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A SRA. PRESIDENTE (Áurea Carolina. PSOL - MG) - Boa tarde.
Sejam todas muito bem-vindas à Câmara dos Deputados, um espaço que precisa ser cada vez mais ocupado pelo povo, pelas mulheres, pela periferia. É uma alegria recebê-las.
Eu declaro aberta a 4ª Reunião Ordinária da Comissão Externa destinada a acompanhar os casos de violência doméstica contra as mulheres e o feminicídio no País, conforme ato da Presidência do dia 8 de março de 2019.
Encontram-se à disposição dos Srs. Deputados cópias da ata da 3ª Reunião, realizada no dia 23 de abril de 2019.
Hoje o tema da nossa audiência é o compartilhamento de experiências bem-sucedidas de acolhimento de mulheres em situação de violência, por iniciativa, sobretudo, das lutas feministas, dos movimentos populares, que muitas vezes, na ausência e na omissão do Estado, se organizam para prover esses serviços que são de direito — de acolhimento, de proteção, de fortalecimento da cidadania das mulheres —, assim como o enfrentamento à cultura patriarcal e à quebra do círculo vicioso da violência machista.
O requerimento desta audiência foi de iniciativa do Gabinetona, mandato coletivo que é integrado por três Parlamentares, sendo duas Vereadoras de Belo Horizonte, Cida Falabella e Bella Gonçalves; uma Deputada Estadual de Minas Gerais, Andréia de Jesus; mais eu aqui na Câmara dos Deputados, conjuntamente com a Deputada Sâmia Bomfim, do PSOL de São Paulo, que faz parte da bancada do nosso partido.
Eu quero agradecer às colegas Parlamentares que fazem parte da Comissão Externa, especialmente a Presidenta, a Deputada Flávia Arruda, que tem sido uma grande parceira aqui conosco, mas que não pôde estar nesta audiência. Ela se justificou, gostaria muito de estar aqui, mas se encontra em missão oficial.
Agradeço à Sara Teixeira, Secretária da Comissão, à Flávia Tambor e à Paulinha, assessoras do meu gabinete, bem como a toda equipe pelo suporte que nos têm dado para a produção e a viabilização desses encontros.
Ela é uma grande parceira das lutas, do MMOB — Movimento de Mulheres Olga Benario, da Unidade Popular pelo Socialismo, que acaba de conseguir assinaturas suficientes para a legalização do partido, e nós vibramos muito com isso. A Indira Xavier é nordestina, mãe solo, professora e faz parte da Coordenação Nacional do Movimento de Mulheres Olga Benario e da Casa de Referência da Mulher Tina Martins. Seja muito bem-vinda!
A Rute é formada em Direito pela PUC de São Paulo, é Coordenadora do Centro de Defesa e de Convivência da Mulher Helena Vitória, Vice-Presidenta da União de Mulheres do Município de São Paulo, co-coordenadora do Projeto Promotoras Legais Populares e ex-conselheira do Conselho de Atenção à Diversidade Sexual do Município de São Paulo. Seja bem-vinda!
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A Joanna é fundadora da Casa da Mãe Joanna, Comunicação e Educação Feminista sobre Gênero. Atuou no mercado de publicidade e marketing no Brasil e no Reino Unido, onde também trabalhou como professora. É cofundadora do Guerreiras Project e do Gender Hub, e coordenadora pedagógica do Emancipa Mulher. Vem se dedicando a projetos feministas desde que completou seu mestrado em Gênero, Mídia e Cultura, pela London School of Economics. Ela também é organizadora de dois livros e escreve regularmente para a Carta Capital. Bem-vinda!
Leny é técnica de enfermagem, Presidente do Conselho da Mulher em Duque de Caxias, no Rio de Janeiro, e atuou como representante do Movimento Negro Unificado em vários eventos, em países como Senegal e Canadá. Bem-vinda, Leny!
Teremos duas Mesas nesta audiência. Iniciamos com essas primeiras quatro participantes. Na sequência, daremos continuidade.
Hoje, nesse marco de 14 de maio, 1 ano e 2 meses da execução da nossa querida irmã Marielle Franco, nós unificamos o sentimento e a construção das nossas lutas feministas, antirracistas, periféricas, de resistência da cidadania LGBTI e dos povos indígenas. Somente a partir desses corpos de luta e da nossa resistência ativa é que podemos enfrentar esse Estado penal e genocida que custou a vida da nossa querida irmã. Seguimos perguntando quem mandou matar Marielle Franco. A figura dela representa para nós a possibilidade de superação dessa sociedade patriarcal e violenta que hoje nós denunciamos.
(Segue-se exibição de imagens.)
Como foi dito, faço parte da equipe da coordenação da Casa de Referência da Mulher Tina Martins, que é uma iniciativa que surgiu em 8 de março de 2016, na cidade de Belo Horizonte, justamente como uma resposta àquilo que temos vivenciado e visto todos os dias, que é o aumento dos casos de violência contra as mulheres, o aumento do feminicídio. Sabemos que 8 de março não é um dia de comemorar, mas um dia de lutar, um dia de resistir. É um dia de lembrar todas as mulheres lutadoras que, infelizmente, têm suas vidas ceifadas, fruto dessa sociedade machista e patriarcal em que vivemos.
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Então, nós achamos que, como determina a lei da Física, para cada ação existe uma reação oposta de igual intensidade — não é isso? Nós vivemos um momento de radicalização das lutas e, nesse sentido, fazemos uma ocupação específica das mulheres. Na madrugada do dia 8 de março, mulheres metem o pé na porta, ocupam um imóvel federal que estava fechado havia anos: o restaurante universitário da antiga Faculdade de Engenharia da Universidade Federal de Minas Gerais, um prédio cujo contrato de construção estava vencido desde 2013 — então, já havia 3 anos. Estava encerrado, então, o prazo para o TRT, dono do prédio, iniciar as obras de construção, mas até então o prédio ficava fechado.
Ele está situado numa região do Baixo Centro de Belo Horizonte, conhecido como um lugar de muita prostituição, em cujas ruas há muitas mulheres em situação de violência, de vulnerabilidade, de mendicância. Então, é uma região extremamente frágil, no centro da Capital belo-horizontina.
Como a Deputada Áurea disse, nós ocupamos esse prédio com o Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas, do qual nós somos parceiros — e temos muito orgulho disso —, e com o movimento de ocupação urbana nacional.
O prédio fica na Rua Guaicurus. No primeiro mês, mais de 50 mulheres passaram por lá. Até então, para nós, era uma pauta reivindicativa. Nós iríamos chegar lá, fazer uma (ininteligível) radical, iríamos apanhar da polícia, sair na capa do jornal. Era isso que achávamos que ia acontecer. Iríamos chegar lá, iríamos ocupar um prédio público, a polícia iria chegar, nos despejar, nós iríamos fazer aquela celeuma, agarrar-nos no... Enfim, vamos resistir, vamos visibilizar, porque nossos corpos também têm que servir para isso. Sabemos que temos que resistir.
Então, para nós, aquele primeiro momento era um ato de resistência mesmo. Só que entramos no prédio de madrugada, e de manhã cedo já começaram a chegar mulheres na porta, inclusive com crianças, perguntando o que era aquilo. E, quando explicamos, elas dizem: "Eu preciso disto aqui, porque estou na rua. Eu saí de casa porque sofria violência doméstica. Fui morar com meu irmão. Tenho uma filha adolescente. Toda vez que eu saio para trabalhar, ele tenta estuprar a minha filha. Eu não tinha mais como fazer, por isso vim para a rua".
Vários casos assim foram chegando, e nós fomos vendo: "Olha, não dá para só sair daqui apanhando da polícia. Nós vamos ter que fazer uma resistência organizada, porque mais do que uma reivindicação, esta casa é uma necessidade".
Então, nós chamamos a cidade para dentro da ocupação. A Deputada Áurea chegou de pronto, junto com outras parceiras nossas. A cidade abraçou aquele espaço, e nós vimos que não dava para entregá-lo assim. Nós iniciamos, então, um processo de resistência que durou 87 dias, e, ao longo desses 87 dias, a cidade ocupou o espaço. Mas ali, enquanto a cidade o estava ocupando, com rodas, com atividades, trazendo doações, solidariedade, nós também estávamos acolhendo mulheres.
Ali, de pronto, chegaram profissionais da Psicologia, do Direito, da Assistência Social... Assim, naquele mesmo espaço, nós interagíamos com a cidade em torno dessa pauta, dessa temática, e também acolhíamos mulheres.
Como fruto dessa resistência, conseguimos fazer com que a Secretaria de Patrimônio da União se sentasse conosco, junto com a universidade. Nós conseguimos, à época, que o Governo do Estado também fosse para o processo de negociação. E a visibilidade, a luta da casa tomou tamanha proporção que o Estado não teve como não ceder um espaço para que nós pudéssemos seguir fazendo esse trabalho de acolhimento.
Esse espaço não é nosso, mas estamos brigando por ele. Como era ano eleitoral, o Estado alegou que não podia fazer a cessão do espaço, que tinha que ser um comodato provisório de 2 anos, e que depois nós voltaríamos a negociar.
Desde que terminou o processo eleitoral, em 2017, nós fizemos toda uma demanda de solicitações, e o Estado, ainda assim, não nos deu resposta.
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Quando o nosso comodato estava às vésperas de vencer, em 2018, nós fizemos mais ações radicais, ocupamos o Governo, e o Estado prorrogou o prazo por mais 1 ano. No entanto, mudou o Governo, e nós, agora, estamos num processo de resistência, porque a casa existe há 3 anos, mas o prédio não é nosso, e a nossa decisão é ficar.
Então, nós temos feito esse processo de resistência e nos denominamos como Casa de Referência da Mulher, no entanto, ainda somos uma ocupação, sim, porque o espaço não é nosso, não está garantido, não está assegurado. Mas, mesmo sendo uma ocupação, nós seguimos atendendo e acolhendo as mulheres em situação de violência.
Como funciona a gestão do espaço? A manutenção do espaço é de responsabilidade do Movimento de Mulheres Olga Benario, do qual eu faço parte. Esse é um movimento feminista e classista que foi criado em 2011, está presente em 18 Estados e possui uma coordenação nacional e coordenações estaduais.
O nosso recorte classista provém do trabalho de base e do foco das atividades junto às mulheres trabalhadoras e periféricas. Com os dados estatísticos, nós vamos ver que esse tem sido o nosso maior público a ser atingido.
É importante frisar que o feminismo é composto pelas diferentes vozes, de diferentes mulheres, sendo necessária a compreensão da especificidade de cada recorte sem perder as pautas comuns.
Então, nós estamos fazendo o trabalho ali na ponta e somos feministas — eu sou feminista, a Nana é feminista, quem está aqui é feminista —, mas as mulheres que chegam, muitas vezes, têm medo desse nome, têm receio desse nome. Muitas vezes, você diz: "É feminista". Aí: "Ai, meu Deus, não quero, não vou, não sei". Nós vamos buscando que, muito mais do que com o nome, com a nomenclatura, a mulher se identifique com aquele espaço, se sinta acolhida e reconhecida naquele espaço. A partir daí, ela se denomina da forma que quiser.
Nós precisamos, sobretudo, garantir que essa diversidade de mulheres possa ser atendida em toda a sua plenitude, independentemente das nossas convicções, crenças, enfim, independentemente daquilo em que acreditamos como ideologia individual.
Como é feita a manutenção da casa? Ela não tem fins lucrativos, e nós a mantemos através de uma rede de apoio, de doações financeiras, de alimentos, de produtos de higiene e limpeza. Nós fazemos várias atividades de campanha e de difusão para fazer a manutenção da casa. Como eu disse, a casa foi cedida pelo Estado. É uma casa tombada, então, não paga IPTU. A água e luz, por enquanto, o Estado está pagando, mas ele já disse que não vai pagar mais. Mas todo o resto é mantido por nós.
Então, a mulher chega com a roupa do corpo, e nós temos que lhe dar a toalha, o sabonete, a pasta, o Prestobarba, o lençol de cama, a roupa, a calcinha, o sutiã, a cama, a comida. Tudo isso é responsabilidade nossa.
Nós trabalhamos de forma voluntária, e umas 25 mulheres fazem esse trabalho voluntário na casa — temos 21 turnos na semana. A casa nunca fechou, desde o dia 8 de março de 2016. Nós só fazemos uma pausa quando temos que ir para a rua fazer manifestação. Aí colocamos um cartaz na porta, dizendo: "Fomos ali e já voltamos". Fora isso, nós nunca fechamos ao longo desses 3 anos e temos 21 turnos ao longo da semana.
Como é um trabalho feito de forma voluntária, nós vamos encaixando esse quantitativo de mulheres dentro das disponibilidades de cada uma delas para fazer esse trabalho de acolhimento direto.
Aí está um pouco das estatísticas.
As nossas cores são roxo e amarelo, mas não fica legal essas cores, não fica bom. Vamos corrigir isso para os próximos eventos.
Quando a Casa começou, os dados que tínhamos do feminicídio no Brasil eram do Mapa da Violência de 2015, e já fazia um balanço alarmante do aumento da violência, que havia sido em torno de 21% em relação aos dados de 2003 e de 2013. Em 2016, os dados mostram que 4.645 mulheres foram assassinadas vítimas de feminicídio no País. Em Minas Gerais, esse número correspondeu a 397 mulheres assassinadas no mesmo período; um aumento de 18,5% em relação ao ano de 2015. No ano passado — dado que se refere ao ano de 2017, e não ao de 2018 —, foram assassinadas 433 mulheres em Minas Gerais, um aumento a mais de 9% em relação ao ano anterior. E, só em 2017, a Justiça local emitiu 25 mil medidas protetivas no Estado. Então, hoje, uma medida protetiva é emitida a cada hora em Belo Horizonte, sobretudo porque é onde tem as DEAMs.
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E aqui temos um pouco do Mapa. Eu costumo dizer que, quando não aprendemos pelo amor, aprendemos pela dor. É engraçado isso. Então, fomos criando os nossos mecanismos, os nossos instrumentos de aferição dos dados, de construção de estatísticas, tudo no mesmo bolo. Nós vamos arrumando a casa, pedindo móvel para montar a casa, pedindo roupa para vestir as mulheres, comida para alimentá-las, criando os instrumentos, fazendo as capacitações, tudo feito ao mesmo tempo. Descansamos carregando pedra, como todas. A nossa vida é esta: descansar carregando pedra! Então, o que conseguimos ter de dado qualificado? Ao longo desses 3 anos, na verdade, até março deste ano, em torno de 345 mulheres foram atendidas pela Casa diretamente, entre abrigamentos e acolhimentos, seja com trabalho psicológico, seja jurídico, assistencial, com as mulheres morando na Casa mais os filhos, independente da faixa etária.
Aqui está mais ou menos por ano. O nosso maior boom foi em 2017, que teve o pico maior da violência nesse último período, e, desse quantitativo, quase 200 mulheres foram atendidas nesse ano.
Do ponto de vista da proveniência das violências, embora a Casa acolha todo tipo de violência, não é uma casa específica para a violência doméstica. Quando fazemos as nossas coletas de dados, percebemos que quase 82% das mulheres que chegam até nós são vítimas de violência doméstica e 18% são vítimas de outros tipos de violência que nós mulheres sofremos na vida.
Em 2016, foram registradas nas polícias brasileiras cerca de 49.497 casos de estupro, conforme informações disponibilizadas pelo 11º Anuário de Segurança Pública, sendo cerca de 135 casos de estupro por dia. Isso dá uma média de 6 casos por hora. Certamente, essa base de informação possui grande subnotificação, porque inclusive sabemos que infelizmente é prerrogativa do oficial de justiça fazer o enquadramento desses casos. Então, não dá conta da dimensão dos problemas, tendo em vista o tabu engendrado pela ideologia patriarcal, que faz com que as vítimas, na grande maioria, não respondam a qualquer autoridade o crime sofrido.
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Colocando a questão sob uma perspectiva internacional, nos Estados Unidos, apenas 15% do total dos estupros são reportados à polícia. É como se a nossa taxa de subnotificação fosse igual à americana ou — isso é o mais incrível — girasse em torno de 90% o número de casos não notificados às autoridades policiais. estima-se que sejam entre 300 mil e 500 mil os casos de estupro no nosso País por ano.
Fazendo um pouco do recorte de raça e de cor das mulheres que foram acolhidas pela Casa ao longo desse período, podemos perceber que a maior parcela é de mulheres negras e pardas. O reflexo disso é que a taxa de homicídio é maior entre as mulheres negras. A diferença é de 71% entre essas taxas.
No nosso quantitativo, 37,1% das mulheres que passaram pela Casa se autodeclararam. E aí há a autodeclaração. É por isso que há um número tão grande de não identificadas, cerca de 28,4%. Mesmo que vejamos que se trata de uma mulher preta, ela nos olha e pergunta: "Você acha que eu sou de que cor?" Eu respondo: "Você não acha que é igual à minha, não? "É, mas eu acho que eu sou preta". "Então está bom! Se não acha, você não é".
Nós temos 37,1% de mulheres que se autodeclaram negras, 20% que se autodeclararam pardas, 14% que se autodeclararam brancas, e 28% que não se declararam nada.
Na localidade do Estado, também fizemos uma separação pela origem territorial dessas mulheres. Hoje, como a Casa está na capital, 70% dos casos são da capital; 13%, da região metropolitana; cerca de 7%, de outros Municípios; 8%, de outras unidades da Federação; e cerca de 5%, de outros países.
Recebemos vários casos ao longo desse período, inclusive casos encaminhados pelo Estado, sobretudo de mulheres imigrantes. Infelizmente, assim como o nosso, os Estados não têm uma política para mulheres imigrantes em situação de violência doméstica. Não tendo como acolhê-las e socorrê-las, recebemos um grande número dessas mulheres imigrantes, sobretudo haitianas. E agora, com essa situação da Venezuela, várias mulheres venezuelanas têm procurado o nosso trabalho. Inclusive, a Embaixada da França chegou a entrar em contato conosco para pedir para acolhermos a mulher, porque ela não tinha como fazê-lo, não sabia bem o que fazer com a situação.
Aqui são as nossas redes. De onde vêm essas mulheres? Cerca de 46% vêm exatamente dessa relação do movimento que construímos com outros movimentos. A primeira coisa que percebemos, quando fizemos a nossa ocupação, é que não dava para trabalharmos sozinhas. Precisávamos fazer uma rede. E tem que ser uma rede que funcione, porque a rede do Estado, infelizmente, não funciona. Ela é feita para não funcionar.
Há vários parceiros e parceiras que têm muita disposição, muita vontade de ajudar, mas que têm limitações. E nós temos que ser esse elemento que faz o tensionamento do outro lado, para podermos garantir que esse parceiro e essa parceira possam disponibilizar o máximo possível.
Porém, nós temos criado a nossa própria rede ao longo desse período. Cerca de 46% das mulheres vêm dessa própria rede de movimentos parceiros; cerca de 4% ou 5% — não está escrito ali, mas acho que é isso — vêm da delegacia; cerca de 5%, do Bem-Vinda, que é um serviço do Município que nos encaminha mulheres. Esse percentual amarelo é o que vem encaminhado dos CREAS e dos CRAS.
Cerca de 5% também vêm do Município. Então, do Município, na verdade, vêm 10%, que são do serviço legal dele, o serviço de acolhimento, e do Sempre Viva, que é um serviço de abrigamento para mulheres em risco iminente de morte. Depois que passa esse prazo, elas não têm para onde ir, e várias vezes o Município recorre, chegando, então, a cerca de 10%. Outros 10% vêm do CERNA, que é do Estado. Então, do nosso serviço, cerca de 20% é a instituição Estado que recorre — seja Município, seja Estado —, mas há uma outra parcela, de 5%, que são os outros serviços, como a POP Rua e a DEAM, que também fazem solicitação à Casa. E 20% vêm oriundos das periferias, através do trabalho que nós realizamos com o Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas, com mulheres que moram diretamente nessas ocupações urbanas geridas pelo movimento, que, nessa relação de parceria, faz a solicitação para que façamos o acolhimento, o abrigamento dessas mulheres.
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Esse é um dado da presença na casa. Eu estou falando das mulheres, das mulheres, das mulheres, só que a primeira coisa que nós pensamos quando construímos a casa era que não dava para ser uma casa de abrigo, que não era para nós escondermos as mulheres. Nós precisamos fazer com que as mulheres retomem o convívio e, mais do que isso, fazer com que a cidade entre na casa para entender por que existe aquela casa. E nós temos uma preocupação com essa relação contínua, para que as mulheres possam se relacionar e que a cidade possa se relacionar com a casa, para que geremos esse debate e essa atividade.
Nós sempre fazemos atividades na casa. A nossa feira de produtoras acontece todo segundo sábado do mês, religiosamente. Fazemos atividades diversas na casa, não só promovidas por nós, mas também por parceiros e parceiras que solicitam o espaço da casa para poder fazer as suas atividades. Com isso, nós movimentamos a presença na casa.
Esse dado é de 1 ano, de 2017 a 2018. Passaram pela casa cerca de 4.490 pessoas, uma média de 400 pessoas por mês, independentemente das mulheres que são acolhidas, nessas diversas atividades que promovemos na casa. Isso é o que temos de assinaturas contabilizadas, mas, por exemplo, há várias atividades livres, como as feiras, e não conseguimos ter esse controle.
Aí vemos os tipos de entidades que frequentam a Casa: cerca de 60% são organizações da sociedade civil; cerca de 18% são instituições do poder público; e cerca de 22% são instituições educacionais.
Neste mês de junho, fará 3 anos que estamos nessa casa — nós nos mudamos no dia 2 de junho —, e vamos realizar o nosso primeiro simpósio acadêmico. O prédio da nossa casa pertence à Fundação de Amparo à Pesquisa, e o Governo do Estado disse que iria fechar e tirar todo o dinheiro dela — ela já não tem, mas iria tirar tudo. Aí nós falamos: "Vamos mostrar, então, para a Fundação de Amparo à Pesquisa que, muito mais do que acolher mulher, se produz ciência aqui dentro". Nós temos muito trabalho produzido na casa, não só no direito, na psicologia e no serviço social, mas também na arquitetura, na música, na TI, na administração, na economia, na comunicação. Há muita coisa produzida ao longo desse período na Casa. Vários seminários internacionais ocorreram na Casa, com pessoas parceiras que colaboraram.
Então estamos nesse processo de construir um simpósio acadêmico para mostrar o seguinte: "Olha, aqui também se produz conhecimento a partir dessa realidade de vida das mulheres". É importante que a casa siga existindo, exatamente para poder inclusive fomentar essa pesquisa.
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Esse é um pouco da nossa rede. Como eu falei, temos construído a nossa própria rede ao longo desse período, e essas são algumas das nossas parceiras, que atuam junto conosco na instituição.
Se as leis e as políticas públicas ainda não são suficientes para impedir que vidas de mulheres sejam tiradas de formas tão brutais, o enfrentamento a essas e outras formas de violência de gênero é um caminho sem volta. Os dados apresentados neste relatório devem contribuir para destacar e denunciar a morte de mulheres, assim como a necessidade do aprimoramento dos mecanismos de enfrentamento a esta.
(Exibição de vídeo.)
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A SRA. PRESIDENTE (Áurea Carolina. PSOL - MG) - Muito obrigada, querida Indira. É muito emocionante ver essa história da Tina.
Desde o primeiro dia, quando eu tive a oportunidade de estar lá e amanhecer na ocupação, vendo todo esse processo acontecer, a resistência, as tentativas de mediação e diálogo com o poder público, o fortalecimento da rede feminista em parceria com vários movimentos sociais, isso nos orgulha muito. Nós lutamos para que a casa se mantenha e para que o Estado cumpra o seu papel de suporte para essa iniciativa de autogestão que defende os direitos das mulheres. Estamos juntas!
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A SRA. PRESIDENTE (Sâmia Bomfim. PSOL - SP) - Olá, companheiras! Tudo bem?
Aqui na Câmara é assim mesmo: estamos numa Comissão, estamos numa audiência e numa reunião — tudo ao mesmo tempo. As Deputadas que estão aqui presentes sabem como funciona. É muito importante que nós, mulheres eleitas, também ocupemos todos os espaços, as nossas Comissões, mas também nos enfiemos nas lutas das quais não querem que sejamos parte. Eu, por exemplo, depois também vou ter que ir até a Comissão Especial da luta contra a reforma da Previdência, principalmente porque ela é injusta com as mulheres trabalhadoras. E assim vamos nos revezando.
Mas, antes de iniciar e de dar a palavra para as companheiras, eu queria dizer que estou muito feliz com a possibilidade deste debate, porque a nossa Comissão Externa foi criada primeiro para tentar auxiliar no diagnóstico do problema da violência contra a mulher em todo o País.
E aqui nós temos representantes de vários Estados, Deputadas de vários lugares, que trazem na bagagem uma luta contra a violência de gênero. Quando a Deputada Áurea Carolina nos procurou para sugerir — foi sugestão da Deputada Áurea — que trouxéssemos para este espaço as experiências bem-sucedidas, eu fiquei muito feliz, porque eu acho que elas são parte fundamental para espalharmos para os outros locais do Brasil o encorajamento e o empoderamento feminino.
O dia de hoje não poderia ser mais propício para isso, porque infelizmente se passaram 14 meses do assassinato da Marielle Franco, que tinha também no seu mandato uma trincheira de luta, entre outras coisas, contra a violência de gênero. Sem dúvida, esta é uma grande homenagem também para aquela que é a nossa companheira, e até hoje nós não sabemos quem mandou matar a Marielle. A nossa luta segue em cada ocupação para defender as mulheres vítimas de violência, em cada mulher que vem à tribuna aqui do plenário para colocar a sua posição, em cada mulher que sobrevive todos os dias e que também luta por Marielle. Então vamos seguir juntas nesse processo.
Antes de passar a palavra à Mesa, eu queria saber se as Deputadas que vieram aqui — a Deputada Flordelis e a Deputada Aline Gurgel — querem dar uma palavrinha, o que eu acho que é importante para seguirmos a nossa discussão. De repente, ter alguma pergunta ou algo para colocar é muito importante, porque esta Comissão é suprapartidária, presente em diversos Estados, e isso também é parte da nossa tentativa de articulação aqui dentro enquanto bancada feminina, para fazer com que os nossos direitos tenham, de alguma forma, prioridade aqui neste espaço, que muitas vezes é hostil à presença e aos direitos das mulheres. Eu acho que esta articulação é fundamental para nos fortalecermos.
A SRA. ALINE GURGEL (PRB - AP) - Deputada Sâmia Bomfim, primeiramente quero parabenizá-la, junto com a Deputada Áurea Carolina, por nos proporcionar este momento com mulheres tão empoderadas, mulheres que têm trabalho renomado e vão nos ensinar muito.
Essa interlocução de talentos e de experiências positivas é muito válida para nós que estamos chegando agora ao Parlamento. Eu venho da Câmara de Vereadores, mas nós sabemos a importância dessa interlocução.
Aqui nós construímos as leis que vão ser operacionalizadas nos Estados e Municípios. Se nós não tivermos a interlocução com vocês... Por exemplo, eu li aqui na pauta o nome da Sra. Indira Xavier, representante da Casa Tina Martins. Eu já me coloco à disposição para conhecer essa casa, porque essas experiências bem-sucedidas nós temos que compartilhar com todo o País. A Leny Claudino de Souza e todos os currículos que estão aqui só fazem engrandecer o nosso trabalho, o trabalho desta Casa.
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Colocamos a Procuradoria da Mulher à disposição. Somos procuradoras desta Casa. Vencemos uma eleição recentemente. Eu estou como procuradora, e a Deputada Sâmia Bomfim também é procuradora. Nós temos também a Deputada Flordelis, que é uma mulher que tem um trabalho na comunidade e nos mostrou que nós somos capazes de fazer a diferença dentro das nossas limitações. Quando nós nos unimos, nos juntamos, transformamos, sim, uma sociedade.
Então quero aqui me colocar à disposição e dizer que nós estamos com uma missão junto com a Deputada Iracema Portella, a nossa Procuradora da Mulher, que é levar a Procuradoria da Mulher para todos os Estados e Municípios que não têm. A Procuradoria da Mulher é um órgão que recebe as denúncias. Isso vai nos ajudar a criar políticas públicas efetivas. E nós propomos também que possamos ter um observatório dentro da Câmara interligado com as universidades que já têm cursos de extensão voltados ao enfrentamento da violência contra as mulheres e têm dados específicos. Com isso, sim, nós vamos conseguir fazer políticas efetivas.
Eu também quero dizer que nós temos um projeto inédito no Estado do Amapá, do qual eu venho. É o projeto Namoro sem Violência. Ele é inédito no País. Nós temos uma pesquisa que informa que 70% da nossa juventude está sofrendo violência no namoro. Hoje são namorados, mas futuramente poderão ser marido e mulher. E nós temos que combater a violência doméstica na essência. Nós temos que fazer a prevenção. O Namoro sem Violência é um projeto consolidado, feito por psicólogas do Centro de Atendimento à Mulher e à Família — CAMUF. Esse centro fica no Estado do Amapá e trata tanto a criança, a mulher, a vítima, quanto o agressor também. Se não tratarmos esse agressor, ele vai se casar novamente. E o que vai acontecer? Ele vai reincidir e continuar praticando violência. Então nós estamos criando aqui várias leis em que uma das sentenças tem que fazer o agressor passar por tratamento, para que ele possa vencer esse machismo que vem lá da sua essência, da sua criação nessa cultura patriarcal, que nós temos que combater. Não podemos dar continuidade a isso, nem deixar que esse homem agressor fique aleatoriamente agredindo mulheres. O projeto Namoro sem Violência faz um questionário como o daquelas revistas, e lá nós identificamos. Daí começamos a trabalhar a desconstrução dessa cultura do machismo, que já está presente nos nossos jovens e adolescentes.
Portanto, quero me colocar à disposição, quero visitar, fazer parte desta Comissão, fazer parte também da Frente Parlamentar Mista de Enfrentamento à Violência nas Escolas, que me interessa muito. Nós vamos compartilhar nossos talentos. Com certeza, teremos um resultado positivo com todos os que estão aqui hoje nos presenteando com o conhecimento e a experiência de vocês.
A SRA. FLORDELIS (PSD - RJ) - Como a Deputada Sâmia já disse, a nossa vida aqui é meio corrida. Saímos de uma Comissão para outra correndo, mas eu não podia deixar de estar aqui, ainda que seja por um pouquinho de tempo, porque é um assunto muito importante.
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Na semana passada mesmo, eu recebi uma ligação de um rapaz que estava trancado no quarto e dizia: "Vem aqui e me ajuda, porque, se eu sair do quarto, eu vou fazer uma besteira, eu vou bater, eu vou matar! Eu preciso que alguém me controle, que alguém me ajude, eu não quero fazer isso!"
Eu mandei uma comissão correndo para lá. Nós conseguimos entrar no quarto, conversamos com ele, trouxemos a garota, colocamos na frente, conseguimos...
Eu tive que encaminhar aquele menino. Eu não pude encaminhá-lo para uma internação, porque é proibido por lei, e eu tive que encaminhá-lo para um centro de recuperação e deixá-lo lá alguns dias. Eu o levei a um neurologista. Ele foi a um neurologista, foi a um psiquiatra, e ele está sendo medicado. Ele está sendo medicado e está passando por um tratamento agora.
E aí é o que a Aline falou: vem lá de trás, vem de pai agressor, vem de uma família de homens agressores, de homens machistas que acham que mulher não tem voz, que mulher tem que se sujeitar a tudo o que ele quer, tem que se sujeitar a todos os caprichos dele.
Estou vendo aqui a Leny, que é lá da Baixada. Eu tenho uma admiração pela sua história, pela sua luta e sua garra.
O que mais me preocupa hoje no Rio de Janeiro são as mulheres das comunidades, que não têm voz, que são agredidas e que vão às delegacias, e até são humilhadas nas delegacias, ou são tratadas com um descaso terrível. As mulheres das comunidades precisam disso aqui que a Sâmia está fazendo, precisam de vozes para falar por elas, para gritarem por elas, para pedirem socorro por elas. Essas agressões precisam acabar, e nós estamos vendo que elas estão crescendo. Em vez de diminuir, esse número só cresce, e está crescendo demais. Esta Comissão, tenho certeza, vai fazer um trabalho excepcional.
A Sâmia é uma guerreira que, quando pega alguma coisa, vai até o fim! Então tenho certeza de que, com todas as suas parceiras, ela vai conseguir fazer um trabalho excepcional nesta Comissão em defesa da mulher.
Como foi muito bem falado aqui, há também o enfrentamento da violência nas escolas. As meninas sofrem muita violência nas escolas, de todo tipo. Os meninos, que já vêm com esse tipo de ensinamento machista de casa, acham que podem passar a mão nelas, acham que podem empurrá-las, acham que podem bater nelas, acham que podem agarrá-las na marra, ou beijá-las na marra. É tudo na marra, não é?
A SRA. PRESIDENTE (Sâmia Bomfim. PSOL - SP) - Muito obrigada, Deputadas.
Ouvi-las falar foi me emocionando na verdade! É aquela coisa: nossa, lá em Minas, elas vivem o que nós estamos vivendo aqui! E é lógico que a situação do CDCM, do Centro de Defesa e de Convivência da Mulher é um pouco diferente, mas as histórias das mulheres, infelizmente, são as mesmas.
É isso. Eu digo que é visceral. Nós estamos discutindo isso não por acaso. Nós estamos comprometidas, e é pela vida das mulheres que nós fazemos isso.
Estou coordenando, há 3 anos e meio, um centro de defesa e de convivência de mulheres que é uma política pública do Município de São Paulo.
Diferentemente da Casa Tina Martins, que foi uma iniciativa das mulheres que não têm recursos, esse é um serviço que está dentro da Pasta da Assistência Social do Município, que tem conveniamento com uma organização, uma OSC, a Associação Cultural Nossa Senhora, e recebe um valor mensal desse conveniamento, para executar o serviço.
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Eu vou compartilhar a experiência e ao mesmo tempo vou trazer alguns problemas, porque acho importante. Se pudermos replicar, vamos replicar a experiência já podando o que entendemos que não está dando certo.
Acho que sobretudo é preciso dizer que esse não é um serviço de abrigamento de mulheres — há uma diferença —, que é um serviço de acolhimento, de atendimento. Se há necessidade de abrigamento, nós encaminhamos as mulheres para o abrigo. Às vezes as pessoas confundem isso. Esse conveniamento do Município é para o atendimento de cem mulheres diferentes, ao mês. Eu digo isso porque é diferente da ocupação da casa, de dizer: "Olha, ela veio todos os dias, durante 1 mês, durante 20 dias". Eu não contabilizo isso. Só vou contabilizar essa mulher uma vez.
Eu acho importante falar o valor desse conveniamento, até para começarmos a mensurar... Quando eu ouço a Indira trazer a experiência de que tudo é feito com questões voluntárias — "fazemos lá, arrecadamos dinheiro e tal" —, mas recebe encaminhamento do Estado, do Município e de fora — e você falou que recebeu contato da embaixada —, acho isso muito perverso. Então, no CDCM, que é o Centro de Convivência, mensalmente recebemos o conveniamento, no valor de 34 mil, setecentos e um pouquinho. São números públicos, estão no Diário Oficial.
A composição da casa: temos sete trabalhadoras. Então, desse valor, quase 60% são destinados ao pagamento dos salários. Ainda bem que somos CLT, apesar de tudo. E há os encargos trabalhistas. Temos a coordenação — eu estou na coordenação —, contamos com uma advogada, uma psicóloga, uma assistente social, uma orientadora socioeducativa, uma auxiliar administrativa e uma agente operacional. Então, essa é a composição da casa.
Infelizmente, nem todos os serviços — e na cidade de São Paulo temos 15 CDCM — contam com vigilância. Aqui eu destaco a importância de haver uma vigilância, não necessariamente armada. Dizemos o que lá? Que é uma casa que só recebe mulheres. Então, essa vigilância também é feita por mulheres. Não adianta falarmos que questões biológicas vão modificar e que precisamos ter homens vigilantes. Enfim, essa vigilância é paga pelo conveniamento, diretamente da Prefeitura, e o aluguel da casa também.
Falei isso para pensarmos em custos. Eu acho importante sabermos disso. É suficiente esse valor? Não. Se vocês forem pensar em sete trabalhadoras, em 60% de 34 mil e um pouquinho mais, verão que sobra muito pouco para pagarmos pela alimentação das mulheres — porque essas mulheres fazem atividades na casa; quando elas vão, sempre fazemos um lanchinho, uma refeição com elas —, para a compra de material pedagógico, pagamento de transporte, compra de material de escritório, manutenção da casa e várias outras coisas que vocês podem imaginar. Todas elas visando a quê? Atender às mulheres da melhor maneira.
Acho importante pensarmos que, por mais que seja um serviço em que executamos uma política pública, ela não veio de graça.
As mulheres brigam muito, brigaram muito, e ainda brigaremos muito. A Sâmia, que estava lá na Câmara, sabe que a todo momento sofremos ataques. Atualmente, um decreto propõe a redução do valor desses conveniamentos. Consequentemente, isso vai afetar o serviço que é prestado.
Eu falei que o convênio é para o atendimento de cem mulheres. No ano passado, tivemos uma média de 135 atendimentos por mês. Com isso quero dizer que já estamos trabalhando acima da proposta do conveniamento.
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Eu queria trazer também o recorte da especificidade do serviço. Estamos localizadas em Guaianases, que está na periferia, na Zona Leste de São Paulo, quase na divisa com Ferraz de Vasconcelos, outra cidade que praticamente não tem nenhuma política específica para mulheres articulada, uma cidade bastante empobrecida. Estava consultando alguns dados. A Secretaria — quando havia — de Igualdade Racial do Município fez um levantamento da população negra. Cidade Tiradentes, que é o bairro vizinho, e Guaianases estão localizados como a terceira e a quarta maiores populações negras da cidade de São Paulo. Consequentemente, qual é o perfil das mulheres a que atendemos? Dois terços dessas mulheres são mulheres negras, também por autorreferência pretas e pardas. Conforme a Indira trouxe, como é autorreferência, por mais que elas se identifiquem às vezes brancas... Eu faço a pergunta, e elas respondem: "Olha, eu não sei". Mas eu falo: "Companheira, é autorreferência. Eu não posso te denominar". Mas vemos, visualizamos que são mulheres negras também.
A cidade de São Paulo contou com a instalação da primeira Delegacia da Mulher em 1985. Contamos também com a instalação do primeiro serviço municipal que tinha a proposta de atendimento integral às mulheres, a Casa Eliane de Grammont — isso aconteceu em 1990 — e com a criação do abrigo sigiloso, acho que da Casa Lenira, em 1991, se não me engano, no ano seguinte.
Vou fazer um pequeno recorte a respeito do que fazemos dentro do serviço — se é para compartilharmos coisas boas, já pontuando algumas coisas. Trabalhamos com esse corpo de profissionais que eu apresentei, fazemos atendimentos individuais das mulheres com profissionais da psicologia, do direito e da assistência, trabalhamos de uma forma mais coletiva o espaço de convivência. Temos um valor para a contratação de oficinas. A ideia dessas oficinas é a de trabalhar coisas que a equipe das profissionais e as rodas de conversa às vezes não conseguem trabalhar. Então, desenvolvemos outras coisas. Por exemplo, lá temos contratada atualmente a musicoterapia. Qual é o resultado disso? As mulheres fizeram canções. Mas, além da letra, elas fizeram arranjos. Elas estão experienciando alguns instrumentos musicais. A companheira que dá as aulas de musicoterapia registrou a primeira vez que uma mulher ousou pegar o violão, esta semana, depois de 1 ano de atividade, também rompendo com algumas barreiras que, para nós, parece que estão dadas. Imagina! Pegar um instrumento? O que é para uma mulher que foi subjugada a vida inteira, que ouviu dizer que não valia nada, conseguir musicar algo, pegar um instrumento? Toda hora falavam que ela era incapaz. Tivemos outra experiência: de uma companheira que lançou um livro. Foi uma questão da casa, de colaborarmos. Ela perguntou: "Será que eu consigo?" Eu falei: "É claro! Vamos lá!" Ela lançou um livro. Por causa do exemplo dela, muitas outras já me deram uns manuscritos para ler. Outra companheira quer lançar o livro dela também, já que a companheira falou que tínhamos ajudado, estimulado.
Também temos oficinas de comunicação.
As mulheres fizeram um registro de suas histórias nessas oficinas. E aí fica também aberto o convite: se alguém quiser financiar, nós estamos precisando editar e publicar essas histórias delas. Com os ataques à cultura, nós ficamos com menos acessos a editais de cultura para poder fazer isso. E elas também estão fazendo fuxico — artesanato —, uma coisa que geralmente se destina às mulheres.
Entendemos que a mulher tem que ter direito a emprego com carteira assinada. Então, tentamos trabalhar várias questões, como fazer o EJA, elevação da escolaridade, inserção na escola. Temos também oficinas de artesanato. Nós começamos com algumas coisas que elas podiam às vezes elaborar e vender, mas hoje elas estão fazendo introdução às artes plásticas. Elas estão trabalhando com aquarela, estão fazendo aqueles ensaios de luz e sombra, com uma educadora que é artista plástica. E isso com um pouquinho de dinheiro que nós temos porque entendemos que temos que selecionar bem isso. Então, tem essa parte, tanto o atendimento individual como o espaço coletivo.
Além dessas oficinas, nós fazemos o quê? Nós também propomos rodas de conversa. Durante todo o processo, quando elas estão vendo, na televisão, as coisas que estão acontecendo, nós fazemos reuniões para discutir isso, o que significa a reforma da Previdência, o que significam esses ciclos de violência. Então, nós vamos, de forma bastante ampla, trazendo essa comunicação com elas e desmistificando algumas situações, como questões de direito à saúde e também direitos sexuais reprodutivos. Nós conversamos com elas sobre isso, porque entendemos que elas são agentes de sua transformação.
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A nossa perspectiva lá no serviço trabalha com o protagonismo das mulheres. Entendemos que esses serviços precisam ter perspectiva de gênero porque às vezes há um serviço para as mulheres sem perspectiva de gênero, e não conseguimos modificar muito o cenário. Eu tenho uma amiga que fala da porta giratória dos serviços de assistência: a mulher não consegue sair porque todo mundo decide o que ela tem que fazer e dá a receita de bolo para ela. Nós trabalhamos numa outra perspectiva. Quando ela entra no serviço, o serviço de demanda espontânea — ela pode aparecer lá, passou na frente, entra, ou pode ser encaminhada por outros serviços da rede de saúde e educação —, ela é quem vai dizer o que ela necessita para sair da situação de violência. Nós fazemos essa escuta, que tem que ser qualificada e não julgadora. E nós vamos trabalhar como um instrumento para essa mulher, a fim de ampliar o leque de alternativas para ela sair da situação de violência.
Então, é diferente a lógica de ela chegar e eu falar: "Agora você tem de ir a uma delegacia, fazer o registro da ocorrência e seguir toda uma cartilha". Para muitas delas, a delegacia não é uma alternativa. Por quê? Porque o filho foi assassinado, porque o Estado se apresenta sempre com a face mais dura. Eu estou falando de mulheres negras da periferia. Então, não é estranho que o Estado não represente proteção, o Estado trabalha em outra lógica com elas. E, pensando nessa perspectiva do protagonismo, ela é quem vai dizer qual é a demanda dela.
Nós entendemos que o enfrentamento à violência passa por uma ampliação de acesso a políticas públicas, mas políticas públicas robustas. E quais são elas? Eu diria que essa mulher precisa de moradia. O que estamos fazendo em relação à moradia? Não são raras as histórias que ouvimos de mulheres de que elas permanecem na situação de violência porque elas não têm um teto. Eu estou me lembrando de uma história em que a permanência na situação de violência por conta daquele teto resultou em mais violência.
Além da violência física contra ela, existiu a violência sexual contra a filha.
No que diz respeito à política de moradia e transporte, nós falamos que ela tem que ir à delegacia, ao IML, levar os filhos não sei aonde, elevar a escolaridade, não sei o quê. Alguém pergunta para ela se ela tem o dinheiro do transporte. Nós não temos o bilhete social. Nós temos que financiar esse transporte ou ela precisa pedir carona. E pedir carona impacta nessa subjetividade dela, que já sofreu tanta violência e que está, enfim, tentando se construir. E isso poderia não ser nenhum problema para nós: "Olhe, hoje eu não tenho". Mas imaginem como é todo dia ter de andar de carona, e todos os vizinhos do bairro saberem que ela vai pegar carona, que nunca paga. Isso também vai afetando essa mulher.
Em relação à política de saúde, a Indira trouxe a questão de trabalhar em rede. Isso é fundamental. Embora seja um serviço municipal, há fragmentação da rede, uma rede enfraquecida, porque os outros serviços não trabalham na mesma perspectiva. Às vezes, é isso. Como é o acolhimento dessa mulher? Quando se identifica a violência — eu não vi, não ouço e não vou nem falar muita coisa porque eu não sei o que fazer —, geralmente os casos são muito complexos. E não dá para achar que, pelo amor ou por que você a abraçou, ela vai superar a situação de violência. Nós precisamos de profissionais qualificados e articulação de rede.
Nós vemos muita conduta inadequada que coloca essas mulheres em mais situação de violência. E nós sabemos que os feminicídios são mortes evitáveis. O Estado é responsável, porque a omissão do Estado também pode culminar na morte dessas mulheres.
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Eu acho que há duas lógicas: a proteção da mulher e dos filhos e a punição do agressor. Nós temos que ver que são coisas que não necessariamente andam juntas. Por quê? No caso da punição, se eu tiver a lógica punitivista, primeiro, eu vou pedir mais delegacia e mandar que essa mulher faça o registro da ocorrência. Quanto à medida protetiva, a folha da medida protetiva não protege a vida dessas mulheres. É preciso fazer o quê? Privilegiar, investir na proteção e na prevenção. A proteção vai dizer o quê? Vamos pensar no protagonismo dessa mulher, no espaço de escuta. E, às vezes, verificar o que ela precisa para sair da situação de violência é de uma passagem para ir morar com os familiares dela, retornar a um local que o agressor não sabe onde é. E isso dá muito mais proteção e, às vezes, garante a vida dessa mulher e das crianças do que ela ir para um abrigamento sigiloso, imaginando que não mudamos muito de endereço, que já fica conhecido. Há uma revitimização dentro desses espaços. Ela tem um tempo muito curto para ficar lá. A política pública não robusta não favorece a saída e a emancipação dessa mulher do serviço de abrigamento.
Eu trouxe algumas ideias, mas eu acho que há muitas coisas sobre as quais podemos nos debruçar. O espaço, por exemplo, do CDCM, que eu tive a experiência de coordenar, é muito potente. E ele é potente porque falamos de coletividade. As mulheres que utilizam os espaços de convivência conseguem se fortalecer para fazer esses enfrentamentos e definir qual é a medida de enfrentamento para elas, que não necessariamente é procurar o poder de polícia porque às vezes no bairro dela, na rua dela, a polícia não entra. E isso aumenta a violência que ela pode sofrer naquela região.
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Então, eu estou à disposição. Não falei quase nada do que eu tinha para falar, mas acho que é importante compartilharmos.
Se eu pudesse deixar registradas duas coisas para nortear os trabalhos aqui, elas seriam: o protagonismo das mulheres, com uma escuta sem prévio julgamento delas; e a forma como devemos pensar a atuação em rede, uma forma robusta, com o desenvolvimento de políticas públicas sob a lógica da prevenção e da proteção, envolvendo moradia, saúde, educação, creche para as crianças, transporte. Enfim, seria uma proteção muito mais ampliada do que demandar só a punição dos agressores.
A SRA. PRESIDENTE (Sâmia Bomfim. PSOL - SP) - Muito obrigada, Rute.
Quero apresentar a oradora de forma mais apropriada, porque eu passei a palavra a ela muito rapidamente.
Além de Coordenadora do Centro de Defesa e de Convivência da Mulher Helena Vitória, a Rute Alonso também é formada em Direito pela PUC de São Paulo; Vice-Presidente da União de Mulheres do Município de São Paulo; Cocoordenadora do Projeto Promotoras Legais Populares; e ex-Conselheira do Conselho da Diversidade Sexual do Município de São Paulo.
Agora, eu vou passar a palavra para a Sra. Joanna Burigo, Coordenadora Pedagógica do Projeto Emancipa Mulheres, Escola Feminista e Antirracista do Rio Grande do Sul.
A Joanna é Fundadora da Casa da Mãe Joanna — Comunicação e Educação Feminista sobre Gênero e atuou no mercado de publicidade e marketing no Brasil e no Reino Unido, onde trabalhou como professora. Ela é cofundadora do Guerreiras Project e Gender Hope, Coordenadora Pedagógica do Emancipa Mulher e vem se dedicando a projetos feministas desde que completou seu mestrado em Gênero, Mídia e Cultura pela London School of Economics. Joanna é também organizadora de dois livros: o Tem Saída? — Ensaios Críticos sobre o Brasil e o Novas Contistas da Literatura Brasileira, lançados pela Editora Zouk, e escreve regularmente para a revista CartaCapital.
Quanto ao Tem Saída?, eu gostaria de salientar que a Deputada Sâmia é uma das autoras do livro e nos respondeu imediatamente quando a convidamos para fazer parte do projeto.
O Tem Saída? é o primeiro livro sobre política, na história deste País, a ser escrito e organizado 100% por mulheres. E temos uma novidade boa: está em produção no momento o Tem Saída? Volume 2, que trata do tema LGBT. Vai sair este ano ainda.
Boa tarde a todas e a todos os presentes. Boa tarde aos que participam desta Mesa comigo nesta audiência pública sobre experiências bem-sucedidas no acolhimento de mulheres em situação de violência.
Eu preparei um roteiro porque a Emancipa Mulher não necessariamente acolhe diretamente mulheres em situação de violência, mas tem algumas estratégias em relação a isso. Então, para não perder o prumo do que eu gostaria de falar, fiz um texto elaborado. Eu não costumo fazer isso, falo de improviso, mas achei por bem fazer assim.
Como a Sâmia disse, meu nome é Joanna Burigo. Eu sou Coordenadora Pedagógica da Emancipa Mulher, uma escola de formação feminista e antirracista sediada em Porto Alegre, embora também opere em outras praças no Rio Grande do Sul.
A escola faz parte da Rede Emancipa, uma rede de educação popular para jovens e adultos de baixa renda — temos representantes da Emancipa presentes aqui na sala hoje. Ela funciona no Brasil inteiro, pois é estabelecida como rede. E, no Rio Grande do Sul, ela é uma ONG presidida pela Luciana Genro desde a sua fundação, em 2011.
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Promovemos, na Emancipa Mulher, debates e aulas abertas sobre todas e quaisquer temáticas pertinentes aos estudos feministas de gênero e raça — todas! Não existe pauta e agenda feminista, nem de raça. Na verdade, todas as pautas são de interesse de pessoas com corpos que são atravessados por questões de opressão estrutural.
Também damos, hoje em dia, aulas de defesa pessoal. Achamos importante inserir essa nova categoria de educação. E também damos assistência jurídica para mulheres, além, claro, do curso base de formação, que se chama Laudelina de Campos Melo.
O curso base, o Curso Laudelina de Campos Melo, foi desenvolvido por mim e pela Winnie Bueno em 2017. Posteriormente, ele foi atualizado por mim e pela Carla Zanella Souza. Hoje somos nós duas que lecionamos. Este ano vamos fazer a formação de novas professoras. Então, peço a quem pertencer à Rede Emancipa que entre em contato conosco, porque vamos formar outras professoras para espalhar pelo Brasil.
É com um orgulho muito grande que estou aqui hoje representando e falando sobre essa nossa escola. E, conforme o desenho desta audiência pública, vou falar com maiores detalhes sobre as nossas experiências, não só no acolhimento de mulheres em situação de violência, mas, sobretudo, nas nossas estratégias de ampliação do acesso a ferramentas do que chamamos de empoderamento intelectual, físico e jurídico. Nós operamos nessas três frentes dentro da Emancipa.
Antes disso, em nome de toda a nossa competente, potente e maravilhosa equipe, eu gostaria de agradecer aos gabinetes das Deputadas Federais Áurea Carolina e Sâmia Bonfim pelo convite para estarmos aqui. Ficou todo mundo muito animado quando o convite chegou.
Eu queria também saudar todas as envolvidas nessa iniciativa belíssima de fomento ao diálogo entre Parlamentares e membros da sociedade civil, particularmente a Flávia Tambor, que foi de uma eficiência afetuosa muito grande e articulou a nossa vinda para cá. Muito obrigada, Flávia.
É importante o reconhecimento institucional das nossas boas práticas. Isso é revigorante, em um momento como o que estamos passando, um momento de vilipêndio à educação. Amanhã teremos a paralisação geral em defesa da educação. Nós dizemos que, para a Rede Emancipa, para a ONG Emancipa Rio Grande do Sul e para a Emancipa Mulher, a nossa arma hoje, mais do que nunca, é a educação. Então, é muito importante participar também deste momento de falar sobre acolhimento e na perspectiva de mudança cultural a partir da educação de base. Acho que é isso o que fazemos com mais competência na Emancipa Mulher.
E é com o coração muito quente que participamos de eventos que promovem essa interlocução, principalmente entre setores de mundo cuja visão dá primazia ao diálogo e à construção coletiva de saberes, porque essa é uma marca muito forte da Emancipa Mulher. É muito importante construir em conjunto a formulação interdisciplinar de saberes e saídas estratégicas para as múltiplas crises que mulheres e pessoas não brancas do Brasil enfrentam.
Costumamos dizer na Emancipa Mulher que a ferramenta interseccional, a ferramenta teórica feminista que usamos, não existe apenas para tornar em fetiche o aprofundamento das opressões vividas por mulheres não brancas, mas também para revelar os privilégios daquelas que estão em situações de maiores benefícios e maiores benesses em razão das estruturas sociais.
Então, aplicamos a ferramenta interseccional da Emancipa em tudo o que fazemos como via de mão dupla. Eu penso na ferramenta interseccional como uma engenhoca vitoriana, na qual você ajusta a lente e vê mais ou menos o aprofundamento de certas opressões. Mas ela serve também na marcha à ré, ou seja, serve para vermos onde nos situamos no que a Patricia Hill Collins chama de matriz de privilégios, para vermos como atuar, abrindo mão de certas benesses ou empregando as benesses que temos de forma a ampliar o acesso de todos e todas a mais dignidade, mais recursos e mais acesso à Justiça.
Eu saúdo também as demais participantes desta audiência, agradecendo a elas e cumprimentando-as por essa nossa insistência em privilegiar um trabalho que visa possibilitar a sobrevivência e ampliar a dignidade das mulheres em uma sociedade que não é apenas atravessada por opressão de gênero, mas fundada nela.
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Sabemos que a opressão de gênero é o que estrutura a nossa sociedade. E sabemos — nós que trabalhamos com isso e que estamos aqui — que operar de encontro a um sistema de injustiças que se aprofundam exige muita coragem e determinação. E a sociedade falha não apenas em não reconhecer e admirar, mas também em não valorizar a fibra das mulheres que lutam.
Quando falamos em orçamento, é mais ou menos disso que estamos falando, é desse valor que estamos falando.
Eu queria agradecer, também, à Áurea, que, nos textos e promoções discursivas que faz, nunca se cansa de falar sobre o patriarcado, essa estrutura que quase ninguém fora do feminismo entende e que é tão importante salientarmos, porque é uma estrutura que está, sim, presente. Não se trata de um monte de homens em um castelo na Escócia determinando nosso futuro e dizendo: "Ha, ha, ha!" Isso existe como rede de relação de poder que mantém e sustenta o poder nas mãos de homens brancos e está cada vez mais fácil de enxergar, usando menos a teoria e mais os olhos. É bem fácil de enxergarmos a existência desse patriarcado.
Nossos cumprimentos, em nome da Emancipa Mulher, à Casa Tina Martins, ao CDCM Helena Vitória, ao Programa de PLP de São Paulo, à ONG Criola — que, eu imagino, falará depois desta Mesa —, ao Fórum de Mulheres Negras da Baixada e às nossas conterrâneas da Casa Mirabal, que é um baita de um projeto de acolhimento às mulheres lá no Rio Grande do Sul, com a qual a Emancipa tem muito orgulho de, volta e meia, fazer algumas parcerias pontuais.
Em 2017, teve início o Curso Laudelina de Campos Melo, o primeiro da Emancipa Mulher. Como eu disse, a escola foi idealizada pela Luciana Genro, após ter lido Mulheres, Raça e Classe, da Angela Davis, e ter se dado conta de que a estrutura de educação popular que ela já tinha através da ONG Emancipa poderia muito facilmente acomodar um curso de formação bastante teórico sobre questões feministas e antirracistas.
E, por isso, ela chamou a mim e à Winnie Bueno para desenharmos esse curso a partir das perspectivas de gênero e antirracistas e também da Comunicação e do Direito, porque eu venho da Comunicação, e a Winnie, do Direito. Seria uma combinação bem ampla de saberes teóricos a respeito dessas questões, para transformarmos em um curso de formação mesmo de mulheres, para qualificar a conversa e aprimorar as discussões que temos a partir de preceitos teóricos dos feminismos. Nós, obviamente, dizemos "dos feminismos" e não "do feminismo", pois mulheres não são um monólito. Então, não surpreende que os feminismos venham atravessados pelas diferenças que existem entre nós.
A Emancipa é também vinculada ao Cursinho Popular Pré-Universitário, como eu disse. Nós temos trabalhado em uma série de atendimentos em uma série de frentes. E a Rede Emancipa não opera somente nos Cursinhos Populares Pré-universitários, que é a marca forte da Rede Emancipa. Existem outros projetos vinculados à rede que são importantes e que devemos salientar. Por exemplo, o Projeto Emancipa Esportes, com a Joana Maranhão, um desdobramento, em parceria com a Rede Emancipa, da ONG que pertence à Joana, a Infância Livre. Essa parceria possibilita a oferta de aulas de natação e judô para crianças da rede pública, mas também, o que é igualmente importante, aulas de educação sexual como forma de prevenção a situações de abuso, um tema caro para a Joana Maranhão e para todos nós. Isso é fomentado pela Emancipa em Minas Gerais.
E, também, desde o ano passado, temos a Universidade Emancipa, que surgiu como um espaço de formação política, pedagógica e cultural para que aqueles conhecimentos que estão aprisionados nas torres de marfim das universidades sejam espalhados para professores também da rede pública e da Emancipa.
Essa lógica é muito parecida com a lógica da Emancipa Mulher. Nosso trabalho é radicalmente teórico na Emancipa Mulher, e o que fazemos é a tradução desses preceitos teóricos para um público que não vai necessariamente se dedicar a isso, como eu me dediquei, porque tive o privilégio a vida toda para fazer um mestrado exclusivo em gênero. Então, sem simplificar os conceitos, abordamos as temáticas pertinentes, a partir, sobretudo, das perspectivas dos feminismos negros.
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As atividades da Emancipa Mulher são superdiversas. Estimamos que, no total, quase 5 mil mulheres já tenham passado pelos nossos eventos desde 2017, o que é bastante gente.
Hoje, como eu disse, estamos direcionadas para o empoderamento intelectual, físico e jurídico, mas estamos pensando em acoplar em breve o empoderamento psicológico também, a partir do trabalho de psicólogas voluntárias, que prestarão atendimento gratuito às mulheres que passam por nós.
Como contemplamos cada uma dessas frentes? O empoderamento intelectual, a partir de uma multitude de atividades pedagógicas que fazemos, que vão das aulas abertas ao Curso Laudelina. O empoderamento físico tem sido feito basicamente pelas aulas de defesa pessoal, que são dadas pela Juliana Campos e pela Daniele Pinho, duas feministas lutadoras de jiu-jítsu que descobriram, por meio de pesquisa — e fascinaram a nós todas —, que o jiu-jítsu na verdade foi a luta que as sufragistas usaram para fazer o cordão de proteção. Então, a Edith Garrud, uma senhorinha vitoriana de 1 metro e 50 centímetros treinou 40 sufragistas para segurarem o cordão contra os homens que estavam tentando impedir que elas se manifestassem. Eu tenho muito orgulho de dizer que o jiu-jítsu é nosso antes de ser dos pitboys. Dá licença, mas o feminismo chegou primeiro, como sempre.
O terceiro empoderamento, o jurídico, vem em forma de uma parceria que fizemos com algumas advogadas voluntárias do Rio Grande do Sul, que oferecem efetivamente assessoria jurídica em casos de violência doméstica e na área de família. Os mutirões acontecem um sábado por mês, quando atendemos uma série de mulheres que vêm com questões diversas atravessadas por questões de gênero.
Realizamos aulas abertas, painéis, debates sobre machismo e racismo, feminismo e antirracismo. Já discutimos filmes e livros, já discutimos cultura pop, arte e urbanismo e, é claro, temas democráticos, nosso curso básico, o Laudelina, que acontece todos os anos. A primeira edição aconteceu em 2017, quando começamos a fazer as aulas abertas e debates, porque começamos a ser chamadas para fazer isso.
O que é importante na Emancipa Mulher é que o nosso método pedagógico é esse de que falei no começo: o diálogo e a participação das cursistas. Isso é central para o método pedagógico emancipatório de toda a rede, porque entendemos que os saberes são múltiplos, e o saber teórico complementa o saber da vivência. Construímos o conhecimento das aulas junto com as nossas alunas. Então, apesar de ter, obviamente, aquele formato clássico da professora em sala de aula, o método é bastante dialógico.
As aulas são todas abertas a todas as pessoas, mas o Curso Laudelina de Campos Melo é exclusivo para mulheres. Percebemos que as tensões raciais já dão conta de fazer com que não precisemos de homens nesse curso para tratar de tantas tensões que precisamos elaborar juntas. E ele tem sido bem-sucedido por causa disso. As mulheres se sentem seguras para fazer os confrontamentos das diferenças entre nós, num espaço completamente livre, pelo menos, de machismo e misoginia.
Por que chamamos o nosso curso de Laudelina de Campos Melo? Porque sabemos que as implicações das discriminações múltiplas que as mulheres sofrem vão afetar mulheres diferentes de formas diferentes. A Laudelina de Campos Melo, muitos anos atrás, já tinha se dado conta disso. Ela fundou o primeiro sindicato de empregadas domésticas e lutou pelo fim da precariedade do trabalho doméstico, que efetivamente, neste País, é ocupado por uma maioria de mulheres negras por gerações. E uma das formas como ela estimulava essas mulheres a buscarem seus direitos era a educação. Nós sempre entendemos na Emancipa que ativismo e educação andam de mãos dadas. Nós não podemos pensar em um sem o outro.
Em 2018, depois da segunda edição do Curso Laudelina, também fizemos um evento que chamamos de Feminismo em Debate, em um tour que aconteceu pelo interior do Rio Grande do Sul.
Estivemos em Canoas, Novo Hamburgo, Santa Maria, Bagé, Pelotas, Passo Fundo e Erechim. E todos os eventos lotavam a ponto de haver gente sentada no chão, o que nos fez perceber a urgência de o debate feminista ser levado para fora das capitais também. As pessoas vinham muito interessadas em saber sobre isso, no contexto delas. Em todos os debates, íamos com um tema mais ou menos pronto, mas, como nosso método é dialógico, percebíamos que as perguntas que vinham eram muito peculiares de cada região.
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O que foi muito interessante no Feminismo em Debate foi o legado: em cada uma dessas cidades, criou-se um micronúcleo Emancipa, com meninas — e estou falando de meninas mesmo, porque são muito jovens — trabalhando para fazer grupos de estudos e dar aulas, solicitando a nós recursos e materiais.
Percebemos, então, que, no momento em que se oferece uma estrutura mínima, é muito mais fácil para as pessoas aderirem a essa discussão. Isso não apenas aprimora a educação, mas também fortalece a rede, e é isso que temos dito. As nossas cursistas acabam voltando para a Emancipa Mulher de uma série de formas, seja como voluntárias nas nossas aulas, seja como advogadas voluntárias. A Tainá Mota do Nascimento foi cursista em 2008 e volta agora como advogada voluntária.
Outras cursistas levam elas mesmas às suas comunidades, aos seus centros, aos lugares onde elas têm entrada, esse conhecimento e esse método de diálogo, de construção conjunta de saberes, interseccional, a partir do diálogo.
O que percebemos é isto: não é apenas uma escola. Aliás, não dá nem para dizer "apenas uma escola", porque é muito mais do que uma escola, é realmente a construção conjunta de mulheres de várias frentes para produção de saberes coletivos e estratégias de saída, estratégias para pensar a respeito de como podemos nos organizar perante o momento tão difícil que estamos passando na nossa história.
A terceira edição do curso vai acontecer no segundo semestre de 2019. Como eu disse, este ano também entra a formação de professoras — estou no momento trabalhando na cartilha —, para podermos ampliar ainda mais o alcance da Emancipa. Obviamente, vamos continuar oferecendo as nossas aulas abertas e as aulas de defesa pessoal, inclusa aí uma aula que não tem nada a ver com acolhimento de mulheres, mas que vale a pena mencionar. É uma aula que eu e a Nina Becker, que é professora de Sociologia da Emancipa, damos. Chama-se Machismo e Assédio. É uma aula direcionada a homens, e tem sido muito interessante ver a presença deles no curso, ver o tipo de questionamento que eles têm. Como somos dialógicas, entendemos que é preciso fazer não somente combate e confrontamento, mas também, muitas vezes, estimular diálogos com pessoas que estão efetivamente querendo ser aliadas na luta. Isso é importante.
Como eu disse, nossas cursistas levam esse jeito Emancipa para frente. É muito interessante observar tudo isso porque contemplar a intersecção de opressões que afetam as mulheres de formas diferentes para nós não é um problema. Para nós, na verdade, esta é a ferramenta, esta é a solução: partir do pressuposto de que ninguém é igual e de que as diferenças podem, sim, ampliar e amplificar o nosso alcance. Para o Emancipa Mulher esse é o caminho, é o nosso trajeto, é o que tentamos fazer.
Sabemos que gênero e desigualdade racial são desafios superpersistentes no Brasil, e aqui é impossível abordar um sem abordar o outro. A violência sexual é uma constante. As violações de direitos fundamentais têm ficado cada dia mais brutais, e os trabalhos domésticos — os não remunerados sobretudo —, traduzem-se em maior ônus para meninas e mulheres, sobretudo meninas e mulheres não brancas.
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O Brasil é hoje o quarto país com maior número de feminicídios no mundo. E sabemos que essas opressões não existem como complemento uma da outra. Elas se reforçam e se potencializam.
Visamos, então, honrar o legado da Laudelina de Campos Melo, da Angela Davis e de tantas outras mulheres, cujo conhecimento e boas práticas vêm formando as nossas estratégias. E buscamos ampliar o acesso ao conhecimento formal sobre a questão de gênero, mas também enriquecer processos pedagógicos, não só para aparelhar a Emancipa, mas também para poder passar isso adiante.
O feminismo que queremos ver potencializado é interseccional. É por isso que estimulamos práxis feministas em que os privilégios cedam lugar não à empatia, porque empatia é difícil ter, mas à alteridade mesmo, em que compartilhamentos francos e solidariedade nos permitam reconhecer as nossas diferenças, porque acreditamos que abraçar a diversidade não é um problema, e sim a própria solução.
A educação emancipatória e os diálogos que pretendemos construir no âmbito da Emancipa e agora com vocês querem revelar o quão naturalizadas são essas estruturas de poder — honroso é o patriarcado, por isso é tão importante falar nisso —, para que essas estruturas de discriminação por gênero e raça sejam desenraizadas e para que possamos plantar no lugar disso maior entendimento para colher no futuro estratégias de saída que sejam justas e inclusivas.
(Intervenção fora do microfone.)
A SRA. PRESIDENTE (Sâmia Bomfim. PSOL - SP) - Até porque as experiências boas precisam ser mais faladas e compartilhadas mesmo.
(Intervenção fora do microfone.)
A SRA. PRESIDENTE (Sâmia Bomfim. PSOL - SP) - Eu fiz assim também. Fique tranquila!
Pessoal, vou pedir que a Deputada Áurea me substitua aqui rapidinho, por favor, para fazermos um revezamento, na verdade, porque agora eu vou à Comissão do FUNDEB e depois à Comissão Especial da Previdência. Peço desculpas, mas o trabalho aqui é assim mesmo. Em seguida eu retornarei para seguirmos com o debate.
A SRA. PRESIDENTE (Áurea Carolina. PSOL - MG) - Obrigada demais, Joanna.
Quero começar como nós fazemos todo o nosso dever de casa quando a negrada está entre os seus. Começo saudando as nossas irmãs que estão aqui, dizendo: "Um sorriso negro, um abraço negro traz felicidade...". Sou negra aposentada, mas hoje não há emprego, e ficamos sem sossego.
Já foi feita a apresentação, mas queria dizer à Deputada que eu sou Leny Claudino. Se vocês não quiserem me achar na favela Vila Operária, em Duque de Caxias, procurem por esse nome. Se quiserem me achar, procurem por Leninha.
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16:19
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Todas as manifestações que foram feitas aqui anteriormente, todas as intervenções e ações, trouxeram um grande marco técnico, um grande marco a que nós mulheres devemos chegar.
Nós queremos parabenizar as Deputadas, a que está aqui, bem como a Deputada que saiu. Ela disse que nós estamos sendo mortas, exterminadas a toda hora, todos os dias. É por isso que eu vou fazer uma fala de favela, uma fala de mulher favelada, uma fala de quem vê, todos os dias, que essa estatística que temos está muito longe do número de mulheres que são mortas todos os dias.
O número dessa estatística está muito longe do número total de mulheres que saem às 4h30min da manhã para ir para a casa de outra trabalhar, não conseguem assistir à televisão e não sabem o que é feminismo. Elas sabem o que é sofrer violência doméstica todos os dias, toda hora, seja ela brutal, direta, seja ela psicológica. De qualquer forma, nós vimos sofrendo.
E ainda sofremos mais! Nós que conseguimos furar minimamente o bloqueio, que conseguimos estar na universidade, que conseguimos ter formação, que conseguimos ter nosso barraco com uma televisão de 23 polegadas, que conseguimos não ter os nossos filhos e as nossas filhas no tráfico, somos a minoria. A maioria está sendo absorvida.
A companheira Indira mostrou a ocupação que ela fez para criar uma casa. Nós, lá em Duque de Caxias, ocupamos sete prédios na época em que o Carandiru foi derrubado. Ocupamos aqueles prédios e temos mais de mil famílias morando lá. Mas nós mulheres vivemos esse processo de apreensão todos os dias.
Quando a Deputada Áurea e as Comissões criam este debate para vermos no que avançamos, as experiências positivas, somos nós que estamos sentadas lá. Há mulher apanhando do pescoço para baixo para depois sair e fazer faxina. E ela não pode dizer que apanhou. O traficante está ali na porta, e ela não pode falar nada. Ela não chega à DEAM, não chega à casa-abrigo e também não tem medidas protetivas.
Nós temos uma lei, a Lei Maria da Penha, que precisa ser muito mais ampliada. Para isso precisamos das Parlamentares. Hoje, o feminicídio leva o agressor à cadeia, mas a violência doméstica não. O cara paga uma cesta básica, volta e bate de novo. Então, os nossos Parlamentares é que vão construir as leis, junto conosco, junto com a sociedade civil, para realmente darmos proteção real às nossas mulheres.
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16:23
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Eu não quero ser indelicada com as outras pessoas que fazem parte da Comissão, mas, quando a Deputada Áurea Carolina cria este debate, convoca esta Comissão e chama estas Parlamentares, nós precisamos levar estas audiências aos nossos espaços, às rodas de conversa que temos dentro da favela, às rodas de conversa que temos dentro das universidades e das escolas, e chamar verdadeiramente nossas mulheres, porque eu sei que nesta Casa as mulheres sofrem dia após dia a opressão praticada por homens machistas: eles oprimem as mulheres, e muito deles têm rótulo de evangélicos.
Eu sou evangélica, sou da Assembleia de Deus. Há 15 dias, fui à Igreja Universal participar de um debate numa rádio. Eu disse na Igreja Universal, a maior no Rio de Janeiro, na Catedral, que 42% das mulheres evangélicas apanham diuturnamente e sofrem opressão. Nós precisamos discutir, precisamos falar com essas mulheres, nós precisamos ir para lá. Essas mulheres devem ser alvo da nossa preocupação. Até aqui, o Senhor me guardou, e eu respeito todas as religiões. Eu sou mãe de quatro filhos, tenho seis netos e um bisneto. Sou aposentada por uma Prefeitura horrorosa, a de Duque de Caxias, nem salário nos pagam, estão nos devendo. Eu tenho uma filha enfermeira, terceira-sargenta do Exército. Caiu no pau no Exército, durante a eleição passada, para o povo do Exército não votar no Bolsonaro. Nós dissemos a ela: "Vão cortar sua cabeça", mas, mesmo assim, ela foi para o enfrentamento. Dos meus outros filhos, uma é profissional de saúde concursada. Eu fiz muito bolinho e muito angu cortado para vender, catei muita latinha, para dar condições aos meus filhos.
Portanto, nós mulheres hoje falamos para as mulheres, falamos dos nossos avançamos. Avanço é o que estamos tendo nesta Comissão. Este é um avanço pontual, porque as Parlamentares que estão aqui têm esta responsabilidade e estão nos tendo como subsídio para avançar nas leis e nas lutas e para construir mais, para construir a legalização geral do espaço da companheira, para construir o que é nosso.
No Rio de Janeiro, na Baixada, nós temos um CEAM que foi ocupado. Nós estamos brigando pelo retorno do CEAM Baixada. Estamos brigando para que os aparelhos e as equipes possam realmente dar condições àquelas mulheres. Nós estamos brigando pelo CEAM Baixada, em Nova Iguaçu, porque é um projeto que oferece creche, linha de ônibus, linha de trem, o que favorece as mulheres, porque as mulheres não têm nem como chegar... Em compensação, nós temos o Fórum da Baixada, o Fórum de Mulheres em Duque de Caxias, em que nós temos elencada a proposta. Hoje o Governo quer tomar para si, mas nós temos um fórum da sociedade civil que vai à luta, que vai à porta da Defensoria, que bota o carro de som para chamar as mulheres. Qual é a nossa sustentação política? São as nossas Parlamentares, porque nós temos Comissões como esta.
Hoje, dia 14, todos nós estamos com o coração apertado, porque nós perdemos, de forma brutal, covarde, uma grande guerreira. Mas não está longe, não!
Nossa companheira Dani Monteiro, nossa Deputada Estadual mais nova, sofreu, no dia da posse, opressão e teve seu carro pichado. Hoje nós temos nossa companheira Renata Souza, que está sofrendo ameaças porque o Governador do Estado do Rio de Janeiro disse para atirar, primeiro, na cabecinha e, depois, perguntar. Quando a Renata faz alguma denúncia, ela está sendo ameaçada pelos Parlamentares de ter questionado seu mandato. Isto é uma tarefa nossa! Ao sair daqui, cada mulher, cada Parlamentar, cada movimento deve prestar solidariedade à Renata Souza e a todas as mulheres! Nós temos também a Deputada Benedita da Silva, um ícone para todas nós. Ela, por ser principalmente uma mulher preta e uma Parlamentar evangélica, sofre algo semelhante.
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16:27
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Falar da mulher e do feminicídio, falar do que nós estamos sofrendo e do que nós estamos vivendo hoje é falar da nossa história. Quando nós falamos de preto — preto é cor; negro é raça —, estamos falando de tinta forte, da minha companheira "pretinha" aqui. Alguém olha e diz: "Será que é pretinha? Olha o cabelo duro dela!" Nós temos outros esteriótipos que não nos identificam. Dizem: "Olha a nossa bunda!" Hoje eu não tenho um bundão, não, porque eu estou diabética; hoje eu tenho uma bundinha, mas eu já tive um bundão deste tamanho, que nos identifica. Portanto, falar de mulher, falar de mulher preta, falar do que nós estamos vivendo hoje é dizer a vocês que construíram esta audiência: "Parabéns para nós!" E nós vamos cobrar de vocês! Nós somos ruins, nós vamos cobrar de vocês, e nós vamos ter toda a solidariedade!
É muito importante falarmos nestes 15 minutos sobre a mulher, sobre esta audiência, sobre a importância desta grande organização que é o Movimento Negro Unificado — MNU, uma das entidades mais antigas. O MNU fez 40 anos no dia 7 de julho do ano passado — faz 41 anos neste ano. Nós temos uma história e uma trajetória de lutas. Para nós, estar estar aqui em nome do Fórum da Baixada é algo de extrema importância.
Por isso, eu peço licença para quebrar o protocolo, mesmo estando hoje numa condição de saúde muito precária, com problema visual muito grande — eu vou fazer uma cirurgia de retina e catarata no dia 17. Nós do MNU construímos um documento em que solicitamos às Parlamentares e a todos os movimentos a realização de uma audiência pública porque, entre todas as aberrações que o Governo tem feito, uma das piores nós vimos agora, quando fez aquela censura ao Banco do Brasil. Nós fizemos um documento, e eu queria pedir à companheira que está com ele que o lesse e, em seguida, nós o passamos às Parlamentares. Eu vou ficar aqui hoje enchendo a paciência de vocês.
Amanhã, nós vamos ao Senado para realizarmos uma audiência pública e falarmos não somente dessa atrocidade, mas também das ações que o Governo tem tido contra o povo negro.
Cadê a menina que vai ler para mim?
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16:31
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(Pausa.)
O Movimento Negro Unificado — MNU, fundado em 1978, durante a ditadura militar, vem publicamente chamar a atenção da sociedade brasileira, denunciando e reivindicando providências às instâncias competentes dos Poderes Legislativo, Judiciário e organizações internacionais que prezam pela liberdade de comunicação, para que exerçam as ações cabíveis para a revogação imediata da decisão autoritária do Presidente Jair Bolsonaro em proibir a veiculação da propaganda do Banco do Brasil que exibia cenas representando a diversidade étnica e cultural no País a partir da atuação de atores e atrizes negros e negras e de outras etnias e comportamentos. Aliás, o Banco do Brasil, fundado em 1808 pela família real, é uma instituição que deve reparação aos africanos e afrodescendentes, que foram tratados, de forma inumana, como moeda de troca. Esta instituição legalizou o financiamento do escravismo, administrando a exploração das riquezas nacionais da Coroa portuguesa.
O racismo institucional cometido pelo Presidente República feriu o Capítulo V da Comunicação Social, bem como a Constituição Federal em vários princípios que regem a administração pública: "A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo, não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição".
Por outro lado, atacou o Estatuto da Igualdade Social, Capítulo VI, que trata dos meios de comunicação: "Art. 43. A produção veiculada pelos órgãos de comunicação valorizará a herança cultural e a participação da população negra na história do País. Art. 44. Na produção de filmes e programas destinados à veiculação pelas emissoras de televisão e em salas cinematográficas, deverá ser adotada a prática de conferir oportunidades de emprego para atores, figurantes e técnicos negros — e negras —, sendo vedada toda e qualquer discriminação de natureza política, ideológica, étnica ou artística. (...) Art. 45. Aplica-se à produção de peças publicitárias destinadas à veiculação pelas emissoras de televisão e em salas cinematográficas o disposto no art. 44. Art. 46. Os órgãos e as entidades da administração pública federal direta, autárquica ou fundacional, as empresas públicas e as sociedades de economia mista federais deverão incluir cláusulas de participação de artistas negros nos contratos de realização de filmes, programas ou quaisquer outras peças de caráter publicitário".
A SRA. LENY CLAUDINO DE SOUZA - O alerta de que terminou o meu tempo já soou duas vezes, mas vamos entregar o documento à Deputada Áurea e às demais Deputadas, para que elas, conosco, possam construir esta audiência pública. É importante para nós que uma audiência pública tenha um grande desdobramento político e, assim, juntas, possamos fazer este debate e, havendo outras ações, possamos realizar esta audiência.
(Procede-se à entrega do documento.)
(Palmas.)
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16:35
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A SRA. PRESIDENTE (Áurea Carolina. PSOL - MG) - Muito obrigada, querida Leninha. É muito grande o prazer de tê-la aqui! Com certeza, conte conosco.
Convido a Marilia Kayano Morais, coordenadora do Programa Promotoras Legais Populares, de São Paulo. Ela é comunicadora e integrante da União de Mulheres do Município de São Paulo. Foi uma das coordenadoras do Programa Promotoras Legais Populares e trabalha com as demais coordenadoras, em parceria com especialistas, ativistas, coletivos e organizações de mulheres, para fortalecer e expandir o projeto em São Paulo e em outras cidades do País. Ela também faz parte da iniciativa Yayartes, bloco carnavalesco Casa de Dona Yayá, que, há 19 anos, desfila pelas ruas do Bixiga com bom humor e irreverência, promovendo as pautas das mulheres por igualdade de direitos e acesso à justiça. Muito bem-vinda, Marilia!
Convido a Nanashara Sanches, coordenadora da Casa de Referência Mirabal, do Rio Grande do Sul. Ela é professora de geografia e militante do Movimento de Mulheres Olga Benario e integra a coordenação da Casa de Referência a Mulheres Mirabal, de Porto Alegre. O Movimento de Mulheres Olga Benario existe há 1 década e, nos últimos 3 anos, construiu ocupações de mulheres voltadas para o acolhimento e o abrigamento de mulheres em situação de violência, a exemplo das Casas de Referência a Mulheres Mirabal, Helenira Preta e Tina Martins. Seja muito bem-vinda!
É um prazer muito grande estar aqui. Agradeço o convite da Deputada Áurea e da Deputada Sâmia para participar desta reunião da Comissão. Eu vim aqui com uma tarefa bastante ingrata, até porque eu não experimentei toda a história das Promotoras Legais Populares — PLPs, mas a Amelinha Teles, que experimentou e nos trouxe sua experiência, manda saudações a todas vocês.
Eu vou falar um pouco do Programa Promotoras Legais Populares, uma iniciativa que nasceu há 25 anos no Estado de São Paulo. Seu início se deu no mesmo período, no Rio Grande do Sul. Em São Paulo, deu-se pela União de Mulheres do Município de São Paulo e, no Rio Grande do Sul, pela THEMIS — Gênero, Justiça e Direitos Humanos.
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16:39
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Por que houve essa dobradinha de trazer este projeto para o Brasil? A Amelinha Teles, da União, e a Denise Dora, da THEMIS, participaram de um encontro do Comitê da América Latina e do Caribe para a Defesa dos Direitos das Mulheres — CLADEM em 1992. Neste encontro com vários países da América Latina e do Caribe, elas ficaram sabendo das iniciativas que aconteceram em alguns países, como Bolívia, Peru, Costa Rica, bem como de cursos populares para as mulheres sobre seus direitos. Isso gerou um impacto muito grande para elas, porque elas fizeram parte de todo o movimento produzido por mulheres em 1987, ano da Constituinte, para construir a Constituição Brasileira que temos vigente agora, a Constituição de 1988.
Este foi um processo feito por mulheres do Brasil, que já vinham se fortalecendo no movimento feminista e no movimento de mulheres, que, no Brasil, oficialmente, dizemos que está ativo desde 1975, Ano Internacional da Mulher, declarado pela ONU. Esta foi a brecha que as mulheres encontraram em plena ditadura militar para, no contexto brasileiro, começar a discutir as questões das mulheres, trazer a problemática das mulheres e querer respostas do poder público para estes problemas, principalmente para o problema da violência.
Diante disso, elas fizeram parte do movimento de mulheres e do movimento feminista que participou ativamente da construção da Constituição Federal. Em 1988, nós recebemos este texto constitucional lindo, que, pela primeira vez na história do Brasil, reconheceu, no art. 5º, que homens e mulheres são iguais em direitos e em obrigações, conforme o texto desta lei.
O que acontece? No Brasil, nós temos um fator cultural muito curioso, em que dizem que as leis não pegam, não funcionam. Assim, em vez de fazerem algo para as leis funcionarem, sempre pensam assim: "Vamos ajeitar a lei para ela funcionar no que já existe". Esta é uma prática cultural muito interessante do sistema de jurisdição, de leis e de práticas do Estado, que verificamos também na Constituição Federal.
O texto que nós temos não é mais o texto ideal que nós poderíamos considerar, em vista de uma Constituição Cidadã — este é o apelido dela, Constituição Cidadã —, mas ela tem furos muito graves. Ela trouxe muitas cargas da ditadura militar. No entanto, foi uma Constituição construída no ensejo deste movimento popular todo, de distensão da ditadura, de transição para um momento democrático. Então, era o que havia de mais moderno em relação ao que já tivemos alguma vez nesta vida como Constituição Federal.
Por volta de 1992, já se começou com aquele papo: "Mas é difícil, não vai pegar, porque não é assim que funciona", com um monte de leis velhas que tinham que ser regulamentadas e atualizadas pela Constituição: "Não, vamos mudar a Constituição!" Diante disso, as mulheres que participaram do movimento de construção da Constituição começaram a ficar um pouco apavoradas porque, afinal de contas, o texto ainda nem estava valendo, nem havia sido efetivado, e já queriam alterá-lo.
Começaram a perceber que falar de Constituição do Brasil com a população de maneira geral era uma coisa muito abstrata. O que é esta coisa, a Constituição Federal? O que é esta lei máxima do País? A relação que a população de modo geral tem com as leis é algo distante. Nós não temos esta construção cidadã. Se isso é da lei, do direito, então, é mais difícil ainda.
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16:43
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A Constituição Federal foi muito importante, na medida em que abriu portas para muitas coisas no Brasil, não só para as legislações que nós temos hoje, como a Lei Maria da Penha, de 2006; a Lei do Feminicídio, de 2015; mas também outras leis e normativas nacionais que regulamentaram e batalharam por esta cristalização na lei e pela cobrança do Estado com relação às políticas públicas de igualdade de direitos para as mulheres, como também para o reconhecimento de convenções e tratados internacionais. A convenção de Belém do Pará, adotada em 1994 pela Organização dos Estados Americanos, comprometendo-se a erradicar todas as formas de violência contra as mulheres, foi uma brecha que nós conseguimos com a Constituição Federal.
Nós precisávamos defender este tipo de coisa de algum jeito. Foi aí que nós pensamos no Promotoras Legais Populares. Houve a iniciativa de fazer um curso para as mulheres terem o conhecimento dos seus direitos. Aqui, quando nós falamos em direitos, temos que pensar sempre na aspiração ao direito, àquela coisa que eu quero experimentar como meu direito, que é transformado, dentro de um país e nas suas relações internacionais, em leis e em convenções. Nós temos aquela coisa mais no chão, na realidade. O que eu experimento? O que há ali de política pública? O que eu conheço ou desconheço do Estado ou das outras organizações que compõem a sociedade e que estão na minha vida, proporcionando-me acesso à lei e a experimentar este direito?
Nós temos oferecido este curso há 25 anos, ininterruptamente, no Estado de São Paulo, na Capital, e conseguimos ajudar outras cidades e outros coletivos, em várias outros lugares, a expandir também este projeto para outros Estados. Aqui em Brasília, por exemplo, existe a iniciativa Promotoras Legais Populares, em parceria com a Universidade de Brasília, que oferece um curso de extensão. Estes cursos foram se multiplicando ao longo dos anos. Nós temos diretamente formadas pelo menos umas 5 ou 6 mil mulheres por todo o Brasil, e elas vão impactando outras mulheres nas suas atividades.
O nome do curso é lindo, Promotoras Legais Populares, um curso que tem muito apelo, já no nome. Nós sempre temos que pensar na questão do apelo porque, quando nós promovemos e fazemos o curso, e as mulheres se formam, elas têm contato com o que é o direito. O entrar em contato com o que é o direito traz muitas lentes para elas: a lente do machismo, a lente do racismo, a lente do classismo, a lente de todas as fobias — de todas as LGBTfobias e de todas as outras formas de discriminação e de opressão que você só vai colocando na frente e vai vendo a situação mais feia: "Aqui tem uma violação de direito, aqui está me machucando ou machucando a outras. Então, o que podemos fazer para encontrar justiça e uma solução para esta situação de violência?" O projeto Promotoras Legais Populares se propõe a formar as mulheres e a oferecer o conhecimento dos direitos e das leis e, possivelmente, dos caminhos para se acessar a lei e a Justiça.
Com o nome Promotoras Legais Populares, nós estamos dizendo que nós mulheres somos uma iniciativa para nós mulheres. Nós ficamos numa briga constante, porque existe sempre aquele perigo da cooptação. Como o nome é muito bonito, a primeira coisa que as pessoas perguntam: "Vocês são um serviço de Estado?" Não, nós não somos um serviço de Estado. Acho que esta é uma coisa que nós temos que falar muito claramente aqui. Nós não somos um serviço de Estado. O que nós oferecemos às mulheres é informação. Na outra ponta, o que nós fazemos é cobrar do Estado respostas. Nós temos, portanto, o binômio informação e resposta.
Nós queremos que o Estado responda às mulheres, que responda à sociedade o que está fazendo com este problema XPTO. Para as mulheres nós oferecemos a seguinte informação: "Estão vendo o caso do feminicídio? O Estado trata assim". É esta a discussão que nós fazemos com elas, a quem mostramos o que fazemos para melhorar.
Paralelamente a isso, acontece uma coisa. Nós ficamos muito na escuta, e é isso que nós conseguimos fazer porque nós fazemos no nosso limite. Nós somos mulheres ajudando outras mulheres. Nós não somos serviço público.
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16:47
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Nós temos que tomar muito cuidado, porque a ideia é bonita. Vêm muitas cidades com Prefeitos, Secretários, Assessores ou Parlamentares que querem levar o projeto para a cidade. Eles dizem? "Eu quero um curso de Promotoras Legais Populares na minha cidade porque eu acho que vai ajudar muito as mulheres". Nós respiramos, pensamos, contamos um, dois, três: "Vai ajudar muito as mulheres, mas vou ser bem sincera com você: vai ajudar as mulheres a cobrar políticas públicas". Portanto, 99% da demanda já acaba aí, porque, se eu estou dizendo que eu vou formar mulheres para cobrar políticas públicas, nós já sabemos do que estamos falando.
O projeto tem o desafio de ser sempre autossustentável no espírito do que vocês viram na Casa Tina Martins. Como a Rute já mencionou, nós temos muita admiração pela Casa Tina Martins, porque elas foram lá, eram mulheres do movimento, resolveram abraçar a causa e dizer: "Não há política pública aqui, e nós vamos fazer política pública".
É como a Rute falou, e eu vou estendendo a fala: é muito cruel. Eu pego também a fala de uma companheira aqui e outra ali. Se eu estou dizendo que eu estou educando as mulheres para pedir direito, eu também não posso dizer: "Você é sabidinha, você sabe tudo, você se vira sozinha". Não é assim que funciona. É cruel falar isso para as mulheres! É sempre isto: nós temos que nos ajudar.
Portanto, o Promotoras Legais Populares é um curso muito procurado pelas mulheres. Todas querem se formar em promotoras legais populares. Elas chegam lá e descobrem outra vida, tanto as que eram feministas, como as que não sabem o que é isso. Elas chegam com resistências, e nós temos que dizer: "Nós somos um curso feminista". Nós temos que marcar este espaço. Elas falam todas aquelas coisas que acham que é o feminismo, e, juntas, nós desconstruímos e construímos. É todo um processo.
Como promotoras legais populares, na nossa atuação, nós temos uma dificuldade básica: nós fazemos por nós mesmas. Nós queremos ajudar todas as mulheres que nós encontramos e que estão precisando de ajuda, mas nós não conseguimos, porque nós somos apenas nós. Nós pegamos nosso dinheiro do "busão" para nos encontrarmos com a companheira na porta da delegacia, entrar com ela, quando ela tem a coragem, ou este é o caminho que ela quer escolher fazer. Nós sabemos que não é.
Nós ficamos na formação das nossas redes. Eu sei que, em Belo Horizonte, se eu sou promotora legal popular, eu sei que posso indicar para a Casa Tina Martins. Eu sei que, em São Paulo, eu posso indicar o CDCM que a Rute coordena. Mas vejam a fragilidade que nós temos, porque nós, como movimento, construímos nossa rede. Se eu sei que ali eu tenho uma parceira, se eu sei que lá eu tenho uma parceira, eu mando para a parceira. Como promotoras legais populares, nós sempre temos que cobrar isso. Nós fazemos nossos atos e manifestos sempre cobrando políticas públicas.
Nós adoramos a Casa Tina Martins, como adoramos o CDCM, mas nós queremos adorar mais ainda o dia em que a Casa Tina Martins fizer parte do aparelho da Prefeitura e qualquer pessoa que estiver lá dentro, não a nossa linda Indira, tratar bem todas as mulheres que chegarem lá. Esta é a dinâmica em que as promotoras ficam a toda hora, tendo que fazer a costura da formação da nossa rede, como mulheres de movimento e mulheres que cobram.
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16:51
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É muito cruel quando chegamos a uma cidade em que vamos fazer o curso de promotoras legais populares; fazemos o levantamento da resposta do Estado nesta cidade, para saber qual é a informação que vão poder dar à companheira; e constatamos que muitas cidades não têm nada, não têm nada! Aí o que acontece? As promotoras vão e fortalecem a rede. "Eu conheço as promotoras da cidade de Santo André, que tem um serviço 'x' que não tem na outra cidade". Eu mando para aquela cidade. Mas fica aquela coisa: se é política pública, não pode fechar as portas. Se você não é do meu Município, é muito difícil essa interligação que tentamos fazer. Tentamos fazê-la sempre no âmbito da pessoalidade, mas queremos multidisciplinaridade, queremos integração de rede como resposta de política pública.
Consideramos que a nossa atuação é muito importante. Enxergamos a importância da nossa atuação pelas mulheres que saem de lá. Sabemos que vão sair de lá as professoras, vão sair as agentes de saúde, vão sair as enfermeiras, vão sair as assistentes sociais, vão sair as advogadas, que estão ali no dia a dia, de repente, no balcão do serviço, atendendo aquela mulher, e vão atender a mulher de um jeito diferente. Mas temos que fazer a outra parte também. Temos que cobrar que aquela mulher não seja um bicho raro porque foi fazer o curso de promotoras legais populares e incorporou as questões de gênero, as questões de raça, as questões de classe e todas as outras interseccionalidades, ou seja, incorporou aquilo e está fazendo um bom atendimento. Temos que cobrar que qualquer pessoa sentada naquela cadeira possa fazer esse atendimento.
Então, ficamos nesta luta: queremos ser autônomas e queremos sempre estar cobrando. Temos muito orgulho disso. Nós somos um projeto autônomo, de feministas autônomas, de coletivos de feministas autônomas, mas com esse diálogo que devemos sempre fazer com o Estado, com um afago e o acolhimento das companheiras que estão dentro da estrutura do Estado. Temos que estabelecer essas parcerias e dizer: "Vamos ver como é que podemos também ajudar vocês que estão aí dentro". Também é uma carga muito pesada você ser aquele pavão, aquele bicho raro, porque esse não é o normal do atendimento.
Temos muito orgulho desse projeto. Já estamos em 27 cidades no Estado e em outras capitais do País. Temos condições de crescer, mas sempre como movimento autônomo feminista, de mulheres, que vai estar sempre cobrando e olhando as políticas públicas e exigindo respostas do Estado, sempre na solidariedade com todas as companheiras, onde quer que elas estejam.
A SRA. PRESIDENTE (Áurea Carolina. PSOL - MG) - Muitíssimo obrigada, Marilia. É só força!
Chegou aqui a Lia Siqueira, que é mestra em direitos humanos e inovações pela Universidade Federal de Juiz de Fora; é graduada em direito pela Universidade Federal de Juiz de Fora; atualmente trabalha como Coordenadora de Projetos e de Incidência Estratégica na associação civil Criola; é membra da Comissão de Direitos Humanos e Cidadania da OAB, Subseção Juiz de Fora, Minas Gerais; é integrante do coletivo PretAção; foi responsável suplente pelo Grupo de Trabalho Nacional de Mulheres do Movimento Negro Unificado; foi membra do Núcleo de Assessoria Jurídica Popular Gabriel Pimenta, como advogada popular.
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16:55
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Item 3. Requerimento nº 13, de 2019, da Sra. Flávia Arruda, Presidenta desta Comissão Externa, que requer a realização de visitas técnicas aos Estados do Rio Grande do Sul, Rondônia, Distrito Federal, Bahia, Minas Gerais, São Paulo, Rio de Janeiro, Piauí, Alagoas, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul para discutir sobre o enfrentamento da violência contra a mulher, protocolos de sucesso e políticas públicas que estão sendo aplicados, entre outros.
A SRA. JAQUELINE CASSOL (Bloco/PP - RO) - Boa tarde, Deputada Áurea Carolina, nobres pares e todas as palestrantes e convidadas.
Eu sou uma defensora nata das mulheres. Na ordem dos Estados constantes do requerimento, Rondônia é o segundo Estado. Eu pleiteei isso por conta do alto índice de violência doméstica que o Estado de Rondônia enfrenta. Há um alto índice de feminicídios e de estupros.
Uma mulher pede socorro, Lia — vocês sabem disso tão bem quanto eu, ou talvez até melhor do que eu, por lidarem com isso no dia a dia —, porque precisa de ajuda. Uma mulher não grita por socorro se não precisar. Na maioria das vezes, eu vejo que as mulheres voltam para o ambiente de violência por causa da dependência financeira. Se ela tem filhos, ela se sujeita a isso. Muitas mulheres, antes de sofrerem violência física, já sofreram violência psicológica e não têm força para nada.
Com base nisso, eu apresentei um projeto de lei para que as empresas terceirizadas que prestam serviço ao poder público federal destinem 10% das vagas para mulheres vítimas de violência doméstica, desde que apresentem a medida protetiva ou a denúncia do Ministério Público. Segundo a Federação Nacional das Empresas Prestadoras de Serviços de Limpeza e Conservação — FEBRAC, em 2012, nós tínhamos no Brasil 13.200 empresas só na área de limpeza e conservação, o que gera 1 milhão e 600 empregos diretos. Seriam 10% dessas vagas.
Aqui no Congresso Nacional, nós temos avançado com a Lei Maria da Penha, a Lei do Feminicídio e várias leis. Mas, no meu Estado, por exemplo, a Profa. Joselita foi morta a pauladas pelo ex-companheiro, infelizmente. Ela tinha independência financeira, fez a denúncia, mas a nossa legislação permitia que o delegado arbitrasse fiança. Ele arbitrou a fiança, o agressor pagou 4 mil reais, saiu de lá e foi diretamente matá-la. Outras vítimas de violência doméstica ou de feminicídio foram vítimas porque denunciaram e tiveram que voltar para suas casas.
Então, eu vejo que é necessário dar um passo. Nós temos que, cada vez mais, aumentar as penas. Nós temos que criar medidas, a exemplo deste requerimento, para ouvir mulheres, para ouvir os governadores, para ouvir o Ministério Público, para ouvir as Varas Especiais, para ouvir as Delegacias Especializadas no Atendimento à Mulher — DEAMs, para ouvir as redes e os movimentos que são essenciais. Eu sempre fui uma defensora do terceiro setor. Na maioria das vezes, essas entidades fazem o papel do poder público com muita eficiência.
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16:59
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Então, essa é a importância da Comissão Externa. Hoje há o requerimento de visita também a Rondônia. Primeiro, iremos ao Rio Grande do Sul, por conta do testemunho que ouvimos da Barbara Penna, que foi queimada viva pelo ex-companheiro e jogada do terceiro andar, além de perder os dois filhos. Todas conhecem o caso. Então, primeiro, o Rio Grande do Sul; depois, outros Estados.
Portanto, peço às Parlamentares que estão aqui que votem "sim", para que possamos fazer esse trabalho em âmbito de Brasil, porque há experiências que estão dando certo com vocês. Em Rondônia, nós temos o Ministério Público da Mulher. Várias medidas têm tido êxito. Eu falo que é uma troca de experiências, e isso é o importante.
A SRA. PRESIDENTE (Áurea Carolina. PSOL - MG) - Perfeitamente, Deputada Jaqueline.
A SRA. JAQUELINE CASSOL (Bloco/PP - RO) - Deputada, eu vou lhe pedir licença. Tenho uma audiência no Ministério da Infraestrutura e preciso sair. Se eu não tivesse de participar dessa audiência com relação ao Estado de Rondônia, com certeza eu permaneceria aqui, porque da pauta feminina eu sou uma defensora. Desejo sucesso e contem comigo.
A SRA. PRESIDENTE (Áurea Carolina. PSOL - MG) - Obrigada, Deputada Jaqueline. Estamos juntas. Temos demonstrado, nesse esforço da Comissão Externa, nos espaços da bancada feminina, que há o engajamento e uma cooperação muito grande entre nós mulheres Parlamentares para além do nosso pertencimento político-partidário. Esse é um avanço fundamental. Defender mais mulheres na política, enfrentar a violência machista, defender a aplicação da Lei Maria da Penha tem-nos unificado. Eu valorizo muito termos conseguido isso. Um abraço.
A SRA. PRESIDENTE (Talíria Petrone. PSOL - RJ) - Quero agradecer esta troca entre tantas mulheres num espaço que normalmente é tão pouco nosso, tão masculino, em que pensamos em estratégias para enfrentar o quadro grave que vivemos de violência contra mulher.
A SRA. NANASHARA SANCHES - Quero agradecer o convite e dizer que é muito importante estar aqui. Estar no centro de poder do País não é uma experiência qualquer. Está aqui também a Fernanda, nossa companheira e minha conterrânea.
O meu nome é Nana. Eu faço parte da Coordenação da Casa de Referência das Mulheres Mirabal e do Movimento de Mulheres Olga Benario, assim como Indira. Vendo a Indira falar, eu fui lembrando o que nos trouxe até aqui. Em uma reunião, uns 5 anos atrás, uma companheira disse assim: "Nós temos que fazer uma ocupação só de mulheres neste País".
Eu fiquei muito impressionada com aquela ideia. Pouco tempo depois disso, nasceu a Casa Tina Martins, e nós ficamos pensando no Rio Grande do Sul: "Se elas conseguiram, a gente consegue aqui também".
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Na verdade, essa ideia surgiu porque o nosso País estava sendo gestado, há alguns anos, pelo que vemos andando pelos corredores aqui hoje: o retrocesso total, o fascismo. Nós víamos ataques às mulheres, à população LGBTI, aos negros e negras. Então, pensamos que era necessário materializar alguns debates e algumas críticas que tínhamos, as quais já foram trazidas aqui. A própria Lei Maria da Penha é uma conquista. Mas víamos, à época, que havia pouquíssimas casas de referência para as mulheres e faltavam vários instrumentos serem de fato colocados em prática.
Com isso, percebeu-se também que não basta só uma lei. Mais do que um mandato, nós precisamos de base. Hoje percebemos que grande parte do nosso povo está do lado errado da história e tem apoiado o retrocesso, às vezes sem perceber. Nós precisamos fazer esse trabalho de base. Acho que ações como as que foram trazidas hoje aumentam a base da Esquerda e o debate sobre a violência contra as mulheres, sobre o racismo etc.
(Segue-se exibição de imagens.)
Eu vou falar da Ocupação de Mulheres Mirabal, que fizemos em Porto Alegre. A nossa ocupação surgiu no dia 25 de novembro de 2016, que é o Dia Internacional de Combate à Violência contra a Mulher. Todo dia 25 de novembro nós fazemos atos e protestos, e dessa vez nós resolvemos entrar no prédio que era da Inspetoria Salesiana São Pio X, no centro da cidade de Porto Alegre, que estava sem exercer função social desde 2013. Depois vocês vão ver que ele segue sem exercer função social.
O nome da ocupação faz uma homenagem ao assassinato das irmãs Mirabal, cujo filme está no Youtube — convido-os a assistirem —, que ocorreu também num dia 25 de novembro. É por isso que existe essa data. Essas irmãs, conhecidas como "Las Mariposas", lutaram contra a ditadura de Rafael Leónidas Trujillo. Elas foram assassinadas, mas, na verdade, foram sementes: logo após, vimos que a República Dominicana teve a sua independência.
A nossa motivação foi, além do debate que eu tinha comentado antes, especificamente no Rio Grande do Sul, o fato de estar ocorrendo debate sobre a extinção de Secretarias — como ocorre em relação a Ministérios —, e as principais atacadas foram as relacionados à luta das mulheres. No Rio Grande do Sul, José Ivo Sartori fechou a Secretaria Estadual de Públicas para as Mulheres. Na época, nós falávamos que essa medida iria trazer problemas, com certeza, pois o Estado já tinha altos níveis de violência contra as mulheres, e essa violência contra as mulheres iria aumentar, o que de fato ocorreu.
Eu trouxe alguns dados para nós analisarmos. Houve o crescimento de estupros e feminicídios.
De 2017 para 2019, foi de 40,9% o aumento do número de feminicídios no Estado do Rio Grande do Sul. Quando surgiu esse dado, o Governador e sua equipe foram bem rapidinhos para tentar criar uma pesquisa que camuflasse esse número, que é muito alto. Foi de 40,9% o aumento do número de casos de feminicídio. Eles estão comparando 2 meses e dizendo que não subiu, que, na verdade, diminuiu. Temos que ficar ligados também nesses dados.
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Vemos um constante aumento da violência contra as mulheres, vemos que outros Estados também estão passando por isso. Passaram pelo fechamento de secretarias, de espaços estratégicos de debate a respeito de como enfrentar a violência contra as mulheres.
Estes são os objetivos da casa. Um deles é proporcionar espaços de referência para mulheres em situação de violência e vulnerabilidade social em Porto Alegre, mas não só lá. Atendemos também mulheres de outras cidades, de outros Estados e de outros países, porque existe demanda.
As mulheres que entram lá podem estar com seus filhos. O abrigamento que é dado pela Prefeitura de Porto Alegre não possibilita isso. Garantimos espaço protegido em abrigo temporário, que inclui alimentação, higiene, vestuário, atendimento individual e em grupo.
Estas são imagens sobre algumas das atividades da casa. Esta é sobre a preparação para um protesto. Estamos ali fazendo alguns cartazes. Aqui estamos fazendo nossa feira da Mirabal para arrecadar recursos para manter a casa.
Estes são nossos objetivos mais específicos, além do acolhimento e do abrigamento. Acho que alguém já falou sobre a diferença entre os dois. O acolhimento pode acontecer em 1 dia e pode ser feito na própria casa, com as profissionais voluntárias dando encaminhamento ao problema. A pessoa pode também precisar de abrigamento. Hoje a Mirabal, assim como a Tina, faz esses dois serviços.
Procuramos, além de fazer esse serviço interno, pensar em como a casa pode mudar a realidade dentro do nosso bairro e dentro da própria cidade. Planejamos e oferecemos espaços de debate e de reflexão sobre a questão da violência contra a mulher, espaços abertos para a comunidade. Também se discute o protagonismo feminino e o papel da mulher na sociedade.
Outro objetivo específico é fortalecer o vínculo das mulheres que são acolhidas com seus filhos. Sabemos que o ciclo de violência é complexo. Para conseguirmos revertê-lo, são necessárias ações com as mães e também com os filhos, com as filhas.
Oferecemos, junto com a rede de apoio da Casa de Referência da Mulher — Mulheres Mirabal, atendimento psicológico, social e jurídico para as mulheres acolhidas e articulamos isso em conjunto com a rede de assistência social do Estado e do Município. Sempre quisemos fortalecer essa rede. Foi muito bem aceita pelas profissionais que atuam nesses espaços, porque veem que existe uma demanda. Muitas querem ajudar, querem trabalhar de fato, e não conseguem, porque há um sucateamento dessa área nos Municípios, nos Estados. A Mirabal tem também esse objetivo de articular o fortalecimento dessas redes de assistência social e de enfrentamento da violência contra as mulheres.
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Foram 2 anos de luta judicial e 1 ano de negociação. Ficamos 1 ano negociando. A Fernanda acompanhava essa luta, essa batalha. Após 1 ano de negociação com entes públicos, a Justiça nos deu 6 meses, mas não conseguimos resolver a parada nesse tempo, porque não havia lugar. O Estado dizia que não havia lugar para a casa ficar, e o Município nos dizia que ali havia menos lugar ainda. E nós dizíamos então que ficaríamos lá no Salesianos, porque o serviço ia seguir.
Depois de 1 ano de negociação, surgiu um prédio, uma escola. O terreno era da Prefeitura, e o prédio era do Estado. Então, era uma escola enrolada. Surgiu essa escola, e ela tinha tanto um prédio de salas de aula quanto um prédio da direção, da administração. Cabia muito bem ali o nosso trabalho. Demos uma carta de aceite, pegando a casa e dizendo: "Vamos fazer nossa casa nessa escola". O que aconteceu foi que a Prefeitura nunca nos entregou a chave. Assinou os papéis, pegou a chave com o Estado, que fez as benfeitorias. O Estado disse: "Nós a passamos para o Município, não cobramos nada pelas benfeitorias, contanto que o prédio seja destinado a políticas públicas para as mulheres". E o que aconteceu foi que a Prefeitura deu para trás nesse acordo. Já tínhamos formalizado a nossa saída do primeiro prédio. O que fizemos? Ocupamos o prédio que nos foi destinado. Era o jeito. Era fazer isso ou passar por uma nova reintegração de posse.
O que o Estado e a Prefeitura não viam no nosso caso — acho que a Tina Martins também demonstra isso — é que o próprio Estado se organiza para cometer violência contra as mulheres. Ir dormir havendo uma reintegração de posse do lugar em que se está trabalhando, dormindo e estudando é horrível. Não saber o dia de amanhã é horrível! Isso é uma violência! No final, é isto, o Estado não faz o serviço e ainda quer impedir que a sociedade civil organizada, que o movimento social o faça.
De qualquer forma, nós nos organizamos e fomos à luta de novo. Já tínhamos alguma experiência com isso. Fomos de novo para esse prédio, que agora é da Prefeitura. Esta imagem mostra que isso ocorreu no dia 7 de setembro de 2018. A casa funciona nesse prédio, e atrás estão as salas de aula. Temos feito uma luta nacional, no Movimento de Mulheres Olga Benario, exigindo creches dentro dos poderes municipais. Estamos fazendo campanha para que esse prédio vire uma creche na cidade de Porto Alegre.
Hoje, temos buscado diálogo com a gestão da Prefeitura, com Secretários, com as Secretárias tanto da Prefeitura quanto do Estado. Estamos com um pedido de reintegração de posse de novo. Sabemos que só o Estado do Rio Grande do Sul tem mais de 30 mil imóveis. Estamos pedindo apenas um deles, não queremos todos os 30 mil. O ideal seria existir uma casa de referência por bairro. Isso é que deveria existir, no mínimo. Nós queremos um, e nem em relação a isso os caras estão dispostos a ajudar. Não estamos pedindo para pagar tudo. Trata-se de um lugar. Temos buscado esse diálogo. Infelizmente, o Prefeito Marchezan Júnior tem uma postura de muita negação da importância do nosso trabalho. Estamos aqui denunciando isso e pensando também na importância de ter uma base para fazer com que a Mirabal permaneça na luta, atendendo demanda na cidade. É nisso que acreditamos.
Vamos seguir até termos a garantia do nosso prédio. Se não der para ser esse, vai ter que ser outro. Já sabemos como fazer a nossa luta, já estamos bem organizados. Então, de um jeito ou de outro, o serviço fica.
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No final do ano, completamos quase 3 anos de luta. Nesse período, acolhemos mais de 300 mulheres em situação de violência e abrigamos mais de 100 mulheres e seus filhos. Fizemos dezenas de debates, buscando fortalecer a rede de enfrentamento de violência às mulheres. Também organizamos feiras, saraus, festivais, peças de teatro. Temos um carinho muito grande por atividades culturais e gostamos de abrir a casa para isso. Não existe acesso à cultura no nosso País de graça. Ainda são poucas as atividades. Agora, em Porto Alegre, estão privatizando os parques, então a pessoa que não puder pagar não vai ter acesso nem ao parquinho. Nós nos preocupamos bastante com isso. Entendemos que cultura e lazer são direitos de todas as pessoas.
A rede de acolhimento da casa já está estruturada e conta com profissionais da área do direito, do serviço social, da psicologia, da educação social, além de militantes que atuam diretamente com a população em situação de rua e a população LGBTI. Então, temos fortalecido cada vez mais a casa para atender as demandas que existem na nossa cidade, que são crescentes.
Mas entendemos que ainda há alguns trabalhos a fazer, como a garantia desse local. Nós vamos seguir incomodando, de porta em porta, até garantir o nosso local. Nós também entendemos a delimitação do nosso trabalho. Não dá para idealizarmos achando que o que estamos fazendo é o máximo que pode ser feito, já que estamos numa conjuntura em que o Presidente da República e os seus aliados têm um discurso e fazem leis no sentido de criminalizar quem faz essas ocupações. Por trás desse discurso — pode não parecer para alguns —, vemos a força desse poder: hoje estão sendo assassinadas as pessoas que ocupam, as indígenas que ocupam, as sem-terra que ocupam.
Então, entendemos que este momento é estratégico para materializarmos a nossa resistência. Isso não vai se dar apenas através das nossas falas. Precisamos, de fato, aumentar a materialização da nossa resistência. O que queremos? A ocupação é uma forma material de dizermos: "É isso que queremos, é disso que precisamos". Entendemos que a Mirabal e as outras ocupações têm esse caráter de, através da emancipação, através do acolhimento, através da educação, tentar atingir a raiz do problema da violência. Saibam que um pouco dessa raiz é aquilo de que estávamos falando: os discursos machistas, homofóbicos e racistas, como os que ouvimos hoje no plenário Ulysses Guimarães.
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(Exibição de vídeo.)
A SRA. NANASHARA SANCHES - Trouxemos esse vídeo para mostrar um pouco como um canal mais crítico, como o teleSUR, vê o nosso País. Eles trataram de alguns temas aí. Estávamos, na época, debatendo o Estatuto do Nascituro e o aumento expressivo dos casos de violência contra as mulheres, e eles colocaram essa situação. Eles vieram ao Brasil, a Porto Alegre, para conhecer a nossa experiência.
Eu acho que isso é tudo. Depois vamos ter um tempinho para outros esclarecimentos, se houver alguma dúvida. Mas queria reforçar, sim, que esperamos, de fato, que a nossa experiência seja algo que demonstre que a nossa vontade de viver não tem nos dado a chance de escolher se temos medo ou não. Nós não temos hoje essa oportunidade de sentir medo. Este é o momento em que precisamos fazer o enfrentamento a essa idade das trevas que estamos vendo no nosso País.
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A SRA. PRESIDENTE (Talíria Petrone. PSOL - RJ) - Passo a palavra para a Deputada Fernanda Melchionna.
A SRA. FERNANDA MELCHIONNA (PSOL - RS) - Obrigada.
Está havendo votação, já abriu a Ordem do Dia, e umas das pautas é, possivelmente, a convocação do Ministro da Educação ao plenário amanhã, o que eu acho que é importante. Esperamos todas que seja um levante dos livros.
Eu só queria agradecer o espaço e registrar o trabalho fenomenal que as meninas fazem. Ainda hoje elas correm o risco de haver reintegração de posse do prédio. A Nana tinha que dar para todas esse histórico do trabalho, da luta de ocupação que as meninas do Movimento Olga Benario fizeram, para chamar atenção para a desestruturação da nossa rede lá, que já é muito desestruturada. O Viva Maria, que é o único abrigo municipal, comporta menos de 40 mulheres. Ele não atende mulheres estrangeiras, por uma questão até de legislação. A Mirabal atendeu em tantos outros momentos não só estrangeiras, mas também mulheres da região metropolitana e de outras partes do Estado.
É muito escandaloso: o Governo do Estado cedeu o prédio para a Mirabal, mas o Município simplesmente não o deu a ela. Eu era Procuradora da Mulher na época. Fizemos toda uma mobilização. Ainda hoje tramita a reintegração de posse. Eu já falei com a Presidente da Comissão Externa, a Deputada Flávia Arruda. E acho muito legal as Deputadas Sâmia e a Áurea, combatentes, guerreiras, terem incluído nos relatos exitosos a Mirabal, contando um pouco do trabalho de vocês, da Joanna, no Emancipa. Estou muito feliz de conhecer a Lia e outras tantas lutadoras.
Quando houver a visita ao Rio Grande do Sul, que vai ser a primeira da Comissão Externa, nós vamos começar pelo Instituto Barbara Penna, que é muito importante. A Barbara é uma sobrevivente: perdeu os dois filhos, teve o corpo queimado. Ela veio aqui, falou da sua história. Ela segue sendo uma sobrevivente que luta contra a violência contra as mulheres, usando o caso dela como um exemplo de informação. Mas espero que façamos também uma visita à Ocupação Mirabal, para fortalecer o trabalho de vocês. Precisamos fazer uma frente social e política em defesa da ocupação. É muito importante que a Câmara dos Deputados, por meio de uma Comissão oficial, conheça o trabalho de vocês e que possamos usar este espaço para defendê-las do neoliberalismo, da tirania e do machismo.
A SRA. PRESIDENTE (Talíria Petrone. PSOL - RJ) - Obrigada, Fernanda querida. Obrigada, Nana Sanches.
A SRA. LIA SIQUEIRA - Queridas, antes de mais nada, gostaria de agradecer o convite da Comissão Externa, dos mandatos da Sâmia, da Áurea e da Talíria.
Corroboro tudo que as minhas companheiras da Mesa falaram anteriormente. Este é um espaço majoritariamente branco, dominado pela branquitude e por uma masculinidade nociva. Acho importantes, não só como símbolos, mas também como marcas de espaço e de uma nova forma de fazer política, audiências públicas como esta, espaços públicos em que possamos debater temas como este. Então, agradeço a Comissão Externa por esse convite.
Venho aqui falar desse lugar de mulher negra, de mulher negra que também é advogada e que representa a Criola, um aquilombamento de mulheres negras no Estado do Rio de Janeiro. É uma organização que existe há 27 anos formalmente, mas que vem de um histórico de batalha das suas fundadoras, Jurema, Lúcia e Mãe Beata, uma batalha de construção muito anterior à sua constituição jurídica.
Eu acho que é importante marcarmos isso. Enquanto juristas, temos muito arraigado negativamente esse conceito de constituição a partir da criação e da instituição jurídica, mas acho que, enquanto ativistas, temos que ressaltar que as nossas forças se articulam muito antes de um estatuto ou de uma formalização da nossa atuação política.
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A Criola nasceu formalmente 27 anos atrás, mas nossa luta tem mais de 30 anos. E uma luta de mais 30 anos é uma luta que se ambienta dentro de um ambiente de redemocratização do Brasil. Nós mulheres negras consideramos, desde a instituição do primeiro golpe que se deu sobre terras brasileiras, que foi o golpe da Coroa portuguesa, que se trata de uma redemocratização, pois o que houve foi uma democratização incompleta. Então, temos o histórico de ler uma redemocratização incompleta e compreender que a atuação política de mulheres negras é essencial para marcar um lugar político e também para instituir uma nova forma de pensar e de agir na política.
A Criola se instituiu dentro dessa constituição do que seria prioritário para nós mulheres negras. No nosso nascedouro, pensamos uma ideia de saúde integral para as mulheres negras. Vínhamos de um contexto de demandas por políticas de saúde, de demandas por políticas de saúde para mulheres negras, mas isso ocorria dentro dos nossos movimentos, porque, nas institucionalidades, nós ainda éramos lidas como pés de página, quando éramos lidas. Infelizmente, ainda somos lidas assim. A nossa presença é de imposição e também de conhecimento sobre nos colocar, nos portar e nos fazer presentes, como a Lélia bem colocava.
Então, nós viemos nessa postura de cobrar saúde integral para mulheres negras. No nosso nascedouro, propusemos uma ação política através de instrumentos de comunicação, que eram os boletins Toques Criola. Posteriormente, desencadeamos ações também de escuta, de atendimento de mulheres e de acolhimento de mulheres, na perspectiva de lutar numa posição antirracista, compreender o fenômeno da violência contra a mulher não apenas por uma perspectiva de gênero, mas por uma perspectiva racial e territorial. Falar de combater a violência contra mulher é também necessariamente falar de uma postura e de um lugar antirracista.
Diante disso, a Criola pensou-se enquanto organização para mobilizar mulheres, para fortalecer mulheres negras e também para fazer incidência política. Compreendemos que mulheres negras que passam por situação de violência não são mulheres negras destituídas de poder ou destituídas de possibilidades de empoderamento. Muito pelo contrário, pensamos que nós podemos ressignificar esse lugar de violência como uma potência política. E foi sempre assim que agimos e pautamos os nossos projetos.
Acho que, dentro dessa perspectiva de entender as nossas histórias como possibilidades de potência, e não só a partir de um lugar de vitimização, é importante colocar alguns liames e alguns desenhos sobre como se dá a violência doméstica e familiar contra a mulher negra hoje. Sabemos que, segundo o Mapa da Violência, desde 2015, houve um crescimento de 54%. A despeito de uma redução da violência contra mulheres brancas, a violência doméstica e familiar contra mulheres negras cresceu, no que diz respeito não só à violência física, mas também à violência sexual. Mas, em paralelo a isso, cresceu outra espécie de violência que não a violência interpessoal: a violência institucional.
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Eu acho que é importante trazermos para um espaço público, como dissemos inicialmente na nossa fala, dominado por uma masculinidade tóxica e por uma branquitude tóxica, que o fenômeno da violência doméstica e familiar contra a mulher não está descolado de uma violência institucionalizada contra a mulher negra e as mulheres como um todo.
Estamos num contexto em que o Estado brasileiro retrocede em acordos que nos davam, pelo menos, um mínimo de segurança, como a questão de entender a violência obstétrica como uma forma de violência que se opera sobre a vida das mulheres. Temos que compreender como esse retrocesso se articula, como esse desmonte de políticas públicas se articula e incide sobre a vida de mulheres negras na sua rotina.
Esse fascismo de Estado não está desacompanhado de um fascismo social. Vendo o crescimento da violência contra as mulheres, do feminicídio — só no mês de janeiro de 2019, houve 179 casos de feminicídio —, nós nos perguntamos como podemos nos rearticular no âmbito de organização de mulheres negras e no âmbito de movimento articulado com outras parcerias de mulheres, dentro de um contexto de uma metodologia feminista participativa, de atuação e de incidência na política, para não somente reagir, mas agir, perante um quadro de violências institucionais e interpessoais que se aprofunda, que não se torna novo, não apresenta novos elementos.
Em uma resposta liminar a isso, eu acho que a Criola vem traçando a ideia da necessidade de transformação, mas também da necessidade de revisão e de recuperação daquilo que nem sempre nós tivemos o cuidado de compreender como nossa memória. Eu acho que uma metodologia muito importante das nossas memórias é o acolhimento, é o abrigamento através da escuta, e estamos praticando isso.
Nos últimos 2 anos, nós instituímos um projeto chamado Por sua Causa, que visava dialogar com mulheres que passam por situações de violência diretamente ou indiretamente, através dos seus filhos e filhas. Essas mulheres falavam numa perspectiva de aliar a situação de violência que vivenciaram à transformação política de um contexto no qual outras mulheres se compreendem como desempoderadas num lugar político.
Isso foi muito produtivo, porque fomos para a perspectiva do autocuidado. O autocuidado foi compreendido como uma necessidade daquelas mulheres de se olhar, olhar sua trajetória, olhar os cuidados que desempenham consigo mesmas em suas rotinas. Não se trata de um autocuidado descolado, como o de sair para passear, meramente. Não estou dizendo que isso não é importante — isso é essencial para a saúde mental. Mas eu me refiro a um autocuidado articulado sob uma perspectiva coletiva: como eu, ao me cuidar, me torno uma pessoa mais receptiva e mais potente para o cuidado da minha companheira?
Então, construímos esse projeto de 2 anos com base em oficinas que abordaram desde cuidados estéticos até cuidados políticos, para que essas mulheres soubessem como lidar, nos ambientes públicos, nos ambientes políticos, com as outras companheiras mulheres negras.
Depois desses 2 anos de projeto, 2016 e 2017, nós revisitamos inclusive as nossas formas de cuidado, as nossas práticas internas enquanto articuladores dentro do movimento negro estadual, e propusemos uma incidência para além do projeto. E hoje firmamos um ambiente de escuta, que se dá diariamente e também em encontros presenciais mensais, para que essas mulheres que vivenciam violência, porque perderam seus filhos, porque sofrem violência doméstica familiar, porque sofreram racismo, discriminação racial, em espaço público, porque sofrem em razão do racismo LGBTFóbico, possam se reunir, se fortalecer e compartilhar os seus espaços de resistência.
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Acho que outro elemento essencial para analisarmos e compreendermos esse aprofundamento das violências contra as mulheres é a questão da interseccionalidade. Temos que nos preocupar com isso. Quando falamos de uma perspectiva de mulheres negras, não estamos falando de uma mulher negra única; estamos falando de uma mulher negra de cor de pele diferente, estamos falando de uma mulher negra com histórias de vida e territórios diferentes, estamos falando de uma mulher negra com vivências de sexualidade diferentes, estamos falando de uma mulher negra com vivências de identidade de gênero diferentes. Acho que estamos num momento em que esse aprofundamento não pode somente pautar as nossas reações; temos que continuar buscando as construções políticas que nós queremos para essa pluralidade de mulheres negras no contexto brasileiro.
Então, é importante, sim, retirarmos deste espaço recomendações não só para a atuação da Comissão Externa, mas também para as nossas atuações enquanto movimentos articulados com esta Comissão, que busca uma proatividade dentro de um espaço político público. Coloco à disposição as forças da Criola para pensarmos essas possibilidades.
O terceiro e último elemento que eu gostaria de trazer para considerarmos é uma perspectiva que nós da Crioula temos proposto para compreender e enfrentar o fenômeno da violência contra a mulher: quando falamos de uma mulher que passa por violência, independentemente de sua ordem, seja violência doméstica familiar, seja violência institucional, estamos falando de ausência de justiça. Essa perspectiva tem que estar colada à nossa realidade, porque somente assim vamos conseguir trazer da margem para o centro a vivência de mulheres que passam por situação de violência. Senão, fica parecendo que se trata só de mais uma situação para a soma de dados, e eu já trouxe aqui pelo menos três páginas de dados sobre o aprofundamento dessas violências.
E por que essa perspectiva de justiça é tão importante para nós? Vimos fazendo essa leitura da compreensão de que lutar por um bem viver é lutar por justiça para trazê-la para o centro das demandas tanto de movimentos sociais quanto políticas. E aí é preciso falar de justiça antirracista, de justiça social, de justiça reprodutiva.
Esta última, principalmente, tem sido pouco comentada. Acho que precisamos reafirmar a necessidade de falar sobre a justiça reprodutiva, mas não numa perspectiva de saúde sexual reprodutiva descolada da vivência daquela mulher; precisamos pensar a justiça reprodutiva como essencial para que essa mulher viva bem nos espaços e para que desempenhe suas funções mais hodiernas.
Então, é preciso pensar que uma mulher que tem um ambiente com saneamento básico, que tem um ambiente com mobilidade urbana, que tem um ambiente em que ela pode recorrer a um serviço de saúde, vai ser menos afetada, por exemplo, por zika, vai ter menos possibilidade de ter isso refletido sobre sua vivência enquanto mulher grávida e, posteriormente, sobre seus filhos e filhas.
Isso é potencializar o debate. Estamos lutando por direitos sociais. Falar em qualquer retrocesso em direitos sociais, em saúde, em educação e em assistência médica é também falar em ausência de justiça para essas mulheres.
Então, com esses três elementos, eu tento colocar como nós temos pensado essas nossas atuações.
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Falo muito rapidamente, neste 1 minuto que me resta, somente sobre alguns outros projetos. Nós falamos aqui do Por sua Causa. Mas, de 2005 a 2007, nós tivemos o Projeto Aguibá, que buscava integrar mulheres ialorixás em comunidades no Estado do Rio, dentro de uma perspectiva de combater violência doméstica e familiar contra as mulheres nos seus lugares. Nós fizemos oficinas com 30 mulheres ialorixás, e essas mulheres foram replicadoras dessas oficinas. Até hoje, mais de 10 anos depois, nós ainda temos efeitos, parcerias e construções políticas que derivam desse projeto. Outro projeto de destaque, já numa perspectiva mais recente, é um projeto que nós temos para fazer um enfrentamento e proporcionar justiça criminal para mulheres que vivenciaram prisão provisória no Estado do Rio de Janeiro — mulheres negras, especificamente. Debater o desencarceramento também é debater uma perspectiva de justiça. É muito interessante comparar a ideia da violência que se opera dentro das casas com a violência que se opera dentro das prisões.
Então, nós precisamos integrar e ampliar as visões sobre como se dá o fenômeno da violência, porque só assim nós vamos conseguir responder e também construir um projeto político mais amplo, que vá além da reação de diminuir cada um dos casos específicos.
A SRA. PRESIDENTE (Talíria Petrone. PSOL - RJ) - Muito obrigada, Lia, por trazer sua perspectiva. Eu tive que sair — vocês já entenderam que aqui há uma correria danada —, porque começou uma votação nominal no plenário. E há reuniões de outras Comissões acontecendo ao mesmo tempo. Obrigada por trazer a perspectiva do que é o nosso corpo negro, com as diversas violências que se concretizam nele. Isso é muito fundamental, ainda mais neste espaço. Então, obrigada.
Agora, nós vamos abrir a palavra brevemente. Eu lamento termos que ser breves, mas, de fato, já começou a Ordem do Dia. Então, vão começar as diferentes votações, e nós precisamos estar no plenário. Mas vou abrir a palavra para breves intervenções. Depois, devolverei rapidamente a palavra à Mesa e farei um fechamento.
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17:43
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Enfim, eu queria colocar à disposição a rede de mulheres da qual eu faço parte. A Mídia NINJA e o Fora do Eixo fazem parte, no Brasil, de uma rede chamada ELLA — Encontro Latino-Americano de Mulheres. Trata-se de uma rede que realiza encontros anuais, onde essas mulheres sentam e debatem sobre como está o andamento dos feminismos plurais na América Latina.
A primeira edição — inclusive quero saudar a Deputada Áurea — foi em Belo Horizonte, em 2014, onde nos sentamos e começamos a debater um pouco sobre como o feminismo brasileiro estava se organizando e vendo o feminismo latino-americano.
Depois, nós fomos para a Bolívia. Também fizemos uma edição na Colômbia. Para mim, foi uma grandessíssima honra ver como mulheres combatentes e guerrilheiras estavam debatendo os acordos de paz na Colômbia, que foram decisivos para a eleição do País no ano seguinte.
No ano passado, em dezembro, nós fizemos uma edição em La Plata, na Argentina. Também foi uma honra receber mulheres vindas do debate gigantesco da Onda Verde sobre o aborto. Especialmente na edição do ano passado, realizou-se um módulo de atividade do chamado Parlamento Feminista. Levamos Parlamentares do Brasil e da América Latina como um todo para debaterem como seria a experiência de um Parlamento onde mulheres debatessem o direito de mulheres 24 horas por dia.
Nós temos um carinho especial pelo ELLA, porque ele é um encontro que se propõe, positivamente falando, ser uma bolha feminista. Durante 4 dias, pensamos na nossa própria moeda, nas nossas próprias leis, no nosso próprio Parlamento, no que seria do mundo se ele fosse feito e pensado para mulheres, como se as mulheres fossem detentoras de direitos plenos. Enfim, temos um carinho muito especial pelo ELLA.
Eu estou aqui para falar e para colocar essa rede à disposição. Nós temos contatos... Mais de 26 países da América Latina e dos países hispanohablantes fazem parte do ELLA. E aí, dentro disso, nós temos uma área específica, um eixo específico no qual se debatem as diversidades das mulheres e um outro eixo no qual se debate a violência. Quando esses dois eixos se encontram, nós falamos sobre muitas realidades das quais falamos aqui.
E o Brasil continua sendo uma grande referência. Toda vez que nós vamos para lá, as mulheres latino-americanas sempre dizem: "Vocês têm uma lei sobre feminicídio. Vocês têm uma lei sobre violência contra a mulher. Vocês têm um projeto de Delegacia da Mulher". Na teoria, o Brasil é uma grande referência para a América Latina.
A Nicarágua, que, no último ano, conseguiu colocar o feminicídio como crime — ele não está nem necessariamente passível de punição, mas se tornou um crime —, olhou muito para a Lei do Feminicídio do Brasil. Isso é engraçado, porque, na teoria, somos grandes referências para a América Latina, para as Américas como um todo, mas, na prática, toda vez que uma mulher brasileira abre a boca num fórum latino-americano, há um grande choque de práticas.
Eu queria colocar o ELLA à disposição. O ELLA volta para o Brasil neste ano. A próxima edição do ELLA deve ser feita em Salvador. No ano passado, na Argentina, nós levamos uma grande... Especificamente as argentinas, mas as mulheres que compõem o fórum em geral levaram muito fortemente o debate do antirracismo dentro do feminismo, como sendo a grande preocupação e o próximo grande passo do feminismo latino-americano a ser tomado, coletivamente falando.
Então, como nós já tínhamos realizado uma edição na Colômbia, outro país da América Latina que tem uma grande representatividade negra na população, voltamos ao Brasil para fazer uma edição em Salvador.
Eu queria não só convidar as Parlamentares e as lideranças de movimentos sociais aqui presentes, mas também colocar essa rede à disposição. Temos pensado muito fortemente sobre o que seria uma rede latino-americana de autocuidado. Dentro disso, obviamente, espaços para atendimento seriam muito importantes.
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17:47
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A SRA. PRESIDENTE (Talíria Petrone. PSOL - RJ) - Muito obrigada, Dríade.
(Intervenção fora do microfone.)
A SRA. PRESIDENTE (Talíria Petrone. PSOL - RJ) - Pois não, pois não. Como é o seu nome?
A SRA. MARIA IRES GRACIANO LACERDA - Boa tarde. Peguei a discussão já no final, porque eu estava em outra Comissão.
Eu sou Maria Ires, Diretora do Sindicato dos Trabalhadores do Judiciário Federal no Estado de São Paulo.
O que eu queria colocar aqui é que temos um Coletivo de Mulheres e discutimos muito as questões de violência porque há muitas mulheres que sofrem violência no local de trabalho, nas suas casas, enfim sofrem todo e qualquer tipo de assédio.
Nós criamos esse Coletivo de Mulheres dentro do sindicato por conta de várias questões que surgiam no dia a dia. Temos um psicólogo que acompanha isso e um advogado. E aí surgiu a ideia de criar esse Coletivo de Mulheres.
Então, estou aqui para comunicar que nós tivemos essa iniciativa há 1 ano, e ela está crescendo. E nós estamos sempre nos engajando, juntando-nos a outros movimentos que surgiram.
Quero parabenizar a Câmara dos Deputados por esta iniciativa e também todas as mulheres guerreiras que aqui estão.
A SRA. PRESIDENTE (Talíria Petrone. PSOL - RJ) - Muito obrigada.
Sou fã de todas as Deputadas que aqui estiveram, Talíria Petrone, Áurea Carolina, Sâmia Bomfim. Fico do outro lado da tela sofrendo com vocês, comemorando com vocês.
Quero dizer que há muita coisa a se fazer e que, em relação ao que está sendo feito, podemos aprender muita coisa. Lamentavelmente, vemos a inauguração de rodas, sempre com os mesmos erros. Então, vamos repetindo. E isso não é mais proteção para a vida das mulheres, não é mais proteção para a vida das crianças –– geralmente, onde há mulher, nós vamos falar que há crianças junto com elas, sim ––, nem é para transformar essa sociedade.
Então, estamos tendo todo esse ataque a direitos sociais e quem está sofrendo diretamente e especialmente são as mulheres negras, são as mulheres das periferias.
Eu acho que é isto: a forma que nós nos unimos nessa rede, que transcende as limitações físicas, que transcende várias outras coisas, em muitos momentos, é para tomar iniciativa e mostrar ao poder público qual é o dever dele. Desculpa, mas, quando as companheiras dizem que a e ele tem o dever de prestar esse serviço, de trabalhar a proteção dessas mulheres, e ele ameaça quem está prestando serviço de forma voluntária, é muito vergonhoso isso. Casa que está sendo centro de referência está sendo ameaçada de ser extinta pelo poder público, e ele tem o dever de prestar esse serviço, de trabalhar a proteção dessas mulheres, e ele ameaça quem está prestando serviço de forma voluntária, é muito vergonhoso isso.
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17:51
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A SRA. PRESIDENTE (Talíria Petrone. PSOL - RJ) - Muito obrigada.
A SRA. MARILIA KAYANO MORAIS - Agradeço novamente por ter sido chamada aqui para conversar com vocês, trazendo um pouco desse programa, desse projeto, que é grande, está em muitos lugares. E reforçar esta questão: nós estamos aqui para falar de acolhimento de mulheres. Nós nos acolhemos há muito tempo. Se não fizéssemos isso historicamente, se só levássemos e não nos ajudássemos, não estaríamos aqui, nesta resistência.
Só que estamos aqui e agradecemos este espaço às Parlamentares que estão fazendo a nossa voz ser ouvida aqui dentro como sujeitos de direito que queremos políticas públicas para nós. Queremos um Estado que nos acolha, um Estado que olhe para nós, um Estado em que nós nos enxerguemos, porque isso é muito importante.
(Intervenção fora do microfone.)
A SRA. MARILIA KAYANO MORAIS - Não, porque sabemos que parecem perseguições, e depois, revelações. Estamos vendo isso por aí.
Então, realmente, queremos um Estado em que nós, mulheres negras e de todas as origens, não brancas e brancas, nos enxerguemos, que todas as pessoas de todas as classes se enxerguem.
Nós queremos agentes de Estados múltiplos, porque vamos nos reconhecer nesse Estado, no dia em que ele for múltiplo, no dia que em que houver mais mulheres no Parlamento, mais mulheres nas delegacias, que façam um bom atendimento, as escrivãs. E naquelas portas da saúde em que vamos, em que as mulheres são maioria, que elas estejam lá para atender as companheiras como companheiras, não como adversárias, não como aquelas para quem o Estado está fazendo um favor.
Nós, como promotoras legais populares, gostamos de desenvolver isso no curso, porque nós vemos que as mulheres recuperam o orgulho de serem mulheres, de se enxergarem como agentes de Estado, quando estão inseridas como agentes de Estado, como aquelas que vão trazer o serviço, não o favor. E são nossas aliadas lá dentro.
Temos que cobrar, sim. Queremos política pública para cuidar também dessas companheiras que estão lá dentro.
A SRA. PRESIDENTE (Talíria Petrone. PSOL - RJ) - Obrigada, Marilia.
A SRA. LIA SIQUEIRA - Queridas, quero, mais uma vez, agradecer a possibilidade de fala e de construção também. Nós compreendemos, nós todas compreendemos esta possibilidade como um nascedouro. Na verdade, é a continuidade de uma possibilidade de construção.
Como a Marilia falou, e eu concordo plenamente, nós estamos aqui para demandar, exigir políticas públicas e pensar que também — colocando o que a Nana falou — nós não temos tempo de ter medo. Nós estamos aqui nos dispondo, colocando a nossa cara para resistir e também para construir uma nova forma de viver.
Apesar de considerarmos este um momento de retrocesso, nós não paramos na nossa demanda de construir novas formas de viver, a partir da diversidade, a partir da pluralidade e a partir também da ideia de justiça.
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17:55
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A SRA. PRESIDENTE (Talíria Petrone. PSOL - RJ) - Obrigada, Lia Siqueira.
A SRA. LENY CLAUDINO DE SOUZA - Eu vou fazer diferente — eu sempre quebro o negócio, não é, gente? Gente velha é fogo. Eu vou fazer diferente o agradecimento a todos, mas também vou fazer o nosso dever de casa. Eu quero passar para a nossa Deputada Talíria Petrone o documento com o qual a nossa Deputada Áurea Carolina já assumiu o compromisso... Gente, tirem foto porque depois, se o povo me bater lá no Rio...
(Risos.)
Estou entregando o documento para a Deputada Talíria, porque há a necessidade urgente de nós construirmos essa audiência pública. Essa audiência pública acontecerá.
Quero dizer também que nós ficamos muito felizes enquanto Movimento Negro Unificado, enquanto Fórum de Mulheres da Baixada Fluminense, enquanto Fórum Municipal dos Direitos da Mulher de Duque de Caxias, por termos estado aqui e visto de perto a responsabilidade de todas nós, todas que vieram aqui fazer o debate, mas especificamente desta Comissão, composta por nossas Deputadas.
A SRA. PRESIDENTE (Talíria Petrone. PSOL - RJ) - Obrigada, Leninha.
Mais uma vez, reforço o agradecimento pela importância que é realmente criar esses espaços de articulação entre a sociedade civil e as Parlamentares.
No Emancipa Mulher, nós trabalhamos com muita força, não apenas na questão educativa, mas também na formação, no estreitamento de laços de resistência. Foi um aprendizado muito grande. Apesar de ter ficado o dia inteiro no celular — porque nós fazemos isto hoje em dia: falamos ao celular e prestamos atenção no que está sendo feito para comunicar também o que está acontecendo em tempo real —, foi muito gratificante ouvir as várias coincidências, prestar atenção, é claro, nas diferenças, mas ver onde estamos dando pontos comuns, onde esses trabalhos estão criando estratégias unificadas e como nós podemos, a partir de situações como essas, estreitar ainda mais o relacionamento entre nós, porque nós sabemos que vamos precisar de um tecido muito forte entre nós para que consigamos resistir. E resistir com esse autocuidado que foi mencionou, não apenas na questão da formulação de políticas públicas e de trabalhos da sociedade civil, mas também nós em nós mesmas.
Eu acho que sabermos que temos umas as outras, que a nossa rede de contato pode ser articulada de forma a fortalecer as nossas estratégias conjuntas, isso para mim é a verdadeira — se é que existe uma — sororidade. Existe uma crítica muito grande a respeito da sororidade, mas eu gosto de pensar na sororidade como esse "contínuo lésbico", como disse Adrienne Rich, esse contínuo trabalho entre mulheres que, na verdade, baliza as nossas ações, não a partir de algum valor patriarcal, mas, sim, a partir do que fazemos para que nós estejamos juntas em situações em que precisemos de resistência.
Então, foi gratificante, foi muito revigorante estar aqui hoje representando o Emancipa Mulher, sempre com muito orgulho e com muita honra, mas também foi muito gratificante conhecer todas vocês pessoalmente — os projetos nós já conhecíamos — e realmente ficarmos mais próximas, para conseguirmos pensar em estratégias conjuntas e articulações que façam crescer esse nosso trabalho de formiguinha.
O ativismo cupim, de acordo com o que nos ensinou a Florynce Kennedy, é o único jeito de realmente derrubarmos o que chamamos de patriarcado. Ninguém entende, mas precisamos continuar apontando para esse nome.
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17:59
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A SRA. PRESIDENTE (Talíria Petrone. PSOL - RJ) - Obrigada.
A SRA. NANASHARA SANCHES - Obrigada. Quero agradecer novamente e reforçar a importância deste espaço.
Aproveito estes segundinhos para dizer que é muito importante que essas ações e essas organizações saiam do dia a dia. Entendo que existem problemas, mas queremos que existam também projetos de lei, que exista verba, que exista recurso, que exista fomento, para que mais e mais ONGs, mais e mais promotoras, mais e mais casas de referência sejam feitas no nosso País. Precisamos de mais organizações e de mais programas de conscientização. Muitas pessoas passam por violência e não estão agindo porque estão com medo. Precisamos fazer uma onda e arrastar essas pessoas, essas mulheres, para que elas lutem e reivindiquem o seu espaço na sociedade, principalmente o espaço político.
A SRA. PRESIDENTE (Talíria Petrone. PSOL - RJ) - Obrigada, Nana.
A Deputada Áurea agradeceu muito, pediu que eu agradecesse. Ela está na oitiva dos engenheiros da Vale, que tem um modelo de desenvolvimento que também impacta profundamente nós mulheres, mulheres ribeirinhas, quilombolas, nessa lógica desenvolvimentista produtivista.
Vivemos um momento em que é mais do que fundamental compartilhar experiências, pensar estratégias comuns para enfrentarmos as múltiplas formas de violência que nós vivemos num Brasil com essas marcas, num país com a marca escravocrata, a marca do patriarcado dos senhores de engenho e dos barões do café, que são os mesmos que ainda ocupam os espaços de poder desta Casa e outros diversos espaços de poder com essa masculinidade branca tóxica inserida numa lógica heteronormativa da elite com poder econômico. Essa história também é de um fundamentalismo que avança sobre nossos corpos e se potencializa neste momento, um momento de muito retrocesso democrático, embora a democracia nunca tenha chegado plenamente para alguns corpos, para corpos de mulheres negras, periféricas, de quebradas, lésbicas, bissexuais, transexuais, travestis, indígenas...
Vão se somando as diferentes opressões que agravam as violências. Sabemos que neste momento há retrocesso e precisamos garantir a possibilidade de seguir lutando por democracia não como algo abstrato, mas como algo que tem a ver com a concretização da possibilidade de viver ou morrer de nós mulheres. Nós morremos de muitos modos.
Infelizmente, este Governo tem nos matado e nos violentado de muitos modos, com o feminicídio, que cresce, com uma autorização que legitima essa violência, legitima a violência sexual, legitima a lesão corporal dolosa e até entrega armas para os nossos agressores, potencializando a possibilidade da nossa morte. E este Governo mata também com o desmonte da Previdência pública, mata ao cortar investimento na educação pública, impedindo especialmente às mulheres negras o acesso à universidade, mata ao negar o termo "violência obstétrica" num País em que 25% das mulheres vivenciam esse tipo de violência — ignora orientações da própria Organização Mundial da Saúde —, mata ao nos negar o direito de ser mãe neste caso, mata ao nos negar a possibilidade de legalizar e regulamentar o aborto — ainda se entende aborto como caso de polícia e não como caso de saúde pública — e mata ao encarcerar os nossos filhos. Temos um Estado mínimo para direitos, e somos nós que ficamos pelo caminho, porque somos responsáveis pelo cuidado da casa, do hospital... E se amplia o Estado penal. Só ontem foram quatro os assassinados no Vidigal. Semana passada, na Maré. Vimos a chacina do Salgueiro, outras chacinas na Maré, 80 tiros no Evaldo, no catador que foi ajudar aquela família, o caso da Maria Eduarda, além de tantos corpos mais, vítimas da bala difusa do Estado. Quando o Estado mata ou encarcera esses jovens, filhos de mulheres negras, num País negro, que tem 40% de presos provisórios, ele também encarcera essas mães. Matar o filho é também matar a mãe, é também violentar essa mulher. Falar de estratégias de combate à violência contra a mulher é também pensar nesse aspecto do alargamento do Estado penal, é também pensar nas mulheres que adoecem para o resto da vida porque perdem seus filhos.
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18:03
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Eu não poderia deixar de concluir lembrando Marielle Franco. Hoje é mais um dia 14. Nenhum dia 14 é mais o mesmo para nós, não só pela amizade e pelo companheirismo, mas pelo marco político. Enquanto não soubermos quem mandou matar Marielle Franco, vítima de um crime político porque denunciava justamente essas tantas violações dos direitos humanos que nós mulheres vivenciamos, não vamos ter a possibilidade de lutar pelo aprofundamento da democracia brasileira. Então, Marielle, presente! E também Maria Eduarda, presente! Anderson, presente! Eu poderia falar o nome de muitas vítimas mulheres desse Estado que tem sangue nas mãos.
Segue a nossa luta. Este espaço é um instrumento para a luta das mulheres, instrumento para construirmos redes de estratégias tanto de prevenção da violência contra a mulher, como também de acolhimento à mulher em situação de violência.
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