1ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA 56 ª LEGISLATURA
Comissão de Legislação Participativa
(Audiência Pública Ordinária - Conjunta das Comissões CDHM e CLP)
Em 5 de Setembro de 2019 (Quinta-Feira)
às 9 horas e 30 minutos
Horário (Texto com redação final.)
10:27
RF
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Saúdo todas e todos os presentes.
Declaramos aberta esta audiência pública da Comissão de Direitos Humanos e Minorias, em parceria com a Comissão de Legislação Participativa, destinada a elaboração de diagnóstico da violação de direitos nas políticas de meio ambiente e dos povos indígenas no Brasil e seus impactos nas políticas sociais.
Esta audiência atende a requerimento de minha autoria, que foi subscrito pelo Deputado Túlio Gadêlha Então, o requerimento foi feito pela Deputada Erika Kokay e pelo Deputado Túlio Gadêlha.
De acordo com a Anistia Internacional Brasil, os grandes projetos de desenvolvimento e a expansão de atividades agrícolas e extrativistas são ameaças aos povos indígenas e aos direitos desses povos. Nós estamos vendo também uma tentativa de exploração não sustentável dos territórios indígenas, desrespeitando inclusive a Convenção nº 169, da OIT.
O Brasil é uma das maiores economias do mundo, mas não tem garantido o respeito aos direitos humanos. Ao contrário, nós estamos vendo a constatação de que há um enfraquecimento da política de direitos humanos, inclusive pela não proteção dos defensores, pelo esvaziamento dos conselhos que têm participação da sociedade civil e pela lógica misógina LGBTfóbica, uma lógica patrimonialista, de fundamentalismo e patrimonialismo que ocupa a Presidência da República.
Tudo isso foi constatado pela Alta Comissária da ONU para os Direitos Humanos, Michelle Bachelet. Houve uma agressão. E ela agride cada uma e cada um de nós, agride cada corpo que foi torturado neste País e em todos os países, por regime autoritários, agride, particularmente, os mais de 30 mil chilenos, chilenas e estrangeiros, pessoas que, no Chile, foram submetidas a toda sorte de tortura.
É inadmissível que nós tenhamos, na Presidência da República, alguém que aplauda o assassinato de uma pessoa, no caso, o pai da ex-Presidenta do Chile, nas salas escuras de tortura, até porque foi constatada a responsabilidade do próprio Estado. Os responsáveis pela área onde foi torturado o pai de Michelle Bachelet foram processados, foram responsabilizados e foram punidos. Portanto, esse é um comportamento de negar que houve uma ditadura e, ao mesmo tempo, de aplaudi-la pelo que ela traz de mais atroz, visto no Presidente da República.
Nós estamos vendo, portanto, uma série de ataques aos povos indígenas. Aproveito para registrar a presença da Deputada Joenia Wapichana, que é a primeira mulher indígena a ocupar assento nesta Casa. (Palmas.)
Isso nos orgulha e mostra que ninguém consegue deter o avanço humano, o avanço da civilização, ainda que pelas brechas de um governo com tanto ódio e desrespeito aos territórios e povos indígenas.
Todos os dias, nós escutamos o Presidente da República responsabilizar os indígenas pela inexistência de progresso do País e tentar eleger os povos indígenas como inimigos de todo o desenvolvimento, inimigos da própria Nação, como faz também com educação, como faz com ambientalistas, como faz com todas e todos.
Aliás, há uma norma na Presidência da República de que todas as constatações que existem são encaradas como ameaças. Houve a constatação do aumento do desmatamento. E a providência que o Brasil tomou, que a Presidência da República tomou foi demitir o Presidente do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais ou forçar a sua própria demissão. Houve a constatação de que há milícias, que estão na antessala da Presidência da República. E a postura do Presidente da República é demitir o Superintendente da Polícia Federal, demitir o Superintendente da Receita Federal e, agora, ameaçar o Diretor-Geral da Polícia Federal. Houve o Presidente da Associação Brasileira de Desenvolvimento Industrial dizendo que o seu superior, o Secretário-Executivo do Ministério, teria lhe feito propostas não republicanas. E qual foi o resultado disso? A demissão do Presidente da Associação Brasileira de Desenvolvimento Industrial do Brasil.
10:31
RF
Portanto, não há apenas uma desconstrução da lógica republicana, uma naturalização da barbárie, um rompimento de qualquer marco civilizatório, mas há também há a demissão e o arbítrio calando todas e todos que, de alguma forma, pontuam o que está acontecendo neste País.
Por isso, nós vamos resistir e estamos nesta audiência com este objetivo. A Comissão de Direitos Humanos estará na Revisão Periódica Universal, em Genebra, a partir da semana do dia 19, e esta audiência faz parte da construção de um diagnóstico tecido com a própria sociedade civil. Nós queremos levar o diagnóstico que será fruto desta audiência, para a Revisão Periódica Universal, sobre os direitos e compromissos que o Brasil estabeleceu através da representação da Comissão de Direitos Humanos em Genebra.
Eu gostaria de chamar a Deputada Joenia Wapichana, porque acho que ela tem que estar conosco nesta Mesa. Nós damos um jeito.
Gostaria de chamar o Cleber Buzatto, Secretário-Executivo do Conselho Indigenista Missionário — CIMI e que tem sido um árduo defensor dos direitos dos povos indígenas. Ele é uma das pessoas que mais tem sofrido ataques de toda sorte aqui nesta Casa, inclusive quatro sugestões de indiciamento na CPI do INCRA e da FUNAI, que foi um dos instrumentos que eles construíram para retirar direitos de quilombolas e retirar direitos dos povos indígenas.
Quero chamar o Dinamam Tuxá, representante da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil — APIB; o Claudio Angelo, Coordenador de Comunicação do Observatório do Clima — OC; a Jussara Griffo, representante da Confederação dos Trabalhadores no Serviço Público Federal — CONDSEF; o Denis Rivas, representante da Associação Nacional dos Servidores da Carreira de Especialista em Meio Ambiente e do PECMA — ASCEMA Nacional; e também o representante da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas — CONAQ. Se estiver mais alguém presente, nós iremos chamar.
Nós queremos também ver se fazemos, até a semana que vem, uma audiência para discutir a situação dos quilombolas em Alcântara, porque ontem foi aprovada a urgência para a Câmara avaliar a ratificação do convênio firmado entre o Brasil e os Estados Unidos no que diz respeito a Alcântara.
10:35
RF
O que nos chama atenção, dentre outras coisas que nos têm chamado atenção sobremaneira, é o fato de que qualquer projeto defendido pelo Governo parte do pressuposto de que o Brasil não tem condições potenciais de elaborar o próprio projeto de desenvolvimento econômico sustentável, de proteger o próprio desenvolvimento tecnológico e científico. Todo raciocínio que eles constroem é no sentido de que o desenvolvimento brasileiro terá de estar subalternizado e relacionado aos interesses estadunidenses, de que os interesses estadunidenses devem ser preservados para que nós possamos ter qualquer tipo de desenvolvimento.
Está presente em toda a narrativa do próprio Governo e esteve presente ontem, durante a questão de Alcântara, que, para que nós possamos nos desenvolver, temos que nos aliar aos Estados Unidos, ou seja, temos que nos subalternizar.
Nega-se, por exemplo, que o Brasil tenha uma empresa como a EMBRAER, que se transformará em 20% da Boeing. Portanto, o País perde uma empresa que é a maior responsável no mundo pela fabricação de aviões de até cem lugares.
Também se nega que o Brasil tenha a maior tecnologia para prospecção de petróleo em águas profundas, desenvolvida pela maior empresa deste País, a PETROBRAS, que eles buscam destruir para lidar com o pré-sal. Eles dizem que é preciso vender as bacias com isenção de impostos, sem conteúdo nacional algum, para poder retirar o pré-sal, negando a potencialidade deste povo brasileiro, que construiu tantos espaços de desenvolvimento.
Como é possível dizer que o INPE terá as suas atividades substituídas por uma empresa privada a ser licitada? Vai se contratar uma empresa privada para cumprir o trabalho feito pelo INPE, um trabalho que tem evidências científicas negadas pela lógica terraplanista deste próprio Governo.
Portanto, isso que nós estamos vivenciando vai se expressar em todos os aspectos. Aí nos vemos um país com o menor índice de investimentos, com o menor recurso para investimentos desde 1997. Isso é o que está previsto para 2020, quando vai haver um corte brutal em todas as políticas sociais. Pensa-se num Orçamento que não inclui o povo brasileiro e busca-se, no desespero, romper qualquer tipo de construção para um desenvolvimento autônomo, para a soberania nacional, para o Brasil expressar a sua grandeza.
É nesse sentido que se cortam as bolsas do CNPq, que não tem recursos para mantê-las no próximo mês. As bolsas da CAPES também estão sendo cortadas, e as universidades estão sendo atacadas.
Estabelece-se uma isenção fiscal tirando impostos do etanol produzido pelo milho estadunidense. Portanto, cria-se uma lógica de dependência, como se a dependência aos interesses estadunidenses representasse a condição de desenvolvimento do próprio Brasil.
Então, nós estamos vivenciando várias farsas que seriam apenas farsas se não carregassem, no seu bojo, no seu útero, tantas tragédias para os nossos povos, para a autonomia e para o desenvolvimento nacional. É preciso lembrar que não se tem soberania nacional quando se abre mão dos instrumentos estratégicos do Brasil e se destrói qualquer perspectiva de desenvolvimento da educação. Um povo é soberano quando tem acesso a uma educação de qualidade e pode desenvolver a potencialidade tecnológica, quanto tem avanço tecnológico e avanço científico.
10:39
RF
Também não construímos soberania se não preservarmos a própria Amazônia e os povos que preservam estas áreas, os povos indígenas. Tivemos a oportunidade, na CPI do INCRA e da FUNAI, de constatar algumas coisas. Quem mais preserva a natureza são os territórios indígenas e quem mais devasta a natureza são os territórios que estão na mão do latifúndio. Esses foram os dados que nós analisamos, são as constatações científicas e estatísticas. Quem mais preserva os territórios e a natureza são os povos indígenas, porque eles têm uma relação de ancestralidade, da própria forma de ser, com a natureza e porque entendem os seres humanos como parte de uma trama de vida. E quem mais devasta são aqueles territórios que estão sob a égide do latifúndio, das cercas, do lucro e do agrotóxico.
Então, cercas, lucros e agrotóxicos é o que nós estamos vivenciando. Houve um seminário em que foi discutida a questão dos agrotóxicos. Hoje, 64% dos alimentos brasileiros têm agrotóxico, são alimentos que fazem mal à própria vida, à existência. Isso mostra, Cleber, uma das expressões mais contundentes da vida sendo minorizada ou subalternizada em função do próprio lucro, porque há a liberação de novos agrotóxicos, a reclassificação de agrotóxicos considerados extremamente tóxicos como não tão tóxicos. O glifosato, que é um dos maiores agrotóxicos existentes no Brasil, tem aqui por volta de cinco mil vezes mais permissividade para sua utilização do que em países da Europa, por exemplo. Isso é o que está acontecendo neste País chamado Brasil.
Composta a nossa Mesa, eu combino com vocês que seja ofertado um tempo de 10 minutos para cada um dos que estão aqui e que, em seguida, possamos abrir para as demais pessoas, para que elas façam uso da palavra e contribuam na construção desse diagnóstico.
Registro, com muita alegria, a presença do Deputado Patrus Ananias, que deve ter uma dor profunda, como tem todo o povo brasileiro, pois construiu uma política de enfrentamento à fome neste Brasil, foi um protagonista desta política de forma muito intensa.
Nós estamos vendo agora que o recurso do Bolsa Família está congelado para o próximo ano. Isso significa que ele está diminuído porque houve uma inflação e porque o valor real da moeda foi depreciado. Para todas as políticas, como o Minha Casa, Minha Vida, o recurso estimado é de por volta da metade ou de pouco mais do que a metade do que o de hoje, que já está em contenção.
O próprio Governo começa a dizer que não pode governar com a Emenda Constitucional nº 95, de 2016. O Deputado Patrus, eu lembro, coordenou a nossa bancada do Partido dos Trabalhadores na Comissão Especial que discutiu a proposta dessa emenda constitucional que vale para 10 anos, até 2026. Mas, para o próximo ano, 2020, o Governo diz que não tem como manter a Emenda Constitucional nº 95, porque ela não conteve as despesas financeiras, que são de 75% do PIB. O problema não é o tamanho da dívida, o problema é o perfil da dívida, o perfil do ponto de vista de resgate de títulos, que tem encurtado, tem sido de menor prazo. Ao mesmo tempo, para que serve a dívida? Se você tem uma casa, dando um exemplo doméstico, você pode se endividar para colocar o filho numa faculdade, para ampliar a própria casa, para comprar a própria casa, para fazer um investimento ou para comprar um forno para produzir alimentos e ter sustentação na sua renda.
10:43
RF
Mas o Brasil está endividado para manter as despesas financeiras e não o nível de investimento, como eu disse. O recurso, de pouco mais de 19 bilhões de reais, é o menor desde 1997. Então, o País não apenas corta as despesas discricionárias, mas também tentar avançar sobre as despesas permanentes, as despesas que não podem sofrer um ato discricionário do próprio Estado.
Ao mesmo tempo, o País não consegue diminuir o déficit. A estimativa hoje é de que haja um aumento de por volta de 367 bilhões de reais da dívida para o próximo ano, que seja autorizada uma dívida de 367 bilhões de reais para o próximo ano. É um crescimento substancial com relação à autorização do déficit para este ano que está em curso.
Portanto, nós vemos o Brasil naufragando, e naufragando nos seus direitos.
Nós estamos aqui, Deputado Patrus, como eu disse antes, para construir um diagnóstico, que esta Comissão levará para a Revisão Periódica Universal, em Genebra, com relação aos direitos e discutir as violações de direitos ao meio ambiente e aos povos indígenas. Teremos outras reuniões, para discutir a educação, discutir, enfim, as políticas de saúde, algumas audiências que irão nos ajudar a fazer uma construção mais tecida e com falas de vários locais, para o diagnóstico que será encaminhado para Genebra.
Então, vamos dar início às nossas falas. Eu gostaria de passar a palavra, em primeiro lugar, para a Jussara Griffo, que representa a Confederação dos Trabalhadores do Serviço Público. Vamos estabelecer um prazo de 10 minutos.
Deputada Joenia e Deputado Patrus, quando V.Exas. quiserem fazer uso da palavra, estaremos absolutamente à disposição para estabelecer a prevalência, que, inclusive, é prevista no Regimento.
Então, com a palavra, por um período de 10 minutos, a Sra. Jussara Griffo, que representa a Confederação dos Trabalhadores no Serviço Público Federal.
A SRA. JUSSARA GRIFFO - Cumprimento todos da Mesa na pessoa de Erika Kokay.
Um dos pontos principais para nós na questão das políticas públicas é a Emenda Constitucional nº 95, que afeta toda a política pública e o setor público.
A questão hoje do Governo Bolsonaro na área ambiental é porque ele não tem política ambiental, ele é contra o meio ambiente. Na campanha dele principalmente, ele queria acabar com o Ministério do Meio Ambiente, a proposta de governo era acabar com o Ministério do Meio Ambiente. E ele está acabando. Existem outras formas de acabar que não sejam uma medida provisória ou um projeto de lei, uma delas é desestruturando.
10:47
RF
Então, a reforma administrativa do Governo Bolsonaro, que afetou várias instituições públicas, também afetou o Ministério do Meio Ambiente. E o que o Governo faz? Por tudo o que acontece neste País ele acaba responsabilizando quem faz políticas públicas. Hoje, quem são os responsáveis pela crise ambiental? Os ambientalistas e os trabalhadores do serviço público que fazem o meio ambiente, que defendem essa política. São eles os responsáveis e não a falta de política de um Ministro que não tem responsabilidade ambiental, que não deveria estar no Ministério do Meio Ambiente. Para mim, ele já deveria ter ido embora, porque não tem proposta para o meio ambiente.
Então, para nós, existe um problema seriíssimo: a questão da reforma administrativa do Governo Bolsonaro. Para mim, o problema seriíssimo é o Governo Bolsonaro como um todo, que não deveria estar aí. Mas, como é o que temos para hoje, vamos ter que aprender a fazer políticas e apresentar propostas alternativas para enfrentar os ataques do Governo ao setor público.
A reforma administrativa para nós é um problema seriíssimo, que não estamos debatendo da forma como temos que debater. Ela está acabando com todas as instituições públicas em saúde, educação, meio ambiente, cultura. O atendimento à população indígena é uma política da reforma administrativa.
E quem são os responsáveis? Os trabalhadores do serviço público, que estão sendo assediados moralmente e estão sendo assediados na imprensa. Os Ministros falam que nós não trabalhamos, que nós ganhamos muito, que nós temos que ser demitidos, que nós temos privilégios. Temos, sim, privilégios. Eu sou privilegiada: sou trabalhadora do serviço público há 33 anos, onde sempre trabalhei muito bem, e saí do serviço público de uma forma tranquila, aposentada, no ano passado, cumprindo o meu papel de quem paga. Então, nós temos que fazer isso, temos que acabar com esse assédio moral.
Agora, nós temos que rediscutir a reforma administrativa do Governo Bolsonaro, reestruturar o Ministério do Meio Ambiente e todos os Ministérios que foram juntados e rejuntados sem questão técnica nenhuma, sem objetivo nenhum, só por uma questão eleitoral de que tem que se diminuir o número de Ministérios. Isso foi uma questão eleitoral. Não houve projeto nenhum para juntar Ministérios e Secretarias. E, diga-se, ele também acabou com o Ministério do Trabalho e Emprego também.
Então, nós não estamos debatendo a reforma administrativa da forma como temos que debater. E, hoje, ela está causando impactos nas políticas públicas, a exemplo da questão do meio ambiente. Para mim, é um ponto fundamental a reforma administrativa, e a nossa proposta, além da saída do Ministro, é reestruturar o Ministério do Meio Ambiente. Esse seria um dos pontos centrais.
Outra questão que nós temos que colocar é o concurso público. Quem faz política pública é o trabalhador do serviço público, o tal do privilegiado, como ouvimos aí na imprensa, que não trabalha e ganha muito. Já pensou se os trabalhadores do INCRA, da FUNAI, da SESAI, da FUNASA, do IBAMA, do Instituto Chico Mendes não trabalhassem e ganhassem muito?
Nós temos que colocar que é preciso acabar com o assédio moral aos trabalhadores no serviço público. Eu fiquei pasma: os trabalhadores do Instituto Chico Mendes não puderam comemorar o aniversário do Chico Mendes no dia 28. Deve ser porque haveria balbúrdia, bagunça. Eles foram impedidos de fazer a comemoração. Não podem fazer reuniões, não podem discutir a situação da instituição num momento de crise ambiental.
10:51
RF
Portanto, a democracia nas instituições públicas está ferida. Nós temos que garantir a democracia, o espaço de reunião. Este Governo não se reúne com os trabalhadores, não negocia com os trabalhadores a sua pauta, onde não está colocada as condições de trabalho, a questão de contingenciamento dos órgãos e dos Ministérios.
Para tirar recursos, você tem que acabar. Desde o golpe, nós estamos tirando 30% por ano e, daqui a pouco, vamos ter que colocar. Então, o contingenciamento dos órgãos e da instituição é uma questão séria, porque, quando se tiram recursos, você não tem como trabalhar, como já não tem. E, aí, tiram recursos de políticas fundamentais, porque o meio ambiente é política fundamental neste País, como está sendo mostrado agora, com a crise.
Os trabalhadores hoje têm uma proposta com relação à crise momentânea, porque, na realidade, vamos precisar de décadas para recuperar o que está acontecendo com o País na questão ambiental. Todos os avanços que fizemos no meio ambiente, em pouco tempo, o Governo Bolsonaro está destruindo tudo.
Nós estamos propondo concurso público e reestruturação do Ministério do Meio Ambiente. A indicação para os órgãos tem que ser uma questão técnica, não pode ser indicado qualquer um. No ano passado, nós discutimos isso aqui, numa audiência pública, por ocasião de uma indicação para o Chico Mendes. Nós queremos discutir a questão técnica. Se não for um servidor da carreira, o indicado deve ter pelo menos um perfil técnico para assumir as instituições, senão não faz projetos. Só faz projetos quem conhece, quem tem um conhecimento técnico da área. Não pode ser qualquer pessoa para assumir a questão das instituições públicas.
Nós queremos debater isso porque, para assumir alguns cargos, principalmente do setor executivo, o indicado tem que ter perfil técnico, sim. Se ele não for servidor público, não for da carreira, tem que ter, pelo menos, um perfil técnico para assumir o cargo. Esse é um ponto que nós estamos colocando nessa questão.
Temos também que discutir os projetos positivos que estão aqui no Legislativo e que defendem o meio ambiente. Nós temos que defender os projetos positivos, mas temos que ser contra os projetos negativos, porque há vários projetos que não defendem a questão ambiental no País.
Então, temos que falar agora "Fora, Bolsonaro e sua equipe toda!", porque ele não tem projeto de Estado. Quem defende a Emenda Constitucional 95, quem defende essa reforma administrativa, quem defende a reforma da Previdência e quem não defende o meio ambiente não pode estar fazendo uma política pública neste País, não pode ser Presidente. Além de defender tortura, além de ser contra mulher, negro e índio, ele defende o genocídio de índio. Bolsonaro defende isso, Bolsonaro defende tortura.
Portanto, não dá mais para discutir isso. Os trabalhadores querem outra pauta para ser apresentada. E, como o Governo não tem mesa de negociação, não se senta com ninguém e só fica falando bobagem na imprensa, nós temos que nos organizar com a sociedade e discutir o projeto que temos de Estado brasileiro, qual é o projeto de Estado que queremos. Esse projeto de Estado que está aí não atende à sociedade brasileira. Ele não atende só ao trabalhador do serviço público, não, ele não atende à sociedade brasileira.
Quem mais precisa de políticas públicas neste País? Vamos discutir isso? Quem mais precisa é o rico que vai para Miami, que viaja todos os dias? Não, os 5% não são os que mais precisam. Quem mais precisa de políticas públicas neste País é a maior parte da sociedade brasileira. É esse debate que nós não fazemos. Defender a FUNAI, defender a SESAI, defender o Ministério do Meio Ambiente, que é o Instituto Chico Mendes e o IBAMA, é discutir e defender o servidor público? Não, é defender a sociedade brasileira. Fizemos o mesmo quando fomos para a rua, defender as universidades. Hoje, essa crise da Amazônia está nos fazendo discutir a bobagem que é o Presidente da República ser contra o meio ambiente. Isso é uma bobagem porque o meio ambiente interfere em toda a nossa vida e é uma questão mundial. O Brasil, hoje, está em toda a imprensa mundial.
10:55
RF
Então, essa é a pauta dos trabalhadores brasileiros. Além de toda essa questão de sermos contra a reforma administrativa e a reforma da Previdência, nós queremos condições de trabalho, liberação de recursos, acabar com o contingenciamento dos órgãos, fazer uma nova estrutura do meio ambiente, concurso público e indicações de cargos.
Literalmente, não dá para falar! Fora, Salles! Não dá para termos um Ministro do Meio Ambiente que não defende o meio ambiente e que tem outros interesses que não os da sociedade brasileira.
É esta a fala que a CONDSEF traz, dando prioridade para o concurso público e para o fim do assédio moral dos trabalhadores do serviço público federal. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Está ótimo. Obrigada, Jussara.
Eu vou passar, agora, a palavra para o Cleber Buzatto, o Secretário-Executivo do Conselho Indigenista Missionário — CIMI, apenas lembrando que ele terá que sair logo mais e ficará liberado para se retirar quando for necessário.
Lembro também que nós tivemos aqui uma audiência pública, se não me falha a memória, na semana passada, para discutir o Relatório Preliminar de Meio Período da Revisão Periódica Universal, em que houve a representação do Ministério das Relações Exteriores e do Ministério dos Direitos Humanos. Soubemos, agora, que o Brasil se recusou a apresentar o Relatório Preliminar de Meio Período na Revisão Periódica Universal que acontecerá em Genebra e está sugerindo uma data em novembro para apresentar essa revisão.
Mas nós vimos aqui que há um desprezo imenso, um desprezo institucional a todos os organismos de defesa dos direitos. O conteúdo da fala de Jair Bolsonaro com relação a Michelle Bachelet se expressa com as ações institucionais, ações governamentais de desprezo para com os organismos, para com os compromissos efetivados pelo País. O Brasil efetivou uma série de compromissos e está, simplesmente, ignorando todos.
Bolsonaro ainda diz que a discussão de direitos humanos é uma ingerência. Os direitos humanos são universais! Então, não há por que dizer que as fronteiras podem permitir toda sorte de violações. A constatação do enfraquecimento das políticas de direitos humanos é óbvia, porque ela bate no nosso rosto todo dia, transforma-se em feminicídio todos os dias, transforma-se em ataques aos povos indígenas, transforma-se em ataques ao povo negro, aos jovens negros e pobres e transforma-se em aumento da violência e da morte oriunda da ação policial, que eles, inclusive, legalizar com a exceção de ilicitude, em função de um forte impacto emocional que não se sabe direito o que é.
10:59
RF
Eu acho que o Brasil está sob forte impacto emocional, está sofrendo um impacto emocional sem tamanho numa lógica de sofrimento.
Ontem, a Deputada Natália Bonavides lembrava, no plenário, a fala de Allende pouco antes de morrer, com o golpe no dia 11 de setembro. Daqui a 5 dias, haverá a lembrança do golpe de 11 de setembro de 1973, no Chile, que deixou marcas e no qual estima-se que tenham sido mortas mais de 3 mil pessoas e por volta de 32 mil pessoas presas e torturadas pelo regime militar. A Deputada Natália lembrava o que Allende dizia — era alguma coisa neste sentido: "Muito antes do que se imagina, homens e mulheres irão adentrar a construção de um novo dia".
Nós vamos perpassar as trevas e construir um novo dia! O que Allende falava para o Chile vale também para o Brasil.
Com a palavra o Cleber Buzatto.
O SR. CLEBER BUZATTO - Saudamos a Deputada Erika Kokay, que preside esta sessão; a Deputada Joenia Wapichana; o Deputado Patrus Ananias; o Dinamam Tuxá, representando aqui a APIB; os demais colegas da Mesa; todos os presentes; e aqueles que acompanham esta audiência pelos canais de comunicação da Câmara dos Deputados.
Agradecemos esta oportunidade. É importante que a Comissão de Direitos Humanos sempre se mantenha como uma porta aberta para a sociedade civil, para ouvir e processar as informações, seja aqui dentro da própria Câmara, seja em outros espaços de articulação e de incidência relativos a essa temática dos direitos humanos também no campo internacional, junto a organismos multilaterais, como neste caso da ONU, mas também com a OEA.
De fato, a situação que envolve os povos indígenas e seus direitos é, na nossa avaliação, dramática no Brasil e se agravou muito com a eleição e a posse do Governo Bolsonaro, ao longo deste ano de 2019. Há alguns pontos — vou tentar ser o mais didático possível — para os quais gostaríamos de chamar a atenção, contestando e repudiando ações deste Governo.
O primeiro ponto é a questão dos discursos violentos e atentatórios contra os povos e seus direitos em nosso País, discursos estes que têm sido feitos por diferentes membros do Governo Bolsonaro e, de modo particular, pelo próprio Presidente. São discursos recorrentes, feitos durante o período eleitoral, no período da transição e após a posse, ao longo desses 8 meses. Inclusive, falácias e informações falsas são usadas nesses discursos, reforçando sentimentos de preconceito que parte da sociedade brasileira mantém e até sentimentos de ódio contra os povos nas suas regiões. Um dos aspectos desses discursos, por exemplo, é uma forma de acusação de que as demarcações das terras indígenas atenderiam a interesses estrangeiros. Nós sabemos que isso é uma falácia, é uma mentira. Isso não tem fundamento com a realidade. Isso se contrapõe ao estabelece a Constituição do Brasil.
11:03
RF
Nesse sentido, é importante, diante de tantas acusações fraudulentas, lembrarmos o inciso XI, do art. 20, da Constituição brasileira, que diz que são bens da União as terras tradicionalmente ocupadas pelos povos indígenas.
Então, as terras indígenas, quando demarcadas, são registradas como patrimônio da União, como patrimônio do Estado brasileiro. Elas ficam sob o usufruto exclusivo e permanente dos povos, mas elas são registradas como patrimônio da sociedade brasileira.
Além disso, o próprio art. 231, além de falar dessa questão do uso exclusivo por parte dos povos, estabelece que as terras indígenas não podem ser vendidas — não podem ser vendidas.
Então, vemos que esses discursos que o Governo e o próprio Presidente têm feito são, na verdade, estratégias para tentar colocar parte da sociedade brasileira contra os povos indígenas, seus direitos e seus aliados em nosso País. Isso é extremamente repudiável e preocupante, porque os discursos acabam públicos e, feitos por autoridades constituídas no Poder Executivo, de modo especial, servindo como combustível, como forma de incentivo a ações violentas contra os povos nas suas regiões, nos seus territórios. Isso é o que também nós temos já observado: a agressão contra os povos pela via discursiva se traduz em agressões físicas contra as pessoas, contra membros dos povos indígenas e contra os territórios dos povos indígenas.
Nesse aspecto, é importante salientar o avanço do processo de esbulho territorial relativo a terras já demarcadas, a terras já registradas como patrimônio da União. Ao longo deste ano, nós temos observado que isso tem se expandido muito fortemente, em situações como a da terra indígena Karipuna, do povo Karipuna de Rondônia; da terra indígena Uru-Eu-Wau-Wau, lá de Rondônia; da terra indígena Apyterewa, do Pará; da terra indígena Awá, do Awá-Guajá, no Maranhão.
11:07
RF
Ou seja, em várias regiões, em número cada vez maior de terras indígenas demarcadas, registradas, onde os povos viviam certa tranquilidade do ponto de vista da posse pacífica, hoje são vítimas de ataques e de crimes que têm sido cometidos por parte de fazendeiros, grileiros, madeireiros, mineradores, que, de forma violenta, têm se apossado desses territórios, têm invadido, têm feito o processo de esbulho não só de bens naturais, como madeira e minério, mas também têm estabelecido posse sobre essas terras, têm promovido processos de comercialização de lotes dentro das terras demarcadas, como está registrado especialmente nos casos Karipuna, Uru-Eu-Wau-Wau e outros. Isso é extremamente grave.
Nós também temos observado que há um processo de instrumentalização do órgão indigenista em nosso País, a própria FUNAI, e de órgãos do meio ambiente também. Mas, de modo especial, no caso da FUNAI, o atual presidente foi indicado pela bancada ruralista e trabalhou na assessoria da CPI da FUNAI e do INCRA, a convite dos membros da bancada ruralista, aqui na Câmara dos Deputados, no período de 2016 e 2017, e agora ocupa a presidência da FUNAI. E, anteontem, dia 3, o Ministro Moro nomeou para a direção de assuntos fundiários, a DPT, uma pessoa que até há poucos dias advogava em processos judiciais contra a demarcação de terra indígena, no caso de uma terra indígena do povo guarani, no litoral do Estado de São Paulo.
Então, nós temos hoje órgãos do Estado brasileiro que têm responsabilidade institucional e responsabilidades constitucionais de promover a efetivação dos direitos dos povos indígenas, de modo particular, as demarcações e proteção das suas terras, sob o comando de pessoas e de forças políticas antagônicas, contrárias à efetivação desses direitos. Nós consideramos isso extremamente grave e precisamos monitorar — acho que a Comissão de Direitos Humanos tem um papel e pode cumprir esse papel — de perto as ações desses órgãos indigenistas e desses gestores no sentido de que possam acontecer na gestão deles ações de improbidade administrativa. Se se comprovar que essas pessoas estiverem agindo contra processos de demarcação de terras indígenas, acho que podemos caracterizar isso como improbidade administrativa, porque as terras indígenas, como falamos antes, são patrimônio da União. E essas pessoas estariam abrindo mão de patrimônio da União por interesses privados.
Além disso, gostaríamos de chamar a atenção também para o processo de cerceamento da participação dos povos indígenas, de suas lideranças, de suas organizações e da sociedade civil, aliada aos povos em espaços de controle social.
11:11
RF
Então, esse é um processo de fechamento. E isso é corroborado inclusive pela fala da representante da ONU, a Michelle Bachelet, que retrata essa situação que, de fato, tem se dado. Por exemplo, o Conselho Nacional de Política Indigenista está inoperante, a Comissão de Educação Escolar Indígena foi extinta. Enfim, uma série de espaços de participação social foram extintos ou estão inoperantes. O próprio Conselho de Direitos Humanos recentemente também sofreu esse tipo de intervenção. Então, esse é outro tema também que preocupa bastante.
É evidente que esses discursos e essas ações estão, de fato, demonstrados na paralisação das demarcações das terras indígenas no Brasil. O Governo Bolsonaro tem falado e tem agido nesse sentido. Isso também agride a Constituição, agride os povos e seus direitos em nosso País. E essas questões estão materializadas. Podemos constatar a materialização desse tipo de ação contra os povos indígenas, por parte do Poder Executivo de modo especial, quando analisamos a execução orçamentária do principal programa orçamentário destinado aos povos indígenas e também das ações que estão previstas no Orçamento Público da União relacionadas aos povos indígenas.
Nesse sentido, muito brevemente, quero fazer referência a algumas dessas ações e à execução orçamentária até o dia 30 de outubro.
No caso, por exemplo, da ação relativa a saneamento básico, que é uma política relacionada à saúde, ligada ao Ministério da Saúde, apenas 22% do valor previsto para 2019 foi gasto até o final de agosto, portanto, o oitavo mês do ano.
No caso da ação de regularização, demarcação e fiscalização das terras indígenas, apenas 15% do orçamento previsto para o ano foi executado até o dia 30 de agosto, o que equivale a aproximadamente 3 milhões de reais, que é evidentemente um valor irrisório considerando-se a demanda que existe. Por isso também, nós observamos o avanço do desmatamento, o avanço das queimadas ilegais por parte de não indígenas nas terras indígenas. Não há ação do Estado para promover a demarcação, não há ação do Estado para promover a fiscalização, que é uma obrigação constitucional, de acordo com caput do art. 231 da nossa Constituição.
Além disso, na ação relacionada à gestão ambiental, apenas 9,94% do orçamento previsto para o ano foi gasto até o dia 30 de agosto. Na ação relacionada à atuação com povos indígenas de recente contato, apenas 19% do orçamento foi gasto.
É importante, Deputada, chamar a atenção para o que isso pode estar escondendo. Esses são números objetivos. Podem estar por trás desses números situações factuais. Inclusive, pode estar havendo processos de genocídio de povos isolados em nosso País. Nós temos, por exemplo, na terra indígena Uru-Eu-Wau-Wau, indicativos de presença de povos isolados numa terra indígena que está sendo invadida, dilapidada por não indígenas. Não se tem informações sobre esses grupos. Em outras regiões, isso ocorre também.
11:15
RF
Então, isso é algo muito sério, muito grave. Essas populações, especialmente os povos isolados, correm riscos gravíssimos de sofrerem processo, seja por ataque direto, caso se estabeleçam esses contatos por parte dos invasores das terras indígenas, seja em decorrência de doenças que eles podem adquirir por não terem anticorpos para uma série de doenças da nossa sociedade, levadas pela invasão desses territórios onde eles se encontram.
Vejam, o Estado brasileiro não está executando o pouco de orçamento que destinou para o órgão indigenista nesse Estado. Para finalizar ainda, com a questão dos direitos sociais, culturais e de cidadania dos povos indígenas, gastou-se apenas 8,87% do orçamento, ou seja, menos de 10% foi destinado a essa ação. No caso da ação de preservação cultural, gastou-se 2% apenas do orçamento até o final de agosto.
Então, queremos reiterar essas denúncias e fazer votos de que a Comissão continue atuante, como tem sido, e que possa também contribuir, caminhando e vendo as questões que podem ser feitas como recomendações e como ofícios às autoridades da própria FUNAI, do Ministério da Justiça, para que se chame atenção a essas situações.
Nesta Casa também nós sabemos que existem vários instrumentos que têm sido manejados e que colocam o direito dos povos em risco, como a PEC 215, a PEC 187. Acho importante que a Comissão dedique um tempo para contribuir com a luta dos povos e de seus aliados, em torno da interpretação da Constituição, no que tange ao art. 231. O STF tem se debruçado, de modo especial, num recurso extraordinário que, a partir deste ano de 2019, passou a considerar como de repercussão geral, no âmbito do qual o Supremo decidirá acerca de teses relativas à interpretação da Constituição, por exemplo, a tese do indigenato, do direito originário, que é o sentido originário que o Constituinte imprimiu na Carta Magna; ou a tese ruralista do fato indígena no chamado marco temporal, que restringe o direito dos povos às terras que ocupavam em 5 de outubro.
Então, esse é um caso emblemático, e nós avaliamos de grande importância que a Comissão de Direitos Humanos e os Parlamentares aliados possam contribuir também com a luta dos povos e seus aliados em nosso País.
Muito obrigado pela oportunidade.
11:19
RF
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Muito obrigada, Cleber.
Primeiro, acho interessante colhermos esse levantamento dos recursos orçamentários que não estão sendo disponibilizados para as políticas de preservação dos territórios dos povos indígenas, que aqui foi relatado — apenas 15% da demarcação, 9% da gestão ambiental, 2% para a preservação cultural —, e ali vamos ver que vai se expressar no orçamento o desprezo pelas políticas ambientais.
Segundo, como falava o Cleber, os instrumentos que foram criados para políticas públicas ambientais e para políticas públicas de preservação dos povos indígenas estão sendo apropriados pelo contrário.
Nós temos no serviço florestal uma pessoa que já foi da bancada ruralista, um dos maiores opositores quando era Parlamentar, um dos maiores opositores aos direitos dos povos indígenas e ao próprio ambiente, e responsável hoje pelo serviço florestal do Governo. Mas alguns Ministérios — o Ministério do Meio Ambiente, o Ministério das Relações Exteriores, o Ministério dos Direitos Humanos, o Ministério da Educação — foram apropriados pelo contrário do que seriam essas políticas, inclusive no seu sentido transversal e no seu sentido de empoderamento humano. E não é inocente essa ocupação. Mas estamos vencendo isso.
Se temos uma pauta ambiental, temos uma premissa a ser superada. Essa lógica, que não é inocente, ocupa esses espaços para submeter as políticas a interesses que a destroem. Essa apropriação interna, esse internismo do contrário das próprias políticas, estamos vendo nesses Ministérios. E como falava aqui o Cleber, isso precisa ser denunciado. Inclusive, na Comissão de Ética Pública nós vamos levantar isso, levantar a pessoa que está na responsabilidade da homologação de terras indígenas: o Presidente da FUNAI, que participou como assessor da bancada ruralista na discussão da CPI do INCRA e da FUNAI. Cabe uma denúncia na Comissão de Ética Pública, porque isso é uma irresponsabilidade, é um rompimento ético do exercício da função precípua da própria FUNAI. Nós vamos tomar todas essas providências.
Com a palavra o Sr. Deputado Patrus Ananias para fazer o seu pronunciamento.
Em seguida, Dinamam Tuxá.
O SR. PATRUS ANANIAS (PT - MG) - Deputada Erika Kokay, nossa querida companheira que preside esta audiência pública, companheiras e companheiros que compõem a Mesa, geralmente, gosto de chegar, sentar e ficar ouvindo. Hoje pedi para falar, Deputada Joenia Wapichana, porque, por coincidência, todas as Comissões das quais participo na Casa estão reunidas.
11:23
RF
Eu sou titular da Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania, e sou suplente, mas procuro ser um suplente atuante, na Comissão de Educação, Direitos Humanos e Minorias e na Comissão de Legislação Participativa. Então, nós estamos com a agenda hoje bem tomada. Eu gostaria de ficar mais tempo aqui, mas vou ter que dar presença também em outros espaços importantes.
Mas fiz questão de estar aqui e trazer uma mensagem. Ontem nós lançamos aqui, na Câmara dos Deputados, a Frente Parlamentar Mista em Defesa da Soberania Nacional, uma frente que se dispõe a levar esse debate da soberania do Brasil aos nossos Estado e Municípios. Nós queremos pôr o pé na estrada brasileira e debater nas Assembleias Legislativas, Câmaras Municipais, universidades, escolas, igrejas, com os movimentos sociais populares, com a juventude.
Nós colocamos no nosso discurso, ontem, duas questões que incidem diretamente nesta reunião de audiência pública: as questões ambiental e indigenista. Cleber, nós entendemos o projeto de soberania nacional como a preservação também do nosso patrimônio, cultural, histórico, memorialístico; a preservação e o alargamento das nossas possibilidades culturais, artísticas e também a preservação do nosso patrimônio ambiental. E está muito claro hoje, de acordo com estudos, que é possível conciliar o desenvolvimento econômico com o que eu chamo também — e quero ver aqui se vocês concordam — de desenvolvimento ambiental na perspectiva do desenvolvimento integral, integrado e sustentável.
Nós que defendemos o patrimônio ambiental, a vida nas suas múltiplas e misteriosas manifestações; nós que defendemos as águas, a terra, a mãe terra, a biodiversidade, os ecossistemas presentes no nosso grande e querido território brasileiro, a meu ver, não devemos ter uma visão, digamos, defensiva, como se a questão ambiental fosse um contraponto ao desenvolvimento. Não. É fundamental o desenvolvimento. Mas não podemos pensar o desenvolvimento sem água. Não podemos pensar as águas sem a biodiversidade, sem os ecossistemas, sem a preservação do solo.
Essa é a questão que nós colocamos ontem no nosso discurso sobre a soberania nacional, que é, no fundo, o discurso sobre um projeto nacional, o Brasil que nós — os 210 milhões de brasileiros e brasileiras — queremos e merecemos.
Eu fiz também questão de realçar, Deputada Joenia Wapichana, a questão indígena no Brasil, lembrando que nós somos um País multiétnico, multirracial, multicultural, mas são as diferenças exatamente que nos constituem. Eu dizia — e reitero aqui o nosso compromisso — que a preservação das culturas, das identidades, da memória dos povos indígenas pressupõe os seus espaços próprios adequados, portanto, os seus territórios, a sua vida familiar e comunitária, a preservação dos seus valores, das suas tradições, como fator fundamental para a identidade nacional, o que vale também para as comunidades e povos tradicionais, para os quilombolas. Essa diversidade é que nos constitui, e nós precisamos preservá-la, e não diluí-la.
11:27
RF
E lembrava também um grande pensador francês, do século XVI, Montaigne, que escreveu uma obra clássica chamada Ensaios. Ele viveu exatamente no século em que os portugueses chegaram ao Brasil e levaram a ele, para ele conhecer na França... os franceses andaram tentando ficar no Brasil também, e levaram indígenas para serem apresentados lá na França. O Montaigne foi a essa apresentação de indígenas. Olhou, ouviu, e fez um texto clássico que está no livro dele. "Eles são diferentes, diferentes". Então, o Montaigne disse claramente isto: não há culturas superiores, nem culturas inferiores, há culturas diferentes. E o que constitui a grande cultura nacional brasileira são exatamente essas culturas diferentes. As culturas indígenas aportam uma contribuição inestimável, porque são habitantes desta terra e aqui forjaram sua cultura, seus valores, sua tradição há milhares de anos.
Então eu quero deixar claro este depoimento aqui porque, às vezes, pode parecer que o nosso compromisso com a soberania nacional é um compromisso que vai diluir, e que nós temos apenas, Deputada Erika, a questão econômica como referência. Não! A questão econômica é fundamental; agora, tem que ser distribuída também. Então nós queremos vincular a questão social, a questão cultural, a questão ambiental, a questão dos valores dos povos e comunidades tradicionais, para formar essa grande unidade na diversidade, que é como nós queremos o Brasil.
Por último, nós estamos falando aqui, a Deputada Erika Kokay começou tratando da Emenda 95. Eu participei, como ela lembrou muito bem, da Comissão Especial, e participei também da Comissão da chamada reforma que, na verdade, foi uma "deforma" trabalhista.
Eu quero só lembrar, gente, que nós temos, todos sabemos, um Presidente perverso, um Governo realmente que não honra as melhores tradições humanitárias da brava gente brasileira, do povo brasileiro. Mas é importante nós termos clara uma coisa: eles não estão sozinhos; por trás deles há interesses, interesses poderosos, interesses que querem se apropriar da Amazônia. E, na verdade, estão se apropriando, como estão se apropriando da Base de Alcântara. Vamos deixar claro: nós temos um Governo no Brasil, hoje, totalmente subserviente aos interesses dos Estados Unidos.
Mas, além dessa questão imperialista, dos interesses de nações poderosas, às quais ou aos quais o nosso desgoverno se submete, eu penso que nós temos que cumprir um papel pedagógico e esclarecer para as pessoas: quando querem acabar com as reservas indígenas, quando querem acabar com a natureza, com os nossos rios, com a nossa terra, com o que nós temos de bonito na Amazônia, com o que temos que preservar; quando querem acabar com o nosso patrimônio histórico, cultural, ambiental, é para transformar isso tudo em dinheiro, em lucro. A Deputada Erika colocou uma frase aqui que eu vou guardar muito bem: "há uma lógica que não é inocente, tem gente ganhando com isso". Esse é o trabalho que nós temos que mostrar às pessoas. Há interesses por trás disso.
11:31
RF
A nossa luta não se resume a derrotar homens medíocres, perversos, como Jair Bolsonaro, Sergio Moro e pessoas desse mesmo nível moral, espiritual; pessoas que não refletem o que há de melhor no nosso povo. A nossa luta, sobretudo, é contra as forças que os colocaram lá e que estão ganhando muito com isso: as forças que fizeram a Emenda Constitucional nº 95; que impuseram uma reforma trabalhista que é o fim dos Direito do Trabalho no Brasil; que agora estão impondo o fim da Previdência; como querem o fim dos territórios indígenas e territórios quilombolas; como estão acabando com a agricultura familiar, com a agroecologia.
Concluindo, a nossa presença aqui foi para trazer a nossa solidariedade. Eu fiz a escolha de vir aqui priorizar este encontro, em detrimento de outros compromissos de hoje, para dizer também que nós queremos levar Brasil afora a Frente Parlamentar em Defesa da Soberania, aos territórios indígenas e quilombolas, para debater a questão. É um tema para discutir não a formalidade, não uma soberania formal, mas é para discutir sobretudo, a partir das nossas diferenças, o Brasil que nós queremos e que os nossos filhos, os nossos netos, as gerações futuras merecem.
Muito obrigado e parabéns por este belo evento, este belo encontro! (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Muito bem, Deputado Patrus Ananias.
O Deputado Patrus pontuou coisas que são fundamentais, por exemplo, que eles não estão sozinhos, e que a nossa luta não é contra os medíocres, os cruéis que estão ocupando seja a Presidência da República, seja o Ministério da Justiça, ou outros Ministérios, como o Ministério do Meio Ambiente. A nossa luta não é contra eles, mas contra as forças e os interesses que os colocaram lá e a sua capacidade, que indica, inclusive, Deputado Patrus, penso eu, ao terem que se utilizar de pessoas que são tão caricatas e que são tão explicitamente absurdas e explicitamente cruéis, uma fragilidade. Ao buscarem títeres, que fossem títeres mais conceituados e que não tivessem tanta grosseria explícita institucional e tanta barbárie sendo naturalizada.
Lembro-me de um provérbio árabe que diz que é preciso sempre medir se as suas palavras serão mais reflexivas, mais ricas do que o seu próprio silêncio. Eu diria, não o silêncio forçado que eles querem impor aos povos indígenas, às mulheres, aos negros. Nós temos hoje a fala que explicita, a fala que arde, a fala que queima, a fala que adentra a pele, que rasga a pele; sejam as falas que são emanadas dos diálogos que foram divulgados entre o Poder Judiciário e o Ministério Público, sejam as falas emanadas das tribunas do poder ou do Governo estabelecido hoje.
Antes de passar para o Dinamam, eu vou ter que passar a palavra para o Denis Rivas, que representa aqui a Associação Nacional dos Servidores da Carreira de Especialista em Meio Ambiente — ASCEMA. Ele vai ter que deslocar logo em seguida, porque tem um voo.
Sr. Denis, sinta-se, após a sua fala, absolutamente à vontade para sair da mesa.
11:35
RF
O SR. DENIS RIVAS - Bom dia a todos e a todas. Eu queria agradecer à Deputada Erika Kokay pelo convite. Eu sou Denis Rivas, Presidente da Associação Nacional da Carreira de Especialista em Meio Ambiente, e também represento e faço parte da Maré Socioambiental. O meu agradecimento inicial eu também estendo aos Parlamentares da Frente Parlamentar Ambientalista. É muito importante esse apoio também que nós estamos recebendo da Comissão de Direitos Humanos.
Eu queria começar me solidarizando com o povo brasileiro, que hoje comemora, em espírito de luto, o Dia da Amazônia. Nós, que teríamos tanto orgulho por ter esse patrimônio mundial dentro do nosso território, neste dia de comemoração, na verdade, estamos de luto por um bioma riquíssimo que o mundo inteiro admira. O mundo inteiro adoraria conhecer as belezas da Amazônia, e infelizmente hoje, neste dia, nós estamos vendo esse patrimônio pegando fogo e sendo destruído aos nossos olhos. Então, eu me solidarizo com os povos da floresta, com os ribeirinhos, com os servidores que estão vivenciando na linha de frente esse momento duríssimo do Brasil.
Eu queria lembrar que a crise que acomete a Floresta Amazônica é também a crise por que passam todos os setores importantes do Brasil, como a ciência e a tecnologia. Todos eles estão sofrendo muito com os ataques que a Floresta Amazônica vem sofrendo. Eu queria destacar aqui especialmente o sofrimento dos servidores da carreira de especialista em meio ambiente do IBAMA, do Instituto Chico Mendes, do Ministério do Meio Ambiente, do Serviço Florestal Brasileiro, que têm visto o trabalho de décadas indo por água abaixo, ruindo, pegando fogo. É mais do que a carreira, é a nossa dedicação de décadas que está ruindo. Daí, nós nos solidarizamos, não numa solidariedade vazia, mas numa solidariedade de quem vive junto com os povos da floresta. Eu tive a oportunidade de conhecer a terra indígena ianomâmi, tive a oportunidade de conhecer a Amazônia profunda por 7 anos em Rondônia, assim como diversos outros colegas que estão nessas linhas de frente de proteção, de construção de um projeto de desenvolvimento sustentável, e nos últimos anos temos visto isso ir por água abaixo.
Eu queria também me solidarizar com os colegas do INPE, que viram o trabalho deles ser desqualificado por este Governo, que infelizmente não percebe a importância da ciência, não percebe a importância da dimensão ambiental dentro do Estado. É uma lástima, uma lástima que nós cheguemos a este ponto de não ter uma percepção da importância desse patrimônio para o Brasil e para o mundo.
11:39
RF
Então me solidarizo com o Sr. Ricardo Galvão, ex-Presidente do INPE, que foi demitido por fazer o trabalho dele; por alertar o Brasil, já em junho, para o fato de que os índices de desmatamento eram alarmantes.
Bom, eu queria agradecer aos presentes o apoio que estamos tendo dos Parlamentares à carta dos servidores, que traz doze propostas. Nós já a entregamos ao Deputado Rodrigo Maia, ontem, e também à Deputada Erika Kokay. Estamos entregando-a também para todas as Lideranças dos partidos. São 12 propostas dos servidores para superar e enfrentar a crise. Nós já vivenciamos, em 2004, um pico de desmatamento, e foi só com a união de diversos setores do funcionalismo público e com a sociedade civil organizada que nós conseguimos, de fato, reduzir os níveis de desmatamento no Brasil, com crescimento econômico. Isso era visto até muito pouco tempo atrás pelo mundo inteiro como um exemplo da contribuição do Brasil para as mudanças climáticas. Infelizmente, nós saímos dessa posição de exemplo positivo, aliando desenvolvimento sustentável e crescimento econômico, para esse desastre que vivemos hoje — não há outro nome, é um desastre. Eu queria, realmente, fazer essa divulgação. Essa carta com as 12 propostas dos servidores públicos está na página da associação dos servidores. Nós ainda estamos colhendo contribuições de organizações que queiram apoiar essas propostas, além dos Deputados, cujo apoio é muito importante, porque são propostas concretas. Ao contrário do que temos ouvido, falácias em cima de falácias, os servidores têm experiência, tem vontade de trabalhar, querem o bem do Brasil, com desenvolvimento sustentável, e, por isso, nós pedimos o apoio da sociedade civil organizada e dos Parlamentares. O e-mail da associação é ascema.nacional@gmail.com. As organizações que concordarem, que quiserem apoiar, por favor, podem enviar o seu apoio para esse endereço de e-mail, e nós vamos incluí-lo nessa proposta, que estamos divulgando amplamente.
Eu gostaria também de destacar um documento, que foi emitido ontem pelo Ministério Público Federal, através da 4ª Câmara, que cuida de Meio Ambiente e Patrimônio Cultural, a partir de uma provocação da sociedade civil organizada e das associações dos servidores em todos os Estados, bem como da Associação Nacional dos Servidores da Carreira de Meio Ambiente, que iniciou uma denúncia mesmo daquilo que está acontecendo no País. A partir dessa denúncia, o Ministério Público emitiu uma recomendação, da qual eu lerei alguns trechos, mas é basicamente uma recomendação para que o Ministro Ricardo Salles se exima de falar bobagens sem nenhum conteúdo. Eu vou ler, para não ficar parecendo que são palavras minhas.
11:43
RF
"Considerando representações encaminhadas ao MPF por associações de servidores federais da área ambiental, entre elas: ASCEMA Nacional, ASCEMA-SP, ASCEMA-RN — aí vem uma série de outras associações também, que pedem —, para apuração das responsabilidades civil, penal e administrativa de possíveis práticas e atos atentatórios aos princípios éticos e morais que norteiam as atividades da administração pública, bem como de atos ímprobos e/ou criminosos, com denúncias de críticas, ameaças, assédio moral e demonstrações públicas de desapreço à conduta de agentes de fiscalização em cumprimento de seu dever, tais como..." E aí vem uma série de documentos que nós anexamos a essa petição, como a transferência do Serviço Florestal Brasileiro para o Ministério da Agricultura, que coloca o Cadastro Ambiental Rural em risco, porque, afinal de contas, como é que o Cadastro Ambiental não está no Ministério do Meio Ambiente? Só isso já é um motivo para ligar o sinal de alerta, não é? E aí vem uma série de outras questões, como a extinção da Secretaria de Mudanças Climáticas, o Ministro visitando uma área embargada dentro de terra indígena, o que claramente estimula... porque uma área está embargada, o Ministro vai lá e acha que está tudo bem? Uma plantação de arroz dentro de terra indígena... Enfim, uma série de ações que o Ministro tomou nos últimos 8 meses; eu acho que é um recorde de descumprimento do mínimo da ética.
E o que diz o Ministério Público? Ele recomenda que se "Estabeleça, em 30 dias — no âmbito do Ministério do Meio Ambiente, do IBAMA e dos ICMBio —, uma política de comunicação pública adequada que permita aos servidores públicos do órgão cumprir o dever legal e constitucional de prestar contas à sociedade das ações específicas e necessárias adotadas diariamente para o cumprimento da legislação ambiental"; que o Ministro "se abstenha de praticar atos públicos com conotação de desincentivo ao descumprimento da lei ou deslegitimação de atos dos servidores responsáveis pela proteção ao meio ambiente e que estejam agindo no cumprimento dos seus deveres constitucionais e legais"; que o Ministro "se abstenha de dar declarações públicas que, sem comprovação, causem deslegitimação do trabalho do corpo dos" servidores do IBAMA e do ICMBio; que "adote medidas de fortalecimento do quadro de" servidores do IBAMA e do ICMBio, "garantindo recursos financeiros para o combate aos incêndios florestais e desmatamento ilegal, bem como seja garantida a necessária autonomia aos fiscais autuantes, nos termos da lei, para empregar instrumentos que visem inabilitar os infratores economicamente para a prática de novos delitos, com o fito de assegurar uma fiscalização producente e eficaz"; que "efetue a nomeação dos cargos ainda vagos de superintendência e direção, sempre com a estrita observância de critérios técnicos que comprovem a aptidão profissional dos escolhidos"; e que "apresente em 30 dias ao MPF, de maneira individualizada, informações que comprovem a utilização de critérios técnicos na nomeação de profissionais para o exercício de cargos e funções públicos no ano de 2019, com a estrita observância dos princípios constitucionais da legalidade, da moralidade, da impessoalidade e da eficiência administrativa, com fulcro no art. 37 da Constituição". Para finalizar, eu gostaria de chamar atenção da sociedade civil porque o patrimônio ambiental brasileiro está submetido aos desígnios desse antiministro, que é condenado pela Justiça e que agora responde a um processo de impeachment aberto pela Deputada Joenia Wapichana, pedido também pelos Senadores Fabiano Contarato e Randolfe Rodrigues.
11:47
RF
Essa política é, na verdade, uma antipolítica ambiental, que já coloca em risco a economia exportadora. O próprio agronegócio corre risco hoje, não só porque depende do meio ambiente saudável — parece que alguns deles esquecem que dependem dos rios voadores que a Amazônia produz, vamos lembrar —, mas que agora essa antipolítica coloca a própria soberania nacional em risco, como o Deputado Patrus Ananias nos lembrou agora. Não é à toa que foi criada essa nova Frente Parlamentar.
Para realmente finalizar, eu gostaria de alertar a sociedade, porque nós precisamos acabar principalmente com o desastre que é esse Ministro Ricardo Salles à frente de uma Pasta que ele não tem, nunca teve, competência para ocupar. Esse é o desastre com que nós precisamos acabar com urgência.
Obrigado. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Obrigada.
Esse documento foi elaborado pelos servidores e assinado por várias entidades, 18 entidades até o momento. Nós vamos, Deputada Joenia Wapichana, sugerir que a Comissão de Direitos Humanos, a Comissão de Legislação Participativa e a Comissão de Cultura possam assumi-lo, na condição de moção. E, a partir dessa moção, poderá ser encaminhada. Aqui há sugestões tanto para o Poder Executivo quanto para o Poder Legislativo, no que diz respeito às proposições que estão nesta Casa que deveriam avançar para assegurar direitos e outras que deveriam ser arquivadas para não ferirem direitos.
Aqui, dentre outras coisas, diz: "O que diferencia esta crise de outras anteriores é o desmonte por ação ou omissão dos atuais gestores da política ambiental". Aqui diz que, entre 2004 e 2012, a redução do desmatamento foi de mais de 80%, período em que o Brasil vivenciou um crescimento econômico chegando a 3% do PIB. Ou seja, comprova com dados que a preservação... Aliás, é o contrário, porque há um estudo da EMBRAPA que aponta que, se não for controlada a devastação, o desmatamento na Amazônia, vai haver um impacto na produção agrícola do Brasil, inclusive no agronegócio. E a EMBRAPA estima um impacto em milhões, um impacto negativo. E também o INPA faz um levantamento de que 70% das chuvas no Estado de São Paulo existem em função da Floresta Amazônica. Se nós olharmos a faixa onde está a Floresta Amazônica, nós vamos ver que ela corresponde a uma faixa onde nós encontramos vários desertos: desertos na América do Sul, desertos na África. Mas aqui não há o deserto, em função da própria existência da Floresta Amazônica. Então, nessa faixa em nível global, nós podemos vemos que há uma diferença no que diz respeito à Amazônia, sob o ponto de vista da desertificação do próprio território.
11:51
RF
Aqui diz também: Diversas atitudes levaram à situação crítica atual. O Sistema Florestal Brasileiro foi entregue ao Ministério da Agricultura. A Secretaria de Recursos Hídricos e a Agência Nacional de Águas foram para um importante usuário de recursos hídricos, o Ministério do Desenvolvimento Regional. Diversos cargos estratégicos do Ministério do Meio Ambiente — MMA e autarquias ficaram vagos durante meses ou foram ocupados por indicações ideológicas antiambientais. Isso é um pouco do que o Cleber Buzatto também alertava sobre quem está na FUNAI.
Há limitação de atuação e perseguição aos servidores, falta de autonomia técnica, desautorização de ações de fiscalização, imposições de lei da mordaça, ingerência em autarquias autônomas por lei, desinformação permanente, redução das autuações, multas e embargos em relação aos anos anteriores, desestruturação e perda dos recursos do Fundo da Amazônia, recusa por doações internacionais, não utilização de dinheiro do Fundo Clima, da compensação ambiental e da conversão de multas, em um contexto de contingenciamento orçamentário e limitações de gastos com a Emenda Constitucional nº 95.
Sobre a força de trabalho, a estimativa atual é a necessidade de cerca de 4.500 vagas para a recomposição da força de trabalho por meio de concursos públicos de todos os órgãos da carreira — IBAMA, ICMBio, MMA, Sistema Florestal Brasileiro. Só no IBAMA, o número de fiscais despencou 45% entre 2010 e 2019. E, dos 780 servidores atuantes na fiscalização, um quarto está apto a se aposentar.
Portanto, é um quadro extremamente caótico, do ponto de vista dos instrumentos. Além disso, aqui também está dito neste documento — que nós queremos transformar em moção destas Comissões para ser encaminhada ao Legislativo e à Presidência da Casa — que nós temos uma proposta de licenciamento ambiental que flexibiliza sobremaneira o próprio licenciamento ambiental.
O Brasil está vivenciando um momento grave, um momento que vai deixar muitos rastros para muitas gerações. A Deputada Joenia sabe — ela tem sido uma aguerrida lutadora — que eles querem se apossar dos territórios indígenas e doá-los para o nível de subserviência que nós temos aqui. E dizia o Deputado Patrus, eu vou repetir: "Eles não estão sozinhos". Eles estão respondendo a interesses que são antinacionais, interesses do mercado que está concentrado na condição de doar este Brasil para os Estados Unidos.
11:55
RF
Passo a palavra para o Dinamam Tuxá.
Em seguida, passo a palavra para a Deputada Joenia Wapichana.
O SR. DINAMAM TUXÁ - Bom dia, pessoal, a todos e a todas. Primeiramente, eu quero saudar a Deputada Erika Kokay e a Deputada Joenia Wapichana pela belíssima iniciativa de trazer ao debate assunto de suma importância não só para os povos indígenas, mas também para toda a Nação brasileira e para o mundo. Quando tratamos de questões ambientais, nós tratamos a questão da sobrevivência da humanidade neste planeta.
Então, esta audiência traz pautas que estão em evidência no momento não só pela questão da Amazônia, mas também pelas questões de mudanças climáticas que clamam pelo apoio da humanidade para combater tais violações ao meio ambiente. Em breve, serão reconhecidos como crimes todos esses atentados que estão sendo praticados contra a Amazônia brasileira, contra o Cerrado, contra a Caatinga e contra todos os biomas existentes no território nacional. Esperamos isso que seja aprovado na Câmara como crime de ecocídio, porque o Estado brasileiro, juntamente com as grandes corporações, há muitos anos, vem explorando, vem destruindo todo o bioma que existe no território nacional.
Passando desta fase inicial de agradecimentos, é importante frisar que nós, enquanto organização indígena, enquanto movimento indígena, estamos bastante preocupados. É uma preocupação que perdura, principalmente após a ruptura da nossa democracia com a entrada do Presidente Michel Temer, quando se acentuou, de forma muito gradativa, a violência contra os povos indígenas. Essa violência resultou na Emenda Constitucional nº 95, com os cortes orçamentários, que influenciaram diretamente o orçamento da FUNAI e da SESAI, que acabaram refletindo na paralisação total das demarcações das terras indígenas e, consequentemente, com essa paralisação, percebemos também o aumento do desmatamento, o aumento da mineração e também o aumento da criminalização das lideranças indígenas que combatem esse tipo de atividade ilícita contra os territórios e os povos indígenas.
Isso é preocupante, porque o atual Presidente da República, em ato de campanha — antes mesmo de ato de campanha, quando era Deputado nesta Casa —, já se utilizava destas plenárias aqui para insuflar a população brasileira contra os povos indígenas. Num ato de campanha, ele fez diversas declarações caluniosas, e boa parte da população brasileira se identificou com aquele discurso. Consequentemente, com esse discurso de ódio contra os povos indígenas, ao se confirmar que ele se tornaria o Presidente da República após as eleições, diversas comunidades indígenas foram atacadas 1 dia após o resultado das eleições, como a comunidade dos pancararus, em Pernambuco, que teve uma escola, um posto de saúde e uma igreja incendiados por seguidores, pessoas ligadas ao Presidente e pessoas que comungam da sua ideologia criminosa frente aos direitos dos povos indígenas.
11:59
RF
Preocupa-nos ainda que, após tomar posse, ele editou a Medida Provisória nº 870, que dilacera a FUNAI, dividindo essa instituição que tem o dever institucional de demarcar e proteger as terras indígenas. Pois bem, com essa divisão que foi feita pelo atual Presidente, tirando da FUNAI a competência de demarcação das terras indígenas, retirando a FUNAI do Ministério da Justiça e colocando-a no Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, da Ministra Damares, e declarando que no seu Governo não há sequer a possibilidade, ele não cogita a possibilidade de demarcar as terras indígenas — esta é uma declaração feita pelo Presidente —, houve uma mobilização muito grande pela Deputada Joenia Wapichana, nossa parenta, pela Deputada Erika Kokay e por uma bancada aqui da Câmara dos Deputados, para tentar reverter esse posicionamento do Presidente, esse ato criminoso de enfraquecimento, de sucateamento da política indigenista.
Pois bem, diante disso, com o apoio dos Deputados e de pessoas sensíveis à causa, conduzida pela Deputada Joenia Wapichana, conseguimos reverter tudo o que foi feito pela Medida Provisória nº 870, trazendo novamente a FUNAI para o MJ e também sua competência de demarcar as terras indígenas. Não contente com isso, ele promulgou uma nova MP, a Medida Provisória nº 886, desfazendo o que foi debatido aqui, o que foi aprovado pelo Congresso, indo de encontro a preceitos constitucionais de que ele não poderia colocar em pauta novamente um novo decreto, pauta já aprovada aqui no Congresso Nacional. Ele é muito mal assessorado, não é? Isso foi novamente debatido e, inclusive, levado ao Supremo Tribunal Federal, que cancelou. E ele reconheceu a falha do ato de tentar pautar novamente essa medida de transferência da FUNAI para o Ministério da Mulher, retirando a competência de demarcação das terras indígenas.
Não contente com isso, por ter tido uma perda aqui no Congresso e no Supremo Tribunal Federal com a insistência no enfraquecimento e na paralisia dos processos de demarcação, ele conseguiu reduzir novamente o recurso destinado à FUNAI, que já opera no seu limite não só de recursos financeiros, mas de recursos de pessoal. Hoje, a FUNAI tem um déficit de aproximadamente 3.600 funcionários para que ela atue de forma plena e consiga implementar as ações dentro das terras indígenas. Infelizmente, esse déficit de pessoal acaba prejudicando a atuação da instituição, que é responsável pela proteção e demarcação do nosso território.
E dos poucos funcionários que aqui ainda lutam para que essa instituição siga os preceitos pelos quais ela foi criada, os preceitos institucionais da FUNAI, parte dos cargos desses funcionários foi destinada a bancadas que comungam contra o direito dos povos indígenas, iniciando pela cabeça da FUNAI, que é Presidência, que hoje é ocupada por um delegado. Não temos problema com delegados. O problema é que o delegado entrou na FUNAI, foi nomeado para a Presidência da FUNAI, para justamente fortalecer a ideologia de bancadas aqui desta Casa, como a bancada do agronegócio. Inclusive, ele assessorou a CPI da FUNAI/INCRA contra os povos indígenas e já chegou a declarar também que é contra a demarcação de terras indígenas. Preocupa-nos mais ainda quando nomeia uma pessoa ligada ao agronegócio, que contestou vários processos de demarcação para ocupar um departamento tão importante quanto a Diretoria de Proteção Territorial — DPT.
12:03
RF
Tais medidas tomadas pelo atual Governo são inconstitucionais, atacam tratados internacionais, violentam as comunidades indígenas, os povos indígenas e o meio ambiente.
Percebemos também que, ao fazer esse discurso totalmente preconceituoso, houve, por parte de diversos organismos governamentais, a prática de racismos institucionais. Vemos que, ao chegarem aos órgãos públicos, está havendo uma certa resistência por servidores públicos em atender os indígenas da melhor forma ou como deveria atendê-los, conforme os preceitos legais e os direitos positivados, que garantem aos povos indígenas acesso a todos os serviços públicos essenciais à vida não só dos povos indígenas, mas de toda a população brasileira.
Percebemos também que há um desmonte das instituições de políticas públicas diferenciadas, a exemplo da saúde e da educação. A aniquilação dos espaços de participação de controles sociais, como o Fórum de Presidentes de CONDISI, que está ligado diretamente ao Conselho Nacional de Saúde e aos distritos sanitários indígenas, o Comitê Gestor da Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental de Terras Indígenas — PNGATI, o CONCEA e o CONAMA.
Diante de tudo isso, nós, enquanto organização, já elaboramos um relatório para ser apresentado na RPU, que vamos disponibilizar para esta Comissão poder agregar às demandas que vão ser juntadas e encaminhadas à revisão periódica.
Quero abordar também que nos preocupa o avanço do desmatamento não só na Amazônia, mas também no Cerrado. Quero principalmente frisar que os defensores do meio ambiente, os defensores de direitos humanos — indígenas e apoiadores — estão sofrendo com essa nova conjuntura. Precisamos assegurar que essas pessoas sejam protegidas. Devemos proteger quem protege o meio ambiente, quem protege a dignidade da pessoa humana, quem protege a humanidade. E esta Comissão, acredito, tem uma força, tem uma influência política para tentar minimamente proteger essas pessoas.
Trago pessoas de suma importância que vêm na defesa dos direitos indígenas, no direito do meio ambiente, como Vasco Pankararu, Sarapó Pankararu, que está neste momento sendo ameaçado por fazendeiros, que vive acuado dentro do seu território, sem poder transitar livremente no território nacional, não só no seu Município, mas em todo o território nacional, porque está sob ameaça. O Cacique Babau também vive constantemente sob ameaça, não só pelo poder público local, ou pelo poder privado local, mas também pelo Poder Judiciário, que vem tomando posições totalmente parciais, que sempre acaba tomando decisões contra os povos indígenas. É o que vem acontecendo, principalmente com o Poder Judiciário das primeiras instâncias. No Supremo Tribunal Federal, conseguimos reverter muitas decisões arbitrárias.
Precisamos iniciar, de forma técnica, de forma colegiada, no campo jurídico, no campo político, de alguma forma, a demarcar as terras indígenas. Que este Congresso se posicione, que esta Comissão comece, de alguma forma, a pressionar, ainda mais do que já vem pressionando, para que volte novamente a pauta da demarcação a ser debatida.
12:07
RF
Nós sabemos que o Supremo já se posicionou. Mas nós precisamos pressionar ainda mais para que esta pauta seja novamente debatida dentro da Presidência da República, para que se cumpram os princípios constitucionais contidos nos arts. 232 e 231 da nossa Constituição Federal. O que nos preocupa ainda mais, e o que traz à tona todo esse debate, é que nós vivemos um cenário desolador. Nós sabemos que a crise na Amazônia hoje, as queimadas na Amazônia hoje são provenientes do discurso. E, pior, além do discurso do ódio e da não existência de uma política ambiental, eles querem culpar as pessoas que protegem aquele meio, aquele bioma. Ele chegou a declarar que as ONGs é que são culpadas. Culparam os povos indígenas e as ONGs que apoiam, que atuam dentro da Amazônia brasileira, como se nós fôssemos os que estão promovendo as queimadas naquele bioma.
Também nos preocupa mais ainda o silêncio da sociedade brasileira. Existe, sim, uma grande mobilização em prol da Amazônia. Mas não existe mobilização para defender quem defende a Amazônia. A Amazônia, por si só... Ela está em pé hoje porque há pessoas no meio da floresta, há indígenas que protegem aquele território. Se fizermos um levantamento para identificar as áreas mais preservadas, veremos que elas estão dentro das terras indígenas. Mas ela só está preservada porque os indígenas estão lá, estão protegendo aquele meio.
Nós precisamos dar visibilidade às pessoas que fazem a proteção daquele meio, porque a floresta em pé não se assegura, prova disso é que as unidades de conservação estão sendo atacadas. Não há presença indígena lá; há proteção do Estado. Mas o Estado não consegue fazer a proteção das unidades de conservação, que são as mais degradadas hoje e justamente as áreas em que há proteção ambiental, e não se cumpre, porque o Estado não é competente para isso. Se as terras indígenas hoje são as mais bem preservadas, é porque nós fazemos a proteção. Damos as nossas vidas para a proteção desse meio.
Muito obrigado. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Isso foi constatado, como eu disse anteriormente, na CPI do INCRA. O mapa é inconteste do ponto de vista de que as áreas mais preservadas são os territórios indígenas e as menos preservadas são as áreas do latifúndio. Nós constatamos isso. Também houve o depoimento do Secretário Nacional de Segurança, que, se não me engano, é o General Theophilo. O General veio fazer um depoimento aqui porque ele foi o responsável pelo Estado-Maior da Amazônia, ou seja, o responsável maior pela presença do Exército brasileiro na Região Amazônica. E ele dizia, primeiro: "Nós trabalhamos em parceria com as ONGs". Ele citou várias ONGs, como o ISA e algumas ONGs ligadas a igrejas, igrejas evangélicas. Ele dizia que trabalhavam em parceria com as ONGs. O Fundo Amazônia é importante, porque eles decidem o que fazer com ele, e eles têm decidido construir uma série de instrumentos importantes para a preservação da própria Amazônia.
É preciso entender que o Fundo Amazônia, primeiro, é gestado pelo BNDES; é uma empresa brasileira, um banco brasileiro. Ele tem um conselho, que é também composto de brasileiros e brasileiras. E os recursos que ele recebe são em função dos índices de controle do desmatamento. Quanto mais se preserva a floresta e se evita o desmatamento, mais o Fundo Amazônia recebe recursos. Não é um recurso que se estabeleça para que o país que cede, no caso a Noruega e a Alemanha, faça qualquer tipo de ação. O nível de ação a ser feito é determinado pelo povo brasileiro, através do conselho e do BNDES, e o recurso vem em função do cumprimento... em função da diminuição do próprio desmatamento. Isso é importante dizer, para que não se crie a discussão falsa de que no fundo há uma ingerência, porque não há ingerência na utilização dos recursos. É em função do próprio desmatamento ou da eliminação, da redução do desmatamento que advêm os recursos.
12:11
RF
Eu queria registrar a presença do Amarildo, uma liderança da Raposa Serra do Sol. É um prazer tê-lo aqui. Ele tem tido uma participação ativa nesta discussão aqui na Casa.
Registro também a presença do Deputado José Medeiros, a quem vou passar a palavra.
V.Exa. terá 3 minutos, Deputado, segundo o Regimento, para fazer o seu pronunciamento. Apenas informo, Deputado José Medeiros, que nós vamos passar a palavra depois para os demais membros da Mesa que queiram usar a palavra e vamos abrir espaço para até cinco inscrições, para as pessoas que aqui estão se manifestarem. As pessoas que quiserem falar levantam o braço, que nós colhemos a inscrição, após a fala dos membros da Mesa. Como hoje é um dia em que as pessoas estão voltando para o seu Estado, vamos dar prevalência ao Deputado, tal como fiz com outros Deputados, para a utilização da palavra.
O SR. JOSÉ MEDEIROS (PODE - MT) - Muito obrigado, Sra. Presidente.
Gostaria só de fazer um acordo de procedimentos aqui. Como isto aqui é um debate, e numa audiência pública nem sempre todo mundo pensa igual, e tendo em vista que nas outras vezes em que me manifestei aqui quase fui apedrejado, vou pedir para a audiência e para os convidados — até mesmo porque eu vou sair, e vão ter tempo suficiente para me arrebentarem — que me garantam os meus 3 minutos, que não façam nenhuma manifestação durante o meu tempo.
Vocês vão ter tempo para esculhambar o Deputado José Medeiros depois. Eu só peço essa garantia.
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Não, Deputado, aqui estão asseguradas as falas. E nós, mais do que ninguém, defendemos a pluralidade das ideias, não podemos ser a mesma coisa que o Presidente da República.
Eu vou pedir que reponham o seu tempo, para que comece agora.
O SR. JOSÉ MEDEIROS (PODE - MT) - Muito obrigado.
Sra. Presidente e demais convidados, eu moro quase na Amazônia, eu moro no Estado de Mato Grosso. Esse debate sobre a questão indígena é muito latente no Estado de Mato Grosso. Vivemos constantemente fazendo audiências públicas, senão nos Municípios, na Assembleia Estadual, e há sempre um fato interessante. Em todas as discussões, sejam de um lado, sejam de outro, sejam de qualquer viés político, há sempre uma coisa que eu acho interessante: todos querem, pensando de uma forma ou de outra, ajudar os indígenas. Então, eu penso que em algum momento vamos ter que convergir para que essa ajuda chegue.
Eu tenho andado muito por Mato Grosso, por todas as aldeias e vejo que essa ajuda não tem chegado, seja de ONG, seja do Estado.
12:15
RF
Tenho passado pelas aldeias de Campinápolis, e as pessoas têm-me dito o seguinte: "Senador, aqui tem fome, aqui tem doença". Passo pela aldeia dos xavantes, a mesma coisa. Eu tenho conversado com alguns fazendeiros que moram perto, e eles falam: "Às vezes, a gente dá vaca, às vezes eles têm que ir para a BR fazer pedágio. As pessoas reclamam. Tem 14, 15 pedágios numa rodovia". É fome! Eles não estão indo lá para... É fome. Em Luciara e Santa Terezinha também.
Então, a situação do indígena, em que pese toda a discussão, não é a melhor. Não vou falar sobre a Amazônia, que eu não conheço. Onde tenho conversado tenho visto essa situação.
Quando faço a defesa aqui de certos temas, a pessoa fala: "Esse reacionário, esse retrógrado!". Eu digo: "Que tema é esse?". Surgiu em Mato Grosso a ideia de os índios parecis, que têm 1 milhão de hectares... Resolveram tirar 10 mil hectares, de acordo com a FUNAI —, fizeram um TAC — Termo de Ajustamento de Conduta com a FUNAI, o Ministério Público, o Judiciário — e começaram a plantar. A situação da aldeia melhorou muito. Eu tenho defendido que as aldeias que quiserem tenham essa autonomia, sem interferência de ninguém de fora — sem interferência de ninguém de fora. Tenho defendido isso com unhas e dentes porque eu vejo a diferença na prática. Esse é um ponto que eu tenho defendido que tem causado muita polêmica.
Outro ponto é o das demarcações. Quando foi feita a demarcação da Raposa Serra do Sol, foi feito um marco temporal. De lá para cá não pararam os conflitos. Penso que ou obedecemos a esse marco, ou temos que nos reunir novamente e fazer um marco temporal de novo, que possa ser obedecido. Por quê? Os conflitos são constantes. Mato Grosso tem sofrido. Agora mesmo, a Fazenda Suiá-Missu tirou de lá uma comunidade de quase 10 mil pessoas. Está lá o conflito. Se o Governo fosse lá, tirasse essas pessoas, dissesse "aqui os indígenas vão ficar" e indenizasse essas pessoas... Não. Tiraram, gastaram-se milhões, e já morreram 22 — depressão ou suicídio. Quando não arrebenta com os índios, arrebenta com os outros, e no tecido social só ficam os conflitos. É mais gente odiando os índios, e os índios odiando... É o que eu digo: nós precisamos começar a resolver essas questões.
Agora é em Juara. É outra questão. Quando eu era criança, morava no Município de Juara, e não havia índio lá. Agora a FUNAI diz: "Aqui é, porque, de acordo com os estudos, tinha". São 5 mil hectares, é uma briga dos infernos. Vai tirar uma vila que está instituída há 70 anos. São 5 mil pessoas. Gente, são 5 mil hectares. O que vai gastar com esse processo, tenho dito, pega, negocia, dá outra área. O Governo do Estado está pronto? "Não, tem que ser essa". Isso para atender 15 indígenas que tiveram uma briga na aldeia.
É muito ranço no meio das coisas, e não se resolve. As coisas precisam sair desse campo da briga. Precisamos partir para o entendimento. A FUNAI precisa passar, sim... Eu discordo totalmente. A FUNAI, do jeito que estava, estava impossível. A FUNAI estava criando pelo menos...
O tempo acabou? (Pausa.)
12:19
RF
Tudo bem. Eu agradeço, Presidente.
Mas eu queria deixar essas mensagens, de que nós precisamos caminhar para um real entendimento dessas questões e parar de brigar, porque, enquanto os políticos brigam, as aldeias passam fome.
Muito obrigado.
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Deputado José Medeiros, houve toda uma discussão, muito acumulada aqui, sobre a questão, por exemplo, dos guaranis kaiowás de Mato Grosso do Sul. Grande parte das pessoas que estão lá, dos produtores, chegou com um título formal, legal, e arrancou... Os indígenas saíram das suas terras e foram utilizados, muitas vezes, como mão de obra escrava para construir as fazendas. E a partir daí...
O SR. JOSÉ MEDEIROS (PODE - MT) - Esse é o nosso distrito. Eu sou de Mato Grosso.
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - Eu sei, eu sei. Estou falando da realidade de guaranis kaiowás porque vou chegar ao que V.Exa. está falando.
Ali se discutiu, com o advento da Constituição, com a demarcação, com a identificação... Os indígenas queriam voltar para o seu próprio espaço, que tem um caráter sagrado, pelos seus antepassados e pela sua própria vivência. A Constituição foi muito clara acerca disso, tanto é que disse que tem que se indenizar apenas pelas benfeitorias, que não tem que se indenizar pela terra nua quem ocupou um território reconhecido como território indígena.
O que se tentou construir à época? Isso em Mato Grosso do Sul. Tentou-se construir um processo de indenização dos proprietários. Os proprietários que foram lá, por boa fé, com títulos, por um processo de colonização do próprio Estado, saem, porque não havia para eles esse caráter tão sagrado, e tentam essa indenização. Houve, à época, uma série de reuniões com o Ministério da Justiça, para se tentar construir isso. Agora, o que não tem sentido é matar por dentro o próprio povo indígena, que saiu de lá e foi colocado no que eles chamam de "confinamentos". Nesses confinamentos há vários povos. Ali eu ouvi a fala de um cacique, que para mim é muito esclarecedora: "Será que alguém acha que eu posso ser indígena se eu não posso pescar, se eu não posso caçar," — é um povo que tem um caráter também nômade — "se eu não posso caminhar, se eu não posso estar na terra onde estão os meus antepassados?". Então, ali a situação é bastante aguda.
Porque há algumas áreas de muitos conflitos em que é preciso realmente haver mediação, para resolvê-los, mas o caráter do território para o povo indígena não pode ser desconsiderado, faz parte da sua própria cultura. Na linha do que V.Exa. está falando, da mediação... Tanto é que eu vou repetir: indenizar apenas as benfeitorias significa não indenizar a terra nua para quem a ocupou — é um posicionamento do Constituinte, que está gravado na nossa própria Constituição.
A questão do marco temporal é outra discussão, porque veja: o povo foi vítima do esbulho, foi retirado de lá de forma ilegal e indevida, negada pela própria Constituição, e aí, em 1988, ele não estava lá, no advento da Constituição, porque foi vítima do esbulho. Isso também é muito injusto com esse povo.
Mas são discussões que eu acho que esta Casa tem que promover, para ver o que é possível construir nesse acordo. De sorte que o compromisso com os territórios indígenas e com os povos indígenas é um compromisso com a nossa brasilidade.
Obrigada pela participação.
Eu vou passar a palavra para a Deputada Joenia Wapichana e depois para o Angelo, para que nós possamos concluir os trabalhos. As pessoas que quiserem fazer uso da palavra apenas levantem a mão.
(Pausa.)
12:23
RF
A SRA. JOENIA WAPICHANA (REDE - RR) - Bom dia a todos e a todas.
Que pena que ele já saiu. (Riso.) Mas é sempre assim a reação. Eu fiquei de propósito, só para ter a oportunidade de responder, mas, infelizmente, ele saiu.
Eu queria, primeiro, agradecer à Deputada Erika Kokay pela iniciativa do requerimento, neste momento em que é importante para nós povos indígenas e sociedade brasileira fazer uma discussão sobre quais são realmente os impactos dessas violações que vivemos, sobre o retrocesso das políticas ambientais e indigenistas e sobre como a Comissão de Direitos Humanos pode dar encaminhamento a isso.
Eu também queria saudar o Amarildo Macuxi, que veio lá da Raposa Serra do Sol. Ele esteve aqui em duas audiências. Participou, no dia 3, de uma Mesa que discutiu o tema Terra e Territórios: Alimentação Saudável e Redução de Agrotóxicos. Ontem nós estivemos em um ato solene pela Amazônia.
Antes de começar a comentar e até mesmo a responder a alguns pontos que são superimportantes, eu quero dizer que acabei de receber uma notícia muito triste para nós da Amazônia, para nós de Roraima e, eu diria, também para o povo indígena ianomâmi. Eu queria pedir 1 minuto de silêncio em respeito à memória de um grande xamã que se chama Lourival Yanomami. Ele é sogro do Davi e faleceu nesta semana. Então se vai mais um guerreiro que lutou muito pelos direitos dos povos indígenas ianomâmis.
Eu peço 1 minuto de silêncio em homenagem à memória dessa liderança.
(O Plenário presta a homenagem solicitada.)
A SRA. JOENIA WAPICHANA (REDE - RR) - Obrigada.
Agora eu vou pedir uma salva de palmas a essa estrela.
(O Plenário presta a homenagem solicitada.)
A SRA. JOENIA WAPICHANA (REDE - RR) - Nós ficamos bastante comovidos também com a resistência dos povos indígenas. Hoje é o Dia da Amazônia — eu sou do Estado de Roraima, parte da Amazônia — e também é o Dia Internacional da Mulher Indígena. São duas datas bastante significativas para nós, Deputada Erika. Que bom que estamos discutindo um tema tão importante. Geralmente, nesses momentos de reconhecimento de datas, a nossa reação como povos indígenas é justamente de protesto, quando fazemos uma análise de conjuntura e encaminhamos demandas. Isso é comum para nós.
Realmente, o que nós estamos vendo no Brasil — e aqui é uma reação — é total retrocesso, omissão e irresponsabilidades na condução do nosso País. Infelizmente — e eu concordo plenamente quando se fala nisto —, há um silêncio por parte da sociedade brasileira. Nós temos que acordar a sociedade. Não é possível — não é possível! — que um chefe de Estado governe um país à base de fake news. Isso porque não considera que existem mudanças climáticas, porque não considera risco à segurança de pessoas dizer que precisa rever a demarcação de terras indígenas, porque não considera o perigo de dizer que terras indígenas devem ser abertas para a mineração. Isso é colocar em risco também a Amazônia. Isso é lamentável.
12:27
RF
Mas eu digo que nós temos que atuar bastante próximos à sociedade, para que ela perceba o que está retrocedendo, para que ela perceba que quem está em risco não são apenas os povos indígenas, a Amazônia, mas também toda a legislação, toda a legalidade, todo o processo em que o Brasil já avançou, em termos de políticas públicas, em termos de consolidação.
Eu aproveito para dizer que o Deputado que saiu daqui falou umas coisas que não são verdades. Primeiro, quero dizer que conheço um pouco, não indo muito além, os parecis. Quem conhece a história dos parecis sabe que eles sofreram bastante pressão no passado.
E a questão de exercer a agricultura, a pecuária ou qualquer outra atividade econômica é plenamente assegurada na Constituição Federal brasileira. Para isso, para exercer esse tipo de atividade, não necessitariam fazer o arrendamento de suas terras. Agora, tem que haver todos os procedimentos. Muitas pessoas alegam: "Ah, eles são proibidos de exercerem a agricultura. Por isso o IBAMA foi lá e embargou". O processo que culminou, digamos assim, na atuação do IBAMA era relacionado ao acesso a sementes transgênicas. Então, foi o contrário. Não foi porque exerceram a atividade da agricultura.
O TAC que foi mencionado, com o Ministério Público Federal, foi para um prazo de transição. Os povos parecis estiveram por muito tempo arrendando a terra e ficaram mais tempo. Quando houve o procedimento, o Ministério Público fez com que eles tivessem ciência de que não era possível legalmente assegurar isso. Houve uma transição, para que os indígenas exercessem, por si sós, a agricultura.
O caso que culminou na atuação do IBAMA foi justamente por causa de outra situação, a questão das sementes transgênicas. Isso trouxe visibilização. Disseram que os indígenas não poderiam exercer o seu papel de produtores, de empresários. Não. Para exercer qualquer direito social, inclusive a agricultura, a agroecologia, o turismo... Como muitos falaram aqui, será que é preciso mudar o art. 231, para que os povos indígenas possam adquirir o CNPJ? Isso não é verdade. Hoje várias organizações indígenas estão à frente de suas atividades econômicas, de suas atividades de defesa dos direitos indígenas e têm o seu CNPJ, inclusive cooperativas. Agora, a forma como se relacionam com a terra é diferente: é uma relação em que valorizam os conhecimentos tradicionais, é uma relação que respeita a natureza, que valoriza o manejo sustentável. É disso que nós estamos falando. Não é simplesmente o modelo que degrada, que explora e, principalmente, que diz que os indígenas, para exercerem a sua cidadania, têm que abrir mão dos seus direitos constitucionais. Ah! Isso, sim, é incompatível com o que a Constituição assegura. Em relação à Terra Indígena Raposa Serra do Sol, eu acompanho o processo, como profissional, já há muito tempo. Conheci o Amarildo, que aqui está, quando era menino ainda. Eu era jovem, tinha os meus 20 anos, e acompanhava isso como advogada, já naquela época.
12:31
RF
O Amarildo, para quem não sabe, é vítima de um conflito relacionado à Raposa Serra do Sol. O pai dele foi assassinado, e seu corpo foi jogado numa cova rasa — isso aconteceu em 2003. O caso está impune. Esta foi justamente uma das argumentações que se defendia: de que as terras indígenas eram de usufruto exclusivo dos indígenas. Foi esta a razão: um crime aconteceu, dentre vários assassinatos que aconteceram lá na Serra do Sol. Só quem foi vítima nesse processo foram os povos indígenas, que tiveram seus pais arrancados e jogados em erosões. Quando falamos "cova rasa", nós nos referimos a uma erosão. Os corpos são jogados, sem valor nenhum, sem respeito nenhum. Até hoje o crime está impune. Quem acompanha esse caso sabe disso. Os fazendeiros saíram, mas deixaram o estrago.
Falar que o processo de demarcação da Raposa da Serra do Sol trouxe um marco temporal também é um equívoco. Jamais a decisão do Supremo respaldou esse entendimento. Essa tese do marco temporal foi citada de uma forma comparativa, como se os indígenas tivessem tido o avanço com a Constituição, com a Constituição de 1988. Mas o direito dos povos indígenas não começa a partir da nossa Constituição. Essa é uma tese que o agronegócio tem defendido, que várias pessoas do latifúndio que lutam, que disputam terras indígenas têm tentado fazer imperar, mas temos rebatido. Não é, Deputada Erika?
Conheço a Deputada Erika desde a época dessas militâncias, contra inclusive esse pensamento ilegal, anti-indígena, racista que diz que os direitos só começaram a partir de 1988. É inverdade por quê? Porque a nossa Constituição assegura que os povos indígenas têm os direitos originários sobre suas terras. Se o direito é originário, ele é reconhecido até mesmo a partir da própria criação do Estado brasileiro. Aqui só havia povos indígenas, que foram vítimas de um genocídio. Segundo os historiadores, havia 5 milhões de índios, e hoje o IBGE registra que há apenas mil — quase mil. Havia mais de mil povos de diferentes culturas, e hoje só há 305. As línguas eu posso comparar agora: de mil povos de diferentes culturas, só restaram 274 línguas faladas. Estamos vendo em que resultou essa violência em relação aos povos indígenas.
Hoje temos 13,8% do território nacional reconhecidos como terras indígenas, mas isso é pouco ainda. Não é justo rever até mesmo essas terras, esses 13,8% que foram reconhecidos oficialmente, com base em legislação nacional, com base em um processo que levou anos. O processo da Raposa Serra do Sol levou mais de 36 anos para ser concluído, mas foi feito com base legal, com critérios que a Constituição determina: questões ambientais, questões espirituais, questões culturais, questões econômicas e atividades que as comunidades desenvolvem. Todos esses critérios são baseados na Constituição. Nada foi feito sem base em legislação.
12:35
RF
Quando ele fala em marco temporal, nós entendemos que é justamente para reverter um direito que já foi consagrado na Constituição e para penalizar os povos indígenas que foram expulsos de suas terras por qualquer motivo, seja porque houve uma pressão sobre o agronegócio, seja porque não houve o processo da terra indígena, seja porque o povo indígena era nômade. Qualquer que seja o motivo, não justiça o não reconhecimento do território indígena.
Realmente, acho que essa demora no reconhecimento das terras indígenas, essa demora na conclusão do procedimento, que já deveria ter sido concluído 5 anos depois da promulgação da Constituição e não foi concluído até hoje é justamente o que leva à depressão e ao suicídio.
Quando comecei, em 2003, na primeira vez em que eu estive em Mato Grosso do Sul, fiquei bastante impactada e levei dali essa visão que eu tinha para a defesa da Raposa Serra do Sol, porque não queria ver meus parentes sofrendo aquilo. Imaginem que visitei uma aldeia, a Panambizinho — até hoje me lembro —, em Mato Grosso do Sul, um acampamento de retomada em que eles estavam, em 2003, quando um tuxaua, o cacique, levou-me para uma casinha. Ele não falava bem o português. Entrei lá e vi uma madeira e uma corda pendurada. Eu não entendia e pedi ao tradutor que me falasse o que o cacique estava dizendo. Ele disse: "Minha filha de 11 anos se enforcou ontem aqui". Aquilo foi bastante impactante: uma adolescente se suicidou simplesmente porque não tinha sido concluído o reconhecimento de sua terra, porque a juventude estava sendo vítima de um trabalho escravo na plantação de cana-de-açúcar. Era violação e racismo: diziam que indígena bom era indígena morto. Imaginem a imprensa falar isso! Então, isso me empoderou bastante.
Mas são fatos contra os quais muitas vezes a sociedade não reage, são fatos banalizados, porque ainda não se tem conhecimento dos indígenas aqui no Brasil. Infelizmente, a nossa sociedade também se silencia diante de violações dos direitos humanos. São cidadãos brasileiros como qualquer um. A única diferença que existe é a diferença cultural, é a diferença relacionada a direitos, porque o direito à cultura é consagrado na Constituição.
Não estamos precisando de mudança no art. 231. Não. Precisamos consolidar o que já existe. Não precisamos que digam o que o indígena pode fazer ou não, se é agricultura, se é pecuária, se é atividade florestal. Precisamos exercer o direito que está ali, já, de demanda do dever constitucional do Estado. Eu queria terminar dizendo justamente isso.
Neste Dia da Amazônia, há várias movimentações no Brasil todo. Tenho recebido informações de que mulheres indígenas, em Manaus, vão para a praça protestar, Deputada Erika, também pela Amazônia. Para Belém está indo um grupo de pesquisadores, por causa do corte. Em São Paulo e em outras áreas também estão gritando. Por quê? Talvez, como resultado deste desastre todo que nós estamos vivendo, Bolsonaro tenha conseguido uma coisa, que foi nos unir em prol de uma ação, de um fato. Se nós não tomarmos providência, ele pode aumentar. Então, Bolsonaro uniu a sociedade, que retomou a força. É isso o que nós precisamos fazer. Nós Parlamentares, com as nossas prerrogativas de mandato, precisamos chamar a atenção para esse fato.
12:39
RF
A sociedade tem que falar, tem que sair desse silêncio, tem que gritar pelos seus direitos, tem que cobrar. Por quê? Porque o Chefe de Estado não pode retroceder em relação a todos os avanços que nós tivemos, a duras penas. Como eu digo sempre aos povos indígenas, todos esses direitos que estão na Constituição não foram dados de graça. Eles nos foram dados a duras penas: com a morte do Aldo da Silva Mota e agora a do xamã ianomâmi, que, com certeza, deve ter agido para ajudar Davi Kopenawa, quando lutava contra esses 20 mil garimpeiros que estão na terra indígena ianomâmi e a favor de um Brasil mais justo.
Os direitos que estão aqui não são uma ideologia. Eles não são uma proteção somente da Esquerda. Eles não são questões a serem remexidas pela Direita, eles são uma conquista do povo brasileiro, que deveria se sentir valorizado por ter uma diversidade de mais de 305 povos. Temos que lutar pelo avanço das políticas públicas, pela melhoria de todos na sociedade.
Gostaria de dizer que tudo o que a Amazônia traz não é somente para os povos indígenas ou para o povo amazônico. Essa nuvem preta que nós vimos em São Paulo está avançando. Se não tomarmos consciência do nosso dever como cidadãos, vamos ouvir falarem assim: "Era uma vez a Amazônia". Nós temos um potencial muito grande de biodiversidade e de diversidade de povos. Esses povos estão dependendo da conservação. Então, nós temos que agir e cobrar das autoridades. Nós Parlamentares já estamos cobrando.
O pessoal da REDE, nós da REDE, protocolamos há 2 semanas o pedido de impeachment do Ministro Ricardo Salles. (Riso.) Vamos fazer uma cobrança: que ele saia, não somente pelas besteiras que fala, pelas declarações que faz, Dinamam — e ele, que detém um poder muito grande, deveria estar defendendo o meio ambiente, mas está defendendo o agronegócio —, mas também pela incoerência, pela incompetência, pela irresponsabilidade, pela omissão dele. Por isso ele deve responder.
A Amazônia fica, o Bolsonaro sai. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Erika Kokay. PT - DF) - E leva o Ricardo Salles com ele. (Risos.)
Eu vou passar a Presidência para a Deputada Joenia.
O Claudio Angelo ainda vai fazer uso da palavra, e uma pessoa inscrita vai fazer uso da palavra por 3 minutos, o Bruno Taitson, da WWF-Brasil.
Com a palavra o Claudio Angelo.
O SR. CLAUDIO ANGELO - É sempre ingrato. Eu podia estar queimando a Amazônia agora, já que o Governo diz que quem queima a Amazônia são as ONGs, mas estou aqui separando vocês do almoço. É uma tarefa inglória — ainda mais falar por último.
Antes de começar, queria dizer que o Deputado José Medeiros nos autorizou a responder a ele em ausência. Então, eu queria só fazer uma correção muito pequena. Ele se referiu a um lugar em Mato Grosso como Suiá-Missu. O nome certo não é esse. Essa é uma terra indígena xavante chamada Marãiwatsédé, de onde os índios foram expulsos. Eles voltaram depois, e parte do setor agropecuário em Mato Grosso já tentou trocar essa terra indígena por uma fazenda com os xavantes.
12:43
RF
Então, queria só que ficasse registrado que esse nome, Suiá-Missu, não existe.
Bem, a encomenda foi a de que eu falasse sobre política ambiental e direitos humanos. Isso é sempre complicado para mim. Ao mesmo tempo não é. É difícil, às vezes, para as pessoas, enxergarem a relação entre mudança climática e direitos humanos, entre política ambiental — essas coisas um pouco abstratas, quando você fala de carbono e emissões — e o que está acontecendo com as pessoas todos os dias.
(Segue-se exibição de imagens.)
Então, eu queria lembrar — e hoje parece até uma piada de mau gosto — o discurso de vitória, no dia 28 de outubro, do Presidente da República, então Presidente eleito. Ele disse isso que vocês estão lendo ali: "Faço de vocês minhas testemunhas de que este Governo será um defensor da Constituição, da democracia e da liberdade". E aí, para mostrar que estava falando sério, ele disse: "Isso é um juramento a Deus".
Muito bem. Será que, de fato, ele está protegendo a Constituição? Vamos ver o que a Constituição diz, em dois artigos. Todo mundo já falou desses dois artigos aqui hoje:
Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
Podem ticar esse pedaço, porque Jair Bolsonaro e Ricardo Salles não estão cumprindo o art. 225 da Constituição.
Art. 231. São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens.
Ticamos também. Todo mundo aqui já falou disso também. Eu não sou advogado, mas a Joenia é. O Presidente da República não só não está demarcando terras indígenas, como também foi eleito prometendo não demarcar 1 centímetro sequer de terra indígena. Depois ele se corrigiu: "Não, não. Não é 1 centímetro, é 1 milímetro. Não demarcarei 1 milímetro de terra indígena".
Diante disso, Dinamam, o fato de haver um assessor do agronegócio na Presidência da FUNAI é apenas uma decorrência natural das promessas de campanha do Presidente. Apesar de o Presidente da República ser um mitômano compulsivo, nesse ponto ele não enganou ninguém.
Vamos para a política ambiental. Assim como ele prometeu que não demarcaria 1 milímetro de terra indígena, ele também prometeu que iria acabar com as instituições responsáveis pela aplicação da lei ambiental, que ele enxerga como uma indústria de multas. Há uma frase lapidar do Presidente da República sobre o Ministro do Meio Ambiente, já então sob fortes críticas, por todo o trabalho que não está fazendo à frente do Ministério do Meio Ambiente. O Presidente vai lá e diz: "O Salles está no lugar certo. Consegue fazer o casamento do meio ambiente com a produção. Eu falei para ele: 'Mete a foice no IBAMA! Não quero xiita'". De fato, o que nós vimos é que meteram a foice no IBAMA. Vemos isso na queda no número de autuações, na queda no número de operações do IBAMA, no fato de o GEF — Grupo Especializado de Fiscalização não ter ido a campo nenhuma vez. Acho que está indo agora, pela primeira vez, à Amazônia, o Grupo Especializado do IBAMA, para fazer uma operação de fiscalização lá.
12:47
RF
Enfim, eu não vou falar mais sobre isso porque o Denis já mencionou, e a Deputada Erika também, quando leu um pedaço da carta dos servidores.
Meter a foice no IBAMA tem, como todo mundo está vendo, resultados muito concretos. Talvez seja essa a eficiência administrativa da qual o Governo tanto fala. Eles prometeram que iam acabar com a governança ambiental. De fato, acabaram com a governança ambiental, foram muito eficientes nisso. Estamos vendo os resultados. Afinal de contas, é um governo que entrega resultado. Quais foram os resultados que o Governo entregou na política ambiental até aqui? Aquela barrinha vermelha, naquele gráfico à minha esquerda, embaixo, representa os alertas de desmatamento na Amazônia. Neste ano vimos um aumento de quase 50% nos alertas. Isso são só os alertas do sistema DETER. "O sistema DETER é míope" — o sistema do INPE foi muito criticado. Ele na verdade subestima o desmatamento. O desmatamento real, com toda a probabilidade, foi de uma área maior do que 6.839 quilômetros quadrados. Se você aplicar os mesmos 50% de elevação em relação ao DETER do ano passado — é aquela barrinha verde —, vai ver que pode haver um desmatamento de área maior do que 10 mil quilômetros quadrados em 2019. Essa terá sido a primeira vez em que o desmatamento na Amazônia chegou aos cinco dígitos, desde 2008.
Ali há outro dado de queimadas: até o final de agosto, as queimadas na Amazônia estavam acima da média. Quando o Governo fala: "Ah! Mas em outros anos queimou mais". Sim, de fato, em outros anos queimou mais. Em 2004, o desmatamento foi de uma área de 27 mil quilômetros quadrados. Evidentemente, aquela floresta cortada precisaria ser queimada. Então, de fato queimou muito. Em 2010 houve uma megasseca na Amazônia. Agora temos o número de queimadas mais alto desde 2010. E elas não são resultado — é importante que todo mundo entenda isto — de um evento climático. Essas queimadas são fabricadas, são causadas por desmatamento. O IPAM — Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia já mostrou em duas notas técnicas — inclusive mostrou dados de chuva — que a seca deste ano, apesar de haver seca todos os anos, não tem absolutamente nada de anormal que justifique essa quantidade de queimadas.
O IPAM publicou mais uma nota técnica ontem à noite — ela está representada nesse último gráfico aqui embaixo, ali na pizza do meio —, em que mostra que a maior quantidade de focos de calor, 33%, está em áreas registradas no CAR — Cadastro Ambiental Rural, ou seja, em propriedades privadas. Ou seja, quem está tocando fogo na Amazônia não sou eu, não são os meus colegas "ongueiros", são os proprietários rurais. E não são os indígenas. Aliás, o foco de calor nas terras indígenas equivale a 6%. Acho que as TI estão representadas ali pela cor verde-escura. O número mais baixo de focos de calor está em terras indígenas. Isso tem consequências. O Brasil é signatário, ainda, do Acordo de Paris, por meio do qual o país que o ratifica se compromete a manter o aumento da temperatura global abaixo de 2 graus Celsius e a fazer esforços para limitar o aumento da temperatura a 1,5 grau Celsius. E mais: apesar de pouca gente falar dela, nós temos a Política Nacional sobre Mudança do Clima, lei brasileira que, em sua versão original, estabelecia como meta para 2020 a redução da taxa de desmatamento na Amazônia para 3.900 quilômetros quadrados. Para quem tem saudade do Michel Temer eu digo o seguinte: ele revogou esse decreto no final do ano passado, e ninguém percebeu. Então, agora, nem podemos mais dizer que essa é uma meta do País.
12:51
RF
Como estamos no que se refere ao cumprimento das metas? Esse gráfico é o da trajetória de emissões no Brasil. A meta para 2020 é extremamente benevolente, porque eles projetaram uma emissão tendencial, que era quase uma ficção, e se comprometeram — o Brasil se comprometeu — a reduzi-la para algo entre 36,1% e 38,9%. Estamos na trave para não cumprir a meta. A meta de desmatamento na Amazônia não vai ser cumprida. Não há nada que possa ser feito agora, a esta altura, para que a meta de redução do desmatamento na Amazônia seja cumprida.
E as metas do Acordo de Paris? Por consequência, o Brasil se comprometeu a reduzir em 37% suas emissões em 2025, em relação a 2005. Por causa da recessão, essa meta também está em risco, e não temos sequer um plano de cumprimento da Contribuição Nacionalmente Determinada, a meta do Brasil para o Acordo de Paris. Aliás, não temos nem a secretaria, nem a instituição dentro do Governo que cuidaria de desenhar esse plano, porque ela foi extinta no primeiro dia da administração Bolsonaro.
Esses gráficos malucos ali mostram o que pode acontecer com as taxas de desmatamento na Amazônia, em cima, e no Cerrado, embaixo, em vários cenários de desregulação de desmatamento e descontrole. É o que estamos vendo acontecer hoje um pouco já. Na Amazônia, no cenário intermediário, o desmatamento pode retornar a 17 mil quilômetros quadrados por ano ou, no pior cenário, a 27 mil quilômetros quadrados por ano. Isso já foi calculado por pesquisadores do INPE. Existe demanda no Brasil para uma taxa de desmatamento como essa, porque a pecuária é feita com baixíssima produtividade. Pode haver, com 27 mil quilômetros desmatados, menos de um boi por hectare. Então cabe. Não há nenhuma lei da física que impeça o Brasil de retornar às taxas de desmatamento de 2004.
E daí? Tudo isso, essas políticas atuais botam o Brasil na contramão dos esforços globais de combate à mudança climática. Apesar dos Estados Unidos, o resto do mundo ainda adere ao Acordo de Paris, ainda leva o Acordo de Paris bastante a sério. Se o Brasil, que é o sétimo maior emissor do planeta, não faz a sua parte, acaba forçando o resto do mundo a fazer mais. Ou todos nós vamos torrar mais do que já estamos torrando hoje.
12:55
RF
Além disso, o que acontece quando você decide, usando a expressão em inglês by desire, deliberadamente, não cumprir os seus compromissos climáticos? Você expõe a população brasileira, em especial as populações mais vulneráveis, como por exemplo as do Nordeste, aos piores efeitos da mudança do clima.
E o IPCC — Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas mostrou isso no final do ano passado. Nessa imagem, vemos o Nordeste brasileiro. Isso aqui é a redução de chuvas, que vai chegar a 15%, quase 20%, caso falemos em segurar a temperatura em 1,5 grau.
E nessa outra imagem, vemos cenários de vários modelos no que se refere ao aquecimento no Brasil até 2040, no caso de não controlarmos emissões, de o mundo não controlar emissões. Em algumas áreas, como no Centro-Oeste e em parte da Amazônia, pode-se chegar a aumentos de temperatura da ordem de 3 graus, 4 graus, 5 graus ou mais.
Para quem acha que isso é coisa para daqui a 40 ou 50 anos, saiba que essa foto foi tirada no mês passado ou na semana passada em Abrolhos, na Bahia, onde está havendo neste momento uma mortalidade em massa de corais por conta do aquecimento anormal das águas do Atlântico.
As lições que tiramos disso tudo são simples: a atmosfera não é de esquerda nem de direita, não tem ideologia, não liga para Twitter, não faz disputa de narrativa, e quem tentar disputar narrativa com a atmosfera vai perder. O que nos cabe fazer é decidir se queremos perder isso num nível muito feio ou pouco feio e, quanto mais demorarmos para agir, mais feio vamos perder.
Era isso o que eu tinha a dizer. Obrigado. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Joenia Wapichana. REDE - RR) - Obrigada.
Eu sempre me pergunto: será que está todo o mundo errado e só o Bolsonaro está certo? Os cientistas estão errados? E o que dizer desses dados publicados e bastante estudados por pesquisadores? Será que a NASA está errada? Realmente, precisamos tomar uma posição bem clara, e a sociedade também.
Eu passo a palavra agora para o Bruno Taitson, representante do WWF-Brasil, pelo prazo de 3 minutos.
O SR. BRUNO TAITSON - Bom dia a todas e todos. Um bom-dia especial à Deputada Joenia. Quando vemos que, em 2019, é a primeira vez que temos uma Deputada indígena neste Parlamento, observamos que historicamente não há representatividade nos processos decisórios deste País. O fato de a Joenia ser a primeira Deputada indígena na história deste Parlamento em 2019 diz muito sobre a falta de representatividade nos núcleos em que as principais decisões do nosso País são tomadas. Então, é muito relevante salientarmos isso sempre que pudermos.
Um ponto importante dentro da temática desta audiência de hoje é que 20% do desmatamento que está acontecendo este ano está se dando em unidades de conservação e em terras indígenas, que constitucionalmente o Governo tem a obrigação de proteger.
12:59
RF
Então, nós notamos claramente que há um descumprimento da Constituição, conforme o Claudio Angelo bem colocou e como foi pontuado por todos os participantes desta audiência. Além do mais, está na Constituição — não é uma ideia que alguém teve hoje, nem agora, nem há 5 anos — demarcar terras indígenas, titular quilombos e fazer a reforma agrária. Tudo isso está na Constituição, não é invenção de ninguém, de movimento social, de ONG, de partido político, nada disso. Nós não podemos nos esquecer, em momento algum, de que isso está na Constituição. Não é favor demarcar, não é favor titular territórios quilombolas e não é favor fazer a reforma agrária, tudo isso está na Constituição.
A outra questão, para realmente finalizar — não quero usar muito do tempo pelo avançado do horário —, é a tentativa clara, que não vem de hoje, mas se intensifica hoje, de desmantelar a legislação ambiental e os direitos dos povos originários. Essa é uma questão inegável.
Nós separamos duas ameaças dentre as dezenas. A tentativa de fazer a mineração em terra indígena é um ponto muito grave e muito sério. Quem defende isso fala o tempo todo: "Vai ser tudo feito em conformidade com a lei, com a sustentabilidade". Eu tenho conhecimento de duas ou três proposições que estão em tramitação que falam disso especificamente.
Mas nós temos sempre que nos lembrar, Deputada Joenia, dos episódios ocorridos. Se a maior mineradora de minério de ferro do mundo, que obteve lucro líquido de 25 bilhões de reais no ano passado, não conseguiu assegurar tudo aquilo que é necessário para evitar o que aconteceu em Brumadinho, certamente as mineradoras que querem fazer garimpo em terras indígenas não vão conseguir impedir que desastres ou crimes, como aquele a que Minas Gerais assistiu duas vezes, aconteçam dentro de terras indígenas, onde estão as nascentes, onde está a floresta protegida.
A outra questão de fato é a PEC 187/16, contra a qual a Deputada Joenia tem liderado uma luta. Essa proposição absurda, dentre outras questões, vai colocar agrotóxico dentro das terras indígenas, onde está a nossa mais protegida floresta, onde estão boa parte de nossas nascentes.
Para encerrar, eu gostaria de pedir à Deputada Joenia que esclareça para nós em que pé anda a questão da PEC 187/16, porque vimos que ela foi votada na Comissão de Constituição e Justiça e agora aparentemente há um risco grande de que ela caminhe.
Muito obrigado a todos e a todas. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Joenia Wapichana. REDE - RR) - Antes de eu encerrar a reunião, vou esclarecer alguns pontos, porque ainda restam alguns minutos.
Quero dizer que concordo que ainda existe muito a desenvolver na política de mudanças climáticas. Preocupa-me bastante o rumo que o Brasil vai tomar na próxima COP — Conferência das Partes. Já coloco a Comissão à disposição para quem puder ajudar, pois sei que a sociedade civil participa bastante dessas discussões. Precisamos realmente acordar a sociedade brasileira para os fatos que vêm acontecendo.
Eu concordo que não existe — e realmente essa é uma preocupação nossa, dos povos indígenas — uma política de controle e nem fiscalização segura para as atividades de mineração. Brumadinho é um fato, e mais de 300 vidas estão pagando por isso, assim como suas famílias. Os povos indígenas, principalmente os ianomâmis, já estão com as suas vidas em risco, já têm mercúrio no sangue. Isso não é no futuro, já está acontecendo agora. Sem legislação que proíba mineração em terra indígena já ocorre isso, imagine com o respaldo legal e com uma falta de política séria sobre esse controle de fiscalização.
13:03
RF
Sobre a PEC 187/16, viu-se uma discussão longa, principalmente porque as pessoas não têm ideia do que significa abrir o art. 231 da Constituição, num momento em que nós estamos mais vulneráveis aqui no Congresso Nacional, em que nós somos a minoria. De Deputada Federal indígena só estou eu aqui, apesar de na nossa Comissão e na Frente Parlamentar Mista haver um número bastante significativo. Mas no desenvolvimento dos planos de trabalho — até mesmo do que você participou —, são poucos ainda os Parlamentares que entendem de fato a importância de estarem protegidos os direitos dos povos indígenas.
Nessa linha de achar, como o Deputado se manifestou, que os povos indígenas estão passando fome e que precisam exercer a cidadania, eu quero dizer que, nesse entendimento de que os povos indígenas precisariam exercer direitos, esses direitos já existem. Por exemplo, um dos pontos da PEC era justamente dizer que os indígenas poderiam exercer atividades de agropecuária e florestais, mas por que abrir o art. 231 para permitir, se a Constituição já permite isso? O que está por trás disso é justamente uma pretensão futura. Nós tentamos não avançar, mas não é porque os povos indígenas não teriam direito, mas porque a forma como a matéria foi redigida estabelece três atividades.
Os povos indígenas já exercem a atividade pecuária. Aqui o Amarildo estava me dizendo que, na Terra Indígena Raposa Serra do Sol, tem-se utilizado aquelas áreas de fazenda que foram deixadas para plantar e também para criar rebanho de gado. É propício ali porque é diferente, é savana, é lavrado. E outros, por exemplo, como a agricultura, mesmo que sejam os parecis — cujo nome tem sido utilizado bastante para tentar respaldar essa PEC 187/16 —, isso não é motivo para alterar o art. 231, porque ele é bastante claro em estabelecer a autonomia dos povos indígenas. O que nós queremos assegurar é que, se for necessário o apoio, o investimento no desenvolvimento de atividades produtivas nas comunidades indígenas, que se faça através de normas infraconstitucionais, que podem justamente ser feitas através da FUNAI, da EMBRAPA ou de algum outro órgão para apoio a essas atividades dos povos indígenas, e não mudar a Constituição.
O problema dela também era o apensado, a PEC 343/17. Numa articulação e graças também à mobilização das organizações indígenas, que estiveram presentes — elas foram barradas, mas insistimos e tiveram garantida a sua presença —, conseguimos chamar a atenção para o absurdo que era justamente tirar do Legislativo a competência de fazer autorização em relação à mineração em terras indígenas. Era o mais problemático possível. Nós conseguimos acordo no sentido de retirar a PEC 343/17 e fomos para o embate. Então, ficou só a PEC 187/16.
Na semana passada, nós estivemos discutindo a PEC 187/16, cuja admissibilidade infelizmente passou pela CCJ. O primeiro passo é discutir a sua constitucionalidade. E passou com o seguinte sentido: "Ah, ela vai passar por outra fase. Apenas se deu o primeiro passo para a matéria ser admitida". Apesar disso, nós fizemos bastante pressão. E consideramos até que tivemos votos surpreendentes. Então, isso não é entendimento geral aqui da Casa. Houve Parlamentares de centro e outros que entenderam que isso era um absurdo. Começamos a falar, por exemplo, até mesmo para a Presidência, para muitos Parlamentares e para muitas pessoas que não era o momento de discutir essa matéria. Tivemos duas declarações que foram superimportantes. Lideranças indígenas participaram de uma reunião com ex-Ministros do Meio Ambiente e com a sociedade civil, quando foi falado de forma bastante clara que não era para avançar a discussão. Então, o Presidente da Casa declarou que concordava, disse que por ele nem era para a matéria ter ido para a CCJ naquele momento e que não iria instalar por agora a Comissão Especial para discutir a PEC. Há um entendimento de prioridade nesta Casa. Prioridade não é deixar mais vulneráveis os povos indígenas. Espero que essas duas declarações que ele deu para a imprensa e no meio da reunião sejam cumpridas. É esse o ponto em que está.
13:07
RF
O SR. BRUNO TAITSON - Obrigado.
A SRA. PRESIDENTE (Joenia Wapichana. REDE - RR) - Quero pedir desculpas pela demora e agradecer aos nossos convidados que estiveram aqui participando desta audiência pública. Agradeço ao Sr. Cleber Buzatto, Secretário-Executivo do Conselho Indigenista Missionário; ao Sr. Dinamam Tuxá, liderança indígena e representante da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil — APIB; ao Sr. Claudio Angelo, Coordenador de Comunicação do Observatório do Clima — ele teve que sair correndo, pois tinha outro compromisso; à Sra. Jussara Griffo, representante da Confederação dos Trabalhadores do Serviço Público Federal — CONDSEF; ao Sr. Denis Rivas, representante da Associação Nacional dos Servidores da Carreira de Especialista em Meio Ambiente. Quero agradecer a todos os presentes aqui.
A reunião foi gravada e vai estar disponível na página da Comissão de Direitos Humanos e também no Facebook, se alguém tiver dúvida sobre alguma das apresentações.
Quero agradecer a todos e à equipe aqui da Comissão de Direitos Humanos.
Declaro encerrada a presente reunião.
Desejo um bom almoço para todos!
Voltar ao topo