Horário | (Texto com redação final.) |
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A SRA. PRESIDENTE (Professora Rosa Neide. PT - MT) - Bom dia a todos e todas.
Declaro aberta a presente reunião de audiência pública da Comissão de Educação, atendendo ao Requerimento nº 233, de 2019, que foi subscrito pelos Deputados Sóstenes Cavalcante, do DEM do Rio de Janeiro, e Professor Israel, do PV do Distrito Federal, e aprovado em 21 de agosto de 2019, com o tema Gestão democrática e participação estudantil.
Quero convidar para estar conosco e discutir um pouco este tema a Sra. Denise Soares, representante da União Nacional dos Estudantes — UNE (palmas); a Sra. Ludimila Brasil, também representante da UNE, que já está aqui (palmas); o Sr. Marcelo Acácio, representante da União Brasileira dos Estudantes Secundaristas — ele não chegou ainda; a Sra. Ailta Barros de Souza, representante da Associação dos Docentes da Universidade de Brasília, que já está aqui (palmas); a Sra. Luciana Custódio, representante do Sindicato dos Professores do Distrito Federal (palmas); o Prof. Erasto Fortes Mendonça, doutor em educação pela Universidade Estadual de Campinas — UNICAMP (palmas); e a Sra. Adércia Hostin, representante da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino — CONTEE. (Palmas.)
Cada um dos convidados vai fazer uma fala de 15 minutos. Essas falas serão gravadas, e, depois, faremos pequenos vídeos, para expor a temática, daqueles oradores que assim concordarem. Nós também temos um chat aberto para que pessoas possam, através da Internet, mandar perguntas formuladas por elas, que serão repassadas aos senhores, para que, ao final, possamos fazer um debate com quem nos acompanha pelas redes sociais e pela TV Câmara.
O nosso objetivo maior nesta audiência é debater iniciativas para a promoção da gestão democrática na educação e o fomento às entidades representativas dos estudantes. Há uma preocupação muito grande com a condição da educação brasileira neste momento, no atual contexto conjuntural e político do País, e especialmente com as entidades representativas dos estudantes, que precisam entender melhor o que o Governo brasileiro e esta Casa estão encaminhando com relação às diretrizes legais para o exercício democrático das instituições e das entidades que representam os estudantes dentro das instituições.
A nossa concepção de gestão democrática é aquela baseada na autonomia dos sistemas, órgãos e unidades educacionais, na participação da sociedade civil, dos estudantes e dos profissionais da educação em todos os níveis de gestão, e na existência e funcionamento de conselhos e fóruns de educação colegiados, entre outras instâncias coletivas, bem como no esforço de fortalecer espaços e canais democráticos de debate e encaminhamento das questões educacionais. Uma diretriz fundante, no nosso ponto de vista, é o fortalecimento do relacionamento solidário e de confiança entre profissionais da educação, estudantes e toda a comunidade, além da garantia da efetiva participação da comunidade educacional na escolha dos seus dirigentes e na construção da proposta pedagógica das unidades educacionais.
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Também não é menos importante a oferta de condições para a existência e efetivo funcionamento de grêmios estudantis e diretórios acadêmicos, que devem ser concretamente dotados de autonomia, condições de funcionamento e liberdade para o pleno desenvolvimento de suas atividades.
Há uma discussão muito forte aqui com relação ao conceito de autonomia. Sabemos que, num País democrático, com a democracia em plenitude, toda autonomia é subordinada à legislação e aos aspectos legais do País. Então, o medo da autonomia exercida pelos colegiados é, na maioria das vezes, bem infundado, porque todo colegiado se submete ao que a legislação orienta.
A materialização da gestão democrática na educação é, portanto, indissociável de princípios como a autonomia intelectual e organizativa dos estudantes e a valorização dos profissionais da educação, aos quais devem ser asseguradas liberdade e autonomia de atuação.
Contudo, o cenário atual conta, por exemplo, com um Ministro da Educação que, em sua experiência acadêmica bastante conturbada, cria situações de muito enfrentamento no que diz respeito à democracia no interior das instituições e estimula, com falas públicas, o acirramento de comportamentos contra professores e entidades estudantis, desqualificando a vida e a autonomia acadêmica, reduzindo-as às balbúrdias e espaços de farra, falando em colocar a polícia dentro da UnB e em outras instituições — o Ministro já provocou vários reitores de universidades, perguntando o que eles têm contra a entrada da polícia no campus, como se polícia presente no campus fosse uma política pública já definida, pelo menos na fala do hoje Ministro da Educação — e atacando as entidades estudantis e suas condições de sustentabilidade.
Além disso, o Ministro editou a Medida Provisória nº 895, de 2019, um duro ataque a uma fonte de receita gerida autonomamente pelas entidades estudantis e importante para o exercício das liberdades, e um decreto instituindo o Programa Nacional das Escolas Cívico-Militares, que colide com a gestão democrática e é mais um estágio para a autorização do uso institucional da violência do Estado e para a perseguição à escola pública e seus professores, além de representar um estímulo à exclusão educacional.
Pergunto aos representantes da Mesa, especialmente ao Prof. Erasto, que é um pesquisador, em que país do mundo há alguma experiência de escola cívico-militar que tenha inspirado o Governo brasileiro, porque, em todas as buscas que eu fiz, não encontrei, nos países democráticos, gestão militar em escolas para civis. Em quais princípios o Brasil está se inspirando para transformar nossas escolas públicas em escolas que ele chama de cívico-militares? São conceitos que aparecem, que não constam da nossa legislação, que não foram discutidos no espaço representativo da democracia brasileira, que é o Congresso Nacional, e que, de uma hora para a outra, são aprovados como projetos com nomenclaturas estranhas e com atitudes estranhas. A mídia nesta semana já deixou muito claro o que as chamadas escolas militares podem estar provocando nos nossos alunos.
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Destaco aqui também que, nesta legislatura, durante o ano de 2019, apresentei o Projeto de Lei nº 1.296, que estabelece parâmetros para a gestão democrática na educação básica — nós temos uma dívida histórica com a questão da organização da gestão democrática no interior das escolas, e ainda há recursos no Supremo Tribunal Federal para impedir que, de fato, a gestão democrática aconteça no interior das escolas —, e o Projeto de Lei Complementar nº 216, que regulamenta o Sistema Nacional de Educação e também trata da gestão democrática na escolha de dirigentes das Instituições de Ensino Superior — IES e no provimento de cargo ou função de direção escolar. Na minha visão, a regulamentação da gestão democrática deve ser um componente importante para o acesso prioritário aos recursos financeiros de caráter suplementar da União pelos entes federativos.
Além disso, apresentei o Projeto de Lei nº 1.967, de 2015, com outras quatro proposições que tratam, no ensino fundamental, de mecanismos e princípios para fortalecer a participação dos estudantes, incluindo o direito à fundação, organização e atuação, propondo que os estabelecimentos devem estimular a criação de grêmios estudantis, inclusive com espaço físico e mobiliário, liberdade de divulgação e participação nas decisões das instituições.
Tem-se, portanto, um cenário de inúmeras proposições que tentam ou já tentaram regulamentar o tema na educação básica e no ensino superior. O Plano Nacional de Educação, de igual modo, ratificou a importância da matéria para a educação e para a democratização da sociedade como um todo.
Gostaria de fechar estas considerações iniciais reforçando que os ataques à autonomia, à democratização de instrumentos e processos de gestão na área da educação e às representações e colegiados precisam ser barrados, e a legislação precisa, por seu turno, ratificar conquistas, e não contribuir para o reforço ao patrimonialismo, ao clientelismo, à perseguição seletiva e ao autoritarismo das estruturas na área da educação.
O debate nesta audiência pública é um importante ponto de inflexão, e, ainda que convocada em curtíssimo espaço de tempo, está conformada uma Mesa expressiva e representativa, especialmente dos nossos estudantes. Agradeço fortemente a todos e a todas que se mobilizaram para estar aqui fazendo esta discussão, que nós iremos divulgar entre as escolas públicas brasileiras e todas as nossas entidades, até porque é na prática da escola, iniciando-se na educação básica, que se pode, de fato, construir conceitos verdadeiros de democracia e de cidadania. Se a educação básica consolidar estas práticas e o ensino superior as implementar, nós teremos pessoas na sociedade interferindo fortemente e fazendo a gestão democrática no Brasil, conforme a nossa orientação legal.
Antes de conceder a palavra à Denise Soares, representante da União Nacional dos Estudantes — UNE, para que faça a primeira fala desta Mesa, registro que um de nossos convidados acabou de chegar: o Marcelo Acácio, representante da União Brasileira dos Estudantes Secundaristas — UBES. Há um problema de ônibus em algumas cidades do Distrito Federal. Isso talvez faça as pessoas se atrasarem um pouquinho. Mas fiquem tranquilos, porque vamos iniciar.
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Quando se fala em gestão democrática, acho que nós — particularmente eu, Denise — que estudamos em instituições privadas só ouvimos falar, porque, em instituições privadas, essa gestão democrática não existe. Digo isso porque, muitas das vezes, o dono da universidade é o próprio reitor ou o presidente do conselho universitário. Então, o que é essa tal de gestão democrática, de onde veio e como nós estudantes teremos uma participação efetiva nesse trabalho?
Viemos de uma educação moldada pela ditadura militar, quando os diretores e reitores eram autoritários, não gostavam de escutar o estudante, o terceirizado e muito menos os docentes que estavam em contato direto com os estudantes. Tivemos, no final dos anos 80, uma série de debates universitários com docentes, técnicos, professores de ensino médio e secundaristas, para discutirmos qual é a educação e a instituição de ensino que queremos.
Sabemos que nós estudantes somos a maioria dentro das escolas e universidades. Portanto, acho que é mais do que justo pararem para nos ouvir, para não ser uma gestão democrática fake. Está lá um representante do corpo discente, mas ele não tem direito a voto, muito menos a voz. Então, acho que temos que começar a discutir o que é a gestão democrática que tanto queremos.
Sabemos que promover a participação do estudante requer disposição dos gestores, dos professores; enfim, requer uma disposição de compartilhar poder na universidade, na instituição. A abertura, o diálogo, o entendimento e a cooperação são palavras-chaves, acho, para quando queremos abordar a gestão democrática. Acho também que deve haver um equilíbrio de responsabilidades do professor, do reitor, do terceirizado, do técnico e do estudante quando queremos abordar a questão da gestão de ensino.
Deve-se, sim, escutar o estudante dentro de uma gestão. Devemos conceder poderes ao estudante, mas não podemos deixar que isso seja um fardo para ele. Essa participação não pode ter o caráter de obrigação. Vou dar o exemplo bem claro da UnB, que tem 47 mil estudantes. Como é que três estudantes vão representar a diversidade e a gama de estudantes daquela universidade? Como é que vamos conseguir fazer com que cada discente representante em seus conselhos consiga representar, em si, uma gama de estudantes bem diversificada?
Viemos de um processo com PROUNI, REUNI e SISU para nos garantir ingresso nas universidades. Vemos que a universidade dos anos 90 e 2000 não é a de agora, de 2019. A universidade de agora tem a cara e a cor do Brasil pela primeira vez. E acho que a gestão democrática é o que garante que a universidade continue tendo a cara e a cor do povo brasileiro. Mas acho que isso não transparece quando não dialogamos sobre permanência estudantil no Conselho Universitário, quando não damos direito à voz ao estudante, para que ele possa falar: "Pôxa, não tenho como chegar à universidade. Vocês me deram condições de estar aqui, mas não consigo chegar, porque não tem linha de ônibus".
Sabemos qual é a realidade do Brasil. Quando levamos isso para o interior do Brasil, quando vemos a realidade das universidades que são frutos do REUNI, a exemplo de Paragominas, no Pará, percebemos que não há condições mínimas de o estudante sair da cidade e chegar à universidade.
Esses assuntos têm que ser abordados no conselho universitário. E quem vai estar lá? Só os discentes, aqueles que têm carros, aqueles que conseguem chegar à universidade. E não existe a mínima garantia de que o estudante terá direito a voz para falar: “Olha, estamos com dificuldade nisso. A infraestrutura não está boa ali. A gente quer falar e conversar um pouco sobre o currículo abordado. A gente quer, sim, opinar sobre os projetos e os programas debatidos dentro de uma universidade. A gente quer ajudar nas semanas acadêmicas. Como podemos opinar e aconselhar as universidades para ajudarem no crescimento democrático da universidade, com participação efetiva?"
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Na parte da LDB em que se separam 70% e 30%, em que esses 30% são compostos por estudantes, técnicos e terceirizados, percebemos que há um erro. Nós estudantes somos mais de 75% dentro de uma universidade e temos que dividir 30% com os técnicos e com o pessoal da segurança. Eu acho que temos que rever a forma como será dada voz aos estudantes, porque cada grupo de 70 estudantes é representado por um discente. Há algo errado nessa conta. Eu acho que temos que debater isso.
A gestão democrática não é uma coisa que vai ser construída hoje para estar pronta amanhã. Eu acho que é algo que tem que ser construído, refletido, debatido e dialogado principalmente com quem está na universidade, e não simplesmente por aquelas pessoas que estão sentadas no MEC, com seu computadorzinho, dialogando sem nunca terem vivido a realidade de uma universidade pública ou privada.
Eu acho que temos que dialogar, sim, para fazer uma boa estrutura. Se o MEC chegar e falar: "Não, vamos conversar! Vocês, discentes, que estão na sala de aula, que estão sem condição nenhuma de ter aula... O que é uma gestão democrática para vocês, professores, que estão se matando com infraestrutura precária?" Não aceitamos que pessoas com o poder falem como será a gestão democrática.
Eu acho que não dá quando querem abordar a questão "queremos ouvir", "queremos impor". Temos que ouvir, aprofundar, estudar. Eu sei que daqui vão sair diversos questionamentos, mas para nós estudantes de universidades privadas não existe gestão democrática. Desculpem-me! Existe um reitor que impõe, e nós pagamos. Os estudantes das universidades públicas fazem parte dos conselhos, mas será que esses conselhos representam, sim, os estudantes? Estão representando, no caso da UnB, os 47 mil estudantes de graduação, pós-graduação e extensão?
Eu acho que fica registrado aqui a seguinte reflexão: onde estão os estudantes neste plenário? Eu acho que nós temos que começar a dialogar entre nós. Onde estão os professores que trabalham nas salas de aula? Eles, sim, terão que opinar, terão que falar o que é uma gestão democrática.
Eu acho que aqui nesta audiência, Deputada Professora Rosa Neide, ficamos com alguns questionamentos: “Por que o MEC não nos chama para conversar? Por que as reitorias têm uma gestão compartilhada tão frágil? Por que querem militarizar a nossa educação? Por que querem amordaçar os nossos professores?"
Eu acho que, se temos um Governo que acha que a educação não é prioridade, este debate aqui nem precisaria ter acontecido. Quando vemos a reforma do ensino médio, a militarização das escolas e o mais novo ataque, que é a colocação de policiais militares armados dentro de uma universidade pública, percebemos, sim, que o Governo não quer o estudante na escola, não quer o universitário na universidade. Ele quer máquinas, ele quer formar robôs.
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A SRA. PRESIDENTE (Professora Rosa Neide. PT - MT) - Agradecemos a intervenção da Denise, representando a UNE.
Gostaria também de agradecer ao Sr. José Roberto Junior, que representa a Secretaria de Educação Básica do MEC.
A SRA. ADÉRCIA HOSTIN - Bom dia a todos e a todas! Cumprimento sempre a coragem e a força da Deputada Professora Rosa Neide, que está representando a educação, sendo tão enfática na luta dos estudantes e na luta do povo brasileiro por melhores condições de educação no nosso País.
Eu sou Adércia, representante da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino, que representa 1 milhão e meio de trabalhadores do setor privado de ensino.
É importante neste momento, quando tratamos da gestão educacional e dos movimentos estudantis, fazermos uma retrospectiva da nossa luta e do quanto se avançou nessas discussões nos últimos anos. Nós tivemos 12 anos de organização por dentro dessas instituições de ensino e, em um espaço muito curto de tempo, dado o golpe do impeachment, dadas essas últimas eleições que tivemos, praticamente nos últimos 10 meses, uma velocidade gigantesca na redução do entendimento do que significa o projeto político-educacional do País.
Nós não precisamos ficar aqui inventando muito a roda, porque nós temos uma lei, o Plano Nacional de Educação, que já traz as diretrizes para o próximo período. Nós temos uma lei que deveria ter sido aprovada há 2 anos, referente ao Sistema Nacional de Educação. Hoje, inclusive, haveria uma audiência pela manhã sobre esse tema, mas foi cancelada, na qual também dialogaríamos diretamente com Estados, Municípios e União sobre todas essas relações que temos que estar pautando de maneira individualizada, o que me parece muito prático, porque, no contexto geral, é aquilo que eu coloco: nós temos o Plano Nacional de Educação, uma lei que deveria estar, essa sim, sendo dialogada diretamente, sendo implementada por um governo sério. Nós não precisamos ficar aqui discutindo a pauta por partes, como nós temos que fazer agora incansavelmente, sem desistir desse contexto.
Então, eu acho que esse preâmbulo inicial é interessante, porque precisamos nos localizar no tempo/espaço em relação ao que fizemos através das conferências nacionais de 2010 e 2014, que mobilizaram mais de 5 milhões de pessoas em torno da pauta educacional do País, que já discutiu bravamente com a sociedade brasileira, com a sociedade civil, quais eram os caminhos da educação que este País necessitava para o seu crescimento.
Nós temos a Emenda Constitucional 95, que avilta todos os investimentos da educação. Com muito interesse em nos calar, a educação, que teve todo um contingenciamento das suas verbas, que foram restringidas, viu agora, na semana retrasada, que foram abertas novamente.
A União Brasileira dos Estudantes Secundaristas e a União Nacional dos Estudantes, com seus estudantes guerreiros e corajosos, fizeram com que essas verbas voltassem para os cofres da educação do nosso País. É importante fazer esse registro, porque foi esse precedente que nos levou a esses valores. Agora, cabe-nos saber da transparência em relação a eles e como serão investidos, porque, quando se fala de valores para universidades, para a educação no País, fala-se de gestão democrática.
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Começo a dizer que não foi nenhuma benesse do Governo liberar os recursos para a educação, foi a pressão popular e dos estudantes que o levou a assumir a sua irresponsabilidade, diante dos cortes de recursos para a educação, do sucateamento previsto para as instituições de ensino público do País. Aliás, as instituições públicas do Brasil devem, sim, ter acesso aos recursos públicos e financeiros, não as instituições de cunho privado. Não muito claramente se fala de instituição pública e privada. Cabe falar do direito que a instituição privada tem que ter. Ela tem direito à livre iniciativa privada, a explorar do jeito que quiser. Quando se fala dos deveres, eles dizem que precisam se organizar no cumprimento das normas gerais da educação e que o ensino é livre à iniciativa privada. Há um equívoco bastante contundente nessa questão: o que é de direito e o que é de dever do setor privado de ensino. Portanto, não discutimos gestão!
Como a companheira da UNE disse, não se discute gestão no setor privado de ensino, salvo no caso de algumas universidades, que por algum motivo recebem recursos públicos. Podemos falar das comunitárias, das filantrópicas. Há um questionamento em voga: qual é o comprometimento dos grandes grupos econômicos que hoje detêm uma parcela significativa da educação, do ensino superior no País, e que hoje avançam rapidamente para a educação básica e para o ensino médio no País, como é o caso de Kroton, Anhanguera, Pearson e de outros? Eu poderia fazer uma aula sobre esses grandes grupos econômicos.
Eu gostaria de deixar o questionamento: qual seria a grande preocupação, aliás a responsabilidade desses grandes grupos econômicos com o projeto de soberania, com o projeto político-educacional do nosso País, com a nossa sociedade, com os nossos jovens, com as nossas crianças e com os nossos velhos? Qual é o grande comprometimento deles? Onde, nos projetos educacionais desses grandes grupos econômicos se fala em gestão democrática? Como se falam e se organizam os conselhos desses espaços?
Não preciso alongar, porque a companheira já disse bem que isso é de fato ilusório: não há espaço dentro desses conselhos universitários. Quiçá, onde há esses espaços, quem participa e quem vota? Como são conduzidos os famosos projetos político-pedagógicos dessas instituições de ensino privado, senão deveriam também pautar a gestão organizativa desses espaços do setor privado?
Quando se fala de quem organiza o projeto político-pedagógico, de quem faz, de quem participa, de quem vota, nós temos que nos lembrar dos docentes, dos discentes, da comunidade escolar que está inserida dentro desse projeto.
Nós não podemos — e eu sou professora do ensino fundamental —, quando formos fazer o projeto político-pedagógico, estar dentro da sala com os coordenadores e donos das escolas. Esse projeto pedagógico viria a ser implementado no formato, na forma como a escola deseja que seja, não haveria muito o que se acrescentar àquilo que vem compilado e pronto. Mais grave ainda é que a maioria desses grandes grupos econômicos já entrega esses projetos prontos para as prefeituras, para o Estado, e se organiza a questão dessa gestão e da administração da gestão dos fundos públicos através da iniciativa privada.
Hoje, quando organizamos nossa fala e fazemos a defesa — daí para além da gestão democrática dos espaços e estabelecimentos de ensino —, falamos também da gestão administrativa dos espaços públicos, que nós colocamos além da defesa incondicional da educação pública do nosso País. Hoje não podemos mais defender única e exclusivamente a educação pública, precisamos defender a educação pública de gestão pública, para que essa gestão pública continue sendo democrática e construída pelos pares, principalmente através da organização do Sistema Nacional de Educação, para que possamos fazer esse corte sério dentro da história do nosso País.
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Nós estamos ficando com uma mancha histórica tão grande quanto aquela que nós estamos acompanhando. Nós estamos tendo uma mancha histórica no currículo da educação no nosso País.
Além de discutir uma antirreforma que nos desclassifique, que é conteudista, nós temos hoje uma reforma trabalhista que prejudica as condições de trabalho, distorce a relação entre público e privado, avança sobre os trabalhadores da rede pública e desqualifica e desmonta os trabalhadores do setor privado. Em gestão democrática se discutem relações de trabalho. Nesse contexto, eu estou aqui colocando quais são as condições reais dos trabalhadores do setor privado, que direito eles têm a uma paralisação, a solicitar a seus patrões uma melhor organização ou uma melhor interação.
Estamos aí discutindo a escola sem partido. Essa é a escola com partido, porque é a escola que nos cala. É importante dizer que este é o papel fundante de um projeto de lei que fala sobre escola sem partido: o de nos calar. Ele não precisa sequer estar aprovado, porque muitos dos nossos companheiros, alunos e professores já estão calados. Já estão calados única e exclusivamente pela possibilidade de que isso venha a ser real, e é real.
Vivemos, sim, num estado de exceção, infelizmente. Há policiamento nas universidades, está prontamente dito que o que as famílias necessitam é das escolas cívico-militares, para que tomemos rumo no País. Não, pessoal! Nós podemos sair na rua e observar o que aconteceu nos últimos 10 meses ou no último 1 ano e meio, o número de desempregados e as condições a que as pessoas se têm sujeitado para minimamente sobreviver. A população de rua triplicou, só não vê isso quem não quer.
Os nossos jovens estão fazendo um recorte significativo do acesso de qualidade à universidade pública. Por quê? Porque não há gestão democrática para se discutir a entrada numa universidade de qualidade que priorize o tripé da educação, que é o ensino, a pesquisa e a extensão, para poder fazer EAD sem qualidade por aí, aos quatro ventos.
Em cima de qualquer padaria, abre-se uma EAD. Não estou desqualificando as padarias, estou desqualificando a oferta da educação sem qualidade via ensino a distância, que precisa ser ofertado com seriedade e responsabilidade, não o ensino a distância no formato que se tem: "Vamos estudar a R$99,90".
Há estudos que colocam que esses alunos que, porventura, conseguem se formar... Muitos desistem, iniciam e não concluem o ensino a distância. Para muitos dos que se formam, jamais seus diplomas são reconhecidos com a mesma qualidade dos daqueles que têm acesso a uma universidade de qualidade e de referência.
Quando nós falamos em educação de qualidade e em gestão democrática, fala-se numa gestão democrática que olha para o aluno, olha para a comunidade escolar, olha para o seu trabalhador dentro das suas instituições de ensino e, acima de tudo, leva em consideração o projeto político-educacional de crescimento para o País e para a sociedade em que está inserido.
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É essa gestão democrática que nós temos buscado para o nosso País. É essa a gestão democrática que nós dialogamos, a do crescimento, a do aceite de que todo jovem e toda criança têm direito de acesso à educação de qualidade. E não falamos do homeschooling, porque já se sabe que quem está por trás de um homeschooling é uma Pearson da vida. Não falamos que nós vamos precisar agora ser direcionados por grandes grupos econômicos que vão organizar a formação dos nossos professores.
O que está se falando em formação? Quando nós falamos: "Ah, fizemos audiência sobre a Base Nacional Comum Curricular", que tipo de audiência realmente aconteceu? Nós que somos estudantes, trabalhadores, representantes de entidades sindicais sabemos exatamente o que tivemos de enfrentar para conseguir estar dentro de algumas audiências. Fomos barrados, não tivemos acesso à fala, foi dificultado o acesso inclusive das nossas falas junto ao Conselho Nacional de Educação. A gestão democrática coloca isso tudo na mesa, plaina, organiza e principalmente faz valer a pena esse resgate histórico do que nós temos de construção para o País, para o próximo período.
Nessa relação, eu vou encerrando a minha fala, lembrando também que, nesse movimento, a escola é um espaço de educação, a escola é um espaço de emancipação da classe trabalhadora e da sociedade em geral. A luta é um espaço de emancipação, como Paulo Freire já nos falava. Então, se este é um espaço de emancipação, estamos aqui todos nós juntos e juntas para que isso aconteça. E nós não desistiremos jamais, porque "sonho que se sonha junto se torna realidade".
Vamos sair do campo da utopia e vamos transformar tudo o que está colocado nos papeis e na boa intenção do Ministério da Educação em discutir educação do País em realidade, que se faça valer um Plano Nacional de Educação, que tenhamos a lei do Sistema Nacional de Educação e que se implemente realmente gestão democrática dividida e partilhada com aqueles que fazem parte do processo, para os próximos períodos.
A SRA. PRESIDENTE (Professora Rosa Neide. PT - MT) - Todo mundo está sendo muito preciso com o tempo.
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Eu sou professora da Secretaria de Educação do Distrito Federal há 25 anos, e, desses 25 anos, 19 anos são em sala de aula. Estou diretora do SINPRO, mas tenho 19 anos vividos em salas de aula. O território escolar é uma realidade que faz parte praticamente da minha vida toda, porque também fui aluna de escola pública. Então, dos meus 45 anos de idade, 40 anos eu vivo em escola pública.
É bom nos situarmos no lugar de fala porque o que estão tentando fazer com a educação é retirar o que há de essencial no território da educação pública, que é o território em que trilho a minha caminhada. Estão tentando retirar o que temos de educação que seja socialmente referenciada pela comunidade, pela participação, pela construção coletiva.
Como foi dito aqui pela nossa companheira da CONTEE, a Adércia, não é necessário mais aprovar o Escola sem Partido, pois ele já está legitimado pelo discurso do ódio que vemos a cada dia. Então, o que nós precisamos é colocar os valores da disputa do território como valores do dia a dia. Miguel Arroyo foi um visionário quando produziu o livro Currículo, território em disputa. Nós precisamos disputar o território curricular da escola, porque, quando se fala em reforma do ensino médio trazendo as diretrizes do que vai ser a retirada de direitos de acesso a todas as áreas do conhecimento prioritárias — áreas de língua portuguesa e matemática —, reduzindo a 1.800 horas obrigatórias cursadas na escola, estamos falando de retirar do filho e da filha do trabalhador e da trabalhadora comum o direito ao acesso a todas as aprendizagens.
Quando retomamos, no debate da BNCC, a volta das competências, nós retrocedemos numa perspectiva de voltar à tona o foco nas competências, e não na construção das aprendizagens. Isso porque, quando se pensa em currículo, quando se pensa em educação escolarizada, temos que pensar numa questão que precede: que sociedade queremos? Então, que sociedade nós queremos, com tudo que está sendo posto na pauta da ordem do dia da educação pública?
Quando Temer assumiu a Presidência do País ilegitimamente, pós-golpe, a primeira coisa que ele fez foi alterar a lei sobre o regime de partilha da PETROBRAS. Pela primeira vez, nós tivemos no Brasil uma verba carimbada que seria destinada à educação pública. Nós tivemos um ataque central à educação, que teve como porta de entrada a alteração do regime de partilha, retirando a exclusividade da PETROBRAS como prioritária na exploração do pré-sal. Pela primeira vez, a ex-Presidenta Dilma, no Plano Nacional de Educação, carimbou uma verba que seria destinada à educação, que seriam os royalties do pré-sal. Receitas do Fundo Social também seriam destinadas à educação. Em 6 anos, isso daria um montante de quase 7 trilhões de reais. Era a nossa esperança.
Nós temos no Plano Nacional de Educação 16 metas não cumpridas.
Por quê? Darcy Ribeiro já dizia que a crise na educação do Brasil não é crise, é projeto. Há um projeto de sucateamento da educação pública do Brasil. Há um projeto de destruição da educação pública do Brasil, porque o que importa são as articulações com o Banco Mundial, com o sistema financeiro internacional. Não é à toa que nós estamos caminhando rumo à financeirização da educação. Basta ver aí a proposta dos vouchers. Os vouchers vêm para substituir a obrigatoriedade, quer dizer, o Governo se desobriga, porque ele dá o voucher, mas ele não universaliza o acesso, ele não qualifica a permanência dos estudantes na escola.
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Falar em gestão democrática é falar em todas essas vertentes. Infelizmente, nós enfrentamos a realidade — e aí eu vou falar aqui do Distrito Federal, que é a realidade que eu vivo — de termos a geração de uma cultura que vai sendo perpetuada, que só fala em gestão democrática quando há eleição de diretor e de vice. E a gestão democrática está muito além disso.
Quero parabenizar a Deputada Professora Rosa Neide por trazer a pertinência deste debate, desta audiência pública, porque nós precisamos fazer isso permanentemente, e não apenas neste momento em que sofremos um ataque frontal à democratização dos espaços escolares. A gestão democrática vai além de se eleger diretor e vice. A gestão democrática traz consigo a democratização das instâncias que existem no interior das unidades escolares, o fortalecimento dos conselhos escolares, o fortalecimento de grêmios estudantis e o incentivo à criação deles. Os estudantes secundaristas sofrem consequentes perseguições nas escolas com as gestões autoritárias que temos. Ontem à tarde, houve um debate numa escola do Paranoá em que o pretenso candidato a diretor da escola disse ser favorável à militarização. Que gestão é essa, quando nós pensamos na perspectiva da gestão democrática, que defende a militarização das escolas?
Hoje, às 7 horas da manhã, eu estava na Rádio Paranoá dando uma entrevista sobre essa proposta da militarização. Quando se fala em gestão democrática, há um debate que perpassa transversalmente a ele, que é o debate da militarização das escolas, da escola sem partido –– há esse nome, e nós temos que trabalhar essa semântica do termo.
Quem defende uma escola partidária? Ninguém defende uma escola partidária. Nós defendemos a liberdade de cátedra, mas eles são tão sagazes, tão sutis, que trabalham a semântica do termo. É óbvio que eu sou a favor da escola sem partido. Mas a escola sem partido tem partido, que é o partido da misoginia, o partido da exclusão, o partido da homofobia, o partido do silenciamento, que, infelizmente, já está legitimado. A quantas audiências nós já viemos aqui nesta Casa? Quantas ofensas nós sofremos quando estávamos debatendo a escola sem partido, com lives sendo transmitidas ao vivo, por aqueles que não diziam os nomes, debochando da nossa luta, debochando da nossa existência enquanto professores e professoras?
Inclusive eu ouvi nesta Casa um Deputado dizer que nós professores da educação infantil — quando ele criticava o conteúdo, a parte da temática curricular de educação sexual — ensinávamos criancinhas de 5 e 6 anos a beijar na boca. É com este limite que nós estamos lidando, com o limite do que existe de mais esdrúxulo no debate. É uma coisa muito absurda, mas acontece. A temática da educação sexual é superimportante, visto que a maioria dos casos de violência sexual acontece dentro de casa. Podemos trabalhar para ajudar a criança a já ir se prevenindo, a cuidar do próprio corpo, a ter cuidado no banheiro que é utilizado por todo mundo da mesma casa.
O que está sendo posto, gente, para nós enfrentarmos é de um desafio tamanho. Nós precisamos nos apegar o tempo inteiro ao ato de amor. Nós temos que amar. Refiro-me ao amor da resistência, ao amor de se poder construir, de se poder emancipar. A educação deve servir não só para emancipar, mas também para libertar o ser humano da sua condição de opressão. O que nós vivemos é um projeto todo arquitetado.
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Vamos entendê-lo. Primeiro, proíbe-se — e vamos lá para uma linha do tempo —, retira-se a exclusividade da PETROBRAS para a exploração do pré-sal; retira-se a oportunidade de cumprimento das metas do PNE e do PDE. Depois, vem a questão da Emenda Constitucional nº 95, que congela investimentos no País por 20 anos, e aí não há investimento na educação e na saúde. Esta madrugada, o Guedes já anunciou que vai retirar a obrigatoriedade do piso para a educação e para a saúde. Aí vêm a reforma do ensino médio, as alterações da BNCC, o ataque ao Conselho Nacional de Educação, os conselhos deixam de ser paritários. E aí nós precisamos, no ano passado, construir as nossas conferências populares de educação. Além disso, existe o ataque, a articulação do Governo Federal para colocar a militarização como projeto de salvação. E há mais: estava comentando aqui com o Prof. Erasto que a OS na educação foi aprovada aqui no DF, no primeiro semestre.
Então, para aquele diretor e para aquela diretora que, muitas vezes, chama a comunidade e defende a militarização na sua escola nós dizemos: "Você está trilhando um caminho para construir o seu próprio fim". Essa é a realidade que nós estamos enfrentando. É isto que se vislumbra: a legitimação do gerenciamento privado nas escolas públicas.
E o que nós temos de palpável para dizer que a militarização é a saída para a crise na educação? Nada. Nós temos, sim, muito de negativo. Em Goiás, por exemplo, onde 50% das escolas já são militarizadas, há 8 anos não se faz concurso público. Em Mato Grosso do Sul e no próprio Goiás, ofertaram 1.700 vagas em concurso público para professor e 350 professores foram aprovados. Qual é essa lógica que nós temos de estruturação do fortalecimento dos aparelhos públicos que perpassam a questão do fortalecimento do seu quadro?
No Paranoá, outra cidade de que falo muito, porque sou dessa região, nós temos 820 professores efetivos e 711 contratados temporariamente. Como construirmos uma educação com continuidade? Não estou aqui dizendo que o professor de contrato temporário não seja importante na nossa rede, e sim que ele não é para substituir professor efetivo.
Esse quadro todo de debate, de discussão está intrinsecamente relacionado e ligado ao debate da gestão democrática. Isso porque, quando você organiza uma unidade escolar que tenha continuidade, em que o quadro seja efetivo, há uma conexão daquele profissional com a sua comunidade, há uma conexão daquele profissional com a sua gestão, e ele consegue interferir.
Pessoal, a nossa experiência com a militarização aqui no Distrito Federal tem sido uma coisa realmente "surpreendente", para eu não deixar de ser elegante. Digo isso porque tivemos o caso, em uma escola, de policiais, que são legitimados, que pegaram telefones de alunos e enviaram mensagens pelo WhatsApp mandando beijinho no cantinho da boca. É um caso grave, sério, mas a comunidade não discute isso. Tivemos o caso de policiais que dispersam alunos do 6º ano, como aconteceu na escola da Quadra 311, no Recanto das Emas, usando spray de pimenta, porque estavam jogando bafo no horário do intervalo. A comunidade não quer discutir isso, porque nós estamos vivendo uma esquizofrenia, uma frequente esquizofrenia. Este é o nome: esquizofrenia.
E aí o Governo e as políticas fundamentalistas atacam o cerne da comunidade. É óbvio que, em comunidades de periferia e em áreas de vulnerabilidade social, a segurança é uma temática importante. Nós não desconsideramos isso. Nós também não somos inimigos da polícia, pois precisamos ter a polícia perto de nós –– perto, mas não no nosso espaço.
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Nós defendemos o Batalhão Escolar. Quando eu era aluna, havia uma dupla de policiais do Batalhão Escolar no portão de cada escola de ensino médio e de CEF. Nas escolas clássicas e de educação infantil, eles alternavam. Nós não tínhamos os casos de violência que temos hoje.
Se o aluno tem acesso a arma branca e a drogas, esse acesso é feito na comunidade na qual a escola está inserida. Então, o debate da violência que acontece na escola precisa ser precedido do debate da violência que acontece na comunidade em que a escola está.
Vejam como é louca essa estratégia. Pegam 20 policiais e os fecham dentro do muro de uma escola, enquanto na comunidade está acontecendo tudo o que acontece normalmente de tráfico de drogas, de violência contra estudantes. Dessa forma, os alunos ficam expostos a toda essa violência no trajeto entre a casa e a escola. Ou será que a segurança é necessária só dentro da escola? Eu não me preocupo com o meu filho ou com a minha filha quando percorre o trajeto de casa para a escola?
Nós tentamos falar essa linguagem bem acessível, bem simples com as comunidades, que geralmente são comunidades carentes. Dizemos: "Pai, mãe, o que você prefere: ter 20 policiais fechados aqui na escola, ou dois na porta da escola e 18 circundando a comunidade?"
Assim, com alguns policiais na porta da escola e outros na comunidade, haveria um trabalho efetivo de segurança. O território da educação é nosso. Nós passamos por no mínimo 8 anos de formação para termos contanto com o estudante, para podermos trabalhar em uma escola em um currículo que emancipe, em um currículo que liberte. Ora, vamos, então, trazer para o DF — e já é um fato, já é real — essa realidade de retirar o que tem de principal, de mais humano em nós, que é a nossa identidade cultural?
Como vocês vão pedir para estudantes negros, oriundos do movimento de rap, muitos dos quais usam cabelo black power, para rasparem a cabeça? Vocês querem violência curricular, violência pedagógica, violência social maior que essa, e referendada e outorgada pelo Estado, que é o mais grave?
Nós precisamos construir uma frente de resistência contra essa proposta de militarização das escolas. Por quê? Porque a militarização das escolas não é a saída para a educação pública. A saída para a educação pública nós temos. Nós temos aqui o nosso projeto, que é o Plano Distrital de Educação, o plano decenal, que extrapola a perspectiva de um plano de Governo.
O PDE prevê a educação integral, a construção de creches, o aumento de quadros, a quantidade de alunos por turma. Essa é a nossa referência de educação, de gestão democrática.
O Governo joga para nós: "Vocês criticam a militarização, mas qual é a saída que vocês têm?". Nós temos a saída: investimento na educação. É o Plano Distrital de Educação, a nossa referência de educação. A nossa lei não é a lei de gestão compartilhada; é a lei de gestão democrática, construída inclusive com o protagonismo desse sindicato há muitos anos. Ela é a nossa referência de lei de gestão.
Apesar de todos os problemas que vivemos na educação, de todo esse cenário extremamente desfavorável, cruel, eu deixo para vocês o pensamento do nosso patrono da educação brasileira, o Paulo Freire, que está sendo duramente atacado, inclusive por quem defende a escola militarizada: vamos manter a esperança viva.
No mês em que comemoramos o Dia do Professor, temos que manter a esperança viva, porque, como disse o Paulo Freire, manter a esperança viva, num país como o Brasil, já representa, em si, um ato revolucionário.
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A SRA. PRESIDENTE (Professora Rosa Neide. PT - MT) - Agradeço à Luciana Custódio, que aqui representou o SINPRO, trazendo as contribuições para a discussão da gestão democrática.
Também agradeço a presença dos Deputados Pedro Uczai e Glauber Braga, grandes parceiros nas discussões dos temas da educação e sempre estão conosco, especialmente na Comissão de Educação.
O SR. ERASTO FORTES MENDONÇA - Quero desejar um bom dia a todos e a todas e agradecer, mais uma vez, à Deputada Professora Rosa Neide a honra de estar presente na Comissão de Educação para discutir temas relevantes das nossas políticas educacionais.
Particularmente, peço licença para cumprimentar a Profa. Ailta e a Ludimila, pelo fato de serem colegas da minha universidade.
E faço isso como um desagravo. Acho que nós estamos vivendo um momento muito sério, muito importante de enfrentamento das políticas educacionais deste Governo, representadas pelo Ministro que atualmente ocupa — a meu juízo, de maneira desonrosa — o Ministério da Educação e que tem feito ataques sistemáticos às universidades, de um modo geral, e à minha universidade, de modo particular. Inclusive, algumas vezes, ele até ofende a pessoa da nossa Reitora, a Profa. Márcia.
Então, deixo aqui o meu registro de desagravo. Gostaria que o Prof. José Ribeiro, como representante do Ministério da Educação, considerasse esta questão que apresento no momento.
Eu tinha pensado em como falar a respeito da gestão democrática, tomando em consideração o objeto principal desta audiência, que é a participação dos estudantes, mas confesso que fiquei um pouco tocado com a pergunta inicial da Denise, representando a UNE, quando citou e situou a questão da gestão das instituições privadas de ensino, em particular, das instituições de educação superior. Ela se perguntou de onde vem essa gestão democrática, que não alcança as instituições privadas.
Eu vou pedir licença, porque, inclusive, este é meu tema de estudo e de pesquisa na universidade, para fazer um pequeno retrospecto do histórico da gestão democrática em nosso País.
Nós temos uma história e, por sermos filhos e filhas de um processo histórico, acho importante sempre recuperarmos esses elementos históricos.
O processo de instituição da educação no Brasil não leva muito em consideração o caráter público da educação.
Quando o Brasil se torna uma colônia de Portugal, o rei de Portugal entrega à instituição religiosa católica dos padres jesuítas o dever de ensinar na forma de um monopólio que dura 210 anos. Para um país que tem quinhentos e poucos anos pós-colônia, é muito tempo.
E não tenham dúvida de que isso gera marcas profundas na forma como a educação é organizada em nosso País.
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Nós tivemos um processo de instauração da República no País que não republicanizou a educação, não trouxe direitos educacionais, como aconteceu nas repúblicas que se instalaram depois da Revolução Francesa nos estados nacionais modernos, que fizeram questão de colocar a instituição educacional pública como uma forma de garantia do direito à educação. Nós não tivemos isso em nosso País.
A primeira vez que se fala na obrigação do Estado de assegurar direito educacional às crianças foi na década de 1930, com o movimento renovador da educação, um pouco na esteira do que viveu o momento cultural na década de 20 e que se espelha de uma forma mais objetiva na Semana da Arte Moderna. Na educação tivemos isso também, mas é pouco conhecido, inclusive de nós educadores.
Nós tivemos um movimento renovador da educação que se espraia de forma mais objetiva no Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova de 1932, que fala, pela primeira vez, no dever do Estado de assegurar educação pública de qualidade, com direito a ambos os sexos a uma educação laica. Imagine o que quer dizer isso na década de 1930 — quando a mulher não votava — até 1932. Imagine o que é isso de revolucionário num País que teve 210 anos de monopólio da congregação jesuítica.
Portanto, falar de educação pública laica, com as mulheres tendo direito a ter o mesmo tipo de acesso que os homens, é um passo revolucionário, mas que só vai começar a se efetivar de fato na década de 1960. Analisemos os indicadores sociais da educação, que é quando as matrículas no ensino fundamental — hoje chamado de ensino fundamental — explodem. O que acontece? Tivemos uma explosão de matrículas: o povo entrando de fato na escola como seu usuário. E o Estado, que garante a matrícula para a maioria da população, não garantiu a equidade na qualidade de ensino.
Portanto, nós tivemos um processo de degradação paulatina, sucessiva, gradativa e cada vez mais intensa de sucateamento das escolas públicas. Eu falo de sucateamento não só do ambiente físico das escolas não, mas dos currículos, do tratamento dado pelo Estado aos seus profissionais de educação e ao direito dos seus estudantes de ter uma educação de qualidade.
De onde surge, então, a gestão democrática? Surge de uma resistência a essa forma de agir do Estado em relação à educação. É daí que surge a gestão democrática. Na década de 1980, final de 70 início de 80, quando nós começamos a ter um processo de resistência mais forte à ditadura civil militar implantada no País em 1964, isso também vai ter reflexo na educação. Os processos de resistência que se dão na sociedade política, na sociedade civil, se dão de maneira particular no interior de nossas escolas, em particular, nas escolas públicas.
Então, aquele processo de escolhas de diretores, que vinha sendo feito como um direito de indicação política de chefetes políticos em cada Município, vai se dar de uma forma que os educadores organizados, particularmente os educadores, nesse momento, por meio de seus sindicatos e confederações, façam o quê? Queiram eleger diretores. Daí surge, de maneira mais forte, o processo participativo no interior das escolas do ponto de vista da gestão. Isso foi muito importante.
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Por outro lado, também nos trouxe um vício de acreditar que a gestão democrática se resume à escolha de diretores de escola, e nós custamos a compreender que não era bem assim. A gestão democrática, por essência, é ter processo participativo nos meios de decisão que a escola toma, em um primeiro momento. Nós tivemos isso. Tivemos governos de Oposição eleitos na década de 80, em 1982, particularmente em quatro Estados da Federação que tinham a maioria do PIB nacional. Recordo-me aqui: Rio de Janeiro, Minas Gerais, São Paulo e Paraná. Nesses quatro Estados, nós tivemos a eleição de governadores de Oposição — pela primeira vez, depois de muitos anos de ditadura, em que os governadores eram impostos como interventores — que trouxeram — não sei se por uma ocasionalidade da vida, mas foi uma sorte para nós, do campo da educação — para as Secretarias de Educação, pessoas absolutamente comprometidas com o processo de direito à educação e com essa luta histórica que vinha acontecendo. Então, foi neste momento que tivemos essa discussão da qual vocês falaram: qual escola queremos, qual o papel da escola, qual a cara que a escola deve ter etc.
A partir deste momento, o processo de escolha de diretores se fez de maneira mais efetiva dentro de sistemas escolares, até o momento em que nós tivemos o processo da Constituinte, que redundou na Constituição de 1988 — em vigor ainda hoje, apesar de muito mutilada —, que trouxe inúmeros avanços para o campo da educação. A que se devem esses avanços? À nossa compreensão de que o processo de lobby existente nesta Casa também é um direito de nós, trabalhadores e estudantes. Então, estivemos presentes, neste Congresso Nacional, exigindo dos nossos Parlamentares que incluíssem direitos educacionais na nossa Constituição. Por isso, estão lá, nos artigos 205 e 206, de maneira particular.
No art. 206, que cita os princípios do ensino no Brasil, felizmente passamos a ter o inciso VI, que diz: "gestão democrática do ensino público, na forma da lei". Não vamos esquecer que, atrás da consequência de termos essa letra da lei constitucional, nós tivemos uma luta imensa aqui dentro deste Congresso para que isso existisse, em primeiro lugar, e que existisse sem a expressão do ensino público. Era gestão democrática. Por que vocês acham que aconteceu de o ensino público ser inserido no inciso VI? Evidentemente, o lobby das empresas privadas de educação aqui esteve da mesma forma que nós estivemos, no Fórum Nacional em Defesa da Escola Pública, que juntou, felizmente, naquele momento, entidade da sociedade civil organizada, em particular do campo da educação, para conquista desses direitos.
Então, trago essas questões à nossa reflexão para que possamos sempre lembrar que gestão democrática não foi uma outorga de Parlamentares constitucionais. Não foi uma outorga. Não foi um presente dado ao setor educacional. Foi uma coisa arrancada, na luta organizada de professores, técnicos, auxiliares de educação e estudantes. Infelizmente, naquele momento, havia muito pouco da sociedade civil como usuária da escola. Isso vai se dar principalmente a partir de associações da sociedade civil que aqui estiveram, como a CNBB, OAB e outras mais.
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A Deputada sabe que nós tivemos aqui inúmeros projetos de lei tanto na Câmara dos Deputados quanto no Senado da República que tentaram fazer essa regulamentação por meio de lei de âmbito federal. Todas essas proposições foram ao arquivo. Alguma razão deve haver para isso. Todas foram ao arquivo.
Felizmente, nós temos hoje agora circulando projetos de lei, inclusive da Deputada que nos coordena hoje nesta audiência pública, que fazem a tentativa de novamente trazer à discussão dos Parlamentares a regulamentação dessa lei.
Fui informado, pelo sinal, de que o tempo terminou, mas eu queria fazer também uma referência, porque penso que isso seja muito importante. Nós vivemos hoje, como já foi dito aqui em várias falas, um período de ódio e de ataque à educação, como nós nunca tivemos na história deste País, tanto colônia quanto república.
Não tivemos nunca isso acontecendo em nosso País, especialmente, nos processos participativos e democráticos, que estão sendo atacados sistematicamente pela mão do Governo. O Governo induz a sociedade a fazer com que esse ódio seja uma maneira de comportamento dentro dos nossos sistemas educacionais de educação básica e, em particular, da educação superior.
Nós vivemos esse período de ódio em que professores e estudantes foram escolhidos como inimigos públicos nº 1 do Governo. O que se pode esperar de um Governo que trata os seus professores e os seus estudantes como inimigos? Acho que se pode esperar muito pouco.
Não tenho a esperança de esperar, mas tenho a esperança de esperançar de que tenhamos o fim dessa forma como o Governo vem atuando no campo da educação, fazendo destruição sistemática de todas as conquistas educacionais que nós tivemos nas últimas décadas — todas! A universidade é sufocada em termos de recursos, e depois se vem com essa papeata de dizer que os recursos foram novamente recolocados na universidade. Então, por que se tira? Tiram para quê? Para fazer o papel do inimigo da universidade e depois para fazer o papel do bonzinho, que retorna o recurso para a universidade.
Isso não engana ninguém, quer dizer, engana uma parte da população, mas a nós aqui, que estamos inseridos nessa luta da educação há muitos anos, não engana.
O Ministro da Educação hoje ocupa — repito — desonrosamente o Ministério da Educação, com papeatas que são colocadas por ele próprio nas redes sociais. Eu não tenho nenhuma dúvida de que isso seja uma cortina de fumaça, uma pequena distração para a população, enquanto as maldades vão sendo feitas por trás dessa cortina.
Que maldades são essas? A destruição das conquistas educacionais e a entrega sistemática de nossa educação ao setor privado, que, cada vez mais, se organiza para tomar conta dela. A sanha e a fome do setor privado não têm limites — não têm limites.
Alguém perguntou aqui — e me parece que foi a nossa colega da CONTEE — que tipo de coisa se pode esperar de donos de escola. Pode-se esperar lucro. Para eles, não interessa se o estudante entra na instituição e termina o seu percurso com sucesso. Não interessa isso. Interessa matrícula, matrícula.
Se alguém sair no meio do processo, paciência, são coisas da vida, desde que alguém entre no lugar de quem saiu. Essa é a lógica que temos hoje.
Ontem eu ouvi do Presidente do Sindicato dos Professores em Estabelecimentos Particulares, o Prof. Rodrigo, na nossa Câmara Legislativa — numa audiência pública feita em homenagem aos professores, diga-se de passagem — uma coisa que me estarreceu. Não me havia atinado para esta questão: professores, especialmente da educação básica, jamais se aposentarão — jamais! Não terão aposentadoria nunca mais. Sabem por quê? Porque os professores da escola privada, quando chegam aos seus 50 anos de idade, estão fora. E a pessoa vai embora não é por opção ou por adoecimento simplesmente. Ela é chutada da instituição privada porque não interessa mais à escola. E ninguém mais vai lhe dar emprego. Então, esses estão fadados a não se aposentarem nunca mais. Esse é o quadro que estamos vivendo.
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De que gestão democrática nós precisamos? Não é a gestão democrática que somente elege diretores de escola. É a gestão democrática que ocupa os conselhos, ocupa as decisões, não somente da escola, mas também dos sistemas de ensino e das políticas nacionais de educação. O que estamos fazendo aqui hoje, discutindo política educacional, é um processo de gestão democrática, é um processo de organização que não pode parar, porque é ele que nos garante que a gestão democrática estará sempre na resistência, sempre na contra-hegemonia. É a essa que somos chamados como um desafio.
É por isso que eu admiro a nossa sempre Deputada Professora Rosa Neide e os Deputados que estão aqui presentes — Deputado Pedro e Deputado Glauber —, por estarem sempre conosco nessa luta, para que compreendamos, insisto nisso, que não é um presente do Parlamento o que estamos conquistando. Essa é uma conquista arrancada na luta. E essa organização, na qual os estudantes têm um papel primordial, tem que persistir.
Quando alguém citou aqui a questão dos 30% de participação, que ainda devem ser divididos com os técnicos administrativos na nossa universidade na escolha de reitores, quero lembrar que isso foi uma lei aprovada no Governo Fernando Henrique Cardoso, que dá hegemonia completa aos docentes da universidade. Eu digo isso com toda a liberdade, como professor. Isso é um escândalo. Os pretextos para isso quase sempre são que o estudante é um elemento provisório na universidade. Ele entra e sai. Os professores, não. Eles estão lá e serão permanentes na universidade. Eu pergunto a vocês: o que de mais permanente pode existir do que um diploma que o estudante carrega para o resto de sua vida? Então, esse direito precisa ser assegurado. Acho que seria um bom momento de pensarmos aqui num PL, quem sabe, que revogue essa idiossincrasia de entender que o professor é o dono da universidade num sistema patrimonialista implantado e de difícil correção nessa instituição acadêmica em que vivemos.
A SRA. PRESIDENTE (Professora Rosa Neide. PT - MT) - Quero agradecer ao Prof. Erasto, que está sempre à disposição para participar das discussões.
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O SR. PEDRO UCZAI (PT - SC) - Deputada Professora Rosa Neide, cumprimento V.Exa. pela iniciativa, ao tempo em que cumprimento os membros da Mesa.
Durante a apresentação de uma parte dos oradores, eu não estava aqui, mas estava em meu gabinete e ouvi suas falas, principalmente a da Adércia, que é minha colega de Santa Catarina. A Denise é uma lutadora, uma batalhadora, que está sempre representando os estudantes e a UNE. E a Luciana trouxe o debate da destruição da democracia, com militarização e violência, que são um dos componentes.
Erasto, eu queria fazer duas ou três considerações aqui sobre o que já foi abordado. A primeira é que eu acho que a ciência, a cultura, a escola pública e a universidade pública não servem para esse "projeto vencedor" no País. Por isso, são eleitos como inimigos. Mas não serve não só para a política, para este Governo, para este núcleo do Governo; não serve para a sociedade que está se construindo no País.
Eu vejo que, mesmo que o setor privado da educação esteja com a sanha financeira, acho que o mais grave, Prof. Erasto, não é privatizar a educação, mas mercantilizar a própria educação pública, a própria universidade pública, e não só o Future-se. Vai ter universidade pública, vai ter instituto federal, vai ter escola pública. Para mim, é mais grave do que só o Governo mandar dinheiro para o setor privado? Não! É o desmonte do caráter público da universidade pública, da instituição pública, da escola pública, o que eu chamo de educação mercantil, que desmonta toda a perspectiva e o universo do conhecimento.
Em terceiro lugar, refiro-me ao modelo econômico que está sustentando essa nova política educacional, um modelo econômico em que não cabe ciência para o País — não precisa de ciência. Não precisa nem da EMBRAPA. Olhem que loucura! A EMBRAPA, que faz para o agronegócio, para a hegemonia do agronegócio, mas cujo investimento caiu de 4,2 bilhões de reais para 1,9 bilhão de reais. Entenderam? Reduz praticamente em 2 bilhões de reais o orçamento para o próximo ano.
Portanto, não se trata de Esquerda ou Direita nessa matriz fundamentalista e ideológica só. Trata-se de um modelo econômico para recolonizar este País, porque há todo um desmonte do setor de maior tecnologia do País, que formou os engenheiros. Para que formar engenheiros? Vai formar qual engenheiro e para qual complexidade da economia se a economia complexa está sendo desmontada? Só estão considerando minérios, commodities, agronegócio, esses setores. O setor de óleo e de gás, de alta tecnologia ou da complexidade do setor de serviços estão se desmontando também.
Acho que há uma questão mais profunda que está legitimando esse novo modelo educacional que vai muito além da militarização, que vai muito além da questão ideológica, que vai muito além da questão fundamentalista, religiosa, conservadora e reacionária. Nós temos que entender a economia com a educação, a economia com a escola pública, a economia com a universidade pública. O País que está se montando e se construindo não precisa ter universidade pública com este caráter atual, não precisa ter escola pública com este caráter atual. Elas podem ser mercantilizadas. Por isso, põem o "S" para fazer a gestão. Por isso, põem a organização. Por isso, desmontam a autonomia, mas não a autonomia da gestão — isso é o mais grave —, e sim a autonomia do pensamento crítico na escola pública e na universidade pública. É a destruição dessa autonomia.
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Termino agora, não vou me estender, dizendo que estou muito feliz por estar partilhando com vocês um pouco desses diferentes sentimentos.
Eu acho que devemos continuar lutando pela discussão democrática. Eu quero cumprimentar a Deputada Rosa Neide por isso. Está lá na Constituição. Eles não vão conseguir retirar isso, mas não vão conseguir ampliar se nós não fizermos a luta. Por isso, temos que continuar insistindo. Arquivou-se? Não tem problema, vamos continuar insistindo. Teimosa é a Deputada Rosa Neide. Teimosos somos nós. Vamos teimando. Vamos teimosamente fazendo essa luta! Um dia nós vamos ser vitoriosos de novo. Acho que esse é o campo de possibilidade de Walter Benjamin. É um campo de possibilidades. Se a correlação de forças agora está assim, logo em seguida terá Equador, Chile, Argentina e Brasil. Essa é a esperança — essa é a esperança.
Em Santa Catarina, a única novidade que nós introduzimos no sistema estadual de educação foi a gestão democrática. Nós fomos o primeiro Estado a regulamentar a LDB à época. Constituímos, além da eleição direta para diretor, no que nós fomos derrotados... Acho que eu não deveria falar isto. Não vou falar, porque, senão, vou me autodenunciar aqui e mostrar meu pecado. Eu tenho um filho de 28 anos hoje. No dia em que nós perdemos os capítulos 28, 29 e 30 da gestão democrática para escolha de diretores — só conseguimos manter o conselho deliberativo escolar, a única experiência nova que conseguimos construir na época, porque na eleição direta para diretor nós perdemos para o filho do Jorge Bornhausen —, eu voltei puto para casa, desculpem-me a expressão, voltei muito louco para casa. E, ao chegar à casa, meu filho ainda criança estava com um monte de brinquedos que havia roubado da escola. Ele roubou brinquedos da escola. Eu, que fui quase padre, falei para ele devolver, porque tinha se apropriado dos brinquedos dos coleguinhas, mas ele não devolveu. Estava puto comigo, porque eu era muito ausente também, revidou, eu gritei com ele, ele gritou comigo, e eu gritei com ele. Enfim, lembrei-me da minha mãe dizendo: "Não roube uma agulha, senão tu viras ladrão". E acabei batendo nele. Foi a única vez em que eu bati no meu filho. Liguei para a minha mãe no outro dia dizendo que eu estava arrependido, e ela me disse: "Pedrinho, ele está cometendo pecado porque não foi batizado ainda".
(Risos.)
Eu estou falando pedagogicamente sobre essa coisa da gestão democrática e do conselho deliberativo escolar. Meu filho nunca mais roubou nem uma bala, mas eu não precisava ter feito a pedagogia do cagaço com ele.
Em relação ao acesso à universidade, na questão da gestão democrática, eu acho que há um elemento para o acesso. Nós começamos uma experiência bonita nos institutos federais e nas universidades federais quando a escola pública começou a colocar alunos na universidade pública com cotas e cortes, o que foi uma grande conquista. Por isso, temos que mantê-la. Essa resistência das cotas tem que se manter como uma questão da democracia. É um elemento da democracia o acesso.
A nossa Universidade Federal da Fronteira Sul avançou numa direção sobre a qual eu já tenho discutido para ver se a questão pode ser transformada num projeto de lei — sobre isso eu queria ouvir os especialistas —, porque o acesso à Universidade Federal da Fronteira Sul não se dá por cotas, ela incorpora as cotas, mas tem outro elemento estruturante, que é o de dar ao aluno de escola pública preferência no ingresso à universidade pública. E qual é o critério? Ter 70% de nota máxima, 7, no ENEM. Nenhum aluno tira nota 10. A nota máxima do aluno, se ele acertar tudo, é 7. Os outros 3 pontos são para quem estudou 3 anos no ensino médio público: 1 ponto se estudou 1 ano em escola pública; 2 e 3 pontos se estudou 2 ou 3 anos no ensino médio público.
Dessa forma, estatisticamente, temos o percentual: 89%, 90% dos alunos que acessam a nossa universidade são da escola pública.
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É a maior alegria ver que 36 alunos, de 40, que estão no curso de medicina são oriundos da escola pública. São filhos de agricultor, de trabalhador e de professor da escola pública. Esse ingresso incluiu cota, incluiu índio, incluiu pobres da periferia e incluiu o conceito do protagonismo e do reconhecimento da escola pública. Proporcionalmente, 90% dos alunos estudam na escola pública. Então, proporcionalmente, esse percentual também está chegando à universidade pública.
Só queria colocar este ingrediente, que é o da democratização do acesso à universidade, porque a maior parte dos alunos das universidades, como onde meu filho formou-se em engenheiro da produção mecânica, é quase toda da classe média alta, moradores de bairros ricos das grandes capitais do Brasil. Como a Universidade Federal de Santa Catarina era uma universidade de referência no País, acolhia a elite brasileira. Então, os pequenos, os mais pobres não conseguiam acesso nas próprias universidades públicas.
A SRA. PRESIDENTE (Professora Rosa Neide. PT - MT) - Agradeço ao Deputado Pedro, outro colega bastante teimoso aqui nesta Comissão, que coloca toda a sua energia, toda a sua experiência a favor da educação.
Com certeza, Deputado Pedro, se vamos fazer gestão democrática, tem que ser na forma da lei, que tem que existir. Nós temos que garantir que ela realmente chegue ao interior de nossas escolas. Como foi muito bem colocado pelo Prof. Erasto, acho que nada é mais permanente do que o diploma que os estudantes conquistam na escola pública. Se amanhã vierem outros, serão sempre por causa dos próprios estudantes. Eles estão representados pelas entidades constituídas nas escolas.
Sou Ludimila Brasil. Estou como diretora da UNE até 2021 e, até 2020, como secretária-geral do Diretório Central dos Estudantes da Universidade de Brasília. Venho aqui colocar a nossa opinião, enquanto gestão democrática e participação estudantil, a partir do ponto de vista de uma estudante que debate com estudantes e que luta bastante para fazer política dentro de uma universidade altamente elitizada. Então, eu queria começar a debater a partir do ponto que discute a conjuntura estudantil atual, para chegar até a importância das entidades estudantis na nossa realidade.
Para nós, o que o Governo Federal faz atualmente é um processo de alienação estudantil. Ele aliena o jovem, a partir do ensino básico, num constante processo de despolitização das nossas realidades.
Quando se militariza uma escola, tira-se o direito constitucional do jovem de debater sua cidadania.
Quando, a partir da Medida Provisória nº 895, de 2019, tira-se o fundo de renda de uma das maiores entidades estudantis da América Latina, no caso, a União Nacional dos Estudantes, impede-se que o estudante universitário tenha um amplo acesso à discussão política dos seus direitos. Então, para nós — e aproveito que o Prof. José Ribeiro está aqui —, tanto da União Nacional dos Estudantes quanto estudantes da Universidade de Brasília, é isso que o Governo Federal faz agora, ele ataca um direito constitucional nacional nosso de debater política, política educacional e gestão de política pública.
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Para nós, é muito sério e muito violento entender que o Governo Federal pretende colocar na mão de organizações sociais — nós não sabemos quais e com quais parâmetros — o bem conquistado à custa de muito sangue estudantil. Para nós, é muito sério entender que o Governo Federal pretende colocar na mão de OSs um bem universitário, o bem da Universidade de Brasília, construído à custa do sangue de Honestino Guimarães, desaparecido, até hoje, na Universidade de Brasília. Então, é a partir daí que eu quero começar a discutir.
Para nós, é absolutamente importante discutir, por exemplo, a paridade nos conselhos da Universidade de Brasília. Por quê? Porque, a partir do momento em que eu escuto “paridade”, eu consigo mostrar para a Universidade de Brasília a importância da política de atenção a estudantes em situação de vulnerabilidade social, estudantes que, inclusive, não têm sua verba repassada e atualizada desde 1994, porque o Governo Federal não vela — e o Governo Federal atual vela muito menos ainda e ataca constantemente — aquele estudante pobre, o estudante que não tem condições de pagar 5 reais de metrô se quiser estudar aos sábados, o estudante que não tem condições de pagar 5,20 em um almoço no restaurante universitário, porque o Governo Federal flexibilizou a verba na tentativa de fazer com que a gestão da Profa. Márcia cortasse essa verba. Então, acho que é a partir daí que temos que pensar a gestão democrática, a partir de um processo de sobrevivência estudantil.
O estudante da Universidade de Brasília quer discutir política. Não foi à toa que nós, uma chapa formada em sua totalidade por organizações do movimento estudantil e por organizações progressistas, tivemos 5 mil votos de diferença da chapa neoliberal, da chapa dos endowments, que também são propostas do nosso Ministro da Educação. Não foi à toa que nós conseguimos colocar uma universidade de cinco campi para debater política em uma gestão de DCE de três semanas. O estudante quer debater, o estudante quer ter condições de debater, o estudante quer mostrar aos professores que eles não são donos da universidade, muito pelo contrário.
Nós usamos a expressão "viver a universidade" e nós discutimos muito sobre isso dentro da Universidade de Brasília. Para nós, viver a universidade não é chegar de manhã, ir à aula, fazer uma prova, almoçar, pegar o ônibus e voltar para casa. Para nós, viver a universidade é entender por que a Universidade de Brasília não consegue compreender projetos culturais. Para nós, viver a universidade é participar de um conselho universitário. Para nós, viver a universidade é fortalecer os nossos centros acadêmicos.
Para nós, viver a universidade é entender por que, dos 47 mil estudantes que estão na Universidade de Brasília, só 12 mil votam numa eleição de DCE.
Tudo isso está sendo cortado, limado e atacado constantemente e violentamente pelo Governo Federal, pelo Ministério da Educação, que, ao cortar a verba e depois liberá-la, tenta flexibilizar o orçamento do ano que vem. Não se enganem! Foi liberada a verba agora, se as universidades não conseguirem usar toda até o fim do ano, essa verba não vai ser restituída no ano que vem. É isso que está se fazendo, não é uma brincadeirinha de sou bom ou de sou mau, como referenciou o Erasto, é uma brincadeirinha de, se não usar essa verba até o fim deste ano, não haverá essa verba na LOA do ano que vem.
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O Ministério da Educação tem que entender que nós, estudantes, estamos debatendo política e entendendo isso. Não estamos na universidade para debater uma política alheia a nós, estamos na universidade debatendo uma política que compreendemos e que entendemos que vai tratar da sobrevivência dos estudantes que vierem depois de nós.
Queria colocar aqui que, para nós, o debate da gestão democrática perpassa o fortalecimento dos grêmios estudantis, dos centros acadêmicos, dos diretórios acadêmicos, dos diretórios centrais dos estudantes, da União Nacional dos Estudantes e da União Continental dos Estudantes Latino-Americanos. Os estudantes estão fazendo uma grande parte da revolução do Chile, compreendendo que o estudante brasileiro tem noção disso e que não tarda muito, não tarda muito, para mais uma vez colocarmos 100, 200, 300 mil estudantes na rua, porque temos a compreensão da responsabilidade que é ocupar uma vaga de uma universidade pública no Brasil.
Nós temos uma compreensão do que o Governo e o Ministério da Educação travam como inimigos; e não se enganem, os estudantes conseguem definir muito bem quem são seus inimigos e nunca se esquecerão deles, porque o nosso processo de politização é um processo que perpassa o tempo. Não é à toa que Honestino Guimarães vive até hoje em nós.
(Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Professora Rosa Neide. PT - MT) - Muito obrigada pela participação, Ludimila Brasil, que, como estudante, nos faz refletir bastante sobre a atual conjuntura.
Saúdo a Mesa, na pessoa da Deputada Professora Rosa Neide. Sou Marcelo, primeiramente, estudante do Instituto Federal de Brasília, faço serviços públicos e estou, como tarefa hoje, como Vice-Presidente Regional da União Brasileira dos Estudantes Secundaristas.
Como foi apresentado pelos expositores anteriores, como foi dado o processo de gestão democrática, a partir do processo histórico, que caminha através da nossa História do Brasil, que tem como uma característica o próprio acesso à educação, vou falar aqui mais sobre a questão da participação dos estudantes, que se dá a partir da redemocratização da educação, na nossa Constituição em 1988.
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A partir da LDB, em 1996, são garantidos três princípios para realização da gestão democrática. São eles: a descentralização da administração e de decisões e ações que devem ser tomadas dentro do âmbito escolar; a participação de todos, que engloba não somente o professor e a direção, mas também os estudantes e a comunidade escolar como um todo, para discussão geral, para solucionar as dificuldades exercidas dentro da sala de aula; e também a transparência, para que todo o ocorrido e todas as discussões possam perpassar através de assembleias.
Há também um viés muito importante, o de garantir a flexibilização da Lei de Gestão Democrática, para que os estudantes possam se articular em conjunto com os professores e a comunidade, através de sua representatividade, dentro da sala de aula e da escola.
Sobre isso dispõe a Lei do Grêmio Livre, sancionada em 1985, de autoria do então Deputado Aldo Arantes. Esta lei dá autonomia aos estudantes secundaristas para criação de grêmios e também para que a organização possa discutir dentro de sala de aula, no âmbito escolar ou fora dele, as necessidades para melhoria da educação nos ensinos fundamental e médio. Traz também consigo a própria organização para além disso.
Hoje, por exemplo, a UBES tem essa função de representar os estudantes nacionalmente e tem a função também de levar adiante os anseios de quem está no dia a dia da educação, de quem está na base, que são os estudantes e, posteriormente, os grêmios estudantis, as entidades estudantis estaduais, também levando para seus espaços discussões através dos fóruns, que são os congressos.
A Lei de Gestão Democrática também garantiu que a União pudesse ter uma participação na educação não só na questão de liberação de recursos, mas também na questão do financiamento, com a criação do FUNDEF, que vigorou de 1997 até 2006, e agora com o FUNDEB, cuja vigência se iniciou em 2007 e vai até 2020. Isso compreende as três etapas da educação básica: o ensino infantil, o ensino fundamental e o ensino médio.
O fundo hoje garante que haja um retorno de 20% dos impostos dos Estados para a União, para que seja dividido posteriormente com a implementação de 10% das receitas do Estado todo ano, para que esse investimento volte para a educação. Hoje o fundo equivale a 63% de tudo o que é investido na educação pública pelo País, o que foi apresentado pelo MEC.
Hoje temos como maior referência de uso do fundo o Estado do Maranhão, que utiliza 100% do FUNDEB para garantir o pagamento de seus professores. Hoje o Estado é referência na valorização do profissional de educação.
O fundo também garante, por exemplo, que os estudantes não paguem por livros na escola. Simplesmente, quando vamos avaliar o custo aluno/qualidade, quem está na escola particular paga 200 reais, e ao estudante de escola pública o material é garantido, através do FUNDEB. Carteirinha e uniformes são também garantidos aos estudantes.
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Há algumas semanas, o Governo Federal definiu que essa verba vai ser colocada em modo fixo, a 15%, como se se pudesse estagnar a educação, simplesmente, num período de tempo sem condições de alavancar o conhecimento e a produção de pesquisas, e vem com essas alternativas, como as que foram apresentadas no início do ano, com cortes na educação.
Nós estudantes fomos, em nome da educação, para as ruas e conseguimos retomar para a educação as verbas que foram contingenciadas. Ao mesmo tempo, não temos garantia de que as pesquisas e os projetos financiados pelos alunos e já em andamento que foram estagnados naquele período terão um retorno qualitativo para a sociedade. Não sabemos se eles vão conseguir ter condições de terminar a graduação com o mesmo planejamento que havia no início do projeto.
Isso sem falar do propósito do Future-se, que retira a autonomia dos estudantes, a partir do art. 207. A característica principal que diferencia o ensino privado do público é a pesquisa e a extensão. A educação pública é a única que chegou a lugares em que é preciso pegar barco para ir à escola, por exemplo. A educação pública conseguiu alavancar a educação em regiões indígenas, por exemplo.
Algo que é importante trazer para esta Casa é que a Lei de Diretrizes e Bases para a Educação garante a discussão de matérias sobre os afrodescendentes.
No entanto, há algumas semanas, o Governo veio com a contraposição de apresentar o projeto para escola cívico-militares, que garante que anualmente haverá 54 milhões de reais direcionados para a implementação desse projeto. Isso entra em uma contradição com o contingenciamento da educação, como foi falado pelo MEC, ao estabelecer o teto de gastos definido pela Emenda Constitucional nº 95. Ao mesmo tempo que não tem investimento para educação, entra em contradição porque hoje no Distrito Federal, o meu Estado, foi destinado 1 milhão de reais para o pagamento de policiais que atuarão na implementação da gestão compartilhada, o que não foi discutido com a comunidade num primeiro momento.
E nós estudantes, junto ao Sindicato dos Professores, que nacionalmente tem articulação para garantir, através da sua área de educação e do conselho, que muitas vezes estão ocupados não só pelos estudantes mas por entidades que não representam os nossos requerimentos, colocamos uma dúvida muito grande em relação ao Governo, principalmente porque a lei da gestão democrática tem um viés a ser direcionado como norteador para que na escola haja ampla discussão, antes das decisões e votações, para que isso possa ser aprimorado novamente.
Aqui, no Distrito Federal, vamos passar pela eleição de diretores, por meio da qual a maioria dos estudantes vota na direção de sua escola, o que tem consequência muito importante.
Esse projeto de militarização não soluciona a educação brasileira porque justifica um problema ainda maior do que o que o Governo criou, porque no momento em que estamos tendo teto de gastos e se retira o piso, simplesmente não se coloca a educação como prioridade.
O Governo, quando da sua campanha, dizia que a educação básica seria prioridade, e hoje ela não é prioridade.
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Para as minhas considerações, acho que é fundamental lutar e manter as nossas conquistas democráticas constitucionais. Para além disso, é preciso compreender que uma construção democrática cotidiana perpassa pelas discussões amplas, não só por um indivíduo, mas pela coletividade, que tenha a fundamental compreensão de todo brasileiro. Afinal, a que servem essas práticas da educação? Para que projetos de Estado? Que Brasil queremos?
A gestão democrática vem com esse intuito de apresentar o Brasil e não só a educação, um Brasil desenvolvido, soberano, que não esteja nas amarras do interesse privado, que hoje simplesmente coloca organizações sociais como norteadoras do financiamento da educação e tira, por exemplo, o Fundo Constitucional como investimento também para a educação nos Estados. Isso depende da interlocução entre os saberes e também a necessidade da construção do nosso Brasil.
O projeto de educação não perpassa por mim, mas por todos, principalmente dentro desta Casa. A gestão democrática, por exemplo, garantiu que nós, estudantes, estivéssemos aqui na criação e também na articulação do Plano Nacional de Educação, conquista igualmente nossa que hoje está representada com dezesseis metas travadas e que apresenta uma solução para tudo o que há hoje no Brasil. É um pouco disso.
Apresento a necessidade de organizar e dar continuidade ao FUNDEB permanente, e nenhuma postura de autoritarismo será aceita. Os estudantes mostraram isso nas ruas. Não foi simplesmente vir a Brasília se manifestar durante apenas um dia. Nacionalmente, mobilizou mais de 2 milhões de estudantes no Brasil inteiro e pode, consequentemente, mobilizar mais estudantes ainda, mobilizou a comunidade acadêmica saindo das ruas, mostrando os nossos projetos de pesquisas e extensões.
Termino minha fala no sentido de trazer estas indagações: que Brasil queremos? Que Brasil cada estudante, cada professor, cada Deputado que está aqui quer? Hoje temos uma bancada que também é da base do Governo e tem que saber pontuar qual é o Brasil que quer, porque o que está apresentado hoje pelo Governo Federal é bater continência para os Estados Unidos. Não queremos servir, por exemplo, hambúrgueres, não queremos fazer pizza, mas, sim, produzir a nossa ciência, ser portadores desse conhecimento e ampliar a nossa criação científica no nosso País.
A SRA. PRESIDENTE (Professora Rosa Neide. PT - MT) - Agradeço ao Marcelo Acácio, que representa a UBES do Distrito Federal. É muito importante. Hoje estamos discutindo a gestão democrática, especialmente a participação dos estudantes. Todos que estão se pronunciando aqui ajudam bastante na reflexão que esta Casa tem que fazer.
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Quero dizer que hoje eu tomei uma decisão aqui, neste momento. Eu tenho várias decisões para tomar, mas uma eu tomei hoje, aqui. Eu vou mudar o meu lattes, porque ele está lá falando da minha vida acadêmica na universidade. Eu fico nervosa como o colega, às vezes, eu até choro, se tiver que falar ao microfone.
Estou aqui falando em nome da Associação dos Docentes da Universidade de Brasília, sou membro da atual gestão. Vou começar falando essas coisas informais, para descontrair e vou dizer por que vou mudar o meu lattes. Eu trabalho desde os 4 anos de idade. Sei fazer todo tipo de trabalho que nós combatemos e que eu combato, inclusive espichar coro e virar tripa de boi, de bode e de porco. Eu vou radicalizar. Venho fazendo terapia há uns 6, 7 anos, para me libertar do preconceito, porque eu sofri a minha vida inteira. Inclusive, quando eu vejo minha colega falando com esse sotaque carregado, assim, eu me lembro de quando cheguei à Universidade de Brasília, em 1997. Eu fui concursada, tirei primeiro lugar na prova escrita e fiquei em segundo no resto porque todo mundo era mais velho do que eu pelo menos 12 anos. Mas toda vez que eu falava com alguém, principalmente com os professores, eles diziam: "Você é de onde?" "Eu sou da Paraíba." "Ah, você veio transferida, não foi?" Eu dizia: "Não, eu vim concursada". E eu levei anos tendo que responder a essa pergunta.
Então, eu vou mudar o meu lattes e vou dizer de onde eu venho, para que, quando as pessoas olharem o meu lattes, elas saibam de onde eu venho e por que hoje eu ocupo espaços como esses. Sabem por quê? Porque eu sou cria da escola pública. Eu botei o meu pé numa escola privada, durante 4 anos, no Colégio Diocesano de Patos, na Paraíba, porque eu ganhei uma bolsa para ser babá de quatro crianças que lá estudavam pagando mensalidades. Aí eu tive que sair porque a família se mudou e me levou, que é outra história que não vai dar para contar aqui, porque eu fui doada, como tantas meninas no Brasil são doadas hoje, ainda, pelas famílias, para poderem estudar. Na volta, o colégio reconheceu e me deu de volta a bolsa. Então, eu fiz 4 anos numa escola privada como bolsista, porque eu vivia nas cozinhas dos outros.
Por que estou falando assim hoje? Porque hoje eu acho que é um dia de ousadia, é um dia de radicalidades. Aí eu vou colocando pouco a pouco e tentando arrumar minha fala a partir do que já ouvimos aqui. E vou começar também provocando, porque é outra característica minha. Não se iludam, eu choro, mas eu brigo também, está certo? Eu sou chorona, mas eu sou atrevida, eu sou brigona, porque se eu não fosse, aqui eu não estaria.
Vou começar com a primeira provocação que eu já coloquei para os meus colegas, a Ludimila principalmente. Eu dizia: "Cadê os protagonistas deste evento? Nós estamos falando de participação estudantil". Então, ficamos conversando sobre a dificuldade e nem falei para a Ludimila, porque não tenho o direito de cobrar dela não. Tenho que começar cobrando dos meus pares também. Estou à frente de um sindicato — vou dar o número aqui — com 2.435 filiados.
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Depois que chegamos à direção, em junho do ano passado, nós tivemos uma assembleia com mais de 400 pessoas, porque foi a primeira delas que tratou do ataque à Unidade de Referência de Preços — URP, que este Governo, através do Ministro da Educação, tenta, a todo custo, arrancar dos professores da Universidade de Brasília. Resta no Brasil apenas este grupo com esse direito, conquistado ainda no final dos anos 80 e estendido para todos os professores e servidores da universidade.
Então, a minha primeira provocação é esta: cadê os protagonistas? Nós estamos falando de gestão democrática e participação estudantil, mas os alunos não estão aqui. Para mim, isso é uma grande tristeza, porque vimos sofrendo de um mesmo mal, que é o estado de anomia. Eu acho que Durkheim é a pessoa que traz o melhor substantivo para falar sobre a situação que nós estamos vivendo hoje — que, aliás, não é só de hoje, vem desde 2015, 2016 — e que vem se alastrando no País. Está ocorrendo a disseminação desse desânimo espiritual, afetivo, que se espraia por todas as esferas da nossa vida: pessoal, familiar, estudantil, profissional, comunitária e qualquer outra em que pudermos pensar. Então, nós vivemos um processo de anomia e de indiferença de uma parte significativa da sociedade brasileira. Isso explica, em boa medida, o fato de termos hoje, no poder, um Governo teocrático, autoritário, que tenta, por todos os meios, resgatar aquele patrimonialismo que nós pensávamos termos enterrado com a Constituição Federal de 1988.
Eu estou convencida de que estou no caminho certo quando adoto o patrimonialismo como um dos eixos fundamentais da disciplina Política Social na Universidade de Brasília. Temos que pensar as políticas públicas, mas pensá-las considerando esse resquício do patrimonialismo, do clientelismo, do coronelismo, que teima em se restabelecer, a todo custo, na política e na vida cotidiana de todos nós brasileiros e brasileiras.
A minha fala ficou completamente desorganizada, em função das outras falas aqui e também da decisão que tomei de falar de mim, de quem eu sou. Eu sou uma cria da escola pública. Eu sou e serei uma audaz defensora da educação pública, inclusive como um princípio do republicanismo.
Não há saída fora da educação pública. Eu sou a prova disso. Saí dos matadouros; saí das brocas; saí das brenhas de serra; saí da cozinha dos ricos e da classe média brasileira para aqui estar. Falo em nome, inclusive, de uma parcela muito significativa dos meus amigos e das minhas amigas de infância que não conseguiram — não por falta de competência, mas por falta de oportunidade — ter as mesmas chances que tive, embora boa parte delas tenham sido na cozinha, lambendo o penico, como dizíamos, da classe média e dos ricos no Brasil. Estou aqui para contar essa história.
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A minha decisão de mudar o meu Lattes foi por isso, porque nós precisamos hoje pensar em uma forma de redimensionar a educação pública, inclusive como um valor, aquele valor que possibilitou a emancipação dos países europeus no final do século XIX e a estruturação de uma cidadania ativa no século XX — isso foi muito bem analisado pelo Marshall, no seu livro Cidadania, classe social e status. A educação, e somente a educação, é que pode romper uma perspectiva de status quo que nós temos no Brasil e que teima em se reproduzir, insistindo na ideia de que a senzala, a cozinha e o terreiro são os lugares dos pobres, dos pretos, dos periféricos e das mulheres. Eu estou aqui para dizer que não, nós não podemos aceitar isso.
Por isso, eu provoquei a Ludimila e provoco os nossos caros estudantes e a Denise também em relação ao protagonismo, que não deve ser somente juvenil. Nós temos que trabalhá-lo na escola, e eu acho que a escola pública é o locus privilegiado para trabalharmos também o protagonismo infantojuvenil. Na escola privada, colegas, eu sei que isso não é possível.
Eu tenho um filho que hoje tem 13 anos e foi também aluno da rede privada. Eu vou fazer como o colega Deputado fez, vou falar da minha vida pessoal também, para descontrair um pouco. O meu filho, quando tinha por volta de 6, 7 anos de idade, começou com uma história de não querer cortar o cabelo. Como eu sempre tive a perspectiva de educá-lo com diálogo, eu fiquei em um dilema: "O cabelo é dele. E aí?" Aí o cabelo começou a crescer, e começou a vir a seguinte história da escola: "Ah, ele é gay. O Michael é gay. O Michael é bichinha. O Michael parece com uma menina". Então, eu fui chamada para ir à escola — escutem bem — explicar que o meu filho não era gay. Vocês podem ter ideia de qual foi a minha resposta. Eu falei: "Não. Eu não vou explicar a vocês se o meu filho é ou não é gay, porque eu não sei nem ele sabe. Porém, eu vou ensinar vocês a respeitarem uma criança, um adolescente, uma pessoa, um ser humano do jeito que ele é e por ele ser o que ele é. Se vocês quiserem fazer esse debate, eu estou pronta a ser uma das pessoas a compartilhar o espaço de fala". A escola acabou não aceitando fazer essa discussão.
Naquele momento, eu já tinha ação no Conselho Tutelar da Asa Norte e, por uma outra razão, eu consegui vaga na escola pública da 407 Norte, de onde o meu filho teve o prazer de só sair para ir para a 410 Norte.
Então, eu sou cria da escola pública, da educação pública, e eu tenho como princípio o meu compromisso em defesa da educação pública, porque eu não vejo possibilidade de construirmos sujeitos críticos no âmbito da educação privada. Sujeitos teimosos e resistentes existem na educação privada também, mas a vida deles lá é muito mais árdua, muito mais dura, porque, além de combater todas as vulnerabilidades que eles têm, muitas vezes, no seio da família e da comunidade, eles têm que combater também o autoritarismo de um capitalismo que insiste em pensar que educação é mercadoria.
Aí eles têm que sacrificar também uma parte da sua vida para fazer a militância e enfrentar os coronéis modernos, que são os novos capitalistas, os donos de escolas, os donos de empreendimentos sobretudo na área de educação.
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Eu queria dizer que, se nós vivêssemos em um país onde a lei prevalecesse e fosse respeitada, até o conteúdo deste nosso encontro seria desnecessário hoje. Todo mundo já falou isso aqui, inclusive com falas maravilhosas. Eu vou citar alguns dispositivos: a Constituição Federal, que trouxe a obrigatoriedade da educação pública e da universalização do ensino, inclusive como uma obrigação, embora prospectiva, para o Estado brasileiro; a LDB; o Estatuto da Criança e do Adolescente; o Estatuto da Juventude. Todos eles garantem a participação do aluno e do jovem em geral na esfera da construção da educação. Nós temos também os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, dos quais o Brasil é signatário, e o ODS 4 traz: "Assegurar a educação inclusiva e equitativa e de qualidade e promover oportunidades de aprendizagem ao longo da vida para todos", o que inclui também a vida universitária.
Então, o dilema que nós temos hoje é: como vamos sair desse estado de anomia? Já passou da hora, gente! Já passou da hora! Nós temos um Ministro que insulta os jovens nas redes sociais. Nós temos um Ministro que nos insulta diariamente também nas redes sociais e que nos assedia moralmente. O que está faltando? Nós temos que assistir ao que ocorre no Chile, na Bolívia e no resto dos países para uma hora dizer: "Ei, vamos acordar. Nós somos o Brasil". Nós temos que aqui pactuar uma coisa: temos que partir para a ação. Já chegou a hora!
Caro colega gestor do MEC, desculpe-me, mas fale para o seu Ministro, que não é meu, o seguinte: a professora disse que já basta. Basta de assédio moral; basta de ataque aos direitos sociais, sobretudo à educação pública; basta de desconstruir, no imaginário social brasileiro, o valor da educação como um valor estruturante de uma sociedade que se quer digna, justa e igualitária; e basta de fazermos piadas com nossos jovens, com nossas crianças e adolescentes.
Então, vamos agora entrar numa segunda fase. Vamos partir agora para a contestação dessa ordem que aqui está, desse Governo teocrático, autoritário, que desconhece a educação como política pública estruturante e estruturadora de um Estado moderno, ou de um país, ou de uma nação. Vamos partir para a desconstrução dessa vertente neoconservadora, neoliberal e ultradireitista que quer esvaziar a educação pública.
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Não se iludam, eles perceberam. Eu vou dar o exemplo de uma colega minha, professora da Universidade de Brasília. Um dia eu conversava com ela sobre um Projeto de Extensão de Ação Contínua — PEAC que leva para as escolas públicas das periferias do DF a discussão sobre a Lei nº 12.711, de 2012, que estabelece as cotas de 50% de vagas para alunos oriundos da rede pública, e sobre o Plano Nacional de Assistência Estudantil — PNAES. Sabem o que a minha colega disse para mim? "Ailta, eu estou tão apreensiva. Estou com medo". Eu perguntei: "Você está com medo de quê?" Ela disse: "Ailta, estão tirando as vagas dos nossos. Você não percebeu isso ainda?" Então, eu disse: "Eu não só percebi como estou trabalhando para isso". E ela disse: "Eu não entendo você. Você não quer que o seu filho faça universidade pública?" Eu disse: "Eu quero. Eu quero muito que ele faça. Mas, primeiro, a escolha não é minha, é dele. Segundo, se ele fizer, eu ficarei mais feliz se ele frequentar uma universidade pública cheia de pretos, cheia de filhos de domésticas, cheia de filhos de porteiros" — e eu tenho hoje, no meu departamento, colegas que são filhas de porteiros de prédio — "cheia de pessoas obesas, cheia de pessoas gays, cheia de pessoas diferentes e que não pensem nem falem como ele, porque acho que assim ele vai aprender muito mais". Aí ela disse: "Então, vamos ter que pensar numa alternativa. Eu vou pôr os meus na escola pública". Essa foi a solução que ela achou. Mas não se iludam. Colocar os filhos na escola pública significava um contraturno na escola privada.
O nosso desafio hoje é sairmos daqui com a esperança de ter esperança e de pensar que a escola pública, que a educação pública e que o compromisso da educadora e do educador público estão sendo postos, para que rompamos com essa lógica da subalternidade, que perpassa a nossa vida cotidianamente, sobretudo quando se é pobre, quando se é mulher, quando se vem da periferia, quando se vem do Nordeste, quando se vem do sertão. Estou aqui para me desafiar também, a fim de que pensemos em buscar forças cotidianas inclusive para participarmos desse processo.
O desafio que eu lançava para os colegas é lançado para nós cotidianamente, porque as pessoas não querem participar. Elas querem ficar lendo WhatsApp e encaminhando mensagens. Então, é preciso redescobrirmos e recriarmos aqui formas de participação que permitam o protagonismo não só da criança e do adolescente, mas também nosso, como sujeitos, como cidadãos, como educadores e educadoras, como trabalhadores da educação.
A SRA. PRESIDENTE (Professora Rosa Neide. PT - MT) - Quero agradecer à Profa. Ailta e falar da importância da história de vida. Eu vejo, professora, que são os nossos exemplos, é a nossa história de vida que desafia tantos outros a ter mais coragem também.
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A SRA. AILTA BARROS DE SOUZA - É essa ousadia que incita o ódio que está hoje colocado e que polariza a sociedade brasileira, porque a elite e as oligarquias brasileiras não suportam a ideia de ver preto, pobre, índio, periférico e pessoas como nós, inclusive mulheres com sotaque, falando e ocupando lugares que historicamente foram restritos ao branco, à elite e ao colarinho branco. É esse ódio que é disseminado quando eles veem pessoa como nós falando.
A SRA. PRESIDENTE (Professora Rosa Neide. PT - MT) - É por isso que temos que nadar mais, ser mais exemplo e fazer com que mais pessoas cheguem ao outro lado da margem e ocupem espaço.
Aqui nós temos Denise, Marcelo e Ludimila, que com certeza, nos seus agrupamentos, incentivam tantos outros a chegarem mais longe. O exemplo arrasta.
Eu acho que, ao mudar o Lattes, poderíamos colocar, quem sabe, naquele primeiro quadradinho, um pouco da nossa história de vida — poderíamos ir teimando em fazer isso. Isso vai fazer com que muita gente que virou tripa fale assim: "Dá para eu ir também".
O SR. PROFESSOR ISRAEL BATISTA (PV - DF) - Deputada Professora Rosa Neide, é muito bom participar deste debate.
Quero cumprimentar a todos dizendo que nós vamos apresentar um relatório sobre o PNE já no início do mês que vem. Nós temos um guia que foi pactuado com a sociedade brasileira, que é o Plano Nacional de Educação. Precisamos nos firmar nesses documentos para que tenhamos políticas públicas de educação que tenham começo, meio e fim, que tenham uma lógica. O que o Brasil quer?
Preocupa-me a possibilidade de talvez não concordarmos ou o Governo não concordar com todas as 20 metas do PNE e querer fazer alguma alteração. Isso pode até ser natural. É natural que as pessoas discordem e queiram fazer alterações. O que não podemos permitir é que um projeto que foi pactuado e votado no Congresso Nacional seja simplesmente descartado, sem que se apresente uma contraproposta que também seja pactuada, rediscutida. Temos que rediscutir tudo.
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Entre os fatores essenciais para uma boa prestação de serviço de educação, o fator mais importante é o professor. É um bom professor que consegue fazer com que, em 1 ano, o aluno aprenda o que ele deveria aprender em 1 ano e meio. É um mau professor que faz com que o aluno absorva apenas 40% do conteúdo que ele deveria entender e das competências que ele deveria adquirir naquele ano letivo. De todos os fatores que vão permitir uma boa educação, o professor é o fator essencial — é mais essencial do que a infraestrutura escolar. Olhem que interessante!
Então, a Meta 17 precisa ser observada com muita atenção. Por quê? No ano passado, nós levamos um susto com a avaliação da Varkey Foundation, que colocou o Brasil em último lugar do mundo em prestígio social da carreira docente.
Nessa Meta 17, eu quero pontuar algumas questões. A primeira é que a valorização do professor se dá pela busca da equiparação salarial dos docentes com outras carreiras de nível superior. Sem querer fazer comparações — eu acho que nós não estamos aqui para prejudicar ninguém —, quem trabalha nas carreiras jurídicas atinge o ápice da carreira em 10 anos; enquanto o professor federal, que é o primo rico entre os professores, leva 25 anos para atingir o ápice. Algumas carreiras têm 75% dos seus servidores no pico. A carreira do professor federal tem 2,8% dos profissionais no pico. Imaginem, nos Municípios e nos Estados, qual é a situação que nós vivemos! Imaginem!
Então, nós precisamos, para atingir a Meta 17, da valorização do docente. Nós temos que tirar a valorização do professor do discurso e colocá-la no orçamento, na prática.
Outra coisa importante — eu tenho feito o alerta, e a Deputada Professora Rosa Neide tem acompanhado isso — é o papel litúrgico dos governantes ao se pronunciarem. Eu falei para o Ministro Weintraub que a postura dele é uma postura que gera comportamento social e que os líderes devem se pronunciar com moderação, com cautela e com sisudez. Ele é o Ministro da Educação. Tem que ser com sisudez! Há uma liturgia do cargo. Ele é o professor dos professores, pela letra da lei, pela regra. Ele é o Ministro da Educação.
Todas as vezes em que nos pronunciamos sobre professores de maneira inadequada... Aconteceu isso recentemente com um grande jornalista de Brasília, que falou dos professores de Brasília de uma forma muito inadequada. Eu tive que ir à tribuna e dizer: "Não faça isso! Depois, quem vai estar na sala de aula com 45 alunos sou eu! Eu vou estar lá!" Estudante não faz o que você fala; estudante faz o que você faz — ele imita. A criança e o adolescente imitam.
Então, eu fico falando: "A educação é importante. A educação é importante. O professor tem que ser respeitado". De repente, se alguém se pronuncia dessa forma sobre os docentes, é lógico que nós não vamos ter o respeito dos estudantes. Não é à toa que o Brasil é o primeiro do mundo em indisciplina escolar. Nós temos que reconhecer isto.
O Brasil é o primeiro do mundo em agressão contra professores. Por quê? Quando um governador permite que a polícia parta para cima de professores em manifestações, quando um presidente se pronuncia tachando professores dessa ou daquela forma, isso cala fundo no comportamento social. Isso nós não podemos permitir.
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Eu também queria fazer uma colocação sobre a Meta 18, Deputada Professora Rosa Neide. Precisamos ficar atentos à Meta 18, que trata do plano de carreira dos docentes.
Nós temos um problema grave, porque 33% dos Estados não têm plano de carreira nem piso salarial. Nos Municípios, a situação é ainda muito pior: 30% dos Municípios não cumprem o piso salarial e, pior, 22% não têm informações a prestar. Essa é a situação que nós estamos vivendo! Nós precisamos ter seriedade, porque temos um plano que precisa ser cumprido até 2024. Muitas metas que tinham que ter sido cumpridas em 2016, Deputada Professora Rosa Neide, não foram cumpridas.
A Meta 19, sobre a qual trata esta audiência, é sobre a gestão democrática. Nós temos 74% dos Municípios brasileiros nomeando diretores por indicações políticas. Isso traz efeitos nefastos para a escola, que precisa da participação da comunidade escolar.
Eu tive a oportunidade, como Deputado Distrital, de fazer parte da relatoria da Lei de Gestão Democrática no meu primeiro mandato. Essa foi uma das melhores experiências que eu tive. V.Exas. não têm noção de como a eleição de um diretor que cumpre critérios técnicos para poder se candidatar faz diferença nas escolas. O diretor é um líder. Ele precisa ter reconhecimento da comunidade escolar. Não adianta um diretor imposto chegar dizendo que vai organizar a escola se ele não goza de legitimidade entre seus pares, entre os pais de alunos e entre os alunos. Por isso, tem que haver a gestão democrática.
A gestão democrática mede dois elementos centrais: a capacitação técnica — os diretores têm que ter capacitação técnica — e a legitimidade perante a comunidade escolar. A escola é uma comunidade. A escola não é um órgão público qualquer, é uma comunidade. Há relacionamentos ali.
Nós precisamos ser objetivos, porque fizemos um documento chamando Plano Nacional de Educação e temos como mensurar as metas. E eu gosto de mensurar, de medir, de saber se estamos alcançando as metas. Discussões sem parâmetros torram o dinheiro público e, assim, não conseguimos chegar a lugar nenhum.
Nós temos um plano, Deputada Professora Rosa Neide. Se quisermos discutir o plano, tudo bem. Mas vamos discuti-lo, vamos repactuá-lo. Enquanto nós tivermos um plano... É como um plano de voo. Já imaginou se um avião decola sem um plano de voo? O avião cai. Na educação, é muito perigoso não seguir o plano de voo, porque nós só percebemos o erro da rota muito depois, quando já não dá mais para tomar nenhuma atitude, quando você já perdeu uma ou duas gerações. Isso é muito ruim.
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Tenho certeza de que, se conseguirmos implementar a gestão democrática nesses Municípios, vamos melhorar a participação da família na escola de maneira muito significativa e melhorar o ambiente de trabalho.
É muito bom quando um diretor chega e as pessoas o reconhecem imediatamente, porque tem liderança, consegue conversar com todo o mundo, entende cada tipo de professor e sabe gerenciar esse RH e essa parte técnica.
A SRA. PRESIDENTE (Professora Rosa Neide. PT - MT) - Agradeço ao Deputado Professor Israel Batista a participação nesta reunião e também o trabalho na Comissão de Educação.
Quero dizer, a partir da fala do Deputado, que realmente, em razão de pronunciamentos públicos, a população civil fica induzida a fazer algumas coisas. Um exemplo muito recente foi a criação do Dia do Fogo no Brasil. O candidato a Presidente da República disse que iria acabar com o IBAMA, que iria liberar totalmente, porque não havia problemas em relação ao clima no mundo. Ele ganhou a eleição, continuou na mesma balada e quase colocamos fogo no País inteiro.
Então, a fala da autoridade — e o Presidente eleito é a autoridade máxima do País —, a partir do momento em que faz pronunciamentos públicos, induz a população.
Embora já tenha sido comentado pelos que já se pronunciaram aqui em relação ao Ministro da Educação, eu, que sou professora e estou desde os 17 anos em sala de aula, quero dizer que fico assustada cada vez que o Ministro abre a boca publicamente, com medo da palavra seguinte, porque sei que é o exemplo que arrasta. E o exemplo que o Ministro dá publicamente em relação aos gestores da educação, aos professores e aos próprios estudantes é altamente perigoso, em razão das reações que a sociedade em cadeia vai tendo em função do pronunciamento da autoridade máxima.
Acho que a nossa conversa, Deputado Israel, na Comissão de Educação, deve ser muito forte nesse sentido. Por isso, agradeço muito a V.Exa. pelo apoio nas ações que fazemos juntos aqui. Muito obrigada.
Neste momento, eu gostaria de passar a palavra ao Prof. José Ribeiro Junior, que representa a Secretaria de Educação Básica do MEC.
Antecipadamente, professor, quero dizer que ficamos muito felizes quando nos foi confirmada a sua presença, até porque já participei muitas vezes de governos estranhos ao que penso e sei que, por dentro do sistema, às vezes conseguimos fazer ou manter algumas coisas.
Quero agradecer à Deputada Professora Rosa Neide por nos convidar para um debate sobre tão importante tema.
Quero parabenizar a Denise Soares e a Ludimila Brasil, que são da União Nacional dos Estudantes — UNE; a Ailta Barros de Souza, com seu belo exemplo,
representante da Associação dos Docentes da UnB; a Luciana Custódio, aqui representando o Sindicato dos Professores — SINPRO e a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação — CNTE; o Prof. Erasto Fortes, que me faz lembrar o Prof. Genuíno Bordignon, um grande inspirador nosso, e a saudosa Regina Vinhaes, que tanto nos ajudou nessa caminhada; e o Marcelo Acácio, da União Brasileira dos Estudantes Secundaristas — UBES.
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Quero agradecer também a presença do Deputado Professor Israel Batista e do nosso companheiro de Ministério que hoje trabalha nesta Casa.
Aproveito para mandar um forte abraço a toda a equipe do Ministério da Educação, que cotidianamente se debruça em milhões de afazeres para tentar, na medida do possível, melhorar a qualidade da educação deste País. São muitos os colaboradores. Para a minha equipe lá, um grande abraço.
Eu gostaria de começar, Deputada Professora Rosa Neide — posso chamá-la de professora? —, dizendo exatamente de onde eu vim. Acho interessante nos colocarmos em relação a isso. É muito bom saber desses grandes exemplos, porque começamos a repensar. É difícil fazer essas contas, mas lá se vão 34 anos dentro do Ministério da Educação. Entrei por concurso público no Ministério da Educação e sou funcionário de carreira há 34 anos. Nem sei se a Ludimila era nascida quando lá entrei. Espero que alguém diga assim: "Poxa! Nem parece!" (Risos.)
(Segue-se exibição de imagens.)
Eu queria fazer uma retrospectiva, porque gestão democrática é um tema que, particularmente, me agrada muito. Este tema já fez com que, em outros anos, enchêssemos esta Casa com mais de 400 pessoas do País inteiro para discutir um projeto de lei encaminhado especificamente para alterar a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional — LDB e aprimorar o seu art.14. Foi um lindo exemplo o que aconteceu aqui. Estava sendo realizado um encontro nacional, quando conseguimos fechar essas duas agendas, fizemos uma audiência pública e trouxemos os representantes que estavam participando daquele congresso. Participaram do evento mais de 400 pessoas, técnicos de Secretarias de Educação do País inteiro. Isso ocorreu há 7 anos, mais ou menos, e foi um momento histórico na minha vida.
Como estamos falando em gestão democrática, acho fundamental resgatarmos alguns princípios legais. Não há como evitar isso.
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Não tenham dúvida nenhuma de que cada letra colocada aí teve muito suor por trás, muita luta — o Prof. Erasto deve ter acompanhado isso de perto —, para garantirmos esse direito na legislação.
No art. 206, temos a garantia da gestão democrática do ensino público, na forma da lei. Devemos ressaltar que, na Constituição, está expressa a menção ao ensino público — dura lex, sed lex. Podemos pensar em rever isso, mas hoje está escrito assim.
Podemos, depois, caminhar pela LDB. E acho muito interessante verificar que já estabelecemos isso como princípio da gestão democrática do ensino.
Então, novamente, devo citar que está garantida em nossa Lei de Diretrizes e Bases da Educação a participação dos profissionais da educação na elaboração do projeto pedagógico da escola, que é algo muito importante. Precisamos garantir e ampliar essa participação; afinal, o projeto político-pedagógico é a vida da própria escola, é o que organiza a escola. A participação de todos nesse projeto é fundamental, assim como torná-lo algo vivo, até porque, se ele for engavetado, não dará grandes resultados.
O inciso II do art. 14 da LDB, com o qual trabalhamos há bastante tempo no Ministério, prevê participação das comunidades escolar e local em conselhos escolares ou equivalentes. O Prof. Genuíno Bordignon sempre cita que órgãos equivalentes não existem, porque o conselho escolar é o órgão que agrega representantes de pais, professores, estudantes e funcionários. Esse conselho tem o diretor como membro nato. Então, não há algo que seja equivalente ao conselho, que é algo tão grandioso.
Para tratar do nosso Plano Nacional de Educação, eu sempre gosto de trazer o texto do Plano Nacional de Educação anterior, porque estamos falando de 2001, quando já tínhamos como objetivo e meta implantar conselhos escolares, esses órgãos da estrutura da escola que favorecem muito a gestão democrática. Portanto, nos idos de 2000, já tínhamos como objetivo e meta implantar conselhos escolares na educação infantil, assim como promover a participação da comunidade na gestão das escolas, universalizando em 2 anos a instituição de conselhos escolares no ensino fundamental e também no ensino médio.
Vejam que, para o ensino fundamental, foi concedido um prazo à época. Então, até 2003, todas as escolas deste País deveriam ter implantado seu conselho escolar. Mas sabemos que essa realidade, infelizmente, não ocorreu como gostaríamos.
Em nosso novo Plano Nacional de Educação, na Meta 19, como bem colocou o Deputado Israel, temos a questão da gestão democrática. Temos também duas estratégias que acho extremamente importantes.
19.4) estimular, em todas as redes de educação básica, a constituição e o fortalecimento de grêmios estudantis e associações de pais, assegurando-se-lhes, inclusive, espaços adequados e condições de funcionamento nas escolas e fomentando a sua articulação orgânica com os conselhos escolares (...)"
Acho isso de extrema importância. Em vez de cada um de nós ficar de um lado, podemos trabalhar juntos, por meio de um colegiado, e potencializar esforços.
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Temos ainda uma legislação dos idos de 1985, a Lei nº 7.398, que fala sobre grêmio estudantil. Vemos que há até algumas complicações na redação dessa lei. Ela se refere aos estudantes dos estabelecimentos de 1º e 2º graus, que era a nomenclatura da época.
Art. 1º Aos estudantes dos estabelecimentos de ensino de 1º e 2º graus fica assegurada a organização de Estudantes como entidades autônomas representativas dos interesses dos estudantes secundaristas (...).
Na minha simples análise, quando a lei fala do ensino do 1º grau e dos estudantes secundaristas, ocorre um problema de redação. Acho que podemos pensar em melhorar isso muito.
Mas, quando falamos de todo esse arcabouço legal, que é de extrema importância, principalmente quando estamos falando nesta Casa, que é responsável por criar toda essa legislação, precisamos entender que isso não pode ser letra morta. Não é verdade?
E, para que toda essa legislação possa se converter efetivamente em gestão democrática, precisamos de ações, mas não só ações do Governo Federal. Precisamos de ações dos sistemas municipais de ensino também.
E aqui, Deputado, eu gostaria muito de fazer uma ressalva. Senti muita falta aqui da representação da UNDIME — União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação, para que ela pudesse compartilhar conosco este momento tão rico.
Ações do Governo Federal são importantes, sim, porque ele é responsável pela Política Nacional de Educação Básica, assim como pelas ações dos sistemas estaduais.
Registro também a falta do CONSED — Conselho Nacional de Secretários Estaduais de Educação, representando todos os Secretários Estaduais de Educação. CONSED e UNDIME são os detentores, na verdade, de todas as redes de ensino, porque o Governo Federal atua muito mais na educação superior. Com relação à educação básica, o Governo Federal é responsável pela política nacional.
Além disso, temos que sempre aprimorar a legislação, o material didático e a formação. E aí eu queria dar um histórico para vocês, um pouquinho, sobre essa questão da formação, na qual o Ministério pôde mais trabalhar durante esses anos. Promovemos cursos de formação, encontros de formação, oficinas de formação, tanto presenciais, quanto à distância — porque, num país de dimensões continentais como o Brasil, não podemos abrir mão dessa ferramenta da educação à distância. E temos feito uma discussão muito forte no âmbito do Ministério, porque precisamos ter muito claro que vamos ter educação boa e ruim presencial e boa e ruim à distância. E o que temos que fazer mesmo é lutar por uma educação boa, seja presencial, seja à distância.
Então trabalhamos muito na formação de Secretários Municipais de Educação — nesse processo, a gestão democrática estava no conteúdo desses cursos —, nos Conselhos Municipais de Educação, de técnicos das Secretarias de Educação; de cursos para coordenadores pedagógicos, diretores escolares... Tivemos várias ações de formação, inclusive com cursos de especialização, financiados pelo Ministério da Educação.
Mais especificamente com relação ao conselho escolar, nós tivemos não só cursos para os técnicos das Secretarias, para que eles se apropriassem do que é o conselho escolar, a fim de que isso pudesse subsidiar o trabalho deles na implantação desses órgãos colegiados nas escolas, como também cursos para os conselheiros escolares.
Chegamos a formar mais de 85 mil conselheiros escolares, distribuídos pelo País inteiro, numa grande rede que constituímos. Aproveito também para mandar um grande abraço para todas essas pessoas dos Estados e dos Municípios, das Secretarias de Educação, que, com todos os problemas, se debruçam cotidianamente para tentar melhorar a educação deste País.
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Só para esclarecer, quando estamos falando em conselho escolar no âmbito do Ministério da Educação, estamos falando desse órgão colegiado na estrutura da escola, que tem competência deliberativa, consultiva, fiscalizadora, mobilizadora, pedagógica, que, por vezes, pode ter o nome de conselho deliberativo, como o Deputado de Santa Catarina colocou, pode ter outros nomes — afinal, vivemos num país de dimensões continentais. Mas o que sempre se cobra é que um conselho escolar, para que seja efetivo, precisa ter legitimidade e, para ter legitimidade, ele precisa de representantes. E aí eu coloco essa palavra em caixa alta, porque não estou falando de simplesmente selecionar alguma pessoa, mas estou falando de representantes de todos os segmentos dentro da escola: pais e professores — o diretor é membro nato. E os demais professores têm que ter representante. Ele deve ter essas competências, além de participar da gestão administrativa, pedagógica e financeira, especialmente como cogestor da escola.
Temos vários exemplos — costumo mencionar — de um poder que o conselho escolar pode promover dentro da escola. O Ministério me deu a oportunidade de visitar um pouco este País e conhecer muitas realidades, conhecer de perto conselhos que efetivamente conseguiram mudar a vida da escola. Acho isso extremamente importante. Temos hoje relatos de diretores. Uma diretora no Piauí chegou a nos dizer: "Hoje eu não sei gerenciar uma escola sem conselho escolar". Disse isso porque é com o conselho escolar que vamos dividir o ônus e o bônus, é com quem vamos decidir, com o parco recurso que temos, se vamos, por exemplo, consertar a porta ou a janela. Sendo a porta ou a janela, sempre haverá quem era a favor da porta e quem era a favor da janela. E, quando discutimos isso no âmbito de um colegiado, democratizamos essa decisão. Sabemos que, se o recurso é pouco, não vai dar para tudo, e temos que priorizar. E aí o conselho escolar é o órgão que democratiza essas escolhas também.
Aí eu trouxe alguns dados que, a meu ver, têm sido muito significativos. O Ministério, desde o ano de 2004, vem investindo nessa política de formação dos conselhos escolares. Em 2017, com base nos dados do INEP e do Prova Brasil — e estamos esperando os resultados do Censo Escolar também, que vai sair agora no final do ano —, conseguimos colocar uma questão que considero de extrema importância para a gestão democrática: este ano, o Censo Escolar vai nos responder quantas escolas têm conselho escolar, quantas escolas têm associação de pais, quantas escolas têm grêmios estudantis. Acho que essa informação vai servir para nossas pesquisas e mais: para nossas ações e para a política pública.
Penso que todo esse trabalho que vimos fazendo este ano repercutiu nesses dados que apresentamos hoje. Entre as escolas que participaram do SAEB (Sistema de Avaliação da Educação Básica) — somente no último dado —, não existe conselho escolar em 7,8% das escolas.
Vamos confirmar esse dado com o censo. Não são todas as escolas que participam do Prova Brasil, mas dessas escolas, que são uma grande maioria, podemos inferir que 98,2% já possuem esse órgão colegiado. Então é muito importante que contemos com a participação de todos, especialmente dos estudantes, para efetivar essa gestão democrática, que já existe e que já tem um instrumento importante no âmbito da escola.
Só para não me alongar muito, eu queria chamar a atenção dos senhores para o segundo dado de baixo para cima. Sempre primamos por um conselho que não fosse somente com diretor e professores, mas que ele tivesse o professor, o diretor — que, por ser membro nato, não consta aí —, o representante do professor, o representante do funcionário, dos alunos e dos pais ou responsáveis. E veja bem: temos 61,8% dessas escolas que já têm esse tipo de representação. Então estamos falando de um órgão colegiado com um potencial enorme.
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Há um outro dado para o qual eu também gostaria de chamar atenção, que é o de 22,7%, que são de professores, funcionários e pais. Eu queria destacar o seguinte: ainda não conseguimos cruzar esses dados, mas provavelmente essas são representações de educação pré-escolar, na qual não faz sentido ainda a participação no conselho, o que não impede, e sabemos disso, de ouvir todos esses alunos, todos esses estudantes. Osasco tem um grande trabalho com isso.
Outra coisa que nos chamou a atenção nos dados do SAEB é que 59,94% desses conselhos já se reúnem 3 vezes ou mais. Se um conselho se reúne 1 vez por ano, sabemos que isso não está sendo efetivo. Mas, se eles estão se reunindo 3 vezes ou mais — a maioria deles —, já vemos uma sinalização positiva e um retorno desse trabalho nesses anos todos.
E aí o que estamos planejando para 2019? Vou reduzir isso ao âmbito da nossa coordenação, mas eu quero registrar que, no âmbito da Secretaria de Educação Básica, o Prof. Janio, que é o Secretário de Educação — e aí eu tenho uma tranquilidade enorme para falar disso, até porque, como eu disse, sou funcionário do Ministério da Educação há anos —, tem dado uma importância muito grande ao Plano Nacional de Educação. Nós somos cobrados por ações que estão no Plano Nacional de Educação e indagados sobre que projetos vamos fazer para cumprir isso.
Um dos projetos que vimos pensando — para dar continuidade até a essa formação dos conselheiros, dos Secretários Municipais, de todo aquele público-alvo que apresentei — é a construção de uma plataforma de formação continuada, que deve ser lançada agora em janeiro, que vai ser composta por materiais formativos, que vai estar aberta para o País, quer dizer, para o mundo inteiro. O diferencial dessa plataforma é que, em vez de ela ter vários cursos, a nossa ideia é que ela tenha vários materiais didáticos, pedagógicos, vários materiais instrucionais.
Eu costumo apresentar aquelas bolinhas ali porque acho que representam bem. E aí, de todo esse material que vai ficar disponível, vamos poder criar uma trilha formativa, como é o caso aqui embaixo. Vou dizer que o cursista, o aprendente vai ter que fazer primeiro o módulo A, depois o módulo B, depois o C, o D e o E.
Ao terminar isso, ele concluiu uma trilha formativa, que tem toda uma intencionalidade pedagógica por trás dela, para receber um certificado.
Mas não vamos impedi-lo de fazer, como havia normalmente nos cursos, em que ou você entrava para fazer o curso ou você não entrava. Então, a grande sacada dessa plataforma é que, por outro lado, podemos traçar um percurso formativo. O que queremos dizer com isso? Que todos aqueles materiais, todos aqueles módulos estarão disponíveis para qualquer pessoa. A Ludimila, por exemplo, pode entrar lá e não querer fazer o curso inteiro sobre o PDDE — Programa Dinheiro Direto na Escola. Ela quer fazer só o Módulo Prestação de Contas, que é o módulo D. Ela vai lá e assiste ao Módulo Prestação de Contas, que é o que mais interessa para ela nesse momento. Ela pode assistir ao A, ao H, e aí ela vai receber declarações sobre esse percurso formativo que ela mesma elaborou. Então, vamos ter liberdade e, com isso, flexibilidade para incluir ou para tirar materiais dentro da plataforma.
Já estou concluindo, Deputada.
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Outro ponto ao qual estamos destinando bastante esforços é a definição de uma matriz de competências e habilidades de diretores escolares. Estamos fazendo uma discussão, inclusive, sobre questões legais, as habilidades e as competências que um diretor escolar tem que ter para atender todas as questões legais que já estão postas. Começamos esse estudo agora, e a nossa ideia é que ele subsidie, inclusive, o processo de seleção de diretores posteriormente.
Outro projeto que vimos trabalhando é o que recebeu o nome de Mentoria e Cooperação em Gestão Escolar. Os dados do SAEB nos disseram que 93% dos diretores já trocam experiências entre si. A partir disso, estamos querendo propor a estruturação de um projeto de mentoria para que essa troca, em vez de ser informal, seja estruturada e, com isso, potencialize essa grande parceria entre os diretores, ou seja, um diretor que tenha alguma experiência pode ser mentor de outros diretores, e uma escola que tenha boa experiência pode ser mentora de outra escola também.
Como disse, a partir da matriz, vamos ter a identificação de quais competências e habilidades um diretor de escola deve ter e aí pretendemos, com base na meta 19, criar especificamente uma trilha para candidatos a diretores, para que esses candidatos a diretores possam fazer essa trilha voluntariamente, e eles receberão uma nota. Nós pretendemos estimular Estados e Municípios para que utilizem essas notas como um dos critérios de seleção dos diretores. Por quê? Como bem disse o Deputado Israel, hoje, infelizmente — não mais 74%, como ele colocou —, 70% dos diretores dos nossos Municípios são somente nomeados por indicação, e temos evidências de que esse não é o melhor método. Acreditamos que um processo de seleção seja muito mais salutar.
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A SRA. PRESIDENTE (Professora Rosa Neide. PT - MT) - Agradeço ao Prof. José Ribeiro Junior pela contribuição.
O SR. MARCELO ACÁCIO - Sra. Presidente, eu quero fazer uma indagação e também algumas considerações.
Compreendo que este debate é muito importante e precisa ser repetido, para que possa haver maior participação dos estudantes. Às vezes, somos questionados: "Cadê os estudantes?" E, automaticamente, já vem a resposta de que eles estão na sala de aula, estão nos espaços de discussão, estão trabalhando — porque estudantes também trabalham — ou estão no espaço de formação, que é a sociedade, cujo principal fator é a participação deles dentro da escola. Mas, além disso, uma garantia que temos hoje é a lei do voto aos 16 anos, que eu não citei, através da qual, pela nossa participação, podemos dizer quem vamos eleger e qual projeto queremos.
Quero dizer que a escola é um espaço de formação social e o que acontece dentro dela também acontece fora dela. E é importante que esse espaço seja gesticulado para além da Câmara dos Deputados, para além das escolas públicas e privadas, para além das universidades.
Quando foi apresentado o eslaide, veio-me uma questão da representação, do acompanhamento desse processo. Para mim, esse é um processo duvidoso porque, hoje, são indicados alguns estudantes e porque, dentro das escolas, muitas vezes não é discutido um projeto de gestão democrática. Esse processo só acontece no período de eleição de diretores, o que, automaticamente, já vem acompanhada da eleição de representantes do conselho escolar. E, ao andar dos 4 anos de gestão, não só os estudantes, mas também as pessoas que foram eleitas — como professores e presidentes ou responsáveis pelo conselho — não têm um acompanhamento diário, que também não é feito pelo Estado, o qual não apresenta uma formação sobre o projeto. Hoje, no Distrito federal, por exemplo, quando há discussão das eleições na gestão democrática, apresenta-se um curso rápido, de 2 duas semanas, sobre algo que não prevalece cotidianamente.
Sobre esses dados, quantas escolas que têm representantes eleitos contam efetivamente com sua presença cordial toda semana, todo mês ou, se não, semestralmente?
Há também as competências. Não queremos que sejam criados, por exemplo, critérios para se eleger um diretor, até porque a competência principal para ser diretor é ser professor de chão, de sala de aula. Isso, para nós, é o diferencial. Não adianta a pessoa ter uma indicação da Secretaria de Educação sem ter passado pela discussão dos estudantes e da comunidade escolar. Nós não achamos que é necessário esse gesto. Basta simplesmente fortalecer o mecanismo de eleição democrática, fortalecer a participação e a formação dos professores que estão cotados como candidatos.
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É um desafio construir uma gestão. Você sai de uma sala de aula com 40 estudantes e, se multiplicarmos esse número por 10, vai simplesmente gerir uma escola com 1.500 ou 2.000 estudantes. Eu acho que, para você construir uma gestão disso, você precisa ter planejamento estratégico. E isso não vem através de critérios sobre como vai se dar a educação e, mais ainda, como deve ser esse professor que se candidata a diretor, porque vai haver um processo de seleção.
Posteriormente, como poderá haver alteração dentro da gestão democrática, também poderá ser dito como devem ser os estudantes que vão ser os representantes. Hoje, dentro da gestão democrática, a Lei do Grêmio Livre garante que qualquer estudante possa ser eleito, possa reger o seu estatuto e tudo o mais.
A SRA. PRESIDENTE (Professora Rosa Neide. PT - MT) - Muito bem.
A SRA. AILTA BARROS DE SOUZA - Sra. Presidente, faço uma pergunta para o nosso colega, o Prof. José Ribeiro.
Professor, eu chamo o Decreto nº 9.812 de decreto da extinção da participação, porque ele extingue boa parte dos conselhos deliberativos da sociedade civil, inclusive o CONANDA — Conselho Nacional de Direitos da Criança e do Adolescente. Eu queria saber em que medida esse decreto também não afeta a gestão democrática no âmbito da escola — somente do ponto de vista formal, porque vi que o senhor também é muito formal como eu. Eu adoro citar leis e sempre falo para os meus alunos: "Leiam as leis, aprendam onde está o seu direito". Como o senhor citou muito a Constituição e a LDB, eu queria saber em que medida esse decreto afeta de fato a gestão democrática da escola.
Há também uma questão de ordem geral. Trago outro dado, novamente sobre a minha convicção de que temos que pactuar com toda a sociedade brasileira, a qual já pactua conosco, porque boa parte dela frequenta os bancos da escola pública. Temos que pactuar com ela para fortalecermos a ideia da educação pública como princípio estruturador de um país livre e soberano.
Como eu falei de soberania, já vou mencionar que está sendo organizada para o dia 30, se não me engano, a Marcha Nacional pela Soberania. E, para mim, educação é um elemento básico da soberania nacional. Este é mais um comentário que eu queria fazer.
Vou dar novamente um exemplo da minha vida pessoal, para mostrar como nós estamos vivendo um grande equívoco político no Brasil, quando se fala em retirar o teto, que não foi um presente da era FHC, foi uma conquista dos trabalhadores da educação. Aliás, para se instituir o piso para a educação básica no Brasil, eu me lembro muito bem como foi difícil na época.
Trago esse exemplo da minha família para dizer como esse piso transformou a escola pública no interior do Brasil. Eu tenho uma irmã e duas cunhadas que têm aquele curso de antigamente, o Pedagógico, o qual boa parte dos professores e sobretudo das professoras de educação básica também fizeram. A partir desse piso, duas das minhas cunhadas tomaram um gosto muito grande pela educação. Elas tinham o Pedagógico, mas foram frequentar aquelas faculdades que dão cursos intensivos aos sábados, e, hoje,
cada uma tem duas graduações. Sabem por quê? Elas diziam: "Não, eu fiz uma graduação porque tinha que ter o título de educadora. Essa aqui eu quero fazer pelo prazer, porque gostei. Eu adorei estudar, eu adorei fazer universidade". Então, cada uma das duas cunhadas está com duas graduações. E a minha irmã, que também tem o Pedagógico e está na educação básica, terminou duas graduações por prazer, a segunda em Pedagogia, porque ela dizia: "Eu amei estudar, amei ter conhecimento". E ela está terminando uma especialização paga do bolso dela também.
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Então, olhem o equívoco histórico em que o Brasil se meteu. Eu sempre gosto de metáforas. Nós estamos cutucando os professores com uma vara, mas existe um grupo que está querendo chutar os educadores e os trabalhadores da educação. Quando eu digo "chutar" estou falando metaforicamente: nós chutamos quando insultamos, quando colocamos um apelido em alguém, quando chamamos alguém de vagabundo, como houve uma pessoa que, nos anos 90, nos chamou, embora ele fosse o mais vagabundo de todos.
Nós também chutamos quando desqualificamos a escola. Eu vou dar o exemplo da escola pública ao lado da minha casa, onde o meu filho estudou inicialmente, na 407 Norte. Nós sabemos que a arquitetura de Brasília tem uma característica bem interessante: os prédios são construídos sobre pilotis. Por quê? Porque a ideia de Niemeyer, já inspirado na obra do Lúcio Costa, era de que, para passar pela quadra, você não precisasse circundar o prédio todo e passasse por baixo, porque é um espaço público.
Então, com relação à Escola-Classe da 407 Norte, da qual sou conselheira, já houve alguns movimentos históricos dos vizinhos nos prédios, com abaixo-assinado para retirá-la de lá. Sabem por quê? Adivinhem! É difícil, não é? Porque eles acham que aquela criança e aquele quase adolescente que lá se sentam, que lá chupam uma balinha e que lá conversam são potenciais marginais. Sabem por quê? Porque eles são filhos dos trabalhadores das cidades-satélites, boa parte dos quais passam o dia aqui no Plano Piloto, trabalhando, e voltam para casa no final do dia.
O que tem de grave essa afirmação que estou fazendo? O fato de que existe uma mentalidade que nós temos que combater não apenas em relação à universidade e ao ensino superior, mas sobretudo em relação à educação básica, à educação fundamental e ao gargalo que existe no Brasil, que é o acesso à creche. Nós temos que desconstruir essa mentalidade de que a escola pública é um lugar para pobres, para pessoas que não conseguiram ter acesso à escola privada.
Bem disse o Ministro aos premiados em uma cerimônia de premiação: "Este é o Brasil que nós queremos, é o Brasil que tem espaço para pessoas como vocês". Então, eu vou reafirmar — e estou representando aqui uma categoria docente — que nós temos que lutar para que o Brasil que nós queremos seja o Brasil da diversidade, seja o Brasil da inclusão social, seja o Brasil do pobre,
do preto, do branco, do índio, do periférico, do diferente, do deficiente, do gay, da lésbica e de todos os diferentes da sociedade. Se nós não fizermos essa construção a partir da escola, nunca chegaremos a ser um país desenvolvido, um país respeitado.
Portanto, é este o desafio que nós temos: pactuar em favor da educação pública, mas não aquela educação pública que temos, sobre a qual colocaram na cabeça que ela tem que ser pobre porque é para pobre. Queremos uma educação pública que seja realmente para todos e todas, que seja objeto de disputa inclusive pelos ricos, como está se tornando hoje a universidade pública, em função das cotas previstas na Lei nº 12.711. É este o nosso desafio.
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A SRA. PRESIDENTE (Professora Rosa Neide. PT - MT) - Eu sei que há pessoas bastante apressadas, mas vou dar mais um minutinho para cada um.
A SRA. LUCIANA CUSTÓDIO - Sra. Presidente, eu quero agradecer a oportunidade e pedir desculpas também, porque tenho uma reunião marcada para as 13 horas, no SINPRO, para discutirmos a LOA de 2020, que é um debate superimportante.
Quero dizer que estamos à disposição. Nós da CNTE sempre construímos uma frente de resistência em defesa da educação, por uma educação pública, laica e socialmente referenciada.
A Ailta falou sobre o ato do dia 30, em defesa do emprego, de direitos e soberania. E a CNTE está convocando um ato para o dia 27 de novembro, pelo FUNDEB permanente. Estamos também nessa luta em defesa do FUNDEB, cuja vigência é até dezembro do ano que vem. Depois, podemos ver, nas redes sociais, o detalhamento desses atos.
Quero convidar todo mundo, inclusive a Deputada Professora Rosa Neide, se estiver aqui em Brasília, para o lançamento do livro Paulo Freire mais do que nunca, de Walter Kohan, no dia 5 de novembro, no SINPRO. Ele está na América Latina fazendo o lançamento desse livro e já esteve aqui em Brasília. Quero fazer esse convite também às meninas da UNE, à UESDF e às entidades aqui presentes. O lançamento será no SINPRO, às 19 horas, com a presença do autor do livro, que fará uma noite de autógrafos também.
No dia 4 de novembro, nós faremos, na Chácara do Professor, que é a chácara do SINPRO, o lançamento do nosso Espaço Chico Mendes, que cai sediar um museu das obras do Chico Mendes. Vai haver um seminário do Conselho Nacional dos Seringueiros no DF, e mais de 200 ou 250 seringueiros estarão aqui. Nós faremos, lá na chácara do SINPRO, no dia 4 de novembro, a partir das 14 horas, esse seminário, com a culminância do lançamento do nosso Espaço Chico Mendes, que inclusive vai entrar para o roteiro turístico de visitas do Distrito Federal.
A SRA. PRESIDENTE (Professora Rosa Neide. PT - MT) - Muito obrigada.
Queria dizer que é uma honra ter um professor de História ocupando agora essas cadeiras, o Deputado Professor Israel Batista. Temos que ter mais professores dentro da Câmara dos Deputados, como a Deputada Professora Rosa Neide e a Deputada Professora Dorinha,
pessoas capacitadas e qualificadas para discutir sobre educação.
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Eu acho que, quanto aos membros da Comissão de Educação, a primeira profissão deveria ser de professor. Nós vemos advogado e professor, administrador e professor, médico e professor. Não, a primeira profissão deve ser de professor. E eu acho que projetos de leis como, por exemplo, o que altera a participação discente nos conselhos universitários, têm que ser debatidos entre o professor e o aluno.
Deixamos aqui a questão de que esta Casa vai ter que pegar e cuidar da gestão democrática, porque, para esse Governo que está aí, para esse Ministro que está aí, eu tenho medo do que vem a ser democrático. Aquilo que é democrático para ele soa, para nós estudantes, como autoritarismo. Ele quer mandar em nós e quer nos silenciar, mas nós não vamos nos silenciar tão cedo.
Então, eu deixo aqui um pedido a esta Casa, aos Deputados e aos professores: cuidem da gestão democrática. Nós estamos nos formando e vamos ocupar esses lugares aqui também. Mas pedimos que, até lá, cuidem bem da nossa educação, cuidem bem do nosso futuro, cuidem bem das nossas crianças.
Vemos os conselhos sendo sucateados, como, por exemplo, ocorre com o CONANDA, e queremos discutir por que estão sucateando o nosso futuro. Vocês aqui não têm muito mais o que prezar, mas estão mexendo no nosso futuro, estão mexendo na nossa ferida. E seus filhos e netos vão viver este Brasil que vocês estão destruindo.
A SRA. PRESIDENTE (Professora Rosa Neide. PT - MT) - Tem a palavra a Adércia.
É preciso que, nesta Casa, a partir dos muitos momentos de luta e dos movimentos que estão ocorrendo aqui, as entidades sérias, as entidades estudantis e sindicais deixem de ser criminalizadas e passem novamente a ser respeitadas. Nós passamos por um momento bastante significativo de desrespeito e, agora, de criminalização das entidades que discutem educação seriamente.
Este também é um momento de lembrar a esta Casa que nós temos, sim, como o Deputado Professor Israel colocou, o Plano Nacional de Educação e a lei do Sistema Nacional de Educação, que incluem a gestão democrática também. Então, é preciso que seja urgente a retomada dessa discussão pela Casa, que discutamos aqui, sim, de forma democrática e ativa, o futuro do nosso País e da sua soberania e, principalmente, o futuro das próximas gerações.
A SRA. ERIKA KOKAY (PT - DF) - E viva Mário Quintana!
A SRA. PRESIDENTE (Professora Rosa Neide. PT - MT) - Você quer falar, Ludimila?
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Quero também nos colocar à disposição para sempre fazermos essa discussão. Nós aqui, tanto no DCE da UnB, quanto na União Nacional dos Estudantes, estamos sempre abertos para fazer esse tipo de discussão, porque, para nós, tanto o papel do professor, quanto o nosso, além de brigar, é educar, porque, quando se educa, faz-se muito além do que apenas ensinar. Quando se educa, faz-se uma marca que nunca vai ser retirada.
A SRA. PRESIDENTE (Professora Rosa Neide. PT - MT) - Tem a palavra o Prof. José Roberto Ribeiro Junior.
O SR. JOSÉ ROBERTO RIBEIRO JUNIOR - Queria agradecer também e parabenizar a Deputada pela iniciativa.
Eu acho que, se estamos falando em gestão democrática, precisamos ter Mesas como esta, Mesas plurais, que tenham a participação de todo mundo, para que todas as vozes possam ser ouvidas. Isso é muito importante. Eu acho que é nesse processo que conseguimos garantir, é nesse processo que conseguimos melhorar a educação do Brasil, um desafio que eu costumo dizer que é proporcional ao tamanho deste País.
A SRA. PRESIDENTE (Professora Rosa Neide. PT - MT) - Prof. Erasto, o senhor ainda quer falar alguma coisa?
O SR. ERASTO FORTES MENDONÇA - Entendemos que esta é uma fala de agradecimento e de despedida, mas eu queria somente fazer uma consideração.
Eu acho que hoje defender a educação democrática, que se expressa de maneira muito particular na gestão das escolas, das universidades, dos sistemas e das políticas públicas, é fazer o enfrentamento ao fascismo e às suas formas de estar presente na sociedade. E, no caso da educação básica, de maneira particular, uma das maneiras mais objetivas desse fascismo se fazer presente são os projetos de militarização de nossas escolas públicas. E aqui eu me permito, pedindo licença à Deputada Erika Kokay, usar uma expressão que ouvi dela ontem, na Câmara Legislativa: "Não fazemos gestão democrática com botas nem com baionetas".
A SRA. PRESIDENTE (Professora Rosa Neide. PT - MT) - Deputada Erika Kokay, faremos como é feito no plenário: como V.Exa. foi citada, faça sua fala agora.
A SRA. ERIKA KOKAY (PT - DF) - Eu fiquei triste hoje porque eu não pude chegar antes. Nós tivemos uma sessão de homenagem aos servidores e, depois, tivemos a Ordem do Dia, e eu tive que ficar lá, para representar as nossas opiniões naquela sessão, mas eu fiz questão de passar por aqui, porque eu penso que esta discussão é fundamental.
A democracia está rompida, na verdade. Alguns falam assim: "Nossas instituições estão sobrevivendo". As nossas instituições não estão sobrevivendo, as nossas instituições estão sendo desconstruídas todos os dias. Amanhece o dia, e vemos um vazamento de uma fala do Sr. Queiroz, dizendo que tem 500 e sei lá quantos cargos na Câmara, no Senado, e que pode entrar, mas ninguém precisa saber de onde você veio, que 20 continhos caberiam bem, tal e tudo mais, e a relação que ele tem com as milícias e com o próprio clã. Nós estamos vivendo de certa forma uma monarquia. É um clã, é uma dinastia que está no Poder e não apenas o Presidente que foi eleito, a sua prole tem esse poder de determinar.
Então, nós temos um processo de rompimento democrático e temos instituições que estão sendo corroídas.
Depois que se vê o que saiu no site The Intercept sobre as relações entre o Ministério Público e o Poder Judiciário, eu não posso dizer que estão preservados os Poderes e as instituições, porque eles estão contaminados.
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Ao mesmo tempo, quando o Presidente da República num primeiro momento responsabiliza as ONGs pelas queimadas na Amazônia, e agora se chega à conclusão de que se tratou do dia do fogo, estimulado em grande medida pelos próprios discursos do Presidente da República, e ele diz que aquilo foi uma fala política, é que as instituições estão rompidas.
E o Presidente diz que, se acontecer no Brasil o que está acontecendo no Chile, que o Paulo Guedes disse que era a Suíça da América Latina... O Chile é a Suíça sem educação, sem saúde, sem previdência, sem nada disso. Agora, o Chile está querendo ser a Suíça e, por isso, está nas ruas. E o Presidente diz que vai colocar o Exército para controlar...
Eu estou dizendo tudo isso porque há um rol de absurdos. Aliás, o Ministro da Educação contribui muito para o que, se Camus estivesse vivo, seria chamado de absurdidade, porque ele diz que deveria haver Polícia Militar na Universidade de Brasília, para controlar os comunistas.
Bom, eu não sei se o Presidente entende direito o que é comunismo, porque ele chega à China e diz que entrou num mundo capitalista e, ao mesmo tempo, diz... Ocorre que tudo o que diverge dele é do comunismo. Eu acho que ele tem um lapso histórico. Ele não tem um entendimento histórico do que representa o comunismo.
Mas o Ministro da Educação disse que era preciso colocar a Polícia Militar dentro da universidade para calar os comunistas. E fala de balbúrdia, diz que desenvolvimento, diálogos, democracia em si... Democracia pressupõe pontos e contrapontos e é inteligência humana. Ela não sobrevive sem a lógica democrática.
Os avanços da humanidade se deram com o estranhamento dos conhecimentos. Foi estranhando os conhecimentos e os conteúdos que Galileu estabeleceu a primeira ferida narcísica na nossa história ao dizer que o mundo e o sol não giram em torno da Terra — ferida narcísica. Depois tivemos outras. Marx foi outra ferida narcísica ao dizer que as coisas não estavam dadas, que elas seguiam uma lógica, discorrendo sobre o que representava o capital. Freud é outra ferida narcísica: o que nós dizemos não vem de algo para além de nós mesmos, é fruto das nossas próprias experiências, dos nossos recalques, das nossas vivências não reconhecidas no campo simbólico.
Nós temos pelo menos três grandes autores de feridas narcísicas que possibilitaram o crescimento do conhecimento humano e revolucionaram o conhecimento humano. O Ministro da Educação trabalha no contraponto disso.
Então, falando de gestão democrática, primeiro, gestão democrática não é apenas eleição — essa que está inclusive em risco. Nós vamos ver o viço da nossa construção democrática no momento em que nós tivermos que resistir ao desconhecimento do resultado das eleições nas reitorias e em outros cantos. Aí nós vamos ver o viço da nossa democracia.
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A educação está sendo considerada inimiga da Nação, as universidades também. Todas as pessoas querem ver seus filhos na universidade pública pelo que elas representam. O Governo está construindo outra narrativa. Se o filho entrar na universidade, ele vai se desconstruir, vai ser moldado e vai ser um idiota útil. Na minha época diziam que éramos inocentes úteis. A ditadura militar era mais generosa conosco, porque dizia que éramos inocentes úteis a serviço do comunismo, de Cuba, do maoismo, da União Soviética, que existia à época, e hoje o Governo diz que os estudantes são idiotas úteis. Eu acho que ele é um Ministro inútil.
Para além disso, vejam o nível de contradição que estamos vivenciando. O Greenpeace faz uma manifestação usando amido para simular o óleo que está asfixiando a vida no Nordeste. É um material lavável, mas eles foram levados à delegacia porque estariam atentando contra o meio ambiente. É impressionante! Foi dito que eles estavam provocando um dano ao meio ambiente. Se o raciocínio fosse este, o Sr. Ricardo Salles deveria estar aprisionado, porque provoca dano ao meio ambiente, e o Sr. Jair Bolsonaro também.
Nesse quadro, eu penso que temos que fortalecer a democracia participativa, e com isso eu concluo. A democracia representativa, e estamos aqui dentro dela, é um espaço importante e tem que ter a lógica, o olhar da população brasileira, das mulheres, da população LGBTI, da negritude, de todos os segmentos da nossa sociedade que foram vítimas de tanta discriminação e desigualdade. A democracia representativa é um espaço importante, mas eu não creio que o País será transformado pelas mãos da nossa democracia representativa, porque são tantos os elementos do sistema eleitoral, são tantas as variáveis.
É só lembrar que estávamos tendo a tomada do Palácio de Inverno, em 1917, na Rússia, e a Duma, que é o Parlamento, estava dominada pelo segmento que estava sendo destituído do Poder. Então, assim, as democracias representativas sempre estão aquém do amadurecimento do próprio povo e das construções de democracia participativa. O Governo tanto entende isso que está acabando com as conferências, com os conselhos. Ele entende o que é o caráter estruturante e contestador da democracia participativa, tanto é que ele desconstruiu, em abril, um colegiado que poderia acionar o plano emergencial de contingência, que só foi acionado pelo Governo, no que diz respeito ao desastre ecológico no Nordeste, no dia 8 de outubro — o desastre começou a ter sua aparição no dia 28 de agosto —, um mês e oito dias depois, mais de um mês depois. Esse colegiado poderia ter acionado o plano de contingenciamento nas emergências para que pudesse dar respostas. E o Governo, de uma forma lenta, porque não tem noção de meio ambiente, acha que isso é coisa que se deve tolerar e não uma construção fundamental para a defesa da própria vida.
Então o Governo entende. E nós temos que entender também a democracia participativa: os grêmios, os DCEs, as instituições, as associações, os sindicatos, que também têm uma participação mais direta dos próprios trabalhadores e trabalhadoras, essas organizações mais diretas de trabalhadores.
Além disso, há o acúmulo de discussões democráticas. Nós não podemos nos curvar ao entendimento do que é a democracia para o Governo, à sua aversão à democracia. Aversão à democracia existe em vários exemplos, tanto no Ministério da Educação quanto no próprio Governo Bolsonaro, que tem aversão à democracia.
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Deputada Rosa Neide, eu custei a entender quando houve aqui uma sessão solene para homenagear a Princesa Isabel, que diziam ser responsável pela abolição da escravatura no Brasil. Nós fizemos uma manifestação dizendo que a abolição pela Lei Áurea era uma farsa. Portanto nós fizemos um protesto, os movimentos da negritude, enfim. E ali o filho do Presidente da República, o Deputado Eduardo Bolsonaro, subiu à tribuna carregando uma bandeira do Império para defender a Princesa Isabel. Eu não conseguia entender como o filho do Presidente da República carregou uma bandeira do Império para a tribuna, mas agora eu entendo, é porque eles estão transformando a república num império, numa monarquia, numa dinastia. A prole, os vínculos sanguíneos determinam os próprios interesses republicanos. Então, eu consegui entender isso.
Concluo dizendo que eu acho que temos que apostar na democracia participativa, em nossa capacidade de dialogar, de estranhar, de duvidar, de termos essa consciência. E quero lembrar Rubem Alves e dizer que estamos vivendo o inverso do que diz a história do Pinóquio. O Pinóquio era reconhecido pelo nariz, mas o que diz a lenda do Pinóquio? Ele era um boneco de pau, uma marionete, e virou gente. A educação faz isto: transforma bonecos de pau, marionetes em gente. E o que querem fazer? Querem transformar gente em bonecos de pau, em marionetes, ou talvez em soldadinhos de chumbo.
A SRA. PRESIDENTE (Professora Rosa Neide. PT - MT) - É uma grande honra ouvir a Deputada Erika Kokay, do Distrito Federal, que sustentou com muita vitalidade a questão do contraponto da Escola sem Partido. Nós vemos ameaças a todo tempo.
Eu quero finalizar esta nossa audiência dizendo que a escola tem que ser com partido, a escola que não é uma sigla partidária, mas que toma parte, que compreende o que está no seu entorno, que respeita a energia das crianças e dos jovens. Um país quer negar o direito de fala, o direito de expressão da nossa juventude e o nosso. E nós já vivemos mais — não que estejamos velhos, mas já vivemos um pouco mais e acumulamos bastante experiência. Mas só a juventude tem a energia capaz de acumular sonhos, de ter utopias muito fortes e de nos transmitir essa energia.
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Na medida em que se quer enfileirar os jovens, e nem precisa ser um soldadinho de chumbo, mas um soldado mesmo, seguindo de forma alienada um foco que alguém idealizou; na medida em que se quer transformar a escola pública, que é o espaço mais democrático que temos para construir e revitalizar conceitos, para fazer com que a nossa juventude tenha cada vez mais sonhos e seja protagonista de suas ações; na medida em que se quer impedir isso, é muito difícil entender que conceito de democracia algumas pessoas deste Governo pronunciam.
Sobre a fala do Prof. José Ribeiro, aquilo que o Ministério acumulou — e é muito importante que o senhor esteja lá, porque o Ministério tem um acúmulo —, quando perdemos o acúmulo, as políticas passam a ser de Governo e não de Estado, e quebra-se tudo o que foi construído.
Eu me preocupo também com essa representação do diretor da escola, porque como Secretária de Estado já participei de inúmeras reuniões com o Ministério da Educação, representando o CONSED. Há uma larga produção com relação à gestão democrática, à escolha dos diretores de escola, e eu vejo que a cada governo se desconstrói tudo e se começa tudo de novo, como se o País não tivesse uma construção sobre essa questão. E aí o País discute a liberdade de cátedra querendo impedir que os professores, dentro do espaço da escola, no uso do acúmulo científico conquistado pela humanidade, tenham o seu espaço na construção do conhecimento.
Então, neste momento eu acho, realmente, que só a democracia participativa e nossa efetiva coragem e determinação podem fazer com que os sonhos acumulados, construídos, aquilo que conquistamos permaneça de pé, mesmo com todos os ferimentos que temos. Acho que no sistema capitalista os espaços que vão se criando são brechas que nós temos que ocupar para fazer com que as estruturas possam ser movidas e possamos permanecer existindo.
Com toda a coragem a Ailta deu um belo exemplo hoje. Eu gostaria mesmo que no lattes tivesse um quadradinho lá em cima, com história de vida e depois a história profissional. Quando entrava na sala de aula para ministrar aulas os alunos perguntavam: "A senhora nasceu na Bahia?" Quarenta anos depois de sair de lá eu me sentia muito feliz porque não havia perdido a marca. E eu contava um pouco da minha história para eles saberem por que eu me tornei professora. Os nossos exemplos são muito singulares e isso faz com que acreditemos realmente que a educação pode ocupar cada vez mais o espaço que ela tem na formação dos nossos jovens, das nossas crianças, dos nossos adolescentes.
Eu queria dizer, professor, que realmente há um PL tramitando que propõe discutir o que se pensou, em 1985, sobre gestão democrática, grêmios, organização de estudantes, dando um passo à frente. E vamos precisar contar com a mobilização para que possamos fazer a discussão interna na Comissão de Educação e depois em toda a Casa.
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