1ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA 56 ª LEGISLATURA
Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara dos Deputados
(Reunião Deliberativa Ordinária)
Em 16 de Outubro de 2019 (Quarta-Feira)
às 14 horas e 30 minutos
Horário (Texto com redação final.)
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O SR. PRESIDENTE (Juscelino Filho. DEM - MA) - Boa tarde a todos.
Havendo número regimental, declaro aberta a 12ª Reunião Ordinária do Conselho de Ética e Decoro Parlamentar, da 1ª Sessão Legislativa Ordinária, destinada a:
1 - Apresentação, discussão e votação do Parecer Preliminar do Deputado JHC, do PSB de Alagoas, Relator do Processo nº 06, de 2019, referente à Representação nº 07, de 2019, do Solidariedade — SD, em desfavor do Deputado André Janones, do Avante de Minas Gerais.
Esse item foi retirado da pauta de ofício por esta Presidência devido ao falecimento do pai do Deputado representado.
2 - Apresentação, discussão e votação do parecer preliminar do Deputado Flávio Nogueira, do PDT do Piauí, Relator do Processo nº 07, de 2019, referente à Representação nº 08, de 2019, do Partido Social Liberal — PSL, em desfavor do Deputado Glauber Braga, do PSOL do Rio de Janeiro.
Encontram-se sobre as bancadas cópias da ata da 11ª Reunião deste Conselho de Ética, realizada em 8 de outubro de 2019.
Indago aos Srs. e Sras. Parlamentares se há necessidade da leitura da referida ata.
O SR. FLÁVIO NOGUEIRA (PDT - PI) - Peço a dispensa da leitura da ata.
O SR. PRESIDENTE (Juscelino Filho. DEM - MA) - Dispensada a leitura da ata.
Em discussão a ata. (Pausa.)
Não havendo quem queira discuti-la, em votação.
Os Deputados que aprovam a ata permaneçam como se encontram. (Pausa.)
Aprovada a ata da Reunião deste Conselho, realizada em 8 de outubro de 2019.
Vamos à Ordem do Dia.
Em relação à apresentação dos Pareceres Preliminares e para o bom andamento dos trabalhos, informo os procedimentos a serem adotados.
Em conformidade com o art. 18 do Regulamento do Conselho de Ética, primeiramente passarei a palavra ao Relator, para proceder a leitura do seu relatório.
Em seguida, o representado e/ou seu advogado terá o prazo de 20 minutos, prorrogáveis por mais 10 minutos, para sua defesa.
Logo após, será devolvida a palavra ao Relator, para a leitura do seu voto.
Após a leitura do voto do Relator, será iniciada a discussão do parecer, podendo cada membro usar a palavra por até 10 minutos, improrrogáveis.
Esgotada a lista dos membros do Conselho, será concedida a palavra a Deputado não membro, por até 5 minutos, improrrogáveis.
Será concedido o prazo para Comunicação de Liderança, conforme art. 66, § 1º, do Regimento Interno desta Casa. Os Vice-Líderes poderão usar a palavra pela Liderança, mediante delegação escrita pelo Líder.
Esclareço que o tempo de Comunicação de Liderança não poderá ser agregado ao tempo de discussão.
Encerrada a discussão da matéria, poderão usar a palavra, por até 10 minutos, o Deputado do partido autor da representação, o Relator e, por último, o representado e o seu defensor.
Após as falas, darei início à votação nominal do Parecer Preliminar.
Item 2 da pauta. Apresentação, discussão e votação do parecer preliminar do Deputado Flávio Nogueira, do PDT do Piauí, Relator do Processo nº 07, de 2019, referente à Representação nº 08, de 2019, do Partido Social Liberal — PSL, em desfavor do Deputado Glauber Braga, do PSOL do Rio de Janeiro.
Convido para compor a Mesa, com a Presidência, o Relator, Deputado Flávio Nogueira.
Informo que o representado apresentou Defesa Prévia em 18 de setembro de 2019, a qual está disponível na pauta eletrônica.
Passo a palavra ao Relator, Deputado Flávio Nogueira, para leitura do seu parecer.
O SR. FLÁVIO NOGUEIRA (PDT - PI) - Boa tarde, Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados.
"Representação nº 08, de 2019.
Processo nº 07, de 2019.
Representante: Partido Social Liberal — PSL.
15:48
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Representado: Deputado Glauber Braga.
Relator: Deputado Flávio Nogueira.
Relatório.
Trata-se de processo disciplinar instaurado em 18 de setembro de 2019 com base na Representação nº 08, de 2019, apresentada ao Conselho de Ética e Decoro Parlamentar pelo Partido Social Liberal — PSL.
A representação imputa ao Deputado Glauber Braga a prática de atos incompatíveis com o decoro parlamentar, previstos no art. 55, §1º e no art. 2º da Constituição Federal; no art. 4º, inciso I, no art. 5º e no art. 9º, §3º do Código de Ética e Decoro Parlamentar. De acordo com a representação, os fatos trazidos aos autos se circunscrevem à seguinte conduta incompatível com o decoro parlamentar: abusar das prerrogativas constitucionais asseguradas aos membros do Congresso Nacional (art. 55, §1º, da Constituição Federal, e art. 4º, inciso I, do Código de Ética e Decoro Parlamentar).
Alega o representante que no 'dia 2 de julho de 2019, as Comissões de Constituição e Justiça e de Cidadania; de Direitos Humanos e Minorias; e de Trabalho, de Administração e Serviço Público realizaram audiência pública conjunta para ouvir, após a devida aceitação de convite aprovado pelos colegiados, o Sr. Ministro de Estado da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro'. Segundo a representação, durante a realização da audiência pública, o representado 'escolheu fugir do debate, quebrando suas regras e invadindo o domínio da pura violência moral, em face da qual não há respostas racionais, mas a simples escolha entre o silêncio e a contraofensiva'.
Nesse contexto, o representante alega que o representado fez uso da palavra para ofender a honra e a dignidade de agente público que estava prestando esclarecimentos aos questionamentos formulados pelos membros do Poder Legislativo. Diante disso, sustenta a tese de quais atos configurariam abuso das prerrogativas constitucionais asseguradas aos membros do Congresso Nacional.
Das alegações na Representação nº 8, de 2019, extrai-se o seguinte resumo das imputações em desfavor do representado:
1) Que o Deputado Glauber Braga, ao receber a palavra para participar do debate, tomou a decisão de não participar do debate, de não formular perguntas, ou mesmo tecer comentários, mas sim, decidiu fugir do debate, quebrando suas regras e invadindo o domínio da pura violência moral;
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2) Que o Deputado Glauber Braga, com a palavra, dirigindo-se ao Ministro Sergio Moro, afirmou: 'O Senhor vai estar nos livros de História como um juiz que se corrompeu, como um juiz ladrão (...) um juiz ladrão e corrompido que ganhou recompensa pra fazer com que a democracia brasileira fosse atingida (...). É o que o senhor é, um juiz que se corrompeu e um juiz ladrão”.
3) Que as palavras proferidas pelo Deputado Glauber Braga caracterizam verdadeiro abuso das prerrogativas conferidas aos membros do Congresso Nacional, porquanto claramente ultrapassam a linha divisória que separa o debate político da pura e direta violência moral.
O suporte probatório das alegações baseia-se no encaminhamento dos endereços eletrônicos da Câmara dos Deputados e do Senado Federal que hospedam o inteiro teor das audiências públicas nas quais o Ministro Sergio Moro compareceu para prestar esclarecimentos.
Instaurado o processo e designada esta relatoria, vieram-me os autos conclusos para manifestação preliminar, nos termos do inciso II do § 40 do art. 14 do Código de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara dos Deputados.
É o Relatório."
O SR. PRESIDENTE (Juscelino Filho. DEM - MA) - Obrigado, Deputado Flávio Nogueira.
Dando seguimento, passo a palavra ao Deputado Glauber Braga, para que faça a sua defesa por 20 minutos, prorrogáveis por mais 10 minutos.
Com a palavra o Deputado Glauber Braga.
O SR. GLAUBER BRAGA (PSOL - RJ) - Sr. Presidente, Sr. Relator, Srs. Deputados, para que eu tenha compreensão do rito, pergunto: o Relator, o Deputado Flávio, fez a apresentação de um relatório prévio, ainda sem manifestação de voto. É isso? S.Exa. não faz agora o encaminhamento da manifestação?
Eu quero, respeitosamente, me dirigir aos Parlamentares do Conselho de Ética para dizer que não procurei nenhum Parlamentar para tratar da questão, nem mesmo o Relator da matéria, o Deputado Flávio, não por desrespeito ou por algum tipo de falta de análise de que merecia uma conversa prévia relacionada ao relatório. Não foi isso. Foi realmente para que o Relator — e também por respeito aos demais Parlamentares — tivesse a liberdade de proferir o relatório que considerasse o mais adequado e para que os Parlamentares pudessem votar da forma que considerassem a mais adequada.
Eu estou na Câmara há algum tempo e não posso pedir desculpas por aquilo que falei. E neste momento vou reafirmar aquilo que já disse: considero que o arquivamento é necessário, por uma defesa de prerrogativa parlamentar, relacionada à imunidade de fala, imunidade essa que é uma garantia democrática não para mim, pessoalmente, mas para o conjunto dos Parlamentares e das Parlamentares, para o exercício da sua atividade.
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Esse foi o primeiro argumento que eu utilizei.
O segundo argumento utilizado por mim, do ponto de vista jurídico, foi a exceção da verdade. Quem fala a verdade não merece castigo, não merece condenação. O que eu já disse reafirmo: o então o juiz Sergio Moro — e fiz uma analogia com o jogo de futebol — se comportou como um juiz ladrão: alguém que se utilizou das prerrogativas de juiz para ferir democracia brasileira, para depois receber uma recompensa e ser Ministro da Justiça.
Os diálogos explicitados pelo Intercept Brasil demonstram que ele não agiu como um juiz imparcial. Foi o contrário disso: foi um juiz parcial, que estabeleceu um conluio e uma fraude com os acusadores, para cumprir um roteiro preestabelecido. Por esse motivo, feriu, sim, a democracia brasileira, tirando das eleições aquele que estava em primeiro lugar e facilitando a vida do então candidato a Presidente da República Jair Bolsonaro.
É um escândalo que depois disso tudo ele tenha aceitado assumir o Ministério da Justiça como uma recompensa do trabalho que teria sido feito no período da campanha eleitoral. Mais grave ainda é que, antes do resultado eleitoral, consultas tenham sido feitas a Sergio Moro se aceitaria participar do Governo de Jair Bolsonaro.
Os senhores podem concordar ou discordar da tese que eu aqui apresento, mas a história é essa — eu não tenho dúvida —, e a História não vai absolver Sergio Moro daquilo que ele fez — e daquilo que está fazendo — com a democracia brasileira quando se comportou como um juiz ladrão.
Falo respeitosamente ao Relator, Deputado Flávio Nogueira; ao Presidente, Deputado Juscelino; e aos demais Parlamentares do Conselho de Ética, independentemente do resultado que venha hoje da deliberação do Conselho. É claro que eu espero que a proposta do PSL de cassação do mandato meu parlamentar não prossiga, mas se ela viesse a prosseguir e minha cassação viesse a ser aprovada no Conselho de Ética da Câmara dos Deputados, eu continuaria sendo um militante. Eu não nasci amarrado a mandatos; a vida não se resume a festivais; eu defendo mandato parlamentar porque acho que é fundamental o estabelecimento de uma prerrogativa democrática. Mas se viesse a ser aprovada...
Repito: falo isso respeitosamente, sem afrontar o Relator nem os demais Parlamentares, mas falo como dever de consciência. Se viesse a ser aprovada a cassação do meu mandato, mais uma vez estaria sendo ferida a democracia, e eu continuaria sendo um militante, e Moro continuaria sendo um juiz ladrão. A História não modificaria esses fatos.
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É exatamente por isso que eu não gostaria de estar neste momento no Conselho de Ética me defendendo de algo que obviamente é uma retaliação política daqueles que não aceitam que verdades sejam proferidas contra aqueles que precisam ouvi-las.
O papel que joga Sergio Moro não é dito só por mim. Se eu abrir o Google aqui, agora, eu vou ter dezenas de manifestações, por exemplo, de Ciro Gomes, dizendo que Moro agiu a partir de uma lógica corrupta. Eu posso pegar várias outras autoridades da República fazendo o mesmo questionamento.
E faço esse debate público exatamente por entender que é a minha obrigação militante. Sergio Moro dispõe, ainda, em boa parte da sociedade brasileira, de uma popularidade com alguns segmentos. Aparentemente, tem mais popularidade até do que o Presidente da República. Vive uma articulação em que o Presidente da República sustenta Sergio Moro e Sergio Moro dá sustentação ao Presidente da República, num processo de blindagem nunca antes visto na história da República, em que procura utilizar o Ministério da Justiça para perseguir adversários e blindar aliados.
Os senhores não precisam concordar com o que eu estou dizendo, mas a imunidade da fala me dá a garantia de dizê-lo, e eu não vou mentir para os senhores no Conselho de Ética. Eu poderia traçar uma tática, ou uma estratégia, de apaziguamento de aqui fazer uma fala diferente, mas eu vou sair desta reunião e vou continuar dizendo as mesmas coisas. Eu não vou modificar aquilo que me atravessa como convicção e como necessidade de um debate político que precisa necessariamente ter esses elementos em cima da mesa.
Sras. e Srs. Parlamentares e todos aqueles que estão acompanhando o Conselho de Ética neste momento, eu avalio com tranquilidade o resultado que vier do parecer e o posicionamento que vier das Sras. e dos Srs. Parlamentares. Não verão da minha parte, de maneira alguma, qualquer tipo de manifestação de caráter pessoal contra qualquer Parlamentar que venha a falar ou a proferir decisões, votos, manifestações divergentes da minha convicção. O que eu vou continuar fazendo é a luta política.
Todo final de semana eu me comprometo comigo mesmo, eu faço a promessa a mim mesmo de na semana seguinte não me estressar no exercício da atividade parlamentar, mas toda semana eu tenho descumprido aquilo que eu me prometi durante o fim de semana.
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E faço isso porque exerço atividade política, pública, o mandato parlamentar por inteiro. Eu não consigo exercer o mandato parlamentar pela metade.
Eu me lembro quando cheguei aqui, em 2009, do primeiro pronunciamento que fiz no Plenário da Câmara dos Deputados: as pernas tremiam, os joelhos batiam um no outro. Mas o tempo fez com que eu tivesse a convicção de que o mandato parlamentar que eu estava exercendo — como o que eu tenho hoje; estou no quarto mandato parlamentar — não era diferente do de qualquer outra pessoa. Não é diferente. Todos aqui têm que ter a prerrogativa do exercício pleno do seu mandato parlamentar para representarem aqueles que a eles confiaram o seu voto; que neles confiaram publicamente para que esse mandato pudesse ser exercido.
Eu não posso exercer o mandato parlamentar pela metade. Eu não posso desconectar o que eu sou da minha figura pública. Eu não posso ter minha figura pública aqui e o que eu sou e o que eu defendo lá. A minha figura pública e o que eu sou têm que estar cada vez mais aproximados. E esse é um exercício cotidiano que eu procuro realizar. E fico satisfeito, ou feliz, de ter um embate que seja duro com outro Parlamentar? Não. Isso não é causador para mim de alegria, de regozijo. Não é. Mas vou deixar de fazê-lo sempre que achar necessário para representar quem confia no exercício do meu mandato parlamentar? Não deixarei de fazê-lo.
Então, Presidente Juscelino, Relator Deputado Flávio Nogueira, Deputados e Deputadas, desculpem-me se eu não posso ter aqui uma posição diferente daquela que tive e se reafirmo aquilo que já falei: defendo mandato aqui com toda força, por considerar que a imunidade de fala é uma prerrogativa parlamentar que não pode ser desrespeitada e defendo também, como tese jurídica, a exceção da verdade. Quem fala a verdade não merece punição.
Se este Conselho considerar que a tese que eu apresentei merece prosperar, agradeço. Que se arquive e que se continue a luta política. Se este Conselho considerar que a tese que nós apresentamos na Defesa Prévia não merece prosperar, que continuemos: que sejam as provas produzidas. Faço questão, inclusive, de fazer a indicação das oito testemunhas a que tenho direito no Conselho de Ética, para comprovação da tese da exceção da verdade, com todos os meios de prova possíveis e disponíveis.
Agradeço a atenção das senhoras e dos senhores.
Acatarei o resultado apresentado pelo Relator.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Juscelino Filho. DEM - MA) - Obrigado, Deputado Glauber.
Devolvo a palavra ao Relator, para que possa proferir o seu voto, que se encontra lacrado.
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O SR. GLAUBER BRAGA (PSOL - RJ) - Sr. Presidente, perdoe-me. Até para que o Relator também fique à vontade, bem como os demais Parlamentares, neste momento eu vou me ausentar, não por desrespeito, mas para que os Parlamentares possam tomar conhecimento do voto. Em caso de necessidade, eu retorno a este Conselho.
Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Juscelino Filho. DEM - MA) - Com a palavra o Relator, Deputado Flávio Nogueira.
O SR. FLAVIO NOGUEIRA (PDT - PI) - "II -Voto do Relator
Instaurado procedimento disciplinar no Conselho de Ética e Decoro Parlamentar, impende ao Relator examinar, inicialmente, se a representação atende aos requisitos mínimos necessários para o prosseguimento do feito, isto é, se a representação é apta e se existe justa causa. É o que consta do inciso II do § 4º do art. 14 do Código de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara dos Deputados, com a redação que lhe conferiu a Resolução nº 2, de 2011.
II - Da Defesa Prévia
Antes de analisar a aptidão e justa causa da representação, tendo em vista que o representado fez uso de sua faculdade de manifestação em qualquer fase do procedimento disciplinar, conforme previsão do artigo consoante, art. 9º, § 5º, do Código de Ética e Decoro Parlamentar, passa-se a expor a argumentação trazida pelo representado.
Conforme ofício datado de 12 de setembro de 2019 entregue à Presidência do Conselho de Ética e Decoro Parlamentar, o Deputado Glauber Braga protocolou documento com a finalidade de apresentar sua Defesa Prévia.
Em relação aos fatos imputados, a Defesa Prévia sustenta que a representação tem por objetivo tipificar a conduta do representado por meio de caracterizações difusas e pouco objetivas. Pontua que uma representação, ao imputar fato ensejador de quebra de decoro parlamentar, precisa mostrar inequivocamente a relação/equivalência entre a conduta e a punição sugerida, algo que efetivamente não ocorreu no caso em análise.
Não obstante, ao final do processamento e instrução do feito, o representante requer a decretação da perda do mandado do representado. Ou seja, é possível perceber que tal representação tem por objetivo apenas causar prejuízo ao Parlamentar representado. Afinal, não há subsunção do fato à norma no caso concreto.
Alega ainda que no caso concreto há a incidência do instituto da imunidade parlamentar.
Sobre o referido instituto, a Defesa Prévia afirma que 'a Constituição Federal de 1988, no caput do seu art. 53, consagrou a imunidade material dos Parlamentares, afastando qualquer tipo de responsabilidade civil, penal ou administrativa/disciplinar que decorra de seus votos, palavras ou opiniões no exercício de seu mandato. Em suma, a imunidade parlamentar garante que o Deputado representado não sofra nenhum tipo de sanção disciplinar ou de responsabilidade política, não podendo ser punido por seus posicionamentos, visto que o parlamentar está coberto pelo princípio da liberdade da fala'.
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Em resumo, o instituto da imunidade parlamentar 'advém da necessidade de assegurar ao parlamentar a mais ampla liberdade, autonomia e independência no exercício de suas funções, notadamente em seus discursos e opiniões, sendo o uso da palavra pressuposto da democracia'.
Nesse contexto, a Defesa Prévia salienta que 'as palavras prolatadas pelo representado foram proferidas in officio (no exercício do mandato)', havendo, portanto, a incidência da imunidade parlamentar.
Disso, conclui-se que 'se a Constituição confere ao Parlamentar a liberdade de expor sua opinião, sem o receito de ser tolhido e punido por isso, não será o partido político representante que o fará, de forma inadequada e descabida'.
II. II Da imunidade parlamentar
Tendo em vista a alegação preliminar de que o uso da palavra pelo representado estaria abarcado pela imunidade parlamentar material, não sendo passível, portanto, de análise por parte desse colegiado, necessário se faz tecer breves considerações em relação ao instituto da imunidade parlamentar.
A imunidade material ou inviolabilidade prevista no art. 53 da Constituição Federal, com redação da EC 35/01, exclui a responsabilidade civil e penal dos Congressistas, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos.
Nesse sentido, a ilustre jurista Rosah Russomano afirma que:
(...) o congressista usufrui de uma proteção ampla, integral, ininterrupta, sempre que atua no exercício do mandato. Sua palavra é livre, desconhece peias e limitações. Vota pelo modo que lhe parece mais digno e que melhor se coadune com os reclamos de sua consciência. Emite opiniões desafogadamente, sem que o atormente o receio de haver incidido em algum crime de calúnia, de injúria ou de difamação.
A literalidade do art. 53 parece apontar que somente estaria abarcada a exclusão da responsabilidade civil e penal dos congressistas, não abrangendo a esfera administrativa. Entretanto, a imunidade não é uma simples disposição normativa que exclui a responsabilidade dos Parlamentares. Trata-se de uma norma constitucional que exclui o próprio enquadramento típico das condutas por ela abrangida. Conclui-se, à vista disso, que a interpretação dos preceitos que regulam a imunidade material deve ser feita de modo que garanta o amplo e efetivo exercício das funções inerentes aos membros do Poder Legislativo.
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Todavia, assim como ocorre com os direitos fundamentais, a imunidade material não pode ser considerada uma prerrogativa absoluta, que não admite sua restrição. Da mesma maneira que qualquer direito fundamental previsto na Constituição Federal, a inviolabilidade parlamentar deve ser limitada quando entra em colisão com outros princípios igualmente assegurados pela ordem constitucional. Robert Alexy esclarece que quando há colisões entre princípios, a solução a ser adotada deve passar pela ponderação do peso de cada um deles no caso concreto, para que seja possível o estabelecimento de uma 'relação de precedência condicionada', com base nas circunstâncias de fato.
Ainda, interessante é analisar duas previsões legais do Direto Comparado que fundamentam a teoria jurídica da liberdade de palavras dos Parlamentares. A primeira delas é a previsão constante na Declaração de Direitos 1689 de 'que os discursos pronunciados nos debates do Parlamento não devem ser examinados senão por ele mesmo, e não em outro Tribunal ou sítio algum'. No mesmo sentido, a Constituição dos Estados Unidos da América, em seu art. 1º, Seção 6, também prevê que os Senadores e Representantes, fora do recinto das Câmaras, não terão a obrigação de responder questionamentos sobre seus discursos e debates.
Resta claro que o instituto da imunidade material tem como objetivo proteger os integrantes do Poder Legislativo contra interferência, influência ou pressão dos demais Poderes. Não havendo óbices para que o próprio Parlamento analise a conduta de seus integrantes a fim de resguardar a dignidade e honra do Poder Legislativo, como instituição política, quando seus membros utilizem de forma abusiva suas prerrogativas constitucionalmente asseguradas.
Conclui-se, portanto, que é prerrogativa deste colegiado ponderar, no caso concreto, considerando a 'relação de precedência condicionada' se a utilização abusiva da imunidade material justifica o seu afastamento, procedendo com a responsabilização administrativa do Parlamentar. Lembrando que, conforme já decidido por este colegiado, 'a intervenção punitiva deste Conselho deve ser exercida com parcimônia, sob o risco de prejudicar o funcionamento das instituições democráticas, criando-se uma situação de temor do uso da palavra, justamente no Parlamento que é a última trincheira do direito à liberdade de expressão'.
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II. III DA APTIDÃO E DA JUSTA CAUSA
A definição do que se deve considerar como representação apta encontra-se no art. 1º, § 1º, incisos I, II e III do Ato da Mesa nº 37, de 31 de março de 2009, que 'regulamenta os procedimentos a serem observados na apreciação de representações relacionadas ao decoro parlamentar e de processos relacionados às hipóteses de perda de mandato nos incisos IV e V do art. 55 da Constituição Federal'. A norma, embora se destine ao Corregedor, aplica-se, mutatis mutandis, ao caso em exame.
Consoante inteligência do referido preceito, a representação será considerada apta quando há: a) tipicidade, se o fato narrado constituiu, evidentemente, falta de decoro parlamentar; b) legitimidade passiva, se a quem se imputa o fato é detentor de mandato de Deputado Federal; e, c) existência de indícios suficientes, se há um conjunto probatório mínimo do fato indecoroso e sua flagrante correlação com o representado.
Diante disso, é função deste Parecer Preliminar somente verificar se foram atendidos os requisitos necessários ao prosseguimento do feito, de modo a justificar, independentemente de juízo valorativo acerca do conjunto probatório inicial, o prosseguimento do Processo Disciplinar perante esta Comissão de Ética e Decoro Parlamentar. Caso contrário, deve-se concluir pelo arquivamento inicial da representação.
Passa-se, portanto, para a análise dos requisitos de aptidão da representação.
Primeiro, no tocante ao pressuposto da legitimidade passiva, não há incerteza quanto ao seu atendimento, uma vez que se constata que o representado é Deputado Federal (PSOL/RJ) eleito para a 56ª Legislatura.
Segundo, quanto à tipicidade, de modo algum os fatos que embasam a representação constituem atos incompatíveis com o decoro parlamentar enquadráveis no art. 55, § 1º, da Constituição Federal e o no art. 4º, inciso I, do Código de Ética e Decoro Parlamentar (abusar das prerrogativas constitucionais asseguradas aos membros do Congresso Nacional).
Embora a autoria e a materialidade dos fatos relatados na representação estejam devidamente demonstradas, elas são inequivocamente atípicas. Isto é, os fatos descritos na inicial não configuram afronta ao decoro parlamentar, tratando-se apenas da natural projeção do exercício de suas atividades parlamentares.
Cumpre asseverar que o conceito de decoro parlamentar está relacionado à garantia da dignidade e prestígio institucional do Poder Legislativo. Desse modo, a quebra do decoro deve configurar uma ofensa objetiva à moralidade institucional do Parlamento.
Cabe lembrar novamente que a imunidade parlamentar não possui caráter absoluto. O Supremo Tribunal Federal, intérprete final da Carta Magna, já asseverou que, muito embora a imunidade cível e penal do Parlamentar tenha por objetivo viabilizar o pleno exercício do mandato, 'o excesso de linguagem pode configurar, em tese, quebra de decoro, a ensejar o controle político'.
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No entanto, a Corte Suprema também exarou entendimento no sentido de que, conquanto ofensas pessoais não estejam irrestritamente acobertadas pela imunidade, certo é que as manifestações dos Parlamentares encerram um modelo de expressão muitas vezes despido de formalidades. Assim, comentários ácidos e até mesmo jocosos acerca de fatos sob debate público, apesar de lamentáveis, não configuram conduta passível de punição, desde que configurado o nexo de causalidade entre as declarações exaradas e o exercício do mandato. Confira-se:
Ementa agravo regimental. Queixa-crime. Negativa de seguimento. Deputado Federal. Crime contra a honra (...)"
Isso aqui eu vou deixar de ler — é um parecer —, mas, se alguém quiser que depois eu leia, farei o máximo para prestar o serviço.
"Desse modo, o membro do Congresso Nacional 'possui a garantia constitucional da imunidade parlamentar em sentido material, sempre invocável, por mais graves que sejam as ofensas que alegadamente tenha proferido, quando conexas a um determinado contexto político e indissociáveis do desempenho do mandato legislativo'.
No caso em análise, observa-se que a manifestação do representado foi realizada em audiência pública dentro do recinto da Câmara dos Deputados. Logo, a imunidade material, inequivocamente, projeta-se a sua fala.
Em relação ao nexo causal entre a conduta imputada ao representado e o exercício das funções inerentes ao mandato, registre-se que as declarações do representado foram externadas em um ambiente de intensa mobilização política e social em torno de possíveis desvios cometidos por agentes públicos integrantes da Operação Lava-Jato. Nesse contexto, o posicionamento do representado sobre os fatos e as pessoas envolvidas não se mostrou, de forma alguma, dissociado de sua atuação parlamentar. Ao contrário, retratou sua opinião sobre o tema perante seus eleitores. Resta, portanto, devidamente demonstrado o liame entre a atuação do representado e o desempenho do mandato legislativo.
Feitas essas considerações, conclui-se que o representado não extrapolou as prerrogativas inerentes ao mandato, na medida em que apenas explicitou, embora de forma que pessoalmente julgo equivocada, sua opinião política sobre eventos que suscitam intensos debates e comoção nacionais.
Desse modo, ainda que não se concorde com as ideias e opiniões externadas pelo representado, sua manifestação não configurou situação suscetível de macular a honra e a moralidade institucional desta Casa Legislativa, tampouco afetou a dignidade da representação popular que lhe foi outorgada.
Logo, a aplicação da penalidade de perda do mandato do representado em razão dos fatos ora analisados implicaria restrição indevida à liberdade de expressão conferida aos Deputados Federais para a garantia do regular desempenho de suas funções.
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Por fim, verifica-se que este Conselho de Ética vem se manifestando no sentido do arquivamento das demais representações que tratam de casos semelhantes, o que nos leva a adotar, em razão do princípio da isonomia, o mesmo posicionamento na presente hipótese.
Conclui-se, portanto, que nem mesmo em tese os fatos imputados ao Parlamentar constituem falta de decoro parlamentar, mas sim o exercício regular do mandato parlamentar.
Terceiro, no que diz respeito à existência de indícios suficientes, haja vista que os fatos imputados ao representado nem sequer configuram falta de decoro parlamentar, não há que se falar em sua existência.
No tocante à justa causa, tendo em vista a atipicidade dos fatos imputados, a justa causa resta descaracterizada.
Diante disso, não resta outra conclusão, senão a de que a representação deve ser arquivada por falta de tipicidade da conduta e de justa causa.
II. III Conclusão
Diante dessa análise preliminar, na esteira dos precedentes deste Conselho, não se deve admitir o prosseguimento deste processo disciplinar, por evidente falta dos requisitos mínimos de admissibilidade.
Dessa forma, conclui-se pela inaptidão e pela falta de justa causa da representação, devendo, pois, ser arquivada a Representação nº 08, de 2019, nos termos dos incisos II e III do § 4º do Código de Ética e Decoro Parlamentar.
Sala das Sessões, 10 de outubro de 2019.
Deputado Flávio Nogueira, Relator."
O SR. PRESIDENTE (Juscelino Filho. DEM - MA) - Obrigado, Deputado Flávio Nogueira.
Nós iríamos dar seguimento aos trabalhos, mas, com a abertura da Ordem do Dia no Plenário da Casa, este Conselho é obrigado a suspender a reunião.
Se a Ordem do Dia acabar cedo, em horário que dê para retornarmos com quórum de discutir e votar o parecer, retomaremos; senão, marcaremos nova audiência, para podermos iniciar a discussão desta matéria e, em seguida, procedermos à votação.
A reunião está suspensa.
Muito obrigado.
(A reunião é suspensa.)
23:03
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O SR. PRESIDENTE (Diego Garcia. PODE - PR) - Declaro reabertos os trabalhos às 23h04min.
Por solicitação do Presidente, Deputado Juscelino Filho, agradeço a presença dos Srs. Parlamentares e dos demais presentes e vou encerrar a reunião.
Antes, convoco reunião deliberativa para a próxima terça-feira, dia 22 de outubro, às 14h30min, para discussão e votação do Processo nº 7, de 2019, em desfavor do Deputado Glauber Braga, e apreciação de pareceres preliminares referentes às Representações nºs 7 e 9, de 2019, em desfavor dos Deputados André Janones e Carlos Jordy, respectivamente.
Convoco também reunião de oitiva para o dia 24 de outubro de 2019, às 10h30min, referente ao Processo nº 2, de 2019, em desfavor do Deputado Boca Aberta.
Está encerrada a reunião.
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