1ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA 56 ª LEGISLATURA
Centro de Estudos e Debates Estratégicos
(Reunião do Grupo de Estudo A DÍVIDA PÚBLICA BRASILEIRA: um novo estudo)
Em 3 de Outubro de 2019 (Quinta-Feira)
às 9 horas
Horário (Texto com redação final.)
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O SR. PRESIDENTE (Félix Mendonça Júnior. PDT - BA) - Bom dia! Bom dia, amigos! Desculpem o atraso para o início desta reunião. O Deputado Denis Bezerra pediu escusas por não poder participar hoje da reunião, mas nós vamos dar seguimento aos trabalhos. Eu peço a todos os oradores que falem ao microfone, porque a reunião vai ser gravada e, depois, vai ser repassada para os demais membros do CEDES.
Hoje, nós temos dois palestrantes convidados: o Dr. Luiz Gonzaga de Queiroz Filho, Consultor do Departamento de Estatísticas do Banco Central, e o Sr. Fernando Alberto Sampaio Rocha, Chefe do Departamento de Estatísticas do Banco Central. Qual dos senhores gostaria de iniciar? (Pausa.)
Com a palavra o Dr. Fernando Rocha. Eu peço que o senhor fale mais perto do microfone por conta da gravação.
O SR. FERNANDO ALBERTO SAMPAIO ROCHA - Muito obrigado, Deputado Félix, pelo convite ao Banco Central para participar deste grupo de estudos. Eu acho que o tema da dívida pública é um dos temas mais relevantes da economia brasileira hoje.
Eu conversava, antes do início da reunião, com os consultores legislativos — eu tive o prazer de trabalhar com o Humberto no Banco Central há algum tempo, no começo dos anos 2000, eu conheci o João Ricardo Motta — e estava dizendo que, da mesma forma que nos anos 80 havia o problema do setor externo, hoje, já no fim da segunda década do século XXI, eu acho que o problema fiscal do País é um dos mais relevantes para a retomada do crescimento sustentável, para a retomada do crescimento do País. Então, em função disso, achamos que é muito oportuno este debate sobre a dívida pública, a reflexão que tem o Congresso Nacional, especialmente a Câmara dos Deputados.
Eu quero parabenizar aqui o Antonio Carlos d'Ávila Junior, com quem também tivemos o prazer de trabalhar no Banco Central. Nós podemos dizer que o Banco Central praticamente está representado por cinco: dois ex-colegas e nós três.
O SR. PRESIDENTE (Félix Mendonça Júnior. PDT - BA) - Então vamos aproveitar para reduzir a taxa do COPOM aqui. (Risos.)
O SR. FERNANDO ALBERTO SAMPAIO ROCHA - Exatamente! Já temos quase maioria. (Risos.)
Então, em função disso, o Banco Central preparou alguns eslaides para estimular ou começar este debate. Esses eslaides foram preparados pelo Departamento de Estatísticas do Banco Central, que tem a função precípua e praticamente única de elaborar as estatísticas econômicas oficiais do País que estão sob a nossa responsabilidade. Depois, estaremos abertos a todos os questionamentos que puderem vir e, ao longo dos trabalhos deste grupo de estudos, podem também contar conosco sempre que nós pudermos contribuir.
(Segue-se exibição de imagens.)
Na apresentação, como era uma coisa que ia ficar registrada, nós achamos melhor botar no eslaide seguinte uma série de conceitos básicos que são do conhecimento de todos sobre as competências institucionais do Banco Central; em seguida, as compilações de estatísticas oficiais pelo Banco Central — vamos apresentar sumariamente um conjunto dessas estatísticas e mostrar, de certa forma, como elas se inter-relacionam —; e, em seguida, as publicações que o Banco Central tem especificamente sobre a dívida pública.
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Eu queria aproveitar a oportunidade para passar às mãos do Deputado as duas principais estatísticas que nós vamos apresentar em seguida: uma nota técnica que o Banco Central fez no âmbito de uma auditoria sobre dívida pública conduzida pelo TCU — o que, se eu não estou enganado, veio a partir de um requerimento do Senado Federal, do Senador Álvaro Dias. Nós anexamos isso ao processo do TCU, mas também retrabalhamos numa nova apresentação para ser uma nota técnica, que está publicada no site do Banco Central e que busca mostrar os condicionantes da dívida. Em seguida a isso, apresentamos as principais características das estatísticas fiscais que o Banco Central divulga — nós achamos que esse é um conjunto importante, mas não exaustivo das informações sobre dívida pública —, o que vocês já tiveram a oportunidade de receber do Tesouro Nacional, que eu acho que complementa de uma forma absolutamente relevante esse trabalho. Por fim, mostraremos uma avaliação daqueles indicadores que conferem a dinâmica para a dívida pública.
Então, nós podemos começar com as competências institucionais do Banco Central. Desculpem-me por falar uma coisa que eu acho que é óbvia, que todos vocês já sabem. Ao Banco Central cabe a missão precípua, de acordo com a institucionalidade vigente, de assegurar a estabilidade do poder de compra da moeda, o que é traduzido operacionalmente no cumprimento das metas de inflação, definidas pelo Conselho Monetário Nacional, o que vem acontecendo nos últimos anos de uma forma bastante significativa. No ano de 2017, a inflação ficou ligeiramente abaixo do piso da meta, que era de 3% — a inflação ficou em 2,95%. Então, o Banco Central escreveu uma carta aberta à sociedade mostrando esses objetivos. E a inflação continua, de uma forma bem controlada, na faixa de 3,5% já há algum tempo.
Além disso, é missão do Banco Central manter um sistema financeiro sólido e eficiente. E nós podemos dizer que ele passou por um teste da vida real com nossa última recessão, de 2 anos e meio, do segundo trimestre de 2014 até o final de 2016. O sistema financeiro conseguiu superar essa crise, esse teste de estresse da vida real com muita solidez. É claro que ainda falta um longo caminho em termos do aumento da eficiência no sentido da redução das taxas — nós conversávamos, antes do início da sessão, sobre esse tema. Mas o que esses pontos querem ressaltar é que o papel institucional do Banco Central está vinculado às políticas monetária, cambial e de crédito do País. Dessa forma, a gestão em si da política fiscal está fora do escopo das atribuições institucionais do Banco Central. Como todos sabem, ela é atribuição do Ministério da Economia, através de sua Secretaria do Tesouro Nacional.
Mas aqui nós entramos num ponto muito importante para os economistas e para a sociedade como um todo, o que rendeu muitas discussões entre economistas, que é a inter-relação entre essas políticas. Evidentemente, as decisões do Banco Central de política monetária, de crédito ou cambial têm impacto na política fiscal. O fato mais conhecido, dentre esses, é a fixação da taxa de juros. A SELIC é uma referência importante para as taxas de juros de mercado, no qual se negociam os títulos da dívida pública. A SELIC é a taxa de um dia, e os títulos têm uma maturidade maior, mas eles sempre apresentam determinado spread sobre a SELIC, e por isso tendem a caminhar juntos.
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Um exemplo bastante interessante disso são os resultados ficais que o Banco Central divulgou na segunda-feira desta semana, que estão nas mãos do Deputado Félix. Não obstante o crescimento contínuo da dívida pública, tanto líquida quanto bruta, há vários anos, talvez os últimos 5 anos, a redução das taxas de juros e a redução das taxas de inflação, que são dois indexadores importantes da dívida pública, fizeram com que, nos últimos 12 meses, encerrados em setembro, a conta de juros da dívida pública ficasse abaixo de 5% do PIB, um valor que não se alcançava desde 2014. Não obstante o crescimento seguido que a dívida teve nesses últimos 5 anos, nós estamos, em relação ao nível do PIB, com uma conta de juros similar. Um conjunto diverso de políticas que tivesse levado a valores menores da taxa de juros poderia ter reforçado essa tendência, e nós estaríamos numa situação melhor ainda.
Mas o ponto aqui é só para dizer que é claro que essas decisões do Banco Central têm implicações fiscais, da mesma forma que as decisões sobre política fiscal têm impacto na taxa de juros. Decisões sobre política fiscal impactam a demanda agregada da economia. Nós vimos isso. As tentativas de estímulo fiscal que precederam a recessão que o País teve de 2014 a 2016 — e que duraram inclusive por esse período — levaram a taxa de inflação a patamares maiores.
Embora esse impacto recíproco seja um tema relevante nas políticas econômicas, ele é uma consequência, pelo menos no nosso ponto de vista. A política monetária do Banco Central é feita visando o controle da inflação de acordo com as metas estabelecidas pelo Conselho Monetário Nacional — CMN. As externalidades com a política fiscal, que podem, digamos assim, simplificadamente, ser favoráveis numa determinada conjuntura e menos favoráveis ou desfavoráveis em outra conjuntura, são consequências dessas decisões. Da mesma forma, acreditamos que a política fiscal tem impactos nas políticas geridas pelo Banco Central.
No eslaide seguinte, nós vemos um sumário bem breve sobre as estatísticas oficiais que o Banco Central divulga. O conceito de estatísticas oficiais é definido pela ONU, que é responsável pelo sistema de contas nacionais, que é o grande guarda-chuva para todo o conjunto estatístico que é produzido nos diversos setores de todos os países do mundo e que se refere àquelas estatísticas econômicas que por um lado são básicas, fundamentais, e por outro lado são produzidas pelos órgãos estatais responsáveis por elas, sejam institutos nacionais de estatística — no caso brasileiro, o IBGE —, sejam os bancos centrais.
Nesse caso, a legislação que cuida do Sistema Estatístico Nacional é bastante antiga: foi elaborada em 1973 e 1974. O IBGE tem uma série de iniciativas, e inclusive está tentando organizar, com um conjunto de Deputados na Câmara, a discussão de temas estatísticos, geográficos ou de geociências de uma forma mais abrangente, e tem uma sequência de propostas para revisar essa legislação estatística.
Pelas informações que nós temos da Presidente do IBGE, Susana Guerra, essa revisão tem duas diretrizes principais. Uma primeira, mais imediata, é fruto de um seminário realizado no mês passado no Instituto Serzedello Corrêa, do TCU, um seminário internacional com participação do Banco Mundial e de outros países, para ter uma legislação moderna sobre registros administrativos, que nada mais são do que aquelas informações que o setor público já coleta a partir das suas atividades-fim. Por exemplo, a Secretaria de Comércio Exterior — SECEX, ao fazer a normatização e o controle das operações de comércio exterior, tem informações sobre exportações e importações; da mesma forma, as Secretarias das Fazendas dos Estados, ao fazerem as notas fiscais eletrônicas, têm essa base de dados, esse registro administrativo. A intenção do IBGE e do Sistema Estatístico Nacional é apenas aprovar uma legislação que possa tornar possível o compartilhamento dessas bases de dados que os órgãos já possuem. Sem trazer nenhum esforço, seja à Receita Federal, ou às Secretarias Estaduais de Fazendas, ou à SECEX, haverá um compartilhamento com o IBGE para fins de produção de estatística. O IBGE avalia que as notas fiscais eletrônicas, por exemplo, têm capacidade, sozinhas, de gerar uma boa proxy, em tempo real, diariamente, no limite, de todo o conjunto de atividades econômicas do País através das transações do comércio. Eles têm informação de setores e tudo. Essa é uma iniciativa que o IBGE está liderando.
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A outra diretriz, na sequência dessa, seria modernizar a legislação dos anos 70 para que nós possamos ter, de fato, um Sistema Estatístico Nacional moderno, previsto e encabeçado pelo IBGE, possivelmente composto por Banco Central, Secretaria da Receita Federal, Secretaria do Tesouro Nacional e outros órgãos públicos que produzem estatística.
Nesse universo de produção de estatísticas, cabe ao Banco Central um conjunto de estatísticas que são — eu diria que nas condições do Banco Central do Brasil, da forma como se dão as relações econômicas no País — meio que naturais ao Banco Central. Por exemplo, as estatísticas do setor externo. O Brasil é um dos países que ainda mantém contrato de câmbio para trocas com o exterior. Isso é regulamentado pelo Banco Central desde os anos 60, com a Lei de Capitais Estrangeiros. Então, essas informações já estão no Banco Central, assim como o registro de capitais estrangeiros. O Banco Central faz as estatísticas do balanço de pagamentos do País e da dívida externa.
Da mesma forma, as operações de crédito são operações de entes regulados pelo Banco Central que informam regularmente ao Banco Central as suas operações. Então, nada mais natural — parece-me — o Banco Central fazer as estatísticas monetárias e de crédito.
A mesma coisa acontece também com as estatísticas fiscais. Simplificando bastante, há um conjunto de estatísticas fiscais divulgado pelo Tesouro Nacional chamado "acima da linha", que capta todas as transações entre agentes da economia com o setor público, uma a uma. O Tesouro Nacional consegue saber cada operação, cada liberação de recursos, cada recebimento, porque foram feitos através desse balanço de receitas e despesas. Ele gera as estatísticas fiscais através dessa metodologia "acima da linha". Da mesma forma como ele — digamos, eu acho que eu posso falar isso — controla o endividamento dos entes públicos, ele também tem o montante da dívida do Governo Central.
Mas o Banco Central tem uma vantagem comparativa: conseguimos ver o reflexo dessas operações fiscais pelo endividamento, pelos balanços de quem são os credores do setor público, que são basicamente os bancos — através da dívida bancária —, os títulos públicos — a dívida mobiliária, que é negociada no ambiente do Banco Central, o Sistema Especial de Liquidação e de Custódia, o SELIC —, e também pela dívida externa do setor público. Com esses três principais elementos e mais uma série de outros, o Banco Central tem essas fontes de acesso e divulga as estatísticas de endividamento do setor público e os resultados pelo critério "abaixo da linha", que servem inclusive de comparação com os resultados do Tesouro Nacional. Além disso, o Banco Central faz parte de uma série de iniciativas internacionais de produção estatística. Nós colocamos, exemplificativamente, algumas que têm a parte fiscal de forma muito destacada, como o Padrão Especial de Disseminação de Dados do Fundo Monetário Internacional — FMI. Agora, inclusive, o Banco Central está trabalhando — e deve ainda neste ano concretizar o objetivo — para passar para um Padrão Especial plus, um conjunto mais restrito, de 14 a 18 países, que atualmente tem uma certificação mais elevada. O Brasil já está muito próximo de chegar lá. Há também uma série de temas estatísticos. Pois não, Humberto.
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O SR. LUIZ HUMBERTO CAVALCANTE VEIGA - Você está falando dessa questão da estatística do FMI. Eles têm algumas estatísticas. Por exemplo, a quantidade de crédito concedido por bancos versus a quantidade de crédito total. Essa informação é coletada por vocês? É o Banco Central que coleta isso?
O SR. FERNANDO ALBERTO SAMPAIO ROCHA - Muito obrigado, Humberto, pela sua pergunta.
Neste caso, com os desenvolvimentos recentes do setor financeiro, a parte do crédito bancário especificamente se tornou apenas uma parte, metade talvez, do crédito total da economia. Existem os créditos de mercado de capitais, existem os créditos entre os próprios setores. O crédito bancário é uma parte. Nós temos duas formas de compilar essa estatística de crédito. Uma é olhando exatamente os agregados monetários mais amplos — M4 —, que são o funding para as operações de crédito. Então, é como se nós olhássemos a operação de crédito no ativo do banco e o funding através dos agregados monetários no passivo dos bancos.
O Banco Central passou a divulgar, a partir de maio deste ano, maio de 2019, com a publicação do Relatório de Economia Bancária, e depois, regularmente, mensalmente, numa nota para imprensa, um agregado que nós chamamos de crédito ampliado ao setor não financeiro. Nós pegamos todas as operações de crédito do setor financeiro e as dividimos entre créditos bancários, utilização de títulos de dívida, sejam os que estão no SELIC, em debêntures, mas também instrumentos securitizados, certificados de recebíveis imobiliários e agrícolas e também operações de endividamento externo.
Então, essa estatística já está divulgada regularmente pelo Banco Central. Se incluirmos o Governo geral, ou seja, todo o setor não financeiro da economia, isso chega a praticamente 140% do PIB brasileiro. Se nós incluirmos apenas o setor privado não financeiro, excluindo o Governo geral, nós temos algo como 80% — setenta e tantos por cento — do PIB, em relação ao crédito bancário, que é um pouco menos de 50%. Já chegou a ser 50%, mas se reduziu.
Essa informação nós temos. Ela é informada para o FMI, que a gera por metodologia própria — mas os dados são do Banco Central —, e ela também é gerada com metodologia própria pelo Banco de Compensações Internacionais — BIS. Nós estamos trabalhando com esses dois órgãos para ver se as diferenças persistem e se nós podemos unificar essas três, mas ainda não chegamos lá.
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Peço que passe para o próximo eslaide para focarmos nas estatísticas fiscais.
As estatísticas fiscais de dívida líquida do setor público e os consequentes resultados fiscais do setor público, que se iniciaram nos anos 90, em 1991, seguiam um manual padrão de referência internacional elaborado pelo FMI em 1986. De lá para cá, temos feito aperfeiçoamentos nessa metodologia. Um dos mais recentes foi um aperfeiçoamento em função do resultado do processo no TCU sobre o caso que ficou comumente conhecido como o das pedaladas. Nós incluímos alguns passivos do setor público junto a bancos e a outras instituições não bancárias e passamos a compilá-los por competência. Em seguida a isso, revisamos a metodologia específica para a apropriação dos resultados do Fundo de Financiamento Estudantil — FIES, esclarecemos sobre securitização e uma série de outros pontos. Como todas as estatísticas, o manual está em constante aperfeiçoamento.
Hoje estamos numa situação que é um pouco, digamos, híbrida entre as versões desses manuais de 1986 e 2014. Em função disso, publicamos, de acordo com uma determinação do TCU, de meados dos anos 2000, o Manual de Estatísticas Fiscais do Banco Central, detalhando essas estatísticas. Sua última atualização foi em maio deste ano, para incluir uma estatística nova que passamos a publicar: o Patrimônio Financeiro Líquido do Governo Geral. Essa estatística, especificamente, tem várias características próprias pelo fato de ela ser usada para apuração das metas de resultado, se o Governo Central atingiu ou não as suas metas de resultado primário. Isso confere uma rigidez maior para essa estatística — os seus dados, por exemplo, não são revisados —, mas acreditamos que ela está bem alinhada com os padrões internacionais, não obstante algumas diferenças. Já que o Humberto mencionou outras estatísticas do FMI, há tipicamente dois conceitos de dívida bruta: um que o Banco Central publica; outro que está de acordo com a metodologia do FMI. Ambos são publicados, no caso, pelo Banco Central.
Temos aqui um conjunto de informações que, acreditamos, podem ser importantes para o trabalho que vai ser desempenhado pela Câmara dos Deputados, pelo grupo de estudos. O Banco Central está inteiramente à disposição de todos os senhores e todas as senhoras para explicar, detalhar, fazer reuniões específicas e buscar responder algum questionamento que exista. Esse conjunto de estatísticas está regularmente atualizado na página do Banco Central. Eu diria que as estatísticas de necessidade de financiamento e de dívida pública são estatísticas básicas que o Banco Central tem sobre política fiscal. Apuramos os estoques da dívida líquida e bruta e, a partir da variação dos estoques da dívida líquida, por exemplo, geram-se os resultados: quanto foi agora o déficit primário do Governo Central ou do setor público, as contas de juros e tudo.
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O que nós colocamos em segundo lugar é exatamente o texto dessa nota técnica que eu compartilhei com o Deputado Félix Mendonça Júnior, que foi feita a partir de uma auditoria do TCU. O foco da nota é exatamente, olhando as nossas estatísticas, o que está por trás da evolução da dívida pública. Primeiro, o que essa nota não tem? Ela não tem uma avaliação da política fiscal, em qualquer período. Ela não diz se essa política está certa, se ela está errada, e tal. Ela busca ser uma nota estatística. Então, do ponto de vista das estatísticas do Banco Central, o que nós podemos ver? O que está por trás do aumento da dívida pública. Nós abrimos a dívida pública por componentes, mostrando, digamos assim, qual o papel da acumulação de reservas internacionais que o Brasil fez entre 2005 e 2009 — a última compra foi em 2012 —; qual o papel das operações compromissadas, que inicialmente cresceram por causa das reservas. O Banco Central comprava dólares do setor bancário e entregava reais. Com isso, a liquidez da economia se ampliava, e o Banco Central realizava uma série de operações compromissadas para voltar essa liquidez para o padrão anterior. Nesse processo, nosso estoque de reservas, que era de 50 bilhões de dólares em 2005, quadruplicou até às vésperas da crise internacional de 2009, quando chegamos a 200 bilhões de dólares. Isso se refletiu também em centenas de bilhões de dólares em operações compromissadas naquele período. Em seguida, nós continuamos a comprar reservas. Hoje a reserva está por volta de 380 bilhões de dólares.
No período em que nós compramos reservas, as operações compromissadas foram utilizadas, no sentido técnico, para esterilizar os impactos de liquidez em moda nacional. Só que, depois disso, as operações compromissadas atingiram o patamar atual — hoje elas superam 1 trilhão de reais —, e a partir daí os próprios juros que incidem sobre as operações compromissadas têm um determinado papel.
Então, a ideia que está por trás dessa nota técnica é exatamente abrir cada um desses fatores, mostrar as estatísticas. Nós fizemos a nota técnica em 2017. Se nós não atualizássemos as tabelas, ela teria uma informação muito limitada. Nós atualizamos esse conjunto de informações semestralmente, sempre após a divulgação do resultado do balanço semestral do Banco Central. Então, agora em outubro nós devemos fazer essa atualização para o primeiro semestre do ano de 2019.
Nós temos, além desse conjunto, um conjunto de outras estatísticas, todas inter-relacionadas, que permitem a verificação de consistência das estatísticas fiscais. Elas se relacionam com as estatísticas de mercado aberto. Digamos que este, dentro do conjunto estatístico do Banco Central, é o lugar onde nós podemos ver todos os detalhes da dívida mobiliária do Governo Federal, que é negociada no SELIC, lá dentro do Banco Central. Temos as estatísticas externas, com todos os fluxos do endividamento externo do setor público; as estatísticas monetárias, pelas quais nós podemos ver os impactos desse endividamento na base monetária; um conjunto de estatísticas fiscais regionalizadas, as quais não sei se são o foco aqui — acho que não —; e também um conjunto de indicadores que são atualizados semanalmente e que permitem avaliar alguns indicadores importantes para políticas do Banco Central.
Esses indicadores são dois, especificamente. Um trata do resultado do Banco Central com as operações cambiais, que são basicamente os swaps que o Banco Central faz e as operações com reservas. Posso estar cometendo alguma impropriedade, mas acho que desde 2008, com a lei sobre equalização de resultados do Banco Central em relação ao Tesouro Nacional, esses resultados cambiais do Banco Central davam ensejo a uma relação com o Tesouro Nacional: prejuízos do Banco Central eram cobertos pelo Tesouro com emissão de títulos; e lucros do Banco Central, a partir das operações cambiais, eram transferidos para o Tesouro mediante depósitos na Conta Única. Então, havia uma assimetria entre os resultados. Eles acabavam, nos balanços das duas entidades, nunca se anulando.
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Tipicamente, no caso brasileiro, se ocorresse, digamos, um semestre de crise, a taxa de câmbio desvalorizava; no momento seguinte — o que foi muito comum da década de 2000 para cá — havia um ajuste de políticas, e a taxa de câmbio se apreciava. Então, o Banco Central podia, por causa da sua exposição em reservas, ter um prejuízo de dezenas de bilhões de reais num semestre e um lucro de dezenas de bilhões de reais no semestre seguinte. Em vez desses resultados se anularem no tempo, eles davam ensejo a um fluxo do Banco Central para o Tesouro e do Tesouro para o Banco Central, de acordo com essa lei de 2008.
Essa tabela, a qual divulgamos semanalmente, busca atualizar, de forma tempestiva, as estimativas desses resultados. No primeiro semestre deste ano, o Congresso Nacional aprovou uma lei que mudou essa relação entre o Banco Central e o Tesouro Nacional. Ela entrou em vigor no dia 1º de julho. Então, a partir dos resultados deste segundo semestre de 2019, não haverá mais essa ida de recurso e volta de recurso naquela magnitude de dezenas de bilhões de dólares porque, quando o Banco Central tiver lucro com as suas operações cambiais, esse resultado será, digamos assim, guardado no Banco Central numa conta de reserva de resultados. E a partir da constituição dessa conta de reserva de resultados, quando tiver prejuízo, o Banco Central não receberá nada do Tesouro, mas ele vai fazer um débito nesta conta. Então, se o desenho dessa política se mostrar bem sucedido, haverá um aumento e uma redução dessa conta de reserva de resultados no resultado do Banco Central, sem que isso implique fluxos financeiros.
Do ponto de vista estatístico, o mais importante é que essa tabela com os resultados é atualizada semanalmente. Em conjunto com ela, o Banco Central recentemente deu um novo indicador sobre a sua política cambial, que é a posição cambial líquida do Banco Central, observando exatamente não só as reservas, que são de 380 bilhões de dólares, mas também os swaps, cujo valor nocional é de mais ou menos 60 bilhões de dólares, no sentido contrário: o Banco Central é ativo em dólar com a reserva e passivo em dólar com os swaps. A posição cambial líquida do Banco Central é divulgada também semanalmente.
Com esse conjunto de estatísticas e com as séries históricas que elas geram, eu acho que nós temos um conjunto bastante sólido de informações para subsidiar os estudos do Banco Central. Acho que essa é a principal mensagem que nós teríamos a dar aqui.
Olhando as estatísticas fiscais especificamente, neste eslaide que está na tela, nós sempre vimos as estatísticas fiscais do Banco Central e a razão própria pela qual elas foram criadas, no começo dos anos 1990, como uma forma de o Banco Central poder avaliar especificamente o impacto das ações do Governo no conjunto da demanda agregada, ou seja, no conjunto da economia, e como isso poderia se refletir na inflação. Então, esse conjunto de informações serve de subsídio para a tomada de decisões pelo Banco Central, e, é claro, depois de uma estatística pronta, o seu objetivo natural é ser divulgada para toda a sociedade. Mas nós, no Banco Central, continuamos vendo essa estatística como uma forma de medir, naquela equação de demanda, o "G", os Gastos do Governo.
Acho que o Humberto tinha uma questão.
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O SR. LUIZ HUMBERTO CAVALCANTE VEIGA - Fernando, no caso, vocês usam a informação do endividamento para avaliar a demanda agregada. Qual é o intervalo que tem o acesso à informação e em quanto tempo, em geral...? Na realidade, isso seria de conhecimento mais do departamento econômico do Banco, mas provavelmente você sabe disso e de mais um pouco. Então, se você puder dar um esclarecimento, eu agradeceria.
O SR. FERNANDO ALBERTO SAMPAIO ROCHA - Sobre o mecanismo de transmissão?
O SR. LUIZ HUMBERTO CAVALCANTE VEIGA - Sim, o mecanismo de transmissão da demanda agregada.
O SR. FERNANDO ALBERTO SAMPAIO ROCHA - Essa é uma daquelas perguntas sobre economia que envolve variáveis que não são diretamente observadas. Com isso, nós temos que usar uma série de ferramentas estatísticas e econométricas para poder definir. Só não é mais difícil do que dizer qual é a taxa de câmbio de equilíbrio. Em geral, na economia brasileira, a propagação de um choque na economia para o conjunto da atividade ou a propagação mais precisamente de uma decisão sobre taxa de juros para o conjunto de atividade leva, para atingir o seu efeito máximo, três trimestres. É por isso que o Banco Central, ao buscar tomar uma decisão de política monetária, está sempre olhando para frente. Alguns economistas até dizem que, na verdade, o sistema de metas para a inflação é um sistema de metas para a projeção da inflação. Então, nós não só olhamos a inflação corrente, mas as perspectivas para a inflação no futuro e agimos se estas perspectivas mudarem.
Um ponto importante da pergunta do Humberto. O Banco Central tem feito questão de dizer, há vários anos, que não há nenhuma decisão mecânica nas suas ações, de tal forma que o câmbio passou de 3,70 reais para 4,20 reais. É claro que a desvalorização do câmbio pode aumentar um conjunto de preços que são determinados em dólares e aumentar a inflação, mas exclusivamente da variação do câmbio não se deduz nenhuma regra de política monetária, porque não há uma forma mecânica de comunicação linear entre um e outro.
Da mesma forma, sobre os choques que podem advir do setor público, tanto de choques refletidos no aumento de gastos quanto no controle de gastos, nós temos que ver as condições mais gerais da economia, a sua forma de propagação, a credibilidade do Banco Central, a ancoragem das expectativas, para que o Banco Central possa decidir atuar sempre olhando em relação ao futuro e tendo a estimativa de que a sua atuação leva por volta de 3 trimestres para atingir o seu impacto máximo.
Voltando para a estatística fiscal, uma coisa que eu já falei aqui é que os bancos centrais acabam tendo uma condição mais favorável de fazer essa estatística pela ótica do financiamento "abaixo da linha", por causa das disposições que têm.
No eslaide seguinte, vamos ver o detalhamento da nota técnica, da qual eu já comentei os principais aspectos.
No próximo, vemos uma tabela com links remetendo para as disposições.
Esse próximo é um conjunto de informações dos fatores condicionantes que estão na nota técnica. Poderíamos mencionar rapidamente os principais.
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Peço ao Luiz Queiroz que detalhe esses fatores.
O SR. LUIZ GONZAGA DE QUEIROZ FILHO - Pois não. Obrigado.
Detalhando mais um pouco a evolução da dívida pública, vemos que ela é explicada por diversos fatores. A nota técnica elaborada por esta Casa, em 2005, expõe muito bem esses fatores, é uma visão teórica muito abrangente. Quando se vai analisar entre um período e outro, alguns fatores que eram relevantes em um determinado período deixam de ser tão relevantes e passam a adquirir importância em função de outros fatores. Por exemplo, nos anos 2000, havia uma concentração muito grande de dívida em dólar, um perfil da dívida mobiliária totalmente diferente do que é hoje, com títulos atrelados a taxas pré-fixadas ou a índices de preço com uma participação reduzida. Isso mudou. Nós tivemos renegociações de dívidas de Estados e Municípios que foram relevantes naquele período e influenciaram a trajetória depois da dívida, a própria LRF. Enfim, há um conjunto de fatores que se apresentam ao longo do tempo de forma dinâmica.
O que explica a evolução da dívida? O primeiro ponto é saber qual o indicador da dívida nós iremos analisar. O indicador da dívida líquida do setor público é o mais abrangente. Através da análise da dívida líquida, obtém-se a resposta da totalidade dos fatores que afetam as contas públicas. É claro que, ao se analisar só o passivo, é uma variável complementar importante, mas não contém todas as respostas, porque esses passivos podem aumentar ou diminuir independentemente das condições da política fiscal. A dívida líquida, apesar de ter um patamar menor por acumulação de ativos, retorno de ativos ou ganhos e perdas com esses ativos, por ser mais abrangente consegue visualizar todos esses custos de maneira uniforme ao longo dos períodos. Para se ter uma ideia mais ampla, é preciso ver o impacto do resultado primário, dos juros, da variação cambial, do reconhecimento de dívidas e privatizações. Esses dois últimos foram importantes na década de 2000.
No caso da dívida bruta, o que influencia a variação da dívida bruta? O próprio resultado primário, que é feito para gerenciar dívidas, e os juros incorporados sobre essa dívida. Nós saímos de um cenário anterior de juros mais altos, e, agora convivendo com a realidade de juros mais baixos, essa variável não está tendo tanta relevância como teve no passado. É claro, nós temos um estoque de dívida expressivo que vai continuar apropriando esses encargos, mas, em termos da dinâmica da dívida em relação ao que ocorria na década passada, esse fator está mais contido. Ao longo do período, houve as aquisições de reservas internacionais, como Fernando mencionou.
Todos esses fatores podem ser dimensionados em números, em séries históricas, desde 2001. Essa nota é a contribuição de cada um deles para cada período, momentos em que eles contribuíram para aumentar ou diminuir a dívida.
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O SR. LUIZ HUMBERTO CAVALCANTE VEIGA - Gostaria de fazer uma pergunta.
De acordo com o que você está falando, Queiroz, esses itens têm um peso no componente da evolução, e esse peso é variável no tempo. Em 2010, o peso era um; em 2015, era outro; em 2019, era outro. Esse detalhamento está nas estatísticas?
O SR. LUIZ GONZAGA DE QUEIROZ FILHO - Sim, é possível visualizar isso.
O SR. LUIZ HUMBERTO CAVALCANTE VEIGA - Por ano, podemos visualizar qual o peso de cada um desses elementos?
O SR. LUIZ GONZAGA DE QUEIROZ FILHO - Sim, inclusive, com uma análise gráfica você consegue visualizar cada um deles e em tal período que esse fator foi mais relevante do que esse.
O SR. LUIZ HUMBERTO CAVALCANTE VEIGA - Eu já acessei esses relatórios. Cheguei a ver mais no final que, no acumulado de 10 anos, tal item teve tantos por cento de peso, mas não vi isso quebrado mês a mês.
O SR. LUIZ GONZAGA DE QUEIROZ FILHO - Perfeito, foi muito importante essa colocação, porque, embora ele mostre os dados acumulados ao longo do período, podemos ver a contribuição de cada um deles para cada ano. O objetivo dessa nota foi servir de referencial teórico para essa análise, para apontar quais os caminhos necessários e viáveis de serem analisados e para, ao mesmo tempo, atualizar os dados dinamicamente. Como Fernando mencionou, a cada período nós vamos atualizando esses dados. E o dado do primeiro semestre de 2019 vai ser atualizado no mês seguinte.
A partir dos dados de cada ano e do detalhamento das informações que estão na nota de imprensa, há um conjunto de tabelas atrelado a essa nota com informações de cada ano. Assim, podemos ver a contribuição de cada fator, porque a nota passa por cada um desses fatores. Cada um deles é abordado em termos quantitativos e na série.
Se houver alguma dificuldade na informação e seja necessário algum detalhamento, nós podemos casar isso com outros dados mais detalhados que são divulgados.
O SR. FERNANDO ALBERTO SAMPAIO ROCHA - Para esse objetivo, fazendo um estudo mais detalhado, mais robusto, que é o caso da Câmara dos Deputados, o conjunto de tabelas é mais apropriado. Existe um link para o conjunto de tabelas com a informação ano a ano e a quebra do semestre. Nesse caso, quando atualizarmos, só vai haver o primeiro semestre de 2019, depois nós substituiremos pelo ano 2019.
O SR. LUIZ GONZAGA DE QUEIROZ FILHO - Seguindo, nós temos o empréstimo a bancos oficiais que contribuiu para o aumento da dívida bruta no período de 2009 a 2014. Só exemplificando esse ponto que você colocou, vemos a contribuição dele ano a ano e quanto contribuiu para o aumento da dívida. No final de 2015 até 2019, vemos esse fator contribuindo no sentido inverso pelo retorno de grande parte desses desembolsos.
Outras operações financeiras do Governo Federal. Nós temos alguns fatores que contribuem de forma permanente, olhando só para efeito de dívida bruta. No caso da dívida líquida, os repasses do FAT, por exemplo, para o BNDES não têm impacto na dívida líquida, mas têm impacto na dívida bruta.
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Por exemplo, no caso de arrecadação de um tributo do PIS/PASEP, o tributo é repassado, sob a forma de créditos, para financiar o desenvolvimento. Então, nesse movimento de repasse, ele tem um impacto na dívida bruta também. Quando o Banco Central faz alguma movimentação com compulsórios, isso mexe nas condições de liquidez, isso afeta a dívida bruta, porque as operações compromissadas fazem parte do conceito.
Nós temos outros itens, como, por exemplo, a variação cambial. Esse item, no passado, de 2000 a 2005, principalmente, até 2008, foi muito relevante, porque nós tínhamos um estoque da dívida bruta em termos de passivos, e quase metade deles — 45% a 46% — era atrelada ao dólar. Estou falando aqui do lado dos passivos. Então, esse fator foi muito relevante no período. Hoje ele está em menos de 5% do total, ou seja, mesmo uma desvalorização cambial expressiva não contribui para o aumento significativo do estoque da dívida. Então, é mais um exemplo de fatores que atuam de forma diferente ao longo do tempo.
Passando para o ponto seguinte, temos as operações compromissadas. Ao avaliar a dívida bruta, é importante também avaliar as operações compromissadas não pelo impacto que elas têm em si, porque por si só as operações compromissadas não são responsáveis pela dinâmica da dívida bruta. O que acontece? A operação compromissada, por natureza, tem efeito líquido neutro no balanço do setor público. A contrapartida de uma variação nas operações compromissadas, que é um passivo do Banco Central, ela sempre tem como contrapartida ou a redução de um passivo do próprio Banco Central ou um aumento de um ativo do próprio Banco Central. Cito o exemplo de um e de outro: quando o Tesouro emite ou resgata títulos da dívida mobiliária, qual é o impacto disso no passivo do Banco Central? A saída ou a entrada do recurso na conta única, que é um passivo do Banco Central, é sensibilizada. E a contrapartida disso são os impactos nas operações compromissadas, porque afetam a liquidez, seja aumentando ou diminuindo.
Outro exemplo, que o Fernando já comentou, é a aquisição de reservas. Você adquire reservas, expande a liquidez e enxuga essa liquidez com operações compromissadas, mas você contabilizou um ativo no balanço do Banco Central, que são as reservas internacionais. É claro que, em termos técnicos, esse ponto não é tão relevante nas análises técnicas, mas, às vezes, quando há uma análise, as pessoas verificam que o estoque das operações compromissadas corresponde a tanto, que isso é tanto por cento da dívida líquida. É uma análise que, digamos assim, precisa ser contextualizada, porque ela em si não contribui para aumentar a dívida líquida das operações compromissadas, porque ela tem uma contrapartida sempre no balanço do setor público e termina gerando um impacto neutro.
Por isso, é importante acompanhar a evolução dos fatores desse item isoladamente, mesmo que ele seja apenas um componente que está ali na dívida bruta, para mostrar o que interfere nessas operações: o próprio resultado primário, os juros sobre o estoque dessas operações que foram acumuladas ao longo do tempo e as operações do Governo Federal com títulos. Quando o Governo emite ou resgata títulos da dívida mobiliária, isso tem uma contrapartida nas operações compromissadas para mais ou para menos, embora essas operações do Governo Federal para o impacto das operações compromissadas, ao longo do tempo, tendem a ser neutras, porque, quando o Governo emite dívida, faz um superávit primário, ele contribui para reduzir as operações compromissadas. Ele usa esse superávit primário para liquidar a dívida. Então, as operações compromissadas voltam ao patamar anterior, ou seja, quando o Governo está dando déficit, o raciocínio é o mesmo: ele expande a liquidez e aumenta as compromissadas por conta do déficit, mas, ao mesmo tempo, ele tem que financiar o déficit. Então, ele emite títulos para financiar esse déficit.
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A contribuição das operações com títulos do Governo Federal, ao longo do tempo, tende a ser de neutra até para contracionista, pelo fato de que o Governo emite muito também para formar o seu colchão de liquidez na conta única, para administrar a dívida em situações que têm concentração de vencimentos, esse tipo de coisa. É claro que essa é uma análise que tem que ser feita em termos intertemporais. Se pegar uma análise dessa apenas num ponto, você pode ver qualquer resultado e tirar conclusões que muitas vezes são precipitadas.
A dívida do Governo está contribuindo para aumentar operações compromissadas ou não? Essa é uma análise tem que ser feita de forma dinâmica.
O SR. LUIZ HUMBERTO CAVALCANTE VEIGA - Eu ia só comentar, porque, na realidade, você tocou na minha principal função no grupo. Eu só vim parar aqui por causa das operações compromissadas.
Eu queria aproveitar a presença do David para solicitar a presença de alguém na Mesa que lide com as operações compromissadas, para vermos esses detalhes. Peço a Juliana que marque esse encontro.
Mas, o que nós vemos aqui é uma questão de tempo. Ter um volume muito expressivo causa uma certa estranheza, do ponto de vista do montante. É uma decisão bastante difícil, é um julgamento muito difícil chegar a um montante. Isso é política monetária. Até que montante, vamos dizer assim, um produto está sendo utilizado pelo banco. O Banco Central está fornecendo um produto financeiro para que as instituições financeiras o utilizem.
Eu acho que essa é uma preocupação que nós temos. Estivemos com o pessoal do Tesouro, na reunião anterior, e discutimos esse ponto.
Então, era isso que eu queria falar.
O SR. FERNANDO ALBERTO SAMPAIO ROCHA - Não, eu acho que foi importante...
Pois não, Deputado.
O SR. PRESIDENTE (Félix Mendonça Júnior. PDT - BA) - Sobre as operações compromissadas, qual o custo delas e o quanto elas se distanciam em relação às operações que são baseadas na SELIC, pura e simplesmente? Em média, porque eu sei que as operações diferem muito.
E sobre o percentual da dívida pública, qual fica atrelado à SELIC — são as mobiliárias, não é? — e qual percentual fica atrelado às operações compromissadas hoje em dia?
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O SR. FERNANDO ALBERTO SAMPAIO ROCHA - Muito obrigado, Deputado.
E, grosso modo, sem uma precisão mais definida, podemos dizer que os custos das operações compromissadas são a taxa Selic. No caso brasileiro, as operações compromissadas curtas têm, em geral, observado uma faixa de 10 pontos básicos, 0,1 ponto percentual abaixo da taxa SELIC.
Nas operações compromissadas há uma parcela feita com prazos muito curtos, que é a SELIC efetiva, e outras que vão crescendo até chegar a 3, 6 e 9 meses. Essa função das operações compromissadas curtas é manter a taxa SELIC efetiva, ou seja, aquela que é efetivamente negociada no mercado de reservas bancárias no nível definido pelo Comitê de Política Monetária do Banco Central. Para uma taxa de 5,5%, a taxa SELIC efetiva deve estar nesses dias — e não tenho o número exato aqui — em 5,40%.
Em relação aos indexadores ...
O SR. LUIZ HUMBERTO CAVALCANTE VEIGA - Só um detalhe. O pessoal do Tesouro disse aqui que havia um spread na operação compromissada. Quer dizer, ele falou que era mais do que SELIC.
O SR. FERNANDO ALBERTO SAMPAIO ROCHA - Claro. Não nas operações curtas que definem exatamente a taxa SELIC efetiva de mercado. No caso de operações a termo, com um prazo um pouco maior, nas operações compromissadas é possível que tenha. Eu não tenho esse número de cabeça, mas consultando a Nota para a Imprensa - Mercado Aberto ou levando essa pergunta aos colegas do Departamento de Operações de Mercado Aberto, eles vão ter essa informação precisa, inclusive uma série delas.
O SR. PRESIDENTE (Félix Mendonça Júnior. PDT - BA) - Cada operação dessa compromissada é justificada por uma necessidade ou isso torna agora praticamente automático? Tem reserva no sistema financeiro, vai para a operação compromissada, ou se justifica, a se tomar cada uma dessas operações compromissadas, se há uma reunião, se há uma decisão para cada operação, ou é uma coisa mais automática hoje no Banco Central?
O SR. FERNANDO ALBERTO SAMPAIO ROCHA - Até onde eu conheço do tema, e certamente o Departamento de Operações de Mercado Aberto poderá dizer melhor, a operação compromissada feita pelo Banco Central do Brasil não difere das operações compromissadas feitas, por exemplo, pelo Federal Reserve, o Banco Central dos Estados Unidos, ou pelo Banco Central Europeu e pelos principais Bancos Centrais. No Federal Reserve, inclusive, como eles têm uma situação bastante específica, eles são um conjunto diferentes de bancos que são independentes entre si, o Board do Federal Reserve toma decisão em relação à taxa de juros e diz lá: "Agora é 1,75". Um intervalo nos Estados Unidos. No mesmo momento, numa instrução seguinte, ele instrui o Federal Reserve de Nova York, que é o Banco Central Regional de Nova York que cuida da mesa de Operações de Mercado Aberto do FED, a fazer as operações compromissadas nos montantes necessários para manter a taxa do Effective Federal Funds nos mesmos níveis da taxa dos FED Funds que foram decididos pelo FOMC, nos Estados Unidos.
Aqui, no Brasil, não acontece diferente. O mesmo Banco Central não precisa que a diretoria informe. É claro que a diretoria instrui o Departamento de Operações de Mercado Aberto. No dia a dia, o Departamento de Mercado Aberto faz uma previsão das condições de liquidez daquele dia e da demanda que vai ter por colocação de operações compromissadas ou da expansão da quantidade de operações compromissadas ou da redução da quantidade de operações compromissadas, sempre com o interesse de manter a taxa de juros da SELIC efetiva nos níveis determinados pelo COPOM.
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Então, nesse gerenciamento do dia a dia, as decisões são tomadas de acordo com essas perspectivas para a liquidez, e o Departamento de Mercado Aberto tem um amplo calendário, digamos assim, de efeitos que vão impactar com isso, desde os casos mais básicos pontualmente. Sabe-se, antecipadamente, exatamente os dias em que vai haver a oferta de títulos públicos pelo Tesouro Nacional ou o resgate desses títulos públicos.
O Tesouro Nacional faz as ofertas semanalmente, e cada título emitido já tem seu prazo de vencimento. Então, quando o Tesouro coloca títulos públicos, a liquidez se reduz, e, quando ele resgata títulos públicos, a liquidez aumenta. E o Banco Central, através do seu Departamento de Mercado Aberto, tem que agir para eliminar esses efeitos de variação da liquidez. Da mesma forma, intervenções do Banco Central ou demandas sazonais por moeda, como é o caso de fim de ano, todas essas operações são vistas.
Então, podemos dizer que o Banco Central tem uma avaliação sobre as condições de liquidez a cada momento, diariamente, e atua para, digamos assim, contrabalançar esses efeitos. Você tem uma expansão inesperada de liquidez, você atua para reduzir, ou seja, você tem uma redução inesperada de liquidez, você atua para fazer.
Agora, eu não tenho conhecimentos mais detalhados sobre como se dá esse cálculo efetivamente.
O SR. LUIZ HUMBERTO CAVALCANTE VEIGA - Deputado, eu queria propor ao Davi, que é o Chefe de Departamento de Relações Institucionais, que convide alguém da área de operações para fazermos um debate aqui. Eu acho que a Juliana pode entrar em contato com ele.
Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Félix Mendonça Júnior. PDT - BA) - Pode sim.
O SR. LUIZ HUMBERTO CAVALCANTE VEIGA - Obrigado.
O SR. FERNANDO ALBERTO SAMPAIO ROCHA - Acho que faltou uma pergunta sobre os percentuais.
O SR. LUIZ GONZAGA DE QUEIROZ FILHO - Isso. Só respondendo ao questionamento do Deputado, a participação no total da dívida líquida, dos títulos atrelados à SELIC, aí incluídas as compromissadas, a dívida líquida do setor público, é 75,6% que estão atrelados à SELIC em termos de dívida líquida, olhando débitos e créditos sobre o estoque total. Isso, incluindo as operações compromissadas, que, como o Fernando mencionou, em termos de taxa média, como o senhor mencionou, pode ser considerado como SELIC também.
Não sei se era esse o ponto. Voltando para...
Pois não.
O SR. ANTONIO CARLOS COSTA D'ÁVILA CARVALHO JUNIOR - Bom dia, pessoal. Fernando, Queiroz, uma das situações que particularmente me preocupa — preocupa, não —, que é um ponto importante para nos debruçar para analisar a evolução da dívida, está relacionada às emissões diretas para bancos federais.
Numa dinâmica bem rápida, o que eu imagino que aconteceu foi que o Tesouro, em vez de captar dinheiro em mercado e passar para o Banco do Brasil ou para o BNDES, fez uma emissão direta e, como depois tinha que resgatar ou, de certa forma, tinha que monetizar esses títulos para os bancos federais, pegava dinheiro na conta única e resgatava esses títulos ou, de alguma forma, monetizava isso. Evidentemente, isso tem um efeito sobre a dinâmica da renda bruta, das operações compromissadas, etc., até porque, como eu falei antes, não houve a emissão de título do Tesouro em mercado para captar recurso, para depois colocar esse dinheiro na conta única e tirar esse dinheiro da conta única para emprestar ao Banco do Brasil ou ao BNDES. E se assim fosse feito, o efeito seria neutro sobre base, sobre operação compromissada, e por aí afora, porque eu tiraria do Bradesco e mandaria para o BNDES, por exemplo.
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Então, vocês têm algum estudo, têm se debruçado de maneira um pouco mais detida ou específica sobre essa dinâmica das emissões diretas ao longo do tempo, de 2008 até 2015, quando elas aconteceram, e o efeito delas, especificamente, sobre a dívida bruta, sobre as operações compromissadas? Há algum trabalho nesse sentido?
O SR. LUIZ GONZAGA DE QUEIROZ FILHO - Vamos ver se eu entendi bem a pergunta. As emissões para os bancos oficiais — e vou dizer até de uma forma mais ampla —, os empréstimos aos bancos oficiais, de maneira geral, o empréstimo de qualquer forma tem impacto sobre a dívida bruta, quer ele seja feito em caixa pelo Tesouro, mesmo que ele não tenha emitido títulos antes, quer ele seja feito por emissão direta. Vamos analisar os dois casos. Claro, para isso temos que ver com mais detalhes.
Em linhas gerais, quando o Governo emite um título por emissão direta, ele bate direto na dívida bruta, porque aí ele está computado. Se ele fizer o movimento da segunda opção, como você mencionou, ele emite títulos em mercado, então, aumenta a dívida bruta e recebe caixa. Mas, na mesma hora, ele diminui as operações compromissadas. Então, nesse primeiro momento, o impacto na dívida bruta dá neutro, nessa segunda opção que você mencionou. No momento seguinte, quando ele passa o dinheiro para o banco, como você aumenta a liquidez lá no sistema, as operações compromissadas voltam a aumentar.
Então, numa análise geral, numa avaliação geral, independentemente de qual seja a modalidade de aplicação, o efeito na dívida bruta é de aumentar. E se ele tivesse feito a opção de emitir antes, o impacto nas operações compromissadas da emissão seria o mesmo, neutro, da mesma forma que foi neutro quando ele emitiu com emissão direta. Por quê? Porque, em relação às compromissadas, ele emite o título, aumenta e reduz as compromissadas. Então, fica neutro lá no total da dívida bruta. E, quando ele passa o crédito, volta a aumentar a dívida. Numa análise geral, eu não vejo diferença nas duas modalidades para efeito da dinâmica da dívida. As duas modalidades teriam efeito neutro sobre as compromissadas e contribuiriam para aumentar a dívida bruta.
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O SR. FERNANDO ALBERTO SAMPAIO ROCHA - Só complementando, nesse caso, eu acho que o Queiroz acabou de mencionar ali naquele painel, naquela coluna que trata da evolução da dívida bruta, o papel desses empréstimos a bancos oficiais. Em relação a esses empréstimos, como ele mencionou uma coisa um pouco mais ampla, as emissões diretas estão dentro desses empréstimos. Para fins de avaliação do impacto nas estatísticas, especificamente, nós englobamos na categoria de empréstimos a bancos oficiais. No caso de desagregar, separando exatamente quais foram as emissões diretas, e tudo, nessa Nota não tem a separação, porque, do ponto de visto do impacto na estatística, parece que bateu lá junto com os empréstimos. Claro que há outras questões orçamentárias, outras envolvidas, de que nós não tratamos.
O SR. LUIZ GONZAGA DE QUEIROZ FILHO - Só destacando essa questão ainda dos empréstimos aos bancos oficiais, esse fator nessa Nota Técnica, como eu falei, cada um deles é mensurado e detalhado anualmente. Na Tabela 10-A dessa Nota, depois se você puder avaliar, esse fator aparece separadamente, a contribuição dele para a dívida bruta, tanto nos períodos em que ele contribuiu para aumentar a dívida bruta, como nos períodos recentes, em que ele está contribuindo para a redução.
O SR. ANTONIO CARLOS COSTA D'ÁVILA CARVALHO JUNIOR - Desculpe-me, deixe eu só voltar um pouquinho, porque para mim ficou um pouco confuso, para ver se fica mais claro. Para nós que estamos acostumados a lidar com esse vaivém de ativos e passivos, que nós trabalhamos juntos no Banco, ficou um pouco confuso. Deixe-me fazer algo um pouco mais devagar.
Vamos imaginar o seguinte: eu vou emprestar 10 bilhões para o Banco do Brasil. A primeira opção que eu vou fazer é emitir um título em mercado, com o Bradesco. No meu caso, para o Tesouro, eu vou aumentar uma dívida em título e vou aumentar em termos de conta única. Para o Banco Central, que é diferente, eu vou ter uma redução da base monetária. O que o Banco Central pode fazer em seguida? Ele pode aumentar a operação compromissada, alguma coisa nesse sentido, ou reduzir?
O SR. LUIZ GONZAGA DE QUEIROZ FILHO - Ele reduz, nesse caso. Reduz a compromissada.
O SR. ANTONIO CARLOS COSTA D'ÁVILA CARVALHO JUNIOR - Reduz. Nesse exato momento, se estivermos preocupados só com a operação compromissada, que seria, por isso a minha pergunta, da evolução especificamente da operação compromissada, e não da dívida bruta como um todo, então, no momento em que o Tesouro capta, a operação compromissada diminui.
No momento seguinte, o Tesouro empresta esse dinheiro, 10 bilhões, para o Banco do Brasil. Para o Tesouro diminui a conta única, aumenta um crédito, que é um contrato junto ao Banco do Brasil, no mesmo montante. Para o Banco Central vai aumentar a base monetária, e aí ele vai...
O SR. LUIZ GONZAGA DE QUEIROZ FILHO - Aumentar as compromissadas, ou seja, a compromissada retorna ao patamar que era antes.
O SR. ANTONIO CARLOS COSTA D'ÁVILA CARVALHO JUNIOR - Isso. Agora, vamos para outro exemplo. O Tesouro não vai captar esse dinheiro em mercado.
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Vamos imaginar que o Tesouro entende que o mercado não tenha 200 bilhões ou 300 bilhões de reais para me emprestar. Ainda que tenha, isso vai ter um custo altíssimo, até porque, se eu pegar esses 200 bilhões para emprestar para o Banco do Brasil, para o BNDES e para a Caixa Econômica, corrijam-me se eu estiver equivocado, parece-me que Banco do Brasil, BNDES e Caixa Econômica não estarão ofertando dinheiro para o Tesouro, porque eles serão os destinatários desse recurso que o Tesouro iria captar. Por exemplo, o Tesouro vai ao mercado pegar 200 bilhões, e o mercado são vocês três. Eu quero pegar dinheiro no mercado para emprestar para vocês dois. Só o Fernando vai participar desse mercado, porque vocês não vão dar dinheiro para o Tesouro para receber em seguida. Isso não faz sentido. Então, esse mercado está menor.
Imaginem que o Tesouro tem avaliado que o mercado não teria condições de oferecer 200 bilhões de reais para ele. Não tem problema, porque o Tesouro está cheio de dinheiro na conta única que veio daquelas equalizações cambiais do Banco Central, que, na sua origem, é criação de dinheiro, porque não veio de nenhum fato econômico, não tem lastro econômico. Simplesmente a taxa de câmbio sofreu uma desvalorização, e aí nasceu dinheiro na conta única do Tesouro.
O Tesouro faz a emissão direta de um título — daqueles 10 bilhões — e empresta dinheiro para o Banco do Brasil. Nasce um crédito para o Tesouro. Mas ele não tem dinheiro para entregar agora. Ele faz a emissão direta de um título público. Então, nesse exato momento não aconteceu nada com base monetária nem com operação compromissada. O que aconteceu foi que o Tesouro recebeu um crédito e emitiu um passivo.
No instante seguinte, vamos imaginar que esse título, como aconteceu em várias operações, tem o vencimento de um dia, como foi o caso de uma operação do BNDES de 13 bilhões. O Tesouro resgata esse título, pega um dinheiro que estava na conta única e empresta os 10 bilhões para o Banco do Brasil. O que vai acontecer é que vai diminuir o dinheiro na conta única, vai diminuir a dívida no Tesouro, e, para o Banco Central, vai aumentar a base. E o que ele vai ter que fazer?
O SR. LUIZ GONZAGA DE QUEIROZ FILHO - Compromissada.
O SR. ANTONIO CARLOS COSTA D'ÁVILA CARVALHO JUNIOR - Compromissada.
Então, nesse aspecto específico do caso da emissão direta, ocorre um aumento líquido de operação compromissada.
O SR. LUIZ GONZAGA DE QUEIROZ FILHO - Olhando esse caso específico, sim. Quanto às operações do estoque que o Tesouro tem na conta única, ele pode hoje fazer a mesma operação. Se você olhar só a operação isoladamente, ela vai ter o mesmo efeito, aumenta a compromissada — isso na operação que ele fizer hoje. Mas esse é o efeito secundário, porque esse dinheiro que está na conta única pode ter acumulado de diversas formas e teve um efeito contrário nas operações compromissadas no passado. Eu não sei lhe responder, especificamente, sobre a operação que o Tesouro mencionou.
Em termos dinâmicos, as operações compromissadas cresceram, ao longo do tempo, por conta de reservas. As demais operações do Tesouro contribuíram para diminuir, e o crescimento final que ficou foram as reservas e os juros sobre ela. É claro que ingressaram alguns recursos na Conta Única do resultado do Banco Central, mas, ao mesmo tempo, esse recurso saiu pagando dívida da própria carteira do Banco Central.
10:37
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Eu acho que podemos passar um item. Ainda falta um tópico nesse mesmo eslaide. Nesse fluxo entre Banco Central e Tesouro, o Banco Central transfere o resultado positivo para a Conta Única.
O Tesouro emite título para cobrir o resultado do Banco Central porque ocorreram esses casamentos no passado, como o Fernando mencionou. Essa nota quantifica isso. Ao longo do tempo também, o que entrou de resultado transferido do Banco Central é uma grande parcela. Não estou com ela aqui, mas vocês podem ver na nota. Ela foi utilizada para resgatar títulos na própria carteira do Banco Central, que também não tem impacto nas operações compromissadas.
Quando olhamos as relações do Tesouro com o impacto monetário, vemos que elas resultaram em outro superávit primário, que ela fez ao longo do tempo, ou emissões que ela fez ao longo do tempo para formar colchão de liquidez.
Por isso é importante analisar a evolução da Conta Única também, que é o tópico seguinte. Ao longo do tempo, o primário vai batendo na Conta Única. Ele faz esse primário para duas coisas: para resgatar a dívida, quando ele fez o superávit primário, ele reduziu as compromissadas; e ele faz isso para resgatar a dívida dele em mercado, que aumenta as compromissadas. Ou seja, a contribuição das operações do Tesouro ao longo do tempo termina sendo neutra.
Então, assim, as relações que o Tesouro tem com o mercado ao longo do tempo, não olhando operações específicas, pois o Tesouro sabe quais são os limites que tem utilizado uma fonte outra, olhando ao longo do tempo as operações que foram realizadas pelo Tesouro com impacto monetário, ele foi contracionista, ou seja, ele contribuiu para reduzir as operações compromissadas.
É claro que há períodos em que ele tem efeito de alta, quando ele fez superávit ao longo do tempo e resgatou dívida em alguns momentos de instabilidade. Por exemplo, passa-se 10 anos fazendo superávit primário, resgata-se parte de uma dívida e deixa uma parte na Conta Única como um colchão de liquidez. Em um determinado momento de crise, em que as condições de mercado estão desfavoráveis, há vencimento de títulos do Tesouro, e o Tesouro resolve não renegociar esse título com as condições que estão vigentes. Ele vai utilizar o colchão que ele acumulou no passado porque ele tem que ter essa margem. Para isso é que ele faz o colchão.
Eu não sei lhe responder em termos de operação específica. Eu vejo assim, em termos da dinâmica ao longo do tempo, a contribuição das operações do Tesouro, o efeito dela sobre as condições de liquidez, teve um efeito mais contracionista. É claro que, em períodos específicos, ele foi expansionista, mas, em termos acumulados, a contribuição líquida dele mostra essa tendência. Tem que ver as motivações, a decisão do gestor e o que o leva a isso. Isso nós não acompanhamos, porque não temos essa sensibilidade, formação para isso. A estatística é macroeconômica exatamente para mostrar como a coisa está evoluindo, os impactos econômicos acumulados. Mas, com certeza, o pessoal do Tesouro, nas emissões, sabe quais foram as fontes utilizadas, como foram utilizadas, o estoque que ele tinha. Essa questão de fonte é uma coisa que, eu confesso, não é a nossa área. Eu tenho uma dificuldade muito grande de entender a questão da anualidade do orçamento. Pode haver um ano em que se acumulou superávit durante 3 anos na Conta Única. Se, no último ano, você utilizar tudo isso para resgatar dívida, em termos de fonte, você terá que usar a fonte que teve durante o ano, porque o orçamento é anual, você tem que usar com as receitas anuais.
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Então, quanto à utilização de fonte, nós não temos essa sensibilidade, como vocês têm, para analisar isso. Mas é uma análise importante. Eu acho que o Tesouro pode dar essas informações.
O SR. ANTONIO CARLOS COSTA D'ÁVILA CARVALHO JUNIOR - Só para encerrar, a preocupação é justamente essa. Eu acho que é um capítulo importante quer precisa ser escrito, porque, no caso dos empréstimos aos bancos, foram 500 bilhões de reais.
O SR. LUIZ GONZAGA DE QUEIROZ FILHO - Sim.
O SR. ANTONIO CARLOS COSTA D'ÁVILA CARVALHO JUNIOR - E nós precisamos entender a dinâmica desse capítulo. Eu acho que a resposta passa também por um pedido de ajuda ao pessoal do Tesouro quanto a esse aspecto.
O SR. LUIZ GONZAGA DE QUEIROZ FILHO - É por isso que, retornando ao quadro, quando falamos de evolução da dívida, há a dívida líquida, que é o indicador mais abrangente. Não se consegue, na minha opinião, avaliar a situação financeira do setor público na sua totalidade sem avaliar a dívida líquida. Não interessa se há ativos que estão reduzindo ou não, que custam mais ou menos. Até por isso tem que se analisar a dívida líquida, para ver essa dinâmica.
E aí vai se desagregando. Vamos ver agora só os passivos, o que faz só os passivos aumentarem. Agora, dos passivos, o que faz só as operações compromissadas. Pode fazer isso para a dívida mobiliária do Tesouro também, pois há uma nota específica para isso. Eu acho que isso também é importante. Nós não nos dedicamos porque o Departamento de Operações do Mercado Aberto — DEMAB já tem uma informação específica para isso.
Depois, casando com essa análise, eu acrescentei, nas três últimas colunas, estes pontos: Conta Única, carteira de título, fluxos entre Banco Central e Tesouro. Se deixar de considerar esses pontos, até mesmo de uma forma adequada, podem ocorrer conclusões não totalmente amparadas, do ponto de vista técnico, na avaliação das outras dívidas
E nós notamos, não em termos técnico, mas em algumas notícias, em algumas coisas, que existe uma mistura muito grande dessa questão de conceitos. Então, olha-se um fluxo isolado, e esse fluxo, quando é tratado de forma isolada dos demais do conjunto, pode gerar conclusões para todo lado. Olhando-se a análise isolada em um ponto só, a análise da evolução da dívida bruta — eu até gostei do título — é importante. É importante analisar todos os fatores. E a análise de todos os fatores tem que ser dinâmica. Ela não pode se concentrar num ponto porque existem essas questões intertemporais que não podem ser desprezadas, que é exatamente esse ponto que você colocou.
O SR. ANTONIO CARLOS COSTA D'ÁVILA CARVALHO JUNIOR - Tentando resumir rapidamente, esse fluxo entre o Banco Central e o Tesouro Nacional que veio de 2008, que foi até a transformação da medida provisória, não foi necessariamente um custo, vamos dizer assim. Ele teria que ser analisado olhando todo...
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O SR. LUIZ GONZAGA DE QUEIROZ FILHO - Todo um contexto. Perfeito.
O SR. ANTONIO CARLOS COSTA D'ÁVILA CARVALHO JUNIOR - O fato de ter feito essas transferências, que até no começo o Fernando mencionou, vai, vem e tal...
O SR. LUIZ GONZAGA DE QUEIROZ FILHO - Sim.
O SR. ANTONIO CARLOS COSTA D'ÁVILA CARVALHO JUNIOR - Vai título e vem dinheiro para o Tesouro. Vem dinheiro para o Tesouro, vai título para o banco. Isso, no longo prazo, pode ser irrelevante.
O SR. LUIZ GONZAGA DE QUEIROZ FILHO - Por isso, essa variável tem que estar integrada com as demais.
O SR. ANTONIO CARLOS COSTA D'ÁVILA CARVALHO JUNIOR - Tem que estar integrada com as outras informações. Além disso, tem que se olhar todo o período.
O SR. LUIZ GONZAGA DE QUEIROZ FILHO - Perfeito.
O SR. JOÃO RICARDO SANTOS TORRES DA MOTTA - Basicamente, quando nós tivemos aqui a palestra com o pessoal do Tesouro, esse ponto em que houve essa mudança de regra, em que se podia aproveitar um movimento, vamos dizer assim, conjuntural de valorização cambial, que gerava um lucro compartimentalizado dentro do balanço do Banco Central, transformar isso num repasse imediato ao Tesouro pode ter sido um fator que estimulou, vamos dizer assim, uma "leniência fiscal", entre aspas.
Aproveitar as vantagens de curto prazo de ter dinheiro em Conta Única para começar a fazer operações, que, se você fosse olhar depois no conjunto do ano, esse resultado seria diferente ou seria compensado internamente, como você mesmo colocou. Então, eu acho bastante relevante essa análise olhada ao longo desse tempo, porque se estava numa ameaça de recessão mundial. Por causa disso, houve uma desvalorização cambial, que gerou um "lucro", entre aspas, porque é aquele lucro cambial de curto prazo. Não se sabe se, depois, caso essa taxa voltasse, a situação melhoraria e tal.
E aquilo foi um fator que também estimulou talvez operações que não tivessem sido feitas. Então, essa é a preocupação do Ávila quando ele quer associar a emissão direta. Quer dizer, foi uma oportunidade de se fazer emissão direta, quando, se fosse fazer pelos instrumentos normais e não houvesse essa permissão da lei para que isso ocorresse... Quer dizer, foi uma oportunidade talvez para se soltar o fiscal, que não seria uma maneira de se fazer, caso houvesse outra condição.
Então, agora, em 2019, retornou ao que deveria ser. Enfim, nesse período, houve ou não isso? Então, essa é uma questão que transcende um pouco a responsabilidade do Banco Central ou não. Enfim, e verificar ao longo do tempo esses fluxos, se realmente houve essa compensação, quais são esses montantes e no que isso interferiu nesse curto espaço de tempo de 2008 até 2014, quando houve um problema fiscal, se isso contribui para que a preocupação com esse problema fiscal não fosse relevante. E gerou o que gerou, não é? Então, eu acho que esse é o ponto.
O SR. FERNANDO ALBERTO SAMPAIO ROCHA - Exatamente nessa linha que o Queiroz mencionou, eu acho que esse é um tema relevante, é um tema que gera discussões entre os economistas, entre os acadêmicos. Não só essa discussão existe entre os acadêmicos, como me parece que ela estava na base das próprias propostas que foram formalizadas depois em projetos de lei, na legislação que foi finalmente aprovada, para aprimorar ou alterar essa relação entre Banco Central e Tesouro Nacional. O principal ponto aí era uma simetria entre fluxos que iam num determinado instrumento, como nós dizemos em estatística, moedas e depósitos, e voltavam em outro instrumento, em títulos, de tal forma que havia um crescimento dos balanços das duas instituições envolvidas: Banco Central e Tesouro Nacional. Reformular essa política ou revogar as regras anteriores e adotar novas vai exatamente eliminar no limite ou minimizar, diminuir bastante esses fluxos.
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Eu acho que esse era um tema relevante da situação fiscal até ontem praticamente. Embora a legislação atual tenha entrado em vigor no dia 1º de julho, ainda há um efeito da lei anterior, que ainda está se prolongando por agora, porque, no segundo semestre do ano passado, houve prejuízo no Banco Central. Esse resultado foi apurado no começo deste ano, em fevereiro e março. E, após aprovação do balanço do Banco Central, constituiu-se esse, digamos assim, passivo, que o Tesouro tem que cumprir. Mas ele vai esperar a anualidade, vai pagar isso no ano que vem.
No primeiro semestre deste ano, aconteceu a mesma coisa, houve outro prejuízo. As magnitudes nesse caso são menores do que já foram nos outros anos. Então, o prejuízo no primeiro semestre, apurado agora no segundo semestre, também vai constituir um passivo que o Tesouro vai cobrir no ano que vem. Então, são os dois últimos efeitos da legislação anterior, que devem ser liquidados em algum momento no começo do ano que vem.
Daí em diante, há essa nova regra. Ninguém sabe qual vai ser o resultado do balanço do Banco Central neste ano. Aqui na última tabela só há informação até o dia 20 de setembro, metade do trimestre. Então, o Banco Central, no segundo semestre, na verdade julho, agosto e setembro, até o dia 20, com as suas operações cambiais, estava tendo um lucro acumulado, no segundo semestre do ano até 20 de setembro, de 89 bilhões de reais. A taxa de câmbio desvalorizou um bocado. Digamos que o semestre se encerrasse no dia 20 de setembro. Esses 89 bilhões de reais seriam utilizados para criar o estoque de reservas de resultado cambial e não mais seriam repassados.
Nós poderíamos imaginar um cenário hipotético, talvez nem tanto, com a situação atual. Há uma série de coisas nos mercados internacionais e doméstico, a taxa de câmbio subiu. Eventualmente, o Congresso Nacional, durante esse mesmo semestre, aprovou a reforma da Previdência, que é uma sinalização importante para o mercado. No semestre seguinte, a taxa de câmbio se aprecia. É um cenário que nós já vimos várias vezes na década de 2000.
O que aconteceria de lá para cá? Por exemplo, 89 milhões bilhões de reais passariam para lá; 89 bilhões de reais passariam para cá no próximo semestre. Com essa nova regulamentação, esses 89 bilhões de reais comporiam o estoque de reservas de resultado no balanço do Banco Central. E, no semestre seguinte, se houver uma apreciação, esse montante seria debitado.
Parece-me que a mudança legislativa atingiu de forma muito precisa esses fluxos e as discussões que geravam entre eles. Aí resta a história desses momentos anteriores, que, de fato, são temas de grupos de estudos e análises.
O SR. JOÃO RICARDO SANTOS TORRES DA MOTTA - Eu só queria chamar a atenção para o fato de que esse é um tema delicado, digamos assim, porque há uma proibição constitucional de financiamento do Tesouro pelo Banco Central. É preciso muito cuidado para não interpretar esse tipo de movimento como um financiamento. Mas, na prática, ele pode ter servido como tal, justamente pelas situações conjunturais e pela demora que se tem de, ao longo dos anos, compensar uma coisa com a outra e tal.
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Então, o efeito fiscal pode ter sido esse, apesar de, tecnicamente ou juridicamente, não se poder considerar exatamente como um financiamento objetivo do Banco Central ao Tesouro. Mas, realmente, se há uma situação conjuntural que pode ser compensada em meses, e dali, daquele instante em que já há aquilo, já repassar, deu-se uma quantidade de recursos ao Tesouro que, provavelmente, ele não teria, o que lhe permite fazer coberturas e ações fiscais de curto prazo, que acabam gerando problemas na dívida no futuro, porque não vão ser compensados. Então, isso é muito difícil de se olhar no detalhe. É um trabalho que seria interessante de ser feito.
Só quero deixar claro que a nossa preocupação não é sair dizendo as coisas. É por isso que nós precisamos da informação correta. É simplesmente a interpretação de que essa regra pode ter sido uma regra que permitiu um comportamento fiscal oportunista, digamos assim, para resolver problemas, crises e tudo o mais, sob pressões de toda a ordem — não nos cabe julgar. Enfim, que fique claro que a nossa ideia não é gerar algum tipo de constrangimento, porque é um problema delicado, mas, de fato, é relevante.
O SR. LUIZ GONZAGA DE QUEIROZ FILHO - Só concluindo a análise, para fechar este eslaide, o último ponto, essa questão dos fluxos entre Banco Central e Tesouro, essas informações estão todas disponíveis, daí a importância de se analisar isso de forma integrada, o que o Banco Central transferiu para o Tesouro, o que o Tesouro transferiu para o Banco Central, e o que o Tesouro pagou da dívida do Banco Central, porque essa última caixinha não tem impacto no restante da economia, em compromissados, em nada; é um fluxo que fica entre o Banco Central e o Tesouro.
Olhando, assim, de frente, é como se essa reserva que está sendo formada no Banco Central, com os resultados, ninguém sabe o que vai acontecer com ela, se ela vai aumentar ou diminuir. Num cenário, daqui para frente, em que ela aumente ou diminua, qual é o ponto disso aí? É o resultado de uma política pública, se ela aumentar, se ela chegar a acumular, chegar um dia a 200 bilhões ou 300 bilhões de reais, ninguém sabe. Vai ser o resultado de uma política pública que gerou resultado. E o resultado de política pública é utilizado para quê? Vai pagar dívida? Essa é outra questão.
Então, essa análise, como os senhores colocam, claro, é muito difícil de se fazer, principalmente porque se misturam muito as coisas, pegam-se pontos isolados, mas o importante é que as informações estão abertas para os analistas de mercado, para os analistas de órgãos de controle, para esta Casa, para todos, e que haja essa discussão, que se analise a fundo, em períodos específicos.
O ponto que eu gostaria de destacar em relação à dívida pública, é que eu acho que poderia... Ah, antes de passar, quando nós olhamos tudo isso aí, esse cenário, normalmente nós olhamos a avaliação da dívida pública e achamos que ela cresce por si mesma: juros, variação cambial e tal. Mas nós vemos o resultado primário aparecendo: a evolução da dívida líquida, da dívida bruta nas compromissadas, na evolução da Conta Única.
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O que acontece? É aquela questão intertemporal em que, no passado, o primário contribuía de uma determinada forma e a conta de juros, de outra; mas hoje há uma certa inversão, já que o primário inverteu e a conta de juros continua aumentando, mas em magnitude menor. Ou seja, nesse ponto do resultado primário, caímos para a discussão de hoje.
Às vezes, quando se analisa a dívida pública, desvia-se desse foco do resultado primário. Por quê? Porque temos que entrar em receitas. Além de olhar o cenário das variáveis que afetam a dívida líquida, como elas afetam o perfil, caímos também naquela análise do lado do resultado primário acima da linha, porque ele tem uma contribuição muito forte e relevante na dívida, que é a necessidade de reformas estruturais.
Então, sobre questões como a evolução da receita pública, como ela responde ao crescimento da economia, eu acho que, num trabalho de avaliação da dívida, como os senhores pretendem apresentar soluções, este caminho é um ponto que, no meu entender, é importante ser trabalhado. Há ainda a questão de desonerações, de incentivos fiscais, de gastos previdenciários — temos aí a reforma — e de rigidez orçamentária, que é outro ponto que se coloca.
Portanto, é como se a evolução da dívida pública hoje estivesse cada vez mais se concentrando nisso. Antes, diríamos: "Está se fazendo superávit primário para pagar juros". Hoje está se fazendo déficit, e os juros estão caindo. Então, há alguma coisa na contribuição desse fator, que esta Casa está discutindo.
O SR. PRESIDENTE (Félix Mendonça Júnior. PDT - BA) - Nós temos como mensurar o que, nos últimos 10 anos, contribuiu para que isso acontecesse? O senhor diz que hoje os juros têm uma participação muito menor, mas nós temos como mensurar qual foi a participação dos juros na evolução da dívida, ou seja, qual foi a evolução da taxa SELIC?
O SR. LUIZ GONZAGA DE QUEIROZ FILHO - Sim.
O SR. PRESIDENTE (Félix Mendonça Júnior. PDT - BA) - Sobre aqueles 75,6%, já que os senhores falaram que a dívida pública está vinculada à SELIC, quanto, dentro desse percentual, está nas operações compromissadas? Esses 75,6% são sobre que montante: 4 trilhões de reais, 5 trilhões de reais? Sobre que montante foi visto esse percentual?
É certo falar que, por exemplo, se esse montante fosse de 5 trilhões de reais, se a dívida pública hoje, falando hipoteticamente, fosse 5 trilhões de reais e ela estivesse baseada na SELIC, teríamos a redução de 1 trilhão de reais? Numa conta simples, para entendermos, a redução de 1% na SELIC equivaleria a 50 bilhões de reais por ano e, em 10 anos, 500 bilhões de reais, ou seja, metade do que se pretende economizar em toda a reforma da Previdência? Um por cento da taxa SELIC equivaleria, em 10 anos, à metade de tudo o que ouvimos falar da reforma da Previdência? É certo afirmar isso?
O SR. FERNANDO ALBERTO SAMPAIO ROCHA - Eu não tenho os números aqui, mas esses são facilmente levantados. Todo mês atualizamos o que chamamos de elasticidade dos indexadores da dívida líquida e da dívida bruta. Fazemos as duas contas. A SELIC é um dos principais indexadores. Tentando puxar de memória, eu acho que cada 1% de redução na taxa SELIC, mantida ao longo de 12 meses, economiza por volta de 45 bilhões de reais.
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Só que eu acho que temos de tratar a economia brasileira como um todo. Na palavra dos economistas, seria fazer um DSGE, um modelo que incorpore todos os fatos da economia. O Banco Central tem sempre mencionado que a redução da taxa de juros básica da economia, tanto em termos nominais quanto em termos reais, é consequência de uma série de fatores. O Banco Central não pode — e principalmente não deve — mexer na taxa de juros para cima ou para baixo com outros objetivos que não sejam o de alcançar a meta de inflação e cumprir o seu mandato.
Uma eventual redução da taxa SELIC, além dos parâmetros que são definidos por esse mandato, ou uma redução aquém, para níveis mais baixos do que os estabelecidos, provavelmente se manifestaria no futuro numa maior taxa de inflação, que, entre diversos efeitos que poderiam ocorrer na economia, teria o efeito, entre outros, de ampliar a dívida pública, porque a taxa de inflação é um dos indexadores da dívida pública, é um indexador menor do que a taxa SELIC. Mas uma redução da taxa SELIC, além do que seja recomendável para atingir a meta de inflação e manter a estabilidade de preços na economia, teria aumento de inflação, redução do horizonte de planejamento, diminuição da atividade econômica futura e também impactos na dívida pública.
Então, quando buscamos analisar os impactos de certas medidas, de certas ações, o ideal — é claro que não temos condições de fazer isto aqui agora — é analisar o conjunto dos fatores. Se quisermos isolar um dos fatores, com a estrutura da dívida atual, essa redução de 1% da SELIC, mantida ao longo de 12 meses, economizaria, digamos assim, ou contribuiria para reduzir a dívida pública por volta de 45 bilhões de reais; ou seja, grosso modo, em 10 anos, se mantivéssemos essa mesma estrutura, seriam 45 bilhões de reais. Mas isso iria evoluindo ao longo do tempo.
O SR. PRESIDENTE (Félix Mendonça Júnior. PDT - BA) - Aproveitando esse aspecto mais global, há pouco tempo, o senhor falou que a solidez do sistema financeiro foi assegurada e que tivemos 2 anos de recessão. Na verdade, o que representa para o senhor a solidez do sistema financeiro? Eu nunca vi tanto lucro ser apresentado pelos bancos, em seus balanços, ao sistema financeiro quanto nesses anos de recessão.
Quando se fala em recessão, imaginamos escassez de recursos, escassez de financiamento, escassez de investimentos, mas, na verdade, ouço vocês dizerem que mantêm os juros altos para segurar a inflação, mantêm os juros altos para não soltar dinheiro no mercado porque a economia pode expandir e, se expandir, podemos ter até problemas de energia, como ouvimos falar no passado. Mas na recessão, 2 anos de recessão, mantivemos os juros da SELIC os mais altos do mundo. Ou seja, em plena recessão, mantêm-se os juros. Se estamos para crescer, mantêm-se os juros. Eu questiono essa análise.
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É claro que o Banco Central tem que ser independente, isso tem que ser analisado pelo mercado. Mas eu não consigo entender esta lógica: se há crescimento, mantêm-se os juros; se há recessão, mantêm-se os juros. Qualquer coisa que aconteça, mantêm-se os juros da taxa SELIC. Essa é a visão, digamos assim, de um leigo, de um administrador de empresas que não é especialista nessa área.
O SR. FERNANDO ALBERTO SAMPAIO ROCHA - O ciclo de redução das taxas de juros efetivadas pelo Banco Central, que é o atual ciclo, está em curso nos últimos 3 anos, provavelmente, com um interregno no meio deles. A partir — não tenho exatamente a data — do final de 2016 ou do começo de 2017, os juros começaram a se reduzir na economia brasileira, foi feita uma redução até 6,5%, depois permaneceram estáveis por aproximadamente 1 ano, em 6,5%, e agora voltaram a cair. A meta para taxas de juros, definida pela taxa SELIC, está, em termos nominais, no menor patamar, desde a criação do Comitê de Política Monetária em 1996.
Quando o senhor se refere à manutenção da taxa de juros durante a recessão, lembrando os números de cabeça, com a ressalva de poder cometer alguma impropriedade, no meio da recessão, que durou de meados de 2014 até o final de 2016, em 2015, ano em que o PIB caiu 3,8%, 3,9%, nesse período, a taxa de inflação atingiu 10,5%, para uma meta de 4,5%, com um intervalo superior de 6,5%. Esse atingimento da inflação de 10,5% era, na visão do Banco Central, uma coisa que teria que ser revertida. Ela foi revertida. Em 2016, a taxa de inflação se situou em 6,5%, exatamente a banda superior da meta. A redução, durante o ano de 2016, foi um pouco superior a 4%, porque 10,5% não foi o pico da inflação recente. Acho que, em janeiro de 2016, ela superou 11%.
Então, o cumprimento do mandato do Banco Central, no sistema institucional vigente, de acordo com as melhores práticas internacionais, dizia que era preciso debelar o início do processo inflacionário, isso foi feito. Em 2015, a inflação estava em 10,5%. Em 2016, passou para 6,5%. E, em 2017, foi aquela inflação mencionada de 3%. O processo foi feito. Após ele ser debelado, veio a retomada da credibilidade e a ancoragem da meta de inflação em todo um horizonte para o qual há um cenário de metas, que vai até 2022.
Com as expectativas de inflação dentro da meta para todo esse período até 2022, tornou-se possível que fossem, sucessivamente, digamos assim, questionados os pisos para taxa SELIC. Quando a taxa SELIC ficou estável em 6,5%, durante 12 meses, já era a menor taxa SELIC, em termos nominais. E as reduções posteriores da taxa de juros fizeram com que, digamos assim, novos pisos da taxa SELIC tenham sido testados.
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O Banco Central comunica em seus instrumentos de informação, como os comunicados do Comitê de Política Monetária, as atas e o relatório de inflação, que essa taxa deve estar no nível expansionista, ou seja, estima-se que essa taxa esteja abaixo do neutro. E ela deve estar abaixo do nível neutro exatamente para buscar estimular a atividade econômica na existência de uma ociosidade muito grande dos fatores.
Então, em relação à taxa de juros, de fato, esse é um tema sempre controverso. Mas, em relação ao nível da taxa SELIC, ela hoje se encontra nos menores níveis da sua história.
O SR. LUIZ GONZAGA DE QUEIROZ FILHO - Respondendo ao que o senhor perguntou, aqueles 75% da taxa SELIC são sobre um estoque da dívida líquida de 3 trilhões e 861 bilhões de reais. Desses 3 trilhões e 861 bilhões de reais, a dívida total atrelada à SELIC é de 2 trilhões e 920 bilhões de reais. Desses 2 trilhões e 920 bilhões de reais, a parcela das operações compromissadas é de 1 trilhão e 254 bilhões de reais, de acordo com os dados de agosto de 2019.
O SR. PRESIDENTE (Félix Mendonça Júnior. PDT - BA) - Obrigado.
Nós nos fixamos muito na inflação. Hoje eu questiono o que é mais danoso para o Brasil: deixar um pouco a inflação mais larga ou ter 10% da SELIC. Fala-se que 1% é 45 bilhões de reais. Então 10% são 450 bilhões de reais ao ano. O que é mais danoso: uma inflação mais larga ou isso aí? Mas essa é outra questão que vamos ter que estudar aqui.
Se 1% representa 45 bilhões de reais, imaginem 10%? São 450 bilhões de reais de acréscimo ao ano na dívida pública. Não sabemos o que é mais danoso para o Brasil: manter uma inflação maior ou segurar forçadamente — pode ser forçosamente — e aumentar a dívida em quase meio trilhão de reais ao ano.
O SR. LUIZ HUMBERTO CAVALCANTE VEIGA - Complementando o que V.Exa. falou e o que o Fernando também levantou, o nível hoje de 5,5%, pelo comentário final dele, não é o nível da SELIC que o Banco Central estima. Ele está abaixo. Ele estaria sendo mantido nesse nível por conta da ociosidade da economia. Então, em qualquer movimento de crescimento econômico, ela vai subir. Aí o efeito vai ser na dívida, no estoque da dívida, se eu entendi.
O SR. PRESIDENTE (Félix Mendonça Júnior. PDT - BA) - Nós temos que transformar todo esse estudo que estamos fazendo aqui em uma linguagem que, no futuro, qualquer um possa pegá-lo e entender o que acontece no Brasil, o que acontece com a dívida pública, o que acontece toda quarta-feira em que há reunião do COPOM. O brasileiro tem que passar a questionar isso, que é um dos maiores problemas que o Brasil tem, que é a dívida pública.
Como não é muito conhecido, nós temos que transformar isso em uma linguagem que seja de conhecimento geral, que qualquer leigo possa ver e começar a debater. Aí sim, nós vamos ter uma segurança maior.
Obrigado.
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O SR. ANTONIO CARLOS COSTA D'ÁVILA CARVALHO JUNIOR - Uma boa pergunta também, por outro ângulo, seria a seguinte: o aumento de 1% daria 45 bi a mais? Uma redução de 1% daria 45 bi?
O SR. FERNANDO ALBERTO SAMPAIO ROCHA - Mas este é o valor ao ano?
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. FERNANDO ALBERTO SAMPAIO ROCHA - É, porque a taxa é anual.
O SR. ANTONIO CARLOS COSTA D'ÁVILA CARVALHO JUNIOR - Sim, estou arredondando. A pergunta é que, se tivermos um espaço — vamos arredondar para 5, temos 250 bilhões a menos, vamos arredondar para 5,5 —, o que precisaríamos fazer para chegar a zero? O que nos impede de chegar a zero?
Em vez de estarmos preocupados com o aumento, o que poderíamos ofertar como uma solução para a sociedade? O que a sociedade poderia fazer em conjunto para que nós economizássemos, por ano, 250 bilhões de juros?
O SR. JOSÉ RICARDO SANTOS TORRES DA MOTTA - É zero real ou nominal?
O SR. ANTONIO CARLOS COSTA D'ÁVILA CARVALHO JUNIOR - Nominal.
O SR. FERNANDO ALBERTO SAMPAIO ROCHA - Aí será juro real negativo.
O SR. ANTONIO CARLOS COSTA D'ÁVILA CARVALHO JUNIOR - Só para arredondar.
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. FERNANDO ALBERTO SAMPAIO ROCHA - Depende do nível de depressão em que estejamos.
O SR. PRESIDENTE (Félix Mendonça Júnior. PDT - BA) - Por hipótese, podemos até ter juro negativo. Não podemos?
O SR. FERNANDO ALBERTO SAMPAIO ROCHA - Depende do nível de depressão da atividade econômica em que estejamos.
O SR. PRESIDENTE (Félix Mendonça Júnior. PDT - BA) - Há países que aplicaram: Japão, Alemanha.
O SR. ANTONIO CARLOS COSTA D'ÁVILA CARVALHO JUNIOR - A questão é que sabemos o que acontece e faz os juros subirem. Mas no que não gostamos de pensar que poderia fazer os juros chegarem a zero? Evidentemente, em uma situação completamente hipotética, já que estamos trabalhando com números de maneira bem simplória, o que nos faria chegar a zero de tal sorte que poderíamos economizar 250 bilhões de juros ao ano e, em 10 anos, 2 trilhões e meio?
O SR. LUIZ GONZAGA DE QUEIROZ FILHO - Eu acho que há dois pontos. O primeiro é uma situação em que o País tivesse uma taxa de juros nominal zero. Ela poderia ser uma taxa de juros real positiva, se o Brasil estivesse em deflação, ou poderia ser uma taxa de juros negativa, se estivermos com qualquer nível de inflação. A receita mais segura para ter juro zero com uma deflação é entrar em uma depressão econômica nos níveis do que o mundo viu nos anos 30, mas eu acho que essa opção deve ser descartada por todos nós.
O segundo ponto é em relação ao que fazer com os juros. Eu acho que os pagamentos, a incidência de juros sobre o estoque da dívida pública de fato são relevantes, e o que nos parece, à primeira vista, é que os juros incidem sobre um estoque prévio. Então, parece-me que se quisermos, em termos econômicos, tratar de causalidade, no sentido de antecedência temporal, a que os econometristas chamam de causalidade no sentido de Granger, deveríamos ver os fenômenos que antecedem as consequências.
Eu acho que o mais adequado seria tratar do estoque, da dívida do montante sobre o qual incidem os juros. E, para isso, parece-me que, olhando os dados da economia brasileira nos últimos 20 anos basicamente, nas duas últimas décadas, veremos que, no período em que o País mantinha superávits primários, houve, ao longo do tempo, uma trajetória de redução do endividamento tanto no conceito líquido quanto no conceito bruto em relação ao PIB.
Então, eu acho que esse ponto, para um conjunto de políticas econômicas sólidas que teria uma contenção do crescimento da dívida pública com início em uma trajetória de redução, hoje, não dá para se contentar apenas com uma política de estabilização da taxa do nível da dívida bruta. Ela é muito elevada, temos que reduzi-la.
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Então, conjugando a contenção da dívida pública com uma inflação equilibrada, esse conjunto sólido de políticas tem que ser tentado, alcançado ou perseverado, e aí nós vamos conseguir fazer a redução do montante de juros apropriados sobre a dívida. Temos indícios disso, são os dados de que nós voltamos a ter um número abaixo de 5% do PIB depois de 5 anos. E, nesses 5 anos, o estoque da dívida cresceu muito, ou seja, a base sobre a qual incide os juros aumentou bastante ao mesmo tempo em que se mantém uma inflação controlada, estável e previsível.
O trabalho de reduzir a dívida nos níveis em que ela está, aparentemente, vai ser um trabalho longo. Nós vamos passar um bom tempo para retornar a dívida aos patamares anteriores. Mas esses são comentários pessoais que extrapolam a minha competência institucional que me trouxeram a esta sala.
O SR. LUIZ HUMBERTO CAVALCANTE VEIGA - Eu queria só fazer um comentário com relação à questão das operações compromissadas. Eu participei quando da medida provisória de 2008, que virou a lei que gerou isso, e, em momento algum, eu percebi, pelo contato, qualquer tipo de intenção ao que aconteceu, e, como o Queiros disse, também não necessariamente foi o que aconteceu, quer dizer, estamos olhando só esse quadro aqui e não estamos conseguindo ver até por conta da dificuldade mesmo que é isso.
Eu estava olhando isso aqui e ficava cada vez mais assustado com a tarefa que vem pela frente, como está na última transparência.
O que acontece hoje com determinada política de juros que temos de manter? O Fernando comentou que o Banco Central americano também realiza operações compromissadas. Na realidade, é claro, realiza, assim como inúmeros Bancos Centrais as utilizam. Essa é uma das ferramentas de política monetária, e nós, como não temos a emissão de títulos pelo Banco Central, temos que fazer a operação compromissada.
No nosso caso, nós fazemos a operação ao contrário de como fazem os americanos. Então, estamos fazendo o que eles chamam de operação compromissada reversa, e, lá, eles fazem a operação compromissada normal.
O SR. LUIZ GONZAGA DE QUEIROZ FILHO - Aumentando a liquidez.
O SR. LUIZ HUMBERTO CAVALCANTE VEIGA - Exatamente. Eles fazem a operação compromissada para colocar liquidez. Então, eles estão em uma posição contrária à do mercado. O que acontece? O problema foi que justamente apareceu nessa medida provisória a impossibilidade de pagar dívida. Hoje, se você faz superávit primário e paga dívida, no mesmo momento você tem que fazer uma nova dívida. Eu vou botar entre aspas essa "dívida". Por quê? Porque é operação compromissada.
O SR. FERNANDO ALBERTO SAMPAIO ROCHA - Mas, quando você fez o superávit primário, você já reduziu?
O SR. LUIZ HUMBERTO CAVALCANTE VEIGA - Sim, você tira...
O SR. FERNANDO ALBERTO SAMPAIO ROCHA - O efeito líquido, o superávit, de qualquer forma, vai reduzir.
O SR. LUIZ HUMBERTO CAVALCANTE VEIGA - Não, eu sei, mas quando você reduz...
(Intervenção fora do microfone.) (Risos.) O SR. LUIZ HUMBERTO CAVALCANTE VEIGA - No momento em que você tirou lá e fez o superávit, você vai liquidar a dívida. Quando liquidou a dívida, pagou os juros, botou dinheiro na economia. Você tem que vir com a compromissada para tirar o dinheiro da economia.
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O SR. LUIZ GONZAGA DE QUEIROZ FILHO - Caiu a dívida que você liquidou. Não é isso?
O SR. ANTONIO CARLOS COSTA D'ÁVILA CARVALHO JUNIOR - O primário é como se você tivesse cavado um buraco, tirando a areia. Traz essa areia para cá, e o Governo vai lá e retorna essa areia para pagar uma dívida. O buraco fica do mesmo tamanho.
O SR. LUIZ HUMBERTO CAVALCANTE VEIGA - É. O superávit, sim, mas o pagamento da dívida, não; quer dizer, você não consegue pagar.
O SR. LUIZ GONZAGA DE QUEIROZ FILHO - Naquele quadro que nós vimos, o resultado primário aparece como um fator em cada uma daquelas colunas. Isso vale para o Governo e vale para qualquer um de nós. Quando se aumenta a diferença entre o que se gasta e o que se arrecada, você está com condições de poupança e usa essa poupança para reduzir uma dívida que você tem. O efeito final, olhando o setor público, não tem como não ser a redução da dívida.
O SR. FERNANDO ALBERTO SAMPAIO ROCHA - É como se houvesse três lançamentos: o resultado primário, o resgate de dívida e a emissão de compromissadas. A emissão de dívida e as compromissadas — podemos usar qualquer um desses três — se anulariam. Mas há o efeito original, que é o superávit primário, no caso do recorrente pelo menos, e simplesmente eu arrecadei mais imposto da sociedade do que eu gastei. Então, eu tirei recursos da sociedade, do setor não público, do setor privado.
O SR. LUIZ HUMBERTO CAVALCANTE VEIGA - Na realidade, realmente eu pulei essa parte. O que eu quis dizer é que a redução da dívida, no momento em que se quer manter uma taxa de juros superior ao que a economia... Porque a liquidez do mercado está mostrando, no momento em que você quer manter a dívida superior, o pagamento de dívida enseja, ato contínuo, a emissão de nova dívida por meio da operação compromissada.
O SR. PRESIDENTE (Félix Mendonça Júnior. PDT - BA) - Ficou na minha cabeça a questão sobre a depressão e os juros questionados sobre como se chegaria a um juro zero, e o senhor respondeu: "Não, só numa depressão". Eu vejo o seguinte: na inflação, há o dinheiro e os produtos no mercado que se pode comprar. Se há mais dinheiro e menos produto, vem a inflação.
E em um estímulo à produção? Se você produz mais carne, mais laranja, mais produtos agrícolas, se você bota mais produção no mercado, você não estaria numa depressão, você estaria com a economia ativa e produzindo mais.
Essa relação de produção e dinheiro no mercado também não varia? Nós temos que ter uma depressão para ter juro zero? Ou nós podemos ter uma economia mais ativa, produzindo mais, gerando mais riquezas, compatível com o juro zero? Por que, nesse conceito de depressão, a inflação tem que ser segura com os juros altos? Eu acho que não. Então, se você solta uma produção, você produz mais e joga mais produto no mercado...
Se há em uma feira a produção excessiva de tomate, ele fica barato. Quando a produção é muito pequena, ele encarece mesmo. Então, eu acho que a relação é com a produção e não com a depressão.
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Essa é uma opinião pessoal, mas eu só queria contrapor o juro zero com a produção mais ativa.
O SR. LUIZ GONZAGA DE QUEIROZ FILHO - É claro, o senhor tem a toda razão. Uma das formas de se alcançar juro zero, historicamente, na economia mundial, é uma depressão, uma perda permanente de produto.
Em um cenário em que se tenha, digamos, uma superprodução de todos os produtos, poderia haver uma queda sustentada dos preços desses produtos que leve a inflação a níveis baixos ou negativos, só que não se pode imaginar, ou pelo menos eu não consigo imaginar, um cenário em que a economia esteja em equilíbrio com todos os produtos sendo superproduzidos.
No caso, a produção obviamente é importante, é um dos principais fatores determinantes, mas a inflação é definida de forma muito geral, muito abstrata, como uma medida de desproporção entre a oferta e a demanda de produtos. Então, é claro que a produção é importante, assim como é a demanda.
Então, a ideia de uma economia sustentada é que o País cresça no ritmo do seu crescimento potencial, que é o crescimento que faz crescer conjuntamente a oferta e a demanda. Com isso, você tem o equilíbrio no sistema de preços, que é a inflação equilibrada, você tem o equilíbrio na oferta de fatores, não há uma ociosidade, ou seja, a taxa de desemprego estaria próxima dos seus níveis de equilíbrio, e poderíamos usar outro nome, chamar de pleno emprego. Isso poderia ser um nível permanente da economia. Isso é o desejável.
Nesse caso, existe uma taxa de juros de equilíbrio também que faz o equilíbrio nos fatores de oferta e demanda do mercado nos fatores de produção e nos preços, e não necessariamente essa taxa de juros de equilíbrio é zero. Não há nenhum apriorismo, em nenhum sistema econômico, que diga que a taxa de juros de equilíbrio que equilibra oferta e demanda, que atinge o produto potencial com o pleno emprego é zero, ou pelo menos nós sempre estivemos acostumados com taxas de juros positivas em qualquer país do mundo.
O que nós temos visto recentemente — esse é um fenômeno que está em plena discussão com economistas do mundo inteiro — é a situação de um mundo em que também o número de cabeças, só para ter ideia de magnitude, provavelmente algo como 17 trilhões em dívidas soberanas ao redor do mundo têm taxas de juros nominais negativas, ou zero ou ligeiramente negativa, menos 0,15%, menos 0,1%, menos 0,2%. Acho que não há consenso.
O SR. PRESIDENTE (Félix Mendonça Júnior. PDT - BA) - Explique um pouquinho mais sobre essa informação da dívida soberana no mundo, que está basicamente sobre taxa negativa e zero. Como essa dívida soberana no mundo está relacionada com a dívida soberana do Brasil?
O SR. LUIZ GONZAGA DE QUEIROZ FILHO - Hoje nós temos um cenário nos principais países em que, se nós somarmos toda a dívida soberana emitida, que seria a nossa dívida pública, o equivalente em cada país à nossa dívida pública mobiliária federal interna, nós teríamos um conjunto de países concentrados na Europa e também no Japão com taxas de juros nominais negativas. É feito um leilão competitivo no mercado, para títulos com duração de 5 anos, 10 anos, e o resultado desse leilão é que os investidores aceitam taxas de juros negativas, ou seja, eles compram papel hoje para receber daqui a 10 anos. E eles compram 100 e aceitam, daqui a 10 anos, receber 99,5; 99,8. São taxas ligeiramente negativas. Se nós somarmos todo o total da dívida pública mobiliária de cada um desses países que está com taxa de juros zero ou ligeiramente negativa, nós teremos algo como 15 ou 17 trilhões de dólares nessa situação.
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O SR. LUIZ HUMBERTO CAVALCANTE VEIGA - O Japão seria o principal exemplo. Quais seriam os outros?
O SR. LUIZ GONZAGA DE QUEIROZ FILHO - Japão, Alemanha, Suíça, alguns daqueles países do norte da Europa que não fazem parte da área do euro. A França deve estar caminhando para chegar a isso, ou está muito próxima. E, nesse caso, os Estados Unidos são o país que mantém as taxas de juros dos seus papéis positivas.
O SR. LUIZ HUMBERTO CAVALCANTE VEIGA - A taxa nominal é positiva, não é?
O SR. LUIZ GONZAGA DE QUEIROZ FILHO - Sim. O que está acontecendo nos Estados Unidos, recentemente, 1 ou 2 meses atrás, é o fenômeno que eles chamam de inversão da curva de juros, no qual os juros cobrados pelos papéis mais curtos são maiores do que os juros cobrados pelos papéis mais longos.
O SR. LUIZ HUMBERTO CAVALCANTE VEIGA - A taxa de juros de 1,6% ao ano para 10 anos...
O SR. LUIZ GONZAGA DE QUEIROZ FILHO - É. E a SELIC deles, o Federal Funds...
O SR. LUIZ HUMBERTO CAVALCANTE VEIGA - (Ininteligível) é de 1,8% ao ano.
O SR. LUIZ GONZAGA DE QUEIROZ FILHO - Isso.
(Não identificado) - Isso foi só um dia.
O SR. LUIZ HUMBERTO CAVALCANTE VEIGA - Não, não, direto. É direto.
O SR. LUIZ GONZAGA DE QUEIROZ FILHO - Acho que já está desde agosto oscilando nesses padrões. E aí, isso, provavelmente, é entendido como se os Estados Unidos estivessem próximos de uma recessão. Isso é entendido, em geral, como um indicador antecedente de uma recessão. Quem olha a série histórica dos Estados Unidos, desde o pós-guerra, constata que isso é uma marca que antecede as recessões. Não é uma obrigação, não é necessário, mas, em geral, isso é interpretado pelo mercado financeiro como que daqui a 10 anos a taxa de juros vai estar menor do que no presente. Isso seria o sentido econômico da inversão da taxa de juros, não é?
Mas, enfim, eu acho que são os temas candentes do momento entre os economistas. Não há um consenso na profissão, e nem eu sou o mais qualificado para ter essa discussão. Só para mostrar, este é o último eslaide que nós tínhamos trazido. Esta era a apresentação que queríamos compartilhar com vocês.
Queremos nos colocar à inteira disposição da Câmara dos Deputados, de cada um dos consultores que estiver trabalhando nesse estudo, para disponibilizar o máximo de informações que nós pudermos.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Félix Mendonça Júnior. PDT - BA) - Muito obrigado, Fernando Rocha.
Pois não, Antonio Carlos.
O SR. ANTONIO CARLOS COSTA D'ÁVILA CARVALHO JUNIOR - Deputado, permita-me, eu falei na reunião passada, também, com o pessoal do Tesouro, e me sinto na obrigação de falar aqui, até para o bem dos trabalhos.
Eu fui auditor do TCU. Fui analista o Banco Central, de 1998 a 2004, e, enquanto eu era analista do Banco Central, eu era analista do Banco Central. Depois, de 2004 a 2016, eu fui auditor do TCU. Enquanto eu estava lá, eu era auditor do TCU. Eu não sou mais auditor do TCU, nem tenho mais condição de voltar, porque já passei pelo estágio probatório aqui.
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O trabalho que eu particularmente estou desenvolvendo aqui não é mais um trabalho de auditor de TCU. E queria deixar muito bem claro isso, porque, com certeza, eu gostaria de eliminar qualquer tipo de impureza nessa relação, até em função de eu ter atuado ativamente no processo das pedaladas e por aí afora, que teve muito a ver com estatística fiscal. Então, até em respeito aos colegas que estão atuando junto, aos Deputados, eu não vou de maneira alguma atuar nesse trabalho sendo um auditor. Pelo contrário, meu papel aqui é contribuir para que o processo legislativo no Parlamento produza uma informação que seja útil para toda a sociedade. E todas as vezes que eu for conversar com os senhores vai ser nesse sentido, e não no sentido de buscar identificar algum erro ou alguma coisa. Isso já foi, já passou.
O SR. PRESIDENTE (Félix Mendonça Júnior. PDT - BA) - Tem a palavra o Dr. David.
O SR. DAVID FALCÃO - Deputado Félix, demais colegas presentes, primeiro, é uma satisfação estarmos aqui. E isso vem ao encontro de uma diretriz do Presidente Roberto Campos, que, logo quando assumiu, nos trouxe uma agenda de 14 itens, entre eles a melhoria da relação do Banco Central com o Congresso. E ela se intensificou bastante neste ano, não só por uma determinação, mas também por uma necessidade.
Ao fim da legislatura passada havia nas duas Casas, no Congresso, aproximadamente 20 mil proposições ativas. Dessas, nós acompanhamos em torno de mil, porque dizem respeito à atuação do Banco Central. Quanto a isso, o Presidente percebeu logo a importância e a necessidade de haver uma maior proximidade, principalmente na cooperação técnica do Banco Central, no suporte ao trabalho parlamentar, e, sobretudo, uma intensificação nesse diálogo, tanto que neste ano nós já fizemos vários eventos e encontros no Banco Central. Eu peço desculpas por algumas vezes que tive de me retirar, porque estava acabando de fechar com o Deputado Sergio Souza, Presidente da CFT, a vinda do Presidente à Comissão no dia 6 de novembro. Então, ele estará aqui, retribuindo uma visita que recebemos da Comissão lá.
Eu vejo aqui que nós temos um prisma ali que está sem um Parlamentar presente, mas ontem nós recebemos o Deputado Denis Bezerra. Houve uma reunião dele com o Presidente Roberto Campos e o Diretor Maurício. E foi tratada também uma questão bastante importante, que deve ser objeto de algumas ações que já estão sendo preparadas, que é o incremento da oferta de crédito pela via do microcrédito. Então, há duas proposições sendo acompanhadas com bastante atenção aqui na Casa. Uma está sendo relatada pelo Deputado Kim, e a outra que está sendo acompanhada pelo ex-Deputado Rogério Marinho.
Nós agradecemos o convite. O Diretor de Relações Internacionais, Maurício, a quem nós estamos vinculados, também se coloca à disposição da Casa sempre que houver necessidade. Quanto à Juliana, depois nós vamos conversar para estendermos a nossa participação e colaboração dentro do possível, conforme sugestão do Humberto e do D'Ávila. Então, não posso nem falar ex-colegas, porque nós estamos sempre trabalhando pelo País num processo de cooperação. E nos colocamos à disposição de todos.
Muito obrigado.
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O SR. PRESIDENTE (Félix Mendonça Júnior. PDT - BA) - Agradeço ao Presidente Roberto Campos, ao Dr. David, ao Luiz Gonzaga, ao Fernando Rocha. Aqui, nós estamos assim, digamos, antes do jogo. Esta é a segunda reunião do CEDES sobre esse tema, a segunda de uma série de reuniões que nós vamos ter, de uma série de explicações, de uma série de entendimentos sobre a dívida pública. Com certeza, nós vamos ter muito trabalho aqui. Não é um trabalho de 2 meses. Eu acho que o trabalho sobre esse caderno vai ultrapassar 1 ano. Então, nós vamos ter bastante tempo, e vamos precisar muito da colaboração do Banco Central para entender o que poderemos fazer em termos de legislações, em termos de movimentos políticos, para que o Brasil tenha uma dívida menor, para que o Brasil possa pagar a dívida aos níveis internacionais, e não ficar pagando acima do que a Europa e o Japão pagam por suas dívidas.
Agradeço também ao Humberto e ao Antonio Carlos? E vamos ter muito trabalho. Juliana, eu peço desculpas pelo atraso hoje no início da reunião. Agradeço a todos os presentes.
Muito obrigado.
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