1ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA 56 ª LEGISLATURA
Centro de Estudos e Debates Estratégicos
(Reunião do Grupo de Estudo Atenção Primária à Saúde no Brasil)
Em 26 de Setembro de 2019 (Quinta-Feira)
às 9 horas
Horário (Texto com redação final.)
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O SR. PRESIDENTE (Dr. Luiz Ovando. PSL - MS) - Nós vamos dar início a nossa atividade agradecendo aos nossos assessores e consultores, a todos os nossos convidados e, de forma específica, ao Sr. Carlos Augusto de Melo Ferraz, Secretário de Controle Externo da Saúde do Tribunal de Contas da União — TCU, ao Sr. José Antônio Bonfim Mangueira, Coordenador-Geral de Monitoramento das Recomendações de Auditoria do Ministério da Saúde — DENASUS/MS, e ao Sr. Jacson Venâncio de Barros, Diretor do Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde do Ministério da Saúde DATASUS/MS.
Quero dizer para os senhores que é uma satisfação tê-los aqui, não nos esquecendo de Marcos e Fábio, nossos consultores, e também do taquígrafo, que, de forma muito discreta, nos ajuda e não deixa escapar absolutamente nada.
Eu quero me apresentar: sou o Deputado Dr. Luiz Ovando, do PSL do Mato Grosso do Sul, de Campo Grande; sou médico. Os senhores estão aqui exatamente para dar esse esclarecimento em relação as nossas dúvidas. Eu vou colocar, de forma bem objetiva, sucinta, aquilo que motivou este debate.
Nós temos na área de saúde muitas afirmações. De modo geral, cada um tem uma maneira de garantir a sua verdade. Como médico, nós também temos a nossa verdade, mas ela não é absoluta. Nós sabemos disso. É preciso juntar, aglutinar informações, para que possamos derivar uma verdade, ou, pelo menos, uma condição mais próxima da verdade.
A busca da verdade é um fundamento filosófico profundo. Nós todos buscamos a verdade de maneira geral. Às vezes, chegamos próximo — poucas vezes. A grande maioria das vezes ela passa a ser relativa e acabamos mudando em alguns aspectos.
Em relação específica à saúde no País, nós tivemos uma série de mudanças. Nesses últimos 15 anos, mais especificamente de 2001 para cá, nós tivemos várias variáveis que comprometeram realmente o resultado do atendimento em saúde, mais especificamente o atendimento primário, o atendimento básico em saúde.
Nós tivemos, em 2013, o Programa Mais Médicos. Ainda ontem, tivemos uma discussão sobre a Medida Provisória nº 890, de 2019, no Plenário 2 do Senado, quando muitas coisas foram discutidas. E sempre destacam o Mais Médicos. Eu sempre tenho insistido no fato do aspecto estatístico do programa, mudança de resultados, redução de mortalidade, redução de internação. E ninguém responde. Essa é uma grande questão, Carlos. Ninguém responde.
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Existem afirmações de que se precisa de mais médicos, de que o País é deficitário em médicos. Aí vamos para a demografia médica e vemos que estamos no índice de forma satisfatória em relação àquilo que preconiza a Organização Mundial de Saúde, mas que há uma distribuição inadequada de médicos. Quanto a isso não há dúvida. Quando vamos a uma cidade como Vitória, onde temos 12 médicos por mil habitantes, e, depois, ao interior do Piauí, onde temos 0,65 médico por mil habitantes, vemos de forma gritante essa diferença.
Baseado nisso, diz-se "não tem médico!". Claro, não há médico nos rincões, não há médico no interior, não há médico nas cidades de 20 mil habitantes ou menos. E é preciso haver. Então, trazem mais médicos, e, não sabemos, só vemos a saúde piorar, do ponto de vista de resultados: pacientes pelo chão, pacientes com diagnósticos protelados, pacientes complicados, pacientes morrendo. É aquilo que aparece na mídia.
Devido a todos esses fatos, e a muitos mais... E eu tenho insistido sempre que, de maneira geral, a medicina está indo muito bem, a medicina ciência, mas a saúde nem tanto. Podemos até arriscar e dizer "vai mal!". A pergunta é: por que isso? Porque saúde não é medicina. Saúde é um conjunto de ações da qual a medicina faz parte. Aí nós abordamos basicamente só a questão médica, e o médico acaba ficando como responsável, porque não quer ir para o interior, falta programa de Governo atrativo, não se valoriza o clínico. Há muita interposição entre paciente e médico, coisa que temos destacado bastante. Consequentemente, os resultados para a saúde não se fazem progressivos, não se fazem em melhoras, e vemos cada vez mais piorar.
Então, temos discutido aqui vários pontos, e hoje basicamente é a verdade. Estatística é a verdade, viu, Carlos? Com algumas pequenas variações, se elas não forem abordadas de forma diferente. Temos bastante esperança em que possamos já começar a ter as respostas diante disso aí.
A nossa apresentação — a Juliana nos assessora bastante, a quem agradeço especificamente, aqui escondidinha — se baseia em 15 minutos. Ela tem aqui uns cartazes com alguma tolerância, sem nenhum problema. Nós temos até o meio-dia. Eu acho que dá para discutir bastante. E os senhores podem, diante daquilo que foi proposto, esclarecer, levantar essas situações todas que levantamos aqui. Quer dizer, nós buscamos exatamente a efetividade na redução de complicações e resolubilidade dos problemas de saúde fundamentados no atendimento primário da saúde, ou atendimento básico, e também redução de internação. Temos alguns dados estatísticos, enfim.
Eu vou deixar a palavra livre. Quem quiser se apresentar e, durante a apresentação do tema, dizer as suas qualificações profissionais, fique inteiramente à vontade.
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Aqui, pela ordem, está o Sr. Carlos. Não sei se os senhores se organizaram em termos de apresentação de sequência de dados. Quero deixá-los à vontade, por favor.
O SR. CARLOS AUGUSTO DE MELO FERRAZ - Bom dia a todos.
Sou Carlos Ferraz, Secretário de Controle Externo da Saúde, do Tribunal de Contas da União. Pelo visto, sou o primeiro a fazer a apresentação. (Risos.)
Começo já ou aguardo as pessoas se apresentarem primeiro?
O SR. PRESIDENTE (Dr. Luiz Ovando. PSL - MS) - Deixe eles apresentarem. Raquel chegou agora e já vai se apresentar.
O SR. CARLOS AUGUSTO DE MELO FERRAZ - Está ótimo.
A SRA. RAQUEL DE NAZARÉ NUNES E SOUZA - Bom dia. Desculpem-me o atraso.
Sou Raquel, Técnica do Departamento Nacional de Auditoria do SUS — DENASUS do Ministério da Saúde. Sou servidora do Ministério desde 2010. Nesse tempo, não fiquei só na Auditoria, rodei por vários espaços, inclusive na própria atenção básica, dentro do Ministério da Saúde. Minha maior afinidade sempre foi com diabetes. Por isso sempre fui permeando vários espaços dentro desse tema.
Hoje, particularmente, estou num curso na Universidade Johns Hopkins avaliando questões de complicações de diabetes, inclusive com uma equipe de vários países. O grupo da Johns Hopkins tem essa potencialidade de misturar vários países da América Latina, o que é uma proposta de estudo de epidemiologia. Então, hoje estamos avaliando as complicações, a quantidade das cinco principais complicações. O país escolhido foi o México. Escolheu-se um Estado do México que tem coisas muito semelhantes com o que precisamos aplicar aqui, principalmente na área de prevenção, que está dentro da atenção primária.
O SR. JOSÉ ANTÔNIO BONFIM MANGUEIRA - Sou José Antônio Bonfim Mangueira.
Primeiramente, obrigado pelo convite.
Estamos aqui em nome do Diretor do Departamento, Sr. Cláudio Azevedo Costa, que não pôde comparecer. Estamos eu e Raquel. Sou Coordenador-Geral de Monitoramento de Recomendações das Auditoria. Nós fizemos ultimamente um trabalho na Política Nacional de Atenção Básica, apenas em dois traçados: diabetes e hipertensão. Estamos, contudo, no final desse trabalho, na construção e na elaboração do relatório gerencial.
O SR. JACSON VENÂNCIO DE BARROS - Bom dia.
Meu nome é Jacson Barros. Quero agradecer o convite. Sou Diretor do Departamento de Informática do SUS — DATASUS. Cheguei este ano. Faz exatamente 7 meses. Estou indo para o oitavo mês. A minha carreira foi no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Sou engenheiro, mas tive a oportunidade de fazer mestrado e doutorado na Faculdade de Medicina, onde estou há 29 anos. Estou emprestado para cá para tentar trazer um pouco do conhecimento da saúde para dentro do DATASUS e poder fazer com que a informatização da saúde no Brasil seja realmente eficaz e traga valor para quem realmente precisa, que é o paciente. Pretendo colaborar.
O SR. RODRIGO ELOY ARANTES - Posso me apresentar também?
O SR. PRESIDENTE (Dr. Luiz Ovando. PSL - MS) - Sem dúvida.
O SR. RODRIGO ELOY ARANTES - Bom dia.
Sou Rodrigo Eloy, da Controladoria-Geral da União — CGU. Atualmente, sou Coordenador-Geral de Auditoria da Área de Saúde.
Nós temos uma estrutura na CGU semelhante à do Tribunal de Contas da União — TCU. Temos divisões temáticas e temos algumas divisões também transversais. Digamos que, num passado pouco recente, nós éramos basicamente divisões temáticas: saúde, educação... Replicava-se praticamente o que havia de Ministérios. Como uma estratégia até de otimização dos nossos trabalhos, passamos a ter organizações mais transversais: equipes especializadas em obras, equipes especializadas em Tecnologia da Informação — TI, enfim.
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Hoje, contudo, ainda mantemos pelo menos as principais áreas temáticas. Ainda mantemos essa estrutura. Quando for fazer minha apresentação, detalho melhor como tem sido a nossa atuação, as nossas linhas dentro de auditoria da área da saúde.
Estou na CGU desde 2012, sempre trabalhando em saúde, apesar de não ter formação na área. É, aliás, uma característica da CGU, apesar das divisões temática, sermos profissionais de auditoria. Eu sou contador. Tenho mestrado em Políticas Públicas e especialização em Análise de Dados. Acredito que essa visão de fora da saúde, dentro da saúde... Digo que quem começa a trabalhar com saúde não quer parar de trabalhar com saúde. É um bichinho que nos pica, e nós ficamos contaminados pelo resto da vida. Acho que essas abordagens de fora agregam muito. E nós temos conseguido bons resultados como órgão de controle, trazendo visões mais estratégicas sobre as políticas de saúde.
O SR. PRESIDENTE (Dr. Luiz Ovando. PSL - MS) - Vamos dar início.
Carlos é o primeiro?
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Dr. Luiz Ovando. PSL - MS) - Isso.
Eu peço que, ao falarem, falem bem próximo ao microfone. Esta reunião está sendo registrada e, assim, o taquígrafo também ouve melhor. Apenas se atentem a esse detalhe, por gentileza.
O SR. CARLOS AUGUSTO DE MELO FERRAZ - Recebi a demanda de falar sobre a atenção primária dentro da ótica do TCU, com o objetivo de investigar qual é a efetividade dos modelos de atenção primária do SUS, comparando-os com outros sistemas universais de saúde, além de indicar meios para ampliação da sua efetividade.
(Segue-se exibição de imagens.)
Na verdade, o TCU não tem nenhum trabalho que trata especificamente disso, mas tem trabalhos que tratam da atenção primária. Vou falar de três: Qualidade da Atenção Básica à Saúde, Programa Mais Médicos e Programa Farmácia Popular. Vou falar rapidamente desses trabalhos, sem detalhes, pois eles estão disponíveis na Internet e porque, na realidade, acho que é mais importante falarmos sobre o último item do que alguma coisa que seja mais resultado de trabalhos da OMS do que do TCU. Na realidade, são trabalhos que são conhecidos internacionalmente.
Vou começar a falar sobre o trabalho de dar foco e qualidade à atenção básica na saúde. Fiscalizar a saúde é extremamente difícil. Então, um dos problemas é esse. Para fazer um trabalho desses, o Tribunal de Contas da União teve que contar com a colaboração de todos os tribunais que estão aqui. Em regra, trabalhos na saúde são assim e demandam articulação dificílima, porque a saúde é extremamente distribuída, a atenção primária é extremamente distribuída, e o País não é exatamente uniforme.
O Ministério da Saúde tem sucessivamente investido e tem percebido a necessidade da atenção primária. Ele tem cada vez investido mais. No ano passado, gastou da ordem de 20 bilhões e tem percebido mais a importância de investir na atenção primária. Não obstante isso, nós continuamos investindo pouco na atenção primária. O recurso gasto no final é pequeno e resulta numa cobertura baixa. Nós estamos com uma cobertura hoje de pouco mais de 60%.
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Quais foram os achados de auditoria desse trabalho? Fragilidades detectadas no processo de levantamento das necessidades de saúde e do planejamento da atenção básica — quem não conhece o problema tem dificuldade em tratá-lo —; deficiências verificadas na atuação ministerial relacionadas à implementação do Contrato Organizativo da Ação Pública, o COAP — na realidade, ele foi muito pouco implementado até hoje, inclusive —; precariedades no contrarreferenciamento de pacientes no âmbito do SUS — a atenção primária não recebe de volta as informações necessárias —; levantamento precário das carências existentes na capacitação de profissionais que atuam na atenção básica e seus impactos na oferta de educação permanente — há carência severa de profissionais na atenção primária, mas elas não são identificadas adequadamente, as pessoas não são adequadamente treinadas, e os resultados são um serviço inadequado —; insuficiência de indicadores capazes de avaliar e monitorar os processos de trabalho e também os resultados — o Ministério da Saúde tem dificuldade em indicadores —; ausência de diagnóstico estruturado da situação de TI nos Estados e Municípios — o Ministério da Saúde tem investido muito, recentemente, nisso, e o Dr. Jacson é capaz de prestar excelentes informações sobre isso, talvez seja onde esteja investindo mais.
No Programa Mais Médicos foi feito este trabalho. Nós constatamos, entre outras coisas, vou me deter apenas nesse detalhe, na distribuição dos médicos. Percebemos, evidentemente, que há muito mais médicos no Sudeste do que no Norte. E registrei do lado direito os nove Estados que mais têm médicos e, abaixo, os nove que menos têm. Isto que está à esquerda é a distribuição dos médicos para os Estados. Os que estão destacados em vermelho são os que mais têm médico.
Então, em regra, os Estados que mais têm médicos, excluído aí o Distrito Federal, são também os que mais recebem médicos. À direita, temos os Municípios que concentram alocação de médicos do Programa Mais Médicos. Ali, estão os Municípios que mais receberam médicos e os destacados em azul são os que não são capitais. Curiosamente, a alocação de médicos para o Programa Mais Médicos é para os Municípios que são capitais ou cidades bastante desenvolvidas, como Campinas, Osasco, Guarulhos, Ponta Grossa, etc.
Então, esta é a distribuição do programa.
Eu estou mencionando isso porque, neste momento, o Programa Mais Médicos vai ser substituído pelo Programa Médicos pelo Brasil. O tema está em debate aqui e existe um risco de repetição do que está aqui. Nós temos de aprender com as lições do passado.
O SR. PRESIDENTE (Dr. Luiz Ovando. PSL - MS) - Carlos, deixe-me só fazer uma pergunta. Eu já tinha visto esse gráfico. No Programa Mais Médicos, aquela porcentagem é em relação ao total de médicos do programa?
O SR. CARLOS AUGUSTO DE MELO FERRAZ - Do programa.
O Programa Farmácia Popular é um programa do Governo Federal também.
Desculpem, eu me esqueci de mencionar que o programa anterior vai ser monitorado no começo do ano que vem. O Programa Mais Médicos ia ser monitorado também no começo do ano que vem. Em função da substituição pelo Programa Médicos pelo Brasil, nós cancelamos o monitoramento e iniciamos uma fiscalização na formulação do Programa Médicos pelo Brasil. Então, neste momento, existe uma equipe analisando a adequação da formulação do programa, se ele foi baseado em evidências, se foram analisadas alternativas etc. Acredito que, em novembro, devemos ter o resultado da fiscalização.
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Muito bem, o Programa Farmácia Popular também deve ser monitorado no começo do ano que vem. A conclusão mais relevante do tribunal é está: "(...) os gastos incorridos pelo Ministério da Saúde ainda se mostraram superiores aos valores que seriam dispendidos caso os mesmos fármacos fossem adquiridos e distribuídos pela rede básica de saúde".
De forma geral, esse é um problema generalizado nas políticas de saúde. Quando a política é formulada, não é feita uma análise de custo-benefício. Não são feitas análises alternativas. Nós escolhemos programas que, na realidade, custam mais para obter o mesmo resultado do que programas já existentes ou alternativas. Em regra, as alternativas não são nem sequer consideradas.
Sobre o Tribunal era isso que eu queria falar, mas quero mencionar alguma coisa aqui da Organização Mundial de Saúde e relembrar algumas coisas.
Este aqui é um documento a Ação Primária da Saúde para o século XX, a visão que a Organização Mundial de Saúde tem para a atenção primária.
Diz a Organização Mundial de Saúde: "A APS é uma abordagem de saúde de toda a sociedade que visa garantir o mais alto nível de saúde e bem-estar possível (...)". Eu queria destacar que a atenção primária, portanto, está limitada pela reserva do possível, do recurso que é disponibilizado para aquilo que é viável fazer. Ela tem obrigação de tentar ser mais eficiente, mas ela está sempre limitada por isso. "(...) concentrando-se nas necessidades e preferências das pessoas, como indivíduos, famílias e comunidades, o mais cedo possível ao longo do continuo que vai desde a promoção da saúde e prevenção de doenças até o tratamento, a reabilitação e os cuidados paliativos (...)".
Pois bem, para a Organização Mundial de Saúde há três componentes inter-relacionados. Os dois primeiros são relacionados a cuidados abrangentes, promotores, protetores, preventivos, curativos, reabilitadores e paliativos ao longo da vida. Isto é, a dimensão curativa é um pedacinho da atenção primária.
Além disso, outro componente é abordar sistematicamente os determinantes mais amplos da saúde, incluindo fatores sociais, econômicos e ambientais, bem como características e comportamentos individuais. Isto é aquele conceito de integralidade que foi colocado na Constituição que não é atender todo mundo conforme a prescrição médica, mas que é examinar o conjunto dos componentes que traz a saúde para a pessoa.
O último item é capacitar indivíduos, famílias e comunidades para otimizar sua saúde, como cuidadores de si mesmo e como cuidadores dos outros.
Percebam que a questão fundamental de saúde é que quem cuida de saúde essencialmente são indivíduos que são capazes de cuidarem de si mesmos. Eles se preocupam em ter uma alimentação saudável, em fazer exercício, em passar protetor solar, em tomar conta de si mesmos, em ter uma vida saudável; e também se preocupam com os outros. Indivíduos atuando isolada ou coletivamente em associações, em igrejas, etc. tomam conta uns dos outros, tomam conta dos componentes da sua família e a família toma conta desses indivíduos. Esses são os elementos centrais da atenção primária de saúde para obtenção de bem estar e saúde. Isto é, a dimensão curativa é um pedacinho disto que está aqui.
A Organização Mundial de Saúde tem este gráfico que é bem bacana que mostra que a entrega de componente de saúde é um componente deste tamanhinho do total do incremento de saúde das pessoas. Na realidade, há outros fatores que são muito mais relevantes e quase 50% são externos à saúde.
Vou destacar alguns. Produto Interno Bruto per capita. É isto mesmo: quando a renda aumenta as pessoas ficam saudáveis; quando a renda cai, as pessoas ficam depressivas, os casais se separam, os filhos perdem educação adequada, as pessoas deixam de se alimentar adequadamente, deixam de cuidar da saúde, saem da academia, etc. A saúde das pessoas piora.
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O que destacamos aqui é relevante para se perceber o seguinte: eu vejo hoje as pessoas discutindo a questão do teto de gastos, que é preciso violar o teto de gastos para se gastar com saúde. Isso está sugerindo que o teto de gastos é um importante componente da saúde, porque garante que o País volte a ter crescimento sustentável e que as pessoas possam cuidar da sua saúde e de si mesmas, porque esse é um dos mais importantes componentes para ter saúde de verdade.
O segundo componente é o saneamento básico. Curiosamente, no Brasil, despesas com saneamento urbano não são despesas de saúde, só despesas com saneamento rural. Mas saneamento é uma questão fundamental para a saúde. Então, nós deveríamos estar discutindo isso aqui, porque a União não tem recursos, os Estados não têm recursos, os Municípios não têm recursos para fazer a atenção primária. Então, se queremos discutir a atenção primária, se queremos melhorar a saúde das pessoas, temos que nos preocupar em buscar meios de captação de recursos para saneamento num país que é extremamente carente de saneamento. Isso significa que precisamos reservar os recursos públicos para lugares onde o saneamento não é viável economicamente e que, para os lugares onde é viável economicamente, nós deveríamos ter feito um monte de concessões, permissões, etc.
O terceiro componente que eu gostaria de mencionar é a educação. É claro que a educação de que nós estamos falando aqui não é saber o resultado da multiplicação de números complexos ou saber o que é uma progressão geométrica e aritmética — não. Precisamos saber isto aqui: é a educação que capacita indivíduos, famílias e comunidades para otimizar a própria saúde e que faz as pessoas compreenderem que elas são as responsáveis, as cuidadoras de si mesmas e umas das outras. Essa educação é fundamental para que tenhamos saúde.
Por fim, vou mencionar o progresso técnico, que também é outro fator extremamente importante. Quem não leva em consideração o progresso técnico na saúde não entendeu o problema de atenção primária. A atenção primária se faz, em grande parte, hoje, com tecnologia.
Este artigo, que não é da Organização Mundial da Saúde, mas explica o tema até melhor do que o próprio texto da OMS, diz o seguinte: a expectativa para a atenção primária no futuro é de que haja sensores no corpo das pessoas para monitorar condições como sinais vitais, para saber quantas horas dormiu, se dormiu bem, quantas horas de sono profundo, quantos passos foram dados, etc.
Existem equipamentos em casa que contribuem para essa melhoria, como medidores de pressão. Há equipamentos sociais, há a possibilidade de a pessoa fazer uma consulta com o médico usando o celular, em que o médico faz prescrições pela Internet. Isso tudo se relaciona à equipe de atenção primária, que recebe as informações. Essa equipe tem mais informações do que o médico. Os médicos são da máxima relevância, mas há outras coisas que vão ser avaliadas e diagnosticadas, para que se possa dar atenção apropriada àquelas pessoas.
Retornando à Organização Mundial da Saúde, o texto diz sobre a força de trabalho em saúde: equipes eficazes e coordenadas, com uma gama de habilidades e competências, para atender à maioria das necessidades de saúde da população perto de onde vivem. Essas equipes são idealmente multidisciplinares e incluem: médico de família, enfermeiro, agente comunitário, assistente médico, agente de reabilitação, nutricionista, gerente de assistência, assistente social, farmacêutico, dentista, curandeiro, equipe de apoio, enfermeiras e parteiros. O médico de família desempenha um papel central no sistema de saúde orientado para a atenção primária, com atenção eficaz. O médico de família especializado em cuidados abrangentes e generalizados para todas as pessoas pode apoiar a equipe da atenção primária na abordagem de uma série de problemas de saúde.
Na realidade, grande parte do problema de saúde deveria ser resolvido por enfermeiros, talvez, enfermeiros mais bem treinados. Não há qualquer necessidade de que seja o médico. Nós temos uma restrição a isso. Achamos que isso está mais vinculado a interesse do que à necessidade da população. Em vez de médico da família, deveria ser enfermeira da família. A política poderia ser Enfermeiros pelo Brasil. Talvez isso fosse mais útil e mais razoável. O médico tem que dar apoio à equipe de enfermagem. Essa é a lógica da atenção primária. Os enfermeiros vão às unidades, atendem às pessoas, etc., e têm o suporte, o apoio do médico, inclusive, com facilidades tecnológicas que hoje existem aí sobrando.
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Este é outro artigo também da Organização Mundial da Saúde, que diz a mesma coisa: precisamos redirecionar intervenções e instalações de cuidados secundários e terciários, como instalações hospitalares, para os lares das pessoas, através de telemedicina, atendimento remoto em saúde. Não há nenhuma necessidade, muitas vezes, de a pessoa estar lá no hospital. Muitas vezes, o atendimento pode ser feito utilizando-se a telemedicina, etc., com monitoramento doméstico, sensores eletrônicos, prescrição eletrônica. Percebam que é exatamente a mesma coisa de que aquele artigo anterior falou.
Quanto a dados, cada vez mais se tem a perspectiva de que se deve haver dados pessoais. Então, precisamos tratar isso, ter capacidade de tratar isso. As equipes têm que ter capacidade de tratar isso, de receber esses dados tratados, para tomarem decisões razoáveis, que possam efetivamente melhorar a saúde das pessoas.
Para finalizar, eu trouxe só um pequeno exemplo aqui. Esse aqui é só um programinha, dentre os muitos que há por aí que tratam de saúde, o Feebris, que faz o diagnóstico de distúrbios respiratórios. Hoje ele está com precisão de 85% em comparação com outros diagnósticos. Esse é um exemplo, mas há dezenas surgindo. A expectativa que há é, no futuro, compreendermos isto. Há cidadãos capazes, às vezes, de se autodiagnosticar, de utilizar ferramentas de suporte, de conversar, de utilizar a telemedicina, conversar com médicos a distância, etc. Essa é a expectativa de futuro da Organização Mundial da Saúde e de vários outros atores.
Obrigado.
É só isso. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Dr. Luiz Ovando. PSL - MS) - Nós vamos proceder à apresentação de todos. Ao fim, vamos fazer uma síntese e discutir.
Com a palavra o Sr. Rodrigo Eloy Arantes, por favor.
O SR. RODRIGO ELOY ARANTES - Bom dia novamente a todos.
Quando recebemos, na CGU, esse convite do CEDES e fui designado para estar aqui hoje, busquei as reuniões passadas do grupo para verificar como o grupo se formou, qual o objetivo principal desse grupo relacionado à atenção primária. Eu analisei as apresentações anteriores do pessoal do IPEA e do CONASS. Enfim, vi que ali já havia um material muito rico em termos de estatística, de dados, de remuneração de pessoal, de distribuição de recursos humanos. Longe de mim querer rebater ou complementar o que eles trouxeram aqui. Por isso, pensei numa apresentação um pouco mais institucional a respeito da atenção primária em saúde, principalmente, da atuação das instituições e dos atores, porque certamente as falhas nos desenhos institucionais são uma das principais causas para problemas em termos de resultados. Então, essa é uma apresentação num viés mais institucional, com um pouco de provocações em certo ponto.
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(Segue-se exibição de imagens.)
A primeira provocação é que eu costumo dizer que o SUS e as políticas de saúde são um universo paralelo. Há muitas questões relacionadas às políticas de saúde que só se encontram no SUS. O Ferraz foi muito preciso ao dizer o tanto de fatores que afetam as condições de saúde da população. Por isso, talvez, dentro de todo o contexto em que o SUS foi criado, de toda a audácia, de todo o grande desafio que foi posto na Constituição quando da sua criação, o principal deles foi falar que não é apenas uma política pública, não são somente políticas sociais, mas são políticas econômicas e sociais voltadas à garantia da saúde da população.
Eu digo que os desafios não são apenas para quem executa, mas para quem controla também. As relações de causa e efeito relacionadas à saúde são bem complicadas de serem aferidas. Novamente, o que o Ferraz colocou é bem preciso. Às vezes, questões de educação, questões de saneamento, questões de trânsito, questões de violência doméstica, enfim, vários aspectos e fatores da sociedade afetam as condições de saúde da população e devem ser considerados tanto pelos tomadores de decisões, como pelos controladores.
Eu destaco aqui um aspecto que acho importante e que gera muitos problemas lá na frente. Uma das principais inovações do SUS, em termos de política pública, é criar um "ente" — entre aspas — ou uma dimensão territorial que não corresponde a um ente federativo, que são regiões de saúde. Existem três níveis da Federação, três entes, os Municípios, os Estados e a União, mas a saúde é toda pensada, é toda desenhada, é toda concebida com a concepção de regiões. Não há como pensar em saúde, em qualquer nível, sem discutir regiões de saúde ou, mais recentemente, macrorregiões, microrregiões, enfim, sem discutir como isso vai se configurar.
O que vai chamando atenção é que, em todo o contexto, de que tudo que foi criado, pensando-se no arcabouço institucional do SUS, de certa forma, as regiões foram aos poucos sendo deixadas de lado. Elas nunca foram efetivas na verdade. Existem colégios participativos, que são as instâncias de governança do SUS, são os conselhos, as conferências; existem as instâncias municipais, estaduais e federais, mas não existem conselhos regionais. A mesma coisa são os gestores. Existem gestores do SUS nas esferas nacional, estadual e municipal, mas não existe a figura de um gestor regional. Tudo isso depende da boa vontade dos gestores estaduais e municipais principalmente. Aí, sim, talvez, a primeira e a única instância que se tenha instituído formalmente sejam os colégios regionais de gestores porque, repito, é uma questão muito mais de boa vontade dos gestores que ali estão do que realmente uma questão institucionalizada.
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Há a questão também de representação de gestores que, cada vez mais, no contexto brasileiro, têm um poder grande. Os CONASS, os CONASEMS e os COSEMS também não encontram uma figura institucional relacionada às macrorregiões de saúde. Enfim, estamos falando hoje de mais de 400 regiões de saúde talvez. Ainda é inviável se pensar em 400 localidades, em 400 territórios para se trabalhar a saúde de forma integral ou se garantir a integralidade da saúde nessas regiões. Por isso, talvez a tendência seja mais em pensar macrorregiões. Há em torno de 100 no Brasil inteiro.
Eu estava falando ali da gestão, das instâncias gestoras do SUS e das lacunas deixadas pela falta de regionalização. Eu queria falar um pouco sobre a rede de controle. É o que nós aqui fazemos, é o que o TCU, a CGU e o DENASUS fazem. Novamente, é um universo paralelo, porque não replica aquilo que acontece em outras pastas.
O modelo com o qual nós trabalhamos divide o controle em quatro grupos. O primeiro grupo é o do controle administrativo, que é realizado pelo controle interno e externo. Em relação ao controle interno, nós lá na CGU temos trabalhado a ideia do conceito das linhas de defesa, que vou abordar mais para frente de uma forma um pouco mais provocativa também. O controle externo o TCU executa no âmbito da União, em apoio ao controle parlamentar também, que é um segundo nível. Aqui também estamos no fórum de discussão de controle parlamentar. Além destes, existem o controle judicial, com a ajuda do Ministério Público; o controle social, que na saúde é muito forte e tem um papel, digamos, híbrido, porque, ao mesmo tempo em que é controle também é participação quando falamos de conselhos; e os controles social e coletivo, formais e informais, a imprensa, os conselhos, conferências, etc.
Eu queria focar aqui a questão do controle interno, porque acho que mais para frente vai fazer sentido o que eu quero dizer sobre o quanto os problemas relacionados ao desenho do controle também podem gerar problemas na execução da política.
Este é o modelo das três linhas de defesa. Certamente muitos já viram esse esquema, no qual uma organização pode ser dividida em três níveis de controle ou três camadas de controle. A primeira linha, a primeira camada de controle é feita pelos próprios executores da política, que são aqueles que têm a responsabilidade de executar determinada política. Como parte indissociável da execução de uma política, existem medidas de controle interno, que são mecanismos para garantir que aquela política está sendo realizada de forma adequada e condizente com os resultados esperados. Aí existe uma segunda linha de defesa, que são instâncias ainda dentro da organização que basicamente se relacionam com a conformidade daquilo que é feito na primeira linha. São instâncias de conformidade. A terceira linha de defesa é a auditoria interna, que tem um papel importante na execução de políticas. Todas essas três linhas se reportam à alta administração da organização, enquanto a terceira linha também se reporta às instâncias de governança e conselhos.
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Ao lado, há a auditoria externa e os órgãos reguladores. Mas eu começo a fazer um paralelo de como isso é no SUS, de como conseguiríamos imaginar isso no SUS. Vamos deixar esse modelo em branco e tentar imaginar como seria isso, por exemplo, no Governo Federal como um todo, não só no SUS.
Quando falamos de Governo Federal, nessa primeira linha, está a alta administração — a Presidência da República, a Casa Civil, os órgãos do núcleo do Governo — e há uma instância de governança, um comitê. É difícil imaginarmos, mas, certamente, o local que melhor representa a governança do Governo Federal é o Congresso Nacional. Existem conselhos constitucionais da República e existe a sociedade de forma geral, que é quem realmente deve definir as diretrizes para a execução das políticas.
Embaixo disso, conseguimos imaginar três linhas de defesa. Na primeira linha de defesa, estamos falando das Secretarias finalísticas, os Ministérios finalísticos que devem adotar seus próprios instrumentos de controle das suas políticas.
Existe a segunda linha, que são os sistemas estruturantes do Governo Federal. Temos a SOF, que trata do Orçamento, o Sistema de Recursos Humanos, que antigamente estava no Mistério do Planejamento e hoje está no Ministério da Economia, a Secretaria de Patrimônio da União, a Advocacia-Geral da União, o Tesouro e algumas comissões — por exemplo, o Comitê de Monitoramento e Avaliação de Políticas Públicas, recém-instituído —, que configuram uma segunda linha de defesa, que atuam com uma função de conformidade daquilo que é realizado na primeira linha.
A terceira linha de defesa, que é o papel do órgão que eu represento, a Controladoria-Geral da União, exerce a função de auditoria interna do Poder Executivo Federal. Então, aqui nos situamos basicamente. Nosso business, nossas entregas são basicamente para a alta administração — Presidência, Casa Civil, núcleo de Governo. É óbvio que, quando falamos de uma organização do tamanho do Governo Federal, incluímos Ministros, Secretários e Diretores. Mas temos que nos reportar principalmente à sociedade de forma geral, aos organismos de governança do Poder Executivo Federal. Ressalto o que cabe a um órgão de auditoria interna: é a avaliação conforme princípios de independência e autonomia das outras duas linhas de defesa. Nada mais do que isso é a função da CGU dentro do Governo Federal.
Novamente, aproveito o pessoal do DENASUS para fazer esse questionamento: e dentro do Ministério da Saúde? Vamos imaginar que estamos falando de um bolo. Podemos cortar o bolo de várias formas — triângulo, quadrado, círculo. Primeiro, cortei pensando na administração como Governo Federal. Agora estou pensando na administração como Ministério da Saúde.
De igual forma, no Ministério da Saúde, há uma alta administração, que é o gabinete do Ministro ou a Secretaria Executiva, apesar de, no caso concreto, a Secretaria Executiva ter muitas atribuições que não caberiam a ela, a meu ver. E há um órgão de instância de governança, que é o Conselho Nacional de Saúde. A partir daí, nós temos as três linhas. Novamente, a primeira linha representa quem executa políticas, as instâncias de conformidade dentro do Ministério da Saúde. Ali está a assessoria de controle interno, o próprio Fundo Nacional de Saúde, responsável pela conformidade da aplicação de recursos. E, como uma terceira linha de defesa, há o DENASUS.
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Eu só queria deixar isso claro porque estamos vivendo um período de mudança no papel do DENASUS. Só a partir deste ano é que ele foi adequadamente colocado na estrutura organizacional do Ministério da Saúde, vinculado ao gabinete do Ministro. Pelo menos em termos de organograma, está numa posição adequada, muito por conta de um próprio acórdão do TCU que tratou da necessidade do DENASUS de exercer o papel de auditoria interna do SUS. Eu digo que isso é provocativo, porque sempre discutimos o DENASUS com a função de auditoria ou como componente nacional de auditoria do SUS. Mas, quando pensamos no Ministério da Saúde, podemos facilmente classificá-lo como órgão de auditoria do Ministério da Saúde, porque o Ministério da Saúde nada mais é do que é a instância nacional do SUS.
Podemos fatiar o bolo de outra forma, pensando no SUS de uma forma geral. Assim, só trocamos o DENASUS por Sistema Nacional de Auditoria. Eu só estou cortando o bolo de outra forma. Quero chamar atenção para o quanto não temos ou o quão frágeis são as segundas linhas de defesa dentro do SUS. Como eu disse, é um arranjo complexo de gestores municipais, estaduais, federais, prestadores, empresas contratadas, hospitais filantrópicos. Enfim, há uma primeira linha de defesa, digamos, caótica em termos de arranjos. Por sua vez, não há uma segunda linha tão bem definida assim. Não temos como chegar a uma terceira linha de defesa sem essas duas.
O questionamento que eu faço em relação é isso é: o que acontece se o espaço político não é ocupado? Estamos imaginando que as medidas de controle, muitas vezes dentro das próprias Secretarias Municipais e Secretarias Estaduais, do próprio Ministério da Saúde são insuficientes. Não existem segundas linhas fortes, bem instituídas. Ou seja, existem buracos dentro do desenho da política. O questionamento que eu faço é o que acontece quando o espaço político não é ocupado. Via de regra, quando há um espaço político vazio, ele é ocupado por quem não deveria. Assim, muitas vezes, o DENASUS faz o que não deveria fazer. O DENASUS faz atividades de controle interno porque, muitas vezes, a atividade de controle interno não é executada por quem deveria fazê-la.
Mas não é só nisso que eu diria que há falhas. Eu acho que essa é a grande causa de muitos problemas na saúde. Os vazios ou espaços mal ocupados têm ocasionado arranjos informais no sistema, fazendo com que determinadas ações não sejam realizadas como deveriam, sendo consequentemente mal realizadas. Ou seja, estamos falando que, quando os espaços não são adequadamente ocupados por quem deveria, geramos distorções no sistema.
Vou dar exemplos de distorções. Serei rápido, para começar o tema da Mesa. O primeiro deles é a federalização da atenção primária. A atenção primária obviamente é competência dos Municípios — prestar serviço de atenção primária, organizar a atenção básica, utilizando outro termo. Mas muitos Municípios não têm condições de fazer isso. As regiões de saúde, por sua vez, foram adequadamente instituídas. Os Estados foram os que mais cedo sentiram problemas fiscais e, por isso, também não conseguiram ocupar esses espaços.
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Então, nós percebemos que a União, por meio do Ministério da Saúde, muitas vezes, precisou ocupar espaços dentro da atenção primária que não eram espaços dela. O Programa Mais Médicos, por exemplo, foi ou é uma solução paliativa quando a União assumiu o papel de contratar médicos da atenção primária. Se pensarmos em termos de desenho do SUS, isso é completamente distorcido, não deveria ser assim. Também não deveria caber à União comprar medicamentos e distribuí-los. É claro que há ganhos de escala. Muitas vezes, medicamentos excepcionais, medicamentos de alto custo justificam isso. Mas isto tem sido uma crescente, em termos de políticas públicas do Ministério da Saúde: a centralização de ações que não caberiam ao Ministério da Saúde.
Cito outro exemplo. A própria federalização da assistência à saúde, dos hospitais. Os hospitais universitários, por exemplo, têm exercido função cada vez mais importante nas redes de saúde. A União está gerenciando estabelecimentos hospitalares que, por sua vez, devem se inserir numa rede municipal ou estadual. Deve haver um contrato ali com o gestor local do SUS. Ou seja, estamos falando de a União, por meio do MEC, por meio da EBSERH, normalmente, assumir uma figura de prestadora de serviço que vai ser contratada com o Município.
Quando se pensava nos hospitais federais, nos hospitais universitários como instituições puramente de ensino, talvez isso fizesse sentido. Mas, muitas vezes, o fato de os prestadores locais típicos não ocuparem os seus espaços adequadamente tem sobrecarregado os hospitais universitários. Em muitas localidades, eles são a principal estrutura hospitalar da região. Paralelamente a isso, de uma forma até um pouco contraditória, há um sufocamento dos Municípios. É aquela velha máxima: as coisas acontecem nos Municípios; ninguém mora nos Estados; ninguém mora na União. Eventuais questões relacionadas a subfinanciamento dos outros dois entes — da União e dos Estados — têm feito um sufocamento dos Municípios, principalmente nas suas despesas.
Uma questão importante da qual falei um pouco é sobre o Conselho Nacional de Saúde. Superando qualquer questão política e ideológica, o Conselho Nacional de Saúde, no último exercício, reprovou novamente as contas do Ministério da Saúde. Um dos pontos abordados pelo Conselho Nacional de Saúde era o de que o Ministério — aí até amplio um pouco para o Governo Federal — não tem adotado, conforme entendimento do Conselho, medidas suficientes para mudar o modelo de gestão do SUS, que, como ele defende, deve cada vez mais investir na atenção básica, na atenção primária, em detrimento da atenção hospitalar ou da média e alta complexidade. Esse foi um dos motivos de reprovação das contas do ano passado.
Outra distorção que gera essa questão de os espaços não serem adequadamente ocupados é a perpetuação de desigualdades regionais. Nós falamos de má distribuição de médicos. Essa é uma questão complexa. Vamos pensar em três fatores de produção: terra, profissional e capital. Com a terra, não se mexe. Nós não conseguimos levar a terra de um lugar para o outro. O capital nós conseguimos levar tranquilamente de um lugar para o outro. Com pessoal, há um meio-termo. Em tese, nós conseguimos levar o pessoal para onde quisermos. Na prática, sabemos que não é assim. São pessoas, são seres humanos. Não é possível simplesmente pegar um médico que mora nos Jardins, em São Paulo, e criar estímulos para que ele se interiorize, para que ele vá para o interior do Piauí. Isso faz com que os gestores tenham de pensar em estratégias diferentes. Eu retomo: esses são espaços não ocupados que acabam gerando distorções. Uma das distorções é essa. O Ministério da Saúde tem de assumir o papel de trazer médicos de outros países ou buscar bolsas; oferecer pagamentos mais atrativos do que os Municípios geralmente ofereceriam a esses médicos, para buscar interiorizar os médicos. Isso ocorre paralelamente, mas de modo um pouco descompassado, à alternativa de se formar médicos nessas localidades. Como eu disse, nesse nosso universo paralelo, um dos grandes problemas também é a urgência de tudo. Tudo na saúde é urgente. Então, eu não posso pensar em ocupar necessidades de médicos, formando médicos daqui a 7 ou 8 anos. Nós temos de fazer coisas para ontem aqui.
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Uma questão que eu queria trazer também que acho importante é uma distorção dos novos modelos de gestão. Como eu disse, os Municípios vão pensar no modelo ideal, no qual os Municípios deveriam contratar esses médicos da atenção primária. Há um limite de pessoal imposto pela da LRF, que é rígido. Há problemas de arrecadação dos Municípios. Eles têm muito problema com a contratação de pessoal, de forma geral, especialmente com a contratação de médicos. Isso estimula a criação ou a adoção de novos modelos de gestão, que muitas vezes são vendidos como uma flexibilização ou um maior dinamismo às políticas públicas. Mas, muitas vezes, adotam-se esses novos modelos apenas como um artifício para fugir das amarras do Estado.
Como eu estou dizendo, muitas vezes se contratam, por meio de contrato de gestão, Organizações Sociais — OSs, Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público — OSCIPs, para que o valor aplicado naquele contrato não seja computado como despesa de pessoal. Não me refiro apenas à questão de demissão e seleção, mas principalmente à questão de limite de pessoal. Acho que essa é uma questão para a qual nós temos de estar atentos, até mesmo com a contratação de entidades filantrópicas.
Imaginem que um grande hospital filantrópico, no qual a maior despesa corrente é com pessoal — assim como é em qualquer hospital. Para o SUS, aquilo não é computado como despesa de pessoal, mas, sim, como serviços de terceiros. Com isso, ele consegue, de certa forma, burlar a legislação, em termos de limite de pessoal, o que vai criando um cenário cada vez mais próximo desse modelo de terceirização da saúde.
Dito isso, eu acho que um aspecto que nós temos de discutir, quando se fala em pessoal na atenção primária à saúde, é a questão do regime jurídico. Cabe à saúde, aos médicos, aos enfermeiros, aos agentes comunitários de saúde observar o Regime Jurídico dos Servidores Públicos em geral. Acho que essa é uma grande questão. Outra questão que sempre está em voga e que eu acho que tem que ser discutida é a necessidade de carreiras específicas para o SUS. Ou seja, se cortarmos o bolo da administração, pensando no SUS como uma organização em si, caberiam carreiras específicas dentro do SUS, não só carreiras municipais, estaduais ou federais, mas do sistema de uma forma geral, principalmente, quanto aos médicos. O que eu falei de limite de pessoal da saúde é uma questão a ser discutida. Aqui no próprio Congresso Nacional, há discussões sobre a eventual flexibilização dos limites de pessoal. Obviamente não vou dar opinião sobre isso, mas esse é um fator a ser discutido, que perpassa os efeitos adversos que encontramos hoje em termos de contratação de pessoal na atenção primária.
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Outra questão importante, que o Ferraz também colocou, é a da telemedicina, como a tecnologia tem avançado a ponto de mudar as relações de trabalho dentro da saúde. Talvez isso seja até um contraponto à estratégia de somente interiorizar médicos ou somente formar médicos no interior. Uma alternativa, uma possibilidade de amenizar a dificuldade de distribuição de médicos pode ser o investimento em telemedicina e em inteligência artificial de uma forma geral. Também há a questão de financiamento do SUS, de buscar mais fontes ou mudar o modelo de financiamento da média e alta complexidade para a atenção básica.
Outra questão que acho interessante — na CGU, temos sempre batido nisso — é a forma de buscarmos novas fontes de recurso na saúde, não criando, obviamente, novas fontes de arrecadação, mas fontes já existentes. Destaco aqui a recente criação da figura da restituição das despesas médicas em caso de violência doméstica. Pessoalmente — esta é uma opinião totalmente pessoal —, essa foi uma medida louvável, alterando a Lei Maria da Penha, que talvez possa até ser expandida para outras coisas. Por que não estender isso para acidentes causados por pessoas que ingeriram bebidas alcoólicas? Por que elas não podem ser responsabilizadas pelos custos no SUS?
Enfim, essas aí foram somente algumas observações que eu queria fazer a respeito do assunto.
Nós, da CGU, também temos muitos trabalhos publicados e estruturados sobre a atenção primária em saúde, sobre a atenção básica. Muitos deles são resultados de consolidação de fiscalizações que nós fizemos ao longo dos anos, principalmente desde 2003, nos sorteios públicos. Então, íamos aos Municípios, víamos o cumprimento de carga horária, contratação de médicos e estrutura de UBS.
Todas estas informações estão disponíveis no nosso site. Ficamos à disposição para discutir os aspectos mais pontuais em qualquer oportunidade.
Agradeço a atenção de todos.
Obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Dr. Luiz Ovando. PSL - MS) - Com a palavra agora a Sra. Raquel.
A SRA. RAQUEL DE NAZARÉ NUNES E SOUZA - Eu vou falar brevemente. Não trouxemos nenhuma apresentação, mas vou aproveitar, inclusive, as discussões e as pontuações trazidas pelo Dr. Ferraz e pelo Rodrigo.
Acho que já ficou muito clara a complexidade que temos em relação à saúde no Brasil, principalmente pela quantidade de campos diversos que temos. Então, temos formações muito diferentes de campos de saúde. Há acessos muito diferentes. De fato, ao trabalhar na saúde no Brasil, acaba sendo muito difícil tentarmos padronizar alguma coisa e gerarmos um único entendimento para o País inteiro.
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Daí se dá a grande dificuldade também que o Rodrigo questionou: a lógica de trabalho do DENASUS. Há dificuldade de o próprio DENASUS desenhar as suas ações e realizá-las também de forma padronizada.
Desde 2016, começamos a realizar auditorias na atenção básica, com um formato semelhante ao curso que fizemos com a equipe do TCU, para tentar mudar, inclusive, a percepção de como fazemos a análise das irregularidades e trabalhar, de fato, como auditoria que vem qualificar a gestão e não simplesmente só notificar o que foi errado.
Percebemos claramente, como o Rodrigo colocou também, que existe uma ausência de um controle primário dentro do Ministério da Saúde, e isso acaba gerando uma sobrecarga de ações que o DENASUS acaba fazendo. Acabamos trabalhando muito dentro de uma lógica de controle interno, porque faz falta o controle interno que não acontece de forma regular nas áreas.
Em partes, esse controle acaba não acontecendo de uma forma tão qualificada como deveria, pelo fato do tipo de controle que é feito. Então, as notificações que são feitas para os Municípios, quando eles não executam as ações, não geram punições muito graves ou, quando geram punições, é corte de recurso, e o corte de recursos sabemos que acaba piorando o quadro, já que aqueles pacientes que não foram atendidos quando o recurso for cortado aí que não serão mesmo atendidos.
Então, temos vários complicadores aí.
O grande problema que observamos dentro da saúde é a falta de qualificação, de fato, na gestão, desde lá na ponta até, muitas vezes, dentro do próprio Ministério, qualificação de entendimento do que está se fazendo ali. Então, há Secretários de Saúde que não são, de fato, da área, que não têm entendimento da região, da territorialização. A lógica de trabalho com regiões de saúde acaba complicando mesmo um pouco o entendimento, mas ela acontece porque as redes de atenção à saúde são desenhadas de acordo com os Municípios que temos e de acordo com as referências que são criadas e contrarreferências tanto de especialistas, quanto de encaminhamento de paciente.
Outra problemática que acho que acaba gerando essa lógica de band-aid é o desenho de trazer mais médicos para dentro da atenção primária, essa questão de não trabalhar de forma muito qualificada com a prevenção. Isso é o que acaba gerando um maior número de intervenções que caem na média e alta complexidade, que aumenta o custo, porque sabemos que é muito mais caro.
Como o Carlos trouxe, é muito interessante essa proposta de trazer mais tecnologia para dentro da atenção primária. A proposta da telemedicina é bem tratada com o telessaúde. Funcionou muito bem por alguns momentos. Então, hoje, volta a funcionar, mas também ainda não é tão presente pelas dificuldades que temos em relação à chegada de rede de Internet mesmo em vários espaços. Isso acaba gerando esse tipo de empecilho, tanto que foi esse o grande problema quando foi proposto que todos os Municípios tivessem essa tecnologia em 60 dias. E, por não chegar a Internet, fica um pouco difícil trabalharmos em relação a isso. Essas são as diferenças no Brasil e, portanto, precisamos trabalhar de forma diferente dentro desses espaços. Mas esta é realmente uma proposta muito boa.
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Quanto à lógica de educação e saúde, eu acho que passou da hora, de fato, de começarmos a observar melhor que educação em saúde não é só o profissional de saúde que tem que estar ciente de tudo o que acontece dentro de diagnóstico, dentro de percepção de sinais e sintomas. Os próprios pacientes, a população e a sociedade têm que observar isso. Trabalhamos isso na UnB, a muito tempo, de forma muito tímida, com uma proposta de educando e educadores, que era bem nessa lógica de como trabalhar com os profissionais de saúde para que eles treinassem melhor os seus pacientes; ou a sociedade, para que ela entenda melhor como é o sinal, o sintoma.
A ideia seria a de trabalhar isso até mesmo dentro de escolas, já que as crianças são os primeiros sinalizadores de várias coisas que acontecem dentro de casa. Então, se eles entenderem o que é um sinal, um sintoma de várias coisas, de complicações dentro da sua casa, eles conseguem ajudar também a sua casa e a sociedade.
Então, eu acho que, dentro dessa complexidade toda, precisamos, de fato, olhar um pouco melhor para a qualificação da gestão que temos. Eu acho que esse é o ponto mais importante, para conseguirmos resultados e paremos de trabalhar com esse tanto de band-aid.
Então, acho que é isso. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Dr. Luiz Ovando. PSL - MS) - Agora com a palavra o Sr. Jacson Venâncio de Barros. (Pausa.)
O SR. JOSÉ ANTÔNIO BONFIM MANGUEIRA - Presidente, só um minutinho. Quero só falar que a Direção do DENASUS informou à Secretaria do CEDES que não faríamos a apresentação justamente porque estamos na construção, na elaboração do relatório inicial dessa ação que estamos fazendo na Política Nacional de Atenção Básica. Pela importância dessa ação, ela vai ser monitorada junto com a Secretaria de Atenção Primária à Saúde — SAPS, onde há um grupo de trabalho do qual a Sra. Raquel faz parte e que está na elaboração deste relatório. Depois que o relatório estiver pronto, poderemos disponibilizá-lo.
O SR. PRESIDENTE (Dr. Luiz Ovando. PSL - MS) - E o senhor não vai falar nada? Está proibido?
O SR. JOSÉ ANTÔNIO BONFIM MANGUEIRA - Não, não estou proibido. Achamos importante participar do debate técnico aqui.
O SR. PRESIDENTE (Dr. Luiz Ovando. PSL - MS) - O.k. Já entendi. Claro que você vai participar aqui.
A SRA. RAQUEL DE NAZARÉ NUNES E SOUZA - Não, é para não dar um spoiler do próprio relatório...
O SR. PRESIDENTE (Dr. Luiz Ovando. PSL - MS) - Não, não. Não vamos antecipar os resultados. Eu entendo. Sem problemas.
A SRA. RAQUEL DE NAZARÉ NUNES E SOUZA - É. Desculpe-me.
O SR. PRESIDENTE (Dr. Luiz Ovando. PSL - MS) - Por nada.
A SRA. RAQUEL DE NAZARÉ NUNES E SOUZA - Na verdade, o que se observa de forma muito clara é que a grande problemática das questões de saúde que existem no Brasil é a falta de conhecimento, de fato, da população. Então, quando trazemos a cobertura, por exemplo, de 65% na Atenção Básica, percebemos claramente que não conhecemos quem é essa população. Apesar de haver uma estratégia de saúde da família em várias regiões, muitas vezes a equipe de saúde não conhece realmente essa população. Então, eles não conseguem nos dizer claramente quantos diabéticos há, quantos hipertensos ou como está acontecendo o monitoramento desses pacientes.
Então, eu acho que, para começarmos a trabalhar bem saúde, precisamos, primeiro, conhecer quem é o nosso público.
O SR. PRESIDENTE (Dr. Luiz Ovando. PSL - MS) - Eu gostaria que o Sr. José Antônio se comprometesse a nos enviar esse relatório assim que ele sair, porque isso é muito importante para nós. E vamos debatê-lo aqui e levantar algumas questões.
Obrigado.
Com a palavra o Sr. Jacson Venâncio de Barros.
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O SR. JACSON VENÂNCIO DE BARROS - Bom dia.
Mais uma vez agradeço a oportunidade de falar um pouco do nosso projeto.
Em tudo o que vocês colocaram, certamente há necessidade de informatização. A expectativa da informatização é a de que ela vem para ajudar. Sabemos da dificuldade de infraestrutura, embora muita coisa tenha melhorado — muita mesmo. Tivemos uma baita surpresa no interior de um dos Estados do Nordeste em que, no mínimo, havia entre 10 a 15 pontos de conexão com a Internet nas nossas Unidades Básicas de Saúde — UBS, coisa que até então ninguém imaginava que podiam acontecer, com velocidades altamente capazes de fazer o que vamos propor aqui.
Quando eu fui convidado para assumir o DATASUS, o Ministro me colocou, como um dos pontos principais, a possibilidade do famoso prontuário eletrônico do SUS, que é uma expectativa, um desejo do povo brasileiro, de todos nós profissionais de saúde ou não, para poder compartilhar, trocar informações de saúde.
Então, minha apresentação vai ser um pouquinho sobre o que o Ministério está fazendo, o que estamos propondo e aonde queremos chegar. Trata-se de uma proposta madura, a uma proposta exequível e dentro dos custos. Nós temos nesse processo a colaboração do TCU, que está diariamente envolvido conosco neste projeto.
Então, eu quero montar um pouco o contexto e mostrar para os senhores aonde estamos chegando.
(Segue-se exibição de imagens.)
Primeiro, alguns pontos importantes da realidade do País. Eu sempre coloco esse gráfico nas aulas porque é importante que saibamos sobre um dos pontos principais. Isto aqui é o Serviço de Arquivo Médico e Estatística — SAME de um hospital, que é onde se armazenam os prontuários de todos os pacientes. Essa imagem tem 10 ou 15 anos, mas acontece até hoje. O que eu quero dizer com isso? Continuamos tratando com papel, continuamos registrando dados em papel e deixando, do ponto de vista secundário, o dado eletrônico. Isso é uma realidade.
No ano passado saiu esse estudo. Convido os senhores a darem uma olhada nesse estudo. Nós ajudamos no estudo de 2018 e, na próxima semana ou na semana que vem, vai sair o estudo de 2018.
Basicamente, ele tem um retrato da utilização de recursos de informática dentro do universo da saúde. E aqui se fala de estabelecimentos de saúde, tais como hospitais, unidades básicas, unidades de pronto-atendimento, laboratórios, etc.
Aqui é só um quadro geral informando que 81% de estabelecimentos têm algum tipo de informatização; mas apenas 21% mantêm os seus registros clínicos de forma digital.
Aí eu dei um zoom nesse processo — e tudo isso está nesse book, disponível na Internet. Se eu pegar os hospitais com mais de 50 leitos, 77% não têm prontuário eletrônico. Eles podem ter sistema de informação, mas não registram de forma eletrônica os indicadores, as informações clínicas em seus sistemas, trabalham com papel. Isso é importante saber.
Como eu vou falar de digitalização, como eu vou falar de informatização, se eu tenho a maioria das minhas informações em papel? Então, isso é uma realidade que precisa mudar. Onde precisa mudar? Nos sistemas de informação, na cultura, no engajamento, no treinamento, na disponibilidade, na mobilidade. Então, essa é a fotografia é de 2017. Com certeza, a fotografia de 2018 deve dar uma melhoradinha, mas nada que seja tão relevante para não mostrar essa realidade nacional.
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Bom, com isso eu trago três problemáticas: falta de infraestrutura, falta de mão de obra qualificada, falta de padronização nas terminologias usadas — e aí eu falo de todos os entes. Se eu quiser pegar um paciente hoje da atenção primária e encaminhá-lo para a atenção especializada, eu já vou ter um problema de entendimento da linguagem. Ora, se eu não sei como codificar o procedimento; tudo bem, basta eu colocar o CID. Mas todo mundo sabe que o CID é um desfecho, é uma hipótese diagnóstica. Depois, lá na frente, eu tenho todos os medicamentos, todos os eventos, o relatório sumário de alta, por exemplo, no caso de um paciente internado. Portanto, como faço trafegar essa informação? Então, falta uma definição clara da taxonomia nacional.
Há também falta de integração e interoperabilidade entre serviços de saúde. Esse é um ponto importante.
Aqui eu queria também trazer aos senhores a questão da falta de confiança entre os sistemas de saúde. Isso é importante destacar. Eu já participei de vários projetos e vi isso. Se hoje, independentemente da tecnologia, eu pegar um laudo emitido no sertão e levá-lo para a capital, a capital vai refazer o exame, porque eles não fazem ideia de como aquele laudo foi gerado. Esse é um ponto que temos que levar em consideração e temos que discutir. E aí não é um problema de tecnologia, mas de confiança nos serviços de saúde.
Quais são as iniciativas do Ministério para trabalhar isso? Para quem se lembra, em 2011, nós tivemos a Portaria nº 2.073. Essa portaria define alguns padrões de interoperabilidade. O termo "interoperabilidade" significa trocar informação dentro de uma mesma estrutura, de um mesmo contexto, de uma mesma semântica. Então, significa que eu vou falar contigo, e você vai entender o que eu falo sem se preocupar em saber como essa informação está trafegando. Então, essa portaria foi baixada em 2011 e elege alguns critérios.
Vejam que já estamos em 2019, e ela não foi colocado em prática. Isso é um problema. É só para mostrar aos senhores esse problema.
Há uma outra iniciativa — essa mais recente — do Ministério da Ciência Tecnologia, instituindo algumas câmeras técnicas para introduzir o uso de dispositivo da Internet das Coisas em quatro grandes temas, um deles a saúde.
O senhor colocou num dos gráficos a utilização de wearables, de dispositivos remotos, de sensores. Alguém precisa controlar e coordenar tudo isso e, pelo menos, legitimar isso.
O Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações — MCTIC e o Ministério da Saúde comporão a Câmara Técnica de Saúde 4.0, para colocar essa inovação ou padronizar essa inovação dentro do cenário nacional.
Existe no mundo um grupo chamado Global Digital Health, formado por 22 países, que define o seguinte: qual é a sua estratégia de saúde digital? Entenda-se "saúde digital" como o uso da informatização na saúde. Que informatização? Podemos aí discutir horas sobre o que eu entendo de informatização. Eu entendo que a informatização tem que ser o uso da tecnologia da informação para trazer valor ao indivíduo. Se ela não tiver valor, não tem sentido. Então, esses 22 países estão divulgando suas estratégias. Essas estratégias passam por cinco pilares: o consumidor, a segurança, o monitoramento, a interoperabilidade e as políticas. Esses cinco temas estão sendo discutidos dentro desses 22 países, e o Brasil é um deles. Quando você lê no livro algo a respeito do Brasil, está lá: "Brasil. O Brasil ainda não tem uma política de estratégia de saúde em funcionamento".
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Isso me incomodou. Isso incomoda. E aí nós estamos trabalhando para definir essa política que estamos levando para fora, que é, basicamente, só um resumo da política que entendemos ser a correta: o uso efetivo de tecnologia da informação e comunicação para levar informações confiáveis para quem precisa, no momento em que precisa. É essa a bandeira que queremos levar. Quem precisa? O cidadão, o gestor, o profissional. Eles são os entes nessa cadeia para realmente trazer a saúde com eficiência, evitar os desperdícios e coisas do gênero.
Para trabalhar em cima disso, nós estabelecemos o projeto Prontuário Eletrônico do SUS, para responder à estratégia de saúde digital nacional, que basicamente tem dois grandes elos: apoio à informatização dos estabelecimentos de saúde — e eu acredito que isso já veio à tona — e a forma do financiamento e o aparelhamento das Unidades Básicas de Saúde.
Nós temos, aproximadamente, 46 mil unidades, pouco mais da metade tem informatização, pouco menos do que a metade precisa de certo incentivo.
Esse trabalho está sendo discutido junto com o Conselho Nacional de Secretários de Saúde — CONASS e com o Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde — CONASEMS e será apresentado à Comissão Intergestores Tripartite — CIT.
Mas isso é uma questão só de infraestrutura. Pois bem, imagine-se que eu tenha todos os hospitais e todos os estabelecimentos informatizados. O que eu faço com isso? Como eu troco essa informação? Aí nós estamos criando o papel da Rede Nacional de Dados em Saúde — RNDS. E é sobre ela que eu vou me aprofundar, porque ela é o coração para que tudo isso aconteça.
Essa imagem apresenta que estamos levando da rede. E qual é o papel da rede? Promover a criação de um prontuário único que permita a troca de informação e, sim, permita a continuidade do cuidado.
É aquilo que o senhor comentou e aquilo que todos já apresentaram aqui: um paciente sai do estabelecimento da atenção primária e, quando vai para a atenção especializada, perco qualquer tipo de informação dele, tanto na referência quanto na contrarreferência. E isso é um problema porque eu duplico exame, ele fica mais tempo na fila, eu não consigo definir se ele é um paciente crônico ou não. E qualquer tipo de informação que ele tenha fica com ele ou com o estabelecimento em que ele foi atendido.
Eu falo, em tom de brincadeira, que o prontuário eletrônico é de todo mundo, menos do paciente. O paciente não tem acesso fácil à sua informação. Se ele for a um hospital hoje pedir o seu prontuário, ele vai ter dificuldade, pios há uma baita burocracia para isso. Entendemos isso e queremos mudar esse cenário. Precisamos mudar esse cenário. Ele tem que ser o centro de tudo, ele é que tem que tomar as decisões sobre a saúde dele, não só sobre a doença. Essa transição, esse processo envolve tanto os setores públicos quanto os privados, porque o SUS é o todo. Eu vou usar o exemplo de uma caixa d'água para vocês entenderem. Eu vou disponibilizar uma caixa d'água para cada Estado, porque 94% dos atendimentos dentro de um Estado são feitos dentro do próprio Estado. Por que eu tenho que ter uma caixa d'água gigante aqui em Brasília e investir milhões de reais nessa infraestrutura? Porque eu não separo essa infraestrutura. Então a nossa proposta é entregar para a Paraíba, para Alagoas, para São Paulo ou para o Rio de Janeiro uma caixa d'água com os dados dos pacientes deles, para que eles possam beber dessa água e alimentar essa fonte. Outro ponto muito importante: não dá para esperar que todos os estabelecimentos de saúde do País estejam 100% informatizados, até porque, se eu tiver que esperar por isso, eu vou ficar de braços cruzados. O que eu posso fazer? Por que eu não trabalho com as informações que eu já tenho, que já estão disponíveis?
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Então, pensando nisso, nós definimos um conjunto mínimo de dados formado pelo registro do atendimento clínico e exames realizados; sumário de alta; medicamentos dispensados, ainda não os prescritos — porque eu não tenho ainda no País um modelo de prescrição única, mas tenho um modelo de dispensação —; imunizações e vacinas — estas porque fazem parte de um programa.
Esses quatro conjuntos de dados vão permitir que eu possa tomar uma medida para a continuidade do cuidado, e eu vou dar um exemplo, citando um fato ocorrido em um evento de oncologia, onde estive há 3 meses. O evento começou com um exemplo de duas mulheres, uma de uma capital no Sudeste e outra de uma capital no Nordeste, e o assunto era câncer do colo do útero. A mulher de São Paulo, por exemplo — mas ela poderia ser do Rio, poderia ser de Minas —, faz o papanicolau uma vez por ano, e está registrado que ela fez o papanicolau. É uma informação que está lá. Não sei o resultado, mas eu sei que ela frequentemente faz o exame uma vez por ano. As duas mulheres tinham entre 30 e 35 anos. A segunda mulher, a do Nordeste, fez o exame uma vez só na vida, quando tinha 16 anos. Qual é a chance de essa pessoa ter, ou de eu diagnosticar, de uma forma avançada, o câncer do colo de útero, de ser difícil o tratamento e de onerar o Sistema Único, porque eu vou tratar isso tardiamente?
Então, só o fato de poder disponibilizar a informação de quem é frequente nos seus exames e de quem não é, certamente, numa consulta, o profissional poderá ter uma ideia de qual é a conduta a ser adotada. Esse é o tipo de coisa que nós queremos disponibilizar na rede, para que seja visível ao profissional de saúde, para que seja visível aos gestores municipais e estaduais.
E o que vai acontecer nos Estados? Eles vão se conectar a esses barramentos, a essas caixas d'água as unidades básicas, as unidades de emergências, os hospitais , e vão trocar informações entre si e entre os Estados, porque eu posso também ter uma informação de um paciente que viaja. Por exemplo, se ele é de Minas e veio a Brasília, eu terei acesso aos seus dados. Portanto, se e somente se for necessário, os dados virão juntos.
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Com isso, queremos atender a população, os profissionais de saúde, os gestores e, por que não, contribuir para a inovação.
Demos um exemplo do que pode ocorrer com a rede. Mas, hoje, o que está acontecendo — e isso é um fato: a quantidade de apps em saúde está passando do bom senso. Todo mundo tem uma ideia e todo mundo quer desenvolver um sistema, um app. Não tenho dúvida de que a mobilidade será a nova era. Mas deve haver alguns critérios. Vou dar um exemplo: imaginem que eu desenvolva um aplicativo excelente para diabetes; se eu sou diabético, ele vai me ajudar. Outra pessoa cria outro aplicativo excelente para hipertensão. Se minha mãe é hipertensa e diabética, ela vai usar dois aplicativos? Porque eles não se falam e ninguém pede para eles se falarem. Não existe nenhuma regra que defina que eles tenham um padrão mínimo de troca de informação. Quem usa aplicativo de saúde sabe dessa dificuldade. Portanto, deve-se fazer um pré-cadastro. Multipliquem isso por centenas ou milhares de aplicativos na área da saúde.
Então, o que nós queremos fazer com a rede é que tenhamos um padrão, para que a inovação adote esse padrão.
Recentemente nós tivemos um projeto de armazenamento de imagens médicas. Imaginem que eu pense separadamente e defina um outro tipo de armazenamento de imagens médicas. Eu vou criar uma outra base de dados de cadastro de pacientes, vou criar um outro tipo de segurança, vou criar um outro padrão de elegibilidade, vou criar um outro padrão de disseminação de dados, vou replicar tudo isso novamente. Não faz sentido. Então a rede vem para definir um padrão.
Agora eu vou comentar com vocês qual é o propósito. Aqui são só alguns pontos importantes. Queremos deixar claro que nós estamos considerando a Lei de Proteção de Dados, estamos usando o CPF como padrão de identificação unívoca do indivíduo, o que permitirá a troca de informação, permitirá adaptar os dispositivos e permitirá a rastreabilidade.
Se um profissional de saúde acessar os dados de um cidadão, automaticamente o cidadão será informado de que no hospital tal, no lugar tal e hora tal foram pesquisadas suas informações de saúde.
Por fim, o que eu quero deixar registrado aqui é que a proposta é criar uma infovia de saúde. Por que não? Nós não devemos nada a outros países. Há muita gente inteligente e competente no Brasil e podemos criar, sim, uma infovia de saúde. No primeiro momento, talvez, ela só se atenha àquelas quatro informações. Faz parte. Conforme as coisas vão surgindo, eu vou ampliando o meu caminhãozinho até ter todas as informações de que preciso.
A nossa hipótese é, com aquelas informações distribuídas de forma nacional, conseguir realmente trafegar, fortalecer a estratégia de saúde digital para o Brasil e atender todas as expectativas do uso da tecnologia em prol desses resultados que os senhores esperam.
Era o que tinha para apresentar.
Obrigado. (Palmas.)
10:37
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O SR. PRESIDENTE (Dr. Luiz Ovando. PSL - MS) - Enquanto os expositores falavam, eu anotei algumas situações que se fazem necessárias debater e discutir.
O Sr. Carlos Augusto Ferraz destacou basicamente a questão da qualidade de atendimento básico de saúde, dizendo que isso só é possível numa articulação. Citou também o fato de que a cobertura não é total, não chega a 60%, e que, de uma maneira geral, nós não conheceremos a realidade porque o diagnóstico da necessidade da população está incompleto — não distorcido, mas incompleto. Consequentemente, essa ausência de diagnóstico preciso deturpa os comportamentos, inclusive, dos gestores, dos secretários, do pessoal de atendimento naquele determinado local.
Ele chamou a atenção para a questão da Farmácia Popular, que complementa inclusive o atendimento, até porque isso se faz necessário. E nós temos percebido que, de uma maneira geral, naquelas instituições outras que conhecemos, o indivíduo reduz significativamente as complicações e principalmente as internações quando se disponibiliza o remédio de alguma forma.
E ele também destacou um aspecto importante que eu gostaria de levantar sobre a questão da educação. De uma maneira geral, quando falamos em Sistema Único de Saúde — SUS — e o pessoal fica muito zangado comigo, como médico, quanto a isso —, eu digo que o diagnóstico é médico e não tem jeito de ser tirado. Mas eles dizem: "Não, saúde não se faz só com médico". Eu sei perfeitamente que não se faz, porque saúde começa com o paciente, que tem que estar dentro do processo.
O que se percebe em nosso País é que o paciente, ou seja, o cidadão, vamos dizer assim, não está dentro do processo. E aí nós começamos a buscar o porquê disso. A nossa característica racial, geográfica, populacional, o contexto de uma maneira geral, levou-nos a uma condição de vulnerabilidade, do ponto de vista emocional. Comparativamente a outras nações, principalmente com os americanos, com quem tive alguma experiência, eles são muito racionais. A questão aqui não é saber quem é certo. São características nossas, e temos que nos adaptar a essas circunstâncias. Somos emocionais, vamos buscar o diagnóstico fundamentado no aspecto emocional. Mas o que nós vemos em relação a isso é que, de uma maneira geral, as características raciais nossas, por essa vereda, têm como pano de fundo o art. 196 da Constituição, que diz: "Saúde é direito de todos". Não há dúvida, eu tenho esse direito. Mas eu tenho que participar do processo, e eu não participo dele.
10:41
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Do ponto de vista nacional, não há política que alerte o cidadão dessa necessidade da participação no processo. De maneira geral, o indivíduo diz o seguinte: "Ninguém tem nada a ver com a minha vida; vou beber do jeito que quiser".
Se chegarmos a alguma situação em que o indivíduo está na boca de fumo, usando crack, numa situação miserável, e quisermos tratá-lo, vão dizer que não pode, pois haverá agressão aos direitos humanos. Então, nós ficamos num limbo da situação de defesa.
Na saúde, primariamente, não é diferente. Não há educação, não há o acompanhamento adequado nem o envolvimento do cidadão, que faz o que quer e diz que tem direito à saúde. Pergunta-se: o que ele fez, em termos de investimento, pela saúde dele? Absolutamente nada.
Isso é uma questão cultural da qual não se fala e que, de maneira geral, não abordamos como deveríamos. O resultado é a sobrecarrega nos hospitais. E assim vamos exclusivamente para aquela situação que é única e exclusivamente terapêutica, não preventiva.
O diabético tem a edícula, o churrasco, a cerveja; assim ele vive durante muito tempo, vai engordando, não faz nenhum exercício e fica diabético. E aí?...
O Carlos disse que à medida que o indivíduo fica mais rico e que a economia vai bem, o indivíduo tem menos problema. À medida que as coisas acontecem, do ponto de vista de recessão, ele tem mais problema. É verdade. Principalmente do ponto de vista emocional, sabemos que há muitas coisas que se complicam.
Precisamos enfatizar que o grande problema que enfrentamos hoje — e que aparece na mídia — é o diagnóstico primário. O indivíduo vem até você com uma crise hipertensiva, com o diabetes descontrolado, com o rim sem funcionar ou com um acidente vascular cerebral que é premente. O indivíduo estava bem, foi ao casamento da filha, levantou no outro dia de manhã e caiu, vitimado ou por infarto ou por acidente vascular cerebral. É aquele desespero, porque toda a família veio para o casamento e vai pressionar. Mas ninguém vai fazer um inventário da vida daquele paciente, do ponto de vista de prevenção. E vai ter o atendimento imediato.
Nós estamos vivendo uma fase na medicina em que ela foi basicamente "urgencializada". E eu me refiro à saúde, especificamente. A saúde foi "urgencializada" e não houve qualquer ênfase na prevenção.
Raquel, você citou a questão da hipertensão e do diabetes. Há quase 20 anos há um programa da hipertensão e de diabetes: o Hiperdia. Eu já tentei levantar esse programa, mas ele não está em lugar algum.
A SRA. RAQUEL DE NAZARÉ NUNES E SOUZA - Na verdade, ele já foi extinto.
O SR. PRESIDENTE (Dr. Luiz Ovando. PSL - MS) - Pois é. Por quê?
A SRA. RAQUEL DE NAZARÉ NUNES E SOUZA - Porque o controle dele voltou para a atenção primária, mas ele tirou o foco único e exclusivamente da hipertensão e da diabetes, é porque a atenção primária deveria ter abarcado isso melhor. Por isso, quando fomos fazer a auditoria da atenção primária, usamos traçadores, e os traçadores escolhidos foram hipertensão e diabetes, porque, pelo nosso entendimento, além de serem as duas patologias que mais pioram em relação a esse gargalo da média e alta complexidade, em relação a custos e a todos os outros prejuízos — e não só financeiros, mas também pelas complicações para a saúde —, são duas doenças crônicas totalmente preveníveis, ou controláveis, pela atenção primária. E, pela antiguidade de tratamento, pela lógica já de terem passado pelo Hiperdia e por várias outras intervenções para essas duas doenças, teríamos uma melhor resposta, porque, se nem a hipertensão e o diabetes têm sido bem controladas na atenção primária, todas as outras coisas provavelmente terão respostas muito semelhantes.
10:45
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O SR. PRESIDENTE (Dr. Luiz Ovando. PSL - MS) - Pois é, mas não está sendo bem controlado.
A SRA. RAQUEL DE NAZARÉ NUNES E SOUZA - Então, não está. Essa é a questão.
O SR. PRESIDENTE (Dr. Luiz Ovando. PSL - MS) - Não estava antes e não está agora!
A SRA. RAQUEL DE NAZARÉ NUNES E SOUZA - É aí que nós percebemos a superfalha, de fato, da atenção primária. E volto, de novo, à questão da qualidade da gestão nas instâncias da atenção primária, principalmente na ponta, no final mesmo — e quero dizer na Unidade Básica de Saúde, nas Secretarias de Saúde —, atenção essa que de fato não é dada à atenção primária, a precarização da atenção primária, e muitas vezes também a lógica inversa do paciente, a lógica da falta de educação do paciente de não buscar saúde de verdade antes de surgirem as complicações. Ele só a busca quando as apresenta.
O SR. PRESIDENTE (Dr. Luiz Ovando. PSL - MS) - Pois é, mas essa é uma coisa simples de entender, faz parte de um programa de Governo. Quando você tem um programa como o Hiperdia, basta implementá-lo na atenção básica, e não retirá-lo. Eu não sabia que havia sido retirado.
A SRA. RAQUEL DE NAZARÉ NUNES E SOUZA - Mas é isto: na verdade, a implementação acaba sendo dificultada pela qualidade da gestão. É por isso que eu aponto isso como...
O SR. PRESIDENTE (Dr. Luiz Ovando. PSL - MS) - Mas como nós vamos chegar até essa situação do pessoal? Esse é o grande gargalo! Podemos ver inclusive que o Governo está com problemas em relação a isso. Há um projeto de lei da Deputada Carmen Zanotto para tentar colocar o renal crônico como deficiente — e ele é realmente; é o maior problema que existe —, mas simplesmente está sendo barrado, porque não há recursos e porque, uma vez colocado como deficiente, esse indivíduo vai ter que ter um salário. E ele é totalmente incompetente do ponto de vista social! Entre 66% e 67% dos renais crônicos têm a etiologia de sua doença na hipertensão e no diabetes. Entende?
Então, nós chegamos a esta questão: o que está acontecendo com a atenção primária? O Carlos diz: "Nós precisamos ter educação; nós precisamos ter saneamento". Mas a Conferência de Alma-Ata, de 1978, já havia estabelecido que se resolve o problema — e, aqui no Brasil, há vários exemplos de cidades — com hidratação oral, alimentação adequada, aleitamento materno e imunização. Não precisa médico para isso. Essa história do Mais Médicos, colocada aqui pelo Rodrigo, eu sempre disse que, para mim, é um engodo! Eu sempre insisto nisso. Inclusive, ela existe até agora, viu, Jacson? Inclusive, o Ricardo Barros, que foi o Ministro anterior, diz que nós vamos economizar mais de 20 bilhões quando informatizarmos a Saúde no País para evitar isso, porque 75% dos exames não são reclamados. Então, fazem-se exames desnecessariamente: "Você já fez exame? Vá fazer de novo; vá fazer de novo!" É como um castigo para o paciente e um rombo para o Ministério. Então, ele disse que vai resolver, que vai economizar. Inclusive, ontem, sobre a questão do Médicos pelo Brasil, ele disse: "Eu conseguiu economizar 5 bilhões, quando fui Ministro durante 1 ano e 8 meses". É verdade, se você faz determinadas coisas para isso.
10:49
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A questão da informatização é decisiva, mas não vai resolver o problema se não houver esclarecimento, se não houver envolvimento, se não houver participação do pessoal. E nós vemos muito que aquilo que funciona o pessoal tira.
A SRA. RAQUEL DE NAZARÉ NUNES E SOUZA - Na verdade, esta é a questão: funciona bem onde há envolvimento, principalmente dos profissionais de saúde. Nem precisamos ir muito longe. Aqui em Brasília mesmo, há regiões onde as Unidades Básicas de Saúde funcionam muito bem, pois elas conhecem o seu território, conhecem a sua população e sabem quem são os pacientes que elas têm que acompanhar e por quê. Então, existe uma referência e uma contrarreferência que funcionam em alguns lugares e em outros não.
Há outras Unidades Básicas de Saúde como, por exemplo, as da Asa Sul e da Asa Norte que normalmente não conhecem o seu território, não sabem quem é a sua população. Então, isso acaba ficando muito personalizado. Em alguns lugares, funciona muito bem. E há Municípios que ainda trabalham dentro da lógica do Hiperdia. Apesar de o programa já ter sido extinto de forma federal, eles o adotaram e mantiveram seu funcionamento dentro do mesmo desenho, tanto que vemos pessoas da área de saúde nomeando também o Hiperdia como algo existente em vários Municípios. Ele deixou de existir no âmbito federal, mas passou a ser integrado por alguns Municípios, onde há essa continuidade.
Mas é uma lógica muito personalizada. É esse o grande problema.
O SR. PRESIDENTE (Dr. Luiz Ovando. PSL - MS) - Na verdade, existe aí uma burocracia. Ou seja, por que não funcionava, o Governo resolveu tirá-lo. Mas o programa é bom; se implementado, o programa é bom.
A SRA. RAQUEL DE NAZARÉ NUNES E SOUZA - Mas, na verdade, não é porque não funcionava, mas porque ele não era generalizável. Essa é a questão.
O SR. PRESIDENTE (Dr. Luiz Ovando. PSL - MS) - Eu entendi. As pessoas não estavam envolvidas, e o Governo parou de cobrar: "Como é que está? O que é isso?" Enfim, este é o grande tributário do País em termos de doenças degenerativas: a hipertensão e o diabetes. É isso que você está estudando e no que está trabalhando.
Já, para a questão colocada pelo Carlos sobre educação, saneamento, investimento e imunização, não se necessita de médico. As pessoas vivem melhor quando elas têm acesso a isso e vão atrás. Daí nós entramos inclusive numa questão filosófica existencial, que é a perspectiva de Nação: "Eu vou cuidar de mim, porque eu tenho uma perspectiva". Mas isso cai em outro nível de discussão, que acabamos não abordando, até porque é uma questão pouco palpável, digamos assim. Eu tenho pacientes que têm 100 anos. Uma paciente minha, que todo ano me convida para o aniversário dela, está com 108 anos hoje, completou em abril deste ano. É uma exceção. Mas nós temos condições de viver bem até os 80, 90 anos, desde que façamos o certo e sigamos exatamente isso que você colocou muito bem, com o que eu concordo plenamente.
O Rodrigo fez um traçado de esclarecimentos funcionais e de propósitos da Controladoria-Geral da União. Eu gostaria de ver os resultados das situações e das irregularidades.
10:53
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Rodrigo, você não falou absolutamente nada. Não sei se você veio para cá proibido de falar sobre isso. Mas eu gostaria de ter visto a ação da auditoria interna do próprio SUS, como as coisas acontecem e como estão indo. Contudo, deu para se ter uma ideia muito boa daquilo que se faz. Sobre a questão do controle, que é inadequado, você mostrou a relação da funcionalidade que leva à distorção no atendimento, inclusive citando o Programa Mais Médicos, que deveria estar na periferia, mas que veio para a área central devido a outras questões, em cujo mérito não vou entrar, senão isso vai se arrastar aqui por muito tempo. Veja a deterioração do conceito.
Hoje, nós estamos enfrentando na Câmara um problema sério, de que sempre falo da tribuna e em todas as Comissões: "O Programa Mais Médicos, na minha maneira de ver, é um engodo, uma falácia!" Eu me baseio no fato de que médico não faz diferença para vacinar, para hidratar e para orientar. Como você disse, uma enfermeira faz isso. Na minha condição de médico — e não que eu seja corporativista —, não posso dizer: "Aí, não precisa de médico". Digo isso às vezes, mas sei que é preciso ter alguém que saiba orientar e mostrar o caminho. Só isso! Contudo, é necessário um indivíduo experiente para fazer o diagnóstico. Às vezes, usa-se a tecnologia na periferia, como aquela câmera de telefone que mostra um grupo de pessoas, mas o nível populacional lá é muito ruim — muito ruim! A questão é que, antes de levar a tecnologia, você tem que instruir e mostrar como usá-la.
Então, nós estamos deixando o médico de lado, a qualidade do médico está ruim, ele está se encantando com a tecnologia, não põe a mão no paciente e diz: "Não precisa mais de médico aqui, não. Vamos usar a telemedicina", o que, para mim é um erro, porque se está deixando de lado a instrução do pessoal, do cidadão, e substituindo um indivíduo que poderia estar fazendo um bom serviço, o que, na verdade, não está acontecendo.
Quanto à questão do Mais Médicos, Rodrigo, o Município é que tem que contratá-los. Eu recebo aqui frequentemente os Prefeitos, e o problema todo é saúde. O que está acontecendo? O Governo Federal está dando uma ajeitada, ele está disponibilizando emendas para substituir a sua responsabilidade com relação à saúde. Custeio, custeio, custeio... A meu ver, essa também é uma forma distorcida daquilo que você falou.
E por que o Município está vindo com o pires na mão? Porque o sistema tributário não ajuda. Essa já é outra vertente. Somente 19% de tudo o que se arrecada no Município fica no Município, depois, vai para o centro, que disponibiliza a participação tributária dos Municípios numa quantia "x", a depender do interesse, dos problemas outros, e assim sucessivamente. Veja que a coisa tem mais implicações, em termos de distorção. E acabam entrando aí os espertos, porque se têm que gerir esses recursos que estão disponíveis. A Constituição diz que são 15%, mas há Municípios que não gastam menos que 25% com saúde, alguns na faixa de 30%, 35% e até de 39%, como lá no meu Estado. E eles fazem qualquer negócio para economizar, como diz o turquinho: "Fazemos qualquer negócio", e aí entram na distorção.
10:57
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Mas, quando a Raquel diz: "Está errado. Os Municípios estão com problema. Vamos cortar a verba", de quem é a responsabilidade? Como se retira verba de alguém que está fazendo alguma coisa? E como fica a população, que está batendo na porta do Prefeito?
Estou colocando essas situações, porque temos mais ou menos ideia disso. Mas gostaria que, em outra oportunidade, vocês nos trouxessem os números, viu, Zé Antônio. E parece que esse relatório vai mostrar isso.
Quanto à questão da informatização, que o Jacson apresentou, eu acho fundamental. Eu digo que a informatização é fundamental, mas, em alguns aspectos, ela ainda está voltada basicamente só para a gestão econômica. O pessoal diz quanto é que tem, quanto custa a lavanderia, o raio-x, e tal.
Eu venho de um hospital, que é a terceira maior Santa Casa do Brasil, em Campo Grande. Estive lá até janeiro, antes de assumir aqui, sempre no centro de custos, porque há uma acusação. Sou da Clínica Médica, que é o fim de linha. Lá fora, eu trabalho como cardiologista e ecocardiografista. Então, sou um superespecialista. Mas, dentro da Santa Casa, eu sou clínico e sempre briguei pela clínica. Lá, o pessoal aponta o dedo, dizendo que a clínica gasta muito. E eu digo: "Vamos lá, vamos lá na enfermaria!" Daí eu levo os administradores à beira do leito: "Este aqui não teve o diagnóstico da perna na hora certa, houve oclusão arterial aguda, ela foi amputada; ele tem 80 anos, pegou pneumonia e teve um AVC. Como é que você quer que eu mande esse cara embora?" Aí, mostro outro, que também teve AVC e está com escara porque não se mexe. Aspirou, a pneumonia é recorrente, o antibiótico é caro, e assim vai indo. Então, a Clínica Médica é o fim de linha, é o patinho feio. Eu estava sempre lá. E o pessoal se preocupava muito com essa questão do custeio, ou seja, com o gasto. Mas eu perguntava: "Cadê a estatística mórbida e etiológica disso aqui para nós verificarmos?" Não tinha!
E outra: você pegava o residente e lhe dizia que tinha que ter informação adequada, porque o pessoal ia usá-la, e tal. Mas o residente ficava 5 minutos com o paciente e 30 minutos na frente do computador, que é outro problema que desvirtua. Não sei como resolver isso. Nós precisamos da informatização, até para que possamos acessar a informação com muita facilidade. E nós vamos conseguir realmente avançar nisso, desde que tenhamos base e fundamento.
Parabenizo todos pelas apresentações. Foram levantadas várias questões. Depois, quero que vocês complementem, respondendo a essas dúvidas que colocamos aqui agora.
Passo a palavra ao Fábio de Barros, depois, ao Marcos. Em seguida, o tempo ficará livre para quem quiser participar.
Muito obrigado.
O SR. FÁBIO DE BARROS CORREIA GOMES - Bom dia, obrigado ao CEDES e ao Deputado Dr. Luiz Ovando pela oportunidade de ouvir colegas tão qualificados.
11:01
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Eu tenho quatro perguntas, uma para cada órgão, mas cada pergunta poderia ser feita a qualquer um de vocês. Então, por favor, se alguém de outro órgão quiser comentar a mesma pergunta, sinta-se à vontade.
Para o TCU, eu gostaria de perguntar se tem tido a oportunidade de usar os dados do PPA — Plano Plurianual no que se referem à saúde e os dados do Relatório Quadrimestral de Prestação de Contas. Vocês têm noção se outros entes federados têm feito uso desses dados? Por exemplo, a Lei Complementar nº 141, de 2012, estabelece que os gestores da saúde devem apresentar, a cada quadrimestre, os dados do relatório nas Casas Legislativas. Isso vem ocorrendo no âmbito federal, nem sempre com a regularidade prevista em lei, mas vem ocorrendo. Seriam essas as questões. Sabemos que os indicadores que estão no PPA e no relatório quadrimestral possuem problemas de qualidade, mas muitos são relevantes. Por exemplo, os dados mostram que a ocorrência da sífilis congênita está aumentando, quadruplicando, no PPA.
Para o DENASUS, eu gostaria de perguntar se tem dados sobre desvios de recursos, se tem uma estimativa do que estamos perdendo no sistema para os desvios. Nós sabemos que há perdas por ineficiência — e talvez seja até a maior parte dos casos —, mas acho que é interessante também termos uma estimativa de quanto o sistema está perdendo para a ilegalidade, que são os desvios.
Para o colega da CGU, queria dizer que ouvi recentemente, numa auditoria, um Deputado mencionar que os gastos administrativos na saúde estariam se elevando bastante, num ritmo talvez até maior do que os gastos assistenciais. Essa foi a colocação dele. Ele associou isso à burocratização excessiva e até fez uma associação com o excesso de controle. Vocês já perceberam se esse tipo de gasto está aumentando mesmo?
Para o DATASUS, quero dizer que achei bastante interessante a estratégia de desenvolvimento do sistema geral, da telemedicina e também da telessaúde. Faço, então, só um questionamento: além desse enorme desafio do prontuário eletrônico, vocês estão tendo oportunidade de pensar aplicativos para implantar a telessaúde, por exemplo, na atenção primária? Foi citada aqui a necessidade de utilizar outros profissionais da saúde, como enfermeiros. Às vezes, a telessaúde pode enfrentar resistências. Por exemplo, no campo da consulta médica, certos aplicativos podem apresentar vantagens e desvantagens e ser mais fáceis numa situação do que noutra. Mas, em outras situações, como na educação em saúde, a orientação dos usuários e a telessaúde poderiam ser usadas até aproveitando outros profissionais, como os enfermeiros. Haveria já algum projeto nesse sentido?
Obrigado.
11:05
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O SR. MARCOS ANTONIO REIS - Começa comigo?
O SR. PRESIDENTE (Dr. Luiz Ovando. PSL - MS) - Deseja fazer alguma pergunta?
O SR. MARCOS ANTONIO REIS - Eu quero fazer só uma observação.
O SR. PRESIDENTE (Dr. Luiz Ovando. PSL - MS) - Pode fazê-la. Depois, eles irão responder.
O SR. MARCOS ANTONIO REIS - Mais uma vez, obrigado. É muito interessante estar neste ambiente com pessoas extremamente capacitadas, que trouxeram dados curiosos para discutirmos esse tema que nos é tão importante.
Eu notei que, nesta reunião, o tema da telemedicina foi recorrente praticamente na fala dos quatro expositores. A meu ver, a discussão tem sido grande na sociedade, especialmente no campo médico, com algumas pessoas dizendo: "Ah, é uma maravilha eu poder entrar no meu computador e simplesmente discutir com o meu médico, sem ter que me deslocar". É maravilhoso, na teoria. E, no campo dos médicos, como o próprio Fábio tratou aqui, às vezes eles têm certa resistência. Particularmente, eu acho que seria um grande tema para tratarmos numa reunião, não digo neste nosso pequeno fórum, mas em outro fórum. Seria muito interessante tratarmos sobre como utilizar a telemedicina nos rincões do Brasil, aonde não conseguimos levar os médicos, e como levar assistência médica para esse segmento do nosso Brasil. É grande o desafio que está vindo com a tecnologia: como viabilizar medicina com tecnologia nesse particular, prescindindo daquilo, que o senhor falou, que é o contato com o paciente? Como não tocar o paciente e ainda assim lhe dar um diagnóstico? Isso é muito interessante.
O nosso colega Jacson trouxe alguns pontos, como aquela fotografia do prontuário. Deve ter muito lugar que ainda está assim. É caótico você olhar aquele emaranhado de papel e não ter como localizar o prontuário.
Há 2 anos, a minha mãe estava internada na UTI de um hospital privado importante aqui de Brasília. Como ela passou 80 dias na UTI, outro médico solicitou determinado diagnóstico de um dos problemas que foi feito no meio do tratamento dela. Mas ele não teve acesso aos documentos, então eu fui atrás do hospital para conseguir a informação: "Olha, eu estou querendo o prontuário da minha mãe, e tal"; "Você vai ter que ir ao setor de arquivo". Eu fui ao setor de arquivo, onde me disseram: "É o seguinte: o prontuário da sua mãe não fica aqui. Você vai escrever o que você quer, e eu vou precisar de 3 meses para lhe trazer o dado". Ao que eu respondi: "Não, obrigado. Não precisa, não. Vamos fazer outro exame". Não teve condição; deixamos para lá.
Como cidadão, eu acharia muito interessante ter acesso aos meus dados particulares no meu celular! É segredo? Está tratando de mim, não é? Vamos pensar assim: "Se eu disponibilizo essa informação, posso criar um monte de neuróticos com saúde", que já existem. Tem gente que é bem neurótica com saúde. Se ele estiver olhando o prontuário dele, vai dizer: "Meu Deus, eu morro no mês que vem". Talvez eu seja um desses. Ainda assim, eu gostaria muito de ter um arrazoado do acompanhamento da minha vida no meu celular. Talvez, eu até ajudasse mais o meu médico quando eu fosse a outra consulta, né? Esse é um ponto interessante.
11:09
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A nossa colega Raquel mencionou também a telemedicina, e você falou de educação e escola. O próprio Deputado também mencionou esse ponto.
Eu me lembro que, quando era adolescente, não tive aulas vinculadas à instrução médica. Nós tínhamos, naquela época, aulas de educação sexual, o que já era... No dia da aula de educação sexual, entrava na sala um profissional especializado, todo mundo ficava tenso, os professores também tomavam cuidado, e todos riam. (Risos.) Sinceramente, se nós tivéssemos — e não o ano inteiro, ou uma disciplina só para tratar disso —, dentro da nossa grade, pinceladas sobre saúde, começando com as nossas crianças, talvez houvesse uma outra visão, lá na frente. É como a pessoa, que o senhor mencionou, que, ao longo da vida, vai a churrascos, bebe suas cervejinhas e, lá na frente — e sempre é lá na frente —, ele se descobre diabético e, de repente, tem que tomar insulina. O meu irmão tem 2 anos a mais que eu. Quando ele descobriu, há 3 anos, que teria de tomar três doses de insulina, foi um baque! Com o meu pai também foi assim. É por isso que hoje eu tomo extremo cuidado. Eu não quero entrar nesse grupo, pois sei das complicações que isso envolve. É quase como se estivessem dizendo: "Você tem câncer". Quando o médico avisa para a pessoa que ela vai ter que tomar insulina, não é agradável. Os médicos devem saber bem mais que eu desse efeito psicológico nas pessoas. Se isso viesse pelo campo educacional, ajudaria imensamente.
Quando você falou, veio à minha mente algo que não tem nada a ver com medicina. Em 2004, houve uma catástrofe de âmbito mundial, que foi um tsunami na região da Oceania. Eu me lembro muito bem de a imprensa destacar uma menininha que conseguiu salvar muita gente que estava na praia. Isso porque, quando ela estudava, alguém mencionou que, quando a onda volta, pode preparar porque é um tsunami que está vindo. Ela era alemã, estava lá de férias com a família, viu aquilo acontecendo, e começou aquele alvoroço: "Vamos embora!" As pessoas foram embora e, naquele ambiente, naquela praia, o número de mortes foi bem reduzido por causa de uma criança. E ela foi referência depois disso, foi lembrada por várias personalidades naquele triste evento, que foi uma pena!
O nosso colega Rodrigo também falou da telemedicina e citou um ponto interessante sobre a RJU: como conseguiríamos alterar determinados estatutos que prendem o médico, que é público, para que ele possa atuar em outras frentes? Eu vou tratar particularmente dessa questão, talvez como sugestão para este nosso fórum.
O nosso colega Carlos mencionou a tecnologia — e eu geralmente trago os meus pontos particulares para ilustrar — e o Farmácia Popular, que o Deputado disse ser algo realmente muito importante. Você tem que favorecer o oferecimento de saúde e, em muitos casos, oferecer também remédios populares. Da sua fala, eu notei a preocupação do TCU, que é notória, com o quesito dos desvios. Há uns 3 ou 4 anos, eu ainda era usuário de Sinvastatina 20 miligramas, um remédio simples, e hoje eu tomo outro. Já evoluíram, trocaram, porque aquele não estava dando mais certo. E eu ia comprá-lo pelo Farmácia Popular. O programa pede que o usuário assine e dê seu endereço; o remédio só é vendido para ele. Isto é, se eu fosse comprar para outra pessoa, ou se alguém fosse comprar para mim, tinha que apresentar procuração. O sistema era altamente burocratizado, justamente para evitar desvios! Quando saía a notinha, eu via que uma caixinha de Sinvastatina custava 75 reais para o programa, mas, quando faziam a nota para mim, saía por 4 reais. "Então, eu vou tomar, porque custa 4 reais". Mas pensei: "Meu Deus, para o Estado, esse remédio custa 75 reais! Se eu fosse comprar, sem estar no programa, eu encontraria por 15 reais". Por isso, algumas farmácias, inclusive aqui do centro de Brasília, não trabalham mais com o programa, talvez, porque tenham descoberto certos desvios. Há um ponto que eu quero tratar aqui, levantado em nossos encontros pretéritos, que é a questão que o Deputado sempre ressaltou da formação do médico e do interesse de se descobrir como levar médico para o Piauí, como o senhor falou no início da nossa reunião. Em São Paulo, há muitos. Em Brasília, conseguimos colocar vários médicos. Conseguimos também para as grandes Capitais, para as grandes cidades próximas às Capitais, mas, para o interior do Piauí, para o interior do Maranhão, do Pará, do Acre, às vezes, não é tão simples. Depois do nosso último encontro, há 2 ou 3 semanas, eu conversei com alguns médicos. Particularmente na consultoria, nós temos alguns médicos, como o Dr. Fábio. Eu não conversei com ele sobre esse tema, mas fui conversar com outros médicos que atuam na área de seguridade, de previdência, e perguntei para um deles: "Meu amigo Gustavo, você é médico, só que você é consultor. Você não pode atuar aqui agora como médico por conta do horário; até poderia no final de semana. Mas você não é médico atualmente. Se amanhã você se aposentasse, você toparia ser médico, porque você tem experiência e já tem mais idade? Você toparia trabalhar fora como médico, por exemplo, no interior do Piauí, onde o Programa Médicos pelo Brasil possibilita até mesmo um teto de quase 33 mil reais?"; "Olha, é um valor, cara! Só que a gente tem que pensar que vai estar longe da família. Às vezes, a tributação arranca tudo. A questão de que eu faço parte do Regime Jurídico Único pode ser um empecilho. Parece que o Médicos pelo Brasil prevê uma contratação via CLT, que seria outra modalidade. É plausível que se pense". Daí, eu disse a ele: "E, se o Estado retirasse a tributação do valor que você viesse a receber para trabalhar nessa empreitada?"; "Olha, realmente seria uma coisa bem interessante a se pensar".
11:17
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Daí, eu disse: "Imagine aquelas pessoas que trabalham em plataformas continentais, ou alguém que trabalha num navio mercante, na navegação mercante. Ele fica 3 meses longe da família, fora do seu país, fora do convívio com os seus, como os colegas que vão também para as plataformas e lá ficam 2 meses, 45 dias, só se falando via telefone, via informática. Ele fica lá esse tempo, ganha o salário dele e depois tem um tempo para retornar, onde fica 1 mês, 15 dias ou mais". Eu fiz essa simulação com ele, e perguntei: "Você toparia?" Ele falou: "Eu poderia pensar. Por uns 3 ou 4 anos, de repente, você tem um estímulo financeiro e um médico de mais experiência. Pois, o senhor mencionou, na nossa última reunião, sobre como levar médicos experientes para cuidar da população".
Esse foi um exercício. Pode ser uma loucura o que eu estou pensando. Mas o fato é que nós vemos que no Brasil há grupos de pressão que conseguem, às vezes, certos subsídios no campo tributário, o que é uma questão complexa. Em nosso Brasil, há questões financeiras complexas. Mas por que não se pensar nesse interesse para com o povo brasileiro, favorecendo a ida de médicos, que naturalmente não iriam querer sair do conforto das Capitais ou dos seus consultórios, por exemplo, do centro de Brasília? Seria o caso de levar médicos que estivessem perto de se aposentar, ou aposentados, que, às vezes, não conseguem montar uma clínica, porque não é todo mundo que consegue fazer isso. Ontem, eu fui a um hospital e reparei nas placas do estacionamento: "Diretoria; Diretoria; Diretoria". Os carros não eram ruins, eram muito bons, mas nem todo mundo consegue montar um hospital. Talvez, o oferecimento de uma vantagem dessas fosse interessante.
Eram essas as minhas ponderações.
O SR. PRESIDENTE (Dr. Luiz Ovando. PSL - MS) - Obrigado, Marcos.
Só para esclarecer, este é o grande drama: por que o médico não vai para o interior? Pergunto o mesmo para você, Raquel: por que você não vai para o interior? (Risos.) Por que você não vai para o interior? É a mesma coisa. De maneira geral, a população fica onde a economia é pujante, e cidades pequenas dificilmente a têm. Digo isso com alguma experiência, só para nos dividirmos para responder ao Marcos.
Quando eu terminei o curso de Medicina, eu tinha 26 anos. Eu havia sido dispensado do serviço militar, mas, na época, ele era obrigatório, então me comunicaram: "Dessa vez, você não vai ser dispensado". Eu disse: "Tá bom. Diante do limão, vamos fazer uma limonada aqui". Nós tínhamos um preparo razoável, no final do sexto ano éramos capazes de fazer pequenas cirurgias, cesárias, apendicectomias, laparotomias baixas, tratar crianças, reduzir fraturas, acidentes, enfim. Nós tínhamos muita prática. Na verdade, isso foi em 1975, há 44 anos. E tínhamos bastante prática, porque nós estávamos no pronto-socorro. Na verdade, eram muitas as oportunidades, poucas escolas, poucos alunos, uma relação médico-população bastante baixa. Então, eu disse: "Eu quero ir para uma cidade, onde eu possa trabalhar e ganhar dinheiro. Em Campo Grande, eu não vou ficar". E eu fui para uma cidade pequena, que tinha 7 mil habitantes. Quer dizer, eu podia escolher três cidades e acabei caindo nessa. Fui para lá, onde não havia médico. Eu cheguei lá, e o comandante perguntou quem era o cirurgião. Nós fazíamos tudo, mas eu não me intitulava cirurgião. Eu estava com outro colega, e ele falou: "Eu sou o cirurgião". O comandante então falou: "Você fica aqui na cidade", que era uma cidade um pouquinho maior, "E você, que é clínico, vai lá para a cidade do interior". A outra cidade ficava a 110 km, não tinha asfalto. O melhor lugar da cidade era o quartel, para vocês terem uma ideia. Areião, não tinha luz, não tinha nada. A energia era com o motor. Então, cheguei lá e comecei a trabalhar. Eu nunca me preocupei com dinheiro, mas ganhei dinheiro que eu não quis ganhar, atendendo a população. Eu digo sempre ao pessoal que não me lembro ter dormido uma noite inteira por mais ou menos 10 meses e meio, enquanto eu lá estive. Eu mantinha duas enfermeiras, que na verdade não eram enfermeiras na acepção ampla da palavra — eram técnicas. Na época existiam as chamadas auxiliares de enfermagem, que era a menor qualificação. Elas moravam no hospital. O pessoal parava no quartel e me levava para atender naquele lugar. Uma das enfermeiras, quando eu chegava lá, já corria e ligava o motor. Às vezes, era preciso operar, acompanhar um parto e tal, e ficava ali. Isso fez com que eu ganhasse um dinheiro razoável. Mas eu resolvia o problema, porque estava preparado para resolver o problema.
11:21
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Essa é a questão hoje. As escolas não estão preparando o médico. Nós tivemos ontem, na Comissão, uma discussão em que o pessoal... Eu, inclusive, fui a Pedro Juan Caballero, que tem 11 escolas médicas, em torno de 25 mil alunos. E o pessoal quer vir para o Brasil e passar por cima do Revalida. Não tem jeito. Para vocês terem uma ideia, existe um hospital em Pedro Juan Caballero, onde todas essas pessoas treinam, com 60 leitos. Esse indivíduo nunca vai ter entrado num hospital. Então isso é uma temeridade. Conforme a demografia médica, existem 42 mil clínicos cadastrados no Conselho Federal de Medicina, e muitos já com bastante experiência. A questão é: por que não oferecer isso?
A pessoa vai para uma cidade pequena dessas do interior, quando tem um ideal, quando tem um desafio. Mas a grande maioria diz não querer mais saber disso, porque não há a valorização do clínico. Esse é o grande drama. Qualquer um de nós busca a valorização naquilo que faz, busca ser valorizado como pessoa, como cidadão. E, de uma maneira geral, o clínico é aquele profissional que, quando se pergunta "aonde você foi?", "fui ao clínico", "ah, no clínico geral?", ninguém valoriza. O Governo não valoriza. Agora é que está começando. Então realmente é preciso isso que você colocou.
Eu sou Relator de um projeto na Casa que preconiza a redução do imposto em 90%. Pagarão só 10%. Isso deveria ser para médicos e odontólogos, mas alguém pediu vista e tal, e tivemos que refazer. Foi uma boa sugestão, e agora vai para o pessoal da área da saúde. Será um projeto mais amplo, para cidades de 20 mil habitantes ou menos. Mas é um problema, porque isso vai implicar em isenção, e o Governo não quer saber de isenção.
Era isso o que eu tinha para esclarecer.
A palavra é de vocês.
11:25
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O SR. CARLOS AUGUSTO DE MELO FERRAZ - Eu sou o primeiro.
Falarei sobre o PPA e demais dados orçamentários.
Temos três tipos de fiscalização operacional do TCU: a operacional, a de conformidade e a financeira. A fiscalização financeira tem o objetivo de verificar a fidedignidade dos demonstrativos contábeis, financeiros, etc; a fiscalização de conformidade visa verificar a legalidade, se os atos estão em conformidade com as normas; e a fiscalização operacional é aquela que objetiva avaliar o desempenho das entidades.
Todas as fiscalizações operacionais têm os dados do PPA — eles são levantados do orçamento ao acompanhamento. Nem sempre a equipe coloca detalhadamente, mas há um capítulo em toda fiscalização operacional, que é "Visão Geral do Objeto", em que se vai encontrar todo o acompanhamento, todos os dados daquela política que está sendo analisada.
Em relação aos desvios e ilegalidades, essas são coisas que estão dentro de um conjunto que vamos incluir como "perdas". Não existem no Ministério da Saúde medidas de eficiência daquele serviço que é prestado. Então se não se consegue medir a eficiência, não se sabe quanto que se perde. E desvio e legalidade é um pedaço do que se perde.
Nós hoje estamos fazendo um trabalho com o Ministério da Saúde e com Banco Mundial para medir a eficiência das unidades prestadoras de serviços de média e alta complexidade. A pretensão é termos uma medida de quanto é a eficiência relativa desses órgãos, e é claro que o desvio e a ilegalidade é um pedacinho disso. Então, depois desse trabalho, provavelmente ano que vem — aliás, esperamos que o DENASUS participe conosco —, nós faremos as fiscalizações para tentar identificar quais as causas de desvio.
É claro que a nossa não amostra não será significativa. Por quê? Porque eu estou falando de uma infinidade de unidades, de milhares de unidades. Mas nós temos a pretensão que é um criar um referencial de avaliação de eficiência, que também possa ser usado pelos TCEs, pelas Controladorias-Gerais dos Estados. Com isso será ampliada a capacidade de termos uma amostra mais relevante, e com isso talvez tenhamos uma medida de eficiência e, dentro dela, as causas da ineficiência. É essa a ideia desse trabalho. Nós esperamos que a medida de eficiência saia até o fim deste ano ou no começo do ano que vem. Ao longo do ano que vem vamos iniciar as fiscalizações para tentar identificar quais sãos as causas de ineficiência.
Esse é um trabalho longo, é um trabalho difícil, porque estamos falando de milhares de unidades. Quando se fala de eficiência na área de saúde todo mundo bota um pé atrás. Ninguém quer discutir eficiência. Existe uma muleta na área de saúde, que é assim: "Eu sou financiado". O.k. Mas isso não é justificativa para tudo. Não é porque sou financiado que eu posso ser ineficiente. Então há uma dificuldade aí, e nós vamos tratar disso.
O SR. PRESIDENTE (Dr. Luiz Ovando. PSL - MS) - Gostaria de dar só uma palavrinha em relação a isso.
Você mostrou ali que o investimento em relação a outros países, como Portugal, é extremamente pequeno. Mas eu nunca me preocupei com isso, porque eu acho que aquele médico, em termos de diagnóstico, pondo a mão e ouvindo o paciente, fica bem barato em relação àquilo, mas nós não estamos fazendo isso. O fato, como contamos aqui, sobre o pessoal de Pedro Juan Caballero é exatamente assim: o pessoal vem para cá, mas vai ficar em cidade grande, encaminhando o paciente e complicando cada vez mais.
O SR. CARLOS AUGUSTO DE MELO FERRAZ - Em relação aos gastos administrativos e burocratização excessiva, nós, por acaso, também estamos fazendo um trabalho com Ministério da Saúde, discutindo a sustentabilidade do SUS, e uma das coisas que estamos tentando fazer é medir o custo administrativo da judicialização. A judicialização em si é a demanda que vai ser atendida, mas existe todo um custo administrativo, que, às vezes, é bastante substancial. Nós estamos fazemos um piloto na cidade de São Paulo, porque é onde existem dados. Nas outras, de uma forma geral, faltam dados. O nível de controle é baixo. Qual é a dificuldade em se tratar de dados? O Ministério de Saúde tinha um indicador, por exemplo, que falava da cobertura do SUS, etc, que era o IDSUS, que foi descontinuado em 2011. Por que razão? Não sei. Nós perguntamos ao Ministério da Saúde, mas não obtivemos a resposta. Até hoje aguardamos o dia em que o Ministério da Saúde vai dar a resposta.
11:29
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(Intervenção fora do microfone.)
O SR. CARLOS AUGUSTO DE MELO FERRAZ - Estamos tentando fazer uma avaliação de quanto é o déficit de assistência no SUS. Temos uma dificuldade enorme, porque faltam dados. Então, é mais ou menos isso. Mas deve sair um resultado, acredito que em novembro, medindo, pelo menos no Estado de São Paulo e no Município de São Paulo, quanto se gasta administrativamente — e não só administrativamente, mas também judicialmente.
As pessoas não percebem que a judicialização produz como resultado não apenas a despesa com a saúde. Eu tive que movimentar a máquina administrativa para prestar aquele serviço, tive que movimentar o Judiciário, o Ministério Público, a Defensoria Pública, um monte de gente. No final das contas, na realidade, isso tudo é custo de transação. Eu deixei de gastar com saúde e gastei com burocracia estatal. Então, isso existe mesmo. Nós esperamos ter uma medida. Não adianta dizermos assim: "Ele existe". Mas ele é relevante? Qual é a relevância disso? Quanto isso representa? Temos que ter a medida. Esperamos ter uma medida, pelo menos para o Estado de São Paulo, para este ano — para outros Estados, talvez no ano que vem.
Foi citada aqui a questão da medicina, do contato com o paciente. O.k., tenho certeza disso. Na telemedicina, talvez neste momento não seja viável o diagnóstico, o telediagnóstico, mas pelo menos temos condição de fazer um filtro do que é relevante, de quais são os casos de risco que devem ser levados para o médico. Eu não preciso ter todas as pessoas inicialmente atendidas pelo médico. Eu posso ter a telemedicina funcionando como um mecanismo de filtro, que me identifique quais são os casos que precisam ser, de fato, encaminhados ao médico. Hoje, se levamos todo mundo, o que acontece é que temos fila e entupimento do sistema. Então, a telemedicina é um mecanismo que acho que já poderia, imediatamente, em um prazo curto, pelo menos funcionar como esse filtro e selecionar quais casos precisam ser tratados. Eventualmente o Estado deve ir até atrás da pessoa para ver o que está acontecendo.
Educação para a saúde é fundamental. Precisamos pensar nas escolas. Nosso sistema educacional não se preocupa exatamente em educar para a vida. Ele se preocupa com coisas que não são necessariamente aquilo que importa para formar cidadãos. A educação fundamental e o ensino médio deveriam ter como objetivo formar pessoas para a vida. Deveria ser isso. Ora, se a pessoa não é capaz de cuidar da própria saúde, será que nós não estamos falhando substancialmente em educação? É claro que o tempo de resposta disso é longo, mas, se não fizermos, não teremos nunca.
Quanto ao Farmácia Popular, a preocupação do Tribunal foi a questão do custo-efetividade. Toda política pública não tem que ser simplesmente efetiva, tem que ser custo-efetiva também. O resultado, ao ser entregue, tem que ter o menor custo possível. E a observação do TCU é: "O.k., precisamos entregar o medicamento, mas há formas mais eficientes de fazer isso?" E, de uma forma geral na área de saúde, de uma forma geral no Executivo e no Brasil, não avaliamos políticas públicas adequadamente.
Toda política pública tem um processo de aprovação que deveria ser seguido e que não é. Começa com o diagnóstico apropriado, em que eu identifico o problema, quais as razões distributivas, as falhas de mercado que justificam aquela intervenção que vamos fazer. Depois eu estabeleço objetivos, indicadores e metas que eu pretendo atingir. Aí, eu levanto quais são as alternativas que eu tenho. Eu vou contratar médicos? Eu vou transferir o recurso para a contratação de médicos? Eu vou criar incentivos? Eu vou reduzir o Imposto de Renda? Então, as alternativas são levantadas, e, depois de as alternativas serem levantadas, é feita a análise de custo-benefício e de custo-efetividade das alternativas e é feita uma avaliação de risco. Essa é a regra de formulação de política no mundo inteiro, salvo no Brasil.
Como consequência de não seguirmos esses passos, não sabemos o que queremos atingir, não temos indicadores, não temos metas estabelecidas apropriadas, e o resultado disso é que não conseguimos avançar no processo. Saúde é um direito de segunda geração — ele depende de uma prestação positiva do Estado, depende de recursos. Eu preciso ter uma avaliação de custo-benefício e de custo-efetividade, porque é preciso saber escolher a política que entrega mais resultado para a população. Mas, se eu não tiver feito essa avaliação, eu não sei o que eu estou fazendo. Será que vale mais a pena eu investir em mandar médicos para o interior, eu fazer uma redução no Imposto de Renda ou eu investir em saneamento básico? Essa resposta o Brasil não tem. Por quê? Porque nenhuma política é formulada adequadamente. Então, precisamos caminhar seriamente nisso.
11:33
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O SR. PRESIDENTE (Dr. Luiz Ovando. PSL - MS) - Não há nada, nenhum resquício, para você pelo menos começar a direcionar?
O SR. CARLOS AUGUSTO DE MELO FERRAZ - Veja, o Tribunal de Contas da União vem trabalhando com o Governo Federal, junto com a CGU e outros órgãos, no sentido de construir um centro de Governo que direcione o processo de formulação de políticas públicas. No ano passado foi criado um referencial que se chama Guia prático de avaliação ex ante de políticas públicas, que é um referencial, é um guia, mas não é obrigatório para a implementação de políticas. Então, ele tem a estrutura básica de como deve ser formulada uma política, tem uma série de orientações, etc. E foi criado também um Guia prático de avaliação ex post de políticas públicas. Isso foi no ano passado.
O Brasil tem um tempo de resposta, as instituições têm um tempo de resposta. Se perguntarem se nós temos hoje gente capacitada para formular adequadamente políticas, temos que ver como é a história das políticas públicas no Brasil. A história no Brasil é assim: "Eu quero fazer uma ferrovia nessa região." Aí, faz-se a ferrovia. Ninguém sabe se era necessária a ferrovia, se era viável, etc. Alguém toma uma decisão: "Eu vou implantar um hospital". Foi feita uma análise? Este aqui é o melhor lugar para um hospital? Precisa de um hospital? Então, há um monte de unidades... Foi mencionada pelo Rodrigo a questão da regionalização. Há 30 anos a questão da regionalização foi posta na Constituição e até hoje não foi implementada. Há Municípios que criam hospitais com 20 leitos, com 30 leitos, e não sabem se aquela era a melhor solução. Às vezes, o hospital é ineficiente, e havia outra formas de resolver o problema. Não é pensado, não é avaliado.
O SR. PRESIDENTE (Dr. Luiz Ovando. PSL - MS) - Não é avaliado nem o custeio do hospital.
O SR. CARLOS AUGUSTO DE MELO FERRAZ - Não é avaliado o custeio. Nós discutimos a questão das OSs. Precisamos transferir para a OS. Mas alguém, alguma vez, quando fez uma transferência... Em quantos casos foi feita uma avaliação de custos, do que se pretende ganhar e não ganhar?
De uma forma geral, existe um problema de formulação de políticas públicas. Isso vale para a pergunta que foi formulada: "Como levar médicos para o interior do Brasil?" Na realidade, a pergunta é: como levar saúde para o interior do Brasil? Não sei se é levar médicos. Se perguntarmos como levar médicos, já estamos dando uma resposta. A pergunta é: como levar saúde para o interior do Brasil? Ora, é preciso identificar o problema, identificar onde, de fato, o problema existe. Onde o problema existe? Será que ele existe na cidade de São Paulo? Eu não sei se há dificuldade de levar pessoas para a cidade de São Paulo. Então, temos que identificar o problema, onde geograficamente ele está, e qual é o tamanho do problema. Eu não sei o tamanho do problema. Quantos Municípios, de fato, têm esse problema? Quais são esses Municípios? Quais soluções eu tenho? É preciso levantar as alternativas: redução de impostos, a União contratar, transferir recursos, etc. Aí, nós vamos fazer uma análise de custo-benefício e vamos ver qual é a melhor. O que não podemos, no Brasil, é continuar queimando dinheiro porque adotamos políticas que são ineficientes.
Então, era essa a contribuição que eu gostaria de dar para o debate.
Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Dr. Luiz Ovando. PSL - MS) - Perfeito. Muito obrigado.
Tem a palavra o Sr. Rodrigo Arantes.
O SR. RODRIGO ELOY ARANTES - Pegando o gancho do que o Ferraz falou sobre o PPA e relatórios de prestação de contas, reforço aquela expressão que eu mencionei do universo paralelo do SUS. Durante muito tempo, existia o PPA e existiam os planos de saúde, que eram peças distintas. Parece que esse PPA que está se encerrando agora é o primeiro em que houve alinhamento. Da mesma forma, havia dois mundos de planejamento — o planejamento oficial do Governo Federal e o planejamento oficial do SUS —, existiam dois mundos de prestação de contas. O Ministério da Saúde presta contas para o Conselho Nacional de Saúde, presta contas para o Congresso Nacional, com julgamento das contas pelo TCU — dois universos completamente diferentes, que durante muito tempo foram separados mesmo.
E ainda há a questão de timing. Vemos que o Plano Nacional de Saúde é um resultado das conferências de saúde. A última, a 16ª foi realizada agora no meio do ano, o que vai gerar um plano de saúde, que não vai casar com o timing do PPA. São dois universos completamente diferentes.
11:37
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O TCU, cabe registrar, tem trabalhado para alinhar isso. O relatório de gestão que o TCU exige passou a ser mais agregado. Não estamos vendo o Ministério da Saúde fragmentado, mas de uma forma mais integral. Esse foi o primeiro ano em que isso aconteceu e é um caminho sem volta, não é, Ferraz?
Então, há tentativas dos atores de derrubar as barreiras.
Sobre a questão dos gastos administrativos, eu volto a dizer que não há dados muito claros, mas se sabe que há aumento dos custos administrativos na saúde. Eu retomo: você pensa que, em muitos casos, a saúde é a única pasta — imagine um Município — que é totalmente segregada das demais, por conta do Fundo de Saúde. É um outro sistema, é um universo paralelo.
Há o Fundo de Saúde. Todas as despesas são executadas ali. Existe um ordenador de despesas dentro da Secretaria de Saúde. Com isso você vai ter que ter toda a estrutura de licitação, toda a estrutura de fiscalização de contratos da Secretaria de Saúde, enquanto você vai ter outra para o resto, que vai estar dentro da Secretaria de Planejamento, de uma estrutura mais transversal dentro do Governo.
Então, ao irmos a um Município, é normal vermos dois universos. Há a folha da saúde e a folha geral, há as licitações da saúde e a licitação geral. Isso, fatalmente, acaba sendo um dos fatores para o aumento dos custos administrativos na saúde.
É normal irmos a Municípios e vermos uma licitação para conservação e limpeza para todos os prédios da Prefeitura, menos para o da saúde. O da saúde é próprio, é outra contratação. Isso ocorre em todos os custos administrativos. Há esses custos gerais e esses custos, como o Ferraz colocou, específicos da saúde, como é o caso para atender demandas judiciais. Mas a falta de informações ainda nos impede de ter uma visão mais consolidada sobre isso. O que sabemos, como órgão de controle, é que isso é um ponto crítico em termos de corrupção. Muitas operações policiais que a CGU apoia, muitos inquéritos e muitos trabalhos que fazemos para coletar elementos para esses inquéritos são sobre contratos da saúde para limpeza, para lavanderia hospitalar. Historicamente, são despesas muito críticas, assim como é a aquisição de medicamentos, é mais um tipo de despesa muito grande, em termos de criticidade para a corrupção.
Só voltando também ao que o Ferraz colocou e fazendo um paralelo com o programa da Rede Nacional de Dados em Saúde, digo que às vezes as etapas das políticas são atropeladas no Brasil muito porque as instituições não têm condições de fazê-las de maneira adequada, mas principalmente porque a dinâmica das políticas públicas no Brasil não permite que isso seja feito. São raros os casos em que se consegue iniciar uma intervenção numa política pública do zero. Muitas vezes estamos apenas fazendo a dependência da trajetória ali, uma questão incremental, para ir trocando o pneu com o carro andando. Muitas vezes, principalmente na saúde, quando surge um problema novo, que você tem que debater, a dinâmica dos atores acaba fazendo com que as decisões, os desenhos sejam formulados de uma forma muito atropelada. E isso é um problema grande. Eu acho que talvez esse seja um dos maiores desafios que o DATASUS vai ter para implementar a Rede Nacional de Dados em Saúde, porque certamente é muito mais fácil implementar essas soluções onde não existe nada do que onde já existe muita coisa. Na questão de implementação de sistema de dados, a nossa experiência mostra isso. Ao longo do tempo, existiram "n" iniciativas do Ministério da Saúde de criação de sistemas, de soluções, alguns obrigatórios, outros facultativos, e muitas vezes se esbarra com aquilo que já tem — um hospital ou uma secretaria de saúde que não estão dispostos a adotar um novo sistema desenvolvido pelo DATASUS ou sob a égide do Ministério da Saúde. Se ele tiver um sistema melhor e já funcionando, ele não vai querer. Talvez este seja o grande desafio para essa estratégia de unificar informações, de fazer barramento dos dados: lidar com aquilo que já existe e que esbarra nisso. São custos administrativos. Em qualquer evento de saúde, eventos com estandes, conferências, vocês verão diversos fornecedores vendendo as mais diversas soluções. Você poderá ver se o seu leito vai estar ocupado ou não pela câmera do seu celular. Quanto ao Sistema Único de Saúde, não há dúvida de que é um sistema de saúde. Se ele é único, é uma questão a ser discutida, porque existem inúmeras realidades. Então, criar lições que unifiquem a atuação do sistema esbarra em desafios realmente muito grandes. E eu, sinceramente, não sei como resolver.
11:41
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O SR. PRESIDENTE (Dr. Luiz Ovando. PSL - MS) - Obrigado, Sr. Rodrigo.
Concedo a palavra à Sra. Raquel Souza.
A SRA. RAQUEL DE NAZARÉ NUNES E SOUZA - Eu vou fazer um apontamento em relação às auditorias que nós fizemos da atenção básica, que, na verdade, funcionaram como um divisor de águas dentro do próprio DENASUS, já que nós mudamos a forma de trabalho do DENASUS, que sempre foi muito dentro da lógica de auditorias em conformidade. A partir da auditoria da atenção básica, nós implementamos algumas coisas dentro da lógica operacional, já que a proposta era verificar de fato qual era a atenção básica entregue para a população lá na ponta. Por isso, vem dando tanto trabalho a construção do gerencial para compilar todas estas auditorias, já que elas trazem várias coisas muito subjetivas também dentro dos apontamentos da atenção básica. Esperamos entregar várias informações para área técnica sobre as nossas percepções nessas auditorias e também muitas outras informações de como estamos trabalhando, que tipo de resposta conseguimos construir para dentro do próprio DENASUS para alinhar melhor os próximos trabalhos a serem feitos para conseguir qualificar.
Então, dentro dessa proposta de análise muito mais operacional, nós não verificamos o custo dentro da atenção primária porque nós queríamos saber qual era a entrega de fato na ponta, entendendo que o uso do recurso, na verdade, tende a ser feito de forma o.k. quando você faz uma entrega positiva e quando aquela população é atendida dentro do esperado. Quando isso não acontece, nós temos várias possibilidades. Normalmente ela está muito mais apoiada na má gestão daquele recurso, muito mais do que a lógica de desvio de recurso. O recurso da atenção básica ainda é bem desenhado em caixinhas. Então nós conseguimos seguir muito — eu acho que é até mais fácil hoje em dia — para onde foi esse dinheiro, porque ele é muito marcado. Nós precisávamos ver como esses recursos estavam sendo usados. E, tendo a resposta de que está sendo atendido, provavelmente o recurso estava sendo usado. Já que nós sempre trabalhamos com a lógica da conformidade, isso não foi tão eficiente para a proposta de qualificação da gestão, onde a auditoria deve, de fato, atuar.
11:45
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O SR. PRESIDENTE (Dr. Luiz Ovando. PSL - MS) - Raquel, deixe-me fazer uma pergunta a você.
Nós ouvimos muito essa questão da gestão. Inclusive ontem, conversando com o Deputado Ricardo Bastos — eu sempre cito o Deputado porque estamos na Comissão de Seguridade, e ele fala muito isso —, que foi Ministro e sabe bem isso, ele disse que não adianta pedir mais dinheiro, tem que melhorar é a gestão, que o pessoal fica gastando à toa. Existem números disso? Existem comparativos: se fizesse assim, o resultado seria assado e tal? O Ferraz já disse que não tem jeito de ter dados. E estou aqui questionando uma coisa que me incomoda. Pelo que ele mostrou, 346 reais é um valor muito baixo em comparação à meta de Portugal, Estados Unidos, etc.
Eu, como clínico, diria para você que consigo resolver grande parte dos problemas sem dinheiro ou com muito pouco. Mas hoje chegam, pedem exames, encaminham, transferem e não sei mais o quê. Isso é gestão, mas a gestão na busca de uma qualidade de um médico, ou de uma enfermeira, ou de alguém que possa orientar adequadamente.
Vocês têm números disso, dessa dificuldade de gestão?
A SRA. RAQUEL DE NAZARÉ NUNES E SOUZA - Eu não consigo lhe dar números.
O SR. CARLOS AUGUSTO DE MELO FERRAZ - O Ministério da Saúde tem um programa-piloto para levar não para a atenção primária, mas para a atenção especializada uma metodologia enxuta de produção. É um projeto do Hospital Sírio-Libanês. Trata-se de uma experiência extremamente interessante. Em relação a essa experiência, o Hospital Sírio-Libanês monitora tudo e tem todos os dados. Nós conhecemos os dados. Eu não os trouxe aqui, mas a experiência é bastante exitosa. Eles têm produzido resultados extremamente interessantes de aumento de eficiência, aumento de entrega e redução de filas com essa experiência que está sendo feita.
Então é possível avaliar, com essa experiência pelo menos, quanto se ganha, quanto se deixa de oferecer em função de ineficiência, desorganização administrativa, problemas de gestão. Eles estão testando essa metodologia para casos de urgência e emergência. É claro que as conclusões não são passíveis de serem extrapoladas, porque a amostra nem de longe é aleatória, mas é uma experiência muito interessante, que vale a pena conhecer.
A SRA. RAQUEL DE NAZARÉ NUNES E SOUZA - Quanto ao que o Marcos colocou sobre integração, digamos assim, das crianças na questão de saúde, o Ministério tem um programa chamado Programa Saúde na Escola, que eu acho, inclusive, que acaba sendo muito subutilizado e deveria ser mais bem aproveitado dentro dessa questão. Na verdade, ele faz a integração entre as Unidades Básicas de Saúde e as escolas da região. Esses profissionais de saúde visitam as escolas. Eles estão normalmente muito dentro das escolas e fazem ações de saúde tanto de coisas pontuais — como vacinação, etc —, quanto de conscientização e percepção de sintomas, de sinais, de qualificação de saúde, de como se cuidar mesmo. Então, é uma forma até de perceber que as crianças são as que levam várias coisas para dentro de casa e é uma forma de questionar algumas coisas de cuidado em higienização de alimentos, de cuidados em relação ao que se está comendo, o porquê de se estar comendo isso. Esse tipo de coisa vem sendo usado dentro do Programa Saúde na Escola, e nós acabamos caindo na personalização, que, em alguns lugares, funciona muito bem.
11:49
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Na época em que trabalhei no Programa Saúde na Escola — PSE Sete Lagoas, isso era um superexemplo, porque eles conseguiram integrar muito bem e fazer com que as crianças modificassem muito o seu âmbito de casa pelo que elas aprendiam na escola em relação à saúde. Hoje o programa é bem reconhecido, apesar de subutilizado. Tanto é que existe uma cooperação com o México. Está sendo internalizada no México a mesma proposta do Programa Saúde na Escola. Estão vindo pessoas do México para ver agora o programa funcionando em alguns Municípios.
O SR. MARCOS ANTONIO REIS - Desculpe-me.
Ele não funciona por uma questão do Município? Esse Município Sete Lagoas quis fazer, abraçou e levou, e esse Município aqui do lado não quis? Ou é uma questão federal?
A SRA. RAQUEL DE NAZARÉ NUNES E SOUZA - Não, ele está em vários Municípios. O Município de Sete Lagoas citei só como um exemplo. Ele é de fato federal. Ele está dentro da atenção primária inclusive. Antes ele era dentro da Coordenação de Alimentação e Nutrição. Agora, não sei exatamente onde ele está. Ele funciona muito bem em vários lugares. Na verdade, falo de personalização pela mesma lógica de que unidades de saúde que funcionam muito bem tendem a buscar sua comunidade e acabam entrando também nas escolas e fazendo bom uso desse espaço. Aqui no Distrito Federal, nós também temos, inclusive na área rural, várias escolas que funcionam muito bem de forma integrada com a Unidade Básica de Saúde. Era só para citar mesmo como exemplo e falar que o Programa Saúde na Escola existe e que é mais bem utilizado inclusive em relação a isso.
Quanto ao Programa Farmácia Popular, tenho só alguns apontamentos. Quando ele foi proposto, a lógica era a de alcançar um número maior de pessoas. De fato, isso seria muito mais possível, já que nós temos inclusive mais farmácias do que postos de saúde. O problema é que não acontece o controle dentro de onde deveria acontecer, que era no Departamento de Assistência Farmacêutica. Isso acabou sobrecarregando muito o DENASUS, que terminou fazendo papel de controle em vez de fazer de fato o papel de auditoria. Já fizemos várias ações no Programa Farmácia Popular e, mesmo assim, não conseguimos grandes repostas. Vamos lá, entregamos para o DAF, e o DAF não executa os controles que deveriam ser feitos, o que acaba gerando todos esses problemas.
Outro ponto que acabou sendo de fato negativo com o Programa Farmácia Popular foi que, quando se passou a entregar o medicamento na farmácia, o paciente parou de ir ao posto de saúde para buscar o medicamento. E era nesse momento em que o paciente ia ao posto de saúde que nós o captávamos para a lógica de prevenção, de orientação. Era exatamente o contato com a equipe de saúde, que eu acho que era bem melhor, porque se programava a data para buscar o remédio. Assim, aproveitávamos para fazer uma reunião com os diabéticos, com os hipertensos. Isso acabou sendo quebrado, nessa lógica do Farmácia Popular. Eu vejo, de fato, que houve uma perda.
11:53
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Era o que tinha a dizer.
O SR. PRESIDENTE (Dr. Luiz Ovando. PSL - MS) - Obrigado.
O Sr. José Antônio tem alguma resposta?
O SR. JOSÉ ANTÔNIO BONFIM MANGUEIRA - Eu só quero levantar um ponto abordado pelo Fábio: se o DENASUS tem dados sobre desvios de recursos. Quando fazemos auditoria na modalidade de conformidade, levantamos esses dados. É preciso deixar claro que, hoje, de acordo com a Lei Complementar nº 141, de 2012, há o desvio de objeto e o desvio de finalidade. Há desvio quando há malversação, desfalque, etc. Desvio de objeto é quando se deixa de gastar na atenção básica e se gasta na média e alta complexidade. Desvio de finalidade é quando não se gasta na saúde, mas se gasta na educação. Nesse caso, não pedimos a devolução para o Fundo Nacional de Saúde. Apesar de o recurso ser federal, para financiar programas federais da saúde, o recurso não é destinado para o Fundo Nacional de Saúde. O Município ou o Estado utiliza o recurso do Tesouro Municipal ou do Tesouro Estadual e destina àquele fundo, para desenvolver o objeto pactuado.
Complementando o que a Raquel disse, especificamente nessa auditoria da atenção primária, que fizemos na Política Nacional de Atenção Primária, não trabalhamos recursos.
O SR. PRESIDENTE (Dr. Luiz Ovando. PSL - MS) - Muito obrigado.
Concedo a palavra ao Sr. Jacson Venâncio de Barros.
O SR. JACSON VENÂNCIO DE BARROS - Observei alguns pontos de tudo que foi apresentado pelo grupo. Quero deixar claro na apresentação que não estamos inventando nem obrigando a utilização de nenhum sistema do DATASUS. É bom deixar isso claro. Peço desculpas se ficou essa impressão.
Na verdade, a diferença com a RNDS é que seja aproveitado o que já está instalado, o que já está funcionando. Hoje, por causa dos Sistemas de Informação em Saúde, todos os estabelecimentos de saúde já são obrigados a enviar os dados.
Ponto um, estamos reaproveitando os dados usados.
Ponto dois, quando comentei sobre a caixa d'água, fiz só uma figura de linguagem. Apenas queria dizer que não vou entregar a caixa d'água vazia. Existem no DATASUS aproximadamente alguns bilhões de informações que, hoje, os gestores, sejam do estabelecimento, sejam dos Municípios, sejam dos Estados, não conseguem ver. Uma das reclamações do CONASS e do CONASEMS foi que eles mandam dados para o Ministério da Saúde e não é devolvido nada. Há uma burocracia muito grande para simplesmente dar uma olhada não só na fotografia da saúde, mas no filme da saúde.
Hoje tenho uma visão epidemiológica "x" e vejo que ela está mudando. Ninguém monta esse perfil, se ele não montar. Qual é a nossa proposta? Quando for ligada essa caixa d'água, ela já vai ser alimentada com os dados do Estado. Vamos pegar todas as informações recebidas pelo DATASUS ao longo dos anos e vamos devolvê-las para os estabelecimentos de saúde. Isso significa que, quando você estiver nos rincões do País, no Brasil profundo, e precisar saber sobre a doença, o estado de saúde ou a fotografia da saúde daquele indivíduo, automaticamente, mesmo que a rede não tenha sido fomentada, você vai ter acesso às seguintes informações: que medicamento se busca na Farmácia Popular, que medicamento se busca nas farmácias especializadas, quais foram as internações, cirurgias ou eventos que aconteceram com aquele indivíduo na saúde, que estão mapeados tanto pela saúde privada, como pela saúde pública.
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É importante deixar claro isso porque nós sabemos como resolver aquilo. Caso tenha ficado a impressão de que estou obrigando o pessoal a usar um novo sistema, é porque não acredito em solução mágica. Acredito que todos têm alguma solução de informatização. Tudo bem que ainda não é 100%, mas alguma coisa pode ser útil para a continuidade do cuidado. Queria deixar isso claro.
Outro ponto que o Dr. Marcos mencionou foi em relação à visão na palma da mão. Nós já temos um aplicativo hoje, chamado Meu DigiSUS. Estou nesse setor há 8 meses, e isso foi feito no ano passado, mas infelizmente não foi dada a devida atenção ou a devida publicidade ao aplicativo.
O que ele é? É um aplicativo do cidadão. Nossa ideia é preenchê-lo com todos os dados do DATASUS. A pessoa vai ter acesso à informação, independente do estabelecimento, do profissional de saúde. Ao baixar a informação no DATASUS, automaticamente, ela vai aparecer no aplicativo do dispositivo móvel.
Outro ponto que foi comentado pelo pessoal da CGU, pelo Rodrigo. Houve um pedido do TCU. Os projetos passados não deram certo porque estavam com algum problema de implementação. A estratégia estava equivocada, na minha visão, como técnico — não estou fazendo juízo de valor —, na forma como ele foi ou ia ser implementado. O que o TCU pediu? "Antes de serem gastos milhões de reais, vamos fazer um piloto, vamos aprender." É o que estamos fazendo.
A nossa proposta é que toda a tecnologia apresentada aos senhores seja agnóstica, ou seja, não é preciso comprar, já são soluções abertas de mercado. Nós internalizamos o conhecimento, estamos colocando à prova. Não fizemos contrato com nenhum grande fornecedor. Nós vamos fazer sim com que a cloud, que é a nuvem, seja colocada em algum lugar. Seria uma estratégia errada comprar equipamento e colocar no data center ou no DATASUS. Ninguém no mundo está indo para esse caminho. A própria IN01, que acabou de ser emitida pelo SISP, que é o órgão central de tecnologia, já diz para não investir mais em datacenter, mas para se investir no uso de nuvem, que é para onde estamos indo.
Esse vai ser o único investimento, talvez o maior, mas longe do valor inicial do projeto anterior. Para isso, o piloto será em Alagoas. Vamos usar Alagoas com uma proposta de piloto, onde vamos informatizar todos os Municípios, os hospitais, e integrar as unidades básicas de saúde. Vamos errar, com certeza; vamos também acertar e aprender com o modelo de Alagoas e replicá-lo para todos os Estados. O modelo de Alagoas foi uma decisão do Ministério da Saúde. Vamos utilizá-lo, porque entendemos que Alagoas tem rincões, o Brasil profundo. Se conseguirmos levar a informação da saúde com qualidade para esse povo, certamente vamos ter grandes ganhos.
Por último, em relação à telemedicina, nesse novo enquadramento do Ministério, foi criado o Departamento de Saúde Digital — DESD. Qual é o papel do Departamento de Saúde Digital? Cuidar da Telessaúde, regulamentar a Telessaúde.
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Quando eu estava no Hospital das Clínicas de São Paulo, fui convidado pelo Conselho Federal de Medicina (CFM) para fazer parte do Comitê de Informação e Informática em Saúde do próprio CFM, como técnico, e estou lá desde 2007 até hoje. Participei do desenvolvimento da portaria da telemedicina. Infelizmente, não foi para frente. O meu papel era técnico, juntamente com os outros profissionais de saúde, médicos. Aprendi muito e pude também colaborar com a proposta da telemedicina. Infelizmente não foi para frente, mas não tenho dúvida de que a "tele", seja ela qual for, será mais um apoio para o profissional de saúde e, se bem utilizada, certamente, vai trazer vários benefícios.
Há uma questão de legislação; há uma questão de remuneração a ser discutida; há uma questão de usabilidade. Só estamos falando dessa relação médico para médico por enquanto. Tudo bem? Certamente o telediagnóstico vem para ajudar, certamente a telerregulação vem para dar eficiência ao processo de translação do paciente nos diversos níveis de atenção à saúde. Esse departamento, que não está sob a minha gestão, está sob a gestão da Dra. Adriana, vem para regulamentar o uso e, na verdade, fazer a efetividade do uso, do ponto de vista do que o Ministério entende e do fortalecimento da atenção primária.
Essa é a proposta da Telessaúde que está sendo encaminhada por esse departamento.
O SR. MARCOS ANTONIO REIS - O senhor mencionou na sua apresentação a miríade de aplicativos que hoje podemos encontrar sobre tudo. Abre lá seu App Store, que tem 1 milhão de aplicativos sobre qualquer coisa que você queira. Sobre a saúde não é diferente, foi o que o senhor mencionou. Cada interessado lança o seu, de acordo com a sua visão do que seria o melhor e o mais fácil. O senhor afirmou que colocar o aplicativo da diabetes para conversar com o aplicativo da hipertensão, só como exemplo, não se consegue, o melhor é criar um só.
Aqui, na Câmara dos Deputados, tivemos uma fase no passado que era vinculada à tecnologia. Temos técnicos dessa área, só que a demanda no campo da tecnologia hoje, em qualquer área da vida, está sendo maior do que estávamos preparados. Não tínhamos técnicos para isso, e o Parlamento tem se esforçado para ser digital, está correndo atrás para estar mais próximo da população. Essa é uma demanda da alta administração da Casa. A solução que nós criamos foi simplesmente elaborar um concurso. Queríamos o Laboratório Hacker, que é o nome. Criou-se um laboratório, e ali conseguimos colocar os interessados, as pessoas que conseguem lidar com tecnologia que às vezes não estão aqui dentro, e não estão mesmo. É aquele colega que veio dos Estados Unidos, formado recentemente; aquele que está estudando aqui no Brasil; ou, então, aquele que é o curioso, não está trabalhando aqui, na Câmara, está lá fora queimando os neurônios. Chamamos esse pessoal para tentar criar ou oferecer à Câmara soluções para problemas que tínhamos com um concurso. E conseguimos coisas bem interessantes.
Coloco essa sugestão. Se, de repente, alguém vai topar, faça um concurso. "Olha, nós temos tal problema. Gostaríamos de integrar determinados sistemas ou aplicativos que até pensamos em lançar para a população, de uma maneira que eles conversem. Como é que vocês fariam?" Às vezes, o próprio pessoal da área tecnológica de dentro do Ministério da Saúde ou dos órgãos específicos tem outras demandas e não conseguem fazê-lo. Chamem gente de fora para fazer. Sai muito mais barato às vezes.
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O SR. JACSON VENÂNCIO DE BARROS - Eu já venho com essa ideia. Recentemente, no Hospital das Clínicas acabamos de criar um centro de inovação. Sou daquele time. Vim de lá. Então, eu já tenho essa ideia. Nós não chamamos de concurso, mas de desafios. Vamos criar desafios e colocar à população, que está muito mais envolvida e está diariamente com tempo para pensar, de cabeça fresca. Este projeto que acabei de mostrar está sendo montado desta maneira.
Nós chamamos o Google, a Microsoft e a equipe da Amazon. Conversamos com pessoas fora do País para poder provar essa ideia e para poder nos ajudar. Para vocês terem uma ideia, esse projeto já está pronto. Ele está funcionando concomitantemente nas redes da Microsoft, da Amazon e da Google, para avaliarmos exatamente isso. Os engenheiros dessas unidades, dessas empresas, estão nos ajudando a formatar melhor isso. É uma forma que encontramos para dar velocidade. A ideia é que em Alagoas comecemos esse piloto em março — essa é a proposta —, já consigamos ligar essas grandes caixas d'água de Alagoas e aprendamos com isso.
Essa sugestão que o senhor colocou é a que estamos praticando. O problema, acredite, não é só na questão tecnológica, mas também na questão de saber qual pergunta que quero responder. Infelizmente, não sei descrever o meu problema. No Ministério da Saúde, como os senhores colocaram, existiam vários ministérios da saúde dentro de um mesmo Ministério da Saúde. Com essa nova visão, estamos querendo mudar. Estamos criando grupos de integração do DATASUS por uma questão até própria. Estou me reunindo com o pessoal do DENASUS recentemente, falando de Farmácia Popular. Alguém pensou em escrever o fluxo da Farmácia Popular e não chamou o DENASUS. Eu disse: "Espere um pouquinho; não estou entendendo". Enquanto não houver o fluxo definido por todos os atores, eu não gasto um centavo com informatização, porque senão informatizo errado. Estou cansado de ver projetos — e o senhor citou alguns — que foram iniciados de forma errada. O dinheiro já se foi. O serviço foi prestado, mas erroneamente. Então, estamos tentando mudar esse cenário. Não é fácil. Mas acredito que estamos indo pelo caminho certo.
Bom, era isso o que eu tinha para colocar.
Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Dr. Luiz Ovando. PSL - MS) - Muito obrigado.
Alguém gostaria de complementar algo mais?
O SR. FÁBIO DE BARROS CORREIA GOMES - Eu queria fazer uma pergunta relacionada com os gestores da saúde. Alguns Conselhos têm falado que está ficando muito difícil encontrar pessoas que queiram assumir as Secretarias de Saúde. Então, vocês que têm a experiência do controle acham que há alguma lacuna na legislação no sentido de proteger os gestores que tentam trabalhar adequadamente? Devido à judicialização, eles se veem na situação às vezes até de prisão ou até de uma certa bagunça no seu orçamento, para ter que atender a uma demanda urgente, e o orçamento destinado a atender às outras demandas fica prejudicado. Vocês identificam algum mecanismo que poderia proteger o bom gestor?
O SR. PRESIDENTE (Dr. Luiz Ovando. PSL - MS) - Carlos, devido ao avançar da hora, vou designar o senhor para responder a essa questão. (Risos.)
O SR. CARLOS AUGUSTO DE MELO FERRAZ - Olha, são tantas questões. Eu acho que isso devíamos discutir fora daqui, porque há coisas que estão sendo discutidas e são difíceis de dizer. Então, por exemplo, o Judiciário determina realização de despesa e obriga que os gestores efetuem despesas com recursos que não existem. Quem fala da gestão do orçamento é o Executivo e o Congresso. Na realidade, o Poder Judiciário às vezes está invadindo esferas de competência que são do Poder Executivo e do Legislativo. Hoje Prefeitos gastam 50% da sua receita com saúde. Não é o mínimo, não.
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Como lidar com isso? Na minha percepção, quando um Poder invade a área de competência de outro Poder, existe uma a lei que trata dos crimes de responsabilidade. Talvez devêssemos pensar que — eu não sou muito delicado — há crime de responsabilidade de juízes, do Ministério Público e da Defensoria Pública ao aprovar determinada realização de despesa que viole a legislação orçamentária. Uma vez que o orçamento foi aprovado pelo Congresso, não deveria competir ao Judiciário determinar que se realize despesa que viole o orçamento. Nos crimes de responsabilidade, a competência para julgamento é do Congresso Nacional.
O SR. PRESIDENTE (Dr. Luiz Ovando. PSL - MS) - Perfeito. Vamos ouvir a Raquel.
A SRA. RAQUEL DE NAZARÉ NUNES E SOUZA - Gostaria de colocar um exemplo. No Ministério Público de Belo Horizonte, faz algum tempo, eles perceberam a quantidade demanda judicial que aparecia na área da saúde. A solução foi colocar algumas pessoas para consultar todos os processos de judicialização da saúde que chegavam lá.
(Intervenção fora do microfone.)
A SRA. RAQUEL DE NAZARÉ NUNES E SOUZA - Não era Telessaúde. Eram profissionais de saúde dentro do Ministério Público para a consultoria. Então, isso diminuiu muito a quantidade de processos de pagamento, de fato, que a saúde acabou tendo que receber, porque eles faziam a qualificação: "Isso não é para ser judicializado; isso não se justifica".
O SR. PRESIDENTE (Dr. Luiz Ovando. PSL - MS) - Na verdade, isso que o Dr. Fábio coloca tem sido realmente uma preocupação. Você vai para frente de uma Secretaria, de uma gerência em relação à saúde, e há a premência do paciente. Trata-se daquela questão que mencionei inicialmente: a questão emocional. Ela norteia, obnubila e altera a visão, enfim, das situações e, dependendo das cidades menores, existe uma pressão muito grande em cima de Prefeitos, em cima de juizado, que vai judicializando. São esquemas de judicialização de saúde. Vocês sabem disso. Vocês lidam com isso e sabem como funciona. "Deixe isso pra lá; vamos judicializar; o pessoal vai pagar mais caro, vai pagar o suficiente." E a coisa vai... Então, isso é realmente um problema.
No entanto, quando o Carlos fala de um Poder interferindo no outro, realmente fica muito difícil se resolver e responder essa questão.
Eu só queria, para terminar, falar da menção que o Jacson faz sobre a telemedicina. Nós estamos evoluindo de uma maneira que não tem volta. A grande questão em relação ao Conselho Federal de Medicina é que a coisa ficou, Carlos, daquela forma meio na penumbra. No momento em que se emitiu a portaria, no dia seguinte já havia hospitais, com todo o esquema, já sabendo o que estava acontecendo. E aí os médicos se revoltaram, se manifestaram pedindo inclusive interferência da Câmara, e o pessoal retrocedeu.
E há outra grande questão do ponto de vista médico. O Carlos mencionava aqui que o indivíduo não quer ir lá para o interior do Piauí ou do Amazonas, enfim, mas tem experiência. E conseguimos fazer isso como médicos. Recebo constantemente aqui pacientes dizendo: "Ah, doutor, eu estou assim, assim..." "Então, você está com isso, faça isso e tal. Tome o remédio X, Y e Z", dizíamos. Quando estudamos, aprendemos: "Jamais responda por telefone!". Eram princípios. "Não responda por telefone! Mande o indivíduo vir à sua frente." Tudo bem, mas você vai ver que, à medida que se adquire experiência, você consegue perfeitamente fazer diagnósticos pelo telefone. Eu já fiz muitos diagnósticos de madrugada: "Doutor, meu pai está assim e tal". "E como é que ele está? Ele está pálido?", eu perguntava. "Doutor, ele está pálido e suando." "Pega, leva para o pronto-socorro, que é infarto", eu diziae era mesmo. A pessoa fazia tudo rapidinho; ao tempo em que eu saía, ia lá, lia o prontuário e tal. Isso é comum. Quem tem experiência e já esteve na linha de frente sabe fazer e sabe diagnosticar. Então, podemos usar aquele telefoninho que vemos através da imagem ou então é preciso uma central em que haja um indivíduo experiente — entendeu, Marcos? —, que possa receber as imagens, as consultas e dizer: "Ó, vai ao médico aí na sua cidade em tal lugar".
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Então, podemos resolver isso, mas tem que ter experiência, porque a preocupação nossa é exatamente o fato de que, no momento em que abrimos e colocamos a gurizada — eu digo "gurizada" não no sentido pejorativo, mas o médico jovem, sem experiência —, eles podem dizer: "Ah, você tem isso". E se não for? E a chance vai ser grande de errar, porque não viveu ainda, não tem experiência. Isso vai sobrecarregar, Jacson, inclusive os serviços de urgência, o SAMU, os prontos-socorros, as UPAs, porque o diagnóstico não vai ser preciso, não terão sido abordadas adequadamente as manifestações clínicas.
Então isso não tem jeito. Não se reinventa a roda. Experiência é decisiva, qualidade é decisiva. Nós talvez, dentro do Conselho Federal de Medicina e do próprio Ministério da Saúde, teremos que trabalhar essa questão para que possamos agilizar. E aí, por meio da experiência, poderemos fazê-lo, ou seja, a informatização vai ser apenas uma ferramenta à disposição da experiência. É para isso que temos que nos atentar.
Eu quero agradecer ao Carlos. Sua exposição foi muito boa.
Obrigado por você ter vindo aqui, Rodrigo. Vai ficar devendo a denúncia desse caso específico, mas agradeço bastante. Foi muito boa a sua apresentação e sua sistematização, inclusive foi funcional e proposital.
Raquel, muito obrigado pela presença. Vamos ver se conseguimos realmente resolver essa questão da hipertensão, do diabetes e resgatar algum programa para poder ficar atento à situação de lá.
José Antônio, muito obrigado. Vou ficar esperando o relatório, está certo?
Jacson, agradeço pela abertura. É importante divulgarmos isso; inclusive a informatização é fundamental para que venhamos a ter realmente agilidade e interação dessas várias informações, porque aí realmente faremos uma síntese e conseguiremos chegar aonde pretendemos.
Fábio, muito obrigado pelas perguntas, pelos questionamentos. Você é um indivíduo experiente e tenho certeza de que vamos fazer deste estudo uma síntese muito boa e bastante oportuna sobre a saúde primária do País.
Marcos, obrigado. Da mesma forma, você também é bastante experiente.
Quero agradecer a todos aqueles que nos assessoraram, ao Agnaldo, ao Marco Aurélio e à Juliana. Agradeço ao pessoal aqui da assessoria, à Giovana, à Daniela, ao Júnior e ao taquígrafo Carlos Eduardo.
É uma satisfação tê-los aqui. Muito obrigado a todos.
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