1ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA 56 ª LEGISLATURA
Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania
(Audiência Pública Extraordinária)
Em 9 de Julho de 2019 (Terça-Feira)
às 9 horas e 30 minutos
Horário (Texto com redação final.)
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O SR. PRESIDENTE (Felipe Francischini. PSL - PR) - Havendo número regimental, declaro aberta a presente reunião, destinada a debater o tema da audiência de custódia, conforme Requerimentos nºs 57 e 58, de 2019, referentes ao Projeto de Decreto Legislativo nº 317, de 2016, que susta os efeitos do inteiro teor da Resolução nº 213, de 2015, do Conselho Nacional de Justiça — CNJ, que dispõe sobre a apresentação de toda pessoa presa à autoridade judicial no prazo de 24 horas.
Explicarei os procedimentos. Nos termos do Regimento Interno da Casa, será concedida a palavra aos expositores por até 10 minutos, prorrogáveis a seu critério. Em seguida, os autores dos requerimentos e do projeto de decreto legislativo disporão de 5 minutos para as suas considerações. Depois disso, os Deputados inscritos poderão falar por até 3 minutos. Oportunamente, será concedida a palavra aos expositores para respostas e considerações finais. E, nos termos do art. 256, §2º e §5º, do Regimento Interno, os senhores convidados e os senhores inscritos deverão limitar-se estritamente ao tema em debate previsto nos requerimentos aprovados.
Primeiramente, eu gostaria de parabenizar os autores do projeto de decreto legislativo por oportunizarem a esta Casa um debate sobre um assunto tão caro à segurança pública e à aplicação da justiça no Brasil. Os autores do projeto são os Deputados Eduardo Bolsonaro, Pedro Lupion e Kim Kataguiri. E os autores dos requerimentos para a realização desta audiência pública são os Deputados Léo Moraes, de Rondônia, e Gurgel, do Rio de Janeiro.
Concedo a palavra, para iniciar o nosso debate, ao Governador Wilson Witzel, a quem eu agradeço a presença.
Governador, quando o Deputado Gurgel, autor do requerimento, nos disse que V.Exa. tinha vontade de vir a esta Comissão debater esse assunto, todos nós Deputados ficamos realmente muito honrados só com seu aceno — e agora com a sua presença. Nós sabemos que, com a sua experiência como juiz, com a sua experiência dentro do Poder Judiciário, com certeza, contribuirá muito com a nossa Comissão.
Então, para iniciar o nosso debate, com a palavra o Governador Wilson Witzel.
O SR. WILSON WITZEL - Muito bom dia, Sras. e Srs. Deputados. Eu peço licença para, na pessoa do Deputado Felipe Francischini, cumprimentar todos e todas.
Aos representantes da imprensa aqui presentes hoje, muito obrigado.
Também quero cumprimentar o meu Presidente da AMB, Jayme de Oliveira. Permita-me assim falar. Eu digo sempre que eu deixei a toga, mas a toga não me deixou. Ainda está viva dentro de mim.
Agradeço também ao Dr. Marcelo Rocha Monteiro, Procurador de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, membro do Conselho de Segurança Pública do Estado do Rio de Janeiro, que é presidido pelo Desembargador Jayme Boente.
Destaco também a presença do Presidente da ANADEP, o Pedro Paulo Coelho.
Muito obrigado.
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Quero dizer da alegria de ter sido defensor público no Estado do Rio de Janeiro, atuando no Tribunal do Júri, em varas criminais, em varas de família e no sistema penitenciário do Estado, por ocasião da minha passagem pela Defensoria, de 1998 até 2001, quando ingressei na magistratura federal.
Agradeço também a presença ao representante do CNJ, o Juiz de Direito Luís Geraldo. Deixo um abraço ao nosso Presidente Toffoli.
Senhores, é uma grande honra ter sido convidado pelo Deputado Gurgel. Em sua pessoa e nas pessoas do Deputado Daniel Silveira e da Deputada Major Fabiana, quero agradecer a toda a nossa bancada do Estado do Rio de Janeiro. Quero dizer da minha alegria de ter sido convidado para estar aqui.
O nosso Secretário Lucas Tristão está me acompanhando. Daqui a pouco, nós teremos uma reunião no Ministério das Relações Exteriores para tratar da expansão do turismo no Estado do Rio de Janeiro.
Meus amigos, minhas amigas, eu fui juiz federal durante 17 anos. Fui juiz criminal durante quase 10 anos, atuando nas varas criminais do Rio de Janeiro e do Espírito Santo, e também fui defensor público no Tribunal do Júri de Nilópolis durante alguns anos, atuando em varas criminais e também na execução penal.
Quando foi criada a audiência de custódia, já havia um passado de críticas ao sistema penitenciário. A audiência de custódia sempre marca um pensamento da magistratura, digamos assim, de que o sistema penitenciário no Brasil não cumpre com a sua finalidade e de que, quanto mais preso houver no sistema penitenciário, pior ele vai ficar. Isso é uma verdade. O sistema penitenciário brasileiro hoje padece de vários problemas. Há algumas situações muito pontuais de sucesso, com modelos como os centros APACs ou penitenciárias que têm a sua capacidade respeitada. Mas esses modelos não são a regra, são a exceção.
Quando nós assumimos o Governo do Rio de Janeiro, o meu Estado, já sabíamos que havia um excesso de quase 30 mil presos, que os presídios estavam completamente imundos e dominados pelas facções, que os presos estavam sem assistência médica e que havia uma bagunça generalizada no sistema penitenciário. Dentro das nossas possibilidades, fizemos algumas arrumações. Prestamos assistência médica aos presos, trabalhamos para a limpeza dos presídios, tiramos celulares de dentro da cadeia, punimos os agentes penitenciários que não estavam de acordo com a política ética e de transparência. Agora, fizemos a primeira licitação que vai permitir compra de alimentos de forma diferenciada, com a participação de várias empresas. Então, fizemos uma arrumação no sistema penitenciário.
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A audiência de custódia e o sistema penitenciário estão muito próximos. Existe uma questão que envolve a audiência de custódia que é a tortura ao preso. Mas, felizmente, essa situação não é a regra, é a exceção. Em todas as audiências de custódia realizadas durante todo esse tempo, atos de arbitrariedade praticados por autoridades policiais não são a regra, são a exceção. Então, se criou uma normatização em razão da exceção, e não da regra.
No meu ponto de vista, o grande objetivo da audiência de custódia é evitar o encarceramento. Vejam bem, volto a dizer, o nosso problema não é o rigor das penas. Sim, hoje as penas podem ser impostas com mais rigor, já que, desde a década de 90, estão sendo recrudescidas. Foram definidos os crimes hediondos, com aumento de penas para crimes mais graves. Mas o nosso grande problema hoje é o sistema penitenciário. Faltam vagas no Brasil. Então, nós não vamos conseguir resolver o problema da segurança pública — é evidente que há soluções que adotamos no Rio de Janeiro que eu não vou abordar aqui — se nós não tivermos um sistema penitenciário adequado, que separe as facções, que permita o controle efetivo do Estado e que dê condições ao preso de trabalhar. Não há como. E isso já se dizia desde o século XVIII. Cesare Beccaria, no livro Dos Delitos e Das Penas, já falava, Deputado Francischini, que não adianta adotar penas rigorosas de empalamento, de arrancamento de membro, de esquartejamento, se a efetividade do sistema for muito ruim.
A nossa política no Rio de Janeiro se baseia em três premissas. Primeira premissa: a polícia tem que ser independente. Não pode ser politizada. Por isso, as Polícias Civil e Militar do Rio de Janeiro têm independência, com os controles constitucionais que lhes são obrigatórios, com a atuação do Ministério Público e de suas corregedorias.
Segunda premissa: o sistema penal tem que ter celeridade. Se a pena imposta, não importa qual seja, demorar demais a ser cumprida, ela não tem valor para a sociedade. O sistema tem que ser efetivo. Para isso, o nosso Código de Processo Penal sofreu algumas mudanças. A principal delas veio na reforma da rotina do julgamento dos processos, mas, a meu ver — eu ainda era juiz criminal após a mudança que permitiu que a audiência fosse toda gravada para dar celeridade —, na verdade, se criou mais uma fase, com o oferecimento da denúncia, o julgamento preliminar e depois o recebimento da denúncia para que, aí sim, possam ocorrer as audiências. Isso burocratizou ainda mais a audiência dos processos sumários.
A audiência de custódia entra nesse mesmo contexto. Torna a punição ainda menos célere. O que nós precisamos fazer — e o CNJ avançou na tentativa de fazer isso — é tentar tirar do sistema penitenciário aqueles que não deveriam estar lá, vamos dizer assim. Mas cria-se uma cultura de não aprisionamento. Evidentemente alguns excessos começam a acontecer: presos que deveriam estar acautelados começam a ser liberados na audiência de custódia e retomam a atividade do crime.
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Então, o nosso grande problema hoje é mostrar para os juízes que as penas podem ser mais graves, como é o caso de roubo à mão armada, Deputado Felipe Francischini. Por exemplo, o sujeito rouba à mão armada, em concurso de pessoas, e tem uma pena de 5 anos e 4 meses. Ele vai cumprir um sexto dessa pena e vai estar na rua. O nosso grande mal hoje é o roubo nas ruas dos Estados e o tráfico de drogas. Então, essa é a quantidade de presos que nós colocamos no sistema penitenciário.
A audiência de custódia acaba sendo um momento em que o juiz já tem essa cultura de que não há espaço no sistema penitenciário, de que vai ter dificuldade para encarcerar o preso, de que lá o preso vai sair pior do que entrou. Então, cria-se, na cabeça do juiz — não é, Desembargador Jayme? — uma cultura de que ele precisa evitar ao máximo que o sujeito fique preso.
Muitos magistrados já ingressam nas varas criminais com essa visão. E muitos não são juízes criminais. Eles estão ali por acaso. Quem faz audiência de custódia muitas vezes não é juiz criminal, não tem experiência na área — é juiz de vara de família, é juiz de vara de fazenda e não tem experiência. Então, a audiência de custódia cria esse limbo na persecução criminal, não ajuda no que diz respeito ao combate à tortura e cria a cultura de que nós precisamos libertar mais do que prender, porque não há vaga no sistema penitenciário.
O que me parece adequado, senhores, é que nós façamos mais uma vez a reforma do Código de Processo Penal. Nós precisamos dar celeridade — e essa é a segunda premissa — ao julgamento das ações penais. E nós precisamos — essa é a terceira premissa — de um sistema penitenciário que funcione.
Por isso é a proposta do Estado do Rio de Janeiro. Aqui eu peço encarecidamente aos Deputados e Senadores que nos ajudem. O Ministério da Justiça, com todo respeito ao nosso colega Sergio Moro, hoje demora quase 1 ano para aprovar um modelo de presídio, retira dos Estados a autonomia e centraliza no Governo Federal, no DEPEN. E os Estados acabam tendo dificuldades de fazer aquilo que cada um entende que deve fazer.
Não há espaço para se construir presídio com facilidade, porque isso causa um certo problema nas cidades. Então, é preciso concentrá-los. A proposta do presídio vertical foi feita pelo Rio de Janeiro com base em tese de doutorado aqui da UnB e tem total viabilidade. Nós estamos apresentando isso para o Brasil. Nós podemos colocar de 3.500 a 5.000 presos, com área para estudo, para recuperação, para ressocialização, para o preso trabalhar e pagar pela estadia dele no sistema penitenciário.
Então, vejam, nós apresentamos uma solução, mas eu recebi a informação de que vai demorar 1 ano. Nessa terceira premissa, de que o sistema penitenciário tem que funcionar, a minha sugestão a esta egrégia Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados é a de que nós temos que retomar a reforma do Código de Processo Penal. É preciso encurtar o caminho.
Uma vez preso em flagrante, se é para levar o indivíduo à presença do juiz, então que nós já o levemos à presença do juiz. E o Ministério Público, se tiver condições, já oferece a denúncia. Se foi preso em flagrante, não tem mais o que fazer. Se a prisão foi em flagrante, ainda que o juiz vá convertê-la em liberdade provisória, como hoje determina a lei, ou manter a prisão preventiva, se o juiz vai fazer isso, o Ministério Público já tem condições de oferecer a denúncia e introduzir o instituto do plea bargain. Eu fazia isso na vara criminal lá em Vitória. Por exemplo, um sujeito era preso com nota falsa. A pena mínima são 3 anos. Eu chamava o advogado e dizia: "Doutor, eu vou dar 3 anos de pena para esse sujeito. O senhor concorda em dispensar aqui o interrogatório, o sumário de acusação, o sumário de defesa?" Isso quando ainda era o processo anterior. "Aí eu já dou a sentença para ele, já digo onde ele vai prestar serviço à comunidade" — isso resolvia a vida dele. E eu já dava um conselho para ele não se meter mais em furada: "Aproveite essa oportunidade que o Estado está dando de não cozinhar você por 2 anos, 3 anos aqui na vara criminal. Você está tendo a oportunidade de ter uma pena alternativa. Vai cumprir a sua pena alternativa e, daqui a 2 anos, já estará liberado de tudo."
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Então, isso é bom para o sujeito, resolve o problema dos processos criminais que se avolumam nas varas criminais. No Rio de Janeiro, uma quantidade imensa de processos poderia ter tido essa solução no momento do flagrante. Isso evita essa quantidade de presos provisórios nos presídios. Não teremos separação, como em outros países, do preso provisório para o preso condenado em definitivo, muito menos por gravidade dos crimes e por regime, o que é mais grave ainda. Nós não temos casa de albergado. O regime semiaberto virou quase regime aberto. Ou seja, o sistema penitenciário está uma bagunça!
Concentrem-se no sistema penitenciário. O sistema penitenciário no Brasil está uma bagunça! Nós precisamos arrumar o sistema penitenciário. Se não arrumarmos o sistema penitenciário, não adianta criar penas mais graves, não adianta querer que a polícia funcione corretamente, como está funcionando no Rio de Janeiro — aqui vai a minha homenagem aos nossos policiais militares e aos nossos policiais civis —, porque não vai resolver nem o problema dos menores infratores, nem o problema do sistema penitenciário.
Então, encerrando, eu me coloco à disposição. Eu já fui membro da Comissão de Reforma do Código Processo Penal da AJUFE, já fui membro de comissões na Defensoria Pública. Eu me proponho a fazer com que esta Casa efetivamente caminhe, no meu ponto de vista, no rumo certo. Muitas vezes, nós falamos: "Vamos aumentar a pena." Tudo bem, mas o juiz vai dar a pena mínima, não tem onde colocar o presidiário e o sistema não funciona, como não vem funcionando há décadas. É preciso que a audiência de custódia, na verdade, transforme-se numa audiência preliminar, onde o membro do Ministério Público, de imediato, ofereça a denúncia. Se a prisão foi em flagrante, se o juiz homologou o flagrante, o Ministério Público não tem que ter 10 dias para oferecer a denúncia. O MP oferece na hora a denúncia, o juiz já verifica se é o caso de receber ou não, a defesa já se prepara para oferecer ali os argumentos que entender pertinentes.
Marcelo, eu vou chutar um número aqui — o Jayme depois me corrija. Praticamente 90% das prisões em flagrante viram condenações. Então, vamos já resolver essa questão de imediato, para não ficarmos com esse processo tramitando 1 ano, 2 anos na vida do preso. Portanto, assim resolvemos definitivamente.
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Apresento outra última justificativa para a mudança dessa proposta. Quando se coloca nessa proposta que o juiz tem que perguntar sobre tortura, isso ofende o princípio da imparcialidade do magistrado e da inércia. Não é o juiz que tem de perguntar — eu nunca fiz essa pergunta — para o réu se ele foi torturado. Na medida em que o juiz pergunta se o réu foi torturado, ele passa a ser o acusador dos policiais que fizeram a lavratura do auto de prisão em flagrante. Quem tem de fazer isso é o Ministério Público. O Ministério Público é que tem de verificar se houve efetivamente algum ato de tortura, estar presente no momento da lavratura do auto de prisão em flagrante e tomar as providências que entender pertinentes.
Todo preso é submetido ao exame de corpo de delito e posteriormente encaminhado ao juiz. As mudanças que nós estamos propondo vão ser importantes para reduzir o trâmite processual, a quantidade de presos provisórios, dar celeridade e respeitabilidade à prisão em flagrante.
Não se esqueçam: nós precisamos de recursos no Rio de Janeiro. Com 1 bilhão de reais, nós vamos resolver o problema do sistema penitenciário pelos próximos 10 anos e dar dignidade ao preso. Nós vamos devolvê-lo para a sociedade e não necessariamente com um sexto da pena. O sujeito que roubou à mão armada, que cometeu um crime grave como esse tem que pegar regime fechado de 8 anos e voltar para a sociedade recuperado, com dignidade para trabalhar, para ser um cidadão e não mais colocar o revólver na cabeça de ninguém. Aí, sim, nós vamos estar prestando um grande serviço ao País, fazendo com que o sistema criminológico funcione e nós tenhamos, enfim, condições de reduzir substancialmente os índices de criminalidade.
Termino com uma frase de Cesare Beccaria: "O que mais teme o criminoso? Não é a pena, não é a quantidade, não é o rigor da pena. O que mais teme o criminoso é a certeza de que ele vai ser punido". Se nós não tivermos essas três premissas funcionando para que o preso tenha a certeza de que em 90% dos casos... Hoje, o índice de solução de casos de homicídios é de 5% a 10%. É por isso que o homicídio no Brasil é essa vergonha. Se nós não tivermos condições de fazer essas premissas funcionarem, esqueçam, nunca chegaremos a níveis razoáveis, toleráveis de combate ao crime no Brasil.
Essa, portanto, é a minha contribuição. Fico à disposição para colaborar.
Perdoem-me, pois terei de sair, mas depois eu volto. Tenho uma reunião com o Ministro Ernesto, do Ministério das Relações Exteriores, e voltarei para ser submetido a indagações. Perdoem-me pela saída, mas em breve estarei novamente com V.Exas.
Muito obrigado pelo convite.
Desejo a todos uma excelente audiência pública. Que nós possamos contribuir com o combate à violência para a dignidade do País. Contem comigo!
Que Deus abençoe o trabalho dos senhores e das senhoras!
Muito obrigado. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Bia Kicis. PSL - DF) - Ao assumir a Presidência desta audiência, quero, em primeiro lugar, agradecer ao Governador Witzel e a todos os membros componentes da Mesa: o Sr. Jayme de Oliveira, Presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros; o Sr. Leonardo Siqueira dos Santos, Corregedor da Polícia Militar do Distrito Federal; o Sr. Pedro Paulo Coelho, Presidente da Associação Nacional das Defensoras e Defensores Públicos; o Sr. Fábio Tofic Simantob, Presidente do Instituto de Defesa do Direito de Defesa; o Sr. Marcelo Rocha Monteiro, Procurador de Justiça do Estado do Rio de Janeiro; o Sr. Luís Geraldo Sant'Ana Lanfredi, representante do Conselho Nacional de Justiça.
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Quero também cumprimentar meu colega Eduardo Bolsonaro, autor do projeto que propõe a sustação das audiências de custódia, e meu colega querido Deputado Gurgel, Relator do projeto, assim como todos os colegas presentes.
A questão da audiência de custódia foi um dos temas mais importantes para mim durante minha campanha. Sobre ele muito me debruço.
Faço votos de que esta audiência traga luz para um tema de tamanha importância para o Brasil.
Passo a palavra ao Desembargador Jayme de Oliveira.
O SR. JAYME DE OLIVEIRA - Obrigado, Deputada. Eu quero cumprimentar todos os integrantes da Mesa, amigos de longa data, na pessoa da nossa Deputada Bia Kicis, que está presidindo a reunião. Queria cumprimentar todos os Deputados, com quem temos também um convívio aqui quase diário nas mais variadas audiências e nas discussões dos projetos da Casa. Quero saudar também o Deputado Eduardo Bolsonaro, que é um dos autores da medida, e o Deputado Luiz Flávio Gomes, ex-magistrado nosso.
Eu fiquei honrado com o convite da Associação dos Magistrados Brasileiros.
O Governador Wilson Witzel, que é também oriundo da nossa magistratura, fez um panorama aqui bastante importante, realista, e mostrou prós e contras do sistema que hoje foi implantado. Muito bem. A audiência de custódia foi implantada no sistema brasileiro por uma decisão do Conselho Nacional de Justiça, por meio de uma resolução, com base em acordo internacional que o Brasil firmou e que foi validado pelo Parlamento. Essa resolução foi objeto de pedido de impugnação no Supremo Tribunal Federal — eu me lembro de pelo menos dois pedidos de impugnação —, mas o Supremo Tribunal Federal entendeu como válida, adequada e correta a resolução, mantendo-a no mundo jurídico.
Eu seguirei aqui duas linhas de raciocínio: primeiro, vou apresentar o que a magistratura pensa da audiência de custódia — eu trouxe um quadro que não sei se vai dar para ler, mas vou mostrar os números; depois, vou levantar algumas preocupações com a pretensão que há de se subtrair do mundo jurídico essa resolução, via decreto legislativo.
Ressalto que é muito importante, Deputado Eduardo, Deputada Bia, que este debate esteja sendo feito na Comissão de Constituição e Justiça e também que a Magistratura tenha a oportunidade de se manifestar.
Muito bem, a AMB realizou recentemente — foi lançada em fevereiro — uma pesquisa bastante profunda com toda a magistratura. Quase 5 mil formulários foram preenchidos, numa pesquisa que demorava, no sistema, cerca de 40 minutos para ser respondida. Nós obtivemos mais de 4 mil respostas. Uma das questões feitas era justamente sobre audiência de custódia.
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O que a magistratura respondeu mostra também um pouco da nossa realidade. A pergunta feita foi a seguinte: "Audiência de custódia é um importante mecanismo de garantia processual do acusado e deve ser aperfeiçoada?" No primeiro grau, entre os juízes de primeira instância, houve praticamente uma divisão completa. Enquanto 49,8% dos juízes discordaram dessa afirmação, 50,2% concordaram. Isso é importante, inclusive esse desmembramento, porque mostra a opinião do primeiro grau, que é quem faz audiência de custódia, e depois mostra o posicionamento das instâncias superiores, chegando aos juízes de segundo grau. Entre os juízes de segundo grau, essa afirmação obteve a concordância de 80,9%. Praticamente 81% dos desembargadores, contra 19,1%, entendem que audiência de custódia é um mecanismo importante. Entre os inativos, portanto os nossos aposentados, o índice de concordância foi de 82%, e, nos Tribunais Superiores, chegou a 88,2% nessa pesquisa. O que chama a atenção? Aqueles que fazem são bem mais divididos do que aqueles que não fazem audiência de custódia.
Qual foi a causa da grande resistência da magistratura? Criou-se mais um mecanismo, sem a correspondente estrutura, para que os juízes pudessem enfrentar... O Tribunal de Justiça de São Paulo, na Capital, criou um núcleo, estruturou-se e foi muito bem. Todavia, em outras regiões do Estado e no restante do Brasil, essa estrutura não existe, e isso dificulta muito a vida do magistrado. Então, os juízes de primeira instância, que são aqueles que fazem as audiências de custódia, dividem-se muito. E há uma insatisfação muito grande com a imposição de mais um mecanismo na sua atividade, o que os prejudicou bastante por falta de estrutura.
Agora eu trato do que disse aqui o Governador, que é um reclamo da magistratura e, por isso acho que nós temos que caminhar na linha do aperfeiçoamento, que seria aproveitar o ato para algo mais efetivo. Assim, chegaríamos ou a uma transação penal, que se está discutindo tanto em relação ao Código de Processo Penal, que, na legislatura passada estava sob a relatoria do Deputado João Campos — este assunto estava em debate na Comissão que trata do Código de Processo Penal — ou o oferecimento de denúncia, como disse aqui há pouco o Governador.
Só a criação de um ato a mais — o que foi feito — gerou muita insatisfação na magistratura de base, que foi quem teve que ir a campo para enfrentar o problema. Então nós temos suspeitado que houve uma divisão na opinião dos juízes. Mas temos que considerar, Paulo, nesse meio a meio — boa parte dos juízes de primeiro grau, como eu por exemplo, responde, assim como respondi quando era juiz de primeiro grau —, quem faz audiência de custódia. Nós não tínhamos essa pergunta no sistema, mas é muito importante perguntar para quem faz. Essa é a questão. É muito fácil eu que não faço dizer que é uma maravilha, dizer que é muito bom. É muito fácil também, na segunda instância, dizer que é muito bom. Há uma distância entre teoria e prática. Para os teóricos tudo é muito fácil, porque não é ele que vai fazer, é outro que vai fazer.
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Eu trouxe os números apenas para mostrar a realidade de pensamento de uma pesquisa que foi agora divulgada no mês de fevereiro, portanto, ela é recente. Essa pesquisa envolve outras questões que dizem respeito também ao tema e que devem ser levadas em consideração, como a transação penal. Essa é uma pergunta que está no sistema. A transação penal teve a concordância de cerca de 88% dos magistrados, desde que com a participação do magistrado. Ou seja, a transação penal é plenamente aceita pela magistratura, desde que com a participação da magistratura.
Eu digo isso por quê? Porque há discussão também de se levar adiante a transação penal sem a participação da magistratura, e isso os magistrados entenderam que não era possível.
Outra pergunta feita também diz respeito ao sistema de videoconferência, que também está ligada ao tema, e que teve o apoio de cerca de 96% da magistratura em algumas políticas criminais.
Eu termino aqui reforçando o pensamento exposto há pouco pelo Governador: é preciso levar essa questão para o debate do Código de Processo Penal, ou para o debate do aperfeiçoamento da legislação via outros caminhos legislativos.
O último dado que eu queria trazer é que me parece que o decreto legislativo não seria, no nosso ponto de vista, o caminho adequado para pura e simplesmente suspender uma resolução do Conselho Nacional de Justiça que foi questionada no próprio Supremo Tribunal Federal e reafirmada como válida.
Penso que o caminho seja a discussão da melhoria desse sistema, especialmente dando mais eficácia àquele momento específico da audiência de custódia e, portanto, à tradução daquele momento em algo mais efetivo para o sistema, por quê? Porque, do contrário, nós teremos muitos gastos, uma despesa muito grande com o sistema e pouca efetividade. Parece-me que o caminho seria dar, portanto, mais efetividade. A sustação via decreto, do nosso ponto de vista, é inviável. Não sei o que pensam os demais integrantes da Mesa, porquanto a Constituição garante que os decretos podem sustar atos do Poder Executivo, mas não do Judiciário.
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Com essas observações, também reforço a ideia à guisa agora de conclusão de que nós devemos trabalhar para o aperfeiçoamento desse sistema, dando mais eficácia à audiência de custódia.
Vou deixar essa pesquisa para a Comissão. Nós já encaminhamos um exemplar deste trabalho para a biblioteca da Câmara e do Senado, porque aqui está o pensamento hoje da magistratura sobre os mais variados temas de interesse da Casa Legislativa.
Com isso, Deputada, agradeço pela oportunidade de trazer à luz pelo menos o pensamento que a magistratura brasileira apresentou recentemente sobre o tema de audiência de custódia, que é bastante dividido, como vimos, mas acreditamos que temos que avançar no tema.
Muito obrigado.
A SRA. PRESIDENTE (Bia Kicis. PSL - DF) - Eu que agradeço.
Passo agora a palavra ao Coronel Leonardo Siqueira dos Santos, representando a Corregedoria da PM do Distrito Federal, pelo prazo de 10 minutos.
O SR. LEONARDO SIQUEIRA DOS SANTOS - Sra. Presidente, Deputada Bia Kicis, muito nos honra a menção. Senhores demais membros desta Mesa, Sras. e Srs. Deputados desta Comissão de Constituição e Justiça que se encontra plena pelo que qualifica a importância do tema que vamos tratar neste momento.
Preliminarmente eu vou trazer a experiência do policial militar e da estrutura de Polícia Militar, portanto de quem abre os inquéritos relativos a ocorrências do Núcleo de Audiência de Custódia — NAC. Essa perspectiva é muito importante, porque, a partir do momento em que houve a implantação da audiência de custódia, houve aumento importante no número de procedimentos, ou seja, inquéritos policiais militares abertos. Eu tenho alguns números para dar aos senhores a serem levados em consideração.
Somente no ano de 2016, portanto o primeiro ano em que houve a aplicação da audiência de custódia efetivamente no Distrito Federal, nós tivemos notícias vindas dos Núcleos de Audiência de Custódia à Corregedoria da PMDF e de outras vias. Houve 713 notícias de fato que envolviam possíveis agressões por policiais militares a custodiados apresentados em audiência.
Feita uma análise preliminar de seu conteúdo, já de pronto 21,76% de todo esse conteúdo havia sido arquivado, o que significa, para que fique bem claro aos senhores, que às vezes a notícia chega do Núcleo de Audiência de Custódia. Nós temos uma pessoa que relata e chega para nós com audiovisual aqui em Brasília. Na corregedoria nós lemos a ata, ouvimos todo o audiovisual e analisamos o laudo que é apresentado pelo IML a nós. De imediato 21,76% de todas essas notícias não têm justa causa para instauração de inquérito e explico por quê. Existem casos esdrúxulos, mas geralmente é perguntado ao custodiado: "O senhor foi agredido pela guarnição da Polícia Militar?" Ele responde: "Sim". O juiz dirigente pergunta ao custodiado: "Onde você foi agredido?" "Ah, eu tomei um chute na cara".
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No laudo apresentado pelo IML, que nos chega por vezes, sequer rubor na face é constatado — sequer rubor na face. Então, é importante, durante a audiência de custódia, considerar as perguntas que são realizadas ao custodiado. O modo como se analisa a questão da agressão, nesta análise preliminar, deve ser considerado pelo magistrado, antes do lançamento próprio em ata e o envio para instauração de inquérito. De imediato, não feita esta análise — "O senhor foi agredido?" "Fui agredido" "Portanto, conste em ata". — esta ata é encaminhada à corregedoria e ele é apresentado ao IML, porque foi apresentado pela prisão em flagrante, e lá será feito o exame de corpo de delito ad cautelam. No IML será ou não constatado que houve lesão — e não se constata em 21,73% dos casos.
Avancemos.
Peço a atenção porque são dados extremamente significativos, que demonstram o plano de quem está lidando com a investigação dos casos envolvendo o NAC. Das ocorrências restantes que são instauradas, temos que em 82,33% dos inquéritos instaurados — foi para o IML, houve a notícia de agressão na ata; no IML foi dito: "O senhor realmente foi agredido e foi lançado no laudo constatado pelo perito que houve a lesão". Melhor e tecnicamente dizendo — não há o oferecimento de denúncia. Ao final da investigação, não se chega à convicção da materialidade, da correspondência daquela eventual lesão e das lesões, em regra — digo isso por experiência. Permitam-me que eu apresente minhas credenciais aos senhores, porque ainda não pude fazê-lo de uma maneira exaustiva. Eu sou o Chefe da Divisão de Polícia Judiciária da Corregedoria da PMDF. Todo o crime militar envolvendo policial militar no DF passa por mim. Quem pede a instauração de inquérito sou eu, e eu sou muito conhecido na corporação por ser um oficial muito rigoroso, e por isso estou lá.
Destes que são instaurados, da instrução feita, 82,33% são arquivados pelo juízo da auditoria militar, por requerimento próprio do Ministério Público. Percebam que, dos inquéritos instaurados, somente 17,33% possuem realmente materialidade para oferecimento da denúncia.
Esses dados são de 2016, portanto, da época da implantação do Núcleo de Audiência de Custódia aqui em Brasília. Em fevereiro de 2015, houve a primeira experiência em São Paulo. Corrijam-me os senhores membros da Mesa, caso contrário Em Brasília, ela se consolidou em 2016. Naquele período, em 2017, desses inquéritos instaurados, estavam em tramitação tão só 14,86%. Lamentavelmente, não tenho os dados estatísticos das condenações resultadas destes 14,86% que foram processados pela Auditoria Militar do DF, mas posso garantir aos senhores: o percentual de condenações efetivas foi muito pequeno. Dito isso, eu quero que os senhores considerem também um dado fático: 703 registros, com a implantação do Núcleo de Audiência de Custódia. Houve 279 Inquéritos Policiais Militares — IPMs instaurados, só em 2017. Isso impactou em mais de 100% do número de Inquéritos Policiais Militares que havíamos instaurados na corregedoria, e, portanto, apresentados à Auditoria Militar do Distrito Federal — dobrou, no mínimo.
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A realidade hoje é que, com o Núcleo de Audiência de Custódia e a aplicação da Lei nº 13.491 — o que corresponde ao que infelizmente não tenho como apresentá-los —, hoje nós temos 250%, aproximadamente, de aumento do número de Inquéritos Policiais Militares de ações penais militares na Auditoria Militar do DF, somente para o ano de 2017. E essa tendência tem se mantido.
Sra. Presidente, permita-me fazer essa memória e jogar um pouco de confete no trabalho excelente, atribuo, que é feito pela Justiça Militar do Distrito Federal e pela Auditoria Militar. A consequência imediata é que no DF nossa Auditoria Militar consegue processar... Apresentada a denúncia em 2015, até a condenação em primeiro grau, não tínhamos um processo com mais de 2 anos de tramitação. Isso é muito diligente, dada a realidade do nosso País. Digo isso porque eu fui juiz militar e, durante esse período, eu era encarregado de fazer algumas audiências no juízo de cartas precatórias de outros Estados. Eu audiências de oitivas de testemunhas de outros Estados onde o processo tramitava há quase 20 anos na Auditoria Militar estadual. Então, a realidade do DF era muito diligente.
Com o aumento em 250%, houve um aumento desse quantitativo e, portanto, o processamento vai perdurar por mais tempo. Ainda não se tem os dados disso, mas certamente, no mínimo, pela lógica, vai dobrar o tempo de processamento de 2 anos para 4 anos, quiçá, 5 anos. Isso impacta em prescrição de crimes extremamente relevantes.
Esses dados são importantes de se contextualizar.
Passo agora, neste último minuto, no meu encerramento, a mostrar a perspectiva de como isso é feito. Senhores, o policial militar, no momento que prende uma pessoa, ele o leva à autoridade policial — o Delegado de Polícia, ou, no caso de um militar que foi preso por crime militar, o oficial de plantão. Ali é feito o auto de prisão em flagrante, ele é apresentado ao IML e fica sob custódia até ir à audiência no NAC. Na audiência é levantada uma série de questões, que eu faço a seguinte memória para levar em consideração. Os juízes formulam perguntas de conteúdo afirmativo: "O senhor foi agredido?" Isso é um convite imediato a que ele alegue: "Eu fui agredido". Ele tem que se manifestar, ao nosso sentir, no sentido de que ele foi agredido ou não.
É importante esclarecer ao custodiado que ele pode responder por crime de denunciação caluniosa — e vários estão respondendo aqui no DF, porque o nosso Ministério Público Militar é muito diligente.
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É importante desvincular da narrativa da agressão o decreto de soltura ou a sua possibilidade, porque ele tem ou pode ter a impressão de que ele vai ser solto se falar que foi agredido. É preciso esclarecer isso ao custodiado em juízo, porque, do contrário, isso provoca um aumento nessa circunstância.
Encerrando, quero dizer que o DF está caminhando para isso. Ele tem sido citado como referência no nosso Núcleo de Audiência de Custódia. É necessário ter um médico-legista na própria audiência para constatação das lesões e indicação da relevância do que lhe é apresentado.
Agradeço a V.Exa., Sra. Presidente.
Estou muito agradecido a todos. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Bia Kicis. PSL - DF) - Agradeço ao Coronel Siqueira por trazer aqui sua experiência tão importante para a elucidação dos fatos.
Passo a palavra para o Sr. Pedro Paulo Coelho, Presidente da Associação Nacional dos Defensores Públicos — ANADEP.
O SR. PEDRO PAULO COELHO - Bom dia a todas e a todos. Cumprimento a 1ª Vice-Presidente, Deputada Bia Kicis, os Deputados Eduardo Bolsonaro, Gurgel e Léo Moraes e toda a Mesa por esta importante oportunidade de debater sobre tema tão caro à nossa sociedade.
Eu queria iniciar fazendo a afirmação de que o nosso processo penal brasileiro é cruel, é seletivo, é racista, é discriminatório. Então, com essa premissa, vou começar a falar um pouco sobre os marcos civilizatórios do processo penal brasileiro.
O primeiro marco civilizatório, entendo eu, é a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, coincidentemente após um regime totalitário que fulminou e destruiu diversas pessoas em campo europeu. E o Brasil já poderia ter aderido a um marco civilizatório interno em 1969, quando da elaboração do Pacto de São José da Costa Rica. Porém, apenas em 1992 esse pacto foi internalizado no Brasil. Então, o Brasil viveu um atraso civilizatório no processo penal naquele momento.
Em 1988, obtivemos muitos avanços com a nossa Constituição Cidadã. Só que, curiosamente, em que pese o princípio do contraditório e da ampla defesa — e eu tenho essa experiência prática, porque fiz várias audiências de custódia como titular do Tribunal do Júri pela Defensoria Pública do Espírito Santo —, diversos processos eram conduzidos sem a presença da defesa, principalmente para as pessoas mais pobres. O Código de Processo Penal previu a obrigatoriedade da presença da defesa até o interrogatório apenas em 2003. Note-se que a primeira fase do Tribunal do Júri era conduzida em boa parte sem qualquer tipo de defesa para as pessoas mais pobres. Essa conduta não é civilizatória, e isso tem que ser afirmado.
O Brasil avançou obviamente, mas tem que avançar mais. A posição da ANADEP, dos defensores públicos, é clara no sentido de que a audiência de custódia — e sabemos da importância de fazer aperfeiçoamentos — é um importante marco civilizatório no processo penal brasileiro. Digo isso não baseado em falas e em dogmática, mas em dados. Mais de 70% das pessoas que passam pela audiência de custódia são pretos e pardos. Infelizmente o processo penal brasileiro tem cor. A audiência de custódia é uma oportunidade para que essas pessoas tenham orientação jurídica, para que essas pessoas tenham pelo menos a esperança de serem assistidas no seu processo penal, diversamente do que acontecia antes de 2003. E a Defensoria Pública do Rio de Janeiro, por exemplo, atua em 94% das audiências de custódia.
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Nós sabemos que há muitos discursos de que a audiência de custódia é feita para soltar criminosos. Nós entendemos o anseio de toda a população. Ninguém aqui na Câmara dos Deputados, ninguém no Brasil quer a violência e que os índices de violência aumentem, até porque quem mais sofre com a violência no Brasil é a população mais pobre. E é essa população mais pobre que é assistida pela Defensoria Pública.
A audiência de custódia no Rio de Janeiro mostrou — e esses dados são recentes e produzidos pela Defensoria Pública do Rio de Janeiro — que 26% das pessoas são soltas. O restante continua preso, respondendo ao processo preso preventivamente. Esses dados demonstram que a regra que deveria ser a liberdade continua não sendo a regra. A regra é a prisão.
Temos que pensar em soluções de combate à violência. Entendo que a prisão não pode ser essa solução simples, rasa, tem que ser debatida. A prisão tem que ser necessária nas condutas típicas de maior gravidade. E a minha experiência em audiência de custódia — e fiz mais de 400 audiências de custódia — demonstra que a pessoa permanece presa nos casos de crimes mais graves, como o homicídio doloso, roubo com emprego de arma. Essas condutas criminosas permitem a permanência da prisão preventiva.
Mas o que não podemos aceitar como civilização, e isso já aconteceu comigo na defesa, é que um catador de lixo que vende sucata — ele não tem, infelizmente, a oportunidade de ter um emprego melhor, mas aquele é o seu emprego — fique preso por 10 meses até ter o primeiro contato com a sua defesa. Vejam, 10 meses. Isso não é civilização.
Entendo perfeitamente a posição dos nobres Parlamentares, mas entendo também que essas questões têm que ser levantadas e que a audiência de custódia deve ser aperfeiçoada de alguma forma. No entanto, não dá para aceitar que uma civilização no século XXI permita que um catador de sucata fique preso por 10 meses, até porque 1 dia de prisão para essa pessoa já seria suficiente para mostrar a falta de civilização.
Eu trago também alguns argumentos formais sobre a impossibilidade da sustação da Resolução nº 213, de 2015 do CNJ. O art. 5º, § 2º, da Constituição Federal é bem claro quando estabelece que os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil faça parte. E o Brasil faz parte do Pacto de São José da Costa Rica. O Brasil deve respeitar, deve observar toda a normativa do Pacto de São José da Costa Rica. Ele diz em seu art. 7º, V, que toda pessoa detida ou retida deve ser conduzida sem demora à presença de um juiz ou outra autoridade autorizada. Inclusive, havia polêmica se essa autoridade autorizada poderia ser o delegado, até porque o delegado exerce importantíssima atividade judicial. Porém, a jurisprudência da corte interamericana entendeu que autoridade deve ser revestida da jurisdição, conforme previsto no Brasil, apenas para os magistrados. Ouvi muito a fala do Governador Wilson Witzel, que vem buscando soluções para o combate à criminalidade. Eu sou do Rio de Janeiro, nascido e criado na entrada do Morro dos Tabajaras. Sei que a violência do Rio de Janeiro é enorme. Nasci ouvindo troca de tiros. Mas eu só ouvia, eu não morria por causa dessa troca de tiros. Eu sei que é a comunidade do Rio de Janeiro que mais sofre; não é a classe média e a classe alta; é a classe mais baixa. Acho que temos que buscar soluções. Por isso, eu parabenizo, mais uma vez, a iniciativa dos nobres Parlamentares. Mas devemos buscar soluções que diminuam essa violência, e essa violência não vai ser diminuída com uma solução tão simplória como a prisão, e, sim, com a redução das desigualdades sociais.
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Estudos demonstram claramente que o problema da criminalidade tem muito a ver com a desigualdade social. O Rio de Janeiro é claro nisso: o morador do Rio de Janeiro convive lado a lado com diversas comunidades. O Leblon é um exemplo. Essa desigualdade social gera violência, essa desigualdade social acirra a criminalidade, essa desigualdade social acirra a revolta de toda a população.
Minha fala é basicamente esta: a defesa da audiência de custódia. Entendemos, sim, que ela tem que ser aprimorada, como todo o sistema de Justiça. Alguns pontos foram levantados aqui sobre a celeridade do processo. A celeridade do processo, com certeza, seria a melhor solução para que o processo penal se tornasse mais justo, porque a demora processual não prejudica apenas a vítima, os familiares da vítima; prejudica o acusado inocente, prejudica aquela pessoa que até é culpada, mas já quer receber uma sentença.
Essas soluções de celeridade têm que ser debatidas, ampliadas, de alguma forma. Trago outros casos também. Fiz o júri de uma pessoa que sonhava em ser policial militar, e ele foi inocentado, mas só depois de 17 anos. Ele não realizou o sonho de ser policial militar, e a demora no processo foi o principal causador desta não realização do seu sonho. Então, temos que pensar em soluções. A audiência de custódia já é um avanço. Talvez devamos aperfeiçoar e melhorar tão importante instrumento civilizatório no processo penal brasileiro.
Muito obrigado. (Palmas.)
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A SRA. PRESIDENTE (Bia Kicis. PSL - DF) - Muito obrigada.
Agora eu passo a palavra ao Sr. Fábio Tofic Simantob, Presidente do Instituto de Defesa do Direito de Defesa — IDDD.
O SR. FÁBIO TOFIC SIMANTOB - Bom dia a todas e todos.
Cumprimento a Mesa, na pessoa da Deputada Bia Kicis. Quero cumprimentar também os demais Parlamentares presentes: o autor do projeto, Eduardo Bolsonaro; Paulo Teixeira, Luiz Flávio Gomes, aos quais quero também fazer um cumprimento especial, e o Fábio Trad, que também vi, mas deve ter ido embora.
Senhores, apenas para que compreendam a minha fala aqui, eu vou me apresentar. Sou Presidente do Instituto de Defesa do Direito de Defesa. Nosso instituto tem como ideia basilar a de que todos — todos! —, indistintamente, tem o direito de defesa.
O instituto faz a defesa gratuita de muitos réus no Tribunal do Júri. Já defendemos, inclusive, policiais militares. Eu, pessoalmente, já fiz a defesa, no Tribunal de Júri, de muitos policiais militares, o que me orgulha. Sentou-se no banco dos réus, não importa se é pobre ou rico; se é policial; se é acusado de tráfico, estupro, homicídio — não importa. Qualquer pessoa que se sentou no banco dos réus terá, aos nossos olhos, um escrutínio para saber se o seu direito de defesa está sendo respeitado. Nós defendemos o direito de defesa e não olhamos a quem.
É importante dizer isso aos senhores para que não se crie a ideia de que o que há é um nós contra eles: bandido contra polícia, polícia contra bandido. Não é nada disso. É apenas o respeito aos direitos de quem se senta no banco dos réus.
Se há um crime que todos nós um dia podemos cometer — isso se diz há séculos —, é o crime de homicídio. Eu imagino que cada um dos senhores, se um dia for acusado de um homicídio, gostaria que o juiz que decidisse pela prisão preventiva decidisse não apenas olhando papéis, mas também olhando no olho de cada um dos senhores; decidisse também ouvindo o que tivessem a dizer, 24 horas, 48 horas depois da prisão, e não 8 meses, como acontecia antes da audiência de custódia, quando o encontro entre réu e juiz só se dava no interrogatório, que é o último ato do processo.
Então, é importante que os Srs. Parlamentares, principalmente aqueles que não são muito familiarizados com as questões jurídicas, entendam o que é audiência de custódia. Audiência de custódia é nada mais, nada menos do que um encontro do juiz com o preso nas primeiras horas do flagrante — não é nada mais do que isso —, encontro que no Brasil ocorria meses depois da prisão.
Eu mesmo defendi, certa feita, um policial militar que foi impronunciado pelo juiz, mas permaneceu preso durante o processo inteiro. Talvez, se houvesse audiência de custódia naquela época, Deputado Eduardo Bolsonaro, esse policial tivesse ficado solto desde o começo.
Veja que o nosso não é um instituto que visa defender este ou aquele cidadão. É um instituto que visa resguardar o estado de liberdade de qualquer pessoa acusada de um crime no Brasil. É apenas isso.
Eu vejo, Srs. Deputados, até um pouco diferente do que eu esperava — e esta é uma Casa de consensos —, que na Mesa há um consenso: ninguém é contra a audiência de custódia. Isso me leva a crer, respeitosamente, que a proposta elaborada pelo Deputado vai ser rejeitada, porque ela simplesmente propõe acabar com a audiência de custódia, e eu não ouvi ninguém que falou aqui hoje dizer que concorda com a extinção da audiência de custódia. Há quem proponha — desde o eminente Corregedor da Polícia Militar até o Governador do Rio de Janeiro — aperfeiçoá-la e modificá-la, discussão, inclusive, que está sendo travada há alguns anos no projeto de Código de Processo Penal que corre nesta Casa.
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Portanto, é importante, até para facilitar a compreensão daqueles que não são familiarizados com as questões jurídicas, dizer que há um consenso: ninguém é favorável a acabar com a audiência de custódia.
Eu aproveito, inclusive, da fala do meu querido amigo Jayme de Oliveira, Presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros — AMB, dados de uma pesquisa importante feita dentro do Judiciário brasileiro a respeito do que eles entendem da audiência de custódia. É evidente que eu não posso interferir na contagem dos votos, mas eu posso, talvez, meu querido amigo Jayme, que não está aqui, interpretar os dados.
Conforme os dados que foram apresentados e colocados aqui, apenas vinte e poucos por cento dos juízes discordam muito da audiência de custódia. Todos os demais ou concordam 100%, ou discordam pouco. E nós não sabemos por que discordam. Discordam porque são contra a realização da audiência, ou discordam do formato e sugerem modificações?
É importante entendermos isso, porque senão ficamos com a impressão de que todos os juízes brasileiros são contra a audiência de custódia, e esse não é o diagnóstico que eu faço, como advogado criminal que frequenta o foro, como vários outros aqui que frequentam e conversam com os juízes. Há críticas, e na Justiça sempre vai haver quem pensa de um lado, quem pensa do outro e quem pensa de modo intermediário. É preciso entender exatamente o que se está criticando. Os juízes que não concordam muito, que discordam muito da audiência, é preciso entender o que estão criticando. Mas sobretudo aqueles que discordam pouco, Deputado Kim Kataguiri, é preciso ouvi-los para saber com o que exatamente esses juízes não concordam. Talvez ouçamos deles críticas que foram feitas aqui: que é preciso aperfeiçoar o juiz que faz perguntas.
V.Exas., provavelmente, vão se deparar, no Código de Processo Penal, com propostas que tornem o sistema brasileiro mais acusatório. O que significa um sistema acusatório? O juiz não interfere no processo. A acusação fala, a defesa fala, e o juiz não; ele é inerte. O juiz não vai atrás da prova, como inclusive disse o Governador Witzel numa entrevista que estava dando. O juiz não investiga.
Essa é uma luta, Corregedor Leonardo Siqueira, antiga da advocacia. O juiz não deve interferir. Eu acho errado o juiz perguntar. É o Ministério Público que tem que fazer perguntas.
São aperfeiçoamentos que podem ser feitos. Perguntas afirmativas feitas por um juiz em audiência podem revelar um ânimo já preconcebido de julgar desta ou daquela forma. Talvez possamos acabar, Deputado Luiz Flávio Gomes, com as perguntas afirmativas feitas por juízes, não só na audiência de custódia, mas nas audiências de produção de provas, de oitivas de testemunhas. Há muito a ser aperfeiçoado.
Mas o que eu quero trazer aos senhores são dados. O Instituto de Defesa do Direito de Defesa, IDDD, instituto que eu presido — e não foi na minha presidência; foi na gestão anterior —, foi convidado, na época, pelo CNJ a celebrar um termo de compromisso e participar da implementação das audiências de custódia em todos os Estados.
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Nós tivemos a honra de participar de todas as audiências de custódia, ao lado do Lanfredi, que foi o juiz responsável e encarregado pelo Ministro Lewandowski, na época, de implantar a audiência de custódia em todo o Brasil.
Vejam os senhores que todos os Estados brasileiros aceitaram implantar a audiência de custódia. Não importa de que partido fossem, não importa de que ideologia fossem, todos os Estados, em questão de meses — 2 ou 3 meses —, implantaram a audiência de custódia. Não houve resistência a isso.
E, depois de implantada a audiência de custódia, nós fomos incumbidos de realizar algumas pesquisas, um monitoramento disso.
Eu quero trazer alguns dados aos senhores do que foi colhido nesse monitoramento, para os senhores verem que a audiência de custódia não serve nem para prender e nem para soltar, mas para aumentar a capacidade sensorial do julgador. O juiz antigamente decidia a prisão preventiva com venda nos olhos e ouvidos fechados. Ele julgava papel. Hoje ele olha a pessoa, ouve a pessoa e decide.
Se nós formos dizer que a audiência de custódia é perigosa porque solta demais, nós estaremos criando uma suspeição sobre todos os juízes do Brasil, porque a audiência de custódia não acabou com o poder do juiz de decidir se alguém fica preso ou solto. É perigoso esse caminho de achar que a simples realização de uma audiência vai levar a um caminho ou a outro.
Por exemplo, nos crimes de tráfico, 70% ficam presos. Nos crimes de roubo majorado, que o Governador citou como um dos crimes que mais assombram a população brasileira, 87,4% das pessoas ficaram presas, quase 100%. No latrocínio, foram 83,33%. No homicídio, foram 76,9%. No feminicídio realmente há um número menor: foram 55,6%. Nos crimes patrimoniais sem violência, como furto, cujo projeto de Alexandre de Moraes, em alguns desses crimes, chega a sugerir até que não haja ação penal pública incondicionada, só se a vítima quiser; mesmo nesses crimes em que uma condenação não gera prisão, nós temos, no furto, 24% de réus mantidos presos em audiência de custódia; na receptação, são 40%; e no dano ao patrimônio público — por exemplo, se eu quebrar esse copo aqui dolosamente —, 29,4%.
Portanto, é uma falácia, data maxima venia, não é verdade que a audiência de custódia foi criada para soltar preso. Isso não é verdade. Ela foi criada para facilitar a decisão do juiz no filtro necessário para saber quem fica preso e quem não fica, porque esse filtro é importante para que possamos socorrer o sistema prisional, que o Governador Witzel também mostrou ser um dos graves problemas hoje do sistema penal brasileiro.
Mas, para resolver esse problema, é preciso filtrar quem entra no sistema, porque o sujeito primário, com bons antecedentes e que não tem que ficar preso, mas entra no sistema, 1 mês depois, Deputado Eduardo Bolsonaro, sai membro do crime organizado. É importante filtrar para saber quem colocar e quem não colocar dentro do sistema prisional.
Eram essas as minhas considerações.
Eu agradeço a atenção de V.Exas. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Bia Kicis. PSL - DF) - Agradeço ao Dr. Fábio.
Passo agora a palavra ao Sr. Marcelo Rocha Monteiro, Procurador de Justiça do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro.
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O SR. MARCELO ROCHA MONTEIRO - Bom dia a todos.
Eu agradeço ao Deputado Gurgel pelo convite.
Quero cumprimentar a Deputada Bia Kicis, Vice-Presidente desta Comissão, que no momento preside os trabalhos; o Deputado Daniel Silveira, com quem tive a oportunidade de estar no Rio de Janeiro, no lançamento da Frente de Segurança; o Deputado Eduardo Bolsonaro, que parabenizo pela iniciativa; e o meu querido amigo Deputado Kim Kataguiri.
O meu antecessor disse que, no entendimento dele, havia um consenso acerca da audiência de custódia. Então eu quero pedir desculpas, porque vou quebrar o consenso, dizendo que apoio a iniciativa da Casa no sentido da abolição da audiência de custódia ou, no mínimo, da sua abolição nos moldes em que é feita hoje.
Por que isso? A audiência de custódia tem por base a Convenção Americana de Direitos Humanos, o Pacto de San José da Costa Rica, que, no seu art. 7º, item 5, prevê que "toda pessoa presa, detida ou retida deve ser conduzida, sem demora, à presença de um juiz ou outra autoridade autorizada por lei a exercer funções judiciais (...)".
O nosso Código de Processo Penal prevê desde sempre a apresentação imediata de quem foi preso em flagrante à autoridade policial, que é o delegado. O art. 304 diz que o delegado vai ouvir o condutor, que é a pessoa que efetuou a prisão, vai ouvir as testemunhas, vai interrogar o preso e, resultando das respostas fundada suspeita contra o conduzido, mandará recolhê-lo à prisão. A contrario sensu, o que isso significa? Que se o delegado entender, depois de ouvir todas essas pessoas — quem efetuou a prisão, as testemunhas, eventualmente a vítima e o preso —, que não procede aquela prisão, não há fundamento para aquilo, seja porque não houve crime, seja por que não foi aquela pessoa que o cometeu, ele não vai recolher o acusado à prisão. Então, ele estará exercendo nesse momento uma função de controle da legalidade da prisão, que é própria do juiz e que a lei atribui a ele, delegado, nesse momento. E, mais do que isso, ainda que ele considere que a prisão foi legal, dependendo do crime, como delegado, ele poderá conceder liberdade mediante fiança. Novamente estará exercendo função jurisdicional — jurisdição cautelar, contracautela — e não estará usurpando a função do juiz, porque estará fazendo isso por expressa autorização do nosso Código de Processo Penal. Por isso, não vejo a necessidade da audiência de custódia para que se cumpra o determinado no art. 7º, item 5, do Pacto de San José. O nosso Código já faz isso.
Existe outra autoridade, o delegado de polícia — com todo o respeito pelos que me antecederam e que discordam dessa opinião —, que vai fazer esse controle. O delegado viu que a prisão foi ilegal e já diz: "Não vai ficar preso, não; não vou recolher ao xadrez; não vou recolher à prisão". Então, a pessoa vai ser liberada. Se a prisão foi legal, mas, nesse caso, cabe fiança, a pessoa vai ser liberada mediante fiança. O delegado pode fazer isso; o delegado tem poder para fazer isso. O Código de Processo Penal lhe dá esse poder.
Também quero ponderar outra coisa. O Pacto de São José da Costa Rica é de 22 de novembro de 1969. A realidade da América Latina era completamente diferente. No Brasil e em diversos países havia regimes de exceção e problemas com prisões ilegais. Hoje o panorama no Brasil é completamente diferente. Aliás não só no Brasil, mas também em quase toda a América Latina, com as lamentáveis exceções de Cuba e Venezuela, que continuam sendo regimes autoritários e ditatoriais. É evidente que a realidade brasileira, em termos de atuação policial e de prisões ilegais, em 2019 não é a mesma de 50 anos atrás. É importante que isso seja também levado em consideração.
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A outra questão importante é, mais uma vez, lamentavelmente, a violação da democracia representativa. Desculpem-me pelo palavreado, mas é o Congresso sendo jogado para escanteio, pois uma norma de processo penal, a criação de uma audiência, partiu do Conselho Nacional de Justiça, por meio de resolução. Isso tem que ser discutido. Isso é lei processual penal. Os senhores foram eleitos para fazer as leis; não os integrantes do Conselho Nacional de Justiça. Ninguém votou em nenhum integrante do Conselho Nacional de Justiça.
Mais uma vez o CNJ extrapola suas funções, legislando sobre o processo penal, atropelando o Congresso Nacional e violando a democracia representativa. E V.Exas. sabem que a democracia representativa é o pior regime que existe, com exceção de todos, como já dizia Winston Churchill.
Na prática, em que aproveita essa audiência de custódia? Nós já temos mecanismos da legalidade da prisão. A prisão, no Código de Processo Penal, tem que ser comunicada imediatamente ao juiz. O preso tem que ser submetido a exame de corpo de delito. "Ah, mas o juiz não vê o preso!" Eu ouvi o meu ilustre antecessor dizer que a grande utilidade prática da audiência de custódia é "aumentar a capacidade sensorial do julgador": "O juiz ouve o preso. O juiz vê o preso e depois decide".
Decide o quê? A mais importante decisão que o juiz tem a tomar quando alguém é preso em flagrante é sobre a necessidade de manter aquele sujeito preso ao longo do processo que está para se iniciar ou se ele pode responder ao processo em liberdade. Quais são os três critérios que o Código de Processo Penal adota para que um réu responda a um processo preso? Vamos ao artigo 312. Primeiro: assegurar a aplicação da lei penal, que, traduzido do juridiquês para a língua de todo mundo, significa perigo de fuga. Segundo: conveniência da instrução criminal, que significa perigo para a prova: se ele ficar solto, vai ameaçar a testemunha. Terceiro: garantia da ordem pública. Se esse sujeito ficar solto, vai cometer novos crimes. Ele é perigoso. Ele é um bandido contumaz.
Eu pergunto a V.Exas. em que o contato do juiz com o réu vai auxiliar o juiz. V.Exas. imaginem a audiência de custódia, em que o juiz — é incrível, mas isso está no inciso VIII do art. 8º da resolução — não pode fazer perguntas sobre o fato. Não pode fazer perguntas sobre o crime. O crime é um pequeno detalhe, não é? O juiz não pode fazer perguntas sobre o crime pelo qual o sujeito foi preso — o homicídio, o latrocínio, o estupro, o assalto à mão armada. Então, ele vai olhar para o réu, vai ter esse contato sensorial de que falou aqui o Dr. Fábio e vai perguntar: "O senhor pretende fugir?" "Não, Excelência." "O senhor planeja ameaçar alguma testemunha de acusação?" "Não, Excelência." "E o senhor se considera perigoso?" "De jeito nenhum, Excelência!" "Então, eu vou soltá-lo; eu vou conceder-lhe a liberdade provisória". É esse o contato sensorial? De um juiz que não pode nem sequer fazer perguntas sobre o crime? "O que senhor estava fazendo nessa rua?" "Por que o senhor atirou?" "Estava com essa arma por quê?" "O que o senhor estava fazendo nesse banco, junto com esse bando que não foi preso com o senhor porque fugiu?" Não se pode fazer pergunta sobre isso! Que sentido isso faz? Que contato sensorial é esse?
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Então, desculpem-me, mas, com toda a sinceridade, não vejo nenhuma utilidade na audiência de custódia.
Outra coisa: não é verdade que a audiência de custódia não tenha sido implantada para diminuir o número de presos. Foi implantada com essa finalidade, sim! Os senhores encontram isso nos consideranda da resolução do Conselho Nacional de Justiça. Lá existe, em determinado momento, o seguinte considerando: "Considerando (...) o contingente desproporcional de pessoas presas provisoriamente".
Isso é uma lenda! Isso é uma falácia! "O Brasil tem um contingente de presos provisórios muito grande, absurdo, de 40%!" Não é de 40%; é de 34,5%, conforme dados de ontem do prisonstudies.org, que é uma referência internacional neste tema.
Peço só 2 minutinhos, Presidente.
O Brasil está em 86º lugar numa lista de proporção de presos provisórios: 34,4% dos presos no Brasil estão aguardando julgamento. Na verdade, não estão aguardando julgamento; alguns estão aguardando julgamento e outros estão aguardando o trânsito em julgado da condenação e ainda são considerados presos provisórios. Suíça, esse país horrível, essa ditadura terrível, tem 42%, mais do que o Brasil. Canadá tem 38,3%, mais que o Brasil. Bélgica tem 35,6%, mais do que o Brasil. Dinamarca, esse país horroroso do Terceiro Mundo, tem 35,5%. O Brasil tem 34%. Então, é uma balela que nós tenhamos um contingente exageradamente grande de presos provisórios, e essa balela foi, sim — está aqui na resolução —, um dos considerandos para se criar a audiência de custódia.
Bom, o que eu posso dizer aos senhores é o seguinte: devemos abolir a audiência de custódia, que mobiliza centenas de juízes, promotores, policiais para esse contato sensorial, para o juiz olhar para o preso e dizer: "Como é que foi a sua prisão?" "O senhor gostou de ser preso?" "Ficou satisfeito com a sua experiência?", resultando nisso que coronel nos falou: 82% de afirmações mentirosas de agressão — 82%! Vamos, pelo menos, transformar essa audiência numa audiência de instrução, permitindo, aí sim, o oferecimento de denúncia oral pelo Ministério Público, trazendo utilidade prática e equidade. O que é isso de interrogar só o preso? Vamos inquirir quem efetuou a prisão, vamos inquirir a vítima, vamos inquirir testemunhas presenciais e vamos usar essa prova, estabelecendo um rito sumaríssimo para as hipóteses de prisão em flagrante, trazendo celeridade.
Eu discordei de quase tudo o que o colega disse aqui. Quase virou um júri isto aqui. Botar um defensor de júri, um promotor de júri e um advogado de júri tinha que dar nisso. Mas o fato é o seguinte: eu concordo que temos que dar celeridade ao processo. Celeridade é bom para o réu inocente, para o réu culpado, para a vítima e para todo mundo. Então, por que não fazer desse limão uma limonada e aproveitar a audiência de custódia para transformá-la numa audiência de instrução? Era o que eu tinha a dizer. Muito obrigado.
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(Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Bia Kicis. PSL - DF) - Muito obrigada, Dr. Marcelo, pelas suas elucidações.
Agora eu passo a palavra ao Sr. Luís Geraldo Santana Lanfredi, representante do Conselho Nacional de Justiça — CNJ.
O SR. LUÍS GERALDO SANTANA LANFREDI - Bom dia a todos.
Eu gostaria de cumprimentar os presentes, na pessoa da Presidente desta reunião da Comissão de Constituição e Justiça, a Deputada Bia Kicis, enaltecendo a oportunidade deste diálogo qualificado, a partir da iniciativa do Deputado Eduardo Bolsonaro e também do Deputado Gurgel.
Eu trago o abraço e a consideração de respeito de S.Exa. o Ministro Dias Toffoli a esta Comissão e a este Parlamento pela oportunidade de discutir um tema tão importante para todos nós.
Eu estou aqui na condição de juiz auxiliar do Conselho Nacional de Justiça e de Coordenador do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário.
A audiência de custódia se define como o ato processual por meio do qual a pessoa presa é apresentada a um juiz de direito, na presença de um representante do Ministério Público e da defesa, a fim de que se defina a respeito da legalidade e da necessidade da manutenção dessa prisão.
O procedimento pode ser assim sumarizado: efetuada a prisão em flagrante e lavrado o respectivo auto pela autoridade policial, deverá o preso ser apresentado ao juiz; o juiz indagará ao preso quanto à sua qualificação e circunstâncias da prisão; o Ministério Público e a defesa poderão formular pedidos e apresentar as respectivas razões; imediatamente o juiz decidirá sobre a legalidade da prisão. Todo esse procedimento, da prisão à decisão do juiz, deverá ser concluído em 24 horas, salvo impedimento devidamente justificado.
As audiências de custódia não são invenção do Conselho Nacional de Justiça; pelo contrário, decorrem da previsão e aplicação direta do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, das Nações Unidas, e da Convenção Americana de Direitos Humanos, tratados internacionais internalizados em nosso ordenamento jurídico já havia 23 anos, quando se iniciou a experiência em nosso País.
Fomentadas a partir de consensos obtidos junto aos respectivos Tribunais de Justiça por todo o País, as audiências de custódia só ganharam caráter obrigatório e vinculante após as decisões proferidas pelo Supremo Tribunal Federal na ADI 5.240 e na ADPF 347. As decisões do Supremo Tribunal Federal — deixe-se bem claro — serviram apenas para reconhecer e declarar a eficácia normativa dos já aludidos tratados internacionais, eis que a obrigatoriedade deles decorria dos Decretos Presidenciais nºs 592 e 678, de 1992, que os promulgou em território nacional.
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Aliás, não se pode esquecer que os respectivos decretos presidenciais foram antecedidos de prévia manifestação deste Parlamento, que não apenas admitiu a absoluta compatibilidade desses tratados com o nosso ordenamento jurídico, como também consignou, sem restrição, pela aplicação deles em todo o território nacional. Tratados e convenções internacionais com conteúdo de direitos humanos, uma vez ratificados e internalizados junto ao nosso ordenamento jurídico, além de criar direitos, operam a supressão de efeitos de outras leis e atos estatais infraconstitucionais que se contraponham à sua efetivação.
Trago aqui as palavras do Ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal, na ADI 5240, para confirmar a autoridade desses diplomas internacionais sobre a legislação infraconstitucional. Diz o Sr. Ministro:
(...) o artigo 7º, item 5, da Convenção Americana de Direitos Humanos, ao dispor que “toda pessoa presa, detida ou retida deve ser conduzida, sem demora, à presença de um juiz”, sustou os efeitos de toda a legislação ordinária conflitante com esse preceito convencional. Isso se deve ao caráter supralegal que os tratados sobre direitos humanos possuem no ordenamento jurídico brasileiro, (...).
Aqui ouso complementar: nos termos do que dispõe o § 3º do art. 5º da nossa Constituição Federal, os dispositivos desses tratados, no que contemplaram as audiências de custódia, estabeleceram direito individual em favor de toda pessoa presa, qual seja, o de ser levada à presença de um juiz, para que sejam avaliadas a legalidade, a conveniência e a necessidade do ato de prisão em seu desfavor.
Não há como deixar de reconhecer que a previsão do Código de Processo Penal, quando da comunicação do flagrante ao juiz, está aquém da atual disposição desses tratados internacionais. É evidente que o novo rito de análise da prisão processual, obrigando a apresentação do cidadão preso à autoridade judiciária, confere um padrão de garantia de direitos diferenciados e sobretudo mais abrangente, em particular o da liberdade individual e da proteção da incolumidade física ou mental, sem prejuízo de outros que decorrem do próprio texto da Constituição Federal. Todos esses direitos são objeto de análise nas audiências de custódia. De modo que nelas o juiz, depois de ouvir o Ministério Público e a defesa, não cria novos direitos, senão aplica a legislação vigente ao caso concreto.
Forçoso reconhecer-se — frise-se — que a garantia da apresentação do preso a um juiz, contemplada nos tratados internacionais já mencionados, também não é uma inovação. A maior parte dos países do nosso entorno latino-americano prevê igual procedimento. Isso para não dizer que essa formalidade de há muito está consolidada na prática judiciária dos ordenamentos jurídicos europeus, cuja matriz conceitual nos serve de inspiração.
Por outro lado, como bem enfatizou o mesmo Ministro Luiz Fux, na ADI 5240, as audiências de custódia compartilham da essência do habeas corpus, cujo pressuposto está no contato direto do juiz com o preso, para que o julgador possa saber do próprio detido a razão pela qual foi preso e em que condições se encontra encarcerado.
Não é por acaso que o Código de Processo Penal brasileiro consagra, no art. 656, idêntica regra, malgrado o pouco uso na prática forense, mas ainda assim fundamental. Verbis:
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Art. 656. Recebida a petição de habeas corpus, o juiz, se julgar necessário, e estiver preso o paciente, mandará que este lhe seja imediatamente apresentado em dia e hora que designar.
É tautológica, por conseguinte, a imbricação da audiência de custódia com o remédio constitucional do habeas corpus, uma vez que ambos são instrumentos voltados para a imediatidade do processo penal, especificamente no seu momento mais crítico, em que a liberdade de uma pessoa é cerceada. Em outras palavras, inexorável a figura de que o direito convencional a uma audiência de custódia deflagra o procedimento legal de habeas corpus perante a autoridade judicial. Não há, portanto, novidade alguma na audiência de custódia, senão o particular da explicitação de que a sua realização passou a ser obrigatória.
Desta feita, não inovou — volto a repetir — o Conselho Nacional de Justiça quando se dispôs a disseminar e incentivar audiências de custódia por todo o País. Naquela altura, início do ano de 2015, as audiências de custódia despontaram com uma pretensão bem definida, qual seja, a de qualificar a porta de entrada do já esgotado e abarrotado sistema prisional brasileiro. A intenção, não escondida, foi a de proporcionar melhor qualidade, assegurando quantidade de informação capaz de tornar tanto a decisão que decreta a preventiva quanto a decisão que libera o agente mais próxima da realidade e do impacto humano proporcionado pelo contato pessoal do conduzido com o juiz.
Aliás, quando as audiências de custódia passaram a ser levadas aos Estados da Federação, nem mesmo surpresa causava a este Parlamento, eis que havia no Senado da República o PLS 554, em trâmite desde o ano de 2011, com o objeto de conferir disciplina a esse procedimento. Foi após o Supremo Tribunal Federal reconhecer, por duas vezes, a obrigatoriedade das audiências de custódia que o Conselho Nacional de Justiça, no final do ano de 2015, trabalhou pela aprovação da Resolução 213, exclusivamente para o fim de dispor, sugestivamente, sobre a forma como a audiência deveria ser realizada.
Já vou me encaminhando para o final da minha exposição.
Para tanto, ofereceram-se protocolos com a indicação de procedimento cabível quando da aplicação e do acompanhamento de medidas cautelares diversas da prisão, como igualmente sobre a forma como deveriam ser conduzidos a oitiva, o registro e o encaminhamento de denúncias de tortura e outros tratamentos cruéis, desumanos e degradantes. Isso para que a atuação judicial, nesses âmbitos, fosse a mais adequada, sem margem para arbitrariedades ou excessos.
E por que assim se procedeu? Quando da edição da Resolução 213 pelo Conselho Nacional de Justiça, o que se tinha — e se convivia — era uma diversidade procedimental, de todo a promover insegurança aos que se entretinham, como também com relação aos que se submetiam à audiência de custódia.
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A proposta de resolução teve a pretensão apenas de ganhar espaço como norma de conduta, servir de roteiro. Não pretendeu, em hipótese alguma, criar regra processual inexistente, senão deduzir de modo sistematizado, a partir de disposições processuais vigentes, um guia de atuação que permitisse balizar a atuação de juízes, promotores e defensores públicos. Daí que a resolução limitou-se a regulamentar previsões legais e convencionais já referidas, sem extrapolar ou contrariar o conteúdo das normas processuais e procedimentais já vigentes em nosso País, representando exclusivamente um exercício lícito de regulamentação do fiel cumprimento da lei.
É importante deixar bastante claro, portanto, que não foi a Resolução 213 que criou a audiência de custódia em nosso País, tampouco criou regra processual não contemplada previamente no nosso ordenamento. O que pretendeu o Conselho Nacional de Justiça simplesmente foi conferir densidade à normativa internacional a ser substituída por lei assim que o Congresso deliberar sobre o tema. Até que isso aconteça, a iniciativa está em plena consonância com as decisões do Supremo Tribunal Federal.
Por outro lado, o conselho, ao dar efetividade à normativa, no fundo buscou promover a transparência e a accountability do Poder Judiciário, em face de qualquer pessoa segregada do seu direito de ir, vir e ficar.
Enfim, com essas considerações é que se traz a esta audiência pública a contribuição do Conselho Nacional de Justiça para o debate.
Obrigado. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Bia Kicis. PSL - DF) - Muito obrigada, Sr. Luís Geraldo, representante do CNJ.
Agora eu passo a palavra ao Deputado Eduardo Bolsonaro, autor do Projeto de Decreto Legislativo nº 317, de 2016, para a sua exposição, pelo prazo de 5 minutos.
O SR. EDUARDO BOLSONARO (PSL - SP) - Sra. Presidente, Deputada Bia Kicis, demais colegas da Mesa, 5 minutos é pouco para falar sobre este tema.
Certamente não é unanimidade. Fico feliz que não tenha sido unanimidade na mesa, mas certamente — eu estava olhando aqui para o lado —, com o quórum que nós temos aqui, se fosse votada agora, a audiência de custódia acabaria no Brasil.
Sra. Presidente, eu não posso admitir que uma recomendação da ONU, com base numa muito precária interpretação do Pacto de San José da Costa Rica... O Procurador Marcelo Monteiro falou muito bem. Na verdade, o Brasil já respeita o Pacto de San José da Costa Rica à medida que uma autoridade policial se encontra com o preso em flagrante. Além disso, o nosso Código de Processo Penal garante ao preso que, em 24 horas, um juiz seja comunicado da sua prisão. Será que todos os juízes até hoje prevaricaram? Eu acredito que não. A ONU, que não tem nenhum membro eleito — ninguém no Brasil votou pela ONU —, acaba, no final das contas, ditando o que nós devemos respeitar aqui no Brasil. A mesma recomendação que é dada para o Brasil é dada para a Noruega. Veja que absurdo, Presidente, uma situação como essa!
Além disso, o CNJ, com todo o respeito, prezado representante Luís Geraldo, atropela o Congresso Nacional. No meu entendimento, isso é matéria de processo penal, tem que passar por esta Casa. Mas, como o Congresso anda desmoralizado, com baixa credibilidade, por vezes, não só o STF, mas também o CNJ, como nesta oportunidade, acabam invadindo a competência legislativa. É por isso que nós estamos vendo algumas reações: um projeto de lei para acabar com o ativismo judicial ou outros que visam reduzir ao tamanho original o CNJ, porque o CNJ não foi criado para ser tão grandioso assim, com tantas atribuições.
Prezado Defensor Pedro Paulo, V.Sa. está certo num ponto: nós temos que olhar pelos mais pobres. Sabe quem mais sofre na comunidade dominada pelo tráfico de drogas, sem a presença da polícia? Exatamente o mais pobre. Temos que lutar aqui para que a polícia garanta tranquilidade a ele para se expressar. Eu tenho certeza: se formos a uma favela dominada pelo tráfico e perguntarmos à população se quer o bandido preso ou solto, ela vai dizer que quer o bandido preso, ou seja, quer o fim da audiência de custódia. Então, nessa medida, V.Sa. acaba confundindo a população humilde com a população criminosa. A audiência de custódia não se presta a defender a população humilde, porque a população humilde é trabalhadora, não vai ser presa em flagrante. A audiência de custódia presta-se a defender o bandido.
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Sra. Presidente, os que mais reclamam da superlotação dos presídios são exatamente aqueles que são contra a construção de mais presídios. Por quê? Porque para eles o argumento da superlotação serve para sua política desencarceradora. Lá na ponta, como pensa esse pessoal? Esse pessoal pensa da seguinte maneira: o sistema capitalista não deu oportunidade ao pobre; logo, o pobre teve que delinquir; e, para colocá-lo no eixo do sistema burguês, vem a polícia. Ou seja, a polícia é o ente que desequilibra a relação, é o ente opressor que garante o sistema, para que continue privilegiando a burguesia. Esse pensamento, que já é antigo e não deu certo em lugar nenhum no mundo, para que as pessoas me entendam, é a mesma coisa que dizer que o bandido é vítima da sociedade. Ninguém concorda com isso.
O bandido tem não só a audiência de custódia, como também tornozeleira eletrônica, advogado de graça, em regra responde em liberdade, transação penal, sursis processual. Se ele for condenado, fica tranquilo, porque tem visita íntima, tem "saidão", tem indulto, tem progressão de regime.
Se nós analisarmos esses fatos, como bem dito no livro Bandidolatria e democídio, dos Promotores Diego Pessi e Leonardo Giardin, veremos que o Brasil sempre dá conta, na sua evolução legislativa, de proteger o bandido. Então, ele fica cada vez mais confortável para delinquir. E nós aqui olhamos, ano após ano, o recorde no número de homicídios. Se vem desarmamento, há recorde no número de homicídios. E o que fazemos? Damos mais garantia ao preso.
Sra. Presidente, isso tem que acabar. Temos que acabar com a audiência de custódia, temos que rever a progressão de regime, o que está no projeto anticrime do Juiz Sergio Moro, temos que "botar quente" nessa galera.
O que mudou de 20 anos para cá? Foi exatamente isto: o bandido está confortável. Ele nos mata rindo e sai pela porta da frente da cadeia.
Aqui do meu lado está o cabo Junio Amaral, Deputado Federal. Eu tenho certeza de que ele vai citar o caso recente em que vagabundos mataram um policial. Isso está filmado. Prenderam os caras, e em 24 horas os caras estão soltos. Como vamos explicar isso para a sociedade, meu Deus do céu?! Será que é essa a Justiça que queremos para o Brasil? É lógico que não.
As garantias constitucionais, prezado Fábio, essas nós vamos garantir, como acesso jurídico, comunicação à família etc. Agora, audiência de custódia, pelo amor de Deus, isso aí é para inglês ver. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Bia Kicis. PSL - DF) - Muito obrigada, Deputado Eduardo.
Passo agora a palavra ao Deputado Gurgel, Relator do projeto.
O SR. GURGEL (PSL - RJ) - Bom dia a todos. Sejam muito bem-vindos à nossa Casa!
O debate é muito saudável. Estamos aqui para servir ao povo. Servindo ao povo, vamos construindo um país com liberdade de verdade, um país com justiça de verdade, e todos convergindo na mesma direção, pelo menos quem tem um coração bom, quem quer o bem da sociedade. Com quem quer o mal não se discute.
Eu sou policial militar há 17 anos e agora estou Deputado. Sou especialista em segurança pública pela UFF — Universidade Federal Fluminense. Entendo que, em segurança pública, temos pelo menos três níveis de discussão.
O nível 1 é o básico, são as estruturas das polícias. Estamos falando de carga horária para a Polícia Militar, estamos falando de uma escala digna de trabalho, estamos falando de equipamentos de trabalho para a Polícia Militar. Por exemplo, estamos falando de uma arma não letal para a Polícia Militar, para que ela não seja acusada de ter matado uma pessoa numa reação em que não deveria ter usado arma de fogo. Se o policial só tem a arma de fogo, vai usar o quê? Vai deixar o bandido tomar a sua arma? Não. Então, ele precisa de mecanismos. O coronel sabe bem do que eu estou falando. O policial precisa de uma arma não letal como opção, para usá-la quando julgar viável. Nós não damos estrutura às polícias, e acontece o que está acontecendo: o caos na segurança pública.
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No nível 2 estão os presídios, de que o nosso Governador falou. Nós precisamos ter condições para acautelar o preso. A grande questão é a seguinte: se há 50 milhões de marginais, tem que haver 50 milhões de vagas para esses marginais. Não podemos deixá-los soltos nas ruas, fazendo de refém o cidadão de bem. Essa política de soltar preso com o argumento da garantia de direitos constitucionais é, na verdade, infringir os direitos constitucionais à vida, à liberdade e à segurança do cidadão de bem, daquele que decidiu cumprir a lei, as normas. O que nós estamos fazendo no Brasil já há algum tempo é tornar reféns as pessoas em seus condomínios com cada vez mais grades, em suas casas com cada vez mais câmeras, em seus carros cada vez mais blindados. Ninguém suporta mais a violência. Seja lá o que estivermos fazendo — desarmamento, audiência de custódia —, não está funcionando. Essa é a grande questão. Precisamos solucionar isso.
O terceiro nível, como eu chamo, envolve economia, emprego, educação, que daqui a 10 anos ou 20 anos vai surtir o efeito necessário, e cultura. Quem nunca ouviu falarem: "essa lei não pegou"? Onde já se viu isso num Estado Democrático de Direito? Dizer que a lei não pegou? Quer dizer, o cidadão tem o poder de descumprir a lei? A lei não pegou? É simples assim? Não há punição? A lei não pegou, e acabou? "Essa lei nada vale, porque ninguém quer cumprir". O que é isso? Anarquia? No nosso País, há uma cultura de não se cumprir lei. E tudo isso gera o caos que nós estamos vivendo.
Especificamente sobre a audiência de custódia, eu vou limitar minha fala porque o meu relatório já vai trazer bastantes dados, com certeza enriquecidos pelo que os senhores trouxeram hoje. Nós vamos mexer mais nele. Hoje foram apresentados dados excelentes, que vamos buscar colocar no relatório.
O nosso querido amigo Desembargador Edison Brandão, de São Paulo, mandou-me dados que eu vou ler, em consideração a ele, que estaria aqui presente se não estivesse fora do País — por isso não pôde comparecer. Nos Estados Unidos, o número de presos por 100 mil habitantes é de 665; no Brasil é de 335. Então, o Brasil prende o equivalente à metade das pessoas presas nos Estados Unidos. Se analisarmos esse dado junto com os índices de homicídio — e estamos utilizando relatório enviado pelo Desembargador Edison Brandão, nosso amigo, a quem dou os créditos —, veremos que, de 1980 a 1990, os Estados Unidos começaram a prender mais. Quando aumentou a sua população carcerária, diminuiu o número de homicídios. Essa inversão proporcional vem se construindo, até chegarmos ao ano de 2020.
O desembargador me mandou também dados de São Paulo, que parece estar seguindo a mesma lógica. Em 2002, começou a aumentar a população carcerária no Estado, momento em que também começou a diminuir o número de homicídios. Em 2018, é inversamente proporcional o número de presos ao número de homicídios.
Em nosso País, a maioria dos problemas são resolvidos com a morte. O bandido não quer só tomar o seu bem, ele quer matá-lo, ele vem preparado para matá-lo. A lógica dele é a de tirar a sua vida, porque ele se sente injustiçado. Ele acha que a sociedade é injusta com ele. Não. Ele pode ser um produto da má gestão pública, mas nunca vítima da sociedade. Eu não faço ninguém de vítima. Eu decidi trabalhar, decidi entrar na polícia, decidi cumprir a lei, e não é justo que eu venha a perder a minha vida na mão de um vagabundo que escolheu o crime. O Estado tem que ter condições logísticas para dar ao marginal o tratamento que ele buscar. Se ele quiser a ressocialização, temos que ter um presídio que o ressocialize. Se ele quiser reiterar no crime, o Estado tem que ter condições de mantê-lo encarcerado, que seja para a vida inteira. Se ele não quer cumprir a lei, se ele não quer cumprir as normas, se ele não quer respeitar o direito dos cidadãos, cadeia nele, que ele seja retirado do seio social. Se ele agredir ou atacar um policial, que seja neutralizado da forma como for possível. Não podemos continuar perdendo pessoas inocentes, trabalhadores, pessoas de bem.
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Muito obrigado.
Um grande abraço a todos. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Bia Kicis. PSL - DF) - Muito obrigada, Deputado.
Concedo agora a palavra ao Deputado Léo Moraes, o autor do requerimento, para a sua exposição, pelo prazo de 5 minutos. (Pausa.)
Não estando presente, passarei a palavra aos Líderes.
Concedo a palavra ao Deputado Kim Kataguiri, pelo prazo de 5 minutos.
Em seguida, terão a palavra o Deputado Paulo Teixeira, pela Oposição, pelo prazo de 7 minutos, e o Deputado Capitão Wagner, pelo PROS, pelo prazo de 4 minutos.
O SR. KIM KATAGUIRI (DEM - SP) - Obrigado, Sra. Presidente.
Cumprimento a mesa.
Mais do que o debate sobre o conteúdo da audiência de custódia, interessa-me o debate em relação à forma. Junto com o Deputado Pedro Lupion e o Deputado Eduardo Bolsonaro, sou um dos autores da proposta que visa — pelo menos na parte da justificativa do PDC que eu redigi —, como preocupação principal, resguardar a competência legislativa do Congresso Nacional.
Com todo o respeito ao representante do CNJ, que afirmou, em justificativa, que o conselho não extrapolou a sua competência porque buscou meramente dar densidade normativa a tratado internacional, quero dizer que é papel do Congresso Nacional dar densidade legislativa, normativa a tratado internacional.
O Congresso, como foi muito bem relatado pelo Deputado Eduardo Bolsonaro, vive um momento de grande desprestígio, vive um momento em que tem a sua competência usurpada. Recentemente, o Supremo Tribunal Federal criou um tipo penal por analogia, no caso da homofobia. Agora, uma norma que deveria ser discutida no âmbito do Código de Processo Penal está sendo editada via resolução do CNJ. É, a meu ver, uma humilhação muito grande para o Congresso Nacional que, justamente sobre uma norma que envolve o processo penal, que é o processo mais grave de todos, em que o Estado dá a sua última demonstração de poder, que é a de tirar a liberdade de um indivíduo, haja usurpação de competência por parte do CNJ. É como se o síndico do meu prédio fizesse uma normativa e revogasse uma lei federal. Isso não é adequado para uma república, isso não é saudável para uma república.
Concordo com o Dr. Fábio no sentido de que caminhamos hoje mais para um sistema acusatório. De fato, hoje no Brasil o juiz é praticamente um Hércules. O juiz pode mandar fazer prova de ofício. Se eu entro com uma ação contra o Dr. Fábio... Não, não vou caracterizar ele, porque vai parecer pessoal. (Risos.)
Se eu entro com uma ação contra... Posso entrar contra V.Exa., Deputado Tadeu? (Pausa.)
Então, se entro com uma ação contra o Deputado Tadeu, eu falo: "Quero produzir a prova 'x'". O Deputado Tadeu, em sua defesa, diz que quer produzir a prova "y", e nós nos damos por satisfeitos com essas provas. Aí o juiz fala: "Não, não, não! Eu não estou satisfeito. Eu quero produzir prova pericial em cima da prova apresentada pelo Deputado Kim". "Espere aí! Eu que estou entrando com a ação não quero mais produzir prova. Por que você juiz fala que eu quero produzir mais prova para fazer o meu argumento contra o Deputado Tadeu?" Nesse ponto, concordo 100% com o que foi dito: há um desequilíbrio, sim.
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Um projeto do Deputado Fábio Trad, aprovado nesta Comissão, prevê mudança na posição, na questão topográfica do julgamento, em que o Ministério Público, o nosso mestre Marcelo Monteiro, fica ao lado do juiz, acima, e a defesa fica abaixo. Isso pode parecer uma trivialidade, um negócio corriqueiro, banal, mas é simbólico do ponto de vista da defesa.
Como foi colocado pelo Governador, que bem citou o doutrinador Cesare Beccaria, o que realmente vai inibir o crime é a certeza da punição.
Em relação ao mérito, ao que se faz dentro da audiência de custódia, acho que o principal problema é a estruturação. Como foi muito bem dito pelo Dr. Jayme, que representa a AMB, por ter sido feita via resolução do CNJ, não foi debatida levando-se em consideração a realidade de todos os Estados do nosso País. E a maior parte dos Estados do nosso País simplesmente não tem estrutura para realizar a audiência nos moldes em que ela existe hoje.
Justamente em razão disso, é o Parlamento o local para debate desse tipo de coisa. Se nós não formos firmes nas nossas posições aqui, colegas, enquanto Parlamento, a favor ou contra a audiência de custódia, a favor do modelo A ou do modelo B — e isso não interessa, é um debate que fazemos aqui dentro —, se não tivermos firmeza na defesa da nossa competência legislativa, não servimos para nada. Então que fechem o Congresso Nacional e deem a chave para o Ministério Público, para o STF, para o CNJ! Votaram em nós só para ficarmos aqui fazendo show? "Eh! Eu apareço! Sou Deputado! Eu discurso! Apresentei um projeto, mas o projeto não vale nada, porque o Supremo derrubou, porque existe uma resolução do CNJ". Nós ficamos que nem um bando de palhaços aqui. O Supremo, por diversas vezes, o Executivo também, desde os anos 90 até hoje, com medidas provisórias, com decretos, usurpam a competência legislativa. Todos os Poderes fazem isso. Virou palhaçada, virou festa. Todo mundo — o Ministério Público, o Judiciário, o CNJ agora, o Executivo — tratora o Congresso Nacional. Se não defendemos a competência que nos é garantida pela Constituição de 1988, simplesmente não temos função, estamos aqui fazendo e debatendo absolutamente nada.
Temos voto, temos representação para debater, levando em consideração as realidades do Brasil inteiro. É com esse molde que eu acredito que devemos, sim, fazer um debate aqui sobre a audiência de custódia, sobre o mérito da matéria, sobre como ela deve ser feita.
Acho excelente a sugestão do Procurador Marcelo e do Governador Wilson Witzel, de transformar a audiência de custódia numa audiência preliminar, já com oferecimento de denúncia, para acelerar o processo. Como foi dito, interessa a todo mundo que o processo seja rápido, principalmente, como foi relatado pelo Dr. Pedro Paulo, àquele que é acusado injustamente, que não cometeu o crime e quer logo se ver inocentado, quer se ver livre da carga de um processo penal, que é pesado, que é desgastante.
Obrigado, Sra. Presidente. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Bia Kicis. PSL - DF) - Obrigada, Deputado.
Passo a palavra agora ao Deputado Paulo Teixeira, Líder da Oposição, pelo prazo de 7 minutos.
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O SR. PAULO TEIXEIRA (PT - SP) - Sra. Presidente, Deputada Bia Kicis, senhores convidados Pedro Paulo Coelho, Marcelo Rocha Monteiro, Jayme de Oliveira, Wilson Witzel, com quem eu gostaria de dialogar e cuja ausência lamento, Fábio Tofic Simantob, Luís Geraldo Sant'Ana Lanfredi e Leonardo Siqueira dos Santos...
Ele está chegando?
A SRA. PRESIDENTE (Bia Kicis. PSL - DF) - Deputado, fui informada de que o Governador está a caminho. Se V.Exa. preferir passar sua vez...
O SR. PAULO TEIXEIRA (PT - SP) - Eu prefiro.
A SRA. PRESIDENTE (Bia Kicis. PSL - DF) - Obrigada.
Passo a palavra ao Deputado Capitão Wagner, que falará pela Liderança do PROS, pelo tempo de 4 minutos.
O SR. CAPITÃO WAGNER (PROS - CE) - Muito obrigado, Sra. Presidente.
Meu cordial bom-dia a todos os presentes. Eu queria saudá-los e agradecer-lhes a presença.
Vou tentar ser bem objetivo, pois disponho só de 4 minutos.
Quero registrar que nós estamos em um país — e aqui eu concordo com o Deputado Kim — para o qual queremos uma legislação semelhante à da Noruega, quando vivemos números piores que os da guerra da Síria. O grande problema é esse.
Deputada Bia, eu não vou entrar no casuísmo e aqui citar exemplos do Ceará, mas vou contar um fato. No Ceará, um casal foi preso com 2 quilos de cocaína e, 24 horas depois, foi liberado, a meu ver, por conta de uma decisão equivocada do Ministério Público, que deu parecer favorável à liberação. Alguém entrou com recurso, depois da repercussão que houve na imprensa, e o casal foi preso novamente.
No ano em que foi implementada a audiência de custódia no Ceará, ocorreram 5 mil homicídios. No Ceará, que tem uma população de 8 milhões de habitantes, ocorreram 5 mil homicídios. O Deputado Vitor Valim, que aqui está, era Deputado Federal à época e bateu muito nessa questão, o que deixo aqui registrado. Mas é importante frisar o que aconteceu no momento em que o Estado do Ceará simplesmente resolveu aplicar o que está previsto no Código de Processo Penal, a partir de janeiro deste ano. Vivenciávamos no Estado um grande conflito, pois as facções dominavam não só os presídios, mas as ruas, os bairros, as comunidades. E essa atitude firme foi sugerida por mim, quando era Deputado Estadual e também pelo Deputado Vitor Valim. Durante os 4 anos em que fui Deputado Estadual, o Governador não se convenceu dessa necessidade, mas, depois que saí da Assembleia, ele resolveu convidar para Secretário da Administração Penitenciária, graças a Deus, alguém que tinha como primazia aplicar o que está previsto na lei, e nós comemoramos hoje no Estado 53% a menos de homicídios em relação ao ano passado. Vou repetir: no ano em que foi regulamentada, no Ceará, a audiência de custódia, ocorreram 5 mil homicídios. Neste ano, em 6 meses, ocorreram cerca de mil homicídios. A tendência é de que, até o final do ano, aconteçam pouco mais de 2 mil homicídios. Houve uma redução gigantesca. Por quê? Simplesmente porque resolvemos tirar das mãos das facções o domínio e a administração dos presídios.
Deputado Junio Amaral, nós tivemos no Estado do Ceará um momento em que o Governo comprou tinta para dar aos presos para que eles pichassem os muros do presídio com o nome da facção à qual determinada unidade pertencia: "Essa unidade aqui é do Comando Vermelho; essa aqui é do PCC; essa, do GDE". Cada presídio tinha, pichado em seus muros, com tinta comprada pelo Estado, o nome da facção que o dominava. Nós denunciávamos, e o Governo fazia ouvidos de mercador: "É a política dos direitos humanos".
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Eu não sou contra a tratar com dignidade o preso. Pelo contrário, sou a favor da ressocialização, de o preso se profissionalizar e trabalhar para, quando sair da unidade prisional, estar melhor do que estava quando entrou.
Mas fazer o que se fez durante muito tempo nos presídios brasileiros e dizer que aquele é o caminho para pacificar a população não é. O caminho é o que está sendo feito hoje no Estado do Ceará. Mesmo sendo oposição ao Governador, no dia em que ele anunciou a nomeação do Secretário Luís Mauro Albuquerque, eu fiz questão de ligar para o Governador e de dizer publicamente à imprensa que o Governador estava acertando. E até hoje apoiamos a atitude do Secretário da Administração Penitenciária, que simplesmente cumpre o que está previsto no Código de Processo Penal.
Então, eu queria deixar registrado que não adianta trazermos soluções europeias, Governador Wilson Witzel — e eu o saúdo neste momento —, se vivemos uma calamidade na segurança pública do País. Para situações de urgência, para situações de crise, nós temos que ter soluções enérgicas. Não dá para buscarmos uma solução compatível com a situação da Noruega, que vive numa situação de calmaria e pacificidade que não existe aqui no Brasil. Para a situação que vivemos hoje, precisamos de uma solução enérgica. E a energia que for implementada em qualquer questão vai ter o nosso apoio.
Espero que façamos este debate nesse sentido.
Muito obrigado. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Bia Kicis. PSL - DF) - Muito obrigada, Deputado.
O Deputado Paulo Teixeira não se encontra no momento.
Passo a palavra ao Deputado Coronel Tadeu, pelo prazo de 3 minutos.
Em seguida, falará o Deputado Sargento Fahur, também pelo prazo de 3 minutos.
O SR. CORONEL TADEU (PSL - SP) - Sra. Presidente, quero cumprimentá-la pela condução dos trabalhos.
Quero cumprimentar, na pessoa do Governador Wilson Witzel, os demais convidados para debater o tema da audiência de custódia.
Fazendo uso do meu tempo, eu já queria dizer que, até então, havia uma unanimidade favorável à audiência de custódia, e um dos membros da mesa a quebrou. O Deputado Eduardo Bolsonaro, na sequência, também quebrou essa unanimidade. Eu vou fazer, obviamente, coro com eles no sentido de que não há unanimidade nisso.
Esse é um tema muito complexo, mas, de antemão, digo que eu sou cem por cento contra o que se faz nessas audiências de custódia. Em primeiro lugar, porque elas não atendem ao Pacto, e o Deputado Eduardo Bolsonaro já frisou isso muito bem. Em segundo lugar, elas promovem descaradamente uma política de desencarceramento. Eu, que trabalhei na Polícia Militar durante 30 anos, ainda acho que, neste País, as polícias enxugam o chão com a torneira aberta. Nós prendemos, e a turma-do-solta-o-preso vem, com suas artimanhas, recorrendo ao Pacto de São José, e dá um jeito de soltar o preso de qualquer maneira e colocá-lo na rua.
Preso não precisa ficar preso, ele precisa ser tratado. Ele cometeu um crime. Nós precisamos buscar a solução para essa situação. O Governador Witzel disse muito bem que nós temos problemas no sistema prisional. Então, não se trata de soltar o preso, mas sim de consertar o sistema prisional. Estamos invertendo a ordem das coisas.
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Eu não tenho dúvida nenhuma de que nós vamos derrubar essa audiência de custódia, e vai ser no voto, e vai ser apertado. Provavelmente, os debates ainda vão ser acirrados em outras audiências, mas, mais cedo ou mais tarde, nós vamos derrubá-la.
Eu queria fazer aqui uma consideração no sentido de que há uma política de desestímulo às corporações.
Só faltam 30 segundos, e eu pretendo respeitar o tempo, Sra. Presidente.
Os números que eu achei são completamente contrários aos que alguns dos senhores disseram: das 229.634 audiências realizadas, 103.669 presos foram colocados em liberdade, quase a metade. E vêm me falar que não é uma política de desencarceramento? Só com esses números — não tenho mais tempo, mas peço mais 15 ou 20 segundos e já agradeço — já está demonstrada a mentira que todos os senhores estão tentando sustentar, mas que é algo que não se sustenta.
Se formos tomar por base o dado citado pelo Coronel da PM do Distrito Federal de que 82% dos inquéritos instaurados são arquivados, isso derruba de vez qualquer argumento com que se tente defender a audiência de custódia. O Conselho Nacional de Justiça extrapolou verdadeiramente as suas funções, e o Parlamento vai corrigir isso. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Bia Kicis. PSL - DF) - Muito obrigada.
Antes de devolver a palavra aos Parlamentares, o Coronel Siqueira, da Corregedoria-Geral da Polícia Militar, gostaria de fazer um breve esclarecimento.
O SR. LEONARDO SIQUEIRA DOS SANTOS - Sra. Presidente, muito agradecido pelo aparte.
Eu gostaria de comentar a fala do Dr. Fábio de que há unanimidade na mesa acerca da manutenção da audiência de custódia. Eu gostaria de esclarecer de maneira bem clara e leal. Eu sou professor titular da cadeira de Valores e Ética Profissional, na Academia de Polícia Militar, já formei mais de 3 mil alunos. É vedado, eu não posso fazer manifestação de conteúdo que possa influenciá-los a uma decisão política, a não ser que ela seja de natureza técnica. A manifestação sobre a conveniência ou não da manutenção da audiência de custódia é pertinente a este Parlamento, por meio desta honrosa Comissão de Constituição e Justiça, e eu não entraria nesse mérito. Mas eu firmo a minha convicção no seguinte sentido, porque são os dados que temos: a audiência de custódia, na forma em que se mantém, aumentou em 240% o número de processamento de crimes militares, o que tornou menos eficiente a Justiça Militar no DF e resultou imediatamente — vejam os senhores, eu apresentei dados aqui — em que de 713 procedimentos 21,76% tenham sido arquivados, sem qualquer indicação plausível, sequer para instauração de inquérito. Dos que foram apresentados à Justiça, só 17,66% foram realmente convertidos e 82,33% foram arquivados de plano, por não haver relevância técnica jurídica para oferecimento de denúncia.
12:17
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Essa é a prova cabal de que não é necessariamente o preso, que já tinha na jurisdição a análise da liberdade provisória pelo juízo a seu tempo, antes mesmo da audiência de custódia, mas sim o policial militar, primeiramente, que está sendo penalizado, desestimulado nas suas atribuições, porque é sujeito de quase 700, vamos dizer que sejam 82%, a no mínimo 550 inquéritos policiais militares arquivados em diversas guarnições da Polícia Militar, simplesmente porque a pessoa alegou que foi agredida.
É sobre esse ponto que eu gostaria de fazer esse esclarecimento, sem me manifestar, pois, mais uma vez, afirmo que é pertinente a este Parlamento a manifestação quanto à conveniência ou não da audiência de custódia.
Muito obrigado.
A SRA. PRESIDENTE (Bia Kicis. PSL - DF) - Muito obrigada pelos esclarecimentos.
Eu quero só informar que, após a fala dos Parlamentares, os integrantes da mesa também terão a oportunidade de participar do debate. Foi apenas um rápido esclarecimento, porque havia uma informação que não era verídica, e o Coronel estava desconfortável com a informação de que havia unanimidade, fora a do nosso palestrante Dr. Marcelo.
Deputado Paulo Teixeira, indago a V.Exa. se posso passar a palavra ao Deputado Sargento Fahur, por 3 minutos, pois eu já o havia chamado e, em seguida, eu passo a palavra a V.Exa. Se não concordar, eu passo a palavra imediatamente a V.Exa. (Pausa.)
O SR. PAULO TEIXEIRA (PT - SP) - Quero cumprimentar todos os integrantes da mesa, agora especialmente o Governador Wilson Witzel, que eu não cumprimentei na primeira rodada.
Em primeiro lugar, quero dizer que a audiência de custódia é uma medida civilizatória num país onde a barbárie está estabelecida.
Em segundo lugar, quero tratar do STF. O STF não é o porteiro do prédio, como foi dito aqui, que vai editar normas. É um dos Poderes da República e o faz com base jurídica.
Eu quero aqui trazer o inciso LXXVIII do art. 5º da Constituição, que dispõe o seguinte:
Art. 5º ....................................................................................................................................................................
..............................................................................................................................................................................
LXXVIII ..................................................................................................................................................................
..............................................................................................................................................................................
§ 2º Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.
Portanto, tem base jurídica o Supremo Tribunal Federal para editar o decreto que criou a audiência de custódia.
Em terceiro lugar, quero dizer que este não é o foro adequado. Falou bem o Juiz Jayme de Oliveira, porque nós estamos debatendo o Código de Processo Penal, e esse tema está tramitando na Comissão Especial que discute o Código de Processo Penal. Não é o foro adequado a Comissão de Constituição e Justiça, embora a juridicidade desse decreto esteja bem comprovada.
Em quarto lugar, quero falar da audiência de custódia. No Brasil hoje, prende-se muito e prende-se mal, porque se sucateou a investigação. Quem prende é a polícia repressiva, e muitas das prisões são erradas. O que faz a audiência de custódia? Primeiramente, peneira as prisões, para fazer uma distinção de uma prisão bem feita de uma prisão mal feita.
Portanto, a audiência de custódia é para evitar que pessoas que não têm nenhum envolvimento com o crime sejam presas injusta e ilegalmente. A audiência de custódia tem essa função. E é por isso que parte das prisões que foram feitas ilegalmente são revogadas na audiência de custódia, que é sim para evitar tortura. Se há um grande número de policiais que acabam respondendo a inquéritos policiais, é porque agiram mal.
12:21
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E, portanto, eu achei estranha a fala do Governador Wilson Witzel, quando ele disse o seguinte: "Nós esclarecemos só 5% dos homicídios no Brasil, me deem 1 bilhão para eu construir prisões". Eu achei que ele quisesse 1 bilhão de reais para investigar, para qualificar as investigações, para desarticular o crime, antes que ele ocorra.
Nós estamos, Governador, lutando contra a barbárie, nós queremos a civilização. Estranha-me que, com V.Exa. a bordo, um helicóptero metralhe comunidades, como aconteceu com uma tenda de evangélicos no Rio de Janeiro. (Palmas.)
Estranha-me, porque essa não é uma postura civilizatória. O uso da força tem que estar sob o manto do direito, tem que estar sob o controle do direito, e não o abuso. V.Exa. pode cometer um grande crime e por ele perder o seu cargo.
Nesse sentido, a audiência de custódia é uma postura civilizatória. Nós temos que melhorar a atividade policial, fazer aquilo que foi dito aqui: conceder ao policial a possibilidade de ter armas não letais; melhorar a qualidade da investigação; dar condições para que o policial possa desarticular o crime, antes que ele aconteça; dar condições para que o policial possa desarticular o crime nas comunidades, desarmar os criminosos, interferir no tráfico de armas pesadas. Desculpe-me, Governador Wilson, mas neste mês o jornal O Globo, insuspeito, noticiou que a cada três homicídios no Rio de Janeiro dois foram cometidos pela Polícia Militar do Rio de Janeiro. É uma ordem para matar.
Nós queremos uma polícia que desarticule o crime, que prenda o criminoso, que o leve para os tribunais e que nos tribunais ele seja julgado, seja preso e cumpra a sua pena, mas não essa barbárie. Por isso eu fiz questão de falar na sua presença. Até apresentei requerimento de convocação de V.Exa. em outra Comissão, mas não aconteceu. Então, nesta oportunidade, eu quero aproveitar para dizer a V.Exa., Governador do Rio de Janeiro, que esse tipo de abordagem policial é uma abordagem ilegal, é uma abordagem inconstitucional, é o estabelecimento da barbárie em nosso País, é a ordem para matar.
E sabem quem é morto? Pessoas que não responderam sequer a processos judiciais. E, se tiverem de responder a processos judiciais, que os respondam, sejam julgadas, sejam presas e cumpram a sua pena. É isso que está na Constituição, não existe pena de morte em nosso País.
Por isso eu venho a esta audiência me manifestar em defesa da audiência de custódia, em defesa de que o foro próprio para o seu debate é a Comissão Especial de Processo Penal, em defesa do aperfeiçoamento da audiência de custódia e em defesa dos bons resultados. Reitero, inclusive, que metade dos juízes de base são favoráveis a ela e, nos tribunais, 80% são favoráveis. Acho que nós não podemos regredir.
Sobre o Supremo Tribunal Federal, um dos autores do projeto disse que bastam um soldado e um jipe para fechar o Supremo Tribunal Federal, o que mostra o desapreço que ele tem pelo STF. Ele disse que, se fosse votada agora, cairia a audiência de custódia; e eu disse que pediria a verificação de votação para todos os membros virem e assim nós apurarmos que esse tema não será derrubado por esta Casa, mas sim será aperfeiçoado e nós prosseguiremos com as audiências de custódia.
12:25
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Obrigado. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Bia Kicis. PSL - DF) - Nós vamos passar, daqui a pouquinho, a palavra para os expositores.
No momento, eu vou passar a palavra ao Deputado Sargento Fahur, pelo tempo de 3 minutos.
O SR. LUIZ FLÁVIO GOMES (PSB - SP) - Sra. Presidente, está aí também um pedido nosso para falar em nome da Liderança.
A SRA. PRESIDENTE (Bia Kicis. PSL - DF) - Pois não, Deputado. É que eu abri a palavra primeiro para as Lideranças, depois a abri para alguns Parlamentares inscritos e, em seguida, concederei a palavra a mais dois Líderes inscritos, e V.Exa. será um deles.
O SR. LUIZ FLÁVIO GOMES (PSB - SP) - Muito bem, muito obrigado.
O SR. SARGENTO FAHUR (PSD - PR) - Boa tarde, Sra. Presidente. Boa tarde a todos.
Primeiramente, eu gostaria de parabenizá-lo, Governador Wilson Witzel, pela sua postura firme contra a bandidagem. Em um pronunciamento que fiz na tribuna da Câmara, eu lhe prometi uma grade de cerveja por ocasião daquela denúncia na ONU contra V.Exa., por mandar matar bandido. Então, eu estou lhe devendo uma grade de cerveja e faço questão de pagar. Parabéns a V.Exa.! Se foi denunciado na ONU — e aquilo é uma porcaria também, só defende vagabundo —, então V.Exa. merece uma grade de cerveja paga pelo Sargento Fahur.
Quanto à audiência de custódia, eu digo que há outros meios. Na hora do flagrante, o preso tem o direito de se manifestar, e a cópia do flagrante é mandada para o juiz. Não tem nada que levar preso para o juiz perguntar para ele sobre o crime que cometeu. A maioria dos presos é de mentirosos, vagabundos, falsos, que vão lá para falar mal de policiais. É claro, se o cara prendeu ele, acabou com o lucro criminoso dele, acabou com a liberdade dele, ele vai falar mal mesmo. Eu cansei de prender vagabundo, e o vagabundo me destroçar perante juiz e promotor. Ainda bem que peguei juízes e promotores conscientes da sua função e da função policial militar. Apenas um lá que quis me enrabar e conseguiu, porque me tirou 1.200 reais e ainda me faz assinar durante 24 meses. Mas eu não ligo, não. Para mim, isso aí é mérito.
Então é um monte de gente defendendo vagabundo. O representante do CNJ falou em tratado com os Estados Unidos, em tratado com não sei quem. Para defender vagabundo, faz-se tratado só com esses países. Por que que não se faz tratado com o Irã e com a Indonésia para meter esses vagabundos no paredão?
Quer dizer, só defendem vagabundos. Nós temos que criar, junto com a audiência de custódia, a audiência "enrabatória" para pegar e levar o policial e a vítima na presença do juiz em 24 horas. O policial, para falar o que ele passou para prender esse vagabundo; e a vítima, para falar o que ela passou na mão desse vagabundo. Mas o preso, a dondoca, tem que levar para lá.
Outra coisa, a Justiça é morosa no Brasil por falta de estrutura, falta de efetivo. Mesmo sabendo disso, o CNJ empurra um pepino para as Polícias Militares e para a Polícia Civil para levar preso à presença de juiz. Por que o juiz não tira a bunda da cadeira e vai lá ao presídio ouvir a merda do preso? Por que a polícia que tem que levar essa porcaria para lá?
Então é uma aberração essa audiência de custódia que só defende vagabundos, em detrimento de pessoas de bem. Eu sou totalmente contra e vou trabalhar a minha vida inteira aqui no Congresso Nacional, na Câmara dos Deputados, para mudar essa aberração.
Muito obrigado. (Palmas.)
12:29
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A SRA. PRESIDENTE (Bia Kicis. PSL - DF) - Obrigada, Deputado.
Eu queria lembrar que, durante a fala do Deputado Paulo Teixeira, a assessoria se manifestou quando foi feita uma crítica ao Governador. Eu queria dizer que é antirregimental a manifestação de pessoas que não sejam Parlamentares durante a audiência. Agradeço a compreensão.
Passo a palavra ao Deputado Junio Amaral, por 3 minutos.
O SR. JUNIO AMARAL (PSL - MG) - Boa tarde a todos os presentes. Boa tarde a todos integrantes da mesa.
Ao cumprimentá-lo, Governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel, eu quero dizer que nessas ações que V.Exa. tem promovido no Estado do Rio de Janeiro, apesar de não estarmos tão por dentro do assunto como o nosso Deputado Daniel Silveira, à distância ficamos muito satisfeitos de ver esse seu posicionamento. Se eu pudesse, estaria com V.Exa. naquele helicóptero lá com o maior prazer. E vou dobrar a caixa de cerveja do Deputado Sargento Fahur.
O nosso povo padece por falta de conhecimento. Eu tenho certeza de que a maioria da população não faz ideia do que acontece numa audiência de custódia — não faz! Se nós representamos o povo, nós temos duas missões. E uma delas é sim a de exercer a vontade do povo aqui na Casa, mas nós temos de informá-lo sobre o que está acontecendo.
O Deputado Eduardo Bolsonaro disse que eu citaria o caso do Sargento Luís, lá da PM do Amazonas, e sim vou citar, porque é o caso mais recente e o mais emblemático para mim.
Para aqueles que não acompanharam e para aqueles que não sabem o que é uma audiência de custódia, eu digo que aconteceu o seguinte: quatro bandidos assassinaram um trabalhador, um policial militar, levaram sua arma — parece até que o objetivo era esse. Foi um latrocínio. Depois disso, os bandidos presos, e já é muito difícil prendê-los, foram à presença do juiz em menos de 24 horas.
Brasil, sabe o que eles fazem? Sabem o que o juiz faz nesse momento? Senta as crianças ali e pergunta: "O que aconteceu no momento da prisão? Como foi o tratamento que os senhores receberam? A polícia ou alguém os machucou ou gritou com vocês?"
Estamos falando de um modo bem simples para as pessoas entenderem. O juiz nessa audiência de custódia não pergunta: "Por que você matou? O que você estava fazendo naquela hora ali? Quais são seus antecedentes criminais?" Não! A audiência de custódia serve para condenar policiais e promover a impunidade.
E aí trazemos os números, como o doutor falou há pouco: 44% das audiências de custódia correspondem na sequência à liberdade dos marginais.
E o representante da PM do DF, o Comandante Leonardo, disse que 82,3% dos casos nem correspondem à denúncia posteriormente, ou seja, se for levar isso a termos de Brasil, o cálculo que eu fiz é que aproximadamente 90 mil presos voltaram para as ruas com mentira. Disseram para o juiz: "Sim, o policial apertou meu braço, puxou minha orelha e gritou comigo". E aí voltaram para a rua.
O povo clama pelo fim da impunidade. Nós representamos o povo aqui. É esta Casa que legisla. Então, nós vamos desfazer a lambança que pessoas como os senhores fizeram neste País nos últimos anos. A paz dos defensores de bandidos acabou, porque não vai mais prosperar. Nós vamos, enfim, colocar o Brasil acima de tudo. E o povo clama para que nós coloquemos os bandidos no lugar deles, ou seja, abaixo de todos nós, e não com tantos privilégios, como tem acontecido.
12:33
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Muito obrigado. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Bia Kicis. PSL - DF) - Obrigada, Deputado Junio.
Agora, eu vou passar a palavra ao Deputado Luiz Flávio Gomes, que somará ao seu tempo de 3 minutos o tempo de 5 minutos da Liderança, totalizando 8 minutos. Depois, eu vou passar a palavra, pela Liderança, para o Deputado Marcel Van Hattem, do NOVO, e, em seguida, vou passar a palavra para os integrantes da Mesa e para os Deputados inscritos.
Tem a palavra o Deputado Luiz Flávio Gomes.
O SR. LUIZ FLÁVIO GOMES (PSB - SP) - Sra. Presidente, senhores componentes da Mesa, obrigado pela presença de todos, obrigado pelos esclarecimentos que todos formularam. É nestes debates que nós vamos ter que construir nesta Casa a ideia do que fazer com a audiência de custódia.
Precisamos fazer da audiência de custódia algo melhor, e não eliminá-la. É impossível eliminá-la. Não se elimina aquilo que está inscrito numa convenção americana e que foi ratificado pelo Supremo na ADPF nº 347. É impossível eliminá-la. Mas podemos melhorá-la. A audiência de custódia serve, sim. E digo isso na linha do primeiro que eu ouvi falar sobre isso, o nosso Governador. Vamos fazer dela uma audiência de instrução, trabalhar com provas no processo. Por quê? Porque isso dá a certeza do castigo.
É uma pena que o meu companheiro, o meu amigo Deputado Kim Kataguiri não esteja aqui. Eu gostaria de explicar uma coisa ao Deputado Kim. Ele está dizendo: "Temos que eliminar essa audiência porque foi feita pelo CNJ e acabou impedindo a atividade parlamentar". Não, não é isso. O direito não é assim.
Quando se aprova um tratado internacional ou uma convenção internacional, somos nós que aprovamos e colocamos a convenção em vigor no Brasil, por um decreto nosso. E, quando o legislador brasileiro aprova um tratado, é a palavra dele, é a manifestação de vontade dele que coloca em vigência a medida no País. Depois, vem um decreto do Presidente para completar o processo. Portanto, fomos nós legislamos que a aprovamos. Não é verdade que nós não legislamos sobre a audiência de custódia. Juridicamente, nós legislamos, porque aprovamos um tratado internacional. E isso foi ratificado pelo Supremo, na ADPF nº 347. Portanto, formalmente, a instituição da audiência de custódia está correta.
Melhor teria sido se nós legisladores tivéssemos legislado desde o início? Sim, teria sido melhor. Mas não foi errado o processo de aprovação do que está vigente. O que está vigente não está errado.
De outro lado, por que dar à audiência de custódia mais valia e fazer dela uma fonte de provas e já de instrução? Porque nós precisamos é da certeza do castigo, e da certeza do castigo contra todos. É preciso que a Justiça brasileira atue contra todos.
12:37
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A palavra que nós mais ouvimos aqui hoje foi "vagabundo". Nessa linha, eu gostaria de dizer o seguinte: sim, todos os que violam a lei têm que sentir o império da lei, sejam vagabundos de rua, sejam vagabundos de Ministérios, sejam vagabundos que se aliam a milícias, sejam vagabundos empreiteiros, sejam vagabundos, eventualmente, políticos financiados por empreiteiros. O império da lei deve agir contra todos. Não podemos distinguir pessoas para que a lei seja aplicada. Compete a cada um decidir na vida o que vai fazer. Se praticou crime, não interessa se é de rua, se é de Ministério, se é de governo, se é de partido, se é político. Não importa!
É preciso trabalhar essa ideia do império da lei erga omnes, contra todos — de baixo, de classe média e de cima —, senão nós só vamos ratificar, o tempo todo, que bandidagem equivale a bandido de rua. E não é verdade. Ou a Odebrecht não é uma bandida? Ou os proprietários da JBS não são bandidos? É claro que são!
O Deputado Eduardo Bolsonaro, meu companheiro de Casa, pessoa que eu respeito tanto, com quem converso bastante, disse que bandido é visto como vítima da sociedade. Há uma visão de que bandido seria vítima da sociedade. Não deve ser visto assim mais! Há bandidos entre os foram vítimas da sociedade e também entre os donos da sociedade. Bandidos que financiam políticos são bandidos. Todos são bandidos.
É preciso entender bem essa afirmação sobre bandidos e vagabundos, porque a lei foi feita para todos. Numa República, ninguém está imune à vigência da lei, respeitando-se, porém, o direito vigente, respeitando-se o Estado Democrático de Direito. Isso é muito importante.
A audiência de custódia faz parte do nosso Estado Democrático de Direito. O Supremo e nós, legisladores, ratificamos a Convenção Americana de Direitos Humanos há mais de 20 anos. Portanto, isso é algo legislado. Podemos aprimorar o instituto? Podemos e devemos. De uma audiência de custódia pode sair uma audiência de instrução. Isso dá a certeza do castigo. Beccaria dizia exatamente que a certeza do castigo é que previne crimes, e não, necessariamente, o aumento de penas.
O Deputado Capitão Wagner sublinhou que este ano, no Ceará, o índice de homicídios está baixando. Os bandidos dominavam as facções dentro dos presídios. Uma medida administrativa muitas vezes gera muito mais efeito preventivo do que dez leis que aprovamos para aumentar pena. Controlar os presídios, colocar os presídios nas mãos do Estado e tirá-los das mãos dos bandidos é muito mais eficaz do que, muitas vezes, ficar aumentando penas.
Portanto nós devemos, racionalmente, com equilíbrio, buscar um aprimoramento de tudo isso. Devemos fazer com esse limão da audiência de custódia uma bela limonada, colher provas e, eventualmente, coligar isso com um acordo penal, se defesa e acusação estiverem em pé de igualdade — do contrário, isso não é possível —, garantindo, portanto, todos os direitos a todas as pessoas. Contra todos os vagabundos deste País, os que estão nas ruas, ou estão nas empreiteiras, ou compraram políticos aqui, ou estão nos Ministérios, ou estão em altos cargos públicos, nós temos que atuar — contra todos, erga omnes. O império da lei deve ser contra todos.
12:41
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Obrigado, Sra. Presidente. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Bia Kicis. PSL - DF) - Obrigada, Deputado Luiz Flávio Gomes.
Passo a palavra ao Deputado Marcel Van Hattem, pela Liderança do Partido Novo, por 3 minutos.
O SR. MARCEL VAN HATTEM (NOVO - RS) - Sra. Presidente, caros membros da Mesa, quero louvar a iniciativa desta audiência pública tão importante, inclusive para ouvirmos todos os lados e ouvirmos aqui os desabafos que têm sido feitos também, proferidos pelos nossos colegas Deputados que atuam lá na ponta, defendendo o cidadão, atuando contra o crime.
Governador Witzel, parabéns pelo trabalho e também pela postura muito correta a favor da sociedade e contra os bandidos e aqueles que infringem a lei.
É muito importante nós lembrarmos que há muitas falácias quando se fala em encarceramento em massa no nosso País. Diz-se que o Brasil é o país que mais prende. Mentira! Mentira! Se considerados regime fechado e prisões provisórias, que é o critério internacional verdadeiro, nós estamos na 60ª posição no mundo.
Aliás, seria lógico depreender isso, se levarmos em consideração que, de todos os mais de 60 mil crimes violentos cometidos por ano no Brasil, apenas pouco menos de 5% são de fato solucionados. Onde estão os responsáveis pelos outros 95%? Infelizmente somos permissivos demais com quem comete crime. E a audiência de custódia é mais um exemplo dessa permissividade.
Se for para mantê-la, é precisa aperfeiçoá-la e alterá-la para que seja em favor da sociedade, como o Deputado e Cabo Junio Amaral e o Deputado Sargento Fahur disseram há pouco, e não do bandido. Ela deve ser aperfeiçoada em favor da defesa, inclusive, dos nossos policiais, que fazem um bom serviço. Sempre há aqueles que exageram, em qualquer instituição, e precisam ser punidos. Mas não se deve generalizar e dar ao bandido, justamente àquele mentiroso, àquele que puxou o gatilho de uma arma para matar uma pessoa, o benefício da dúvida. Isso é um absurdo! Isso é uma inversão total de valores, Sra. Presidente Bia Kicis!
Nós vivemos num país muito violento, em que se mata muito, em que se prende pouco e, pior, em que há progressões de regime abjetas. Por isso, a partir do pacote anticrime de Sergio Moro, precisamos nos debruçar sobre este tema e acabar com as progressões de regime da forma como ocorrem hoje. Nós precisamos acabar com o indulto de Natal, ou "insulto de Natal", como é conhecido por alguns, porque é outro absurdo.
Se aqui se prende muito, solta-se muito também, o tempo todo. Há quem diga, Sra. Presidente, que, em lugar de portões, nossos presídios poderiam ter portas giratórias, pelo tanto de presos que entram e saem, entram e saem. Inclusive, alguns nem chegam à cadeia; são soltos antes, sob o argumento de que as cadeias estão cheias. Então precisamos deixar a nossa sociedade presa, encarcerada em casa, com medo dos bandidos que estão soltos do lado de fora, andando pelas ruas? Não, essa não é a solução. A solução é, sim, construirmos mais presídios, fazermos mais parcerias público-privadas, fazermos com que haja mais respeito à lei por parte da sociedade. Para isso, precisamos acabar com a impunidade e aprimorar todos os instrumentos que hoje estão à disposição das nossas instituições.
12:45
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Parabéns, mais uma vez, pela iniciativa de fazer esta audiência pública. Conte com o Partido Novo para termos uma discussão séria, baseada em argumentos, em números, em fatos, e que respeitem os direitos humanos, sim, de todos, sobretudo de quem é cumpridor da lei e trabalhador.
Muito obrigado, Sra. Presidente. (Palmas.)
A SRA. TALÍRIA PETRONE (PSOL - RJ) - Sra. Presidenta, eu queria como Líder.
A SRA. PRESIDENTE (Bia Kicis. PSL - DF) - Deputada Talíria, eu vou passar a palavra primeiramente à Mesa e volto para V.Exa.
A SRA. TALÍRIA PETRONE (PSOL - RJ) - Sra. Presidenta, a fala de Líder precede as outras falas. Eu queria falar como Líder, Sra. Presidenta.
A SRA. PRESIDENTE (Bia Kicis. PSL - DF) - Vou passar a palavra por 4 minutos a V.Exa. Se houver outro Líder que queira falar, eu vou passar a palavra primeiro à Mesa e, depois, devolverei a palavra aos Líderes e aos Parlamentares inscritos.
Tem a palavra a Sra. Deputada Talíria Petrone.
A SRA. TALÍRIA PETRONE (PSOL - RJ) - Sra. Presidenta, por economia processual, poderíamos juntar já o meu tempo de inscrição ao meu tempo de Líder. Fique à vontade para juntar ou não, mas acho que seria o ideal.
(Intervenção fora do microfone.)
A SRA. TALÍRIA PETRONE (PSOL - RJ) - Obrigada, Presidenta.
Primeiro, acho que há aqui uma construção muito equivocada sobre o papel da audiência de custódia. Num país com as marcas expressas pelo que são os presídios brasileiros e no que é, Sr. Governador, o modelo de segurança pública do Rio de Janeiro, a audiência de custódia nada mais é do que um instrumento para garantir a legalidade da prisão e o acesso ao direito à defesa, o que muitas vezes os presos só têm anos depois. Aliás, temos, no Rio de Janeiro, o caso do Rafael Braga, que foi preso numa manifestação com frascos de Pinho Sol na mão e que está até agora em prisão domiciliar. Sabemos bem que quem é pobre e negro, num País com as marcas que tem o nosso, não tem acesso à defesa como os bandidos de colarinho branco, que muitas vezes não são nem responsabilizados. Com relação a esses eu não vejo os senhores dizerem que bandido bom é bandido morto. Nem acho que para esses vale esse lema, porque eu, diferentemente do Sr. Governador, acho que temos que fazer cumprir a lei.
A audiência de custódia é para combater, sim, torturas e maus-tratos. Mesmo aqueles que cometem violações à lei têm esse direito garantido por lei. Vejam, no Rio de Janeiro, lá na favela do Fallet, tivemos, como resultado de uma operação do Estado, sinais de tortura, sinais de fuzilamento, assim como na chacina do Salgueiro, em São Gonçalo. É preciso garantir a lei. A audiência de custódia é instrumento para isso.
Segundo, quero dizer aos senhores expositores — e reforço que é muito importante conversarmos sobre este tema — que não se está reinventando a roda. Eu tenho visto várias proposições que tramitam na Casa com propostas que violam acordos internacionais dos quais o Brasil, mesmo que tardiamente — isso foi falado pela Mesa — é signatário, como o Acordo de São José. Não dá para acharmos que o Parlamento pode desfazer esses acordos, assim, sem pautá-los, inclusive causando problemas com a comunidade internacional, e dizendo: "Não queremos mais esses acordos". É isso que o Brasil quer? Sair de acordos que são garantidores de direitos humanos? Olha, impressiona-me a posição do NOVO, que, na verdade, é a expressão da mais velha política. Tenho saudade dos liberais garantidores dos direitos humanos, pois não se trata de esquerda ou direita neste caso. Os direitos humanos são a fronteira entre a democracia e a barbárie. O Congresso não pode passar por cima de acordos dos quais o Brasil é signatário e que têm a audiência de custódia como elemento importantíssimo.
12:49
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O STF, aliás, já reconheceu que vivemos num Estado inconstitucional nos presídios brasileiros. Não podemos ignorar isso. Fala-se que não se prendem os homicidas, mas prendemos mal. Temos a terceira população carcerária, em números absolutos, do mundo, sendo que 40% são presos provisórios. Esses ficam quanto tempo lá sem serem julgados? Há problemas com tuberculose, pneumonia. Aliás, o Rafael Braga, se não me engano, é hoje vítima de tuberculose adquirida a partir de uma prisão injusta nesse sistema penal seletivo que os senhores, muitas vezes, defendem, violando inclusive a lei.
Penso que, de forma demagógica, estamos caminhando na contramão da democracia. Eu tenho o meu papel como pessoa de esquerda, mas estou falando de democracia, estou falando de garantir e aprofundar o Estado Democrático de Direito. E aqui temos destruído instituições que são essenciais para garantir a democracia, Srs. Deputados. Por exemplo, o esvaziamento do mecanismo de combate e prevenção à tortura e a situação dos presídios no Ceará. E foi negada, inicialmente, a ida para se verificar o que acontece no Ceará. Há chacinas do Brasil inteiro.
Sr. Governador, a solução que o senhor apresenta é: "Vamos encarcerar mais. Vamos prender mais". Em vez disso, o senhor deveria dizer: "Vamos investigar mais os homicídios. Vamos investigar a milícia". A milícia apoia os seus seguidores, e a sua base tem bastante relação com ela. Por que o senhor não fala da milícia? Porque a diferença entre milícia e tráfico de drogas é que a milícia tem braço no Estado, elege Senadores, Presidente, Governadores e domina regiões com 2 milhões de pessoas no território do Rio de Janeiro.
Eu acho — e eu termino neste 1 minuto e meio que me resta — que é grave o momento que estamos vivendo. E a democracia, no que se refere a encarceramentos e segurança pública, tem sido violada de diferentes formas, porque bandido, Sr. Governador, é quem descumpre a lei, certo? E o senhor considera, de fato, que o senhor está dentro da lei, quando fala: "Tem mesmo que atirar na cabecinha"? O senhor, como ex-juiz, deveria conhecer a legislação brasileira e saber que não há pena de morte no Brasil. O senhor se considera alguém dentro da lei, quando comanda pessoalmente uma operação policial que atira sobre uma tenda evangélica, Sr. Governador, podendo matar favelado negro, que é morto pela expressão da sua política de morte, essa política que o senhor vem empreendendo no Rio de Janeiro, em vez, Sr. Governador, de ir atrás de milícias, de milicianos que dominam, com braços no Estado, o território brasileiro? O senhor acha que está dentro da lei, Sr. Governador? O senhor acha...
O SR. DANIEL SILVEIRA (PSL - RJ) - Pela ordem, Sra. Presidente.
Sra. Presidente, não é esse o tema da audiência.
A SRA. TALÍRIA PETRONE (PSOL - RJ) - Estou no meu tempo. Eu gostaria de ter garantido o meu tempo.
O SR. DANIEL SILVEIRA (PSL - RJ) - Desculpe-me, Deputada, mas não é esse o tema da audiência.
A SRA. PRESIDENTE (Bia Kicis. PSL - DF) - Vamos nos ater ao tema da audiência.
O SR. PAULO TEIXEIRA (PT - SP) - Sra. Presidente, eu acho que é preciso manter a ordem para ouvirmos quem está falando.
A SRA. TALÍRIA PETRONE (PSOL - RJ) - Eu tenho, regimentalmente, o tempo de Líder.
(Intervenção fora do microfone.)
12:53
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A SRA. TALÍRIA PETRONE (PSOL - RJ) - Com licença. Primeiro, volte o meu tempo, por gentileza, Sra. Presidenta. Segundo o Regimento — a senhora pode perguntar à assessoria —, nós não precisamos nos ater ao tema de uma audiência pública. Eu tenho a liberdade de falar como Parlamentar e assim seguirei. Eu queria que meu tempo fosse retomado com os 30 segundos que me restavam.
A SRA. PRESIDENTE (Bia Kicis. PSL - DF) - Pode retomar o tempo, por favor, para encerrar.
A SRA. TALÍRIA PETRONE (PSOL - RJ) - O senhor considera que está dentro da lei, Sr. Governador, quando diz que tem que jogar míssil em favela?
Por fim, já que o senhor não respondeu a dois ofícios do Presidente Rodrigo Maia, já que o senhor não respondeu o ofício da bancada do PSOL, eu queria saber se, além de o senhor defender política de segurança de morte para o povo, o senhor acha natural numa democracia não responder sobre tentativa de assassinato, planejamento de assassinado de uma Parlamentar do seu Estado eleita.
O senhor expressa a política da morte de negros e favelados.
A SRA. PRESIDENTE (Bia Kicis. PSL - DF) - Agora, eu vou passar a palavra ao Governador Witzel, por 3 minutos.
O SR. WILSON WITZEL - Muito obrigado.
Primeiro, quero cumprimentar o Deputado Paulo Teixeira e a Deputada Talíria. Muito obrigado pelas indagações. Quero convidar o Deputado Paulo Teixeira, que não é do nosso Estado, para conhecer o trabalho que nós estamos fazendo.
Eu falei sobre a necessidade de se criarem mais presídios porque os presídios no Brasil realmente são verdadeiras masmorras, na sua grande maioria. Não há sistema penitenciário que possa dar jeito na transformação daquele que é preso se não for adequado. Então, a minha proposta é de que nós tenhamos um sistema penitenciário eficiente, senão o sistema não vai funcionar.
A investigação que nós estamos fazendo no Rio de Janeiro é a melhor investigação do Brasil. Convido o senhor a conhecer o nosso departamento de combate à lavagem de dinheiro e ao tráfico de armas e de drogas, que hoje está fazendo um trabalho fantástico. Inclusive, Deputada Talíria, os resultados que nós estamos obtendo hoje na investigação contra a máfia das milícias é o melhor do Brasil. Nós saímos de 5% de elucidação de crimes de homicídio para 25%. Nós investimos na investigação qualitativamente, pela minha experiência como magistrado federal, na investigação da lavagem de dinheiro. Sem tirar o dinheiro daqueles que financiam o tráfico de armas e de drogas, efetivamente, fica inviável o combate nas comunidades, que são as que mais sofrem com o terrorismo que lhe é imposto, não pelos favelados, pelos pretos — esses são estudantes e trabalhadores, são gente do bem —, mas pelos terroristas que estão nas comunidades, pessoas que optaram pelo crime organizado e estão ali dominando o território, dominando aquelas comunidades.
Ao largo da investigação que nós estamos fazendo no Rio de Janeiro, que é, ressalto, a melhor do Brasil e está dando resultado, nós estamos investindo numa polícia ostensiva de qualidade. A Polícia Militar do Rio de Janeiro tem 15 mil homens a menos do que deveria ter, e nós estamos hoje com 3 mil novos policiais em formação, uma formação de 10 meses, uma formação com ética e com transparência.
Agora, infelizmente, o combate é inevitável. O que nós temos hoje nas comunidades do Rio de Janeiro são terroristas, são pessoas financiadas pelo tráfico de armas e de drogas dominando território, causando terror naquelas comunidades, cooptando jovens, estuprando pessoas inocentes, atingindo as famílias e destruindo os lares.
Esse tipo de crime não há como combater, se nós não o enfrentarmos. É preciso tirá-los de lá. Há um indicativo de que há mais de 100 mil fuzis no Rio de Janeiro. Isso não é fabricado no Rio de Janeiro. Ontem, foi apreendido um fuzil com a bandeira dos Estados Unidos, do Exército americano.
O tráfico de armas e de drogas hoje tem que ser combatido com investigação e com inteligência. Nós estamos investindo nisso e convidando a Polícia Federal e o Ministério Público Federal para trabalharem nesse mesmo sentido.
12:57
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O terrorismo que hoje existe nas comunidades, se nós não o enfrentarmos... Nós vamos lá para prender, porque, muitas vezes, a guerra das facções é que faz vítimas inocentes, e nós queremos defender essas pessoas que votaram em mim. Eu tive uma expressiva votação nas comunidades, exatamente porque quero livrá-las desse carma, desse terrorismo que hoje as atinge. Mas esses bandidos que hoje estão com armas nas mãos, que não querem se entregar, atiram nas pessoas da comunidade, matam crianças, matam jovens e praticam atos de agressão muito maiores do que a polícia. A polícia, quando é chamada, vai com técnica para enfrentamento. E nós vamos proteger cada vez mais a população, as crianças nas escolas, as pessoas que estão nas ruas, orientando-as sobre como devem se comportar em razão desse confronto que hoje nos é imposto pela própria comunidade terrorista que está ocupando as nossas favelas.
E, a par disso, o nosso programa de atendimento às comunidades, o Comunidade Cidade, vai levar o saneamento, vai levar a abertura de ruas, vai levar a coleta de lixo. Nós temos um grande programa, que nunca foi feito no Rio de Janeiro, visando olhar para as comunidades. Gastou-se o dinheiro com a corrupção em vários pontos, mas não se gastou dinheiro com o pobre. Nós temos esse programa para melhorar as comunidades e tirar dessas comunidades esse terrorismo que hoje está lá promovendo a violência contra o nosso povo.
A polícia do Rio de Janeiro não é uma polícia de enfrentamento, de extermínio. É uma polícia de salvação daquela comunidade, que hoje está tomada pelo terrorismo. E nós estamos fazendo esse trabalho, reduzindo sensivelmente os índices de criminalidade e conseguindo efetivamente fazer com que nós tenhamos condições...
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. WILSON WITZEL - Não, eu fui fazer o reconhecimento junto com o Prefeito daquela região, para fazer o Comunidade Cidade. Aquilo não era uma tenda evangélica, desculpe-me. Quem falou isso para o senhor falou errado. Aquilo era uma posição de atirador de elite, com banquinho, para atirar na polícia, aí, sim, na cabecinha da polícia. E nós fazemos o contrário: se um bandido com fuzil não se entrega, a polícia vai atirar para matar, porque não há outra alternativa. Em qualquer lugar do mundo, bandido de fuzil — em qualquer lugar — é terrorista e morre, se não se entregar. O recado está dado. Se quiser ser submetido ao processo de julgamento tem que se entregar, levantar a bandeira branca. E não é isso que eles fazem; eles atiram nos policiais.
Eu convido a Deputada Talíria a participar do próximo enterro — espero eu que não aconteça — de um policial e falar com a família sobre a perda que ela teve daquele filho querido, atingido mortalmente.
Nós temos agora, num hospital no Rio, um policial sem o braço, Deputada Talíria. O policial está sem o braço porque foi atingido por um tiro de fuzil e não foi...
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. WILSON WITZEL - Eu posso falar?
A SRA. PRESIDENTE (Bia Kicis. PSL - DF) - Deputada, por favor. O Governador veio como convidado para participar de uma audiência. Ele não veio aqui para ser agredido e inquirido dessa forma. V.Exa. teve o seu tempo para falar. Agora a palavra está com o Governador, que será respeitado nesta CCJ.
O SR. WILSON WITZEL - Eu queria só dizer o seguinte: nós temos um policial agora, Deputado Daniel Silveira, que está perdendo o braço, porque tomou um tiro de fuzil. Mas não foi um tiro de fuzil de nenhum favelado, de nenhum preto, de nenhum pobre; foi um tiro de um terrorista, e é esse que nós estamos combatendo. E esse policial não recebeu a visita de nenhum Parlamentar do PSOL, nem a sua família, para dizer que ele vai ter também um tratamento de acolhimento, em razão do serviço prestado.
13:01
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Temos policiais que perderam parte da cabeça e famílias de policiais destroçadas. Nós estamos salvando a população pobre. Basta abrir os olhos para ver isso. Nós estamos, efetivamente, fazendo o trabalho que a polícia e a segurança pública têm que fazer.
Finalizando, quero dizer que concordo quando o Deputado Luiz Flávio Gomes, meu querido professor, disse que a audiência de custódia precisa ser aperfeiçoada. Os direitos humanos, previstos no Pacto de São José da Costa Rica, exigem um transcurso processual mais célere. Nós criamos mais uma etapa processual que acaba tornando o processo mais lento. O que precisamos fazer é concentrar os atos processuais, para que o Ministério Público tenha condições de investigar qualquer tipo de tortura que venha a acontecer e não o juiz, porque investigar não é papel do Judiciário. Cabe ao Judiciário julgar, e o Ministério Público atua como custos legis e fiscal da atividade policial. Com isso, aperfeiçoamos o sistema.
Parece-me um momento importante para avançarmos neste sentido e darmos mais celeridade aos julgamentos dos processos criminais. O sistema todo tem que funcionar. Não é possível que a polícia não investigue com qualidade, ou que a polícia ostensiva não enfrente, com contundência, o crime organizado, não tenha celeridade, e o sistema prisional não funcione. Quando isso acontece, nós efetivamente temos um momento diferenciado na história do Brasil. Eu tenho certeza de que vou colaborar.
V.Exa. está convidado a conhecer a Polícia Civil do Rio de Janeiro, a melhor polícia do Brasil. Perdoem-me, mas estou fazendo aqui uma provocação aos demais colegas. Nossa Polícia Militar, as únicas Secretarias despolitizadas do Brasil e nossas polícias são independentes. É o modelo e o legado que vamos deixar para o Brasil.
Muito obrigado. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Bia Kicis. PSL - DF) - Muito obrigada, Governador.
Eu gostaria de registrar a presença do Sr. Otavio Leite, Secretário de Turismo do Rio de Janeiro e colega Parlamentar, que nos honra com sua presença. Muito obrigada, Deputado. (Palmas.)
Passo a palavra ao Dr. Jayme de Oliveira, Presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros — AMB. S.Sa. dispõe de 3 minutos.
O SR. JAYME DE OLIVEIRA - Muito obrigado, Deputada Bia Kicis.
Quero dizer, mais para agradecer, que tivemos uma oportunidade muito rara, única, de ouvirmos as mais variadas posições. Eu quero reforçar um pouco as falas do nosso Governador e do Deputado Luiz Flávio Gomes não sobre uma questão técnica, que me parece que a Casa precisa considerar.
O art. 49 da Constituição estabelece que é competência do Congresso Nacional sustar os atos normativos do Poder Executivo, e não os do Poder Judiciário. Eu estou trazendo apenas uma questão técnica para ser considerada, avaliada, porque o que nós estamos vendo aqui é que há pelo menos certo consenso da maioria sobre a possibilidade de aperfeiçoar a audiência de custódia. Isso é importante. O Código de Processo Penal é, a meu juízo, o melhor instrumento para fazermos esta discussão.
Eu não sei se o Relator, que estava aqui, foi reconduzido, mas o Deputado João Campos era o Relator. A Comissão de Trabalho estava muito atuante no ano passado, e nós temos condições de avançar com relação a isso.
A competência do Congresso Nacional prevista no inciso XI do art. 49, no que diz respeito a zelar pela preservação de sua competência legislativa, não é a mesma para sustar os atos normativos do Poder Judiciário. O CNJ, lembremos, integra o Poder Judiciário dentro da estrutura constitucional.
13:05
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Eu acho que o que se pode fazer é levar ao Supremo esta discussão sobre o ato normativo. No entanto, a Casa Legislativa tem condições de aperfeiçoar, por legislação específica ou pelo Código de Processo Penal, a questão da audiência de custódia.
Eu trouxe o pensamento recente da magistratura sobre o tema e trago considerações a respeito do veículo e do caminho adequado, Governador e Parlamentares, a respeito desta resolução do CNJ. O que vimos aqui é que as questões transbordaram um pouco. Nós temos vários assuntos na área criminal, como o sistema penitenciário, mas a audiência de custódia pode, sim, ser aperfeiçoada. Nós somos um país que não tem muitos recursos — não temos tantos recursos. No entanto, nós podemos aproveitar os atos dando um pouco mais de efetividade a eles. Foi isso que nós tentamos trazer aqui.
Encerro minhas considerações, reforçando este aspecto sobre a questão legal, porque não me parece adequada a possibilidade de revogação de um ato normativo do CNJ via decreto legislativo, numa análise da Constituição.
Eu vou encaminhar à Comissão o pequeno estudo que nós fizemos. Eu já encaminhei a pesquisa e posso entregá-la a quem mais desejar. Trata-se de um trabalho muito extenso na magistratura.
Eu e a associação nos colocamos à disposição dos senhores para prosseguirmos nestes debates, junto à Comissão e ao Parlamento, para que avancemos com relação a este assunto.
Muito obrigado, Deputada, por mais esta oportunidade.
A SRA. PRESIDENTE (Bia Kicis. PSL - DF) - Muito obrigada, Dr. Jayme.
Passo a palavra ao Dr. Pedro Paulo Coelho, Presidente da Associação Nacional dos Defensores Públicos, e, em seguida, ao Sr. Marcelo Rocha Monteiro, Procurador de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, que manifestaram a intenção de falar neste momento. Os demais participantes da Mesa preferem falar após ouvirem os Deputados.
O SR. PEDRO PAULO COELHO - Boa tarde.
Eu acho que estamos tendo um debate muito enriquecedor. A Associação Nacional dos Defensores Públicos reafirma a importância da audiência de custódia, que foi muito bem lembrada aqui, como verdadeiro marco civilizatório. Eu acho que esta é uma oportunidade, sim, de debatermos o tema. Vamos buscar um consenso para o aperfeiçoamento da audiência de custódia: práticas de um médico-legista no ambiente da audiência de custódia; serviço social para que a pessoa custodiada, que às vezes é usuária de drogas, seja atendida no CAPS AD — Álcool e Drogas, porque é dever do Estado dar este tipo de atendimento; e avançar em políticas de estrutura de todo o sistema de Justiça penal.
Quase todos os Deputados falaram do problema da investigação no País. O Brasil não investiga, e não é para culpabilizar os agentes. Pelo contrário! É pela falta de estrutura do setor da investigação. Eu trago aqui diversos exemplos. Eu fiz várias audiências de custódia como titular do Tribunal de Júri do Espírito Santo, mais de 200 audiências no júri, e as investigações, principalmente sobre a população mais pobre, eram muito precárias. Faltam estrutura, capacidade, pessoal na equipe técnica de peritos, exames simples, que poderiam elucidar um crime, como o exame de microcomparação balística, que consiste basicamente na comparação da bala que alvejou a pessoa com a arma detida. Cada arma dispara como se fosse uma impressão digital. O exame de microcomparação balística, muitas vezes requisitado pela defesa — às vezes, há a pecha de que a defesa quer apenas enganar o juízo, o que não é verdade, já que o que nós queremos é apurar melhor a investigação —, não era realizado, em vista da falta de peritos.
13:09
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Este debate tem que avançar. Eu acho que nós precisamos investir na Polícia Judiciária, na polícia pericial, no sistema do Estado acusador, mas também do Estado defensor. Eu falo pela Associação. Quando nós vemos a triste realidade em que se encontram as Defensorias Públicas no Brasil, em que menos de 40% das comarcas têm defensor público, nós estamos dizendo que os outros 60% não merecem defesa. Isso não pode ser aceito num Estado que pretende se tornar civilizatório. É basicamente isso.
Nós reafirmamos a defesa do aperfeiçoamento da audiência de custódia por todos os argumentos já elencados, pelo seu status supralegal. Lembramos que este precedente do STF diz que os tratados internacionais sobre os direitos humanos têm status supralegal não nasceu com a audiência de custódia, mas com o debate sobre a possibilidade ou não da prisão civil do depositário infiel. No entanto, eu não vejo ninguém debater ou criticar a ausência da prisão civil para o depositário infiel. Vamos trazer este debate então, porque o argumento foi este, também utilizado no caso da aplicação da audiência de custódia.
Eu queria, mais uma vez, agradecer a oportunidade e dizer que o debate foi muito rico. Eu acho que as opiniões contrárias e as favoráveis são muito importantes para aprimorar esta discussão e aperfeiçoar a política de segurança pública, que, acho, é desejo de todas e todos.
Muito obrigado.
A SRA. PRESIDENTE (Bia Kicis. PSL - DF) - Muito obrigada, Dr. Pedro.
Passo a palavra ao Deputado Léo Moraes, requerente desta audiência pública. S.Exa. dispõe de 5 minutos.
O SR. LÉO MORAES (PODE - RO) - Sra. Presidente neste momento da audiência pública, Deputada Bia Kicis, prometo não me alongar nestes 5 minutos, em respeito aos demais colegas que estavam aqui desde o início. Eu estava presidindo a Comissão de Minas e Energia, da qual também era proponente, para discutir os valores exorbitantes dos combustíveis, com a presença do Diretor-Geral da ANP, o Sr. Décio Oddone.
Eu gostaria de dizer quão importante é este debate e a necessidade de trazê-lo para o local adequado, onde desempenhamos nossas atribuições. Sabemos da existência do Pacto de São José da Costa Rica. Por que não aprimorar esta matéria no local adequado, que é exatamente esta Casa?
Eu já ouvi alguns relatos e posicionamentos. Quero dizer que concordo com o que disse o Governador do Rio de Janeiro. Ora, se nós realizamos uma audiência de custódia, que possamos também promover a instrução naquele momento, trazendo luz ao debate, para a elucidação dos fatos. Nós não podemos banalizar a atividade das polícias, como a Polícia Militar, e fulanizar os crimes cometidos. Se damos a oportunidade de ampla defesa, que possamos, sobretudo, avançar.
Eu não discuto o mérito pela totalidade do projeto anticrime do Ministro Sergio Moro, mas vamos discuti-lo, como em outros momentos discutimos e aprovamos outros projetos. Agora é o momento de aperfeiçoá-lo.
Portanto, não tenho dúvida de que esta discussão é importante. Que façamos de um limão uma limonada! O que não podemos é permitir que isso fique do mesmo jeito.
13:13
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O Deputado Sargento Fahur, que está ao meu lado, já se posicionou. Eu tenho certeza de que quem faz polícia na ponta da corda, de que quem faz segurança pública no dia a dia, se sente completamente desmotivado e frustrado, porque tem a dificuldade de prender e de investigar e, quando se chega à audiência de custódia, um sai por uma porta e o outro, por outra: um vai conter o crime, o outro vai dar continuidade à marginalidade.
Portanto, o trabalho da Câmara Federal é debater estes temas espinhosos, temas difíceis, em relação aos quais existem opiniões divergentes, para, a partir disso, conseguirmos ser felizes e entregar respostas à sociedade.
A audiência de custódia é importante? Sim, é. Setores do Judiciário e do Ministério Público se posicionam desta maneira? Sim. Mas, sobretudo, que cumpramos com nosso papel, mantendo a audiência de custódia de modo a otimizá-la, a qualificá-la, e que a partir disso haja a instrução e que consigamos, sim, punir os autores dos crimes bárbaros que são cometidos, porque, enquanto um sai por uma porta e o outro sai por outra, este mesmo que saiu de lá sorrindo e feliz vai cometer um crime contra aquele que o prendeu. Afinal, muitas vezes eles moram nas cercanias um do outro: no mesmo bairro, no mesmo lugarejo. O policial olha o crime de frente, muitas vezes sem ter o que fazer, e, quando o faz, é punido diariamente com ameaças, inclusive com violência contra sua família.
Portanto, eu acho que foi muito importante o debate.
Parabenizo o Deputado Gurgel, coautor do requerimento, e outros colegas que estiveram conosco neste debate.
Posiciono-me favoravelmente ao projeto, desde que com a alteração, para que possamos evoluir. Afinal, esta é a nossa prerrogativa na Câmara Federal.
Parabéns à Deputada Bia Kicis pela condução da nossa audiência!
Muito obrigado.
A SRA. PRESIDENTE (Bia Kicis. PSL - DF) - Obrigada, Deputado Léo Moraes.
Passo a palavra ao Deputado Daniel Silveira. S.Exa. dispõe de 3 minutos. Em seguida, falará o Deputado Pedro Lupion.
O SR. DANIEL SILVEIRA (PSL - RJ) - Muito obrigado, Sra. Presidente.
Eu queria saudar o Governador, meu amigo pessoal, embora ele não esteja presente. Gostaria de dizer que nosso Procurador Marcelo, com certeza, abrilhanta esta audiência, não desmerecendo os demais membros. Todos são muito bem-vindos!
Eu não vou entrar no mérito da discussão de se pegar o criminoso, passando na frente do juiz, porque sou radicalmente contra isso. Defendo a tese de o delegado de polícia fazê-lo. Digo isso como operador do Direito e policial militar na vitrina mundial da violência, infelizmente, que é o Rio de Janeiro. Isso é muito ruim.
Gostaria de falar também sobre a população carcerária. Há um grande mito no Brasil. Entraram neste ponto os Deputados Cabo Junio e Marcel Van Hattem. Nós somos, sim, a posição 36ª no ranking, porque os números absolutos, é claro, nos colocam em quarto ou terceiro lugar. No entanto, se forem relativos, são 260 ou 280 presos, se me engano, para cada 100 mil habitantes, no total de 607 mil presos. Trata-se de dados específicos: não são invenções.
A maneira como as audiências de custódia são conduzidas está errada. O criminoso jamais poderia ser interpelado, ao sofrer alguma agressão. Ora, se ele resiste à prisão, é evidente que o policial vai fazer uso progressivo da força. Isso vai machucá-lo, com certeza, quiçá se não terminar na letalidade, se continuar resistindo cada vez mais. O policial está amparado pelo Código Penal — também não vou entrar no diapasão de ser muito defasado. Concordo com nosso Procurador Marcelo quando diz que o pacto está totalmente defasado — aqueles eram outros tempos.
Não viemos aqui para retirar o direito, embora preso, para mim, não tenha que ter direito nenhum, principalmente preso em flagrante, com crimes de alto potencial ofensivo. Se foi preso em flagrante, por que ele tem que ser interpelado por um juiz se ele foi machucado pelo policial, se ele está chateado com o policial? O agente tem fé pública na sua palavra. É impossível que ele não seja ouvido. É impossível que o viés da audiência de custódia se dê com a vertente de se defender um marginal.
13:17
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Há pouco tempo, uma magistrada ou um magistrado de Florianópolis, não me lembro, liberou, após a audiência, um criminoso que estava portando fuzil na favela. Qual era a intenção dele?
No Governo Wilson Witzel, a primeira coisa é a investigação. Eu acompanho de perto o trabalho realizado. A ultima ratio é a morte, o tiro na cabecinha, para não ter erro, como ele disse. O Governador tem feito um trabalho excelente, tem tentado, de fato, mostrar à sociedade que no Brasil o confronto é inevitável, pelo tempo que nós vivemos e atravessamos.
Portanto, eu me posiciono radicalmente contra qualquer tipo de audiência de custódia desta maneira. Eu acho que tem que ser motivada uma mudança, para que o policial, de fato, demonstre ao magistrado ou ao delegado o que houve na ocorrência, e não tornar mais uma vez o bandido uma vítima da sociedade, quando ele não o é.
Mais um detalhe. Por que pretos e pardos — usem o termo que quiserem — são mortos pela polícia em confronto? Porque são a maioria que hoje cometem os crimes. Se fossem brancos, loiros, de olhos azuis, também seriam mortos em confronto. Trata-se de uma questão estatística. Se fossem brancos, seriam mortos. São negros. São mortos em confronto!
É isso.
Muito obrigado, Sra. Presidente.
A SRA. PRESIDENTE (Bia Kicis. PSL - DF) - Obrigada, Deputado Daniel.
Passo a palavra ao Deputado Pedro Lupion.
O SR. PEDRO LUPION (DEM - PR) - Obrigado, Deputada Bia Kicis, nossa Presidente nesta sessão.
Quero cumprimentar todos os membros da Mesa que fizeram suas exposições, cada um com sua consciência e, obviamente, sua posição pessoal em relação ao tema debatido aqui. Insisto que mantenhamos o tema audiência de custódia.
Não estou aqui para testemunhar uma questão política sobre o Estado do Rio de Janeiro, e sim uma questão que abrange todo o território nacional: a audiência de custódia.
Cumprimento, em nome de todos os Parlamentares, o Deputado Gurgel, o Relator do projeto de decreto legislativo do Deputado Eduardo Bolsonaro, ao qual está apensado um de minha autoria e do Deputado Kim Kataguiri.
Primeiro, Dr. Marcelo Monteiro, eu vi sua exposição com muita atenção e confesso que concordo com suas palavras. Eu sou Deputado Federal do Estado do Paraná. Meu Estado, em 2011, tinha a pior situação carcerária do País: o maior número de presídios com superlotação e a menor estrutura de qualquer tipo de previsibilidade de algum tipo de melhora no sistema carcerário. Com os anos, esta realidade foi melhorando. Hoje temos uma situação um pouco melhor, mas ainda há muito preso em delegacia e muitos problemas de superlotação nos presídios. No entanto, para mim, isso não serve de justificativa para termos a deturpação das audiências de custódia, como elas estão sendo feitas hoje. Neste caso, eu concordo com todas as opiniões.
Sou extremamente ligado à Polícia Militar do Estado do Paraná. Tive um grande apoio para estar aqui representando cada um deles, apesar de não vestir a farda. Sempre tive uma grande amizade, um grande respeito e muita admiração pelas forças policiais, porque sei o que elas enfrentam no dia a dia, Deputado Coronel Tadeu.
O que mais me indigna, o que mais me choca, não é o simples fato de um meliante ser posto em frente à autoridade, ao magistrado, e ser liberado logo em seguida. Frustra-me muito o que acontece, em muitos casos, quando ele é incitado a atribuir alguma culpabilidade ao policial que exerceu a prisão. Isso tudo me deixa muito preocupado. Há uma total deturpação da função da autoridade policial.
Eu tenho amigos policiais militares que hoje têm medo ou receio de realizar uma prisão porque sabem que vão chegar à audiência de custódia e o cara será liberado: haverá algum problema, ou ele responderá por alguma coisa. Isso incentiva cada vez mais aquele policial "CDF" que fica dentro do quartel, numa função administrativa, fazendo tudo para avançar na carreira, e não o policial que está nas ruas, no dia a dia, enfrentando a criminalidade.
13:21
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Quando apresentei este PDL, eu tive o apoio de muita gente da polícia, mas tive também muito apoio de magistrados do meu Estado e de outros Estados que entendiam que não deveria ser feito desta maneira. Não vamos questionar se vale ou se não vale, se foi feito corretamente, se a Câmara tinha que legislar, se o CNJ poderia legislar. Efetivamente, como está, não funciona e não serve para conter a criminalidade. Ao contrário, é só um incentivo, na certeza de que o meliante ele vai poder reincidir, de que não vai ser punido pelo que fez.
Temos exemplos clássicos: o sargento da polícia no Amazonas e no Estado do Paraná, durante um assalto a banco em que bandidos foram presos em flagrante, com todo o armamento, os coletes e o dinheiro, e foram soltos quatro horas depois.
A SRA. PRESIDENTE (Bia Kicis. PSL - DF) - Para eu fazer uso da palavra, vou passar a Presidência ao Deputado Gurgel. (Pausa.)
O SR. PRESIDENTE (Gurgel. PSL - RJ) - Com a palavra a Deputada Bia Kicis.
A SRA. BIA KICIS (PSL - DF) - Primeiramente, quero cumprimentar todos os integrantes da Mesa que proferiram suas palestras, trouxeram esclarecimentos, de um lado ou de outro, qualquer que tenha sido o posicionamento.
Sem dúvida alguma, este é um tema de extrema importância para a sociedade brasileira. Portanto, nós Parlamentares temos o dever de nos debruçarmos sobre a questão da audiência de custódia.
Confesso que há muitos anos, como advogada e cidadã, tenho me posicionado a favor da extinção da audiência de custódia exatamente pela forma como ela é feita. Nós assistimos, indignados, a policiais serem punidos, enquanto bandidos o mais terríveis possível, que praticaram os piores crimes — traficantes, sequestradores, homicidas, latrocidas — saem pela porta da frente. Isso é um verdadeiro deboche com o povo brasileiro.
Hoje, porém, por isso reafirmo a importância do debate dos esclarecimentos, ouvi propostas verdadeiramente interessantes, como a do Governador Witzel e as de outros integrantes da Mesa, de que a audiência de custódia, de fato, como está não, pode permanecer, porque o povo se cansou da impunidade. O povo grita por uma solução, e nós temos a obrigação de trazer esta solução para o combate à impunidade.
Houve uma sugestão de transformação, mediante projeto de lei, destas audiências em uma audiência de instrução e julgamento. Esta, sim, pode ser uma saída para o problema. É uma saída que aparece para mim, que eu passo a vislumbrar a partir desta audiência. Por isso, parabenizo os requerentes desta audiência; o Deputado Eduardo Bolsonaro pela autoria do projeto; o Deputado Gurgel, pela relatoria; e os demais colegas aqui presentes.
O fato é que temos que apresentar uma solução, que seja jurídica, que seja constitucional, dado que estamos nesta importante Comissão de Constituição e Justiça. Mas esta solução há que ser construída politicamente, porque não podemos fechar os olhos para o que acontece hoje nas audiências de custódia.
13:25
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Eu não posso, de forma alguma, conformar-me com os índices trazidos aqui pelo Coronel Siqueira. Eu me coloco à disposição daqueles que queiram me fornecer elementos, como os demais colegas que assim queiram, para apresentar um projeto de lei para, assim, podermos dar à sociedade o respeito que ela merece e àqueles que estão à margem da lei e cometem crimes o devido rigor que eles também merecem, em prol da paz da sociedade e da manutenção do ordenamento jurídico brasileiro.
Muito obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Gurgel. PSL - RJ) - Parabéns, Deputada Bia Kicis!
Quando temos a intenção do bem, Deputada Bia, sempre nos entendemos.
Eu quero parabenizar os integrantes da Mesa, que, apesar de divergirem, foram extremamente educados e solícitos uns com os outros e com os Deputados. Infelizmente, alguns membros desta Casa não conseguem ter respeito à opinião alheia. Este é um grande exemplo. O debate sempre enriquece qualquer assunto, qualquer tema. Eu mesmo vou usar, no relatório, diversos pontos de vista tratados aqui. Parabéns à Mesa!
Retorno a presidência dos trabalhos à nossa Presidente Bia Kicis. Foi uma honra para mim presidir esta Mesa.
A SRA. PRESIDENTE (Bia Kicis. PSL - DF) - Tem a palavra o Deputado Paulo Ganime, por 3 minutos.
O SR. PAULO GANIME (NOVO - RJ) - Obrigado, Sra. Presidente Bia Kicis.
Quero parabenizar o Deputado Gurgel, que acabou de sair da mesa. Foi S.Exa. que fez o requerimento para a realização desta audiência. Eu acho que este debate é muito importante, não só sobre a audiência de custódia, mas também sobre a segurança pública.
Eu sou do Rio de Janeiro, Estado do Governador Witzel, que não está mais à mesa, mas que participou ativamente deste debate. Entendo que somos de um Estado que sofre muito com a segurança pública. Eu nunca atuei na área da segurança pública, mas, quando decidi, em 2017, candidatar-me a Deputado Federal para as eleições de 2018, escolhi como um dos principais temas da minha campanha a segurança pública, justamente por entender que não daria para resolver os problemas do Brasil, em especial do meu Estado, o Rio de Janeiro, sem tratarmos o tema da segurança pública.
A segurança pública envolve o desenvolvimento econômico, a dignidade humana, o salvamento da vida das pessoas. Nós tentamos, durante anos, alguns modelos de segurança pública fracassados, não só no Rio, mas no Brasil todo. Nós falamos muito do Rio de Janeiro porque o Estado é vitrine. A Capital, em especial, cidade de onde eu venho, aparece no Jornal Nacional com frequência quando acontece alguma coisa relacionada à segurança pública. Mas os índices de segurança no Nordeste são ainda piores do que os referentes ao Estado do Rio de Janeiro. Portanto, este não é um tema ligado apenas ao meu Estado: é um tema nacional. Alguns Estados já conseguiram melhorar seus índices, em especial os índices de mortes violentas, como o próprio Estado de São Paulo. O Rio de Janeiro e também o Ceará, assim como outros Estados, não conseguiram resolvê-los.
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Ninguém quer matar ninguém. Ninguém quer que ninguém morra. Quando falamos de mortes violentas, isso vale para todos os lados. No entanto, sem dúvida nenhuma, se a ação policial, em algum momento, resultar na morte de alguém, que não seja do inocente, que não seja daquele que sofre com a violência no dia a dia, em especial aqueles que moram em locais em que mais são submetidos, como o próprio Governador falou, à violência de terroristas — acho que essa é a palavra certa.
Quando nós falamos ou quando o Governador fala em abater uma pessoa com um fuzil na mão, é claro que ninguém quer que alguém morra. Se a polícia tiver alguma opção para não abater essa pessoa com o fuzil na mão, ela vai fazer essa opção. Entretanto, sem dúvida nenhuma, entre a morte de um inocente e a morte de um meliante com um fuzil na mão, não tem como escolher. Se qualquer pessoa nesta Casa, neste momento, visse alguém entrando nesta sala ou em qualquer outra sala com um fuzil na mão, aposto que iria querer, sim, que a Polícia Legislativa atirasse para matar essa pessoa com o fuzil na mão. Por que isso vale para a nossa realidade na Câmara, nas ruas do Rio de Janeiro ou nas ruas de qualquer cidade, mas não vale numa comunidade, numa favela? A situação é a mesma. Uma pessoa com um fuzil na mão é terrorista e tem que ser paralisada, qualquer que seja a função para isso. Se chegar ao extremo, que seja o extremo. É uma pena, pois ninguém quer matar ninguém, ninguém quer que ninguém morra. É verdade que, no Brasil, não existe pena de morte, mas, se duas vidas estão em risco, que a vida de quem está colocando em risco a vida de um inocente seja aquela que vai ser sacrificada em benefício da vida do inocente.
Obrigado, Presidente.
Parabéns, mais uma vez, por esta audiência!
A SRA. PRESIDENTE (Bia Kicis. PSL - DF) - Muito obrigada, Deputado Paulo Ganime.
Vou passar a palavra ao Dr. Fábio Tofic Simantob, Presidente do Instituto de Defesa do Direito de Defesa, pelo prazo de 3 minutos.
Em seguida, eu passarei a palavra para o Dr. Marcelo Rocha Monteiro, Procurador de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, pelo mesmo prazo.
O SR. FÁBIO TOFIC SIMANTOB - Obrigado, Sra. Presidente.
Eu vou rapidamente tecer algumas considerações sobre o que foi dito aqui, tanto pelos meus colegas de Mesa como pelos Parlamentares que usaram da palavra.
Com o perdão do gracejo, às vezes, eu fico com a impressão de que estamos naquela situação em que o marido ou a esposa — tanto faz — chega a casa, pega seu cônjuge com o amante no sofá e adota como medida trocar o sofá. A impressão que eu tenho é que este é um debate inundado de paixões. Todo o mundo quer resolver o problema da segurança pública. Parece que o grande vilão da segurança pública, o grande vilão da criminalidade, o grande vilão da impunidade é a audiência de custódia. Eu confesso — trabalho com audiência de custódia há vários anos — que realmente não imaginava que houvesse essa opinião.
A audiência de custódia tem muitos problemas e, com certeza, precisa passar por vários aperfeiçoamentos. É um instituto muito novo. Entretanto, querer tributar a audiência de custódia? Vejam, senhores, como a paixão toma um pouco conta do nosso debate. Estamos falando de um ato judicial praticado com um juiz de direito, um advogado e um membro do Ministério Público. Eu tenho aqui dados que indicam que mais de 80% dos pedidos de prisão do Ministério Público são aceitos pelo juiz. Há uma concordância quase plena, meu querido amigo Jayme, entre Ministério Público e juiz.
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Do que nós estamos falando aqui? Data maxima venia — eu não quero fazer nenhum tipo de provocação indevida —, do que nós estamos falando aqui? Quer dizer que o Ministério Público e o juiz estão coniventes, no País inteiro, com as defesas para colocar bandido na rua e punir policiais? É disso que nós estamos falando aqui? Eu não consigo entender exatamente qual é o motivo para se transformar uma audiência... Audiência é isto aqui. Nós podemos ser contra o projeto ou a favor do projeto, mas alguém seria contra fazer a audiência? Com a audiência de custódia, é a mesma coisa: eu posso ser contra a prisão, a favor da prisão, a favor de matar bandido, contra matar bandido, mas não contra a audiência. A audiência é para aumentar o nível de conhecimento sobre um caso, sobre um fato. Então, isso me intriga.
Eu vou concluir. Já caminho para o fim.
Aqui foi dito que metade é solta. Isso não é verdade. Talvez, se computarmos crimes sem violência, pode ser metade. Mas, nos crimes com violência ou até no tráfico, que é sem violência — normalmente são apreensões de poucos gramas de maconha, até 50 gramas, temos estatística sobre isso —, a prisão é regra. Eu não entendo isso. Não é o mesmo fórum que eu frequento.
Com relação à apuração de tortura, eu queria até depois fazer uma pergunta para o nosso colega Coronel que compõe a mesa. Ele disse que, em 17% dos casos em que o juiz encaminha e pede para instaurar inquérito, é oferecida denúncia. Com todo o respeito, eu considero um número elevado. Se estivermos falando em 200 casos, estamos falando de 34 casos em que, se não fosse a audiência de custódia, a própria Polícia Militar, ou melhor, a Corregedoria da Polícia Militar não poderia instaurar processos. Aí 34 processos em que se apurou tortura deixariam de ser instaurados. Isso é muito grave! Qual seria o instrumento? Qual seria a forma de esses casos serem apurados se não fosse por meio da audiência de custódia? Se a culpa é da audiência de custódia, isso significa que esses casos, sem audiência, estariam impunes. Essas são coisas que precisam ser mais bem compreendidas, sem paixões.
Em relação ao pacto estar defasado — esse é meu último ponto —, eu sugiro, na linha do que foi dito pelo Luiz Flávio Gomes, que é um jurista respeitado por todos: se o pacto está em desuso, que se altere isso, por meio de uma proposta de emenda à Constituição, para acabar com o pacto, para acabar com o decreto legislativo editado por esta Casa que inseriu o pacto aqui.
Eu quero dizer aos senhores, até para que não percam muito tempo com esse projeto, que a audiência de custódia hoje não vive mais por causa da resolução do CNJ. Os senhores podem acabar com a resolução do CNJ e, provavelmente, em vários Estados da Federação, ela vai continuar sendo realizada por provimento de tribunal. O Tribunal de Justiça de São Paulo a editou por provimento, porque não tem como o Congresso Nacional impedir que um tribunal regulamente uma lei que prevê o envio do preso nas primeiras horas do flagrante. Então, não há como o Congresso fazer isso, a não ser que acabe com o pacto e diga que o pacto tem que ser revogado. Aí é outra história. Senão, é perda de tempo. Não há como proibir, repito, os tribunais de todo o País de aplicarem essa sistemática que apenas regulamenta o que está previsto na lei, que é o envio do preso nas primeiras horas do flagrante à pessoa de um juiz. Muito obrigado.
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A SRA. PRESIDENTE (Bia Kicis. PSL - DF) - Muito obrigada.
Passo a palavra ao Dr. Marcelo Rocha Monteiro, Procurador de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, para as suas considerações, pelo prazo de 3 minutos.
O SR. MARCELO ROCHA MONTEIRO - Boa tarde.
A esta altura, eu queria só retrucar o Dr. Fábio, que me precedeu e afirmou que ninguém pode ser contra uma audiência, ninguém pode ser contra esta audiência pública aqui, por exemplo. Há uma profunda diferença, Dr. Fábio, entre esta audiência pública e a audiência de custódia: aqui todos os lados são ouvidos; lá o juiz só ouve o preso, não ouve o policial que efetuou a prisão, não ouve a vítima, que é completamente ignorada, não ouve as testemunhas. Esta audiência que estamos realizando é democrática e ouve todos os lados; a de custódia, tenho minhas dúvidas.
Quero dizer também que não é verdade que, se suprimirmos a audiência de custódia, deixaremos de obedecer à regra do art. 7º, item 5, do Pacto de San José da Costa Rica. Tudo é uma questão de interpretação. Eu já disse isso na minha fala anterior e vou repisar.
Diz o Pacto:
Art. 7º .........................................
5. Toda pessoa presa, detida ou retida deve ser conduzida, sem demora, à presença de um juiz ou outra autoridade autorizada por lei a exercer funções judiciais (...).
O nosso código prevê, desde sempre, a apresentação imediata do preso em flagrante ao delegado de polícia, à autoridade policial, que pode liberá-lo, que pode não o autuar em flagrante, nos precisos termos do art. 304, § 1º, se entender que não tem fundamento aquela situação de prisão. Mais ainda: pode conceder liberdade provisória mediante fiança, função jurisdicional de caráter cautelar, em determinados casos, atribuída pela lei à autoridade policial.
Então, vamos com calma. Não é assim.
Se V.Exas. aprovarem este decreto legislativo que está sendo debatido, estaremos abandonando o Pacto de San José da Costa Rica? Não é verdade. Tudo é uma questão de interpretação desse dispositivo, desse art. 7º, item 5, do Pacto.
Finalmente, eu gostaria de dizer o seguinte: se perguntarmos à população brasileira, se perguntarmos àquele trabalhador que vai para o ponto de ônibus às 5 horas da manhã, qual é a fronteira entre a democracia e a barbárie, ele vai dizer que a fronteira entre a democracia e a barbárie é ele poder esperar em paz o ônibus que vai levá-lo ao trabalho, sem correr o risco de ser assaltado, sem correr o risco de ter uma arma encostada na cabeça para levarem seu celular. Na minha cidade, estão assaltando até pessoas em fila de desempregados, em fila de Unidade de Pronto Atendimento, do sistema público de saúde. Essa é a fronteira entre a democracia e a barbárie. A fronteira é o combate à impunidade. Na democracia, combate-se a impunidade. Na democracia, pune-se de forma efetiva os criminosos. Na barbárie, eles fazem o que querem.
Muito obrigado. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Bia Kicis. PSL - DF) - Muito obrigada, Dr. Marcelo.
Passo a palavra ao Sr. Leonardo Siqueira dos Santos, representante da Corregedoria da Polícia Militar do Distrito Federal, para suas considerações finais.
Em seguida, falará o Sr. Luís Geraldo Santana Lanfredi, representante do Conselho Nacional de Justiça — CNJ, também para suas considerações finais.
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O SR. LEONARDO SIQUEIRA DOS SANTOS - Sra. Presidente, demais membros desta Mesa, demais Parlamentares presentes, eu quero tão somente reiterar meus protestos de mais elevada estima e apreço por esta participação e pela nobre participação, no debate, de todos os Deputados aqui presentes e dos que aqui apresentaram suas manifestações.
Eu espero terem sido os dados de grande valia para os estudos que esta Casa fará sobre a temática. Tenho certeza de que, independentemente de seus resultados, haverá uma melhoria no nosso processo no País, qualquer que seja a decisão tomada pelos Parlamentares.
Coloco, em nome da Comandante-Geral da Polícia Militar do Distrito Federal, a corporação à disposição desta ilustre Casa, dos gabinetes que desejarem dados que possam substanciar seus estudos, bem como dos demais membros presentes nesta distinta banca da qual eu tive o prazer de participar.
Senhores e senhoras, Sra. Presidente, muito obrigado. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Bia Kicis. PSL - DF) - Muito obrigada, Coronel Siqueira.
Passo a palavra ao Sr. Luís Geraldo Lanfredi.
O SR. LUÍS GERALDO SANTANA LANFREDI - Prezada Deputada Bia, na pessoa de quem eu cumprimento os que resistem e continuam neste plenário, todos os integrantes desta Mesa, agradeço mais uma vez a oportunidade de fazer este debate qualificado, que se realiza na Casa da democracia, que tem a sua autoridade significada justamente pela diversidade das suas opiniões.
As minhas observações são apenas pontuais. Enalteço a importância das considerações que todos fizeram ao longo desta manhã e começo de tarde, para dizer principalmente que não houve intenção alguma do Conselho Nacional de Justiça de usurpar ou tirar deste Parlamento qualquer espécie de iniciativa ou prerrogativa própria de uma Casa de Leis que representa o povo brasileiro — muito pelo contrário. Quando este mesmo Parlamento, por duas de suas CPIs do sistema prisional, houve por bem reconhecer que o nosso sistema prisional, já naquela altura, estava adoecido, também consignou que havia problemas no próprio funcionamento do sistema de justiça. Quando o Supremo Tribunal Federal, no ano de 2015, dá consistência a essas conclusões deste Parlamento, o que está reconhecendo com o estado de coisas inconstitucional é a necessidade de que todos tenhamos responsabilidade por esse mesmo problema, porque naquela altura o Supremo deixou muito claro que todos têm condição de participar e encaminhar este assunto que afeta diretamente a segurança pública da população.
As audiências de custódia não são atos ou ritos para bandidos, são para todos os cidadãos. E, sendo algo inerente a todo e qualquer cidadão, hoje se incorporou ao patrimônio jurídico de cada um de nós. A ideia aqui é que todos tenham visibilidade, mas principalmente sejam realmente tratados em igualdade de condições.
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Essa é a mesma visibilidade que o Conselho, quando patrocina as audiências de custódia, pretende conferir às alternativas penais e à monitoração eletrônica, para que essas também assumam o seu protagonismo como opções do sistema de justiça, deixando de lado a prisão como alternativa e não como regra.
O Programa Justiça Presente, do Conselho Nacional de Justiça, está buscando justamente requalificar o encaminhamento da audiência de custódia. Isso está acontecendo neste momento, Deputada Bia, graças à participação conjunta com o Departamento Penitenciário Nacional, com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento — PNUD e também com o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime — UNODC. A intenção é que justamente busquemos a parametrização desse rito, para que haja uma mesma qualificação na sua maneira de executar de norte a sul do País. É esse o compromisso atual desta gestão do Conselho Nacional de Justiça, do Ministro Dias Toffoli.
Muito obrigado. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Bia Kicis. PSL - DF) - Muito obrigada.
Antes de encerrar, eu vou passar a palavra ao Deputado Delegado Pablo, que estava inscrito e acabou de chegar à Comissão.
O SR. DELEGADO PABLO (PSL - AM) - Muito obrigado, Presidente.
Peço perdão por não estar aqui mais cedo. Realmente tive muitos compromissos hoje.
Agradeço a presença de todos os explanadores que vieram aqui.
O assunto de que nós estamos tratando hoje, a audiência de custódia, é de uma relevância enorme. Eu vivenciei isso na minha vida policial — passei 12 anos como delegado de Polícia Federal. Tive a oportunidade de ver aqui alguns representantes falarem sobre audiência de custódia, sobre seus conhecimentos e experiências. Vivenciei isso na minha vida prática e conheço os benefícios e a problemática que a audiência de custódia criou no Estado brasileiro.
Pelo que percebi na minha vivência e no meu trabalho, a audiência de custódia acabou sendo um instrumento para solucionar a superlotação carcerária nos presídios brasileiros. Tentou-se consertar o problema do aumento da massa carcerária mantendo nas ruas pessoas que cometeram delitos, alguns de menor potencial ofensivo, dando para essas pessoas uma segunda chance.
Em situações em que os réus são primários e o delito realmente não gera grande repercussão na sociedade, eu acho que a audiência de custódia até tem um bom lugar, pois existe a capacidade de colocação de medidas alternativas e de penas substitutivas da cadeia, até para que aquele indivíduo não seja encarcerado junto com outros e venha a ser cooptado pelas organizações criminosas dentro dos presídios.
Recentemente, no Estado do Amazonas, de onde eu venho, ocorreu um caso emblemático. Um sargento foi executado por três criminosos — três! —, todos com antecedentes criminais. Um quarto criminoso ficou do lado de fora aguardando. O sargento estava parado na porta de um estabelecimento e foi executado. A juíza, não sei por que cargas d'água — sou obrigado a diminuir o linguajar —, colocou esses três criminosos na rua no dia seguinte. Ela colocou todos eles de volta nas ruas. Isso foi tão perigoso que eles tiveram que voltar para se entregar, senão a população iria fazer justiça com as próprias mãos. Se eles não se entregassem, com medo de serem mortos, a população iria enlouquecer.
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Há distorção no instituto. A câmera de filmagem mostra a execução. Isso foi parar no Brasil inteiro. O nosso Presidente Bolsonaro colocou isso na página dele. Eu mandei diretamente para ele, e ele colocou em primeira mão. Houve milhares de compartilhamentos e observações de como as pessoas já consideram o instituto de audiência de custódia exacerbado, colocado em situações que realmente não têm mais encaixe.
No momento em que estive aqui mais cedo, o ilustre Procurador estava falando sobre o instituto, que é baseado no Pacto de San José da Costa Rica, que tem quase 50 anos de existência. Lá se falava, Procurador, em juiz de primeiras garantias, não em audiência de custódia. São coisas totalmente diferentes. Em países desenvolvidos, como os Estados Unidos e a Alemanha, onde existe esse juiz de primeiras garantias, o indivíduo sai de lá muitas vezes já com uma pena prévia, com uma punição, uma reprimenda para ser cumprida naquele instante, o que não acontece no Brasil. Aqui no Brasil, pela lista do CNJ, a primeira pergunta feita para o indivíduo que é preso é: "Você foi bem tratado pela polícia?"
Eu não entendi qual é o objetivo da audiência de custódia. Não é ser um juiz de primeiras garantias! No primeiro instante em que ele chega, o questionamento que lhe passam não é se existiu o crime, se ele é partícipe do crime ou se ele é autor, mas se ele foi bem tratado no momento da prisão. Nós estamos fazendo o mesmo que foi feito quando foi criada a súmula vinculante das algemas: tirou-se o foco do crime e colocou-se o foco nas algemas, ou seja, estamos tirando o foco do delito e colocando o foco na prisão. Isso está equivocado.
O meu pensamento é que a audiência tem que voltar a ser pensada como um juiz de primeiras garantias. O magistrado ou o delegado de polícia, como foi bem colocado aqui, tem a função constitucional e processual penal de analisar a ocorrência do delito no primeiro instante, pois é o primeiro garantidor de direitos. Isso é que tem que ser observado no caso da audiência de custódia.
Aqui nesta Casa, tramitam vários projetos de lei para que seja regulamentada essa situação. Eu espero — quero dizer isto a todos os presentes — que esta Casa assuma essa responsabilidade, porque é dela e não do CNJ.
O CNJ, com o devido respeito e a devida vênia aos seus integrantes, está lá para regulamentar situações no Judiciário, não para criar novos institutos. Nós estamos criando um instituto novo. Isso está equivocado.
Peço a esta Casa Legislativa que assuma a sua responsabilidade e regulamente essa matéria o mais breve possível. A sociedade brasileira espera.
Muito obrigado a todos. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Bia Kicis. PSL - DF) - Muito obrigada, Deputado Delegado Pablo.
Agradeço mais uma vez a todos os integrantes da Mesa, que nos honraram com sua presença e sua experiência.
Nada mais havendo a tratar, vou encerrar os trabalhos. Antes, convoco para hoje, dia 9 de julho de 2019, às 14h30min, Reunião Deliberativa Ordinária para deliberação da pauta publicada.
Está encerrada a reunião.
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