1ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA 56 ª LEGISLATURA
Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional
(Audiência Pública Ordinária)
Em 4 de Setembro de 2019 (Quarta-Feira)
às 9 horas e 30 minutos
Horário (Texto com redação final.)
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O SR. PRESIDENTE (General Girão. PSL - RN) - Senhoras e senhores, em nome da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional, dou as boas-vindas aos nossos convidados, que gentilmente aceitaram o convite para participar deste importante debate. Dou as boas-vindas igualmente a todos os demais que estão aqui presentes — aos Parlamentares, ao público e à imprensa.
Eu gostaria de pedir a quem está em pé que ocupe esta terceira fileira também.
Vamos dar início à audiência convidando as pessoas que vão fazer parte desta Mesa de debates.
Convido para compor a Mesa o General Maynard Marques de Santa Rosa, Secretário Especial de Assuntos Estratégicos da Presidência da República (palmas); o General Luiz Eduardo Rocha Paiva, Diretor de Geopolítica e Conflitos do Instituto Sagres — Política e Gestão Estratégica Aplicadas (palmas); o Sr. João Adrien Fernandes, Chefe da Assessoria de Assuntos Socioambientais, representando o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (palmas); o Ministro Leonardo Cleaver de Athayde, Diretor do Departamento de Meio Ambiente, representando o Ministério das Relações Exteriores (palmas); o Prof. Pio Penna Filho, Diretor do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília. Tão logo o Prof. Pio Penna chegue, ele ocupará o seu espaço aqui à frente.
Em função de uma solicitação recebida do Ministério do Meio Ambiente, o representante do Ministério solicita que possa usar da palavra inicialmente porque tem outro compromisso em vários outros locais.
Acabamos de anunciar: Prof. Pio Penna, por favor, o senhor queira ocupar o seu espaço aqui junto conosco. Seja muito bem-vindo. (Palmas.)
Gostaria de pedir que, durante as apresentações, mantenhamos o silêncio em respeito às pessoas que estão fazendo uso da palavra. Muito obrigado.
Na audiência pública de hoje, atendendo ao Requerimento nº 109, de 2019, de minha autoria, subscrito pelo Deputado Arthur Oliveira Maia e pela Deputada Perpétua Almeida, debateremos o respeito à Amazônia brasileira e as ameaças nacionais e internacionais à soberania da Amazônia brasileira.
Antes de dar início às exposições, esclareço aos senhores convidados e aos senhores Parlamentares que a reunião está sendo gravada para posterior transcrição. Por isso solicito que falem sempre ao microfone.
Informo ainda que a reunião está sendo transmitida em tempo real pela Internet, bem como está sendo gravada para inserções na grade de programação da TV Câmara, alcançando um público bastante expressivo em todo o Brasil.
09:41
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Após a exposição dos seis convidados, abriremos os microfones para debates, com os Parlamentares inscritos, lembrando a todos que a lista de inscrições está disponível na mesa da assessoria, localizada ao lado da bancada. As inscrições serão encerradas ao término da exposição dos convidados, por analogia ao que prevê o art. 171 do Regimento Interno e em conformidade com o Acordo de Procedimentos aprovado nesta Comissão em uma reunião deliberativa no dia 3 de abril de 2019.
Informo a todos os presentes que temos na Casa hoje mais três reuniões tratando da Amazônia brasileira — uma Comissão Geral, no plenário da Câmara, que foi convocada ontem; uma sessão da Comissão de Meio Ambiente; e uma sessão plenária para discutir também a soberania da Amazônia, no auditório Nereu Ramos, na qual se vai discutir também ação popular em relação a esse fato.
O que nos levou a solicitar esta audiência pública foi exatamente a profusão de notícias e de matérias que foram colocadas em toda a mídia e nas redes sociais com declarações, com várias abordagens feitas em relação à Amazônia brasileira. Por conta disso, tomamos a iniciativa de fazer essa solicitação via requerimento na CREDN. A partir daí, não só os que estão aqui presentes, mas também os que vão nos assistir, estamos em condições de, juntos, debater o tema, que é recorrente. Não é de hoje que se ameaça a soberania brasileira na Amazônia. Nada mais justo do que fazermos isso na Semana da Pátria. É uma semana que deve caracterizar, sim, a fortaleza das nossas convicções em relação à soberania do Brasil.
Começando as exposições, passo a palavra ao Sr. João Adrien Fernandes, que tem até 15 minutos para a sua exposição.
O SR. JOÃO ADRIEN FERNANDES - Primeiramente bom dia a todos. Deputado, obrigado pela oportunidade dada ao MAPA para podermos fazer nossa exposição neste dia.
De fato, como o senhor mencionou, o tema é extremamente relevante e está sendo debatido não somente nesta sessão, mas também em outras. Até por isso eu pedi a oportunidade de falar primeiro, porque eu vou ter que ir depois ao plenário para também expor esse tema, que de fato é uma questão que traz uma grande preocupação não só para o Ministério da Agricultura, como para todo o Governo.
Nós sabemos que a Amazônia é um patrimônio nacional que precisa ser preservado e precisamos encontrar formas sustentáveis para o seu desenvolvimento econômico. Nós, no Ministério da Agricultura, estamos bastante focados em encontrar essas soluções.
Eu retorno hoje, Deputado, da missão que houve no Norte — no Pará e depois na Amazônia —, da qual vários Ministros participaram, para se encontrarem com os governos estaduais, seja da Amazônia oriental, seja da Amazônia ocidental, junto com o Exército, para entender um pouco as agendas estaduais, alinhadas com o Governo Federal. Também pudemos ver como está o encaminhamento da GLO. Faz 11 dias hoje que ela foi instaurada e já tem alguns importantes resultados no combate às queimadas e ao desmatamento legal.
O que nos preocupa bastante, Deputados presentes aqui hoje, é que existem alguns temas e algumas questões que são extremamente complexas de serem solucionadas na Amazônia. E nós precisaremos de um engajamento entre o Poder Judiciário, o Parlamento e o Poder Executivo para podermos solucioná-las.
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A primeira questão que eu destaco dessa reunião que nós tivemos no Norte sobre os temas da Amazônia é a questão do combate à ilegalidade que existe hoje no desmatamento, nas queimadas e na ocupação fundiária daquela região. Essa é uma questão histórica, que nós não conseguimos solucionar até hoje. Boa parte daquela região tem áreas não destinadas, tem grandes áreas devolutas e tem um problema fundiário sistêmico extremamente complexo de se solucionar.
Agora, com a nova configuração do Ministério da Agricultura, a parte fundiária, que é o INCRA, veio para dentro do Ministério. Portanto, nós começamos a analisar os diversos cadastros, seja o CAR — Cadastro Ambiental Rural, seja os cadastros fundiários. Então nós conseguimos agora ter toda uma integração sobre a discussão fundiária, que antes estava dividida entre MDA, MAPA, MMA e vários outros. Essa nova configuração nos permite fazer essa análise. Nós estamos identificando um montante de áreas que podem ser tituladas e que estão prestes a ser tituladas na Amazônia. Isso de fato vai começar a trazer o título e, portanto, perante a lei, a responsabilização daquelas áreas que estão sob domínio desses produtores ou de pessoas que estão lá assentadas — ribeirinhos, entre outros.
Agora nós também temos o problema sério das invasões de áreas não destinadas, áreas públicas e terras indígenas. Muitas invasões são feitas por grileiros, por madeireiros ilegais, entre vários outros tipos de exploração que vão contra a nossa legislação. Por isso se torna extremamente importante uma ação coordenada da Justiça com a Polícia, com o Parlamento e com o Poder Executivo, para podermos coibir esse tipo de situação. O Ministério do Meio Ambiente está muito focado nesse combate à ilegalidade. Nós da Agricultura também damos suporte. Mas é fundamental que o Judiciário participe disso.
Em vários relatos do Exército, quando você chega para fazer uma autuação ou coibir uma ilegalidade, você não tem o título daquela área — então você não sabe quem é o proprietário —, você não tem o mandado de segurança para poder apreender aquelas pessoas. Então, se nós não tivermos aqui uma ação coordenada, nós não conseguiremos solucionar esse problema.
O Exército tem feito um trabalho que é brilhante. Um grande ativo que nós temos no Brasil é ter um Exército como o nosso, que entende de florestas, entende de questões nacionais, entende de combate a essas questões. Mas, de fato, se nós não estivermos juntos ao Judiciário, nós não vamos conseguir solucionar esse problema.
O que nós também estamos discutindo bastante no Ministério da Agricultura é que, além desse ordenamento territorial, que é fundamental para podermos justamente responsabilizar aqueles que atuam de forma ilegal, para podermos implementar a legislação brasileira, como o Código Florestal e diversos outros, nós precisamos também desenvolver toda uma agenda de incentivos econômicos para que a floresta preservada, a exploração sustentável e a bioeconomia sejam uma alternativa econômica para as pessoas que habitam aquela região.
Nós percebemos que existe uma contradição muito grande na Amazônia: talvez seja a maior biodiversidade do mundo e ao mesmo tempo um dos menores IDHs do Brasil. Existe uma questão social — de pobreza, de renda — inerente àquela região que nós precisaremos combater. Não adianta somente nós ficarmos no comando e no controle se nós não tivermos os incentivos para uma economia sustentável que caminhe de forma paralela.
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Nós sabemos que hoje o Brasil passa por um problema fiscal muito grande e que a nossa fiscalização está comprometida. Portanto, não se torna sustentável somente uma política ambiental focada no comando e no controle. Nós precisamos de incentivos econômicos.
Parabenizo os Deputados que aprovaram o projeto de lei que dispõe sobre o pagamento por serviços ambientais, que é o primeiro instrumento para remunerar os serviços ambientais prestados por essas comunidades, produtores rurais, entre outros habitantes daquela região, Mas nós temos que seguir nessa agenda.
O Ministério da Agricultura tem uma agenda forte na questão da bioeconomia, que está sendo liderada pela nossa Secretaria de Agricultura Familiar, que, de fato, tem foco nos ativos ambientais, na exploração sustentável, na exploração de nossa biodiversidade. Há questões medicinais existentes hoje na Amazônia que não conseguimos explorar de forma sustentável, como as ervas e os óleos essenciais, e diversas questões, como o exemplo claro do açaí e vários outros produtos da Amazônia, que têm um valor agregadíssimo nacional e internacionalmente.
Nós temos algumas dificuldades, porque hoje existe uma regra muito rígida na exploração desses produtos. Temos dificuldade na questão sanitária, na comercialização desses produtos. Nós estamos de fato enfrentando esse desafio.
Aprovamos, recentemente, o Selo Arte, no âmbito do Ministério da Agricultura, para produtos artesanais. Há o reconhecimento dessas práticas tradicionais como práticas de qualidade sanitária e qualidade produtiva para exercer a comercialização. Estamos também focados na agenda das concessões florestais, que foi transferida para o Ministério da Agricultura, que, anteriormente, estava no âmbito do Serviço Florestal Brasileiro, que cuida da exploração sustentável das unidades de conservação, das terras preservadas da União, que acabaram indo para a concessão privada.
Ressalte-se um fato muito curioso que aconteceu na semana passada, quando nós viajamos para Rondônia e sobrevoamos áreas sob concessão florestal e áreas dentro de unidades de conservação e fora de concessão. A diferença é brutal: percebe-se uma tremenda preservação onde existe concessão florestal. Não existem queimada e ocupação ilegal. As trilhas são muito benfeitas e o escoamento da madeira é feito de forma certificada.
No entanto, temos um desafio relacionado à questão fiscal no País, que impede a fiscalização da forma como nós gostaríamos. Ao mesmo tempo, nós temos instrumentos, como a concessão florestal, por meio da qual é permitida a exploração sustentável pela iniciativa privada, para que promova o manejo de forma sustentável dessas áreas, mantendo e preservando a nossa biodiversidade e a nossa floresta, tornando ativas essas áreas ambientais. E nós aqui precisamos incentivar e levar a cabo essa grande agenda. Para vocês terem noção, hoje nós temos mais ou menos 1 milhão de hectares sob concessão, e o nosso planejamento no MAPA é ampliar para 3.9 milhões de hectares sob concessão florestal. Esse é um grande desafio, e nós precisaremos de muito alinhamento com o Congresso Nacional.
Outra questão é a assistência técnica. A Assistência Técnica e Extensão Rural — ATER e a Política Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural — PNATER estão hoje no MAPA, mas, anteriormente, estavam no MDA. Nós percebemos que, dentro da assistência técnica, existe um grande paradigma de ruptura. É preciso capacitar as pessoas que habitam naquela região para que abandonem práticas tradicionais de reformas, de pastagens, através do fogo, e adotem tecnologias modernas, tecnologias tropicais, desenvolvidas pela EMBRAPA, de manejo integrado do solo, com pastagem, agricultura e a utilização de bioinsumos que estamos discutindo no MAPA.
09:53
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Nós precisaremos de capacitação para que a agricultura daquela região absorva as práticas agrícolas que as Regiões Sudeste, Centro-Oeste e Sul do País já utilizam, porque, de fato, boa parte dessas queimadas foi também causada por produtores que talvez não tenham acesso a tecnologias, como outras áreas acabam absorvendo, e ateiam fogo nas pastagens. Note-se que isso acaba se espalhando por áreas ambientais. É preciso um trabalho intensivo de assistência técnica para capacitar a agricultura daquela região e também possibilitar toda essa parte de exploração da biodiversidade e da bioeconomia, porque nós temos um grande potencial que precisa ser desenvolvido.
Em relação à questão internacional, nós sabemos que a Amazônia entrou no rol das preocupações globais. Essa questão não surgiu ontem. Ela foi criada e desenvolvida ao longo dos últimos 30, 40 anos, desde a Rio 92, com diversos acordos internacionais que colocaram a questão ambiental como uma questão relevante à qual os países precisam estar atentos. Esse tema é extremamente complexo, porque envolve questões geopolíticas, científicas, ideológicas, comerciais e técnicas, ou seja, é um conjunto de questões que estruturou essa política ambiental no mundo. Nós precisamos de muita inteligência, muito cuidado e muita estratégia para participar desse debate.
No que se refere à agricultura, nós conseguimos, há 6 anos, colocar o setor agropecuário como uma solução para a discussão da sustentabilidade e não como um problema. Nós temos hoje tecnologias tropicais desenvolvidas pela EMBRAPA, como o Plano ABC — Plano de Agricultura de Baixa Emissão de Carbono, que cuida do plantio direto, da integração lavoura-pecuária, da reforma de pastagem, do próprio Código Florestal, de toda parte da nossa energia renovável, que está presente no RenovaBio. O setor agropecuário é uma importante solução e um grande contribuinte para as discussões ambientais, tanto que 70% das nossas metas relativas ao Acordo de Paris — e temos as metas da NDC brasileira — já estão implementadas. E boa parte disso está no setor agropecuário, que conseguiu ampliar suas áreas de restauração de pastagens degradadas, ir além da meta dos modelos de ILPF — Integração Lavoura-Pecuária-Floresta e ampliar sua matriz energética para energias renováveis. Então, nós estamos fazendo um trabalho para que essa geopolítica ambiental não traga ônus para o setor agropecuário.
Nós precisamos de muita inteligência e de muita estratégia para debater o tema, porque senão ele pode, sim, dar munição para aqueles que querem criar barreiras comerciais, barreiras para o nosso desenvolvimento. Então, nós precisamos de um olhar muito estratégico. Os Ministérios da Agricultura e do Meio Ambiente já têm uma visão bastante estratégica sobre esse tema. Nós precisamos, de fato, de um posicionamento muito incisivo no País, para mostrar que o Brasil tem feito grandes contribuições, seja através do Código Florestal, seja através da agropecuária, que só ocupa 30% do nosso território. Sessenta e seis por cento do nosso território é preservado com vegetação nativa. Nós temos um grande potencial de energias renováveis.
O Brasil é um país que pode contribuir muito para essa discussão. No entanto, não podemos aceitar novas imposições, restrições comerciais, a situação atual, que é uma guerra de comunicação, e que isso venha a onerar ainda mais a nossa economia. O Brasil tem grande potencial para ter uma economia renovável, que é base da agricultura, base da nossa produção de bioenergia, bioetanol, mas precisamos de fato ter de uma estratégia muito bem elaborada para que essa questão geopolítica ambiental não venha a onerar o nosso País. Mas, sim, ser um fator de competitividade.
09:57
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Eu deixo aqui as minhas palavras inicias. Sr. Presidente, agradeço a V.Exa. pela oportunidade. Quero dizer que no Ministério da Agricultura esse tema, nos últimos 20 dias, tem sido a nossa prioridade número 1. Nós temos uma grande agenda de implementação dessas questões, mas nós precisamos de um alinhamento entre Executivo, Judiciário, Parlamento e Exército, como sempre um ativo no País, para conseguirmos conciliar essa complexidade de temas que envolvem a geopolítica ambiental existente no mundo.
Eu deixo aqui as minhas palavras e agradeço a oportunidade. A Ministra Tereza Cristina envia aqui o seu abraço e seu agradecimento pelo espaço. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (General Girão. PSL - RN) - Muito obrigado, Sr. João Adrien Fernandes.
Eu solicito ao senhor — e sei que o senhor tem o compromisso de comparecer a outros ambientes aqui da Casa — que, primeiro, mantenha um representante para acompanhar os diversos debates que vão acontecer e, se possível, que retorne, porque nós temos uma sistemática na Comissão. Cada um dos integrantes da Mesa vai ter o prazo de 15 minutos. Os Deputados e os Senadores inscritos farão suas abordagens pelo prazo de 3 minutos, podendo ter um tempo adicional em função de pedidos da Liderança. A meu ver, é interessante que o MAPA indique um representante para que responda a algum questionamento no futuro. Agradeço muito a sua atenção e observação.
Dando prosseguimento à audiência pública, passo a palavra ao General Maynarde Marques de Santa Rosa, Secretário Especial de Assuntos Estratégicos da Presidência da República, por até 15 minutos.
O SR. MAYNARDE MARQUES DE SANTA ROSA - Inicialmente eu agradeço a distinção do convite do Deputado General Girão para participar deste importante fórum político sobre a Região Amazônica.
Eu farei uma abordagem sintética com enfoque geopolítico em função da interação dessa ciência com o conceito de soberania. O meu foco será na Bacia Amazônica, deixando de lado o Mato Grosso e o Tocantins que fazem parte da Amazônia Legal, onde se concentra, por sinal, a maior parte das queimadas, justamente na área de transição da fronteira agrícola.
(Segue-se exibição de imagens.)
A Bacia Amazônica é um bioma fechado e isolado do restante do continente, confinada entre os Andes e o Atlântico, o Planalto Central e o Maciço Guianense. Tem o Rio Amazonas como centro gravitacional, espinha dorsal de uma rede de 20 mil quilômetros de vias navegáveis.
O Rio Ganges, na Índia, exerce um papel geopolítico semelhante ao nosso grande rio. A Amazônia brasileira mede 4.2 milhões de quilômetros quadrados, enquanto a Índia é 15% menor, com 3 milhões, 287 mil e 590 quilômetros quadrados. A população amazônica é de apenas 18 milhões e meio de almas, enquanto a da Índia é 77 vezes maior, com 1 bilhão e 282 milhões. A população indiana ocupa todo o espaço habitável do seu país, enquanto a nossa se concentra nas principais cidades e se distende nas margens dos rios, deixando desertos grandes espaços do interior.
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O Dr. Armando Mendes, eminente pensador paraense, alertou-nos sobre o maior problema político da Amazônia, que é o seu vazio demográfico. Sem população, não há presença do Estado, fato que se agrava com a imensidade do território e a distância dos grandes centros nacionais. Por isso, a região fica relegada à condição de latifúndio político. O Prof. Armando Mendes a chamava de "megafúndio", que é o megalatifúndio político.
A configuração compacta do território favorece a preservação da integridade política e lhe dá uma vocação de autonomia. Por isso, o Grão-Pará viveu independente do Brasil por 209 anos, até o colapso do pacto colonial, em 1823. Após a Independência, eclodiu a revolta popular da Cabanagem, entre 1835 e 1840, explodindo o ressentimento nativo contra a tirania e a exploração histórica dos colonizadores. A violência generalizada consumiu 20% da população total. A Cabanagem foi sufocada pela força, mas o ressentimento ainda permanece latente no inconsciente coletivo. Nesse episódio da história, a soberania nacional foi salva pelo patriotismo da liderança rebelde.
No final do século XIX, auge do ciclo da borracha, uma migração em massa de nordestinos povoou os afluentes da Calha Sul do Rio Amazonas, onde havia abundância da seringueira Hevea brasiliensis. A Calha Norte, onde predominava a Hevea benthamiana, uma planta de produtividade inferior, manteve-se intocada. Por isso, o norte do Pará tem uma área equivalente à da Itália, mas com população igual à de Florença. Esse vazio demográfico, de 1,5 habitante por quilômetro quadrado, representa grande risco geopolítico à soberania brasileira.
As políticas governamentais para a região sempre foram reativas e descontínuas. Até a Primeira República, concentraram-se nos acertos diplomáticos de fronteiras, matéria em que muito devemos ao Barão do Rio Branco. A questão amazônica só aflorou a agenda política após o colapso do mercado da borracha, em 1914. Mesmo assim, a primeira providência concreta só aconteceu no contexto da Segunda Guerra Mundial, quando o Governo Getúlio Vargas criou a Superintendência do Plano de Valorização Econômica da Amazônia — a SPVEA e os territórios federais do Guaporé, Rio Branco e Amapá, por proposta do eminente geopolítico Prof. Everardo Backheuser, de Niterói.
Na Constituinte de 1946, houve pressões pela internacionalização da área, que foram neutralizadas graças ao empenho e à liderança do então Deputado Artur Bernardes.
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O Governo Juscelino construiu a Rodovia Belém-Brasília, em 1959 e 1960, para criar uma alternativa de acesso à região no caso de crise, como foi a dos apagões de Manaus e Belém no fim da guerra quando a frota de submarinos alemã bloqueou a foz do Rio Amazonas.
O Programa de Integração Nacional, das décadas de 60 e 70, focou na implantação da infraestrutura econômica regional, mas terminou incompleto, devido à crise do petróleo. Nessa fase, criou-se a Zona Franca de Manaus; foram construídas as Rodovias Transamazônica, Manaus-Porto Velho, Cuiabá-Santarém, Manaus-Boa Vista, além da Hidrelétrica de Tucuruí; iniciou-se a Perimetral Norte; e a COMARA concretizou a rede de aeroportos estratégicos. A partir dos anos 80, os maiores investimentos foram a BR-364, Cuiabá-Porto Velho; e as Hidrelétricas de Jirau, Santo Antônio e Belo Monte. O Plano Amazônia Sustentável, lançado em 2008, não produziu resultado prático.
Então, na situação atual, os indicadores econômicos e sociais mostram que a região continua subdesenvolvida e dependente dos incentivos do Governo Federal. Todos os Estados amazônicos seriam inviáveis sem as transferências obrigatórias da União. Lá 43% da população, quase 7 milhões de pessoas, vivem abaixo da linha de pobreza, com 5,5 dólares por dia. Mas a população cresce na proporção de 3,07%, quase o dobro da taxa média nacional. A renda per capita é pouco mais do que a metade da renda per capita do Brasil, é 56,7% da renda per capita nacional. O IDH, que é de 0,681, é inferior ao do País, que é de 0,727.
A Região Amazônica contribui com apenas 8,6% para o PIB brasileiro, apesar de ser a maior e mais rica do Brasil em recursos naturais. Os indicadores da Zona Franca de Manaus mostram estagnação, com tendência declinante. Entre 2010 e 2018, a contribuição da Zona Franca para o PIB do Amazonas caiu de 25,92% para 23,41%. Os benefícios que foram projetados para a Amazônia Ocidental, com a criação da Zona Franca, ficaram restritos à Região Metropolitana de Manaus. A Zona Franca está esgotada como modelo de desenvolvimento regional, embora seja inegável a contribuição que ela ofereceu para a cidade de Manaus e a Região Metropolitana, inclusive nos indicadores de emprego e de renda.
O contexto estratégico é preocupante. Pressões ambientalistas e indigenistas de toda ordem invalidam as políticas governamentais. Neste momento, há uma campanha psicológica em curso contra o Brasil, sincronizando operações de mídia externas e internas. No entorno da região, proliferam os ilícitos transnacionais: a Bolívia sofre a expansão do mercado de drogas; a Venezuela tende à fragmentação da ordem interna; o Suriname e a Guiana enfrentam o problema da expansão chinesa. Enquanto isso, a nossa gestão pública trabalha de mãos atadas, por uma legislação restritiva, produzida, sem filtro estratégico, desde 1988.
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Se a economia amazônica permanece estagnada, enquanto cresce a população e cai a renda per capita, pode, então, eclodir a insatisfação social. O risco aumenta na proporção da taxa de crescimento da população urbana, que é maior do que a da população rural. Portanto, é preciso agir por antecipação, criando uma nova alternativa de desenvolvimento.
A diretriz estratégica assinada pelo Sr. Presidente da República, no dia 11 de janeiro, prevê a integração da Calha Norte. Com esse fim, foi concebido o Programa Barão do Rio Branco, como um cluster geopolítico, capaz de induzir a formação do mercado regional. A sinergia do programa pode transformar Santarém em um entreposto com papel similar ao de Uberlândia no Triângulo Mineiro em relação ao Centro-Oeste e catalisar um fluxo comercial contínuo entre Manaus e Belém, viabilizando o mercado regional da Bacia Amazônica.
O Programa Barão do Rio Branco é um conceito estratégico que ainda precisa de estudos de viabilidade técnica, licenciamento ambiental e disponibilidade de recursos para a sua implementação. O programa prevê a implantação da Ponte de Óbidos sobre o Rio Amazonas e a Hidrelétrica de Cachoeira Porteira no Rio Trombetas. A ponte Barão do Rio Branco vai permitir a integração do Amapá, assim como a parte do Amazonas situada na Calha Norte e o Estado de Roraima ao sistema rodoferroviário nacional, além de abrir a possibilidade de estender a BR-163 até a fronteira do Suriname. O Porto de Óbidos pode tornar-se um importante modal hidrorrodoferroviário, por oferecer calado de 14 metros no pico da vazante, permitindo a atracação de embarcações de 30 mil toneladas e reduzindo, então, o frete hidroviário. A hidrelétrica vai aumentar a oferta regional de energia e estabilizar o balanço de carga afetado na vazante pela variação anual do regime de águas.
É preciso considerar que, quando os rios da bacia na margem sul entram no período da vazante, cai a capacidade de geração de carga em 50%. Quando a Calha Sul está na vazante, a Calha Norte está na cheia e vice-versa. Então, a construção da hidrelétrica na Calha Norte vai permitir um equilíbrio de carga o ano inteiro. A eletricidade vai, então, permitir a industrialização da bauxita, que é abundante em Oriximiná e Óbidos, criando uma vantagem competitiva para esses Municípios, que têm uma renda per capita equivalente à metade da renda per capita do Brasil. Conclusão. Sendo a Bacia Amazônica relegada ao esquecimento por três décadas, esvaziou-se o interior, cresceu a favelização urbana e estagnou-se a economia. A região pede socorro. O Brasil precisa criar condições para o empreendedorismo privado, aproveitando o potencial de recursos naturais existentes; revisar a legislação restritiva, para adequá-la o interesse nacional; enfim, recuperar a esperança da população nativa. A criação de um mercado regional autônomo e pujante pode representar uma solução permanente para o problema do desenvolvimento. A presença do Estado é a garantia da lei, da soberania nacional e da preservação das nossas riquezas naturais para gerações futuras.
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Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (General Girão. PSL - RN) - Obrigado, General Santa Rosa.
Em prosseguimento, passamos a palavra ao General Luiz Eduardo Rocha Paiva, do Instituto Sagres.
V.Exa. dispõe de até 15 minutos para a sua exposição.
O SR. LUIZ EDUARDO ROCHA PAIVA - Sr. Deputado Girão, Sras. e Srs. Parlamentares, demais senhoras e senhores, bom dia.
Eu vou tratar da geopolítica amazônica e de seus reflexos para soberania, patrimônio e integridade territorial do Brasil.
A Amazônia, meus senhores, não é problema, é, sim, solução. Mas muita gente — e muita gente fora do País — pensa que ela é solução para eles. Para quem será a solução? Tem que ser para nós.
O indígena, quero ressaltar aqui, nunca foi ameaça, mas é um instrumento da ameaça. Ele deve ser protegido e valorizado, participando, auferindo, junto com os demais irmãos brasileiros, dos bônus produzidos pelas terras em sua posse, em prol do desenvolvimento, da segurança e do bem-estar de suas comunidades, mas também da sociedade nacional.
Quero falar um pouco sobre a Amazônia e a marcha da insensatez. Todos devem conhecer aqui que, nos anos 80, Barbara Tuchman escreveu o best-seller mundial A marcha da insensatez. Ela usou de eventos históricos para mostrar como governos criam condições objetivas para futuros desastres geopolíticos quando faltam visão estratégica ou compromisso com o futuro da nação. A insensatez caracteriza a política de sucessivos governos brasileiros na Amazônia, submissos à secular cobiça estrangeira, intensificada desde 1991 sob discursos de ambientalismo e indigenismo, que são justos, mas camuflam segundas intenções.
As lideranças e a sociedade brasileira criaram, por si próprias, as condições objetivas para a ingerência internacional na Amazônia, seja pela conduta servil de lideranças, seja pela omissão da sociedade. Não adianta ficar buscando culpados. A Nação precisa conhecer o risco de não povoar racionalmente, não desenvolver responsavelmente, não integrar nacionalmente, não controlar eficazmente e não defender dissuasoriamente a Amazônia. Isso, sim, é governar com soberania.
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Hoje não existem apenas ameaças, mas também uma limitação real à soberania nacional para decidir sobre o nosso patrimônio. Bastou um governo mudar a política indígena e a política ambientalista para todo o mundo cair com pedras em cima do País.
Soberania não exime o Brasil da obrigação de usá-la com responsabilidade ambiental. Em estratégia o tempo não se conta por anos, mas sim por décadas. Portanto, erros cometidos em determinado momento, como ocorreram há 30 anos e continuam ocorrendo, terão consequências desastrosas muitos anos depois.
Vamos ver agora um pouco das vulnerabilidades na Amazônia brasileira.
A Amazônia é um território imenso, rico em recursos estratégicos, cobiçado internacionalmente e tem um vazio de população e de órgãos do Estado. Lá as ONGs ocupam espaços que caberiam ao Estado e muitas representam interesses internacionais. Elas lideram os indígenas e várias atuam para que, no futuro, eles constituem nações autônomas.
Vamos acompanhar a projeção.
Se nós temos uma região rica, cobiçada internacionalmente por potências estrangeiras e atores não estatais — ONGs, por exemplo —, e temos vulnerabilidades nessa região, nós estamos diante de uma ameaça.
Vamos ver se essa região apresenta vulnerabilidades: ela é um vazio populacional, o Estado é ausente, a região é mal integrada, é pouco desenvolvida e, portanto, tem um vazio de poder. Isso são características de vulnerabilidade. Outra vulnerabilidade: governos foram submissos a pressões externas desde 1991, quando foi feita uma pressão internacional para que a terra indígena yanomami fosse demarcada numa faixa de fronteira de um tamanho imenso, porque senão iam boicotar a Rio 92.
Eu não estou falando de fraqueza militar diante de 99% das nações do mundo, não. Se tivermos fraqueza militar diante de 1% que tem condição e cobiça sobre essa região, estamos, portanto, diante de fatores e atores de ameaças. Portanto, há a necessidade de vencer o desafio de ter um projeto de Nação, um projeto de Estado, para povoar, como eu disse, racionalmente, desenvolver responsavelmente, controlar eficazmente, integrar nacionalmente, controlar e defender a Amazônia.
Para que os senhores tenham uma ideia, em 1991 foi demarcada a reserva yanomami, que vai da Cabeça do Cachorro até o Amapá. É interessante que isso ocorreu em 1991. De lá para cá, foram criadas todas aquelas outras reservas na faixa de fronteira. Coincidentemente, exatamente na Calha Norte agora levantam a ideia do Corredor Triplo A. Isso é o que eu chamo de estratégia de ações sucessivas. Não que eles imaginassem o Corredor Triplo A, mas como houve demarcações na faixa de fronteira por pressões internacionais... Não houve nenhuma pressão militar. Só por pressão política, econômica e social o País cedeu e demarcou.
Agora vamos ver mais alguns detalhes aqui sobre isso.
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Como eu falei, não houve nenhuma pressão militar, houve cessão voluntária de soberania sobre terras indígenas e unidades de conservação na faixa de fronteira. Por que na faixa de fronteira? Porque elas pegam o nosso País de um lado e, do outro lado, outro país. Então, isso favorece a pressão internacional para uma gestão compartilhada. Já que essa imensa terra indígena compreende os dois lados da fronteira, então existe a necessidade de uma gestão compartilhada. É isso que não veem no Brasil.
Este eslaide mostra o Corredor Triplo A — comparem a primeira figura com essa —, de acordo com uma política indigenista e ambientalista voltada ou cedente às pressões internacionais.
Não sou eu que estou dizendo que existe pressão internacional. Os senhores podem acessar, no Diário do Senado, um discurso do Senador Mozarildo Cavalcanti em que, numa audiência com o Presidente Lula, o Presidente reconheceu as pressões da USP, da OEA e de diversas ONGs.
No ano de 2007, o Governo brasileiro vota favoravelmente à Declaração Universal dos Direitos dos Povos Indígenas. Essa declaração não pode passar no Congresso, porque, se passar, ficará selada para sempre a cessão da nossa soberania na região. Ela não está... mas o Governo de 2007 votou favoravelmente.
Nessa declaração consta o seguinte: os índios têm direito em suas terras de autogoverno e livre determinação de sua condição política — estranho, não é? E isso é interpretado à luz de quem? —; instituições políticas e sistemas jurídicos próprios; pertencer a uma comunidade ou nação indígena; vetar atividades militares em suas terras; recusar medidas legislativas ou administrativas em suas terras.
Nós temos 608 terras indígenas. Isso aí significa uma autonomia maior que a dos Estados da Federação. Aqueles que defendem essa declaração dizem: "Ah! mas o art. 46 diz que nenhum artigo da declaração poderá ser usado para afrontar a integridade territorial e a unidade política". Mas não fala em soberania. Se o País aceitou tudo aquilo que está ali no início, ele já cedeu a soberania.
Senhores, de que adianta integridade territorial se não tivermos soberania para explorar o nosso patrimônio, se o nosso patrimônio estiver subordinado a regras definidas pela comunidade internacional? Entenda-se por comunidade internacional as potências internacionais e os organismos internacionais.
O art. 42 dessa declaração diz que as Nações Unidas, os seus órgãos, os Estados e um conselho indígena das Nações Unidas tomarão as providências para o cumprimento dos artigos da declaração. Um dos órgãos que está nesse art. 42 é o Conselho de Segurança das Nações Unidas, que tem autoridade para declarar intervenção internacional. E o Programa Nacional de Direitos Humanos 3, em um de seus artigos, diz o seguinte: "Tornar constitucionais os instrumentos internacionais de direitos humanos ainda não ratificados no Congresso".
Se isso acontecer, nós vamos perder soberania. Volto a falar que não adianta ter as Forças Armadas mais potentes do mundo se a liderança política adota posições que criam condições objetivas para a perda de soberania sem ser necessário disparar um tiro. É isso que está acontecendo no Brasil.
Povo, território, nação e instituições políticas são nada mais nada menos que estado-nação. Teríamos 608 terras indígenas no País com todas as condições de um estado-nação. É uma vergonha que o País tenha aprovado esse acordo.
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Ao contrário da Sérvia, Bolívia e Brasil, a China, ao invés de retirar as populações da Província de Xinjiang, que eles têm lá no noroeste, onde a maioria é uigur, é turcomana, não é chinesa, o que fez? Deslocou, favoreceu, estimulou a migração de populações da etnia han para equilibrar a situação naquela região.
Em vez de nós colocarmos o indígena, dono da terra, para participar dos empreendimentos, na direção do empreendimento, para ter uma porcentagem muito grande do empreendimento e vai ter saúde, vai ter educação, vai ter tecnologia e vai preservar o seu dialeto, sua cultura, suas danças, suas festas típicas, mas vai desenvolver a sua terra para ter tudo isso. E o Brasil também vai aproveitar o bônus dessa terra, porque o subsolo, eu lembro, é da União.
Continuando. A história: parece que a nossa liderança nacional ainda não aprendeu que uma região que é rica, tem um vazio de poder, tem uma população segregada, separada dos demais irmãos — como é o indígena segregado e não integrado —, desnacionalizada, sob liderança ligada a potências alienígenas, como são as nossas ONGs, é um sinal, é um cenário de provável perda de soberania e integridade territorial, a despeito do direito internacional. É isso que está acontecendo na Calha Norte, na Amazônia, particularmente em Roraima.
E a gente tem que aprender com a história, meus senhores. A Espanha perdeu três quartos do Brasil porque não o ocupou. A Bolívia perdeu o Acre porque quem o ocupou foram os nordestinos brasileiros. A Sérvia perdeu Kosovo porque lá tinha mais albanês do que sérvio. E a Ucrânia está perdendo a sua parte oriental porque lá tem mais russo do que ucraniano. E nós estamos fazendo a mesma coisa no Brasil.
Como é que se comportam as potências internacionais no jogo de xadrez da geopolítica internacional? Aqueles conflitos que estavam lá do outro lado do mundo estão vindo para o nosso entorno. Vejam o caso da Venezuela, puseram o Brasil para escanteio e quem está resolvendo o problema na Venezuela é a Venezuela mesmo, os Estados Unidos, a China e a Rússia. O Brasil foi posto para escanteio, quando ele devia ser líder na região. Por quê? Porque não tem poder militar científico-tecnológico para isso nem poder político. E agora, com aqueles conflitos migrando para a América do Sul, para o nosso entorno, nós vamos sofrer as mesmas restrições em vários conflitos que por aí virão.
Como é que se comportam essas potências mundiais no jogo do poder? Elas têm como interesse vital manter ou ampliar o seu status de poder, para isso necessitam de um altíssimo consumo de recursos, os quais ou elas não têm em seus territórios ou precisam manter, sem explorar, para uma contingência no futuro, uma necessidade. Então elas precisam ter acesso global, em situações de maior benefício para elas. Para isso, elas têm como objetivos: exercer influência, ter controle ou presença em áreas ricas ou composição estratégica importante.
Por exemplo, o Oriente Médio e a Crimeia. Vejam que, quando a Ucrânia correu o risco, para a Rússia, de ingressar na OTAN, a Rússia foi lá e retomou a Crimeia. Vejam que a Inglaterra não devolve Gibraltar para a Espanha, e nunca vai devolver, porque é uma região geopolítica importante, e não é só pela riqueza mineral.
Então, elas têm como estratégia projetar poder, limitar a projeção de rivais e dificultar a ascensão de novos rivais. Ninguém vai invadir a Amazônia, conquistar a Amazônia, porque isso é impossível. Se não conseguem isso nem no Iraque nem no Afeganistão, não vão conseguir na Amazônia. Mas podem muito bem ocupar a foz do Rio Amazonas, numa situação posterior, e dizer: "Saímos daqui depois que assinarem esse acordo de exploração dos recursos da Amazônia", de modo que eles ficam com a grande parte do bônus e nós com a menor parte do bônus, mantendo não a soberania, porque estaria perdida, mas a integridade territorial. Isso porque administração, para eles, é problema: "Fica com vocês, mas nós vamos deixar uma base aeronaval nossa aí na foz do Rio Amazonas, pelo sim, pelo não".
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Eu queria trazer para os senhores um cenário hipotético que escrevi em 2006. Os senhores vejam que é mais ou menos o que está acontecendo agora. Os recursos da Amazônia, escassos no mundo, são interesses vitais, particularmente para as potências. A globalização exacerbou essa carência e trouxe potências globais rivais para o nosso entorno. Essas potências, coligadas ou não e com ou sem o aval de organismos internacionais, pressionam ostensivamente o Brasil nos campos político, psicossocial e econômico, científico e tecnológico, não no militar, a fim de serem atendidas em seus interesses. É estratégia indireta que está sendo colocada agora.
O Governo — e eu escrevi isso, em 2006, sonhando que um dia nós tivéssemos um governo que mudasse essa política, e agora nós temos — resiste e passa a sofrer sérios boicotes e sanções internacionais, bem como ameaças militares (está aí o Macron) de ocupação temporária, bloqueio ou danos em áreas estratégicas sensíveis do território nacional, escalando a crise e agravando as pressões, aí já numa estratégia direta. Os atores oponentes ao Brasil procuram amparar as suas ações nas questões de meio ambiente: proteção indígena, controle de ilícitos transnacionais e necessidades da comunidade mundial, camuflando os verdadeiros motivos. Esse cenário vem sendo construído há 30 anos, por meio de ações sucessivas, particularmente na Calha Norte do Rio Amazonas.
Meus senhores, é isso que está acontecendo com o Brasil.
E, para concluir, uma postagem que eu fiz recentemente no Facebook: "Amazônia — é a hora de virar o jogo".
Por que a volúpia das pressões internacionais em demarcar terras indígenas na Calha Norte do Rio Amazonas, desde o início dos anos 1990?
Começou com a demarcação da Reserva Ianomami e, desde então, 30 anos depois, a Calha Norte ficou repleta de terras indígenas e unidades de conservação, exatamente onde querem o Corredor Triplo A — coincidência, não?
Anseio da comunidade mundial? Negativo, é claro que não. Ela é apenas um instrumento conduzido por "poderosos poderes" — aquelas grandes potências mundiais.
Foram criadas, então, as condições objetivas para agora, passados 30 anos, ser proposto o tal Corredor.
Atenção! Ele tem como base as imensas terras indígenas demarcadas sucessiva e exatamente em seu traçado. Essas terras se projetam em países vizinhos, como Venezuela e Colômbia, mas não na Guiana ex-inglesa, não no Suriname ex-holandês, todos da OTAN, e não na Guiana ainda francesa.
Interessante, não?
Porque a França é um país amazônico. Eu não sei porque ela ainda não falou isso. De certa forma o Macron falou: "Estão queimando a nossa casa", entenderam? Porque eles são um país amazônico.
O que pretendem é impor a soberania compartilhada no Corredor, segundo normas alienígenas impostas adivinhem por quem?
A balcanização da Calha Norte foi uma estratégia de ações sucessivas implementadas durante três décadas. Ou seja, pouco a pouco "demarcaram" o Corredor, criando condições para a ingerência alienígena.
Em 2006 não se sabia que haveria uma proposta de um Corredor Triplo A, mas eu publiquei alguns artigos em que projetei a ameaça atual. Disse, há muito tempo, que se o Brasil não revertesse sua política indígena, estariam "criadas as condições objetivas" para uma "declaração" alienígena, comprometendo a soberania nacional nas imensas terras que iam sendo demarcadas exatamente na nossa Faixa de Fronteira. Macron e outros já fizeram tal declaração. Portanto, que nossos líderes reajam com posições firmes, não compareçam, não mandem representantes, nem reconheçam qualquer debate ou proposta vindas de fóruns como o Sínodo do Vaticano sobre a Amazônia, inclusive sobre o tal Corredor. Porque ir lá já significa reconhecer o debate; não ir lá é desconhecer tudo, tanto o sínodo como o que eles vierem a concluir, a decidir.
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Que saibam usar argumentos consistentes, apresentem propostas inteligentes e altivamente soberanas, não baseadas em bravatas terceiro-mundistas, mas sim alicerçadas nos ensinamentos da história e nos princípios da estratégia da geopolítica.
É hora de virar o jogo.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (General Girão. PSL - RN) - Muito obrigado, General Rocha Paiva.
Gostaria de fazer uma referência à presença da Deputada Aline, Deputado Pablo, Deputado Flávio Nogueira, Deputado Alcides Rodrigues e Deputada Jaqueline Cassol. Muito obrigado pelas presenças. Há outros Deputados presentes também.
E vamos dar prosseguimento.
Passo a palavra ao Sr. Ministro Leonardo Cleaver de Athayde, do Ministério das Relações Exteriores.
V.Sa. dispõe de até 15 minutos para sua exposição.
O SR. LEONARDO CLEAVER DE ATHAYDE - Bom dia a todos.
Sr. Deputado General Girão; senhores colegas expositores; S.Exas. Srs. Parlamentares; primeiro, queria dizer que é um prazer e uma honra comparecer, atendendo ao convite para participar desta audiência pública, e aqui falar em nome do Ministério das Relações Exteriores.
Entendo que o tópico da audiência é sobre as ameaças nacionais e internacionais à soberania brasileira na Amazônia. Como eu sou diplomata e represento o Ministério das Relações Exteriores, tentarei, com sua permissão, Deputado Girão, me ater principalmente à dimensão internacional desse tema e tratar da questão das ameaças internacionais.
Primeiro falamos em soberania, e esse termo é extremamente caro a qualquer diplomata. Na verdade, a soberania é nada mais nada menos do que o princípio fundamental, a pedra angular do sistema internacional. E assim é desde pelo menos o século XVII, com a Paz de Vestfália, e isso tem sido, desde então, sucessivamente reconhecido e consta de forma extremamente explícita, inclusive, da Carta das Nações Unidas firmada e adotada em 1945.
Acho que vale a pena ler alguns trechos dessa carta, porque isso é uma informação, insumo fundamental para qualquer discussão mais aprofundada. O art. 2º, § 4º, da Carta das Nações Unidas, diz o seguinte: "Todos os membros deverão evitar em suas relações internacionais a ameaça ou o uso da força contra a integridade territorial ou a dependência política de qualquer Estado". O § 7º deste mesmo artigo afirma: "Nenhum dispositivo da presente Carta autorizará as Nações Unidas a intervirem em assuntos que dependam essencialmente da jurisdição de qualquer Estado".
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Eu quero deixar muito claro o conceito de soberania. E acho que os senhores todos devem ter uma ideia, uma noção, do papel absolutamente crucial que o Patrono da diplomacia brasileira, o Barão do Rio Branco, desempenhou na delimitação das fronteiras brasileiras. Para o diplomata, a defesa da soberania brasileira é tão importante quanto é para os nossos colegas militares e para as Forças Armadas. Temos a mesma preocupação que têm os nossos colegas militares. É claro que nós lutamos pela mesma causa, temos as mesmas preocupações, mas desempenhamos funções complementares. Tanto os diplomatas quanto as Forças Armadas servem ao Brasil.
Inclusive, achei muito interessante a apresentação agora do General Rocha Paiva. E quero já deixar muito claro que tudo o que direi aqui complementará a exposição dele, que me pareceu extremamente apropriada.
Sou Diretor do Departamento de Meio Ambiente do Itamaraty, e o tema Defesa da soberania tem múltiplas vertentes e pode ser abordado a partir de várias óticas. Por esta audiência pública tratar da Amazônia, pelo tema proteção do meio ambiente constar muito das manchetes e também por eu ser Diretor do Departamento do Meio Ambiente, vou-me ater à questão da defesa da soberania no que diz respeito aos temas do meio ambiente, à proteção do meio ambiente.
Primeiro, é importante esclarecer que questões relacionadas às ameaças à soberania nacional estão presentes nas discussões sobre o meio ambiente desde os seus primórdios. Como vários expositores aqui disseram, essas discussões não se iniciaram agora, tampouco nos anos 1990, quando houve a Rio 92. Na verdade, começaram no final do século XIX, quando surgiram os primeiros movimentos e causas ambientalistas. Com o tempo, esses movimentos foram crescendo e se desenvolvendo, e o tema ambiental realmente entrou na agenda internacional, mesmo nos anos 1970. Foram nos anos 1970 que surgiram as primeiras ONGs, as mais conhecidas, que militam muito pela causa ambiental. E, em 1972, houve a 1ª Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, em Estocolmo, que tratou do tema. Antes de continuar, farei, desde agora, um caveat, uma qualificação do que vou dizer aqui. É importante que os senhores compreendam que o Itamaraty não contesta a relevância da discussão sobre os temas ambientais. Entendemos que há preocupações com relação ao tema, muitas delas legítimas, que o tema está, sim, na agenda internacional, e nós temos que lidar com isso, queiramos ou não. O Brasil também assumiu compromissos internacionais referentes a esses assuntos, e o atual Governo brasileiro já deixou muito claro que está comprometido com sua implementação e mantém esses compromissos. Mas isso não quer dizer, no que se refere a esse tema da agenda internacional, que é a causa ambientalista, assim como a outros assuntos, que não exista uma geopolítica ambiental, tema esse que outros expositores já levantaram aqui hoje.
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Isso quer dizer que a causa ambiental, que em si mesma tem sua relevância, é reconhecida internacionalmente, o que não quer dizer que não haja tentativas de instrumentalização dessas causas por atores externos que a utilizam para o próprio benefício para fazer avançarem agendas e interesses, que, muitas vezes, nada têm a ver com a proteção do meio ambiente. São, no fundo, agendas escusas, agendas econômicas, agendas relacionadas ao protecionismo comercial, por exemplo, e outras. Isso acontece, sim. E o papel do diplomata é procurar enxergar isso de forma muito clara, objetiva e realista, é ficar atento para o surgimento dessas ameaças e desenhar estratégias para com elas lidar, na medida em que adentrem a agenda internacional.
Mas, volto agora aos primórdios do regime ambiental internacional. Desde os anos 1970, os temas relacionados à soberania estiveram muito presentes. Nos seus primórdios — e isso é fato, basta aos interessados estudarem a literatura existente sobre o assunto —, desde os anos 1970, e até antes mesmo, muitos desses movimentos ambientalistas eram movidos por algumas noções bastante problemáticas, pelo menos pela ótica dos países em desenvolvimento, como o Brasil. Primeiro, havia muito a noção essencialmente malthusiana de que, na verdade, o meio ambiente comporta um número muito limitado de seres humanos, de sociedades desenvolvidas. Há um limite para isso. Esse é um fato conhecido. Inclusive, havia acadêmicos, que ocuparam posições importantes em estabelecimentos reconhecidos internacionalmente, que defendiam muito essa ideia. Houve até um pensador, um filósofo ambiental, que chegou a propor uma fórmula para especificar exatamente o número máximo de seres humanos que o planeta Terra poderia comportar. Era muito interessante esta fórmula: ele basicamente equiparou o número de ursos que havia no planeta; se não me engano, era necessário contar o número de ursos. Ele fez uns cálculos relacionados ao organismo dos animais e disse que tinha que contar o número de ursos que havia no planeta e multiplicá-lo por dois ou três. Não lembro exatamente qual era o fator, mas era uma fórmula matemática. Ele queria chegar ao número total de seres humanos que poderiam viver no planeta Terra, sem que isso causasse um dano irreversível ao meio ambiente, e esse total seria equivalente a essa fórmula em que se multiplicava o fator pelo número de ursos que havia no planeta. De fato, parecem ser posições extremistas. Mas o importante é ter presente que o tema estava ali. Havia discussões, e eram ventiladas e disseminadas ideias por acadêmicos nos debates. Isso fez reforçar e legitimar uma agenda, que era essencialmente conservacionista: "Não dá para continuar. Nós temos que congelar o desenvolvimento, principalmente de determinados países, como os países em desenvolvimento". Nos países que já estão desenvolvidos, que já são ricos, fica muito difícil reverter a riqueza e o estágio de desenvolvimento. Embora eu ache que havia até acadêmicos que achavam que isso seria, sim, possível, talvez fosse o caso de revertermos a uma idade mais primitiva do desenvolvimento da raça humana, onde seriam alterados de forma considerável os atuais padrões de consumo e produção. De qualquer maneira, em geral essa agenda conservacionista voltava-se muito para os próprios países em desenvolvimento, e havia a ideia de que o desenvolvimento tinha que ser congelado. Por exemplo, a Floresta Amazônica teria que ter seu desenvolvimento congelado, assim como o de outras florestas tropicais. Em segundo lugar, havia também uma noção, uma visão holística dos ecossistemas que foi ganhando força. E, com o tempo, foi-se solidificando e se consolidando a ideia de que as florestas tropicais em geral — e a Amazônia em particular, por ser a maior floresta tropical do mundo — tinham relevância muito grande para a proteção do meio ambiente em escala global. Essa noção foi-se consolidando e foi se legitimando mesmo a ideia de que, dada a relevância do seu papel no ecossistema mundial, a Amazônia e as florestas tropicais constituiriam uma espécie de bem comum da humanidade, como o são os oceanos, o espaço exterior, a atmosfera, o regime da Antártica.
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Então, essas ideias estão aí e, é claro, são extremamente problemáticas, porque elas caminham na trajetória da legitimação da tese de que, como se trata de um bem comum, temos de internacionalizá-lo. Bem comum tem de ser internacionalizado.
Essas ideias estavam muito presentes até os anos 80. Quem já vivia na época se lembra muito bem disso. A ideia de que a Amazônia deveria ser internacionalizada estava presente e era comentada, inclusive por alunos de colégios, em países desenvolvidos. Essa ideia era levada a sério mesmo.
Vieram os anos 90 e a negociação das primeiras convenções ambientais.
Contando a história dessas convenções, é importante ter muito presente que essas convenções, sim, surgiram em resposta, a bem da verdade, às pressões e a todo o debate acalorado que estava ocorrendo sobre a proteção do meio ambiente. Foi, portanto, uma resposta a essas pressões, inclusive a pressões que o Brasil e outros países em desenvolvimento estavam sofrendo. Mas o importante é ter presente aqui também que os termos dessas convenções não foram ditados por potências estrangeiras. Foram termos negociados e, na verdade, foi uma negociação na qual os países em desenvolvimento, pelo menos na Rio-92, se saíram muito bem.
Eles deram um contragolpe político nessas agendas conservacionistas que apontavam muito o dedo, inclusive, para o Brasil, para a Amazônia e para outros países em desenvolvimento, como se fôssemos a principal causa dos problemas ambientais mundiais. Isso foi revertido, em larga medida, com os instrumentos adotados na Rio-92.
O que fizeram esses instrumentos? Por exemplo, na Declaração do Rio sobre meio ambiente e desenvolvimento, em 1992, veremos que o Princípio 2 afirma muito claramente que os Estados têm o direito soberano de explorar seus próprios recursos, segundo suas próprias políticas de meio ambiente e desenvolvimento.
Trata-se, portanto, de questão muito importante, porque a noção, primeiro, da afirmação da soberana dos Estados sobre a exploração de seus recursos, e, segundo, da ideia do direito ao desenvolvimento dos Estados, vai na contramão da agenda conservacionista. Isso gera um enfoque completamente diferente para o tratamento do tema.
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Esse conceito sugere, na verdade, o contrário do que rezava a agenda conservacionista, ou seja, a ideia de que não há solução para os problemas ambientais que não passem pela questão do desenvolvimento. Tem de haver desenvolvimento econômico. O tratamento eficaz dos problemas ambientais exige o desenvolvimento econômico.
De modo que essa ideia que surgiu na Declaração do Rio é muito fácil de exemplificar, tal como um problema ambiental importante que existe no Brasil e em outros países em desenvolvimento, que é a questão dos lixões, dos aterros sanitários. O que são os aterros sanitários? O lixão. Há lixão ou aterros sanitários, como existem no Brasil, em países desenvolvidos? Não há. Esse é um resultado e uma consequência do subdesenvolvimento, da falta de desenvolvimento.
O fato é o seguinte: os lixões afetam o meio ambiente de forma negativa, pois emitem gases de efeito estufa, principalmente o metano. Eles agravam o problema da mudança do clima. Pode-se tratar de lixão e de aterro sanitário sem desenvolvimento econômico? É óbvio que não. Então, acho que esse exemplo ilustra muito bem a questão.
Está presente não apenas na Declaração da Rio-92, mas também nas demais convenções ambientais adotadas na época, o princípio que estabelece as responsabilidades comuns, porém diferenciadas. Esse é o princípio basilar das convenções e a sua inclusão nas convenções ambientais adotadas na Rio-92 foi uma grande vitória dos países em desenvolvimento. Também esse conceito se contrapõe àquela tendência que havia antes de apontar para os países em desenvolvimento a causa dos problemas ambientais. O que está por trás desse princípio é que, na verdade, as responsabilidades históricas pelos problemas ambientais mundiais são causadas pelos países desenvolvidos. Por exemplo, na questão da mudança do clima, os grandes emissores não são os países em desenvolvimento, mas os países desenvolvidos. Os países em desenvolvimento são vítimas do problema e precisam, inclusive, contar com financiamentos para que possam fazer frente a esse problema. Perdão, General. Eu sei que eu estou me entendendo muito, mas pediria para falar por mais 2 minutos para tentar resumir e finalizar.
Assim surgiram essas primeiras grandes convenções ambientais. O regime que se estabeleceu no início atendia, sim, aos nossos interesses. Todavia, é importante ter presente que as tentativas de instrumentalizar a agenda ambiental, esses foros e regimes criados continuaram e continuam até hoje. Isso está mais do que evidente, inclusive no âmbito dessa confusão atual com a qual nós estamos lidando, dessa crise que tem muito nos ocupado nas últimas semanas.
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Um assunto, uma questão para a qual nós estamos muito atentos é que o conceito com o qual o Brasil está trabalhando é o de que proteção do meio ambiente exige desenvolvimento econômico. Então, tem que ser dada uma resposta ao desenvolvimento, para que seja dada uma resposta efetiva à preocupação com a proteção do meio ambiente. Mas existem, sim, atores que vêm procurando reverter a ótica que se consolidou a partir da Rio 92 com uma outra noção, que na verdade nos remete muito aos anos 80 e 70, que é essa ideia da securitização da agenda ambiental. Tem havido já, há anos, tentativas por parte de alguns países de levar a discussão sobre proteção do meio ambiente para o Conselho de Segurança das Nações Unidas. E a essas tentativas nós temos nos contraposto. Temos nos oposto a isso e continuaremos nos opondo.
O importante é ter presente que essa agenda... É claro que muitos objetivos políticos estão sendo perseguidos pelos atores que em prol dela advogam, mas, em boa medida também, é importante ter presente que há, inclusive, um interesse desses países que defendem a securitização da questão ambiental em desviar o foco das discussões de meio ambiente e, principalmente, da questão do desenvolvimento econômico. São países que, por exemplo, têm obrigações internacionais de prestar assistência ao desenvolvimento. E isso está sendo feito inclusive porque se consolidou, no âmbito das convenções ambientais, a ideia de que o direito ao desenvolvimento é importante, de que tem que ser dada uma resposta à questão do desenvolvimento econômico. Parece que, em alguma medida, os países que agora advogam em prol da securitização dessa agenda voltada para as questões do desenvolvimento buscam justamente deixá-la de lado, por causas óbvias.
Securitização da agenda ambiental significa tratar dos temas ambientais da ótica da segurança e da defesa, ou seja, levá-los para o Conselho de Segurança para discutir até mesmo intervenções militares em países que se julgue que estejam adotando políticas que comprometem o meio ambiente em escala mundial. Isso, diga-se de passagem, é contrário à Carta das Nações Unidas. Eu li, logo no início, o artigo segundo da Carta das Nações Unidas. Em princípio, aliás, na sua letra, diz claramente que esse tipo de intervenção não é legítimo, não é aceitável. Mas há essa ideia, sim, de defender que, talvez, em determinadas circunstâncias...
Pelo menos esse é o risco que existe. Ainda que esses países não explicitem isso dessa forma e não digam: "Nós queremos atacar países que tenham políticas ambientais com as quais não concordamos" — isso não é dito de forma tão explícita —, as potenciais implicações são as mesmas.
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Então, é claro que esse assunto está sendo tratado com a maior seriedade pela nossa diplomacia.
Eu acho que já me estendi demais, mas estou aberto ao prosseguimento do debate.
Obrigado, Deputado General Girão. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (General Girão. PSL - RN) - Muito obrigado, Sr. Ministro Leonardo. Realmente o tema é muito difícil de ser esgotado em 10, 15, 20 minutos. Talvez nós devêssemos fazer isso da maneira como estamos fazendo aqui, bastante racional e por mais tempo.
Gostaria de destacar também a presença do Deputado Arthur Oliveira Maia, um dos coautores desta audiência pública.
Passo a palavra agora ao Prof. Pio Penna filho.
V.Sa. dispõe de até 15 minutos para a sua exposição.
O SR. PIO PENNA FILHO - Bom dia, Presidente. Gostaria de agradecer o convite que me foi feito pelo Deputado General Girão e pelo General Rocha Paiva para poder participar deste debate. Também estendo o meu desejo de bom dia a todas e a todos que estão aqui presentes.
O tema Amazônia suscita um debate acalorado e, em determinados momentos, pouco consensual. É como nós estamos vivendo agora: ou se é contra ou se é a favor. Para uns, há uma ameaça à soberania do Brasil sem fundamento nenhum. Para outros, há uma ameaça com fundamentos muito claros.
A minha fala vai ser mais no sentido de buscar tecer algumas ponderações sobre a temática da Amazônia e a importância de um debate permanente sobre esse tema. Uma outra coisa que fica muito clara é que se trata de uma temática que surge e ressurge no debate internacional. Às vezes, ela vem com mais intensidade. Outras vezes, ela vem com menos intensidade. Ela é alvo recorrente; porém, não permanente.
Então, nós acabamos perdendo a possibilidade de observar ou de implementar políticas contínuas com relação à Amazônia. Eu acho que esse é um dos primeiros problemas que temos que enfrentar. No Brasil — estou dizendo no geral —, há uma baixa consciência sobre a Amazônia, sobre o que ela representa para o Brasil, sobre o que ela representa para o mundo.
O que pauta a Amazônia e leva a debates como este? Cenários, por exemplo, como o que nós vivemos agora: queimadas que fugiram ao controle, que se ampliaram, associadas a uma pressão internacional muito forte.
A baixa consciência nacional sobre a Amazônia, para mim, é notável. Sou professor num dos melhores cursos de Relações Internacionais do Brasil, se não for o melhor. Eu pergunto aos meus alunos, que formam uma elite nacional que estuda Relações Internacionais: "Vocês conhecem a OTCA?" Em determinadas salas, nem um aluno já ouviu falar da OTCA — Organização do Tratado de Cooperação Amazônica. Isso é sintomático. Se os alunos da elite nacional não conhecem a OTCA, que é simplesmente uma organização internacional sediada em Brasília e voltada para os assuntos amazônicos, que nós consideramos extremamente relevantes e estratégicos no País, imaginem o resto da população?
11:05
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Portanto, o debate acaba ficando muito centrado na temática ambiental. Isso é natural. O que ocorre é como se pauta esse debate. Como o tema que nós estamos discutindo é as ameaças à Amazônia e à soberania, ameaças internas e externas, temos que observar com uma certa equidistância.
Geralmente, nos debates, nós deixamos de lado questões que são extremamente sensíveis, por exemplo, as atividades ilegais; o garimpo; a biopirataria; o tráfico internacional; o desflorestamento; as ocupações ilegais; a ameaça à integridade dos povos indígenas. De fato, temos uma série de ameaças internas, e é claro que essas ameaças internas à Amazônia têm reflexos no exterior. Por quê? Aí entram os interesses muito divergentes e múltiplos que existem quando nós pensamos em Amazônia.
Nós temos lá os interesses fundiários de fazendeiros; a expansão da fronteira agrícola; a ação de organizações não governamentais — algumas atuam de forma, na minha opinião, sincera; outras, não; mas não dá para demonizar todas elas —; a ação de religiosos; a ação de ambientalistas. Principalmente essas três últimas que eu falei — organizações não governamentais, religiosas e ambientalistas — têm fortes ramificações externas. É claro que isso potencializa um discurso ambientalista que também é um discurso militante.
Mas eu chamo a atenção para o seguinte: não se trata de um discurso sem fundamento. Por quê? E aí, na minha opinião, está o "x" da questão. Quando o Brasil se faz mais presente na Região Amazônica, com políticas públicas claras, com fiscalização, com uma abordagem mais positiva e propositiva, a imagem que se tem do País no exterior é outra. Uma notícia, por exemplo... E pelo amor de Deus, porque eu não estou aqui falando para defender ou atacar esse ou aquele governo, não!
Vou dar um exemplo para os senhores. Em 2012, uma matéria foi publicada, no site UOL, com a seguinte manchete: ONU usa Amazônia como exemplo para outros países diminuírem o desmatamento ilegal. A ideia era completamente oposta, mas o que estava acontecendo aqui nesse período? Primeiro também não existia, em cenário internacional, o oportunismo, no caso, de um líder francês, que queria aproveitar o momento para usar o discurso a seu favor, de acordo com o seu interesse. Nós tínhamos aqui — parece-me, porque eu não estudei esse detalhe — uma política de fiscalização mais efetiva.
Vamos lembrar o seguinte: os últimos anos no nosso País, desde o segundo Governo da Presidente Dilma até agora, no início deste Governo, nós ficamos completamente à deriva. Houve uma sucessão de crises, ou seja, um estado de crise interminável, que praticamente paralisou as ações que demandariam continuidade no País, afetou a política externa, afetou políticas internas. Agora é que nós estamos voltando a nos recompor, a nos reorganizar, em termos de um cenário previsível. Há um Governo que deve cumprir o seu mandato de 4 anos, e a vida continua. Então, eu chamo a atenção para o fato de que não dá para tratar essas questões com radicalidade, não dá para o Brasil usar a política que vinha usando há muito tempo, há muito tempo não, desculpe, mas que já chegou a usar em determinado momento da história, de soberania absoluta, de resolver as questões amazônicas fechando a Amazônia.
11:09
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É inevitável que o tema Amazônia, o tema ambientalista, associado ao aquecimento global, associado a um movimento extremamente ativo neste campo no plano internacional, principalmente nos países mais desenvolvidos, ele não vai desaparecer da agenda, não vai. É interessante essa história da Amazônia, porque os portugueses, e depois os brasileiros, no século XIX, tinham até uma política um pouco contraditória. No caso, o objetivo dos portugueses, e depois o dos brasileiros, era fechar a foz da Amazônia para impedir qualquer penetração, ao mesmo tempo que forçavam a abertura da navegação na Bacia do Prata.
Já no século XIX, houve uma primeira pressão internacional concreta, uma missão foi enviada, não uma missão oficial, mas o norte-americano esteve na Amazônia fazendo um levantamento para uma ação concreta de transferência de escravos e de propriedades rurais do sul dos Estados Unidos para a Amazônia brasileira. Isso foi no final de 1850, já quase se aproximando da guerra civil americana. E aí o Brasil usou diplomacia ativamente para conter aquela iniciativa e impedir que o tema se desdobrasse.
Depois, no século XX, nós tivemos de novo, como bem colocado pelo Ministro do Itamaraty, a volta da discussão da Amazônia nos anos 70, e depois nos anos 90, com relação à temática ambiental, não apenas ambiental, mas a questão indígena também desperta interesse no plano externo.
A questão que eu coloco é que o grande problema da Amazônia é que ela precisa de mais atenção por parte das autoridades estaduais e federais. Parece óbvio isso. A melhor forma de afastar qualquer ameaça e pressões externas ou mitigá-las é aumentando a presença do Estado. Como? Com políticas contínuas, porque, na estrutura que há hoje, quais setores estão mais presentes na Amazônia — hoje não, há décadas? São os militares, as Forças Armadas, com destaque para o Exército. As outras instituições brasileiras participam pouco ou se envolvem pouco na temática amazônica, e a ausência do Estado ou a precariedade da ação do Estado é que causa situações como esta que nós estamos vivendo agora e que nos levou a esta discussão aqui, que foi a perda de controle, o aumento de queimadas, a exposição internacional, ou seja, o aproveitamento internacional, a exploração internacional nesse aspecto.
11:13
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Eu gostaria também de chamar atenção porque falamos muito na Amazônia sob a perspectiva nacional, mas nós temos que lembrar que se trata da Pan-Amazônia. Nós temos aqui uma vasta região, que é compartilhada por nove países, sendo que, claro, o Brasil tem a maior parte dela. Quase 60% da Amazônia estão no Brasil, mas são nove países. Afinal, eu fico intrigado: para que serve a OTCA? Qual o grau de cooperação com os países vizinhos? Se nós identificamos aqui na fala de todos os meus predecessores que é necessário desenvolver a Amazônia para preservá-la, esse desenvolvimento seria muito mais inteligente se pensado numa dinâmica regional, porque o problema que acontece na fronteira, digamos, na Amazônia colombiana, na Amazônia peruana, desdobra-se para cá e vice-versa. A ideia é pensar na integração Pan-Amazônia, porque não é só o Brasil. É uma coisa que eu penso e não é à toa que os meus alunos não conhecem o que é a OTCA. Se fizerem essa pergunta na rua, ninguém vai responder. Para que serve a OTCA? O que ela tem feito, o que fez a OTCA? Ela está aqui em Brasília. Um aluno meu foi fazer estágio lá e desistiu.
Então, são reflexões que acho oportunistas. Não deveríamos afastar, digamos assim, radicalizar o discurso do eles contra nós. É claro que a cobiça internacional com relação a recursos amazônicos existe. Essa coisa da fazemos fronteira com a França — e não é uma fronteira pequena, são 730 quilômetros de fronteira, a maior fronteira da França é com a gente — é um anacronismo, sim. O que a França está fazendo aqui até hoje? Esse é um resquício colonialista.
Sim, os franceses são racistas, são colonialistas — estou generalizando, é claro que não são todos —, eles ainda pensam como no século XIX, que têm uma missão civilizatória a cumprir pelo mundo afora, que são os portadores da civilização. Vão ver o que eles fizeram lá na África e continuam fazendo lá nas antigas colônias africanas. Desde a descolonização, vamos colocar de 1960 para cá, os franceses fizeram mais de 40 intervenções militares na África. Essa ideia de soberania para os franceses é absolutamente relativa. Eles têm bases permanentes em alguns países africanos. Eles não têm o menor pudor em pensar que a ação militar externa deles é legítima.
Então eu acho natural sim que haja despertado a atenção aqui no Brasil as falas do Presidente Macron, com certeza, porque é muito fácil quando nós pensamos em política internacional, em política externa, a construção de argumentos que fundamentem determinados interesses.
11:17
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No caso do Brasil, há uma vulnerabilidade enorme na Região Amazônica em relação a isso, como foi lembrado pelo General Rocha Paiva. Por exemplo, o mais grave, na minha opinião, é a questão do território ianomâmi. Se nós formos pensar nos fundamentos do Estado-Nação, veremos que eles têm um território, uma língua, um costume, um povo, todos os requisitos para se tornarem um dia um Estado, todos, todos. E existem várias outras reservas. É claro que são importantes políticas específicas para as populações indígenas que são abandonadas pelo Estado brasileiro. Isso também é inegável. Não dá para dizer que o índio é tratado como um cidadão brasileiro, porque não é.
O Brasil é um país, na minha opinião, multiétnico e multinacional. Aqui não se fala apenas português, não. Falam-se várias outras línguas, que nós não reconhecemos, que são as línguas das populações indígenas, e esse é um tema também interessante do debate internacional, que é como ele tem sido apropriado ultimamente. Por exemplo, os noruegueses dizem que investem muito na Amazônia por conta da defesa das populações indígenas, para o bem-estar delas. Se isso é sincero, eu não sei, mas é o que eles alegam. Eles falam assim lá: "Nós estamos investindo aí por uma questão ambiental, mas também para o bem-estar das populações indígenas, para o desenvolvimento delas."
Então, dos dois lados, há problemas e ameaças internas à Amazônia, por conta da baixa fiscalização que é resultado de uma presença insuficiente do Estado na Pan-Amazônia e também de falta de ações coordenadas mais claras entre o Governo Federal e os Governos Estaduais. Esse é outro ponto. Geralmente quem está aqui em Brasília pensa assim: "Olha, o Brasil é a partir daqui", digamos, da capital, e perde a dimensão regional. Isso é muito interessante principalmente com relação à fronteira.
Essa é uma questão que não tem uma solução militar, não tem uma solução diplomática, ou seja, essa questão envolve um conjunto de ações que devem necessariamente ter continuidade, inclusive aumentando o grau de consciência nacional acerca da temática amazônica.
Obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (General Girão. PSL - RN) - Muito obrigado, Prof. Penna Filho. Desculpe-me por ser o portador desse controle, mas esse é um dos papéis que exercemos aqui.
Encerradas as exposições, passemos aos debates. Pela ritualística da Casa, primeiro fazem uso da palavra os requerentes desta audiência pública.
Então, por uma questão de facilidade, vamos convidar o Deputado Arthur Maia para fazer uso da palavra.
V.Exa. tem até 3 minutos para fazer a sua abordagem.
O SR. ARTHUR OLIVEIRA MAIA (DEM - BA) - Sr. Presidente, eu quero parabenizá-lo por ter tido a iniciativa desta audiência. Nós apenas subscrevemos o requerimento de V.Exa.
Quero saudar, na pessoa de V.Exa., todos os integrantes da Mesa, até por uma questão de economia de tempo, que, como os senhores podem notar, é muito escasso.
11:21
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Amanhã irei à Austrália e à Nova Zelândia com um grupo pequeno de Deputados com o propósito de avaliar as condições indígenas e as relações governamentais desses países com os seus índios. Essa viagem é consequência do trabalho de relatoria, que me foi empenhado aqui na Casa, do Projeto de Lei nº 490, que trata da questão indígena, e, mais recentemente, do trabalho de relatoria da Comissão Especial — apesar de não ter sido instalada ainda — que vai tratar do problema referente à produção agrícola em terras indígenas.
Esse tema indígena me parece um tema conexo ao tema amazônico. Não há como afastarmos essas duas questões. Eu lamento, mas lamento profundamente ter chegado atrasado, porque eu queria muito ouvir a palavra do General Rocha Paiva como também do General Santa Rosa. Eu tive oportunidade de ouvir os outros palestrantes, o que me foi muito importante.
Eu concordo plenamente com o Prof. Pio Penna sobre essa relação sempre de muita cobiça que existiu dos Estados Unidos para com Amazônia.
Não sei se o senhor conheceu o livro de um historiador americano chamado Geraldo Horne, intitulado O Sul mais distante, que fala justamente de 1850, quando houve a tentativa de fazer a colonização da Amazônia, exportando negros do sul dos Estados Unidos para a Amazônia. O Jorge Caldeira também trata desse tema com profundidade na biografia de Visconde de Mauá.
Então, esse é um tema obviamente recorrente. Eu concordo, como aqui já foi dito, que temos pouco conhecimento da Amazônia, e o pouco conhecimento que temos é um conhecimento absolutamente infantil conduzido pela decisão midiática. É muito simples se colocar na televisão que está havendo queimadas na Amazônia quando não se diferencia o que é queimada e o que é desmatamento. É muito fácil se falar em preservar a Amazônia, como se fosse possível fazer uma cerca, trancar a Selva Amazônica e fazer com que aquilo ali permaneça intacto por toda a eternidade.
Essa discussão ambiental é uma discussão muito mais complexa, sobretudo em épocas de debates absolutamente superficiais que vivenciamos hoje nas redes sociais. É muito difícil apresentar argumentos mais profundos, argumentos que tentem conciliar a questão da subsistência das pessoas que vivem na Amazônia, que tentem conciliar a questão da própria preservação da selva e, ao mesmo tempo, fazer com que as pessoas compreendam que só haverá preservação se houver desenvolvimento econômico para aquelas populações que lá residem.
Enfim, tudo isso é muito complexo. Quando ocorre um incêndio qualquer e um sujeito pega uma foto de uma queimada, que pode ter acontecido na Austrália, ou nos Estados Unidos, ou em qualquer lugar, e bota lá com um animal cercado de fogo, morrendo abraçado com um filhote, aquilo se transforma num argumento. Não há palavra sensata e verdadeira que se possa oferecer em oposição àquilo que seja recepcionada por aquele que está vendo aquela imagem.
Então, eu acho que esta Comissão, meu caro Deputado General Girão, precisa ter uma atitude mais proativa em relação à Amazônia, porque, afinal de contas, como também vários expositores colocaram, esse debate só vem à tona em momentos de crise. Por exemplo, como houve lá esses incêndios, agora temos que tomar conta. Mas isso não é verdade. É preciso que haja, por exemplo, uma rediscussão.
11:25
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Eu volto ao tema que eu estou abordando mais diretamente nesse meu mandato, que é a questão indígena. Não é razoável que se imagine que no Brasil haja uma população indígena na casa de 2 milhões e que dois terços dessa população esteja abaixo da linha da pobreza, apesar de todos os investimentos que o Governo brasileiro tem feito, que não é pouco, que tem sido objeto inclusive de episódio de corrupção repetidamente noticiado. Não é possível que essa população tenha 13% do território nacional de terras aptas a produzir e continue em estado de absoluto abandono, abaixo da linha da pobreza. Alguma coisa está errada nessa conta, Deputado General Girão. Se eles têm terra, se há investimento, alguma coisa está errada nessa conta.
Então, é preciso que nos deparemos com esses problemas para que possamos de fato definir o que é possível se fazer em termos de investimento na Amazônia e ter, sim... É claro que eu tenho divergência em relação a muitos posicionamentos do Presidente Bolsonaro, mas temos que apoiar o Governo brasileiro na defesa da nossa soberania com relação à questão Amazônica.
É corretíssima a colocação do Prof. Pio Penna. Essa condição de Estado sui generis francês é uma contradição com os tempos atuais. Esse colonialismo francês, que vem desde o século XVII, XVIII, atravessou os tempos como se não tivesse havido nenhuma evolução dos povos que eles colonizam. Não é razoável que tenhamos uma Guiana francesa aqui ao lado. Não é razoável que a França esteja presente de uma maneira imperialista em pleno século XXI e queira nos dar lição de como devemos tratar a nossa floresta amazônica. Eles não têm moral para isso.
De fato, o momento que nós estamos vivendo é um momento que nós devemos evocar, até por estarmos numa reunião da Comissão de Relações Internacionais, uma passagem memorável na vida de Rio Branco. Quando a França disputava conosco o Território do Amapá, e ele tinha que ir lá fazer a defesa da posição brasileira, antes de sair daqui ele dizia: "Não podemos brigar. Nós temos que derrotá-los na força do argumento". E, com brilhantismo excepcional, ele conseguiu manter o Território do Amapá como parte do Brasil.
Este momento que nós estamos vivendo demanda justamente a capacidade e a inteligência de todos nós. Eu vejo aqui a representação das nossas Forças Armadas, através dos Generais aqui presentes, e dos militares, e eu sei que os senhores têm um profundo conhecimento desse assunto, e eu entendo que temos que nos organizar para fazer um debate mais proativo. Nós temos que nos colocar antes que aconteçam episódios como esse que aconteceu no mês passado, porque os nossos opositores se aproveitam de episódios como esse para apontar o dedo contra nós, como se fôssemos criminosos, quando, na verdade, existe por trás de tudo isso uma luta comercial muito clara contra o nosso agronegócio. Não tenho dúvidas de que, por trás de muitas — não vou dizer que são todas — ONGs que se falam defensoras da Amazônia ou se falam defensoras dos índios, existem propósitos que são impossíveis de serem mostrados à luz do dia, porque escondem, na verdade, intenções de competições comerciais, que nós sabemos que existem. Esse argumento tem sido usado muito mais como uma forma de combate comercial. Esta reunião é muito importante, Deputado General Girão. Nós temos que dar sequência a esta conversa. Eu acho que inclusive seria razoável marcarmos uma visita à Amazônia. Como Relator do Projeto de Lei nº 490, de 2007, estamos tentando organizar uma ida ao Alto Xingu e à Amazônia para visitar as tribos, a Raposa Serra do Sol e os ianomâmis. Isso é necessário para esse trabalho que, na verdade, quase vai escrever o Estatuto do Índio no Brasil.
11:29
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Então, eu quero pegar os contatos dos senhores depois. Acho que temos que estreitar essa relação, porque é muito importante que não encerremos esta conversa ao concluirmos a reunião. Não pode haver solução de continuidade se, de fato, queremos dar uma ajuda ao Brasil e defender as nossas posições.
Parabéns a todos os senhores!
Mais uma vez, peço desculpas pela minha ausência no começo da reunião. Eu estava na CCJ.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (General Girão. PSL - RN) - Obrigado, Deputado Arthur Oliveira Maia.
Convido V.Exa. para ocupar a Presidência, enquanto eu me dirijo aos debatedores e a todos os presentes. (Pausa.)
Deputado Arthur Oliveira Maia...
O SR. ARTHUR OLIVEIRA MAIA (DEM - BA) - Pois não. Desculpe! (Pausa.)
O SR. PRESIDENTE (Arthur Oliveira Maia. DEM - BA) - Passo a palavra ao nosso Presidente e autor do requerimento, o Deputado General Girão.
O SR. GENERAL GIRÃO (PSL - RN) - Mais uma vez, eu gostaria de agradecer a presença de todos e dizer que participar desta audiência pública, para nós, tem sido praticamente uma história de vida. Quem me conheceu no Exército sabe que dediquei quase 15 anos da minha vida à Região Amazônica. Tenho algumas afirmações sobre as quais pediria àqueles que estão presentes e que vão nos assistir daqui a pouco na TV Câmara refletissem sobre elas. São algumas frases, e eu gostaria de dizer a primeira.
Prof. Penna Filho, eu sei que o senhor se manifestou bem claramente sobre isso e não falou diferentemente do que vou falar. A Amazônia não é problema. A Amazônia é solução. A Amazônia brasileira é a solução para o nosso País sair de todo o atraso que nós temos e chegarmos a um Brasil que é o País do presente. Outra frase que já foi cantada em verso e prosa por artistas brasileiros é que o Brasil não conhece o Brasil. O senhor falou muito bem isso. O Brasil não se conhece!
Muitos de nós aqui — o General Santa Rosa participou de vários debates durante muito tempo, bem como o General Rocha Paiva, que inclusive foi Comandante da Escola de Estado-Maior e, com isso, levantou muitas discussões sobre o problema amazônico — precisamos, sim, conhecer a Amazônia brasileira.
11:33
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Eu não quero me dedicar aqui agora à situação das demarcações das terras indígenas. Fui profundo estudioso do assunto, inclusive dediquei parte da minha carreira militar a tentar assessorar dois Presidentes da República em relação ao problema da demarcação de uma terra indígena só, a Terra Indígena Raposa Serra do Sol, e acabou que a demarcação aconteceu de um jeito... Quando o senhor conseguir levar essa comitiva lá, espero poder estar presente nessa comitiva também. A realidade da terra indígena é degradante. Hoje eles morrem de beribéri e de algumas outras doenças e estão realmente em situação bastante difícil.
Eu queria que, nas suas considerações finais, os senhores opinassem sobre isso. Não quero aqui falar mal de ninguém, mas lamento que tenha faltado a Governos brasileiros anteriores um sentimento de brasilidade, de nacionalidade — eu não digo nacionalismo exacerbado, eu digo sentimento de brasilidade mesmo —, porque aceitaram que pressões internacionais fossem determinantes para a intervenção no nosso País. Como já dito aqui, à soberania não se renuncia. Soberania não se negocia; soberania é exercida. O País tem que ser soberano. Se você não for soberano, vai aparecer alguém para dar ordem a você como ser humano, como pessoa física ou pessoa jurídica, até na sua casa. Então, esses compromissos internacionais não podem ser motivo de nós estarmos aqui assim.
Existem ONGs que fazem excelente trabalho na Amazônia — eu vi isso de perto; muitos de nós talvez tenhamos visto —, mas são mais de 100 mil! Eu acredito que o número é inverso. Poucas delas conseguem fazer trabalhos realmente de louvor, grande parte está lá para desfazer e interferir na nossa soberania, haja vista vídeos e realidades que nós temos de algumas situações em que não se consegue circular no território nacional.
Eu mesmo fui impedido de estar presente numa reunião numa comunidade indígena porque havia uma negociação feita com o então Presidente da República e um secretário que foi fazer a visita e ele disse que tinha combinado com o bispo A, B ou C que eu não poderia estar presente naquela reunião. Isso foi um absurdo que carrego até hoje na minha vida e estou desabafando com os senhores. Isso aconteceu quando da demarcação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, uma discussão que estava no Supremo Tribunal Federal e que acabou como nós sabemos que acabou.
Eu gostaria de não falar muito, eu gostaria de agradecer aos senhores realmente — vamos ter daqui a pouco uma oportunidade para os senhores externarem as suas opiniões —, mas eu gostaria de terminar a minha abordagem lembrando uma frase cunhada na década de 70 aqui no Brasil pelo cidadão, que por acaso era militar, General Rodrigo Octávio. Essa frase está presente hoje em quase ou senão em todos os quartéis do Exército da Amazônia brasileira. Ele disse o seguinte: "Árdua é a missão de desenvolver e defender a Amazônia. Muito mais difícil, porém, foi a de nossos antepassados de conquistá-la e mantê-la".
11:37
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Hoje a nossa missão é essa. Precisamos desenvolver a Amazônia, precisamos caracterizar a conquista da Amazônia, precisamos exercer a nossa soberania na Amazônia — exercer a soberania utilizando os recursos amazônicos de maneira racional e ecológica, com certeza absoluta, em respeito ao meio ambiente e em respeito aos que moram lá, mas também em respeito aos brasileiros que precisam dos recursos amazônicos para sermos um país desenvolvido.
Essa responsabilidade nós precisamos exercê-la, sim, independentemente do que pensem outros países. Nós temos que ter a soberania de decidir — é claro que decidir com responsabilidade. Não vamos tocar fogo, não vamos destruir o que temos. A destruição neste momento deverá ser combatida. Acredito fielmente que não é isso que estamos fazendo.
Eu gostaria que os senhores pudessem opinar sobre isso no final.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Arthur Oliveira Maia. DEM - BA) - Eu convido o próximo orador inscrito, o Deputado Nicoletti, para fazer uso da palavra.
O SR. NICOLETTI (PSL - RR) - Nobre amigo Deputado Arthur Oliveira Maia e Deputado General Girão, que foi o nosso Comandante na 1ª Brigada de Infantaria de Selva e também Comandante do 7º Batalhão de Infantaria de Selva em Roraima, para mim é um prazer estar aqui falando. Fui militar do Exército por 15 anos, servi nas nossas fronteiras também em Tefé, no Amazonas. Sou conhecedor dessa região de fronteira.
Eu gostaria de parabenizar pelo excelente serviço prestado pelas Forças Armadas, não só o Exército Brasileiro, como também a Marinha e a Aeronáutica, que têm feito excelente trabalho na Região Amazônica. Só quem serviu lá, ou quem conhece, realmente sabe o serviço que um soldado consegue realizar nessas condições que a Amazônia nos proporciona.
Eu acho importante que os Parlamentares possam fazer algumas viagens em comitivas. Eu trabalhei em Tefé, na área de comunicação social, também na 16ª Brigada, recebendo vários Parlamentares. Ali eles conhecem os pelotões de fronteira e os destacamentos e sabem da realidade pela qual o militar passa em defender a Amazônia, a nossa soberania. Isso é de suma importância. Nós sabemos que a Amazônia tem a biodiversidade da fauna e da flora e a sociodiversidade com quilombolas e povos indígenas. É importante mantermos esses povos indígenas também com atenção.
São de suma importância as ações cívico-sociais que o Exército e a Marinha realizam pelos rios na parte ocidental da Amazônia, onde as comunidades indígenas só têm assistência do Governo Federal pelas Forças Armadas. Através de barcos regionais, de balsas, são levadas medicações e muitas das vezes o primeiro atendimento médico àquelas comunidades indígenas. É importantíssimo esse papel do Exército Brasileiro, junto com as demais forças.
Eu destaco também a importância de outras forças no combate ao desmatamento, como a PRF, o IBAMA, a Polícia Federal, que tem feito um trabalho excepcional também na nossa região da Amazônia.
Aqui fica como sugestão que possamos fazer junto ao Exército Brasileiro mais comitivas com Parlamentares!
11:41
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Sobre a Raposa Serra do Sol, nosso autor do requerimento Arthur Maia, vamos ter pela frente, se Deus quiser, um trabalho bom com relação à agricultura em terra indígena. Na Raposa Serra do Sol, várias comunidades querem produzir. Hoje não temos a regulamentação necessária, mas, se essa PEC passar, conseguiremos fazer com que, pelo menos na área de lavrado, onde se possa cultivar, esses indígenas possam ter essa valorização, essa ajuda do Governo Federal, e não fiquem só no assistencialismo, porque hoje o indígena sai de uma terra em que poderia estar produzindo e vem para a cidade, onde acaba sendo um pedinte em sinais. Ele acaba tendo doenças também e acaba não tendo esse incentivo.
Então, aqui fica como sugestão à Mesa que articulemos junto ao Comando do Exército algumas visitas de Parlamentares para conhecerem a realidade da Amazônia.
Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Arthur Oliveira Maia. DEM - BA) - Muito obrigado, Deputado.
Passamos agora a palavra ao Deputado Flávio Nogueira.
O SR. FLÁVIO NOGUEIRA (PDT - PI) - Quero cumprimentar a Mesa. Gostei bastante das exposições. Aqui o nosso Dr. Pio Penna Filho falou sobre um tema importantíssimo, a multinacionalidade que temos no Brasil. Falta a nós, brasileiros, esse sentimento de pertencimento, quer dizer, a união individual de todos para um projeto nacional, para um projeto de nação.
Aliás, essa é uma discussão que vem desde o tempo do Brasil Império. O próprio D. Pedro II tentou criar esse sentimento de nacionalidade brasileira que não temos. Às vezes devido a acirramentos ideológicos, às vezes devido a sequências de movimentos revolucionários no Brasil de separação ao longo da nossa história, nós não podemos nem dizer que somos uma Nação unificada — existem segmentos. O Prof. Pio Penna falou sobre os indígenas. Só no segmento dos índios, há várias nações, com costumes às vezes diferentes, com idiomas diferentes.
O que faz nós, os brasileiros, sermos unidos como Nação é praticamente o nosso idioma. Ser nacionalista no Brasil é como se se estivesse compactuando com o governo atual. Se o governo é de esquerda, você tem um sentimento de nação; se o governo é de direita, você passa a ter outro sentimento de nação. Não há, portanto, esse pertencimento tão necessário, de que precisamos no Brasil.
A Amazônia é composta por vários países. Ela abrange em torno de 60% da área territorial brasileira. E o professor citou aqui uma frase do Presidente francês. Ele disse que estão queimando nossa casa. Eu acho que isso tem duplo sentido. Aí fala sobre a nossa soberania. Ele pode dizer que se pode colocar ali uma base militar a qualquer momento, porque aquilo é um território francês, como fizeram os ingleses com as Malvinas. De uma hora para outra, os argentinos quiseram recuperar o seu território. E os senhores viram no que deu: todas as nações potentes do mundo ficaram do lado do Reino Unido.
11:45
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Então, é preciso haver esse sentimento nacional. De fato, é preciso que o Ministério das Relações Exteriores trabalhe afinado. Nem sempre o que diz o Governo pode ser trabalhado depois em sentido contrário, para amenizar o que foi dito. Isso é o que devem fazer os Ministros e os diplomatas do Ministério das Relações Exteriores, até porque Rio Branco já dizia que, por trás de uma boa diplomacia, havia um Estado forte. O que é um Estado forte? As nossas Forças Armadas também devem ser fortes. Então, devemos ter tanto uma boa diplomacia como um Estado forte.
Não sei para quem faço a próxima pergunta, mas como está o SIVAN, na Amazônia? Que tipo de vigilância nós temos? No passado, muito se pregou a integração da Amazônia com a Transamazônica, por exemplo. São 5.600 quilômetros de rodovia. Mas, depois, não deram continuidade a isso.
Então, eu acho que nós devemos integrar a Amazônia e ter a nossa soberania, mas também saber dialogar e fazer diplomacia com os outros países.
O SR. PRESIDENTE (General Girão. PSL - RN) - Muito obrigado, Deputado.
Vou passar a palavra ao próximo inscrito, o Deputado General Peternelli.
Logo após, em função das nossas condições, eu gostaria de pedir aos senhores debatedores que preparem suas respostas para darmos prosseguimento à reunião.
Passo a palavra ao Deputado General Peternelli.
O SR. GENERAL PETERNELLI (PSL - SP) - Presidente General Girão, General Santa Rosa, General Rocha Paiva, Ministro Leonardo, Prof. Penna Filho, é um prazer estarmos aqui falando sobre a Amazônia.
Apesar dos pesares, com essa queimada, houve um aspecto muito importante, que foi exatamente propiciar à sociedade brasileira e, em especial, ao Congresso brasileiro a discussão sobre a Amazônia. A Amazônia virou tema. Neste mesmo momento, o Plenário faz um debate sobre a Amazônia. Então, isso é muito importante. Costumo dizer que há vários fatores sobre a Amazônia.
Eu acabei de fazer a entrega de um parecer da Consultoria Legislativa. Depois, vou deixar mais uma cópia com o General Santa Rosa. Esse parecer prevê plantações em terras indígenas, porque não há nenhuma legislação que proíba esse plantio.
11:49
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Deputado Arthur Maia, além desses aspectos do Projeto de Lei nº 490, de que vou me inteirar, pois a problemática indígena é estratégica para o País, quero passar às mãos de V.Exa. também um requerimento que realizei, tendo em vista que já há um projeto de lei desde 1996, aprovado no Senado, que dispõe sobre a exploração e o aproveitamento de recursos minerais em terra indígena. Como já passou pelo Senado, talvez essa seja uma oportunidade.
Eu gostaria de falar da Amazônia — pediria até ao Leonardo depois que subsidiasse os Deputados, em especial os da CREDN — porque, dos seus aspectos, nós só falamos da queimada. Sobrevoei muito a Amazônia em várias oportunidades, pilotando um helicóptero. É verde que não acaba mais. O interesse dos outros países se dá porque só a área verde de lá equivale a 28 países da Europa. Nós temos uma legislação ambiental que é referência mundial. A nossa legislação, em especial no que se refere à Amazônia, é uma das mais severas. Na Amazônia, pelo Código Florestal, só se pode plantar em 20% de uma fazenda. Nenhum lugar do mundo tem aspectos como esses que há na nossa Amazônia.
As riquezas da Amazônia, em especial as minerais, estão lá para serem exploradas, seguindo-se a legislação do meio ambiente. Logicamente, não pode ser diferente. Mas, se o País tem uma série de aspectos econômicos, menosprezar essa possibilidade não parece muito inteligente. Nós devemos, então, sempre abordar esses aspectos da Amazônia.
Concordo plenamente que, dentre os países da Amazônia, o Brasil tem uma oportunidade de promover uma liderança entre eles, para debater a respeito da Amazônia. Nós temos, no País, em vários aspectos ambientais — a começar pela Amazônia, na qual mais de 80% se mantêm nas mesmas condicionantes —, de mostrar exatamente como isso pode ser explorado, impactando o meio ambiente da menor forma possível.
Já é do conhecimento de todos que, nas reservas dos cintas-largas, nós temos a maior mina de diamante a céu aberto do mundo. Legalizá-la e explorá-la, dentro do marco legal, é muito mais óbvio do que ela continuar sendo explorada do jeito que é atualmente, sem que se tenha esse respaldo legal.
Então, mais uma vez, cumprimento o Deputado General Girão, agradeço a presença ao Gen. Santa Rosa e ao Gen. Rocha Paiva, cujas palestras ouço há muito.
Concito a todos nós do Congresso a não ressaltarmos as queimadas. Como disse o Deputado Arthur Oliveira Maia, há a parte desmatamento, há o próprio manejo do campo, há uma série de aspectos. Nós todos sabemos que isso é cíclico e que, dos últimos 20 anos, a queimada deste ano está longe de ser a maior queimada.
11:53
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Nós também vimos no ano passado, nos Estados Unidos, um incêndio que ficou descontrolado, inclusive queimou muitas residências, houve todo um aspecto.
Na aviação do Exército, de onde eu vim, era comum os pilotos de helicópteros, em determinada época do ano, tirarem férias e irem pilotar em Portugal para combater os incêndios que eram comuns em determinada época do ano.
Então, no meu entender, não adianta abordarmos só esses aspectos de incêndio. Temos que abordar exatamente esses aspectos positivos que há na Amazônia, explorar toda essa biodiversidade que nós temos, lembrando que Jacques Cousteau, há 60 anos ou mais, já entrou com seu barco Calypso na Amazônia para explorar, para conhecer aspectos que existem lá em termos de dados científicos que podem ser aproveitados pela comunidade brasileira.
É hora de nós pegarmos toda essa ação. Concordo com o Deputado. Capitaneados aqui pela CREDN, temos que estimular esse contexto da Amazônia brasileira.
Parabéns a todos.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (General Girão. PSL - RN) - Obrigado, Deputado General Peternelli.
Nós vamos passar a palavra aos nossos debatedores para que eles possam responder alguma colocação e fazer as suas conclusões sobre a nossa audiência pública.
Eu só gostaria rapidamente de fazer um comentário. Eu era comandante de um batalhão de fronteira lá em Roraima e tivemos a oportunidade de fazer patrulhamento na faixa de fronteira e nós encontramos numa das comunidades indígenas, na Calha do Rio Branco, uma figura que tinha máquina fotográfica e fazia coletas de raízes e folhas, enfim, das riquezas da natureza. Na oportunidade, a nossa patrulha fez uma abordagem, e o pessoal da aldeia indígena disse o seguinte: "Esse estrangeiro que está, italiano, é jardineiro". "Jardineiro?" "Por que um jardineiro?" "Porque ele se interessa por raízes, por plantas." Está certo?
Então, aquele cara estava lá, sem passaporte, sem autorização do Brasil, praticando biopirataria.
Nós precisamos, sim, proteger as riquezas. Algumas delas, a gente nem imagina que existem. No sul de Roraima, na calha ali do Rio Branco e do Rio Negro também — o Rio Branco é afluente do Rio Negro —, existe, por exemplo, a biopirataria de peixes artesanais.
A nossa Amazônia tem riquezas que nem imaginamos que existam e, por isso, precisam ser muito bem preservadas por nós.
Passo a palavra agora ao General Santa Rosa para suas observações.
O SR. MAYNARDE MARQUES DE SANTA ROSA - Concluindo, eu queria agradecer esta oportunidade, que é gratificante, uma vez que tratamos de um assunto da maior relevância para a estratégia nacional, que é a Amazônia.
Eu queria recordar algumas coisas que eu apresentei aqui. A primeira estratégia que nós devemos ter é a de povoar a Amazônia, que é nossa. A segunda coisa é reconhecer o direito das populações amazônicas de exercerem o livre empreendimento, a sua autonomia. Temos que considerar que, em 209 anos, a Amazônia se formou, consolidou e desenvolveu independente do Brasil. E o sentimento dos amazônidas não é plenamente igual ao sentimento que existe no Planalto Central e na Região Sudeste.
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Temos que reconhecer que aquela região está sendo tratada, como disse Armando Mendes, como um grande latifúndio, o que impede o nativo de usar o recurso que está sob os seus pés, por meio de legislação feita em gabinete de Brasília. Então, temos que reconhecer o direito dos amazônidas e a autonomia na gestão do seu destino. É claro que só num país como o nosso.
O terceiro ponto que eu queria destacar é aquele que está retratado na frase de Sepé Tiaraju, na 16ª Brigada de Infantaria de Selva, na margem do Lago Tefé: "Esta terra tem dono".
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (General Girão. PSL - RN) - Obrigado, General Santa Rosa.
Concedo a palavra agora ao General Rocha Paiva, para os seus esclarecimentos e conclusões.
O SR. LUIZ EDUARDO ROCHA PAIVA - Nós temos que ter em mente que essa preocupação internacional com a Amazônia vai continuar acontecendo e que o Brasil tem que saber como gerir esse patrimônio, que é primeiramente seu.
Nós também nos preocupamos com o Ártico, com a Groenlândia, com a Antártida. E eu espero que não se preocupem só com a Amazônia, mas com esses lugares também. Mas parece que a preocupação deles é sempre com a Amazônia.
As demarcações aqui ocorreram independentemente das reuniões ecológicas. Então, houve reunião na Rio 92, na Rio+10 e outras. Ali podem ter sido determinadas muitas coisas por países potências, só que eles fazem o que querem. Mas eles continuaram pressionando, e nós fomos à revelia do que estava previsto. Nós fomos fazendo as nossas demarcações e chegamos àquela situação catastrófica na Calha Norte em que nos encontramos agora.
Só um detalhe: no Tratado sobre a Não Proliferação de Armas Nucleares, as potências não nucleares se comprometeram a não desenvolver a bomba atômica, e as nucleares a diminuírem os seus arsenais. Só quem cumpriu até agora a missão que estava no tratado foram as não nucleares, porque as nucleares continuam desenvolvendo e aumentando os seus arsenais. Então, isso é coisa de quem é mais forte e de quem é mais fraco. Quem é mais fraco tem que tentar ficar mais forte.
Vejam bem que, antes da Rio 92, houve praticamente a imposição, pressão, para criar a reserva ianomâmi. Depois, naqueles 10 anos até Joanesburgo, aquela situação na Calha Norte. E o Governo brasileiro, antes da Rio+10 em Joanesburgo, queria levar o fato para apresentar na reunião. Aí demarcou a reserva indígena e a unidade de conservação do Tumucumaque, que quase fechou a Calha Norte no Estado do Pará. Mais alguns detalhes. Eu sou favorável a que haja investimento estrangeiro, porque, se depender só dos nossos recursos, vai ser difícil termos projetos de desenvolvimento na Amazônia. Sou favorável a projeto conjunto, mas que nós tenhamos força na hora de traçar os artigos do acordo, de modo que não percamos a soberania naquilo que é vital. Acordo não ameaça a soberania se tivermos cuidado. Diferente, por exemplo, é aquela doação para manter a árvore em pé, enquanto eles vêm com as suas equipes de cientistas, vão explorar nossa biodiversidade, e levam de lá o que permite a eles desenvolverem projetos e venderem para nós medicamentos e outras coisas com um valor muito maior.
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Eu estou falando um pouco ligeiro antes que ele me casse a palavra.
A Pan-Amazônia. Meus senhores, todos os nossos vizinhos da Amazônia estão debruçados sobre o Pacífico ou o Caribe. A Amazônia para eles é uma coisa... Eles têm tão poucos recursos que, se entrar ali um país estrangeiro até com muito mais condições de autoridade sobre a região, para eles isso não é problema. Para nós é. É diferente. Então, o problema da OTCA se dá muito mais porque esses países estão muito menos interessados em sua Amazônia do que nós, porque para nós ela é solução. Para eles é um problema. Poderia vir a ser solução se eles tivessem mais condições, como nós temos, de criar polos de desenvolvimento limitados, de acordo com a vocação daquela região, polos de desenvolvimento para fazer o desenvolvimento sustentável da Amazônia. Então essa diferença temos que ter em mente.
Outro detalhe, a questão da diplomacia com a defesa. Meus senhores, a diplomacia é a vanguarda da defesa nacional. O primeiro embate da defesa nacional é a diplomacia, daí a sua importância. Inclusive na Constituição está dito que ela é o primeiro elemento a ser jogado no conflito internacional.
Deputado Arthur Maia, o senhor disse que vai à Austrália e à Nova Zelândia para ver como é que eles levam a questão da gestão indígena lá. Mas fica em mente o seguinte, Deputado — uma sugestão minha: eles não têm uma Amazônia lá dentro nem há tanta gente no mundo de olho grande neles, até porque na Austrália os índios vivem em deserto, que eu saiba. Aqui não. Então, as coisas que eles fazem para resolver a problemática deles são diferentes, têm que ser diferentes das nossas.
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. LUIZ EDUARDO ROCHA PAIVA - Há aí um detalhe, conversaremos depois. O meu medo é que eles assinaram, inclusive os Estados Unidos. Ou seja, os países em que não há ninguém discutindo se o indígena lá tem que ter nação autônoma podem assinar tranquilamente. Nós assinamos, mas não passou ainda nesta Casa. Eles podem exigir que cumpramos. Mas quem vai exigir dos Estados Unidos uma nação yanomami? Quem vai exigir dos Estados Unidos uma nação Raposa Serra do Sol? Quem dá pitaco, desculpem o termo, dentro dos Estados Unidos em termos de reserva indígena e meio ambiente? Lá na Rússia, quando foram discutir problema de meio ambiente lá no Ártico, o Putin prendeu o pessoal da WWF. Não estou dizendo que tenhamos que fazer isso aqui. Mas uma ONG, aqui dentro do País, que receba recurso de fora não podia ser autorizada a trabalhar em políticas públicas, porque está defendendo interesse dos outros.
É interessante também conhecer a experiência dos índios Parecis, em Mato Grosso, porque eles estão fazendo agronegócio, estão ganhando dinheiro, e, por incrível que pareça, é o Estado brasileiro que está atrapalhando.
Projeto de nação. É importantíssimo o País ter um projeto de nação e Amazônia estar inserida nele.
12:05
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Quanto à França e à Defesa Nacional, meus senhores, a França é que está do lado da foz do Amazonas. A Amazônia não é uma área de defesa. A Amazônia é um continente. Ela tem áreas de defesa, que são a foz do Amazonas e Roraima. Toda a fronteira oeste é plano B, porque é muito importante para a segurança pública, para a questão do narcotráfico e contrabando — para isso é importantíssima —, mas para a Defesa Nacional é plano B. Ninguém vai chegar à Amazônia pedindo permissão à Colômbia, ao Peru, à Bolívia para passar lá por dentro, atravessar os Andes, com uma logística desgraçada, para chegar ao Brasil numa área periférica. Já há o Comando Sul, já há a Quarta Frota e a OTAN, que está do nosso lado, que é a França, tudo do lado da foz do Amazonas.
Continuando, patriotismo e nacionalismo, que eu ouvi aqui. Patriotismo e nacionalismo são só sentimentos. O primeiro é afetivo, porque o patriotismo vem do coração, e o segundo é político e vem da razão. Patriotismo e nacionalismo são o mesmo sentimento, que não pode ser xenófobo.
E o problema da ideologia? O País está dividido, porque ele vive uma crise de conflito ideológico. Ideologia é radicalismo, é dogmatismo, é desunião. Ideologia, de um lado ou de outro, só serve para desunir o País. Quando uma chega, combate a outra, e o País fica andando de lado. O centro, e não estou falando em partido político, o centro do espectro é onde está a virtude — não sou eu que digo isso, vários filósofos disseram isso —, porque ali se calca um país, calca-se o futuro do País em cima de princípios e valores, com liberdade econômica, mas com responsabilidade social, porque não podemos deixar abandonada uma parte da nossa população.
Com isso eu termino. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (General Girão. PSL - RN) - Muito obrigado, General Rocha Paiva.
Passo a palavra agora ao Sr. Ministro Leonardo, para suas considerações e esclarecimentos.
O SR. LEONARDO CLEAVER DE ATHAYDE - Muito obrigado, Deputado.
Eu quero, primeiro, agradecer mais uma vez o convite para participar desta audiência. Tem sido para mim, na verdade, não apenas uma honra poder falar perante a Comissão, mas também uma experiência muito enriquecedora ouvir os demais expositores e os Srs. Parlamentares.
Só para concluir, então, foi comentado pelo Sr. Deputado que o Brasil tem, na verdade, a despeito das críticas que por vezes se fazem à nossa política ambiental, uma das legislações ambientais mais rigorosas do mundo. E isso é verdade mesmo — é verdade mesmo. Nós temos isso presente, inclusive usamos essas informações, essas e muitas outras, para defender o Brasil perante governos estrangeiros e nos foros internacionais. Nós municiamos as nossas embaixadas com informações sobre as nossas legislações, nossas políticas, que demonstram, que comprovam, exatamente isso.
É fato que a nossa legislação ambiental, em alguns aspectos, é tão rigorosa que, caso adotado e replicado em outros países, por exemplo, nos países europeus, o nosso Código Florestal, ele provavelmente levaria ao colapso a agricultura europeia. Bom, "colapso" é uma palavra muito forte, mas poderia causar graves problemas para o tipo, para o modelo, de agricultura que eles têm lá. Isso muitas vezes não é levado em conta, mas é uma coisa que tem que ser dita. O Brasil tem uma legislação muito rigorosa mesmo e merece ser reconhecido por isso e pelos esforços que tem feito para cumprir os seus compromissos internacionais ambientais.
12:09
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Quanto à preocupação que também foi externada aqui por vários a respeito da agenda conservacionista e as implicações disso no desenvolvimento econômico, eu acho que está muito claro para nós que a conservação pura, nada mais do que isso, não tem como representar uma resposta efetiva aos problemas ambientais. O uso sustentável dos nossos recursos naturais está reconhecido nas principais convenções ambientais e é um direito que nós devemos exercer. É claro que a proteção do meio ambiente, para que seja efetiva, tem de ser reconciliada com o desenvolvimento econômico. Não tem como proteger o meio ambiente sem combater a pobreza, sem dar respostas aos problemas de desenvolvimento que nós temos.
Agora, de que maneira isso pode ser feito? Como se faz essa reconciliação entre desenvolvimento econômico de um lado e as preocupações ambientais de outro, inclusive as preocupações relacionada à conservação? Esta é uma questão complicada mesmo. Não é uma questão fácil de se administrar. Onde se estabelece o equilíbrio entre a conservação de um lado e a exploração sustentável dos recursos de outro? Quais são as riquezas da Amazônia que cabem ser exploradas? Quais são os melhores modelos de desenvolvimento?
Essas questões são mesmo complexas e muito difíceis de responder, mas o importante é que o Governo se engaje, como já está fazendo, numa reflexão sobre os melhores instrumentos para a promoção dessa reconciliação. O que não vai resolver, e isso está muito claro, tanto para o Itamaraty, quanto para o Governo, é a solução de se museificar os nossos recursos naturais, inclusive a Floresta Amazônica. Transformar a Amazônia em um grande parque natural e manter a sua população na pobreza ou, pior ainda, expulsá-la de lá não é resposta aceitável. Isso não é só não aceitável por razões óbvias para o País como não seria uma resposta adequada à problemática ambiental. Sem desenvolvimento econômico não se protege o meio ambiente. Esse é o tema chave que embasa as nossas posições.
Eu já comentei que, há, sim, tentativas, para as quais estamos atentos, de desviar o foco das discussões sobre meio ambiente da adequada consideração da dimensão do desenvolvimento. E essa tentativa de securitizar a agenda ambiental em parte é movida por isso mesmo. Deixar isso de lado fica muito fácil. O pensamento de que a questão não passa pelo desenvolvimento econômico, que não passa inclusive pela necessidade de que os países desenvolvidos cumpram com as obrigações de financiamento que eles têm sobre os regimes ambientais internacionais, achando que tudo se resolve pela ótica da segurança, é, na verdade, um pensamento muito primário que acaba embasando essa agenda da securitização, e a ela continuaremos nos opor de forma contundente. Então, seria isso.
12:13
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Muito obrigado, Deputado. Obrigado mais uma vez pelo convite. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (General Girão. PSL - RN) - Muito obrigado, Ministro Leonardo.
Passo a palavra ao Prof. Pio Penna Filho para seus esclarecimentos e considerações.
O SR. PIO PENNA FILHO - Eu serei o mais breve possível.
Eu acho que o momento atual mostra que nós vivemos uma certa vulnerabilidade com relação à temática amazônica, vulnerabilidade interna e externa, e isso deve ser motivo de reflexão.
Vulnerabilidade interna por quê? Recentemente, saiu uma pesquisa do Datafolha sobre vários pontos acerca da Amazônia. Parece que 20% dos entrevistados não demonstravam confiança em que o Brasil pudesse preservar a floresta. Isso é gravíssimo, porque está aumentando internamente a desconfiança acerca da nossa própria capacidade em administrar e conduzir a preservação e o desenvolvimento da Amazônia. E, é claro, existe a vulnerabilidade externa por causa da exposição negativa do Brasil. Como foi dito pelo Deputado, uma imagem lançada pelo mundo tem a capacidade de causar um prejuízo, um estrago para lá de assustador. Foi isso que aconteceu, porque a mídia internacional deu um grande destaque para as questões relacionadas às queimadas e à questão dos franceses.
Por último, na linha do que o Deputado General Girão falou, eu gostaria de falar um pouco sobre um dos problemas da Amazônia que ultimamente está sendo pouquíssimo discutido, que é a biopirataria. Eu vou dar alguns exemplos aqui bem breves: óleo de copaíba, que é usado como agente anti-inflamatório para o tratamento de caspa, de desordens da pele, de úlceras de estômago, dentre outras doenças, tem patentes requeridas pela França e pelos Estados Unidos; amapá-doce, que é aplicado no tratamento de doenças respiratórias, como asma e bronquite, tem patentes requeridas pela Rússia e pela Coréia do Sul; unha-de-gato, que é usado contra artrite, reumatismo, herpes, gastrite, e é considerado um poderoso anti-inflamatório natural usado também contra gripes e viroses, dentre outras propriedades, tem patentes requeridas pelos Estados Unidos e pela Polônia; sangue de drago, que é extraído da árvore Croton palanostigma e é empregado como adstringente, cicatrizante, antiviral e tem aplicação, de acordo com estudos, no tratamento de doenças pulmonares e herpes genital, tem patentes requeridas pelos Estados Unidos, Inglaterra, Japão e outros países da União Europeia.
Os senhores devem se lembrar da questão do açaí que o Japão quase se apropriou do nome. Então, isso aqui mostra que precisamos prestar muito mais atenção na Amazônia.
12:17
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Eu faço um link, para finalizar, com um outro tema extremamente importante e que está ligado à biopirataria. Nós estamos à beira do abismo no nosso País — à beira do abismo! — com relação à nossa capacidade de pesquisa. Os recentes cortes de verbas no CNPq e na CAPES e o estado atual das universidades só fazem agravar essa situação. Há poucos institutos de pesquisa específicos na Amazônia, o que é outro absurdo neste País. De fato, essa é uma situação desesperadora. Eu acho que tem muito a ver com a própria segurança nacional essa paralisação nas atividades de pesquisa, formação e capacitação de cientistas, professores, etc.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (General Girão. PSL - RN) - Muito obrigado, Prof. Penna Filho.
Eu gostaria de pedir paciência para me ouvirem talvez por mais 1 minuto. Nós pretendemos produzir um relatório-resumo sobre o que foi discutido aqui e apresentá-lo na sessão da CREDN, para que possamos socializar as informações que foram aqui discutidas.
O SR. ARTHUR OLIVEIRA MAIA (DEM - BA) - Permita-me um aparte, General?
O SR. PRESIDENTE (General Girão. PSL - RN) - Pois não.
O SR. ARTHUR OLIVEIRA MAIA (DEM - BA) - Já que V.Exa. está propondo consequências desta nossa reunião, o que é acertadíssimo, eu queria pedir a ajuda de V.Exa. e dos outros generais que conhecem bem a questão amazônica sobre um roteiro que poderíamos fazer para aprofundar os debates do Projeto de Lei nº 490 ou até mesmo da emenda constitucional que trata da exploração agrícola em terras indígenas. Eu gostaria de encomendar à Comissão, aproveitando e bebendo do conhecimento de V.Exa., uma proposta de roteiro do que seria interessante nós irmos visitar na Amazônia para podermos formar um juízo de valor apurado e concreto da situação indígena lá na Região Amazônica.
O SR. PRESIDENTE (General Girão. PSL - RN) - Muito obrigado, Deputado.
Daqui a pouco eu ofereço a palavra para alguém que queira fazer algum outro comentário, mas vou colocar outro assunto que nós já falamos muito rapidamente e que vale a pena nós reprisarmos. Como falou o professor, o desgaste internacional em relação à nossa incapacidade de cuidar dos nossos bens, especialmente da Floresta Amazônica, foi muito grande. Os órgãos formadores de opinião devem ser responsáveis ao mostrarem as realidades do Brasil. Então, eu gostaria de pedir ao nosso Ministro que o Itamaraty também se empenhasse nisso. Nós vamos colocar isso no relatório e vamos mandá-lo também para o Itamaraty, para que nos empenhemos nisso. Já existe requerimento nesta Casa, na CREDN, cobrando uma corresponsabilidade desses órgãos formadores de opinião, porque, a partir do momento em que isso é jogado no ar, não se consegue mais controlar o que foi lançado.
Lamentamos que isso tenha sido feito sem, talvez, obedecer a princípios de patriotismo. Não significa que vamos esconder o que está acontecendo de errado, mas temos que, primeiro, apurar o que está acontecendo antes que isso seja divulgado. Lamentamos que, em algumas redes sociais, algumas personalidades do mundo tenham colocado imagens para fazer referências a ameaças de destruição da Amazônia, dizendo que era o "pulmão do mundo" e fazendo várias outras afirmações, colocando fotos e imagens que não eram nem do Brasil. Lamentamos por isso, porque eles são formadores de opinião e, infelizmente, têm muitos seguidores nas redes sociais.
12:21
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Alguém mais quer fazer uso da palavra aqui na mesa?
O SR. LUIZ EDUARDO ROCHA PAIVA - Os senhores me desculpem, mas vou colocar uma ideia que tenho há muito tempo, sobre a qual já escrevi e que queria trazer para os senhores. Ela é meio polêmica, mas cai nas mãos da CREDN. Muitas vezes eu vejo audiências públicas em que os chefes militares têm que fazer uma exposição da situação da defesa nacional, de projetos de defesa, etc., mas, como se trata de audiência pública, ele não pode falar muita coisa que sabe que existe e que precisa ser dita.
O militar da reserva, quando fala, não tem o mesmo peso — podem tirar o cavalinho da chuva, porque não tem o mesmo peso. A Nação nos paga por 40 anos para estudarmos estratégias geopolíticas de defesa nacional. Nós lemos, observamos e, na ativa, vimos pelo Ministério da Defesa ou pelo comando de uma força e não podemos falar. Eu acho que isso é um papel da CREDN porque aqui está a representação da Nação. Como a Nação vai cobrar de mim, se ela me pagou para eu conhecer, para eu saber e, mesmo sabendo que alguma coisa não está bem, eu não posso falar publicamente?
A forma correta é eu, militar da ativa, me dirigir ao representante do povo daquela Nação em uma audiência reservada, com protocolo de confidencialidade. Se ouvir dez chefes militares da ativa, a CREDN terá a posição de muitos temas que não podem ser tratados publicamente. Sem necessidade de dizer a origem daqueles dados, ela vai estudar tudo aquilo que foi dito e ver se há fundamento ou não, podendo cobrar, ainda reservadamente, do Ministério da Defesa, da Secretaria de Assuntos Estratégicos — SAE, do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República — GSI. No momento em que a CREDN tiver uma posição, a Casa do Povo, que é o Congresso, vai se dirigir à Nação e dizer "Algo está muito errado na defesa nacional e nós temos que consertar". (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (General Girão. PSL - RN) - Muito obrigado, General Rocha Paiva.
O SR. ARTHUR OLIVEIRA MAIA (DEM - BA) - Sr. Presidente, eu acho que, diante da colocação do General Rocha Paiva, é muito oportuno que façamos uma reunião secreta, o que é previsto no nosso Regimento Interno, para que possamos debater esse assunto e tomar conhecimento dos pontos de vista a que o General se reportou. Como ele muito acertadamente disse, é preciso que nós todos tenhamos conhecimento para poder ajudar o País neste momento. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (General Girão. PSL - RN) - Se V.Exa. concordar, podemos fazer um requerimento a quatro mãos, ou até a mais mãos, propondo à CREDN a promoção dessa reunião.
Mais alguém quer fazer uso da palavra? (Pausa.)
Gostaria de agradecer a presença de todos e de fazer um agradecimento especial — deixando registrado esse agradecimento — aos que compõem a CREDN — os servidores da Comissão, o Secretariado — pelo apoio na organização e na realização desta nossa audiência pública.
Independente de concorrências que possa ter havido, com certeza nós abrimos os nossos corações e as nossas mentes para buscar propostas e soluções para o nosso Brasil.
Nada mais havendo a tratar, dou por encerrada a presente reunião, agradecendo a presença dos convidados, dos Srs. Parlamentares e dos demais presentes. Muito obrigado.
Selva! (Palmas.)
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