1ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA 56 ª LEGISLATURA
Comissão de Educação
(Seminário - 1º Dia)
Em 29 de Outubro de 2019 (Terça-Feira)
às 9 horas
Horário (Texto com redação final.)
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A SRA. PRESIDENTE (Margarida Salomão. PT - MG) - Bom dia a todas e a todos.
Declaro abertos os trabalhos do seminário O Papel da Universidade Pública no Desenvolvimento da Ciência e Tecnologia, da Educação e do Conhecimento. Este seminário é promovido pela Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática em conjunto com a Comissão de Educação da Câmara. Foi convocado em virtude da aprovação dos Requerimentos nºs 119 e 138, de 2019, da minha autoria, na Comissão de Ciência e Tecnologia, e do Requerimento nº 227, de 2019, também da minha autoria, na Comissão de Educação. Na Comissão de Ciência e Tecnologia, os nossos requerimentos foram subscritos pelos Deputados Vinicius Poit, do Partido Novo; Márcio Jerry, do PCdoB; Ted Conti, do PSD; e Vitor Lippi, do PSDB.
Informo que este seminário está sendo transmitido ao vivo pela Internet, em formato interativo, e pode ser acessado pelo sítio eletrônico da Câmara dos Deputados e da Comissão. Por meio da plataforma, internautas poderão encaminhar perguntas aos palestrantes.
Comunico ainda que as apresentações em multimídia serão disponibilizadas para consulta na página eletrônica da Comissão de Ciência e Tecnologia da Câmara dos Deputados.
Estamos aguardando a chegada de algumas pessoas, mas, para prestigiar os pontuais, vamos dar início ao primeiro painel de debates, que tem como tema Autonomia, Gestão e Democracia, para cuja exposição convido para compor a mesa o Reitor Roberto Salles, ex-Reitor da Universidade Federal Fluminense e coordenador do grupo de trabalho da Câmara dos Deputados destinado a acompanhar e avaliar o sistema universitário brasileiro. Muito bem-vindo, Prof. Roberto Salles. (Palmas.)
Convido também a Profa. Dra. Maria Emília Walter, Decana de Pesquisa e Inovação da Universidade de Brasília, que representa aqui a Reitora da UnB, Profa. Márcia Abrahão. (Palmas.)
O Prof. Luiz Antônio Cunha, como todos sabemos uma autoridade de grande eminência no campo dos estudos da educação brasileira, está se deslocando para cá. Mas, como nós precisamos dar início aos nossos trabalhos, vamos começar sem ele. Ele se juntará a nós depois. Aqui na Câmara a dinâmica é assim mesmo, uma pessoa entra, outra sai, e isso não prejudica a qualidade das nossas deliberações.
O Reitor Amaro Lins, da Universidade Federal de Pernambuco, que foi meu colega quando eu era Reitora, infelizmente não poderá participar deste seminário.
Agora vamos esclarecer os procedimentos.
Cada palestrante terá até 15 minutos para a sua exposição. Após as apresentações, será concedida a palavra aos Parlamentares, respeitada a ordem de inscrição, para formularem suas perguntas, no prazo de até 3 minutos. Os palestrantes disporão do mesmo tempo para resposta. Caso ainda haja disponibilidade de tempo, os palestrantes poderão responder a questionamentos de internautas e do público presente, participação que eu encorajo. As perguntas serão dirigidas por escrito à Mesa, e para tanto há formulários à disposição na bancada de apoio aqui à minha direita. Ao final de cada debate, os convidados e os painelistas terão um tempo para suas considerações finais.
09:31
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Feitos esses esclarecimentos, vou dar início às apresentações. Passo a palavra, em primeiro lugar, à professora Maria Emília Walter.
A SRA. MARIA EMÍLIA WALTER - Bom dia a todos e a todas.
Primeiro, eu gostaria de agradecer a oportunidade de estar aqui e poder fazer este debate tão importante hoje para a nossa vida.
Eu trouxe pronta a minha apresentação. Vou falar daqui. É cacoete de professor.
(Segue-se exibição de imagens.)
Vou falar sobre autonomia, gestão e democracia, mas vou começar com o conceito de ecossistema de inovação. Talvez todas as pessoas aqui saibam esse conceito, mas acho importante ressaltá-lo porque, participando desses debates aqui, deparei-me com frases do tipo "O Brasil não faz inovação porque as universidades não têm inovação, etc." Então, achei melhor começar com esse conceito.
O ecossistema de inovação é hoje uma quíntupla hélice. Ele começou com uma tríplice hélice, clássica, que todos conhecem: academia, governo e setor privado. A sociedade e tecnologias sociais foram incorporadas, e ultimamente foi incorporado ainda o conceito de meio ambiente. No Brasil, falta entendimento claro do papel desses entes diferentes e faltam essas interfaces também. Todos têm mais ou menos alguma interface, mas isso não está bem construído no País.
Eu vou citar alguns dados da UnB, que é uma representante da classe das nossas universidades públicas brasileiras. Estou focando as universidades públicas sem, absolutamente, desmerecer o setor privado e as comunitárias.
Então, sobre a UnB, nós somos a quinta universidade federal de acordo com o QS World Rankings e, de acordo com o THE, somos a oitava melhor universidade federal no Brasil. Apesar de todas as críticas que fazemos a esses rankings, etc., isso já demonstra nossa excelência. Possuímos localização geográfica privilegiada, porque estamos na Capital do País, com todas as embaixadas, etc., e temos pesquisadores de diversas nacionalidades compondo o corpo docente e discente.
Vou falar de algumas ações institucionais no sentido da inovação. Vou focar nesta discussão a inovação, que está tão falada hoje no País.
Na UnB, por uma questão histórica, nossas pró-reitorias são chamadas de decanatos. Então, nós temos o Decanato de Pesquisa e Inovação, que abriga a nossa agência de inovação, o CDT, em atuação já há uns 30 anos, não exatamente dessa forma; temos uma Diretoria de Pesquisa, que faz o contato entre a universidade e os grupos de pesquisa, etc.; e temos uma parte administrativa.
09:35
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Nós fazemos essa interface com a universidade através dos demais decanatos, ou pró-reitorias, de Graduação, Pós-Graduação e Extensão.
Aí estão os pilares da universidade: ensino, pesquisa e extensão.
Estamos terminando de discutir a política de inovação da UnB. Eu vou apresentar para vocês um pouquinho mais adiante o Plano de Internacionalização de 2018 a 2022, dentro de um programa da CAPES chamado CAPES-PrInt. Nós estruturamos a nossa internacionalização dessa maneira.
Temos um corpo de pesquisadores diversificados nas três grandes áreas do conhecimento: ciências exatas, ciências da vida e ciências sociais e humanas.
Temos mais de 6.500 projetos de pesquisa, muitos com cooperação internacional. Desse total, 32%, mais ou menos, são financiados por agências de fomento nacionais e internacionais, órgãos públicos, empresas, etc. Grande parte desses projetos inclui parcerias internacionais com Canadá, Estados Unidos, países europeus e da América Latina, de uma maneira geral.
Temos uma produtividade científica muito relevante: 21% são bolsistas de produtividade do CNPq. Tivemos, de 2013 a 2018, mais de 20 mil publicações em periódicos qualificados, reportados em bases de dados internacionais. Quase a metade, 42%, está nos estratos superiores do Qualis-CAPES. A produção científica é crescente, com aumento de quase 20% nesse período.
Outra coisa que se veicula hoje: nosso impacto vem crescendo. A UnB é um exemplo de como vem funcionando a academia. Nós acompanhamos o resto do País. Estamos hoje entre os maiores publicadores de artigos científicos do mundo. Mas, de fato, isso não se traduz numa inovação, pois ainda estamos muito abaixo nos rankings.
Temos aí outros números, que eu não vou ficar repetindo.
Temos 153 cursos de graduação e 92 programas de pós-graduação, compostos por 156 cursos de pós-graduação. Temos 90 cursos de mestrado e 66 cursos de doutorado, fora os Institutos Nacionais de Ciência e Tecnologia. Nós temos quatro coordenações e dezenas de outros professores participando de INCTs — para quem não sabe, esses INCTs são ligados ao MCTIC e são grupos de excelência em pesquisa. Isso tudo está permeando o ensino, a pesquisa e a extensão.
Nós categorizamos os nossos laboratórios. Estamos fazendo uma categorização também no sentido de otimizar a sua manutenção e de possibilitar outras ações dentro da universidade.
O que importa nesta tabela é o total que está em vermelhinho, à esquerda: nós temos mais 860 laboratórios de ensino, pesquisa e extensão, dos quais mais de 300 são de pesquisa.
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Nós preparamos um portfólio da UnB — isso está na página, pode ser visto. Classificamos por área de conhecimento, as grandes áreas, ligadas ao CNPq e à CAPES, laboratórios multiusuários, prestação de serviços tecnológicos, etc.
O que queremos com isso? Estamos trabalhando intensamente junto com o sistema das universidades, que inclui todo o setor privado e também as comunitárias, para dar visibilidade ao público sobre as inúmeras atividades existentes.
Temos mais de 600 grupos de pesquisa, vinculados ao CNPq e distribuídos nessas grandes áreas. E temos nesses grupos de pesquisa, para vocês verem a extensão das colaborações, mais de 3.300 pesquisadores externos, sendo 240 deles no exterior. Isso está na página. Basta entrar na página da UnB, onde nós temos a aba de pesquisa e inovação. A página com o Plano de Internacionalização hoje é bilíngue, e temos a intenção de incorporar outras línguas, sobretudo o espanhol, da nossa América Latina.
Nós fazemos pesquisa em dois grandes eixos. Esse foi o foco da internacionalização na UnB. Em um eixo, temos transformações em curso, onde os pesquisadores estudam e tentam compreender as transformações naturais ou humanas do planeta, e temos as transformações necessárias, sobre como a ciência, a tecnologia e práticas sociais podem responder a esses inúmeros desafios.
Partindo desses dois eixos, nós chegamos aos nossos temas estratégicos, e o projeto foi selecionado no edital CAPES-PRInt, o que foi muito importante, porque a competição foi nacional. Temos então esses seis temas estratégicos. Nós pensamos em temas mais locais, obviamente aqui da região, mas que tenham amplitude mais global. Os temas contemplam desde ciências humanas, com dinâmicas naturais e antrópicas sobre o planeta, o que inclui geologia, matemática, etc.; desigualdade, globalização e seus efeitos sobre a sociedade contemporânea; a vida e saúde em um mundo em transformação, etc.
Em termos de inovação mesmo, há alguns números que, se comparados com os de países estrangeiros de ponta, obviamente são baixos. Mas devo dizer que é bastante injusta essa comparação, a forma como nós temos sido comparados a países de Primeiro Mundo. É óbvio que temos que fazer comparações, para ter um termômetro, porém temos uma realidade de país que precisa ser pensado em vez de importar modelos prontos de outros países, de outros contextos. Então, temos aí patentes, proteções, etc., e transferência de tecnologia.
Aqui nós temos alguns números. Isto é só para mostrar que temos, sim, ações no sentido de empreendedorismo, inovação, etc., que é o que cabe à universidade.
Temos o nosso parque científico e tecnológico, que foi remodelado recentemente, e temos hoje sete empresas residentes, num total de mais de 3 mil colaboradores.
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Por que estou dizendo isso? Aqui eu entro mais diretamente no tema objeto da discussão. Primeiro, é importante que a academia, sobretudo aquelas instituições que são mantidas com financiamento público, conservem sua autonomia e independência. É importante dizer que essas pesquisas básicas geram conhecimento nas três grandes áreas. Temos as pesquisas aplicadas, que resolvem problemas mais imediatos, e temos também ações para inovação, como prestação de serviços tecnológicos, empreendedorismo, etc., que foram preconizados pelo decreto de inovação.
É importantíssimo que sejam garantidos esses espaços de criatividade e novas ideias. A universidade é um centro gerador de ideias e conhecimentos que seguem o método científico, e isso precisa ser garantido, mas não é garantido pelo mercado. O mercado atua diretamente com a população, visa lucros, isso não é problema nenhum, mas esses papéis têm que ser bem compreendidos.
Há também dados indicando que os países que equilibram o ecossistema têm sustentabilidade a longo prazo. Países como a Alemanha, por exemplo, têm espaços de geração de ideias garantidos pelo Governo, e não é pouco o recurso que vem do Governo. Mesmo nos Estados Unidos, tão propalados, mais da metade dos recursos das universidades vem do Governo. Então, os países que direcionam a academia no sentido de atendimento do mercado em pouquinho tempo perdem a inovação. Esses dados são conhecidos.
Eu preciso dizer também que artes e humanidades são essenciais para o desenvolvimento de um país. Nós, que somos um País de cultura fortíssima — se há algo que fazemos bem é música, cultura —, não podemos nos desconfigurar.
A gestão da academia é colegiada e democrática. Para quem não tem muita familiaridade, nós temos colegiados, nossas decisões são colegiadas. Temos departamentos, unidades acadêmicas e administrativas, conselhos superiores, etc. Nesses espaços, é garantida a participação livre e democrática. O acesso é público, e as discussões são bastante ricas. Essas construções coletivas são um pouco lentas mesmo, não têm velocidade, mas elas são férteis geradoras de ideias interessantes. Importante dizer aqui que nós, gestores das universidades públicas, somos representantes dos colegiados. Essa gestão precisa ser garantida.
Voltando, o desafio no Brasil é a criação de interfaces entre esses cinco entes da inovação. As universidades públicas, assim como as comunitárias e as particulares, elas avançaram. Existe um entendimento muito claro nas universidades de que elas têm que fazer a transferência de conhecimento. Mas essas interfaces precisam ser construídas, e precisa ser entendido, pelo setor privado principalmente, que esses são projetos de colaboração, não são prestação de serviço, porque não se contrata a universidade para fazer isto ou aquilo. Os projetos são construídos.
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A agências governamentais, que é importantíssimo manter, elas têm papéis diferentes e fazem o esteio dos recursos do nosso Sistema Nacional de Ciência e Tecnologia. CAPES, CNPq e FINEP também avançaram nesse sentido. Hoje, a CAPES está propondo um novo sistema de avaliação, em que uma das pernas é a inovação. Então, existe esse avanço no entendimento. O marco legal da inovação traz o arcabouço jurídico, porém esses aspectos jurídicos não estão pacificados. Só quem trabalha com isso no dia a dia sabe o quanto se sofre com questões jurídicas para atender a todas as demandas. Portanto, ainda há um caminho a percorrer.
Era isso. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Margarida Salomão. PT - MG) - Quero agradecer à Profa. Maria Emília, que representa neste evento a Reitora Márcia, da Universidade Brasília, com uma apresentação tão completa, tão rica em informações, e que eu tenho certeza vai contribuir muito para o debate.
Quero saudar os Parlamentares Deputado Gustavo Fruet, que passou rapidamente por aqui, e Deputada Ângela Amin, que está aqui conosco e integra comigo uma Subcomissão desta Comissão de Ciência e Tecnologia que trata exatamente do financiamento da ciência, da pesquisa e do desenvolvimento tecnológico.
Com muita alegria, chamo para juntar-se a nós o Prof. Luiz Antônio Cunha. Para mim é uma distinção particular tê-lo aqui, dada a admiração que eu tenho por ele e o prazer de ter trabalhado a seu lado.
Vou passar a palavra agora ao nosso próximo palestrante, o Reitor Roberto Salles, que preside o GT constituído pela Presidência da Câmara para tratar de questões referentes à universidade, ao seu financiamento, à sua sustentabilidade, aos seus desafios.
Antes de introduzir o Prof. Roberto, eu queria dizer que, ouvindo a Profa. Maria Emília — eu já tinha tido a oportunidade de conversar brevemente com a Profa. Helena Nader a respeito disso —, vejo que é extraordinário fazer aqui nesta Câmara, na Comissão de Ciência e Tecnologia e na Comissão de Educação, um evento para debater a contribuição que as universidades oferecem ao desenvolvimento científico e tecnológico no Brasil. Tempos difíceis estes! Mas, de outro lado, nós temos que capitalizar essa dificuldade. Acho que esta é uma oportunidade que nos deram para deixarmos claro para a sociedade o quão relevante e imprescindível é a construção dessa hélice que a Profa. Maria Emília teve a oportunidade caracterizar. Está claro que ela não é compreendida, que ela não pertence ao senso comum — e, digo mais, nem mesmo ao senso comum político.
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Hoje ainda, Prof. Roberto, antes de vir para cá, eu li uma entrevista do Presidente da Casa em que ele diz que quer encaminhar uma série de questões, mas que é necessário superar o corporativismo das universidades. Eu acho necessário mesmo. Quem de nós aqui defenderia o corporativismo ou qualquer outra forma de trava ao desenvolvimento da razão? Não seríamos nós, os professores universitários, que por definição somos inimigos desse tipo de obstrução anti-iluminista. Mas, de todo modo, está posto que há uma necessidade pública de mostrarmos que razões que ultrapassam essas amarras devem ser apropriadas pela sociedade na defesa dos seus melhores interesses.
Faço este pequeno comentário para dizer da minha enorme alegria de ter aqui conosco o Reitor Roberto Salles, que foi Reitor da Universidade Federal Fluminense, onde continua atuando como professor, e é o Presidente do GT da Presidência da Câmara.
Com a palavra o Prof. Roberto Salles.
O SR. ROBERTO SALLES - Bom dia a todos.
Gostaria de agradecer pela oportunidade à Deputada Margarida Salomão, da Frente Parlamentar, também ex-Reitora.
Cumprimento a Deputada Angela Amin, a palestrante Maria Emília — mande um abraço para a nossa grande Reitora Márcia —, o Prof. Luiz Antônio.
Vejo aqui presentes outros palestrantes: a Helena Nader — é um prazer muito grande —, o Nelson Cardoso, grande professor, e também o Pró-Reitor de Santa Catarina Carlos Alberto.
Senhoras e senhores, na verdade eu não estou aqui como ex-Reitor da Universidade Federal Fluminense. Fui Reitor de 2006 a 2014, à época do Programa de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais. Nós apresentamos o maior projeto do País. Conseguimos dobrar o número de alunos de graduação, passando de 25 mil para mais de 50 mil, depois de 8 anos. Multiplicamos por quatro o número de pós-graduandos stricto sensu. Nós somos hoje a primeira universidade de entrada de alunos presencial. Também conseguimos dobrar a área, de 240 mil metros quadrados em 50 anos para mais 170 mil metros quadrados de construção em 8 anos. Portanto, eu acho que a Universidade Federal Fluminense, como todas as outras, aproveitou muito bem o Programa de Reestruturação e Expansão.
Já que estamos falando em corporativismo, aproveito para dizer que nós tivemos uma resistência muito grande dentro das universidades. Eu não me considero nem de esquerda, nem de direita — não tenho partido político —, mas o pessoal mais à esquerda não queria o programa, essa oportunidade. E, obviamente, as universidades tiveram que enfrentar a situação. Graças a Deus nós avançamos, tudo discutido dentro da universidade, em todos os setores. Isso é importante também. A universidade tem que ter a liberdade de discutir vários temas. Como o nome diz, a universidade representa a diversidade da população. É como no Congresso. Seria como querer tolher o Congresso, e o pessoal da Direita não falar, ou o pessoal da extrema-Direita, ou da extrema-Esquerda, ou do Centro. Isso não cabe. Não existe lugar nenhum no mundo — eu pesquisei — onde a universidade não tenha autonomia. Apontem-me uma universidade no mundo, em qualquer país, que não tenha autonomia.
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Eu gostaria também de agradecer ao Presidente Rodrigo Maia por ter nos autorizado a vir. Na verdade, esse grupo de trabalho é um grupo de assessoramento técnico ao Presidente da Câmara. A subordinação é ao Presidente da Câmara. Os relatórios preliminares são entregues ao Presidente da Casa. Nossa missão é realizar um diagnóstico da educação superior, seja pública, seja privada. Elas são complementares. A cada momento nós emitimos um relatório preliminar, para que ele saiba o que está acontecendo.
No meio desse caminho, recebemos todas as entidades, já conversamos com todos os segmentos, democraticamente. Então nos deparamos com o programa Future-se, que agora está na segunda versão. Essa comissão é formada por quatro ex-Reitores: Ana Lúcia Gazzola, ex-Reitora da Universidade Federal de Minas Gerais; Thompson Mariz, ex-Reitor da Universidade Federal de Campina Grande; e Eliane Superti, ex-Reitora da Universidade Federal do Amapá. Também formam o grupo de trabalho dois consultores legislativos, Ricardo Martins e Renato Gilioli, e três assessoras da Presidência da Câmara. Esse é um trabalho voluntário, de prestação de serviço à Nação. Todo mundo sabe, ele não é remunerado. Obviamente, as despesas são pagas pela Câmara.
(Segue-se exibição de imagens.)
Após o ato do Presidente, que está aí, nós fizemos nossa primeira reunião. O ato é de 30 de março, e 1 mês depois da instalação nós fizemos uma reunião. Temos 1 anos, que finda agora em abril, para entregar o relatório. Foi uma riqueza muito grande. Eu já tinha coordenado a comissão que tratava da educação pública superior, e nós tivemos um desdobramento que foi o documento elaborado pelo Rossieli para a extensão, sempre vista com desconfiança por falta de dados auditáveis. Nós provamos que esses dados existiam. Então o Rossieli baixou uma norma e incluiu a extensão. A extensão passou a ter a devida importância. Ela é a relação com a sociedade. A universidade tem que se mostrar para a sociedade, sair dos muros.
Tratamos também do PNAS, instituído por decreto presidencial, que então pode acabar a qualquer momento, e já está tramitando.
O outro desdobramento é a PEC 24, que trata da flexibilização do teto dos gastos, porque as universidades arrecadam recursos e não podem gastá-los na plenitude. Elas atingem o teto e não podem gastar mais. Quer dizer, incentivam a universidade a fazer parcerias, e depois ela não consegue gastar o dinheiro que arrecada.
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Por último, já nesta Comissão, sensibilizamos o Presidente da Câmara, depois de uma discussão sobre o Future-se, para a necessidade de autonomia e a regulamentação do art. 207. Só que ele avançou: autorizou um projeto do Deputado Gastão Vieira, que nós atualizamos para os dias de hoje, porque ele é de 2004, e nomeou uma Comissão Especial, que eu acredito que já está na fase de indicação dos membros pelos partidos. Provavelmente o Presidente vai ser o Deputado Gastão, que não é o autor. Na verdade, o projeto de autonomia é dele, mas a Comissão não é sobre a autonomia, a Comissão tem um projeto maior, que é mais ou menos fazer o que o GT está fazendo: um diagnóstico da educação superior.
Temos muita esperança nesta Comissão, porque a educação tem que ser vista como um sistema. Não dá para brincar de educação. E eu estou na Casa correta para dizer que a educação é uma questão de Estado, não de Governo. Não pode um Governo achar que a educação está ruim porque o outro fez isso ou aquilo, e aí muda, depois chega outro e, porque é de outro partido, de esquerda ou de direita, quer desmontar o que o anterior fez. Isso não é educação, isso é brincar de educação.
Nós temos universidades jovens. Nossa mais antigas, UFRJ e USP, brigam para saber quem é a mais antiga. Acho que é a UFRJ, que ganha por pouco. Têm cerca de 100 anos. E a maioria das universidades que estão nesses rankings têm mais de 100 anos: têm 200 anos, algumas até 800 anos. A de Coimbra vai fazer 800 anos, a de Bolonha tem quase 1 mil anos. Mesmo assim, quando verificamos as publicações, o que o Brasil produz, observamos que estamos bem à frente de muitas universidades de outros países.
Os Governos tinham que ter orgulho do que as nossas universidades fazem, e aí incluo centros universitários e faculdades. Temos centros de pesquisa excelentes! E ainda temos empresas como a EMBRAPA e o Instituto FIOCRUZ, que não são universidades, mas são grandes escolas. Todas entraram através da universidade.
Começa lá na pré-escola, na creche, a desigualdade entre os Estados e as Regiões. Na China, agora um bom professor recebe incentivo para ir trabalhar em escola do interior, para fazer acontecer. O professor é valorizado. Se não fizermos isso... Que igualdade há entre as escolas do Rio de Janeiro, de Brasília, de São Paulo, de Minas Gerais, de Santa Catarina — em homenagem à Deputada — e escolas da Região Amazônica, do Sertão do Seridó? Nós temos que garantir as melhores práticas a todas as regiões! A educação tem que ser vista como um sistema vivo, que começa na pré-escola e passa pela educação infantil, pelo ensino fundamental e pelo ensino básico até chegar à universidade, que retroalimenta o sistema formando bem professores para todos esses segmentos, faz pesquisa, gradua o estudante, prepara o cidadão para a atividade técnica e oferece também pós-graduação em várias áreas. Estão disseminadas instituições como EMBRAPA, FIOCRUZ, IME, ITA, universidades públicas federais, estaduais, municipais, confessionais, sem fins lucrativos, particulares também. Não podemos demonizá-las, pois elas complementam o sistema. Há particulares e particulares. Nós temos conversado com Elizabeth Guedes, que representa um grande segmento das privadas. Ela disse: "Nós não queremos autorregulamentação. Nós não queremos bagunça! Queremos ser diferenciadas das que estão aí na Bolsa de Valores, não sei onde, só querendo ganhar dinheiro". Então, nós temos que respeitar também o setor privado que trabalha bem. Eles não querem muita coisa, não. Eles querem poder trabalhar, e trabalhar com qualidade. É isso. Temos que ter essa visão de país. Eu vou dar um exemplo aos senhores. Eu peguei a pesquisa do Abílio Baeta e da Concepta Mcmanus: 58% das federais e 14,5% das estaduais e municipais foram responsáveis por 72,5% das publicações em 2018. Em 2000, houve 15 mil publicações; em 2018, 82 mil publicações em revistas de todo espectro que se possa imaginar. De 2000 a 2018, foram 900 mil publicações! Em 2018, formamos 21 mil doutores e 60 mil mestres. Isso é realmente significativo.
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Quem fez os cálculos sobre o derramamento de petróleo? Vou dar um exemplo atual. Há várias teorias. Eu gostei muito da teoria de um professor de Engenharia da UFRJ sobre afundamento de barris. Se o petróleo é realmente clandestino — ninguém pode dizer isso —, de país que está sendo bloqueado, mal ou bem, e os barris caíram no mar, obviamente que o óleo, dada a sua densidade, vai para a superfície. Essa é uma das teorias. A outra diz que foi na passagem de um navio para outro. Isso é complicado. Mas quem fez o cálculo? Nós temos uma Marinha, temos satélites. Nós temos tecnologia para isso. Podemos não ter o nosso, mas fazemos uso de consórcios. Fizeram um cálculo que apontou para 150 milhas depois de determinada região do Nordeste. Quem fez isso? Universidades. Quem está fazendo o mapeamento das correntes, para tirar aquele material todo? A Universidade de Pernambuco, estadual.
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Nós temos agora pesquisas de petróleo em águas profundas. Quem está fazendo isso? Pesquisadores de onde? De universidades. Temos grandes pesquisadores na EMBRAPA. Eles são oriundos de onde? Das universidades, que também fazem isso. Então, tudo que o Brasil possui, tudo que o Brasil possui de forte, tecnológico, como aviação, por exemplo, saiu das universidades, dos centros de pesquisa. O kit de diagnóstico rápido de AIDS saiu da FIOCRUZ! Vacinas imunobiológicas, do Instituto Vital Brazil, do Instituto Butantan. A prova é cabal!
Eu acho que o Congresso, que os Deputados e Senadores, tinham que visualizar que com educação não se pode brincar. Temos que fazer um projeto para 20 anos. Ninguém vai botar a mão na educação, nenhum Governo. Vamos fazer um projeto com início, meio e fim, dando responsabilidade, mas também acompanhando, dando autonomia, como têm as paulistas — não sei se o modelo é aquele —, que têm 30 anos e funcionam muito bem. Eles têm direitos e deveres, têm que prestar conta à sociedade. Há risco? Há quem diga que deveria haver uma agência, como a Agência Nacional do Petróleo, uma agência independente, para acompanhar, para dar rumos para a nossa educação, de modo que ela não ficasse ligada a nenhum Governo de plantão. E não estou criticando nenhum Governo. Isso é uma constante. Há Governos que incentivam, que dão apoio. Outros, não. Nesse vai e volta, a nossa educação fica patinando. Temos que dar atenção, sim, desde a creche, a educação básica... Mas é um erro grosseiro achar que se pode fazer uma divisão e tratar da educação básica, da educação fundamental e esquecer a universidade."
O que não dizem é que há um subfinanciamento da educação e da saúde. Há aplicação errada do dinheiro? Sim. Vamos corrigir essa aplicação. Vamos cobrar de quem usa mal o dinheiro. Vamos combater a corrupção nos Municípios que desviam a merenda escolar das crianças. Mas não vamos demonizar a universidade. A universidade é, sim, o local das grandes discussões, e elas têm que ter liberdade de ensino, de cátedra, não podem ser tolhidas por ideologia nenhuma. Você não encontra na universidade plantações de maconha, como dizem por aí. Eu quero ver. Eu desafio. "Ah, fumaram!" Pode ser. De 50 mil alunos, se meia dúzia fuma maconha, o que se vai fazer? Tomar conta? A maioria está ali para estudar, para subir na vida. Então, temos que acabar com isso, e quem pode fazer isso é esta Casa, que tem o poder, Deputados e Senadores.
Eu não ouvi a entrevista do Presidente da Câmara, mas o que nós queremos é também acompanhar o que acontece nas universidades. Por exemplo, eu não acho que haja 100% de transparência em todas as fundações de apoio. Fui ver os sites das fundações. Hoje, se eu quero saber o salário de uma pessoa, eu entro no Transparência. Tem fundação que coloca o projeto tal, o valor... Quem são as pessoas que recebem as bolsas? CPF tal, CPF tal e CPF tal. O que é isso?! Tem que estar lá o nome. O projeto é este, o produto é este, quem está trabalhando são estas pessoas, estes alunos, e eles estão ganhando tanto de bolsa. Isso tem que estar no projeto. Mas as pessoas escondem isso. E fundação também não pode servir de local que o reitor aproveitar para emitir passagem para viajar de classe executiva. Há uma lei, do tempo da Dilma, que não permite compra de passagem em classe executiva.
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Nós não podemos esconder as mazelas que existem nas universidades. Temos que deixar tudo claro. As rubricas têm que ser claras e transparentes com relação à aplicação do recurso. Mas isso é o de menos. Isso é uma coisa pequena, estanque. O que é a universidade faz é muito maior, para que alguém queira colocar em xeque o seu papel.
Então, eu concordo, em parte. Não sei o que o Presidente disse, mas acho que temos que ter esse controle. E eu já proponho, embora ninguém tenha me pedido isso, que se crie uma agência independente, para que esse acompanhamento não fique ao sabor de nenhum órgão. Essa agência veria o que as universidades estão fazendo, verificaria a aplicação de recursos, essas coisas todas. Tudo tem que ser claro e transparente. Não cabe mais colocar nada para baixo do tapete.
Eu queria agradecer e me colocar à disposição para qualquer debate.
Muito obrigado. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Margarida Salomão. PT - MG) - Quero agradecer ao Prof. Roberto, ao Reitor Roberto, pela sua contribuição aqui, muito importante, ainda mais porque ele ocupa essa posição chave neste momento da nossa cena pública de presidir o GT constituído pelo Presidente da Câmara, Rodrigo Maia.
Eu queria mencionar que estiveram presentes aqui os Deputados Paulo Ganime, Fred Costa e Alencar Santana Braga, de São Paulo.
Informo que este evento que nós estamos realizando e que está sendo transmitido pela Internet é também uma iniciativa do Observatório do Conhecimento. Então, quero agradecer a presença dos Presidentes da APUBH, da ADUFRJ e da associação dos docentes da Universidade de Santa Catarina, da UNICAMP e da Universidade Federal de Pernambuco. Menciono também a presença da FASUBRA, que está participando conosco, e da Reitora Sandra, minha querida amiga, que vai agora mesmo ser chamada a participar da nossa segunda Mesa.
Passo a palavra agora para o Prof. Luiz Antônio Cunha, que coroa as apresentações da primeira Mesa.
O SR. LUIZ ANTÔNIO CUNHA - Profa. Margarida Salomão, muitíssimo obrigado pelo convite de V.Exa. para participar desta Mesa, sobre um tema tão importante.
10:15
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Sras. e Srs. Parlamentares, senhoras e senhores, colegas universitários aqui presentes, eu queria falar dos adversários da autonomia universitária, ontem e hoje.
Tratar da universidade é focalizar uma instituição quase milenar na Europa, recente no Brasil. A nossa mais antiga, a UFRJ, vai completar o centenário em 2020.
A universidade assume diferentes formas e identidades, conforme a época e o país. Na origem, ela foi uma comunidade simples de mestres e discípulos, sem prédios próprios e praticamente desprovida de orçamento. Tornou-se uma instituição complexa, multifuncional, com território de configuração própria e orçamento que por vezes chega a ser superior ao da Prefeitura da cidade onde se localiza. De uma instituição que se dedicava à medicina e aos estudos especulativos, veio a ser uma importante geradora de forças produtivas, humanas e materiais.
Em uns países, a universidade se confunde com o ensino superior de graduação, enquanto, em outros, ela converge com instituições especializadas, como o Instituto Oswaldo Cruz, já citado, no desenvolvimento do saber legítimo e na outorga de diplomas de mestrado e doutorado. No entanto, há um elemento comum à instituição universitária, presente em todos os tempos e em todos os lugares: a luta pela difusão e o desenvolvimento do saber, sem constrangimentos externos, vale dizer, a luta pela autonomia.
Essa luta começou contra a Igreja, de onde a universidade nasceu. Depois, contra o Estado, que criou as suas para se valer dos seus serviços, mas sob controle direto. Em seguida, contra o partido, naqueles países em que ele era ou é único. Finalmente, contra o mercado, que almeja reduzir a universidade a um mero mecanismo de acumulação de capital físico ou financeiro.
Vou focalizar, resumidamente, os principais protagonistas do constrangimento à autonomia universitária no Brasil.
A primeira legislação sobre as universidades não foi uma lei, mas um decreto do Governo Provisório, em 1931, no qual o controle estatal sobre elas não era sequer dissimulado. A exposição de motivos do Ministro da Educação, o fascista estrito senso Francisco Campos, pretendia tutelar o espírito universitário, que, com o tempo, viria a adquirir a experiência e o critério indispensáveis para a autonomia plena, fosse no terreno administrativo, fosse no didático. Desde então, de tempos em tempos irrompem projetos coercitivos à autonomia universitária, que procuram impor mais e mais controles e restrições orçamentárias, além de que pretendem estabelecer o que as universidades públicas devem ensinar, como e a quem.
Parece que há uma resistência atávica do Estado brasileiro em reconhecer a autonomia universitária, mesmo quando a lei manda, mesmo estando ela inscrita na Constituição. Busca enquadrá-la mediante diversos formatos institucionais. Primeiro, como autarquia, isto é, gerida pelas próprias normas, mas logo a submeteram a uma pletora de leis, decretos e portarias que amarraram de tal maneira a administração universitária, que o termo "autarquia" significou o seu oposto. Depois, inventou-se a modalidade fundacional, para as universidades mais recentes, o que não adiantou muito, porque também para elas a sanha controlista governamental dirigiu mais e mais normas e regulamentos. Assim foi que autarquias e fundações tiveram que criar instituições periuniversitárias, as fundações de apoio, de direito público e direito privado, para contornar a sanha controlista.
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Agora, o mercado.
Desde meados do século XX, a busca de recursos provenientes da venda de bens e serviços passou a ser considerada um mecanismo de compensação das dotações financeiras congeladas ou minguantes. O ensino, a pesquisa, a assistência — é preciso frisar a assistência, porque ela existe — e a extensão passaram a ser definidos como mercadorias vendáveis — ou não. Claro está que a autonomia universitária perde com isso, pois os interesses empresariais são bem distintos dos acadêmicos, como se pode ver pelo imediatismo da aplicação da propriedade dos resultados e das cláusulas de segredo.
O atual Governo Federal requentou ideia da segunda metade da década de 1990 e propôs o projeto de lei que resultará, se aprovado, numa profunda reforma das universidades federais.
Na concepção do atual Ministro, autonomia administrativa implicaria contrato de gestão com organizações sociais e autonomia financeira adviria de fundos de investimentos lastreadas nos bens imóveis das universidades e em receitas de fontes diversas, com a prestação de serviços e a cobrança de cursos de pós-graduação lato sensu.
No entanto, além de submeter ao mercado as finanças e a gestão das universidades federais, o projeto mantém e até amplia o controle ministerial, uma mistura da idealização do modelo norte-americano — idealização do modelo norte-americano, eu não disse cópia — idealização, repito, do modelo norte-americano tão valorizado na atual conjuntura para tantas coisas, com a realidade filofascista do Estado Novo.
Depois do Estado, as Igrejas. A Igreja Católica tanto atacou a Universidade do Distrito Federal criada no Rio de Janeiro por Anísio Teixeira, em 1935, por abrigar o que entendia serem professores subversivos e comunistas — parece que os adjetivos persistem —, que, 6 meses depois da inauguração, ela sofreu intervenção com dirigente católico leigo nomeado Reitor e liquidande. Até hoje, a Universidade do Distrito Federal — a do Rio de Janeiro, não a deste — foi a única universidade pública extinta no Brasil. Tomara que tenha sido a última!
Em 2018, alguns dias antes do segundo turno da eleição presidencial, Deputados da bancada evangélica da legislatura anterior lançaram alentado manifesto, quase um programa de governo. No que dizia respeito ao ensino superior, o texto endossou a autonomia universitária prevista na Constituição e propôs um interessante programa de alfabetização solidária para as universidades públicas. Lamentavelmente, descambou para um contraditório controlismo que talvez tenha se baseado no documento do Banco Mundial listado na bibliografia. Banco falar de universidade nunca dá certo, nem mesmo com sotaque religioso.
Finalizando esta breve mensagem, gostaria de precisar um ponto essencial.
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Não é fácil ter uma visão ampla do que seja a universidade devido à multiplicidade de suas atividades: da física à história, das engenharias à educação, da medicina à linguística, etc. Apenas fazendo um curso de graduação ou pós-graduação não há como se ter uma visão do que seja a universidade. Nas brasileiras, isso é mais difícil do que nas europeias, por causa da formação de nossas mais antigas universidades, a partir de unidades profissionais isoladas, de modo que os cursos tendem a se realizar todos dentro de uma unidade acadêmica, quase sempre ignorando as outras. Até nas universidades mais recentes observa-se essa tendência inercial, que a reforma universitária de 1968 não foi capaz de superar, apesar dos mecanismos integradores nela previstos. Temos muito a fazer nesse sentido.
As universidades são instituições complexas que demoram muito a amadurecer e que demoram tão mais quanto maiores e mais frequentes forem as interferências perturbadoras em sua autonomia. Por isso, elas precisam de estabilidade nas relações com o Estado e a sociedade. As universidades não têm finalidade única e de fácil mensuração, como maximizar lucros, por exemplo, ou projetar força, no caso de instituições militares. Por isso, especialistas em organização empresarial ou militar não as compreendem, mesmo tendo obtido nelas títulos de bacharel, mestre ou doutor.
As finalidades da universidade são múltiplas, e a tríade ensino, pesquisa e extensão está longe de contemplá-las. Insisto na assistência da área de saúde. Elas podem até ser berçários de empresas, mas isso não passa de um subproduto de sua atividade. E não faz parte do espírito universitário o tal empreendedorismo, expressão polissêmica muito valorizada pelo projeto de lei do atual Ministro — chega a ser título —, expressão que tem servido para qualificar atividades tão distintas como as expedições dos bandeirantes escravizadores de indígenas e as práticas caritativas dos missionários religiosos. Pior do que isso, a ênfase no empreendedorismo desvia a atenção da desindustrialização e do desemprego.
Concluo com os votos para que esta Casa Legislativa reconheça a importância da autonomia universitária e não deixe de verificar in loco o que elas fazem com esse direito tão longamente reivindicado.
Muito obrigado. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Margarida Salomão. PT - MG) - A fala do Prof. Luiz Antônio Cunha ilustra por si mesma a robustez da reflexão de que é capaz a universidade brasileira, da qual este País não pode prescindir. Esse é o ponto. É muito importante que nós compreendamos isso.
Eu quero agradecer ao Professor por essa contribuição que foi ao mesmo tempo sintética e densa.
Bem, temos outra Mesa com outros grandes palestrantes — cito a Profa. Sandra, Reitora da UFMG; a Profa. Helena Nader, Presidente da ABC que foi Vice-Presidente da SBPC no tempo em que elaboramos o marco da ciência e tecnologia neste País; e o Prof. Nelson Cardoso Amaral, da Universidade Federal de Goiás.
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Eu gostaria de sugerir que questionamentos e intervenções ficassem para o fim da segunda Mesa, para termos a oportunidade de ouvir esses expositores e fazer — quem sabe? — um debate mais completo.
Agora, a nossa querida Deputada Angela Amin nos honrará com a coordenação da segunda Mesa. (Pausa.)
A SRA. PRESIDENTE (Angela Amin. Bloco/PP - SC) - Eu gostaria de agradecer à Deputada Margarida Salomão, a autora do requerimento que proporcionou esta discussão sobre universidade pública.
Eu entendo que ela deve ser estendida, como bem colocado aqui pelo consultor da Casa, o professor da UFMG, para pensarmos a universidade pública como um todo, o que considero importante.
Daremos início, então, à segunda Mesa do seminário, cujo tema é Financiamento e Educação Superior Pública.
Convido para compor a mesa a Sra. Sandra Regina Goulart Almeida, Reitora da Universidade Federal de Minas Gerais — por isso a Deputada Margarida Salomão escapou da condução da Mesa, porque Minas chegou. (Risos.)
Convido também a Sra. Helena Bonciani Nader, Vice-Presidente da Academia Brasileira de Ciências — ABC, aqui representando o presidente da instituição, o Sr. Luiz Davidovich; e o Sr. Nelson Cardoso Amaral, professor da Universidade Federal de Goiás — UFG.
O Sr. José Henrique Paim Fernandes, ex-Ministro da Educação, comunicou a impossibilidade de participar do seminário.
Esclareço que os procedimentos adotados nesta etapa do seminário serão os mesmos adotados na primeira Mesa de debates. Cada palestrante terá o tempo de até 10 minutos para a exposição. Após as apresentações, será concedida a palavra aos Parlamentares, respeitada a ordem de inscrição, para, no prazo de até 3 minutos, formularem suas perguntas e considerações. Os palestrantes disporão do mesmo tempo, de até 3 minutos, para as respostas. Caso ainda haja disponibilidade de tempo, os palestrantes poderão responder aos questionamentos dos internautas e do público aqui presente.
10:31
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As perguntas deverão ser dirigidas por escrito à mesa. Para tanto, há formulários à disposição na bancada de apoio, à direita.
Ao final do debate, cada convidado terá até 3 minutos para as suas considerações finais.
Lembro que este seminário está sendo transmitido ao vivo pela Internet, em formato interativo, e pode ser acessado pelo sítio eletrônico da Câmara dos Deputados e da Comissão. (Pausa.)
A Deputada Margarida Salomão está bem boazinha: ela aumentou o tempo para 15 minutos. (Risos.) Como eu já falei, Minas chegou. Aí mudam até as regras.
Passo, então, a palavra à primeira expositora desta mesa, a Sra. Sandra Almeida, para a sua apresentação.
A SRA. SANDRA REGINA GOULART ALMEIDA - Bom dia a todos e a todas.
Eu vou ficar em pé. Acho que é vício de professora.
Bom, primeiramente, gostaria de agradecer pelo convite que me foi feito à Profa. e Deputada Margarida Salomão e à Deputada Angela Amin. Para mim, é um prazer estar aqui.
Cumprimento a Profa. Helena Nader, uma grande amiga e parceira na defesa da universidade pública.
Cumprimento o Prof. Nelson Amaral, cujo trabalho eu já conheço. Não o conheço pessoalmente, mas inclusive vou citá-lo aqui também.
Cumprimento todos os presentes, a Profa. Stella Brandão, presidente do sindicato de professores da minha instituição, e o professor e sempre reitor Roberto Salles.
(Segue-se exibição de imagens.)
É um grande prazer estar aqui para falar um pouquinho sobre a universidade pública e a sua importância para o desenvolvimento da ciência e da educação. Nesta mesa eu devo falar sobre financiamento, mas, antes de falar sobre financiamento, gostaria de destacar que nós não podemos falar de financiamento sem falar no desenvolvimento da ciência e da educação. Uma coisa está ligada à outra. Então, nós falamos sempre em investimento em educação, ciência e tecnologia, para o desenvolvimento do País. Sempre falamos dessa forma. Também não podemos falar sobre financiamento sem levar em conta o que foi dito na mesa anterior sobre a autonomia universitária. Essa é a base para se falar do futuro da universidade pública, do futuro do financiamento da universidade pública.
Não podemos também nos esquecer dos exemplos de sucesso que nós temos, de vários países, como Coreia do Sul, China, Canadá e Israel, que investiram em momentos de crise nas universidades. Isso para nós é muito importante.
Devemos lembrar também do caso de sucesso das universidades paulistas. Todo mundo, quando fala de universidades, faz referência às universidades paulistas. O Estado de São Paulo fez uma opção, em 1932, a de investir maciçamente nas universidades estaduais e também na FAPESP, a maior e mais importante agência de fomento da pesquisa do Estado. Isso é mostrado quando vemos dados da USP e da UNICAMP. É claro que tem a ver com o trabalho que vem sendo realizado, mas tem a ver também com a política de Estado que foi pensada para São Paulo e da qual carecem vários dos nossos Estados, a começar pelo meu Estado, Minas Gerais, Deputada, que tem o maior número de universidades públicas. No entanto, isso não tem significado apoio à educação superior, investimento na educação superior, o que é tão importante para o nosso País.
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Um dado muito importante que quero citar, antes de começar a falar especificamente das universidades, é o da correlação — e já foi provado isto em artigo publicado há mais ou menos 2 meses — entre educação superior e níveis de desigualdade de um país. Foi demonstrado que, de todos os países analisados, países em desenvolvimento, o Brasil é o país que apresenta maior retorno salarial para quem possui ensino superior. Isso nos mostra a importância da educação superior para o nosso País. Esse é um dado importantíssimo.
Agora, um dado muito triste é o de que nós temos apenas 18% da população entre 18 e 25 anos de idade no ensino superior. A meta do Plano Nacional de Educação é de 33% para 2024. Nós não vamos alcançá-la. O País está fadado a manter a desigualdade social. Se nós dependemos do ensino superior para melhorar a vida da população em geral, essa falta de planejamento do Estado para o aumento de vagas no ensino superior, para o aumento do apoio ao ensino superior, vai se refletir em mais desigualdade no futuro. Não resta a menor dúvida quanto a isso.
Eu gostaria, antes de começar a falar sobre financiamento, de citar outro dado. Nós temos ouvido muitas coisas sobre as universidades públicas. Fiz um levantamento muito rápido, não extensivo, da importância do sistema de ensino superior público para o nosso País. Vejam bem os resultados: 90% da produção científica do País está nas universidades públicas; 80% dos cursos de pós-graduação são de universidades públicas — e 90% dos cursos melhor avaliados são de universidades públicas.
Hoje se fala muito em ranking, e nós temos muitas críticas à maneira como os rankings são muitas vezes feitos, mas o que temos visto é que as universidades públicas estão em todos os rankings e nas posições superiores. No ENADE, cujo resultado acabou de ser divulgado, 64% das notas mais altas — e estou falando de notas 4 e 5 — foram de alunos de universidades públicas federais. De acordo com o RUF — Ranking Universitário Folha, que nós conhecemos, as 17 melhores instituições são universidades federais e as 22 melhores instituições em ensino são universidades federais.
Esses são apenas alguns dados breves. Eu sei que há várias outras maneiras de lidar com esses dados, mas queria só mostrar que é inconteste a qualidade das universidades públicas federais no nosso País. Isso é muito importante, isso precisa ser mantido como patrimônio do nosso País.
Quando nós falamos em financiamento da educação superior, o que precisamos levar em conta? Aqui eu fiz uma divisão um pouco diferente da que normalmente nós encontramos.
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Primeiro, trabalhamos com recursos orçamentários, que são não discricionários, ou seja, salários dos servidores, incluindo de aposentados e pensionistas. É importante dizer isso porque os dados muitas vezes levam em conta coisas que não deveriam ser levadas, para se falar de custo da universidade, custo por aluno. Temos também os valores discricionários, aqueles que podemos gastar. Dividi de maneira diferente daquela que é usada: primeiro, os valores de custeio, o que usamos para a manutenção da universidade; depois, valores de capital, ou seja, investimento, equipamento, construções, investimento que não temos tido nos últimos anos; e um valor muito importante — e vocês verão depois por que estou dizendo isto —, o orçamento da assistência estudantil. Quando eu mostrar, vocês verão o quanto é importante pensarmos na assistência estudantil cada vez mais. O PNAES, o Plano Nacional de Assistência Estudantil, foi criado por decreto governamental. Uma de nossas pautas é transformar esse decreto em lei, pela importância da assistência estudantil hoje para as nossas universidades. Os dados a seguir vão mostrar isso.
Quando falamos em financiamento, falamos do financiamento que é conferido à pesquisa — aqui estou trabalhando com pesquisa e extensão —, financiamento que vem dos órgãos de fomento, ou seja, das várias FAP — Fundações de Apoio à Pesquisa, da CAPES — Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior, do CNPq — Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico e da FINEP — Financiadora de Estudos e Projetos. Isso não é computado como orçamento da universidade, mas é um valor importantíssimo, quando falamos em financiamento da educação superior. Não temos como pensar numa instituição de ensino, pesquisa e extensão sem pensar no fomento que recebemos, para pós-graduação, da CAPES e do CNPq, que fomenta também pesquisa e trabalhos de extensão.
Temos que pensar nos recursos próprios. O que são recursos próprios? Muito tem sido falado sobre esses recursos próprios. Esses recursos têm várias naturezas. Primeiro, todo convênio feito com órgãos públicos que não são do Ministério da Educação entra no orçamento das universidades como recurso público. Por exemplo, em Minas Gerais, temos muitas parcerias com a Secretaria de Estado da Educação, com a Secretaria de Estado da Segurança Pública. Temos vários projetos. Isso entra na universidade através de recursos públicos, até mesmo o recurso da ordem do Ministério da Saúde entra como recurso próprio nas nossas instituições. Falo isso para entendermos a natureza dos recursos próprios.
Cito também um valor que conseguimos através da pesquisa aplicada. O que é pesquisa aplicada? É a pesquisa feita ao longo de vários anos que chega a um estágio em que se torna um produto, uma patente e uma transferência de tecnologia. Demora muito esse retorno, pela própria natureza da pesquisa, porque a pesquisa básica é transformada em pesquisa de patente e transferência de tecnologia.
Outro recurso próprio é o valor da prestação de serviço que às vezes acontece. As empresas procuram as instituições — pode ser a PETROBRAS, pode ser a FIAT, que é o nosso caso lá, pode ser a EMBRAER também — e pedem o desenvolvimento de um produto através de uma prestação de serviço.
Todas essas possibilidades entram para nós como recursos próprios. Por que estou falando disso? Já vou adiantar uma questão, porque é um grande desafio que temos no momento, a partir do momento em que há um teto de gastos públicos. Esse teto incide também sobre os recursos próprios da instituição. O que tem acontecido é que, quando captamos um pouco mais do que é permitido pelo orçamento, esse valor retorna para superávit primário. Isso é terrível para as universidades, que contam com esse valor. São prestações de serviço inclusive de órgãos públicos, que não podem fazer uso da instituição com esse recurso. Geralmente, são recursos que retornam para a pesquisa, e não para o custeio da universidade.
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Eu vou falar um pouquinho mais da questão do financiamento e vou dar o exemplo, sempre que possível, da minha universidade, por razões óbvias, porque tenho os dados mais concretos da minha universidade.
A primeira coisa que eu menciono nessa transparência é o número de alunos da universidade.
Antes, eu queria pontuar duas questões. A primeira é a significativa expansão das universidades que ocorreu depois de 2009. No caso da UFMG, foi de quase 50% a ampliação.
Quando nós falamos de universidades, falamos não apenas de estudantes da graduação e da pós-graduação, mas também — e era isto o que eu queria mostrar — da especialização, que é pós-graduação, da educação a distância — em número menor — e da educação básica e profissional. Então, não podemos esquecer que, quando falamos em universidade, não falamos apenas de graduação, mas também de pós-graduação, de ensino, de pesquisa e extensão. Não temos como valorar uma universidade sem levar isso em consideração.
Esse é o dado que eu queria mostrar, o que me leva a colocar a questão da assistência estudantil em primeiro plano, como forma de financiamento. Por quê? Deem uma olhada na diferença. Esses são dados da UFMG, mas coincidem com os da maioria das universidades. Hoje esse é o perfil. Olhem como os indicadores socioeconômicos mudaram de 2008 para 2018: 57% da nossa comunidade, dos estudantes que ingressam na universidade, vêm de família com renda familiar de até 5 salários mínimos. Se não houver apoio para esse grupo, nós não teremos como mantê-lo na universidade. É uma ilusão. Se nós os incluímos na entrada, temos que lhes dar condições de permanência na universidade e de ascensão social. Sem isso, é impossível a ascensão social por meio da educação superior.
Vejam bem esses outros dados: 20% vêm de famílias com renda de até 10 salários mínimos, e 5% vêm de famílias com renda de até 20 salários mínimos.
Só de olhar esses dados nós concluímos o quê? Que não adianta falar em cobrança de mensalidade. Nas universidades públicas, atualmente, isso é algo impossível. Nós estaríamos cobrando de 5% dos estudantes, dos que poderiam de fato pagar mensalidade. Isso não resolveria nenhum dos problemas das universidades e causaria impacto terrível nas nossas comunidades, o de haver dois grupos de estudantes, com diferentes perfis e com diferentes atenções, digamos assim. E nós fazemos questão de que a nossa universidade seja diversa e contemple a todos de maneira igual.
Olhem esse outro dado, de quem cursou ensino médio em escola pública: hoje são 54%. É a média das universidades, não só da UFMG. Cinquenta e quatro por cento do nosso alunato cursou escola pública. Então, a necessidade de assistência estudantil é premente.
Esse dado é o de residentes em Belo Horizonte: eram 76% e agora são 50%. Daí a necessidade de moradia. A maioria dos alunos vem de cidades do interior, de populações com baixo poder aquisitivo, e precisa de moradia, precisa de alimentação, precisa de subsídio.
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Então, se nós queremos uma universidade que tenha impacto na mobilidade social e que tenha relevância para o nosso País, precisamos de investimento em assistência estudantil. Esse é o primeiro ponto a ser abordado, quando falamos de assistência.
Esse é um dado muito importante da nossa universidade, mas eu sei que também se reflete em outras. A taxa de evasão de alunos assistidos é menor, e eles têm as mesmas notas daqueles que entraram em ampla concorrência, ou até melhores. Isso nos mostra que nós estamos no caminho correto e que precisamos investir cada vez mais em assistência estudantil. Em 95% dos cursos da UFMG, o rendimento dos cotistas assistidos é melhor. É claro que há cotistas que não são assistidos, porque têm empregos e se mantêm. A assistência estudantil faz diferença no rendimento e na vida dos nossos estudantes.
Já falei sobre a importância desse financiamento, falo agora da importância do financiamento da pesquisa. Vejam bem esse gráfico: na cor azul está representada a pesquisa feita em universidades federais; na cor vermelha, em universidades estaduais; na cor verde, em universidades privadas, fundações e empresas. Podemos ver que esse é o quadro do Brasil. Esse é o quadro em quase todas as universidades do mundo. Sessenta e seis por cento da produção científica das universidades dos Estados Unidos são fomentados com verba pública, não com verba privada. As empresas entram no final do processo, na hora de fazer a transferência de tecnologia. A produção básica, a pesquisa básica é o início de qualquer tipo de produção. Eu repito o que disse o professor que me antecedeu: que o empreendedorismo é a ponta do que está lá, do que foi feito durante muitos anos. O que nós temos de investimento em pesquisa, em pesquisa básica, é feito pelo Estado. Sessenta e seis por cento da produção científica do Canadá e dos Estados Unidos são fomentados com verba pública; na Europa são 77%. Então, essa é a tradição que nós temos. Não há como fugirmos dessa tradição.
Esse dado sobre o impacto médio da citação é da UFMG, mas, como eu disse, é a média das grandes universidades brasileiras. O corte mundial é de 1, em termos de qualidade da produção; o do Brasil é de 0,9, geral. Não é um dado ruim. Foi mencionado que a produção do Brasil é ruim. Ela não é ruim. No caso da UFMG, ela ultrapassa o nível internacional inclusive. A razão por que psicologia e ciências sociais ficam na parte de baixo, ou seja, não são 1, é que não há a tradição da publicação em artigos, em livros, e em inglês. Então, não há como estarem na base de dados pesquisados. Digo isso para que tomem muito cuidado ao ler números e estatísticas, porque eles contam apenas uma versão da história.
Outra questão que nós temos e quase nenhum outro país do mundo tem, com exceção de alguns países da América Latina, é o trabalho de extensão. Ele não é computado em nenhuma base, em nenhum tipo de explicação sobre financiamento de universidades no Brasil, o que é diferente no exterior. A universidade brasileira tem um impacto importantíssimo nas ações de extensão.
Estes dados são da UFMG: 32,3% das ações de extensão são feitas nas áreas de saúde e educação. Isso é importantíssimo. São ações feitas na ponta, para a nossa comunidade.
Falo agora, especificamente, de orçamento. Esse é um dado importante. Eu gostaria de me deter um pouco mais nele, mas sei que o Prof. Nelson vai falar especificamente sobre isso. Refiro-me aos dados equivocados que têm saído sobre o custo-aluno nas universidades públicas federais.
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Observem que aqui nós estamos falando de custo médio do aluno, o que inclui, majoritariamente, ensino presencial — diferentemente do que ocorre nas universidades privadas, que têm um número muito grande de ensino a distância —, pesquisa e extensão. E eu não estou falando apenas de dados de graduação.
Os primeiros dados da média do custo-aluno da UFMG, que são muito parecidos também com os dados da nossa média, são dados do TCU, de 2018, sem incluir os gastos com hospital universitário. E esses dados abrangem a graduação, a pós-graduação stricto sensu e a residência, deixando de lado todo o trabalho de pesquisa e extensão. Então, vejam que o valor é baixo, sem contar tudo aquilo que eu mencionei antes. O custo de um estudante seria de pouco mais de 1.400 reais por mês, sem contar a pesquisa e a extensão que nós fazemos. Isso é muito pouco! Está abaixo de qualquer índice que nós possamos analisar.
O estudo da UFG, do Prof. Nelson Amaral, um trabalho muito benfeito, mostra que esse dado é mais baixo ainda do que o dado utilizado pelo TCU. Não somos nós que estamos falando. É o TCU que está dando esses números. Então essa é a média, e uma média pequena, que nós temos que avaliar sem contar tudo mais que as universidades fazem.
Evolução orçamentária da UFMG.
Vocês podem notar que os recursos da LOA têm caído sistematicamente, e o valor do pessoal ativo também — é a linha laranja. A linha azul representa os gastos com aposentadorias e pensões, o que se tem mantido. Chamo a atenção para a linha verde, que indica a aplicação de recursos do Tesouro, que tem caído muito. E a linha azul-claro mostra os recursos captados, públicos e privados. Vejam como está aumentando essa captação. Mas, embora essa captação venha aumentando, nós não tenhamos conseguido usar todo o valor arrecadado.
O último que eu gostaria de mostrar é esse investimento em pesquisa na UFMG. Vejam bem os dados. O investimento público está em azul. O auge foi em 2014. De lá para cá, esse investimento só tem diminuído. Ao mesmo tempo, o investimento com recursos privados tem aumentado, muito em função do trabalho que nós temos feito de transferência de tecnologia. Mas esse não é o caminho, porque quando se chega aqui, muito embora nós tenhamos conseguido aumentar esses valores privados, nós não temos conseguido usar esses recursos. Eles não têm sido revertidos para a universidade. O que nós conseguimos a mais é usado para fazer superávit primário. Quer dizer, isso não resolve o nosso problema. Se nós chegamos a ter recursos privados hoje é porque houve investimento público. Não há como se fazer investimento, não há como se fazer transferência de tecnologia, inovação e empreendedorismo — essas são as palavras da moda, não é isso? —, se nós não fizermos pesquisa básica. E pesquisa básica só é feita com apoio do Governo, em todo lugar do mundo.
Queria terminar dizendo que não há nação desenvolvida que tenha universidades desprestigiadas ou fracas. Não se constrói um país sem investimento contínuo e sustentável em educação, ciência e tecnologia. Nós vamos perder o bonde da história, se continuarmos com essa política de ataque às universidades e de restrição ao financiamento. Preocupa-nos muito a fusão da CAPES com o CNPq. São agências que têm funções totalmente diferentes e que são imprescindíveis, como eu mostrei aqui, para o financiamento de todas as atividades de educação, ciência e tecnologia.
Muito obrigada. (Palmas.)
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A SRA. PRESIDENTE (Angela Amin. Bloco/PP - SC) - Gostaria de agradecer à Profa. Sandra Almeida a exposição e de registrar a presença dos Deputados Pedro Uczai e Maria Rosas e de representantes da Associação dos Docentes da Universidade Federal de Goiás.
Concedo a palavra à Profa. Helena Nader para sua exposição.
A SRA. HELENA BONCIANI NADER - Bom dia a todas e a todos. Para mim é uma honra estar aqui. Eu quero agradecer às Deputada Angela Amin e Margarida Salomão e a todos os que fizeram este evento acontecer. É importantíssimo o suporte que a Câmara e o Senado, que representam o Estado brasileiro, estão dando a essas reivindicações, que não são de corporações, mas do povo brasileiro.
Eu vou trazer alguns dados, mas antes quero, na pessoa da minha grande amiga Sandra, cumprimentar todas as reitoras e representantes de associações que estão aqui e, na pessoa do nosso companheiro de Mesa Nelson Amaral, cumprimentar todos os senhores aqui presentes: reitores e assim por diante.
Coube a nós, dentro do tema O papel da universidade pública no desenvolvimento da ciência e tecnologia, da educação e do conhecimento, falar sobre financiamento.
Eu vou passar rapidamente alguns eslaides que eu trouxe com dados e tentar não ser repetitiva. Eu não sou reitora e nunca fui reitora. Eu só fui pró-reitora de graduação e de pós-graduação e pesquisa da Universidade Federal de São Paulo, onde eu sou docente na Escola Paulista de Medicina. Então eu vou trazer alguns números que a Deputada Angela já falou e alguns mais e vou reiterá-los com gráficos, porque eu acho que temos sido espezinhados e maltratados pela mídia e também pelas instituições que usam os números e os interpretam de maneira errada.
(Segue-se exibição de imagens.)
Aqui há um dado da OCDE que eu acho importante. As barras vermelhas indicam o número de pessoas com educação superior; as barras azuis, o número de pessoas com educação formal inferior ao ensino médio. E a seta indica a situação do Brasil. Vocês veem que ele muda muito pouco. Nós estamos pegando pessoas entre 25 e 64 anos — então eu já estou fora, não pelos 25, mas pelos 64.
Como eu disse, a barra azul é referente à educação inferior a ensino médio. Então, 55% da nossa população tem educação inferior ao ensino médio, e, nessa época, 15% tinha ensino superior — agora são 18%.
Este é um dado mais recente da OCDE, entidade de que o Brasil queria fazer parte, mas foi posto para escanteio, recentemente, dividido por homens e mulheres. Alguém pode dizer: "Que bom! As mulheres estão melhor". Não, estamos todos, homens e mulheres, em situação péssima. As mulheres e os homens com educação superior ficam entre 25 e 34 anos de idade, uma faixa etária muito restrita. Há mais mulheres nas universidades — é a conclusão a que se chega —, mas o total é de 18%.
Este mapa, para quem não acredita que o século XXI é o século da economia do conhecimento... Que o Ministério da Economia nos ouça! Isso é importante.
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O Brasil está ali — eu pus uma seta vermelha para indicar. Quanto mais se caminha na abscissa para a direita, pior se está. Então, nós estamos bem mal. O gráfico mostra a relação entre renda e escolaridade. Nós estamos falando de emprego. Não estamos falando de palavrões, nem de esquerda e direita.
E, para aqueles que dizem que nós temos muitos mestres e doutores, é importante mostrar este eslaide.
Querem que sejamos como a Coreia. A Coreia é o primeiro país neste gráfico. Estão vendo? Aquela barra escura significa o nível terciário: doutorado e assim por diante. O Brasil está na rabeira! Nem se vê quanto temos de mestrado, de doutorado e de bacharelado! Ali estão os 18% de que eu falei para vocês. É muito pouco!
E, para quem acha que isso é mentira, estão aqui dados do Science and Engineerig Indicators, de 2016: entre 6,4 milhões de pessoas, o Brasil tem 1,9% desse valor em pessoas formadas na área de ciências — todas — e engenharia. E na área de não ciência e engenharia, que pega as humanidades, etc., entre 13,6 milhões de pessoas, o Brasil tem 5,4%. Comparem com a China. A China, na área de engenheiros e cientistas, tem 23% — é um quarto desta pizza. E, na área de humanidades e outras áreas, tem 12%.
Aqui vemos um Brasil que deu certo. É surreal que estejam querendo destruir este País que deu certo. Este dado mostra a evolução da pós-graduação. Por que acertamos nisso e não conseguimos acertar no ensino fundamental e no ensino médio? Por que não há uma política de continuidade? A CAPES é a prova do sucesso das políticas de Estado, e não de Governo; o MEC é a prova do contrário. Então, nós temos o exemplo de que nós sabemos como fazer.
Isso aqui, como a Sandra já mostrou, é fruto da universidade pública. Todo mundo cresceu. É claro que o Sudeste, de onde eu venho, diminuiu. Ainda bem! Ainda bem! Eu não trouxe aqui, mas vocês precisavam ver os dados que mostram que já há vários cursos com notas 6 e 7 na Região Norte e na Região Nordeste.
Este é um mapa também de extrema-esquerda, da UNESCO, que está mostrando que... Quando trazemos dados, às vezes, somos vitimizados. E eu acho muito importante a universidade pública vir a público mostrar para o que ela serve e trazer dados. E o povo que interprete os dados.
Então, está aqui: a Argentina está muito mais verde do que o Brasil. O que significa isso? Lá há muito mais doutores e engenheiros do que no Brasil. O Brasil tem por volta de 700 doutores por milhão de habitantes. Em Israel, um país transcontinental, há 8.500 cientistas e pesquisadores. Dá para entender um e entender o outro. Então, nós estamos aquém.
Na ciência — e este gráfico é motivo para se ter orgulho —, em 1985, quando foi criado o Ministério da Ciência e Tecnologia, época do Governo do Presidente Sarney, que substituiu o falecido Tancredo neves, nós tínhamos 0,35% dos artigos científicos publicados no mundo. Hoje nós estamos estabilizados, mais ou menos, em 2,5% a 2,8% da produção mundial. Continuamos em 13º lugar. Se vocês pegarem a base de dados Scimago, estamos em 14º.
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Eu fiz questão de mostrar isto aqui porque Folha de S.Paulo, Estadão, O Globo, todo mundo diz que se publica muito, mas sem sentido, sem impacto. Então vamos olhar os números. Em 2011, por este novo índice, em que o mundo é igual a 1, o nosso impacto era de 0,73. Em 2016, passamos para 0,86.
Vamos olhar então como é que o Brasil está em relação aos países do BRICS. A África do Sul está melhor do que nós. A Rússia é medíocre, realmente, com uma ciência pífia. Mas os maiores matemáticos estão lá. E eles têm as ciências espaciais e engenharias como nunca.
Nós fomos a Israel em uma missão e ficamos, durante o carnaval, em reuniões. E, em todos os lugares a que íamos, públicos ou universidades, eles diziam: "Israel plantava laranja nos kibutz, na década de 90. Era o que nós fazíamos. Com a vinda dos cientistas russos, Israel teve um salto de qualidade". E a ciência russa está abaixo da nossa. Mas é uma ciência pífia? E vejam a Índia.
Este outro gráfico ninguém comentou. O Japão está abaixo do índice 1. A ciência do Japão não existe? É uma ciência não significativa? Vejam ali: Japão, Brasil e México. Se vocês olharem, o cinza é o Japão. Mas o Japão é uma potência mundial! Então, índice tem que ser usado com parcimônia, entendo o que ele significa, principalmente porque aqui estão todas as áreas.
Agora saiu um novo dado. Está aqui. Ele avalia ciências da saúde; ciências biológicas; ciências exatas e ciências da terra — de acordo com as áreas da CAPES —; ciências da agricultura; engenharia; multidisciplinar; ciências sociais aplicadas; humanidades e ciências sociais; linguísticas, literatura e arte. Vejam que, na área da saúde, a média do País, de 2013 a 2018, está próxima da média mundial: 0,96. A biológica é inferior, 0,74. Mas eu quero salientar que em humanidades e ciências sociais, o nosso índice é 1. É exatamente igual ao mundo: 1.
Aí vamos ver as universidades. Há várias aqui. Essas são as 15 melhores nesse sentido. Mas olhem o número de trabalhos em cada uma delas, nas diferentes áreas, e os impactos — isso é uma média. A Universidade Federal do ABC, na saúde, tem 1,06; em exatas, 1,95. O índice varia com as áreas. A UnB é excelente na área da saúde, mas não é expressiva na área da agricultura. Então, índices têm que ser usados com muito conhecimento para se tomar decisão.
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E aí nós somos os culpados pelo fato de que o Brasil não vai bem na inovação, não é verdade? Nós somos os responsáveis, apesar de termos lutado por 10 anos para conseguir o Marco Legal de Ciência e Tecnologia.
Neste gráfico, quanto mais alto se está, pior é. É o contrário do que normalmente usamos. O aumento aqui significa que o Brasil está perdendo posições na inovação. Está em 66º, em 2019.
Quotas de produtos de alta tecnologia.
Este mapa vale a pena analisar. Todo mundo pode ter acesso a ele. É gratuito. É o Growth Lab Report, do Fórum Econômico Mundial. Pode-se pegar dados de todos os países, inclusive do Brasil. O Brasil está ali, onde eu pus aquela flecha. Vocês veem que nós temos pouca produção atualmente em alta tecnologia. Existem países piores do que nós, se isso compensar alguma coisa. Mas eu quero estar para lá, como a Suíça, etc.
Parcela de empregos intensivos em conhecimento na força de trabalho. Está ali o Brasil, com 21%. É muito pouco!
Este gráfico eu trouxe porque também dizem que a universidade não colabora com a indústria. Isso aqui é do Clarivate Analytics. Vai sair um trabalho escrito pelo Diretor Científico da FAPESP, o Prof. Brito Cruz — eu espero que ele já o tenha acabado —, que mostra que os números são muito melhores, porque o Clarivate só olhou indústrias de grande porte e multinacionais. O Prof. Brito fez um levantamento que pega as pequenas indústrias, e os índices da universidade brasileira são iguais aos das universidades da Califórnia. Só são inferiores aos do MIT. Então, nós estamos indo. Este gráfico significa que estamos aumentando a colaboração com a indústria. Ele indica trabalhos publicados em parceria com a indústria.
Aqui vemos a situação das diferentes universidades. A USP está em primeiro lugar nesse aspecto, entre as grandes.
E aqui o que vocês veem? Todas as áreas do conhecimento aumentaram a colaboração com a indústria: a agricultura é a barra verde, que nem aparecia no primeiro grupo, de 1985 a 1987. Enfim, vemos colaboração com a indústria em todas as áreas: agricultura, ciências biológicas, saúde, engenharia e ciências exatas e da terra.
E o financiamento? O verde aqui significa "péssimo"; o vermelho, "excelência". Não fui eu que escolhi a cor. O gráfico é do Fundo Monetário Internacional. Juro por Deus que eu não alterei isso.
Aqui vemos o investimento em pesquisa e desenvolvimento como porcentagem do PIB. Os países da OCDE têm investimento de pouco mais de 2%, e o Brasil — esclareço que o dado é velho, é antigo, porque não está havendo renovação nas páginas — tem investimento de 1,2%. Atualmente não é isso. Sabemos que hoje é muito menos.
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E, agora, rapidamente, eu vou trazer alguns dados, porque temos sido acusados de ter muito dinheiro e fazer mau uso dele e de não conhecer o sistema americano. Bom, eu morei lá. E todas as vezes que eu fui para os Estados Unidos tive as despesas pagas por eles, todas as minhas bolsas. Eu podia ter ficado lá. Tive oportunidade para isso. Estou no Brasil porque eu amo o Brasil e sei que este é um país que vai dar certo. Mas eu trouxe os dados.
De novo, quem financia educação e ciência nos Estados Unidos? Este é um mapa feito pela coirmã americana da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência. Nos Estados Unidos, é a American Association for the Advancement of Science. A nossa SBPC tem 71 anos; a coirmã americana tem 171 anos. Este mapa mostra que a defesa é responsável por quase metade da pizza. Este é um trabalho de 2014. Na época, isso equivalia a 66 bilhões de dólares. E as outras agências? Olha o número de agências de financiamento à ciência. Nós temos três, e estão querendo fechar as três, o que não podemos permitir. São elas: CAPES, CNPq e FINEP, com o FNDCT.
Aqui, vemos a evolução das agências: o azul é o NIH, que é da saúde; o vermelho, o National Science Foundation; e assim todas as agências federais, sempre num crescendo de financiamento. Inclusive, vocês lembram que, logo que o Trump assumiu, ele mandou um orçamento para o Congresso para cortar verbas da ciência. E, curiosamente, republicanos e democratas, nas duas Casas, votaram para aumentar o financiamento. Isso é visão de Estado, que é o que esta Casa está fazendo. Então, eu agradeço de novo.
Aqui, estão o financiamento em P&D e as áreas em que eles mais investem: saúde, espacial e outras.
Este outro eslaide mostra o financiamento em P&D nas universidades. Em azul-escuro está o financiamento federal; em vermelho, o estadual e o local — ou seja, tudo Governo —; em cinza, o da indústria. Isso é na universidade. Os dados podem ser comprovados. Eu garanto, porque eu conheço bem quem fez o trabalho, em 2014, a AAAS. Estou quase acabando, mas antes vou falar de duas cartilhas.
A primeira é o Relatório Fiscal de Políticas para Inovação e Crescimento, do FMI, que diz que o apoio público é fundamental para o desenvolvimento das tecnologias inovadoras e que um maior esforço fiscal dos governos, com apoio adicional equivalente a 0,4% do PIB, levará a um crescimento adicional do PIB de até 5% no longo prazo — investimento em ciência.
A outra cartilha é a da Comunidade Europeia que mostra o valor da pesquisa, ao dizer que o investimento em pesquisa pública tem retorno de 3 a 8 vezes do valor aplicado e que entre 20% e 75% das inovações não poderiam ter sido desenvolvidas sem a contribuição da pesquisa pública.
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Temos aqui, de novo, vários estudos sobre investimento público e Comunidade Europeia.
O financiamento público em pesquisa e inovação atua como um catalizador para alavancar as atividades de ciência e tecnologia e o crescimento econômico.
Concluo dizendo que eu não sou contra o ajuste fiscal, pelo contrário. Eu sou totalmente a favor de que haja um ajuste fiscal, porque eu tenho que ser coerente com a minha trajetória de vida. Durante 10 anos, eu estive na SBPC e agora estou na ABC. Então, são 12 anos lutando por educação e ciência. Quando foi feita a Emenda Constitucional 95, nós lutamos para que não se incluíssem no teto as áreas de educação e ciência, porque isso é política de Estado, e quem atira na criança não vai ter futuro.
Então, diante da justificativa de que o Brasil precisa da Emenda Constitucional 95 para ganhar a confiança do mercado, é necessário fazer algumas perguntas. E esclareço que são perguntas minhas, não da ABC. Eu tenho que assumir o que eu falo, porque eu não consultei todos os membros da Academia para ver se eles concordam com isso. Então, pergunto: de que mercado estamos falando? Do especulativo ou do produtivo? Daquele baseado em matérias primárias ou daquele que trata com produtos de alta tecnologia? Daquele baseado em mão de obra desqualificada e com baixos salários ou daquele com profissionais qualificados e bem remunerados? E repito a frase que aqui no Congresso Nacional se fala sempre: "Ciência e educação não são gastos, são investimentos".
No meu último eslaide, trago algo que sugere que o Banco Mundial ouviu a minha frase e a está usando. Vocês podem procurar em inglês, mas eu traduzi o que o Banco Mundial colocou em seu Relatório de Desenvolvimento Mundial, de 2018: "Os alunos de hoje serão os cidadãos, líderes, trabalhadores e pais do amanhã. Portanto, uma boa educação é um investimento com benefícios duradouros".
Obrigada. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Angela Amin. Bloco/PP - SC) - Agradeço à Profa. Helena Nader a participação.
Aproveito a oportunidade para registrar a presença do Deputado Glauber. S.Exa., parece-me, já se ausentou, mas passou por aqui.
Finalizando, eu passo a palavra ao Sr. Nelson Amaral para a sua exposição.
O SR. NELSON CARDOSO AMARAL - Bom dia. É um prazer estar nesta manhã aqui com vocês. Agradeço o convite às Deputadas Angela e Margarida. É um prazer compor esta Mesa com as Profas. Sandra e Helena e participar deste evento com os Profs. Luiz Antônio, Roberto Salles e Maria Emília, que fizeram a análise anterior.
(Segue-se exibição de imagens.)
Eu quero agradecer às professoras que fizeram as duas apresentações anteriores, porque facilitaram muito o que eu vou analisar.
Eu vou numa vertente em que eu tenho insistido, quando analiso os dados da educação. Como aqui estamos tratando de ciência e tecnologia, vou fazer a mesma análise voltada para ciência e tecnologia, incorporando os gastos nas áreas de saúde e militar, para que possamos examiná-los. Por isso coloquei no título da apresentação a seguinte pergunta: "Qual a prioridade nacional?", mais ou menos na linha do que a Profa. Helena Nader estava dizendo.
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Quando olhamos os dados do MCT, como são os pesquisadores e o pessoal de apoio no Brasil, por setor institucional, a maior parte está exatamente na educação superior, como mostra aquele gráfico de cima. Em torno de 80% estão na educação superior: na educação superior privada, na educação superior pública. Em que setor da educação eles devem estar? É claro que eles estão em todos os setores, mas estão mais em que setores?
Aqui temos uma referência. Quem examina as transparências pode ver que há todos os componentes para pegar os dados que o MCT utiliza. Não é fácil compilar estes dados.
Esta tabela mostra os programas de pós-graduação no País inteiro, separados: universidades federais, outras instituições federais, estaduais, municipais e as universidades privadas, com o total. É claro que onde há pós-graduação, mestrado e doutorado há, obrigatoriamente, pesquisa. Como podemos ver, as universidades federais têm 2.180 programas, conforme dados do GeoCapes de 2016. As outras instituições federais têm 217 programas; as instituições estaduais têm 971 programas, com grande concentração em São Paulo, nas três paulistas; no Paraná, as municipais, muito pouco; e as privadas, no Norte e no Nordeste. Há a necessidade de pagamento de mensalidade, e existe pós-graduação privada. Normalmente, elas se concentram mais na Região Sudeste e um pouco na Região Sul.
Com base nisso, onde estão os professores que pesquisam e as pessoas que trabalham em pesquisa e em desenvolvimento? Nas instituições públicas: 81,4% é o percentual das instituições públicas. Grande parte do pessoal que trabalha na educação superior está nas instituições públicas. Por isso, a pertinência de toda esta discussão que estamos fazendo sobre o financiamento das instituições públicas.
Eu tenho insistido, nas várias análises sobre os recursos da educação, que nós temos que olhar concretamente para o recurso aplicado por habitante. Nós não devemos ficar olhando apenas o percentual do PIB. É claro que olhar o percentual do PIB é importante, mas fala-se do percentual do PIB, e o Brasil aplica, por exemplo, 6% em educação, enquanto os Estados Unidos aplicam 5%. Os valores são algo em torno disso.
O Brasil está muito melhor que os Estados Unidos: está aplicando 6% do PIB. No entanto, são 6% do PIB brasileiro e, nos Estados Unidos, são 5% do PIB americano. Além disso, é preciso olhar mais outro componente, qual seja, o tamanho da população, o grupo de pessoas de 0 a 24 anos, para depois se concluir por habitante ou por pessoa em idade educacional, para que os números tenham sentido. Do contrário, os números não fazem sentido nenhum.
Quando eu vejo que se aplicaram tantos por cento em saúde ou em gastos militares, não tenho ideia. Eu tenho que ver o outro componente, por habitante, que envolve estes dois valores, para entendermos o que quer dizer. Eu aprendi isso numa entrevista com o médico Adib Jatene. Na ocasião, ele estava debatendo com um grupo de jornalistas que falava exatamente sobre o percentual do PIB aplicado na educação brasileira e sobre o percentual do PIB aplicado em países europeus. Disse ele: "Isso que vocês estão dizendo não tem sentido para mim". Ele começou a falar sobre valor por habitante. Eu disse que a mesma análise poderia ser feita em relação à educação no Brasil, e eu passei a fazê-la. Assim, vamos fazer esta análise no caso da ciência e da tecnologia para ver o que dá.
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Eu acho que esta apresentação explica tudo o que foi mencionado anteriormente sobre nossa situação. Eu não vou cansá-los toda vez que for apresentá-la. Eu vou demorar um pouquinho nesta apresentação só para entendermos em que situação nos encontramos.
O Brasil tem 208 milhões de habitantes e um PIB de 3,248 bilhões. Trata-se de um PIB em dólar, PPP, que é a paridade do poder de compra. Nós só podemos comparar moedas de países usando o dólar PPP, senão acabamos fazendo comparações absurdas de países com o dólar daqui e o dólar de lá.
Nesta tabela, temos o percentual aplicado em ciência e tecnologia em vários países, com o valor aplicado em bilhões e o valor por habitante. Mais agora do que antes, estou procurando pegar fontes insuspeitas, que não são comunistas, como a Profa. Helena Nader diz. Ali estão os dados da CIA e do Banco Mundial. São dois bancos de dados cuja validade não tem como ser questionada.
O que nós precisamos fazer? Temos que pegar o percentual do PIB, pegar o valor do PIB e dividi-lo por habitante, para termos uma ideia de como que este País financia a ciência e a tecnologia. Quando nós vemos o resultado, percebemos que não há surpresa nenhuma.
Eu não vou parar muito nas outras tabelas, mas elas têm todos os dados. Eu sei que este material fica na página da Câmara, e ele serve para subsidiar outras pessoas, no caso da necessidade de alguma conferência. Se houver alguma dúvida, basta conferir.
Eu coloquei em ordem decrescente os países que são selecionados, para termos uma ideia. A Coreia do Sul tem 1.800 por habitante. Na sequência, vêm os Estados Unidos, a Alemanha, o Japão, a Finlândia, a Austrália, a França, o Canadá, o Reino Unido, a Nova Zelândia, a Itália, a Espanha, a Hungria, Portugal, o Brasil e o Chile, com um pouquinho menos de 200 por habitante. Pronto! Se quisermos nos comparar com estes países, precisamos colocar mais dinheiro para a ciência e a tecnologia, pois hoje estamos sofrendo ferrenhamente. A todo momento se fazem comparações com estes países.
Estes pontos são todos interligados. Aqui estão os valores aplicados em ciência e tecnologia, em saúde e educação e em gastos militares, o que foi uma surpresa para mim, pois eu nunca tinha investigado muito estes números. De uns tempos para cá, eu comecei a perceber para onde estão indo os recursos e qual é a prioridade brasileira, principalmente depois da Emenda 95.
Aqui temos a mesma coisa, mas nós acabamos pegando o valor aplicado por pessoa de 0 a 24 anos, que é o potencial de idade educacional que o País tem, para termos uma ideia. Se o País tem poucas pessoas de 0 a 24 anos na educação, quando se divide pelo número de matriculados, o número a que se chega é alto. No entanto, um monte de pessoas está fora do sistema educacional. Este é o cuidado que nós precisamos ter, não é, Profa. Helena?
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É por isso que eu pego a faixa de 0 a 24 anos, para olhar o potencial de estudantes. Se houver gente fora da escola, inclui-se na conta. Coisa semelhante se dá: faz-se a conta, obtém-se o valor, divide-se e obtém-se por pessoa.
Falando sobre a Finlândia, muitas pessoas gostam de nos comparar com a Finlândia, principalmente quando sai o resultado do PISA: quase 12 mil — 11 mil e alguma coisa. Não estou nem falando da Alemanha, Canadá, Estados Unidos, Austrália, Reino Unido, Coreia do Sul, Nova Zelândia, França, Japão, Itália, Espanha, Portugal, Hungria e Chile.
Nós temos que direcionar mais dinheiro para a educação, diante das muitas outras necessidades que o Brasil tem.
Na saúde, ocorre a mesma coisa. Neste caso, no entanto, é preciso analisar a questão por habitante. O percentual do PIB aplicado, pelo banco de dados da CIA, são, nos Estados Unidos, 10 mil por habitante. Os exemplos são os mesmos: Alemanha, Canadá, Austrália, França, Nova Zelândia, Japão, Finlândia, Reino Unido, Itália, Espanha, Coreia do Sul, Portugal, Hungria, Chile e Brasil.
Há outros pontos, como o valor por habitante aplicado em gastos militares.
Na verdade, o Brasil precisa de muito dinheiro para tudo! É um país rico, mas, ao mesmo tempo, pobre! O Brasil é muito grande, com uma população enorme, de 0 a 24 anos. Há muitas pessoas, e nossa dinâmica populacional é, entre aspas, "perversa", porque a quantidade de idosos, pessoas com 60 anos ou mais, vai passar de algo em torno de 20 e poucos milhões para 50 milhões. É um aumento brutal! Daqui a 2036, serão 25 milhões de idosos a mais. Daqui a 2036, serão 20 milhões de pessoas a mais no País. Mesmo assim, criaram esse absurdo chamado Emenda 95!
Não levaram em conta estes fatores. Que ideia é esta de fazer um congelamento por 20 anos sem considerar que a população vai crescer 20 milhões e que nós estamos numa mudança brutal da dinâmica da população brasileira, com 25 milhões de idosos a mais?
Se fizermos uma análise mundial sobre este congelamento, no caso da responsabilidade fiscal, os países fazem isso por 2 ou 3 anos, sempre colocando um vínculo entre a inflação e a variação do PIB, entre a inflação e a variação dos impostos. Sempre há alguma ligação para destravar o congelamento. É um absurdo este congelamento! Esse congelamento já está causando problemas seriíssimos. Um deles diz respeito aos recursos próprios das universidades. Além disso, mistura-se isso à regra de ouro e ao superávit primário, gera-se uma conjugação tripla que é uma amarração violenta para o País! Já estão começando a perceber isso. Basta olhar a proposta orçamentária para o ano que vem.
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Com relação à carga tributária brasileira, ela é a maior do mundo. Nós temos uma carga tributária de país rico, mas serviços de país pobre? É isso? Esta é a frase que nós mais ouvimos quando se fala de carga tributária. Isso é verdade? A carga tributária brasileira é de 32,29% do PIB. Na Austrália, são 27,8%. Nos Estados Unidos, 26%. Novamente, são 32,29% do PIB brasileiro. Lá, são 26% do PIB americano. Se não falarmos isso, não faz sentido. Alguns citam 32% e 26%, mas nossa carga tributária é maior que a dos Estados Unidos. O cara vai aos Estados Unidos e vê estradas, universidades, prédios, órgãos públicos, e quer que as coisas aqui sejam iguais às dos Estados Unidos, porque aqui a carga tributária é maior que a americana. Esta análise é um absurdo total! No entanto, fazem esta análise o tempo todo.
Aqui nós vemos a carga tributária em percentual. Quando se analisa por habitantes, o Brasil está com 32%, só para termos uma ideia; os Estados Unidos estão aqui e a França está com 45%. Considerando-se o percentual do PIB, esta frase é verdadeira: temos uma carga elevada, comparativamente com os outros países. Mas não é este o número que tem concretude, não é o percentual do PIB. Haverá concretude se fizermos aquela conta que eu tenho feito o tempo todo.
Façam isso por habitante. O que dá? No Brasil, são 5 mil dólares/PPP, os Estados Unidos dão mais de 15 mil. Lá se arrecadam, em média, mais de 15 mil dólares/PPP por habitante. Aqui são 5 mil. Esta é a carga tributária brasileira. É preciso retornar serviços proporcionais a isso, e não se olhar apenas para o percentual do PIB.
Vocês podem imaginar a angústia em que eu vivo toda vez que eu sento na frente da televisão para ver as pessoas falarem isso o tempo todo. Eu tenho estes números de cabeça!
Como foi a evolução dos recursos aplicados em ciência, tecnologia, educação, saúde e defesa nacional entre 2000 e 2018? A função educação pega, de todos os Ministérios, o que é classificado como educação e soma-se. A função ciência e tecnologia abrange tudo o que é de todos os Ministérios e soma-se. Esta é a função. A função defesa nacional abarca, de todos os Ministérios, o que é compatível com a defesa nacional e soma-se. A Emenda 95 começou a atuar em todo o dinheiro do Poder Executivo. Ela vale em todo o dinheiro do Poder Executivo, mas não vale para os setores que fazem parte do Poder Executivo. Portanto, pode-se, sim, na Emenda 95, colocar prioridades dentro do Poder Executivo. O que está congelado é o dinheiro total do Poder Executivo, não o que está dentro de cada setor deste Poder. Fica parecendo que o dinheiro da saúde e da educação tem que estar congelado.
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A evolução está aí.
No caso da educação, houve uma correção para janeiro de 2019, pelo IPCA. Com uma série histórica tão grande, é claro, nós temos que fazer isso para fazer sentido. Diante daquele patamar, já se pode dizer que se trata da Emenda 95 ou deste componente presente ali.
Vejam como é curioso o que eu encontrei. No período de 2000 até 2006, houve praticamente uma emenda constitucional, sem se definir a emenda constitucional. Foi um período em que eu fui Pró-Reitor e Vice-Reitor da universidade. Eu vivi muitos desses momentos. Os valores da educação eram reajustados pela inflação. Agora existe a Emenda 95, coisa que não existia naquela época.
A saúde tem um perfil parecido, embora não tenha havido uma emenda constitucional naquele período anterior. Mas parece que existe congelamento.
Esta tabela mostra o que aconteceu com a ciência e a tecnologia no período.
Sobre a defesa nacional, eu já conferi este gráfico umas duas ou três vezes. Eu já o apresentei umas três vezes. Eu sempre peço que, se alguém puder, verifique e veja se há algo errado. Eu me belisco o tempo todo. Houve aquele salto de 20 bilhões de 2015 para 2016, número que continua subindo. Pelo visto, vai subir mais, porque há uma proposta de emenda à Constituição sobre a previdência dos militares em que se prevê aumento salarial para eles, junto com a reestruturação da carreira. Na reestruturação da carreira, provavelmente estes valores vão subir.
Fica a pergunta: qual é a prioridade? (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Angela Amin. Bloco/PP - SC) - Agradeço ao Prof. Nelson Amaral sua exposição.
Passamos às perguntas e às considerações dos Parlamentares aqui presentes. S.Exas. poderão falar por 3 minutos. Antes, porém, passo à condução dos trabalhos à Deputada Margarida Salomão.
A SRA. MARGARIDA SALOMÃO (PT - MG) - V.Exa., que é a Vice-Presidente, pode continuar, Deputada, por favor.
A SRA. PRESIDENTE (Angela Amin. Bloco/PP - SC) - Concedo a palavra à Deputada Margarida Salomão.
A SRA. MARGARIDA SALOMÃO (PT - MG) - Há muito tempo, acho, não temos um conjunto de apresentações tão contundentes e tão meridianas quanto à demonstração. Trata-se, de fato, de que escolha e de que futuro nós desejamos para este País.
A única coisa que me dói é que estamos aqui, se pensarmos apenas nas presenças, pregando para convertidos, embora até os convertidos saiam daqui mais animados diante de suas crenças. É muito importante que se tenha os dados que foram apresentados aqui sobre a CIA, diante do nível de sobriedade que apresentam. Eles revelam bem o caminho que nós estamos tomando, o que é muito problemático para nosso futuro. Digo isso porque não cabe dúvida, como disse a Profa. Helena Nader: hoje nós vivemos a economia do conhecimento. Assim, se eu corto investimento em economia de conhecimento, isso significa cortar qualquer investimento em prol da universidade. É como se se fechasse uma fábrica. Em grande parte, isso representa um equívoco.
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Eu vou solicitar à Comissão de Ciência e Tecnologia, na qual eu tenho a honra de estar ao lado da Segunda-Vice-Presidente, que transforme este conjunto de palestras em uma publicação. As apresentações feitas aqui deveriam se tornar um conjunto de publicações, porque os dados são tão relevantes, que é necessário fazê-lo. É claro que eles todos estão disponíveis na base de dados da Câmara, mas acho que é preciso que eles estejam reunidos, para que possam ser usados como a ferramenta que eles são.
Eu quero cumprimentar todos os expositores, os que nos apresentaram os dados, os que nos apresentaram a evolução histórica do processo da autonomia ou da falta de autonomia da educação superior brasileira, como fez o Prof. Luiz Antônio Cunha.
É muito importante debater este assunto. Estou fazendo, na verdade, um comentário, porque estou impactada pela contundência destes dados.
Eu quero agradecer aos expositores e sugerir falar com nosso Presidente Félix. Para isso, eu conto com o apoio da Vice-Presidente, a Deputada Angela Amin, para que possamos fazer esta transformação. Como as apresentações foram feitas, e elas são muito substanciadas, eu gostaria que saísse um artigo ou um capítulo de cada uma das falas, o que, a meu ver, ajudará muito nossa Câmara e nosso grupo de trabalho.
O Deputado Rodrigo Maia disse que está realmente interessado neste assunto. Eu quero dizer que ele tem sido um grande aliado. Quero deixar isso muito claro. O Deputado Rodrigo Maia tem sido um importante aliado na defesa da ciência e da tecnologia, bem como na defesa das universidades brasileiras. Eu vejo a atuação dele em operar o descontingenciamento dos valores do CNPq, quando este estava absolutamente desidratado de recursos para suas obrigações corriqueiras. Não era investimento: era para cumprir o que já havia.
Reitero: o Deputado Rodrigo Maia é um grande aliado. Mas eu acho que ele precisa, como tantos de nós, ter acesso a estas informações. Eu creio que elas não são do domínio comum. Pelo contrário, há um discurso do senso comum de que as universidades são perdulárias, que elas não inovam, que elas têm relações paupérrimas com o sistema privado, tudo ao contrário do que vimos aqui. Aliás, disseminou-se o discurso de que nós gastamos mais com a educação do que os Estados Unidos. Eu ouço isso nos corredores desta Casa de forma recorrente. Eu acho que estas informações foram apresentadas de forma tão qualificada, que é necessário que elas sejam compartilhadas, para que possamos de fato construir políticas de Estado, como reclama o Prof. Roberto.
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Eu aproveito para dizer que a Câmara e o Senado fizeram o dever de casa quando nós votamos o PNE. O PNE foi votado. Ele pode ser aperfeiçoado? É claro que sim! Criticado? Deve ser. Mas o PNE foi votado, ele é um plano de voo. Mas não podemos, a cada oscilação política, mudar o plano de voo. Do contrário, nós corremos o risco de nunca decolar ou, o que é pior, de viver um desastre. Eu acho que isso é muito grave.
O Presidente Rodrigo Maia diz que está aguardando o relatório da Deputada Tabata Amaral, que reunirá os dados para demonstrar o que de fato o que está acontecendo com o financiamento das universidades no Brasil. Eu confio muito na capacidade da Deputada Tabata. Creio que ela é capaz, por exemplo, de usar estes dados. Aliás, vou passar todos os dados a ela. Tomo a liberdade de passar estes dados a ela, para que ela possa subsidiar seu relatório com informações com esta qualidade, para que nós possamos evoluir numa política que nos dê segurança. Foi isso que aconteceu com a Coreia, que é nosso outro exemplo, bem como com a Finlândia, que tem 1,5 milhão de habitantes, como disse o Prof. Nelson Amaral. É muito importante falar isso, porque 1,5 milhão é a população de Belo Horizonte.
Na Finlândia, todo mundo tem cartão de identidade, que é o cartão de crédito e o título de eleitor. Vamos falar a verdade: é mais fácil 1,5 milhão do que um país com a população do tamanho do nosso e com as desigualdades que nós temos.
O Prof. Nelson mencionou um valor que ele sabe que é de referência. Na verdade, quando se diz que no Brasil as pessoas pagam a terça parte de impostos que paga o cidadão americano, isso é fato. Ele mostrou. Mas há uma desigualdade enorme na contribuição, uma imensa desigualdade na contribuição, de modo que quem menos recebe é que mais paga. Este também é um dado da estrutura brasileira.
Eu queria fazer este comentário e fazer um pedido à nossa Vice-Presidente, que tem sido uma interlocutora importantíssima no debate sobre o financiamento da ciência e da tecnologia no Brasil, um tema que eu considero prioritário.
Os partidos ainda não se deram conta de que a Comissão de Ciência e Tecnologia é central, em se tratando do debate do desenvolvimento brasileiro. Eu digo isso até ao meu partido. Aliás, do meu partido, só eu estou aqui.
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Eu canso de falar para a minha bancada: "Vocês estão olhando para o lugar errado". Se não olharmos para ciência e tecnologia, não vamos olhar para o nosso projeto de futuro. Infelizmente, por uma série de razões culturais e também por falta de informação, nós temos patinado muito. Então, pelo menos, vamos recorrer.
A Deputada Professora Rosa Neide, que chegou aqui, é uma grande defensora da educação. Dados extraordinários e apresentações muito mobilizadoras foram feitas aqui na primeira e na segunda mesa. Amanhã continuaremos. Eu quero convidar todo o mundo para continuarmos o debate neste momento de inteligência e de emancipação que nós estamos vivendo na Câmara, para darmos consequência a tantas coisas que nós estamos aprendendo aqui.
Muito obrigada, Presidente.
A SRA. PRESIDENTE (Angela Amin. Bloco/PP - SC) - Eu gostaria de cumprimentar a Deputada Margarida Salomão. O que V.Exa. disse vem ao encontro daquilo que nós temos trabalhado muito. Queremos fazer com que os dados existentes possam se tornar informação, de maneira organizada, para que essas informações possam servir para a tomada de decisão. Nós só teremos condições de tomar decisões da maneira correta a partir do momento em que essas informações estiverem disponibilizadas de maneira organizada, para que possamos transformar essas informações em conhecimento. Eu acho que isso é de fundamental importância para o Brasil.
Eu gostaria de dizer que tive a oportunidade de ser Relatora da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional na década de 90. Uma das discussões a que nós mais nos dedicamos foi exatamente sobre o conceito de autonomia universitária. Foi feito um trabalho bastante intenso naquela oportunidade, porque poucas pessoas entendiam exatamente o conceito de autonomia. Eu acho que nós avançamos naquela oportunidade, mas temos que nos atualizar. Nós não podemos deixar de nos atualizar sempre.
Com relação à pesquisa, nós tivemos a oportunidade — a Deputada Margarida Salomão estava aqui na semana passada — de relatar um projeto de lei de autoria do Deputado Assis Carvalho, que definia, através de uma legislação, a liberdade do pesquisador nas entidades e universidades. Este projeto de lei é terminativo nas Comissões. Ele saiu desta Comissão de Ciência e Tecnologia e seguiu sua tramitação. Como sou suplente na Comissão de Constituição e Justiça, eu já solicitei a possibilidade de relatá-lo naquela Comissão, para que tenhamos esse processo definido na legislação brasileira. Então, como sou suplente lá, eu já solicitei ao Presidente, através do sistema, que me designe Relatora, para que tenhamos esse cuidado com relação à importância da pesquisa, principalmente para averiguar e respeitar o pesquisador.
Eu gostaria de registrar que, diante da necessidade de nós pensarmos a educação como um todo, é necessário — eu acho que os dados aqui também mostraram isso — valorizarmos a universidade, bem como valorizarmos o sistema educacional como um todo. O Plano Nacional de Educação deixou muito clara a importância desse atendimento, para que o aluno, independentemente de ser de escola pública ou de escola privada, tenha a possibilidade de enfrentar o ensino superior.
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O Estado de Santa Catarina, na década de 80, foi o primeiro Estado brasileiro que transferiu a área de assistência social para a área da educação, do atendimento à educação infantil, desde o início. Esta atitude foi muito trabalhada. Nós tivemos muita dificuldade para trabalhar essa visão da necessidade de os princípios educacionais serem agregados ao atendimento à criança desde o início da sua existência. Isso foi um avanço bastante importante. Depois, a partir da discussão da Constituição Federal, seguiu sendo analisado esse aspecto. Quando se trata de educação, nós não nos cansamos de discutir, de aprimorar e de nos atualizar.
Eu entendo que este momento da Comissão de Ciência e Tecnologia é muito importante e dinâmico. Eu não tenho receio algum de dizer que vamos colher um resultado bastante positivo, por causa da qualidade dos Parlamentares que aqui estão e principalmente pelo compromisso desta Comissão com o resultado.
Eu gostaria de agradecer à Deputada Margarida Salomão.
Informo que nenhum outro Parlamentar se inscreveu para questionar. Dessa forma, passaremos às considerações finais dos membros da primeira e da segunda mesa, para que possamos encerrar.
Concedo a palavra à Profa. Maria Emília Walter, da UnB.
A SRA. MARIA EMÍLIA WALTER - Eu gostaria de agradecer às Deputadas a oportunidade de estar aqui, sobretudo porque o Congresso tem sido um aliado grande nessa parte.
Eu acho muito importante que as pessoas entendam o esforço que estamos fazendo para que o trabalho feito nas universidades seja compreendido. Esse processo participa do ecossistema de inovação. Eu volto à história do ecossistema de inovação porque acho importante que as pessoas compreendam que o aporte de recursos financeiros para as universidades não tira do Governo a necessidade de investir recursos, como bem vimos nos eslaides.
Todos estamos desejando que o País avance e que isso, de fato, seja uma oportunidade para repensarmos nossas ações. Existem várias ações que podem ser feitas, mas eu acho que esta é uma oportunidade muito grande de repensar toda essa estrutura que temos para fazer transferência do nosso conhecimento.
De fato, eu quero deixar como mensagem final o desejo de que sejam aprimorados o nosso Sistema Nacional de Ciência e Tecnologia, a academia, as agências de fomento, CAPES, FINEP, CNPq, FAPs e todo o nosso sistema, que foi tão duramente conquistado durante 50 anos, 60 anos. Não vamos dar passos para trás e retroagir o Brasil muitos anos. Para construir, levamos 60 anos; mas, para destruir, é muito rápido.
Então, eu gostaria de pedir sensibilidade e de agradecer muito esta oportunidade de reafirmarmos a excelência acadêmica das universidades e a nossa disposição de colaborar para o desenvolvimento do País. (Palmas.)
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A SRA. PRESIDENTE (Angela Amin. Bloco/PP - SC) - Agradecemos à Profa. Emília Walter.
Passo a palavra ao Prof. Roberto Salles.
O SR. ROBERTO SALLES - Em primeiro lugar, eu gostaria de parabenizar a segunda mesa. Comparando-a com o primeiro grupo, até parece que realmente houve uma combinação entre nós, até parece que nos reunimos antes para falarmos praticamente a mesma coisa.
A educação é vista como um sistema vivo que se retroalimenta. Começamos com a educação na pré-escola até chegarmos à pós-graduação, à formação de professores e às pesquisas que estão permeando todo o nosso País em todos os setores. Não existe nenhuma dúvida quanto a isso. Se não for comparada a uma questão de Estado, se continuarmos... Brilhantemente, o Prof. Luiz Antônio Cunha fez um histórico dos soluços que são feitos a cada Governo que entra.
Eu acho que isso é um trabalho dos Srs. Deputados e dos Srs. Senadores, para que tenhamos um horizonte de 50 anos em que ninguém possa mexer no sistema. Esperamos que se valorize o professor, como está acontecendo agora na China, onde as escolas que deram certo nos centros urbanos desenvolvidos levam suas ideias para o sertão e para as regiões longínquas.
Eu quero dizer que estou muito esperançoso com a Comissão Especial. Estou imaginando que a Comissão será presidida pelo Deputado Gastão Vieira. S.Exa. é experiente, foi Presidente da Comissão de Educação e verá a universidade como um todo. Já há um projeto de autonomia. Com a contribuição de todos, com os dados que estão aqui, acho que isso realmente poderia ser muito positivo para o trabalho desses Deputados. Eu acredito que a Comissão será composta por 30 Deputados — não sei qual é o tamanho dela.
Eu também gostaria de agradecer ao Deputado Rodrigo Maia, que tem nos incentivado a comparecer a todos os eventos.
Eu queria fazer uma retificação, para tranquilizar algumas pessoas. A Ana Lúcia Gazzola inclusive já puxou a minha orelha aqui. Eu falei de duas coisas, e vou repetir. Não sei quantas fundações existem, mas, se há 63 universidades e se cada universidade tem uma fundação — as novas não têm fundação —, acredito que existam cinquenta e poucas fundações de apoio. Há 63 universidades, mas algumas são jovens e, acredito eu, não têm fundação.
As fundações foram e ainda são importantíssimas para as nossas universidades, mas eu não posso dizer que todas são transparentes, porque não são — a maioria, eu acredito que seja. Entrem nas páginas das instituições e vejam se conseguem saber quanto cada projeto daquele recebe de bolsa. Vejam se todos estão uniformes. Não estão! Tem que se uniformizar. Se vocês conseguem ver o contracheque de cada pessoa, por que eu não posso saber quanto ganha o cara que está no projeto tal? Aparece o CPF dele. Isso eu vi! Ninguém me falou! Eu não posso concordar com que todas sejam iguais, pois não são — a maioria, sim; mas algumas têm que fazer mea-culpa.
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A outra questão que eu falei foi sobre as agências, como a Agência Nacional do Petróleo e a Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Numa agência pública, os membros são escolhidos pelos Deputados. O MEC trataria da questão que tem que ser tratada e as universidades seriam acompanhadas. Isso é uma proposta minha, não é da Comissão. Isso foi uma coisa que eu coloquei como uma tentativa de as universidades poderem tranquilamente trabalhar dentro da sua autonomia, com a existência de um órgão específico que possa acompanhá-las, que possa ver os problemas e que ajude a corrigir algumas coisas que têm que ser corrigidas.
Também não podemos ter 100% de autonomia e cada um fazer o que quiser, sem que ninguém responda a ninguém. Não dá para continuar assim. Isso é o que eu acho. Tem que haver autonomia, com o reitor mandando, com as fundações submetidas a reitores, tudo certinho, com livre pensamento, com livre cátedra, mas tendo que prestar contas à sociedade. É isso! Temos órgãos de controle? Temos, a exemplo do Tribunal de Contas, etc. Mas, em vez de o MEC ficar dando pitaco dizendo "precisamos disso, precisamos daquilo", haveria uma agência independente e pública para fazer isso. Essa foi uma ideia que eu tive. Não é uma proposta do GT e não está amadurecida.
Eu estou respondendo isso, porque Ana Gazzola já me acionou aqui. Estou respondendo a ela que isso aí foi uma palavra, foi uma voz que eu falei, mas não foi em nome do GT. Estou falando em meu nome, Roberto Sales, como também aqui não falo em nome da Universidade Federal Fluminense. Eu falo em nome do grupo de trabalho nomeado pelo Presidente da Câmara, o Deputado Rodrigo Maia.
Muito obrigado. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Angela Amin. Bloco/PP - SC) - Agradeço a presença e as colocações do Prof. Roberto Salles.
Eu gostaria de justificar que o Prof. Luiz Antônio tinha voo marcado e teve que sair antes. Portanto, ele não estará no encerramento dos trabalhos nesta manhã.
Passo a palavra à Sra. Sandra Almeida. Só não vá brigar com o Rio de Janeiro, por favor! (Risos.)
A SRA. SANDRA REGINA GOULART ALMEIDA - Eu gostaria, primeiramente, de agradecer à Deputada Margarida Salomão, à Deputada Angela Amin e a todos os demais Deputados do Parlamento.
O Congresso tem sido um parceiro num momento muito decisivo para todos nós. Este é um momento muito difícil para as universidades públicas. Nós temos sofrido não apenas um ataque no campo material, com a restrição orçamentária — foi graças à atuação do Parlamento que nós conseguimos reverter parcialmente uma situação que vem se configurando extremamente dramática desde maio —, mas também um ataque no campo simbólico. Muitas das coisas que falamos aqui foram em resposta a todos esses ataques que nós temos sofrido, que são infundados e inverídicos, como nós podemos mostrar. Esses dados são usados com má-fé, como mostrou a Profa. Helena Nader.
O nosso papel tem sido divulgar esses dados importantíssimos para todos nós. É importante que o Parlamento saiba, que todos os Deputados tenham conhecimento e que a população tenha conhecimento desses dados que estão sendo mal interpretados, mal usados, muitas vezes com má-fé. Por exemplo, dados de custo de alunos ou de investimento em educação são dados que nós precisamos divulgar. O que está sendo dito não é verídico. As universidades têm tido um papel importantíssimo no desenvolvimento do País. Se chegamos aonde chegamos, se temos sustentabilidade principalmente na agropecuária, se tivemos avanços em várias áreas do conhecimento, foi por causa do trabalho das universidades.
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Eu tenho dito que nós somos a solução, não somos o problema. Nós temos sido tratados como problema. Não somos o problema. Nós somos a solução para um País que quer ser desenvolvido, que quer ser mais equânime. Este é um dos grandes problemas que nós temos: a desigualdade. A solução está no investimento contínuo e sustentável nas nossas universidades. Nós somos um patrimônio do nosso País. Isso é importantíssimo para todos nós.
Eu agradeço também ao GT, na pessoa do Prof. Roberto, o papel que tem sido feito, a interlocução que tem sido feita com o Presidente da Câmara, Rodrigo Maia, e com o Congresso Nacional. Isso tem sido muito importante para todos nós.
Eu gostaria de fazer um pedido. Eu faço esse pedido ao Parlamento em meu nome e, acredito eu, em nome de várias universidades. Peço que nos ouçam e faço um apelo para que sejam votadas as ações que são importantes para todos nós. Como já foi mencionado pelo professor, a Emenda Constitucional nº 95, de 2016, não pode se aplicar à educação e à saúde. O País não tem como continuar crescendo e nós não temos como investir e conseguir desenvolvimento com esses limites orçamentários. Há também a PEC que limita os nossos gastos especificamente.
A autonomia é imprescindível. Se São Paulo deu certo — eu fiz uma comparação —, foi porque optou por dar autonomia às universidades num momento imprescindível. Nós precisamos dessa autonomia. Não pode haver ingerência nas nossas universidades, como tem acontecido nos últimos anos. Isso, para nós, é imprescindível. Nós somos um patrimônio do País e somos muito transparentes. Nisso aí, eu discordo um pouco do Prof. Roberto. Nós somos extremamente transparentes atualmente. O TCU e a CGU estão sempre nas nossas universidades. Nós temos colocado todos os dados à disposição da sociedade como um todo. Nós temos feito um trabalho de transparência muito sério, juntamente com a CGU e com o TCU. Os dados de alunos que eu mostrei são dados do TCU. O próprio TCU tem levantado dados importantíssimos sobre a transparência do trabalho que é feito, o controle do trabalho, a integridade. Em todas as universidades, hoje, nós temos um órgão de integridade que cuida da transparência das universidades. Então, nós estamos cada vez mais transparentes nessas ações.
Eu acho que nós já temos, nas nossas instituições e nos órgãos governamentais, uma agência que cuida da transparência dos dados das universidades. Por isso, eu acho que criar mais uma agência seria extremamente complicado, neste momento, em que nós já temos todo um aparato nesse sentido. Esta é a minha opinião.
Na verdade, estou aqui mais para agradecer o trabalho de todos os Deputados, o trabalho da Comissão. Esse é um papel importantíssimo que vocês fazem para a sociedade e para o nosso País.
O SR. ROBERTO SALLES - Eu quero deixar claro — acho que não ficou muito claro — que, em nenhum momento, eu disse que as universidades não têm transparência. Eu não falei isso. Eu me referi a algumas poucas fundações. Quero deixar isso muito claro.
Realmente, há todos os órgãos de controle, mas, de qualquer forma, mesmo com os órgãos de controle e mesmo com autonomia, ficamos sujeitos aos soluços dos governos que entram e que saem. Falo isso especificamente em relação ao MEC. Então, a ideia da agência seria nós sermos tratados por uma agência pública, e nós nos entenderíamos dentro da autonomia.
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Eu quero deixar claro que, em nenhum momento, eu falei que as universidades não têm transparência. Eu sei disso. Fui Reitor por 8 anos. Graças a Deus, minhas contas foram aprovadas nos 8 anos, internamente e pelos órgãos de controle. Eu me referi a algumas poucas fundações em cujos sites eu entrei. Não há. Tem de uniformizar, tem de colocar lá: entraram 10 milhões de reais para o projeto tal, quem são os envolvidos, quanto ganha cada um de bolsa e qual é o resultado, qual é o produto. Isso não é feito em todas. Foi a isso que eu me referi. Quero deixar isso claro para todos.
Muito obrigado.
A SRA. PRESIDENTE (Angela Amin. Bloco/PP - SC) - Agradeço, mais uma vez, os questionamentos feitos pelo Prof. Roberto e as colocações feitas pela Profa. Sandra.
Passo a palavra à Profa. Helena Bonciani Nader.
A SRA. HELENA BONCIANI NADER - Eu quero, mais uma vez, agradecer à Deputada Margarida Salomão, à Deputada Ângela Amin, a todos os Deputados das duas Comissões e ao Presidente da Câmara, o Deputado Rodrigo Maia, pelo apoio que tem sido dado a essa pauta de reivindicações.
É importante salientarmos que nenhuma dessas pautas é para benefício próprio. Não estamos aqui pedindo aumento de salário nem carreira especial. Nós estamos aqui pedindo o Brasil que queremos, o Brasil que os brasileiros merecem. Eu queria deixar isso claro.
Deputada Angela Amin, Deputada Margarida Salomão, não deu tempo de trazer, mas vou encaminhar os dois relatórios do Clarivate Analytics, porque neles há outro dado relevante. Pergunta-se muito se é preciso haver universidade em todo local. Qual é o impacto da universidade, localmente? Eu vou dar um exemplo. Conheci de perto a Universidade Federal do Acre, que tem 42 anos ou 43 anos. O impacto lá é fantástico. Será que ela deve ser uma universidade de pesquisa? Talvez não, mas ela tem uma pesquisa de impacto, e está publicando. Todos os Estados estão publicando internacionalmente. Todos têm colaboração internacional e todos têm um impacto. Então, isso é importante.
O PNE é lei. Eu trabalhei nisso. Fiz até piquete aqui. Quando não nos deixavam falar, nós — os estudantes, a ANPG, a UNE — conseguíamos um microfone e ficávamos todos falando por que precisávamos que se votasse o PNE. Ele não está sendo respeitado. É o que nós queremos. Ou é lei ou não é lei. Não existe meia lei.
Uma das coisas muito claras do PNE, voltando-se para a educação básica — eu concordo totalmente com você, nós temos de pensar desde a pré-escola —, é o tempo integral. Não é tempo, é educação integral. Saiu um artigo ontem, acho que foi ontem, na Folha de S.Paulo, de uma escola que fica no bairro mais pobre da cidade de São Paulo, onde se implantou o integral. Os estudantes deram declarações de que estavam se apoderando da escola. Com isso, o IDEB deles cresceu 2,5%. Então, nós temos exemplos.
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Há outra coisa que eu queria dizer para encerrar: as empresas brasileiras que deram certo nasceram na universidade. Nós temos que falar isso. Eu fico muito triste não por ter sido vendida uma parte da empresa, mas, sim, por não passar a ser Embraer-Boeing, em vez de Boeing-Embraer. Pelo amor de Deus, ela nasceu no ITA, foi criada pelos Governos militares da década de 50 e por aí afora!
Em Santa Catarina, temos o exemplo da WEG, que nasceu na Universidade Federal de Santa Catarina. É uma empresa de classe mundial, presente em 130 países. Só na China, cinco plantas estão sendo feitas. Ela bateu o recorde mundial de fabricação de microímãs para luz síncrotron Sirius. Inclusive, agora ela vai fabricar para a Suécia. O que a WEG fez? Dizia-se que, se se conseguisse fazer o ímã com 30 micrômetros, já seria um fato único no mundo. Sabem com quantos ela fez? Cinco. Sabem onde? Dentro do Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais — CNPEM, junto com as universidades.
A Whirlpool vendeu a EMBRACO. De novo, houve a participação da Universidade Federal de Santa Catarina. Eu estou trazendo exemplos. Há uma ação coordenada pelo CNPq a respeito do zika e querem extingui-la!
Então, nós temos que lutar, sim. Eu estou lutando. Na verdade, a diária que eu ganho não cobre a despesa, a não ser que eu queira fazer dieta. Estou precisando, mas tudo bem. (Risos.)
É verdade. Nós estamos aqui lutando pelo Brasil, pela sociedade brasileira.
Muitos dizem: "Mas a sociedade brasileira não está junto com vocês". Não vamos esquecer que, na sociedade brasileira, conforme eu mostrei, 60% não acabaram o ensino médio. É uma sociedade que se levanta às 4 horas da manhã para ir trabalhar e viaja 3 horas nos grandes centros. Se nós dermos educação a esta sociedade, ela vai entender. E ela está entendendo hoje com os filhos que estão entrando na universidade pública, por via das ações afirmativas — eu detesto o nome "cota". Foi isso que houve e foi isso que mudou. O impacto das ações afirmativas na universidade pública é fora de série, tanto que universidades privadas, como a FGV, estão adotando também ações afirmativas. A diversidade é preconizada no mundo inteiro. A nossa universidade está na fronteira de tudo isso. Podemos melhorar? Não tenho dúvida.
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Eu sempre digo que só não melhoramos quando morremos. A função do ser humano é buscar sempre melhorar, para si, para os outros ou para o todo. Vou continuar na luta em defesa do conhecimento e de uma sociedade justa. Que o Ministério da Economia nos ouça! Todos aqueles que estão nesse Ministério foram formados em grandes escolas. A maioria foi para o exterior com bolsas de entidades como CAPES e CNPq e fizeram lá a sua formação.
É disto que precisamos para o Brasil: mais investimentos nessas áreas. Inclusive, a WEG acabou de comprar uma empresa de São Paulo que teve acesso ao financiamento PIPE, da FAPESP.
Vou fazer um pedido ao Prof. Brito Cruz. Eu vi os dados. Não os trouxe porque acho que isso seria extremamente deselegante. Ele fez um estudo fantástico sobre colaborações dentro dos Estados brasileiros, sobre o impacto na economia. Espero que ele escreva logo esse trabalho e o mande para vocês, para que também circule. Ele é o Diretor Científico da FAPESP. É preciso que esse trabalho circule, para divulgar que existem dados que mostram o papel da universidade, que sempre poderá ser melhorado. Sempre!
Obrigada mais uma vez. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Angela Amin. Bloco/PP - SC) - Mais uma vez agradeço as palavras da Profa. Helena.
Tem a palavra o Prof. Nelson, para fazer suas considerações finais.
O SR. NELSON CARDOSO AMARAL - Eu não posso esquecer que estamos no Parlamento brasileiro, em duas Comissões importantíssimas: a Comissão de Educação e a Comissão de Ciência e Tecnologia.
A Profa. Helena lembrou do PNE. Ele vai até 2024. O próximo PPA, que está sendo discutido, vai até 2023. Vai de 2020 a 2023. Então, se o PNE não está no PPA 2020-2023, sobra apenas a chance de ele estar no PPA de 2024, que é o último ano do Plano Nacional de Educação.
No meu entender, isso é gravíssimo. Nessa proposta de PPA, só há uma referência ao plano, que é aumentar em cinco pontos percentuais a taxa bruta de educação superior, que está em 36,4, se eu não me engano. Fala-se em acrescentar mais 5 pontos percentuais até 2023. Essa situação vai ser gravíssima para o governante de 2024.
Tenho outra preocupação muito grande, que se refere à Constituição brasileira. É notório, o tempo todo, que o grupo que assumiu o poder na Presidência da República não concorda com os termos desta Constituição, em muitos aspectos, tanto que querem até mexer em cláusulas pétreas. É preciso lhes dizer que não se pode mexer em cláusula pétrea.
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No meu entender, a gratuidade está por um fio. Participei de um seminário no IPEA exatamente sobre o exemplo da Austrália. Por isso coloquei a Austrália em várias análises aqui. Vai chegar o momento de compararmos o Brasil com a Austrália e dizermos que essa maneira de fazer será complicada aqui no Brasil. Eu acho que eles concluíram isso lá também, que é o empréstimo condicionado à renda. Acho que eles concluíram isso no IPEA também, porque o volume de dinheiro é muito pequeno pela desigualdade brasileira e pelo perfil de renda da sociedade brasileira. A gratuidade constitucional está em perigo. Essa é uma avaliação muito pessoal.
Está escancarado que a vinculação constitucional está em jogo na reforma administrativa. Se a vinculação constitucional está em jogo, o FUNDEB está em jogo, porque o FUNDEB é uma subvinculação da vinculação. Se acabou a vinculação, acabou a subvinculação. O FUNDEB está relacionado à educação básica. Como foi dito aqui em vários momentos, o ciclo educacional de ciência e tecnologia é um ciclo completo. Se se fere um deles, acaba-se ferindo o todo.
No meu entender, com o Future-se, o art. 207 da Constituição está em perigo. Eles podem querer mudar esse artigo da Constituição, porque a primeira proposta do Future-se é uma afronta à autonomia universitária, prevista no art. 207.
A segunda proposta, a atual, é mais disfarçada um pouco, mas o contrato de desempenho que estão propondo também é uma afronta à autonomia prevista no art. 207. No meu entender, está igualmente em jogo, assim como vários aspectos da LDB.
Importantíssimo para as universidades é o art. 55 da LDB, que diz que, no Orçamento Geral, têm que estar previstos recursos suficientes — recursos suficientes — para manutenção e desenvolvimento das instituições de educação superior federais.
Esse conjunto tem me preocupado muito. Qual é o caminho que vai ser tomado, se o Future-se não passar? Na segunda-feira, no Senado, vou participar de uma mesa sobre o Future-se. Com essa nova formulação, ele também não passa, as universidades não vão aprová-lo, principalmente porque houve uma proposta intermediária, que não foi oficializada, que dizia que um dos componentes, um dos indicadores obrigatórios seria reduzir a folha de pagamento. Isso foi retirado.
Vão estar frente a frente, porém, na mesa de negociação de um contrato, duas forças desproporcionais. Uma é o Governo Federal e a outra é a universidade, uma a uma, fazendo o seu contrato de desempenho. Nessa mesa, pode ser colocada esta condição: tem que haver a redução de salário. Que força a universidade vai ter nesse momento de negociação? Existe uma regra básica de assinatura de contrato: os dois lados que assinam têm de ter o mesmo poder de negociação no momento da assinatura do contrato. Nesse caso, ocorre algo muito desproporcional. Isso seria possível com a alteração do art. 207.
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Nós não sabemos muito bem quais vão ser os próximos passos se o Future-se não for aprovado pelos conselhos universitários. Para assinar o contrato, isso tem que ser aprovado pelo conselho universitário.
A minha preocupação vai muito além desse dia a dia em que estamos, até porque eu cansei de me preocupar com o dia a dia, pois fui pró-reitor e vice-reitor. De origem, eu sou físico. É por isso que mexo muito com números. Depois fiz doutorado em educação. Agora eu tenho a oportunidade de perceber e analisar esses ambientes maiores e chamar a atenção para alguns problemas seriíssimos que podem vir nesse processo que estamos vivendo de mudanças tão rápidas.
Como disse a Profa. Maria Emília, destruir é muito fácil. Tudo o que construímos ao longo de décadas e décadas... E vejam que são poucas décadas. A universidade brasileira é recente. A Universidade Federal do Rio de Janeiro vai fazer 100 anos no ano que vem.
Agradeço a oportunidade.
Espero situações melhores e discussões mais amenas. (Risos.)
Acho que eu só trouxe notícias estranhas aqui hoje.
Obrigado. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Angela Amin. Bloco/PP - SC) - Agradeço as contribuições do Prof. Nelson. Nós não podemos desanimar.
Gostaria de agradecer à Profa. Helena as referências à Universidade Federal de Santa Catarina e ao impacto dessa atuação nas empresas e no cenário dos Municípios.
Quero dizer que nos orgulha muito, principalmente no caso da WEG, o Município de Jaraguá do Sul. As cabeças e os recursos são de cidadãos desse Município. Joinville tem um corpo empresarial bastante intenso, mas não tem a exclusividade que tem o Município de Jaraguá, que nos orgulha muito.
Para que conclua esta audiência, convocamos — é uma convocação (riso) — a Profa. Margarida, que propôs esta reunião. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Margarida Salomão. PT - MG) - Agradeço a gentileza da Deputada Angela Amin, que me permite finalizar a etapa de hoje. Insisto que amanhã prosseguiremos com exposições que, acredito, serão muito esclarecedoras, muito ricas para subsidiar a formulação de políticas.
Como disse a Deputada Angela Amin, não podemos admitir esse tipo de retrocesso, em que o preconceito ou a desinformação constituam o elemento que fundamente proposições que atrasam, de fato, a nossa evolução histórica.
A história da universidade brasileira é recente. A universidade brasileira é tardia, consideradas as nações do Ocidente.
É importante destacar algo. Eu tive a oportunidade de dizer isto nesta Comissão, na primeira vez em que o Ministro da Ciência e Tecnologia veio aqui. A CAPES e o CNPq são construções que atravessaram Governos. Tiveram apoio inclusive à época dos Governos militares. É necessário reconhecer isso. Durante o período dos Governos militares, ninguém quis desmontar a CAPES ou o CNPq, pelo contrário. O investimento no BNDES, o reconhecimento do papel estratégico do BNDES também se reivindicou àquela altura.
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De todo modo, ainda que aquele projeto de Nação fosse diferente do que eu defendia à época e continuo a defender, havia um projeto de Nação. Agora, quando se desmancham esses elementos absolutamente essenciais para que desenvolvamos uma inteligência nacional e uma perspectiva estratégica, o nosso futuro fica em risco. É das próximas gerações que se trata. A expressão mais verdadeira que podemos ter de amor à Pátria é uma concepção generosa com relação a isso que está por vir.
Mais uma vez agradeço a todos os que participaram desta manhã riquíssima. Lamento que hoje, em sendo uma terça-feira de manhã, não tenhamos a Câmara com tantos Deputados, ainda mais depois do Dia do Servidor Público, de todo modo um dia importante para muitos de nós (riso) que trabalhamos pelo público brasileiro, pela sociedade brasileira, muitos ao longo de toda sua vida.
Acho que cumprimos bem esta etapa. Estão todos convidados para dar continuidade ao evento amanhã pela manhã.
Muito obrigada. (Palmas.)
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