1ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA 56 ª LEGISLATURA
Comissão Externa destinada a acompanhar as investigações que visam apurar as responsabilidades pelo derramamento de óleo
(Audiência Pública Ordinária)
Em 21 de Novembro de 2019 (Quinta-Feira)
às 9 horas e 30 minutos
Horário (Texto com redação final.)
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O SR. PRESIDENTE (João Daniel. PT - SE) - Bom dia.
Declaro aberta a sexta reunião da Comissão Externa destinada a acompanhar as investigações que visam apurar as responsabilidades pelo derramamento de óleo.
Considerando que a ata da quinta reunião ordinária encontra-se à disposição na Internet e na Secretaria da Comissão, indago se há necessidade de sua leitura por algum membro da Comissão. (Pausa.)
Dispensada a leitura da ata.
Não havendo quem queira retificá-la, submeto-a à votação. (Pausa.)
Damos a ata como aprovada.
Passemos à Ordem do Dia.
Queremos agradecer, de antemão, a todos os convidados que aqui estão presentes.
Apenas o Sr. Francisco Kelmo Oliveira Santos, Diretor do Instituto de Biologia da Universidade Federal da Bahia, não pôde vir, por um problema hoje justificado, mas se colocou à disposição para estar presente assim que outra audiência for marcada e ele for convidado.
Chamamos para compor a Mesa o Sr. Gilvan Dias dos Santos, Diretor Presidente da ADEMA/SE — Administração Estadual do Meio Ambiente do Estado de Sergipe (pausa); o Sr. Humberto Barbosa, Coordenador do Laboratório de Análise e Processamento de Imagens de Satélite — LAPIS, da Universidade Federal de Alagoas (pausa); o Sr. Leonardo Barros, Diretor Executivo da Empresa HEX Tecnologias Geoespaciais (pausa); o Sr. Paulo Nobre, pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais — INPE (pausa); o Sr. Alberto Wisniewski, Professor do Departamento de Química da Universidade Federal de Sergipe.
Esclareço que esta audiência pública cumpre uma decisão colegiada da Comissão, em atendimento aos Requerimentos nº 5, do Deputado Carlos Veras, e nº 16, do Deputado João Daniel.
Para melhor andamento dos trabalhos, esclareço que adotaremos os seguintes procedimentos: o tempo concedido a cada palestrante será de 20 minutos, não podendo haver apartes; os interessados a interpelar os palestrantes deverão se inscrever previamente na mesa de apoio; as perguntas serão feitas ao final aos palestrantes e deverão se restringir aos assuntos da exposição, formuladas no prazo de 3 minutos, dispondo o palestrante de igual tempo para as respostas.
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A reunião está sendo gravada e transmitida ao vivo pela Internet e pela TV Câmara. Todo o conteúdo permanecerá disponível na página da Comissão e poderá ser utilizado pelos serviços de comunicação da Casa na íntegra ou em parte para a produção de reportagens e documentários afins.
Feitos esses esclarecimentos, iniciamos a nossa audiência pública.
Quero agradecer a todos que estão presentes no plenário.
Vamos iniciar com nosso convidado que tem feito um grande trabalho, comprometido com a área ambiental, que não tem se esquivado de estar 24 horas por dia em defesa da questão ambiental. Sou testemunha disso. Tenho acompanhado o grande companheiro e amigo Gilvan Dias dos Santos, Diretor-Presidente da ADEMA — Administração Estadual do Meio Ambiente do Estado de Sergipe.
Também registro as presenças de Sílvio Sá, Presidente do Sindicato dos Trabalhadores em Água e Serviços de Esgotos do Estado de Sergipe, e do amigo Dernival Neto, Chefe do Escritório de Representação do Governo de Sergipe em Brasília.
Gilvan, fique à vontade. O senhor tem 20 minutos. Se precisar de mais tempo, nós o concederemos tranquilamente.
O SR. GILVAN DIAS DOS SANTOS - Bom dia a todas e a todos.
Quero cumprimentar a Mesa na pessoa do Deputado João Daniel, a quem parabenizo pela importância de trazer a debate esse lamentável ocorrido na costa brasileira, mais de perto no litoral nordestino, tomando proporções maiores e chegando também ao litoral sudeste.
Quero saudar ainda Dernival Neto, representante do Escritório de Sergipe em Brasília, e os demais que me ladeiam, que compõem a Mesa, mestres e professores, que trarão as suas contribuições.
Sergipe, não diferentemente de outros Estados do Nordeste, vem sofrendo com esse lamentável ocorrido desde o dia 24 de setembro do ano corrente, uma terça-feira, quando fomos informados da chegada dessa substância oleosa. Naquele primeiro momento, todos os atores que labutam na defesa do meio ambiente se reuniram para pensar em ações mitigadoras, que eram exatamente o recolhimento dessa substância que apareceu no nosso litoral norte.
A preocupação inicial se dava porque no litoral norte de Sergipe, mais precisamente na cidade de Pirambu, existe a maior reserva para desova de tartaruga marinha do Brasil, a REBIO — Reserva Biológica de Santa Isabel. Infelizmente, a porta de entrada desse lamentável acontecido foi nas cidades de Pirambu, Brejo Grande e Pacatuba. A preocupação, desde o início das informações que nos chegavam, era o risco para a desova das tartarugas marinhas na REBIO de Santa Isabel.
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Juntaram esforços a ADEMA, o órgão estadual para o meio ambiente, e o IBAMA. Também tivemos o apoio de empresas terceirizadas da PETROBRAS e da termelétrica CELSE — Centrais Elétricas de Sergipe S.A.
Inicialmente, foi feita uma limpeza, que foi concluída no dia seguinte, quarta-feira, 25. No final da tarde de 25 de setembro, fizemos um sobrevoo e tamanha foi a nossa alegria em ver as areias de toda a praia de Pirambu, no litoral norte, limpas. Nós ficamos felizes com o que vimos naquele momento. Mas, para nossa tristeza, no dia seguinte, fomos tomados mais uma vez por uma carga dessa substância oleosa. E isso ocorre até os dias de hoje.
É bem verdade que precisamos ter muita responsabilidade com as informações. O que ocorreu e está correndo em Sergipe, Deputado, é que os seus 163 quilômetros de costa foram afetados. Toda a costa foi afetada. Nos dias atuais, temos a redução da chegada desse óleo, mas continuamos recebendo no litoral sul e no litoral norte essa substância oleosa.
No dia 5 de outubro, o Governador Belivaldo Chagas decretou situação de emergência ambiental em sete Municípios, por meio do Decreto nº 40.451, de 2019: Aracaju, Pirambu, Pacatuba, Brejo Grande, Ilha das Flores, Itaporanga e Estância.
Nesse ínterim, nós aguardávamos que as respostas a tudo que estava acontecendo viessem na velocidade da expectativa e dos trabalhos que ali eram feitos por todas as equipes envolvidas. Nós tivemos e temos apoio para fazer a limpeza das praias da Prefeitura Municipal de Aracaju, de 72 alunos do Corpo de Bombeiros, de mais 120 homens das empresas terceirizadas da PETROBRAS e de 50 homens do Exército.
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Em números, hoje, 273 pessoas trabalham na limpeza das praias, que é o que compete unicamente ao Estado neste momento, tendo em vista que a competência originária de investigação e de todo o arcabouço sobre a chegada dessa substância oleosa às praias dos Estados é da União. Então, para nós, só resta fazer aquele trabalho que chamamos de enxugar gelo.
Para que os presentes tenham conhecimento, Sergipe já recolheu de suas praias até o dia 3 do mês corrente 1.210 toneladas dessa substância. É um número extremamente representativo. E nós estamos destinando esse óleo, neste primeiro momento, a um local que tem licença. A licença para essa entrega é feita de forma muito precária, porque esse material está indo de forma provisória. Mas já conseguimos, com as empresas de cimento, usar isso como coprocessamento, como combustível para as suas caldeiras que produzem cimento no Estado.
As informações nos levam a uma preocupação continuada. A chegada dessa substância oleosa continua a cada dia. Nós não sabemos se ela está crescente ou decrescente. O fato é que a cada dia chega mais substância nova ao litoral sergipano e mais de perto ao litoral sul.
Dentro de toda essa situação trazida pelo derramamento de óleo, todos sabemos que o que nós nordestinos temos para oferecer são as nossas praias. O momento é de alta estação e estamos, Deputado, senhoras e senhores, padecendo pelas informações desencontradas que são dadas pela União, que poderia ser mais transparente com os Estados, principalmente naquilo que preconizamos como importante, que é o PNC — Plano Nacional de Contingência.
A União insiste em dizer que foi dado o início. Em Sergipe, posso falar como representante, como a pessoa que fala por indicação do Governo no PNC, passamos todos os nossos contatos. Mas até o presente momento não tivemos resposta nenhuma.
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O Governo Federal, em resposta a uma demanda, a uma ação civil pública promovida pelo Ministério Público Federal, deu a informação de que os Estados estavam inseridos. Mas nós temos a convicção, até porque falamos pelo Estado, de que não temos essa participação na evolução da aplicabilidade do Plano Nacional de Contingência.
A grande dificuldade dos Estados sobre essa ocorrência são as interfaces com o Governo Federal, que tem dificultado muito o diálogo, esse diálogo que tanto nós preconizamos pela importância da situação. Ficamos sabendo, muitas vezes, de algumas tratativas do comando único pela imprensa. Temos chefes do Estado visitando os Estados, mas não têm sequer a urbanidade e a hombridade de informar aos órgãos, nem sequer ao Governo do Estado. Esta é uma das grandes dificuldades que temos em toda esta situação: fazer com que o caminho de todos os atores reunidos em mitigar essas ações seja enfrentado com muita irmandade entre todos aqueles envolvidos.
Uma das grandes dificuldades dos Estados, falo por Sergipe, é exatamente uma interface mais transparente e mais próxima com a União, para podermos tratar de ações mitigadoras nesse sentido. Para que os senhores tenham ideia, fazemos parte de um comando e nos reunimos diariamente para tomar as melhores decisões. Nós temos equipes trabalhando diariamente, fazendo visitas nos pontos críticos. A reunião é feita para demandar as ações que possam corresponder à ação mitigadora do dia seguinte. Muitas vezes, não somos nem sequer ouvidos. Alguns relatórios que o IBAMA e a Marinha emitem não são usados com as informações que os órgãos estaduais têm ofertado a partir da inspeção e da fiscalização que é feita diariamente.
É relevante deixar o registro aqui de que é importante que o Governo Federal, as instâncias federais possam fazer uma aproximação com os Estados e com os Municípios e tratar com irmandade, com proximidade, de modo a que todos pretendam o bem comum, que é resolver o problema. O que todos os Estados querem é exatamente voltar ao status quo ambiental anterior. Os Estados tanto têm sofrido em seu entorno.
Falo ainda de um segundo viés, exatamente a parte hoje mais afetada, que são os pescadores, os marisqueiros, que, num segundo momento desse lamentável ocorrido, foram atingidos. Num primeiro momento nós fizemos a indicação e a fundamentação técnica em decretar situação de emergência por conta das praias, pelo que estávamos vivenciando naquele momento. Mas hoje estamos diante de outra realidade. Os nossos mangues, estuários e rios também estão afetados.
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Em alguns pontos de Sergipe, pescadores já não conseguem voltar mais com as mesmas pescarias. Não queremos amplificar o horizonte e dizer que em todo o litoral isso está acontecendo, mas em alguns locais, senhores e senhoras, aquelas pessoas que vivem da pesca já não têm mais a mesma razão do seu ordinário dia, pois não estão mais encontrando os seus pescados.
Atrelado a isso, dentro do polígono que chamamos de área diretamente afetada, temos uma segunda área que é indiretamente afetada, que são aqueles pescadores que até conseguem, em determinado lugar, em outro lugar, fazer sua pescaria. Mas, por conta de toda a descrença e de toda a cortina de fumaça que existe, talvez por falta de serem inseridas as comunidades acadêmicas para que possam dar informações mais contundentes e esclarecedoras à população, as pessoas têm deixado de adquirir os pescados. Isso está, de forma indireta, afetando algumas regiões.
Nós temos preocupações. A primeira é que não temos a certeza de que o fato gerador de tudo isso tenha cessado, porque nós não sabemos a origem, tampouco temos a certeza de ter cessado esse lamentável ocorrido, até porque nós temos recebido isso diariamente.
Indo para o final da minha colaboração, trago também para este debate de mais profundidade alguns pedidos, alguns encaminhamentos que entendemos relevantes.
Como eu disse no início, nós temos hoje 15 cidades em Sergipe que foram afetadas. Destas, 11 foram afetadas diretamente, quatro, indiretamente, conforme aquilo que acabei de dizer aqui. Pescadores, pessoas que vivem no entorno, sofrem com a descrença, o que faz com que, ainda que consigam ir a outro lugar que não foi afetado diretamente, não possam se utilizar daquilo que sempre fizeram, que é a venda e até mesmo o consumo, pois muitas pessoas estão amedrontadas de consumir o produto.
Eu recebi na ADEMA um envelope com alguns crustáceos. A Universidade Federal de Sergipe está promovendo análises, porque esses crustáceos estavam, podemos dizer, contaminados com óleo. A informação que nos chegou foi que eles foram pescados em alto mar sergipano. Nós encaminhamos isso e as informações preliminares nos dizem que estavam contaminados.
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Foram atingidas 20 praias em Sergipe. Destas, três estão impróprias para banho. Conforme a Resolução CONAMA nº 274, de 2000, existem duas formas de se interditar uma praia. Uma delas é pela análise feita semanalmente durante 5 semanas. É preciso que em somente 1 semana dê concentração acima de mil. Se der em 2 semanas, independentemente de ser a primeira ou a última, se for dentro de 5 semanas, ela tem de ser interditada.
Outra vertente que a Resolução CONAMA 274/00 traz para interditar praia é por derramamento de óleo em trecho que o órgão ambiental — mesmo que a análise de água ateste estar apta para o banho, depende da concentração de óleo naquele polígono — determine que deve ser decretada como área imprópria. E nós tivemos algumas áreas impróprias nos primeiros momentos em que chegou o óleo ás praias, dado o número, dada a expressividade dessa substância.
Querendo agora, de fato, concluir, apresento uma proposta para a reflexão de S.Exas., o Deputado João Daniel, e dos demais Deputados que conduzem esta Comissão, no sentido de que considerem os pleitos de Sergipe. São alguns pedidos, que, acredito, muitos outros Estados deverão fazer também.
O primeiro é continuar gritando pelo Plano Nacional de Contingência. Isso é algo extremamente importante. Se o Governo Federal tivesse atentado para isso, talvez os desastres fossem menores diante do que todos estamos vivendo. Ainda que o Governo Federal insista em dizer que o PNC está em andamento, nós desconhecemos, porque os Estados precisam participar, como preconiza lei específica.
Outro pleito é de ajuda diante da grande dificuldade que estão tendo os entes federativos. É inadmissível que a União pense em resolver isso sem a participação direta dos Estados e dos Municípios. Eles não querem ser somente coadjuvantes, querem também ser responsáveis pelas deliberações, pelas decisões que devem ser tomadas, pelas ações mitigadoras desse lamentável ocorrido.
Pedimos também que sejam destinados, diante dos clamores, recursos para pesquisas. Todos sabemos que numa situação de gravidade ambiental, de descontrole ambiental — é o que estamos vivendo —, de degradação ambiental, ainda que hoje pudéssemos aqui dizer que deixou de chegar a substância oleosa nas praias, tudo aquilo que já foi ocasionado deve ser pesquisado por quem têm expertise, que são as universidades, para que possam nos dar tranquilidade perante esse lamentável ocorrido. Nós não sabemos há quanto tempo essa substância oleosa esteve ou está na água. Precisamos que aqueles que têm profundidade científica possam se somar a isso e dar uma resposta para toda a população.
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Pedimos ainda informações e transparência em todos os procedimentos. Esse é um pedido que nós fazemos. Sabemos que em investigações às vezes nem as partes têm vez. Até por se tratar de algo administrativo, não há o contraditório para ser explorado. Mas pedimos que pelo menos os Estados saibam o que a União pretende ou está fazendo. Pedimos mais transparência e mais informações.
Inteligência técnica, científica e multidisciplinar é outro pedido que também fazemos.
Remoção e recuperação. Estamos fazendo a remoção, mas precisamos recuperar essas áreas. Os mangues precisam ser recuperados. Essas áreas que foram tocadas de forma muito contornada precisam ser assistidas pelas universidades. Acima de tudo, é preciso haver um plano de recuperação dessas áreas que foram degradadas por tudo isso.
O que entendo como o mais importante desses pedidos é a necessidade da participação efetiva dos Estados no Comitê de Suporte ao Monitoramento das Manchas de Óleo. Talvez a maior voz de pedido seja a participação efetiva dos Estados no Comitê de Suporte.
No mais, quero agradecer ao Presidente, o nobre Deputado João Daniel, e me colocar à disposição para aquilo que entenderem necessário. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (João Daniel. PT - SE) - Muito obrigado, Gilvan Dias dos Santos, Diretor-Presidente da ADEMA, pela sua exposição, pela sua presença e pelo seu compromisso.
Queremos registrar a presença de pescadores. Agradeço a todos os representantes de pescadores dos Estados de Sergipe, Pernambuco, Ceará, Bahia e Piauí a presença.
Muito obrigado. (Palmas.)
A segunda exposição é do Sr. Humberto Barbosa, Coordenador do Laboratório de Análise e Processamento de Imagens de Satélite — LAPIS, da Universidade Federal de Alagoas.
Muito obrigado, Prof. Humberto, pela presença e por ter aceitado o convite.
O senhor tem 20 minutos.
O SR. HUMBERTO BARBOSA - Bom dia a todos.
Eu agradeço o convite ao Deputado Federal João Daniel para participar desta audiência e, por seu intermédio, cumprimento todos os presentes.
Eu gostaria de fazer a apresentação dali, porque talvez eu consiga colocar algumas informações de uma forma mais explícita.
O SR. PRESIDENTE (João Daniel. PT - SE) - Pode ficar à vontade.
O SR. HUMBERTO BARBOSA - Antes de começar, quero dar uma pequena informação: eu sou Professor da Universidade Federal de Alagoas, lotado no Instituto de Ciências Atmosféricas, e Coordenador do Laboratório de Análise e Processamento de Imagens de Satélite — LAPIS. A minha formação é de meteorologista, com mestrado em Sensoriamento Remoto pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais — INPE, e doutorado na área ambiental, também com aplicações em tecnologias geoespaciais, mais especificamente com satélite. A minha formação é interdisciplinar e multidisciplinar.
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(Segue-se exibição de imagens.)
Chamo atenção, antes de trazer essa formação interdisciplinar e multidisciplinar, para o fato de que a missão do laboratório há 12 anos foi e continua sendo estabelecer essa relação entre o componente operacional e a academia. Nós tentamos transpor essa lacuna ou a falta de uma ponte que estabeleça uma melhor sinergia do que é desenvolvido nas universidades — entenda-se isso como a formação de recursos humanos de alto impacto, com conhecimento em alta tecnologia, mas também com metodologias — e suprir uma carência do setor, principalmente operacional, no sentido de que as agências governamentais possam se beneficiar e de que as metodologias regionais possam colaborar nessa pesquisa. Para isso, precisamos de tecnologia e precisamos estabelecer com muita clareza o que está sendo desenvolvido nas universidades. Isso passa também por um processo de formação de recursos humanos de alta capacidade. Essa foi uma pequena introdução, uma primeira mensagem.
Eu disse que as universidades têm o papel de estabelecer essa ponte entre a parte operacional. O que é a parte operacional? É a capacidade de gerar informações 24 horas por dia, 7 dias por semana, 365 dias por ano. A universidade não tem esse caráter, porém tem o que é mais precioso: a formação de recursos humanos de alta capacidade e o desenvolvimento de metodologias. Nesse sentido, também bebemos em fontes de informações que normalmente agências governamentais no País possuem. A diferença é que essas tecnologias são disruptivas.
De 2004 a 2006, o LAPIS adotou um sistema independente de informação, descentralizado, em que eu posso receber diariamente 10 gigabytes de dados, incluindo vários provedores. É importante mencionar essa questão de provedores de informações de dados em tempo quase real, o que permite um monitoramento contínuo e automático dessas informações.
A experiência do LAPIS começou em 2007, mais precisamente na Universidade Federal de Alagoas. Nós temos experiência com o voo da Air France, o famoso voo 447. A zona de convergência intertropical foi uma questão, em termos de monitoramento, para entender os processos que poderiam ter provocado o acidente com o voo 447 da Air France. Mais recentemente, observem no lado direito, nos estudos do afundamento dos Bairros Pinheiro, Mutange e Bebedouro, o LAPIS também participou, principalmente na questão hidrometeorológica e também analisamos o acidente com o cantor Gabriel Diniz. Mas o ponto crucial são os mapas que são gerados diariamente pelo laboratório.
Esta foi outra temática: as secas que têm afetado a região. De 2012 até 2016, 2017, o impacto delas foi determinante em termos de problemas socioeconômicos na região. Para atender a essa demanda, o que o LAPIS colocou? O LAPIS colocou o desenvolvimento de um produto diário de cobertura vegetal, um índice de vegetação diário. Isso foi possível através das imagens de satélite.
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Dentro desse contexto, como surgiu a participação do LAPIS na investigação do derramamento de óleo? Primeiro, foi um desafio. Nós escutamos, de forma muito forte e intensa, que as imagens de satélites não poderiam detectar as manchas de óleo no litoral do Nordeste brasileiro. Isso, por si só, já foi o grande desafio e foi a primeira pergunta estabelecida no laboratório.
Já tínhamos experiência em outras áreas, áreas inundadas, onde o Sentinel... Não vou entrar em detalhes, vou evitar o jargão aqui, mas o Sentinel é o que há de melhor em tecnologia de mapeamento de desastres. Quando colocamos o desastre, é importante olhar o início, o durante e o fim. E o Sentinel tem uma reputação em termos de áreas inundadas e de monitoramento de áreas de derramamento de óleo.
A primeira questão é: temos que responder a essa pergunta que já foi tácita ao dizer que as imagens de satélites não poderiam detectar essas manchas localizadas na costa do litoral nordestino?
Adotamos o Sentinel como referência. E quais eram os desafios iniciais da pesquisa? Para fazer esse tipo de pesquisa, não havia o epicentro, não havia a região central que pudesse estar sendo monitorada. Ou seja, teríamos que adotar uma metodologia completamente aleatória para fazer essa varredura e encontrar o padrão. Já estávamos há 45, 50 dias, salvo algum erro, de que já haviam sido encontradas manchas no dia 30 de agosto, mais precisamente em Conde, um Município do litoral da Paraíba.
Precisávamos definir que assinatura o Sentinel poderia encontrar, embora existam, na literatura, padrões espaciais, assinaturas, em que já tem sido utilizado. Ele é um satélite de monitoramento principalmente de desastre natural. A Ásia Pacífico é a região onde se atestam e se validam todos os tipos de tecnologia. O Sentinel tem sido utilizado também na Ásia Pacífico para olhar desastre natural.
A assinatura era importante e havia sim um padrão de assinatura no qual existe toda uma questão técnica e de informações muito específicas na área para entender essa assinatura e esse padrão que estão associados a essas manchas.
A segunda questão é: como monitorar o vazamento em qualquer área do litoral ou mesmo no fundo do mar? Esse era um desafio. Não tínhamos ainda como seria feito esse monitoramento utilizando as imagens do Sentinel.
A descontinuidade das imagens de satélite. Por ter optado pelo Sentinel, havia sempre uma consideração ou o que nós chamamos de um trade-off. O que é isso? O que eu ganho com a resolução espacial, o que eu ganho com os dados. O Sentinel é independente das condições atmosféricas, independente da condição de imageamento, se é dia ou noite. Porém, sua resolução temporal limitava certas questões que poderiam ajudar a responder à pergunta principal, se o satélite realmente detectava as manchas no litoral do Nordeste.
Então, nós precisamos adotar uma metodologia, que começou a ser determinada, primeiro, aleatoriamente. Começamos a varrer no sentido do Maranhão até o sul da Bahia, toda a costa do litoral nordestino, estendendo-nos um pouco ali à região do Espírito Santo e, em alguns casos, até a região do Rio de Janeiro. Foi um movimento aleatório, pegando todas as imagens disponíveis, colocando-as num sistema de informação geográfica, no qual eu inseria outras informações complementares, porém, o dado principal era a imagem do Sentinel. Como os senhores podem ver, aqui é só um detalhe de como foram colocadas as imagens do Sentinel, olhando no sentido horário, do Maranhão até o sul da região do Espírito Santo. Embora ali não pegue um pouco, são todas as imagens disponíveis do Sentinel dos últimos meses, referentes a julho e agosto. Ainda estendemos até setembro, quando estava disponível. Em outubro, à medida que as informações de que as manchas ainda continuavam — e continuam — chegando à Região Nordeste do Brasil, principalmente à costa, à Região Norte e ao litoral leste, avançávamos colocando novas imagens do Sentinel.
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Então, essa foi a primeira parte da etapa metodológica utilizada com os dados do Sentinel, que foi fazer essa varredura de toda a região costeira.
Em 3 dias, a grande pergunta ou uma das perguntas do laboratório já havia sido respondida. As imagens do Sentinel detectaram a presença de uma grande mancha localizada ali paralelamente ao norte do Rio Grande do Norte, mais precisamente ali no Município de São Miguel do Gostoso.
Como os senhores podem ver, embora nós trabalhemos com outros níveis de processamento, outros filtros e outras análises, aqui é só para que o grande público perceba o que encontramos quando chegamos à região do Rio Grande do Norte, à região costeira. Havia uma grande mancha que, de fato, passava de mais de 90 quilômetros de extensão, com aproximadamente 1 quilômetro de largura.
Eu não vou entrar em detalhes e nem usar jargão para explicar aquela imagem, mas ela me chamou a atenção, de imediato, e fizemos um contato com a Agência Espacial Europeia, para que também jogasse luzes técnicas a fim de que pudéssemos ter certeza de que não havia outros sinais. Novamente, eu não vou entrar em detalhes da imagem do Sentinel, mas há muita interpretação. Durante a discussão, eu posso falar de algumas delas.
E recebemos... Esse e-mail está documentado, isso ocorreu em meados de outubro... Até então, nem as autoridades brasileiras tampouco a mídia sabiam dessa informação. Como resposta, recebemos um e-mail falando sobre essa mancha, com mais informações técnicas, para que eu pudesse tomar uma decisão ou fazer uma avaliação mais assertiva e conclusiva sobre a imagem do Sentinel do dia 24 de julho de 2019.
Essa data é crucial para o LAPIS, é determinante não só para responder, mas para refutar outras questões específicas em relação ao derramamento de óleo.
Eu vou deixar que os senhores gravem bem essa imagem e também a data, porque vou retornar a falar sobre essa imagem mais à frente.
Continuamos fazendo a varredura e também jogando luz para saber se havia outros satélites que pudessem identificar essas imagens ou, principalmente, essa grande mancha de óleo, o que poderia ser uma mancha de óleo, no dia 24 de julho. E aí recorremos a outros satélites, como o Aqua MODIS e ao NOAA-20, para confirmar.
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Porém, é sempre importante apontar, embora muitos presentes não tenham formação técnica, que sensores óticos são extremamente sensíveis. Quem é da área de meteorologia e da área ambiental... No meu caso eu navego nessas duas áreas: a meteorológica e também a ambiental. O que é importante para a área ambiental é a ausência de informação sobre as condições atmosféricas, a ausência de informações, por exemplo, sobre nuvens, aerossóis. Enfim, isso tudo, na área ambiental, deve ser abstraído. No caso do meteorologista, essa é a informação mais importante. Existem nuances meteorológicas e oceanográficas que complicam ainda mais essa questão dos sensores óticos, da mesma forma como ocorre com os sensores ativos, a exemplo do Sentinel 1A. Não vou entrar muito em detalhes. Tendo o Sentinel como referência, olhamos para o Aqua MODIS e para o NOAA-20 VIIRS em busca informações complementares que poderiam nos auxiliar na validação dessas informações.
Um ponto importante: para sensoriamento remoto, é fundamental a validação em superfície. Já estávamos falando, de quarenta e poucos dias após o ocorrido, desse grande derramamento. Para nós da área de sensoriamento remoto e da área de desastres, a resposta mais rápida é a melhor ferramenta. E precisamos validar isso em superfície. Então, ao não termos essas informações, estávamos buscando informações retroativas para que pudéssemos encontrar um padrão que estivesse associado a essa grande mancha ou a outras manchas, embora não tenha sido o nosso primeiro objetivo que foi buscar manchas de navios. Fomos buscar alguma evidência que pudesse jogar luz sobre o derramamento de óleo.
Só para complementar, digo que, nessa primeira varredura que fizemos, do Maranhão até o sul da Bahia, foram necessárias várias horas, vários dias olhando essas imagens, colocando no sistema de integração várias outras informações, como informações sismológicas, informações sobre exploração de petróleo, sobre as dutovias que ligam essa exploração de petróleo, e outras informações, como, por exemplo, a topografia do fundo do mar, porque ela tem um papel importante também na questão de ruídos relacionados com o Sentinel, e também sobre marés e ventos. Enfim, todas estavam dentro de uma mesma plataforma, do mesmo sistema de informação, o Sistema de Informações Geográficas — GIS, que permite analisar esses dados ao mesmo tempo.
Então fizemos toda essa varredura e localizamos a grande mancha no dia 24. Encontramos alguns slicks. Eu não vou entrar muito em detalhes sobre o que são slicks. Eles podem ter origem orgânica ou não orgânica, mas muito deles estão associados com derramamento de óleo ou com óleo vindo do fundo do mar, naturalmente. Encontramos esses slicks no sul da Bahia.
A segunda etapa começou, salvo engano, no início de novembro, quando foi anunciado pela Polícia Federal e pela Marinha que o Bouboulina poderia ser o principal causador, a origem, o suposto, o primeiro suspeito de ter provocado o derramamento de óleo. Quando surgiu a primeira informação, numa sexta-feira à tarde, quando ficamos sabendo oficialmente, veio muito rapidamente à minha cabeça que era a mesma imagem que eu encontrei no Rio Grande do Norte, ou seja, a narrativa agora se complementava com o que estava sendo colocado. Porém, o que fizemos após essas análises foi olhar o nosso sistema, pegar a localização da imagem do Sentinel do dia 24 de julho de 2019, a localização geográfica do ponto...
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Um ponto importante: o Sentinel 1A... Existem o Sentinel 1B e 1C, e existem outros Sentinels, mais especificamente o Sentinel de sensores ativos. Neste caso, o Sentinel também detecta a presença de navios. Existe uma geometria, existe toda uma questão metodológica e de interpretação de imagens do Sentinel sobre as quais eu não vou entrar em detalhes aqui, mas ele localiza a presença de navios e possíveis informações, principalmente ondas de Bragg, tipos de rugosidade da superfície, altimetria da superfície, informações dielétricas da superfície. Isso tudo faz com que uma mancha seja mais clara ou mais branca, em função dessas ondas e micro-ondas na banda C. Eu não vou entrar muito em detalhes, mas foi o suficiente para olharmos a imagem do dia 24 de julho e olhar a passagem do Bouboulina.
De onde vieram essas informações de inteligência de localização de navios? Da Marine Traffic. Tivemos acesso como usuário. Acessamos toda a plataforma, pegamos todos esses dados do Bouboulina e de quatro navios e vimos que o Bouboulina passou 2 dias após a mancha do dia 24 de julho. Então, não havia uma coerência espacial. Havia um pouco de coerência espacial, mas a coerência temporal... Havia uma diferença, um delay de 2 dias. Ou seja, a mancha existia, e 2 dias após passou o Bouboulina.
Todavia, nós nos mantivemos olhando o padrão baseado nesse sistema de inteligência da Traffic Marine, no sentido de ver se havia alguma anomalia. Há informações também que são postas nesse sistema, informações meteorológicas e oceanográficas, sobre ventos. Fomos olhar o comportamento do Bouboulina em relação àquela linha diagonal que sai do Rio Grande do Norte até a África do Sul. Continuamos a olhar, como vocês estão percebendo ali, e não havia nenhuma anomalia em termos de velocidade, em termos de o navio ter parado e outras características que foram levantadas. Então, chegamos à conclusão de que não havia nenhuma relação direta com as manchas que havíamos descoberto, que havíamos colocado com muita luz e que poderiam ser uma parte do quebra-cabeça.
Daí partimos para uma outra etapa, que foi analisar os quatro navios. Da mesma forma, o Maran Libra chegou até a desligar o sistema. Não vou dizer "desligar", não havia informação da localização do Maran Libra. Todavia isso não o qualificava como um dos navios gregos que poderiam ter causado o derramamento. Olhamos todos os quatro navios, com todas as informações, e isso não se evidenciou.
A segunda parte. Depois da eliminação desses quatro navios gregos, começaram a surgir outras perguntas. A imagem do Sentinel detectava a presença de navios próximos da grande mancha que encontramos que não estavam relacionados com os navios gregos tampouco com outros navios. Quando você olhava a Marine Traffic, esse navio não existia, porém, na imagem do Sentinel, detectava-se a presença de um navio. Então havia um navio fantasma para a Marine Traffic. Para a Marine Traffic era um navio fantasma. Não havia informações de localização geográfica. Fizemos uma listagem espacial de possíveis navios naquela região e deduzimos naquele momento que se tratava de um navio que não tinha a localização dentro do sistema internacional, como é exigido por lei.
Então, no dia 19, começamos a fazer uma segunda varredura. Essa varredura se iniciou no mesmo sentido, porém buscando um padrão, uma assinatura espacial que já havíamos detectado na primeira varredura. Fomos mais pinpoint, no sentido mais detalhado, para fazer essa varredura e encontramos a segunda grande mancha localizada na data. A imagem do Sentinel identifica, no dia 19 de julho de 2019, uma mancha de mais ou menos 86 a 50 quilômetros, muito próxima da costa da Paraíba e com uma extensão de 500 metros. Nós ainda estamos analisando essa parte, jogando outras informações técnicas para detalhar, mas foi a nossa segunda grande mancha, num intervalo de 5 dias em relação à primeira mancha do dia 24.
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E, pasmem, encontramos no Sentinel a localização de um ponto brilhante, que, normalmente, é uma possível indicação do navio, e havia outros navios também. Mais uma vez a Marine Traffic o via como um navio fantasma. Não havia essa localização. A localização na imagem é independente do sistema de inteligência da Marine Traffic. Então, não havia essa mesma informação. Dedução para a Marine Traffic: um navio fantasma. Para nós não era um navio fantasma. Nós precisávamos entender que navio passou ali naquela região, que embarcação poderia estar associada a essa passagem.
Nós tínhamos, mais recentemente, essa quebra-cabeça e precisávamos de mais luz no dia 25 de julho, especificamente, porque temos, nos dias 19 de julho e 24 de julho, as duas grandes manchas. A presença dessa grande mancha foi detectada por três satélites, que é a nossa referência do dia 24. E havia um gargalo, os outros satélites óticos, alguns com muito problemas de cobertura de nuvens. Nós recorremos ao CBERS, o satélite sino-brasileiro para exploração terrestre, do INPE, uma parceria entre Brasil e China. O INPE vai lançar agora o CBERS-4. Nós vimos algumas nuances óticas, e isso é sempre muito difícil, porque se trata de interpretação de imagens. O fundo do mar absorve radiação, a reflectância dele é baixa e a emissividade dele vai depender dessas condições oceânicas. E a atmosfera pode muitas vezes provocar ou causar áreas mais secas e dar uma percepção de como se fosse uma mancha de óleo.
Então, nós jogamos luz. Isso aconteceu recentemente, no último final de semana. Nós conseguimos essa imagem com o INPE. Nós processamos essa imagem. Então, nós ainda estamos em processo de avaliação. Mas há um grande sinal ali que pode estar relacionado com a mancha de óleo que estamos analisando. E, para validar isso, nós estamos utilizando a imagem do EUMETSAT de alta resolução, que são imagens de 15 em 15 minutos, num sensor específico que pode jogar luz em termos de derramamento de óleo.
Então, o quebra-cabeça era isso. A primeira mancha do dia 24 de julho foi detectada por três satélites. A extensão dela aumentou utilizando o Aqua MODIS e o NOAA-20 VIIRS, que foi utilizado também como referência, no dia 19 de julho, para que norteássemos quem era esse fantasma do ponto de vista da Marine Traffic. Fizemos um exercício inverso. Nós observamos esses dados retroativamente, selecionamos a costa leste e, no mês de julho, varremos todos os navios cargueiros com óleo cru que a Marine Traffic disponibiliza no seu sistema de vigilância, no sistema de inteligência. Fizemos o mesmo para aquela região ali no dia 24, selecionamos todos os possíveis navios que poderiam ter traficado sem ter nenhuma contestação diplomática, ou seja, o sistema permite o acesso a esses dados, sem que molestemos governos ou outras autoridades. Selecionamos 111 navios com base na região geográfica. Note-se que tinha que ser um navio cargueiro transportando óleo cru e teria que ser no mês de julho, já que a mancha foi registrada no dia 24. Nós precisávamos saber se em algum momento esse navio daria alguma informação, se haveria alguma anomalia que pudesse associar com todos os navios e cargueiros que passaram no mês de julho e que tivessem alguma associação com a mancha do dia 19 e a mancha do dia 24.
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Para simplificar, essas informações estão contidas num dossiê extremamente preciso, nos relatórios bem detalhados. Esse dossiê vai ser entregue à Polícia Federal, à Marinha e a outros órgãos que fazem parte da Comissão de investigação. Não esquecendo que havia outra mancha aqui embaixo na Paraíba, que ligava todo esse quebra-cabeça.
O meu tempo já está se estendendo mais do que deveria.
Nós conseguimos detectar a uma distância de mais ou menos 4 dias, fazendo alguns cálculos aproximados, a localização de um navio suspeito. Ele ligou — e não posso nem usar essa palavra "ligar" — a localização dele e, de repente, apareceu naquele ponto dos 117 navios. Esse navio foi o único que teve uma posição destacada numa determinada localização, depois de um processo de seleção de 117 possíveis navios cargueiros que poderiam ter passado naquela região, indo da costa do Nordeste até o Caribe e um pouco mais ainda próximo à costa leste dos Estados Unidos. Nós identificamos esse navio, fizemos uma pesquisa retroativa para saber qual era o comportamento dele e observamos as curvas em termos de trajetória, ou seja, como ele apresentava isso.
Antes de entrar nisso, vou fazer um resumo aqui. Nós rastreamos 111 navios. Um deles apresentou a evidência de que alguma incidência poderia ter ocorrido durante o seu trajeto. O navio suspeito apresentou uma trajetória muito irregular. Isso está muito bem detalhado no dossiê, com datas e toda a relação de como foi a movimentação desse navio. Esse navio foi o primeiro que o LAPIS apontou após ter refutado as informações do Bouboulina. E isso foi baseado em quê? Não foi em achismo, foi baseado nas evidências das imagens do Sentinel e nas informações de inteligência marinha disponibilizadas pela Marine Traffic.
Esse eslaide mostra a trajetória regular desse navio que a Marine Traffic associou como navio fantasma. Ele fez essa trajetória, normalmente, ao longo desse ano, nos últimos meses, porém ele também fez uma trajetória após o dia 24. Vocês não vão entender isso aqui, porque há muitas informações técnicas. Mas aquele ponto vermelho do lado direito é a localização dele na Índia e depois a localização dele ali próximo a Bahamas. Se estendermos um pouquinho, vemos que ele começa a subir em direção aos Estados Unidos, numa latitude próxima de Connecticut, da Pensilvânia e de Massachusetts, mais ou menos em águas internacionais. Ele vira, vai para a região contornando os Açores, desce em paralelo ao Marrocos, vem para Serra Leoa, desaparece e vai aparecer novamente na Índia. Todos os pontos desse navio estão detalhados.
Esse é o nome do navio. Nós achamos melhor divulgá-lo, apesar de termos que consultar algumas autoridades a respeito, especificamente, do Voyager I. Esse é o navio que nós apontamos como suspeito. Não estamos dizendo que é ele. O LAPIS não tem capacidade, não tem ferramenta criminal para dizer que o Voyager é o culpado.
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Porém, baseados em informações, em evidências de satélites e em informações da Marine Traffic, chegamos a essa conclusão. E, pela primeira vez, pelas evidências das imagens de satélites, vimos que as manchas do dia 19 de julho e do dia 24 de julho se correlacionam em termos de espaço e tempo que o navio normalmente leva, embora por todo tempo o Voyager 1 estivesse com sinal desligado naquela região. Ele era fantasma até naquele ponto, mas, chegando na região das Bahamas, ele já não passava a ser um navio fantasma. E ele passa pela Venezuela. Não sabemos se, nesse trajeto do Voyager, ele foi para a Venezuela. Normalmente, ele vai. Esse é um percurso, normalmente, do Voyager passando pela Venezuela.
Essas são algumas manchas com que contamos com a imprensa para validar. O colega nosso de Sergipe e eu começamos a atuar com a imprensa, muitos acompanhavam os militares e os mutirões. Pedimos que o jornalista nos informasse a localização, que tirasse fotos para que pudéssemos validar com o Sentinel. São pequenas manchas. Isso aí é muito mais difícil, porque o nível de interpretação foi uma equalização da imagem do Sentinel. Isso envolve uma robustez em termos de processamento de imagens e conseguimos detectar pequenas manchas que se aproximavam não só da costa norte e sul de Alagoas, isso identificado pelo Sentinel alguns dias após essas manchas terem chegado.
Esses são os slicks encontrados no sul da Bahia. É sempre complexo falar de slicks porque eles têm vários componentes. Aquela mancha escura ali é uma condição oceanográfica. Os ventos de 2 a 12 metros por segundo são as melhores condições para as ondas de Bragg, que são as condições em que as ondas são menores e maiores, e, com isso, se diferencia a resposta de superfície. Mas se os ventos são muito calmos, abaixo de 2 metros por segundo, eles provocam aquelas manchas que os senhores estão vendo. Ao lado daquelas manchas existem slicks, que são pequenos componentes de hidrocarboneto que estão suspensos na água. Com as correntes oceânicas e com os ventos atmosféricos, eles conseguem fazer tipo uma dança e contornos. Essas imagens também foram comparadas com o ERS-1 e o ERS-2. O ERS-1 é um radar utilizado pela agência europeia e existe o registro desses slicks. Isso foi feito também para que tivéssemos um padrão de localização desses slicks e também de eliminação de sinais no Sentinel, que são provocados pela intensidade do vento, direção e velocidade desses ventos, o que pode provocar um sinal como se fosse uma mancha, quando, de fato, é apenas a intensidade, que é baixa nas zonas de Bragg, ou seja, tem pouca rugosidade e daí o sinal é um sinal escuro, que é diferente da rugosidade provocada pelo óleo ou pelo slick.
Os nossos mares estão seguros? Esta é a pergunta. Em dado momento, nas duas varreduras que foram feitas com as imagens do Sentinel, na primeira houve uma questão geral: qual era a origem desse derramamento? Ainda continua em fase de monitoramento e em fase de validação. Há muitas informações. A segunda etapa era olhar os navios e ver a que ponto esses navios têm colocado pressão na nossa costa, em águas nacionais, e, muitas vezes, em águas internacionais. Está claro que precisamos de um sistema de monitoramento operacional contínuo e sistemático na nossa costa.
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Percebemos isso quando começamos a ver alguns navios, principalmente no Espírito Santo, que estavam completamente dissociados, sem nenhuma conexão com as manchas do Nordeste, porém eram vazamentos ou poluentes de navios que estavam ali na região de exploração de petróleo, ou seja, não só é vazamento, mas há poluentes que também os navios podem liberar, o que pode provocar também a poluição dos mares.
Pergunta-se: nossos mares estão seguros? Consultamos a ANP — Agência Nacional do Petróleo. Já tínhamos experiência com a questão de Brumadinho e com a questão de Pinheiro, em Maceió. Já tínhamos trabalhado com esses postos de exploração. Na ANP havia uma presença muito clara no dia 23, e no dia 28 um plano de contingência da PETROBRAS foi colocado em ação nesse tanque perfurador em que houve uma trinca e um vazamento. Mas houve um plano de contingência da PETROBRAS e tudo isso foi a resolvido em 28 de agosto. Não há nenhuma relação com as nossas manchas, mas isso traz e joga luz em relação à questão de os nossos mares estarem recebendo cargas de poluição.
Eu não vou entrar em detalhes sobre as informações dos slicks de origem natural ou de origem orgânica.
Por último, mostramos aqui novamente a mancha do dia 24 de julho, com a localização dos poços de exploração da PETROBRAS, com os dutos, as dutovias na região do Rio Grande do Norte. Há duas imagens do Sentinel, no meu sistema de informação geográfica, quando conseguimos estabelecer algum padrão e tentar buscar algumas informações auxiliares que complementem e que possam jogar luz, ou, de certa forma, em algum momento refutar algumas questões que são levantadas em termos da imagem de satélite, ou mesmo em relação à parte atmosférica oceânica ou ao ruído gerado pelo navio.
Conclusões: as manchas de óleos detectadas a partir dos satélites próximo ao Rio Grande do Norte e Paraíba indicam que o navio tanque pode ter praticado crime ambiental. Mais uma vez, é uma suspeita. Vazamentos identificados em outras áreas do litoral brasileiro chamam atenção de que o problema pode ser ainda mais complexo do que o atual desastre. Lembro eu, por estar na Região Nordeste do Brasil quando era pequeno, que piche era uma coisa normal. Víamos pequenas quantidade de piche. Eu pisava. Era muito pequena. Não se compara com o que está acontecendo agora, mas já havia registro de pequenas quantidades de piche na praia. Qualquer pessoa que se lembre da sua infância certamente passou por essa experiência.
É necessário estabelecer um programa de monitoramento contínuo para evitar emitir gás, tipo de desastre de vazamento de óleo no mar?
Os resultados dessa pesquisa serão entregues mais uma vez à Polícia Federal. Entregaremos a algumas pessoas-chave, ao Senador Jean Paul Prates, que é o Relator na Comissão do Senado, todo o detalhamento. É um processo que ainda está em andamento. São 15 páginas geradas, com informações detalhadas de como foi feito esse dossiê desde que iniciamos essa pesquisa, utilizando, principalmente, os dados de satélite, mais especificamente as imagens do Sentinel, os dados da inteligência marinha do Marine Traffic, outras informações de dados auxiliares e muito conhecimento. Para transformar dados em informação e dar um pulo para o conhecimento tácito ou explícito, ou trazer isso para a sociedade, há a uma passagem bastante grande que exige conhecimento e interdisciplinaridade.
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Isso é que o laboratório fez. A Universidade Federal de Alagoas participou de todo esse processo. Então, a nossa principal mensagem, que é importante, é que as nossas referências sempre foram duas imagens e foram outros dados auxiliares para que chegássemos a apontar esse navio. Ficamos muito preocupados em anunciar essa informação, porque é uma responsabilidade, e o Laboratório não tem uma missão de investigação. Cabe às autoridades investigar e as nossas informações estão todas disponíveis. Nessa pequena plataforma que está em andamento também vão estar disponíveis as informações para que possam ser utilizadas.
Com isso, deixamos essa pequena participação da Universidade Federal de Alagoas e estabelecemos essa importância, porque o impacto das manchas na Região Nordeste do Brasil tem uma cadeia. Hoje, a principal cadeia afetada são os pescadores artesanais — não que a fauna e a flora não sejam. Mas há uma preocupação. Recebemos, por intermédio do LAPIS, um pedido especial de um usuário: "Vocês podem tentar jogar luz nisso, encontrar uma solução ou, pelo menos, apontar com as imagens de vocês?"
Essa foi outra condição que fez com que avaliássemos independentemente essas imagens. Mais uma vez, elas foram avaliadas de forma independente, com muito cuidado, para que não se colocassem certas autoridades em questionamento. Trata-se de pesquisa, e, pode ser questionada, como tem sido. Assim deve ser. E pode ser em alguns pontos. Estamos tranquilos para falar sobre esses pontos mais específicos.
Agradeço ao Deputado João Daniel pelo espaço e pela oportunidade de estar presente nesta audiência. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (João Daniel. PT - SE) - Muito obrigado, Prof. Humberto Barbosa.
Concedo a palavra ao Sr. Leonardo Barros, Diretor Executivo da Empresa HEX Tecnologias Geoespaciais, pelo tempo de 20 minutos.
O Prof. Humberto excedeu alguns minutos. Portanto, quando completarem os 20 minutos, haverá um sinal, e, caso precise de mais tempo, fique à vontade.
O SR. LEONARDO BARROS - Bom dia a todos. Obrigado pela oportunidade do convite de expor e esclarecer alguns pontos do nosso trabalho realizado.
(Segue-se exibição de imagens.)
Em primeiro lugar, eu gostaria de apresentar rapidamente a nossa empresa, no sentido de demonstrar aos senhores a competência, a expertise que nós temos acumulado ao longo dos últimos anos na matéria de sensoriamento remoto e aqui, no objeto desta audiência, especificamente na detecção e monitoramento de manchas de óleo sobre águas.
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A HEX é uma empresa focada única e exclusivamente na execução de sensoriamento remoto, a partir de dados orbitais. Nesse sentido, nós acumulamos mais de 190, quase 200 milhões de quilômetros quadrados efetivamente monitorados no território nacional, em mar, mais de 100 milhões de quilômetros quadrados acumulados. E, quando eu digo acumulados, eu tenho os atestados emitidos por agências do Governo Federal brasileiro que atestam esses números a que eu estou me referindo aqui neste momento.
Não cabe aqui a explicação, mas o sensoriamento remoto é aplicado a vários temas, como este aqui em questão, como a questão do desmatamento, monitoramento de fronteiras e invasões. A HEX atua em uma série desses temas, notadamente junto a órgãos e a agências do Governo Federal.
Eu trouxe aqui algumas referências por meio das quais objetiva demonstrar aos senhores que a HEX não atuou nesse episódio de uma forma pontual. Na realidade nós já investimos nesse tema há alguns bons anos. Por exemplo, nós temos um artigo científico publicado e aceito na comunidade internacional especificamente sobre detecção de manchas de óleo no mar, a partir de dados do Sentinel. Ao que me consta — e posso corrigir isso —, se nós não fomos a primeira instituição no mundo a publicar um artigo específico de detecção de manchas de óleo no mar, a partir de Sentinel, com certeza fomos um dos primeiros. Esse artigo inclusive foi objeto de destaque num dos maiores congressos de geotecnologias do mundo, que, naquele ano, foi realizado na França, especificamente em Nice.
A partir disso, eu trouxe um atestado emitido pela embaixada britânica no Brasil. A HEX foi contratada por uma agência do governo britânico para conceber e desenvolver um algoritmo, um modelo matemático de processamento de imagens de satélite de radar, especificamente, para detecção de manchas de óleo no mar também. Então, temos essa capacidade.
Por último, não menos importante, eu trouxe aqui, que está em tela, o Atestado de Capacidade Técnica, emitido pelo IBAMA, indicando que a HEX monitora, há mais de 2 anos, uma área de interesse específica, que não é essa do incidente, exatamente buscando detectar manchas de óleo e monitorar a evolução dessas manchas de óleo. Nesse caso, a área de interesse é de quase 1 milhão de quilômetros quadrados, que compreende a Bacia de Campos e a região do pré-sal brasileiro. Então, dessa maneira, o objetivo é nos credenciar para compor esta discussão que está em voga no presente momento.
Outro ponto que eu acho muito importante de ser posicionado aqui, para que fique claro perante todos os senhores, é que a HEX agiu nesse trabalho por conta própria. A HEX entregou os indicativos e resultados, apurados pela empresa, direta e exclusivamente para as autoridades brasileiras. Então, se o sigilo da investigação que está sendo realizado não tivesse sido retirado, na sexta-feira — e me falha a memória agora da data precisa —, provavelmente os senhores não nos conheceriam. E, somente a partir do momento da retirada do sigilo das investigações, o trabalho da HEX, que nós fizemos e entregamos para as autoridades brasileiras, tornou-se público. Eu acho que essa é uma informação importante de ser contextualizada.
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Senhores, eu vou contar com o apoio do nosso gerente de soluções de radar, um profissional altamente especializado na matéria, que é o Alexandre. Mas, antes de passar a palavra para o Alexandre, eu gostaria de saber, Deputado, se eu posso utilizar esse apoio técnico para poder conduzir a apresentação.
Antes de passar a palavra para o Alexandre, eu gostaria de me colocar ao lado do professor da Universidade Federal de Alagoas, primeiro, na questão da aplicação de dados de satélites, da detecção de manchas de óleo e do monitoramento e acompanhamento. Isso é possível, e nós temos uma literatura científica farta nesse sentido. Nós mesmos contribuímos muito para essa literatura científica. Nesse aspecto, eu me posiciono ao lado do nobre professor da Universidade Federal de Alagoas.
Outro aspecto é que a HEX entregou um relatório, e o nosso trabalho cessou. Nós não evoluímos mais em análise posterior à entrega do nosso documento com os indicativos que lá constam. Nesse aspecto, nós não avaliamos outros indicativos gerados por outros meios, por outras instituições, sejam elas brasileiras ou estrangeiras. O que me ocorre aqui é que, sobre a ressalva que o professor fez em relação aos nossos indicativos, ao polígono e à mancha que ele considera que é coincidente, o prisma de comparação do nosso relatório está equivocado. O indicativo da mancha, do polígono e da localização da mancha de óleo não é esse que foi apresentado aqui pela universidade. Isso invalida o indicativo elencado pela Universidade Federal de Alagoas? Não. O que eu estou falando é que os indicativos e o polígono, com os quais uma instituição ou a nossa instituição trabalhou ou trabalha, são diferentes. Uma coisa exclui a outra? Em absoluto. São indicativos, como o nobre professor comentou aqui, que não são conclusivos, nem o nosso trabalho — e repetindo as palavras do professor — nem o trabalho deles.
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Nesse ponto nós também concordamos que são indicativos de polígono, de manchas e de embarcações potencialmente envolvidas que merecem atenção e que suportam linhas de investigação.
Somente essas linhas de investigação que estão sendo conduzidas pelas autoridades brasileiras é que poderão chegar a alguma conclusão. Essa é uma observação que eu faço.
Eu trouxe um detalhamento metodológico que nós utilizamos e vou compartilhá-lo com os membros da Mesa, para que, talvez, fique mais fácil — o objetivo é facilitar — a análise dos nossos indicativos gerados.
De pronto, mais uma vez eu reconheço a autoridade científica do INPE sobre o tema. Para nós seria uma honra — por que não dizer? —, professor, que os senhores verificassem, auditassem e que, eventualmente, pudéssemos até estar trabalhando juntos em outros momentos em que o Brasil precise desse tipo de apoio.
Outro aspecto é que a HEX trabalha hoje com as principais constelações de satélites, tanto com dados gratuitos, como são esses do Sentinel, quanto com dados pagos. Nós somos distribuidores no Brasil da empresa Airbus Defence and Space. Temos uma parceria técnica com outro grande provedor de dados satelitais, que a MaxSAR, empresa norte-americana, além de outros provedores de dados.
Quanto às áreas de interesse que estão sob a nossa responsabilidade, enquanto nós conversamos aqui neste momento, a nossa plataforma está adquirindo dados de forma automática junto a provedores ao redor do mundo. Para os senhores terem ideia, nessa área que nós monitoramos para o IBAMA, a que eu me referi agora há pouco, nós trabalhamos com dados — só para falar de radares, sem falar em dados óticos — do Envisat e Sentinel; do Cosmos, que é italiano; do Radarsat-2, canadense; do TerraSAR-X e TanDEM-X, franco-alemães, da Airbus. Na realidade, trabalhamos sempre convergindo dados de origens distintas com a finalidade de chegarmos às informações que nós objetivamos.
Chamo aqui o Alexandre para continuar conduzindo a apresentação. De antemão, nós nos colocamos à disposição dos senhores para prestar esclarecimentos e dar apoio no que for necessário.
O SR. ALEXANDRE SILVA - Obrigado, Leonardo.
Exmo. Sr. Deputado, ilustres membros da Mesa, senhoras e senhores, agradeço por esta oportunidade de podermos demonstrar um pouco a parte técnica do trabalho que nós realizamos. Espero que os senhores saiam daqui com a mesma impressão que nós tivemos com os indicativos que nós detectamos.
Para iniciar esse trabalho, nós não começamos do zero. Nós partimos da análise de trabalhos executados anteriormente na investigação quanto à origem das manchas.
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Um deles foi o trabalho realizado pela Federação Internacional da Poluição de Proprietários de Tanques — ITOPF. Esse relatório apontou, tendo como base as correntes oceânicas e os ventos oceânicos, as possíveis áreas de origem dessa mancha de óleo que chegou ao litoral.
(Segue-se exibição de imagens.)
Neste eslaide os senhores podem ver que essas possíveis áreas de origem contemplam três regiões com datas distintas. No caso, a área mais ao leste, mais ao norte, seria a possível área do dia 1º de agosto; a mais ao sul, no dia 15; e a mais ao oeste, em 25 de agosto. Tudo isso leva em consideração os modelos de correntes oceânicas e os ventos, de uma forma que eles chegassem ao litoral conforme a distribuição dos pontos que os senhores podem ver nos mapas, pela data que chegaram e da forma que chegaram. Então, essa foi uma engenharia reversa que eles fizeram para determinar aquelas áreas.
Nós utilizamos essa informação para determinar as nossas áreas de interesse para a procura, ou seja, a partir desse momento não procurávamos no oceano inteiro, mas procurávamos segundo dados científicos e segundo áreas específicas.
Também tivemos o conhecimento de outro relatório da agência americana NOAA sobre a análise de imagens do Sentinel-1 e do Sentinel- 2, óptico. Eles analisaram aquela área hachurada em azul e não encontraram indícios de poluição por óleo naquela área em determinado intervalo de tempo. Eles analisaram as áreas, entre o dia 25 de agosto até o dia 7 de outubro, pelo Sentinel-1.
Os senhores podem ver a sobreposição da área do NOAA com as áreas do ITOPF e o caminho que fizemos para determinar o monitoramento. Aqui os senhores podem ver a análise das correntes marítimas naquele período. Essas correntes são do dia 1º de agosto e o caminho que ela poderia ter feito para chegar ao litoral da forma como chegou ao litoral. Com base nisso, determinamos uma quarta área, como o nosso Diretor Executivo, Leonardo, já disse anteriormente. Essa quarta área tem período mais antigo do que o dia 1º de agosto. No caso, fizemos uma procura até o dia 25 de julho e anteriormente. Perfazendo esse caminho, nós chegamos a algumas conclusões. Primeiro, a de disponibilidade de imagens na região.
A partir do momento em que nós nos afastamos geograficamente da costa, a disponibilização de imagens diminui drasticamente. Então, o certo, nós monitoramos perto do litoral e fomos entrando no oceano. A partir daí, os senhores podem acompanhar a disponibilização do tipo de imagem. Então, no Envisat e Sentinel-2 perto da costa; Sentinel-1 próximo à costa, um pouco dentro do oceano; e a partir de que se afasta ocorre uma escassez desse tipo de informação, ou seja, do tipo de adensamento de informações necessário para facilitar as análises e ter essas análises determinantes.
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Passamos, então, para imagens maiores, imagens que têm a parte do nível óptico, a parte do infravermelho, que são a MODIS e a Sentinel-3. Elas têm uma cobertura diária e global com todas essas informações radiométricas. Obviamente, dessas imagens diferentes produtos são derivados, como, por exemplo, a análise de concentração de clorofila, a análise de NDVI para constatar se ali existe alguma formação de origem orgânica ou de origem vegetal. A parte do sensor termal que serve para indicar a temperatura.
Informo aos senhores que todos esses dados foram consultados na nossa análise. A parte da forma, da feição, é uma parte importante na detecção de óleo porque a forma do óleo é muito característica. Existem diversos gabaritos de forma e de cor que aparecem no espectro eletromagnético, na radiometria, na resposta espectral. Existem vários gabaritos, vários estudos feitos em cima da detecção de óleo que nós consultamos para ver se aquelas manchas têm realmente alguma coerência em serem poluições por óleo e seus derivados.
Aqui os senhores podem acompanhar, do canto superior esquerdo para a direita e do canto inferior esquerdo para a direita, a série histórica das detecções. Os senhores podem ver que nas imagens do dia 27 e do dia 28 não existem alterações, não existe nenhuma alteração nas imagens, as imagens estão limpas, e, a partir do momento do dia 29, ela começa a ter aquela alteração com um padrão característico. Então, vamos nos ater a esse padrão característico. Nós tivemos quatro padrões característicos. Elencamos esses padrões característicos e, a partir daquele momento, tivemos quatro detecções. Nós fizemos esse trabalho para correlacionar essas detecções — são detecções isoladas ou são detecções correlacionadas —, e, para isso, nós utilizarmos mais uma vez os modelos de correntes e ventos oceânicos, porque a mancha de óleo se movimenta com a orientação da corrente e do vento oceânico. Esse é um fator fundamental para fazer a correlação entre as manchas e elencar a possibilidade de essa mancha ter chegado ao litoral.
Estes são os resultados dos modelos utilizando correntes geostróficas também, que são as principais componentes das correntes oceânicas. O vento nessa região era predominantemente de 10 a 15 nós, com direção e sentido de leste a oeste. E, como senhores podem ver, o modelo dá uma coerência muito grande com essas feições, inclusive estabelecendo uma correlação entre essas 4 detecções em 4 dias seguidos e também o padrão de chegada na costa, como os senhores podem ver, para o dia 30 de agosto.
É importante lembrar que, na literatura científica, quando nós falamos de imagens no ótico, a análise não é simplesmente feita a olho nu. Então, nós fizemos uma análise espectral de todas as manchas.
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Como os senhores podem ver, naqueles picos ali estão as respostas no visível, que são como o esperado para uma mancha de óleo naquela região. Os senhores podem ver no lado direito a concentração de clorofilana A em miligramas por metros cúbicos dessa mesma feição. E, como os senhores podem notar, a variação é muito pequena.
De acordo com a literatura científica, para se ter uma representação daquela forma de algas, por exemplo, teria que haver uma concentração bem elevada de clorofila A naquela região: no caso de luminescência de fitoplânctons, no mínimo 3 miligramas por metro cúbico; no caso de algas e suspensão de bloom de algas, no mínimo em torno de 10 miligramas por metro cúbicos; no caso do que eles chamam de silk lane, que é material orgânico na superfície, aproximadamente 30 miligramas por metro cúbico. Em todas as feições, aliás, em toda a área, a concentração de clorofila não excedeu 0,2 miligramas por metro cúbico. Então, a variação é muito pequena na região para se ter uma representação de tamanha expressividade.
Em face disso, nós descartamos a possibilidade de ter sido algum fator relacionado a fator biológico ou a fator ambiental. Então, a partir desse momento, nós delimitamos aquela mancha e dissemos que tínhamos indícios — são indícios, obviamente — de contaminação por óleo e derivados naquela região. Com esses indícios, nós delimitamos aquela região e, a partir dessa delimitação, nós consultamos dados AIS.
É importante frisar que temos que ter cuidado com a fonte de dados AIS. A nossa fonte de dados AIS é uma fonte completa. Além de antenas, são utilizados satélites na detecção. Por que eu digo isso? Porque a tecnologia de antenas possui um padrão TDMA de slots. Então, o navio ou a embarcação com AIS ligado necessita alocar um slot para enviar sua posição. O que acontece é que, com a limitação de alguns serviços de AIS e com a concentração de embarcações em uma determinada região, mesmo a embarcação com AIS ligado pode ter perda de informação, dado o congestionamento desses slots. Por isso, é necessário avaliar muito bem a fonte dos dados e, no caso do AIS, utilizar uma fonte bem sólida desses dados. Por exemplo, eu não sei se cabe aqui mencionar isso, mas embarcações que podem ter sido apontadas como dark ships foram documentadas, foram localizadas, estavam com AIS ligado e, portanto, não seriam navios-fantasma. Ao apontar esses dados, como o professor da UFAL disse, existe certa responsabilidade. Se você tem esses dados e consegue fazer o cruzamento, não se pode dizer que o navio seja um dark ship ou um navio-fantasma, até você saber se ele estava ou não com AIS ligado naquele momento ou se ele o desligou de forma proposital.
A maioria dos navios apontados pelo professor da UFAL são também documentados. Nós chegamos a fazer alguns relatórios sobre esses navios e os entregamos à Polícia Federal. O que acontece é que, na região que delimitamos, fizemos o cruzamento com todo tipo de embarcação que ali passou. Não nos limitamos a navios tanques e a navios de origem específica determinada. O navio que apontamos foi o único que passou naquela região. Os demais dados surgiram a partir das informações agregadas naquele serviço disponível.
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Acho que é isso, Leonardo.
Agradeço a todos mais uma vez, Exmo. Sr. Deputado.
Devolvo a palavra ao Leonardo Barros.
O SR. LEONARDO BARROS - Senhores, para encerrar a nossa participação, inclusive corroborando algumas menções do professor da Universidade Federal de Alagoas, quero dizer que a primeira lição aprendida desse episódio, desse incidente, é a necessidade de o Brasil contar com um sistema de monitoramento dos seus mares. Aí tem que ser definido em qual abrangência, em qual tamanho, com qual qualidade, etc. Cabem vários estudos sobre isso, mas é premente essa necessidade.
Outro aspecto é que — este é um entendimento pessoal — todos os indicativos que porventura tenham sido gerados, ou venham a ser gerados, por qualquer instituição, independentemente se pública, privada ou acadêmica, desde que embasados metodologicamente, com evidências explícitas, claras, merecem ser investigados.
Por último, é muito importante essa mobilização da sociedade brasileira, enquanto academia — nós somos uma empresa 100% brasileira —, enquanto iniciativa privada, da própria PETROBRAS, das autoridades do Executivo e do Legislativo, porque estamos mostrando ou tentando mostrar ao mundo que temos capacidade de apurar o que está acontecendo.
Trata-se de um incidente complexo. A questão não é fácil, não é simples. Em determinado momento, eu fui questionado, e acho que o professor vai concordar comigo: "Ah, esse negócio de procurar mancha de óleo no mar é trabalho de estagiário!" Até isso eu ouvi. Nós estamos vendo aqui a complexidade desse assunto. Merecem respeito as equipes técnicas locadas e aqueles inclusive que eu nem conheço, pelo esforço que estão fazendo. Esse é um assunto que realmente precisa ser tratado.
Posso afirmar, sem entrar em detalhes, que a questão de incidentes relacionados a manchas de óleo em mares brasileiros é muito mais corrente e recorrente do que os senhores possam imaginar. Eu digo isso porque nós somos uma empresa que mantém há anos um monitoramento ativo, sistemático, de determinada região do mar brasileiro.
Muito obrigado a todos. Eu me coloco aqui à disposição. (Palmas.)
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O SR. PRESIDENTE (João Daniel. PT - SE) - Muito obrigado, Leonardo Barros, que representou aqui a empresa HEX.
Tem a palavra o Prof. Alberto Wisniewski, do Departamento de Química da Universidade Federal de Sergipe.
O SR. ALBERTO WISNIEWSKI - Bom dia a todos e a todas.
Obrigado, Exmo. Sr. Deputado Federal João Daniel, pelo convite para aqui estar e demonstrar um pouco do trabalho e da participação da universidade pública nesse incidente que acometeu principalmente o Nordeste brasileiro, no sentido de demonstrar, assim como as falas anteriores, a competência de que dispomos no País.
Esse é um caso que naturalmente mexeu com várias instituições. Várias pessoas se predispuseram a ajudar, a própria comunidade naturalmente se envolveu com isso, e o nosso Grupo de Pesquisa em Petróleo e Energia da Biomassa da Universidade Federal de Sergipe não pôde ficar de fora. Logo que esse óleo chegou até a costa sergipana, entramos em contato com o IBAMA, inicialmente, para que pudéssemos contribuir, de certa forma, com a competência que nos cabe.
Inicialmente, a proposta da nossa participação foi a seguinte: tínhamos que responder se esse óleo que estava chegando à costa sergipana tinha alguma relação com as 19 ou 21 plataformas que operam naquela região, naturalmente para que se pudesse fazer um combate inicial a esse evento. Depois, a segunda resposta que nos predispusemos a fornecer era se todo o óleo que estava chegando à costa sergipana tinha apenas uma origem ou diferentes origens. Por fim, havia o caso, que está divulgado na mídia, do aparecimento de alguns tambores de óleo, a princípio, no litoral sergipano e, mais recentemente, no litoral do Rio Grande do Norte. Começamos o trabalho tentando responder a essas três perguntas inicialmente ao IBAMA, porque é o órgão de que nos aproximamos para que pudéssemos ter acesso às amostras de óleo, amostras de material, já que eles estavam fazendo o trabalho de coleta.
(Segue-se exibição de imagens.)
Não vou ficar explicando toda a parte química do processo, mas vou apresentar esse material — até peço desculpa por passar alguns eslaides de forma mais rápida — para dar uma ideia a toda a sociedade do que muito se falou, do DNA do petróleo. Usamos o DNA, uma estrutura de proteína, para identificar cada um de nós e pequenas diferenças entre nós; o petróleo segue essa mesma linha, então podemos usá-lo. Estou usando esse jargão do DNA do petróleo porque ele foi muito batido e muito divulgado nesse tempo.
O que seria isso? O petróleo carrega dentro dele uma porção de compostos. Estamos falando de uma porção de compostos. O petróleo hoje, posso afirmar aos senhores, tem mais de 40 mil compostos na sua composição química. Ele é um produto com muitos compostos dentro, o que dificulta naturalmente a análise, mas também facilita. Considerando que o petróleo tem uma origem orgânica de 140 milhões de anos e que ele veio do aporte de matéria orgânica, ou seja, foi uma quantidade de matéria orgânica que deu origem a esse petróleo, ele carrega dentro dele uma composição química.
11:38
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Aqui embaixo os senhores e senhoras podem verificar um gráfico cheio de sinais. Nesse gráfico cheio de sinais, cada sinal desses é um componente dentro do petróleo. Dentro desse perfil, podemos começar a diferenciar óleos. Aqui os senhores podem verificar que temos quatro óleos diferentes, olhando simplesmente esse perfil. Isso é um fingerprint, é uma impressão digital. Assim como cada um de nós tem na identidade uma impressão digital, o óleo segue essa característica, e usamos esse perfil como uma impressão digital para o identificarmos.
O que acontece? Inicialmente começamos a tentar responder às perguntas que surgiram. Aqui há duas imagens: uma do barril, do tambor que apareceu na praia de Pirambu e a outra do que apareceu lá na Coroa do Meio, em Aracaju, aonde foi a maior quantidade de óleo junto que chegou à costa. Começamos a trabalhar nesse perfil. Inicialmente verificamos que eles não têm correlação. Eles têm uma diferença entre os sinais que os senhores observam ali. Isso, a princípio, poderia remeter-nos a dois incidentes, o que traria um problema um pouco maior. Se um incidente está difícil de resolver, imaginem dois. Também não pode aportar no litoral barris contendo óleos. Então teríamos que tratar isso como dois incidentes.
O que acontece é que temos um problema, porque esse óleo, quando cai no ambiente, pode sofrer biodegradações naturais. Aqueles compostos que observamos ali na coluna do meio, aqueles sinais, podem ser decompostos no próprio meio ambiente. Os microrganismos conseguem digerir. Inclusive, isso é um dos tratamentos que se utiliza quando há acidentes envolvendo óleo em alto mar: se coloca uma quantidade de microrganismos em cima desse óleo, e eles vão comer esse óleo e vão digerir.
Ocorre que existem algumas espécies que chamamos de biomarcadores: aquelas moléculas que estão ali do lado. Por mais que eu tenha um óleo de características diferentes, se nós olharmos aqui do lado direito, nós observamos que, através de uma análise muito específica, eu consigo identificar todos esses biomarcadores, em intensidades que me propiciem dizer se um óleo é parecido com o outro. Eu pego esse perfil da direita e consigo comparar aqueles sinais, que são de biomarcadores, entre os três, ver se eles se equiparam, ou seja, o óleo tem que ter os mesmos biomarcadores e nas mesmas intensidades.
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É muito natural que todo óleo tenha os mesmos biomarcadores, mas eles mudam as intensidades. E se ele muda a intensidade, eu já posso dizer que não há correlação. Agora, se eu consigo pegar essas intensidades, eles têm os mesmos compostos e as mesmas intensidades, eu posso dizer que são óleos parentes, são óleos que tiveram uma associação na sua origem.
Aqui é só para demonstrar aos senhores e às senhoras que ali em cima temos um óleo fresco e, embaixo, temos um óleo que esteve em contato com o mar. O que que acontece? Os hidrocarbonetos, que são os menos tóxicos, são digeridos. Mas esses biomarcadores, independentemente de os óleos estarem em contato com o mar ou não, continuam intactos. Então, temos que pegar esse óleo todo e buscar pinçar essas moléculas, para podermos utilizá-las como referência para fazer a identificação da origem do óleo.
Este trabalho não é nosso, mas o usamos para resolver essa questão, porque emitimos um resultado que confrontou um laudo inicial que a Marinha havia divulgado. A Marinha inicialmente havia divulgado que o óleo do tambor não era o mesmo e não tinha relação com o óleo da praia. Efetivamente, usando as técnicas convencionais e padrões utilizadas por vários laboratórios no mundo, realmente podemos dizer que não, mas existia esse trabalho na literatura, que é bem recente, de 2017, que sugere utilizarmos uma técnica um pouco mais apurada e não tão convencional pelos laboratórios.
Seguindo a lógica desse trabalho que já está consolidado na literatura, ele mostra aqui — se vocês observarem, ali no cantinho está MRM e, embaixo, SIM — é o mesmo óleo, só que, embaixo, foi analisado pela técnica convencional e, em cima, pela técnica um pouco mais avançada, mais recente.
Então, observamos que, pela técnica convencional, embaixo, há menos sinais e, às vezes, sinais com menos intensidade, o que dificulta compararmos esses óleos, essa impressão digital. Então nós optamos em trabalhar pelo método lá de cima, pelo método MRM, que é um método que traz um pouco mais de seletividade, ou seja, eu consigo olhar muito mais a fundo nesse DNA do petróleo.
O que aconteceu? Este aqui é o resultado que a Marinha conseguiu e que nós conseguimos, utilizando o método tradicional para comparar o ponto 4 e o ponto 1. O ponto 4 é o tambor, e o ponto 1 é o óleo da praia. Eu consigo olhar e verificar que realmente há diferença. Então, eu poderia afirmar que são óleos que não têm relação, são diferentes. Mas eu não posso desconsiderar esse óleo, porque não sabemos quanto tempo ele está no mar, não sabemos o quanto ele já foi impactado por esse processo. Então, nós pegamos essa região que está ali no final, que é a região mais nebulosa, mas que é a região que deve ser utilizada para se fazer a identificação de petróleo, separamos, e a trabalhamos com uma técnica mais apurada para fazer essa identificação. Quando fizemos isso, inicialmente comparamos o óleo da praia com os óleos que são produzidos em Sergipe.
Aqui eu trouxe três exemplos apenas. Então, vocês conseguem observar que, para uma classe de biomarcador, lá em cima, aquele óleo da praia não apresenta o mesmo perfil que os óleos produzidos em Sergipe.
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Então, eu consigo ver que a impressão digital dele não tem relação com os óleos produzidos naquela região. E usamos este processo aqui para uma classe de biomarcadores. Na química forense investigativa e geoquímica orgânica, a gente não se baseia apenas em uma evidência. Vai-se criando mais evidências. Então, fomos repetindo essa análise para diversos outros biomarcadores, mostrando que o óleo que estava na praia não tinha relação com os óleos produzidos em Sergipe.
Este aqui, como eu falei, há várias comparações para eliminarmos. Então, entramos na comparação do óleo que estava na praia com os dos tambores e por que eu estou batendo nessa tecla do tambor, gente? Porque, novamente, se os tambores chegaram à praia coincidentemente na mesma época em que o óleo e são diferentes, há dois eventos. Agora, se eles chegaram na mesma época à praia e eles têm uma correlação, esses tambores trouxeram algumas informações que poderiam ajudar na investigação, porque esses tambores tinham escritas à mão, esses tambores tinham datas de fabricação, apesar de o tambor não conter o produto original dentro, porque esses tambores são da empresa Shell de lubrificantes, eles não contêm lubrificantes dentro, não contêm o produto inicial, mas eles têm etiqueta, eles têm lote de fabricação, eles têm data de fabricação, então consegue-se associar e ter indícios de que navio pode ter carregado esse tipo de produto.
E aí, quando usamos esse tipo de análise mais específica, observando que o ponto 1, que é o óleo da praia, e o ponto 4, que é o óleo do tambor, começamos a olhar aqui que eles possuem exatamente as mesmas moléculas, os mesmos biomarcadores e nas mesmas intensidades, então, eu posso dizer que esse aqui de baixo tem parentesco com o que está na praia, e aí voltamos a ter apenas um evento, ou seja, o evento que liberou aquele óleo que chegou à costa foi o mesmo evento em que esses tambores vieram a acometer o litoral, novamente para ajudar na investigação, uma vez que eles tinham dados que poderiam ser utilizados e que eventualmente foram utilizados pela Polícia Federal e pela agência de investigação.
Então, as respostas que nós trouxemos com esse trabalho até o momento são: o óleo não é das plataformas e não tem as características dos óleos produzidos no Estado de Sergipe. Esses óleos na costa toda eram um óleo só, ou seja, mesmo com aspectos diferentes, eles eram óleos que eram de uma fonte só. E aqui respondemos, junto com essa análise e com outros biomarcadores, que eles são parentes, ou seja, o conteúdo dos tambores é de um óleo que tem aspecto diferente, ele é um óleo mais fluido, ele é um óleo diferente, mas ele é parente do óleo que está na praia, porque ele pode ter sido uma limpeza de convés, ele pode ter sido uma limpeza de um duto, de uma tubulação, que foi utilizado e foi acondicionado nesses tambores. Essa é uma prática bastante comum. Mas, quando se olha o aspecto só, eu falaria que é diferente. Quando eu olho o perfil usando as técnicas convencionais, eu diria que são diferentes. Mas quando analisamos à nível molecular, conseguimos então dizer que não, que esses óleos são parecidos, porque, se eles fossem diferentes, isso aqui não ia ter semelhança, eles iam ser muito distintos, como eu mostrei para os óleos que foram analisados referentes a Sergipe.
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Fizemos dezenas de pesquisas, por isso que, inclusive, nós demoramos a soltar resultados. Nós levamos duas semanas trabalhando nesse evento, e não soltamos nenhuma informação enquanto nós não tivéssemos total certeza e vários pontos de indícios que levassem a essa conclusão. Então, fizemos várias comparações. Depois partimos para outras substâncias, que são características também, que não são comumente usadas, outras moléculas. E essas moléculas, só para vocês terem uma ideia, elas estão no petróleo desde quando ele foi produzido, é uma molécula que nasceu com o petróleo há 140 milhões de anos e ela vem intacta até os dias de hoje dentro do petróleo. Então, conseguimos pincelar essas moléculas para as utilizarmos como referência de comparação.
Este aqui, por exemplo, é o trabalho que se utiliza para tentar se desvendar a origem desse óleo, se veio de país A, se veio do campo B, se veio do lugar C. É exatamente esse processo que se utiliza. O problema é que se dificulta um pouco, porque não há, exatamente, comercialmente, um óleo sendo vendido quase sempre na forma não misturada. Então, a partir do momento em que se mistura, pode haver algumas divergências desse tipo de análise que é feita.
Enfim aqui estão todas as comparações possíveis. Aqui é um ponto crucial que eu acho interessante, porque o óleo é pesado. Sabe-se que o óleo é pesado pela sua densidade, ou seja, ele tem uma densidade próxima à densidade da água. E isso tem dificultado um pouco os trabalhos de detecção, porque, como a densidade dele é muito próxima a da água, ele fica subindo e descendo. Quando o óleo é leve, a densidade dele é menor. Então, ele sobe e fica na superfície. Quando a densidade é muito próxima a da densidade da água, ele tem esse aspecto de ficar submergindo e subindo. Há essa característica do perfil do óleo de ele ser um óleo pesado. Principalmente aqui na composição elementar, vocês observam ali o percentual S, que é o percentual de enxofre desses óleos, tanto no óleo do tambor, quanto no óleo das praias. Eles apresentam percentuais muito próximos. Dentro da área de produção de petróleo, são percentuais muito próximos. E esse percentual ajuda, porque pode-se dizer em que campo do planeta é produzido esse óleo, porque ele tem um grau API pesado, com teor de enxofre 1.7. Com essas informações, consegue-se fazer uma peneira e direcionar que tipo de campo de petróleo no planeta pode produzido esse tipo de óleo. Então, consegue-se afunilar para menos de meia dúzia de campos que podem produzir esse tipo de óleo.
Ali em cima estão as relações que corroboram que o óleo da praia e o óleo do tambor são óleos, porque os índices são muito parecidos. Esses índices utilizam aquelas análises que mostrei na transparência anterior. Não satisfeitos, aplicamos técnicas mais avançadas ainda. Cada pontinho desses indica um composto do petróleo. E a cor destaca a concentração. Então, usamos essa técnica justamente para comparar o óleo achado na praia e o óleo do tambor, para mostrar, também, segundo essa técnica — que é mais recente, mais avançada —, que o óleo do tambor e o da praia são os mesmos.
11:54
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Novamente, aqui demonstramos que nos tambores há informações que podem ajudar a identificar a origem. E houve tambores que não tinham óleo. E uma notificação revelou que havia outro tipo de material dentro, tecidos ou restos de material utilizado dentro de embarcações, o que pode nos levar a outro tipo de informação. Eu não tenho exatamente a informação sobre o que estava lá dentro, porque esse tambor não chegou até nós com esse tipo de material. Mas a minha provocação é nesse sentido.
As conclusões eu já apresentei. Hoje, pela manhã, por não estar satisfeito — eu, enquanto líder do Grupo de Pesquisa em Petróleo e Energia da Biomassa na Universidade de Sergipe —, convidei uma colega para trabalhar nesse projeto. E essa pesquisa está sendo feito por livre e espontânea vontade. Nós nos candidatamos e entramos. Não fomos notificados para participar.
Esta é a minha provocação à Presidência da Mesa — e para demonstrar também para a comunidade que está aqui —, que são os ensaios ecotoxicológicos, que não estão sendo efetivamente aplicados nesse estudo.
Essa colega, Profa. Jamile, que é da área de Ecotoxicologia, foi por mim convidada para que nos ajudasse, aplicando os parâmetros da Resolução CONAMA nº 357, que traz parâmetros que determinam a qualidade da água, tanto de rio quanto de mar, aplicando a ABNT de 2007, que usa microcrustáceos para verificar a toxicidade.
O que quer dizer isso? Como está na foto, pegamos microcrustáceos, que são parentes distantes do camarão, mas são espécies com certa correlação, com tamanho entre 2 e 3 milímetros — são, portanto, muito pequenos.
Utilizamos esse método: deixamos a água em contato com o óleo; colocamos uma quantidade desses microcrustáceos e, depois de 96 horas, contamos quantos deles sobreviveram. A ideia é que o ambiente que não tenha toxicidade permita que 100% dos microcrustáceos sobrevivam.
Nesse caso, os resultados parciais indicaram que 17% dos animais morreram quando adicionamos 6% do óleo que estava no tambor. Então, quando colocamos 6% do óleo do tambor em contato com a água do mar, 17% dos animais morreram.
Usamos o óleo do tambor nesse experimento porque ele era mais fácil de ser dissolvido. Então, a maior toxicidade seria, efetivamente, dele. Mas a gente fez também outra comparação. Essa parte de baixo aqui que é a mais interessa. No dia 31 de outubro foi coletada água em duas regiões de Sergipe, duas praias, e foi feito o teste diretamente na água do mar. E, quando feito esse teste, observou-se uma mortalidade de 52% e 48%, respectivamente. Ou seja, são índices bastante altos que não são vistos porque o óleo já foi retirado. Mas isso está impactando naturalmente a cadeia de alimentação, porque são microcrustáceos que, naturalmente, são alimentos para outros peixes e outros tipos da fauna marinha.
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Eu queria agradecer, novamente, pelo convite ao Exmo. Sr. João Daniel. E gostaria de dizer que todo esse trabalho foi feito voluntariamente dentro da universidade pública pela equipe de alunos que trabalha comigo na graduação e na pós-graduação em Química da Universidade Federal de Sergipe. E agradeço à Prof. Jamile pela colaboração, que era nossa colega e que hoje está em outra universidade.
Eu ainda gostaria de deixar aqui algumas provocações, rapidamente, já que meu tempo se esgotou.
Esse evento tem consequências danosas que, efetivamente, não conseguiremos sanar, porque já aconteceu. Mas quero deixar uma provocação, porque precisamos aprender com esse processo, precisamos entender que o Estado deve estar fortalecido nesse sentido de poder trabalhar, ter acesso a informações e ter suporte para desenvolver atividades.
Hoje, a grande dificuldade do meu trabalho, por exemplo, nessa área de identificação de óleo decorre do fato de que toda a informação sobre óleos no Brasil depende da iniciativa privada. Não existe um órgão de Estado com domínio dessa informação. Toda informação se origina de uma empresa. E tudo o que ela disser nós vamos ter que entender que é verdade.
Então, fica essa provocação aqui: precisamos ter a instalação — e pode ser dentro de um órgão já existe, a exemplo da ANP, do Ministério do Meio Ambiente ou em outro lugar — de um órgão constituído com competências para que possamos ter respostas do Estado em relação a isso, e não efetivamente dependermos somente de informações que venham de fora, que nos impossibilitem de apurar sua veracidade.
Então, agradeço novamente e me coloco à disposição para esclarecimentos.
Obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (João Daniel. PT - SE) - Muito obrigado, Prof. Alberto.
Vamos ouvir o último expositor. Antes, quero registrar a presença do nosso amigo, Claudio Fontineles, Diretor da Indústria Urbana do Piauí.
Após a exposição do nosso amigo, o pesquisador Paulo Nobre, as pessoas que quiserem fazer alguma pergunta ou intervenção poderão se inscrever e terão 3 minutos.
O Manoel está à disposição para inscrever os interessados. Quem quiser pode passar o nome completo ao Manoel, porque vamos franquear a palavra a todos, tranquilamente.
12:02
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Então, passaremos a palavra — e queremos agradecer, de antemão, pela presença — ao Paulo Nobre, pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, pelo tempo de 20 minutos. Caso V.Sa. Precise de mais tempo, fique à vontade.
Muito obrigado.
Concedo a palavra ao Paulo Nobre.
O SR. PAULO NOBRE - Deputado João Daniel, muito obrigado pelo convite. O INPE sente-se honrado em estar nesta Comissão e poder contribuir com essa questão crucial.
Eu vou me desviar um pouco da questão investigativa e me deter sobre o que falou o nosso primeiro palestrante, Gilvan dos Santos, ou seja, a responsabilidade quanto ao óleo que já chegou e, também, a resposta às perguntas que, acho, são as mais palpitantes: qual a quantidade de óleo que ainda vai chegar e onde ele chegará? Como vamos fazer para evitar o dano e não apenas recolher o óleo que já chegou? Nós temos uma capacidade preditiva no Brasil, de detecção e previsão?
Se houver mais óleo, primeiro, devemos saber a quantidade e se ele vai chegar à costa brasileira e em qual praia.
Portanto, peço licença a V.Exa. para apresentar algumas imagens.
(Segue-se exibição de imagens.)
Qual é a resposta do Estado brasileiro a essa grande crise? O que estamos experimentando é algo com que não estamos habituados. É como se fosse uma agressão à Nação. Mas não se trata de agressão militar ou assemelhada, trata-se de uma quantidade enorme de óleo que está chegando às nossas praias, fato que se configura como um dos maiores desastres ecológicos já registrados desse tipo.
Então, para uma agressão dessa dimensão, qual é o ferramental de que dispomos hoje? O que, no caso, o gabinete de crise montado pelo Ministério da Defesa fez foi convocar a comunidade científica em caráter emergencial. Reuniram-se vários pesquisadores e montou-se essa estrutura de coordenação científica, para prover ao Estado brasileiro, ao nosso Ministério da Defesa, informações que nos permitam atuar sobre o óleo que ainda não chegou. Essa é a nossa grande pergunta.
A investigação policial está em curso, ela vai acontecer, etc. Mas isso não é o que realmente conta para o pescador lá na praia. O que importa para ele é o que vai dizer a comunidade científica organizada em torno desses grupos de trabalho.
Eu coordeno o primeiro deles, o GT-1, que foi o primeiro grupo formado, que trabalha na parte de detecção, monitoramento e previsão.
Então, temos hoje 100 pesquisadores do Brasil inteiro oferecendo-se gratuitamente, sem serem pagos por isso, além dos próprios salários, para responder essas questões. Eu não vou tratar agora dos outros grupos porque há uma questão adiante que trará essa resposta.
12:06
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Terminamos ontem a primeira oficina de estudo de monitoramento e modelagem que fizemos lá no INPE de São José dos Campos. Houve 25 pessoas presentes e outras 20 pessoas participando remotamente, que não tiveram, à queima-roupa, condições de se deslocar para lá.
Estas são as universidades, os institutos de pesquisa e empresas que estiveram presentes. Nós tivemos uma discussão riquíssima, e eu posso já lhes adiantar qual foi o resultado do nosso workshop: saber que nós temos uma estratégia, que não estamos perdidos. Agora, vai ser fruto da estratégia a resposta sobre quantidade, local, mecanismos, ferramentas, satélites, modelos, dados in situ. Eu posso dizer que nós já estamos vencedores, do ponto de vista da Nação, ao, por conta da resposta imediata da comunidade ao chamado do, no caso, comitê de crise, sediado no Ministério da Defesa, poder trazer uma resposta.
Esta é a missão desse grupo: elencar e desenvolver as metodologias para calcular a dimensão do ataque, a dimensão do problema. O que chegou às nossas praias é uma golfada de óleo e agora nós devemos trabalhar arduamente, por décadas, talvez, para limpá-la ou esse é só o começo, a ponta do iceberg de uma quantidade não conhecida de óleo que está circulando no oceano de várias formas, no fundo, próximo à praia, em suspensão, preso na circulação? Qual é o tamanho do problema? Então, esta é a missão do grupo, que está assim articulado.
As nossas metas são pontuais e numéricas. Quanto óleo ainda atingirá o nosso litoral? Então, nós não estamos olhando para o retrovisor, estamos olhando para frente e temos que saber se nós conseguimos responder esta questão.
Eu fiquei muito contente de escutar o colega de Sergipe falar sobre a questão da datação química. Ela é um dos elementos que nos ajudarão a responder isto: quando, onde e quanto. Eu sou meteorologista, trabalho no CPTEC — Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos do INPE, e estas são as perguntas que fazemos diariamente para prever chuva e temperatura: onde choveu, onde vai chover e qual vai ser a temperatura? Também é preciso saber por quanto tempo, qual é o tamanho do fôlego, do esforço que nós temos que empreender. Isso vai galvanizar os recursos humanos, materiais e tecnológicos necessários para nós enfrentarmos esse desafio que afeta diretamente a vida das pessoas, com as suas decorrências para a saúde e tudo o mais.
Os nossos objetivos são detalhadamente estabelecermos uma sistemática de monitoramento para a determinação de alerta; desenharmos uma suíte de modelos com que possamos prever, se houver óleo, onde esse óleo vai nos alcançar; e identificar metodologias que possam nos prevenir de futuras ameaças. Então, nós temos que aprender com a desgraça, com a crise, para que, se acontecer uma próxima vez, nós possamos responder num tempo muito inferior ao tempo de resposta de agora.
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Vejam, senhores: isto daqui é uma figura de monitoramento de circulação oceânica. Há um vórtice aqui embaixo, outro ao norte de Ilhéus, um a leste de Salvador, outro vórtice permanente ali na costa mais ao norte. Como o óleo chega através das correntes, primeiro, nós temos que ter a capacidade de prever as correntes.
Qual foi a ação imediata do Governo ao gabinete de crise? Quando lá reunidos, nós dissemos: "Almirante, nós precisamos saber se os nossos modelos estão prevendo essa circulação corretamente, porque, se a previsão for ruim, nós não vamos saber aonde vai chegar o óleo". A resposta imediata da Marinha, senhores e senhoras, foi colocar em ação a nossa mais sofisticada embarcação, a mais sofisticada embarcação do Atlântico Sul, talvez, do Hemisfério Sul, o Navio de Pesquisa Hidroceanográfico Vital de Oliveira, que está agora amostrando o sistema de correntes e não só ele. O Vital de Oliveira, que é como chamamos intimamente o navio, tem um scanner sônico lateral que nos permite — essa é a única ferramenta que faz isso — detectar a presença de óleo em forma de emulsão no oceano, o que nenhum satélite enxerga. O óleo que está submerso é invisível para os olhos de um satélite, razão pela qual as nossas análises todas feitas no INPE com imagens de satélite pretéritas indicaram nenhum óleo. Então, o fato de que nós temos um instrumental com que podemos ir aos locais de maior probabilidade de presença do óleo e medir isso diretamente é uma vantagem enorme, o que leva a ter a esperança de podermos prever o futuro. No entanto, para isso não basta modelo.
Um modelo de difusão de óleo se baseia nas seguintes premissas: conhecer o campo de correntes, conhecer o campo de ondas, conhecer o campo de marés — isso tudo nós aproximadamente conhecemos —, mas também conhecer a fonte do derrame, a quantidade de óleo e o tipo de óleo, o que nós desconhecemos. Então, nós estamos tentando prevenir a chegada de algo que não sabemos onde surgiu, em que quantidade, se é episódico, se continua vazando.
Diante disso, nós usamos uma técnica conhecida chamada lagrangiana reversa. O que nós sabemos? Chegou óleo às praias, com data e local. Então, nós pegamos os pontos, colocamos traçadores de flutuabilidade igual a da água neles, damos marcha ré nas correntes e perguntamos assim: "Esse óleo pode ter vindo do Atlântico Norte? Ele pode ter vindo do Atlântico Sul?" A resposta é essa simples ferramenta de investigação diz que o óleo tem que ter vindo, para alcançar do Maranhão ao Espírito Santo, por meio da Corrente Sul Equatorial. Ele tem que ter entrado na bifurcação — naturalmente essa é uma hipótese. Ou vários navios podem ter jogado o óleo, em vários locais, combinadamente, de modo que ele chegasse como chegou. Isso não está descartado. Através dessa metodologia, nós conseguimos encontrar uma região, se houver, onde a concentração, andando para trás dos pontos, é máxima.
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Então, se houve um vazamento, em algum lugar, as partículas que passaram por essa região trazem um DNA, trazem uma impressão digital. É como numa cidade, onde há um lugar em que oferecem uma comida meio estragada. Várias pessoas passam por lá e comem. Depois, cada uma delas vai para um canto até que chega ao hospital, e o médico pergunta: "O senhor comeu alguma coisa no lugar tal?" Com o número daqueles que comeram e tiverem aquele problema, o médico consegue traçar de volta o ponto comum. O ponto comum é a quantidade de óleo, é a existência do óleo.
Então, nós temos técnicas de como encontrar... Isso se traçarmos o deslocamento para trás, no tempo. Qual é a região, se existe uma, na qual havia uma concentração máxima desses pontos? É uma pesquisa em curso. Por quê? Nós queremos saber qual foi o navio? Não, nós queremos saber se há uma possibilidade física de esse óleo ter sido derramado, porque, se o óleo foi derramado — eu posso lhes dizer isso com toda tranquilidade —, na corrente Norte Equatorial, ali em Fortaleza, na Costa Norte, ele não chega a Salvador, porque as correntes não permitem. Assim também seria se ele fosse derramado em frente a Salvador. Ele não chegaria ao Maranhão.
A segunda questão — a questão premente — é aonde esse óleo vai chegar. Como é que fazemos essa previsão? Nós vamos trazer algumas hipóteses de fonte, usar os modelos de circulação. Nós ainda não estamos nesse ponto. Não sabemos ainda nem quando, nem onde, nem quanto óleo foi derramado.
Nós estamos utilizando — isso foi fruto do nosso workshop de ontem — modelos que respondem à circulação. Aquilo ali seria uma animação, mas ela está bem devagar. Os senhores vão precisar acreditar em mim. Se ficarem um tempo suficiente aqui, vão ver que aquele giro ali é um vórtice. Naquela escala ali, de 100 metros de resolução do modelo, com 1 metro de lâmina d'água ou menos, nós conseguimos ver o efeito da maré, o horário que o influxo da circulação é para a praia ou da praia para o oceano.
A nossa estratégia para responder a essas questões é utilizar o conjunto de conhecimento científico disponível, as técnicas e os modelos. E, agora, nesse estágio, nós não estamos nos fiando muito em sensoriamento remoto. Por quê? Porque nós temos visto que o óleo está vindo ou superficialmente ou, como o colega mencionou... Imaginem que é um óleo de flutuabilidade quase igual a da água, e, à noite, quando esfria um pouquinho, ele fica flutuante, ele sobe. Durante o dia, aquece a camada superficial, e ele afunda.
Então, quando os nossos satélites, no óptico, no visível, fazem o imageamento, eles não veem nada, porque, em geral, no óptico não enxergamos à noite. Enxergamos pouco à noite, enxergamos com radar. Esse óleo pode estar brincadeira de esconde-esconde conosco, de modo que as nossas técnicas não o encontrem. E, se for essa a hipótese, nós vamos encontrar características distintas do avanço desse óleo. Então, o que nós precisamos fazer em seguida? Nós temos uma comunidade científica extraordinária. Há conhecimento e tecnologias no Brasil. Nós estamos prontos? A resposta é sim e não. E estou trazendo isso, Deputado, porque é importante que o Legislativo saiba que o Brasil tem capacidade de fazer isso, mas requer investimento. Nós temos que estar em estado de alerta.
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Eu trouxe dois exemplos: um deles é o conjunto de softwares desenvolvidos lá na Observação da Terra, lá no INPE, onde nós integramos uma variedade enorme de informações locais de vários canais, de todos os satélites, com dados e previsões de navios, aviões. A ideia é que, utilizando o software TerraMa, que é desenvolvido no INPI, nós consigamos acompanhar o trajeto de cada navio e simular qual seria a mancha do óleo que se geraria se aquele navio pudesse soltar água no mar.
Então é uma ferramenta extraordinária, desenvolvida e disponibilizada aqui. Ela requer, contudo, que nós tenhamos algumas novas antenas instaladas, etc., o que nós vamos informar ao Comitê de Crise.
Como exemplo, eu lhes mostro a figura do próximo eslaide. Olhem a figura à esquerda. A figura à esquerda seria a cobertura dos satélites — são vários —, o Sentinel, e os nossos satélites, o CBERS, com antenas colocadas em Cuiabá, Cachoeira Paulista e Natal. Nós fazemos todo esse margeamento. Toda aquela região em azul é a região que nós conseguimos monitorar com dados recebidos no Brasil, integrados naquele software que eu mostrei há pouco. Com a antena que possivelmente virá a ser construída nas Canárias, nós teremos, praticamente, uma cobertura extraordinária em tempo quase real. Além disso, nós dirigimos e determinamos as cenas de coberturas do CBERS, que é um satélite construído, como mencionado anteriormente, pelo INPE, em parceria entre Brasil e China. Então nós podemos fazer coletas específicas de regiões de interesse, porque é nosso satélite.
Isso já existe. Praticamente, há um pequeno investimento, para nós termos a gestão do que está acontecendo. A próxima coisa é a previsão. Saber que há uma coisa no mar é bom. É necessária a detecção. Para prever, é preciso de modelos e de supercomputação.
Então, os modelos existem. Ali está uma figura da evolução da supercomputação no INPI. A linha reta mostra como é mundialmente, e a outra linha mostra como nós estamos. Nós estamos 10 anos, Deputado, atrasados. É necessário um upgrade, uma renovação do nosso sistema de supercomputação.
Neste momento, é necessário um investimento concentrado na capacidade de monitoramento por satélites, navios. Eu não mencionei drones. Isso tudo está num relatório técnico que nós vamos encaminhar ao Ministério da Defesa. É um conjunto, um aparato observacional do sistema terra, dos oceanos e da atmosfera e um aparato de modelagem com o qual nós podemos responder ao pescador: vai chegar óleo amanhã na sua praia. Os senhores imaginam o que isso significa? Isso realmente justifica nós termos a comunidade científica que temos. Trata-se de colocar a nata do conhecimento à disposição do Estado brasileiro para gerar informações que são relevantes para as pessoas que moram onde moram. Este é o meu último eslaide. Eu não tenho conclusões. Vim fazendo isto aqui para cá, de ontem para hoje, para ter a oportunidade de dizer que nós estamos diante de um momento de união nacional. Alguns dos senhores assistiram ao jogo do Brasil e Itália em 1970 — poucos aqui —, que foi um grande momento de júbilo. Pois é o momento de nós fazermos essa união agora. E estamos fazendo isso na comunidade científica, em coordenação com a força-tarefa do Ministério da Defesa, na qual o estão envolvidos o Ministério da Ciência e Tecnologia, o Ministério do Meio Ambiente, a Agência Nacional do Petróleo, para darmos uma resposta à sociedade do que podemos e devemos fazer.
12:22
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Coloco-me à disposição para as perguntas que os senhores e as senhoras possam ter.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (João Daniel. PT - SE) - Muito obrigado, Paulo Nobre, pela sua exposição.
Queremos registrar a presença aqui do Sr. Guilherme Mateus, do Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias Urbanas no Estado de Pernambuco, do Sr. Hermes Costa, Professor da Universidade Federal de Pernambuco, e do Sindicato dos Urbanitários de Pernambuco — SINDURB-PE.
Agora nós vamos abrir para intervenções. Em seguida, faremos uma rodada da Mesa.
Eu queria que os expositores da Mesa pudessem anotar as perguntas. Em seguida, após as intervenções do Plenário, poderão dar as respostas. Depois faremos as considerações finais.
Estão inscritas oito pessoas. Vou iniciar pelo Sr. Raimundo Siri, que é de Cova da Onça, no litoral baixo-sul da Bahia, do Movimento dos Pescadores e Pescadoras Artesanais.
Muito obrigado pela presença. (Pausa.)
Ele saiu? (Pausa.)
Quem estiver à frente do microfone aqui no plenário, na hora de falar, pode ligá-lo e se identificar. Isso tudo está sendo gravado e vai ficar documentado.
Muito obrigado.
Tem a palavra o Sr. Raimundo.
O SR. RAIMUNDO SIRI - Boa tarde a todos e a todas. Meu nome é Raimundo Siri mesmo. Sou pescador artesanal da comunidade de Cova da Onça, no baixo-sul da Bahia.
Ao longo das apresentações aqui, eu ouvi muitas palavras técnicas. A gente fica meio sem saber, sem entender direito essas palavras. Mas, ao mesmo tempo, fazemos um esforço e conseguimos capturar algumas.
12:26
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Eu senti falta, na verdade, nesta plenária da presença de uma universidade especializada na questão da saúde. Mas fui contemplado com a fala do companheiro que, ao final, falou algo em relação à questão tóxica desse produto que está chegando às praias.
Eu ouvi a conversa de um pescador da minha comunidade esta semana, um senhor de muita idade, que falou uma coisa simples: "Siri, eu gostaria que esse óleo chegasse pelo ar, porque aí contaminaria todo mundo, ninguém escaparia".
O primeiro palestrante — se não me engano, foi o companheiro lá de Sergipe — falou sobre uma coisa muito interessante sobre os pescadores. Se bem entendi, ele falou que os pescadores estão em segundo lugar entre os impactados, ou algo nesse sentido.
O impacto vem pela natureza. E as pessoas comentam o tempo todo que o impacto desse petróleo, que não é óleo, vem para contaminar a natureza. A natureza somos nós, pescadores, que a preservamos. E os primeiros corpos a serem expostos a essa catástrofe, a esse crime ambiental, são os dos pescadores. Em nenhum momento vemos instituições ou organizações falando dessas ações feitas pelos pescadores.
E esses impactos, na verdade, que são um crime, paralisaram nossas vidas. Foi dito aqui muito bem que, além de não conseguirmos pescar, também não conseguimos vender o que já pescamos. E as contas não param. A barriga também não espera — não só a nossa, mas a de nossos filhos e nossos netos também. E não vemos uma única organização governamental preocupada com os pescadores.
E fui a uma reunião do primeiro comando, da qual se falou aqui, lá na Bahia. Criaram uma comissão ou comitê de comando. Lá não existiu a pauta social sobre os pescadores. Eles só falavam sobre impacto ambiental, mas não falavam da gente. E aí eu pergunto aos senhores, Deputados, o que esta Casa e essas organizações estão pensando para o pescador artesanal, uma vez que estamos impossibilitados de viver?
Já esgotou o meu tempo, mas quero dizer que sabemos que, seja via navio, seja via vazamento, todos os caminhos levam ao cometimento de um crime. Isso é fato. Agora, a primeira pessoa a ser, de certa forma, prejudicada é o pescador.
Eu gostaria de saber o que esta Casa e as instituições e empresas estão pensando e peço que incluam o pescador nessas falas daqui para frente.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (João Daniel. PT - SE) - Muito obrigado, Raimundo Siri.
Concedo a palavra ao Sr. Antônio Severo, de Parnaíba, Piauí, representante do Movimento de Pescadores e Pescadoras Artesanais.
Muito obrigado, Antônio, pela presença.
O SR. ANTÔNIO SEVERO DO NASCIMENTO - Eu sou Antônio Severo do Nascimento, nascido na Praia da Pedra do Sal, onde esse desastre já chegou também.
12:30
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O que nós, todos os pescadores, pensamos é que estamos pescando, e não tem quem compre nosso peixe.
Estamos atravessando a fase mais difícil das nossas vidas. E, com isso, como o companheiro já falou, o que vamos fazer? Todo mundo aqui fala bonito. Eu quero que vocês me desculpem, mas desde os 8 anos de idade trabalho na pesca, sou pescador e nunca fui à escola. Mas estamos atravessando essa fase muito difícil, e todos os pescadores ficam perguntando uns aos outros: "O que vamos fazer, pois não tem quem compre nosso pescado e nós vivemos da pesca?"
Então, em razão de um desastre desse, o que todos os pescadores e todas as famílias de pescadores — e não falo apenas da minha praia, mas de norte a sul do País — podem fazer? O que vocês, autoridades, vão fazer por nós, pescadores? É isso o que estamos precisando ouvir.
Queremos que alguém vá para a televisão e diga à Nação que o peixe não está afetado pelo óleo e que a população pode comprar o peixe e comê-lo tranquilamente, sem problema. Caso isso não aconteça, como nós, pescadores e famílias de pescadores — como eu e outros Brasil afora somos —, vamos ficar? E digo isso porque não só os pescadores, mas famílias inteiras de pescadores também são afetadas.
Obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (João Daniel. PT - SE) - Obrigado, Antônio Severo, piauiense.
Concedo a palavra à Nildes Oliveira, do Recôncavo Baiano, representante do Movimento de Pescadores e Pescadoras Artesanais.
A SRA. NILDES OLIVEIRA - Boa tarde a todas e a todos.
Eu queria saber qual é o controle que vão fazer para esse óleo não chegar à Baía de Todos os Santos, para não acabar com os nossos manguezais?
Os nossos pescadores estão sofrendo brutalmente, com suas contas acumuladas e tudo o mais. Há lugares que não foram afetados diretamente, mas indiretamente. Então, não estamos vendendo nosso pescado, não estamos pagando nossa luz. Crianças não estão indo ao colégio porque o pai não tem dinheiro para comprar o pão. Elas tinham o marisco, mas como vão comer o marisco agora, se não têm o arroz e o feijão? Então, pedimos uma solução para os nossos manguezais.
O pessoal do Recôncavo, os pescadores, estão sofrendo, porque vocês não têm uma solução. Estamos muito preocupados com nossos pescadores. Não há como continuarmos ouvindo vocês dizerem que vão resolver — e não resolvem. E digo isso porque passamos pelo Seguro Defeso, em razão da desova do camarão; depois veio todo o impacto desse óleo. Então, não tivemos o direito de pescar, porque tivemos a desova do camarão e, agora, o óleo. Vejam que já se vão 4 meses sem pesca, e ninguém dá uma solução para isso.
Obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (João Daniel. PT - SE) - Obrigado, Nildes Oliveira.
Concedo a palavra à Camila Batista, do Conselho Pastoral de Pescadores — Regional, Ceará.
12:34
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A SRA. CAMILA BATISTA - Boa tarde a todas e todos! A partir das explanações anteriores, o entendimento que tive é o de que estamos caminhando para um colapso ambiental. E, quando se entra num processo de colapso ambiental, que é o que nos aponta, entra-se num colapso também da humanidade, sobretudo dentro das comunidades tradicionais pesqueiras, que são as mais impactadas pela incidência do óleo nas praias.
Já me sinto muito contemplada, inclusive com o que o Siri trouxe, com relação à necessidade de realizarmos uma discussão também no âmbito da saúde. Precisamos envolver o Ministério da Saúde, as entidades de pesquisa em saúde, para fazermos o levantamento dos agravos à saúde dos pescadores e pescadoras ambientais e das pessoas em geral, pois precisamos considerar essa dimensão do cuidado com a vida das pessoas. Para mim, esta é uma sugestão: esta Casa acolher nesses grupos de trabalho, os GTs, as entidades de pesquisa à saúde e ouvir também os profissionais que se dedicam a esse processo de pesquisa.
Alguém falou mais cedo sobre vigilância ambiental, processo esse que precisamos fortalecer, assim como devemos materializar os pescadores e pescadores para que eles também realizem uma vigilância popular em saúde e ambiental, pois, a partir dessa questão dos componentes químicos contidos no petróleo, precisamos saber quais desses componentes ficam na água. Não se trata apenas de retirar o óleo e o petróleo que chegam nas praias, mas também de saber o que fica de resíduo de componentes a partir da passagem desse petróleo. Então, precisamos aprofundar os estudos com relação à vigilância ambiental e à vigilância em saúde. Temos que envolver os CERESTs e os órgãos que realizam esses tipos de vigilância.
Por último, há ainda o impacto econômico que precisa ser considerado, além do impacto à saúde e ao ambiente. Os pescadores já nos trouxeram suas queixas: estão sem conseguir vender o peixe, por conta da insegurança alimentar. As pessoas têm essa insegurança, pois não sabem se podem consumir o peixe. Então, precisamos urgentemente da pesquisa em cima dos pescados das marés e dos estuários. As pescadoras são as maiores impactadas pelo problema, porque elas é que fazem a pesca das marés e dos estuários. E, repito, nós precisamos fazer com urgência o estudo do pescado, para que a população tenha a segurança de consumir ou não o pescado. Temos de pensar também emergencialmente nas alternativas econômicas para os pescadores, enquanto se dá esse estudo, pois entendo que envolve coisas de curto, de médio e de longo prazo. Temos que considerar toda esta dimensão da vida dos pescadores: econômica, ambiental e da saúde. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (João Daniel. PT - SE) - Obrigado, Camila.
Com a palavra o Lailson, do Movimento dos Pescadores de Pernambuco.
O SR. LAILSON - Boa tarde a todos! Sou Lailson, moro no Cabo de Santo Agostinho, em Pernambuco, e sou do MPP.
12:38
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Foi dito aqui que essas manchas foram detectadas no dia 24 de julho. No entanto, o Governo só implantou o plano de crise 40 dias depois. Vejam como são as coisas! Já começa por aí: 40 dias depois! Outra coisa, esse petróleo — e foi dito aqui, mas não deu para captar — veio só de um navio? Quantas toneladas foram retiradas de petróleo? Será que esse navio comportava tudo isso, um só navio? Isso não ficou muito bem claro na minha mente.
Eu queria saber também sobre a área da saúde, porque eu fui um dos que teve contato com o óleo. Numa área de 200 metros, captamos 450 toneladas de óleo em Xaréu e Itapuama. Não vi ninguém falar aqui de Pernambuco, mas eu digo que foram mais de 1.400 no total em Pernambuco, e eu fui um deles. Estou preocupado com isso.
Lá, estamos preocupados com a situação financeira de todos. O nosso seguro da lagosta do ano passado ainda não saiu; eu fui um dos que não o tirou ainda, que isso fique bem claro. E o deste ano, o Governo disse que ia antecipar, mas até agora nada. Esse é o descaso, infelizmente, do Governo em relação a nós.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (João Daniel. PT - SE) - Obrigado, Lailson.
Com a palavra o Claudio Fontineles, do Piauí.
O SR. CLAUDIO FONTINELES - Boa tarde a todas e a todos! Quero cumprimentar a Mesa, em nome do nosso Presidente João Daniel, nesta audiência.
Sou Claudio Fontineles, sou funcionário da empresa de saneamento do Estado do Piauí AGESPISA e também um dos Diretores do Sindicato dos Urbanitários, que representa mais de 4.500 trabalhadores do Estado.
Algumas observações foram feitas em relação às explanações, e o último que se manifestou, de Pernambuco, foi muito objetivo. Realmente fica uma pergunta no ar. Nós temos uma área litorânea de aproximadamente 7.500 quilômetros. Só no Nordeste, são cerca de 3.400 quilômetros. Esse óleo apareceu basicamente em todos os litorais dos Estados nordestinos e agora está se estendendo um pouco mais para a Região Sudeste.
Você tem aí uma avaliação científica de estudos que foram colocados por vários institutos e órgãos, e ela se concentrou em navio, ou em alguns poucos navios, em suspeitas fantasmas, etc., alguns registrados e identificados. E ele fez uma pergunta muito contundente: para um litoral tão extenso e uma quantidade de óleo tão expressiva que surgiu, a ponto de se recolher não sei quantas toneladas de óleo em poucos quilômetros de área...
12:42
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Então, fica a pergunta: Um único navio tem essa capacidade? Tecnicamente eu não sei. Eu não me aprofundei nesses estudos. Há a questão da reparação dos danos ambientais. Como vão ficar nossas riquezas marítimas, nossos corais, nossa biodiversidade? Há também a situação dos pescadores, que estão aqui em peso colocando suas dificuldades. São muitas as perguntas.
Resumindo, o que podemos observar é que realmente o Governo que está à frente do nosso País está agindo com absoluto descaso no tocante a esse desastre ambiental que ocorreu no nosso País. Só após 30 dias ele veio a se manifestar oficialmente em relação a esse prejuízo gigante que a nossa natureza está sofrendo. Portanto, é nesse sentido que faço essa pergunta.
Há a necessidade de se investir em tecnologia, que sempre foi muito necessária. O que nós estamos vendo no dia a dia é que, a cada dia que passa, o Governo prioriza grandes grupos empresariais multinacionais e penaliza o nosso País, através de cortes, cortes, cortes e mais cortes, e a população de menor poder aquisitivo sofre a cada dia. Esse desastre ambiental é apenas mais um dos vários desastres que vão ocorrer, e nós sabemos que a inércia do Governo vai permanecer.
Então, a pergunta que fica para os nossos expositores, em relação a essa quantidade gigantesca de óleo que chegou às nossas praias, é se um, dois, três ou cinco navios têm realmente a capacidade de causar todo esse dano, considerando que esse desastre vai ficar na história como o maior desastre ambiental ocorrido no mundo em relação a esse tema.
Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (João Daniel. PT - SE) - Obrigado, Claudio.
Tem a palavra o Sr. Hermes Costa, de Pernambuco.
O SR. HERMES COSTA - Boa tarde a todos e a todas. Boa tarde, Deputado João Daniel.
Nós estivemos aqui ontem à noite, fazendo exposições, apresentações. Eu sou recifense, sou engenheiro da Companhia Pernambucana de Saneamento e também sou professor da Universidade de Pernambuco. Eu estou aqui representando em torno de 20 mil trabalhadoras e trabalhadores, pelo Sindicato dos Urbanitários de Pernambuco.
Eu sou daquele típico recifense que frequenta realmente a praia. Eu vou à praia nos finais de semana e tenho observando, ao longo desses últimos 4 meses, o impacto real que está acontecendo para a economia dos trabalhadores e trabalhadoras que vivenciam arrecadando seu pão do dia a dia com o comércio local nas praias.
Os pescadores estão sofrendo, os marisqueiros estão sofrendo. Os catadores de caranguejo, os que atuam no setor hoteleiro, em restaurantes grandes e pequenos, os que têm barracas, os diversos atores dessa área, todo o mundo está parado. É impressionante a crise econômica que está acontecendo no litoral pernambucano. Esse é um fato que não conseguimos esconder. Além disso, estamos observando também a destruição dos arrecifes.
Então, a vida marinha realmente está sofrendo com isso. Há inúmeros estudos, e isso eu posso dizer com tranquilidade porque eu estou dentro da universidade, conversando com os colegas que estão atuando no comitê de crise no Estado, conversando com os representantes do Governo Estadual. São assustadores os resultados que estão vindo.
12:46
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O que vemos do Governo Federal? Qual é a ação efetiva disso? Algumas semanas atrás, tivemos uma fala técnica impressionante do Secretário da Pesca, numa live junto com Bolsonaro. Foi uma coisa linda quando ele falou: "Gente, não se preocupe, o peixe é um bicho inteligente. Quando ele vê o óleo, ele foge". Rapaz, eu me emocionei com aquela fala.
Peço desculpas ao companheiro que representa o INPE. Inclusive eu já tive a oportunidade de passar algumas semanas no INPE. Eu estudei no ITA e tive algumas oportunidades de ver a capacidade técnica que vocês têm. Deixa-me muito feliz saber que vocês também estão participando disso. É um pouco de reforço, porque algo de bom pode vir daí.
Já se passaram 4 meses e o Presidente Jair Bolsonaro ainda não fez uma visita ao Nordeste para tratar desse assunto. Não houve uma visita. Ele não fez uma fala de solidariedade aos trabalhadores e trabalhadoras que sofrem dia a dia. Será que ele vai continuar com essa picuinha de debate ideológico porque o Nordeste não garantiu votos para a eleição dele? Será que ele vai esquecer que existem centenas, milhares de famílias que estão sofrendo dia a dia a falta de cuidado do Governo Federal?
É dentro dessa realidade que eu acredito que seria muito interessante que vocês que estão aqui em Brasília fizessem uma visita para conversar com o pescador, com o catador de caranguejo; para pegar no óleo; para sentir o cheiro dele; para saber o impacto daquilo; para perceber a importância de uma ação efetiva. Essa fala bonita que acontece, como a que ouvimos do Secretário, ou essa fala técnica dos representantes — que é importante, do meu ponto de vista —, em nada traz ganhos efetivos para nós. Não existe uma política publicitária falando que o turista pode frequentar as praias do Nordeste; não foi apresentado nenhum estudo efetivo para mostrar o impacto que isso traz para os alimentos, para a vida marinha, para o peixe que é coletado na praia. Não tem nada mostrando isso. O que existe é um temor, é uma crise efetiva de preocupação. Eu que sou recifense, que tenho acesso ao caranguejo, eu não sei o impacto disso. Será que eu vou comer e vou passar mal? Será que meus filhos vão comer e vão passar mal? Isso traz uma preocupação grande. Se isso continuar dessa forma, vamos matar as famílias e os trabalhadores que vivem desse negócio. Então, nós esperamos isso.
A pergunta que eu faço aos apresentantes do Legislativo e aos representantes do Governo Federal é a seguinte: quando vamos ter uma ação de verdade para mudarmos esse cenário?
Era isso aí.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (João Daniel. PT - SE) - Obrigado, Sr. Hermes Costa.
Tem a palavra o Sr. Sílvio Sá, de Sergipe.
O SR. SÍLVIO SÁ - Boa tarde a todos e todas.
Eu sou técnico em química da Companhia de Saneamento de Sergipe — DESO e estou aqui na condição de Diretor-Presidente do sindicato dos trabalhadores do setor de saneamento e irrigação do meu Estado. Eu sou amante da pesca esportiva. Eu tive o prazer e a felicidade de aprender com meu pai, na infância, a pescar siri e caranguejo artesanalmente, e eu sei do sacrifício e do valor de todos vocês aqui presentes.
12:50
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O meu Estado Sergipe é o Estado brasileiro com o segundo menor litoral; só ganhamos do Estado do Piauí. Quando surgiu esse desastre ambiental, fiz uma análise. Por conta de a nossa costa litorânea ser uma plataforma marítima rasa, não temos aqueles paredões rochosos que existem em outros Estados nordestinos, denominados arrecifes. E o que eu imaginei? Mesmo essa mancha de óleo chegando ao nosso litoral, eu sei que o trabalho de remoção é diário e muito oneroso. Não imaginamos e não mensuramos o quanto esse impacto se deu nos paredões de recifes de corais, em que ficam impregnadas essas manchas — e no nosso litoral são removíveis. Por outro lado, as nossas cinco bacias hidrográficas recebem influências do mar, são desembocadoras estuarinas. Então, o manguezal, que é o maior berçário da fauna marinha, tem altos e baixos nas variantes de marés. Então, esse impacto do óleo chega às raízes da vegetação típica do mangue, que vai afetar o aratu, o siri, o caranguejo. Estamos vendo o impacto socieconômico junto às marisqueiras, aos pescadores, aos comerciantes, além do turismo também em nosso Estado.
Quando surgiu essa problemática — eu sou da companhia de saneamento —, veio a preocupação também com a questão de abastecimento. E no nosso Estado cidades e povoados litorâneos são abastecidos por poços artesianos, com água com características ferruginosas e calcárias. A única cidade, Brejo Grande, que fica próxima à Foz do São Francisco e nos trouxe preocupação fica a 12 quilômetros. E veio também um trabalho bacana, da CHESF, que aumentou a vazão das comportas do Rio São Francisco, em Xingó, que estava na média de 800 metros cúbicos por segundo — hoje está em torno de 1.200, 1.300 diária — para haver um anteparo, uma barragem da influência do avanço do Oceano Atlântico na Foz do Rio São Francisco.
Por último, eu gostaria de dizer... Os dois últimos antecessores falaram muito em volume. Eu ouvi, se não me falhe a memória, no programa A Voz do Brasil, que esse volume derramado em todo o litoral corresponde a 2% do volume, da capacidade de um navio. Eu fiquei abismado. Eu não sei se esse dado realmente procede. Queria saber se tem algum relato de manchas, alguma coisa, do lado oposto, na costa africana, porque sabemos que Nigéria e Angola são países produtores de petróleo. Será que chegaram alguns resquícios do lado de lá também por conta dessa navegabilidade?
Eu digo a todo mundo que nós estamos real e literalmente à deriva, a ver navios.
Obrigado por tudo. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (João Daniel. PT - SE) - Muito bem, Sílvio Sá.
Está com a palavra a Roseli, consultora da Câmara.
A SRA. ROSELI SENNA GANEM - Bom dia. Eu queria perguntar para todos os membros da Mesa, porque um dos objetivos desta Comissão é fazer propostas legislativas: que diretrizes específicas podemos colocar para fortalecer a gestão de desastres no Brasil, especificamente para derramamento de óleo, em relação ao monitoramento da costa brasileira? O que poderíamos inserir na legislação com esse objetivo de instituir um sistema e dar algumas diretrizes para ele?
12:54
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Pergunto ao Paulo Nobre: em que data específica o Ministério da Defesa acionou o INPE e essa coordenação científica?
Pergunto ao Alberto: é possível realmente saber de onde vem o óleo, de qual campo? Ele não é produzido em Sergipe, mas vem de onde, afinal? Dá para saber de qual país ele vem? Eu acho que é isso?
O SR. PRESIDENTE (João Daniel. PT - SE) - Tem a palavra Manoel Magalhães.
O SR. MANOEL MAGALHÃES - Quero agradecer também a este evento, mas a grande questão que se coloca hoje é com relação ao que o Governo Federal, que chegou tão atrasado, ao que parece, em conduzir o PNC, que é o plano de contingência. Inclusive, é um plano de contingência específico para o óleo. Não se trata de nenhum plano de contingência aberto, é um plano de contingência específico para o óleo. Nesse caso, vemos em Sergipe... O Dr. Gilvan afirmou que grande parte das ações que estão acontecendo no Estado não tem a participação da União. A União, por meio do IBAMA ou alguma coisa, está contribuindo, mas não tem uma atividade, diria, concatenada com as ações dos órgãos. Parece-me que o PNC continua sendo uma peça de ficção para esse Governo.
Qual é a saída? Porque temos entidades aqui que deveriam estar ligadas, fazendo um coletivo de trabalho junto a esse PNC — e todas elas deveriam estar presentes nele. Qual é a saída que temos para fazer com que no futuro essa coisa não venha a se repetir? É essa a questão com a qual mais estamos preocupados.
O SR. PRESIDENTE (João Daniel. PT - SE) - Muito obrigado, Manoel.
Passamos então a palavra para a Mesa.
Respondendo a uma das perguntas sobre a Comissão. A Comissão fez uma diligência em Pernambuco. E nessa ida tivemos oportunidade de fazer uma visita e nos reunir em Cabo de Santo Agostinho. Eu não sei se o Lailson estava lá no dia em que foram a Comissão do Senado e a da Câmara ao Cabo de Santo Agostinho.
O SR. LAILSON - Não estava não.
O SR. PRESIDENTE (João Daniel. PT - SE) - Não! Tivemos oportunidade de ir à Praia de Itapuama. Ouvimos entidades não governamentais e pescadores. Temos uma diligência na Bahia. E nós gostaríamos de pedir a todos que aqui estão que, se puderem e tiverem interesse, deixem o contato, porque na ida aos Estados, caso haja diligência e visita, em todos eles queremos ir aonde estão pescadores e marisqueiros.
Esta Comissão aqui... Infelizmente, esta audiência com a presença de vocês... Seria muito importante se nós tivéssemos os contatos e contássemos com a presença de vocês, porque que nós ouvimos aqui representantes de cinco Ministérios, que representavam o Governo Federal, há 15 dias. Nós temos um relatório com todas as informações faladas por cada Ministério, o da Agricultura, o da Defesa, o da Saúde.
12:58
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Eu queria agradecer a todos que fizeram intervenções. Há mais uma inscrita para fazer intervenção. Eu gostaria que a companheira que se inscreveu fizesse a sua intervenção agora. Logo em seguida, passaremos a palavra à Mesa para fazermos as considerações finais.
Companheira, eu não sei o nome de todo mundo. Você pode se apresentar. Fique à vontade!
A SRA. ANDREIA ROCHA - Obrigada, mas eu queria dizer que são duas as que querem falar. Na verdade, estávamos procurando a pessoa que estava fazendo a inscrição e a visualizamos agora. Falaríamos eu e a D. Dalva.
O SR. PRESIDENTE (João Daniel. PT - SE) - Podem ficar à vontade você e a D. Dalva.
A SRA. ANDREIA ROCHA - Eu sou Andreia Rocha, do Conselho Pastoral dos Pescadores. Eu me inscrevi para fazer duas perguntas à Mesa e trazer uma questão para ilustrar a situação dos pescadores, porque estamos na base com os pescadores. Nós vimos informações das possibilidades de onde tem vindo esse petróleo, da origem disso. Quais são as medidas de contenção? Como os institutos estão pensando isso e de que forma eles podem ajudar?
Uma coisa que também vimos nos veículos de imprensa há algumas semanas foi a possibilidade de esse petróleo não ter surgido de um navio, mas de uma fenda em uma mina de petróleo brasileira, do pré-sal. Eu queria que vocês dessem informações a respeito disso. O foco aqui foi investigar os navios, pois algum poderia ter derramado o petróleo. Mas o que vocês têm a dizer sobre essa outra possibilidade?
Vou falar com relação à situação das comunidades pesqueiras. Eu sou do Recôncavo, de comunidade pesqueira também. A situação já estava difícil para as comunidades, mas agora está muito agravada. Queria falar sobre a categoria pescador artesanal. No início do ano, quando se abriu a primeira etapa do defeso, um vídeo do Presidente da República ameaçava os pescadores, chamando os pescadores artesanais de mentirosos. Isso foi uma forma muito mesquinha. Dizia que 65% dos trabalhadores da pesca eram falsos e que iriam fazer um pente fino. Depois disso, o seguro defeso, que os pescadores já estavam sem acessar, aumentou. Além disso, 85% das mulheres não estão recebendo o Bolsa Família. Com essa situação do derramamento do petróleo, isso se agravou: as pessoas estão sem receber esse auxílio importante para a renda e estão sem poder vender o pescado porque algumas regiões estão sem poder consumir. É importante trazer a questão desse impacto social.
Isso é urgente. Temos feito muita luta e muita mobilização, mas o Governo não está entendendo a urgência. A urgência das pessoas é se alimentar. Queríamos trazer isso para ilustrar essa situação, que é gravíssima e para a qual pedimos providências.
13:02
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Estamos aqui. Outros estão aqui na Casa. Amanhã haverá várias audiências. Queremos sair daqui de Brasília com uma solução urgente. Os pescadores não têm uma renda extra, não têm de onde tirar neste momento. Eles pescam numa semana para ter o que comer na outra, pescam num dia para ter o que comer no outro dia. Se eles não têm tudo isso, eu queria que vocês tivessem a sensibilidade de perceber essa questão e contribuir. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (João Daniel. PT - SE) - Muito obrigado.
A outra companheira — não me veio aqui o nome dela — pode dizer seu nome e fazer sua apresentação.
A SRA. DALVA - Boa tarde, senhoras e senhores.
Meu nome é Dalva.
Como já foi dito aqui, eu estou preocupada com os pescadores porque nós não temos uma resposta. Vejo os companheiros falando que já cortaram água, já cortaram luz. O Natal está chegando, e eles não sabem como vão sobreviver.
Eu gostaria de levar uma resposta. Nós temos que ter essa resposta, porque disseram que isso vinha de navio, e eu tenho para mim que não vem de um navio só. De quantos navios vem? Só vai parar quando sujar a Baía de Todos os Santos? Está chegando perto.
Obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (João Daniel. PT - SE) - Muito obrigado, companheira.
Agora nós passaremos a palavra aos membros da Mesa.
Pelo tempo de 3 minutos — se precisar de mais, pode ampliar —, tem a palavra o Gilvan.
O SR. GILVAN DIAS DOS SANTOS - Dentro das perguntas trazidas, eu acredito que há maior convergência para todas aquelas que dizem respeito exatamente ao defeso ou coisa nessa linha.
O Estado de Sergipe tem sido um Estado modelo porque exatamente de lá partiram ações para outros Estados, como Bahia, Pernambuco e a própria Alagoas. Do ponto de vista do decreto de situação de emergência, o que nós estamos fazendo lá, inclusive com o apoio direto do Ministério Público Federal?
O Presidente da República sinalizou uma possível medida provisória que venha a contemplar todos os pescadores e marisqueiros. Mas aí surgiu uma dúvida, já que nem todos estão escritos. Parece-me que de 2014 para cá há um déficit de atualização desses dados. É preciso que pelo menos os Municípios que foram afetados... Não precisam correr, não precisam decretar agora situação de emergência para isso, mas é preciso que os órgãos ambientais, seja em nível estadual, seja em nível federal, possam reconhecer áreas que foram afetadas de forma direta ou indireta. E é isso o que nós estamos fazendo em Sergipe.
Eu já falei aqui, respondendo à pergunta do Raimundo Siri, mas talvez tenha ficado pouco entendível. Quando nós falamos que primeiramente foram afetadas as praias, nós nos referimos ao momento de chegada do fato. Não dissemos que a praia seria mais importante do que os pescadores. Queríamos dizer que o fato gerador de início foi o que chegou nas praias. E aí, foi num segundo momento que se constatou que chegou também nos estuários, nos rios, mas essa é uma discussão mais recente por conta da cronologia desse crime ambiental.
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O que o Estado de Sergipe está fazendo pode ser encaminhado a outros Estados, Deputado. Os Estados devem reconhecer os Municípios que foram afetados de forma direta ou indireta. A fiscalização é feita diariamente, com a produção de relatórios em que consta se há presença dessa substância nos rios. Isso é considerado como afetando o Município de forma direta. Considera-se que o afeta de forma indireta, como os senhores aqui já falaram, quando há a bravura de vocês irem pescar sem ter retorno da pescaria e da venda, porque há um temor muito grande, há uma confusão de informações, seja das áreas técnicas, seja dos outros envolvidos, o que deixa a população refém dessa situação. Eu acredito que este seja o caminho: os Estados podem reconhecer que seus Municípios foram afetados, e eles estarão, com certeza, sendo abrangidos pela medida provisória, que o Governo Federal diz que vai fazer.
Quero responder à uma pergunta de Roseli sobre o que pode ser inserido para um momento como esse. Acho que se deve cumprir aquilo que já está pactuado. Existe o Plano Nacional de Contingência. O que a PETROBRAS e os atores que podem começar isso estão alegando? Alegam que o plano é para um tipo de óleo, não é para esse outro tipo de óleo. Uma discussão surgiu, e nós que andamos, que percorremos... Aqueles que estão nas discussões do tema estão andando de um lado a outro. Desde o dia 24 de setembro, eu passeio em casa e vivo nas praias, vivo correndo para tentar dar minha maior colaboração em tudo isso.
No primeiro momento, foi falado que esse petróleo não é das bacias sedimentares do Brasil. Todos beberam dessa água. Em Recife, eu fiquei assustado, porque 10% da produção do petróleo brasileiro, da PETROBRAS, é esse petróleo. Então, há uma colcha de retalho que se faz. Como bem alguém falou aqui, é importante que essa investigação tenha seu curso, mas o lado ambiental — e agora socioambiental — deve ter seus contornos estabelecidos.
Voltando à pergunta bem colocada da Roseli, deve-se colocar em prática o PNC, o plano nacional. Isso já deveria ter sido feito. Os Estados deveriam ter participação. As outras Secretarias deveriam ser chamadas, e se faria tudo que deveria ser feito, inclusive com aqueles que estão na ponta da lança, que são os pescadores, que vivem agora sofrendo essa angústia de ver o seu dia sendo cerceado, diante de tudo aquilo que já fazem ao longo da vida, como caminho real de suas vidas.
Então, essa é minha colaboração final.
O SR. PRESIDENTE (João Daniel. PT - SE) - Muito obrigado, Gilvan Dias dos Santos, Presidente da ADEMA de Sergipe.
O nosso querido Paulo Nobre tem urgência em sair, e o Leonardo Barros também.
Tem a palavra o Leonardo, para fazer suas considerações.
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O SR. LEONARDO BARROS - Eu agradeço mais uma vez à Comissão.
A nossa empresa continua à disposição das autoridades brasileiras, nós estamos dispostos a apoiar o que estiver ao nosso alcance, como fizemos até agora.
Mais uma vez, eu acho que instrumento legal existe. Como um colega aqui da Mesa comentou agora, eu considero que o PNC seja mais do que suficiente, em termos de legislação. Falta agora um engajamento maior para nós brasileiros podermos nos aparelhar e dar as providências necessárias. Essa é a minha visão.
Nós vimos aqui hoje, em menos de 4 horas de audiência, um show de tecnologia, com especialistas de diversas áreas. Então, isso também não nos falta. O que falta, realmente, é essa organização.
Como Presidente da HEX, uma empresa brasileira, eu me coloco à disposição. Eu espero que haja uma alternativa, uma saída positiva no final desse episódio.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (João Daniel. PT - SE) - Muito obrigado, Leonardo Barros e HEX Tecnologias Geoespaciais, pela presença, pela contribuição e pela exposição.
Tem a palavra para fazer suas considerações e para responder aquilo que for possível o Sr. Paulo Nobre, pesquisador do INPE, que vai ter que sair.
O SR. PAULO NOBRE - Obrigado, Deputado.
Senhoras e senhores que representam a comunidade de pescadores, eu queria que vocês soubessem primeiro do meu acolhimento da situação. Eu acho que as palavras não conseguem descrever isso. É, de fato, um desastre humanitário de grande escala.
O que eu tenho a lhes dizer, eu sei, não diminui a dor. Nós estamos, através de vocês, vivendo a crise. Mas eu quero que vocês saibam que o Governo Federal está colocando de uma maneira concentrada e coordenada o esforço do conhecimento nacional, das nossas universidades, em prol de entender e resolver o problema nas suas várias dimensões.
Eu chamo atenção para o Grupo de Trabalho 3, o grupo de avaliação e análise do Ministério da Defesa, que é na área de impactos socioambientais. Então, os nossos especialistas, enquanto nós conversamos aqui, estão se reunindo para acolher e oferecer soluções mitigatórias que permitam amenizar o desastre já ocorrido e olhar essa questão da saúde, que é gravíssima, de modo que nós entendamos que vivemos num país em que o conhecimento científico é colocado à disposição da nossa sociedade.
Então, eu queria que vocês tomassem a minha palavra, porque eu estou dentro desse processo. Como eu mostrei aqui, estou trabalhando com a parte de previsão. Há mais óleo para chegar? A resposta aos colegas é "sim, o óleo que chegou é uma fração do total que chegaria se um navio tivesse afundado e liberado todo o seu petróleo". Mas não é possível responsavelmente dizer nem A nem B. Nós, com todas as letras, não sabemos quanto óleo está no mar. Essa é a nossa pesquisa. Nós estamos trabalhando dia e noite para responder essa questão. Agora, chorar o óleo derramado não adianta, nós temos que explicitar isso.
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Eu quero responder outra questão: o que fazer para o futuro, para isso não nos atingir novamente? Essa é a sua pergunta e a do colega. Nós precisamos legislativamente investir em sistemas de resiliência, para detecção e prevenção. Isso já está em relatório técnico com o Ministério da Defesa. Então, nós devemos falar tecnicamente dos valores, das instituições e da governança. Não basta ter satélite.
Há uma coisa que eu não mencionei e que é gravíssima: a erosão da nossa capacidade de pensar. Os jovens que estão sendo formados e não estão sendo contratados. O INPE tinha 1.400 funcionários há 10 anos ou há 7 anos, e hoje tem 700, porque as aposentadorias chegam e não há novos concursos. Então, Deputado, existe uma questão gravíssima para a segurança nacional. Para evitar que novos desastres como esse aconteçam, é preciso entendermos a necessidade de contratar, de trazer os nossos jovens cientistas, os jovens pesquisadores para trabalhar nas soluções.
Não sabemos se a origem do óleo é o pré-sal. Parece que não. O nosso colega já mostrou que é um óleo de outras dimensões. Mas seria diletantismo ficar falando sobre isso agora. O que realmente importa é saber quais ações nós tomaremos daqui para frente para lidar com o óleo que já está contaminando os nossos manguezais, a nossa capacidade de pesca, e saber qual é o tamanho do problema que vem para o futuro.
Então, eu peço licença para as senhoras e os senhores. Agradeço muito ter escutado os seus depoimentos. Eu podia antevê-los, mas é diferente escutar de quem está lá na praia vivendo a situação.
Eu me coloco à disposição e coloco o Ministério da Defesa, se eu posso falar em nome desse esforço da sociedade científica, da comunidade científica nacional, em prol de resolver o problema que está lá. Entendam que isso está acontecendo agora enquanto nós estamos aqui, nesta reunião.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (João Daniel. PT - SE) - Muito obrigado, Paulo Nobre, a você e a toda a equipe do INPE. Nós agradecemos a sua exposição, a sua presença e a sua contribuição.
Tem a palavra o Prof. Alberto, do Departamento de Química da Universidade Federal de Sergipe, para dar suas respostas e fazer suas considerações finais.
O SR. ALBERTO WISNIEWSKI - Vou tentar responder algumas questões bem colocadas. Há vários esforços em diferentes linhas.
A Camila colocou a questão da qualidade do pescado. De fato, isso não é uma coisa muito fácil de se fazer. Não é impossível, não entendemos que seja impossível, mas é difícil, porque não é um protocolo convencional analisar resíduos de petróleo em pescado. Então, isso vai levar tempo, porque é preciso buscar uma infraestrutura. Existem alguns grupos — lá na universidade, por exemplo — que trabalham com isso, verificando o impacto de navios, de barcos dentro do rio. Naturalmente, existem hidrocarbonetos nos rios, nos estuários.
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O que estamos falando é de um aporte, de uma quantidade maior do que o natural. Qual é o impacto disso? Esse tipo de análise é possível ser feito? É. A questão é que é preciso ter esforços e direcionar uma infraestrutura para que se faça isso, porque vai ter que se fazer análise no marisco, vai ter que se fazer análise no camarão, vai ter que se fazer análise no peixe, efetivamente nas partes comestíveis ou na parte interior desses animais. E isso pode diferir de uma espécie para outra. Então, é possível? É, mas será necessária a definição de uma infraestrutura focada para fazer esse tipo de trabalho, que não é um protocolo convencional. Isso é feito em algumas universidades em modo de pesquisa.
Em relação aos colegas que levantaram a questão do volume de óleo — Lailson, Claudio —, não é o percentual que acho que foi levantado pelo Silvio, de 2%. Não é isso, mas é possível, sim, um navio-tanque carregar... Estima-se que chegou à costa brasileira algo em torno de 30 mil barris de petróleo. Os grandes tanques carregam entre 160 mil e 200 mil barris. Então, estamos falando de algo em torno de 10% a 15% de um navio. De fato, eu não sou investigador dessa área criminal, mas eu conheço um pouco do mercado de petróleo. Ninguém joga ao mar 30 mil barris de petróleo porque está jogando dinheiro fora. Então, de fato não é uma coisa que deva ter acontecido premeditadamente, ou seja, dispor desse volume de óleo, ainda mais sabendo a questão das sanções ambientais, não só no Brasil, mas efetivamente as sanções ambientais internacionais.
Respondo à Roseli. Obrigado, Roseli, pela pergunta. De fato, é possível saber de que campo saiu? É. A questão é que, assim como o DNA de um humano, precisamos ter uma referência. Então, se eu quiser saber se o meu filho efetivamente é meu filho, a referência sou eu, mediante a análise do DNA. Quando temos um óleo sem referência, temos que sair pegando amostra de óleo de todo o planeta para fazer comparações. Então, estamos falando um volume de amostras gigantes, que pode ser diminuído em função de alguns parâmetros, como eu já demonstrei aqui: óleos pesados, determinado teor de enxofre... Aí começa haver redução da amostragem.
A questão é que dificilmente a academia tem acesso a essas amostras, porque muitas delas estão envolvidas com a iniciativa privada, e a iniciativa privada, naturalmente, não tem obrigação de dispor de amostra para todo mundo. Nós, pesquisadores, temos dificuldade em conseguir amostras inclusive das empresas que operam no País, quanto mais de fora do País. Então, é de fato necessário pensar numa estrutura de Estado, vinculada a algumas das instituições que têm competência para isso, com força de lei para fazer com que o Estado tenha esse tipo de informação, e isso não fique apenas de posse de quem explora, de quem tem acesso a esse tipo de bem, dessa commodity.
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Então, de fato, muita gente tem... Eu posso dizer que, assim como me voluntariei a trabalhar e a ajudar, eu efetivamente acho que, como funcionário público e professor de universidade pública, é minha função dar respostas à comunidade de acordo com minhas competências. Acho que isso faz parte da minha função. Eu tenho acompanhado vários colegas que se envolvem, que têm tentado... Mas ainda esbarramos em algumas questões de limitação de acesso à informação, sem saber o que efetivamente está sendo feito, como isso pode ser feito, porque é uma ação de uma instituição de ensino, de um pesquisador, em detrimento de uma organização, de instituições que já estão concebidas para essa finalidade.
Então, agradeço novamente ao excelentíssimo João Daniel, Deputado Federal, pela oportunidade de estar aqui, de demonstrar um pouco meu conhecimento e de tentar responder às perguntas. Eu sei que isso efetivamente não acolhe toda a comunidade, principalmente quem está na ponta, como já foi dito aqui, recebendo o impacto direto, mas eu quero dizer, assim como o colega Paulo, que me antecedeu, que existem boas pessoas e bons profissionais tentando apoiar a comunidade, mas temos que desamarrar algumas que ainda podem efetivamente segurar esse trabalho.
Obrigado a todos pela escuta.
O SR. PRESIDENTE (João Daniel. PT - SE) - Muito obrigado, Prof. Alberto.
Concedo a palavra ao Prof. Humberto Barbosa, Coordenador do Laboratório de Análise e Processamento de Imagens de Satélite — LAPIS, da Universidade Federal de Alagoas, para exposição final, respostas e considerações finais.
Muito obrigado pela presença.
O SR. HUMBERTO BARBOSA - Bom, João Daniel, eu agradeço o convite. É muito importante estar presente nesta audiência.
O SR. PRESIDENTE (João Daniel. PT - SE) - Fale um pouquinho mais perto do microfone, por favor.
Obrigado.
O SR. HUMBERTO BARBOSA - Destaco aqui que estou representando a Universidade Federal de Alagoas e eu vou fazer as minhas considerações em duas etapas.
Na primeira etapa eu acho fundamental abordarmos as reivindicações dos pescadores artesanais, que são extremamente importantes e representam o que de fato anseia a sociedade civil. Eu faço um paralelo rápido com a seca na Região Nordeste do Brasil. Sabemos que a seca ainda é um fenômeno que ameaça toda a questão socioambiental — e isso há mais de 1 século. Eu acho que a participação da sociedade civil, neste momento e historicamente, sempre esteve relegada a um segundo plano. Eu estou falando isso como professor, como servidor público, um crítico em relação até à minha participação como servidor público, sobre como as nossas informações devem chegar à sociedade em geral, ao grande público.
É nesse sentido que eu digo aqui, sem nenhuma outra conotação, senão também como um servidor público, porque faço parte da sociedade cidade civil e também sou impactado, que eu como peixe, eu gosto de peixe. Isso também traz um nível de alerta para mim e para toda minha família. Então, é importante destacar que estamos todos juntos nesse contexto.
Nesse sentido, olhando para os pescadores, eu acho importante, principalmente nessa questão da sociedade civil, que nos articulemos para vocês procurarem suas bases, seus Municípios, seus Estados, porque o problema é complexo. Esse problema vai exigir uma articulação de ferramentas corretas para que se chegue a uma solução ou para que se criem políticas públicas adequadas para atender e evitar futuros desastres nesse nível.
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Então, eu acho importante o que você falou sobre essa questão de os Municípios e os Estados se mobilizarem. Eu acho que a Região Nordeste do Brasil, que é a região agora mais impactada, tem que começar a se mobilizar. E vocês são, sim, os agentes que podem fazer essa articulação. Então, dentro do PNC, eu acho que poderia, sim, ser estendida essa participação aos pescadores. Eles têm um papel importante.
Nesse sentido, eu acho fundamental que vocês continuem articulados. Eu acho que a sociedade entende e sabe da complexidade desse problema, que não vai ser resolvido de uma hora para outra, mas é um processo que vai ouvir várias vozes, para que a academia, o setor operacional e, sim, os Parlamentares, que certamente ouvirão os anseios de vocês, possam formular políticas públicas.
Na parte técnica, a Universidade Federal de Alagoas colocou um grupo de trabalho muito específico para fazer levantamentos de vários níveis, desde a questão dos peixes, dos pescadores, diretamente em análises, envolvendo o Departamento de Química e outros grupos. É um grupo de trabalho de servidores públicos que está prestando esse serviço e tentando entender toda essa dinâmica.
Falo — e aí trago uma questão um pouco mais ampla — do Rio São Francisco. Por exemplo, hoje a Universidade Federal, conjuntamente com outros grupos na Região Nordeste, João, colocou vários pesquisadores num barco, numa viagem, numa expedição científica, para acompanhar e fazer o levantamento de informações do Velho Chico. O Velho Chico não está isento e nem tampouco deslocado de toda essa questão ambiental dos nossos mares, porque há uma forte conexão principalmente na região de Sergipe e de Alagoas.
Então, eu volto novamente a jogar luz nisso. A participação dos Municípios e dos Estados vai ser a forma como nós, sociedade civil, poderemos implementar ou direcionar ações práticas para que possamos participar mais do PNC. O exemplo dos comitês de bacias não é perfeito, mas foi criada essa forma para que a sociedade civil pudesse se engajar direta ou indiretamente nessas ações.
Então, é uma questão de cidadania. Obviamente, a sociedade está preocupada, porque não são apenas os pescadores artesanais. Existe a questão da pesca internacional, que também afeta uma escala muito maior, em termos de alimentos, de segurança alimentar e da qualidade desse peixe. Então, é uma questão muito complexa em relação às diretrizes para que se coloque isso de forma descentralizada. Primeiro, eu acho que não pode ser centralizada. É por isso que eu menciono os Municípios e os Estados de toda a Região Nordeste do Brasil, com uma força para que se criem algumas ferramentas, algumas políticas de Estados e Municípios que possam trazer vocês juntos dentro dessa questão. Não há como — esse já é um próximo passo — resolver a questão desse impacto ambiental sem trazer aqueles que realmente estão na ponta do impacto, que são os pescadores. É inevitável que vocês, em algum momento, façam parte desse processo. Os mares também precisam desses pescadores artesanais, porque vocês são o primeiro contato com toda a questão que surge nessa região, especificamente. Vocês atestam a qualidade do que está acontecendo nos nossos mares. Vocês são os guardiões. Há de se fazer essa comunicação muito direta entre o que é a parte da academia, o que é a parte das agências governamentais e como vocês poderiam ser inseridos nesse contexto para que estivessem mais bem representados dentro da academia.
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Estas respostas atendem ao Lailson, ao Claudio e a vários que estiveram aqui fazendo perguntas, que são os representantes dos pescadores. Eu acho que essa é uma articulação que vai depender muito de vocês. Que vocês possam, nas suas bases, nos seus Estados, fazer isso de uma forma direta e ver como é possível gerar políticas que possam ser representadas por esses Estados!
Em relação à parte técnica, Roseli, quero dizer que hoje a universidade passa por uma situação extremamente crítica de recursos. O meu serviço em relação a isso se restringe a basicamente três pessoas. Estou sendo bem claro com você. No laboratório hoje temos várias dificuldades em termos de recurso, de bolsas e de colaboradores, mas nem por isso deixamos de colocar o esforço de tentar encontrar uma primeira resposta diretamente relacionada com a minha competência, que é a parte de processamento de imagens de satélites. Já tenho mais de 22 anos de experiência.
Existe uma câmara setorial entre o Brasil e a Alemanha. Há uns 4 ou 5 anos, foi feito um primeiro contato dos representantes brasileiros com os representantes europeus para que se pudesse criar um plano de contingência utilizando-se informações de satélites. No caso, o satélite Sentinel 1-A foi uma pauta da discussão. Existe o Projeto Copérnico, que hoje é de interesse para o Brasil em termos de articulação, de informações de missão do Sentinel 1-A a 2-B e de várias missões não só de radares ativos mas também de radares ópticos.
Então, na nossa pesquisa — também respondendo um pouco aos pescadores —, buscamos uma forma muito geral e aleatória para buscar uma resposta para isso, porque, de certa forma, a sociedade e a universidade cada vez mais estão tentando estreitar essa relação. Foi importante que pudéssemos nos envolver, porque isso é um anseio de toda a sociedade, não só dos pescadores. No meu prédio, vira e mexe alguém me pergunta: "Professor, como está a situação? Já há uma solução? Já podemos comer peixe?" Essas são perguntas que são feitas pela sociedade civil e que, de certa forma, também chamam muito nossa atenção na academia.
Há um esforço hoje da Universidade Federal de Alagoas com esses funcionários públicos, nas suas competências, de tentar atender a uma demanda rápida. Por isso eu citei o São Francisco, porque ele tem essa integração e poderia, sim, coordenar ações. O São Francisco hoje é uma área muito impactada, e com essa questão dos oceanos torna-se ainda mais vulnerável.
Nesse sentido, a nossa pesquisa foi pautada em dois pontos, e o primeiro foi saber se nós encontrávamos alguma resposta, nessa região costeira, que pudesse ser identificada por satélite. Havia um certo questionamento se os satélites poderiam observar isso. Pensamos no futuro. Claro, pensamos na observação, mas, para chegar a uma resposta, tivemos que olhar a questão mais retroativa de dados, de informações e de integração de dados.
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Partimos de uma informação muito importante: a PETROBRAS e a Universidade Federal da Bahia, em estudos independentes — o Alberto, da Universidade de Sergipe, também é uma testemunha —, concluíram que este óleo que está chegando à nossa costa não é um óleo produzido no Brasil. Voltando àquele jargão da década de 70, o óleo não é brasileiro, nesse sentido. Então adotamos essa evidência e utilizamos o dia 30 de agosto como a data de aparecimento das primeiras manchas que impactaram o litoral da Paraíba. A partir daí tentamos eliminar os navios, embora houvesse uma certa preocupação nossa de que outras fontes precisassem ser investigadas, fontes naturais que podiam estar relacionadas, principalmente os sliks. A conexão com essa parte do fundo do oceano precisa ser mais bem avaliada.
Esse é um trabalho interdisciplinar e multidisciplinar. Eu acho que as universidades têm um papel importante nesse processo. Elas não podem ser ignoradas. Elas têm especialistas que podem contribuir. Eu acho que a sociedade civil como um todo já está, na forma dos pescadores, colocando que é necessária uma resposta depois de um desastre. Ainda estamos aprendendo muito com essas questões do antes, durante e depois de desastres. Quais são as medidas? Quais são as ferramentas para se fazer isso? Também há de se entender que o Brasil é um país muito complexo, que tem uma dimensão continental, e realmente há coisas que precisamos melhorar de infraestrutura, não só de formação de recursos humanos mas também de infraestrutura de análises. Que isso seja descentralizado!
Quando eu falo descentralizado, não me entendam errado. Eu estou falando que, se o problema está na Região Nordeste do Brasil, vamos buscar um pouco dessas competências na Região Nordeste do Brasil, para que também se junte com outras competências em outras partes. Isso faz com que a ciência também ganhe um pouco mais de descentralização regional, fazendo que ela possa chegar também a outras regiões que têm competência, mas não têm infraestrutura.
Ficam essas mensagens.
Mais uma vez, dirigindo-me diretamente aos pescadores, eu acho que é importante que vocês continuem, nas suas bases, com os seus Parlamentares, conversando e vendo como vocês podem fazer parte de um plano nacional de contingência. Essa é a mensagem final.
Nós do LAPIS, mesmo com pouco recurso, mesmo eu tirando o meu tempo como servidor público para colocar luz nesse problema, achamos que é importante que a academia faça essa ligação com a os anseios da sociedade de uma forma direta e não fique só olhando para os artigos. Fica também essa mensagem um pouco crítica.
Deputado João Daniel, eu agradeço mais uma vez pelo espaço. Acho que foi muito importante você ter coordenado esta audiência. Embora tenham faltado alguns agentes, certamente em um segundo processo eles vão estar presentes.
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (João Daniel. PT - SE) - Muito obrigado, Prof. Alberto, da Universidade Federal de Sergipe; Paulo Nobre, do INPE; e Leonardo Barros, representante da empresa HEX.
Prof. Humberto Barbosa, da Universidade Federal de Alagoas, muito obrigado pela sua exposição e pela sua presença.
Gilvan Dias dos Santos, Diretor-Presidente da Administração Estadual do Meio Ambiente do Estado de Sergipe — ADEMA-SE, muito obrigado pela presença.
Também quero registrar a presença do Dernival.
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Queria agradecer aos sindicatos aqui presentes, a todos os companheiros e companheiras do sindicato, aos pescadores e pescadoras do Movimento de Pescadores e Pescadoras, à Pastoral dos Pescadores. Queria dizer a vocês que esta Comissão foi criada por uma solicitação nossa, a partir da nossa visão de que esse crime ambiental estava ocorrendo e o Governo Federal, exatamente como vocês disseram aqui, não se pronunciava. O Governo Federal pronunciou-se a partir do dia, que eu não tenho anotado aqui, na manhã de um sábado, em que eu e o Senador Rogério Carvalho, acompanhados por Gilvan e toda a equipe de Sergipe, fomos à praia e a maior mancha estava lá. Fizemos uma denúncia à Câmara Federal e uma denúncia ao Senado Federal. Foi na tarde desse sábado, pela primeira vez, que o Governo Federal falou sobre o assunto.
Nós ouvimos os pescadores e pescadoras, as representações de Sergipe, e sabemos da gravidade disso. Nós queremos nos colocar à disposição do Movimento de Pescadores e Pescadoras, da Pastoral dos Pescadores, para cobrar ações imediatas, que já foram cobradas, que era a antecipação de um seguro-defeso mínimo, para buscar uma solução, provisória pelo menos, para os pescadores e pescadoras. Isso foi anunciado pelo Presidente em exercício Davi Alcolumbre, quando esteve em Alagoas e Sergipe. Não sabíamos se já tinha sido liberado ou não. Estamos ouvindo aqui de você que está atrasado inclusive o anterior.
Então, a partir de todas as informações que vocês tiverem, nós nos colocamos à disposição para cobrar, realizar seminário e audiência lá na região onde vocês moram também. Esta Comissão não tem uma data para fechar, mas o objetivo dela é tanto buscar subsídios para elaboração de uma legislação melhor para o nosso País como também cobrar investigação, apuração e punição por esse crime ambiental ocorrido.
Esta Mesa de hoje — eu queria agradecer a todos — realizou-se no sentido de buscar entidades públicas e também privadas que estivessem acompanhando este caso, pesquisando, para que estejam no nosso relatório as informações e possam contribuir para a Câmara Federal.
Também quero dizer a vocês todos que deve estar sendo implantada nos próximos dias uma CPI, que tem um poder maior do que a Comissão. Nós nos colocamos à disposição. Deveremos estar integrando também essa CPI, que será coordenada, acredito, pelo Deputado João Campos, que também é membro desta Comissão, junto com mais 20 ou 22 Parlamentares. Há 22 Parlamentares nesta Comissão. Ouviremos quem de vocês acharem importante e tiverem denúncias e questões importantes a serem colocadas.
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Queria agradecer a todos e todas e nos colocar à disposição.
Nada mais havendo a tratar, encerramos a presente reunião.
Convocaremos uma nova audiência posterior com data, horário e plenário a ser divulgado.
Agradeço a presença a todos e todas.
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