1ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA 56 ª LEGISLATURA
Grupo de Trabalho destinado a analisar e debater as mudanças promovidas na legislação penal e processual penal pelos Projetos de Lei nº 10.372, de 2018, nº 10.373, de 2018, e nº 882, de 2019.
(Audiência Pública Ordinária)
Em 25 de Abril de 2019 (Quinta-Feira)
às 9 horas e 30 minutos
Horário (Texto com redação final.)
09:59
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A SRA. PRESIDENTE (Margarete Coelho. Bloco/PP - PI) - Bom dia a todas e a todos.
Nos termos regimentais, declaro aberta a 8ª Reunião do Grupo de Trabalho destinado a analisar e debater as mudanças promovidas na legislação penal e processual penal pelos Projetos de Lei nºs 10.372 e 10.373, de 2018, e 882, de 2019, convocada para audiência pública sobre os temas propostos no roteiro de trabalho deste grupo.
Encontra-se à disposição dos Srs. Deputados cópia da ata da 7ª Reunião, realizada em 23 de abril de 2019.
Pergunto aos Sr. Deputados se há necessidade de leitura da ata. (Pausa.)
O SR. SUBTENENTE GONZAGA (Bloco/PDT - MG) - Peço a dispensa da leitura da ata, Presidente.
A SRA. PRESIDENTE (Margarete Coelho. Bloco/PP - PI) - Não havendo discordância, fica dispensada a leitura da ata, a pedido do Deputado Subtenente Gonzaga.
Indago se algum membro deseja retificar a ata. (Pausa.)
Não havendo quem queira retificá-la, coloco-a em votação.
As Sras. Deputadas e os Srs. Deputados que a aprovam permaneçam como se encontram. (Pausa.)
Aprovada.
Expediente.
Nós recebemos mensagem eletrônica do Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional — DRCI do Ministério da Justiça e Segurança Pública em que informa que, devido a compromissos anteriormente agendados, a Sra. Diretora Erika Mialik Marena não poderá comparecer à reunião designada para a data de hoje e que, para representá-la nesta audiência, foi designado o Sr. Eduardo Mauat da Silva, Coordenador-Geral daquele departamento.
Nesta audiência vão ser analisadas e debatidas as mudanças na legislação penal e processual penal. Tema 3: perdimento de bens; ação civil de perdimento de bens; Fundo Nacional de Segurança Pública; Fundo Penitenciário Nacional; impactos financeiros.
Foram convidados e encontram-se presentes o Sr. Egbert Buarque, Secretário de Controle Externo da Defesa Nacional e da Segurança Pública do Tribunal de Contas da União; a Sra. Samira Bueno, Diretora Executiva do Fórum Brasileiro de Segurança Pública; o Sr. Eduardo Mauat da Silva, Coordenador-Geral de Articulação Institucional do Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional do Ministério da Justiça e Segurança Pública, representando a Sra. Diretora do Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional da Secretaria Nacional de Justiça do Ministério da Justiça e Segurança Pública; a Sra. Luiza Fonseca Frischeisen, Subprocuradora-Geral da República e Coordenadora da 2ª Câmara de Coordenação e Revisão Criminal do Ministério Público Federal; e o Sr. Samuel Vida, advogado.
Solicito a atenção de todos para o tempo destinado à exposição dos convidados e para os debates dos Srs. Parlamentares.
Cada convidado disporá de 20 minutos para proferir sua fala, não havendo, nesse momento, possibilidade de apartes.
Os Srs. Deputados interessados em interpelar os convidados deverão inscrever-se previamente e poderão usar a palavra por 5 minutos, ao final das exposições, podendo haver réplica e tréplica.
Gostaria também de reiterar aos senhores convidados o pedido de que, na medida do possível, deem foco ao texto do projeto de lei que nós estamos discutindo, a fim de que possamos aqui trabalhar mais diretamente, mais concretamente nos termos do projeto.
10:03
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Gostaria de convidar para compor esta Mesa inicial o Sr. Egbert Buarque, a Sra. Samira Bueno e a Sra. Luiza Cristina Fonseca Frischeisen. (Palmas.)
Gostaria de registrar a presença dos senhores representantes do CONAMP — Associação Nacional dos Membros do Ministério Público, bem como do Sr. Leonardo Santana, representante da Rede Justiça Criminal.
Sejam bem-vindos! Muito obrigada pela presença.
Passo a palavra ao Sr. Egbert Buarque, Secretário de Controle Externo da Defesa Nacional e da Segurança Pública do TCU, para suas considerações, pelo prazo de 20 minutos.
O SR. EGBERT BUARQUE - Primeiramente, bom dia a todos.
Bom dia, Deputada Margarete, Deputado Capitão Augusto e demais Parlamentares presentes.
Agradeço enormemente o convite que me foi feito para participar desta audiência e poder contribuir com algumas reflexões e análises a respeito das duas proposições legislativas, o PL 882 e o PL 10.372.
Eu preparei uma pequena apresentação, bastante rápida. Não tenho a pretensão de abordar a questão da ciência jurídica, falando aí da mudança da legislação penal. Compilei alguns tópicos, alguns artigos das duas proposições e, ao final, eu apresento a antecipação de alguns dados do último relatório de auditoria, que nós concluímos no começo do ano e que ainda está para apreciação do Plenário do TCU, o terceiro trabalho sobre o sistema prisional e a execução dos recursos do Fundo Penitenciário Nacional.
(Segue-se exibição de imagens.)
Fazendo a leitura das duas proposições, eu identifiquei pelo menos 12 aspectos que convergem para a constatação de que a proposta é um endurecimento contra os crimes de maior potencial ofensivo, que ela aumenta as penas e reduz ou dificulta as possibilidades de progressão de regime. Eu identifiquei, primeiro, a alteração do art. 75-A do Decreto Lei nº 2.848, de 1940. Atualmente, o limite máximo de pena é de 30 anos e vai aumentar, pela proposta do PL 10.372, para 40 anos. Há uma possibilidade de aumento.
10:07
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A proposta prevê a alteração do art. 33 do Código Penal, para inserir o § 7º, o que acarreta a possibilidade de aumento da população carcerária também e de aumento da pena em dois terços.
A proposta prevê a alteração do inciso I do § 2º do art. 157 do Código Penal, com o aumento da pena em um terço, se houver o emprego de qualquer tipo de arma. Se eu não me engano, na redação atual do Código Penal é para arma de fogo esse agravante.
A proposta prevê alteração também no art. 59 do Código Penal. A introdução proposta no PL 882 tem o seguinte parágrafo único:
Art. 59.............................................................................................................................................
Parágrafo único. O juiz poderá, com observância dos critérios previstos neste artigo, fixar período mínimo de cumprimento da pena no regime inicial fechado ou semiaberto antes da possibilidade de progressão.
Ou seja, dificulta a possibilidade de progressão.
Progressão de regime para crimes hediondos: altera o § 2º do art. 2º da Lei de Crimes Hediondos. A proposta é de metade da pena, se for primário — hoje é de dois quintos —, e de dois terços da pena, se for reincidente — hoje é de três quintos.
Organizações criminosas — Lei nº 12.850, de 2013. Diz o § 9º do art. 2º:
Art. 2º..............................................................................................................................................
.............................................................................................................................................................................
§ 9º O condenado por integrar organização criminosa ou por crime praticado através de organização ou associação criminosa não poderá progredir de regime de cumprimento de pena ou obter livramento condicional ou outros benefícios prisionais se houver elementos probatórios que indiquem a manutenção do vínculo associativo.
Ou seja, é o caso de continuar pertencendo a uma facção, o que é bastante comum quando se trata de organização criminosa. Na verdade, a finalidade é essa.
Permissão para órgãos de segurança pública utilizarem bens apreendidos. Os tópicos anteriores, só para fazer uma distinção, mostram obviamente uma possibilidade de pressão sobre o sistema prisional, pressão no sentido de criar uma tendência de aumento de população carcerária, com consequências que mais à frente eu vou colocar aqui. Agora, o art. 133 tem um aspecto um pouco diferente. A redação atual diz:
Art. 133. Transitada em julgado a sentença condenatória, o juiz, de ofício ou a requerimento do interessado, determinará a avaliação e a venda dos bens em leilão público.
Parágrafo único. Do dinheiro apurado, será recolhido ao Tesouro Nacional o que não couber ao lesado ou a terceiro de boa-fé.
Essa é a redação atual. A redação proposta é para o art. 133-A:
Art. 133-A. O juiz poderá autorizar, constatado o interesse público, a utilização de bem sequestrado, apreendido ou sujeito a qualquer medida assecuratória pelos órgãos de segurança pública previstos no art. 144 da Constituição para uso exclusivo em atividades de prevenção e repressão a infrações penais.
Bem, aqui eu faço um comentário um pouco diferente, por uma constatação que nós fizemos ao acompanhar a intervenção na segurança pública do Rio de Janeiro. Uma das constatações do Gabinete de Intervenção Federal na segurança pública do Rio de Janeiro, ao fazer o diagnóstico das corporações policiais, foi de que havia um problema de logística, principalmente de armamentos. Ou seja, nesse tipo de proposição — e eu imagino que deva ser essa a ideia em relação a armamentos apreendidos, a viaturas apreendidas com integrantes de facções criminosas, para uso das polícias —n eu acredito que tem que ser avaliado caso a caso. Há um problema de logística nas corporações, para aquisição de armamentos e de munições e para contratação de manutenção de viaturas. Então, tendo em vista que esses bens não vão seguir uma lógica que atenda à necessidade logística dos órgãos de segurança pública, eu acredito que essa medida traz, na verdade, um problema de logística para as corporações. O meu entendimento é o de que a redação anterior deve permanecer, de que os bens devem ser leiloados, e os recursos, recolhidos ao Tesouro Nacional ou estadual — enfim, ao Erário —, e não serem usados pelas corporações, porque isso vai causar confusão — na verdade, o termo é esse — na logística das corporações de segurança pública. Então, faço aqui uma proposta: de que esse artigo seja redigido de maneira que mitigue o risco de causar problemas na logística das corporações.
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Reforma do crime de resistência. A redação proposta traz o acréscimo do § 2º:
Art. 329 ..........................................................................................................................................
....................................................................................................................................................................
§ 2º Se da resistência resulta morte ou risco de morte ao funcionário ou a terceiro:
Pena - reclusão de seis a trinta anos (...).
Ou seja, há aumento de pena, há endurecimento.
Dificultar a soltura de criminosos habituais. Aqui o juiz deverá denegar a liberdade provisória. Ou seja, há uma pressão sobre o sistema prisional novamente.
Aumento da pena para posse ou porte ilegal de arma de fogo de uso proibido. Acrescenta-se o § 1º:
Art. 16 ...........................................................................................................................................
§ 1º Se a arma é de uso proibido:
Pena - reclusão de seis a doze anos.
As condutas previstas no § 2º também teriam suas penas dobradas, ou seja, o § 2º também dobra as penas.
Aumento das penas para comércio ilegal e para o tráfico internacional de arma de fogo: de 4 a 8 anos de reclusão, a pena passa para 8 a 16 anos de reclusão, no caso do comércio ilegal; de 4 a 8 anos de reclusão, a pena é aumentada para 10 a 20 anos de reclusão, no caso de tráfico internacional de armas.
Alterações nas fontes de recursos do Fundo Nacional de Segurança Pública e na destinação dos seus recursos. Essa proposta de lei 10.372 inclui novas fontes de recursos para o Fundo Nacional de Segurança Pública e inclui os Municípios na repartição dos recursos do Fundo Nacional de Segurança Pública. Entretanto, eu acredito que essa proposta, o PL 10.372, talvez tenha sido encaminhada antes de ter sido promulgada a Lei nº 13.756, que já dispõe de forma bastante detalhada sobre os recursos, inclusive os advindos das loterias, destinados ao Fundo Nacional de Segurança Pública e sobre essa repartição.
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Agora, salvo engano — corrijam-me se eu estiver errado —, a Lei nº 13.756 não destina recursos aos Municípios, e a proposta de lei 10.372 prevê a destinação de recursos aos Municípios. Entendo que é algo a se considerar, porque o Município também pode ter um papel relevante na segurança pública. É claro que não só com atividade estritamente de segurança pública, policial, vamos dizer assim, mas também com outras atividades que afetam a segurança pública, como, por exemplo, o incentivo ao melhor ordenamento do solo urbano, o plano diretor do Município. Essa é uma questão que afeta diretamente a segurança pública. Então, talvez seja necessária uma orientação nesse sentido. O próprio FUNPEN já tem uma previsão de destinação de recursos para os Municípios também. É um montante de recursos pequeno, porém já é algum recurso para o Município. Essa questão municipal de recebimento de recursos provenientes dos fundos de segurança pública seria útil, sim, a nosso ver.
Bom, na verdade, tirando aquele art. 133-A, que eu acho bastante específico, a respeito da logística das corporações que atuam na segurança pública, os demais pontos que eu consegui levantar dessas proposições convergem para uma conclusão: a de que essas proposições contribuem para o aumento do período de encarceramento e para o aumento da população carcerária, ou seja, há maior pressão sobre o sistema prisional. Obviamente, não cabe ao Tribunal de Contas da União fazer essa escolha. O papel do tribunal, obviamente, é o de auxiliar os tomadores de decisão com informações que sejam úteis. E isso leva a uma questão de financiamento. Aumentar a pressão sobre o sistema prisional vai demandar aumento das fontes de financiamento desse sistema, que hoje, como é de conhecimento de todos — isso é notório — já não consegue cumprir com a sua missão dentro dos ditames da Lei de Execução Penal, e tem um déficit enorme. Se eu não me engano — a colega Samira sabe disso melhor do que eu —, o déficit é de mais de 300 mil vagas. O ritmo de oferta de novas vagas não acompanha o ritmo do encarceramento, a taxa de encarceramento. Esse déficit vem crescendo, obviamente. Então, uma vez que se estabelece o aumento do período de cumprimento da pena e se dificulta a progressão de regime, a pressão sobre o sistema prisional aumenta. E o sistema prisional, como funciona hoje — isso também é notório, é sabido —, não cumpre seu papel ressocializador. Boa parte dos presídios — e infelizmente temos exemplos recentes no Ceará — funciona como um depósito de captação de mão de obra das facções. Basta ver que as medidas que foram tomadas no Estado do Ceará para endurecimento, para, vamos dizer assim, cumprimento da legislação dentro do ambiente prisional deflagaram ações criminosas Basta ver que as medidas que foram tomadas no Estado do Ceará para endurecimento, para, vamos dizer assim, cumprimento da legislação dentro do ambiente prisional deflagaram ações criminosas bastante violentas, mostrando que ali é onde se atinge realmente as facções, ou seja, no ambiente prisional.
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É necessário se estabelecer fontes de recursos, de financiamento, para que o sistema prisional se transforme em instrumento efetivo de redução de criminalidade. No entanto, o aumento de recursos, por si só, não dá conta de cumprir com essa finalidade de melhorar o sistema prisional, porque esse aumento de recursos tem que ser acompanhado por uma melhoria da capacidade de gestão.
O que temos visto recentemente, desde a ADPF 347, que determinou o descontingenciamento dos recursos do FUNPEN, é que existem recursos nos Estados ainda pendentes de execução, embora esses recursos de cerca de 2 bilhões de reais já tenham sido repassados há 2 anos, no final de 2016, em 2017 e em 2018 também, com cerca de 200 milhões de reais.
Essa execução é muito pequena. Esse relatório que nós estamos concluindo agora aponta uma execução de cerca de 6% desses recursos. Há dificuldades para se elaborar projetos, analisá-los e aprová-los no Departamento Penitenciário Nacional. Os recursos existem, estão com os Estados, mas, até agora, em termos de criação de vagas, foram muito pouco nos últimos 2 anos.
Eu enxergo aqui um efeito dominó nessas medidas, porque haverá um possível aumento da pressão sobre o sistema prisional, que vai demandar maior destinação de recursos para o segmento, a fim de que esses recursos realmente se materializem na criação de novas vagas e haja a melhoria do sistema prisional e da gestão.
Esta tabela exemplifica, já com dados deste último trabalho que nós concluímos no final de março, a execução dos recursos do FUNPEN em 11 Estados. Nós temos um problema de escolha do investimento nesses Estados. Em alguns deles, como, por exemplo, o Pará e o Piauí, existe a escolha de se investir na criação de vagas do regime fechado, quando o maior déficit não é no regime fechado, no caso dos presos provisórios. Há uma questão de escolha, de priorização de investimento que não se amolda à necessidade real.
Este gráfico mostra a mesma coisa, ou seja, o investimento no regime fechado em comparação com o regime semiaberto. O investimento e a criação de vagas no regime fechado é muito maior.
Esta outra tabela mostra a evolução da execução dos recursos. Havia uma previsão de se entregar 14.893 vagas e, até agora, 996 vagas foram entregues em Pernambuco. E Pernambuco conseguiu entregar essas vagas, porque já possuía projetos prontos quando este recurso chegou ao Estado para ser licitado, contratado e executado. Nós temos, neste caso, uma execução muito baixa. Como está sendo mostrado aqui, nós temos um total de 55 obras previstas, entre as quais a conclusão provável, até o final de 2019, é de apenas 5 obras.
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O SR. LAFAYETTE DE ANDRADA (PRB - MG) - Por quê?
O SR. EGBERT BUARQUE - Nós temos poucos projetos...
O SR. LAFAYETTE DE ANDRADA (PRB - MG) - Discordo. Eu fui Secretário de Segurança em Minas Gerais...
A SRA. PRESIDENTE (Margarete Coelho. Bloco/PP - PI) - Deputado, eu pediria a gentileza de V.Exa. que se manifestasse mais adiante.
Eu vou devolver o tempo do Sr. Egbert Buarque, só para mantermos a ordem dos trabalhos.
Obrigada.
O SR. EGBERT BUARQUE - Agora, há um gargalo grande no DEPEN, que possui apenas três engenheiros para dar conta de todas as suas atividades, tanto das internas, quanto das de análise de projeto. Trata-se do que está exatamente aqui: a insuficiência do quadro técnico de engenharia do DEPEN, ante às competências da unidade, que conta apenas com três engenheiros no seu quadro.
Isso faz com que boa parte desses projetos fiquem em análise. Nós temos 32 projetos em análise e 29 projetos em diligência do próprio DEPEN, dos 63 projetos que foram apresentados. Desses 63 projetos, apenas 2 projetos foram aprovados.
Do lado do DEPEN, eles criticam a qualidade desses projetos...
O SR. LAFAYETTE DE ANDRADA (PRB - MG) - Mas há a questão da Caixa Federal também. Há projetos que foram aprovados no DEPEN que ficam agarrados na Caixa durante 10 anos.
O SR. EGBERT BUARQUE - Sim, são os contratos de repasse, as construções via contrato de repasse.
Esses dados aqui são para mostrar esses gargalos de gestão, porque não basta ter o recurso disponível se os gargalos de gestão não forem resolvidos. Neste momento, o que nós temos é este quadro. Existe dinheiro; o recurso foi repassado ao Estado, e há cerca de 2 bilhões de reais nos Estados, mas a maioria das obras ainda não começou.
Com essa perspectiva de endurecimento das penas — e novamente não vou entrar no mérito se isso é bom ou ruim, porque não cabe ao TCU se pronunciar sobre isso —, a pressão sobre o sistema carcerário e a demanda por recursos vão aumentar, e a gestão tem que acompanhar essa demanda. Se não o fizerem, o sistema prisional vai continuar fazendo parte do problema, e não da solução, neste caso.
Esses dois últimos gráficos são apenas para mostrar a execução do FUNPEN nos últimos 18 anos, com destaque — eu deveria ter destacado em vermelho — para os últimos 3 anos: 2016, 2017 e 2018.
Este gráfico mostra isso melhor e evidencia o seguinte: havia um volume muito grande de recursos represados no DEPEN até a ADPF 347, a partir da qual o STF determinou o descontingenciamento do FUNPEN. Com isso, o FUNPEN tinha a sua principal fonte de receita como receitas financeiras do saldo que estava represado. Com esse descontingenciamento, a partir de 2016, essa receita financeira, que era a principal fonte de recursos do FUNPEN, caiu drasticamente.
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Para os próximos anos, o FUNPEN, como está estabelecido hoje — se nada for modificado —, não terá a mesma relevância que teve nesses 2 últimos anos, ou seja, os repasses do FUNPEN não serão no mesmo montante que foram nesses 2 últimos anos. Então, mais uma vez, colocando pressão sobre o sistema carcerário, teremos uma demanda maior para a oferta de vagas, e essa conta vai ficando maior. E o FUNPEN não vai ter condições de pagar a maior parte dessa conta, do jeito que está. Os Estados, ao que tudo indica, em razão da crise fiscal que assola boa parte deles, acredito que também não tenham esses recursos. Então, essa equação precisa ser pensada.
A SRA. PRESIDENTE (Margarida Salomão. PT - MG) - Vou prorrogar seu prazo por 3 minutos e concederei o mesmo tempo aos demais palestrantes. É que eu percebi que o senhor entrou aí na explicação dos dados e, realmente, interrompê-lo vai ser prejuízo aqui para a nossa assistência.
O SR. EGBERT BUARQUE - Desculpem-me.
A SRA. PRESIDENTE (Margarida Salomão. PT - MG) - Eu vou prorrogar por 3 minutos e vou garantir igual tempo aos demais palestrantes.
O SR. EGBERT BUARQUE - Muito obrigado. É só um fechamento aqui, uma conclusão, para reforçar.
Então, nesse mesmo trabalho que nós concluímos agora, no final de março, fizemos uma estimativa, com premissas até certo ponto moderadas, conservadoras, de quanto seria necessário investir no sistema prisional para que ele cumprisse a Lei de Execução Penal, e chegamos a um número — e ele, obviamente, será posto aí para contestação, para ser aprimorado — de investimento de cerca de 97 bilhões nos próximos 18 anos, considerando criação de novas vagas, reforma de unidades prisionais, gastos de custeio, de equipamentos. Isso dá uma média de 2,7 bilhões por ano, dentro dessa estimativa, e considerando que a taxa de crescimento da população do sistema prisional vai diminuir, não vai se manter no patamar dos últimos 18 anos, que, se eu não me engano, foi cerca de 8% ao ano. Essa taxa cairia, convergiria, aproximadamente, para o crescimento da população entre 15 anos e 29 anos de idade, que é a maioria da população carcerária.
Então essa previsão, diante de premissas assim conservadoras, já traz um número bastante imponente: 97 bilhões de investimento em 18 anos. Por que 18 anos? Porque pegamos o histórico de 2000 a 2018, para fazer essa projeção para mais 18 anos. Essa proposição aumenta a pressão, e esse número — como eu já ressaltei aqui, é contestável, pode ser aprimorado, e queremos que o seja — fica maior ainda.
Essa é a nossa constatação, diante dessas proposições, do ponto de vista da área da competência do Tribunal de Contas de trazer informações para subsidiar a decisão do Congresso.
Muito obrigado. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Margarida Salomão. PT - MG) - Muito obrigada, Dr. Egbert.
Passo, então, a palavra à Sra. Samira Bueno para suas considerações, também pelo prazo de 23 minutos.
A SRA. SAMIRA BUENO - Obrigada pelo convite, Deputada Margarete Coelho.
Obrigada, Deputado Capitão Augusto.
Saúdo todos os Deputados presentes e os meus colegas de Mesa.
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Eu não tenho formação jurídica, sou Diretora-Executiva do Fórum Brasileiro de Segurança Pública e minha formação é na área de administração pública e ciências sociais, mas assim como a fala do Egbert, a fala que eu trago aqui é uma reflexão sobre o impacto das propostas dessas alterações legislativas, no campo da segurança pública, especificamente do ponto de vista financeiro, o que isso pode representar diante das mudanças que ocorreram recentemente — no ano passado, houve uma série de alterações legislativas, no campo da segurança pública — e também um pouco na linha do que o Egbert traz de resultados para a aprovação desse pacote do ponto de vista financeiro.
(Segue-se exibição de imagens.)
Eu queria começar por essas mudanças recentes, porque eu acho que a razão de ser desta discussão aqui é o enfrentamento da criminalidade violenta que assola o País, e essas mudanças legislativas, de algum modo, estão sendo colocadas como resposta para isso. Eu queria trazer alguns antecedentes muito recentes que acho importante termos em mente, especialmente quando nós falamos do impacto financeiro.
No ano passado, houve a aprovação da lei que cria o Sistema Único de Segurança Pública — SUSP, que vem sendo discutido desde o início dos anos 2000, desde 2002, para ser mais específica, tanto pela Esquerda quanto pela Direita. Ambos os campos convergem em algum ponto — o Deputado Subtenente Gonzaga está aqui acenando. Eu acho que é, inclusive, unânime entre os policiais que nós precisávamos da aprovação do SUSP.
O SUSP é uma espécie de sistema único na segurança pública, como temos o SUS na saúde, tentando dotar esse sistema de segurança pública de maior capacidade de governança. Quem trabalha na área sabe muito bem que boa parte das tarefas relacionadas ao enfrentamento do crime, da violência e da prevenção recaem sobre as polícias estaduais.
De certa forma, há saturação do trabalho nas Unidades da Federação. A União deveria liderar ou coordenar minimamente esse processo e dizer, em linhas gerais, o que essa Política Nacional de Segurança Pública historicamente nunca foi capaz de fazer. Com relação aos Municípios, a Constituição deixou muito em aberto o seu papel. Pode-se ter guarda municipal? Mas o que isso significa? Tem o papel de prevenir crimes ou não? Os crimes são necessariamente um fenômeno territorial, e o Município tem, neste caso, um papel muito importante nisso.
A ideia do SUSP, aprovado no meio do ano passado, é de se tentar adotar um pouco esse campo da segurança pública de maior governança, dar mais racionalidade para esse sistema e induzir o aumento da participação do Governo federal no cofinanciamento da política de segurança.
O Egbert já mencionou — eu não vou me estender nisso — que nós temos uma alteração da Lei do Fundo Nacional de Segurança Pública, agora, com certa arrecadação a partir das loterias, e a criação de um Plano Nacional de Segurança Pública, que foi aprovado por um decreto em dezembro do ano passado. Trata-se de um plano decenal, com validade de 10 anos, que vai determinar, inclusive, os repasses de recursos do Fundo Nacional de Segurança Pública para os Estados e para os Municípios. Então, existe sim a previsão do repasse para os Municípios, independentemente de se ter guarda ou não.
Nós temos que pensar um pouco que toda essa discussão desses projetos de lei, de algum modo, está conectada a um espectro maior, que são essas mudanças que nós tivemos no ano passado, do ponto de vista até da arquitetura institucional da segurança pública.
Eu trago rapidamente aqui um dado — eu não sei se os senhores vão conseguir enxergar muito bem a imagem —, que é fruto de um estudo que nós vamos divulgar na semana que vem, que está pronto e posso compartilhar com os senhores. Basicamente, trata-se do levantamento das receitas do País ao longo dos últimos 15 anos.
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Não sei se os senhores conseguem enxergar aqui, mas basicamente este gráfico mostra que, desde 2012, nós temos uma estagnação da receita do Estado brasileiro, em torno de 3,6 trilhões de reais; a União tem a maior capacidade de arrecadação, com 58% da arrecadação da receita; as Unidades da Federação com 25%, e os Municípios só com 17%.
No entanto, quando nós olhamos o financiamento da segurança pública, vemos que há essa linha maior, que marca, no último ano, 78 bilhões de reais. Trata-se da linha das despesas com segurança pública das Unidades da Federação, até porque fazem a gestão das Polícias Civil e Militar, e têm esse custo de recursos humanos. São os Estados os que mais gastam com a segurança pública. A União está só com 11 bilhões de reais, e os Municípios com quase 6 bilhões de reais. As Unidades da Federação, embora tenham essa menor capacidade da receita, estão arcando com 80% das despesas com segurança pública, e essas despesas não incluem prisões. Nós estamos falando basicamente de gestão das duas polícias. O custo do sistema prisional é outro desafio do ponto de vista de se estimar o quanto custa.
Para avançar na nossa conversa, eu trago também um dado que diz respeito à execução do Ministério da Justiça, que mostra um pouco os recursos disponíveis e como eles vêm sendo gastos.
No último ano disponível, em 2017, o Ministério da Justiça executou 15 bilhões de reais, dos quais 11,5 bilhões de reais foram destinados para as Polícias Federal e Rodoviária Federal. Nós tivemos 1 bilhão de reais para o FUNPEN, mas, como o Egbert disse, é um número que está inflado. Entre 2016 e 2017, nós tivemos 2,5 bilhões de reais, dentro do FUNPEN, fruto do descontingenciamento que o STF determinou, a partir de uma ação proposta pelo PSOL, em 2015.
Os recursos do FUNPEN, o fundo, vinham sendo contingenciados para fazer superávit primário. Com o descontingenciamento, nós também tivemos uma mudança na lei do FUNPEN. Hoje, tanto os recursos do FUNPEN, quanto os do Fundo Nacional de Segurança Pública, não podem ser contingenciados. No caso do FUNPEN, agora é fundo a fundo. Então, o dinheiro que os Estados receberam para a construção dos presídios fica no fundo. No caso do Fundo Nacional de Segurança Pública, este dinheiro permanece como convênios, fazendo com que surja outro problema do ponto de vista de gestão e execução.
Aqui há mais um gráfico, só com a informação dos fundos, porque eu acho que é bom se refletir sobre eles e sobre o tamanho desse dinheiro, que, na verdade, é bem pouco. Em 2017, nós tivemos 700 milhões de reais no Fundo Nacional de Segurança Pública. Se nós formos olhar para o detalhamento, por exemplo, deste gasto, de 700 milhões de reais, 200 milhões de reais se tratavam de emendas parlamentares. Dos 500 milhões de reais, 450 milhões de reais foram destinados para a Força Nacional de Segurança Pública.
A capacidade de se induzir qualquer tipo de ação nos Estados é mínima, porque, dos 700 milhões de reais, sobraram 50 milhões de reais e, dentro desses 50 milhões de reais, em torno de 20 milhões de reais foram para o SINESP — Sistema Nacional de Estatística em Segurança Pública.
É importante se chamar a atenção para isso. O Egbert trouxe também, na apresentação dele, uma discussão sobre as escolhas que nós fomos fazendo em relação ao que se financia.
Enfim, eu acho que a apresentação do gráfico das receitas e toda a discussão que acontece hoje, nesta Casa, sobre a reforma da Previdência, mostram que nós temos sério desequilíbrio econômico e fiscal. Isso é algo que nós vamos ter que enfrentar, e as políticas públicas estão sendo comprometidas em todas as áreas, porque, basicamente, nós não temos dinheiro; o dinheiro acabou.
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Então, aprovar uma ação significa tirar alguma outra coisa da nossa cartela de opções e de projetos — não há recursos para fazer tudo. Estamos dizendo que, desses quase 90 bilhões de reais direcionados à segurança pública no ano passado, temos 700 milhões de reais do Fundo Nacional de Segurança Pública. Em 2018, como quase todo o valor do descontingenciamento do FUNPEN, valor próximo a 3 bilhões de reais, foi implementado em 2016 e 2017, em 2018 só temos 250 milhões de reais.
Vamos pensar no prognóstico, no que temos este ano do ponto de vista financeiro. Primeiro, o FUNPEN não deve receber mais nenhum recurso que estava represado nesse contingenciamento. Então, o valor do descontingenciamento já está disponível para os Estados, mas não deve gerar novos recursos. Temos a expectativa de que a mudança da Lei do Fundo Nacional de Segurança Pública vai gerar uma receita extra. A estimativa do Ministério da Justiça é de 1 bilhão de reais para a segurança pública. Mas a própria Comissão para análise de orçamento aqui da Câmara fez um texto, quando ainda era uma medida provisória a alteração, segundo o qual não existia uma memória de cálculo que pudesse atestar que o valor arrecadado seria de fato daquela ordem. Então, ainda estamos trabalhando um pouco com uma expectativa bastante otimista em relação a esses recursos que vêm da loteria.
Aqui está o gasto da Força Nacional de Segurança Pública e do Fundo Nacional de Segurança Pública.
Diante desse cenário, temos que pensar um pouco no impacto dessas mudanças do ponto de vista legislativo. Como o Egbert disse, muito provavelmente haverá uma pressão no sistema prisional, que não está aí considerado. O CNJ estima que o custo de um preso no Brasil hoje está em torno de 2.500 reais por mês — então, façamos as contas.
Eu vou dar um spoiler aqui para os senhores: amanhã nós vamos divulgar dados relevantes. O Fórum Brasileiro de Segurança Pública tem um projeto em parceria com o portal G1. E o Núcleo de Estudos da Violência tem monitorado vários indicadores de criminalidade e informações sobre o sistema prisional. Amanhã nós vamos divulgar os dados relativos a abril em relação ao sistema prisional brasileiro. Temos de novo um aumento na massa carcerária: há em torno de 750 mil pessoas encarceradas.
Mas eu gostaria de chamar a atenção para um ponto. Mesmo com todos esses recursos do descontingenciamento do FUNPEN disponíveis, tivemos ao longo desse último ano a criação de 8.651 vagas. Mas o número de presos no sistema cresceu para 21.952 — quase 3 vezes o número de vagas disponíveis. Então, permanecemos com um déficit em torno de 300 mil vagas, com mais 700 mil pessoas encarceradas. Então, mesmo com todo esse montante de dinheiro, o déficit permaneceu. E aí chamo de novo a atenção para o fato de que se tratou de um período de bonança.
Acho que os senhores não conseguem ver os números, mas, se olharem a evolução ao longo do tempo o montante de recursos dentro do Ministério da Justiça, por exemplo, e dos fundos — o Fundo Nacional de Segurança Pública, o Fundo Nacional Antidrogas e o FUNPEN —, o último ano que tivemos algum recurso significativo foi ainda na época do PRONASCI, em 2011. Então, há pelo menos 7 anos não temos grandes investimentos nessa área. Boa parte dessas despesas do Governo Federal tem sido com convênios, de forma muito difusa. E temos quase uma minirreforma no campo da segurança pública com a aprovação do SUSP e com a criação do Plano Nacional de Segurança Pública, na tentativa de lhe dar um mínimo de racionalidade. Como o projeto, pelo que pude ver, não traz nenhuma proposta no sentido de penas alternativas, muito provavelmente o impacto vai ser expressivo.
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Temos uma mudança na lei do FUNPEN que permite que parte dos recursos do FUNPEN seja utilizada com segurança pública. Acho que esse é outro ponto que precisamos considerar. Mesmo que tenhamos mais recursos disponíveis para o FUNPEN, parte disso está indo para fazer gestão das polícias e está indo, porque, de fato, é necessário. Embora esses 700 milhões de reais do Fundo Nacional de Segurança Pública possam parecer pouco — e, na verdade, são do ponto de vista do tamanho do desafio que temos —, para muitos Estados esses recursos são vitais. Há um estudo do Prof. Arthur Trindade, da UnB, que mostra que, para 19 ou 20 Estados, toda a capacidade de investimento está limitada aos recursos do Fundo Nacional de Segurança Pública. Então, eles não conseguem fazer investimentos sem esses recursos. Basicamente o que os Estados têm capacidade de colocar na segurança pública é o valor que vai ser desembolsado para salário, manutenção de viatura, delegacia e olhe lá, porque sabemos também que há vários Estados que estão parcelando os salários do funcionalismo público.
Dessa forma, temos um quadro muito grave do ponto de vista financeiro, e o projeto não traz nenhum tipo de estudo que embase as propostas aqui colocadas. Ele não traz, por exemplo, uma previsão da taxa anual de crescimento do encarceramento. Também não traz uma previsão do impacto econômico que essas propostas trarão, caso sejam aprovadas. Assim, no momento em que os senhores nesta Casa estão fazendo uma discussão sobre a reforma da Previdência, com esse grande desequilíbrio que existe nas contas, olhar para esse pacote e não mensurar o seu impacto econômico pode ser desastroso.
Enfim, eu não sei o quanto isso é possível dentro desta Casa. Sei que há o Regimento, com os trâmites próprios, mas eu acho que é preciso avançar na análise do impacto do custo financeiro de cada uma das medidas propostas. Isso não significa que estou fazendo juízo de valor sobre a aprovação ou não. Mas, em se aprovando, é preciso saber de que forma isso vai impactar, quanto vai custar se tantas pessoas a mais forem presas. Precisamos ter um mínimo de previsibilidade para fazer a política de segurança pública. E precisamos profissionalizar essa área. Se avançamos bastante nas áreas de educação e saúde, na área da segurança pública não conseguimos avançar nesse tema.
Além desse impacto no sistema prisional, há outras propostas colocadas das quais acho que ninguém vai discordar, como, por exemplo, a expansão do banco de identificação genética. Ele existe desde 2013, e ninguém vai discordar de que essa é uma ação importante. É claro que é uma ação importante, mas isso também tem custo. O SINESP está em desenvolvimento desde 2012. Ele custou até agora pelo menos 300 milhões de reais. Em janeiro deste ano, pela primeira vez, ele foi capaz de publicar uma estatística de homicídio mensal relativa ao ano passado. Embora seja uma ferramenta mais operacional, para integração das bases dos boletins de ocorrência, mas é algo que está em desenvolvimento há 7 anos, que leva tempo e custa dinheiro. E os recursos que estão sendo utilizados para o desenvolvimento do SINESP são do Fundo Nacional de Segurança Pública. A maior parte do dinheiro do Fundo Nacional de Segurança Pública está sendo utilizada para o financiamento da Força Nacional.
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Por que eu chamo atenção para isso? Porque, no momento em que se opta por desenvolver esse tipo de projeto, quem vai arcar com isso são os Estados, que dependem de algum modo desse cofinanciamento, dependem do repasse de recursos da União, e não há dinheiro disponível. Para os que não sabem, a Força Nacional de Segurança Pública é formada por policiais que são mobilizados das polícias estaduais e ficam a serviço da União. Eles são enviados para as missões nos Estados, desde que haja uma solicitação do Governador. O mecanismo de pagamento desses servidores pela União é por meio de diárias. Então, na verdade, esse é um jeitinho de remunerar essas pessoas, que continuam recebendo o salário pelos Estados, e a União as remunera com diárias. É como se fosse um certo bônus no salário, para ficarem disponíveis para essas operações da União.
Sendo assim, que está acontecendo? Estamos usando os poucos recursos disponíveis basicamente para o funcionamento da Força Nacional de Segurança Pública, que de algum modo já está sendo remunerada pelos Estados. Os Estados estão perdendo duas vezes: estão pagando o salário de um profissional que não têm à disposição no dia a dia, para as questões operacionais, e também não recebem recursos de convênio, porque o dinheiro que era destinado ao convênio para os Estados está sendo utilizado para o pagamento das diárias.
Dessa forma, temos uma questão aí que precisa ser equacionada e não temos sido capazes de fazer isso. E, ao que tudo indica, não temos novas fontes de recursos, até porque temos o teto dos gastos — outra questão que não podemos ignorar quando estamos fazendo essa discussão sobre esse projeto de lei —, que limita qualquer tipo de investimento. A partir de 2016, a correção pelo IPCA só vai incidir sobre os gastos que podemos ter do ponto de vista do Governo Federal nos próximos 20 anos.
Então, ainda que busquemos novas fontes de financiamento, nós também estamos dizendo que vamos mexer na lei do teto dos gastos. Se puxa de um lado, abre-se uma fissura em outro. Então, começa a ficar muito difícil ver uma solução do ponto de vista econômico para implantar tudo que está aqui proposto. Se for essa a opção, então vamos abrir mão de todas as outras políticas que estavam sendo implementadas, com todos os limites que elas têm.
Também devemos ter clareza sobre o fato de que o Estado brasileiro optou praticamente nos últimos 30 anos por alterar leis penais como forma de tentar enfrentar o crime e a violência. Acho que isso faz parte do jogo democrático, acho que boa parte das leis de fato precisam ser alteradas. Mas a lei penal por si só não resolve o problema. E, no momento em que se impacta financeiramente todo o sistema para conseguir financiar o que a lei penal vai provocar, de novo se está deixando descoberta uma outra área. Por exemplo, falamos do banco de identificação genética. É óbvio que expandir isso é superimportante para o País, e as investigações vão avançar muito. Mas em 2018 tivemos 559 investigações nas quais foram usados de fato o material genético e o banco de investigação genética. Repito: 559. Isso não é nada se formos pensar no tamanho da criminalidade no Brasil, onde há mais de 160 mil homicídios. Então, por que são só 559? De um lado, há um problema com o banco; de outro lado, há o problema das polícias técnico-científicas, que não têm recursos, que não têm pessoal, que não têm insumos nem para fazer a coleta desse material genético e não vão ter dinheiro — os Estados são superpressionados com a crise fiscal — para implantar esses novos métodos. Se a União não fomentar, através de repasse, isso vai continuar não acontecendo. A mesma coisa ocorre com a reestruturação das polícias, com todas as limitações que temos hoje, em especial em relação à investigação de crimes violentos.
10:51
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A última estimativa que fizemos mostrou, por exemplo, que em 2017 conseguimos esclarecer quase 25% dos homicídios do País, se considerarmos o número de denúncias oferecidas pelo Ministério Público. Então, a investigação dos crimes violentos é um grande dilema. Podemos aperfeiçoar todas as leis penais. Se a Polícia não conseguir fazer uma boa investigação, um inquérito para que o Ministério Público ofereça uma denúncia, nenhuma lei vai mudar essa realidade, porque vamos continuar lidando com essa ineficiência latente na ponta, que tem a ver com a polícia investigativa.
Eu coloquei os principais pontos em relação aos valores — e já vou concluir, porque meu tempo está acabando. De todo modo, independente da aprovação ou não do projeto que está aqui em tramitação, eu só queria chamar atenção dos senhores porque imagino que sejam muito pressionados e cobrados pelos seus eleitores nos seus Estados em relação a essa temática do enfrentamento da violência. Mas, do ponto de vista financeiro, o prognóstico é devastador. Mesmo que não se mexa em nada, provavelmente a receita vai ficar mais ou menos no mesmo valor que vem sendo desde 2012. Não temos nenhum prognóstico, nenhuma projeção de crescimento muito expressivo neste ano. Os Estados continuam muito pressionados, vários estão parcelando os salários dos servidores. Então, não devemos ter novas contratações.
Pensando nas polícias também, se conseguirmos remunerá-las de forma adequada, provavelmente não vamos ter ajuste salarial nem nada. E há a reforma da Previdência. A impressão que eu tenho é de que ela vai cair como uma bomba no colo dos policiais, porque essa reforma não está garantido isonomia entre os servidores. Na reforma dos militares vemos uma série de ajustes do ponto de vista salarial para garantir reposição salarial e tudo mais, mas para os policiais militares isso não vai acontecer. As Polícias Militares estão bastante insatisfeitas com isso, porque as Forças Armadas estão tendo um tratamento diferente.
Eu não me surpreenderia se, entre 2019 e 2020, essa grande crise econômica no campo da segurança pública resultasse, por exemplo, em greves nos Estados, assim como tivemos em 1997. Do jeito que está, o quadro já é muito grave. Precisamos buscar novas fontes de recursos para financiar isso tudo.
Aprovando essas leis da forma como elas estão, precisamos dobrar a aposta e pensar ainda mais em como financiamos isso tudo.
Obrigada. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Margarete Coelho. Bloco/PP - PI) - Obrigada, Samira.
Passo a palavra à Sra. Luiza Cristina Fonseca Frischeisen, para que apresente suas considerações, pelo prazo de 23 minutos.
10:55
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A SRA. LUIZA CRISTINA FONSECA FRISCHEISEN - Bom dia a todos e a todas.
Eu queria agradecer o convite feito pelo Deputado Capitão Augusto e pela Deputada Margarete Coelho para falar aqui em nome do Ministério Público Federal.
Eu gostaria muito de falar de financiamento de segurança pública, mas eu não vou falar sobre isso porque vou me ater aos outros dois temas da audiência de hoje.
Ontem esta Casa teve uma audiência pública específica sobre financiamento de Sistema Único de Segurança Pública — SUSP. Já peguei o material e ainda não o olhei. Mas vou falar sobre dois pontos que julgo importantes para os quais eu fui convidada para falar especificamente: do projeto de Sergio Moro e do projeto da comissão de Alexandre de Moraes. O projeto de Moro trata do confisco alargado, e o projeto de Alexandre de Moraes é sobre ação civil de extinção de domínio. São esses dois elementos.
Eu também adoraria falar se o projeto aumenta ou não o número de presos, o que temos para fazer para tirar, a questão de quem está preso, a questão da Lei de Drogas, sobre a qual também temos aqui um projeto na Casa para modificar. Mas, realmente não vou falar sobre esses temas, porque senão vou perder meus 23 minutos.
(Segue-se exibição de imagens.)
Então, eu vou falar um pouquinho sobre a questão do confisco alargado. O confisco alargado está muito ligado à ideia de que não adianta só prender, mas há também que se conseguir obter os bens adquiridos diretamente como produto do crime ou aqueles que foram misturados com o próprio patrimônio. Essa é uma realidade muito verdadeira, porque na lavagem de dinheiro o dinheiro ilícito é transformando em lícito. Assim, muitas vezes, ele se mistura com o patrimônio lícito: com o seu, da sua mulher, do seu pai, da sua mãe, dos seus filhos, da família inteira. Então, o confisco alargado vem muito nessa linha das convenções internacionais de combate à corrupção. Mas no Brasil, ele também é muito importante para o combate ao tráfico de drogas e ao patrimônio adquirido pelas milícias.
Quando falamos em quem mistura o patrimônio total, pensamos no Rio de Janeiro, pensamos nas milícias que estão ligadas tanto ao crime como à administração, às vezes, de serviços lícitos e ilícitos. O confisco alargado é uma medida do ponto de vista patrimonial que tem o objetivo de alcançar o produto do crime. Para quê? Para descapitalizar aquele que enriqueceu com o crime e permitir que outros grupos não enriqueçam e não possam produzir outras ações criminosas com aquele produto do crime.
O projeto de Moro traz essas questões aqui, que estão no art. 91-A. As razões pelas quais ele traz esse confisco alargado é que o Brasil é signatário de várias convenções de combate à corrupção. O confisco alargado é tido como uma possibilidade de conseguir o produto do crime, evitando o refinanciamento do crime. Entendemos que isso não fere a presunção de inocência, não é inconstitucional, por quê? Porque há um procedimento específico para fazer o confisco alargado.
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Então, a nossa apresentação aqui tem esse ponto sobre o qual o projeto está baseado — que são esses, e nós entendemos que são pontos positivos no projeto de lei — e aqui, de acordo com o que nos foi pedido, o que pode ser aperfeiçoado.
Nós entendemos que o projeto — aí já vou fazer um comparativo — tem uma coisa muito interessante: ele não estabelece rol de crimes. Então, ele tem uma versão moderna. Já fazendo a comparação, é uma das modificações que nós colocamos na ação civil de extinção de domínio. A ação civil de extinção de domínio tem rol de crimes, e achamos que não deve ter. Por quê? Porque toda vez que se coloca um rol de crimes, normalmente, acontece o seguinte: um, esquece-se de algum crime; dois, deixa dúvidas se aquilo vai abranger um crime que eventualmente seja tipificado no futuro. E aí se tipifica alguma coisa e tem sempre que se ficar modificando as outras leis. Já vivemos isso com a lei da lavagem de dinheiro. Primeiro, havia um rol de crimes muito pequeno; depois, aumentamos; e, hoje, não temos rol de crimes, sendo necessário só indícios. Podem ser crimes de toda natureza.
Isso foi muito importante, porque, por exemplo, no início, a lei de lavagem não alcançava contravenções. O jogo ilícito, especialmente o dos bicheiros no Rio de Janeiro, é contravenção. Então, só conseguimos tipificar a lavagem de determinados delitos se deixarmos o rol em aberto. Entendemos que o rol em aberto do confisco alargado é interessante, mas ele deixa conduta habitual superior a 6 anos. Entendemos que pode ser mais aberto, porque pode ser necessário o confisco alargado para uma organização criminosa. Como vou provar essa habitualidade? É a da organização criminosa, é a da quadrilha ou é a realização de vários crimes do mesmo tipo? Entendemos que isso pode ser melhorado.
No que se refere a produto ou proveito do crime, entendemos que pode ser retirado, porque produto ou proveito do crime já é o que temos agora. Isso não é o confisco alargado. O confisco alargado é para se conseguir aquilo que se misturou com o patrimônio lícito. Por exemplo, temos situações no Ministério Público Federal em que o dinheiro foi lavado em construção civil, foi lavado em bois, foi lavado em fazendas. Portanto, ele se mistura. Eu tenho a fazenda, a fazenda é lícita, mas o boi é ilícito, ou o contrário. Então, é necessário o confisco alargado para essas situações.
Nós estamos trazendo umas sugestões, para que seja feita a vinculação à organização criminosa, porque a organização criminosa já traz essa possibilidade de substituir a reiteração. Há uma questão que achamos importante, que não está prevista, que é ter o regime processual disso. Não está escrito — e essa é uma questão que nós temos nos colocado, há um indicativo — qual é o procedimento que vai ser seguido. É claro que como isso é uma alteração no Código Penal, ele não vai falar de procedimento, porque o procedimento estaria lá no Código de Processo Penal. Isso aqui é no CP, e achamos que deveria haver um dispositivo no CPP.
Agora, pode ter uma menção a qual rito vai ser seguido. Vai ser o rito normal das cautelares, da hipoteca e do sequestro, previstos no Código de Processo Penal, ou vai ser o rito da cautelar de uma tutela de urgência, prevista no Processo Civil? Acho interessante estudar essa questão, senão vai haver o dispositivo, mas vamos ficar discutindo anos como se aplica o confisco alargado. É importante fazermos uma remissão. Parece-me que o confisco alargado é uma cautelar que vai ter um resultado final, como as cautelares de sequestro e de arresto de bens, mas é importante ter algum dispositivo sobre isso. Bom, aqui nós trouxemos uma sugestão exatamente sobre esse rito. Mostramos aqui a forma como se faz em Portugal a promoção de perda de bens. Dizemos aqui qual é o rito. Isso é muito importante, do contrário, seria como dizer que vamos garantir um direito, mas sem dar o mecanismo processual. É importante termos um mecanismo processual pelo qual haja o confisco alargado. E este aqui é o exemplo de Portugal que nós estamos trazendo.
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Trazemos aqui outras questões também sempre como sugestão e já mostrando por que o confisco alargado não tem problemas de inconstitucionalidade. As pessoas falam: "Ah, mas vai ferir a presunção de inocência". Não, não vai ferir a presunção de inocência, justamente porque há a ação penal, a condenação, o tipo penal e vai se ter o rito especial para o confisco alargado.
Outra coisa importante também, já que estávamos falando aqui de financiamento, é a destinação do que for apurado. Sabemos que hoje, por exemplo, a nossa legislação penal traz a apreensão de bens na lei sobre o tráfico de drogas. Com base na lei sobre o tráfico de drogas, os bens são apreendidos e podem ser leiloados. Existe a questão da alienação antecipada hoje. O projeto Moro fala em alienação antecipada — já foi falado um pouco aqui. A alienação antecipada hoje é uma realidade. Inclusive, existe uma resolução do CNJ — Conselho Nacional de Justiça para os juízes para que se faça a alienação antecipada. Na lei de drogas há a destinação para o Fundo Nacional Antidrogas. Quem administra isso? A SENAD — Secretaria Nacional de Políticas Sobre Drogas, que tem até hoje a pretensão de ser uma agência de administração de bens.
A lei sobre lavagem de dinheiro fala em destinação dos bens, mas isso nunca foi regulamentado. Então, até hoje há uma discussão sobre para onde vai o dinheiro arrecadado dos crimes de lavagem. Vai para o Estado? Vai para o Município? O que os Estados têm feito? Têm feito atos para que as polícias utilizem os valores arrecadados dos crimes de lavagem. Mas, na área federal, por exemplo, são feitos leilões, e o dinheiro entra direto para o caixa da União. Então, é importante pensar nessa destinação.
Agora, quando se pensa em destinação, o que foi dito anteriormente pelo colega do TCU é importante. Por quê? Porque hoje, para os senhores terem ideia — eu estive na SENAD —, existem 90 mil bens apreendidos, em ações com trânsito em julgado. Quais são esses bens? Aquele montão de carros que vemos nos pátios das polícias, quando o Fantástico mostra. É aquilo lá. De quem são aqueles carros? São carros roubados de terceiros e de bancos, em operações de leasing. Por exemplo, um porsche que está ali pode ir para a polícia? Não pode. E o avião eu posso dar para a polícia? Quem vai pagar o combustível e o hangar? Então, a destinação dos bens realmente está muito ligada à manutenção e à administração.
É importante talvez já pensar na destinação, pensar em um fundo, em quem vai gerir esse fundo e como vai ser o aproveitamento dos recursos desse fundo. Em regra, o melhor, eu concordo, é leiloar. Não se faz a destinação do bem. Na verdade, pode-se fazer a destinação do recurso arrecadado com o bem. Foi apreendido um monte de armas. É possível a polícia usar essas armas? São as armas que devem ser usadas pela polícia? A polícia como um todo pode usar arma de cano longo? Então, talvez seja melhor dizer que vamos destruir o que é possível, vamos leiloar os carros, vamos leiloar bens e destinar parte desses recursos para o fundo específico que vai ser utilizado pela polícia ou pelos Governos dos Estados para políticas de segurança pública. Então, é importante também pensar nessa destinação dos bens do confisco alargado, bem como nessa investigação que tem a ver com o rito de que estávamos falando. Também trouxemos outras sugestões, que vão ficar no portal. Aqui temos um portal, e tudo o que trazemos fica disponível lá para que todos possam consultar, analisar, fazer críticas e também outras sugestões. Esta é uma sugestão para o projeto mesmo. Trazemos aqui uma sugestão para não haver rol de crimes. Acreditamos que seria a melhor sugestão para essa questão do confisco alargado.
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Vou terminar a apresentação para passar para outra questão. Aqui há só comparações. Temos outro texto, para eu falar um pouco sobre extinção de domínio.
A ação civil de extinção de domínio é uma previsão do projeto da comissão do Ministro Alexandre de Moraes. Como nós sabemos, essa foi uma comissão instituída aqui na Casa pelo Presidente Rodrigo Maia. E esse projeto é muito interessante porque passou por uma comissão, na qual havia representantes de todos os integrantes do sistema de justiça criminal: juízes, advogados, membros dos Ministérios Públicos Estaduais e Federal, bem como defensores públicos. Esse projeto foi muito debatido e já passou por filtros.
A ação civil de extinção de domínio é um projeto que tem sido tratado por quem lida com lavagem de dinheiro e combate à corrupção, pelo menos, desde o início dos anos 2000, porque sempre foi uma demanda da ENCCLA — Estratégia Nacional de Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro, da qual participam mais de 60 órgãos, entre eles o Ministério Público, o Poder Judiciário e também órgãos dos Executivos Federal e dos Estados.
A ação de extinção de domínio vai resolver uma questão muito prática, e vou falar para vocês qual é. Em Mato Grosso do Sul, o Ministério Público Federal processou Rafaat, que tinha bens à beça. O que aconteceu com o Rafaat?
(Intervenção fora do microfone.)
A SRA. LUIZA CRISTINA FONSECA FRISCHEISEN - Exatamente. E o que aconteceu com a ação penal? Foi extinta. O que aconteceu com os bens? Voltaram para a família, porque no processo penal não se persegue o espólio, pessoal. "Ah, mas eu não posso herdar bens ilícitos". Bom, meu amigo, mas não eram ilícitos, porque ele tinha os bens em seu nome, em nome da sua família, tudo misturado. Quem vai ficar com aqueles bens? Do ponto de vista penal, eu não tenho saída. Do ponto de vista civil eu tenho, com a ação de extinção de domínio. Assim, pode-se pegar os bens do espólio. O objetivo aqui é perguntar a quem tem o bem se pode comprovar a origem do bem.
A ação de extinção de domínio existe na Irlanda, nos Estados Unidos, na Inglaterra, na Colômbia, e serviu para bens que vinham tanto do terrorismo como do tráfico. Na Irlanda, a ação surgiu por causa dos bens ligados ao terrorismo, do Exército Republicano Irlandês, o IRA; na Colômbia, por causa dos bens dos traficantes. Então, a extinção de domínio resolve o problema verdadeiro e prático do que se fazer com os bens ilícitos, quando não há como fazer a persecução penal, por exemplo, na hipótese de a pessoa ter morrido, ou então em situações em que é muito difícil conseguir a tipificação penal do enriquecimento ilícito. Contra as milícias, no Rio de Janeiro, não se consegue a persecução penal de determinados crimes. Mas eu sei que o patrimônio está, sim, 250% maior. Então, uso a ação de extinção do domínio, porque é matéria cível e seguirá as regras do processo civil, com o contraditório e também com o rito.
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Essa ação civil de perdimento de bens é uma oportunidade muito boa para se estudarem os dois projetos, porque o melhor produto, no meu ponto de vista, de terem juntado os dois projetos — o projeto do Moro e o da comissão do Alexandre de Moraes — é podermos estudar a ação civil de perdimento de bens junto com o confisco alargado, para compreender que o confisco alargado é um produto na ação penal, e ação de perdimento de bens é um produto na área cível.
O que acontece? Também nesse projeto há rol de crimes. E nós entendemos que não deve haver rol de crimes. Por quê? Porque o rol de crimes não contempla, por exemplo, crimes como as grandes fraudes contra o INSS, crimes cometidos por Prefeitos, crimes em licitações, ou seja, vários crimes. Embora ele seja um projeto que tem natureza cível, ele não contempla esses delitos e ainda tem um rol. Quando se faz um rol, esquece-se de algo. Basta olhar o rol para vermos que algo foi esquecido. Se olharmos de novo, achamos outro esquecimento. Então, é muito importante que não haja rol, mas que se siga uma regra de confisco alargado como o da lei sobre a lavagem de dinheiro, que não tem rol de crimes.
Então, propomos a exclusão do rol de crimes, alterando tal critério para a extinção de domínio. Pode-se até vincular o cabimento da ação a condenações com determinada pena mínima ou pena máxima, ou seja, pode-se criar um critério relacionado com a gravidade do delito. E a gravidade do delito, em regra, está relacionada à pena. Para isso que há pena mínima e pena máxima e cabe suspensão condicional do processo, cabe transação. Vejam que estamos colocando essa ideia baseados na lei que trata da criminalidade organizada e na lei que trata da lavagem de dinheiro, que estabelecem esses patamares e não têm um rol de crimes.
Também estamos trazendo outro fundamento, que são as recomendações do Grupo de Ação Financeira Internacional — GAFI, de 2004. Para quem não sabe, o GAFI é um órgão de inteligência financeira. Todos os países fazem parte do GAFI, onde trocam informações. E quem representa o Brasil é o Conselho de Controle de Atividades Financeiras — COAF, nosso órgão de inteligência, criado pela lei que trata da lavagem de dinheiro, que é de 1998, alterada pela Lei nº 12.683.
Estamos trazendo aqui alguns critérios relativos às infrações penais, para substituir o rol de crimes, como, por exemplo, infrações com penas graves, adotando critérios da legislação brasileira, ou seja, penas privativas de liberdade superiores a 4 anos. Por que sempre usamos esse critério de pena superior a 4 anos? Porque até 4 anos o regime é aberto ou substitutivo, com penas restritivas de direitos.
O nosso sistema tem os regimes aberto, semiaberto e fechado. Se a pena for de até 4 anos, no regime aberto, ela é substituível por pena restritiva de direitos. Então, o pressuposto disso é que aquele crime cometido contra aquele bem jurídico protegido por aquela lei, cuja pena é passível de substituição, não é de uma gravidade que precisaria ter essa questão patrimonial. É um critério. Eu posso ter o critério do rol de crimes, eu posso ter esse critério, eu posso ter o critério de envolvimento com organizações criminosas. Algum critério eu tenho que ter. E é melhor ter um critério genérico do que um rol de crimes. Então, propomos uma emenda para ser analisada na ação civil de perdimento de bens. Subsidiariamente, queremos dizer que, se quiserem continuar com o critério do rol de crimes, vão ter que colocar alguns crimes aí, porque ficaram faltando. Por exemplo, ficaram faltando o tráfico internacional de pessoas para fins de exploração sexual e os crimes que estão relacionados aqui, que deveriam ter entrado no rol. Vejam que são muitos os crimes que estão faltando. Por isso, é melhor não ter rol de crimes e adotar outra prática.
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Consta também no projeto quem vai fazer isso. Trata-se de uma ação cível. E há menção de que a polícia judiciária — as Polícias Civis e a Polícia Federal — poderia fazer essa persecução. Bom, se isso é cível, essa possibilidade não está de acordo com a disposição da Constituição, que fala em persecução no caso de crime. Então, é uma coisa que temos que observar também. Quais serão os legitimados para propor a ação de extinção de domínio? Parece-me, claramente, que serão os Ministérios Públicos e, eventualmente, podemos pensar nas procuradorias da União, dos Estados e dos Municípios, como já é na ação de improbidade. A polícia judiciária não pode fazer isso, porque não tem capacidade postulatória. Quem postula em juízo, no âmbito penal, é o Ministério Público. No âmbito cível, o Ministério Público e as procuradorias públicas, como a Advocacia Geral da União. Isso é importante, senão de cara haverá um problema nesse projeto de lei, e isso vai atrapalhar todo o resto. Propomos excluir essa questão.
Volto a dizer que o rito é importante. Como vamos estabelecer uma ação civil de extinção de domínio sem estabelecer o rito? Temos que dizer qual é o rito específico, com contraditório, claro, e a sentença. Essa sentença vai ter natureza declaratório ou constitutivo-declaratória, porque ela vai declarar que aquele bem não teve origem lícita.
Temos que pensar também sobre se vamos poder executar a sentença imediatamente ou não. Eu posso fazer uma execução provisória. Eu faço a alienação antecipada e deposito a arrecadação em juízo. Não se pode confundir isso com execução provisória da pena, porque não se trata de pena privativa de liberdade ou restritiva de direitos. Não preciso da manifestação do segundo grau. Por quê? Porque aqui é uma questão patrimonial. Eu posso alienar o bem e depositar a arrecadação em juízo. Após o depósito em juízo, eu vou ver a destinação. "Ah, mas lá na frente houve reversão da sentença". Usa-se o dinheiro depositado na conta do juízo. Por quê? Para eu não deixar o bem perecendo, porque administrar bens é muito difícil, muito difícil! Quem vai administrar um posto de gasolina que pertenceu a uma pessoa de uma organização criminosa? Como eu conto os bois numa fazenda em Mato Grosso do Sul, com parte no Paraguai? Como fazemos isso? É muito difícil. Por isso, a alienação antecipada é o mais importante e é essencial, eu diria, em 99,9% dos casos.
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Era essa a apresentação que eu queria fazer para os senhores. Espero que eu tenha sido rápida e tenha exposto os pontos principais.
Agradeço a atenção.
Obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Capitão Augusto. PR - SP) - A nossa Coordenadora teve que se ausentar por alguns minutos. Daqui a pouco ela retornará.
Vamos desfazer a primeira Mesa, mas peço aos convidados que permaneçam no recinto, porque depois teremos as rodadas de perguntas.
Convido agora para comporem a Mesa os Srs. Eduardo Mauat da Silva e Samuel Vida. (Palmas.)
Depois, os convidados poderão responder as perguntas diretamente das bancadas. A câmera os filmará no local onde estiverem. Não precisarão retornar para esta mesa. (Pausa.)
Vamos começar pela ordem posta.
O Sr. Eduardo Mauat da Silva tem a palavra por 23 minutos para sua exposição.
Aproveito o momento para apresentar o nosso convidado. Ele é Coordenador-Geral do Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional do Ministério da Justiça e Segurança Pública, representando a Diretora do Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional, da Secretaria Nacional de Justiça, do Ministério da Justiça e Segurança Pública. Foi indicado pela Deputada Carla Zambelli.
O SR. EDUARDO MAUAT DA SILVA - Muito bom dia a todos.
Para nós é uma honra estar aqui com os senhores para este debate cidadão em relação a essas medidas que estão sendo propostas pelo Ministério da Justiça para o combate ao crime organizado e ao crime de modo geral.
Não temos nenhuma pretensão de ensinar Direito aos senhores. Quem seríamos nós para isso. A nossa ideia hoje é trazer alguns elementos para que os senhores possam, oportunamente, formar sua convicção acerca desses temas que são propostos aqui.
Nós nos propusemos a falar hoje sobre perdimento de bens, buscando não ser redundante em relação ao que disse a Dra. Frischeisen, que nos antecedeu. E, se der tempo, gostaríamos de abordar alguma coisa sobre o whistleblower.
Por coincidência, participamos de um evento com um representante dos Estados Unidos no mês de março, em que foi tratada essa questão do whistleblower, como é vista na lei americana, que já está bastante evoluída em relação a isso e tem apresentado alguns resultados bastante interessantes com relação a esse tipo de denúncia endógena, que vem dos servidores públicos federais, estaduais e municipais, relacionada a irregularidades cometidas dentro da sua repartição.
Primeiramente, em relação a perdimento de bens, o art. 91, na redação original do Código de Processo Penal, já prevê a perda de bens, como a Dra. Frischeisen mencionou. O que esse novo dispositivo procura fazer? A facilitação para que as coisas retornem ao seu devido lugar. Se um cidadão tem sob a sua posse ou propriedade bens que são produto de crime, esses bens ou são de terceiros, de particulares, de qualquer um de nós, ou provêm do Estado, de ganhos ilícitos do Estado. O que a lei prevê é colocar as coisas no seu devido lugar para que esse dinheiro retorne ao Estado e possa ser utilizado em benefício de todos nós. Essa é a ideia da lei.
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Eu estou atualmente trabalhando no DRCI, mas sou Delegado de Polícia Federal já há 20 anos. Então, eu já fiz algumas investigações em que me deparei com algumas dificuldades para colocar as coisas no seu devido lugar.
A lei de lavagem de dinheiro, que já está consolidada no nosso ordenamento, prevê uma inversão de ônus da prova em relação ao patrimônio. Se um patrimônio é apreendido cautelarmente no curso de uma investigação, o investigado tem que provar que tem dinheiro suficiente, proveniente de ganhos lícitos, para adquirir aqueles bens, senão eles são apreendidos. Quer dizer que essa inversão já existe de maneira tranquila no nosso ordenamento.
O que a norma proposta faz? Ela faz uma consolidação dessa regra e a coloca como regra aplicável a todos os crimes com pena superior a 6 anos, para que não vire também uma bagatela, até porque investigar crimes com questões patrimoniais às vezes despende grande esforço das instituições ligadas à persecução. Às vezes há quebras de sigilo, análise patrimonial, porque não basta empiricamente nós dizemos: "Fulano de tal tem uma fazenda em tal lugar que está em nome de laranjas". É necessário que se prove que essa fazenda tem alguma ligação com o investigado, que ele teve algum proveito em relação a isso e que aquilo está conectado ao patrimônio dele. É necessário que se prove ainda que os donos da propriedade são laranjas. Então, para que ocorra esse efetivo perdimento há um iter constitucional e legal que deve ser seguido.
Não imaginamos que essa lei vá trazer alguma facilitação para expropriação abusiva de bens de investigados, porque já existe norma praticamente igual a essa, só que estritamente ligada à lavagem de dinheiro. Além disso, existe todo um rito processual e procedimental para garantir que a identificação desses bens, a sua apreensão e o seu oportuno perdimento sejam feitos de uma maneira tranquila.
Fora essa questão da inversão do ônus da prova, o que nós achamos interessante também e gostaríamos de destacar para os senhores é que também foi garantida a possibilidade do contraditório. O condenado poderá demonstrar a inexistência da incompatibilidade ou a procedência licita do patrimônio. Quer dizer, vai haver necessariamente contraditório e ampla defesa ligados aos bens. Parece impróprio, mas vai haver contrário também ligado a essa questão dos bens.
Em relação à questão procedimental, acreditamos que se possa utilizar o que já existe no Código de Processo Penal. Os arts. 125 a 144 preveem medidas assecuratórias em relação ao perdimento de bens com base na norma que já existe.
Acreditamos que seja possível, no curso até do inquérito policial, identificar os bens ligados ao investigado que sejam evidentemente incompatíveis com os seus ganhos. Aí, aquele procedimento seguiria em apartado, com o processamento e a oportunidade de apresentação de provas, com toda a investigação relacionada à ligação do investigado com o patrimônio, para se demonstrar de maneira contábil e financeira que o patrimônio dele não é matematicamente compatível com a compra de determinados bens, o que é perfeitamente possível de se fazer. Nossos peritos já fizeram isso várias vezes. Pega-se o salário da pessoa, o que transita na conta dela, todos os ganhos, e se faz uma projeção daquilo que ela gastaria para sobreviver e do que sobraria para comprar alguma coisa. Assim se faz matematicamente a prova da incompatibilidade do patrimônio. Se ela ficar provada, o investigado tem a chance de provar também, por alguma outra maneira, que os bens foram adquiridos licitamente. Não ocorrendo essa prova, o patrimônio seria perdido, então, em favor da União ou dos Estados. Acreditamos que essa medida seja interessante para realizar de maneira mais eficaz a descapitalização das organizações criminosas e dos criminosos geral. Verifica-se de maneira corriqueira que, quando um elemento é tirado de cena, ele é simplesmente substituído, e a organização continua exatamente como estava, só mudam as pessoas que estavam lá. Então, para evitar que isso ocorra, é interessante que se descapitalizem essas organizações. E não estamos falando só de crimes investigados pela Lava-Jato, mas também de crimes mais rasos. Uma quadrilha de traficantes, por exemplo, em que há uma intensa troca de elementos, porque são presos, são mortos, fogem, etc., também precisa ser descapitalizada. E às vezes é difícil a questão de prova. Essa norma com certeza nos daria também ferramentas nessa área e em qualquer outra área de crimes com que nós estamos já acostumados a lidar.
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Com relação à criminalidade organizada de colarinho branco, entre outros tipos, também seria um facilitador o fato de nós podermos agir a partir de elementos coletados no curso da investigação que deem certa segurança de que certos bens são incompatíveis com determinado patrimônio. Isso será feito oferecendo-se ao investigado a oportunidade de prova de que aqueles bens foram adquiridos licitamente, sem que haja o perdimento imediato dos bens.
É interessante demonstrar um pouco mais de eficácia da norma criminal. Como nós dissemos, o que esse projeto busca, nesse item específico, é unicamente colocar as coisas no seu devido lugar. Os bens adquiridos ilicitamente que estão na esfera de atribuição dos criminosos precisam voltar ou para as vítimas ou para o Estado, para que ele possa devolver a todos nós políticas públicas de educação, saúde, etc. É isso que essa norma prevê.
Não há nenhum gasto orçamentário ou financeiro necessário, nenhuma necessidade de aprimoramento das instituições, de aparato, de tecnologia. Nós já temos todo o ferramental para trabalhar com isso. A ferramenta jurídica que nos daria um pouco mais de tranquilidade e de eficácia no nosso trabalho seria esta, a possibilidade de poder fazer essa inversão de ônus da prova que hoje já é, como eu disse, largamente utilizada no combate à lavagem dinheiro e a quaisquer outros crimes com penas superiores a 6 anos.
Verifica-se que a questão patrimonial também é enfocada na transação prevista na alteração do art. 28-A e seguintes. Segundo a proposta, o investigado deverá abrir mão também do patrimônio, reparar o dano ou restituir a coisa à vítima, salvo impossibilidade de fazê-lo — isso aí é só uma generalização do que já existe —, renunciar voluntariamente a bens e direitos indicados pelo Ministério Público, como instrumentos, produtos ou proveito do crime. Aí também está prevista a questão da descapitalização. Todas essas medidas estão voltadas à eficácia da lei penal. No Brasil, muitas vezes caímos naquele lugar comum de acreditar que as leis não funcionam, não pegam, etc., mas essa é uma lei bastante prática. Nós conversamos com alguns colegas e concluímos que ela teria efeito bastante prático nas investigações. Então, ela tem tudo para, uma vez aprovada pelos senhores, ser implementada já no dia seguinte. Acredito, sim, que com ela haveria um ganho muito interessante para a nossa sociedade. Com relação a bens ainda, eu gostaria de abordar a lei de extinção de domínio. Não entraremos em polêmica agora, mas quero dizer, com a vênia da Dra. Frischeisen, que as polícias judiciárias têm, sim, poder postulatório, e isso está previsto em várias normas. Não está previsto na norma o poder de investigação do Ministério Público, que foi concedido a ele pelo Supremo Tribunal Federal como uma benesse, em virtude de várias investigações que já fizeram com sucesso, e isso está consolidado também. Da mesma maneira que a investigação pelo Ministério Público, que não tem previsão legal nenhuma na seara criminal, está consolidada, o poder postulatório da polícia judiciária está consolidado na lei — não foi nenhuma jurisprudência que criou isso, basta ler a lei. Então, nós entendemos que as polícias judiciárias podem, sim, atuar nas questões cíveis de extinção de domínio. Seria mais ou menos como atuar numa ação penal ou numa ação civil comum. Não há grandes dificuldades nisso. Haveria mais autoridades voltadas também a atuar na área cível, em que o rito não é tão intrincado quanto na área penal.
11:31
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Sugerimos aos senhores que pensem com bastante carinho nessa questão de outorga também às polícias judiciárias dessa faculdade de promover as ações cíveis de extinção de domínio, porque são ferramentais importantes. O procedimento seria como o das ações cautelares, que nós já estamos acostumados a fazer todo dia. Então, não haveria grandes dificuldades em relação a isso. A instrução também não seria muito mais complicada do que a dos inquéritos policiais com que nós lidamos diariamente.
As perguntas serão feitas no final, Sr. Presidente?
O SR. PRESIDENTE (Capitão Augusto. PR - SP) - Sim.
O SR. EDUARDO MAUAT DA SILVA - Está bem.
Há outro ponto que eu gostaria de destacar para os senhores. Não sei se isso já foi tratado — parece-me que as sessões estão sendo temáticas —, mas, para que eu não fique batendo na mesma tecla e já que estou aguardando que talvez haja perguntas em relação à perda dos bens, eu só destacaria um item que consta do art. 310 da proposta de alteração do Código Processo Penal, relativo à soltura dos criminosos habituais.
Tenho 101% de certeza de que essa mudança trará um grande ganho a toda a sociedade. Há casos gravíssimos de criminosos que são soltos em audiências de custódia e, no momento seguinte, voltam a cometer crimes novamente, para o escárnio da sociedade.
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Lembro de um caso de Curitiba, em que o mesmo bandido voltou três vezes à casa da pessoa para roubar — três vezes! Ele foi preso pela polícia e foi solto; foi preso de novo e foi solto.
Esse escárnio significa retrabalho, é como enxugar gelo. O sujeito que comete crimes, é um criminoso habitual, é um criminoso profissional, não tem a mínima intenção de mudar de atividade, se for solto, vai fazer o quê? Vai roubar de novo, vai cometer crime de novo, vai matar, vai estuprar, vai assaltar. Então, é um ato humanitário, senhores, a alteração do art. 310. Imaginem pessoas que foram recentemente vítimas de violência serem sujeitas a essa mesma violência no mesmo dia, ou no dia seguinte, por pessoas que não têm a mínima intenção de abandonar aquela carreira criminosa. Estou falando isso porque eu vi na prática, senhores. Eu vi um elemento que foi preso pela Polícia Federal e saiu, não digo que antes de nós, mas logo depois de nós; ainda pediu carona. Isso é um escárnio. E ele já era reincidente, já havia cometido vários crimes.
O art. 310 fala do criminoso habitual e diz que, se o juiz verificar que o agente é reincidente ou está envolvido na prática habitual, reiterada ou profissional de infrações penais ou que integra organização criminosa, ele deverá denegar a liberdade provisória, com ou sem medidas cautelares, salvo se insignificantes ou de reduzido potencial ofensivo as condutas.
Nisso, a lei até ressalvou o furto famélico. Digamos que alguém esteja morrendo de fome e roube uma fruta ou um pedaço de carne no supermercado para seus filhos. Essa pessoa estaria fora do alcance desse dispositivo. Esse dispositivo seria para criminosos mesmo, para pessoas que são realmente perigosas.
É interessante que, durante a abordagem policial, o sujeito atira, quer matar, quer dar facada. Se dermos um milímetro de chance, ele vai matar alguém. Aí, quando ele chega à Justiça, vira bonzinho: "Não, eu nunca mais vou fazer isso". Só que ele já fez aquilo, já foi preso e solto várias vezes. Então, eu digo que, às vezes, há uma ingenuidade do Poder Judiciário, talvez por falta de um ferramental adequado, que os senhores possivelmente darão, para que se mantenha aquela pessoa presa, porque ela não pretende deixar de cometer crimes e vai, com certeza, continuar cometendo, tão logo seja solta.
Passado isso, vamos falar brevemente da questão do whistleblower, que vem do direito americano. Eles inclusive desenvolveram bastante essa doutrina.
Os americanos entenderam que há instituições públicas que precisam ser mantidas sãs, e há pessoas que observam coisas erradas e ficam atemorizadas de delatar, de comentar. Por quê? Elas podem não ter a prova em mãos, mas elas sabem onde conseguir aquela prova. No entanto, elas podem perder o cargo, a função, o emprego, caso façam aquela denúncia; elas podem ser retaliadas.
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Verificou-se no direito americano que isso estava acontecendo. As pessoas apresentavam denúncias relacionadas a crimes praticados dentro de repartições públicas das esferas federal, estadual e municipal e eram alvos de represálias. Isso fazia com que se alargasse a tolerância quanto às irregularidades. Salvo questões extremamente graves, as irregularidades eram toleradas, e isso estava fazendo mal à administração pública. Então, criou-se a figura do whistleblower, o sujeito que, de boa-fé, mesmo que ele possa estar indiretamente implicado naquela circunstância, explana os elementos que ele conhece a respeito daquela infração que estaria sendo cometida dentro da repartição.
A lei proposta no arcabouço do projeto do Ministério da Justiça prevê que, tal qual na norma americana, essas pessoas sejam protegidas de retaliação. A sua identidade também seria preservada, salvo se essencial para o prosseguimento do processo. E, nessa possibilidade, haveria ou a divulgação da identidade ou o termo de oitiva seria retirado dos autos, mantidas as demais provas colhidas. Quer dizer, não haveria o caso de alguém ser processado e não conhecer quem é o seu acusador.
Outra questão importante é que só com o depoimento daquela pessoa ninguém será condenado. Tem que haver vários elementos de corroboração. Então, o principal trunfo relacionado a essa alteração da Lei nº 13.608, de 2018, é criar um clima de intranquilidade para o cometimento de ilícitos dentro de repartições públicas, porque nunca se vai saber se quem está ao seu lado vai lhe denunciar. Isso eu acho ótimo, porque o criminoso não pode ficar tranquilo. Geralmente, o criminoso quer cometer o crime dentro do ambiente em que ele sente seguro e impune. Então, criando-se um ambiente de insegurança para o criminoso e se protegendo a pessoa que irá denunciar, para que não seja praticada nenhuma represália contra ela, inclusive sob pena de perda do próprio cargo, vai-se criar um clima para que sejam proibidas condutas ilícitas dentro de repartições públicas.
É claro que, no decorrer da aplicação dessa norma, uma vez aprovada pelos senhores, ela irá mostrar talvez a necessidade de ampliação desses benefícios, como existe na lei americana. Mas, numa visão preliminar, já seria um grande avanço.
Gostaria de ler um trecho que menciona que, no caso de retaliações que tenham sido praticadas antes da incidência dessas medidas cautelares que visam à proteção do denunciante de boa-fé, ele poderá ser indenizado. Poderá eventualmente ser fixada recompensa para o denunciante quando as informações disponibilizadas resultarem em recuperação de produto de crime contra a administração pública em até 5% do valor recuperado. Quer dizer, ainda há um incentivo financeiro para a denúncia. Isso tudo são questões de boa-fé. A lei fala em boa-fé. Se for provado que o sujeito era um criminoso que estava dentro da quadrilha e simplesmente se rebelou contra os colegas para ganhar algum dinheiro, ele já não recebe nenhum benefício.
11:43
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Nós estivemos em um evento para tratar desse sistema americano, e eu perguntei como ficaria essa questão no processo criminal. Por exemplo, o sujeito vai e diz que o chefe dele cometeu vários atos de corrupção. Instaura-se um inquérito policial e depois uma ação penal contra o chefe dele. O sujeito sofre medidas protetivas para que não perca o cargo, a função ou o emprego. Lá pelas tantas, por insuficiência de provas ou por qualquer outro elemento, o sujeito que foi acusado é absolvido. Como fica a situação do denunciante? Eu perguntei para os americanos como eles lidam com isso, porque isso é uma coisa com a qual nós vamos lidar futuramente. Eles disseram: "Nós vemos as questões como independentes. Se havia prova de boa-fé objetiva, ou seja, se objetivamente nós tínhamos elementos para verificar que aquela informação era idônea e aquele sujeito inicialmente não teria nenhum envolvimento com o fato, essa questão é independente do resultado. Sendo absolvido o acusado, a proteção ao denunciante permanece".
Agradeço a todos a atenção a esta nossa breve explanação. Nós nos colocamos à disposição oportunamente para as perguntas.
Obrigado, Sr. Presidente. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Capitão Augusto. PR - SP) - Eu que agradeço.
O último convidado de hoje é o Prof. Samuel Vida, advogado e professor de Direito da UFBA, Coordenador do Programa Direito e Relações Raciais da Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia. O senhor tem 23 minutos.
O SR. SAMUEL VIDA - Quero iniciar cumprimentando o Deputado Capitão Augusto e os demais Deputados presentes, especialmente o meu conterrâneo Deputado Orlando. Quero cumprimentar os expositores que me antecederam. Aprendi muito com as diversas intervenções. Quero cumprimentar todas as pessoas que estão aqui presentes.
Parece-me que nós estamos assistindo a um momento de suma importância para o próprio Legislativo, em que este GT, depois de constituído, oportunizou o debate sobre esses projetos de lei.
Nós temos uma tradição no Brasil de longa duração de condução dos debates sobre Direito Penal de forma muito aligeirada e costumeiramente orientada para a lógica punitivista. Isso tem trazido consequências muito graves para a cidadania e para as relações sociais no País. Eu daria como exemplo dessa longa tradição o episódio marcante que inaugura a República no País. Antes mesmo da aprovação de uma Constituição Republicana, o Estado brasileiro produziu um Código Penal, em 1890 — portanto, quase 1 ano antes da Constituição Federal —, que, àquela altura, adotava medidas reclamadas por parcelas sobretudo da elite da sociedade e que aprofundavam as desigualdades e as exclusões no País.
Eu cito duas, a título de exemplo: a primeira foi a criminalização da capoeira e, de certa forma, das religiosidades de matriz africana, visto que admitia a restrição ao direito de liberdade religiosa, quando supostamente atentasse contra a moral e os bons costumes, expressão de conceito absolutamente indeterminado, delegando-se à autoridade policial a responsabilidade de delimitar e definir o que seria atentado à moral e aos bons costumes.
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No Brasil, nós temos, por décadas, toda uma história de extrema violência contra as religiões de matriz africana praticada pelo Estado e, sobretudo, liderada pelas autoridades policiais. Na Bahia, por exemplo, um delegado se notabilizou, tendo se transformado em personagem de obra de Jorge Amado, o chamado Pedrito Gordo, um notório comandante de invasões a terreiros de candomblé e confisco de bens. Ainda hoje, no Museu do Crime, na Bahia, temos diversos objetos sagrados de terreiros de candomblé fruto dessas ações.
Em Maceió, Alagoas, tivemos um episódio ainda mais grave, a Quebra de Xangô, como se chama e hoje resgata a pesquisa historiográfica. No período de aproximadamente 15 dias, todos os templos religiosos de matriz africana, lá chamados de Xangô, foram derrubados, fisicamente destruídos, como consequência desta lógica que, volto a dizer, faz parte da tradição política e jurídica brasileira há muito tempo.
O segundo exemplo desta lógica que eu gostaria de resgatar diz respeito à fixação da maioridade penal. O Código Penal de 1890 fixou a maioridade em 9 anos. Nós sabemos de elogios públicos de intelectuais, como Nina Rodrigues, que vão afirmar categoricamente que se tratava de uma medida necessária para conter as crianças negras, criminosas natas, perigosas para a sociedade, que mereceriam, portanto, uma intervenção acautelatória, antecipadora de responsabilidades, vocacionada para a lógica do recrudescimento da punição e do aprofundamento da utilização do Estado como instrumento de repressão, e não garantia de direitos.
Parece-me muito oportuno que a Comissão e o Grupo de Trabalho tenham optado pela escuta, pelo debate e pela ponderação, antes de qualquer solução sedutora tomada internamente e de forma exclusiva pelos Parlamentares para a aprovação de tal ou qual expediente.
Eu gostaria de fazer este registro, porque acho muito importante abordar esta questão. É um alento para a sociedade civil perceber que, mesmo na conjuntura de dificuldades como a que vivemos no nosso País, há uma atitude de compromisso do Poder Legislativo em buscar o diálogo e procurar construir uma resposta legislativa que, de fato, dialogue com a pluralidade da sociedade, com a complexidade da situação, e que não ceda à lógica imediatista de certo apelo popular muitas vezes construído por interesses diversos — corporativos, eleitorais, midiáticos —, apelo que clama por mais punição, antes de ponderar a situação posta no âmbito do sistema penal e prisional do País.
Feito este registro, prossigo na tentativa de abordar três aspectos que envolvem os dois projetos e que, de certa forma, marcam a leitura que, como intelectual, professor, pesquisador, eu tenho buscado empreender, tanto na Universidade Federal da Bahia, como aqui na Universidade de Brasília, onde me integro à comunidade acadêmica.
Eu tenho desenvolvido, junto com vários outros intelectuais, um esforço de leitura do Direito brasileiro à luz das relações raciais. Nós temos construído um campo de pesquisa que se chama Direito e Relações Raciais, que vem mostrando como é longa a tradição no País de construção da juridicidade a partir da lógica da reafirmação, reprodução e manutenção de hierarquias raciais iníquas, profundamente geradoras de desigualdades, e como é necessário que elas sejam detidas. Não se pode cogitar a hipótese de uma sociedade democrática em que o Direito seja utilizado sistematicamente em desfavor de ampla parcela — eu diria maioria — da sociedade, que constitui a base deste Estado.
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Portanto, esta leitura é inevitavelmente articulada com esta dimensão: não é possível imaginar o Direito como algo asséptico, técnico, neutro e universal, que não produz efeitos diferenciados na sua implementação prática numa sociedade profundamente marcada por desigualdades, entre as quais o racismo é a mais aguda, tampouco é possível imaginar que o Poder Judiciário, ou o aparato do campo jurídico, para ser mais amplo, incluindo, portanto, as polícias, o Ministério Público e outras instâncias, opere com a lógica da absoluta descontaminação desta cultura que estrutura e define o funcionamento da sociedade e das instituições públicas e privadas no País.
Eu estou me referindo a coisas concretas, coisas da vida real. Dou como exemplo dois episódios recentes do Judiciário. Um deles diz respeito à decisão proferida pelo Juiz Federal Eugênio Rosa há pouco mais de 5 anos, quando ele declara em sentença que as religiões de matrizes africanas não poderiam ser protegidas por uma medida de iniciativa do Ministério Público, visto que, no entendimento do magistrado, não possuíam um livro nem uma hierarquia estruturada dos moldes do que ele concebe serem as condições que caracterizariam uma religiosidade. Trata-se de uma manifestação absurda, que, filtrando-se as diversas intolerâncias e as diversas percepções preconceituosas da sociedade, materializa-se numa decisão judicial. Ele foi obrigado a recuar, em face do repúdio e da reação mobilizada contra esta manifestação.
O outro exemplo, este muito mais recente, de algumas semanas atrás, ocorreu quando a Juíza Lissandra Ceccon, da 5ª Vara Criminal de Campinas, também em sentença, declara alto e bom som que o réu, que ela inclusive condenara, não possuía o estereótipo de criminoso porque era branco, possuía olhos claros etc.
Portanto, nós não podemos cair na ilusão de imaginar que, ao mexer no Direito Penal, nós estamos operando com instâncias, pessoas e estruturas absolutamente preparadas para lidar com esta situação de desigualdades. Pelo contrário: nós temos que ter todo o cuidado para impedir que estas presentes manifestações internalizadas no inconsciente, definidoras de escolhas morais, de juízos políticos e morais, interfiram na ação concreta do cotidiano e atinjam a cidadania, volto a dizer, da maioria da população brasileira.
Dessa forma, o primeiro aspecto que chama nossa atenção e que, a nosso ver, merece uma reflexão cuidadosa por parte do Parlamento é o sentido geral que marca as duas proposições, um sentido de intensificação do punitivismo, um sentido de resposta imediatista a uma situação real de problemas de violência, postos na sociedade, mas que procura a resposta na repetição de um caminho já trilhado por longo tempo, com efeitos e resultados visivelmente ineficazes, insuficientes. Mais ainda: esta opção potencializa a manutenção de um limite sobre o conceito, sobre o entendimento, sobre o debate acerca da segurança pública que vem sendo perpetuado no País, de reduzi-la a policiamento e a direito penal. É preciso sair desta armadilha, que tem, de forma muito visível, nos levado ao fracasso repetido e anunciado.
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Se analisarmos o que vem ocorrendo ao longo dos últimos anos — aqui uma parte destes dados foi muito bem apresentada, especialmente pela Samira —, vamos assistir a um processo histórico de investimento, de ampliação e de mobilização de recursos para a segurança pública. Exceto nos últimos anos, quando houve certa estagnação, nós tivemos uma história de crescimento no volume de recursos mobilizados para a segurança pública. Nós temos também uma história de aprovação de normas cada vez mais duras, cada vez mais restritivas, de ampliação do leque de criminalização de certas condutas, em que não conseguimos, por esse caminho exclusivo, deter a espiral de violência e de insegurança que se estabeleceu na sociedade brasileira. Deste modo, é preciso fazer ponderações, pelo reconhecimento de que este caminho não se tem mostrado o mais adequado, o mais apropriado, e não pode ser colocado como fonte exclusiva de enfrentamento da segurança pública.
A própria sabedoria do legislador constituinte quando nos apresenta, no atual texto constitucional, o entendimento de que a segurança pública é um direito social — é o que consta no art. 6º, além de já estar indicado no art. 5º —, de responsabilidade de todos e dever do Estado, sinaliza a possibilidade de outro caminho, o de recuperar um sentido para a segurança pública sem abrir mão do policiamento, sem abrir mão do aparato protetivo da sociedade, aparato repressivo de condutas delituosas, aparato que amplia o leque de articulações de esforços para outras dimensões, sobretudo articuladas com a garantia e a afirmação de direitos.
Se não deslocarmos este eixo, imagino que estaremos, independentemente do resultado que venha a se dar em torno destes projetos, assistindo à repetição de um ciclo, em que entregamos à sociedade promessas de mais punição, promessas de mais encarceramento, lembrando que já temos a terceira maior população carcerária do mundo, e solapamos a cada movimento destes a democracia, solapamos a cada movimento destes os direitos e as garantias fundamentais, ainda que sob o argumento sedutor de que há uma necessidade imperativa circunstancial, o que, entretanto, jamais justificaria tais opções.
Ainda sobre esta dimensão, parece-me que este Grupo de Trabalho pode dar início a um ciclo virtuoso de deslocamento desta abordagem, mobilizando a sociedade civil e outras instâncias estatais para a discussão sobre a segurança pública como algo muito mais amplo e articulado com a teia de iniciativas que não se exclusivize e não se finde ou se funda apenas nas políticas de repressão.
Neste sentido, o conjunto de proposições oferecidas ao debate pelos dois PLs aponta exatamente para o recrudescimento penal, exatamente para o avanço da modalidade autoritária do Direito Penal, que cada vez mais ameaça a democracia e cada vez mais, em nome de uma urgência na contenção da violência, solapa direitos, fragiliza garantias, inviabiliza as possibilidades de que a democracia floresça e se desenvolva em nosso País.
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O segundo aspecto, que me parece muito importante destacar neste diálogo com a sociedade, diz respeito ao descolamento cada vez maior, a partir de tais lógicas, da Constituição, tanto no sentido a que já me reportei, como no sentido específico deste debate em suspenso acerca da execução provisória da pena.
Nós vivemos uma situação em que muito provavelmente — há toda uma indicação neste sentido — o Supremo vai recuar da posição adotada em caráter precário, embora tenha se generalizado, de autorização — alguns têm entendido como obrigação — de prisão antecipada, de execução antecipada da pena. Digo "muito provavelmente" porque todo o cenário e as movimentações dos Ministros apontam nesta direção.
Assim, temos diante de nós um projeto em especial que sugere exatamente uma antecipação, estabelecendo na esfera infraconstitucional o que provavelmente, dentro de um tempo breve, pode estar caracterizado como inconstitucional, como impossível, como intolerável diante do que prevê a Constituição. Parece-me que este é um cuidado que precisa ser incorporado. Além do cuidado geral com a lógica garantista, com a lógica de afirmação da cidadania que a Constituição estabelece, é o cuidado também especificamente no tocante à antecipação da execução da pena.
Parece-me, ainda, que neste campo temos a necessidade de ponderação acerca de certos temas e abordagens que vêm se colocando com ênfase, todos eles, volto a dizer, se desgarrando da lógica constitucional. O ataque às audiências de custódia é desses exemplos. Nós não podemos reduzir a análise das audiências de custódia ao olhar de que eventualmente o fato de uma pessoa liberada de uma prisão ilegal, porque este é o critério básico para justificar a liberação na audiência de custódia, eventualmente cometa um novo crime deva ser considerado como razão para se desconsiderar a importância civilizatória da adoção tardia pelo Brasil desta regra internacional protetiva dos direitos fundamentais.
Nós estamos falando de um Estado que prende ilegalmente, que abusa de prerrogativas e do poder de policiamento de forma sistemática, e não como exceção. Portanto, não podemos inverter esta perspectiva e atacar as audiências de custódia como se elas fossem uma ameaça à segurança pública. Ao contrário: elas são um freio que pode permitir a entrada no circuito de legalidade da ação repressiva, tão necessária para quem sustenta, propõe e acredita na democracia como possibilidade.
É preciso, portanto, cuidado. É preciso não se deixar ser pautado pelos, digamos, apelos midiáticos, pelos programas sensacionalistas ou pela expectativa justa por parte da população de ter respostas imediatas, mas que nem sempre apontam para os mecanismos mais adequados, para que estas respostas venham de forma satisfatória.
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É bom lembrar que a democracia não pode ser confundida com as oscilações conjunturais da opinião pública, sob pena de mergulharmos no paradoxo de que seria razoável acabar com a democracia se a maioria assim desejasse. A democracia pressupõe, inclusive, a firme defesa de um núcleo de normas jurídicas protetivas da cidadania que colocam o cidadão protegido até mesmo do Estado, como condição de possibilidade. Muitas vezes, esta defesa exige, tanto por parte do Poder Legislativo, como por parte do Poder Judiciário, uma atitude contramajoritária, bem como a necessária coragem e o compromisso democrático de resistir às flutuações de humor circunstanciais que podem determinar retrocessos institucionais.
Este é um aspecto que me parece fundamental ser destacado e estar presente na nossa preocupação não só institucional, mas também política, quando apreciamos projetos desta natureza.
Estou acelerando aqui porque os 23 minutos são, ainda que muito generosos, insuficientes. Eu gostaria de tecer breves comentários sobre o aspecto do perdimento e da delação do bem, como vem sendo chamada.
A hipótese tangenciada pelo argumento formal de atacar o crime organizado mediante a fragilização material é, sem dúvida, um argumento tentador e inteligente, capaz de virtualmente produzir efeitos muito positivos para o combate ao crime, sobretudo o crime organizado. Mas é preciso, mais uma vez, ponderar os limites que uma ordem condicional democrática impõe. A hipótese de decretar o perdimento antes da sentença transitada em julgado potencialmente coloca em risco direitos, coloca em movimento situações que podem produzir prejuízos não só para os cidadãos, como para o próprio Estado, porque fica muito indeterminado como será feito o ressarcimento nas hipóteses em que, ao fim e ao cabo, os sujeitos que respondem aos processos venham a ser inocentados.
O que fazer, como fazer, como vai se dar este processo de compensação ou de reparação?
No caso particular do perdimento de bens, quando se estabelece a ampliação da regra de inversão do ônus da prova, atentando contra princípios estruturantes fundamentais do Direito Penal como mobilizadores, possibilitadores da ampla defesa de um processo legal que não extrapola os limites da razoabilidade, como ficam, por exemplo, as situações em que os sujeitos alvejados operam naqueles casos reais da vida em sociedade no Brasil?
Cito, por exemplo, casos que operam no mercado informal. Eu fico imaginando a zona de indeterminação que pode ocasionar injustas e precipitadas decisões sobretudo para aqueles sujeitos. Neste caso, volto a falar da população negra, que, por razões históricas estruturais, opera na economia informal e opera com interesses econômicos que nem sempre são estruturados dentro da dita legalidade.
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Por fim, quanto à delação do bem — permitam-me uma referência respeitosa à fala do meu colega de Mesa, meu antecessor —, parece-me perigosa a ideia de se instaurar um clima de intranquilidade como medida de prevenção do delito. Parece-me que isso flerta com a possibilidade de aliciar animosidade de variada ordem pessoal e de outras naturezas, para criar um clima de profunda degradação das relações nos ambientes de convívio.
Delação é sempre algo extremamente perigoso, se não for muito bem manejado, se não surgir sobretudo como fruto da manifestação espontânea de arrependimento real. Quando a delação é tangenciada pela possibilidade de obtenção de vantagens, ela vira um instrumento perigosíssimo. A história recente do País tem demonstrado a inconsistência de várias delações, em que algumas geraram até mesmo condenações precipitadas.
Portanto, não me parece boa medida adotar este tipo de expediente e trazer para as relações institucionais a possibilidade de que sujeitos, de forma anônima, criem instabilidade, retaliem desafetos e gerem um clima de intranquilidade que, a meu ver, respeitosamente, volto a dizer, longe de contribuir para a inibição do delito, pode instaurar um clima de absoluta perseguição recíproca, instabilização e envenenamento das relações no interior dos espaços institucionais.
Respeitando o tempo a mim conferido, estas são as observações que faço, ao tempo em que me coloco à disposição para o debate e volto a reafirmar minha alegria pela oportunidade de participar desta atividade, na condição de interlocutor da sociedade civil. Louvo a iniciativa do Parlamento e agradeço ao Deputado Marcelo freixo o convite. Espero que este debate prossiga, escute mais vozes e, ao fim, adote as decisões mais ponderadas a respeito. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Marcelo Freixo. PSOL - RJ) - Obrigado, Prof. Samuel. Obrigado a todas e a todos os expositores pelo tempo e pela dedicação.
A intenção do GT é exatamente fazer com que a sociedade civil participe de um tema tão relevante. Quem dera tivéssemos a chance de contar com a participação efetiva da sociedade nas audiências públicas para debate de todos os projetos de lei nesta Casa! Certamente, no lugar da ideia de perda de tempo, teríamos ganho de qualidade, o que efetivamente temos conseguido. Vamos até o fim de maio com duas audiências públicas por semana neste intuito.
Tem a palavra o Deputado Fábio Trad.
O SR. FÁBIO TRAD (PSD - MS) - Sr. Presidente, orientado que fui pela consultoria, peço que seja sanado um erro material no Requerimento nº 3, de 2019, apresentado por mim e aprovado, à unanimidade, pelo Grupo de Trabalho. Solicito que seja substituído o nome de José Benedicto de Figueiredo Neto por Benedicto Arthur de Figueiredo Neto.
O SR. PRESIDENTE (Marcelo Freixo. PSOL - RJ) - Está corrigido, Deputado.
Obrigado, Deputado Fábio Trad.
Temos a ordem de inscrições dos Deputados. Lembro que temos o tempo de 5 minutos para perguntas objetivas. Depois, passaremos a uma nova rodada de respostas dos convidados e das convidadas.
12:11
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Deixem-me fazer um esclarecimento. O Prof. Samuel sugere chamarmos todos os expositores à mesa. Eu acho sempre melhor colocarmos todos à mesa. Creio que cabem mais uns três, seria simpático. Nas outras audiências, a mesa era maior, mas, mesmo assim, nós não conseguimos colocar todos, e as respostas foram dadas pelo próprio auditório.
Peço desculpa aos senhores e às senhoras, em nome dos Deputados e Deputadas, mas, neste momento, está havendo na Casa uma quantidade enorme de audiências públicas: na CCJ, estamos com o Terra Livre Indígena; temos a audiência que trata do encarceramento de mulheres — todas estão funcionando ao mesmo tempo. Muitos Deputados participam de várias Comissões ao mesmo tempo. Quebrando um pouco o senso comum de que se trabalha pouco, quem quer trabalha muito. É verdade que nem todos querem, mas temos trabalho.
Concedo a palavra ao Deputado Subtenente Gonzaga.
O SR. SUBTENENTE GONZAGA (Bloco/PDT - MG) - Boa tarde a todos e a todas.
Agradeço a nossos convidados a presença.
Estamos aqui com o Vereador Leandro, de Paraisópolis, Minas Gerais. Seja bem-vindo, Leandro, à nossa Casa, a Casa do Povo!
Vou tentar organizar meu raciocínio.
Nós, Deputados que estamos nesta Comissão, acabamos repetindo muita coisa para nós mesmos. Mas, como os convidados são outros, precisamos lembrar.
Eu queria começar pelo que disse o Prof. Samuel. Eu tenho tido dúvida sobre a eficácia da proposta legislativa de execução em segunda instância na legislação infraconstitucional. Eu reitero: sou defensor da execução em segunda instância, por entender que ela é necessária. Nós não podemos, com um país do tamanho do nosso, querer que apenas o STJ e o STF consigam de fato dar o controle de legalidade e de constitucionalidade a todas as ações. Portanto, não vejo como termos eficácia na persecução penal se continuarmos dependendo do STJ ou do STF para pacificarem a compreensão do controle de legalidade nos processos.
No entanto, tenho sérias dúvidas se a legislação infraconstitucional seria suficiente para superar algumas dificuldades. Não o sendo, o que faríamos se a discussão constitucional que se coloca é a partir do princípio de que para alguns é cláusula pétrea o fato de que ninguém seja considerado culpado até o trânsito em julgado? Como é que superaríamos isso, até mesmo na Constituição?
Faço esta pergunta a todos, não apenas ao Prof. Samuel, que pontuou esta questão, mas aos outros, que também se manifestaram.
Voltando ao início do sistema prisional, Samira, os dados com que todos trabalhamos são dados do fórum, e todos nós nos apropriamos da produção de conhecimento do fórum. Muito daquilo em que estamos evoluindo é resultado da articulação e do poder sinergético que teve o fórum em processar, nos últimos 10 ou 12 anos — eu o acompanho desde 2008, quando da Conferência Nacional de Segurança Pública —, o quanto a produção de conhecimento que os senhores foram capazes de fazer e que vem sustentando mudanças legislativas aqui. Portanto, fica o nosso reconhecimento.
12:15
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Temos, por exemplo, a questão financeira do Fundo Penitenciário Nacional — FUNPEN. Se não me engano, a Medida Provisória nº 851, que depois virou Medida Provisória nº 855, parece-me, aquela do Ministro Alexandre de Moraes, retirava recursos do FUNPEN e colocava na segurança pública e, na segurança pública, era para a Força Nacional. Acho que nós realmente tivemos um grande avanço. Eu tive a oportunidade de ajudar a construir aquele texto, para que o princípio do fundo a fundo fosse bem consolidado, mas ainda não fomos capazes de fazê-lo em relação à segurança pública. Tentamos fazer no caso do Sistema Único de Segurança Pública — SUSP, mas não conseguimos. Nem agora, com a medida provisória das loterias, a ampliação do fundo, nós fomos capazes, porque houve uma resistência do Executivo.
O Executivo federal não nos permitiu melhorar e aprofundar esta questão, em se tratando do Fundo Nacional de Segurança Pública, o que, em boa medida, fizemos com o FUNPEN.
Com relação à Força Nacional, tenho uma posição crítica a ela, que não é de hoje. Acho que há um equívoco estratégico. A ideia nasceu na época do ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso, para fazer o controle dos movimentos grevistas e reivindicatórios dos policiais militares nos Estados. Depois, com Lula, sem projeto de lei, acabou-se criando a Força Nacional. Acho que houve um equívoco, do ponto de vista estratégico, em se tratando da segurança pública no Brasil.
A não ser a Polícia Penal, que eu defendo, o sistema prisional precisa de legitimidade para atuar no espaço que é só dele, ninguém mais quer ir para lá, ninguém mais vai para lá. Fora isso, eu não vejo a necessidade de criarmos mais polícias. Nós precisamos instrumentalizar as polícias que já existem, principalmente as que devem cuidar das fronteiras. É preciso que elas sejam fortalecidas nos Estados.
Apenas para rememorar, o fundo a fundo precisa ser aperfeiçoado. Talvez este seja um espaço, Presidente Marcelo Freixo, neste momento, para resolvermos a questão do fundo a fundo na segurança pública, já que tivemos resistência no ano passado. O Dr. Egbert traz um cálculo de 97 bilhões para os próximos 18 anos, que seria o custo de implementação das regras propostas neste projeto, em termos de encarceramento, se eu entendi bem esta referência.
Eu queria saber se há também o cálculo, se há algum estudo possível, da possibilidade de redução da demanda pela eficácia do cumprimento da persecução ou execução penal.
Por que estou perguntando isso? Para além desta discussão que estamos fazendo, temos um trabalho no plenário: o PL 7.223. Estamos trabalhando nesta proposição, que está na pauta do plenário. Trabalhando na Comissão Especial em 2016 e 2017, nós o consolidamos. O trabalho se deu em várias audiências públicas, passou pelo crivo do Departamento Penitenciário Nacional — DEPEN e do Ministério da Justiça. Aliás, o Ministro Moro novamente analisou o projeto e já encaminhou a nota técnica. Hoje o projeto encontra-se sob análise do Governo, na Casa Civil, e é bem mais rigoroso que esta proposta aqui, no sentido de uma nova modulação para a progressão do regime. O Deputado Fábio Trad tem participado ativamente conosco da formulação.
A proposta do Ministro Moro que está neste projeto dialoga apenas com um ponto da progressão do regime: o de 50%, nos casos de crimes hediondos que resultem em morte. Na proposta que está no plenário, já tendo sido avaliada pelo DEPEN, pelo Ministério da Justiça e por vários outros órgãos, estamos propondo uma alteração que mantém os atuais 16%, mas cria uma série de outros níveis: 20%, 25%, 30%, 40%, 50% e 70%. Nós estamos fazendo a modulação pela gravidade. Os 16%, que significam um sexto da pena, são mantidos, em se tratando de crime primário sem violência; os 20%, para crimes reincidentes sem violência; os 25%, para crimes violentos praticados contra a pessoa; os 30%, para crimes reincidentes com violência; os 40%, para quem exerce o comando da organização criminosa, e não para quem a integra. Há, dessa forma, um tratamento diferenciado dentro desta estrutura, que mantém o crime hediondo que não resulte em morte nos 40%, como já acontece atualmente, e colocando-se os 50%, conforme sugestão que o projeto do Juiz Moro traz para o crime hediondo que resulte em morte, seguindo a mesma lógica e elevando o resultado de morte para um nível maior, ou seja, 70%.
12:19
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Portanto, com esta proposta no plenário, nós estamos dialogando na Comissão e fazendo os cálculos baseados neste projeto. Esta não é a única realidade da Casa. Há vários outros projetos, este é um deles.
Eu fui Relator da Comissão Especial e trabalhei, e continuo trabalhando, muito este tema. O Dr. Gabriel, da consultoria desta Comissão, que aqui se encontra, também foi consultor no caso deste projeto. Nós dialogamos muito. Para mim, está muito claro que esta modulação atual de um sexto da pena realmente precisa ser alterada, e há consenso nisso. Eu não vou dizer que é um consenso do Plenário, porque ainda não votamos. Porém, estamos construindo um acordo com vários partidos.
É claro que não há unanimidade, mas precisamos fazer uma opção política, ou para a política de execução da pena no Brasil, porque o que está aqui efetivamente não está apresentando resultado.
Eu acho que, para discutirmos os erros do Judiciário, por conta da possibilidade do erro judiciário da Polícia de prender equivocadamente ou do Ministério Público de denunciar equivocadamente ou de dar uma condenação equivocadamente, precisaríamos ter noção de que percentual é este, para ver se se justifica o fato de não termos mais rigor no cumprimento da pena.
Este projeto dialoga com o regime fechado, indiscutivelmente. Nós não fechamos com outro regime, mas há consequências.
Portanto, feitas estas ponderações, volto à pergunta: será que, se dermos mais eficácia ou tornarmos mais rígido o cumprimento da pena, no sentido da progressão, o que efetivamente vai demandar novas vagas — não temos dúvida disso, é inquestionável, pois ninguém foi capaz de calcular quantas vagas, mas isso vai demandar novas vagas —, isso não teria efeito na redução? Quando avaliamos a reincidência no Brasil, parece que o próprio fórum fala em 80% ou 85%. Assim, a reincidência também não está, de alguma forma, ligada ao modelo, que, na minha perspectiva, significa a frouxidão dos 16% de cumprimento de pena para a progressão? Será que, com uma atenção maior neste sentido, nós não estaríamos invertendo esta curva? Este é um aspecto.
Há outro aspecto. Eu fiz esta pergunta na audiência passada. O Brasil tem 8% de elucidação de crimes, encarcerando a partir de condenações de 8 anos — de 4 a 8 anos, deve haver motivação pelo juiz. O CNJ diz que tem 900 mil mandados de prisão em aberto, para ser cumpridos. Se estamos buscando eficácia na persecução penal, é possível falarmos em eficácia sem efetivamente enfrentarmos o dilema ou a tragédia do encarceramento?
12:23
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Que vantagem terá a sociedade, se tornarmos todo o sistema muito mais eficaz na elucidação de crimes, na oferta de denúncias, nos julgamentos, mas se não tivermos, de fato, um olhar para a execução da pena, ponto final de tudo isso? Como trabalhar o desencarceramento na perspectiva de tornar eficaz o sistema da persecução penal? Este é um dilema a ser colocado.
Eu ainda pergunto ao Dr. Egbert se é possível o TCU fazer um cálculo, do ponto de vista financeiro, de como seria se o Brasil adotasse a polícia de ciclo completo. Nós precisamos deste cálculo. Este tema será enfrentado, ou melhor, já está sendo enfrentado — foi colocado na agenda de discussão da segurança pública desde 2008. Há várias propostas de emenda à Constituição que tratam deste assunto. Nós vamos enfrentar esta questão, ainda que existam divergências. Há divergências, e nós sabemos onde elas estão, e há desconhecimento. Nós precisamos dos dados.
Portanto, eu queria saber se é necessária uma inciativa, se precisamos provocar isso. Precisamos deste cálculo porque este projeto não ataca, mas dialoga com a eficiência e a eficácia da persecução penal. Na nossa compreensão, um dos grandes problemas da ineficiência na persecução penal, na atuação policial, é o atual modelo, este modelo de polícia partido, em que o ciclo completo não é admitido, coisa que só Brasil, Guiné-Bissau e Cabo Verde fazem. Nos Estados Unidos, há 18 mil polícias — a Samira já deve ter dito. Mas todas, a polícia militarizada e a polícia civil, fazem o ciclo completo.
Há uma divergência quanto à compreensão da Dra. Luiza e do Dr. Eduardo sobre se já está positivada ou não a competência de postulação da ação do perdimento de bens. Eu acho que isso precisa ficar claro, porque ou está positivada, e nós devemos reconhecê-la, ou não está positivada, e teremos que arbitrar quem vai fazer.
O Dr. Eduardo disse que já existe lei. Portanto, eu gostaria de saber sobre isso.
A SRA. LUIZA CRISTINA FONSECA FRISCHEISEN - Desculpe-me, Deputado. Eu falei em capacidade postulatória. A polícia faz a representação. Eu até vou falar sobre isso. Mas hoje a polícia faz a investigação e a representação. O Ministério Público, por sua vez, faz a cautelar, a ação civil. São coisas diferentes. A polícia faz as representações. Eu falei em capacidade postulatória nociva, como a AGU e o Ministério Público, e não em representação, que a polícia faz hoje, que está na lei.
O SR. SUBTENENTE GONZAGA (Bloco/PDT - MG) - Sim. Eu gostaria de saber sobre esta divergência.
Por fim, dialogando sobre a preocupação legítima do arbítrio — agora eu falo como policial militar —, nós não estamos buscando o arbítrio para cometer ilegalidades. A perspectiva dos policiais militares, ao fazer este debate, é a busca de eficácia. Percebam que eu estou fazendo um esforço para representar o pensamento da nossa categoria.
Acho que nós precisamos positivar a questão da reiteração e da repetição criminosa, para a discussão, por exemplo, da prisão preventiva.
A SRA. PRESIDENTE (Margarete Coelho. Bloco/PP - PI) - Deputado, peço a V.Exa. que conclua.
O SR. SUBTENENTE GONZAGA (Bloco/PDT - MG) - No art. 319 do Código, que trata da prisão preventiva, uma das motivações é a ordem pública. Eu apresentei um projeto de lei para tornar isso objetivo e coloquei a repetição criminosa de crimes violentos contra a pessoa como um dos critérios. Este projeto foi apensado ao projeto do Código de Processo Penal. O Relator setorial, o Deputado Paulo Teixeira, que não está aqui no momento, nem sequer reconhece no seu relatório a ordem pública como um dos pressupostos.
12:27
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Portanto, nós temos um debate a aprofundar aqui.
Muito obrigado. Peço desculpa se excedi no tempo.
A SRA. PRESIDENTE (Margarete Coelho. Bloco/PP - PI) - Obrigada, Deputado.
Como a Dra. Regina precisa sair um pouco mais cedo, eu vou tentar encaminhar o mais rapidamente possível.
Tem a palavra o Deputado Marcelo Freixo, para suas considerações.
O SR. MARCELO FREIXO (PSOL - RJ) - Senhoras e senhores, obrigado. Muito obrigado, Sra. Presidenta.
Serei muito breve e peço desculpa por uma delicadeza que busco nunca cometer: a de não permanecer para as respostas, em vista do que tinha dito.
A SRA. PRESIDENTE (Margarete Coelho. Bloco/PP - PI) - O áudio ficará disponível, Deputado.
O SR. MARCELO FREIXO (PSOL - RJ) - Toda a minha equipe vai ficar aqui, mas peço desculpa por essa indelicadeza.
Quero ser muito breve. Eu gostei muito das exposições. Nenhum de nós duvida da seriedade da segurança pública, e não podemos medir pelas nossas diferenças quem é mais e quem é menos preocupado com a segurança. Nós precisamos superar esta questão.
Ninguém é mais preocupado com a segurança do que o outro. Ninguém tem mais legitimidade do que o outro por ser mais preocupado. Existem concepções, ideológicas ou técnicas, essas coisas dificilmente se separam, pois nos marcam. Todos nós achamos que segurança é coisa séria e, por isso, todos nós estamos aqui.
Por considerarmos que se trata de algo muito sério, precisamos ter embasamento do que falamos, e é preciso termos estudos. É muito grave imaginar um projeto de lei que vai alterar o sistema penal, já que não se altera a segurança pública, porque especificamente este projeto do Ministro Sergio Moro é um projeto penal — ele não é um projeto de segurança pública. O projeto mexe com muito poucos fatores ou elementos da segurança pública. Isso não é uma crítica: é apenas uma constatação. Este projeto trata da questão penal, não é um projeto da segurança pública. Nós ainda aguardamos, e com ansiedade, um projeto de segurança pública. Achamos importante que venham muitos projetos para a área da segurança pública. Este tem natureza penal.
Por ser um projeto penal, ele vem num momento — quero resgatar a fala da Profa. Samira — de crise financeira profunda, tanto é que nós tivemos a votação da PEC do Teto de Gastos.
O Estado do Rio de Janeiro, por exemplo, está impossibilitado de realizar concurso público nos próximos 3 anos. Isso significa que não teremos a contratação de agentes penitenciários, de profissionais da saúde no sistema penitenciário, porque isso está impossibilitado por lei! Temos uma lei do teto de gastos.
Esta é a configuração fiscal, financeira e orçamentária brasileira. Não estou nem entrando na polêmica do significado destas medidas fiscais, em que também temos polêmicas. A questão independe disso.
Diante deste quadro, este projeto vai provocar um forte crescimento da população carcerária brasileira, para além daquilo a que já se vem assistindo. Quando encontramos o Ministro Sergio Moro, eu fiz a ele a mesma pergunta que fizeram a Presidenta Margarete e o Deputado Paulo Teixeira. Quando encontramos com o Ministro Sergio Moro, eu perguntei ao Ministro — foi a mesma pergunta da Presidenta Margarete e também do Deputado Paulo Teixeira —: qual é a expectativa? Qual é o estudo de impacto social e orçamentário? É isso que eu quero trazer como pergunta. Não se trata só de uma expectativa orçamentária, mas também de uma expectativa de impacto social.
12:31
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Nós temos 750 mil presos hoje. Daqui a 1 ano, com essas medidas adotadas, qual será a nossa população carcerária? Qual é a estimativa? Isso tem um impacto social também, não só um impacto orçamentário, evidentemente. É gravíssimo não haver a previsão de um impacto orçamentário. Qual projeto de lei pode ser feito sem impacto orçamentário? Nenhum! Por que esse pode? Não pode. É uma regra, da qual não podemos abrir mão. Qual é o impacto social disso? Qual público será diretamente atingido?
Nesse sentido, a falta de estudos vai permeando uma série de decisões. Por exemplo, o cancelamento das saídas das prisões no regime semiaberto é uma medida. Baseado em que estudos essa é uma medida necessária? Baseado em que estudos isso vai melhorar os índices de segurança pública? Baseado em estudos, eu garanto que apenas 4% dos presos que saem do regime semiaberto para visitas periódicas ao lar não retornam — apenas 4%. Baseado em que estudos se cancela o direito de visitas periódicas no semiaberto? É baseado numa sensação de insegurança? É um senso comum que permeia, no lugar dos estudos, as certezas desse projeto? Eu acho que nós precisamos trazer isso para o centro dos debates.
Vão aumentar de 30 anos para 40 anos a pena máxima? Em que estudo se baseiam, Deputado Subtenente Gonzaga, para dizer que uma quantidade X de presos que, depois de 30 anos, ganharam a liberdade provocou um aumento da insegurança pública, um aumento do crime? Qual é o estudo que existe sobre isso? Na verdade, vão dizer o seguinte: "Trinta anos é pouco". Por quê? "Porque eu acho pouco. Joga para 40 anos". Quarenta anos por quê? "Porque eu acho bom".
Qual é a base? Estamos falando de algo sério, como mencionei no começo da minha fala. Todos nós achamos que segurança pública é algo sério. Se é sério, em que se baseiam as nossas afirmações e mudanças muito graves?
Por exemplo, qual é o conceito de criminoso habitual? Em que lugar do Código Penal se define criminoso habitual? O que é criminoso habitual? Estamos falando de reincidência? Então, escreva "reincidência"! Precisamos ter segurança jurídica na hora de tratar de algo tão sério, que todos nós achamos sério. Por isso, estamos dedicando tanto tempo das nossas vidas aqui.
O que é criminoso habitual? Não há previsão legal do que é um criminoso habitual, a não ser na nossa sensação. Eu acho que nem o Eduardo Cunha poderia ser caracterizado como criminoso habitual. Isso significa o quê? Estamos falando de reincidência? O.k. Então, vamos fazer uma política de reincidência, com estudos sobre a reincidência, com casos de reincidência, e vamos propor algo que, baseado nos fatos da reincidência, nos leve a uma determinada mudança de lei propositiva. Não dá para aceitar que a ideia de um senso comum, elevado a uma potência máxima, defina mudança legislativa nesta Casa desse jeito. O que é criminoso habitual? Qual é a previsão legal disso? Não existe. Isso cai, no dia seguinte, no Supremo. Não há como definir. Não há como defender. Não estou dizendo que não há reincidência, mas vamos dar trato correto, com competência, com estudo, ao que queremos mudar, para mudar para melhor, porque este País já provou que as coisas podem mudar para pior. Temos provas contundentes disso nos últimos tempos. Nesse sentido, tentar acabar ou não valorizar os espaços das audiências de custódia, tratadas aqui pelo Samuel... Mais uma vez, registro que 42% dos presos são presos provisórios. Isso é um escândalo! Isso deveria ser tratado, e não é! São pouquíssimas linhas, e é preciso muito esforço para enxergá-las, para dar conta do preso provisório. Eles são 42%! Se temos como objetivo enfrentar o chamado crime organizado — entendemos que crime organizado, segundo a lei, são facções que se alimentam do caos penitenciário —, neste momento fiscal, sem estudos, o aumento da população carcerária pode resultar no fortalecimento dessas facções, do crime organizado. Essa é uma consequência previsível e possível. Podemos evitar isso.
12:35
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Enfim, eu agradeço muitíssimo. São essas as minhas considerações para a reflexão de toda a Mesa.
Peço perdão pela minha necessidade de sair, por ter compromissos em outras Comissões.
Obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Subtenente Gonzaga. Bloco/PDT - MG) - Obrigado, Deputado Freixo.
A Dra. Luiza quer fazer suas considerações, porque terá que sair. Porém, entre os presentes que vão se manifestar, temos inscrito só o Deputado Fábio Trad.
O SR. FÁBIO TRAD (PSD - MS) - Eu vou ser bem rápido.
A SRA. LUIZA CRISTINA FONSECA FRISCHEISEN - Eu aguardo.
O SR. PRESIDENTE (Subtenente Gonzaga. Bloco/PDT - MG) - Quero desejar boas-vindas ao Deputado Luiz Antônio Corrêa, que passou a integrar o nosso Grupo de Trabalho.
Seja bem-vindo!
Com a palavra o Deputado Fábio Trad.
O SR. FÁBIO TRAD (PSD - MS) - Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados, convidados, convidadas, vou fazer a primeira pergunta à Samira Bueno, porque eu cheguei um pouquinho atrasado em virtude dos trabalhos na CCJC e não pude ter o prazer de assistir à palestra do Egbert Buarque. Então, eu vou me dirigir primeiro à Samira Bueno.
Qual é a sua avaliação sobre a sugestão de se destinarem 25% dos recursos do Sistema S para o financiamento de programas de combate à violência e de prevenção na área de segurança? Essa sugestão está prevista no art. 10 do Projeto de Lei nº 10.372, de 2018. Quero saber se você concorda. Qual é o seu pensamento? Você acha que é interessante? Há, como sugestão para o Grupo de Trabalho, alguma ideia de como buscar outras fontes de financiamento que evidentemente não penalizem o contribuinte, para o financiamento de programas de combate à violência e de aparelhamento da segurança pública?
A outra pergunta é dirigida à Profa. Luiza Cristina.
A senhora é professora?
A SRA. LUIZA CRISTINA FONSECA FRISCHEISEN - Da escola do Ministério Público Federal.
O SR. FÁBIO TRAD (PSD - MS) - Sim, pela palestra, a senhora tem todo o cacoete de professora. Isso é muito bom.
Profa. Luiza Cristina, neste momento, eu quero lhe fazer uma pergunta no seguinte sentido: no caso de o acusado que teve seus bens constritos, apreendidos e já alienados ser absolvido, a senhora tem alguma outra sugestão, além daquelas do projeto, como mecanismo de reparação, para que não haja prejuízo irreparável?
12:39
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Concordo com o Delegado Eduardo. É preciso reagir duramente, sobretudo em relação à constatação, que é inevitável, da periculosidade das organizações criminosas no Brasil. Hoje nós vemos um crime organizado extremamente aparelhado, sofisticado, rico e, conforme alguns estudos afirmam, muito mais estruturado que as próprias forças do Estado.
Como disse o Deputado Freixo, não há realmente um conceito do que é o criminoso habitual. A pergunta é: por que não apresentamos um projeto de lei ou mesmo uma sugestão ao Grupo de Trabalho, para definir o que seja criminoso habitual? Poderíamos pensar juntos a esse respeito. Se realmente há uma anomia na conceituação do que seja criminoso habitual, vamos, então, criar a definição. Não existe, no art. 327 do Código Penal, o conceito de funcionário público? Podemos, então, conceituar criminoso habitual. É uma sugestão que eu gostaria de compartilhar com o delegado. Pergunto, ainda, a ele: qual é a sua avaliação e o que pensa sobre o ciclo completo? Concorda? Seria interessante para dar autonomia aos agentes e a outras forças de segurança, para também investigarem? Pergunto se ele pode apresentar mais sugestões legislativas para a descapitalização das organizações criminosas.
Estou procurando provocar a criatividade dos convidados para ajudar o Grupo de Trabalho.
Concordo com o Samuel quando diz que o nosso sistema penal é seletivo. Isso é histórico. Inclusive, trata-se de um sistema que é seletivo a partir da própria formulação da lei penal.
Com a Operação Lava-Jato, surgiu outro perfil de destinatário da lei penal, e isso ficou mais visível: não é mais o pobre, o negro, mas sim o branco, o rico, o corrupto. Eu pergunto: esse fenômeno, na sua avaliação, representa ou não um avanço na estratégia de se combater a seletividade do sistema penal?
É claro que houve mesmo algumas violações às garantias individuais nessas operações, mas vamos procurar nos abstrair no seguinte sentido: só o fato de ter emergido outro destinatário da lei penal é um alento ou não na sua avaliação? Eu gostaria de ouvir o Prof. Samuel também.
São essas as considerações. Vou me abster de fazer comentários, porque a nossa estratégia é mais provocar as inquietações dos convidados para aprimorar o nosso Grupo de Trabalho.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Subtenente Gonzaga. Bloco/PDT - MG) - É mais eficaz, Deputado Fábio Trad.
Vou passar a palavra para a Dra. Luiza, pedindo permissão aos demais membros da Mesa, porque ela tem que sair. Depois passarei a palavra para o Deputado Gurgel, para as suas considerações, e, em seguida, voltaremos a ouvir a Mesa.
Estão encerradas as inscrições de hoje.
12:43
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A SRA. LUIZA CRISTINA FONSECA FRISCHEISEN - Deputado, eu vou me permitir começar pela pergunta que o senhor fez sobre a questão da execução provisória da pena.
A execução provisória da pena é um tema muito caro para mim, porque, antes mesmo de o Supremo ter revisto a sua posição sobre a possibilidade de execução provisória da pena, eu já tinha escrito sobre isso.
Primeiro, é importante dizer que a nossa Constituição é de 1988 e que, de 1988 a 2009, houve execução provisória da pena, sob a égide desta Constituição, com alguns dos próprios Ministros que lá estavam. Qual era a realidade? Fazia-se execução provisória da pena depois do segundo grau. Sempre se fez isso. Eu atuo e milito na área criminal no Ministério Público Federal há muitos anos e fazia execução provisória da pena.
Essa execução provisória da pena partia do princípio de que o recurso especial e o extraordinário são especial e extraordinário, e, portanto, não fazem revolvimento de prova e nunca tiveram efeito suspensivo, salvo se requerido em medida cautelar. A defesa sempre teve o habeas corpus para discutir o que fosse necessário. A modificação da execução provisória da pena não se deu num caso de crime contra o patrimônio ou contra a vida. A modificação se deu num caso de sonegação fiscal.
De 2009 a 2016 — portanto, num tempo muito menor do que de 1988 a 2009 —, o Supremo disse que era possível fazer, de novo, a execução provisória da pena. O que aconteceu entre 2009 e 2016? O Supremo, em todos os momentos em que quis dar a execução provisória da pena, deu a execução provisória da pena antes do trânsito em julgado, mas o fez seletivamente. Eu posso citar um caso do Mato Grosso do Sul, um caso de corrupção de um Desembargador Federal do TRF-3. Depois de inúmeros recursos, depois dos famosos segundos embargos de declaração, o Ministro Gilmar disse: "Está bom. Chega! Vai executar a pena". Estou falando de casos em que atuei e que conheço de perto, portanto. Num outro caso, um juiz também deu execução provisória da pena, por questão de corrupção. Estamos falando de execução provisória em crimes da área federal, com atuação do Ministério Público Federal, de ação penal originária, seja no STJ, seja no Tribunal Regional Federal da 3ª Região.
Naquele momento, em 2016, aconteciam inúmeros recursos procrastinatórios — inúmeros. Justamente porque a prescrição era o destino desses processos, o Supremo foi criando outras posições, que estão inclusive no projeto, que são os marcos interruptivos da prescrição. Nós não falamos sobre isso. Qualquer acórdão interrompe a prescrição. Essa posição do Supremo foi feita no caso do propinoduto, que foi um caso envolvendo recursos do Rio de Janeiro. O Ministro Alexandre de Moraes disse: "Os acórdãos interrompem". Isso me parece óbvio, mas a interpretação não era bem essa. Então, a sentença interrompe, o acórdão interrompe, tudo interrompe.
O boletim do Supremo desta semana traz uma decisão do Ministro Marco Aurélio, vencido, sobre a questão da execução no caso do propinoduto. Depois de condenado em três instâncias, já no STJ, a parte pedia para responder em liberdade, e foi mantida a prisão.
Então, essa questão da execução provisória da pena — parece-me — pode ser feita, sim, por meio de lei, porque assim sempre foi. A lei existia. O que é importante? Modificar a Lei de Execução Penal — LEP, que está modificada para a execução provisória da pena restritiva de direito. Há uma discussão entre o STJ e o Supremo: o Supremo não admite, o STJ admite. Espero que não haja modificação. O Prof. Samuel espera que haja, e eu espero que não haja.
12:47
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Eu lhes digo isso baseada em números, porque atuo junto ao Superior Tribunal de Justiça em matéria criminal e tenho números da modificação. Quando essa questão estava para ser discutida novamente, nós fizemos memoriais no Supremo Tribunal Federal e constatamos que 50% da movimentação criminal do Superior Tribunal de Justiça é de habeas corpus e de recursos em habeas corpus — não são de recursos especiais nem de agravos em recursos especiais —, e 40% vêm do Estado de São Paulo. Os HCs são concedidos? São concedidos, de ofício, grande parte com parecer do Ministério Público. Por quê? O Tribunal de Justiça de São Paulo não costuma, em muitos acórdãos, obedecer à decisão do Supremo e do STJ, tais quais: progressão de regime em caso de tráfico de drogas, possibilidades de substituição em penas alternativas. Portanto, quando perguntam se são concedidos, eu digo: "São, mas, para modificar a pena, não". Essa pesquisa foi feita no Supremo pelo Ministro Barroso. Qualquer um que procurar no Google o número de concessões de habeas corpus do STJ e do Supremo vai obter esses dados.
Então, parece-me que o que for feito em termos de legislação será simplesmente dizer aquilo que foi dito entre 1988 e 2009, na interpretação da nossa Constituição Federal.
Sobre a audiência de custódia, ressalto que o Ministério Público Federal defende a audiência de custódia. Nós não achamos a audiência de custódia inútil, mas achamos que a audiência de custódia pode ser mais bem aproveitada para os acordos de não persecução penal. Somos favoráveis aos acordos de não persecução penal, que estão previstos no projeto do Sergio Moro e no projeto do Alexandre de Moraes. Defendemos a posição do projeto do Alexandre de Moraes, que fala em acordos de não persecução. Estamos falando de acordos de não persecução pré-processual com penas alternativas. Não estamos falando de penas restritivas de direito, mas de penas restritivas de liberdade. O projeto do Moro fala em até 4 anos. Para nós da área federal, isso é muito importante. Por quê? O Conselho Nacional do Ministério Público tem uma resolução que permite os acordos. Nós já fizemos 500 acordos no Ministério Público Federal — eu coordeno a área que faz essas estatísticas — e temos acordos relacionados a estelionatos contra a Previdência, contrabando e descaminho, falsidade e moeda falsa. Se pudéssemos fazer isso em audiência de custódia, seria ótimo.
Então, defendemos a audiência de custódia e fazemos acordos em audiência de custódia.
O projeto do Moro, de fato, trata de 10 ou 13 leis. O Deputado Freixo falou da questão do endurecimento do regime — o Deputado Subtenente Gonzaga também abordou isso — e da questão de não haver saída no semiaberto. Essas questões devem ser consideradas na lei penal? Talvez elas devam ser consideradas na Lei de Execução Penal. Há um projeto sobre isso aqui na Casa, que passou pelo Senado e está esperando o Relator especial. O projeto de execução penal saiu daqui, foi para o Senado, saiu do Senado e veio para cá. Os Deputados irão aprová-lo? Talvez aprovem algumas coisas, talvez não aprovem outras.
Quando se fala em recrudescimento da pena — digo isso por mim, pela minha experiência —, deve-se considerá-la de forma individualizada. Dizer que a pena para determinado crime vai ser cumprida 100% no fechado é meio caminho para a inconstitucionalidade. "Nesse caso aqui, só vai poder progredir com esse tanto". Por quê? Nós temos esse precedente no Supremo, no caso da Lei de Crimes Hediondos, da individualização da pena. Podemos tratar disso na Lei de Execução Penal. Por que 40 anos? Quando você analisa a progressão de regime, percebe que ela acaba se dando de uma forma muito mais rápida do que deveria. Assim, a pena de 30 anos nunca é cumprida em 30 anos, a pena de 15 anos nunca é cumprida em 15 anos, a pena de 10 anos nunca é cumprida em 10 anos. A solução é aumentar para 40 anos? Creio que não, porque vamos ter o mesmo problema: a de 40 anos não vai ser cumprida em 40 anos, vai ser cumprida em 20 anos; a de 20 anos vai ser cumprida em 10 anos; etc.
12:51
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Então, nós temos que ver o quê? Nós temos que ver a Lei de Execução Penal e as condições de progressão de regime para um dos apenados. Para isso, nós precisamos da construção de presídios para regime semiaberto. Do fechado, ele vai direto para o aberto, porque não há semiaberto. "Se não há semiaberto, eu ponho no fechado. Pelo menos vai ficar preso". Isso tudo não pode ser ignorado.
Para que exista uma solução, nós temos que compreender o sistema como um todo. O sistema como um todo inclui a segurança pública. Hoje nós temos uma política de segurança pública, que é o Sistema Único de Segurança Pública — SUSP, e o financiamento da segurança pública. Ontem houve uma audiência só para discutir isso aqui na Casa, só para discutir sobre o financiamento do SUSP. Temos que entender o processo penal, o direito penal e a execução penal. O negócio começa com a fixação. Qual é o bem jurídico que eu vou proteger pelo direito penal? Isso é importante. Há a pena mínima e a máxima. E, decorrente das penas mínima e máxima, eu tenho o quê? O regime. Depois eu tenho a execução penal. Então, se eu quero ter um caminho para isso, tenho que ter a compreensão do todo.
É muito importante falar sobre a execução provisória da pena também. Eu não posso esquecer que hoje a execução provisória da pena inclui o processo do júri. Hoje você pode fazer a execução penal depois da condenação do júri. Eu acho que isso é muito importante, num país que estava com 60 mil homicídios e só 8% de resolução dos crimes do júri. Quando falamos em júri, nós falamos da família da vítima. Então, é bem importante fazer a execução provisória, muitas vezes, inclusive quando o réu respondeu o processo solto. É importante essa questão também.
Quando falei sobre a capacidade postulatória, eu me referi à capacidade de agir em nome próprio. O que o Polícia Federal faz — o Delegado Eduardo tem toda razão — é representar em juízo, na investigação criminal. Isso está previsto na lei. Não há o que discutir. Essa capacidade de representar em juízo, por uma quebra de sigilo, poderá ser feita no cível? Foi o que eu apontei, quanto à questão da ação de extinção de domínio. A Polícia Federal faz essas representações, até porque essa quebra de sigilo e a interceptação telefônica são cautelares na investigação que está sendo feita pela polícia no inquérito, com acompanhamento do Ministério Público. Então, nesse sentido, a polícia faz a representação, que será analisada pelo Ministério Público e pelo juiz. Quero só deixar claro esse ponto, porque, de fato, o senhor perguntou.
Sobre o ciclo completo eu vou me abster, porque seria necessária outra audiência pública. Eu acho que esse é um tema muito importante e está intrinsecamente ligado à questão da segurança púbica. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Subtenente Gonzaga. Bloco/PDT - MG) - Obrigado, Dra. Luiza.
O nosso acordo de procedimentos prevê que os membros têm 5 minutos e os não membros, 3 minutos, para fins de esclarecimento.
Tem a palavra o Deputado Gurgel.
A SRA. LUIZA CRISTINA FONSECA FRISCHEISEN - Deputado, eu vou pedir licença para me retirar.
Obrigada. Até logo.
O SR. GURGEL (PSL - RJ) - Não membros, deem-se por satisfeitos por terem 30 segundos!
12:55
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Brincadeiras à parte, a reforma penal é uma realidade no nosso País. Precisamos conseguir não só isso, não só esses pacotes que vieram para cá. Acho que nós precisamos reformular todo o nosso sistema penal, que faz parte da segurança pública.
Costumo chamá-la de nível 2. Nós temos vários níveis de segurança pública, e eu costumo chamar a reforma penal de nível 2, assim como a execução da pena, como a doutora falou.
Eu gostaria de considerar alguns pontos. Eu cheguei agora — todo o mundo percebeu —, mas me foi passado aqui um pouco do que foi tratado.
Sobre a utilização das armas pelos policiais, fui informado de que um dos debatedores disse que haveria um problema de logística. A pergunta que eu faço é a seguinte: o problema de logística seria tão grave a ponto de não suprir a economia que essa utilização vai gerar?
Hoje, se nós não destruirmos essas armas, que é o caminho delas, e as utilizarmos, sobretudo se for um fuzil ou determinados armamentos... Muitos dos nossos policiais não têm armas acauteladas. Eu não veria problema em uma pistola apreendida, por exemplo, ser registrada, ser documentada, e o policial utilizá-la. Sinceramente, não vejo problema logístico nisso. Deve haver uma organização, a mesma organização que faz com que ela seja realmente destruída e não seja desviada. Nada impede que, por corrupção, ela não seja destruída, seja desviada. Acredito até que seja mais fácil você conseguir desviar uma arma no processo de destruição do que no processo de logística para a arma ser acautelada por um policial, por exemplo. Acho que é importante entendermos isso. Na minha visão, seria um grande instrumento para equipar as nossas polícias.
A doutora se retirou, mas a pergunta dirigida a ela seria sobre os braços financeiros do crime, sobre se utilizar esse recurso também.
A economia não seria melhor do que o problema logístico? Não valeria a pena gerar esse problema e solucioná-lo, a fim de obter essa vantagem pecuniária para as nossas organizações? Vamos colocar dessa forma.
Em relação ao aumento da pena, com esse regime que temos, com essa redução de pena que temos, realmente fica complicado. Mas também não podemos deixar o crime do jeito que está. Uma pessoa mata alguém, tira uma vida, ceifa uma vida e, em 8 anos, em 10 anos, ela já está na rua. A outra vida está destruída. Então, como é que vamos resolver isso? Aumenta-se a pena, diminui-se a progressão de regime? Acaba-se com ela nos crimes violentos? Nos casos de crimes violentos, como os crimes contra a vida — para mim, são os mais graves —, eu sou a favor do rigor total, porque a outra vida já está destruída. Se você já ceifou uma vida, principalmente num homicídio, se você matou aquela pessoa; para mim, você jogou fora o seu direito à vida. Eu penso assim. Mas o que vemos, na realidade, não é isso. O que vemos é a pessoa, depois de 8 anos, dependendo da pena que ela tomar, na rua, com uma vida normal, de repente até matando de novo.
Então, é importante tirarmos um pouco a polarização ideológica do debate, a fim de chegarmos ao caso concreto: de fato, o que isso vai promover de mudança na vida das pessoas? O que nós estamos discutindo? Aqui não há lado A ou lado B. Aqui há a praticidade da coisa. O que isso vai trazer de concreto para nós? Qual é a utilidade disso?
Essas são as considerações que eu gostaria de fazer. Estou um pouco limitado, porque não participei da explanação dos senhores, mas creio que deva contribuir com alguma coisa.
Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Subtenente Gonzaga. Bloco/PDT - MG) - Obrigado, Deputado Gurgel.
Eu pergunto se alguém da Mesa está premido pelo tempo, para nós darmos prioridade. (Pausa.)
12:59
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Então, podemos começar pelo Samuel, porque ele disse que tem um compromisso.
V.Sa. dispõe do tempo regulamentar de 5 minutos.
O SR. SAMUEL VIDA - Eu quero registrar, mais uma vez, minha satisfação com a qualidade do debate, com o cuidado, a abertura para a escuta que se tem feito presente, que tem presidido o encontro. Fico muito feliz com isso, porque, infelizmente, diante de eventual divergência, a capacidade de escuta às vezes é deixada de lado, em benefício de determinados protagonismos meramente reafirmadores de suas posições iniciais.
Basicamente duas questões me foram dirigidas, e eu vou tratar delas. Tenho um compromisso às 14 horas e não vou poder ficar até o fim.
A primeira questão diz respeito à possibilidade de tratamento, na esfera infraconstitucional, da execução provisória. Eu entendo que não há essa possibilidade, pela convicção que tenho no diálogo com a tradição de interpretação da Constituição, pois se trata de matéria constitucional. E mais: trata-se de cláusula pétrea. É óbvio que há situações práticas que têm sido enfrentadas, mas é bom também registrar que elas não implicam a não consideração dessa regra constitucional. Há necessidade de tratamento pontual, como disse a Dra. Luiza, em situações em que se evidencia uma tentativa de fraude, de uso de medidas meramente protelatórias, de violação do próprio ordenamento constitucional e jurídico em última instância. O problema é transformar isso, que é exceção, na regra.
Segundo, se há uma limitação no âmbito processual penal que possibilita expedientes protelatórios, isso tem que ser objeto de discussão. A solução é um ajuste, uma atualização, uma adequação de toda ritualística, de todo o procedimento, de forma a minimizar ou eliminar esse risco, não a supressão dos direitos de forma genérica, como a medida cogitada acaba estabelecendo. Então, essa é a minha posição, respondendo ao Deputado Subtenente Gonzaga.
A questão suscitada pelo Deputado Fábio Trad é muito interessante. De fato, se nós analisarmos do ponto de vista histórico, em poucas ocasiões nós tivemos um perfil de réu tão fora da tradição de seletividade que atinge fundamentalmente pobres e negros. Nesse sentido, sim, a crescente mobilização da sociedade e o aperfeiçoamento do aparato normativo de combate à corrupção e a outros delitos antigamente chamados de crimes de colarinho-branco têm possibilitado o ingresso ainda limitado — é bom que se diga — desse novo perfil. Mas volto à afirmação anterior: esse deslocamento não deve ser visto como justificativa para a supressão de direitos. Não se pode pretender, em nome desse alargamento, em nome da ampliação do rol de réus, uma espécie de justiçamento que atropele direitos fundamentais.
13:03
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É bom também dizer que esses direitos que estão sendo atropelados para muitos desses réus já são atropelados para aqueles não protegidos pela tradição cultural e institucional do País. Não há absolutamente nada de novo nos episódios envolvendo a Lava-Jato que implique violação de direitos e garantias que não tenha acontecido junto à população negra — inclusive, com muito maior intensidade em casos muito mais banais, digamos assim.
Portanto, é preciso restabelecer a perspectiva de afirmação democrática e de vigência de uma ordem constitucional garantista que aposta na democracia. Acho que esse é o sentido que não pode se afastar do nosso horizonte. Os ajustes devem ser feitos, pois fazem parte do processo histórico institucional. Não se pode imaginar o direito de forma estática, que não seja capaz de dialogar com as novas demandas, mas há determinados vetores que não podem ser afastados, sob pena de, em nome de um pragmatismo de ocasião, sacrificar o bem maior, que é a consolidação de um horizonte democrático.
Agradeço mais uma vez o convite feito pela Comissão. Faço o agradecimento na figura do Deputado Subtenente Gonzaga.
Parabenizo o Grupo de Trabalho e me coloco à disposição para continuar o debate de outras formas, se necessário for.
Desejo que tenhamos sucesso e que possamos, ao final, celebrar a aprovação dos ajustes mais adequados para o aperfeiçoamento normativo da nossa democracia.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Subtenente Gonzaga. Bloco/PDT - MG) - Obrigado, Dr. Samuel.
Quero convidar a nossa Presidente, Deputada Margarete Coelho, para reassumir a Presidência dos trabalhos da Comissão.
Por favor, Deputada. (Pausa.)
A SRA. PRESIDENTE (Margarete Coelho. Bloco/PP - PI) - Quero agradecer ao Dr. Samuel pela sua palestra.
Passo a palavra à Dra. Samira, para que ela faça as suas considerações.
A SRA. SAMIRA BUENO - Obrigada, Deputada Margarete.
Vou responder brevemente. Como tenho 5 minutos, vou tentar amarrar as principais questões, começando pela pergunta do Deputado Marcelo Freixo sobre a estimativa de crescimento e sobre os estudos de impacto social e orçamentário.
O projeto não traz nenhum tipo de estudo que demonstre um pouco esse impacto, tanto do ponto de vista orçamentário quanto do social. Acho que o atual quadro nos permite pensar um pouco sobre o resultado disso e o seu significado. Eu até pedi para checarem para mim uma estatística sobre o número de pessoas encarceradas no Brasil, por exemplo, por homicídio. Pelo último INFOPEN, considerando homicídio simples, homicídio culposo, lesão corporal, aborto, sequestro e cárcere privado, há 84 mil pessoas encarceradas. Estamos falando aqui de uma massa de mais de 700 mil presos.
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Acho que a primeira coisa a se fazer é sempre mostrar que, quando estamos falando desses crimes graves e do agravamento de pena para eles, precisamos olhar um pouco para essa massa e não esquecer que, na verdade, a maior parte das pessoas encarceradas hoje no Brasil está lá por delitos relacionados a crimes contra o patrimônio e tráfico de drogas. À medida que se endurecem essas leis, há mais pessoas presas.
Temos hoje um grande problema do ponto de vista da quantidade de pessoas presas. Trata-se da incapacidade que o Estado brasileiro tem de ressocializar essas pessoas. Na verdade, sabemos que os nossos presídios têm sido fábricas de criminosos. Estamos tentando romper uma trajetória no crime. "Como aquela pessoa está produzindo crimes, está produzindo violência, vamos encarcerá-la, porque essa é uma forma de proteger a população". No fundo, estamos empurrando essa pessoa para outra trajetória, que muitas vezes diz respeito a uma escalada na vida criminosa, porque os presídios são dominados por facções, porque não existe vaga disponível para todo o mundo e porque não conseguimos ainda implantar projetos de ressocialização.
Não conseguimos minimamente oferecer algum tipo de perspectiva para que aquela pessoa que um dia vai sair do presídio, inclusive por ter cometido um delito muito menor, faça alguma outra coisa. A apresentação das despesas com segurança pública mostrou inclusive o limite do ponto de vista do financiamento dessas ações. O dinheiro hoje disponível tem sido empregado principalmente no sentido de construir novas vagas e novas unidades prisionais. Não temos nenhuma grande política, nenhum grande projeto. Acho que o Conselho Nacional de Justiça tem pautado isso de forma bastante séria nos últimos anos, mas não temos sido capazes de oferecer nenhuma perspectiva.
O impacto social disso é dos piores. Não é à toa que chegamos aonde chegamos. Essa expansão das facções criminosas e esse grande domínio que elas começam a exercer no sistema prisional em diferentes Estados não acontecem do dia para a noite. Esse é um processo que vem acontecendo nos últimos 20 anos, 30 anos. Estamos olhando para um lado, para uma ponta, que diz respeito à lei penal — é muito legítimo fazermos o debate sobre essa lei —, mas também temos que olhar para o outro lado, que é o impacto financeiro que isso tem, o efeito sobre a vida das pessoas e o que vamos fazer com isso depois.
Às vezes, há consequências não previstas das mudanças na lei penal. Acho que a Lei de Drogas é o grande exemplo disso. Existia toda uma aposta de que ela seria uma resposta para não se encarcerar o consumidor, mas só o traficante. No entanto, explodiu o número de pessoas encarceradas por tráfico de drogas e isso acabou tendo outro efeito. Acho que também temos que pensar nessas possibilidades quando estamos analisando esse tipo de projeto.
Em resposta ao Deputado Fábio Trad, eu queria dizer que não sou jurista, mas, quando se fala em destinar 25% do Sistema S para a segurança pública, para o Fundo Nacional de Segurança Pública — FNSP, para o Fundo Penitenciário Nacional — FUNPEN, eu não saberia falar sobre o ponto de vista legal, mas é óbvio que o esforço de buscar novas fontes de financiamento é louvável e tem que ser permanente. A apresentação das despesas com segurança pública mostra que elas estão crescendo muito além do que a receita tem crescido.
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Na verdade, a receita estagna, e os Estados — até mesmo os Municípios que não têm nenhuma capacidade de gerar receita para dar resposta para isso — estão se virando. Inclusive, os Municípios são os atores que mais apresentaram crescimento no financiamento da segurança pública nos últimos 15 anos, porque os prefeitos também estão muito pressionados pela população, afinal o crime está acontecendo ali, naquele território. Então, isso é sempre louvável.
Entretanto, esbarramos também na lei do teto. Para arrumarmos mais dinheiro para a segurança pública, teremos que tirar de alguma outra área, porque esse investimento também não pode ser feito nos próximos 20 anos. Estamos no terceiro ano da lei do teto. Então, nos próximos 17 anos, dado o cenário atual, também teremos uma limitação do que poderemos colocar nessa área.
Se resolvermos que vamos priorizar a área da segurança pública, teremos que "combinar com os russos", porque, no caso da mudança da Lei do Fundo Nacional de Segurança Pública, no ano passado, o percentual inicialmente previsto para a segurança pública era maior. Pessoas que militam na área do esporte, que teria o percentual reduzido dentro da arrecadação das loterias, começaram a se manifestar. Importantes atletas brasileiros se manifestaram, e houve o recuo. Se não tem como aumentar, será tirado de alguém. Se aumentarem o da segurança pública, vão reduzir o do esporte, vão reduzir o da educação, vão reduzir o de alguém.
Esse é o grande desafio desse debate. Como conseguimos punir quem precisa ser punido por crimes graves e, de forma adequada, manter essas pessoas presas o maior tempo possível? O que queremos é isto: que o homicida seja punido. Isso é indiscutível, mas precisamos pensar também no que fazemos com este grande contingente: há cerca de 40%, quase 300 mil pessoas, de encarcerados por tráfico de drogas neste País, numa política que tem sido restrita à redução da oferta e que...
O SR. SUBTENENTE GONZAGA (Bloco/PDT - MG) - Sra. Presidente, V.Exa. me permite dialogar com ela por 30 segundos? (Pausa.)
Qual é a sua avaliação de um processo — na minha visão, é acelerado — de tornar hediondos vários crimes, a fim de buscar o cumprimento de uma pena por um tempo maior, com esse piso de um sexto da pena, que é o que prevalece? Na minha compreensão, buscamos insistentemente tornar vários crimes hediondos porque estamos buscando um tempo maior de cumprimento de pena.
A senhora vê alguma relação nisso?
A SRA. SAMIRA BUENO - Muito provavelmente, isso também tem impactado todo esse cenário que estamos apresentando e discutindo.
A questão é que temos pouquíssimas evidências de que isso de fato funcionou, porque temos feito todo esse esforço de mudança nas leis penais, transformando alguns crimes em hediondos, porque a pessoa tem que ficar mais tempo presa.
Então, vamos prender mais? Aí investimos na polícia, porque ela tem que prender mais, porque os crimes estão acontecendo e porque a população está insegura, refém do medo? Enfim, prendemos mais e não conseguimos sair dessa lógica.
O senhor, por exemplo, fez uma provocação sobre o ciclo completo. Não sei se o Egbert vai ter alguma possibilidade de estimar como isso, de algum modo, serviria como solução, mas vamos lembrar o projeto inicial, a primeira versão da proposta do pacote do Moro, que previa inclusive isto para os delitos de menor potencial ofensivo: a possibilidade de a Polícia Militar, por exemplo, fazer o termo circunstanciado, o que é um avanço em relação ao ciclo completo. Isso foi vetado pela Polícia Federal. E aí? Como sairemos dessa celeuma?
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É óbvio que a Polícia Federal tem seus argumentos, que são legítimos; a Polícia Militar também tem seus argumentos, que são legítimos. Mas nós estamos patinando em torno disso. E no que conseguimos avançar é sobre a lei penal, porque a única conclusão a que chegamos é que nós precisamos punir o criminoso.
Entretanto, nós estamos fornecendo, cada vez mais, grande estoque para o crime organizado, a droga vai continuar entrando. Enfim, os Estados Unidos, sendo o país que é, com a justiça rígida que têm, com o tamanho das forças policiais que têm, não foram capazes de fechar suas fronteiras e garantir que ali não entrem drogas. Então, isso vai continuar. Somos tríplice fronteira com os três principais produtores de cocaína do mundo. Então, vai continuar entrando droga pelo Norte, ela vai passar pelo Nordeste, ela vai para a Europa. A droga vai continuar circulando. O que nós vamos fazer em relação a isso e como nós vamos lidar com as organizações criminosas nesse sentido?
Eu acho que nós precisamos, sim, ter um olhar para não fortalecer ainda mais essas organizações criminosas. Vamos pensar em leis para punir os membros do crime organizado? Ótimo. Mas como podemos pensar em alguma solução para evitar que milhares de jovens continuem sendo arregimentados?
Nós sabemos que, ao entrar no sistema prisional, não interessa, a pessoa pode ser bem intencionada, pode querer sair daquela vida, mas vai ser obrigada a pagar mensalidade para a facção. Quando ela sair dali, vai prosseguir o vínculo, e ela vai continuar tendo de pagar mensalidade. Nós também sabemos o quanto o Estado, de algum modo, é perverso, porque ele não está fazendo a gestão do sistema prisional. Nós estamos falando em encarcerar mais, mas também estamos falando de um sistema gerido pelo crime. O que nós vamos fazer com isso?
Eu acho que só temos de tomar cuidado para não dar um tiro no pé.
O SR. GURGEL (PSL - RJ) - Presidente, permite-me uma pequena intervenção?
A SRA. PRESIDENTE (Margarete Coelho. Bloco/PP - PI) - Eu gostaria de seguir. Eu me perdi um pouco, porque dei uma saída, mas acho que já estamos na fase de respostas dos nossos convidados. Então, eu gostaria de dar prosseguimento a essa fase. Peço-lhe desculpas, Deputado, porque todos aqui estamos com o tempo estourado para os voos.
Eu gostaria, então, de dar sequência e, no fim, se a sua dúvida permanecer e se a Dra. Samira ainda estiver por aqui, eu lhe devolvo a palavra. Fico agradecida pela compreensão.
Passo a palavra ao Dr. Egbert Buarque, para que ele faça suas considerações finais e dê as respostas aos nossos interlocutores, aos membros do grupo.
O SR. EGBERT BUARQUE - Serei bastante objetivo nas respostas.
O Deputado Subtenente Gonzaga fez dois questionamentos. O primeiro questionamento é se não haveria uma redução da reincidência pelo endurecimento da pena e por se dificultar a progressão de regime. Isso há que se avaliar com evidências ao longo do tempo de que essa prática realmente teve algum impacto, alguma correlação com a redução de criminalidade.
Como a Samira mencionou aqui, em relação ao que o sistema prisional oferece hoje, em termos de estrutura para ressocialização, tudo indica que colocar mais pessoas dentro desse sistema prisional é um caminho que fortalece a criminalidade. É o que parece, mas não há evidências disso. A evidência terá que ser colhida ao longo do tempo.
13:19
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Quanto à questão da polícia de ciclo completo, o tribunal ainda não se debruçou sobre isso para avaliar a eficiência dessa medida. Eu tive a oportunidade de ver uma apresentação do Secretário de Segurança Pública de Santa Catarina, que é coronel da Polícia Militar da ativa, sobre o termo circunstanciado, que disse fazê-lo usando um tablet no capô da viatura — e eu acho que o senhor já conhece essa experiência também. Pareceram-me bem interessantes os números que ele apresentou, nessa oportunidade, de ganho de eficiência e de disponibilidade de pessoal da polícia para o atendimento do cidadão, uma vez que ele não tem que ir mais à delegacia e consumir tempo fazendo o termo circunstanciado. Então, é um trabalho possível, e, sendo solicitado pelo Congresso Nacional, obviamente, o tribunal fará esse trabalho.
Ao Deputado Gurgel, respondo que fiz um comentário, na minha exposição, sobre a proposta do art. 133-A, a mudança contida nele, pois trata da questão de o material apreendido ser utilizado pelas polícias por questão logística. O senhor mencionou a questão do acautelamento. Desculpe-me a ignorância, mas o acautelamento seria o uso do armamento pelo policial, sem que esse armamento entrasse no patrimônio da corporação, vamos dizer assim, e, portanto, fizesse parte da cadeia logística.
O SR. GURGEL (PSL - RJ) - Existem duas formas: pode entrar no patrimônio do Estado ou pode não entrar, e pode somente ser acautelado. Em relação à questão logística — é justamente a pergunta que eu lhe fiz —, existem várias formas de solucionar a forma de utilização, desde a doação a ele até somente o empréstimo.
O SR. EGBERT BUARQUE - Na medida em que esse equipamento entra na cadeia logística, digamos assim, da corporação, e a corporação se responsabiliza pela manutenção dele, pelo suprimento, como uma viatura, como um armamento, essa diversidade de equipamentos vai tornar bem mais difícil esse suporte logístico. Ou seja, pensando como Tribunal de Contas, seriam necessárias diversas licitações para contratar manutenções e suprimentos a diversos tipos de equipamentos. O esforço da área da retaguarda da corporação fica bem maior para colocar essa logística em funcionamento, para que o equipamento chegue à mão do policial a tempo e em boas condições de uso.
Essa é uma dificuldade, tanto que a Lei de Licitações e Contratos dá bastante importância a isso, porque justamente coloca como critério de dispensa ou inexigibilidade — eu não vou entrar nesse detalhe — a manutenção do padrão logístico nas corporações, inclusive nas Forças Armadas. E não é à toa que temos hoje em dia os principais fornecedores de armamentos — se não me engano, a Sig Sauer, a Glock e a Taurus — brigando, Estado a Estado, para fazer vendas de pistolas, justamente para estabelecer esse padrão logístico e se perpetuar como o fornecedor naquele Estado ao longo dos anos. Essa é uma questão bastante importante e que, inclusive, a Lei de Licitações e Contratos colocou.
Eu vejo que esse caso tem que ser analisado com alguma cautela, para não gerar um volume maior de trabalho da área de suporte logístico das corporações.
Esse era o meu comentário. Eu acho que eu fui bem objetivo.
O SR. GURGEL (PSL - RJ) - Contribuindo, acredito, com a questão tratada pelo senhor, dependendo do que se fizer — por exemplo, a arma .40, a munição não é comprada para a arma xis, ela é comprada para a utilização —, não teria esse problema de logística. A manutenção também é feita dentro do sistema da Polícia Militar, dentro do quartel e por profissionais.
13:23
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Eu não consegui enxergar ainda a dificuldade. Só quero deixar aqui registrado para que o senhor, de repente, numa próxima oportunidade, explique melhor o assunto. Se for equipamento específico, por exemplo, uma arma que não se utiliza, concordo com o senhor — aí vai gerar outro problema logístico —, mas as armas que já são utilizadas, eu acho que é só utilizar o material e o pessoal que já existe.
A SRA. PRESIDENTE (Margarete Coelho. Bloco/PP - PI) - Eu passo a palavra agora para o Dr. Eduardo Mauat da Silva, para que faça as suas considerações finais. Eu aproveito um pouco mais da presença dele, já que, felizmente, hoje aqui a audiência está boa, animada.
O SR. EDUARDO MAUAT DA SILVA - É uma honra estarmos nesta Casa Legislativa, podendo contribuir com debates extremamente interessantes.
Com relação a nossa divergência com a Dra. Denise, realmente foi uma questão interpretativa. Na verdade, a Dra. Denise entende que não há necessidade, isto é, ela é contra a extensão do poder postulatório das polícias judiciárias para a área cível. Não que nós não tenhamos capacidade postulatória na área criminal já consolidada, mas ela diz ser contra isso. Então, nós, perfeitamente, respeitamos a opinião da Dra. Denise, que tem sido uma grande colaborada na ENCCLA. Mas nós divergimos e entendemos que pode, sim, haver essa extensão. E sugerimos aos senhores que analisem essa possibilidade.
Foi mencionado pelo Prof. Samuel como ficaria, no caso de absolvição, se houvesse uma alienação antecipada dos bens. Na verdade, isso é perfeitamente reversível. O projeto prevê que, no caso de absolvição proveniente, fica assegurado ao acusado o direito de restituição dos valores, acrescidos de correção monetária. Então, não seria, mesmo não havendo uma execução provisória, no caso dos bens, até para preservá-los. Nós vemos aí veículos e bens apodrecendo nos pátios das delegacias, com prejuízo para o próprio investigado também, porque, se ele for absolvido, vai receber um caco no final do processo. Então, alienam-se os bens e permanece aquele valor à disposição do juízo; em havendo a absolvição, esse dinheiro é entregue de volta para o investigado.
Outra questão, mencionada pelo Sr. Deputado Marcelo Freixo, foi que não se estaria tratando de aspectos de segurança pública, mas de projeto meramente penal. Nós respeitosamente divergimos desse pensamento, porque segurança pública tem que ser vista como um todo. Qualquer elemento que possa influenciar na segurança do cidadão é segurança pública. Então, em vários normativos que estão sendo propostos pelo Ministério da Justiça há impacto direto na segurança pública, na vida do cidadão.
Quanto a questões técnicas, o projeto, sim, baseia-se em questões técnicas, e não em estudos nos moldes que talvez alguns dos senhores gostariam ou alguns que são contra o projeto gostariam. A descapitalização, por exemplo, do crime organizado já possui vasta doutrina nacional e estrangeira. Seria redundante eu tratar dos vários estudos que já mencionam que a descapitalização do crime é, sim, uma maneira de combatê-lo.
Quanto à habitualidade, que o Sr. Deputado Marcelo Freixo mencionou também, já está largamente definida na doutrina e na jurisprudência. Existe o crime habitual, que seria, por exemplo, a manutenção de casa de prostituição. Tecnicamente, isso é visto como crime habitual. Existe a habitualidade da conduta, que também é largamente abordada pelos doutrinadores como sendo a prática reiterada de crimes. Então, a nosso ver, com a vênia de eventual entendimento dos senhores, a questão da habitualidade já prescinde de maiores questionamentos.
13:27
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Quanto à audiência de custódia, é necessário verificar que, quando ela foi implementada, por força de uma decisão do Supremo quanto ao acatamento de convenções internacionais às quais o Brasil aderiu, ela foi colocada no mundo jurídico, digamos, de supetão. Então, as audiências de custódia surgiram basicamente para constranger os policiais que estariam apresentando a pessoa presa. Quando se perguntava se houve tortura, coação moral, física, etc., bastaria que a pessoa alegasse que tinha sido algemada previamente, sem necessidade, para que o juiz eventualmente pudesse soltá-la, por força da Súmula 11 do Supremo Tribunal Federal.
Com o amadurecimento dessa prática, passou-se a analisar também questões relacionadas a medidas cautelares, liberdade provisória, etc. E os tribunais entenderam que a audiência de custódia seria matéria jurisdicional: o juiz iria decidir se ele faria audiência de custódia ou não de acordo com as circunstâncias da prisão em flagrante. No caso de preso que foi assistido por advogado e que decidiu ficar em silêncio, ou então que manifestou o seu direito de falar e não houve nenhum tipo de ponderação durante a lavratura do interrogatório, o juiz entendia que estavam presentes os requisitos fundamentais para a manutenção da prisão, pelo menos do ponto de vista (ininteligível).
Houve, portanto, um amadurecimento. Entendemos que a audiência de custódia não é por si só negativa. Ela pode ser positiva, sim, para eventuais abusos, eventuais ilegalidades, eventuais equívocos que as autoridades possam ter cometido. Porém, ela demanda talvez uma intervenção legislativa, para que se analise de maneira abstrata todos os casos possíveis, porque hoje ela está sendo regulamentada no âmbito dos tribunais. Entendemos que ela, por si só, não é uma ideia ruim, mas precisa ser aprimorada, e talvez fosse o caso de os senhores fazerem algum projeto para que se regulamente a matéria. Podemos sugerir algo, se for o caso, se os senhores quiserem nos dar essa oportunidade.
Das perguntas que me competiam, Sra. Presidente, era basicamente isso.
Muito obrigado.
A SRA. PRESIDENTE (Margarete Coelho. Bloco/PP - PI) - Eu gostaria de agradecer muitíssimo a assistência.
Tem a palavra o Deputado Subtenente Gonzaga.
O SR. SUBTENENTE GONZAGA (Bloco/PDT - MG) - (Inaudível). A Polícia Rodoviária Federal já estava fazendo em mais de 23 Estados por força de provimentos. E o Ministério da Justiça, no final do ano passado, interpretou a Lei nº 9.099, de 1995, no sentido de que, de fato, ela é extensiva a todos os policiais e, no âmbito do Ministério, regulamentou também para todos os policiais e para a Polícia Rodoviária Federal.
Vários Estados estão fazendo isso. Santa Catarina foi pioneiro, mas hoje Rondônia e Minas Gerais estão fazendo, com resultados extremamente importantes.
A SRA. PRESIDENTE (Margarete Coelho. Bloco/PP - PI) - Tem a palavra o Sr. Eduardo Mauat da Silva.
O SR. EDUARDO MAUAT DA SILVA - Em relação a essa questão, acho que o senhor tinha mencionado algo sobre qual seria minha opinião. Foi o senhor? (Pausa.)
Perfeito. Trata-se da questão do ciclo completo.
Entendemos que há pontos positivos e negativos em relação a isso. Portanto, agiliza-se o encaminhamento da ocorrência, mas é uma ocorrência que, se tiver, como se diria no jargão, "rebarbas", vai acabar prejudicando aquela equipe e deixar os policiais comprometidos. Uma coisa é você entregar a uma outra instituição para que ela faça a formalização; outra coisa é você fazer todo o procedimento. Pode eventualmente ser suscitada alguma ilegalidade e ser fragilizada a equipe que está conduzindo a ocorrência. Esses são os aspectos.
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Mas, se perguntassem a minha opinião, eu digo que teria que ser analisado, sim. É uma possibilidade, sim, a questão do ciclo completo. Eu só digo que toda alteração legislativa tem que ser vista do ponto de vista funcional do bem da sociedade e não deve ser corporativa. Muitas vezes ela termina tornando-se corporativa.
Obrigado. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTE (Margarete Coelho. Bloco/PP - PI) - Eu renovo os agradecimentos à plateia, aos colegas Deputados membros da nossa Comissão e aos nossos convidados, que deram contribuições excelentes ao tema.
Eu vou ter muita diversão no feriado, porque eu vou ouvir todos os áudios. Esse era, realmente, um dos temas que me despertava maior interesse.
Também gostaria de reiterar o pedido para que os senhores e as senhoras encaminhem à Comissão material que tenham a respeito deste tema, porque nós estamos disponibilizando esses materiais na nossa página, que está sendo bem frequentada por pesquisadores, por jornalistas, por estudiosos e também por estudantes.
Agradeço muitíssimo a todos mais uma vez. Desejo um feliz retorno.
Dr. Egbert Buarque, vou retornar com o senhor para discutirmos, assim como com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública.
Agradeço ao Dr. Eduardo Mauat. A Deputada que o indicou não pôde estar conosco hoje por motivo de doença, mas mandou-lhe um abraço.
Muito obrigada.
Eu tenho uma solicitação do Deputado Fábio Trad, apontando erro material em relação ao nome do convidado para audiência pública, relacionado no Requerimento nº 3, de 2019, aprovado por este Grupo de Trabalho.
Esta Coordenação solicita à Secretaria a correção do erro material, para que conste o convite do Sr. Benedicto Arthur de Figueiredo Neto, em correção ao nome de José Benedicto de Figueiredo Neto.
Também gostaria de comunicar que, como não temos certeza da realização de sessão na próxima terça-feira, nós estamos adiando a nossa audiência pública desse dia. O grupo irá decidir como fazer para repô-la, a fim de que não tenhamos uma prorrogação em nosso calendário de audiências públicas.
(Intervenção fora do microfone.)
Na quarta-feira? Então, a votação está aberta no grupo, Deputado.
Muito obrigada a todos.
Nada mais havendo a tratar, dou por encerrada a presente reunião.
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