1ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA 56 ª LEGISLATURA
Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher
(Palestra: Brasileiras)
Em 29 de Maio de 2019 (Quarta-Feira)
às 8 horas
Horário (Texto com redação final.)
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A SRA. PRESIDENTE (Luisa Canziani. Bloco/PTB - PR) - Muito bom dia!
Estamos ao vivo na TV Câmara.
Eu sou a Deputada Luisa Canziani, Deputada Federal pelo PTB do Estado do Paraná.
Hoje estamos dando continuidade à palestra Brasileiras, um programa muito especial que a Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher realiza.
Recebemos dois talentos muito importantes aqui na nossa Comissão: a Profa. Débora Garofalo e a Vera Moraes.
A Profa. Débora é professora da rede municipal do Estado de São Paulo, vencedora do Desafio de Aprendizagem Criativa do MIT 2019 e considerada uma das dez melhores professoras do mundo pela Global Teacher Prize 2019. Ela irá falar muito especialmente sobre robótica com sucata, trajetória e resultado.
É uma honra, professora, é um privilégio recebê-la aqui.
Também estamos recebendo muito especialmente a Sra. Vera Moraes, designer, pós-graduada em marketing, consultora de inovação da agência Inventtando, head do ecossistema de inovação Nos Inovators, colunista do Clube SEBRAE e consultora credenciada SEBRAE, nas áreas de inovação, design e marketing. Ela também irá falar um pouco sobre inovação e empreendedorismo.
Eu gostaria de esclarecer que as apresentações das convidadas ficarão disponíveis na página da Comissão.
Primeiramente, eu gostaria de conceder a palavra à Profa. Débora, para que ela nos conte um pouco da sua trajetória, da sua história de vida, do seu trabalho.
É com muita gratidão que presencio este momento, em que a professora está aqui na Câmara dos Deputados. Obrigada, professora.
A SRA. DÉBORA GAROFALO - Eu é que agradeço. É uma imensa honra estar aqui hoje, para falar um pouco, como professora da escola pública, sobre o trabalho de robótica com sucata. Então, eu gostaria de agradecer, Deputada, o seu convite.
Antes de começar, eu queria contar um pouquinho da minha trajetória.
Eu tenho muito orgulho de ser professora da escola pública. Já leciono há 14 anos. Fora isso, eu sou formada em Letras. As pessoas estranham um pouco o fato de eu trabalhar robótica e ser formada na área de humanas. Eu também escrevo sobre tecnologias. Recentemente, tive a honra de levar a nossa educação tão longe, num patamar tão distante, em nível mundial.
(Segue-se exibição de imagens.)
A SRA. DÉBORA GAROFALO - Com relação à minha trajetória, durante esses 14 anos, eu tive a oportunidade que muitos colegas não têm de vivenciar um pouco a indústria. Na indústria eu vivenciei a importância do trabalho com as tecnologias. Eu trabalhei na área de recursos humanos. Então, havia a possibilidade de selecionar esses meninos e meninas para trabalhar. Espantava-me o fato de essas crianças saírem do ensino médio sem uma preparação, sem poder dominar as tecnologias. E, nos testes práticos, esses meninos não tinham condições de ocupar essas vagas. Isso começou a me inquietar muito. Em 2015, eu tive oportunidade de ser professora de tecnologias e me lembrei muito dessa minha trajetória. Então eu falei: "Eu quero ser professora de tecnologias para poder transformar a vida desses meninos, através desse uso que é tão essencial, que é falar de tendências, programação e robótica".
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Puxando um raio-x da comunidade, quando cheguei, em 2015, à escola onde estou hoje, eu me deparei com o seguinte cenário: as crianças não têm saneamento básico, elas residem em quatro grandes favelas da cidade de São Paulo; a escola está inserida dentro dessa comunidade; a maioria dos pais dessas crianças, eu diria 80%, está presa no sistema prisional.
Era necessário fazer alguma coisa, porque essas crianças não se identificavam com a escola, não se identificavam com a sala de aula. Por outro lado, a escola recebia toda essa violência vinda do lado de fora da sala de aula.
Eu sou professora hoje de 780 crianças. Infelizmente, o único lugar que essas crianças têm de lazer é a escola. Elas passam o Ano-Novo e o Natal dentro da escola. Então, a escola para essas crianças é tudo, é um mundo. Era necessário fazer alguma coisa.
Quando eu assumi, recebi a minha sala de aula, que é o laboratório de informática. Do lado de fora, a primeira queixa das crianças foi quanto à quantidade de lixo. Era uma quantidade de lixo não só nos cantos, mas também nas ruas, nos muros da escola. Fiquei pensando: "Puxa, como ser professora de tecnologia sem atacar esse problema que é tão grave para essas crianças, sem envolvê-las com esse problema!?"
Para mim, a escola só faz sentido quando ela realmente pode ser significativa, quando podemos usar um problema social para transformá-lo em currículo.
Então, o trabalho de robótica com sucata nasce dessa vontade de transformar a vida dessas crianças e jovens da periferia da Zona Sul da cidade de São Paulo. Isso deu oportunidade para que esses meninos pudessem mudar, ser protagonistas da sua própria história e, mais do que isso, reinventar essa escola, que, até então, era tida como uma escola tradicional. Os meninos ainda estavam acostumados, infelizmente, ao quadro, ao giz. Era necessário quebrar um pouco isso, pensando que o nosso menino de hoje nasceu nesta era digital. Nós estamos falando de indústria 4.0, e a escola praticamente ainda não acompanhou essa evolução.
O meu papel foi muito além da sala de aula, foi realmente olhar para esses meninos e falar: "Não é esse lugar que vai determinar o que vocês podem ser na vida, são vocês. O lugar a gente pode transformar, e vocês vão ser protagonistas dessa história".
Olhamos para essa questão do lixo como uma grande oportunidade de transformação. Começamos então um trabalho. Fizemos aulas públicas, tiramos esses meninos da sala de aula, levamos para as ruas, sensibilizamos a comunidade, de porta em porta, sobre essa questão, já que a maioria dos pais não estão presentes na vida dessas crianças e as pessoas que residem com elas têm um grau muito baixo de instrução.
A ideia então era também empoderar esses meninos e meninas para que eles fossem multiplicadores dessa história, levassem a questão da sustentabilidade e, mais do que isso, conversassem com as pessoas sobre a questão do descarte correto, sobre a reciclagem desses materiais.
Usei a metodologia ativa, que visa tirar esse menino da passividade de ser um mero ouvinte e trazê-lo para o centro do processo, para que ele realmente possa agir ativamente na construção da sua aprendizagem.
Eu usei um ciclo que consiste em algumas etapas: imaginar o problema, construir e testar. Funcionou, nós vamos compartilhar; não funcionou, nós vamos identificar o erro, repensar e aperfeiçoar.
A partir disso, esses meninos se sentiram pertencentes. O que ocorre com a escola hoje? Infelizmente, quando utilizamos o método tradicional, não damos oportunidade de esses meninos vivenciarem a aprendizagem. E a tecnologia tem isto de mágico: permitir que esse menino possa vivenciar essa aprendizagem com as mãos.
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Os pilares do trabalho são: aulas públicas, recolhimento do lixo nas ruas, sensibilização da comunidade sobre os 3 Rs, que é reciclar, reduzir e reutilizar, lavagem e separação desses materiais, pesquisa, exercício do pensamento científico para a construção desses protótipos com esses materiais que nós retiramos das ruas e compartilhamento através de feiras de tecnologias.
Na nossa última feira, no ano passado, nós abrimos ao público. Havia 500 pessoas dentro da escola, inclusive a universidade. Isso serviu para mostrar que a escola não é uma ilha, que precisamos realmente abrir esses espaços. Hoje, por exemplo, estou muito feliz de ser professora e de também estar aqui ocupando este espaço. Precisamos realmente interligar esses espaços para mudar de fato a sociedade.
Mostro no eslaide um pouco dos registros de como ocorrem esses momentos. É imprescindível utilizar luvas, porque há um contato muito iminente com o esgoto. Não é todo material que conseguimos retirar das ruas. Nós fazemos o registro daquilo que não conseguimos retirar, através de fotografias, e acionamos os poderes públicos em São Paulo. A Subprefeitura virou uma parceira nossa, justamente por trabalhar com essa questão. Os próprios meninos também estão aprendendo a lidar e a reivindicar essas ações.
São as crianças que determinam o percurso. Tenho 23 turmas. São 780 crianças, e todas elas fazem esse trabalho, dos 6 aos 14 anos. Traçamos o percurso para esses meninos, a fim de que atuem junto à comunidade.
No próximo eslaide, mostro como é a volta para a sala de aula. Pensando nessa sala de aula, como ela é? É uma sala de aula que permite experimentação, que permite que esses meninos fiquem em pé, que eles trabalhem em colaboração, que haja uma mesa como aquela ali, que propicie aquele tipo de aprendizagem, em que as meninas possam ser inseridas com as tecnologias? Incentivamos aquelas meninas a seguirem esse tipo de carreira. Há alunas no sexto ano já mexendo com ferro de solda, construindo.
Eu gosto muito daquelas fotos ali nas imagens, porque mostram os primeiros registros desse trabalho, que começou voltado para a cultura maker, em que se aprende a fazer para depois realmente ter a robótica presente.
Naquela imagem, vemos uma garrafa PET, que se tornou num carrinho, e a mão robótica feita com papelão. Ali aparece o meu aluno construindo um aspirador de pó. Ele queimou a minha sala e de repente virou para mim e falou: "Professora, o erro faz parte, não é? Você lembra que falou isso?" Pois é, o erro faz parte desse processo. É bacana, porque ele aprendeu que não pode ligar numa voltagem maior. Ele disseminou isso, e nunca mais tive problema com a sala. O robozinho foi feito de papelão. O carrinho de PVC foi feito por meninas.
Eu achei fantástica a ideia dessa menina, porque ela achou uma porta de PVC na comunidade, cortou-a com serrote — é algo muito complexo de ser feito — e construiu esse carrinho. Ele tem um arduíno e um controlador, que é a placa programável, e canta a música Let it Go, porque é de uma menina. Aquele foi o primeiro momento, em que eu consegui realmente tirar essas crianças da escola e elas puderam ir à Bienal do Ibirapuera apresentar os trabalhos delas. Esse foi um momento muito significativo, em que essas crianças ocuparam outros espaços dentro da sociedade. Aqui mostro um pouco dessa evolução. Na primeira foto, está o meu aluno William. Ele construiu um helicóptero com garrafa de suco, palito de churrasco, palito de sorvete e motores que ele encontrou na rua. O que mais me chamou a atenção nesse trabalho foi que o William não sabia ler e escrever. Depois que ele fez esse primeiro trabalho, ele virou para mim e falou assim: "Professora, você me ensina a ler e a escrever?" Então, notamos como esse trabalho é importante para essas crianças. Esse menino, por 13 anos, não se encontrou dentro dessa escola, mas, depois que ele vivenciou uma aprendizagem diferente, ele foi despertado para que pudesse, então, aprender a ler e a escrever. Na segunda foto, nós temos o Wall-e, que é o símbolo da sustentabilidade. As crianças é que fizeram também. Ele anda, fala, conversa. Na terceira foto, vemos um jogo criado pelas meninas, um jogo que saiu da esfera virtual para a esfera real. É um jogo do Pac-man totalmente feito com seringas. Ele é hidráulico. Dessa maneira, vemos a criatividade desses meninos ainda na educação básica, tomando corpo e tomando forma.
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Em relação a esse trabalho, é importante salientar que nós utilizamos todas as áreas do conhecimento. Em nenhum momento, eu deixei de lado a matemática, a língua portuguesa, a geografia, a história, as ciências. Muito pelo contrário, todas estão muito presentes, mas de outra forma, de uma forma prática, porque as crianças realmente entendem por que elas têm que aprender esses conteúdos.
Nesse eslaide, vemos soluções para a vida prática. Eles saíram de uma esfera em que eles queriam construir coisas que não tinham, porque a alegria dessas crianças era no final do ano ganhar um pacote de bolacha ou uma bola de futebol, para realmente pensar em soluções para a vida. Ali vemos um console que eles criaram para se divertirem dentro do intervalo, para propiciarem às outras crianças um intervalo interativo, um intervalo diferenciado. Aqui no canto, vemos uma casa, que foi construída também por um grupo de alunos. Dentro da comunidade, nós já tivemos dois incêndios. Em um deles, houve vítima, infelizmente, a irmã desse menino que teve a ideia de construir essa casa. Ela tinha necessidades especiais e não conseguiu sair da casa a tempo. Quando ele construiu essa casa, ele a fez com energia renovável. Ele virou para mim e... Desculpem-me se eu me emocionar... Ele não queria que outras crianças passassem pelo que ele passou. Então, ele estava dando uma solução ao criar uma casa com energia sustentável, para que outras crianças não passassem por essa situação.
Vemos, portanto, o quanto essas crianças realmente estão aprendendo dentro dessa escola, o quanto é importante esse trabalho. É importante também desmistificar esse uso da robótica, porque, até então, no Brasil, o trabalho de robótica era um trabalho considerado realmente para uma elite. Para se ensinar robótica, era preciso ter um kit específico. Esse trabalho quebra um pouco isso. Podemos olhar para aquilo que temos e fazer grandes coisas com baixos recursos.
Desse eslaide eu também gosto muito, porque mostra eles em evolução.
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Então, nosso primeiro protótipo foi um carrinho movido a balão de ar. Esses foram os materiais que nós encontramos na época. E eles tiveram vida utilizando-se a Terceira Lei de Newton. Imediatamente eles foram para o chão, para ser testados.
Aí se vê a evolução desse trabalho ao longo do tempo, com a garrafa PET, depois com o carrinho de PVC, e por último temos o Chevrolet, que anda, tem farol, é totalmente feito com papelão, isopor e garrafa PET. O que ele tem de eletrônico realmente é a placa programável, que faz o carrinho funcionar.
O resultado desse trabalho é que nós conseguimos combater em 93% a evasão escolar; reduzimos em 95% o trabalho infantil; saltamos de um IDEB de 3,5 para 5,2; e retiramos mais de 1 tonelada de lixo das ruas, transformando-o em protótipos.
Mas, mais do que isso, eu costumo dizer que esse trabalho devolveu a autoestima dessas crianças. Para mim foi um choque ver que crianças tão pequenas não tinham perspectiva de vida, e, de repente, com o trabalho, elas realmente voltaram a sonhar. "Eu quero ser um designer." "Eu quero ser um biólogo." "Eu quero ser um advogado." "Esse aprendizado me despertou para a vida."
Este ano, eu recebi uma grata notícia de um dos meus alunos. Ele passou em Física na USP. Isso para mim é uma grande vitória. (A oradora se emociona.)
Pensar que essas crianças não tinham expectativa de vida... As políticas públicas têm que atingir essas crianças. Para mim é incrível ter esse menino fruto da escola pública passando em Física na USP.
Eu trouxe um pequeno vídeo, só para ilustrar um pouco mais. Ele foi feito pelo Global Teacher Prize, e eu acho que ilustra muito bem esse trabalho.
(Exibição de vídeo.)
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A SRA. DÉBORA GAROFALO - Eu acho que o vídeo está bem completo no sentido de mostrar um pouco do nosso trabalho. Hoje o meu maior sonho é realmente que esse trabalho se multiplique nas escolas brasileiras, porque ele provou os benefícios de inserirmos, de fato, a programação na vida dessas crianças, e não só a programação, a robótica, mas de uma forma significativa, com baixos recursos, ofertando qualidade com equidade.
Para finalizar, então, porque acho que meu tempo já está bem apertadinho, eu trouxe uma frase para refletirmos. Ela foi escrita pelo Prof. Papert, que infelizmente nos deixou há 2 anos, e pelo Prof. Resnick, que continua o trabalho lá no MIT. Eles dizem que, analogamente, ser digitalmente fluente não é apenas saber como usar ferramentas tecnológicas, mas também saber usá-las de forma significativa.
Muito obrigada. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Luisa Canziani. Bloco/PTB - PR) - Muito obrigada, professora, pela sua fala. Todos aqui ficamos muito emocionados. Não tenho a menor dúvida de que os telespectadores da TV Câmara também ficaram muito emocionados.
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Acho que a sua fala demonstra cada vez mais o quanto a educação transforma. Aliado a isso, é muito incrível, como cidadã, como admiradora do seu trabalho, ver a sua paixão pela educação, a sua paixão por ensinar, a sua paixão pela aprendizagem. Muito obrigada por compartilhar a sua experiência conosco. Haveremos de criar muitos projetos e oportunidades em parceria com a Comissão da Mulher e a Câmara dos Deputados.
Agora, vou passar a palavra, muito especialmente também, à nossa convidada Vera Moraes. É com muita alegria que recebemos a Vera, porque ela é pé vermelho, da minha cidade, de Londrina. Estamos recebendo uma londrinense, paranaense, aqui no Brasileiras.
Vera, a fala é toda sua.
A SRA. VERA MORAES - Bom dia. Obrigada, Deputada Luisa. Adorei o convite. Mas, depois da fala da Débora, acho que não tenho nem mais o que falar. (Risos.)
Débora, quero ser sua amiga, depois dessa história. (Risos.) Juro. Você se emocionou, eu também. Não sei se a Deputada Luisa se emocionou, porque ela estava olhando para a frente, mas vi vários olhinhos aqui se emocionando junto com você. Vou lhe dizer uma coisa: o impacto começa por você. Tenho certeza de que você também foi muito impactada com a tecnologia, porque teve que aprender para poder passar isso para eles. Nossa! Também quero conhecer mais o seu projeto e ver como posso ajudá-la.
Gente, sobre a minha trajetória, também caí meio de paraquedas na tecnologia. Como filha de professor de universidade — minha mãe é até hoje assistente social de uma escola de surdos —, na minha casa, eu tinha muito estímulo para o estudo. Eu pedia: "Mãe, me dá 50 reais para comprar uma roupa nova". Minha mãe respondia: "Não!". "Me dá mil reais para eu comprar um livro". "Toma!" Na minha casa, sempre foi muito estimulado qualquer tipo de estudo. Fiz vários cursos, desde pequena. O que me trouxe até aqui? A importância da educação ali da Profa. Débora, do impacto que causa em nós lá atrás.
Eu me formei em design em Londrina, depois fui para a área de marketing — eu me formei lá atrás, em 2000 —, e, com o boom da Internet, tudo começou a virar digital, redes sociais, e não era tanto o design ali físico que trabalhávamos, tínhamos que ir para o on-line também. Daí comecei a aprender esse on-line também na minha vida. Sempre fui muito empreendedora, desde pequena. Meu primeiro CNPJ é do ano de 1997, mas eu já trabalhava antes disso como empreendedora não oficialmente.
Já tive várias empresas que não deram certo, com o mesmo CNPJ e tal. Aprendemos com erro mesmo, professora. Isto é um conceito de startup: erra, e aprende rápido, e muda rápido, e pivota logo. Fui pivotando e usando esses conceitos todos de que hoje sei os nomes — na época eu fazia isso sem saber. E fui sendo empreendedora. Já quis ter uma revista, o que nunca deu certo. Hoje tenho uma agência de TI em Londrina, de que hoje é o meu sócio que cuida. Cuide bem, viu, Tony! Ele está lá me ouvindo. E hoje estou em São Paulo, num programa de inovação, presto consultoria a uma empresa que criou o programa para um grande banco. É um programa bem legal de inovação, que tratamos com startups e tal.
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Mas eu só pude estar aqui hoje porque fiz vários trabalhos na comunidade de Londrina, como o Startup Weekend, hackathons. Então aconselho a quem quer empreender e não sabe por onde começar, homens ou mulheres, adolescentes ou crianças — existem esses programas — a participar desse tipo de programa, porque você aprende a rapidamente ter uma ideia. Você testa a ideia, joga no mercado, valida e cria uma empresa com o mínimo produto viável, para depois você ir colocando mais ferramentas nesse seu produto. Então você começa a aprender.
E eu acho que as mulheres estão chegando e tomando conta do empreendedorismo em tecnologia. Por quê? Porque a maioria das mulheres tem que ser mãe, tem que ser dona de casa, e às vezes está cuidando de um parente, da mãe, do avô. Então ela precisa ter essa maleabilidade que a tecnologia e a Internet lhe dão, de poder trabalhar em casa às vezes, de criar o seu próprio negócio e só ir para o trabalho quando necessário, ou de trabalhar em home office. Então o empreendedorismo e a tecnologia estão atraindo mulheres. Isso é muito legal.
Inclusive mais cedo estava conversando com a Deputada Luisa. Hoje existem aceleradoras de carreira de mulheres, como a B2Mamy, lá em São Paulo, existem coworkings só de mulheres que têm uma creche no local. Então é muito legal, porque você pode levar o seu filho e trabalhar. Existem eventos que são feitos para mulheres. Eles têm um lugar, no próprio evento, para você deixar suas crianças enquanto entra no evento para aprender um pouco mais. No prédio em que eu trabalho, por exemplo, há sala de amamentação. Acho que isso também é muito importante, ter esse olhar, para a mãe receber o filho lá.
Isso, gente, é um negócio também. Quem tiver olhos para isso vai ver que essas mulheres estão dominando o mercado. Então começar a facilitar isso para elas é um grande negócio.
Cada vez mais vão aparecer eventos de tecnologia e inovação. Existem escolas de TI em São Paulo só para mulheres, existem vários movimentos, e provavelmente aqui em Brasília também. Não tenho muita intimidade com Brasília, mas provavelmente deve haver.
Mulher dá muito lucro, gente. Inclusive tenho uma história para contar de uma startup em que a metade dos empregados eram mulheres. E era uma startup de tecnologia e de finanças, que é um mundo muito masculino. Essas moças fizeram um pedido ao CEO, homem, elas queriam fazer uma ação para trazer mais mulheres para usar o sistema. E elas fizeram uma propaganda direcionada para essas mulheres e conseguiram aumentar em 40%, acho eu, o número de usuários daquele produto de tecnologia.
Se vocês tiverem esse olhar de diversidade... A diversidade está diretamente ligada à inovação, porque, quando criamos um produto, não o fazemos só para homens brancos de classe média, nós criamos para mulheres, para negros, para LGBT, para quem tem alguma deficiência física. O produto é criado para todos. Se eu olhar um produto e ele tiver a minha identificação, com certeza vou comprar, porque vou ver que a pessoa pensou em mim. Então, diversidade e tecnologia estão ligadas diretamente a inovação.
A SRA. PRESIDENTE (Luisa Canziani. Bloco/PTB - PR) - Obrigada, Vera, pela fala, pela gentileza de estar aqui.
Eu gostaria de pegar um gancho nessa questão, afinal nós estamos aqui no Brasileiras, um programa da Comissão da Mulher. Acho que podíamos falar um pouco do papel da mulher, das meninas da professora, podíamos falar para as meninas, para as mulheres. E podíamos falar também um pouco mais do papel das mulheres na área de atuação de cada uma. As mulheres são a maioria da população e do eleitorado e mais escolarizadas do que os homens — isso é fato —, mas, em determinadas áreas, de programação, de ciência exata, o número de mulheres ainda é muito reduzido.
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Então, acho que seria interessante trazer esse panorama, nessa perspectiva inclusive de mais mulheres estarem em contato com o mundo da inovação, o mundo do empreendedorismo, a programação, a robótica, não é, professora? Acho que seria interessante trazer também esse olhar, essa discussão aqui para o nosso programa.
A SRA. DÉBORA GAROFALO - Sem dúvida.
Quando comecei o trabalho, a primeira coisa que senti foi um grande machismo, dos meus próprios alunos, que ficaram me testando o tempo todo, para saber o que eu conhecia e o que eu não conhecia de tecnologia. Aí, quando comecei o trabalho de robótica, foi fatal eles excluírem as meninas logo de cara, para que elas não pudessem participar das aulas. E foi toda uma mudança cultural, de conversa realmente com eles, de eles me aceitarem, primeiro, como professora de tecnologias e, depois, de eles aceitarem as meninas nas aulas.
Se olharmos para o mundo, por muito tempo o mundo foi realmente dominado por mulheres na tecnologia. E foi ocorrendo o contrário: os homens começaram a se interessar, as mulheres saíram desse ramo, e hoje, como vemos, são poucas exceções.
Quando comecei o trabalho, a primeira coisa que ouvi — e atribuo isso ao fato de eu ser mulher também — foi que eu estava fazendo artesanato, que eu não estava ensinando a essas crianças robótica. Isso é muito complexo, porque eram homens me dizendo isso.
Mudar esse papel na sociedade hoje é fundamental. A mulher pode, sim, deve ocupar esses espaços. Acho que a escola exerce um grande papel nisso tudo: desmistificar o que é essa tecnologia e permitir que essas meninas sejam inseridas. Vemos grandes trabalhos dessas startups, particularmente conheço algumas que fazem excelentes trabalhos.
Lugar de mulher é onde ela quiser. Precisamos começar a fomentar isso dentro da sociedade. É fundamental inserir essas meninas também no mercado de programação, também no mercado de robótica, porque elas têm a mesma capacidade. Mostrei a vocês um carrinho, feito por menina, que canta a música Let it go. Acho que é isso que precisamos fomentar na sociedade.
A SRA. PRESIDENTE (Luisa Canziani. Bloco/PTB - PR) - Excelente, professora! Obrigada.
Vera, estávamos conversando, antes de o programa começar, sobre a quantidade de startups na instituição em que você trabalha. No universo de 200 startups, só 15 startups foram fundadas por mulheres. Essa é uma discrepância gigantesca! A que você atribui esse baixo número de mulheres encabeçando startup?
A SRA. VERA MORAES - Acho que isso tem muito a ver com os cursos que elas escolhem. Hoje em dia é que está aumentando o número de mulheres que procuram cursos na área de tecnologia. Mas, para ter startup, ela não necessariamente precisa saber tecnologia, ela pode entender de negócios e ser a fundadora da startup e contratar um homem para ser o seu programador. E está aumentando o número de moças que procuram por cursos na área de tecnologia, como eu disse, para poder dedicar mais do seu dia a dia à família, aos filhos, ao marido, porque a tecnologia lhes facilita isso.
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Há também muitas startups que criaram produtos. A professora mesma contou o caso daquele aluno que, da sua própria dor, criou um produto para evitar incêndios, e eu estou vendo várias mulheres também criarem os seus produtos a partir das suas dores. Por exemplo, existe o Lady Driver, que é um tipo de Uber para a mulher. Qual era a dor dela? Era entrar num carro com um motorista homem e ter algum problema. Então, à noite, de madrugada, quando uma mulher trabalha até mais tarde e, para ir para casa, tem que andar a pé um trecho, mas não pode fazê-lo, porque, por exemplo, o ponto de ônibus é longe, deslocar-se de Uber facilita a segurança dela, e ela se sente segura com uma motorista mulher. Já para a motorista mulher, esse trabalho também permite que ela seja dona do nariz dela. Ela pode ser motorista no horário que ela quiser, pode cuidar dos filhos, levá-los para a escola, cuidar de um parente doente, de uma mãe, de uma família e ter um tempo para ter o dinheiro dela.
Então, eu acho que a tecnologia também abre mundos para as mulheres sanarem as suas dores, mas também para elas ultrapassarem essas dores e as transformarem em algo muito bom.
A SRA. PRESIDENTE (Luisa Canziani. Bloco/PTB - PR) - Obrigada, Vera, pela resposta, pelos ensinamentos.
Nós estamos chegando ao fim do nosso programa Brasileiras, e eu gostaria de fazer um anúncio muito especial. Nós estamos indicando a Profa. Débora para participar do Prêmio Darcy Ribeiro de Educação.
Então, fica aqui a nossa indicação, professora. (Palmas.) Depois iremos estendê-la à Comissão de Educação.
Nós estamos, então, fazendo essa indicação. Gostaria de anunciar isso, muito especialmente, aos telespectadores do programa. Esse prêmio é voltado à questão da educação.
Quero agradecer, mais uma vez, a presença desses dois talentos que estiveram conosco hoje.
Agradeço também, muito especialmente, à equipe da Comissão da Mulher, à equipe do nosso gabinete e a toda a equipe da TV Câmara, que sempre está à nossa disposição, nos ajudando, nos auxiliando, para fazermos a melhor transmissão possível e levarmos a melhor informação aos nossos telespectadores.
Muito obrigada pela gentileza.
Na semana que vem voltamos com o Brasileiras. (Palmas.)
A transmissão acaba, mas nós continuamos falando. (Risos.)
A SRA. DÉBORA GAROFALO - Obrigada.
A SRA. PRESIDENTE (Luisa Canziani. Bloco/PTB - PR) - Imagina. Obrigada por estarem aqui. Foi muito legal.
A SRA. VERA MORAES - Parabéns pela indicação, professora.
A SRA. PRESIDENTE (Luisa Canziani. Bloco/PTB - PR) - Deixe-me apresentar a você, professora — a Vera já o conhece —, o meu pai. Nós temos aqui a presença dele, que já foi Deputado por algum tempo e é minha grande inspiração de vida. Ele ficou muito entusiasmado com a vinda de vocês duas e quis, é óbvio, participar do programa.
A palavra é sua. Fique à vontade para questionar as nossas convidadas.
O SR. ALEX CANZIANI - Obrigado, Deputada.
Parabéns por mais este evento.
Quero cumprimentar toda a Comissão da Mulher e sua equipe também por proporcionar não só à Câmara, mas ao Brasil inteiro palestras desse nível.
Quero dizer que eu fiquei muito tocado, viu, professora, pela sua fala. Parabéns. Fiquei emocionado, como brasileiro, quando eu vi aqui uma finalista desse Teacher Prize. Milhares de pessoas do mundo inteiro concorreram, e uma brasileira ser uma das finalistas realmente é um orgulho para todos nós. É inspirador o trabalho que você faz. Eu acho que nós precisamos replicar esses bons modelos.
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Muitas vezes, e você falava isso, vemos as pessoas reclamando porque não têm isso, porque não têm aquilo, porque não têm condição, porque têm dificuldade. Dificuldade todo mundo tem. Mas é preciso fazer de uma dificuldade uma oportunidade. É preciso ver que, apesar de todos os problemas, apesar de toda carência, é possível, sim, fazer e inspirar os alunos a sonhar grande, para que possam ter uma perspectiva melhor.
E eu acho que foi uma feliz coincidência nós termos aqui hoje a Vera também. A Vera é uma empreendedora, faz um belo trabalho. Para terem uma ideia, ela fica em um prédio de dez andares, onde estão empresas de grande porte. Mas as startups que ela conecta para ficar em contato com essas empresas...
Eu acredito, Vera, que você vai sair daqui com uma missão.
A SRA. PRESIDENTE (Luisa Canziani. Bloco/PTB - PR) - Várias missões.
O SR. ALEX CANZIANI - Mas uma especialmente vai ser a seguinte, Deputada Luisa, vou deixar uma sugestão aqui: como conectar aquele hub de alta tecnologia, de altos recursos, de altas capacidades, para que possamos fazer uma conexão num bairro pobre da cidade, numa escola pública? Imagine que química nós podemos fazer disso, Débora! Podemos levar, por exemplo, aqueles alunos para conhecerem onde você trabalha, Vera, para dizer o seguinte: "Se vocês estão fazendo robótica, terão que estar aqui daqui a alguns anos fazendo a sua startup". Isso pode ser mais uma inspiração para essas crianças, para que elas possam pensar em algo ainda maior do que pensam hoje.
E mais, o que se pode fazer lá? Por que não fazer um hackathon lá na escola? Por que não fazer um Weekend lá? Não sei se já houve lá alguma coisa parecida com isso. E é preciso fazer uma parceria para levar essas pessoas, como você dizia, esses jovens de classe média, brancos, que não conhecem a realidade da periferia, não da África, não da Ásia, e sim de São Paulo, onde eles moram há anos e nunca tiveram, talvez, acesso a isso. E eles vão ver, então, através daquilo que estão fazendo, como podem impactar outras crianças também, dando, talvez, uma oportunidade, um incentivo, uma inspiração. Que possamos, então, juntar esses dois mundos!
Eu vi ali a frase do Papert. Inclusive a Deputada Luisa lançou este ano, Profa. Débora, numa escola municipal em Londrina, um programa do Papert, do MIT, o WASH, que é exatamente fazer programação para as crianças. E a ideia, Deputada Luisa, é levar isso para várias outras escolas, não é?
A SRA. PRESIDENTE (Luisa Canziani. Bloco/PTB - PR) - Sem dúvida. Já iremos replicar em outras cidades também, em Prado Ferreira.
O SR. ALEX CANZIANI - Em Prado Ferreira vai ser lançado esta semana.
A SRA. PRESIDENTE (Luisa Canziani. Bloco/PTB - PR) - E também em outras escolas lá em Londrina. Ficamos muito comovidos com o lançamento do programa. Alunos do Instituto Federal do Paraná, no campus de Londrina, estão ensinando alunos do quarto e quinto ano da rede municipal a programarem. Lançamos o programa numa escola municipal e depois fomos acompanhar o que os alunos estavam realmente aprendendo. Professora, eu fiquei tão comovida! Eles estavam fazendo os próprios jogos, tinham uma dinâmica, uma desenvoltura, estavam criando, programando. Foi, sim, uma experiência muito gratificante. Inclusive quero que a senhora esteja em Londrina, no Estado do Paraná, para dar uma palestra.
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Nós temos no Paraná o Consórcio de Desenvolvimento e Inovação do Norte do Paraná — CODINORP, que é o primeiro consórcio do Brasil voltado para a gestão educacional, que é um case. Inclusive há um interesse muito grande do Presidente do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação — FNDE, em relação aos Consórcios Intermunicipais de Educação, para que façamos uma formação continuada. Então, espero que uma das dez melhores professoras do mundo esteja ensinando na nossa rede do consórcio, enfim, na rede municipal e estadual do Estado do Paraná.
Fica, portanto, o convite aqui para a professora.
Vera, o que você achou da sugestão?
A SRA. VERA MORAES - Achei ótima. Eu falo que a minha melhor qualidade é a conexão. Então, eu sou muito boa para conectar.
Então, pode ficar tranquila, professora. A senhora já faz uma grande coisa e nós vamos ajudá-la a fazer com que isso fique maior ainda.
A SRA. DÉBORA GAROFALO - Eu só tenho que agradecer. Como eu disse, escola não é ilha. Nós precisamos realmente conectar essas ações e mostrar para esses meninos que eles podem ser o que eles quiserem, que eles podem continuar pensando alto.
Aceite o meu convite, Deputada, para ir a Londrina, porque eu acho que é o momento realmente de inspirarmos outros professores e mostrar caminhos possíveis para reinventar a nossa educação.
Muito obrigada.
A SRA. PRESIDENTE (Luisa Canziani. Bloco/PTB - PR) - Excelente.
Alguém deseja fazer mais algum questionamento? Euclides... Não? (Risos.)
Todos ficaram muito comovidos aqui com a sua fala, professora.
A SRA. VERA MORAES - Ficaram impactados.
A SRA. PRESIDENTE (Luisa Canziani. Bloco/PTB - PR) - Exatamente.
Então é isso. Quero agradecer mais uma vez.
Agora ficaremos mais um pouco juntas aqui na Câmara.
Quero expressar mais uma vez a minha gratidão pela presença dos senhores, e, mais do que isso, como cidadã brasileira, quero agradecer pela trajetória e pela maneira com que cada uma, em sua área, tem impactado a vida das mulheres, a vida das pessoas, enfim, a vida de todos os cidadãos.
Muito obrigada. (Palmas.)
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