1ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA 56 ª LEGISLATURA
Comissão Mista de Planos, Orçamentos Públicos e Fiscalização
(Audiência Pública Extraordinária)
Em 19 de Setembro de 2019 (Quinta-Feira)
às 10 horas
Horário (Texto com redação final.)
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O SR. PRESIDENTE (Dra. Soraya Manato. PSL - ES) - Declaro iniciada 7ª Reunião de Audiência Pública de 2019 da Comissão Mista de Planos, Orçamentos Públicos e Fiscalização.
Esta reunião foi convocada com a finalidade de debater o financiamento e o retorno do investimento em ações relacionadas à primeira infância, em virtude da aprovação dos Requerimentos nºs 9, 16 e 18, de 2019, da CMO, de autoria do Deputado Felipe Francischini, a pedido da Deputada Leandre.
Neste momento convido para compor a Mesa o Sr. Osmar Terra, Ministro de Estado da Cidadania; o Sr. Alexandre Fineas Lima e Sousa, Coordenador-Geral de Políticas Sociais e Transversais da SECAP; o Sr. Naercio Menezes Filho, Economista e Professor do INSPER e da USP; a Sra. Júlia Alves Marinho Rodrigues, Consultora de Orçamento da Câmara dos Deputados; a Sra. Claudia de Freitas Vidigal, ex-Presidente do CONANDA, fundadora do Instituto Fazendo História e atual representante da Fundação Bernard Van Leer no Brasil.
Anuncio a presença do Sr. Rudson Marcos, Juiz de Direito e Diretor-Geral da Escola Superior da Magistratura de Santa Catarina.
Informo, ainda, que o Sr. Flávio Cunha, Professor Associado de Economia da Universidade de Rice; o Sr. Victorino Ribeiro Coelho, Presidente da ONG Contas Abertas, e o Sr. Carlos von Doellinger, Presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada — IPEA, encaminharam e-mails justificando a ausência.
Para melhor ordenamento dos trabalhos, comunico que, de acordo com o estabelecido no art. 398, inciso X, do Regimento Interno do Senado Federal, o Ministro disporá de 30 minutos para fazer a sua exposição. Em seguida, será aberta a fase de interpelação, na qual o Ministro só poderá ser aparteado desde que o permita, conforme prescrito pelo art. 398, inciso IX, do Regimento Interno do Senado Federal. Após o Ministro, farão uso da palavra, se assim o quiserem, os demais componentes da Mesa, pelo prazo de 5 minutos.
De acordo com o art. 398, inciso X, do Regimento Interno do Senado Federal, os Srs. Parlamentares inscritos para interpelar o expositor poderão fazê-lo estritamente sobre o assunto da exposição, pelo prazo de 5 minutos, tendo o interpelado igual tempo para responder, facultadas a réplica e a tréplica pelo prazo de 2 minutos.
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A lista de inscrição para o debate está aberta.
Passo a palavra ao Sr. Osmar Terra, Ministro de Estado da Cidadania.
O SR. MINISTRO OSMAR TERRA - Eu queria agradecer o convite da Comissão Mista de Orçamento e agradecer à Presidente em exercício, a Deputada Soraya Manato.
Quero cumprimentar meus colegas Deputados e Deputadas: a Deputada Leandre, Presidente da Frente Parlamentar Mista da Primeira Infância; o Deputado Ricardo Barros, nosso ex-Ministro da Saúde; a Deputada Carmen Zanotto, minha querida parceira de longa data; o Deputado Zacharias Calil, grande aquisição do Parlamento brasileiro neste novo mandato; o Deputado Aureo Ribeiro.
Quero cumprimentar também todos os componentes da Mesa, a Claudia Vidigal, nossa parceira de longa data; o Naercio Menezes e, enfim, todos os que estão aqui.
Vou tentar ser breve e vou pedir desculpas antecipadas a quem já assistiu a essa exposição, porque eu acrescento algumas coisas, mas eu a repito. A turma da Frente Parlamentar já não aguenta mais me ouvir. Mas, para quem não viu, eu acho que é importante pontuar alguns conceitos que baseiam a política pública na área da primeira infância.
(Segue-se exibição de imagens.)
A primeira coisa que quero dizer é que tanto a primeira infância quanto os programas de capacitação e a educação de maneira geral são o único caminho para diminuir desigualdades e para diminuir a pobreza. Transferência de renda não diminui pobreza. Nós temos grandes programas de transferência de renda. Aliás, o Brasil é um dos países do mundo que mais tem programas de transferência de renda. O Bolsa Família é o menor deles. Há programas muito maiores que o Bolsa Família que ajudaram a diminuir a pobreza, como a aposentadoria do trabalhador rural, que não é uma aposentadoria na prática, mas é uma transferência de renda. Cento e dez bilhões de reais por ano vão para as famílias, para os aposentados rurais, em grande maioria pobres, enquanto eles só arrecadam 8 bilhões de reais. Ou seja, gastam-se 110 bilhões de reais e arrecadam-se 8 bilhões. Para mim isso é um programa de transferência de renda. Isso foi criado em 1994. Em 1996, criou-se o Benefício de Prestação Continuada — BPC, para as pessoas de famílias mais pobres que ainda têm um problema de deficiência física ou mental. Isso representa 60 bilhões de reais por ano, enquanto o Bolsa Família representa 30 bilhões de reais.
Nenhum desses programas resolve sozinho o problema da pobreza. Juntos eles melhoram a situação das pessoas, mas não acabam com a pobreza nem transferem as pessoas numa situação de pobreza para uma situação de não pobreza. A experiência é essa. No próprio Bolsa Família, se os senhores virem a curva do programa, verão que só aumenta o número de famílias, não diminui. Ele trabalha com a pobreza extrema, a fronteira da pobreza extrema.
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Para quem não conhece o Bolsa Família em detalhe, ele é aquele programa que tem que garantir que as pessoas possam, pelo menos, repor as calorias que consomem a cada dia. Essa é a fronteira da pobreza com a miséria, ou com a pobreza extrema. Ele atende às famílias que têm uma renda individual entre 170 e 80 reais per capita. Então, essa renda per capita mensal da família exige uma complementação. O Bolsa Família é uma complementação. Ele atinge hoje 13 milhões e 800 mil famílias no Brasil. O número dessas famílias chegou a 16 milhões, quase 17 milhões. Nós conseguimos passar um pente-fino, e agora ele está em 13 milhões e 800 mil. Chegamos a terminar a fila. Agora está voltando a fila de novo, em razão da nossa dificuldade orçamentária, mas ele está atendendo às necessidades da grande maioria, 95%, das pessoas que estão nessa fronteira. E nós estamos trabalhando para que a fila não dure 2 ou 3 meses. Ela já chegou a durar 1 ou 2 anos no passado.
Mas eu quero dizer que existem as condições para essas famílias — elas têm que manter a criança na escola, têm que manter a frequência, têm que ter a carteira da vacinação —, mas isso ajuda a melhorar, mas não resolve o problema da pobreza.
Faço uma saudação ao Deputado Darcísio Perondi.
Nós nos debruçamos em acrescentar aos programas de transferência de renda duas ações que, estas sim, apostamos que vão nos ajudar a diminuir a desigualdade e diminuir a pobreza. Eles são o Criança Feliz — vou explicar aos senhores a lógica, a base dele e mostrar as evidências que existem em relação a isso — e o Programa Progredir, de geração de emprego e renda. Nós estamos focalizando agora, no Ministério, um público específico, que são os jovens do Bolsa Família entre 18 anos e 29 anos que nem trabalham nem estudam. Há 4 milhões e 600 mil jovens entre 18 e 29 anos nas famílias do Bolsa Família que não trabalham nem estudam. Isso é uma tragédia. Isso é uma tragédia para eles, porque anula qualquer possibilidade de um futuro melhor, e para a família também, porque eles são a esperança da família de progredir mais rápido e sair da pobreza. Esses programas são vinculados basicamente à área da educação. Depois, lá pelo meio da exposição, eu vou falar disso.
O nosso Programa Criança Feliz é um programa da área social, mas poderia ser da educação, poderia ser da saúde. Ele é intersetorial. Em 4 de setembro, foi anunciado o Prêmio WISE Awards, da Cúpula Mundial de Inovação para a Educação. O prêmio é dado pela Fundação Catar, do Emirado do Catar, e é o maior prêmio que existe, no maior evento que existe — ele ocorre de 2 em 2 anos — sobre inovação em educação. Nós concorremos com 130 países, com 482 projetos de programas públicos e conseguimos ganhar. O prêmio vai ser entregue agora em novembro, dias 18 e 19, no Emirado do Catar.
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Eu vou explicar primeiro a base do programa e depois como estamos colocando esse programa em prática, para mostrar a possibilidade de impacto dele.
Vou trabalhar um pouquinho sobre conceitos científicos. Eu sou médico de formação, e esse é um assunto ao qual sempre me dediquei, basicamente a área da neurociência, que hoje tem um acúmulo de pesquisas muito grande, principalmente de meados da década de 90 para cá, que mostram que o início da vida tem um impacto enorme no restante da vida.
Até o Estatuto da Criança e do Adolescente, nós não conhecíamos isso. O Estatuto foi um avanço enorme, mas nós não conhecíamos o impacto da primeira infância, o que acontece realmente nos primeiros meses e anos de vida. E agora nós conhecemos e estamos conhecendo cada vez mais. Esse período da vida está se iluminando cada vez mais.
Então, foi isso que nos levou a ter uma política pública para a área da primeira infância, acrescentando ao ECA o Marco Legal da Primeira Infância, que foi uma construção coletiva na Câmara e no Senado. Nós conseguimos aprovar em tempo recorde. Em menos de 1 ano, nós aprovamos na Câmara e no Senado por unanimidade, coisa muito rara, e a lei passou a vigorar em 8 de março de 2016.
Qual é o conceito básico? "A formação inicial dos sistemas vivos estabelece os condicionantes para o funcionamento de cada aspecto do organismo, seja interno ou externo, através de toda a vida". O que ele está dizendo? Que qualquer forma viva tem potencial genético de desenvolver as condicionantes de sobrevivência, as funções que lhe permitam sobreviver, muito cedo. As formas vivas que não desenvolvem componentes e funções que ajudam a sobreviver muito cedo tendem a não sobreviver ou a ter uma dificuldade maior de sobrevivência.
Então, o processo todo de evolução das espécies leva a que um cavalinho quando nasce já saia caminhando, que ninguém precise ensiná-lo a caminhar, já saia mamando, que ninguém o ensine a mamar. Ele já tem os componentes básicos para sobreviver. A espécie humana não é diferente, mas a espécie humana tem um tempo maior para organizar funções, porque o cérebro é muito mais complexo do que o de qualquer outro mamífero. Então, o ser humano precisa de um período.
Esse período de organização das competências básicas, das funções básicas, ocorre nos primeiros mil dias de vida. Então, é um processo que ocorre muito rápido no começo da vida, e depois vai diminuindo a intensidade. Isso acontece basicamente no cérebro. O que é cérebro? O cérebro, na verdade, falando em linguagem mais funcional, é um comando de sobrevivência. Quanto mais sofisticado o cérebro, em melhores condições aquele ser sobrevive.
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Então, o cérebro humano tem uma capacidade enorme, um potencial enorme em relação ao de qualquer outra espécie. Mas ele também tem que se desenvolver muito cedo nas suas funções básicas. A criança, quando começa a ser gerada, é um ET, não tem noção do que é calor, do que é frio, do que é cor, do que é sabor, da visão, da audição, do afeto, do vínculo, do apego. Tudo isso são funções que têm que acontecer muito cedo, até para desenvolver a parte cognitiva depois. O cognitivo vem depois do desenvolvimento dos componentes socioemocionais, que acontecem muito cedo, lá nos primeiros 18 meses de vida. Todos eles têm um potencial genético, mas dependem do estímulo do meio para se organizar.
Todos os seres humanos organizam a visão nos primeiros 6 meses. Uma criança que nasce com catarata congênita não organiza a visão, não recebe a informação do meio, não consegue enxergar. Então, ela não recebe as formas, as cores, os movimentos, as imagens. E o que acontece? Se ela não operar e corrigir a catarata nos primeiros 6 meses, depois do sétimo mês em diante não adianta mais corrigir; estará cega para sempre. O programa genético é para organizar a visão nesses primeiros 6 meses, organizar a audição no primeiro ano e meio, 2 anos. Se não organizar ali, não adianta. Não adianta fazer implante coclear para a criança ouvir depois dos 2 anos de idade. Ela vai ouvir um barulhão, não vai se adaptar. O período crítico para desenvolver a audição e definir as variedades de sons, a associação de sons, é o primeiro ano de vida. Também a capacidade de dar e receber afeto, de se vincular a outra pessoa e de, com isso, ter segurança emocional para explorar o mundo acontece nos primeiros 18 meses de vida. Depois, não se organiza mais. Uma criança que é maltratada, negligenciada, abusada nos primeiros 18 meses de vida vai ter problema para o resto da vida, vai ser um adulto problemático, vai ser um adulto potencialmente violento, vai ter uma série de componentes que vão marcar para sempre a sua vida.
Isso tudo, essa programação, tem uma base física, que é a organização das redes neuronais pelo estímulo do meio e pelo programa genético. Isso aqui é um neurônio, que é uma célula muito especial que recebe e transmite sinais. O que o cérebro faz na verdade? Recebe a informação do meio, através de sinais visuais, auditivos, de cheiro, processa esses sinais, compara com arquivos, que chamamos de memória, e dá uma resposta àquele estímulo, que pode ser um movimento do corpo, pode ser até um comportamento complexo. Mas sempre, basicamente, é uma resposta de sobrevivência, de entender o meio, perceber o que está acontecendo no meio, para agir de forma a sobreviver em melhores condições.
Os neurônios transmitem, através desses cabos, os axônios, sinais elétricos que se transformam em sinais químicos nesse ponto de contato aqui. É o que chamamos de sinapse.
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Aqui, nesse ponto de contato, vem um sinal elétrico e libera substâncias químicas. Vejam que eles não se encostam. Os neurônios não encostam uns nos outros. Eles têm uma distância. É uma distância muito pequenininha, mas há uma distância ali. Então, o sinal elétrico não passa direto. Ele chega aqui.
Ele chega nesta ponta aqui. Essa é a ponta. Ele libera essas bolas azuis, que liberam essas bolinhas menores, que se encaixam no buraquinho que é do tamanho delas. Quando o buraquinho não é do tamanho delas, elas batem e voltam. Elas se encaixam nesse buraquinho. Quando elas se encaixam nesse buraquinho, disparam um sinal no neurônio seguinte. Então, eles estão sempre sinalizando uns para os outros e trabalhando em rede. Conforme a região do cérebro, eles têm uma função diferente. A visão é aqui atrás. Se tivermos uma lesão aqui, tomar uma pancada aqui, nós podemos estar com o olho normal, a retina normal, tudo normal, mas ficaremos cegos, porque aqui é processada a visão. A audição é mais para cá. A fala um pouco mais para baixo. O comando do movimento de um lado do corpo é aqui. Quando tem um derrame aqui, para o lado oposto. Quando tem um derrame aqui, para o outro lado. Então o cérebro se especializa por região, se especializa por substâncias químicas e pelo tipo de sinalização.
Esse aqui para mim é o diagrama, é a parte esquemática mais importante para entendermos o que na verdade acontece no início da vida e o que acontece por toda a vida. Quando vem um sinal aqui, ele vem muito forte. Vamos imaginar um sinal intenso. A emoção, por exemplo, potencializa os sinais elétricos. Há uma área da emoção que potencializa a atividade elétrica.
Vamos imaginar que vem um sinal do neurônio para cá. Esse sinal chega aqui muito forte. Ele vai liberar uma quantidade grande de bolinhas. O neurônio de baixo vai formar um monte de buraquinhos rapidamente para receber aquelas bolinhas. Mas ele esgota, ele tem um limite. Quando esgota a capacidade de ele receber as bolinhas e o sinal continua intenso, vai formar um novo ramo, em minutos. Isso se organiza muito rápido e sinaliza aqui. Esgotou aqui e o sinal continua intenso, forma um outro ramo. Isso tudo acontece em poucos minutos, e se forma uma pequena rede que não existia antes. Essa rede vai ficar para sempre. Depois dos 80 anos, 90 anos, começa a diminuir muito. Com Alzheimer, por exemplo, ela é destruída. Mas essa rede vai ficar. O que significa isso? Quando passar um sinal de novo, um sinal elétrico aqui nessa rede específica, ele vai evocar a informação que a originou. A isso nós chamamos de memória.
Nós somos as nossas memórias. Sem as memórias, não somos nada, não vamos entender nada do que está acontecendo, não vamos saber quem nós somos, onde estamos. Todos os seres, e mais ainda os seres humanos, precisam da memória para se orientar no mundo, para entender o mundo onde eles vão viver. Esse processo aqui é muito intenso nos primeiros mil dias de vida, depois ele diminui de intensidade. Ele não acaba. Nós vamos formar memória a vida inteira, mas a intensidade maior, a quantidade maior de informações para serem captadas ocorre no início para aquele ser poder se orientar no mundo.
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Há uma interação entre genética e ambiente que funciona o tempo inteiro.
Isso é uma animação mostrando dentro do útero os neurônios se organizando. Os sinais elétricos são essas faisquinhas brancas. Podem ver que estão se formando novos braços dos neurônios. Vão-se formando as redes numa velocidade incrível, são milhões de conexões por minuto no início da vida.
Esse cérebro aqui é o cérebro do embrião, que está num processo intenso de formação. A mãe nem sabe que está grávida ainda, e esse processo já está acontecendo. Ele começa na segunda semana, e praticamente o número de neurônios se organiza até a vigésima segunda semana de vida intrauterina. Então, são 20 semanas decisivas na vida de qualquer ser humano.
Aqui foi o problema, por exemplo, do zika vírus. O zika entra na placenta e não deixa esse processo acontecer. Então, ele dá os quadros neurológicos, principalmente microcefalia. Agora nós criamos uma pensão especial. O Presidente Bolsonaro assinou uma pensão especial substituindo o BPC para as crianças com zika. Esse é outro assunto sobre o qual depois nós vamos falar.
Isso aqui é um cérebro de uma criança recém-nascida. Aqui são os neurônios. Aqui são as conexões. Vejam que há poucas conexões no início. Com o estímulo do meio, a criança vai ouvindo sons, vai vendo imagens, vai vendo rostos, ela vai formando uma rede. Com 1 ano ela já tem uma rede enorme. Não aumentou o número de neurônios, mas aumentou muito a rede de conexões do cérebro. As memórias dela estão em número muito grande.
Aqui é uma curiosidade importante de entendermos também. Na puberdade diminui o número de conexões. O cérebro faz uma curva.
Isso aqui é uma tomografia com emissão de pósitrons que pega, a cada região do cérebro, a intensidade de atividade dos neurônios. Então, tem uma cor diferente.
Aqui é o nascimento: zero. Aqui mostra como cresce rápido: 3 anos de idade, 5 anos, 6 anos, depois vai diminuindo. O que acontece? Até os 3 anos de idade, 4 anos, 5 anos os neurônios formam uma quantidade de redes. Tudo que é informação forma redes, vai formando redes, formando, formando, só que uma parte delas não é muito estimulada. O sinal não é constante. Em resumo, não é importante. O que é importante está sempre se repetindo. O que acontece? A partir da puberdade, dos 9 anos de idade, o cérebro começa a deletar as informações que não são muito usadas, para ele poder ser mais eficiente, não ficar uma confusão muito grande para tomar decisão. Então, ele se especializa para ser mais eficiente. Um adulto de 19 anos tem a metade das conexões que tem uma criança de 3 anos. Isso é para ter uma ideia da importância que tem esse período da vida. Isso nunca mais vai acontecer. Essa intensidade de captação de informações nunca mais vai se repetir ao longo da vida. Esse é o período mais importante.
Este é o desenvolvimento o cérebro.
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Esse sujeito aqui é John Bowlby. Para mim, foi a maior sacada. Ele foi o responsável pela maior descoberta em relação a esse desenvolvimento. Observando mamíferos, viu que o bebezinho mamífero — o cachorrinho pequeno, o pato, até aves também — tende a ficar perto do adulto enquanto são pequenos, enquanto estão criando condições de sobreviver. Eles precisam da proteção e do atendimento do adulto para poder sobreviver e melhores condições de vida. Ele então estudou esse comportamento em várias espécies e no ser humano.
Enfim, ele tem todo um trabalho, mostrando, a cada semana, como vai se desenvolvendo essa relação do bebê com uma pessoa que cuida do bebê. É uma relação em que se organiza inclusive a capacidade de dar e receber afeto. Isso começa muito cedo no cérebro humano. Ele chama esse período de "apego", attachment. As crianças têm uma base, elas não vão muito longe, elas ficam olhando onde está o adulto, até os 2, 3 anos de idade, principalmente até os 2 anos. Ela corre, mas fica cuidando, ela não ultrapassa um raio de 60 metros em média do adulto. Ela está sempre procurando, porque é o adulto que a protege, é o adulto que dá comida, quando ela está com fome, que dá água, quando ela está com sede, que atende quando ela está com dor, que atende quando ela está com xixi na fralda, que atende quando ela está com cocô na fralda. É o adulto que a protege, é aquela pessoa. Em geral, é a mãe, mas pode ser um cuidador também ou um pai. O mais frequente é a mãe.
Ela tende a manter uma proximidade, ela transforma esse adulto na base segura dela e, quando esse adulto responde bem a ela, atende-a nas suas necessidades, ela se sente segura para explorar o mundo. E, a partir daí, ela começa, pela curiosidade, que é um programa genético também, a explorar e aprender o mundo. Aí, começa o desenvolvimento da parte cognitiva. Até então é uma relação basicamente socioemocional com o adulto, e ela sofre muito quando se separa desse adulto. Ela tem o sofrimento da separação.
Este eslaide nos mostra que as crianças nascem também geneticamente programados para a emoção. Ninguém ensina emoção para a criança. A criança se comunica antes de falar; nos 3, 4, 5 meses de vida, ela já se comunica emocionalmente com o adulto que a protege, que a cuida. Ela tem um programa para perceber a emoção no rosto do adulto: ela olha e percebe e ela percebe sentindo a emoção que o adulto está sentindo. É o olhar sustentado da criança. A criança está sempre procurando os olhos da pessoa que cuida dela. Ela percebe a emoção como? Na expressão do rosto, no tom da voz e no gesto.
Esta foto aqui é uma experiência que inclusive viralizou na Internet, alguns de vocês já devem ter visto. É uma criança olhando para a mãe e vendo a mãe cantar; a mãe estava cantando uma canção triste. Mas a criança não fica triste por causa da canção, ela não entende nada que a mãe está falando, ela fica triste por causa da expressão do rosto da mãe que está interpretando a canção. Ela acompanha, ela sente o que a mãe está sentindo. Vamos lá.
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O SR. MINISTRO OSMAR TERRA - Essa sintonia é extraordinariamente importante para desenvolver a parte do apego e a parte socioemocional da criança. E isso acontece nos primeiros 18 meses, depois, a programação genética já não faz esse processo funcionar tão rápido.
Aqui nós vemos um jogo de espelhos.
Kandel, que ganhou o Prêmio Nobel de Medicina em 2000, fala uma coisa importante, foi ele que descobriu como se forma a memória de longo prazo, aquilo que eu expliquei antes: "O detalhamento da formação da rede de neurônios do cérebro é dependente de interações específicas (...) com o meio ambiente". O meio ambiente aqui se supõe o adulto junto. "A influência do ambiente no cérebro muda com a idade(...). Profundos efeitos ocorrem nas fases iniciais de desenvolvimento pós-natal."
Essa é uma descoberta fantástica. O processo educacional todo depende disso. As crianças já chegam à escola sabendo mais ou menos, tendo mais facilidade de aprender, dependendo do estímulo e da organização que tem o cérebro dela no início da vida.
As vias cerebrais que afetam a capacidade de ler e escrever, o comportamento e a saúde se organizam muito cedo no cérebro humano. Depois, não se organizam mais, eu quero dizer isso para vocês também, ou se organizam com muita dificuldade. Então, há o período certo para cada coisa.
A parte de cognição é importante entender. Aqui é quando a criança é gerada — é menos 9: são 9 meses antes de ela nascer. Aqui é o nascimento. Aqui são os 12 meses do primeiro ano. Aqui é com 1 ano de idade. Estas são as curvas de funções de linguagem e cognitivas.
Vejam só: as funções e a linguagem já estão organizadas aqui, antes de nascer já estão começando a se organizar. Elas têm um pico aos 3, 4 meses de idade. Esta curva aqui, um pouquinho mais adiante, mostra a parte auditiva aos 8 meses. Depois, ela vai diminuindo com a idade, dos 12 meses aos 6 anos — 1, 2, 3, 4, 5, 6 anos.
A mãe que lê contos para a criança no primeiro ano de vida, mesmo que a criança aparentemente não esteja entendendo, está fazendo com que a criança forme memória de um vocabulário muito rico. A mãe de classe média, que tem um vocabulário por si só já muito rico, faz essa criança desenvolver a memória e um vocabulário extraordinário; enquanto que a mãe pobre, que não tem um livro para ler em casa para a criança, que, às vezes, é analfabeta ou com pouca escolaridade, fará com que o vocabulário da criança seja mais limitado.
As crianças nascem com o mesmo potencial, seja numa família rica, seja numa família pobre, mas elas vão se desenvolver de forma desigual pelo estímulo que elas vão receber do meio. E há um período crítico em que nós temos que intervir, senão vai haver uma desigualdade. Ela já chega à escola em desigualdade. Aos 4 anos, uma criança de classe média tem um vocabulário 20, 30, 40 vezes maior do que uma criança de uma família pobre. E isso faz toda a diferença na escola. Ela vai entender melhor o que o professor fala, o professor vai entender melhor o que ela fala e a outra vai ter mais dificuldade.
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Esta aqui é a parte cognitiva. As associações cognitivas de deduções, do raciocínio lógico estão no auge aos 5 anos de idade. Tudo está acontecendo muito cedo, e não é na escola, não é na escola que isso acontece. Nós temos que trabalhar antes. Se nós estamos querendo desenvolver o ser humano, as competências humanas, nós temos que trabalhar desde o útero para que essa criança tenha um desempenho melhor na vida.
Heckman, economista que recebeu o Prêmio Nobel de 2000, mediu isso do ponto de vista econômico. E ele mostra que, considerando as despesas em educação, assistência social, crime, sistema prisional e os ganhos salariais, para cada dólar investido, em programa de primeira infância, voltam 7.16 dólares até a idade de 27 anos. Na verdade, economizam-se 7.16 dólares, para cada 1 dólar, economizam-se 7 e até aos 40 anos se economizam 12 dólares. Isso é para dizer o seguinte: não existe nenhum programa social que tenha esse resultado. O maior impacto na área social para diminuir repetência, para diminuir problemas de assistência social, para diminuir a violência vem dos programas de primeira infância.
Esta aqui é a curva que ele faz do custo-benefício. O benefício é muito alto, se os programas começam antes da pré-escola. Depois, vai diminuindo com o tempo. Os investimentos em política pública vão tendo um retorno menor.
Comportamento. Este aqui é um filme sobre comportamento. Eu não vou passá-lo, porque é muito longo, são 10 minutos, não vou tomar mais tempo. É um filme que mostra os estudos do Richard Tremblay, um professor de Montreal que acompanha mil crianças que nasceram em Montreal há mais de 30 anos. Ele mostra em que período da vida o comportamento é mais alterado, inclusive ele localiza bem o surgimento do comportamento violento, quando é que ele surge. Ninguém fica violento na idade adulta. Já é possível prever um adulto com comportamento violento observando as crianças.
Isso aqui também é para desmistificar algumas fábulas que temos, porque, às vezes, perdermos um tempão acreditando naquilo e, depois, vemos que, na prática, as coisas são diferentes.
Rousseau, no período do Iluminismo, das mudanças que originaram a Revolução Francesa, todos os conceitos da Revolução Francesa, cunhou a ideia de que o ser humano é um bom selvagem: ele nasce puro e bom e esse mundo cruel, desigual vai transformando-o num ser violento, num ser egoísta. Na verdade, todos os seres humanos nascem egoístas. O egoísmo é um componente básico de sobrevivência. Quando a criança está no colo, estabelecendo o seu apego com o adulto, 1 ano, 1 ano e meio, você a coloca no chão para brincar com as outras, ela acha que tudo é dela, ela toma brinquedo dos outros. Os brinquedos são dela. É o "egoísmo" — entre aspas — de sobrevivência, só que as outras crianças também acham que é delas. E aí quebram o pau, não é? O ser humano é mais agressivo, no ciclo de vida, entre 1 e 4 anos de idade, quando há quantidade maior de agressões que um ser humano faz contra outro ser humano, só que isso não dá Boletim de Ocorrência, porque o soquinho não tem tanta força. Se fosse na idade adulta, seria uma chacina.
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Então, este é um filmezinho que mostra isso. O componente de agressividade, de egoísmo, está presente desde o início da vida. Não existe o bom selvagem.
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O SR. MINISTRO OSMAR TERRA - Quem trabalha ou já trabalhou e acompanhou crianças em creches sabe que isso é a coisa mais frequente que existe.
Negligenciar uma criança é, às vezes, tão grave quanto maltratá-la. Ao não atendê-la nas suas necessidades, a criança não entende nada. Ela começa a sentir fome e aí começa a chorar, e existem mães que, por ignorância, dizem que não podem acostumar mal a criança, que ela tem que aprender os horários dela, e aí o estresse na criança começa a subir.
O estresse se organiza muito cedo em nós, toda a quantidade de hormônios que o estresse libera, a forma como encaramos uma situação difícil, não se organiza na idade adulta, mas, sim, na primeira infância, e essa organização leva, nos primeiros 2 anos de vida, a um fenômeno chamado estresse tóxico. Os hormônios do estresse sobem muito rapidamente. O cortisol, que é um dos hormônios, lesiona o cérebro nesse período. Quando o cérebro está formando as suas conexões, principalmente do sistema do apego, o cortisol lesiona, ele destrói os neurônios, se mantido alto por muito tempo.
A criança nasce bem, não tem doença nenhuma, não tem problema genético nenhum e, aos 2 anos de idade, ela já tem lesões cerebrais pelo estresse permanente que ela vive, pela negligência, pelo abuso, pela violência de quem dela cuida. Quando ela chega na adolescência, podem aparecer depressão, ansiedade, pensamento suicida. Nós estamos inclusive no Setembro Amarelo, mês de prevenção ao suicídio. Está aumentando muito o número de suicídios de jovens, e aí vem droga, vem um monte de coisa junto. Mas é importante lembrar que esse potencial se organiza muito cedo. Como consequência, podem aparecer também a síndrome de estresse pós-traumático, agressão, impulsividade, delinquência, abuso de substâncias. Essa é uma pesquisa do Martin Teicher, publicada na Scientific American, em 2002.
Esta é a curva de Tremblay. Ele acompanha mil crianças que agora já estão com 30 anos, já são adultos e mostra que, no início da vida, há quatro segmentos: há um grupo, que é muito pouco agressivo, mas é agressivo. Entre 1 e 3 anos há um pico pequeno. Aqui, é a quantidade de agressões num dia. É uma quantidade menor, que vai diminuindo. É o contrário, é a civilização. Os limites que a família bota na criança é que vão diminuindo a agressividade dela. Não são a família e a civilização que a tornam violenta.
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Aqui é um segundo grupo um pouco mais agressivo. Aqui também são 10 anos, 15 anos, 20 anos, 30 anos.
Há um outro grupo aqui. Os senhores podem ver que aqui começa a aparecer uma curva. Trata-se do período da adolescência, a puberdade, com os hormônios já explodindo, e as mudanças corporais. Isso altera o comportamento. O adolescente tem um comportamento que nós chamamos de...
O psiquiatra argentino Maurício Knobel criou um termo: a síndrome da adolescência normal. Os adolescentes todos têm um comportamento alterado. Eles mudam de humor de hora em hora, ficam agressivos e tal, por causa dessas flutuações hormonais. Isso leva a uma impulsividade e a uma agressividade maiores.
Então, há uma curva de aumento da agressividade aqui que diminui, mas não diminui tanto na idade adulta.
Há 4% dessas crianças — é em qualquer grupo que esse percentual acontece — que têm um comportamento muito agressivo com 1, 2, 3 anos de idade. Depois há um pico na adolescência e uma agressividade muito maior na idade adulta.
É possível detectar, por probabilidades, quem vai ter um comportamento mais agressivo na idade adulta. Se cuidarmos bem, intervirmos aqui, reduzimos muito a agressividade futura dessa criança. Os maiores programas de prevenção de violência têm que ter dentro deles programas de primeira infância, de cuidados na primeira infância.
Nós falamos muito em violência, que estão reduzindo o número de homicídios e tal. Esta curva aqui corresponde a 13 anos de idade. Aqui é 45 anos, 25 anos, 18 anos, entre 18 e 24. Essa curva do crime — esse aqui é crime violento — é universal e atemporal. O Quetelet que foi o primeiro que fez, no século XIX, fez exatamente essa curva. Essa é a curva do crime rate do Canadá e dos Estados Unidos. É mais ou menos a mesma coisa em qualquer lugar do mundo. Os jovens é que são mais violentos. Os jovens é que morrem e que matam mais. Isso não é um acontecimento de uma época. No mundo todo é assim.
É claro que, quando um país cuida melhor, tem menos problemas sociais, tem mais acompanhamento e também tem penas mais severas — as penas funcionam nesse negócio —, o percentual fica com essa curva, mas ela é menorzinha em relação a outros países.
Eu estou terminando. Aqui é quando a cuidadora é abusiva. A pessoa cuida mal da criança, não dá bola para a criança, não a atende em suas necessidades. É uma criança pobre. Ela pode não ter brinquedo eletrônico — a criança rica tem —, mas, se tiver uma pessoa que cuide com carinho dela, ela suprirá essa parte emocional bem. Ela ajuda a criança a desenvolver melhor essa parte emocional. A criança rica pode ter todos os brinquedos do mundo, mas se tiver uma pessoa a maltratando não adianta nada. A cuidadora abusiva não somente deixa de brincar e interagir menos com a sua criança, mas também induz a um estado traumático e negativo durador. Assim que acontece o estresse tóxico, porque ela não acalma a criança, não proporciona consolo interativo, seus estados emocionais intensamente negativos duram por longo período de tempo. Tais estados também são acompanhados de severas alterações na bioquímica do cérebro imaturo, especialmente nas áreas associadas com o desenvolvimento das competências interpessoais.
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Esta é uma das maiores tragédias do mundo contemporâneo: as crianças da Romênia. Essas crianças foram vítimas de um ditador chamado Nicolae Ceausescu, que acreditava que, para desenvolver a Romênia, deveria aumentar a população. Então, ele cobrava e exigia que as famílias tivessem cinco filhos, pelo menos. Ele acompanhava inclusive no posto de saúde, se a mulher estava ou não menstruando, por que não engravidava. Era nesse nível. Assim, nasceram muitas crianças. Mas os pais tinham que trabalhar ou morriam, e os orfanatos ficavam lotados. Criaram creches e orfanatos gigantescos, lotados de crianças.
Eles não entendiam a interação do adulto com a criança. Eles achavam que inteligência e que a parte emocional era genética e não precisava ter nenhum cuidado especial. Então, eles largavam as crianças em cima de camas desses lugares desde pequenininhos, não interagiam com as crianças, não as pegavam no colo, não as olhavam nos olhos. Havia poucos cuidadores também para o número de crianças. Quando morreu o Nicolae Ceausescu — ele morreu por uma revolta popular — abre-se o regime. Era um regime socialista lá na Romênia.
Então, entram os Médicos Sem Fronteiras, que fazem o primeiro registro dessas crianças. Eles relatam que quando entraram nos orfanatos as crianças ficavam todas em silêncio. Eles nunca haviam visto isso: todas as crianças em silêncio, fazendo movimentos repetitivos, como se fossem autistas. Isso é uma tragédia, porque essas crianças, no período mais importante de organização das suas competências, foram privadas, tiveram uma profunda privação de estímulos. E isso tem um resultado.
Este aqui é um adolescente que teve cuidados na primeira infância e esse aqui é um adolescente órfão da Romênia. Vocês podem ver que o estresse traumático, o estresse tóxico destruiu áreas inteiras do cérebro, principalmente essas áreas que são associativas entre a parte racional e a parte emocional, que comanda o controle de impulsos. Essa criança tem menos atividade cerebral do que a outra. O que está em vermelho e amarelo é o que tem mais atividade. Se fizer o exame nas outras, vai dar um resultado muito parecido.
O Canadá tenta adotar crianças da Romênia e faz um programa de adoção. O Charles Nelson, que esteve recentemente aqui no Brasil, um grande pesquisador de Harvard, fez esses estudos, que mostram que a criança nascida no Canadá tem um Quociente de Inteligência — QI 108, em média, nos primeiros anos de vida. O escore de linguagem que eles estabelecem lá é 106, e 13% das crianças têm comportamento alterado, são mais agressivas. As crianças adotadas da Romênia precocemente quase repetem o padrão canadense: elas têm 99, têm um QI 99 e são menos agressivas inclusive do que as crianças do Canadá. As crianças da Romênia adotadas maiores têm um QI menor, têm um escore de linguagem bem menor e 43% têm comportamento alterado, comportamento agressivo e violento. O padrão de estresse que teremos ao longo da vida é organizado na primeira infância. Nesta imagem vê-se que não é só dar o leite para a criança, mas olhar nos olhos da criança, conversar com ela naquele momento, falar baixinho, falar o manhês, no qual a voz fica mais fininha e a criança sabe que está falando com ela. Quando a mãe está falando fininho, imitando a criança, a criança sabe que a mãe está falando com ela. Isso aqui produz um desenvolvimento enorme.
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Esta aqui foi a nossa primeira turma da Frente Parlamentar da Primeira Infância. O Marco Legal é a Lei nº 13.257, de 2016. Nós criamos em cima disso o programa Criança Feliz, que é hoje o maior programa do mundo de visita domiciliar. Por isso que nós estamos ganhando prêmio do Catar. Esse é o que tem maior escala no mundo. O Criança Feliz acompanha criança de 0 a 6 anos em casa. Toda a semana o visitador vai a casa daquela criança oferecendo instrumentos para que os pais estimulem o desenvolvimento cognitivo, emocional e psicossocial dos filhos.
Por que é importante ir a casa? Porque na casa se tem noção do ambiente daquela criança, se é um ambiente estressante, se é um ambiente violento. Inclusive, essa visita ajuda a reduzir violência doméstica.
Esse é o maior programa em escala do mundo. Nós estamos chegando a 765 mil pessoas atendidas dentro do programa: 640 mil são crianças, 125 mil são gestantes, todas do Bolsa Família ou do BPC, o Benefício de Prestação Continuada para as famílias mais pobres que têm deficiência mental ou física.
Os beneficiários do Bolsa Família são crianças de 0 a 3 anos — fazemos a visita até os 3 anos —, que recebem visitas domiciliares semanais. Já temos 25 mil visitadores e monitores hoje acompanhando essas crianças. As crianças beneficiárias do BPC têm acompanhamento até os 6 anos. Há crianças afastadas do convívio familiar, crianças institucionalizadas. Uma meta que estamos querendo cumprir dentro do Governo é acabar com a institucionalização de crianças. Vamos ter lares adotivos para todas. Hoje, temos em torno de 9 mil crianças institucionalizadas no Brasil. Queremos, no máximo em 2 anos, não ter mais nenhuma criança institucionalizada, pois sabemos da importância dessa relação com a família e com o cuidador.
Há crianças atendidas por microcefalia. Estamos criando Centros Dia, também acompanhando com o programa.
Visitas domiciliares. Quando começamos o programa, de todos os programas sociais, o Sistema Único de Assistência Social — SUAS fazia uma média de 2 milhões de visitas domiciliares por ano no Brasil. Vejam que só neste programa aqui nós já chegamos a 20 milhões de visitas domiciliares. E estamos tendo, imaginem, 750 mil por semana, já dá 3 milhões de visitas por mês. Esse é um outro fator: é o Estado indo à casa das pessoas, ajudando aquelas pessoas a cuidar, a desenvolver, a estimular melhor seus filhos, e ligando aquela família com todos os programas sociais que há naquele Município. Os profissionais são capacitados e com atuação intersetorial. Seguimos um protocolo da UNICEF e da Organização Mundial de Saúde para isso. Os visitadores têm que ter uma ligação com a comunidade. Eles avaliam o ambiente familiar, identificam fatores que podem comprometer o desenvolvimento integral da criança e orientam sobre cuidados essenciais nos primeiros anos de vida. Além disso, os visitadores estabelecem o vínculo entre as famílias e os serviços existem no Município. Estes são os Municípios: 2.620 Municípios aderiram ao programa, praticamente a metade dos Municípios brasileiros. Mas os maiores aderiram, os que têm mais população. Então, a maior parte da população já está dentro do programa, potencialmente dentro do programa porque há Municípios que têm lá 5 mil crianças que podem entrar no programa e têm 2 mil sendo atendidas. Agora estamos abrindo uma nova etapa para inclusão. Este aqui é o recurso gasto com o programa. O programa foi criado em 2016. Em 2017 começaram as visitas, ao custo de 207 milhões. Em 2018, foram 256 milhões. Em 2019, o custo vai ser de 377 milhões.
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Nós estamos propondo terminar este ano de 2019 com 1 milhão de famílias atendidas em casa. E, no final do ano que vem, 2 milhões de famílias atendidas em casa. O total de famílias do Bolsa Família e do BPC, de crianças que se enquadram no programa, do BPC e do Bolsa Família, são 3 milhões e 200 mil. Então, queremos fazer uma progressão. Estamos com 1 milhão. Vamos para 2 milhões no ano que vem. E, até o final do Governo, queremos chegar nos 3 milhões e 200 mil. Talvez não chegue nisso, por vários motivos. Não é simples se chegar em todas ao mesmo tempo.
Agora é isto aqui que eu quero pedir para a Comissão de Orçamento. Agora vem o chapéu aqui. Nós precisamos de 1 bilhão e 190 milhões de reais, mas só temos previstos 517 milhões. Então, precisamos ter uma previsão orçamentária maior.
Por que eu acho importante isso aqui? Porque está havendo um discurso contra o programa dizendo o seguinte: "Não, o dinheiro tem que ser para o Sistema Único de Assistência Social. Não se pode tirar dinheiro do programa do SUAS para colocar no Criança Feliz, porque nós estamos usando a rede do SUAS, que chega mais rápido em todos os Municípios". Isso não é verdadeiro porque são orçamentos separados. Se o SUAS não está tendo pagamento adequado temos que fazer com que se libere o orçamento. O orçamento do SUAS é de 3 bilhões. É um orçamento diferente deste orçamento aqui. Este aqui é um plus. Então, não se pode dizer: "Não, não está vindo dinheiro para um programa, vamos cortar o outro". Esse é um raciocínio que surgiu na última conferência de assistência social, na qual mandaram acabar com o programa Criança Feliz. Quando as decisões são muito esdrúxulas, não precisamos respeitá-las. Não respeitamos, e o programa continuou. Nós precisamos ter essa diferença aqui. Precisamos que os nossos Deputados e Deputadas da primeira infância entrem com emendas para corrigir essa diferença aqui, bem como que a Comissão as aprove. Aqui é só para os senhores terem uma ideia do que é o WISE Awards. WISE — World Innovation Summit for Education: é a cúpula mundial de inovação na educação. Vou passar um vídeo de 1 minutinho.
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(Exibição de vídeo.)
O SR. MINISTRO OSMAR TERRA - A Ely é a nossa Coordenadora, a nossa Secretária Nacional de Promoção do Desenvolvimento Humano.
(Exibição de vídeo.)
O SR. MINISTRO OSMAR TERRA - Na verdade, o programa é de educação da família, e não da criança.
(Exibição de vídeo.)
O SR. MINISTRO OSMAR TERRA - Os visitadores criam um vínculo extraordinário com as famílias. (Palmas.)
(Segue-se exibição de imagens.)
Essa frase aqui, para mim, é muito importante. As crianças nascem e todas têm o mesmo potencial, um potencial muito semelhante. O que vai fazer a diferença é o que acontece com elas a partir do momento em que nascem, principalmente na primeira infância. Isso vai diferenciá-las para sempre, criar a desigualdade, criar a pobreza, a incapacidade de sair da pobreza no futuro.
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Era isso o que eu tinha a dizer.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Dra. Soraya Manato. PSL - ES) - Quero parabenizar o Ministro Osmar Terra por mais uma vez nos fornecer e nos favorecer com essa palestra brilhante, tão engrandecedora e emocionante.
Antes de passar para o próximo expositor, eu queria registrar a presença da Deputada Federal Leandre, da Deputada Carmen Zanotto, do Deputado Dr. Zacharias Calil, do Deputado Aureo Ribeiro, da Deputada Dulce Miranda, do Deputado Lucas Gonzalez, da Deputada Soraya Santos, do Deputado Darcísio Perondi, do Deputado Misael Varella e da nossa Senadora Daniella Ribeiro.
O próximo expositor será o Sr. Naercio Menezes Filho, Economista e Professor do Insper e da USP. No princípio, ele ficou meio revoltado com os 5 minutos que eu lhe dei aqui, mas já o liberei.
V.Sa. tem a palavra. (Pausa.)
O SR. NAERCIO AQUINO MENEZES FILHO - Muito obrigado pelo convite. É um prazer e uma honra estar aqui na Comissão.
Meu nome é Naercio. Eu sou professor de Economia do Insper, da USP e da Academia Brasileira de Ciências. Quero parabenizar o Ministro pela brilhante apresentação. Acho que ele já deixou claro muitos aspectos importantes da primeira infância. Eu só vou complementar com alguns outros resultados, que acho que são importantes para dar um quadro geral da primeira infância no Brasil.
(Segue-se exibição de imagens.)
Primeiro vou resgatar um pouco a história do investimento em educação, o que nós não fizemos no passado. Ao longo do século XX, os senhores podem ver aqui que a taxa de analfabetismo, por exemplo, sempre foi bem mais alta no Brasil do que em outros países do mundo. Em 1950, havia 50% de analfabetos em comparação com um número bem menor de analfabetos na Espanha, na Argentina e nos Estados Unidos. Isso gerou imensos problemas, os quais enfrentamos até hoje. O fato de não termos colocado todas as crianças na escola ao longo do século XX causou prejuízos muito grandes.
Mas a educação melhorou bastante desde 1992. Como os senhores devem saber, um jovem de 22 anos, em 1992, tinha só 6 anos de estudo, ou seja, o equivalente ao ensino fundamental, primeiro ciclo. Hoje em dia, ele tem 11 anos de estudo, no ensino médio. Então, houve um grande avanço educacional no Brasil nos últimos 20 anos, o que reverteu um pouco o atraso histórico que tivemos em educação. No entanto, não houve aumento de produtividade.
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Nesse gráfico, nós vemos o Brasil em azul. Aqui, no eixo horizontal, temos os anos de estudo e, no eixo vertical, a produtividade. Nós dobramos a produtividade, de 1965 a 1980, que foi a época do milagre econômico, sem investir em educação. De 1980 a 2010, como eu mostrei, a educação melhorou muito, mas a produtividade não aumentou. A produtividade da economia hoje continua a mesma que tínhamos 30 anos atrás. Se olharmos a Coreia, que está em vermelho no gráfico, verificaremos que aquele país foi aumentando a educação e a produtividade ao longo do tempo.
A grande questão que se coloca é esta: se nós avançamos tanto em termos de acesso à educação, por que a produtividade da nossa economia está parada há 30 anos? Sem melhorar a produtividade, não é possível haver crescimento econômico no longo prazo, não é possível melhorar a vida das pessoas ao longo das gerações. O país vai ficar estagnado. E é o que tem acontecido há mais ou menos 30 anos.
Quais as razões disso? Primeiro, o aprendizado dos alunos é muito baixo. Se olharmos o PISA, que é um exame internacional que avalia alunos do mundo inteiro aos 15 anos de idade, vemos que 70% dos jovens no Brasil têm um desempenho abaixo do básico. O Brasil está em verde, no gráfico. Se formos comparar, no México a taxa é de 60%; no Chile é de 50%. Mas, nos países da OCDE, somente 20% dos jovens têm desempenho abaixo do básico. Nos países como Coreia, França e Canadá, o valor é mais próximo de 10%. Portanto, esse é um grande problema. Os nossos jovens aprendem muito pouco na escola. Na verdade, isso acontece tanto nas escolas públicas como nas privadas. Setenta por cento abaixo do básico é um número muito elevado.
Além disso, como foi falado, temos uma alta porcentagem de jovens que não estudam nem trabalham. Atualmente, em torno de 17% dos nossos jovens de 14 a 24 anos nem estudam nem trabalham.
Para complementar, eu queria só mostrar o estudo que eu fiz do PISA, sobre o desempenho dos jovens ao longo da prova do PISA. A prova do PISA foi feita em computador e foi possível acompanhar, ao longo da prova, o desempenho de todos os alunos de todos os países. Nós fizemos isso, e o resultado é impressionante. Enquanto Finlândia e Coreia acertam entre 50% e 60% ao longo de toda a prova — aqui o eixo é ao longo da prova —, os brasileiros vão diminuindo a taxa de acerto ao longo da prova. Depois há um intervalo, melhora um pouco, e depois cai novamente. Isso reflete uma falta de persistência, de garra e de resiliência por parte dos alunos brasileiros.
Se olharmos esse outro gráfico, veremos que ele também mostra isso. Esta é a porcentagem de alunos que não abre a questão. Começa com zero no começo da prova. Quando todos abrem, o número vai aumentando rapidamente. Na metade da prova, 60% dos alunos nem abrem a prova para fazer, não abrem a questão. Portanto, o nosso desempenho péssimo no PISA parece estar refletindo o fato de que os alunos nem tentam responder às questões. Eles vão desistindo da prova, à medida que o tempo vai passando. No gráfico, há um break. A porcentagem diminui, depois vai aumentando novamente. Um amigo meu sugeriu que se façam mais breaks (risos), assim a prova vai melhorando ao longo do tempo.
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Esta figura e a que apresentei sobre o PISA mostram que parecer haver um problema grave de aprendizado, e parece que esse problema pode estar relacionado com a falta de resiliência, de garra para ir até o fim da prova.
No Brasil, o que tem acontecido? Os gastos com educação têm aumentado muito — os gastos no ensino fundamental triplicaram e no ensino médio também triplicaram —, o que foi importante para colocar os alunos na escola, mas a proficiência não melhorou. Melhorou no quinto ano, quando houve aumento de aprendizado dos alunos. No nono ano, houve um aumento menor, mas, no terceiro ano do ensino médio, a proficiência está parada. Então, apesar de termos gastado mais por aluno, o aprendizado não está melhorando.
E todas essas questões, a meu ver, baixo aprendizado, baixa persistência e baixa proficiência, têm a ver com o desenvolvimento infantil. Como foi muito bem colocado pelo Ministro, os problemas na infância acabam gerando problemas de desenvolvimento e dificuldades de aprendizagem, que vão se acumulando ao longo da vida. Então, é muito importante atacar essa questão da primeira infância, para que seja possível resolver esses problemas.
Na verdade, como princípio, nós deveríamos ter igualdade de oportunidades. Todas as crianças que nascem no Brasil deveriam ter as mesmas oportunidades, não importando onde elas nascessem, de que cor, de que raça, de que região são. Todas deveriam poder atingir seus sonhos e suas metas. Isso não acontece porque desde a primeira infância o tratamento é bastante diferenciado em todas as regiões, dependendo da situação da família.
Isso já foi falado pelo Ministro, não vou repetir.
Eu queria só falar um pouco da Loteria da Vida. São dados de Pelotas. Há acompanhamento das crianças desde o nascimento até os 22 anos de idade. Nós vemos que, dessas crianças, 28% das nascidas em 1993 nasceram de mães com baixa escolaridade; e de 8%, as mães tinham o ensino superior. Portanto, é a loteria da vida, porque não é mérito, não é nada: é sorte ou azar. Você pode nascer, e sua mãe ter ensino superior; ou você pode nascer, e sua mãe ser analfabeta. Se houvesse igualdade de oportunidades, o fato de você ter nascido e sua mãe ser analfabeta ou ter ensino superior não deveria importar para o seu desenvolvimento emocional, seu aprendizado e suas chances na vida. Mas no Brasil, como não há igualdade de oportunidades, isso é completamente relevante.
Nós vemos, por exemplo, que as mães com ensino superior faziam mais exames pré-natais do que as analfabetas, fumavam menos do que as analfabetas. Isso começa já na gestação. Depois, aos 15 anos, dos filhos de mães com ensino superior, só 18% repetiam o ano; dos filhos de mães analfabetos, 81% repetiam o ano. E, se formos olhar quem está na faculdade, isso é mais impressionante. Os que tiveram sorte de nascer de mães com ensino superior, metade já estava na faculdade aos 18 anos, ao passo que, dos que nasceram de mães analfabetas, só 2% estavam na faculdade. É uma diferença enorme de perspectivas na vida, porque as condições iniciais eram muito diferentes, e o Brasil é um país extremamente rígido, com pouca mobilidade intergeracional e pouca mobilidade de renda. As diferenças iniciais têm um impacto muito forte para o resto da vida. Se olharmos a situação atual, no Brasil, temos 5% de pessoas na pobreza extrema; no Nordeste, 11%. Mas, nos domicílios com crianças, no Nordeste, 22% está na pobreza extrema atualmente. De crianças de 0 a 6 anos, 22% delas moram em domicílio de famílias extremamente pobres na Região Nordeste; na Região Norte, 16% e, no Brasil por inteiro, 12%. Essas crianças dessas famílias de renda familiar per capita de até 100 reais dificilmente vão ter condições de atingir seus objetivos na vida, se não houver programas como o programa de visitação, programas bem sucedidos que atenuem essas diferenças que existem hoje em dia.
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Essa pobreza é não extrema, a pobreza de renda de até 400 reais por mês. Vemos, por exemplo, que no Maranhão 70% das famílias têm renda de até 400 reais per capita por mês. Os níveis de pobreza ainda são bastante elevados, e isso vai ter consequências muito grandes daqui para frente.
Para terminar, falamos do saneamento básico, que é uma coisa básica. Cerca de 39% das crianças moram em domicílios que não têm esgotamento sanitário por rede coletora; 22% têm ao menos uma inadequação nas condições de moradia, ou paredes externas com materiais não duráveis, ou adensamento excessivo. Enfim, 58% das crianças moram em domicílios que têm pelo menos uma restrição grave: ou não têm acesso a programas de proteção social, ou as condições de moradia são inadequadas, ou não têm saneamento. Basicamente, metade das crianças está nesses domicílios com pelo menos uma inadequação grave.
Quando vemos a importância da primeira infância para o futuro, se metade das crianças está numa situação inadequada, ficamos pensando como vai ser o futuro dessas crianças.
Esse gráfico representa dados que variam muito entre as regiões. No Norte e no Nordeste, é bem forte, com índices de 36% e 24%, respectivamente.
Passamos à conclusão.
Cometemos um erro histórico na educação, não termos investido na educação ao longo do séc. XX. Isso tornou a sociedade extremamente desigual, com baixa mobilidade, alta criminalidade e alto índice de pobreza. Recentemente, melhoramos o acesso à educação, mas não houve efeito na produtividade. E isso parece refletir em baixas habilidades socioemocionais e no aprendizado na educação. E muito disso decorre da falta de investimento na primeira infância. É um reflexo da situação da pobreza, que ainda é muito alta no Brasil, e afeta o desenvolvimento infantil. É necessário melhorar o desenvolvimento das crianças, para que tenhamos aumento da persistência desses jovens, da garra, da qualidade do aprendizado, e eles possam se inserir no mercado de trabalho formal e ganhar dinheiro e aumentar a mobilidade de renda no Brasil, que é muito baixa.
Obrigado. (Palmas.)
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O SR. PRESIDENTE (Dra. Soraya Manato. PSL - ES) - Quero agradecer ao Sr. Naercio Aquino Menezes Filho a fantástica exposição.
Agora, para fazer uso da palavra, vou chamar o Sr. Alexandre Fineas Lima e Sousa, Coordenador-Geral de Políticas Sociais e Transversais, da SECAP.
O SR. ALEXANDRE FINEAS LIMA E SOUSA - Bom dia a todos!
Eu gostaria de agradecer a presença nesta ilustre Comissão. Agradecer à Exma. Sra. Deputada, a qual cumprimento, e também agradeço a todos os demais Parlamentares.
Vou tratar de um assunto que, na verdade, é como todas as políticas públicas do Governo, dentro do período de 2020 a 2023, vão ser estruturadas. É como se pensássemos qual seria o regimento para o funcionamento dessas políticas.
(Segue-se exibição de imagens.)
O que pretendemos com o Plano Plurianual para esses anos de 2020 a 2023? Nosso lema é planejar, priorizar e alcançar.
Para quem não conhece a organização do nosso Ministério da Economia, lembro que nós estamos dentro da Secretaria Especial de Fazenda; somos a Secretaria de Avaliação, Planejamento, Energia e Loteria; temos mais quatro Subsecretarias. A Subsecretaria à qual eu pertenço é a Subsecretaria de Planejamento Governamental. E temos outras duas Subsecretarias, que são Subsecretarias de Avaliação.
Uma grande vantagem que nós temos nesse período é que o planejamento já surge dentro dessa caixinha de avaliação. Nós vamos fazer um planejamento já pensando em como vamos avaliar bem as políticas.
Estes são os fundamentos legais que estão presentes na Constituição sobre o Plano Plurianual.
O § 1º do art. 165 diz:
Art. 165.......................................................................
§ 1º A lei que instituir o plano plurianual estabelecerá, de forma regionalizada, as diretrizes, objetivos e metas da administração pública federal para as despesas de capital e outras delas decorrentes e para as relativas aos programas de duração continuada.
Então, na verdade, englobamos praticamente todas as despesas, com exceção daquelas despesas financeiras.
No processo de elaboração, reparem que temos um tiro curto para fazer todo o processo. Começamos em janeiro já com a reestruturação do Ministério da Economia. Em fevereiro, fizemos uma oficina, convocando especialistas nacionais para pensar quais seriam as diretrizes. E essas diretrizes foram baseadas no plano de Governo e também nos discursos dos Ministros.
Em março, fizemos apresentações na ENAP — Escola Nacional de Administração Pública sobre a metodologia, que foi apresentada em áreas técnicas, inclusive para o IPEA — Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. Participou também o BNDES — Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social nesse nosso processo.
Em maio, começamos as oficinas. Fizemos mil horas de trabalho. Essas mil horas foram divididas em 54 oficinas na ENAP. Disponibilizamos também um curso de EaD. Diversas pessoas de qualquer parte do País tiveram acesso à nossa metodologia.
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Em junho foi disponibilizado o nosso Manual Técnico do Plano Plurianual e também foi feita uma participação eletrônica pelo Wikilegis, com mais de 2 mil participações.
Em junho, julho e agosto tivemos essa fase qualitativa e quantitativa, fase em que os Ministérios inserem dentro do SIOP — Sistema Integrado de Planejamento e Orçamento todo o debate que foi feito nessas 54 oficinas e mais as oficinas internas ministeriais.
Em agosto, enviamos essa minuta de Exposição de Motivos, a Minuta do Projeto de Lei, junto com a Mensagem Presidencial.
A metodologia, a nossa regra de convívio, digamos, dentro do PPA, baseou-se em algumas críticas e observações que foram feitas nos PPAs anteriores. Trouxe algumas delas feitas pelo TCU.
No PPA 2012-2015 — vou ler rapidamente —, houve:
Elevado índice de falhas na apuração de resultados relativos às metas; fragilidade no modelo de PPA, bem como dos atributos definidos para o plano; falta de regionalização das programações do PPA; má formulação de indicadores e metas, que não medem aquilo que foi proposto; representação inadequada, pelos programas, das necessidades do país; inefetividade do PPA como instrumento de planejamento das organizações governamentais; dificuldade de coordenação entre planos e entre órgãos centrais e setoriais.
Quando chegamos ao PPA de 2016-2019, vemos que tentaram superar essas críticas, e outras foram apresentadas, como as "falhas na confiabilidade e qualidade de parcela significativa das informações e desempenho (...) referentes às metas previstas no Plano Plurianual; ausência de divulgação dos parâmetros anuais utilizados pelos órgãos responsáveis para acompanhar, qualificar e prestar contas sobre o andamento das metas quadrienais definidas no PPA".
Esse conjunto de críticas, nós o incorporamos na nossa metodologia, em como vamos fazer o PPA para esses próximos 4 anos. Baseados nisso, pensamos em quatro pilares fundamentais para o nosso PPA.
Simplicidade metodológica.
O PPA anterior tinha 54 programas temáticos, 304 objetivos, 542 indicadores, 1.136 metas, 3.101 iniciativas. Agora o que temos? Doze diretrizes, 15 temas, entre 60 e 70 programas, objetivos, metas e indicadores. Com essa simplificação, no fundo, o que fizemos? Para responder, aproveito a palestra do Ministro. Nós separamos a caixinha de cada planejamento dentro do Governo para permitir que cada caixinha dessas pudesse ter a sua potencialidade explorada e que se pudesse fazer a comunicação de uma com a outra e criássemos essa questão da rede. Temos uma explicação brilhante, falando sobre como as redes neurais funcionam. No fundo, o que fizemos foi dividir e dizer: cada nível de planejamento vai ter a sua especificidade, vai ser separado. O que acontecia com esses 54 programas nesse PPA anterior? Cinquenta e quatro programas temáticos, 34 objetivos, 542 indicadores, 1.136 metas, 3.101 iniciativas. O que acontecia é que o PPA pretendia ser tanto um planejamento de 4 anos como um planejamento institucional. O que fizemos foi exatamente separar essas coisas, deixar cada qual no seu lugar. Realismo fiscal.
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É o primeiro PPA feito sob a égide da Emenda Constitucional nº 95, que criou o teto de gastos. Foi uma realidade que trouxemos para o PPA. Os PPAs anteriores tinham uma tendência: quando se previa uma receita para o PPA, vários programas podiam se encaixar. Aqui não, aqui entregamos o envelope inicial, uma realidade fiscal, uma realidade orçamentária, para que fosse construído o PPA.
Integração do planejamento e avaliação.
Como falei anteriormente, a nossa Subsecretaria é de avaliação e planejamento, portanto já saímos com esse DNA marcado. O planejamento já vem com a ótica de avaliação, para que o nosso ciclo orçamentário possa realmente ser completo. Nesse ambiente de escassez de recursos — como vimos, há pouco, há um programa de primeira infância extremamente relevante, mas com poucos recursos —, podemos, via avaliação, realocar as prioridades do Governo, as prioridades de Nação.
Visão Estratégica e Foco em Resultados.
Este é o quarto pilar. Quando chegamos ao começo deste ano, reparamos que as pessoas que nos passaram o bastão estavam ainda nessa ótica de tentar fazer um PPA que desse conta de muita coisa. O que percebemos é que, dada a nossa sinergia de organização, poderíamos fazer um PPA que tivesse visão estratégica e foco no resultado, um PPA mais enxuto, mas que nada perdesse, em que essa simplicidade não se revelasse algo simplório. Não, é algo extremamente denso, que dá uma visão de médio prazo, até um pouco mais, para que os planejamentos estratégicos ficassem acoplados. Vou explicar mais à frente.
Aqui está a nossa visão geral da metodologia. Como expliquei, fizemos uma separação de como as dimensões estratégicas vão ser estruturadas dentro do PPA. Temos, lá em cima, três dimensões: dimensão estratégica, dimensão tática e dimensão operacional. Essa estrutura das dimensões do PPA faz com que lá em cima tenhamos os eixos estratégicos, que serão a conexão com o planejamento de longo prazo — de 12 anos, 15 anos, 16 anos —, que, inclusive, ainda vai ser regulamentado. A partir desses eixos estratégicos, temos diretrizes do PPA, como se fossem metas de governo para os 4 anos. Descendo as diretrizes, temos temas; dos temas, temos os programas.
Aqui já entramos na dimensão tática. O programa é o grande elo entre a dimensão estratégica, de médio e longo prazo, e a dimensão operacional. Vamos ficar com esse PPA mais estratégico, enxuto, para que ele dê condição de que o orçamento, o planejamento estratégico institucional, consiga dar conta da realidade que queremos mudar ao final do PPA.
São 13 diretrizes, 15 temas, 66 programas.
Na estrutura do nosso PL, temos 5 capítulos.
O primeiro fala Do Planejamento Governamental e do Plano Plurianual. Aqui trazemos alguns conceitos, porque ainda não temos uma lei de finanças que estabeleça como o PPA tem que ser estruturado. A cada novo PPA temos, digamos, a possibilidade de alteração. A nossa expectativa é que nosso PPA agora consiga dar um pouco de luz a essa discussão e consigamos regulamentar o dispositivo constitucional que fala sobre o PPA. Portanto, trazemos alguns conceitos que podem ser que até extrapolem o âmbito do PPA, mas, na verdade, são conceitos que faltam dentro do ordenamento jurídico.
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Capítulo II, Da Estrutura da Organização do Plano Plurianual; neste ponto, refletimos mais ou menos aquela transparência anteriormente apresentada.
O Capítulo III, Da Integração com o Orçamento, foi um grande desafio que tínhamos: exatamente para fazer com que o Planejamento e o Orçamento conversassem entre si.
O Capítulo IV fala Da Governança do Plano Plurianual e o Capítulo V, Das Disposições Gerais.
Apresento essa imagem para que se entenda como essas caixinhas vão se comunicar entre si. Como eu falei, fizemos essa separação. Aqui está uma área cognitiva, ali está uma área de visão, lá está uma área auditiva. Separamos essas áreas, mas elas são conectadas entre si.
Temos um planejamento governamental e um planejamento ministerial, na ótica do PPA. Como mostrei anteriormente, dentro desse planejamento governamental há eixos, diretrizes, temas; e há os programas. Esses programas fazem elo com o orçamento.
OSU é uma sigla que usamos para Orçamento de Subsídios da União. Esse foi um trabalho que a Secretaria anterior, da qual surgiu a Secretaria de que faço parte, formulou, apresentando todos os subsídios da União — gastos tributários, benefícios creditícios e financeiros. Todos eles estão dentro do PPA neste ano. Vocês vão ter oportunidade de ver que, em cada programa, há uma linha, há um espaço de gastos, recursos não orçamentários, que também fazem parte, são recursos que ajudam a financiar as políticas públicas. Isso tem que ser levado em consideração.
Este é o Planejamento Estratégico Institucional. Na visão estratégica ministerial, ele traça a missão, a visão e os valores do Ministério, que são divididos em objetivos diferentes, dentro do Ministério. O PPA anterior pegava parte desses objetivos e colocava aqui dentro. Nós separamos, deixamos isso no nível gerencial, para dar mais flexibilidade à gestão, inclusive para traçar projetos que possam ser, com o tempo, modificados com uma velocidade mais rápida.
Uma das vantagens que podemos encontrar no PPA 2020-2023 foi a estruturação dos programas por meio do modelo lógico. No fundo, o que isso quer dizer? A apresentação do Ministro é a possibilidade de olhar para a realidade, de pensar quais são as causas críticas ou quais são as evidências daquela realidade ou daquele problema — no caso, o desenvolvimento da primeira infância — e o que temos que fazer para modificar essa realidade. Construímos o PPA dessa forma, olhando para causas críticas, para um problema, e traçando um objetivo, o resultado a que se quer chegar. Acreditamos que, com esse resultado, podemos gerar impactos na sociedade.
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Por isso, temos no DNA o planejamento junto com a avaliação, porque, quando utilizamos esse modelo lógico, no fundo estamos dizendo o seguinte: "Olha, eu acredito que isso aconteça, mas, quando começar a rodar, está acontecendo? Por que não aconteceu?" Esse modelo lógico nos permite avaliar as políticas públicas, avaliar melhor os programas.
Tento explicar melhor. Há causas críticas, temos um recurso, dentro da realidade fiscal que temos. Realmente, muitos programas decaem em quantidade de recursos nos próximos 4 anos, por conta da realidade fiscal que temos. Aqui pensamos nas ações que esses recursos podem financiar, que vão gerar produtos, com seus resultados intermediários. Esse núcleo é exatamente o núcleo do Planejamento Estratégico Institucional. O Ministério olha para o objetivo, olha para a meta do PPA e constrói todo o planejamento estratégico institucional de tal forma que tais produtos possam gerar esse resultado final com os impactos esperados da política.
Nesta imagem, para finalizar, um grande instrumento de implementação que o PPA já está prevendo é exatamente o Contrato de Desempenho. Vejam que coisa interessante que abrimos como possibilidade para esses próximos 4 anos! Aqui podemos imaginar que, quando encaminhamos o PPA para o Congresso Nacional, está havendo uma pactuação do Congresso com o Poder Executivo, da sociedade com o Poder Executivo. E quais são os elementos pactuados? Eixos, diretrizes, temas, e os programas — dentro do programa, está a ação.
No entanto, como pactuamos o desempenho? Eu acho que esta é uma grande questão para trazermos para este Parlamento. Como os Ministros pactuam com os órgãos? Ou como os órgãos e os Ministros pactuam com os entes federativos? Em outras palavras, como o meu Planejamento Estratégico Institucional dos Ministérios é contratado em relação ao desempenho?
O nosso PPA, no art. 12 da proposta, traz a possibilidade do Contrato de Desempenho. Eu sei que está sendo discutida nesta Casa a regulamentação, se eu não me engano, do art. 37, § 8º, da Constituição, que trata da autonomia da gestão orçamentária e financeira, que pode ser ampliada por meio do Contrato de Desempenho, mediante metas estabelecidas.
Com isso, queremos apenas mostrar para vocês a possibilidade que há neste PPA de conseguirmos criar um grande instrumento de implementação para o nosso Plano Plurianual.
Era o que tinha a dizer.
Agradeço a todos. Obrigado! (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Dra. Soraya Manato. PSL - ES) - Obrigada, Sr. Alexandre.
Vamos passar agora a palavra para a Sra. Claudia Vidigal, ex-Presidente do CONANDA — Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, fundadora do Instituto Fazendo História, atual representante da Fundação Bernard van Leer no Brasil.
A SRA. CLAUDIA VIDIGAL - Muito obrigada, Deputada. Agradeço a todos a presença.
A senhora me apresentou um pouquinho, e eu gostaria de me apresentar um pouco mais. Eu gostaria de iniciar lembrando a importância de a sociedade também participar nesse processo.
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Eu represento aqui a Rede Nacional da Primeira Infância também, faço parte dessa Rede. É uma Rede com mais de 200 organizações que trabalham com a primeira infância. É um orgulho poder estar aqui também pela Rede.
Neste momento, eu represento a Fundação van Leer. A Fundação Bernard van Leer é uma fundação holandesa que existe há 70 anos, e há 50 anos atua com a missão de investir na primeira infância ao redor do mundo. E essa missão só se fortalece nos últimos anos.
(Segue-se exibição de imagens.)
Eu falava que a missão da van Leer só se fortalece nos últimos anos, conforme os argumentos que já foram trazidos na apresentação do Ministro e na apresentação do Naercio. Realmente, são argumentos científicos, argumentos indiscutíveis, mas também argumentos humanos e argumentos outros tantos. O que eu queria trazer são outros argumentos, além dos que já foram apresentados.
Hoje, se fôssemos sistematizar a conversa que tivemos aqui, o argumento científico de toda a apresentação do Ministro é que os primeiros mil dias de vida são quando o cérebro se desenvolve e a maioria das sinapses ocorrem. Investir em cuidadores para que ofereçam ambientes seguros, responsivos e estimulantes é assegurar um bom começo.
A Fundação Bernard van Leer tem como missão um bom começo para todos. O que vamos buscar aqui como argumento científico é isto: se queremos começar direito, começamos pelo começo. Quanto mais cedo, melhor.
Depois temos o argumento econômico. Há diversas pesquisas. O Naercio trouxe uma apresentação brilhante, falando mais do eixo de educação. Enfim, o argumento econômico tem um ponto principal: investir nos primeiros anos de vida traz o retorno mais alto, mais duradouro e mais eficiente do que em qualquer outro momento do ciclo de vida. Estou correta, Naercio? Este seria o argumento econômico.
O argumento da equidade, que também já apareceu e aparece em muitos estudos científicos — eles se misturam, como vemos, o econômico também é científico, o científico da neurociência também é econômico —, é que o investimento no começo da vida evita o surgimento de grandes desigualdades logo no começo da vida. Que as crianças cheguem à escola no mesmo patamar. Como exemplo, colocamos o número de palavras faladas, conforme o Ministro já mencionou. Esse número é muito diferente em relação a uma criança de classe média e a uma criança mais vulnerável. Como resultado, as crianças pobres se beneficiam mais com as intervenções na primeira infância, o dobro. Estudo da UNICEF comprovou que 1 bilhão de dólares investido em crianças mais pobres, mais vulneráveis, reverte duplamente, se comparado com o investido na classe média. De fato, precisamos investir nas crianças pequenas e nas mais vulneráveis, se queremos um resultado mais eficiente, de fato.
Por fim, há os benefícios de curto, médio e longo prazos, que já foram apresentados hoje aqui. Não vou repetir. Vou pular alguns aspectos, pois acho que deles já falamos bastante. Irei para outros com que talvez eu possa ainda complementar.
Esta imagem, o Ministro a apresentou também. Mostra o cérebro de uma criança recém-nascida, depois no primeiro mês, aos 9 meses, aos 2 anos e adulto. De 2 anos até a idade adulta, podemos ver que há uma diferença bastante pequena. O que acontece é que a grande maioria dos caminhos já foram trilhados naqueles primeiros 2 anos, e eles tendem a se repetir. É como se estivéssemos em um gramado no campo de futebol. No começo, é só um gramadinho, não faz diferença por onde se vai andando; tem o lado ruim, o lado bom, e todas as coisas vão acontecendo. Contudo, com o tempo, com aquele emaranhado de possibilidades, as trilhas mais usadas é que vão se fixando, e as menos usadas vão sendo deixadas de lado. Ou seja, o cérebro vai criando uma arquitetura de trilhas que ele vai acessar com mais facilidade, que podem ser trilhas boas ou trilhas ruins. É uma arquitetura que favorece um tipo de comportamento, um tipo de atitude no mundo, que realmente é construído nesse início da vida.
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Nesta imagem se vê uma trilha de comportamentos que vão se repetindo, pela ansiedade, egoísmo, impulsividade. Se vivenciarmos essas experiências muitas vezes, como a falta de responsividade e a apatia, são essas trilhas que vão sendo acionadas depois com maior facilidade. Contudo, podemos também fortalecer as outras trilhas, como as de autoconfiança, empatia e autocontrole.
De fato, nesses primeiros 2 anos de vida, nós não só estamos construindo todas as conexões, mas também estamos construindo as trilhas, os caminhos que vão ser acessados com maior facilidade. Por isso, a importância do cuidado com a primeira infância.
É claro, nós não vamos ser deterministas e achar que isso nunca poderá ser alterado. Isso pode ser alterado, mas é como construir uma trilha num campo de futebol, com grama baixinha, ou no meio de uma floresta. Depois, quando a floresta já está crescida, dá mais trabalho, exige mais esforço e, portanto, mais investimento também. Então, se queremos fazer direito, precisamos começar pelo começo.
Nós já sabemos que os bebês precisam de interação emocional e social, precisam de ambientes seguros e estimulantes, precisam de nutrição adequada. Para isso, temos uma gama de serviços. Por que nós falamos da intersetorialidade o tempo todo na primeira infância? Porque, de fato, a criança não precisa só do leite materno, não precisa só da vacinação, não precisa só da creche, não precisa só da cidade como um ambiente favorável. Ela precisa de uma composição de oportunidades para o seu desenvolvimento, que é intersetorial por si só. Por isso, a tentativa e busca pela intersetorialidade, o que não é algo fácil. É algo que costuma ocorrer muito mais no território mesmo, quando o agente de saúde pode encaminhar para um outro serviço de educação, quando dentro da creche nós temos um olhar mais atento para a questão da vacinação, que inclusive é um ponto de atenção. Como aumentarmos os índices de vacinação que estão caindo? A intersetorialidade está aí para isso. Às vezes, é na creche ou em uma frequência em algum outro serviço que vamos encaminhar para outra demanda. Portanto, essa intersetorialidade é fundamental.
Daí a dificuldade de se pensar o orçamento da primeira infância. Pouquíssimos países no mundo conseguiram construir um orçamento de primeira infância. É muito difícil realmente determinar onde está o orçamento da primeira infância dentro do SUS ou dentro da educação.
Nós temos como pinçar algumas coisas dessas e olhar com mais atenção para isso. Basta vermos o art. 227 da Constituição Federal, que coloca a criança como prioridade absoluta.
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Como podemos planejar todas as políticas da nossa Nação, como projeto de País, de Nação, a partir do art. 227, com ênfase especial nesses conhecimentos que estamos adquirindo? Por exemplo, se pensarmos na saúde, nós temos políticas direcionadas à primeira infância, ao aleitamento materno, ao banco de leite, às questões da vacinação. Essas todas são as políticas que temos de priorizar dentro do SUS, por exemplo. E com a nutrição ocorre a mesma coisa. Cito também a questão das creches, de que vamos falar um pouquinho agora.
Vamos pensar num bebê chorando, porque a fralda dele precisa ser trocada. Ele está com fome, está cansado, está assustado, porque ninguém vem ajudá-lo. Essa experiência vai trilhando a experiência, o caminho ruim. Vamos pensar num outro bebê que está rindo, está satisfeito, está brincando, está participando do mundo atentamente e conseguindo brincar com os coleguinhas. Tudo isso vai criando as trilhas mais favoráveis. Isso não quer dizer que não há uma diferença genética que possa constituí-los. Não é que todo mundo é igual a uma tábua branca, em que nós estabelecemos as políticas a partir dessa tábua branca. Há diferenças, sim, mas até que lugar cada um pode atingir? Nós não estamos pensando em criar todos idênticos a partir das possibilidades, mas, sim, que cada um possa atingir o seu pleno potencial.
Essencialmente, o que as crianças precisam é de cuidadores que sejam receptivos, responsivos, e de interação emocional, como nós falamos. Quem são esses cuidadores primordialmente? Nós sabemos quem são os cuidadores primordialmente. Nós falamos que são os pais, e sabemos que as mães estão mais à frente. Mas esta também é uma questão para pensarmos: os pais poderiam estar cada vez mais presentes. São com os pais que a maioria das crianças pequenas — refiro-me aos primeiros mil dias, até os 3 anos de idade, no comecinho da vida mesmo — passa a maior parte do seu tempo. O investimento na primeira infância deve facilitar e complementar o trabalho dos pais. O nosso trabalho é ajudar o trabalho deles a ser melhor.
Para definir como investir nesse processo, é importante identificar o que pode dificultar esse trabalho. Se olharmos para a primeira infância e entendermos que a nossa função é colaborar com os pais para melhor exercerem sua função, começaremos a ter um norte sobre quais são as políticas públicas e investimento que podemos fazer para que cada criança atinja seu pleno potencial.
Os pais podem não saber o que têm de fazer, por exemplo. Muitas vezes eles não têm esse conhecimento. Eles precisam se conscientizar da importância desse começo da vida, precisam saber um pouco mais sobre os cuidados relacionados à saúde e à nutrição, mas também dar mais amor, mais carinho, chances de brincar, explorar. Precisa ler com os bebês, cantar, conversar. Isso é o que o Criança Feliz buscar fazer, e não apenas ensinar o que precisa ser feito, mas em alguns momentos ajudar essa família a identificar o valor do que ela tem ali, fazê-la entender a importância daquelas histórias que ela tem para contar, daquela musiquinha que ela gosta de cantar. Muitas vezes, uma família muito simples não entende esse valor e acha que o valor vai estar ali, quando a criança for para a creche ou para a escola. Ela não percebe a importância dessa interação.
Um visitador que bate na casa, valoriza, testemunha aquele cuidado e ajuda essa mãe a entender a importância dos seus atos tem um valor inestimável para experiência dessa dupla mãe e filho.
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Eu estou terminando.
Ser pai e ser mãe é difícil. Os pais podem estar estressados e com pouco tempo. Eu pus ali a falta de tempo como um fator bastante determinante que impede uma mãe e um pai de bem cuidar dos seus filhos. É fato. É falta de tempo porque ela tem de cuidar dos trabalhos domésticos, ou ela trabalha fora de casa, ou ela precisa trabalhar fora de casa, mas, ao mesmo tempo, não há creche e não sabe como faz. Então, deixa com o irmão mais velho. Vejam, nós estamos colocando todos em situação de risco.
Então, há falta de tempo da mãe. Como nós criamos estratégias para que essa mãe tenha mais tempo? Há diversas, a creche é uma delas.
É claro que a creche é um direito da criança também, mas é um direito da família. É importante que a mãe possa ter parceiros no cuidado do filho, para que ela não se sinta cada vez mais isolada na sua casa e, com isso, acabe entrando num lugar de depressão, de falta de interatividade. Aí, sim, haverá um problema de saúde mental que vai impedi-la de cuidar bem do seu filho.
Então, há a questão do tempo, a questão do conhecimento e, por fim, não menos importante e talvez mais relevante para essa nossa conversa, a falta de serviços básicos.
Nós estamos falando dos postos de saúde, nós estamos falando de CRAS, nós estamos de CREAS, nós estamos falando do Criança Feliz chegando a mais famílias, com programa de visitação. E é claro, como não falar das creches. É essencial, toda criança tem o direito à educação de qualidade.
Nós sabemos que a cobertura nacional está em cerca de 30%. Há números divergentes, mas ela é próxima a 30%. Esta é a nossa realidade. Nós já colocamos a meta de 50%. Nós já não atingimos a meta de 50%. Nós sabemos quão difícil é atingir esta meta, e não desistimos.
Precisamos continuar seguindo, para que tenhamos mais creches e maior cobertura, mas também e simultaneamente investir em outros programas enquanto essas famílias não têm a possibilidade de ter seus filhos nas creches. Então, não é uma coisa ou outra. É uma coisa e outra.
Assegurar, dentro do FUNDEB, o recurso necessário para que sejam abertas vagas com qualidade é fundamental. Existe um fundo. Como nós trabalhamos dentro deste fundo, dentro do FUNDEB, para ampliar o orçamento de primeira infância?
Na verdade, devemos fazer um orçamento realista que olhe para o valor de cada vaga e tenha um valor que seja real. Enquanto nós colocarmos o valor de cada vaga muito baixo, muitos Municípios acabarão desistindo de abrir essa vaga. "Bom, é tão baixo, que deixa eu esperar um pouco essa criança crescer que ela entra na educação formal e é melhor" ou, o que pode ser pior: "Vamos abrir vagas ruins mesmo, vamos fazer creche bem ruim, mas nós temos pelo menos um lugar".
Isso pode causar na verdade um resultado reverso. Nós sabemos que a política das creches de má qualidade podem causar um resultado reverso.
Então, vou terminar, apresentando, em uma frase só, três casos, ao redor de mundo, de investimentos simples na primeira infância, mas que trouxeram resultado bastante eficiente.
Este primeiro é um estudo global, cujas estimativas apontam que a eliminação da desnutrição infantil em um país faz com que haja o crescimento de 1 a 2 pontos percentuais no PIB, simples assim. Vamos trabalhar para eliminar a desnutrição. É claro que não é um dado específico, é uma estimativa. Mas é uma estimativa feita com base em estudos científicos.
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O segundo estudo de caso vem da Índia. Cada 100 dólares gastos em um programa de desparasitação pré-escolar e fortificação de ferro aumentava 2,7 anos de tempo de permanência na escola, ou seja, matar parasita e dar ferro para as crianças fazia com que elas ficassem até 3 anos a mais na escola — 100 dólares.
Este é um exemplo de como os investimentos no desenvolvimento de primeira infância podem levar a benefícios que não são quantificáveis imediatamente. Nós não estamos falando só de matar o parasita. Então, é muito difícil ainda quantificar todos os benefícios que o investimento na primeira infância faz. Nós estamos falando aqui que matávamos parasitas e ganhávamos mais tempo de vida escolar.
Eu acredito que ainda há muitos benefícios que o Naercio vai descobrir daqui a pouco nas pesquisas dele e vai apresentar os gráficos que mostram, quando investimos em primeira infância, como isso pode ser de fato revertido. Coisas que nós ainda nem imaginamos hoje, ou imaginamos, mas não temos dados científicos.
Por fim, o estudo da Jamaica — acho que muitos aqui já o conhecem — é importante, porque nele se baseia o Criança Feliz. Nesse estudo, visitadoras acompanharam famílias muito vulneráveis. Eles puderam comparar longitudinalmente o grupo que recebia as visitas e o grupo que não recebia as visitas. Então, eles tinham dois grupos: um que recebia visitas e um que não recebia visitas, ambos bastante vulneráveis.
O grupo que recebeu visitas teve resultados ainda bastante importantes depois de 20 anos. Um dos principais deles é este: as crianças extremamente desfavorecidas que foram tratadas pelo programa de visitação familiar tinham 25% mais renda como adultos do que as que não receberam o programa. Percebem? Quem foi visitado ganhava 25% a mais.
Isso não quer dizer que a criança do Criança Feliz vai receber 25% a mais. Essa é só uma evidência de um estudo que nos mostra que isso dá certo, traz resultado. Vamos tentar aproveitar essa experiência e pensar em como nós a ampliamos, como nós aprendemos?
Acho que nós ainda estamos aprendendo muito no Criança Feliz, mas nos baseamos em estudos que já foram bem sucedidos.
Por fim, eu só queria trazer aqui o caso de Boa Vista, para fechar mesmo, que parte da perspectiva de uma estratégia da Fundação Bernard van Leer, onde eu trabalho, a Urban95. Nós sabemos que a criança vive e está no território e nós mudamos a vida da criança mesmo quando mudamos ali onde ela está: o território, a cidade. E nós sabemos também que as cidades e os territórios no Brasil muitas vezes dependem do orçamento público federal. Então, as coisas não estão desvinculadas.
Em Boa Vista, o que vem acontecendo é que a primeira infância é priorizada em todas as políticas. Ela é priorizada na hora em que nós pensamos nos abrigos para ônibus, onde nós vamos colocá-los. Se nós temos dinheiro para 150 abrigos de ônibus, mas precisávamos de 300, onde serão os 150 primeiros? Onde há mais crianças pequenas e gestantes, próximos aos postos de saúde, próximos às creches, próximos às unidades aonde as crianças mais circulam.
E não só. Vamos pensar em mobilidade; como faremos assentos preferenciais, como vamos garantir, em todos os lugares, os assentos preferenciais; como faremos o Criança Feliz acontecer, cada vez com mais qualidade; lá existe o programa Família que Acolhe, que são grupos de mães. Então, há uma série de intervenções que vão acontecendo na cidade.
A Prefeita Teresa Surita costuma dizer que é porque ela está buscando ser a capital da primeira infância. Está buscando não, ela está conseguindo.
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Com vontade política e com realmente um bom manejo de dados para definir as prioridades, tanto as evidências científicas das crianças pequenas, de onde elas estão, quanto a vulnerabilidade fazem a diferença para a construção da política.
É um caso bem sucedido que eu convido também os colegas a conhecerem.
Era isso que eu tinha a tratar. Agradeço mais uma vez pela oportunidade e me coloco à disposição para continuar o debate. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Dra. Soraya Manato. PSL - ES) - Obrigada, Claudia. Sua exposição foi fantástica.
Antes de passar a palavra à próxima oradora, quero registrar a presença da Deputada Paula Belmonte.
Concedo a palavra agora para a Sra. Júlia Alves Marinho Rodrigues.
A SRA. JÚLIA ALVES MARINHO RODRIGUES - Bom dia a todos. Eu trabalho aqui na Câmara dos Deputados na Consultoria de Orçamento e já venho assessorando a Comissão e as Deputadas na Frente Parlamentar no estudo deste tema.
Para começar, eu acho que há o reconhecimento de que é muito difícil nós conseguirmos ter olhares específicos a partir das leis orçamentárias. Nós temos uma linguagem própria, todo mundo que está na CMO sabe disso. Às vezes é uma linguagem árida, difícil. É um desafio quando nós tentamos mudar um pouco essa lógica e extrair quanto é gasto com pessoa, com a deficiência, com idosos, com mulheres, com a igualdade racial, é um desafio permanente.
(Segue-se exibição de imagens.)
No caso da questão da criança, do adolescente e da primeira infância, nós já temos um acúmulo. Eu acho que nós temos que valorizar todo o esforço que vem sendo feito pelo Poder Executivo, desde o final dos anos 90 e nos anos 2000, de tentar enxergar e construir uma metodologia para a apuração do Orçamento Criança. Uma parceira do IPEA com o UNICEF, com o Ministério do Planejamento, com o INESC e também com a equipe de consultores do Senado Federal possibilitou que, entre 2002 e 2016, nós tivéssemos um orçamento temático, um orçamento que apurava quanto a União estava gastando com os programas e ações destinados às crianças.
Então, nós temos já um acúmulo que nós podemos aproveitar também para apurar o montante gasto em relação à primeira infância. Muito em função desse esforço federal, nós temos várias experiências também nos Estados e Municípios, que estão desenvolvendo seus mecanismos próprios de apuração e de verificação. Aqui no DF, há uma parceria muito grande do Tribunal de Justiça; no Paraná, o Tribunal de Contas da União também está acompanhando, e são experiências bem interessantes para nós também nos apropriarmos delas para avançar.
Acho que temos que reconhecer o avanço que foi o Marco Legal da Primeira Infância contar com a previsão de que a União deverá informar à sociedade, não só ao Congresso, a soma dos recursos aplicados anualmente no conjunto dos programas e serviços para a primeira infância. Infelizmente, nós, aqui no Congresso, ainda não recebemos nenhuma informação do Poder Executivo sobre esse montante de recursos, mas acho que é um processo que pode ser construído e que pode ser aprimorado.
Eu também gostaria de valorizar e de destacar o esforço que foi feito pela Rede Nacional da Primeira Infância de fazer um levantamento, em 2014, associado ao Plano Nacional. Eles têm um observatório e divulgaram o Orçamento da primeira infância. Então, é mais um acúmulo em que nós podemos nos inspirar também para avançar nesse caminho.
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A minha apresentação vai ser bem rápida, eu acho que todo mundo já está bem cansado. Para o futuro, o que nós temos? Nós temos também mais um avanço. O Fineas está aqui ao meu lado e pode também falar um pouco sobre isto, se achar necessário: a explicitação no Plano Plurianual e na Lei Orçamentária Anual do programa voltado para a primeira infância. Então, nós temos agora um programa específico no Orçamento, na LOA e no PPA com este olhar para essa parcela da população. Eu acho que este é um avanço bem importante. É o Programa 5024, se alguém quiser pesquisar nos documentos. Ele tem, como o Ministro já havia colocado mais cedo, uma previsão de 524 milhões para o próximo ano, e depois um conjunto de 1 bilhão de reais para os 3 anos seguintes.
O que nós achamos que pode ser uma contribuição do Congresso também para o aprimoramento do programa é discutir a compatibilização dos valores orçamentários que foram previstos, com as metas, porque nós temos uma meta ambiciosa de chegar a 3 milhões de crianças ao final do plano, só que os valores orçamentários são decrescentes. Então, eu acho que é uma questão que se coloca aí para a Comissão, para a Frente, a de como nós compatibilizamos uma ampliação expressiva da meta, com recursos que, de partida, já estão diminuindo. O Orçamento previsto para os anos de 2021, 2022 e 2023 é de 380 milhões, claramente inferior, tanto ao Orçamento de 2019 quanto ao valor previsto para 2020.
Outra possibilidade também que se abre aqui para o aperfeiçoamento do programa é que, no momento, nós contamos apenas com ações do Ministério da Cidadania, e, como foi reforçado pelo Ministro e por vários outros expositores, nós precisamos de uma atuação integrada de vários Ministérios, como Saúde, Educação, Justiça e Direitos Humanos. Então, este também é um desafio que está colocado aqui para o Congresso Nacional, para o Relator do PPA. O Dalmo está aqui e vai nos ajudar, vai ajudar a Deputada Leandre, que é Presidente da Frente, a contribuir. Eu acho que a ideia, neste momento de discussão das leis orçamentárias, é fortalecer e contribuir para que o programa seja o mais consistente possível.
Obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Dra. Soraya Manato. PSL - ES) - Obrigada, Júlia.
Eu queria registrar a presença do Deputado Eli Borges e pedir desculpas a ele.
Desculpe-me, Deputado.
Encerradas as considerações dos expositores, iniciaremos o debate.
A primeira inscrita é a Deputada Leandre.
A SRA. LEANDRE (PV - PR) - Muito obrigada, Sra. Presidente. Quero cumprimentar todos os que aceitaram o convite para virem participar desta importante audiência pública. Quero também agradecer a todos os que vieram trazer mais conhecimento para esta Casa.
Em especial, quero fazer um agradecimento ao Deputado Felipe Francischini, ao Deputado Hiran Gonçalves e ao Deputado Hildo Rocha, que são integrantes da Frente Parlamentar Mista da Primeira Infância, que eu tenho a honra de presidir, aqui nesta Casa, junto com a Deputada Carmen Zanotto. Eles aceitaram o desafio de trazer este tema para a CMO. Nós, que falamos sobre isso todos os dias, somos convertidos. Cada vez que nós ouvimos alguém falar, nós aprendemos muito, e nós sabemos que temos muito a aprender. Mas nós também precisamos inverter um pouco a lógica, sair um pouco da esfera do discurso, do debate e ir para a área mais efetiva.
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Uma das coisas que eu sempre me preocupei foi justamente que nós temos bons modelos de boas práticas, nós temos boas políticas públicas, mas o que muitas vezes as impede de prosperar e trazer melhores resultados é justamente a falta de investimento.
Então, quando a Frente fez seu plano de trabalho, nós montamos uma estratégia pensando exatamente nisso. Nossa primeira ação foi fazer uma indicação ao Governo Federal para que, no PPA, ele contemplasse a primeira infância como uma agenda estratégica, de prioridade, de todos os Ministérios.
Essa indicação foi acompanhada com mais de 200 assinaturas dos Parlamentares que compõem a Frente e foi recebida pelo Ministro Onyx. Nós tivemos a felicidade muito grande de ver como veio o documento no sentido do compromisso que o Governo assumiu, então, com a primeira infância, sendo ela a prioridade maior do plano. Isso, com certeza, merece o nosso reconhecimento. O Governo reconhecendo isso, e é uma coisa inédita pelo menos até onde eu conheço, eu tenho certeza de que vai ser um grande passo para que nós possamos construir grandes mudanças no nosso País.
Sabemos, porém, que o PPA é só um primeiro passo. Ele só traz as nossas intenções. Nós precisamos avançar dentro da Lei de Diretrizes Orçamentárias e dentro do próprio Orçamento, construindo o gráfico orçamentário, mas também o gráfico financeiro, para que as coisas que estejam previstas tenham também o recurso para serem implementadas.
Eu assistir infelizmente a só uma parte da apresentação do representante do Ministério da Economia. Quero também pedir desculpa, porque precisei me ausentar um pouquinho, mas já percebi, dentro do seu planejamento estratégico, que o senhor trouxe para cá realmente muitas possibilidades, e nós podemos fazer esse trabalho em conjunto com o Parlamento.
Quando nós trazemos, dentro da nossa estratégia da Frente Parlamentar, essa discussão para a CMO, é para que nós possamos também falar para aquelas pessoas que muitas vezes nunca tiveram a oportunidade de ter um contato maior com o tema. Não significa que a pessoa não tenha interesse e não tenha compromisso. É porque aqui dentro se discutem coisas que são muito mais técnicas do ponto de vista financeiro, orçamentário.
Vejo que, nas explanações, em especial do Prof. Naercio, com quem eu tive oportunidade de ter aula inclusive, durante a formação para o desenvolvimento da primeira infância, que é oferecida por meio do NCPI em parceria com o INSPER, com a rede nacional e com a Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal, ele consegue nos convencer de que os investimentos feitos de maneira certa e no momento oportuno são os que trazem mais retorno. Isso traz para nós, como Parlamentares, um grande compromisso e uma grande responsabilidade.
Então, nós não podemos ficar com esse recurso só na área social ou no âmbito da educação ou no âmbito da saúde. Nós precisamos migrar para a área de Orçamento. E foi isso, Professor, que nós, inspirados naquilo que o senhor nos ensinou, quisemos trazer para dentro da Comissão Mista do Orçamento.
O Ministro fala do Marco Legal da Primeira Infância. A Lei nº 13.257, de 2016, aprovada nesta Casa por unanimidade, sancionada sem veto, é considerada uma das leis mais importantes do mundo. É uma lei em que, pela primeira vez, a ciência conversa com a política. Ela está muito respaldada nos avanços científicos. É a oportunidade de nós usarmos o conhecimento feito pela ciência para dentro daquilo que nós queremos desenvolver no nosso País. A Deputada Carmen Zanotto foi uma das autoras dessa lei, mas nós não conseguimos naquele momento colocar um orçamento mínimo para a primeira infância. Mas, se olharem lá no art. 11 § 2º, existe um dispositivo que diz que o Poder Executivo tem que, por obrigação, divulgar os índices gastos com a primeira infância.
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Aí começa o nosso desafio. Eu quero agradecer de coração à Júlia todo o empenho que está tendo junto com a frente nesse trabalho. É difícil nós reconhecermos ou identificarmos quais são as ações. Eu vou citar um exemplo. Eu já fui gestora de saúde, na década de 90. E até hoje, dentro da saúde, as ações que se conseguem identificar com muita clareza são em especial as ações de imunização, que são as vacinas. É claro que o maior público são as crianças, e é extremamente importante.
Entendo que nós precisamos estabelecer uma inversão de lógica. Eu não posso, por exemplo, pensar que desenvolvimento é medido pelo crescimento, peso e medida. Eu preciso estabelecer programas e metas que consigam desenvolver ou trazer algo que nós consigamos mensurar o desenvolvimento integral dessa criança. Isso, com toda a certeza, passa pela área da saúde. Não adianta nós falarmos do desempenho da criança na fase escolar, se ela tem déficit, se muitas vezes esse déficit poderia ter sido identificado lá nos primeiros 6 meses. E onde está essa criança nesse momento? Está no seio da sua família, e talvez o serviço que mais tenha contato com essa criança seja a área da saúde.
Então, aí estão os nossos desafios de construir, dentro de um orçamento, programas para que nós possamos realmente implementar isso. Talvez nós não precisemos mexer aqui na peça do Orçamento. O que nós precisamos é convencer que o próprio Ministério crie um PO — Plano Orçamentário, para que ele mostre e traga, para que no futuro nós possamos ter modelos, como se tem o CIOPS, que tem que cadastrar, tem que registrar tudo aquilo que se faz dentro dessas áreas específicas, até para que se possa comprovar ao Tribunal de Contas que se estão cumprindo essas metas.
Só para concluir, eu gostaria também de dizer que, como estratégia da Frente Parlamentar, nós não poderíamos deixar fora o Tribunal de Contas. Então, eu estou aqui trazendo essa informação de que nós já estivemos conversando com o Tribunal de Contas, com a ATRICON — Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil, para que eles peguem o Marco Legal da Primeira Infância, fixem-se no art. 11, no § 2º e comecem também a observar, na prestação de contas dos Municípios, dos Estados e da União, quanto é que está sendo apresentado como prestação de contas de investimento para a primeira infância.
Então, com certeza, essa cobrança do Tribunal de Contas virá, porque está respaldada pela lei. Cabe a nós também aqui criar todas as ferramentas e os instrumentos legislativos, executivos, para que isso possa ser cumprido.
Também existe aqui na Casa um projeto de lei de autoria da Deputada Erika Kokay, eu sou a Relatora e acho que é um projeto de lei muito estratégico, que pretende colocar, nos anexos da Lei de Responsabilidade Fiscal, também metas para o cumprimento daquilo que está estabelecido na Constituição, no Estatuto da Criança e do Adolescente e no Marco Legal. É o que nós precisamos fazer em todas as esferas de Governo da parte executiva, aquilo que tem que ser cumprido para que o Executivo possa estar de acordo com a Lei de Responsabilidade Fiscal. Eu acho que isso é um avanço. É claro que ainda é um embrião, nós vamos ter muito para conversar, ninguém quer impor responsabilidade para ninguém. Nós queremos deixar uma marca registrada e duradoura, porque, por mais que o nosso Governo tenha boa intenção — e outros que passaram também tiveram —, nós todos aqui somos passageiros e precisamos ter o compromisso de criar políticas de Estado, para que, depois da nossa passagem, elas fiquem. Eu acho que este é o maior patrimônio que nós podemos construir se realmente cada um de nós quer mesmo que o nosso País tenha uma outra história. Nós ouvimos nas falas de todos aqui que, se queremos mudar a história, temos que começar do começo a história. Só se faz bem quando se faz bem desde o começo. A primeira infância é o alicerce para essa construção maravilhosa chamada ser humano. Muito obrigada. Quero agradecer às mais de 20 instituições também que estão aqui presentes. Infelizmente, não vou nominá-las, mas são grandes parceiros aqui da Câmara dos Deputados, da Frente Parlamentar da Primeira Infância. Tenho certeza de que serão grandes parceiras nessa luta para buscarmos um caminho para garantir orçamento para primeira infância. Obrigada de coração.
12:21
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Presidente, parabéns pelo seu trabalho junto conosco na Frente Parlamentar da Primeira Infância. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Dra. Soraya Manato. PSL - ES) - Obrigada, Deputada Leandre.
Passo a palavra agora para a Deputada Carmen Zanotto.
A SRA. CARMEN ZANOTTO (CIDADANIA - SC) - Muito obrigada, nobre Deputada Soraya. É uma grande alegria termos V.Exa. como Parlamentar aqui, na nossa Casa, em especial na nossa Comissão de Seguridade Social e Família, na Subcomissão Permanente de Saúde e também como membro desta Comissão Mista de Orçamento.
Quero saudar todos os nossos expositores, dizer que, além de termos feito o curso junto com o Ministro Osmar Terra, na primeira turma de Harvard, tivemos um grande impacto aqui na Casa, porque eu fui Secretária em Santa Catarina, e ele, no Rio Grande do Sul. E lá ele já trabalhava com a PIM — Primeira Infância Melhor e tentava trazer para nós gestores esse novo olhar. Ele não desistiu da caminhada de Secretário de Estado e de Parlamentar nesta luta.
Com certeza, Cláudia, o impacto e o compromisso da Prefeita Teresa Surita é fruto, sim, de ela ter sido da primeira turma e por ter trabalhado com o nobre Ministro Osmar Terra aqui na Casa , assim como nós, no Marco Legal da Primeira Infância. Isso vem se multiplicando, o que é muito importante.
Esta audiência pública, nesta Comissão, Júlia, Alexandre, em que teoricamente se discute a questão financeira mesmo, um mais um são dois, quanto cortou o Orçamento, quanto foi contingenciado, quanto vai aumentar. Parece, quando estamos nesta Comissão, que são apenas números, mas não são apenas números. Nós vimos, pelo nosso Prof. Naercio o quanto isso significa na vida das pessoas. Nós temos que parar de olhar apenas para os números e ver o que esses números representam para nós.
A nobre Deputada Leandre, que é nossa Presidente, já fez uma fala belíssima sobre este novo paradigma, de termos conseguido, pela Frente, junto com o Ministro, e termos inserindo esta questão no Orçamento.
Vejo com muita dificuldade conseguirmos reproduzir isso para os Municípios. Então, o papel da nossa CMO aqui, o papel do Orçamento da União é o papel de dar as diretrizes para o conjunto dos nossos Estados e Municípios com relação a isso.
12:25
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Chamem do nome que quiserem o programa. O que tenho dito? Gente, não dá para continuarmos nos apegando a um passado que trouxe uma sequela grande que foi chamado, inclusive, de Programa de Primeira-Dama, de primeiro damismo. Não podemos nos apegar a isso, porque cada dia que passa nós estamos condenando esse conjunto da sociedade menos favorecido a não ter as mesmas condições do que as crianças que nascem numa condição um pouco mais favorecida.
Então, é preciso haver transparência no Orçamento, clareza do Orçamento, essa conexão de rede, porque nós sabemos que nós estamos sob a égide da Emenda Constitucional nº 95. Não adianta! Olha, eu estou vivendo uma situação, quero já declarar aqui o que eu estou vivendo no meu Estado, em função da peça orçamentária da área da saúde, porque eu represento o segmento saúde — até porque sou Vice-Presidente da Subcomissão Permanente e presido a Frente Parlamentar Mista. Há uma parte do orçamento da média e alta complexidade que ficou já de livre aplicação no início do ano que vem. E uma parte do orçamento ficou numa chamada regra de ouro, algo que o senhor, Alexandre, possa nos esclarecer, algo que vai depender da liberação de um PLN para não determinar irresponsabilidade do Presidente da República, ou pedaladas, ou podemos chamar também do que quisermos.
Só que a minha pergunta vai para a Júlia: o mesmo está acontecendo no orçamento da cidadania, da assistência social? Quais são esses valores? Por quê? Porque uma coisa é uma peça orçamentária que traz um orçamento aqui, mas parte desse orçamento vai precisar, sim, de autorização do Legislativo para ser liberado. Num olhar simplista, o que significa isso? Vou dar o exemplo de Santa Catarina, que eu venho estudando, e o Wagner e o Mário têm nos ajudado nisso, inclusive nós temos essa reunião já marcada na Comissão de Seguridade Social e Família.
Para quem olha a peça, sem querer compreender, diz assim: "Houve um corte no orçamento de Santa Catarina de 40%". Quando você olha o orçamento da média e alta complexidade pontualmente, houve um pequeno crescimento em relação ao ano passado. Mas parte desse orçamento está lá num outro grupo, num outro item orçamentário, para que isso seja descontingenciado ou aprovado por PLN. Por isso, temos que ter a mesma leitura, para dizermos: "Espere aí, nós crescemos no orçamento da cidadania, nós crescemos no orçamento da primeira infância". Mas quanto disso está disponibilizado? Cem por cento a partir de janeiro do ano que vem? Ou quanto disso ainda vai estar contingenciado e precisa de PLN? Nós precisamos ter essa clareza.
A outra questão que precisamos ter clareza é quanto ao MEC, gente. Nós estamos falando de primeira infância, nós estamos falando de educação infantil. Nós saímos da época em que precisávamos de uma crecheira. Isso foi no passado. E esse passado, Deputada Soraya, Deputada Paula, que está aqui conosco, é um passado distante mesmo. O que eram as nossas creches de antigamente? Bastava termos um espaço para colocar aquelas crianças, não importava a qualidade daquele educador dentro daquele espaço físico ou se aquela criança passava o dia todo no caminho. A Cláudia foi muito perfeita no que disse.
Cláudia, você tem que sair dando palestras pelos nossos Municípios, porque a sua linguagem é uma linguagem de compreensão, porque, muitas vezes, as pessoas não compreendem a dimensão daquilo que estamos falando. Quando você compara com um campo de futebol, as linhas, e se repetem o estresse psicológico e os caminhos de agressão e de sofrimento que, com certeza, estarão impactando a vida dessas nossas crianças, vemos a necessidade da educação.
12:29
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Nós precisamos que a educação, a primeira infância, seja vista na peça orçamentária não apenas como aquelas creches padrões que se construíram e que, muitas vezes, não são nem adequadas para a região onde são construídas. Nós, por exemplo, do Sul — e a minha região é a mais fria do País —, temos que esperar a medição da obra e o pagamento total daquela obra para, depois, erguer algumas janelas e muros. É impossível que nas creches as nossas crianças fiquem numa cerâmica ou fiquem em locais com aberturas no pátio, pois não tem como levá-las para o pátio, porque temos temperaturas de - 4º, de - 9º à noite, 2º, 0º de manhã. Com essas temperaturas, como é que se leva uma criança para o espaço externo?
Então, é necessária uma lógica de olhar um Brasil de norte a sul diferente e de parar de achar que tem que ser pacote com essa ou aquela nomenclatura e desenho. "Se quer, Prefeito, é assim; se não quer, não pegue". E o que Prefeito faz? Pega. Sabem por quê? Porque senão vai ser acusado de não querer construir ambientes para os quais lhe foram fornecidos recursos.
Então, queria fazer um apelo ao nosso Ministério da Economia. Que busque assegurar para o Ministro da Educação recursos que também possam ser vistos na peça orçamentária para a educação infantil na lógica da primeira infância, como o Ministério da Cidadania está fazendo.
Nós, Deputada Soraya Santos, na saúde vamos ter que conversar também com o Ministro Mandetta — e digo nós porque somos do segmento saúde — para dentro da peça orçamentária da saúde vermos como fazer a conexão. Em épocas de recursos escassos, temos que ser muito imaginários. Meu Deus, talvez tenhamos que quebrar um paradigma. Nós temos os agentes comunitários de saúde todas as semanas nas nossas casas. Se estamos falando em escolher prioridade, e a primeira infância é prioridade, será que nós não temos que começar a discutir? E olha que nós fomos resistentes lá atrás. Essa é verdade, temos que admitir. Gostaríamos, sonhamos e imaginamos ter um visitador domiciliar qualificado na primeira infância apenas para olhar esse público. Mas, quando não se tem isso, o que é melhor ou menos pior? É não se ter nada ou se ter também, dentro da formação dos agentes comunitários de saúde, esse público alvo? Que o agente comunitário de saúde tenha, sim, um olhar para as crianças nessa faixa etária.
Eu acho que temos muito para avançar. Quero registrar que avançamos muito. Avançamos, sim, fruto — e sempre precisamos registrar isso — de uma bandeira do nosso colega Deputado, ex-Secretário de Estado do Rio Grande do Sul, lá ele iniciou, e hoje Ministro Osmar Terra, que nos contaminou no bom sentido. Osmar Terra conseguiu junto com as entidades da sociedade civil mostrar para o Parlamento e para os homens e mulheres que por aqui já passaram e que estão lá fazendo gestão municipal o quanto isso é importante. Agora, só se a diretriz nacional — e aí repito — do Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão, quando fizer o orçamento da educação, da seguridade social e da segurança pública tiver esse olhar, porque todos estão interligados. Não dá para excluirmos um segmento do outro e fortalecermos essa rede. Quero dizer que esta Comissão está de parabéns por ter acolhido a propositura da nossa coordenadora e Presidente da Frente Parlamentar, Deputada Leandre. Nós aqui vamos ter que correr atrás, sim, do orçamento.
12:33
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Por que, Menezes, nós precisamos correr atrás do orçamento? Porque nós vamos ter dificuldades. Não adianta negarmos isso. Nós estamos tendo dificuldade. O que está sendo criado na peça orçamentária precisa vir à tona com clareza para todo mundo. Não é corte de 40%. Repito, estou dando o exemplo de Santa Catarina comparado a outros Estados, porque essa é uma pauta que acabou sendo publicizada antes de termos todo o estudo técnico. Repito, não houve corte no orçamento do MEC de Santa Catarina. Houve um pequeno crescimento de 2% comparado a 2019. Mas tem, sim, na peça orçamentária um contingenciamento, para ser mais claro, um bloqueio orçamentário, para cumprir com a regra de ouro, que é a Emenda nº 95. E eu posso falar com muita propriedade, porque eu fui contrária à aprovação de Emenda Constitucional nº 95, não por achar que podemos gastar mais do que se deve, do que se arrecada, mas porque eu entendia que já tínhamos que fazer o ajuste lá atrás, melhorar o orçamento da saúde e da educação, no mínimo, antes de termos a aprovação. Mas passou e agora temos que trabalhar com isso. Nós estamos discutindo na saúde a possibilidade, assim como na educação, de flexibilizar para os segmentos que são importantes. Não adianta daqui a 6 anos ou daqui a 3 anos dizermos: "Deveríamos ter investido na primeira infância um pouco mais". Sabem por quê? Porque essa geração desses menos favorecidos que nasceram em condições desiguais no nosso País já não terá mais o mesmo sucesso, o mesmo resultado e o mesmo impacto.
Então, queria que o Alexandre falasse um pouquinho sobre esse bloqueio orçamentário, tanto na saúde, quanto na assistência social, porque vai impactar diretamente também nas ações e serviços. Pergunto à Júlia como poderíamos aqui, antes mesmo de aprovarmos a peça orçamentária, não só a partir da designação das emendas de Comissões, porque eu tenho certeza de que, na Comissão de Seguridade Social e Família, nós vamos aprovar orçamento da nossa emenda para o Ministério da Cidadania e para a atenção básica, de média e de alta complexidade na saúde... Assim vai acontecer na Comissão de Defesa dos Direitos da Pessoa e na Comissão de Defesa dos Direitos das Pessoas com Deficiência e na Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher. Nós temos essa atribuição como membro dessas Comissões.
Como podemos ainda melhorar sem depender de emendas individuais, de emendas de Comissões e de emendas de bancada esse ajuste orçamentário, melhorando, em especial, o impacto na primeira infância e na área da educação? Eu acho que hoje talvez seja a mais fragilizada do orçamento, se é que eu entendi. Por favor, peço que deem esclarecimentos nesse sentido.
Deputada Dra. Soraya Manato, perdoe-me por ter me alongado um pouquinho, mas a nossa permanência aqui desde às 9 horas da manhã mostra a importância desse tema para um conjunto de Parlamentares, compreendendo que muitos têm que viajar, porque as atribuições nos Estados também não são pequenas por parte dos Parlamentares.
O SR. PRESIDENTE (Dra. Soraya Manato. PSL - ES) - Obrigada, Deputada Carmen Zanotto. A Deputada Carmen Zanotto é uma excelente Parlamentar.
É uma honra, Deputada Carmen, ser sua colega, inspirar-me em V.Exa. e fazer parte com V.Exa. de algumas Comissões. Parabéns pela sua explanação, que foi muito lúcida. V.Exa. é uma pessoa que realmente é muito preocupada com a saúde do Brasil, com a primeira infância, com a mulher.
12:37
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Muito obrigada.
Agora vou passar a palavra ao Deputado Eli Borges.
O SR. ELI BORGES (SOLIDARIEDADE - TO) - Presidente Dra. Soraya Manato, muito obrigado. Quero parabenizar os palestrantes.
Fiz questão de parar aqui nesta Comissão, mesmo não fazendo parte dela, porque considero um dos principais temas desta Câmara Federal tratar da questão das crianças. Salvo melhor juízo, quando a criança nasce, ela está 70% aberta para a vida. Ela tem uma fase cognitiva que vai de 0 a 7 anos, um tempo principal de 2 ou 3 anos. Nesse período, é muito trabalhado nela o controle emocional, a habilidade social, a linguagem, os limites e as regras que nortearão e forjarão o caráter dela para o resto da vida. O Brasil de hoje é fruto do Brasil de ontem. Nós fomos crianças no ontem. Como crianças, nós detectamos valores que nos regem para o resto da vida. Eu tenho percebido que existem pessoas que são incapazes de fazer o erro e, quando eram crianças, aprenderam que não podiam errar em certo ponto. Elas são honestas na velhice, são honestas na vida toda, porque valores vieram do tempo de infância.
Agora, quero compreender algo sobre a sociedade moderna e idealista — tenho algumas preocupações para entrar na questão orçamentária —, que está propondo modelo em que nós estamos tendo um choque que chamo de choque de confusão etária. A criança tem fases etárias até se tornar adulta. Falo disso não só num mundo racional, como é o nosso, de homens e mulheres também, como também no próprio mundo animal irracional. Entretanto, aqui nesta Câmara, está sobrando, minha querida Deputada, uma série de Parlamentares que têm uma visão distorcida da pureza da criança e das suas faixas etárias. Pegam isso e envolvem a educação. Querem criar políticas que nunca, mas nunca mesmo, vão ser coerentes com a biologia, com as faixas etárias. Temos, por exemplo, uma série de exemplos nos Estados Unidos de pessoas que estão retornando a visão de respeitar tudo isso no modelo educacional, quer seja em casa, que é o berço da educação, quer seja também lá na escola.
Por esse motivo, eu queria citar alguns pontos que considero importantes no orçamento. Em que pesem os dados que vou ler aqui rapidinho, cresceu de 0,5% do PIB e foi para 0,7%, mas isso é muito pouco. Se o que eu fizer até esse período cognitivo for 70% para o resto da vida, então, essa é a grande fase do investimento, da mente fértil, da mente pura, das estradinhas que a doutora citou ali, no consciente, no subconsciente, na interação cognitiva, etc. Portanto, o investimento é muito pequeno, é extremamente pequeno. Não se valoriza criança, não se valoriza o futuro do Brasil. Não se valoriza investir nas crianças, não se valoriza o futuro do caráter do Brasil. Quando não se trabalha com a criança hoje, não se trabalha com o futuro do Brasil, preparado para a vida. Essa é uma questão que muita gente não está levando em conta. Lamento e vou entrar aqui na questão orçamentária.
12:41
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Existem Deputados que estão brincando com crianças como se fossem joguetes de ativismo e uma série de outras coisas. Estão brincando literalmente com esse ser tão puro que é a criança, ainda imaginando que se tem que trabalhar pontos como erotização infantil, ideologias, etc., quando o que elas precisam é ir para a escola.
Aprendi na Escola Dominical, minha querida Deputada Soraya, os quatro pontos do aprendizado. Aprendi isso muito cedo. O primeiro deles é que eu aprendo quando eu ouço. O segundo é que eu aprendo mais ainda quando eu ouço e falo. O terceiro é que aprendo mais ainda quando eu ouço, falo e vejo alguma coisa. E o quarto ponto é que eu aprendo muito quando eu ouço, falo, vejo alguma coisa e faço. Percebo que a criança gosta das cores, mas as nossas escolas, sobretudo as pré-escolas, ainda são muito carentes de material pedagógico, de envolvimento, de interação no sentido de propiciar à criança não só que ouça bastante, mas que também fale bastante.
Eu vou até citar um fato curioso, com todo o respeito. Muito cedo, eu fui estimulado a falar, até recebi o apelido de "grilo falante". Isso foi bom para mim, porque eu queria falar sobre tudo. Eu não sabia que iria precisar tanto disso hoje, que iria tomar tanto o tempo desta Comissão. Fui estimulado a isso. Recebi um apelido, mas nunca me importei com apelido. Houve um investimento na fala, porque cresci numa família cujos pais falavam na igreja. Então, eu achava bonito e também queria falar.
Acho que está faltando hoje uma educação em que a criança possa não só ouvir, mas também possa ser levada a falar. A Psicologia, salvo melhor juízo — estou diante de quem sabe mais do que eu —, diz que o maior centro de comando do corpo é a palavra falada, emitida, verbalizada. Então, quando eu falo, acabo desenvolvendo muito mais o meu intelecto pela necessidade de superação que tenho na minha fala. Acho que está faltando essa visão, não só a de incentivar a criança a ouvir, mas a de incentivá-la também a falar mais e a ver mais.
Eu, por exemplo, nunca me esqueço de livros que li. Eu viajava nesses livros por causa das imagens. A coisa que eu mais queria nos livros eram aquelas imagens. Lembro-me de ter lido uma série de livros quando criança, mas tudo o que eu queria era ver aquelas imagens. Uma das coisas que mais ficou na minha cabeça ainda quando dessa formatação cognitiva foram exatamente aquelas imagens, que mexiam comigo, que me levavam para o mundo. Era um mundo meio irreal, mas as viagens mexiam com a minha emoção.
O ser humano é razão e emoção, em tese. Por isso, esse negócio de adotar crianças por pessoas que são só de um lado ou do outro não funciona. A mulher está mais ligada à emoção, e o homem está mais ligado à razão. Aí não vai dar certo, não se completa. Se forem dois homens adotando uma criança, vai haver mais razão. Se forem duas mulheres, haverá mais emoção. Aí é uma briga tremenda. Espero que eu não tenha arrumado problema aqui citando isso, mas foi Deus que fez assim. Isso é biologia, é ciência. Não adianta tentar de forma diferente.
Outro ponto é fazer mais. As nossas creches e as nossas escolas precisam ter mais condição para que possam dar mais à criança não apenas o ouvir — é claro que criança gosta de ouvir —, não apenas o ouvir e falar, não apenas o ouvir, falar e ver, mas o ouvir, falar, ver e também o fazer, talvez com datashow, com historinha, com as cores, enfim. Eu, por exemplo, não tenho nenhuma dificuldade de falar. Quando eu era criança — vou repetir —, eu era o "grilo falante", porque eu via meus pais falarem e eu queria falar também. Então, essa questão do Brasil precisa ser rediscutida no orçamento. Se nós investirmos nas crianças, vai demorar um pouco, mas, quando elas forem adultas, primeiro, o Brasil vai ter muito mais caráter por metro quadrado. É um fato lamentável não ser assim.
12:45
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Eu lembro que, com 12 anos, eu vendia picolé em Porangatu. Colocaram trinta picolés em um carrinho, e eu vendi os trinta. Quando voltei, entreguei o dinheiro dos vinte. A mulher disse: "Tudo bem". Eu disse: "Não, agora têm mais dez". E ela disse assim: "Têm mais dez?" Eu disse: "A senhora colocou trinta, eu vendi vinte, mas têm os dez, eu estou pagando os dez". Ela perguntou: "Menino, onde você aprendeu isso?" "Foi minha mãe que me ensinou". Eu tinha 10 anos, 12 anos de idade. Isso foi aqui em Goiás, em Porangatu.
Por essa razão, Presidente, está faltando muito, está faltando família na vida da criança, está faltando escola, mas não escola com essas ideologias doidas — porque ninguém sabe o resultado disso — que ferem todo um processo cognitivo e etário, essa coisa louca de quem brinca com um menino como se a cabeça dele fosse uma bola para ele fazer um gol que ele imagina que é o gol correto. Isso não dá certo. Não está dando certo o mundo. Hoje nós temos uma série de casos de suicídio de crianças e de adolescentes, coisa que não havia, porque o mundo da criança é muito bonito, muito colorido. Eu não estou dizendo que a criança não tem que aprender regras.
Mas eu quero cooperar com V.Exa. no sentido de aumentarmos o orçamento, para que esses quatro itens do aprendizado sejam muito fortes nas creches e para que as escolas não sejam um local de ideólogos de gênero, de erotização infantil, mas que seja um local em que se trabalhe o cognitivo das crianças, na pureza delas. Assim, é preciso levar a criança a ouvir mais, a falar mais, a fazer mais e também a ver mais imagens, até porque isso vai ficar no subconsciente, que vai trazendo essa reação.
Termino dizendo — e eu estou muito preocupado em não dizer besteira aqui, porque não sou psicólogo — que se 70% do que eu aprendo até 7 anos vai para o resto da vida, está aí o grande momento da criança e está aí o grande momento do Brasil. Nisso está o maior investimento que o Brasil pode fazer para o seu futuro, seja o Brasil econômico, seja o Brasil social, seja o Brasil que vai ter bons índices nas escolas, seja o Brasil das descobertas científicas. A fase para se investir é essa. Se não fizermos isso agora, o futuro vai nos dizer que tivemos a oportunidade de fazer e não fizemos e que será tarde demais. Que compreendamos isso e que aumentemos o percentual do PIB para investir nas crianças, sobretudo nessa fase. Se fizermos isso, eu acredito que teremos um Brasil melhor do que o que nós estamos tendo. Esse será o nosso legado, e é isso que eu quero deixar para o futuro.
Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Dra. Soraya Manato. PSL - ES) - Obrigada, Deputado Eli Borges.
Passo a palavra agora à Deputada Paula Belmonte.
A SRA. PAULA BELMONTE (CIDADANIA - DF) - Bom dia a todos, apesar de ser quase 1 hora da tarde. Ninguém almoçou, então é "bom dia". Que Deus nos abençoe.
12:49
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Eu fiquei muito feliz com a fala do Deputado Eli Borges, porque normalmente, quando temos essas audiências, são mulheres que falam. As pessoas pensam que falar sobre a primeira infância, falar sobre criança e adolescente é uma política café com leite, que não é uma política séria. Na realidade, eu vejo que é uma das políticas mais importantes para o Estado brasileiro. Se investirmos — eu digo que não é um custo, mas um investimento — na nossa criança e no nosso adolescente, teremos um futuro melhor para o nosso País, todos nós vamos ganhar com isso. Então, eu fico muito feliz de ver mais pessoas defendendo essa pauta. Eu proporcionei uma audiência pública lá na Comissão de Educação a respeito da primeira infância.
Nós temos aqui, como muito bem disse a Deputada Leandre, Presidente da Frente Parlamentar da Primeira Infância, um farol, que é o Ministro Osmar Terra. Ele vem trazendo um monte de marinheiros junto, para que possamos iluminar as políticas brasileiras e começar a acordar para o fato de que, através das nossas crianças, nós vamos transformar este Brasil. A Deputada Carmen Zanotto também é uma pessoa que faz parte dessa história, porque ela trouxe o marco legal, iniciou. E o mais importante é fortalecer cada vez mais essa rede do bem.
Eu acompanhei esta audiência pública desde o início. Eu não estava aqui presente, mas estava acompanhando via Internet. Nós tivemos duas outras audiências muito importantes aqui, Deputado. Uma dela foi a respeito do que V.Exa. estava trazendo: ideologia de gênero. A outra foi a respeito de um projeto de lei que está dando oportunidade de mudança de nome para as nossas crianças que são adotadas. Essa é uma responsabilidade que entendo que não podemos dar para uma criança, que não tem maturidade suficiente para a mudança de nome, a critério do pai que está adotando, ainda mais em um período que é anterior à adoção definitiva. Isso é muito sério, porque nós temos que preservar a memória das nossas crianças.
Então, eu estive acompanhando essas duas audiências, às quais eu também subscrevi. E estava acompanhando também esta aqui.
Nós estamos neste momento, nesta quinta-feira, graças a Deus, trazendo à Casa a pauta da memória da nossa criança e a responsabilidade do Parlamento em cuidar dessa criança, porque este é o nosso dever: fiscalizar e proteger as crianças.
É muito importante também reconhecer que, através de determinação do STF, nós conseguimos que 1 bilhão de reais de multa da PETROBRAS fosse investido na educação infantil, que é a educação da primeira infância. Esse foi um trabalho conjunto com a própria Frente Parlamentar da Primeira Infância, mas também com a Comissão de Educação e a Frente Parlamentar da Educação. Eu faço parte das duas frentes. Sou Relatora da Comissão Especial da Primeira Infância, na Comissão de Educação, e o Deputado Idilvan Alencar fez um projeto de lei para que esse recurso fosse destinado à educação infantil. Nós estivemos com a Procuradora Raquel Dodge à época, estivemos também com o Ministro da Educação. Hoje, foi destinado 1 bilhão desse orçamento para a educação infantil. É um dinheiro que está disponível, mas precisamos ainda fazer uma fiscalização eficiente para que ele chegue às nossas crianças, porque só através de uma educação de qualidade, através de políticas de Estado, nós vamos conseguir realmente avançar nessa pauta.
12:53
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Eu entrei na política com essa defesa. Sou mãe de 6 filhos, e foi este meu motivo da entrada na política: a defesa das nossas crianças e dos jovens. Antes nunca tive vida política e não tenho família na política. E o que eu percebo hoje é que muitas vezes a defesa da criança e do jovem faz parte de discurso de muitas pessoas, mas efetivamente a realização é muito pouca, inclusive, como disse aqui muito bem a Deputada Carmen Zanotto, pelos Municípios e pelos Estados.
Eu me questionava sobre por que é assim. Uma das respostas — e, infelizmente, tenho até um pouco de constrangimento em falar — é que criança não tem título de eleitor. É muito mais fácil defender uma pauta de universidade, porque os jovens têm título de eleitor, do que defender uma criança, que não tem título de eleitor.
Percebemos que para o jovem ter acesso à universidade pública de qualidade é preciso investir na base. Nas regiões vulneráveis existe um filtro natural. Primeiro, passa pela qualidade da gestação, do pré-natal e da alimentação. Quando queremos uma colheita fértil, melhoramos a nossa terra. Nós temos que melhorar a nutrição das nossas crianças, o acompanhamento dessas crianças desde o pré-natal. Nós temos que dar nutrientes a essa criança para que, cada vez mais, ela se desenvolva intelectualmente. A necessidade disso é comprovada.
O Ministro Osmar Terra fala muito bem a respeito disso. Inclusive é tema do Prêmio Nobel de Economia esse investimento em alimentação na primeira infância. O ideal é que toda criança ficasse com sua família, mas infelizmente não é essa a nossa realidade hoje. As pessoas precisam trabalhar. E a política que envolve a nossa criança é muito abrangente, Deputada Soraya. Uma mãe precisa ter oportunidade de sair para trabalhar. Aliás, o déficit maior na oferta de creche é exatamente nas comunidades mais vulneráveis, e eu não vejo muitos Deputados defendendo essa pauta. Menciono até que quando a mulher começa a ter um empoderamento financeiro ela deixa de sofrer, muitas vezes, violência doméstica.
Quando falamos sobre miséria material, nós estamos falando também, infelizmente, sobre miséria de princípios e de valores. Eu conheci criança aqui no Distrito Federal cujos próprios pais, familiares dela, queimaram o seu bracinho. Toda vez que eu falo sobre isso eu me emociono. Estamos falando de crianças. Queimaram o bracinho dele com ponta de cigarro. Quando damos um ambiente seguro a essas crianças, damos também a oportunidade de elas serem simplesmente crianças!
Isso aqui não é política café com leite; isso aqui é política séria, é política de Estado. Precisamos, sim, trazer mais e mais pessoas para essa pauta e ter esse desprendimento de título de eleitor para pensarmos num Brasil do futuro, para pensarmos no que nós queremos como futuro do nosso País.
12:57
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Eu tenho algumas indicações muito importantes a respeito desse assunto, para que possamos realmente estar abraçados com o Governo do Estado. Vejo que hoje o CNJ está fazendo um trabalho muito importante, trazendo esse tema para dentro do Judiciário. Eles estão com a meta de formar 23 mil pessoas no Brasil inteiro. Hoje mesmo está acontecendo o seminário do Pacto Nacional pela Primeira Infância, em Manaus, ao qual eu não fui por conta desta audiência. Esse pacto traz a responsabilidade do Judiciário. Vejo que esse é um caminho corretíssimo. Nós Parlamentares estamos aqui hoje, mas daqui a 4 anos não sabemos. Com o Executivo é a mesma coisa. Mas o Judiciário é perene. Então, vamos conseguir colocar isso na nossa sociedade como tema principal. O Brasil precisa olhar a nossa criança com responsabilidade e ver que isso é um investimento. Quando investimos na primeira infância, nós economizamos lá na frente.
Esse recurso de 1 bilhão de reais e também o de duzentos e poucos milhões que foram destinados ao Programa Criança Feliz, espero que consigamos realmente fazer com que cheguem lá na ponta, porque cartilha bonita nós já temos muitas. Nós estamos precisando é que isso chegue lá na ponta, para que as nossas crianças possam ter o desenvolvimento adequado e possam simplesmente ser crianças.
É isso que eu defendo. Contem comigo aqui para o que der e vier, porque nós estamos aqui juntos na defesa das nossas crianças.
Grata.
Que Deus abençoe a cada um dos senhores!
O SR. PRESIDENTE (Dra. Soraya Manato. PSL - ES) - Obrigada, Deputada Paula. Lindas as suas palavras.
Recentemente, na Comissão de Seguridade Social e Família, nós estávamos discutindo sobre adoção. Hoje em dia, a grande maioria das pessoas quer adotar realmente por amor, mas nós ficamos surpresos com uma Parlamentar que defendia a família que, antes de ter essa adoção efetivada, já começava a chamar a criança por outro nome. Essa Parlamentar nos afirmou que é desejo da própria criança.
Eu achei o cúmulo do absurdo, porque eu acho que uma criança não está se importando com o nome dela. Ela está se importando realmente em ter amor, em ter uma família.
A SRA. PAULA BELMONTE (CIDADANIA - DF) - Eu posso fazer um parêntese?
Isso que V.Exa. está trazendo é tão sério, que, depois daquela discussão que nós tivemos na Comissão, eu tive o cuidado, eu tive a preocupação de conversar com alguns juízes da Vara de Família e com psicólogos a respeito do assunto. Nós temos que ter muito cuidado com algumas pautas que entram aqui.
Nesse caso específico que V.Exa. está falando, pode acontecer, por exemplo, de uma menina de 5 anos dizer: “Ah, eu me chamo Dorotéia e quero me chamar Serafina”. Isso é uma coisa. Agora, pode começar a vir assim: "Eu me chamo Dorotéia e quero me chamar João". Com 5 anos de idade! V.Exa. está entendendo a situação? É sério isso!
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Além disso, temos que entender outra situação. Há um juiz de uma Vara da Família que, em 98% dos casos, trabalha com Direito Sistêmico. E ele diz o seguinte: "Aqui não cabe julgamento". Ele consegue resolver 98% dos casos ali, na primeira instância. Cabe o quê? O reconhecimento do pai e da mãe. Todos nós aqui só estamos nesta terra porque tivemos um pai e uma mãe, independentemente de o pai ser um assassino e a mãe uma prostituta. Nós não podemos quebrar esse ciclo, e deve haver o reconhecimento disso por parte dessas crianças.
O SR. PRESIDENTE (Dra. Soraya Manato. PSL - ES) - Com certeza!
A SRA. PAULA BELMONTE (CIDADANIA - DF) - Então, isso é muito sério! Devemos ter cuidado com a memória das crianças. Tenho certeza de que V.Exa. está nessa pauta junto conosco.
Grata, Deputada.
O SR. PRESIDENTE (Dra. Soraya Manato. PSL - ES) - Com certeza.
O SR. ELI BORGES (SOLIDARIEDADE - TO) - Presidente, quero parabenizar a Deputada. Eu estou muito sensibilizado. Inclusive, quero acompanhar mais. Há muita coisa aqui, eu soube de uma pauta perigosa.
Um dos problemas mais sérios das crianças americanas hoje chama-se crise de identidade. Ela olha no espelho e biologicamente ela se define. Aí, vai alguém lá fora e diz: "Não, não é o que o espelho que manda, é o que você quer ser". Essa crise de identidade está trazendo uma série de problemas. Podem ver os dados dos americanos, que adotaram isso mais cedo. Pelo amor de Deus, gente! Vamos entender que há uma biologia, uma faixa etária e um choque advindo de uma crise de identidade, que está deixando muita gente desnorteada.
A Câmara está cheia de gente com esses pensamentos. Não sei onde arrumaram isso.
O SR. PRESIDENTE (Dra. Soraya Manato. PSL - ES) - É verdade, Deputado.
Agora, eu quero deixar uma pergunta no ar, principalmente para a Claudia Vidigal.
É o seguinte, Claudia: se nós podemos afirmar que o adulto, aquela pessoa acima dos 18 anos, é produto da família e do meio em que vive, então os pais muitas vezes são os "culpados" — entre aspas — pelos problemas que esse ser vai ter na fase adulta?
Sendo médica, vejo muitas pessoas de nível sociocultural mais alto que chegam ao consultório e falam: "Ah, doutora, eu trouxe minha filha, que tem 12 anos, porque eu acho que ela está muito gorda" — usam esse termo. Ou falam: "Eu acho que ela tem uma mama muito pequena". Então, vão incutindo isso. Também falam: "Eu acho que ela é uma pessoa que não se interessa por nada". São coisas que vejo às vezes. Esses pais falam isso sem pensar, achando que estão fazendo o melhor pelo filho — os pais sempre acham que estão fazendo o melhor —, mas estão fazendo o pior.
Então, eu quero saber se essa pessoa, que virou adulta, é produto realmente do meio em que vive e da família, dos pais que a criam?
A SRA. CLAUDIA VIDIGAL - Cada um de nós é produto de uma série de fatores. Por isso nós trouxemos a questão genética, que existe, é fato. Existe a questão familiar, é claro, de importância fundamental e gigantesca. Mas é importante nós não isolarmos essa família de um contexto social. A família também já é, muitas vezes, resultado de toda uma fragilidade num sistema que também não oferece oportunidades para mais informações, para mais serviços, para mais caminhos a fim de melhor cuidar dos seus filhos.
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Então, vejam que nada existe isoladamente. Esse é um sistema composto por um componente genético, um componente familiar, um componente comunitário e um componente social. Acho que estamos falando aqui do componente maior de todos, que são as diretrizes nacionais da formação do sujeito. Mas vejam que eles são todos integrados.
Às vezes, nós buscamos uma solução simplista, como se fosse assim: "Bom, se fizermos isso, isso e isso, vai dar certo". Não é assim. É a composição mesmo, não é?
O SR. PRESIDENTE (Dra. Soraya Manato. PSL - ES) - Passo a palavra aos demais expositores, para responderem às dúvidas dos Deputados.
O SR. ALEXANDRE FINEAS LIMA E SOUSA - Em relação à pergunta da Deputada Carmen Zanotto, gostaria de dizer que faço parte de uma secretaria que lida mais com a parte de planejamento. Mas, pelo conhecimento que eu tenho em relação a essa questão, trata-se de são ações condicionadas à regra de ouro, tendo sido feita uma escolha dessas ações para serem condicionadas.
Então, com o que eu posso me comprometer, Deputada? Infelizmente, não tenho tanto conhecimento. Mas posso encaminhar essa pergunta lá dentro do Ministério da Economia e tentar trazer uma resposta para a senhora sobre por que essas ações foram escolhidas em detrimento de outras. Realmente, foi feita uma escolha, e nós temos que prestar esse esclarecimento.
Em relação à questão sobre o Programa Primeira Infância em si, eu percebo que foi feito o reconhecimento aqui de o nosso PPA ter apresentado como prioridade de Governo a primeira infância. Nós temos um programa específico, com metas audaciosas, e inclusive a nossa colega aqui da Mesa já está questionando como é que vamos conseguir fazer isso. Mas vejam que, diante de um cenário fiscal que realmente é complicado, o Ministério da Economia, o Governo Federal, o Executivo ainda estão se comprometendo em fazer um grande esforço nesse sentido. Nossa meta é de termos 3 milhões de crianças beneficiadas. Essa é a nossa meta.
O que acontece é que o Ministro realmente contamina todo mundo. Eu vejo que também fui um dos contaminados com esse tema. Foi uma brilhante palestra. É realmente emocionante a forma como o Ministro expõe. Então, sou mais um contaminado.
O fato de esta audiência ter existido já fez uma movimentação no Poder Executivo. Ontem, eu estava junto com o Ministério da Cidadania e junto com o MEC levantando esta questão: por que não há ações do MEC, ou por que esse programa ficou restrito só ao Ministério da Cidadania? Bem, o que eu tenho de resposta é que realmente existe uma complicação operacional, que temos que conseguir avançar dentro do Poder Executivo em questões de execução orçamentária. Mas já há uma sinergia. Na conversa que eu tive ontem, soube que o Ministério da Educação já trabalha junto com o Ministério da Cidadania e com o Ministério da Saúde. As pessoas já estão conversando lá dentro sobre esse programa.
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Eu acho que, na verdade, as coisas estão evoluindo. O Programa Criança Feliz foi criado em 2016, e o PPA tem um programa específico. Então, eu acredito que ao final desse PPA nós vamos ter uma sinergia. Todos gostaríamos de ver diversos Ministérios trabalhando dentro desse programa.
Queria só registrar aqui também que a Deputada Leandre me deixou uma contribuição do Ministério Público do Paraná, do Centro Marista de Defesa da Infância, que eu vou anexar aos meus documentos e levar também para o Ministério da Economia.
Eu não sei se houve outras perguntas, mas isso foi mais ou menos o que eu pude anotar aqui.
Agradeço novamente o convite. Esta brilhante audiência vai nos ajudar nesse compromisso com a primeira infância.
A SRA. JÚLIA ALVES MARINHO RODRIGUES - Deputada Carmen, só para complementar as informações, no Projeto de Lei Orçamentária para 2020, 367 bilhões de reais estão condicionados à aprovação do crédito pelo Congresso Nacional. Esses 367 bilhões foram divididos em várias ações do Poder Executivo, como pagamento de salário de servidor, aposentadoria rural, aposentadoria urbana. Há também recursos no SUAS que estão condicionados e no Programa Primeira Infância. Nesse programa, dos 570 milhões de reais previstos, 155 estão como fontes condicionadas. Mas eu acho que, além disso, nós temos que recordar a apresentação do Ministro no sentido de que esses 570 milhões não são suficientes.
O orçamento que o Ministério entende como adequado para o cumprimento dos compromissos é de 1 bilhão de reais. Então, há todo um esforço dos Deputados, dos Senadores, das bancadas e do Relator para tentar recompor esse valor. De acordo com aquela nossa conversa na semana passada, o Bolsa Família também está com uma necessidade de orçamento, está com um orçamento a menor. Então, nós temos vários desafios para o orçamento do Ministério da Cidadania para o ano de 2020.
O SR. PRESIDENTE (Dra. Soraya Manato. PSL - ES) - Agradeço o comparecimento dos senhores convidados, dos Parlamentares e do público.
A reunião está encerrada.
Muito obrigada. (Palmas.)
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