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O SR. PRESIDENTE (Rodrigo Agostinho. PSB - SP) - Boa tarde, senhoras e senhores.
Declaro aberto o seminário da Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável destinado a debater o Dia do Bioma Pantanal. O requerimento para a realização deste evento é de minha autoria.
O evento está sendo transmitido ao vivo pela Internet e será gravado para ser exibido posteriormente pela TV Câmara.
Quero fazer um agradecimento especial a todos os presentes e a todos os expositores que vieram, atendendo a um chamado para que possamos debater hoje o nosso Bioma Pantanal, a maior planície inundável do planeta, com uma rica biodiversidade, mas que sofre ataques de todos os lados.
Convido para compor a Mesa os expositores Fábio Soares Eon, Coordenador dos Setores de Ciências Naturais e Ciências Humanas da UNESCO; Marcos Rugnitz Tito, Oficial Sênior de Projetos da International Union for Conservation of Nature, a IUCN — eu, como membro da IUCN, fico feliz de ver a instituição aqui —; Cristina Cuiabália Rodrigues Pimentel Neves, Gerente de Pesquisa e Meio Ambiente do SESC Pantanal; Júlio César Sampaio da Silva, Coordenador do Programa Cerrado Pantanal da WWF; Felipe Augusto Dias, Diretor Executivo do Instituto SOS Pantanal; e Marcio Yule, da Coordenação Estadual do PREVFOGO — Centro Nacional de Prevenção e Combate aos Incêndios Florestais.
Nós temos tramitando nesta Casa um projeto de lei muito importante no que diz respeito à regulamentação do Bioma Pantanal, protegido pela nossa Constituição. Eu quero fazer um agradecimento especial à equipe da SOS Mata Atlântica, que está sempre presente, aqui coordenando a Frente Parlamentar, nas pessoas de Mario Mantovani, Roberto Klabin e da Lídia, que fazem um esforço muito grande para que esses assuntos possam ter uma tramitação mais ágil dentro da Câmara.
Eu queria primeiramente cumprimentar a iniciativa do Deputado Rodrigo Agostinho e lhe agradecer o convite. Cumprimento aqui também as autoridades presentes, os colegas da Mesa, o nosso parceiro Marcos Tito, da IUCN, a Cristina Neves, do SESC Pantanal, o Júlio César, do WWF, o Felipe Dias, do Instituto SOS Pantanal, e o Marcio Yule, do PREVFOGO.
Para quem não me conhece, sou Fábio Eon e coordeno a área de ciências naturais da UNESCO. Venho, na verdade, da área de ciências humanas do nosso escritório e estou interinamente coordenando esse departamento na representação da UNESCO no Brasil.
Vou fazer uso do meu tempo de fala, nestes 10 ou 15 minutos, mais como um sobrevoo nos motivos que levaram a UNESCO a dar dois títulos importantes para o Pantanal: o título de Patrimônio Natural e o título de Reserva da Biosfera. Vou deixar os desafios ligados ao meio ambiente para os colegas da Mesa e vou fazer uma apresentação um pouco mais institucional nesse sentido.
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(Segue-se exibição de imagens.)
Para quem não conhece, a UNESCO é a organização da ONU para a educação, a ciência e a cultura, e, dentro da área de ciência, obviamente temos um guarda-chuva muito amplo, porque lidamos com as ciências duras, a química, a física, a matemática, além do tema de oceanos, meio ambiente e outros assuntos que estão listados aqui.
As ciências naturais têm uma característica muito peculiar dentro da UNESCO, porque é um setor que tem o que chamamos programas intergovernamentais. Os países-membros da UNESCO fazem um pouco desse secretariado, se apropriam desses programas internacionais. Eu citei alguns exemplos aqui no Brasil. Temos o programa voltado à água, e quem faz o secretariado desse programa é a Agência Nacional de Águas, aqui no Brasil; temos um programa de geociências, temos o Geoparque do Araripe, listado pela UNESCO, aqui no Brasil; temos um programa ligado a oceanos, cuja mediação quem faz, aqui no Brasil, é o Ministério da Ciência e Tecnologia.
Eu vou discorrer um pouquinho mais, dentro do nosso tempo, sobre o programa O Homem e a Biosfera, um programa muito bem-sucedido, criado pela UNESCO nos anos 70. Temos sete biosferas da UNESCO listadas aqui no Brasil, entre elas o Pantanal. Quem está na presidência da comissão brasileira desse programa é o Ministério do Meio Ambiente.
Em síntese, eu vou falar muito mais destes dois programas da UNESCO e dos porquês de a organização ter considerado o Pantanal tanto patrimônio mundial natural como também reserva da biosfera. As duas identidades visuais dos programas estão aqui expostas. Certamente vocês já as viram em alguns sítios pelo Brasil afora.
Vamos começar pelo começo, pela própria ideia de patrimônio da humanidade. De onde ela vem? Talvez vocês conheçam essa história. Eu vou ser um pouco redundante. A ideia de patrimônio da humanidade surgiu com um empreendimento econômico, uma reserva que estava sendo construída no Egito, a Represa de Aswan. A construção dessa obra implicaria a inundação de um patrimônio arqueológico considerável do Egito, os templos de Abu Simbel.
Isso gerou uma celeuma muito grande no contexto internacional. A comunidade internacional se sensibilizou e, através de um movimento muito forte, que foi tocado internacionalmente, o Governo do Egito, por meio de financiamento externo, fez essa obra de remoção literal dos templos de Abu Simbel para outra localidade próxima da represa. Isso, no final dos anos 60, suscitou alguns instrumentos importantes dentro da governança de patrimônio mundial da humanidade.
Vocês devem saber que existem categorias diversas de patrimônio mundial. Temos o patrimônio histórico, que aqui no Brasil é regido pelo IPHAN e segue um rito diferenciado dentro da UNESCO. Quem tem dado o apoio técnico à UNESCO para listar um sítio como patrimônio histórico é o ICOMOS, que é o Conselho Internacional de Monumentos e Sítios.
Na área de patrimônio natural — eu vejo aqui o Marcos —, a IUCN, União Internacional para a Conservação da Natureza, tem dado esse apoio técnico a duas instâncias que são importantes nesse sentido. O Comitê do Patrimônio Mundial, da UNESCO, é o secretariado desse programa e faz o seguimento da Convenção do Patrimônio Mundial, redigida pela UNESCO em 1972.
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Como nós vamos versar um pouco mais sobre patrimônio natural, eu colei aqui, literalmente, o que consta na convenção sobre o que seria um bem natural a ser listado como patrimônio natural da humanidade. Então, no caso do Pantanal, mais especificamente nesta categoria de quatro itens — o primeiro versa mais sobre sítios de valor geológico excepcional —, eu entendo que o Pantanal teve esta candidatura aprovada muito mais pelo simbolismo que representa, com toda a diversidade étnica, que nós conhecemos bem, com toda a biodiversidade que o Pantanal representa e por ser, certamente, um dos patrimônios que estavam muito bem listados, ou bem ancorados na Convenção para a Proteção do Patrimônio Mundial Cultural e Natural, da UNESCO.
O que eu tenho a dizer sobre o Pantanal como sítio do patrimônio natural? A candidatura do Pantanal foi proposta no ano 2000 e aprovada no Centro do Patrimônio Mundial da UNESCO, em Paris. Mesmo assim, é uma área muito pequena do Pantanal. Ela representa apenas 1,3% do Pantanal brasileiro. Essa é uma realidade muito diversa, por exemplo, se nós pegarmos a Reserva da Biosfera do Pantanal. Eu vou discorrer um pouquinho mais sobre ela daqui a pouco.
Mas, falando sobre o segundo programa da UNESCO, que é O Homem e a Biosfera, em Inglês chama-se Man and the Biosphere, foi um programa criado em 1968, como resultado de uma conferência internacional promovida pela UNESCO sobre biosfera. E o Programa MAB, oficialmente, foi lançado em 1971. Ele fundamentalmente visa a três objetivos: promover a conservação da biodiversidade em vários biomas espalhados pelo mundo, promover o desenvolvimento sustentável e, por último, promover a relação mais harmoniosa entre o homem e a natureza. Então, a candidatura do Brasil para o Pantanal obviamente teve esse foco. A Reserva da Biosfera do Pantanal coincidentemente foi listada pela UNESCO no ano 2000, no mesmo ano em que foi anunciado o Pantanal como Sítio do Patrimônio Natural. E é uma reserva que tem características únicas. O Aécio, que é nosso colega da reserva, certamente pode detalhar isto muito melhor. Mas, hoje, é a terceira maior reserva da biosfera no mundo. Pelo mapa que vocês podem ver aqui no Brasil, nós temos a felicidade de possuir sete reservas da biosfera: a Reserva da Mata Atlântica, a Reserva da Caatinga, a Reserva do Cerrado, a Reserva da Amazônia Central, a Reserva do Pantanal, entre outras.
As reservas da biosfera são instâncias autogeridas por meio de comitês criados de forma autônoma que, normalmente, reúnem membros da sociedade civil, da academia, do setor privado e do governo.
Nesse ponto, eu dou um panorama das várias reservas da biosfera criadas no mundo. Aqui nós acompanhamos as sete reservas que existem no Brasil. Mas vocês veem que vários países têm uma concentração muito intensa de reservas da biosfera. Se não me engano, o Peru, por exemplo, que é um país relativamente pequeno para a parte da Amazônia, tem quatro reservas ligadas à Amazônia; e, no Brasil, nós temos apenas uma.
Assim, este conceito de reserva da biosfera é muito interessante, do ponto de vista internacional, porque promove atração de investimentos para aquelas localidades, atração de turismo, atração de uma série de programas internacionais, até de intercâmbios entre as próprias reservas da biosfera promovidos pela UNESCO.
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Uma reserva da biosfera típica da UNESCO reúne essas três condições: uma área central, que seria uma zona núcleo, uma área de conservação de proteção integral; uma área que nós chamamos de zona tampão ou zona de amortecimento, onde é possível haver algumas atividades, contanto que não sejam muito agressivas à natureza, que sejam muito mais ligadas à pesquisa e à educação ambiental; e, por último, o que chamamos de zona de transição, onde a presença humana é mais visível, é mais intensa.
No Pantanal, vocês veem essa disposição — o Laércio pode me corrigir, porque este é um gráfico relativamente antigo e pode ser que isso tenha mudado. Há três conceitos expostos no mapa. As áreas em verde são as áreas núcleo — não necessariamente uma reserva da biosfera precisa ter apenas uma área núcleo. Então, nós temos casos, aqui no Brasil, em que há vários núcleos espalhados. A área de transição é a que está em amarelo. E, por fim, há essa área de amortecimento entre a área de transição e a área núcleo.
A Reserva da Biosfera do Pantanal, como vocês veem, é uma reserva que cobre três Estados brasileiros: Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e um pouquinho de Goiás.
Obviamente, vocês conhecem muito bem a realidade do Pantanal, toda a importância da pecuária extensiva na região. Então, grande parte da área é coberta por pastagem, ambientes florestais e silvicultura, espalhados neste mapa sobre o uso do solo da Reserva da Biosfera do Pantanal.
Como se dá a estratégia de crescimento e de expansão da Rede Brasileira de Reservas da Biosfera? Por uma estratégia definida pelo Estado brasileiro, nós temos hoje uma coincidência entre os biomas brasileiros e as reservas da biosfera. Temos uma reserva da biosfera praticamente para cada bioma brasileiro, com exceção dos Pampas.
As reservas podem ser ampliadas. Nós já tivemos casos, aqui no Brasil, através da COBRAMAB — Comissão Brasileira do Programa Homem e Biosfera, em que as reservas tiveram sua área de cobertura ampliada. Recentemente, as Reservas da Biosfera do Cerrado e da Mata Atlântica tiveram a sua área consideravelmente expandida. Esse é um território que visa a esta gestão integrada, então, também pode incluir corredores ecológicos, cinturões verdes em áreas urbanas e mosaicos.
A reserva da biosfera é um conceito da UNESCO que está muito alinhado com o próprio Sistema Nacional de Unidades de Conservação, o SNUC. Apesar de não serem unidades de conservação stricto sensu, são consideradas, pela legislação brasileira, instrumentos de gestão do Sistema Nacional.
Segundo a definição na Lei do SNUC — e eu coloco aí o art. 41 —, a reserva da biosfera é "um modelo, adotado internacionalmente, de gestão integrada participativa e sustentável dos recursos naturais".
O uso da palavra "modelo" causa um pouco de polêmica no plano internacional, porque pode dar a impressão de que é uma coisa muito abstrata e pode não representar adequadamente o que nós entendemos como conceito de reserva da biosfera. E, como eu já havia dito também, as reservas podem incluir todo e qualquer tipo de unidades de conservação, como corredores ecológicos e mosaicos.
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Enfim, a minha fala aqui é muito mais institucional, no sentido de trazer um pouquinho desses conceitos: o que é um sítio do patrimônio natural, o que é uma reserva da biosfera e o que o Pantanal fez por merecer em relação ao recebimento desses títulos.
Quero fazer o meu voto para que consigamos ter o Pantanal mais em evidência no plano internacional. É um bioma muito querido por todos nós, que sofreu muito nos últimos meses, mas que, infelizmente, ainda tem pouco destaque na mídia internacional — e, muitas vezes, na mídia nacional também — e recebe, comparativamente com Amazonas, muito menos recursos, apesar da complexidade toda envolvida.
Eu deixo os meus contatos para qualquer dúvida ou qualquer informação que vocês queiram do nosso escritório da UNESCO do Brasil.
O SR. PRESIDENTE (Rodrigo Agostinho. PSB - SP) - Quero cumprimentar o Fábio pela exposição.
(Exibição de vídeo.)
Quero, com a exibição dessas imagens, tentar sensibilizar as pessoas que estão nos acompanhando pela TV Câmara e também as que estão aqui presentes quanto à realidade que foram os derradeiros meses. Sobre isso o Marcio vai poder falar com muito mais propriedade do que eu, mas eu queria aproveitar o gancho da fala do Fábio, que me antecedeu, pois a UNESCO e a UICN podem contribuir com esse contexto local, sobretudo no que diz respeito a algo que ele destacou e de que eu gostei muito: o Pantanal tem muito menos evidência do que outros biomas. Na minha percepção — eu ainda não cheguei a estudar bem os números —, comparativamente, proporcionalmente, o bioma Pantanal sofreu muito mais as consequências do fogo do que a Amazônia, e pouco se falou sobre isso.
Nós temos um coletivo de instituições e entidades que compõe o chamado Observatório do Pantanal, em cuja rede nós fizemos um posicionamento referente ao tema.
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(Segue-se exibição de imagens.)
Nós sabemos dos incêndios, mas sabemos pouco das suas consequências. Nós que estamos atuando no tema acabamos recebendo muitas dessas imagens de animais que faleceram nos incêndios não apenas por causa da ação direta do fogo, mas também por causa de outros impactos, como o efeito do gás carbônico decorrente dos incêndios.
Nisso tudo está a União Internacional para a Conservação da Natureza, cujo Secretariado eu estou representando.
Quase mil pessoas trabalham nessa organização, mas ela tem quase 15 mil pessoas — o Deputado Rodrigo se apresentou como um dos membros. E ela também é composta de instituições. Infelizmente, o Brasil ainda não é um membro, mas algumas entidades, como o Instituto Chico Mendes, sim. Nós temos uma gama de pessoas, que eu posso chamar de "um exército do bem", que podemos acionar para as ações que precisarem ser feitas.
A UICN tem mais de 70 anos — agora completou 71 anos — e, na década de 1970, tocou muito no tema de que nós vamos tratar hoje, que é a Convenção de Ramsar e o CITES.
Aí vocês podem ver alguns dos espaços de convocação que nós temos, como o próprio Congresso Mundial de Conservação da UICN; a Convenção do Patrimônio Mundial, que o Fábio mostrou e da qual nós somos órgão consultivo, como ele bem disse; a CITES, Convenção sobre o Comércio Internacional de Espécies da Fauna e da Flora Selvagens Ameaçadas de Extinção, que foi criada por uma resolução da UICN; e a Convenção sobre Zonas Úmidas, da qual nós somos entidade anfitriã da. Essa é um pouco a nossa relação mais direta.
E temos comissões que tratam especificamente do tema. Eu vou mostrar só algumas das ações e ferramentas com que nós atuamos.
Na Comissão de Sobrevivência de Espécies, talvez vocês devam ter escutado mais da UICN, porque trabalhamos com a Lista Vermelha de Espécies Ameaçadas .
Hoje, junto com as instituições brasileiras que estão trabalhando na ampliação de listas como essa, nós estamos apoiando a iniciativa que pretende fazer com que essa lista faça parte de uma lista internacional e que respalde quando exista qualquer tipo de efeito negativo, como, por exemplo, uma diversidade climática ou uma ação antrópica, para que as pessoas tenham uma linha de base, uma informação de referência. A própria Lista Vermelha de Espécies Ameaçadas é uma informação importante que nós utilizamos no nosso dia a dia nas ações ambientais.
Do lado direito dessa lâmina, eu cito um mapa, que eles chamam de BAZE — Aliança para Extinção Zero.
Eu não sei o quanto vocês conseguem enxergar aí do fundo, mas boa parte desses sítios
está concentrada justamente na área dos Biomas Mata Atlântica e Cerrado, um pouco mais na Amazônia e muito pouco — só há um sítio praticamente — no Bioma Pantanal, mais uma vez corroborando quanto faltam os nossos esforços, como entidades que estão à frente da pesquisa e do desenvolvimento, para fortalecer esse tipo de informação e podermos falar com mais propriedade.
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A IUCN também está vinculada a uma ação que se chama, em português, Áreas Chave para a Biodiversidade, que apoiou, no início do processo, a definição de Áreas Prioritárias para Conservação da Biodiversidade Brasileira, que está na sua terceira versão. São instrumentos e informações que precisamos utilizar para fazer a análise desses impactos e também a análise do porquê de manter o bioma do jeito que está.
Nós também temos, como IUCN, junto com a ONU Meio Ambiente, uma plataforma de base dados de áreas protegidas. Vocês podem acessar essa informação na página do Protected Planet. Vocês conseguem ver ali, na parte inferior da tela, no lado direito, por exemplo, no sítio Patrimônio, informações referentes à informação que foi apresentada pelo Fábio, também acessível diretamente nessa página.
Como IUCN, vimos trabalhando muito no fortalecimento da governança. Como eu citei recentemente, nós temos, aqui nas regiões brasileira, paraguaia e boliviana, uma rede chamada Conservatório do Pantanal, na qual tentamos fortalecer essa governança das entidades e tentamos pactuar ações concertadas.
Na Conferência das Partes da Convenção da Biodiversidade do ano passado, foi iniciado um processo, que eles chamam de "Outras Medidas Eficazes de Conservação Baseadas em Áreas", que busca contabilizar justamente essas áreas que o Fábio apresentou, porque às vezes não são consideradas como áreas protegidas em alguns países, mas contribuem para a conservação das áreas. Temos uma série de áreas estaduais e municipais, privadas, RPPN também, e outras formas de RPPN, que não são as propriamente ditas RPPN, que virão a ser contabilizadas no marco desse conceito, que eles chamam de OECM.
Essas são as ferramentas com as quais a IUCN está envolvida. Esperamos que essas ferramentas levem essa informação que está no território para o marco das discussões internacionais.
Eu vejo, Fábio, a nossa importância. Podemos vir a contribuir com essa discussão, que às vezes se dá em âmbito local, fazendo com que ela seja feita da forma mais correta possível e que seja considerada nos espaços de diálogos internacionais.
Então, essas três ferramentas que eu apresentei para vocês — a Lista Vermelha de Espécies, as Áreas Chave para Biodiversidade e a base dados de áreas protegidas — estão integradas em uma só ferramenta, que vocês podem acessar no link www.ibat-alliance.org. Vocês fazem o recorte da área que precisam pesquisar, e ele dá toda essa informação de uma vez só.
É uma ferramenta bastante funcional, da qual eu entendo que precisamos fazer mais uso e que devemos ampliar.
Estamos procurando ampliar também outra ferramenta, da qual começamos a fazer mais uso aqui no Brasil, que é a Lista Vermelha de Ecossistemas, que se dá na Comissão de Gestão de Ecossistemas. Há pouco mais de 5 anos, houve um processo de capacitação, aqui no Brasil, de um grupo, que derivou numa publicação sobre a Lista Vermelha de Ecossistemas aqui no Brasil. Uma das áreas em que foi feito um trabalho foi justamente a área do Pantanal, pelo Prof. Dr. Gustavo Manzon e pela Dra. Catia Nunes, que deram essa informação. Hoje temos uma informação mais correta de como está a vulnerabilidade dos ecossistemas na região do Pantanal. Eu acho que é em função dessa informação mais qualificada que temos condições de ter um diálogo maior com os setores que estão propondo ações contrárias.
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Deputado Rodrigo, não tendo informação qualificada, fica difícil entrarmos num diálogo concertado — não há como, sem nos respaldarmos com informações.
Então, a IUCN faz esse trabalho de levar as ações locais para os espaços de discussões internacionais. Uma delas está muito relacionada às Metas de Aichi, da Comissão de Biodiversidade, que tem o compromisso de, em 10 anos, atender a algumas metas. Por exemplo, a Lista Vermelha de Espécies e Ecossistemas, que são duas ferramentas, contribui muito com as Metas 11, 12 e 13. Então, o uso dessas ferramentas vai nesse sentido.
Finalmente, vou concluir aqui a apresentação, nós temos o que também posso chamar de "ferramenta", uma plataforma, que se chama Bonn Barômetro, com a qual se está tentando ver como está a meta brasileira de restaurar 12 milhões de hectares até 2020. A IUCN vem acompanhando e vem fazendo uma aproximação. Esperamos que, em parte dessa meta de restauração, sejam também considerados os trabalhos de restauração que estão sendo feitos no Pantanal ou o potencial que eles têm.
Finalizo a minha apresentação convidando a todos para o Congresso Mundial da Natureza, da IUCN, na cidade de Marselha, nos dias 19 e 20 de junho do próximo ano. Com a ausência da COP aqui na nossa região e a mudança para a Espanha, onde se perdeu um pouco o espaço de diálogo para o terceiro setor, eu acho que um bom espaço para o qual levar essas discussões que estamos fazendo aqui, sobre o tema ambiental no Brasil, pode ser o congresso. Então, estão todos convidados.
O SR. PRESIDENTE (Rodrigo Agostinho. PSB - SP) - A próxima painelista é a Sra. Cristina Cuiabália Rodrigues Pimentel Neves, Gerente de Pesquisa e Meio Ambiente do SESC Pantanal.
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(Segue-se exibição de imagens.)
Hoje nós estamos aqui integrando a Comitiva Pantanal no Pulso das Águas, no intuito de promover sensibilização e de chamar mais atenção, principalmente, para as ameaças que esse ecossistema, essa grande área úmida, vem sofrendo nos últimos anos, de forma bastante intensiva e às vezes até um pouco silenciosa. Então, é importante que possamos ter mais momentos como este, de integração com todas as iniciativas e instituições que estão trabalhando, e trabalhando arduamente, em defesa do Pantanal. Estamos muito felizes e muito gratos por este momento.
O SESC Pantanal, num panorama muito rápido, é pautado por três grandes eixos, que são a conservação da biodiversidade, a ação social e o turismo ecológico. Há 20 anos esse é um trabalho contínuo, ininterrupto, desde 1997, quando o SESC aterrissou lá no Pantanal e criou a Reserva Particular do Patrimônio Natural SESC Pantanal, a maior Reserva Particular de Patrimônio Natural do Brasil, com 108 mil hectares.
Depois da criação da reserva, outras unidades surgiram, em decorrência do sucesso que foi a criação desse projeto e da realização de pesquisas. Foi construído um hotel, que hoje é uma grande vitrine desse trabalho, e depois outras unidades, que integram não só o turismo, mas também e principalmente a ação social no Pantanal. Nós não fazemos nada sozinhos. Contamos com as comunidades pantaneiras e as privilegiamos, para estarem juntas nesse trabalho com o SESC.
O SESC Poconé fica na cidade de Poconé, e o Parque SESC Serra Azul, uma unidade mais recente, fica numa região muito sensível das cabeceiras que abastecem todo o Pantanal, na área de planalto. Então, conectamos Cerrado e Pantanal através dessa unidade, simbolicamente. Para quem não conhece essa região do Estado de Mato Grosso, nós estamos nos Municípios de Barão de Melgaço, Poconé e Rosário Oeste.
Estamos diante de um cenário, então, de ameaças e pressões muito intensas e muito graves. O SESC, que está há 20 anos nessa região do Pantanal, vem vivendo essa dinâmica muito de perto, está dentro dessa dinâmica, é um agente de transformação e sofre também com essa transformação rápida da paisagem. Aqui está uma imagem de parte da cidade de Poconé, uma cidade com quase 300 anos, com uma história e uma cultura tradicional riquíssima. Ela vem sendo consumida pela atividade da mineração. Os garimpos estão dentro da cidade, e não temos ideia de qual vai ser o cenário dessa cidade daqui a 10 ou 20 anos. Vinte anos talvez seja um horizonte muito longo, mas, principalmente nos próximos anos, não sabemos o que vai ser dessa região.
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Além disso, temos os incêndios florestais. Foram atingidos mais de mil quilômetros quadrados em 2019 e ainda há várias regiões do Pantanal em chamas, porque é uma região muito atípica. O incêndio continua queimando mesmo em locais que chove, por conta da matéria orgânica bastante densa. Todos os colegas que vieram do Pantanal estão com fuligem na roupa porque foi um fogo que realmente se alastrou e sobre o qual perdemos o controle. Na RPPN foram 9 mil hectares atingidos por esses incêndios, mas, fora da reserva, sabemos que foi bastante grave também.
Aqui esta imagem, só para que vocês entendam, é de dentro da RPPN, é o acero, uma linha limpa mecanizada que fazemos na área. Aqui é o fogo. Dois dias depois, ele pulou esse acero e atingiu esse ninho com esses tuiuiús, levando os filhotes. Foi quando realmente perdemos o controle dos incêndios.
Bom, e o que se perde diante de tantas ameaças? Temos dados que demonstram a riqueza que se perde. Só o SESC Pantanal recebe mais de 30 mil hóspedes, visitantes, a cada ano. É a população de Poconé, a cada ano, que atraímos, recebemos e que está consumindo, fazendo com que todo esse patrimônio seja um ativo ambiental, social e econômico.
Quanto à ação social, há que se observar o poder dessas comunidades, a riqueza de transformação, a riqueza econômica de produção de natureza, de cultura, para tornar o Pantanal realmente um produto de desenvolvimento.
Temos também modelos de eficiência. Aqui está a nossa usina fotovoltaica, com 1.200 placas fotovoltaicas, que têm capacidade de suprir até 50% da demanda energética do Hotel Sesc Porto Cercado.
Então, existem várias formas de demonstrarmos o quanto é importante, o quanto funciona e o quanto de resultado podemos ter se investirmos no Pantanal e se tivermos esse fortalecimento para conter ou, minimamente, controlar essas ameaças.
No que tange ao reconhecimento nacional e internacional do Pantanal, hoje a RPPN é zona núcleo da Reserva da Biosfera, reconhecida pela UNESCO, e também tem um sítio Ramsar, que é um reconhecimento internacional de áreas úmidas.
Nós perdemos muitos saberes, perdemos muitos conhecimentos que vêm sendo gerados, que entram na arena de discussão com esses diversos interesses para o Pantanal. Nós temos dados, nós temos informações, nós conhecemos o Pantanal. Isso não nos falta.
Precisamos, mais do que nunca, construir pontes, considerar o Pantanal planalto e planície. Muitas das ameaças que chegam ao Pantanal vêm do planalto, como a poluição de agrotóxicos advinda do plantio de monoculturas nas áreas do planalto, que é toda carreada para o Pantanal. Então, além dos incêndios, da monocultura e da mineração, há várias ameaças também que vêm das áreas de planalto.
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Esta região é o Parque Sesc Serra Azul. A imagem mostra uma cachoeira, que inclusive está fechada ao público por conta de sedimentos vindos dessas áreas de nascentes desprotegidas. O Parque Sesc Serra Azul recebe 17 mil visitantes por ano, e a tendência é esse número crescer.
E a nossa responsabilidade socioambiental deve ser com foco no ser humano. A proteção da biodiversidade é uma ação humana, com o uso dessa área; não é uma proteção da natureza intocada.
São muitos os pantanais, acho que somos muitos os pantaneiros. Nós hoje somos aqui a voz daqueles que não têm voz. Nós somos aqui a voz das matas, dos animais, das gerações que ainda estão por vir, e essa voz precisa de coro. Estamos aqui em busca de fortalecimento dessa voz e nós não vamos desistir.
O SR. PRESIDENTE (Rodrigo Agostinho. PSB - SP) - Passamos a palavra agora ao Júlio César Sampaio da Silva, Coordenador do Programa Cerrado Pantanal, da WWF-Brasil.
O SR. JÚLIO CÉSAR SAMPAIO DA SILVA - Muito boa tarde a todos, aos que estão aqui presentes e aos que estão nos assistindo pela Internet e pela TV.
Eu queria agradecer o convite ao Deputado Rodrigo. É uma satisfação estar aqui hoje, dia 12 de novembro, Dia do Pantanal. Acho que a Cristina deu o tom da nossa presença aqui. Essa comitiva vem ao Senado e à Câmara dos Deputados para ressaltar a importância desse bioma, desse ativo brasileiro, de toda essa riqueza que temos no País.
Vou falar um pouquinho sobre os desafios de conservação, e eu vou pedir licença aos que estão aqui presentes para ler um dos posicionamentos do grupo Observatório Pantanal, que o Marcos comentou, justamente sobre uma das principais ameaças que estão agora incidindo sobre o Pantanal, que é a mudança sobre o zoneamento ecológico da cana, com a possível entrada dessa cadeira produtiva naquela região. Trata-se de um posicionamento de mais de 30 organizações que trabalham em prol da conservação do Pantanal. Então, eu queria tomar a liberdade de fazer a leitura desse texto aqui.
(Segue-se exibição de imagens.)
O Pantanal fica, no imaginário das pessoas, como uma grande área úmida, mas só quem conhece, quem vivencia essa região entende como é essa dinâmica com as águas. O Pantanal é uma grande área úmida, é a maior área úmida na região tropical. Ele está dividido entre o Brasil, a Bolívia e o Paraguai. Então, esses três países compartilham esse território. Em alguns períodos do ano, o ambiente que presenciamos é essa área onde a água domina.
A paisagem do Pantanal é dinâmica e heterogênea, não é só água, não é só planície, vegetação herbácea, gramíneas, etc. A vegetação é bastante heterogênea, os ambientes são bastante heterogêneos. Quem conhece o Pantanal, quem estuda o Pantanal sabe que se fala em 12 tipos diferentes de Pantanal, e essa dinâmica é diferente em cada uma dessas regiões.
Trata-se de uma área essencial para a vida. O Pantanal é uma das regiões com maior número de aves migratórias. Um montante gigantesco de aves migratórias utiliza esse ambiente, num determinado período do ano, para sua passagem, sua migração. O Pantanal também é rico em biodiversidade.
São mais de 4.700 espécies de plantas, de peixes, de mamíferos que habitam o Pantanal, pontuando-o como uma área extremamente importante do ponto de vista da sua riqueza biológica.
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O Pantanal também é habitado por pessoas, o dito pantaneiro, que diz ser pantaneiro, bate no peito e se orgulha disso. Mas antes dessas pessoas, já havia outros lá, os povos indígenas, que já habitavam essa região. Eles conhecem e reconhecem essa dinâmica, adaptaram-se a essa dinâmica natural do Pantanal e respeitam essa dinâmica. Fato é que, dada a sua ocupação mais recente, que data de cerca de 350 anos atrás, quando os primeiros bandeirantes chegaram à região em busca de ouro, em busca de riquezas, essa região começou a ser ocupada, o gado começou a chegar e, de lá para cá, a modificação que percebemos no Pantanal foi uma manutenção de aproximadamente 83% da sua cobertura natural.
Alguém pode dizer: "Poxa, se perdemos 17%, isso não é muito". Se compararmos com outras áreas no Brasil e no mundo, como o Cerrado, em que mais da metade já foi substituída por cultivos, por plantios, etc., a maioria de nós reconhece a situação da Mata Atlântica como um bioma extremamente pressionado pela ocupação humana e que já perdeu uma grande parte do seu território, o Pantanal é sim um dos biomas brasileiros mais conservados, mas isso não é um status para nos deixar tranquilos, porque as ameaças que estão prestes a acontecer e que pressionam o Pantanal trazem a preocupação de várias organizações, de várias pessoas que vivem e dependem dessa região.
Só como exemplo, cito a discussão sobre a geração hidrelétrica na região. O potencial de produção de energia hidrelétrica na região é muito grande. Nós temos o mapa aqui da Bacia do Alto Paraguai. Os pontos que estamos vendo ali coloridos são projetos em diferentes estágios de concepção para a geração de energia, PCHs, hidrelétricas. Sem dúvida alguma, esses projetos, que somam em cerca de 153 projetos, se todos forem implementados, podem colapsar esse recurso essencial que chamamos de maior área úmida continental do planeta. Então, a dinâmica das águas do Pantanal vai ser seriamente afetada se todos esses projetos forem implementados tais quais esses estudos e esses planejamentos estão sendo feitos.
Portanto, a discussão e a reflexão sobre o impacto desses empreendimentos na dinâmica natural do Pantanal são superimportantes, e pedidos inclusive de discussão dos projetos de lei sobre o Pantanal que vêm sendo discutidos na Casa estão justamente tentando tratar e tentando resgatar pontos importantes como esses.
Sobre esse futuro que se espera do Pantanal, será que o Pantanal que queremos enquanto brasileiros, enquanto produtores, enquanto pantaneiros, para bater no peito e dizer com orgulho que somos pantaneiros, será que esse cenário do Pantanal como potencial de geração de energia hidrelétrica é o que queremos? Essa é uma reflexão.
Também sobre a dinâmica das águas, esse mapa mostra toda a Bacia do Rio Paraguai, que vai desde a região mais alta no Mato Grosso até o Paraguai, ali embaixo, onde já se soma ao Rio Paraná. Aqui, nas cores mais escuras e mais claras, temos as sub-bacias, que compõem essa grande bacia, e as bacias mais escuras são aquelas que mais contribuem para o aporte de água nessa região.
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Então, nós vemos as bacias ali no entorno de Cuiabá, no extremo norte da região do Mato Grosso e na região de Coxim. Na região de Anastácio e Aquidauana estão as sub-bacias que mais contribuem com a água que chega ao Rio Paraguai e consequentemente são responsáveis pela dinâmica natural do Pantanal. Portanto, cuidar dessas bacias, cuidar desses berços d'água é essencial para uma estratégia de conservação dessa região.
O mapa colorido ali do lado mostra a precipitação, o quanto chove nessa região. E se observarmos o círculo no centro, veremos que não é a área em que mais chove na América do Sul. Apesar de ser a maior área úmida continental do planeta, no Pantanal não chove tanto, se comparado com outras regiões da América do Sul.
Em termos de ocupação e de dinâmica de uso do solo, nessa figura, as áreas em vermelho são as que foram alteradas, as que foram desmatadas. Elas, hoje, de fato, geram riquezas, produzem alimentos, mas, se recordarmos a imagem anterior, essa região que está em vermelho é justamente a que estava em azul-escuro, as áreas que mais contribuem com as águas do Pantanal. Então, a qualidade e a integridade das nascentes nessa região são essenciais para a manutenção do Pantanal.
Nós precisamos de rios livres, nós precisamos de um Pantanal que pulse para que essa dinâmica possa se manter, e nós consigamos perceber e sentir o Pantanal não só nesta geração, mas também nas próximas gerações.
Eu queria aproveitar este último eslaide para ler o posicionamento das organizações do Observatório Pantanal.
O Observatório Pantanal é uma plataforma de organizações da sociedade civil. Atualmente cerca de 30 organizações compõem o Observatório Pantanal, com representações no Brasil, na Bolívia e no Paraguai. Então, a sociedade civil desses três países está se unindo. Há mais de 2 dois anos ela vem se mobilizando, justamente para se posicionar e garantir que os direitos para a conservação do Pantanal possam de fato ser implementados.
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A sociedade mal conseguiu avaliar todo o prejuízo provocado pelas catastróficas queimadas nas últimas semanas, e o governo brasileiro, por meio do Decreto nº 10.084, permitiu não só que a cadeia da cana-de-açúcar se instale no Pantanal, como também na Amazônia, e que seja realizada sem regulamentação nos demais biomas brasileiros.
Na semana do dia 12 de novembro, momento em que os holofotes se voltam para o Pantanal, data que foi instituída após o ambientalista Francisco Anselmo Gomes de Barros atear fogo no próprio corpo como protesto contra a permissão de implantação de usina de álcool no Pantanal, de fato, não há nada a comemorar.
Em termos de austeridade, a medida normativa jogou fora muitos recursos públicos baseados em ciência na elaboração do Zoneamento Agroecológico da cana-de-açúcar, o qual era o documento base que norteava e regulamentava a cultura da cana-de-açúcar no Brasil, elaborado com base na aptidão do solo (aptidão edáfica ou pedológica), Clima (aptidão climática — risco climático) e nas características da cultura.
Em 2018, a revista Science publicou uma carta que aborda as ameaças da liberação da cana-de-açúcar, destacando seus efeitos catastróficos para a biodiversidade e para os serviços ecossistêmicos. Entre os perigos da expansão dessa cultura em ambientes frágeis como os biomas Amazônia e Pantanal, pode-se citar:
1. Aumento da pressão sobre os ambientes naturais pelo desmatamento. Uma pesquisa mostrou a importância de se manter a proibição do cultivo da cana para impedir novos desmatamentos. A conversão de pastagens em plantio de cana diminui a emissão de gases de efeito estufa, porém, se a proibição deixa de existir, consequentemente o desmatamento aumenta e, com isso, as emissões também se incrementam. A exemplo do que foi comprovado na bacia hidrográfica do Paraná, vizinha à do Pantanal, a cultura da cana "empurrou" o gado para novas frentes de pastagens, aumentando a pressão nas áreas nativas de menor valor econômico, algo perfeitamente possível de ocorrer na BAP.
2. Aumento da degradação do solo pela erosão, devido ao maior tempo de exposição à chuva, ao vento e ao sol do que nas demais culturas e ao longo período de entressafra, com compactação do solo devido ao uso de maquinário pesado.
3. Quando o cultivo não é mecanizado, além dos impactos sociais, a queima é recorrente, e, se o Pantanal já sofre atualmente com os incêndios avassaladores, pode-se esperar ainda mais impacto a partir dessa prática.
4. O Pantanal é altamente dependente de seu fluxo de água, e a cultura da cana, além de utilizar muita água para irrigação durante a fase de crescimento da planta, ainda contamina tanto águas subterrâneas como águas superficiais, sem falar na contaminação por vinhoto, resíduo da industrialização da cana.
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As alegações do Governo brasileiro de que o Renovabio (Política Nacional de Biocombustíveis) seria um importante fator para impedir o aumento do desmatamento são postas em dúvida uma vez que a inserção das informações é voluntária e não há obrigações legais impostas aos agricultores.
Se, por um lado, o Governo brasileiro alega que o Decreto nº 6.961 estava defasado, ou apresentando algum problema, o correto seria abrir uma ampla discussão com especialistas para fazer a atualização dita necessária, e não suspender a regra por completo, de forma autoritária e sem apresentação de embasamento técnico e transparência adequada.
O Observatório Pantanal tem posicionamento contrário ao que está disposto no Decreto nº 10.084. Entende-se que é preciso manter o Zoneamento Agroecológico da cana-de-açúcar, concordando com outras organizações da sociedade civil que já se pronunciaram sobre o tema, como o Observatório do Clima e a Coalizão Clima, Floresta.
Portanto, o Observatório Pantanal solicita que se suspenda o Decreto nº 10.084, como forma de garantir à Nação brasileira o direito disposto na Constituição de 1988, em seu art. 225, de ter um meio ambiente ecologicamente equilibrado, sendo dever do poder público e da coletividade defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
O SR. PRESIDENTE (Rodrigo Agostinho. PSB - SP) - Há 82 internautas acompanhando ao vivo esta audiência. Recebemos um pedido no sentido de que as pessoas participem da campanha nacional em defesa do SESC, em www.sesc.ms/euvalorizo.
(Segue-se exibição de imagens.)
Observamos, por meio destas imagens, que o Pantanal é bastante complexo na sua biodiversidade. A diversidade de espécies é muito grande, seja em termos de vegetação, seja em termos de animais, mas há, dentro do Pantanal, uma relação muito boa entre essa diversidade e a atividade econômica que lá está instalada, como foi dito aqui, há pouco mais de 300 anos.
Na verdade, todo este potencial abre espaço para outra atividade, o turismo dentro da região, como foi mencionado aqui.
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Todos os títulos recebidos pelo Pantanal, entre eles o de Reserva da Biosfera e Patrimônio da Humanidade, não foram por acaso: foram fruto da singularidade e da qualidade do ambiente, o que nos propicia um diferencial em relação a qualquer outro ambiente, seja no Brasil, seja no mundo. No entanto, ele não é conhecido ou reconhecido.
Hoje, dia 12 de novembro, Dia do Pantanal, como foi dito pelo Júlio, lembra uma triste data: o dia 12 de novembro de 2005, um dia extremamente quente. Na época, eu tinha uma Elba e, quando eu estava indo para uma reunião, a bomba d'água estourou. Eu acabei sabendo da tragédia só depois, porque eu não consegui chegar a tempo à manifestação contra a cana-de-açúcar em Campo Grande.
Daí vem minha preocupação, desde 1980. Mato Grosso do Sul foi um dos primeiros Estados a ter, por assim dizer, uma ONG ambientalista, exatamente na luta contra a instalação de usinas de álcool na Bacia do Alto Paraguai, que resultou no Decreto nº 328, de 1982, que foi modificado em 2008, a partir de toda uma discussão sobre se deveria deixar ou não novas usinas se instalarem na Bacia do Alto Paraguai. Este Dia do Pantanal remete, então, àquele tempo em que a briga era por conta das usinas de álcool na Bacia do Alto Paraguai.
Como nós sabemos que o zoneamento é uma plataforma de planejamento, eu quero aproveitar que estamos na Câmara Federal para dizer que o que falta no Brasil é planejamento. Quando nós fazemos zoneamento, não é o Felipe, não é a Cristina, não é o Júlio, mas sim todos os que estão dentro da sociedade que fazem este planejamento. Quando você faz um zoneamento, ele é uma cadeia, em que todos os setores discutem a atividade. Nós temos que partir do princípio de que o zoneamento serve de planejamento para podermos instalar as atividades econômicas com base nas características edáficas, do solo, e em todas as características científicas e técnicas aceitas. A capacidade de suporte de cada região é definida pelo ambiente, e não pelas pessoas. Quando fazemos um zoneamento, nós estamos fazendo algo para planejar.
O Brasil tem dificuldades em planejamento. Em alguns momentos, eu digo que o Brasil é uma grande fashion week: qual é a moda da vez? O que está dando dinheiro? A partir daí, nós fazemos a atividade econômica acontecer onde quer que aconteça. De outro lado, quando nós fazemos um zoneamento, nós o fazemos com base nas características da capacidade de suporte do ambiente. Depois, o zoneamento, que recebeu recursos públicos e tudo, é simplesmente revogado. Isso não está correto.
Isso não pode acontecer. Não se trata de uma ideologia, mas sim de um planejamento, que, portanto, tem que ser observado de forma clara, para que possamos estabelecer de fato o que pode e o que não pode ocorrer na região em que foi feito o zoneamento.
Como foi dito, nós temos alguns riscos. O Pantanal ainda é um bom ambiente, relativamente protegido. Oitenta e quatro por cento da área ainda estão conservados, ou seja, são utilizados, mas não foram alterados e, portanto, continuam com a vegetação nativa. No entanto, esta área vem sendo diminuída ano a ano. A velocidade com que hoje está sendo transformado o Pantanal é de cinco campos de futebol por hora. É uma mudança muito significativa a que está acontecendo na região.
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Nós tivemos, apenas nos meses de junho, julho e agosto, 160 alertas de desmatamentos no Pantanal, com uma média de 66 hectares por alerta. Isso é algo significativo para um ambiente como o Pantanal, que ainda tem um potencial muito grande para ser utilizado e que, se utilizado de forma correta, vai gerar muito emprego e muita renda para a sociedade.
Recentemente, o IBGE lançou o limite da planície pantaneira. Se observarem este mapa, verão que na Região Norte, em Poconé e em Cáceres, houve diminuição da área do Pantanal, segundo o IBGE. Em compensação, na região mais ao sul do Pantanal, houve aumento de área. Então, aquele valor de 151 mil quilômetros deve ter alguma variação a partir de agora, por conta desta autorização do IBGE, porque aquilo foi resultado do novo limite. O Pantanal, apesar de tudo isso, ainda é um privilégio para nós, porque ele ainda tem 84% de sua área protegidos.
Nós fizemos, há pouco tempo, uma expedição pelo Pantanal para visitar projetos de conservação e de ecoturismo. Impressiona a riqueza que há no Pantanal. Para que possamos estabelecer uma política pública adequada, aqui eu falo aos Deputados. Deputada Bia, acho que é importantíssimo entender o quanto é privilegiado aquele ambiente, o quanto a atividade econômica do turismo na região rende para a sociedade local e o quanto isso será um ativo importante para o Estado de Mato Grosso do Sul e para o Estado de Mato Grosso. É de extrema importância entendermos estes aspectos e trabalharmos com vontade para criarmos mecanismos e políticas que fortaleçam o desenvolvimento do turismo naquela região.
Nos vinte e poucos dias em que percorremos o Pantanal, nós colhemos depoimentos, ouvimos histórias incríveis e visitamos projetos de conservação que ampliaram e potencializaram o turismo na região, projetos que transformam a região onde eles estão instalados em uma região rica. É disso que nós precisamos.
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15:41
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O Pantanal precisa ser conhecido e reconhecido pela classe política — pelos Deputados e pelos Senadores, pelos nossos Governadores e pelo nosso Presidente —, para que possa ser potencializado de fato pelo que ele merece. Foi isso que nós tentamos fazer aqui. Eu acho que, se conseguirmos no mínimo sensibilizar alguns, já estaremos ganhando muito nesta reunião do Dia do Pantanal.
O SR. PRESIDENTE (Rodrigo Agostinho. PSB - SP) - Quero cumprimentar o Felipe Augusto Dias pela fala, uma pessoa que está sempre nesta Comissão lutando pelo Pantanal.
Nós temos duas listas para as inscrições. Já temos a inscrição de representantes da sociedade civil e do Deputado Nilto Tatto e vamos passar as listas para que outras pessoas que tiverem interesse possam se inscrever. Nós conduziremos esta audiência pública até que comece a Ordem do Dia. Enquanto a Câmara não instalar a Ordem do Dia, nós vamos seguindo com a audiência normalmente.
Quero cumprimentar o Presidente da Mesa e os demais componentes, bem como todos os presentes, aos quais agradeço a participação. Quero agradecer o convite feito pelo Laércio, que, desde o primeiro momento, me convidou para participar desta reunião neste dia. É um privilégio e uma honra estar aqui hoje.
Antes de começar, eu gostaria de prestar um testemunho sobre o dia 12 de novembro de 2005. Eu presenciei todo aquele evento da morte do Franselmo. Eu estava chegando ao evento, a convite do Alessandro Menezes, da ECOA, que, juntamente com o Franselmo, organizava aquele dia. O evento foi marcado para próximo do meio-dia, na Rua 14 de Julho com a Barão do Rio Branco, e eu estava chegando bem no momento.
Eu vinha pensando em outras coisas, mas eu tinha percebido, numa visão periférica, que havia alguém se organizando num colchonete de algodão. Depois, ficamos sabendo que ele o tinha embebido com 40 litros de gasolina: ele estava arrumando o colchonete como se fosse fazer uma apresentação. Ele se sentou no colchonete e cruzou as pernas. Quando eu vi, já subia um cubo de fogo imenso, de mais ou menos dois metros e meio de altura, no colchonete inteiro. Dois taxistas estavam conversando, e eu pedi a eles que pegassem um extintor e fossem em direção à pessoa, pois ela tinha ateado fogo no corpo. Em nenhum momento ela tentou sair do colchonete. Ela ficou só falando. Eu estava a mais ou menos 100 metros. Eu não entendi o que ela falava, e ela ficou protestando, protestando, protestando. Isso aconteceu há 14 anos. Este foi um ato de desespero daquela pessoa. Foi desesperador! Eu fiquei mal por muito tempo. No outro dia, eu até procurei ajuda médica, porque eu não conseguia dormir, só ficava pensando no ato dela. Hoje, novamente outro fato: a cana no Pantanal.
Eu não era amigo dele, mas o conhecia de reuniões, de eventos, de atos de proteção ao meio ambiente. Eu fiquei muito mal durante muito tempo mesmo. Esse dia marcou a minha vida para sempre.
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Para acontecer o fogo, precisa-se de três elementos. Como fonte de calor, está aí o Sol, mas o Sol é só uma figura, uma fonte de calor. O Sol junto com o oxigênio e o combustível não causa incêndio florestal. Além disso, 99% dos incêndios florestais são ocasionados pelo homem, 1% é de causa natural — aqui, no Brasil, é raio. Normalmente, depois de um raio, cai uma chuva. Não quer dizer que sempre após um raio caia uma chuva. Quem conhece o Mato Grosso do Sul e conhece a Serra do Amolar sabe que todos os incêndios da Serra do Amolar são ocasionados por raio, e nem sempre chove lá. Há fogo que começa em cima, no cume da Serra do Amolar, onde não mora ninguém, onde não há ninguém colocando fogo para plantar, para rebrote de pasto, até porque lá em cima da Serra do Amolar não existe pasto. E inúmeros incêndios, na Serra do Amolar, começam com raio.
Danos diretos e indiretos à fauna. Estas são algumas imagens de animais mortos. Neste ano, no Pantanal, o que morreu de serpente, que os brigadistas registraram, é uma quantidade muito grande, além de jaguatiricas, tamanduás — é um animal muito lento e tem uma visão muito ruim. O melhor sentido do tamanduá é o olfato, que, com a fumaça, é um sentido prejudicado. Os tamanduás, em vez de correrem do fogo, correm para o fogo. Então, morrem bastantes tamanduás.
O incêndio retira o habitat dos animais, que não têm para onde ir, principalmente quando se queima uma unidade de conservação, que hoje em dia é quase uma ilha cercada de área produtiva. Quando se queima uma unidade de conservação, o prejuízo é maior, porque os animais que não morrem lá saem dessa área protegida e vão para campo aberto, ficando visíveis para os predadores e também para o ser humano.
Problemas ambientais regionais: morte de árvores, alteração do ecossistema e perda de biodiversidade.
Essa foto no canto superior à direita é de uma área de Floresta Amazônica que foi atingida pelo fogo. A Floresta Amazônica é extremamente sensível a incêndios. Ela não está adaptada, não precisa do fogo, é sensível ao fogo e morre, criando quase uma savanização e esse tipo de vegetação que nasce numa área de Floresta Amazônica.
Os efeitos da emissão dos gases são: efeito estufa, aquecimento global, aquecimento das cidades, desertificação.
Isto aqui é uma animação do aquecimento, do monóxido de carbono e do fogo ativo no mundo.
São 2 bilhões de toneladas de carbono por ano, segundo a fonte.
O fogo é bastante utilizado na pecuária, para limpeza e rebrota de pastagens e para o combate às pragas. O objetivo é um pasto verde, para colocar o gado, e também o combate às pragas.
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Na prevenção de incêndio, utiliza-se o fogo para realizar esse aceiro negro, colocando fogo em determinadas áreas — utiliza-se bastante isso em unidades de conservação, como o Parque Nacional das Emas e o da Chapada dos Veadeiros —, e também para evitar incêndio em áreas de reflorestamento. É utilizado também como estímulo à frutificação.
Vemos uma área atingida pelo incêndio florestal e uma área onde foi utilizada queima prescrita. O IBAMA, de um tempo para cá, desde 2014, há uns 5 anos, tem trabalhado muito com o Manejo Integrado do Fogo, que é o uso do fogo, através de queima prescrita, em determinadas áreas onde o fogo traz benefício, principalmente para evitar o incêndio florestal. O Manejo Integrado do Fogo é a integração entre o manejo do fogo (prevenção, preparação, combate e uso do fogo) — era isso o que fazíamos até pouco tempo atrás —; a cultura do fogo (necessidades sociais, econômicas e culturais do uso fogo) — por quê, para quê, quando e onde queimar, qual o objetivo —; e ecologia do fogo (sensibilidade, tolerância ou dependência das plantas e animais ao fogo).
É com esse triângulo do Manejo Integrado do Fogo que temos trabalhado lá no Estado do Mato Grosso do Sul. Na terra indígena kadiwéu, temos trabalhado já há 2 anos com esse Manejo Integrado do Fogo e, neste ano, com o aporte científico do Projeto Noleedi, do CNPq e do IBAMA, que tem financiado experimentos e pesquisas da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul. Houve um chamamento do CNPq, que tem trabalhado lá desde o começo do ano nesse Manejo Integrado do Fogo. Eles estão monitorando e analisando as queimas prescritas que têm sido realizadas.
No Brasil, muitas vegetações presentes nos Biomas Cerrado, Pantanal e Campos Sulinos apresentam características de dependência do fogo. Algumas áreas do Pantanal também têm uma vegetação que depende do fogo. É nessa área que temos que trabalhar.
Essa integração é extremamente necessária. Neste ano, o fogo queimou muito no Pantanal, queimou algumas reservas que estavam sem fogo há mais de 15 anos e algumas há mais de 20 anos. O último grande incêndio na Serra da Bodoquena, onde hoje é o Parque Nacional da Serra da Bodoquena, foi antes da criação do parque, em 1999. Então, já faz 20 anos que houve um grande incêndio naquela área.
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Com o fogo que ocorreu no Chile em 2017, morreram onze pessoas. Dessas onze pessoas, oito eram combatentes. Portanto, eram pessoas que tinham experiência com incêndio florestal, mas morreram.
Essa é uma série histórica do Bioma Pantanal. Este ano, 2019, é um ano com uma grande quantidade de focos de calor. Não é o pior ano. Muitas pessoas perguntam se este foi o pior ano da história. Não é o pior ano. Já tivemos anos piores. Eu acredito que este ano vai ficar muito próximo do ano de 2007. Observando esse gráfico, podemos ver que, a partir de 2007, havia uma tendência de queda no número de focos de calor, que este ano aumentou bastante. Isso ocorreu também porque as chuvas que viriam em setembro não vieram, assim como não vieram em outubro. Até agora, em novembro mesmo, choveu muito em determinadas áreas, mas em algumas áreas choveu muito pouco. Ali na região da BrPec e da Fazenda Bodoquena, choveu 100 milímetros. No Parque Estadual do Pantanal do Rio Negro, não deve ter chovido nem 10 milímetros. E são áreas muito próximas uma da outra.
No comparativo sazonal do bioma, temos essa régua. A vermelha é a máxima. O pior mês historicamente era agosto, mas, a partir de 2010, passou a ser setembro. A partir de 2010 até 2019, quase todos os meses de setembro foram piores que os meses de agosto — não porque em agosto diminuiu, mas porque em setembro aumentou bastante. E em outubro também. Outubro deste ano foi o pior outubro desde 2002. Então, há 17 anos, não queimava tanto no mês de outubro.
Esse mapa mostra onde temos brigadas. Em Mato Grosso do Sul, o Prevfogo tem cinco brigadas. Há uma brigada em Corumbá, que é especializada para trabalhar no Pantanal. Nós temos, em Porto Murtinho, duas brigadas indígenas: uma na Aldeia Alves de Barros e outra na Aldeia São João. Em Aquidauana, temos duas brigadas terenas: uma na Limão Verde, que é bem próxima da cidade, e uma que começou no ano passado — este é o segundo ano —, que é na Aldeia Taunay/Ipegue. Nós temos 91 brigadistas contratados este ano. Nós já tivemos 120, mas também já tivemos 39. Então, esse ano tivemos uma quantidade razoável.
Temos trabalhado bastante. Nós fazemos o registro, através de um formulário chamado Registro de Ocorrências de Incêndio (ROI). Neste ano, se verificarmos a média das brigadas, veremos que foi de dois ROIs por dia. Então, são dois combates por dia, mas todos os dias, desde a criação da brigada. São muitos combates mesmo. A brigada tem trabalhado de manhã, de tarde e de noite. Costumamos dizer que o incêndio florestal não funciona só em horário comercial.
Então, temos feito rotação de esquadrão, trabalhando de manhã, de tarde e de noite no combate. Também fazemos educação ambiental.
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Uma resolução de 2014 proíbe o uso do fogo de 1º de agosto a 30 de setembro, e no bioma Pantanal o período foi estendido até 31 de outubro. Este ano, o Secretário do Meio Ambiente, juntamente com o Superintendente, estenderam esse período no Pantanal até o final de novembro, devido às condições climáticas e à ocorrência de incêndios na região.
Neste eslaide vemos um trabalho feito pelo analista ambiental Alexandre, do PREVFOGO, sobre as áreas queimadas em 2010. No Município de Corumbá, foram queimados mais de 600 mil hectares em 117 dias, o que representa a média de 5.200 hectares por dia.
Estes dados são do site do INPE. Em outubro deste ano, a área queimada foi de 5.188 quilômetros quadrados, o equivalente a 518.800 hectares — só no mês de outubro, e não é o pior mês! Em 2019, 12,1% do bioma Pantanal foi queimado; ano passado, 2,1%. Comparando-se com o ano passado, este ano queimou-se bastante. Ano passado, foi extremamente tranquilo. Em 2005, queimaram-se 27.472 quilômetros quadrados de área. Como o Pantanal tem 150 mil quilômetros quadrados, então, este ano, até agora, foi queimado 12,1% do Pantanal.
Este é um gráfico que representa a maior concentração de focos de calor, desde 1999. É incrível, mas algumas áreas queimam seguidamente, por 2 anos. Por isso, o acúmulo de combustível no Pantanal independe de ter havido queimada no ano anterior ou não. Este ano ainda não fechamos o gráfico.
Com relação à régua de Ladário, as réguas sobre inundação, o gráfico mais alto foi o do ano passado. Quando o Pantanal está cheio, não pega fogo. Dizem que é porque tudo está inundado, mas não é. Principalmente, na nossa visão, é porque são retirados os acessos.
Como eu falei, em 99% dos casos, quem coloca fogo é o homem. É ele que acende a chama. Só o acúmulo de combustível não produz incêndio; só o fator umidade de combustível também não produz incêndio; só a ignição não produz grandes incêndios. Meteorologia causa incêndio pequeno e controlado. O grande incêndio, para acontecer, tem que ter combustível acumulado, a umidade tem que estar baixa, mas principalmente alguém tem que acender a chama para que ocorra um grande incêndio. São nesses fatores que nós temos que trabalhar.
Isso foi discutido muito no evento que ocorreu semana passada, de 28 de outubro a 1º de novembro, em Campo Grande.
O PREVFOGO está à disposição para trabalhar em parceria. Este ano, trabalhamos em parceria com grandes propriedades e organizações governamentais em nosso Estado. Temos pouca gente, 90 brigadistas não vão dar conta do trabalho.
Por isso, nós temos que criar polos, principalmente nas grandes propriedades, para capacitar os trabalhadores dessas fazendas e equipá-los para que façam o primeiro ataque. Mas o principal é a capacitação. O fogo é um assunto extremamente sério e só a vontade não resolve. Precisamos de pessoas qualificadas, capacitadas e equipadas para realizar esse combate e fazer, principalmente, o manejo integrado do fogo.
Muito obrigado.
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(Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Rodrigo Agostinho. PSB - SP) - Nós vamos começar pelos Parlamentares. O primeiro inscrito é o Deputado Nilto Tatto.
O SR. NILTO TATTO (PT - SP) - Quero saudar o nosso Presidente, Deputado Rodrigo Agostinho, e cumprimentar toda a Mesa e os expositores pela bela apresentação.
Eu começo dizendo que nós temos uma ameaça muito séria representada por esse decreto que libera o plantio de cana. Atrás da cana virão outras atividades econômicas que não deveriam entrar no Pantanal. É importante que se fale sobre essa visão míope presente hoje no Governo Bolsonaro, no Ministério do Meio Ambiente. Na verdade, nós não temos um Ministério do Meio Ambiente.
Aqui foi mostrado o Pantanal, a riqueza que há ali. O que há de bens comuns do povo brasileiro precisa ser cuidado, inclusive para as futuras gerações. E assim também é em relação a outros biomas. E nós não temos Ministro do Meio Ambiente, nós não temos Ministério do Meio Ambiente. Nós temos uma pasta que está subordinada à agenda que representa esse decreto para liberar o plantio de cana no Pantanal.
Eu e o Deputado Patrus Ananias demos entrada na Casa a projeto de decreto legislativo para tentar anular esse decreto que libera a plantação de cana no Pantanal e na Amazônia.
Presidente, eu estou aqui com uma tarefa, e talvez até extrapole o tempo, mas é importante. De certa forma, acho que há uma ausência na Mesa, que é a representação das comunidades locais. Todos colocaram bem o papel e a importância dos pantaneiros, mas eu acho essa participação importante.
Estou com uma carta da coordenação da Presidência do Conselho Nacional de Povos e Comunidades Tradicionais, da Claudia Sala de Pinho, que é pantaneira. Ela tinha pedido, inclusive, à Deputada Fernanda Melchionna para apresentá-la, mas S.Exa. está em missão no PARLASUL. Então, eu passo a ler a carta. Ela é importante até para complementar o informe desta audiência pública:
Nós comunidades tradicionais pantaneiras somos o próprio Pantanal e, neste dia, temos poucas comemorações e alguns desafios e reflexões a serem feitos. Somos uma coletividade de pessoas que vivem em uma das maiores áreas inundáveis do planeta, com modos de vida distintos e harmonizados pelos contrastes do ciclo das águas do Pantanal, permeados por conhecimentos biológicos, sociais, econômicos e culturais na percepção, uso e manejo dos bens naturais desse bioma.
Somos e sempre seremos os guardiões da biodiversidade pantaneira. Nossos ancestrais constituem a riqueza desse lugar. Formam-se as águas, o ar, a terra, e tudo que nela existe. Nos autodefinimos como comunidades tradicionais pantaneiras amparados legalmente no Decreto nº 6.040, de 2007, e na Convenção nº 169, da Organização Internacional do Trabalho.
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E, nesse sentido, a Rede de Comunidades Tradicionais Pantaneira, entidade representativa desse segmento nos Estados do Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, e que ocupa a presidência do Conselho Nacional de Povos e Comunidades Tradicionais, vem a este espaço manifestar:
Temos o direito à autoafirmação de nossa identidade como tradicional e de ser consultado sobre quaisquer temas, leis e empreendimentos que nos dizem respeito.
O Pantanal é nossa casa, é nosso lugar e de nossos ancestrais. Não invadam, não criem normas sem nos consultar. Queremos ter voz e vez nas discussões de política da Lei do Pantanal, que deve promover a preservação e a conservação dos bens ambientais, a melhoria e recuperação da qualidade ambiental, visando assegurar a manutenção da sustentabilidade e o bem-estar da população envolvida.
A nossa cultura pantaneira também contribui para o Pantanal que temos hoje. É necessário reconhecer, valorizar e proteger.
O Pantanal é toda a bacia do Alto Paraguai. Sem essa parte não tem como falar em conservação da planície e dos demais ambientes pantaneiros.
Precisamos da regularização fundiária dos territórios tradicionais. Queremos continuar no nosso lugar com dignidade e segurança.
É preciso refletir e agir sobre as mudanças climáticas. Em alguns lugares do Pantanal já se tem a falta de água, uma anormalidade do ciclo hidrológico do bioma, que para nós é ocasionada por muitas alterações, como o desmatamento e a monocultura da soja extensiva no planalto e também na planície, dentre outros.
Queremos que se incentive a manutenção e a conservação de áreas naturais mediante a criação de unidades de conservação, respeitando os territórios ocupados pelas comunidades tradicionais, pois temos práticas e conhecimentos de conservação e manejo do bioma.
O Decreto nº 6.961, de 2009, que estabelecia o zoneamento agroecológico da cana-de-açúcar no Pantanal, é uma conquista de movimentos sociais do Pantanal. A sua revogação é um retrocesso, possibilita o aumento do uso de agrotóxico e desequilíbrio do bioma, aumenta o desmatamento e a pressão sobre nosso território, afetando as diversas formas de vida e o nosso próprio modo de vida.
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16:09
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As comunidades tradicionais pantaneiras até o dia de hoje não são consideradas como afetadas pelos empreendimentos e não há sequer indenização dos danos causados ao modo de vida e ao bem viver das comunidades tradicionais.
É urgente a prevenção de incêndios no Pantanal e, principalmente, o diagnóstico dos impactos causados pelo fogo junto às comunidades tradicionais ocorridos neste ano.
Sabemos o rastro de devastação que fez em nossos territórios e em toda a biodiversidade, de onde a maioria das comunidades tira seu sustento alimentar, nutricional e econômico.
Precisamos de um plano de proteção e recuperação das nascentes e das APPs com plantas nativas para renascer as águas do Pantanal e renascer a vida.
Somos contra a cota zero. A pesca está relacionada com o modo de vida e cultura local da região pantaneira. É preciso incluir os pescadores e pescadoras que, em sua grande maioria, são de famílias de pescadores artesanais, seus olhares, experiência e voz sobre a capacidade de utilização e reposição do estoque pesqueiro, e o que significa o peixe na alimentação, na economia e bem viver das comunidades tradicionais.
Somos contra a atividade de mineração no Paraguai. Na região do Pantanal são explorados o ferro e o manganês, o calcário no Pantanal Sul, e o ouro e diamante no Pantanal Norte. A contaminação do solo com derivados de petróleo e com o mercúrio advindo da extração mineral nos garimpos é uma questão grave, principalmente porque são depositados na planície, afetando toda a bacia hidrográfica.
É preciso fomentar o manejo da fauna silvestre por meio de atividades comerciais de base comunitária envolvendo os detentores de conhecimentos tradicionais.
Queremos que considerem o Plano de Recursos Hídricos da Região Hidrográfica do Rio Paraguai 2018, com seu diagnóstico, prognóstico e plano de ação. Este é uma iniciativa do Conselho Nacional de Recursos Hídricos, que decidiu por sua elaboração por meio da Resolução nº 152, de 17 de dezembro de 2013.
O SR. PRESIDENTE (Rodrigo Agostinho. PSB - SP) - Passo a palavra à Deputada Bia Cavassa, que é nativa do Pantanal.
A SRA. BIA CAVASSA (PSDB - MS) - Sr. Presidente, quero cumprimentá-lo e estender os cumprimentos a todas as autoridades que compõem a Mesa, bem como às demais senhoras e senhores que aqui se encontram.
Sou pantaneira — sou nascida no Município de Corumbá — e vejo que nós desde cedo, muito cedo, aprendemos a cuidar, a conservar o Pantanal, e talvez essa seja a razão da harmonia que temos com o nosso meio ambiente lá. Mas vejo também com muita preocupação que não adianta nós fazermos a nossa parte. Eu vejo que essa consciência tem que ser de todos, principalmente dos que estão no nosso entorno, dos que estão nas fronteiras, que também têm que ter esse mesmo cuidado e essa mesma consciência com o meio ambiente. Todos que aqui estamos devemos ter o mesmo objetivo de sensibilizar, de chamar a atenção de todas as autoridades para que tenhamos um olhar diferenciado para esse bioma tão importante que é o Pantanal.
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Para mim, pantaneira, é muito triste ver o Pantanal ardendo em chamas, encoberto de fumaça, que causa prejuízos para a saúde da população dos Municípios atingidos pelas queimadas e, principalmente, para a nossa flora e fauna, que sofreram sérios transtornos também.
A Câmara tem que dar uma resposta para a sociedade. Por isso, como Parlamentar, fiz um requerimento ao Presidente desta Casa, para que se constitua uma Comissão Externa com o fim de averiguar e fiscalizar a situação dos incêndios que atingiram parques, áreas de proteção ambiental e de preservação permanente do Pantanal. Precisamos dar uma resposta eficiente. Como Parlamentar daquela região, vejo que essa é uma das medidas que precisavam ser tomadas.
O SR. PRESIDENTE (Rodrigo Agostinho. PSB - SP) - Obrigado, Deputada.
A SRA. CATIA NUNES DA CUNHA - Primeiro quero cumprimentar e desejar boa tarde ao Deputado Rodrigo Agostinho, Presidente da Comissão de Meio Ambiente desta Casa.
Desejo boa tarde também aos Srs. Deputados presentes, à Sra. Deputada, aos outros membros desta Casa e aos colegas.
A reflexão que faço é: o que temos a comemorar neste dia 12 de novembro? Estamos aqui, nesta Casa, prestando contas à sociedade dos nossos avanços, das nossas conquistas científicas e das nossas preocupações com o futuro do Pantanal. Estou aqui na qualidade de pesquisadora do Centro de Pesquisa do Pantanal associada ao Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Áreas Úmidas/CNPq - UFMT e também parceira do SESC Pantanal e também do Mulheres em Ação no Pantanal — MUPAN e Wetlands International nesses últimos tempos.
Acredito que alguns pontos devem ser comemorados. São pontos que proporcionam a condição de uma política pública acertada, justa, coerente, para um sistema diferente do que estamos acostumados a legislar, a estudar, que são os ecossistemas terrestres. O Pantanal não é um ecossistema terrestre. É um ecossistema de áreas úmidas. E a minha primeira pergunta é: por que temos tanto medo, na parte legal, de considerar o Pantanal como uma área úmida? Por que esse medo? É porque o fato de existir um ecossistema diferente é uma descoberta nova? Trabalhamos muito nisso, reunindo os marcos conceituais importantes para defender uma política justa para o Pantanal, entendê-lo na sua natureza. Essa é a diferença.
Trazemos outra coisa também para os nossos colegas cientistas e para a comunidade política desta honrosa Casa.
Se queremos traçar uma política para essa região, existe uma questão, um ponto focal que devemos começar a entender: o que nós cientistas chamamos de "caráter ecológico das áreas úmidas, ou do Pantanal", que difere do caráter ecológico do ecossistema terrestre, que nem sei qual é, porque temos outras demandas. Mas a minha área é a área úmida, e entender seu caráter ecológico é fundamental para não colapsarmos o sistema. Quando desenvolvemos uma política pública, essa é a joia que tem que ser preservada. Se interferirmos nesse caráter ecológico, que é a identidade do sistema, nós vamos colapsar os serviços ecossistêmicos do Pantanal. E é isso o que a natureza nos dá. Então, não podemos colapsá-lo.
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Dentro da comunidade científica, nosso maior desafio foi criar uma unidade gerenciável para o Pantanal, porque esse bioma é extremamente complexo, como nossos colegas já colocaram. Chove aqui, não chove ali; inunda aqui, não inunda ali. Então, há esse caráter de complexidade. E a primeira coisa que temos que fazer para administrar isso é quebrá-lo em unidades, para tirar essa complexidade, facilitar a forma de manejo, de uso. E nós conseguimos quebrá-lo em unidades. Nós buscamos isso, exatamente como acontece no Pantanal, em como um pantaneiro identifica a sua propriedade ou o seu rio ou a sua fazenda. Ele dá nomes. Ele gerencia, ele maneja de acordo com essas unidades. Essa é uma forma gerenciável sustentável. Nós estamos em outros tempos, então, temos que olhar isso. Essa é uma unidade de gestão, porque aí teremos características e serviços ecossistêmicos específicos de cada unidade.
Outra coisa que nós da comunidade estamos buscando são soluções sustentáveis. Existem duas coisas que já estão prontas e que podemos utilizar. Uma das questões trabalhadas por essas instituições é que nós temos problemas seriíssimos de invasão de lenhosas que impacta a economia de base, que é a criação de gado, por perda de área de pastagens nativas de alta qualidade. Então, nós trabalhamos e desenvolvemos um modelo de restauração ecológica desses campos, com base no manejo tradicional dos campos nativos. Por quê? Porque as pessoas já sabem como fazer. Não vamos reinventar a roda. Ela já existe. Vamos adequá-la a nossos tempos mais modernos.
Outra questão também é que, quando se fala em uso do Pantanal, sempre queremos importar modelos da Amazônia, do Cerrado ou de outros ecossistemas que não são parecidos com o Pantanal. Mas há duas espécies de plantas no Pantanal que têm uma qualidade madeireira excelente, que podemos usar, mas elas ocorrem em populações densas. Isso significa que são quase todas da mesma idade. Se eu uso o modelo tradicional usado em outras florestas, eu as dizimo, porque estão todas, mais ou menos, na mesma idade. Então, não é essa a condição.
Pode-se, sim, utilizá-las, porque as fazendas carecem, as pessoas da região carecem delas. Então, elas podem ser usadas na própria região. Existe um modelo de ciclo de corte, de diâmetro de corte especial para essas espécies, só que elas têm que ser usadas junto a outro conceito desenvolvido pela FAO para manejo florestal, que é o do uso múltiplo da floresta. No Pantanal, tem que haver o uso múltiplo daquele macro-hábitat ou daquele ecossistema em que há essas espécies. Deve-se associar o uso dessas espécies ao ciclo de corte, diâmetro de corte, em termos de ofertas das pastagens para criação de gado, ofertas de manutenção da qualidade da água, de manutenção da água, de todo o recurso aquático. Há um conjunto de serviços que aquele ambiente produz, e não podemos simplesmente eliminar tudo em função de um só tipo de uso. É diferente? É complexo? É difícil? Qualquer mudança, qualquer forma de uso fora do costume nosso, no começo, parece ser difícil, mas como é que as pessoas viveram lá tanto tempo e por que hoje está impossível, se é assim que eu posso dizer, viver lá? Porque se saiu do sistema. É a ele que nós temos que voltar.
Nós temos várias coisas para comemorar, mas eu não comemoro hoje, porque há três coisas que, no meu ponto de vista, são preocupantes. Faço uma provocação a esta Casa e a todos nós. Já se passaram 31 anos da promulgação da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, que, em seu Capítulo VI, Do meio ambiente, quando declara que o Pantanal é patrimônio nacional, fala que sua utilização far-se-á na forma de lei. Onde está essa lei? Por que não existe essa lei? O que está faltando para existir essa lei? Essa é uma obrigação desta Casa, por isso faço esta cobrança. E vocês têm pessoas que podem auxiliá-los, porque o estudo no Pantanal está muito avançado, há muita informação.
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Outra questão que eu também não comemoro é a da instabilidade, que eu chamo de instabilidade jurídica, porque as decisões que são tomadas no Brasil com base em estudos técnicos, como é o caso do zoneamento, de uma hora para a outra saem de cena, sem que ninguém fique sabendo ou tenha discutido. Isso vai contra o meu papel de cidadã, de brasileira. É muito importante que não tenhamos essas instabilidades.
Por último, como pesquisadora, como alguém que trabalha com produção de conhecimento, capacitação de pessoas, não há como comemorar quando um País não prioriza a pesquisa científica para as suas tomadas de decisão — decisões têm que ser tomadas com bases científicas —, quando recursos financeiros são retirados das instituições de pesquisa, de programas já instituídos que vêm dando resultado, sem nem se comentar, sem nem se discutir. Simplesmente se mudou. É como você falou: agora a moda é outra. Esperem aí! A produção é uma coisa séria para um país. Ela não pode ser de moda. Ela tem que ter um começo, um início e um fim. Terminou o programa? Aí, sim, muda-se, faz-se análise, submete-se às instituições a análise, faz-se acompanhamento, faz-se monitoramento, para ver se está sendo bem feito. Isso é justo, mas não o é usar essa outra forma.
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O SR. PRESIDENTE (Rodrigo Agostinho. PSB - SP) - Apenas quero comentar que nós estamos aqui na sala com o autor do projeto de lei sobre o Pantanal que tramita nesta Casa. Nós já tivemos um projeto de lei do Senador Blairo Maggi, que tramitou no Senado. Nós inclusive estamos aqui com o Relator da proposta que tramitou no Senado, que era o PL 750/2011, do Senado, que teve o Senador Pedro Chaves como Relator.
Nós temos em Mato Grosso do Sul uma lei própria que diz respeito ao zoneamento da cana-de-açúcar, a Lei nº 326, de 1982. E nós temos em Mato Grosso uma lei estadual sobre o Pantanal, que tem inúmeras lacunas, mas que é o instrumento que temos hoje: a Lei nº 8830, de 2008.
O SR. ALESSANDRO MOLON (PSB - RJ) - Muito obrigado, Presidente.
Cumprimento V.Exa., todos os membros da Mesa, todos os presentes, o Senador Pedro Chaves, que nos honra com a sua presença.
Primeiro, quero fazer um testemunho, Presidente Rodrigo Agostinho. Eu tive a oportunidade, em julho deste ano, de conhecer o Pantanal. Eu estive no SESC Pantanal — vejo aqui a Cristina, que trabalho no SESC Pantanal — e fiquei muitíssimo impressionado com a força, com a riqueza, com a biodiversidade, com a pujança da natureza pantaneira. Eu já sabia disto pelos estudos, pelas leituras, pelos biólogos, mas pude ver com os meus olhos a riqueza desse bioma e a importância de o Brasil proteger essa biodiversidade tão sensacional. É importante para o nosso País, para a nossa população, para o nosso povo. Os impactos da preservação do Pantanal vão além das nossas fronteiras. Sua preservação é uma contribuição que damos para o ecossistema de toda a região, para a América Latina e para o mundo. Nós precisamos aprovar esse projeto de lei. É fundamental proteger esse bioma o quanto antes.
Como estamos vendo, ações do Governo colocam em risco a sobrevivência do Pantanal. A revogação do decreto que tratava do zoneamento da produção de cana-de-açúcar, de alguma maneira, coloca no horizonte um risco para essa e para outras regiões e ameaça a própria força da marca do etanol brasileiro nos mercados exteriores. É uma medida insana, porque, além de colocar em risco a natureza, coloca em risco a própria produção de etanol. O etanol brasileiro é reconhecido como um etanol limpo. Ele tem uma marca de proteção da biodiversidade brasileira e vai perder essa marca. Quem entende disso está apavorado com essa medida.
Portanto, o Governo caminha na contramão da história, colocando em risco os interesses econômicos e também os interesses de preservação da biodiversidade brasileira. Trata-se de um perde-perde: ninguém ganha com isso.
Talvez só quem pense que o curto ou curtíssimo prazo é o que deve presidir as decisões brasileiras é que ache que essa pode ser uma medida positiva.
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Então, é fundamental reverter essa tendência, e o Congresso tem papel decisivo para isso. V.Exa., como Presidente da Comissão de Meio Ambiente, o Deputado Nilto Tatto, como Coordenador da nossa Frente Parlamentar Ambientalista, e todos os Parlamentares envolvidos com essa causa podem dar uma grande contribuição. É hora de o Congresso fazer aquilo que o Governo não está querendo fazer.
O Governo enfraquece a ciência e a tecnologia. Nós — 21 Líderes partidários e o Presidente da Câmara — publicamos um artigo no jornal O Globo manifestando que o Congresso defenderá a ciência e a tecnologia. O Governo retrocede na proteção ambiental. O Congresso deve afirmar a proteção ambiental, aprovar o projeto de lei do mar, aprovar o projeto de lei do Pantanal, entre outras várias medidas que temos aqui, para dizer: "Se o Governo não vai fazer, nós faremos, o Poder Legistativo fará". E esta sessão tem uma grande importância para isso, ao reunir forças políticas diversas aqui, ao reunir representantes da sociedade civil, representantes da academia.
Nós temos que proteger essa riqueza. É perfeitamente possível conciliar a proteção à natureza com a produção. Aqui é preciso superar a visão atrasada, pobre e, eu diria, até burra de que ou se protege, se preserva, ou se produz. Ao contrário, é fundamental a proteção, a preservação, para uma produção melhor, para uma produção sustentável, para um desenvolvimento sustentável, e não para um desenvolvimento que seja um voo de galinha, que decola aqui e cai ali na frente, como infelizmente se tem insistido em fazer no Brasil nos últimos anos.
É preciso mudar esse rumo, e para isso as nossas leis são fundamentais. Eu conto com a liderança de V.Exa. e com a liderança do Deputado Nilto Tatto, que também é um grande batalhador nessa causa, para, junto com a sociedade brasileira e com essa comitiva do Pantanal, a quem agradecemos — sentimo-nos honrados, a Casa ganha com a presença das senhoras e dos senhores aqui —, conseguirmos fazer avançar nossa pauta em defesa do Pantanal, essa grande riqueza brasileira.
O SR. PRESIDENTE (Rodrigo Agostinho. PSB - SP) - A próxima inscrita é a Áurea da Silva Garcia, da MUPAN e da Wetlands International.
A SRA. ÁUREA DA SILVA GARCIA - Senhoras e senhores legisladores, pesquisadores, representantes de organizações governamentais e não governamentais que atuam em defesa do nosso Pantanal, boa tarde.
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16:33
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Então, esse grupo de mulheres entusiasmadas, em agosto de 2000, cria a organização não governamental Mulheres em Ação no Pantanal. Desde então, nós temos atuado principalmente na nossa região transfronteiriça — Brasil, Bolívia e Paraguai —, onde está o nosso Pantanal, e buscamos o fortalecimento de lideranças, principalmente de mulheres, para que atuem nos processos de discussão, de decisão, de gestão das águas, de gestão territorial e de desenvolvimento local.
Inicialmente, com o Espaço Pantanal, entre as participações em grupos, essa atuação passa para outras regiões do Brasil e também da América Latina, consolidando-se em vários processos. Entre eles há alguns processos formativos, como, por exemplo, a formação em gênero, água e educação ambiental, que foi reconhecida. Hoje faz parte do compêndio de capacitação para igualdade de gênero da ONU Mulheres e também das experiências do Ibero MAB em relação à participação, à capacitação de mulheres e à atuação em reservas da biosfera.
Hoje, a nossa instituição está qualificada como OSCIP, e buscamos o fortalecimento e o trabalho em rede. Entre esses trabalhos em rede, uma outra iniciativa que nós estamos desenvolvendo é o Programa Corredor Azul, da Wetlands International, que conta com o apoio da DOB Ecology. Além do Pantanal, como a área focal, há esteiros do Iberá e Delta do Paraná, na Argentina.
Tudo isso é possível numa rede interinstitucional de organizações. Entre elas, várias estão aqui presentes: INAU, CPP, SESC Pantanal, WWF, SOS, IHP, Movimento Pantera Brasil, PREVFOGO. Estes são alguns dos parceiros que nos permitem dar segmento e olhar para o Pantanal enquanto um espaço de discussão, um espaço de proposição de estudos.
Entre alguns dos estudos, temos como destaque as ameaças aos marcos legais, a questão da proposta da hidrovia. Vamos inclusive disponibilizar alguns exemplares desse documento, desse estudo. Também discutimos os negócios sustentáveis, o ecoturismo e o fortalecimento de plataformas, como a que já foi apresentada hoje aqui: o Observatório Pantanal.
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Nesses primeiros 2 anos, buscamos construir essa base de dados a partir de estudos coordenados por vários pesquisadores, dentre eles a Kátia Nunes, que sempre esteve junto ao nosso programa.
Uma das metas desse programa foi o estabelecimento do escritório da Wetlands International no Brasil. A sede do escritório é em Campo Grande. Diferentemente de outras organizações, que escolhem o eixo Brasília-Rio-São Paulo, escolhemos estabelecer essa organização a partir do Pantanal, pela proximidade e pelas questões de aproximação entre os temas discutidos e trabalhados ao longo dos anos pela MUPAN e pela Wetlands.
Neste primeiro momento, o nosso programa é voltado para o Pantanal, mas, considerando as riquezas e as diferentes áreas úmidas, vemos como oportunidade a ampliação de área de atuação para as demais regiões do País.
Desde a criação, temos o Pantanal como um espaço de encantamento. Realizamos recentemente, no espaço do SESC, um encontro de todos os escritórios da Wetlands International. Durante esse encontro, os diretores dos escritórios tiveram a oportunidade de conhecer e vivenciar tanto as belezas do Pantanal, quanto os seus dilemas; a beleza da fauna e da flora, toda a riqueza da paisagem, e também os dilemas. Isso aconteceu num período crítico — a Cristina já relatou —, o período do fogo, que atingiu toda a região. Os diretores puderam também vivenciar a pressão na área urbana, considerando a ampliação da mineração, da extração de minérios na região de Poconé, que impacta a paisagem e também tem todo o viés econômico. Essa situação na região é bastante delicada. Com isso, o grupo de diretores elaborou uma carta de ação coletiva para cessar e prevenir novos incêndios no Pantanal, que vou distribuir e já está disponível nas nossas redes sociais.
O importante, que gostaria de destacar, foi a dimensão que tomaram esses incêndios e o período em que aconteceram.
Claro que demorou para ser noticiada, pelas mídias nacional e internacional, a problemática no Pantanal. Foi destaque a Região Amazônica, mas os incêndios na Região Pantaneira e no Cerrado foram muito prejudiciais tanto para as comunidades, quanto para os recursos naturais.
Nesse sentido, eu gostaria de fazer um convite aos pesquisadores, aos representantes de organizações aqui presentes, àqueles que quiserem conosco dar continuidade à discussão sobre os incêndios. A partir da lista de endereços eletrônicos que vocês disponibilizaram, enviaremos um convite para que participem, se tiverem interesse, de uma reunião virtual em que trataremos dessas questões.
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Meus agradecimentos a esta Casa por abrir este espaço. Não temos muito o que celebrar, no atual momento, em relação às várias questões judiciais e legais relativas aos incêndios. Mas com a rede de organizações de pesquisadores, juntamente com os legisladores, temos uma possibilidade de buscar alternativas para o nosso Pantanal e também para outras regiões, outros biomas.
O SR. PRESIDENTE (Rodrigo Agostinho. PSB - SP) - O próximo orador é o Sr. Angelo Rabelo, do Instituto Homem Pantaneiro.
O SR. ANGELO RABELO - Deputado Rodrigo, parabéns pela abertura. Eu acho que este é um fato a se comemorar: esta Casa abrir espaço para discutir as questões do Pantanal.
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E o Pantanal nos apresenta isso como uma oportunidade, porque nós temos uma história de ocupação de 300 anos, e isso foi marcado justamente por um grande pacto de harmonia. Nós estamos avançando justamente no conceito de produção de natureza numa região da Serra do Amolar. Nós, o instituto, somos o guardião da Serra do Amolar, com uma rede de parceiros de um sítio da humanidade. Com certeza, vamos ao encontro do trabalho que o SESC Pantanal vem fazendo no Mato Grosso. Nós conseguimos pensar de uma maneira uniforme.
Temos que nos preocupar, e a Deputada conhece bem isso, Deputado. Lamento não poder mostrar uma imagem, mas nós temos um rio que está com quase 200 quilômetros secos. É o Rio Taquari. Ele é a história da omissão de todos. Todos que discutiram o tema não foram capazes de tomar iniciativas que pudessem ir ao encontro da solução.
O Pantanal tem provocado isso, o que eu acho importante. Todos nós devemos tomar cuidado, porque, às vezes, o encanto com a arara-azul e com a onça-pintada provoca, nas pessoas que visitam, uma dissonância cognitiva, ou seja, perde-se a noção de que nós temos problemas, nós temos garimpo, nós temos um processo de ocupação violento no Planalto, que hoje inunda, no nosso Município — não é, Deputada? —, 1 milhão e meio de hectares. Mais de cem fazendas estão totalmente inviabilizadas economicamente.
Eu reitero o que a Dra. Catia colocou. Eu tive o privilégio de trabalhar com o Senador Pedro, acompanhando a discussão da Lei do Pantanal, que esta Casa retoma, o que é uma necessidade.
Concluo, Deputado, fazendo uma referência a uma personagem, a um homem pantaneiro ilustre: Abílio Leite de Barros, irmão do nosso poeta Manoel de Barros. O Dr. Abílio faleceu há pouco mais de 15 dias. Ele escreveu um livro chamado Lembranças Pantaneiras. Ele começa o livro dizendo: "Tenho pressa em escrever este livro porque sei que, das espécies ameaçadas, eu sou a maior delas". Então, a história do Pantanal é marcada pela presença do homem. Em qualquer relação em que ele não esteja presente, nós estaremos, sem dúvida nenhuma, caminhando para um colapso.
O SR. PRESIDENTE (Rodrigo Agostinho. PSB - SP) - Obrigado.
O SR. LEONARDO AVELINO - Sr. Deputado Rodrigo, quero parabenizar, por seu intermédio, esta Casa pela iniciativa de nos receber, pantaneiros que somos, para falarmos a respeito da nossa região.
Antes de falar pela Panthera, quero dizer que falo em nome do Pantanal. Eu sou da quarta geração de pantaneiros, sou criador de gado. Tenho uma pequena propriedade no interior do Pantanal e falo com o coração aqui, Sr. Deputado. E com o coração digo que, ao assumir a responsabilidade de tocar essa instituição que tem como função, propósito, defender a onça-pintada, nós nos preocupamos com a ciência. A primeira coisa que quis saber era se, afinal de contas, a onça-pintada traz ou não traz problema para o Pantanal. Para nossa surpresa, descobrimos que, só na região de Porto Jofre, onde fizemos estudo, a onça-pintada traz 57 vezes mais lucro do que prejuízo. Estima-se que os fazendeiros percam em torno de 500 mil reais por ano com perda de gado decorrente de ataque de onças, e o turismo, na região de Porto Jofre, hoje gera 27 milhões de reais –– isso só na região de Porto Jofre.
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Esse é um turismo que me impactou muito, e falo como pantaneiro. Na época da onça-pintada, entre agosto e outubro, quase não há mais pesca. De cada dez barcos, oito são de turistas. Há poucos pescadores na região. Eu perguntei uma vez para um desses piloteiros, que são, na verdade, hoje, os grandes responsáveis pela preservação da onça-pintada: "Por que você prefere trazer turista a trazer pescador?" "Ah, é porque eu recebo mais, eu não tenho que trabalhar à noite, eu forço a mim mesmo e ao meu filho a aprender uma língua estrangeira, eu me instruo, eu não tenho barco para limpar à noite. É um turismo de muito maior rentabilidade, além de receber em dólar, Sr. Deputado."
Digo que o turismo de observação de fauna é o turismo que mais cresce no mundo, e nós, brasileiros, ainda não nos atentamos a isso. O mundo olha para o Pantanal! O mundo olha para o Pantanal! Recebemos milhares de turistas o ano todo. E esses turistas que aqui vêm, muitas vezes, como foi bem dito aqui pelo meu querido amigo Rabelo, pouco percebem as inúmeras ameaças que rondam o Pantanal.
Nós já perdemos um rio, o Rio Taquari. Estamos com inúmeros problemas de assoreamento. Há várias regiões, parcelas do Pantanal que hoje não mais inundam, que têm um sistema hídrico que parece estar comprometido. Isso nos preocupa sobremaneira, porque falo como pantaneiro e brasileiro. Estamos perdendo a oportunidade de gerar divisas e riqueza com um novo paradigma mundial, que é o paradigma do desenvolvimento sustentável. É um paradigma mundial no qual o Brasil tem tudo para ser líder, para ser campeão.
Por isso, conclamo esta Casa, como aqueles que fizeram aqui anteriormente, para que assuma essa responsabilidade histórica. O Legislativo hoje, no Brasil, vive um momento ímpar, vive um momento histórico, tem uma oportunidade única. O Legislativo tem uma oportunidade única no Brasil neste momento histórico! Então, que assuma e cumpra este que é o desejo de todo pantaneiro: ver sua região preservada.
O SR. PRESIDENTE (Rodrigo Agostinho. PSB - SP) - Indago, antes de encerrar, ao Senador se gostaria de fazer o uso da palavra.
Para mim é uma grande alegria participar desta audiência pública. Quero dizer que estamos retomando, realmente, uma lei que certamente será consistente e dará segurança jurídica a todos aqueles que, de fato, procuram ir ao Pantanal para trabalhar com pousadas, trabalhar com turismo contemplativo. Eu achava a legislação do Blairo Maggi, o Projeto de Lei nº 750, de 2011, bastante consistente. Eu fui o Relator Substituto na época, fiz diversas audiências públicas — acho que foram pelo menos umas oito audiências públicas.
E naquelas audiências eu pude observar que havia, na verdade, uma angústia por parte dos pantaneiros em relação à invasão da soja e de outros produtos agrícolas no Pantanal, trazendo um impacto ambiental desastroso e irreversível.
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Foi o SOS Pantanal que levantou essa bandeira da legislação –– sou conselheiro do SOS Pantanal ––, extremamente importante. Lutamos muito por isso e conseguimos avançar bastante em relação à legislação. Inicialmente o projeto teve o seu andamento normal, mas ficou parado no final do ano passado, no final da minha gestão, na Comissão de Meio Ambiente do Senado. E agora eu vejo, com muito bons olhos, que a Câmara tem um projeto. Já vi inclusive o anteprojeto. Ele está muito bom. Eu acho que vai atender a todos os nossos pantaneiros.
A nossa intenção não é verificar, como falou o Rabelo, as lindas paisagens de araras-azuis, de onças, etc., como mostram os cartazes, e sim a situação do homem pantaneiro, a situação do Pantanal, a depredação dos rios, os impactos ambientais que ocorrem, as cabeceiras dos rios. São problemas gravíssimos, que nós temos que ter coragem de enfrentar.
Eu cheguei a colocar, numa sala de audiência pública, de um lado, os ambientalistas e, de outro lado, os produtores rurais. Foi, na verdade, um embate bastante complicado. Fizemos um debate em Cuiabá, ficamos até 2 horas da tarde discutindo e, se houvesse tempo, ficaríamos mais ainda. E ali chegamos à conclusão de que é necessário que o Congresso Nacional faça o seu trabalho.
Esta Casa tem, realmente, o sagrado dever de fazer uma lei consistente, porque é a melhor forma de nós pacificarmos tudo isso. Lembro que a ciência, a academia tem também um papel relevante em prol do Pantanal. Vemos aí a biopirataria, diversas coisas no Pantanal que hoje precisam ser corrigidas.
Então, mais uma vez, eu enfatizo a importância desse projeto que está aqui na Câmara dos Deputados, que deve prosperar. As audiências públicas são importantes porque robustecem, enriquecem muito o texto fundamental. Somente através de uma lei forte, com segurança jurídica, nós vamos resolver definitivamente esse problema.
O SR. PRESIDENTE (Rodrigo Agostinho. PSB - SP) - Agora nós vamos abrir a palavra para mais uma inscrição, a da Márcia, antes de finalizarmos.
Eu ouvi algumas posições aqui e gostaria que fossem mais bem esclarecidas, porque está havendo equívocos.
Primeiro equívoco: esse decreto da Presidência com relação à cana não afeta Mato Grosso do Sul, porque Mato Grosso do Sul tem uma lei. Não é decreto, Felipe. Pela Lei nº 328, de 1982, foi convalidado o zoneamento ecológico-econômico e pela Lei nº 3.839, de dezembro de 2009. Ele veda qualquer tipo de instalação de destilaria de álcool ou de usina de açúcar e o plantio de cana na planície pantaneira, com exceção da Depressão de Miranda.
Quanto à Depressão de Miranda, ele vai ter de obedecer a uma série de requisitos, inclusive com relação à recarga de aquífero. Dificilmente alguém teria habilidade ou estaria habilitado a instalar na região. Pega tanto a questão de planície como de planalto do Estado do Mato Grosso do Sul. Portanto, não é uma norma federal que vai desautorizar uma norma estadual, que é mais restritiva.
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Nós tivemos a grata satisfação de participar da elaboração dessa lei, por isso falo com certa propriedade.
A outra questão, sobre a qual falo rapidamente também, relaciona-se ao Projeto de Lei do Pantanal. Eu ouvi aqui a pesquisadora falando que nunca foi feito nenhum projeto. Há um equívoco. O projeto feito em 1989 pelo Estado do Mato Grosso do Sul tramitou nesta Casa, quando foi surpreendido com um projeto que passou no Senado Federal, de autoria do Senador Jayme Campos. o projeto veio para esta Casa, para a Câmara Federal. Como eu participava do CONAMA, nós provocamos a criação de uma Câmara Técnica temporária no CONAMA para discutir ambos os projetos. Foi homologada pelo CONAMA uma terceira proposta, que ratificava as duas propostas, tanto a de Mato Grosso como a de Mato Grosso do Sul. Foi encaminhada para cá, porque aqui tramitava.
O fato é que tivemos inclusive uma audiência pública. O Coronel Rabelo estava presente — não é, Coronel? ——, com o Deputado Luciano Pizzatto, que era o Relator do projeto, na época. Infelizmente, o projeto acabou se perdendo aqui na Casa, por várias e várias emendas que foram sendo recebidas, inclusive na época do Ministro Sarney. Daí pra frente — eu tenho até acompanhado esse projeto —, o projeto está perdido em algum lugar, e não sei no que deu isso. Por isso, Deputado Rodrigo Agostinho, acho que temos de resgatá-lo, porque foi realmente algo discutido com a comunidade, discutido com todas as pessoas, através de audiências. Essas pessoas participaram, não é, Coronel Rabelo? Eu acho que é interessante que se resgate alguma coisa daquilo que foi realmente discutido à época.
Estou chegando, estou estreando agora. E estou agora no Acqua Soluções Sustentáveis, onde estamos trabalhando inclusive com as questões do Taquari, exatamente com essa denominação Acqua Soluções Sustentáveis. Estamos verificando o que se pode fazer com relação àquela comunidade afetada pela situação que há mais de 40 anos vem ocorrendo com o Taquari.
O SR. PRESIDENTE (Rodrigo Agostinho. PSB - SP) - Agradeço os registros, Sra. Márcia, até porque estou no meu primeiro mandato como Deputado e desconhecia uma parte dessa história. Apesar de ser apaixonado também pelo Pantanal, não sou pantaneiro, sou um turista no Pantanal, que visito sempre que posso. Fico feliz de podermos resgatar nossa história.
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Nós tivemos uma participação alta pela Internet. Vamos trabalhar para que esta audiência seja veiculada também na TV Câmara.
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