizemos muito: se não se descobriu a origem ainda, estamos em alerta. Enquanto não se descobrir a origem, estamos em alerta. "Ah, foi descoberta a origem! Não vem mais óleo." Nesse caso, beleza!
Agradeço mais uma vez pelo movimento e também pela atuação de todos os voluntários, das pessoas que nos acompanham e que fizeram todo esse trabalho.
Agradeço também ao pessoal que tem apoiado o trabalho do Salve Maracaípe. Nós estamos aqui e eu tenho a grande responsabilidade de estar falando não só por mim, pelo Salve Maracaípe, mas também por todos os voluntários do Nordeste que têm dado sangue pelas soluções.
Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Herculano Passos. Bloco/MDB - SP) - Obrigado, Daniel Brandt Galvão, pelas explicações.
O SR. CLEMENTE COELHO JUNIOR - Gostaria de falar rapidamente.
O SR. PRESIDENTE (Herculano Passos. Bloco/MDB - SP) - Nós estamos com...
Bom, passo a palavra ao Clemente, a quem peço que, por gentileza...
O SR. CLEMENTE COELHO JUNIOR - Não, é só um exercício para todos aqui. Quero lembrar que o Plano Nacional de Contingência é de 2013. Ele completou 6 anos agora em outubro. O Manual do Plano Nacional de Contingência foi aprovado em abril de 2018. Em abril de 2019, foi dissolvido o Comitê Executivo, que iria operacionalizar o plano nacional.
Se ele aconteceu da forma como foi construído, em 2013, e da forma como foi escrito, a resposta é não.
O SR. PRESIDENTE (Herculano Passos. Bloco/MDB - SP) - O.k.
Quero agradecer a colaboração de Clemente Coelho Junior, Daniel Brandt Galvão e Humberto Alves Barbosa, e dos Deputados que participaram, os Deputados Rodrigo Agostinho, Bira do Pindaré e João H. Campos.
Nada mais havendo a tratar, vou encerrar os trabalhos, antes convocando os Srs. Deputados para a próxima reunião ordinária, ocasião em que também haverá audiência pública, com a participação de membros do Grupo de Acompanhamento e Avaliação — GAA, formado pela Marinha do Brasil, pela Agência Nacional do Petróleo — ANP e pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis — IBAMA, a ser realizada na próxima terça-feira, dia 10 de dezembro, às 14h30min, em plenário a ser definido.
Está encerrada a presente reunião.
Voltar ao topo