1ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA 56 ª LEGISLATURA
Comissão de Educação
(Audiência Pública Ordinária)
Em 5 de Novembro de 2019 (Terça-Feira)
às 10 horas
Horário (Texto com redação final.)
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O SR. PRESIDENTE (Professor Alcides. Bloco/PP - GO) - Bom dia a todos e todas.
Declaro aberta a presente reunião de audiência pública da Comissão de Educação, atendendo ao Requerimento nº 219, de 2019, de nossa autoria, aprovado em 14 de agosto, com o tema Cobranças de Mensalidade na Transferência de Alunos, objeto do Projeto de Lei nº 2.521, de 2011.
Convido para a Mesa os seguintes convidados: Mauro Grimaldo da Silva, da Confederação Nacional dos Estabelecimentos de Ensino — CONFENEN; e Bruno Coimbra, Assessor Jurídico da Associação Brasileira de Mantenedores de Ensino Superior.
A Sra. Amábile Pacios, da Federação Nacional das Escolas Particulares — FENEP, ficou de chegar um pouco mais tarde.
Quero agradecer a presença do colega Deputado Glauber e demais presentes.
Informo também que o Ministério da Educação foi convidado para participar desta audiência, mas respondeu que a temática estava fora de sua competência.
Antes de passar a palavra aos convidados, informo que a reunião está sendo gravada para posterior transcrição. Por isso, solicito a todos que forem usar da palavra que falem ao microfone.
Para melhor ordenamento dos trabalhos, adotaremos os seguintes critérios: cada expositor terá o prazo de 20 minutos para sua exposição, não podendo ser aparteado; o debate será aberto ao final da última palestra; e as perguntas deverão se restringir ao assunto da exposição.
Informo aos Parlamentares que a lista de inscrição para os debates encontra-se na nossa mesa de apoio. Solicito aos Deputados interessados em interpelar os palestrantes que se inscrevam previamente.
Informo às pessoas presentes que quiserem formular perguntas aos participantes que as façam por escrito e entreguem ao pessoal da nossa mesa de apoio. Caso haja tempo, tentaremos responder a todas as perguntas.
Por fim, antes de passar a palavra aos convidados, informo que esta audiência é interativa e está sendo transmitida ao vivo, pela Internet, tendo sido aberto um chat para participação dos internautas, que poderão enviar suas perguntas aos Parlamentares. Lembro aos internautas que eles podem votar nas perguntas e que aquelas que forem melhor ranqueadas também serão apresentadas aos palestrantes.
Concedo a palavra ao Sr. Mauro Grimaldo da Silva, da Confederação Nacional dos Estabelecimentos de Ensino — CONFENEN.
O SR. MAURO GRIMALDO DA SILVA - Exmo. Deputado Professor Alcides, digníssimo autor do requerimento desta audiência pública, Dr. Bruno Coimbra e todos os demais presentes, um bom-dia.
A Confederação Nacional dos Estabelecimentos de Ensino — CONFENEN agradece o honroso convite para participar desta audiência pública a respeito do substitutivo ao Projeto de Lei nº 2.521, de 2011, apresentado pela ilustre Deputada Professora Marcivania.
A CONFENEN completa, neste ano, 75 anos de existência. Ela surgiu como Federação Nacional dos Estabelecimentos de Ensino — FENEN, durante o 1º Congresso Nacional dos Diretores de Estabelecimentos de Ensino Secundário e Comercial, e, em 1977, transferiu e fixou a sua sede nesta Capital Federal.
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Sempre ativa nas causas da educação nacional, a FENEN trabalhou intensamente durante a Constituinte de 88, preservando e ampliando os direitos da escola privada, e sempre se pautou pela defesa incondicional do ensino de livre iniciativa e da liberdade de ensinar e de aprender, preservando-se a coexistência das escolas públicas e privadas.
Em 1990, a FENEN transformou-se em CONFENEN, reconhecida, em âmbito nacional, como entidade máxima e única de representação da educação privada em todos os seus níveis e modalidades.
Na qualidade de representante maior da educação privada em todos os níveis, a CONFENEN abrange 43 mil instituições de ensino, o que representa, segundo dados do INEP, 22,3% do total das instituições de educação básica e 89,4% das instituições de ensino superior. Vê-se, pois, a grandeza do ensino de livre iniciativa e sua importância para o desenvolvimento e crescimento econômico desta Nação de grandes proporções territoriais e de muitas diferenças regionais.
O ato de educar é direito natural e inalienável da família, cada uma com sua opção filosófica e sua crença, seus valores, princípios e propósitos, respeitando-se a individualidade de cada um dos brasileiros. E a escola privada constitui-se uma opção.
Ao Estado cabe oferecer a todos os cidadãos meios para que eles possam exercer sua opção educacional, assegurando-lhes a escola gratuita. Mas a educação não pertence ao Estado, não é um monopólio estatal, pois a Constituição Federal assegura o ensino de livre iniciativa. Diz ela em seu art. 209:
Art. 209. O ensino é livre à iniciativa privada, atendidas as seguintes condições:
I - cumprimento das normas gerais da educação nacional;
II - autorização e avaliação de qualidade pelo Poder Público.
O ensino, portanto, é livre à iniciativa privada desde que haja autorização pelo poder público e que os estabelecimentos de ensino cumpram as normas gerais da educação nacional e submetam-se à avaliação de qualidade realizada pelo órgão de ensino competente, o MEC, as secretarias e os conselhos de educação.
Assim, a Constituição Federal contempla o ensino de livre iniciativa, afastando qualquer pensamento que trate o ensino privado como concessão ou delegação, notadamente porque o Estado não detém o monopólio do ensino.
Evidentemente, todas as escolas privadas, em todas as suas formas de constituição jurídica, com ou sem finalidade lucrativa, para um regular funcionamento, estão sujeitas a regramento constitucional e infraconstitucional, especialmente a Lei nº 9.394, de 1996, que trata das diretrizes e bases da educação nacional. Elas estão sujeitas ainda ao cumprimento das normas do Direito Civil e de proteção do consumidor, que possuem regras mais do que suficientes a reger a relação contratual entre os alunos ou seus representantes legais e a escola particular.
É conveniente ressaltar que as normas gerais da educação nacional mencionadas no art. 209 da Constituição Federal não se confundem com matéria econômico-financeira de preços e de custos. Aqui surge a questão central desta audiência pública, que é o substitutivo ao Projeto de Lei nº 2.521, de 2011, oferecido pela Ilustríssima Deputada Professora Marcivania.
A audiência foi requerida em razão de o substitutivo apresentado a esta Comissão de Educação nem sequer tratar da ementa do projeto originário do Senado Federal e, sim, direcionar a questão à obrigatoriedade de se anexar a planilha de custos da escola ao contrato de matrícula, além de outras questões sem qualquer relação com o projeto aprovado por aquela Casa.
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Além disso, o substitutivo ao projeto de lei traz, em seu bojo, inconstitucionalidades latentes e está na contramão dos princípios estatuídos pela Lei nº 13.874, de 2019, a Lei da Liberdade Econômica, recentemente aprovada pelo Legislativo nacional. Ele também estabelece tratamento não isonômico às escolas de livre iniciativa ao impor-lhes obrigações não previstas para outros segmentos privados.
Tendo em vista, pois, o disposto na Constituição Federal e nas leis de mercado, o substitutivo não é apenas inconstitucional, mas também antieconômico, e visa, sem dúvida, ao controle dos preços das mensalidades escolares, à ingerência estatal na relação contratual privada entre alunos e escola e também à ingerência na administração da escola privada.
Vejamos: há propostas de alterações e acréscimos de parágrafos ao art. 1º da Lei nº 9.870, entre eles o § 4º, que estabelece a obrigatoriedade de se anexar ao contrato a planilha de custos, com um demonstrativo no qual o estabelecimento de ensino explicitará as melhorias em seus serviços educacionais.
A primeira questão a ser destacada é que o texto contraria os princípios da livre concorrência ao determinar que cada escola anexe ao contrato uma planilha de custos com explicitação das melhorias em seus serviços educacionais, o que se trata de uma verdadeira intervenção do Estado na escola de livre iniciativa. Além disso, o texto determina a abertura do sigilo fiscal e dos projetos de melhoria, expondo-os à concorrência predatória, com a qual as pequenas e médias escolas vêm sofrendo pela atuação dos grupos educacionais.
A Constituição autoriza a intervenção no domínio econômico para evitar, por exemplo, a dominação de mercados —monopólio, oligopólio e cartel — ou a eliminação da concorrência. Na medida em que se obriga que a escola a fazer a abertura da planilha de custos e a explicitação dos projetos de melhoria dos serviços e de processos pedagógicos, é evidente que isso se torna público, com a possibilidade de que o concorrente conheça as práticas que serão por ela adotadas e, a partir de então, adote práticas visando à concorrência desleal.
O texto proposto caminha, portanto, em sentido contrário ao determinar a anexação da planilha de custos à proposta de contrato, bem como a explicitação do planejamento de melhorias, possibilitando, assim, a violação do sigilo de dados contábeis e de segredos empresariais. Vê-se que o pretendido acréscimo do § 4º ao art. 1º da Lei nº 9.870 trata-se, em verdade, de medida de controle de preços das mensalidades escolares, o que não condiz com o regramento constitucional que assegura o exercício do ensino de livre iniciativa.
O § 5º, que se pretende acrescer à lei na redação proposta, estabelece a faculdade de apresentação de datas de pagamentos alternativos. Trata-se de uma faculdade já exercida hoje, na medida em que a fixação dessas datas insere-se na autonomia privada de cada instituição: pode ser o dia 1º, o dia 5, o dia 10, o dia 20, enfim. Isso depende da organização do fluxo de caixa de cada estabelecimento privado de ensino. Todavia, a questão está afeta à contratação e não traz qualquer prejuízo às partes. Não há problema.
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Os §§ 8º, 9º e 10 tratam de determinação de negociação do valor das mensalidades escolares, com previsão de instalação de comissão de encargos educacionais. Os dispositivos promovem verdadeira interferência nas instituições educacionais. O objetivo, ao que nos parece, é o controle de preço das mensalidades, estabelecendo ainda a possibilidade de instalação de comissão ad hoc de encargos educacionais. Além disso, os dispositivos trazem mais ônus às escolas, os quais se refletirão na planilha de custos, com possível elevação do preço de mensalidades escolares. São, portanto, medidas também antieconômicas.
Cria-se ainda a possibilidade de a própria escola, após a fixação do preço da anuidade ou semestralidade escolar, contestar o reajuste, que deve ser definido com base em planilha de custos, como a própria lei já determina desde 1999 e antes mesmo disso. No caso de revisão, a vigência será retroativa à data da aplicação do reajuste contestado. Todavia, não se estabelece em quais hipóteses a escola poderá considerar o reajuste como insuficiente. No caso, tanto os alunos, seus representantes ou associação de pais e alunos como a escola poderão contestar o reajuste, caso entendam que ele é abusivo ou insuficiente. No entanto, como a escola vai contestar um reajuste que ela mesma definiu com base em sua planilha de custos, considerando-se que há regras próprias para se chegar a esse valor?
Também não está claro o que será considerado abusivo, uma vez que o preço é fixado com base na planilha de custos. Então, se existe a planilha de custos elaborada pela escola, dentro da sua realidade, observados os demais critérios que a lei determina, o que será considerado abusivo? O que extrapolar o que a planilha de custos apurar? O que extrapolar o índice oficial de inflação? Isso não está claro. Aliás, não existem parâmetros objetivos a definir tais questões. E lembro que a apuração da anuidade ou da semestralidade decorre da variação de custo de cada instituição.
Observa-se que a legislação sobre a liberdade econômica, recentemente aprovada, estabelece, em seu art. 3º, inciso III, como essencial para o desenvolvimento e o crescimento econômico do País, entre outros, o direito de definir livremente, em mercados não regulados, o preço de produtos e de serviços como consequência de alterações da oferta e da demanda. Para que não fiquem dúvidas, o ensino de livre iniciativa, embora haja regramento específico sobre definição de preço, é um segmento não regulado, pois não está inserido nas atividades consideradas monopólio ou prerrogativa do Estado, arroladas nos arts. 20, 21, 175 e 178 da Constituição Federal. Nesse sentido, todas as disposições atinentes à formação de preços dos serviços educacionais prestados por particular devem seguir o disposto na Lei da Liberdade Econômica, ou seja, os preços podem ser definidos livremente, sem qualquer interferência estatal ou mesmo dos próprios contratantes.
A de se ponderar que o texto dos parágrafos que se tenciona inserir na Lei nº 9.870, de 1999, retiram a autonomia e a liberdade das instituições de ensino para definir o preço da anuidade ou da semestralidade escolar, promovendo verdadeira ingerência na organização das instituições. Isso também nada favorecerá o aluno ou seu representante legal. Pelo contrário, poderá acarretar-lhes acréscimo ao preço original, uma vez que se estabelece retroatividade à data de aplicação do reajuste, com os ônus daí decorrentes. Ademais, nem sequer está explícito no projeto se a eventual negociação do valor da anuidade ou da semestralidade seria individual ou coletiva. O § 11 excepciona dessa obrigatoriedade de negociação e de instalação de comissão ad hoc as cooperativas educacionais. Mas cooperativa educacional é escola, da mesma forma que todas as demais, lembrando que as instituições de ensino podem assumir diversificadas formas de constituição jurídica. Então, não se justifica, no caso, excepcionar as cooperativas educacionais, que nada mais são do que escolas privadas, como todas as outras.
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Os §§ 12 e 13 vedam a cobrança de duas parcelas no mesmo mês e determinam que o valor relativo à matrícula esteja inserido no valor total anual ou semestral. Cria-se mais uma parcela relativa à matrícula, embora o projeto substitutivo mencione que ela seria a primeira parcela já inserida no valor total. Ora, a própria lei já determina que o que se contrata é uma anuidade ou semestralidade escolar. A primeira parcela paga no ato da matrícula não significa a matrícula, uma vez que a matrícula é a contratação de todo o serviço.
A contratação dos serviços educacionais se dá com a matrícula, como dito. Não existe contratação de mensalidade escolar. Estabelece-se e cobra-se um valor, um preço único por um todo: série anual ou período letivo semestral. Inexiste, portanto, valor pago pela matrícula que se constituirá, conforme a proposta, a primeira das parcelas. Vejam que a Lei nº 9.870 determina a contratação do serviço no ato da matrícula, quando, em geral, paga-se a primeira parcela da semestralidade ou anuidade.
Não existe também cobrança antecipada de mensalidade, mesmo porque a lei não trata de mensalidade escolar, e, sim, de uma semestralidade ou anuidade, contratada no ato da matrícula, a qual será dividida para pagamento em 6 ou 12 parcelas. Então, no ato da contratação, já existe a definição das datas de pagamento.
Como já foi dito, a escola cobra um preço fixo por um todo, e não por serviços prestados. Se cobrasse por serviços prestados, o pagamento só deveria ser feito nos meses de aulas e atividades, após o término da aula, da atividade ou da prova, e não haveria um valor semestral ou anual dividido em parcelas. O semestre letivo ou série anual constitui, portanto, serviço global prestado continua, gradual e coordenadamente durante certo período, sem subdivisão. Ressalta-se ainda que a data de pagamento da parcela é previamente definida, como já foi dito.
Por fim, a vedação de cobrança antecipada é flagrante interferência estatal na escola de livre iniciativa, o que contraria a Constituição Federal, mesmo porque o próprio contratante pode querer fazer o pagamento antecipado. Como isso ficaria se a lei vedar a cobrança antecipada das mensalidades?
O § 14 estabelece o valor que a escola poderá reter em caso de desistência antes do início das aulas. O texto do substitutivo faz referência a valor de parcela paga a título de matrícula. Como já exposto, a lei determina a contratação de anuidade ou semestralidade escolar. Então, não existe pagamento a título de matrícula. O que se cobra é uma parcela da anuidade ou da semestralidade escolar.
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No § 15, proíbe-se a cobrança de quaisquer ônus financeiros adicionais ao pagamento das parcelas da anuidade ou semestralidade vencidas até a rescisão, ou seja, está se proibindo que as escolas cobrem, em caso de desistência antecipada sem motivo justificado, uma multa pelo não cumprimento do contrato. Ora, a matrícula enseja uma série de procedimentos e ônus à escola: dispêndio com pessoal, horas de trabalho, o próprio processamento e formalização da matrícula. Mas, de acordo com o projeto, não se pode estabelecer qualquer penalidade para o caso de rescisão antecipada.
Isso traz uma série de transtornos, porque se abre espaço para a concorrência desleal e predatória, na medida em que hoje o mercado já pratica, em muitos casos, o assédio direto a alunos de outras instituições. Essa é uma prática nefasta que vem trazendo grandes transtornos aos estabelecimentos, principalmente àqueles que realmente prezam por um ensino de qualidade e que não têm poder econômico para combater essas práticas. Então, evidentemente, a rescisão antecipada causa prejuízo à escola.
Aqui há um sério problema, porque o próprio Código Civil e também o Código de Defesa do Consumidor preveem cláusula penal em caso de rescisão e de não cumprimento de obrigação livremente pactuada. Isso está sendo vedado pelo projeto.
Por fim, a alteração que se propõe ao art. 7º da Lei nº 9.870 — reduzir pela metade o percentual de adesão para propositura de ação coletiva, passando-o de 20% para 10% — privilegia a decisão tomada ou apoiada por uma minoria. Não se demonstra razoável o percentual proposto.
Então, Deputado, essas são as considerações que a CONFENEN traz aqui para esta audiência pública. Esperamos que elas sejam levadas em consideração na apreciação do substitutivo ao Projeto de Lei nº 2.521, de 2011.
Muito obrigado a todos.
O SR. PRESIDENTE (Professor Alcides. Bloco/PP - GO) - Dr. Mauro Grimaldo da Silva, agradecemos suas palavras. Muito obrigado.
Agora vamos passar a palavra ao Bruno Coimbra.
O SR. BRUNO COIMBRA - Bom dia a todos. Bom dia, Deputado Professor Alcides. Gostaria de agradecer o convite em nome do Prof. Celso Niskier, Presidente da ABMES.
A ABMES vem acompanhando este projeto desde a sua origem. Inclusive, como apontado pelo colega Mauro, quando o projeto nasceu, em síntese, ele pretendia que o aluno que se transferisse para outra instituição no meio do semestre tivesse que pagar só as parcelas até o momento da rescisão do contrato. Isso também é abordado no substitutivo.
Nós tivemos uma oportunidade de conversar com a Deputada Professora Marcivania sobre os detalhes do processo. De fato, foram vários os substitutivos apresentados, houve várias alterações no curso da instrução deste projeto de lei.
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Conversando com a Deputada Professora Marcivania, nós levamos as contribuições que percebemos, na linha dos apontamentos feitos pela CONFENEN. Muito provavelmente, esse projeto virá criando um cenário de encarecimento dos procedimentos atinentes à mensalidade ou servirá até para que a inadimplência aumente, o que já é um problema notório, de pública notoriedade em relação ao setor privado.
Eu já fui contemplado pelas palavras do Prof. Mauro em relação aos detalhes do projeto. Eu trouxe aqui uma contribuição, Deputado Professor Alcides, apenas para tentarmos criar um paralelo, para que entendamos a complexidade disso operacionalmente dentro das instituições de ensino. Na ABMES, refiro-me mais propriamente às instituições de ensino superior. A fala da CONFENEN é até mais abrangente, porque toca também na educação básica.
Em relação às instituições de ensino superior, no final de 2017 tramitou um dos projetos que teve maior movimentação, digamos assim, aqui nesta Casa, o da reformulação do FIES. O João acompanhou também essa reformulação, toda essa discussão. Houve uma discussão muito ampla aqui. Uma das reformulações, no âmbito do FIES, foi a de que a coparticipação do estudante fosse paga por meio de boleto à Caixa Econômica Federal. Para aquela parte que não era financiada pelo Governo, para aquela parte que é honrada diretamente pelo estudante, eles criaram todo um procedimento que tinha como única justificativa — não digo que não seja relevante — o fato de ser um boleto, o que criaria uma cultura de pagamento, uma adimplência maior em relação à parte não financiada pelo Governo. Encerro aqui a fala em relação ao FIES. Quis fazer apenas um paralelo, para que eu trouxesse para este exemplo. Aqui, parece-me, nós estamos criando elementos e mecanismos que vão servir ao propósito de não criar uma cultura de pagamento.
Nós também estamos diante de uma diminuição do FIES. Seguramente, os alunos irão migrar mais para a estrutura de pagamento com recursos próprios. Acreditamos e defendemos que o FIES de voltar a ser impulsionado por esta Casa, pelo Senado e pelo Planalto, mas isso não é algo que parece se aproximar. Portanto, muito provavelmente nós vamos ter mais alunos que vão honrar os seus encargos educacionais com recursos próprios. Nessa perspectiva de cultura de pagamento, e aqui eu estou atraindo o exemplo do FIES, parece-me que esse projeto não vai criar essa cultura, na contramão disso tudo. Ele muito provavelmente vai facilitar ou induzir o estudante a utilizar algum dos mecanismos que estão aqui elencados para o adimplemento da sua mensalidade.
É claro que aqui nós também consideramos que a questão econômico-financeira do País leva a escolhas, e infelizmente, às vezes, a escolha é tirar a educação da planilha de custos da família. Em geral, essa é uma das primeiras coisas a ser cortada. E quando é cortada, por exemplo, na educação básica, há uma migração. Essa migração comprovadamente aconteceu nos últimos 4 anos pelo menos, quando o estudante saiu das instituições privadas, principalmente das básicas, e foi buscar uma vaga na pública.
Será que isso também é um desejo nosso? Será que não é melhor nós otimizarmos os procedimentos internos das instituições. E pontuo aqui, Deputado Professor Alcides, a pontuação. Sei que a educação é uma pauta do Deputado. Já estivemos aqui lado a lado, em relação a outras discussões. E essa aqui me parece não ser diferente, porque a sustentabilidade financeira da instituição está conectada umbilicalmente com a questão da qualidade. Isso é inarredável em qualquer discussão a respeito da sistemática adotada dentro de uma instituição de ensino, seja da educação básica, seja da educação superior.
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Um ponto já mencionado pelo Prof. Mauro relaciona-se à criação de uma comissão ad hoc. Conversamos com a Deputada Professora Marcivania sobre o assunto e externamos as nossas preocupações. Isso, já no seu start, é algo que vai criar custos no âmbito da instituição e vai criar procedimentos, e não há uma clareza de qual é o alvo desse procedimento.
Há até esta preocupação em relação a isto: se está aquém ou além do que já está planilhado pelas instituições, com uma preocupação de referencial muito grave, a de publicar a estratégia da instituição de alocação dos seus recursos. O Prof. Mauro fez um apontamento de que já se tem a obrigação dessa planilha. Nós até conversamos com a relatoria sobre vincular isso ao contrato. Já fica disponibilizada a planilha de custos da instituição. Contudo, eu ter que externar a minha estratégia de alocação desses recursos, onde eu irei otimizar, se eu estou indo mais para a educação à distância ou se eu estou incrementando os meus custos na área da saúde... Para instituições de pequeno e de médio porte, que são a maior parte das associadas da ABMES, que são a maior parte das que estão ofertando — é claro que nós temos pelo menos cinco ou seis grandes grupos educacionais, que já têm toda a sua estrutura —, o impacto dessa lei é muito relevante. E nós fomos muito incisivos em relação a isso nos diálogos que já tivemos sobre o assunto. Esse impacto é muito mais relevante para uma pequena ou média instituição. No cotidiano de uma instituição de 500 ou 600 alunos, o impacto é enorme, até porque uma comissão de pais e alunos ou a comunidade acadêmica ali envolvida pode levar uma discussão para que se passe a fazer eleição do que seja prioridade para a comunidade acadêmica, e não ser técnica e pedagogicamente definida pela instituição acadêmica e seus profissionais a alocação desses recursos.
Fazemos outros apontamentos. Outros pontos nos causaram estranheza, inclusive em relação à forma como evoluíram. Cito o § 12. Nós sabemos que há pais que são servidores públicos, cuja remuneração é mensal e bem organizada. Há previsibilidade para efetuar o pagamento das mensalidades. E há profissionais liberais que, por exemplo, podem receber montantes no curso do semestre. Nós iremos impedir, por exemplo, que esse profissional liberal que recebeu uma herança, que recebeu um valor de honorários ou que recebeu algum recurso extraordinário procure a instituição e diga: "Eu quero antecipar o meu semestre". A instituição, dentro da sua liberalidade, se assim desejar, se desejar dar um desconto para essa pessoa que quer antecipar todo o semestre ou até o ano todo, com base nesse § 12 estaríamos agindo de forma ilegal.
Além disso, como foi dito diversas vezes pelo Prof. Mauro, há direta interferência na estrutura, nas decisões de uma instituição de ensino superior, o que não acontece em nenhum outro setor. É claro que a educação tem um relevo enorme na sociedade. Nós sabemos disso. Esta Comissão tem um volume de trabalho muito intenso, mas creio que a relevância da educação tem que servir para que nós encaminhemos questões para impulsionar, implementar e otimizar a oferta, e não questões para clara interferência no que as instituições estão programando e projetando para a oferta. Há outro ponto, Prof. Alcides, e já vou-me encaminhando também para a conclusão das nossas contribuições. Refiro-me à matrícula, porque também nos causa até estranheza a discussão em cima disso. Vou retomar o projeto na sua origem. Na sua origem, o projeto dizia, em síntese, o seguinte: se o aluno chegou ali no terceiro ou quarto mês daquela semestralidade e decidiu ir para outra instituição, ele pagará só até aquele período. Ele fica devendo ou, às vezes, vai inadimplir. Ele se muda para outra instituição e dá sequência ali à sua semestralidade. Isso é um pouco diferente em relação às instituições que ofertam educação básica. Na superior, o que ocorre é que nós conhecemos até casos limites: o aluno foi-se transferindo, nunca pagou nenhuma instituição e se formou. Já é matéria da lei, eu não posso desligar aquele estudante dentro do semestre. Nós temos algumas reflexões a respeito disso, mas não é o mote desse projeto de lei. Mas, no limite, o que acontece, por exemplo, e isso atinge também a educação básica, é que o aluno que estudou até o terceiro semestre impactou uma vaga. Isso é considerado em quase todas as lógicas de prestação de serviço em que eu tenho uma entrada e não tenho como fazer a substituição desse aluno. Por exemplo, do terceiro semestre em diante, é absoluto prejuízo para as instituições de ensino. Eu não tenho a reposição daquela vaga ou dificilmente vou ter a reposição daquela vaga, porque pode acontecer nos diversos semestres. Eu não tenho condições, por exemplo, de abrir um processo eletivo específico para aquele estudante. Imaginem que eu tive a invasão de um estudante, que foi atraído, conforme a fala do Prof. Mauro, pelos concorrentes que têm margem para fazer ofertas no meio do semestre e atrair aquele estudante, que vai transferido para aquela instituição. Eu não vou repor aquela vaga. Vou continuar com o meu custo fixo daquela oferta. Isso é muito claro para todo mundo. Ali é um prejuízo consolidado para a instituição de ensino.
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Esse projeto, para além de manter essa lógica, essa estrutura, traz — e aqui vou usar o termo em seu sentido pejorativo mesmo — uma burocratização para o sistema de cobrança de mensalidade, de estabelecimento da mensalidade. No nosso sentir, muito provavelmente o efeito colateral inequívoco vai ser, sim, o aumento da inadimplência, o engessamento de formas inovadoras e dinâmicas, e da internacionalização. Tudo isso é o que o Ministério da Educação e os Conselhos Estaduais preconizam para as instituições de ensino. Então, eu vou engessar a instituição no momento em que estou pedindo para ela inovação, internacionalização, empenho de mais recursos, para que consiga concorrer num mercado cada vez até mais internacionalizado. Como é que eu vou fazer mobilidade acadêmica, se tenho todo o engessamento da minha opção de alocação de recursos?
A ABMES assim enxerga esse projeto, de fato — e desculpem-me a redundância: o projeto vai burocratizar. Este é um norte que não nos parece o mais adequado. E não nos parece o mais adequado especialmente em relação à pequena e à média instituição de ensino, como são propriamente as de ensino superior, no caso da ABMES, que venho representar aqui.
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Como eu já disse, ela vem mantendo, aqui no § 5º, o ônus adicional ao pagamento das parcelas de anuidade ou semestralidade vencidas até a data da rescisão. Então, aquele aluno que participou do vestibular, comprometeu uma vaga daquela instituição de ensino e pretende a sua transferência, por quaisquer que sejam os motivos, afeta o equilíbrio financeiro da instituição. É claro que a transferência é uma liberalidade desse estudante. Eu não quero crer que nós vamos impedir a transferência do estudante. Não é esse o tom, nem é essa a pretensão da discussão acerca desta matéria, mas gostaria que houvesse uma sensibilidade e uma percepção muito clara de quais são os efeitos disso na sustentabilidade financeira das pequenas e médias instituições.
Eu reitero, Deputado Professor Alcides, e sei da sensibilidade do senhor em relação às matérias de cunho educacional, que a relevância desta não é diferente.
A ABMES segue também dialogando com a Deputada Professora Marcivania. Em alguns pontos, já percebemos que há uma possibilidade de avançarmos no diálogo para que essa lei sirva ao propósito de ter a inadimplência como um problema, porque ela é um problema para as instituições, mas que não busquemos uma solução cujo efeito colateral seja um cenário pior do que o que já estamos enfrentando.
Eu reitero, em nome do Prof. Celso Niskier, o agradecimento pelo convite para participar desta audiência pública. É uma grande satisfação poder contribuir com as discussões no âmbito desta Casa.
Temos outras pautas de grande relevância. Esta é uma delas. Confiamos em que, a partir desta discussão e das contribuições do setor, nós possamos construir uma legislação que otimize o cenário, que contribua para o problema que já estamos enfrentando.
Como eu já disse, já conversamos com a Deputada Relatora, temos todo esse histórico da evolução dessa norma, e a ABMES segue à disposição e absolutamente interessada nessas pautas.
Só para finalizar, Deputado, quero dizer que creio que não por acaso o Ministério da Educação não tenha vindo. Não deve ser interesse — e aqui uso a expressão “não deve” no sentido de "a Constituição espera que não" — que o Estado interfira diretamente nas operações internas de uma instituição de ensino. Então, inclusive, com a negativa de presença do Ministério da Educação, estou fazendo uma suposição, com o que foi trazido pelo Prof. Mauro em relação ao que a nossa Constituição define, de que não é interesse do Estado vir aqui e criar mecanismos para que ele interfira diretamente nas nossas operações. Creio que inclusive a ausência do Ministério da Educação tenha significado nesta audiência pública.
Muito obrigado, Deputado Professor Alcides.
Seguimos à disposição.
O SR. PRESIDENTE (Professor Alcides. Bloco/PP - GO) - Queremos agradecer a você, Bruno Coimbra, da ABMES, e dizer-lhe que nós, realmente, comungamos do mesmo raciocínio seu e do Prof. Mauro de que o Ministério da Educação não tem interesse em interferir nas instituições privadas ou engessá-las. E falo não só das universidades, como também das escolas privadas de primeiro e segundo grau.
O único Deputado que estava aqui, o Deputado Glauber Braga, que apresentou o substitutivo, retirou-se.
Se houver alguém que queria questionar algo, fazer alguma pergunta, para que nós possamos continuar com a audiência pública, fique à vontade.
Agradecemos aos nossos debatedores, o Mauro Grimaldo, da CONFENEN, e o Prof. Bruno Coimbra, da ABMES.
Alguém gostaria de se manifestar? (Pausa.)
Quando nós pedimos para fazer esta audiência pública, tínhamos observado alguns pontos
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de inconstitucionalidade, que foram bem explicitados pelo Mauro.
O Mauro fez um relatório conciso, trazendo todas as invasões do substitutivo apresentado pelo nosso colega Deputado Glauber Braga, Relator da matéria, cuja autora é a Deputada Professora Marcivania.
Logicamente, com essas questões expostas, nós sentimos e percebemos que vamos rejeitar o projeto, para que possamos fazer outro, porque, se nós rejeitarmos o substitutivo e aprovarmos o teor da matéria, ela também terá alguns vícios que terminarão prejudicando as instituições. Então, o mais certo é rejeitar todo o projeto, para que possamos apresentar outra proposição, com o auxílio de vocês, e, assim atender as faculdades de forma ampla.
Eu realmente sou contrário a esta matéria. Foi por isso que solicitei esta audiência pública, para discutirmos todos esses parâmetros. A matéria ficou bem discutida, bem debatida, e acho que ela deve voltar para o Plenário da Comissão o mais breve possível, para que nós possamos tomar posição e fazer um trabalho de rejeição dela.
Agradeço ao Mauro, ao Bruno e a todos os presentes.
Até uma próxima oportunidade.
Muito obrigado.
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