1ª SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA 56 ª LEGISLATURA
Comissão Externa destinada a fazer o acompanhamento e fiscalizar as barragens existentes no Brasil, em especial, acompanhar as investigações relacionadas ao rompimento em Brumadinho-MG
(Audiência Pública Ordinária)
Em 21 de Março de 2019 (Quinta-Feira)
às 9 horas e 30 minutos
Horário (Texto com redação final.)
11:28
RF
O SR. PRESIDENTE (Zé Silva. SOLIDARIEDADE - MG) - Senhoras e senhores, bom dia!
Declaro aberta a 11ª Reunião Ordinária da Comissão Externa destinada a fazer o acompanhamento e fiscalizar as barragens existentes no Brasil, em especial, acompanhar as investigações relacionadas ao rompimento em Brumadinho.
Encontram-se à disposição dos Srs. Deputados cópias da Ata da 10ª Reunião, realizada no dia 19 de março de 2019.
O SR. PADRE JOÃO (PT - MG) - Peço, Sr. Presidente, dispensa da leitura da ata.
O SR. PRESIDENTE (Zé Silva. SOLIDARIEDADE - MG) - Atendendo ao requerimento do Deputado Padre João, fica dispensada a leitura da ata, que permanece à disposição, caso pretendam retificá-la. (Pausa.)
Não havendo quem queira retificá-la, está em votação a ata.
Os Deputados que a aprovam permaneçam como se encontram. (Pausa.)
Aprovada.
Nos termos regimentais, apresento expediente recebido nesta semana pela Comissão Externa: Ofício nº 12, de 2019, do Deputado Júnior Ferrari, em que apresenta justificativa de ausência nas reuniões dos dias 26 de fevereiro, 27 de fevereiro e 12 de março, em razão do cumprimento de compromissos no seu Estado.
Dando início a nossa audiência, eu quero mais uma vez pedir desculpas a todos os presentes. Nenhum dos compromissos desta Comissão até aqui começou com atraso. Mas, em virtude do problema de os voos de Belo Horizonte para Brasília terem sido cancelados, os nossos expositores só conseguiram chegar há aproximadamente 10 minutos. No entanto, nós vamos cumprir, com toda a tranquilidade, a programação e o nosso objetivo, que é muito importante, em relação às barragens no Brasil.
Por isso, convido para tomarem assento à mesa o Prof. Sidney Nicodemos, do Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais, doutor em Engenharia Metalúrgica e de Minas, na área de concentração em Ciência e Engenharia de Materiais; o Sr. Denes Martins da Costa Lott, mestre em sustentabilidade socioeconômica e ambiental pela Universidade Federal de Ouro Preto, Minas Gerais; o Sr. Marcelo Augusto Martins Neto, doutor em Geologia pela Albert-Ludwigs Universitäit Freiburg, na Alemanha, também ex-professor da Escola de Minas da Universidade Federal de Ouro Preto. Agradeço a todos a presença.
Esclareço que a realização desta audiência pública cumpre decisão do colegiado desta Comissão, em atendimento ao Requerimento nº 10, de 2019, da minha autoria, com o tema Descomissionamento das Estruturas e Tecnologias de Aproveitamento de Rejeitos de Mineração.
Esclareço também que, para o andamento com objetividade dos nossos trabalhos, adotaremos os seguintes procedimentos: o tempo concedido aos nossos palestrantes e expositores será de 15 minutos, prorrogáveis a juízo da Comissão. Esclareço que não poderá haver apartes. Os Deputados interessados em interpelar os palestrantes deverão se inscrever previamente na mesa de apoio. Eu peço à assessoria que disponibilize a lista de inscrição para os Srs. Deputados. As perguntas deverão restringir-se ao assunto da exposição e ser formuladas no prazo de 3 minutos, dispondo os palestrantes de igual tempo para as respostas. Também já esclareço que elas serão respondidas em blocos. São facultadas ainda a réplica e a tréplica pelo prazo de 3 minutos.
11:32
RF
Antes de passar a palavra para os convidados, comunico que realizaremos no dia 22 de março, amanhã, às 10 horas da manhã, em Congonhas, Minas Gerais, debate público para tratar dos riscos de rompimento da Barragem Casa de Pedra, da Companhia Siderúrgica Nacional. Também haverá visita técnica à Barragem Casa de Pedra às 15 horas, em Congonhas.
Além desses eventos, a Comissão realizará na próxima segunda-feira, às 14h30min, mesa-redonda para debater a situação das barragens do Estado de Goiás, no Auditório Solon Amaral, na Assembleia Legislativa de Goiás.
Feitos esses esclarecimentos, daremos início agora às exposições.
Concedo a palavra, por 15 minutos, ao Prof. Denes Martins da Costa Lott, mestre em sustentabilidade socioeconômica e ambiental pela Universidade Federal de Ouro Preto, como eu já disse.
Se o senhor quiser usar o microfone sem fio, fique à vontade, bem como para usar o projetor. (Pausa.)
Enquanto o professor se prepara para iniciar sua apresentação, que agradecer à Assessoria Parlamentar do Ministério de Minas e Energia, que está aqui presente em todas as audiências. Obrigado, Alesson. Agradeço à Consultoria Legislativa e às equipes dos gabinetes dos Parlamentares, da TV Câmara, da Rádio Câmara, da imprensa, da Taquigrafia e a todos os que nos ajudam a realizar um bom trabalho nesta Casa.
Muito obrigado.
O SR. DENES MARTINS DA COSTA LOTT - Bom dia.
Conforme o Deputado Zé Silva já disse, eu sou mestre em sustentabilidade pela UFOP. Vale dizer que eu trabalhei na Vale por 22 anos. Até 6 meses atrás eu exercia função de Presidente do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio Paraopeba, curso d'água que foi atingido pelo rompimento da Barragem de Córrego do Feijão, em Brumadinho.
(Segue-se exibição de imagens.)
O tema proposto para nossa apresentação diz respeito a descomissionamento e utilização de rejeitos de barragens, ou, para ser mais preciso: Descomissionamento de Estruturas e Tecnologias de Aproveitamento de Rejeitos.
O termo "descomissionamento", para esclarecer, foi muito usado até há uns 15 anos na academia e nos órgãos técnicos, mas caiu em desuso, tendo sido abarcado pela questão muito em voga hoje em dia, mundialmente, chamada de "fechamento de mina". Hoje, descomissionamento é uma parte do macroassunto "fechamento". Digo isso só para tentarmos esclarecer o tema tecnicamente e colocar os conceitos nos seus devidos lugares. O tempo é curto, mas nós vamos tentar fazer isso.
11:36
RF
Descomissionamento de barragem, então, é a eliminação de fatores prejudiciais ao meio ambiente e à saúde de seres vivos. Ou seja, é uma maneira de se deixar determinada estrutura inerte, digamos assim, de forma que ela não provoque mais danos ou cause mais poluição que, tecnicamente, seja passível de prejudicar seres vivos, bem entendidos como plantas ou animais e, dentre os animais, os humanos. Compreende trabalhos de desativação da infraestrutura e de serviços associados à produção e de desmobilização da mão de obra do empreendimento minerário.
Vamos abordar esse tema dentro do contexto do fechamento de minas, que é tema da minha especialidade acadêmica, da minha especialidade pessoal.
Desativação é a preparação para o encerramento das atividades realizadas num local. Nesse contexto está inserido o descomissionamento ou a eliminação de fatores prejudiciais ao meio ambiente e à saúde de seres vivos. Após o descomissionamento, o sítio está pronto para ter suas atividades interrompidas definitivamente e, já adiantando, receber um novo uso. No conceito de fechamento de mina há o uso futuro.
Fechamento é a etapa final do ciclo de vida do empreendimento. Significa o encerramento total das atividades desempenhadas durante a operação, com a finalização das ações de desativação. A partir daí o local pode ser utilizado para outros fins.
Com relação ao fechamento de mina, vale dizer que é recente a abordagem do tema na legislação brasileira. No ano passado, através do Decreto nº 9.406/2018, que regulamenta o Código de Mineração, é que o tema foi abordado numa legislação de primeiro nível — o Código de Mineração não mudou, mas o seu regulamento sim. Anteriormente, o tema estava em portarias do Departamento Nacional de Produção Mineral — DNPM e resoluções de conselhos ambientais. Com o referido decreto, pela primeira vez o tema fechamento chega a uma norma federal. E ele está explicitado como aspecto da atividade mineral. Ele é elevado a esse nível.
O Plano de Fechamento de Mina hoje é obrigatório, junto com o Plano de Aproveitamento Econômico — PAE, tendo requisitos próprios e formas específicas de cumprimento, conforme previsto no próprio decreto. Não vou tecer detalhes aqui.
O fechamento de mina pode incluir, dentre outros aspectos, especificamente: recuperação ambiental da área degradada; desmobilização das instalações e dos equipamentos que componham a infraestrutura do empreendimento, que é a desmobilização, também chamada hoje de descaracterização; aptidão e propósito para uso futuro da área; monitoramento e acompanhamento dos sistemas de disposição de rejeitos e estéreis, da estabilidade geotécnica das áreas mineradas e das áreas de servidão, do comportamento do aquífero e da drenagem das águas.
11:40
RF
Por fim, o minerador passa, pelo decreto, a ser obrigado a executar e concluir adequadamente, após o término das operações e antes da extinção do título, o plano de fechamento de mina.
Avançando no tema descomissionamento e fechamento, é importante lembrar que Minas Gerais, Estado de onde venho e de onde é o Deputado Zé Silva, foi pioneiro — e não poderia ser diferente, porque a atividade minerária está no próprio nome "Minas" — em ter, no seu ordenamento jurídico-ambiental, uma deliberação que trata especificamente desse assunto.
Refiro-me à Deliberação Normativa do Conselho Estadual de Política Ambiental — DN-COPAM nº 220, de 21 de março de 2018. Ela define o que é mina paralisada; o que é mina abandonada; o que é Plano de Recuperação de Áreas Degradadas — PRAD; o que é Plano Ambiental de Fechamento de Mina — PAFEM; o que é descomissionamento — ela ressuscita esta palavra, que estava meio abandonada —; o que é fechamento; o que é suspensão; o que é recuperação; e o que é uso futuro.
Além disso, essa Deliberação estabelece a obrigatoriedade do Relatório de Paralisação de Atividade Minerária, quando ela ocorrer; determina os casos que são de apresentação de Plano de Recuperação de Áreas Degradadas — PRAD e os que são de apresentação de Plano Ambiental de Fechamento de Mina — PAFEM, uma figura nova que essa DN criou; e estabelece a Declaração de Recuperação Ambiental, quando essa acontece, ou, especificamente, quando a mina que recebeu esses documentos e esse trabalho foi oficialmente fechada. A partir daí, fica com a recuperação ambiental declarada. Isso ainda não ocorreu aqui, porque é uma norma recente, de aplicação ao longo do tempo.
Descomissionamento de barragens. Vamos direto ao ponto que nos interessa.
A lei que instituiu a Política Nacional de Segurança de Barragens, Lei nº 12.334, de 2010, no seu art. 18, estabelece que:
Art. 18. A barragem que não atender aos requisitos de segurança nos termos da legislação pertinente deverá ser recuperada ou desativada pelo seu empreendedor, que deverá comunicar ao órgão fiscalizados as providências adotadas.
É o que vai ocorrer com as barragens a montante, conforme determinação recente da Direção da Vale, pós-acidente de Brumadinho, e conforme resoluções da Agência Nacional de Mineração — ANM e do Conselho Estadual de Política Ambiental e da Fundação Estadual do Meio Ambientes — COPAM/FEAM, que nós vamos abordar na sequência.
Esta aqui é a resolução: Resolução Conjunta SEMAD/FEAM nº 2.765/2019. Aliás, desculpem-me, a resolução não é do COPAM, mas da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável — SEMAD. Ela não passou pelo Conselho, foi um ato do Secretário Germano.
Essa Resolução determinou a descaracterização de todas as barragens de contenção de rejeitos alteadas pelo método a montante, provenientes de atividades minerárias existentes em Minas Gerais, e deu outras providências. E ela é mais restritiva do que a Resolução nº 4/2019 da ANM, que é posterior, inclusive. Por quê? Porque a resolução da SEMAD não permite a transformação de barragem a montante em barragem a jusante. E a da ANM, em determinada passagem, permite, abarca essa possibilidade, através da construção de um barramento a jusante da barragem a montante, aproveitando aquele barramento. Mas em Minas Gerais isso não pode acontecer.
11:44
RF
Essa questão toda traz à tona um paradigma da mineração do século 21 que tem que mudar. Com o colapso das barragens de Mariana e Brumadinho, a situação gerada nas cidades mineradoras em específico — e hoje eu assessoro uma cidade mineradora nesse assunto, o Município de Itabira — é de risco, é de pânico, é de medo, é de insegurança. Em paralelo, essas mesmas cidades vivem uma dependência econômica quase que total das empresas de mineração. Essas cidades precisam também de uma gestão adequada da CFEM — é o que eu abordo no meu livro — e de diversificação econômica, o que elas não têm.
Vamos ver o caso de algumas elas.
Itabira é um caso seriíssimo. A Vale anuncia que as reservas lavráveis conhecidas e de aproveitamento viável duram mais 10 anos. Depois disso, do que essa cidade vai viver? Do que aqueles 110 mil habitantes da cidade vão viver?
São Gonçalo do Rio Abaixo tem uma mina tida como moderna e ela própria é tida como cidade moderna, com a maior renda per capita do Brasil por conta da mineração. Houve paralisação das operações de uma barragem, e a cidade entrou em pânico. A Prefeitura entrou em pânico total por falta de recebimento da CFEM.
Outra cidade também considerada como importante na atividade e que a Comissão vai visitar, segundo o Deputado, é Congonhas. Parece-me que a barragem lá, pela informação que eu tenho, é uma barragem a jusante, com alteamento a jusante. Mas a cidade tem uma dependência enorme da mineração, para não dizer total.
Outro exemplo importantíssimo: Conceição do Mato Dentro. Um tubo do mineroduto estourou em São José do Goiabal, cerca de 1 ano atrás, a mina parou, e a cidade entrou em caos financeiro. É um problema! Falta planejamento, falta trabalho com perspectiva de fechamento das minas.
Passo a falar especificamente da parte do tema proposto relativa às alternativas para aproveitamento de rejeitos.
Temos hoje madeira feita de rejeito e pisos intertravados de tijolos. O Prof. Marcelo, que me sucederá na apresentação, vai abordar o assunto de forma minudente e vai esclarecer melhor essas possibilidades. Mas, infelizmente, isso não é solução para a barragem, ainda. Isso absorve muito pouco, um percentual muito pequeno da quantidade de rejeitos gerados.
Quais são os problemas? Escala de geração de resíduos de mineração muito superior à demanda; carga tributária incidente sobre esses produtos altíssima; distância entre os mercados produtores e os consumidores; limitações na aplicação dos produtos com utilização de resíduos; problemas de armazenamento e estocagem do rejeito e do produto; falta de mecanismos de apoio ao reaproveitamento de rejeitos.
11:48
RF
Outra questão importante: tecnologias para a eliminação de barragens. Nisso temos avançado. Temos um exemplo importante da Vallourec, na Mina de Pau Branco. E há um projeto da própria Vale que vem avançando em Itabirito, na Mina do Pico, chamado Pilha Cianita. É o processo de empilhamento drenado: através da utilização de um filtro, retira-se a maior quantidade de água possível. É gerada uma torta, que pode ser manuseada e acondicionada em pilhas a céu aberto. É uma solução muito interessante, muito importante. Apesar de ser uma área muito grande, é sim uma alternativa à barragem de rejeito.
Muito bem, como eu disse, a minha abordagem se dá no contexto maior do fechamento de mina. É assim que eu entendo que a mineração tem que trabalhar: com foco no fechamento progressivo de suas atividades. As minas fecham. E elas fecham por razões econômicas, muitas vezes, por queda no preço das commodities ou alta dos custos de produção. Elas fecham também por razões geológicas, como decréscimo no teor do corpo de minério. Fecham por razões técnicas, como condições geotécnicas adversas ou falhas mecânicas. Fecham por acidentes ambientais ou questões de segurança — caso de Brumadinho, caso de Mariana, está tudo aí, espero que não aconteça mais. Outra razão são mudanças políticas, algo muito comum nos tempos mais modernos; nos países da África isso aconteceu muito. Fecham também por pressão social de ONGs, movimentos sociais, entidades internacionais. Mais uma razão é o fechamento de indústrias ou de mercados da cadeia produtiva, além da exaustão das reservas, que é o esperado que aconteça.
Temos, cada vez mais, que pensar no uso futuro dessas áreas. É possível conceber a mineração como atividade sustentável? Há muitos que dizem que não. Eu entendo que sim, através da utilização dessas técnicas de fechamento cada vez mais empregadas em países como Canadá, etc., e que devem vir para o Brasil de forma mais intensa, na minha opinião.
Planejar o fechamento permite tornar efetiva a ideia de sustentabilidade na atividade mineral. Como? Regulamentando melhor o uso da CFEM, dizendo como ela deve ser usada, e não somente como ela não deve ser usada, que é o que a norma diz hoje. É preciso especificar a forma como ela deve ser usada, talvez criando uma poupança pública, uma medida que eu defendo. Mas outras propostas existem, como minerar com utilização da técnica de fechamento progressivo e conceber a mineração a partir do fechamento — o mining for closure.
Seguem exemplos de uso futuro de áreas mineradas que se tem no Brasil e no mundo. Este aqui é o estádio do Sporting Clube de Braga, em Portugal, um belo estádio, que ocupa uma pedreira abandonada. O Projeto Éden, na Inglaterra, ocupa uma área que era uma mina de caulim, um lugar aberto à visitação com um museu muito bonito. O Parque das Mangabeiras, em Belo Horizonte, ocupa área que era trabalhada pela FERROBEL, uma pequena mineradora do Município de Belo Horizonte que funcionou até o início dos anos 1970. A próxima é a Ópera de Arame, em Curitiba. E aqui embaixo é o campus da Universidade Federal de Ouro Preto, que está assentado em cima de uma mina fechada de bauxita. São exemplos importantes.
11:52
RF
Eu quero agradecer o convite e dizer que estou à disposição.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Zé Silva. SOLIDARIEDADE - MG) - Obrigado, Prof. Denes. Eu, como engenheiro, estava muito curioso para ouvi-los em relação a esse tema tão importante do fechamento de minas, especialmente o do aproveitamento dos resíduos.
Nós recebemos aqui do Prof. Denes Martins da Costa, ex-Presidente do Comitê da Bacia do Rio Paraopeba, mestre em Sustentabilidade Socioeconômica e que trabalhou por 22 anos na Vale, o livro O fechamento de mina e a utilização da contribuição financeira por exploração mineral. Depois, professor, o senhor autografa um livro para ficar com a Consultoria e outro para ficar na biblioteca da Câmara dos Deputados, para que toda a população brasileira tenha acesso ao seu trabalho. Parabéns!
Em seguida, passo a palavra ao Dr. Sidney Nicodemos, professor do Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais e doutor em Engenharia Metalúrgica e de Minas na área de concentração em Ciência e Engenharia de Materiais.
O senhor dispõe de 15 minutos.
O SR. SIDNEY NICODEMOS - Agradeço ao Deputado Zé Silva e às demais Deputadas e Deputados presentes. Sinto-me honrado pelo convite e um pouco entristecido pelas tragédias que já aconteceram, mas estamos aqui na perspectiva de evitarmos tragédias futuras.
Vou tentar simplificar a apresentação, fazendo uso dela mais concatenado com a apresentação dos demais colegas, porque já foram explicados muitos dos conceitos sobre que planejei falar anteriormente. Então, vou ganhar um pouco mais de tempo.
(Segue-se exibição de imagens.)
A ideia básica é utilizar a tecnologia nacional, a expertise local. Em Minas Gerais, temos dezenas de instituições que trabalham com esse tema de reaproveitamento dos resíduos das barragens. E nós vamos utilizar esses resíduos para vários fins, para tentar minimizar o lançamento ou o descomissionamento das estruturas de barragens hoje existentes.
A utilização de resíduos sólidos na indústria de base mineral pode ocorrer como matriz de produtos ligados a corpos cerâmicos, constituídos de concreto e argamassa, ou em misturas asfálticas, como sub-base de construção de rodovias, ou pré-moldados — o Prof. Denes apresentou alguns modelos. Basicamente vamos lidar com a motivação, com o que nos impele a buscar formas alternativas de aplicar esses grandes volumes, e são volumes estratosféricos a que nos referimos.
Vou falar um pouco das nossas equipes multidisciplinares, tanto em Minas, na UFMG, no CEFET, onde eu trabalho, e na UFOP, como no Espírito Santo, que também colabora conosco, ONGs com que nos relacionamos e empresas que já detêm essa tecnologia ou que já fizeram essa transferência.
Basicamente, qual é o nosso papel nesse cenário de colaborações? É utilizar esses rejeitos. Não consideramos que esses materiais lançados, tanto os estéreis quanto os resíduos, sejam rejeitos, na prática. Eles são resíduos que podem ser transformados em algum coproduto, em algum outro subsídio para a fabricação de estruturas, eventualmente, na construção civil, em pavimentos e em outras aplicações.
11:56
RF
A produção de materiais de base tecnológica para a construção civil foi o que primeiramente nos impeliu, sobretudo nessa modalidade de construção pesada, de rodovias ou de pavimentos e outras aplicações.
A produção de agregados para a construção civil pode se dar: na mistura com cimento Portland ou na utilização de outros materiais, como argamassa e concreto; na produção da matriz de cimento asfáltico, com base em petróleo, areia e filler; na estrutura de vias públicas, com pavimentos intertravados; na fabricação de artefatos pré-moldados, seja na forma de placas, seja em outro formato; e em diversas outras aplicações.
Esta aqui é a descrição da nossa equipe. Nós trabalhamos no Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais — CEFET, com sede em Belo Horizonte, mas temos unidades no interior também voltadas a isso em Araxá e em Timóteo, bem como a Universidade Federal de Outro Preto e o Instituto Federal do Espírito Santo, com os quais nos relacionamos. Trata-se de um grupo multi-instituição voltado para a aplicação desses materiais na área de construção pesada, de construção civil. E ressalto, no grupo, o papel importante do Prof. José Roberto, do Espírito Santo, e do Prof. Ricardo Fiorotti, da Universidade Federal de Ouro Preto, que foram os pioneiros, juntamente conosco, na elaboração de propostas para a reutilização desses materiais na construção civil.
Temos aqui várias instituições, ONGs, como a Bacia Viva, o Instituto Santos Dumont, a INTERPAV e a Phosther, que é especializada na aglomeração desses resíduos para reutilização na fabricação de algum componente ou na reutilização como produto reinjetado no sistema.
Aqui, estamos basicamente contextualizando a importância e o volume do que estamos tratando. Uma lavra a céu aberto, num topo de morro, é geralmente concatenada aos vários tipos de barragens que podem ser construídas, tanto para o lançamento desses resíduos do processo de tratamento minerário quanto dos estéreis, que, a priori, são retirados no início da atividade.
O que nos interessa nesse aspecto? Verificar onde e como podemos utilizar esses estéreis ou rejeitos que aparentemente não têm valor econômico. Mas nós vamos mostrar que existe, sim, valor econômico. Pode ser gerado emprego e renda com o que hoje nós tratamos como resíduo. E nós trabalhamos esse conceito de gerar matéria-prima de segunda geração como resultado desse processo de beneficiamento que vamos fazer dos vários tipos de rejeitos.
A Política Nacional de Resíduos Sólidos, de 2010, deixa bem clara a definição do que é resíduo e do que é rejeito. Então, quando falamos desse descomissionamento de rejeitos, na maior parte do tempo estamos tratando de resíduos, e não de rejeitos. Nós conseguimos separar o que é lançado em três componentes bem canônicos, bem tradicionais. Temos a quantidade exacerbadamente alta de minério de ferro, areia, que é um resíduo mais grosseiro desse material, e o resíduo mais fino, que é uma argila mineral ou silte. Então, o rejeito seria qualquer material para o qual ainda não foi encontrada uma aplicação tecnológica, uma economicidade para a sua reaplicação. O que nós vamos mostrar aqui é que, após a separação, há, sim, destinação correta para isso, que tem valor econômico e possibilita a geração de emprego e renda. Os três nortes da nossa pesquisa são o progresso social, o crescimento econômico e a visão ambiental, ecológica, que está segmentada nessa visão humanística de criar uma perspectiva de reutilização desses resíduos.
12:00
RF
A pesquisa propriamente dita segue a lógica com que lidamos na área de materiais, sejam materiais particulados sejam materiais de qualquer outro segmento.
O projeto de reutilização dos resíduos, que visa dar destinação econômica, encontrar uma nova aplicabilidade para os resíduos, envolve o levantamento das propriedades físico-químicas e o comportamento desses materiais particulados frente a determinados grupos de materiais, seja ligando-os ao cimento, seja aplicando-os em misturas asfálticas, seja utilizando-os como geopolímero, um material relativamente recente nas aplicações de construção civil e que não demanda utilização de cimento, mas, sim, uma cura autocatalítica na presença desses materiais que contêm sílica e alumínio.
As aplicações tecnológicas desses grupos são várias, porque os volumes são muito grandes. A fabricação de blocos intertravados seria uma aplicabilidade para esses grandes volumes de que estamos tratando.
Como eu falei, os resíduos são de grande geração. Paralelamente ao setor minerário, nós também trabalhamos com os resíduos do setor siderúrgico. Esses setores têm uma sinergia muito grande e lidam com esse processo de produção de ligas metálicas ferrosas ou não ferrosas, alumínio ou outros materiais. Nós lidamos, em grande parte, com a perspectiva de usar tanto os resíduos de rejeitos de barragens de mineração quanto os resíduos da siderurgia.
Os resíduos silicosos, encontrados em barragens de extração de quartzo e em alguns subprodutos da fabricação de porcelanatos e louças sanitárias, também podem ser incorporados ou "blendados" a esses resíduos de mineração ou resíduos da atividade siderúrgica.
A produção de novos materiais de base tecnológica busca, primeiramente, fazer o beneficiamento e encontrar uma aplicabilidade econômica sustentável do ponto de vista daqueles três eixos: construção civil, obras de infraestrutura viária e rodovias vicinais. Na Região Metropolitana do Quadrilátero Ferrífero existe uma grande quantidade de Municípios ainda sem pavimento adequado. Como esse é um volume estratosférico, poderia ser feita alguma aplicação nesse segmento de fabricação de pavimentos para um trânsito melhor.
Para redução de custos, basicamente, nós utilizamos um material que já passou por um processo de beneficiamento numa usina de tratamento de minério. Como já foi feita uma cominuição desse material e ele já está britado e peneirado, é muito mais fácil sua aplicação como matéria-prima para uma fabricação cerâmica.
O monitoramento e o manejo, como o Prof. Denes apresentou, são soluções importantes que, concatenadas à reutilização desses rejeitos, podem evitar lançamentos nas barragens atuais ou o alteamento dessas barragens, na medida em que vamos encontrando escalonamento para essas produções.
12:04
RF
O problema da área de disposição e sua revitalização foi bem tratado pelo professor, que mostrou que podem ser construídas, após um programa correto de fechamento de mina, várias estruturas de lazer ou de educação. Essas são algumas das alternativas desse projeto.
O que buscamos é o desenvolvimento tecnológico, sobretudo na nossa região. Nós do CEFET e da Universidade Federal de Ouro Preto estamos praticamente rodeados por essas barragens. Por isso buscamos essa solução. É o nosso papel, como parte da sociedade, buscar esse aprimoramento científico-tecnológico. Esse não é um problema que deve ser transferido para outros, mas um problema para o qual nós na academia temos que encontrar solução. Não vai ser um europeu, um asiático ou um americano que vai dar as destinações corretas para esses resíduos minerários, mesmo porque nós acreditamos que essas destinações já existem.
Eu vou correr um pouco porque acho que é importante para o debate.
No Brasil, em qualquer que seja a extração minerária — minério de ferro, ouro, bauxita —, é gerado um volume gigantesco de resíduos anualmente, algo em torno de 2 bilhões e meio de toneladas. Basicamente, a maior parte dos resíduos é lançada em barragens, sendo pouca quantidade destinada ao empilhamento com drenagem, como o Prof. Denes apresentou.
A taxa de reutilização é extremamente baixa. Estamos falando de quase nada reutilizado. Nos países onde esse programa de reutilização foi implementado, a maior parte dos resíduos ou é estocada em pilhas para futura utilização ou já é reutilizada, após o tratamento, diretamente na fabricação de alguns produtos que são comercializados.
Aqui eu mostro dados da construção civil, que, paralelamente, é o setor que mais demanda materiais, como nós sabemos. Como o volume demandado pela construção civil é gigantesco, esse seria um setor que poderia absorver rapidamente parte desses volumes de resíduos.
Não sei se os senhores sabem, mas a maior parte da areia da construção civil, seja em São Paulo, seja no Rio de Janeiro ou em Belo Horizonte, é areia industrial. Próximo a Belo Horizonte, há grandes barragens com material que pode ser utilizado, evitando-se a extração de areia ou a produção de areia a partir de britagem e moagem. Fazer uso disso é algo muito racional.
Vemos aqui o triste exemplo da Barragem Mina do Feijão, que é o motivo principal de estarmos aqui hoje. No nosso cenário de possíveis barragens de reutilização, pela proximidade com Belo Horizonte, nós já a havíamos indicado como uma grande probabilidade de estudos junto à Vale e junto a outras mineradoras que atuam nessa região.
Este gráfico mostra, ao longo de 1 ano, a análise físico-química dos resíduos de barragem. Em vários pontos coletados, num critério estatístico de validação, o teor de óxido de ferro está sempre em torno de 45%, 50%, o que é alto. Esse é um material nobre que está sendo lançado em barragens. A nossa ideia é reprocessar esse material nobre e extrair dele areia e argila.
12:08
RF
Então, a composição dos resíduos minerados tem cerca de 30% de sílica e em torno de 5% de alumina. Essa composição de sílica, óxido de ferro e alumina é o que caracteriza físico-quimicamente a maior parte desses materiais, juntamente com o tamanho das partículas.
Aqui está uma das patentes que o nosso grupo, juntamente com o pessoal lá do Espírito Santo, pediu o depósito. O processo, tecnicamente, envolve a reextração primeiramente, que é o processo de reaproveitamento desses resíduos para algum fim, e a retirada das argilas em duas etapas concatenadas, depois a areia para a construção civil, que é um resíduo mais grosseiro, e fazemos a separação por processos magnéticos.
A lógica seria a mesma, pensando-se na mineração. O que nos interessa neste momento de tratamento do resíduo não é o minério de ferro, mas sim aquilo que não tem propriedades e que não tem densidade semelhante ao óxido de ferro. Fica fácil, então, separarmos a argila para uso em tijolos, em estruturas de construção civil, e a areia para a construção civil, o que sobra seria o resíduo minerário, que depois é pelotizado e tem um valor econômico.
Então, nesse processo, conseguimos mapear e construir um CAPEX e OPEX, pensando na eventual utilização, o que mostra que o processo é altamente rentável.
Quanto à receita operacional desse processo, teríamos para 1 unidade de 100 toneladas/hora — é simplesmente um piloto, para dar prova de conceito —, em 30 dias, um faturamento bruto da ordem de quase 10 milhões de reais, com um custo operacional de implantação dessa unidade girando em torno dos mesmos 10 milhões de reais. Quer dizer, o processo se pagaria em curto espaço de tempo, é algo economicamente viável.
O minério que está estocado, que foi jogado lá, é retirado, graças à visão de reaproveitar areia e argila. E ele vem como uma consequência desse processo.
A destinação dessa areia seria para a construção civil, supostamente, substituindo a areia industrializada, que falta nas grandes cidades, sobretudo em Belo Horizonte, e a argila seria utilizada nos processos de construção de revestimentos, refratários e louças sanitárias, que também são demandados pela área de construção civil.
Basicamente, o que nós já mostramos que é viável no processo de separação é a construção desses bloquetes intertravados — o professor já os tinha apresentado —, o paver, com a utilização do resíduo, que apresenta várias vantagens comparativas, dentre elas, maior resistência mecânica. Substituindo parte da areia usada nesses intertravados por resíduos, conseguimos aumentar a resistência em quase 50% em relação à utilização da areia. Quer dizer, o material que está sendo jogado fora tem propriedades mecânicas muito mais interessantes do que a areia industrializada, porque ele tem o efeito filler, uma relação de fechamento de poros de maior resistência mecânica.
Na utilização de base e sub-base também encontramos várias vantagens comparativas em relação ao material tradicional normalmente utilizado nessas aplicações.
Eu poderia narrar vários outros exemplos, mas são exemplos pequenos, se pensarmos nos grandes volumes.
12:12
RF
A utilização tem que ser concatenada com vários destinos. O primeiro é a aplicabilidade na construção civil, obviamente, no pavimento. Mas, à medida que a pesquisa for andando, novas e diversas outras aplicações podem e deverão ser otimizadas. Basta, acredito, criar uma legislação que obrigue esse tipo de aprimoramento na utilização desses resíduos.
Depois, eu coloco em discussão isto aqui. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Zé Silva. SOLIDARIEDADE - MG) - Obrigado, Dr. Sidney Nicodemos. Muito anima o nosso trabalho nesta Comissão ver que existem alternativas tecnológicas que não estão sendo utilizadas. E cabe a nós realmente fazer uma legislação que obrigue isso.
Em seguida, eu convido o Dr. Marcelo Martins Neto, geólogo e doutor em Geologia pela Universidade de Freiburg, na Alemanha; ex-Professor da Escola de Minas da Universidade Federal de Ouro Preto; ex-Vale; atualmente, Sócio-Diretor da MULTIPLUS Engenharia e Consultoria, empresa de consultoria e desenvolvimento de projetos para as indústrias de mineração, cimenteira e construção civil. Dr. Marcelo, muito obrigado por nos ajudar a construir um novo tempo da mineração no Brasil.
V.Sa. tem 15 para a sua exposição.
O SR. MARCELO AUGUSTO MARTINS NETO - Boa tarde a todos.
Eu gostaria, inicialmente, de agradecer ao Deputado Zé Silva o convite e a todos a presença. Eu vou tentar ser bastante objetivo em cima do tema que me foi colocado, que é o aproveitamento de rejeitos. O que nós vamos focar aqui é o seguinte: vontade é uma coisa, viabilidade é outra. Então, vamos transcorrer sobre vários aspectos essenciais para a viabilidade do aproveitamento de rejeitos e também mostrar alguns números muito importantes que balizam essa viabilidade.
Em primeiro lugar, do ponto de vista conceitual, é muito importante colocar que essa iniciativa de aproveitamento de rejeitos é a introdução da economia circular na mineração: em vez se de dispor de suposto resíduo, transformar esse resíduo em insumo e em produto e o reinjetar na cadeia produtiva.
Qual é o primeiro ponto? O primeiro ponto muito importante expresso aqui é a escala. Só em Minas Gerais, são produzidas anualmente cerca de 500 milhões de toneladas de minério de ferro apenas no Quadrilátero Ferrífero — 500 milhões de toneladas de rejeitos e estéreis por ano! Disso aí, mais ou menos um terço é rejeitos e dois terços são estéreis. Se existe um problema gerado numa escala de elefante, ele não vai ser resolvido tirando formiguinha de outro lado. A questão da escala é fundamental. É preciso que as iniciativas tenham impacto na escala desse enorme volume e quantidade de rejeitos gerados anualmente na mineração.
O outro ponto extremamente importante é o entendimento, é uma abordagem integrada do problema, vamos chamá-lo assim, para a solução desses rejeitos.
A primeira camada é a que vem do chão, que vem da mina, que é a caracterização física, química e mineralógica, o balanço de massa desse rejeito. Cada mina tem sua característica, embora sejam bem semelhantes, como o Prof. Sidney acabou de colocar. E isso tem que ser estudado e caracterizado.
A segunda é a camada tecnológica. Não adianta conhecer o rejeito se não há uma rota de processamento mineral, uma rota de transformação viável tecnicamente para transformar esse rejeito em produtos.
A terceira camada é o mercado. Não adianta ter o rejeito e transformá-lo se não há aceitação, se não está dentro das normas técnicas e se não há produto com demanda no mercado.
12:16
RF
Por fim, há uma camada inteira que permeia esses três níveis: o entendimento da cadeia produtiva, o drive da logística. Ou seja, não adianta processar rejeitos em Minas Gerais para pavimentar estradas no Maranhão, a conta não fecha, e fluxo de caixa. Tem que haver investimento de capital, dinheiro não cai do céu, tem que haver fluxo de caixa sustentável nesse processo de transformação.
Observando e entendendo essa abordagem, vemos, por exemplo, que há muita iniciativa interessante que é muito bonita na bancada de laboratório, mas sem tecnologia. Em muitas demandas no mercado não existe o encaixe, não existe o entendimento da cadeia logística, por exemplo, para se entregar esse produto no mercado.
Outro ponto fundamental é o entendimento da cadeia produtiva. Como foi colocado há pouco pelo Prof. Sidney, o rejeito do minério de ferro — que é o impactante, de grande volume, e vamos focar nele — tem uma mineralogia muito simples: é basicamente composto, como o professor acabou de colocar, por argilas, areia, e óxidos e hidróxidos de ferro. A mineralogia é muito simples. Agora, a cadeia produtiva tem que ser entendida.
Por exemplo, foi citada pelos dois colegas a questão de fazermos blocos, pisos intertravados, por exemplo, etc. Se fizermos o bloco com o rejeito in natura, pulando o primeiro elo da cadeia produtiva, que é gerar os insumos, vamos criar um bloco com baixa resistência à compressão, e a argila, o mineral, se não for propriamente calcinado, a argila é hidrófila e vai absorver água e estourar esse material depois de um determinado tempo.
Existe um primeiro elo da cadeia produtiva. Podemos pegar o material, o rejeito, tanto da barragem quanto da planta, o rejeito chamado dinâmico, que sai da planta de processamento mineral, e passar por uma tecnologia, uma rota de processamento. E há várias hoje, como o professor acabou de colocar. Nós temos uma patente também na MULTIPLUS que já foi aprovada em escala piloto. Estamos já em passos largos para montar a primeira planta industrial de processamento de rejeito.
No fim do primeiro elo da cadeia produtiva, que chamamos de cadeia primária, há basicamente dois insumos: pozolana artificial, que é uma argila calcinada, um aglomerante poderoso — nós vamos ver já, já, as aplicações no mercado —, e areia.
Em alguns casos, podemos também gerar na cadeia primária pigmentos que têm inclusive enorme valor agregado, milhares de dólares por tonelada, depende da quantidade de óxido, de calcinação, enfim, da rota tecnológica.
Por fim, há a cadeia secundária, que é cliente da cadeia primária. São as cimenteiras, a indústria de pavimentação, de construção pesada, materiais de construção, etc. que vão desenvolver os produtos secundários.
Não dá para queimar etapa.
Outra coisa, a cadeia secundária já está instalada. A indústria cimenteira já está aí, a indústria de pavers, de blocos. A cadeia primária não existe. Então, o investimento há que ser focado na cadeia primária para gerar os insumos necessários e viabilizar o reaproveitamento, a transformação de rejeitos.
Esse é o primeiro ponto em que eu gostaria de focar. Daqui para frente, nas iniciativas, temos que ter foco na cadeia primária, ou seja, na produção de insumos para a indústria da construção civil, não em produtos finais. Para produtos finais, a indústria já está aí, já está pronta. Temos que focar na fabricação de insumos, ainda vamos chegar lá, se há baixa complexidade e se é compatível com a escala. Estamos falando de produtos cujos mercados, e vamos mostrar os números daqui a pouco, são da ordem de milhões de toneladas por ano, ou seja, são produtos que têm escala no mercado.
Nesses mercados, para a pozolana artificial, que são argilas calcinadas, poderosos aglomerantes, a demanda que está pronta é a da indústria cimenteira. É uma adição para cimento, principalmente o CP-IV, que absorve de 15% a 50% desse material. Hoje o insumo utilizado é basicamente escória siderúrgica moída, que é um mercado restrito e cativo. Com a retomada econômica, para crescer a indústria do cimento, tem que haver adição. E a pozolana pode ser gerada a partir de argila, de rejeitos estéreis de mineração.
12:20
RF
Obviamente, a indústria de concretagem, base de pavimentação, como o professor disse, é o maior mercado e não está pronto ainda, precisa de um processo — e vamos discutir isso daqui a pouquinho — para ser viabilizado: pelotização, etc.
Da areia industrial, não precisamos falar. Todos sabem para que serve o insumo areia.
Vamos em frente. Todos acima são utilizados na cadeia secundária. E, como eu disse, há potencial para pigmento, etc.
Esse é só um exemplo do mercado da indústria cimenteira. No caso do cimento CP-IV, como eu disse, vem crescendo a demanda, porque é o de melhor custo/benefício, absorve 15% a 50% de pozolana. Estamos falando de um mercado que pode chegar a um valor entre 5 milhões e 15 milhões de toneladas por ano, obviamente, considerando o crescimento econômico esperado, a retomada da indústria da construção civil.
É importante dizer, em termos de logística — falando de minério de ferro, estamos falando do Quadrilátero Ferrífero, que é onde se gera —, que metade da produção e do consumo do cimento no Brasil está na Região Sudeste, e metade desta está em Minas Geais, no entorno, ou seja, num raio logístico viável para se produzir pozolana e alimentar as indústrias cimenteiras que fornecem para Minas Gerais e para a Região Sudeste.
Na indústria de pavimentação — isso é bem interessante —, a pozolana, como os senhores podem ver ali no manual do DNIT, já é normatizada como outros aditivos para a utilização em base de rodovia. O rejeito pode ser usado in natura ou mesmo o arenoso no leito e na sub-base. E a pozolana, na base, pode substituir entre 5% e 10% na mistura solo-cimento, com redução de custo, obviamente, aumentando a sustentabilidade. Há um potencial, como vamos ver, de dezenas de milhões de toneladas por ano nesse mercado dentro do raio de logística viável.
A areia, todos sabem, é consumida na ordem de centenas de milhões de toneladas por ano no Brasil. Aqui vemos dados de Minas Gerais, do DNPM, até 2014. Isso não mudou muito com a retração da construção civil. Em torno de 40 milhões a 50 milhões de toneladas por ano de areia são consumidos no Estado. Estamos falando de um mercado significativo em quantidade, que vai crescer com a retomada do crescimento econômico. A areia tem potencial em diferentes faixas: a areia muito fina é insumo para argamassa; a areia mais grossa vai para pré-moldados, etc.; o rejeito de mineração fornece uma gama significativa de faixas de tamanho de grãos para suprir a demanda da indústria. Existe a substituição de areia lavada de rio, que tem enorme impacto ambiental, ou mesmo de areia industrial, como foi citada por Sidney, que é muito mais cara do que a areia obtida a partir do processamento de rejeito.
No que se refere à consolidação do mercado, este é um recado para as Sras. e os Srs. Deputados aqui presentes, o primeiro passo são iniciativas políticas, ou seja, legislação favorável ao aproveitamento. Há que se avançar em legislações favoráveis à reutilização de rejeito.
Com relação a iniciativas corporativas, é necessário foco em sustentabilidade — isso está mudando, principalmente depois desses acidentes que ocorreram recentemente — e investimentos de capital. Temos conversado com mineradoras. Há uma resistência muito grande da própria mineradora à diversificação, a criar uma outra área de negócio, por questões de gestão, mas muito também por investimento de capital, que é necessário para viabilizar a cadeia primária, que eu mencionei antes.
Com relação a fontes de financiamento com juros baixos, o BNDES precisa, enfim, entrar.
12:24
RF
Desenvolvimento de mercado. Isso entra com a questão da legislação também, que são incentivos fiscais, tanto em nível federal, PIS/COFINS, quanto estadual, ICMS. Isso significa o quê? Melhor retorno para o investimento e maior competitividade dos produtos no mercado. O incentivo fiscal aí é essencial, principalmente no início, para alavancar a produção.
Por fim, temos também desenvolvimento de mercado e certificação. É importante que o poder público certifique, que haja um selo dizendo que é produto de rejeito.
Outra coisa muito importante é incentivo às licitações. Por exemplo, na questão da pavimentação, se houver um incentivo nos editais do DNIT, da ANTT dando pontos para quem utilizar material reciclado de rejeito, isso vai servir de enorme incentivo para utilização desses materiais. Esse sim é um ponto fundamental. Não é só incentivo fiscal, é incentivo em licitações públicas também.
Agora temos a cereja do bolo, para mim, que toca no lado social: como viabilizar o aproveitamento de rejeito, considerando o raio limitado da logística? É o que temos chamado de criação de polos regionais de materiais de construção sustentáveis. O que é isso? Temos que viabilizar logística, porque eles têm que ser regionais; temos que ter um raio de 100 a 200 quilômetros no máximo de abrangência para a viabilidade de um polo desses.
Segundo ponto, geração de oportunidade, emprego e renda para as comunidades das cidades mineradoras, diversificando a economia, como meus dois colegas falaram, da dependência de determinados Municípios com a CFEM e com o salário dos funcionários da Vale, por exemplo, que comem nos restaurantes de lá.
O licenciamento social do empreendimento é importante. Esses polos são concebidos da seguinte forma: temos que ter uma planta de produção primária para gerar os insumos, areia e pozolana, e toda uma cadeia de indústrias, um número de indústrias da cadeia secundária em volta, tais como fábricas de argamassa, cimento, concreto, pré-moldado, piso, bloco, cerâmica, etc. Isso pode alavancar, nas regiões mineradoras, grandes projetos sociais, como conjuntos habitacionais sustentáveis e programas de pavimentação, como Sidney colocou. Isso já é realidade na França. Este é um exemplo de pavimentação usando rejeitos. Aqui em cima vemos que o rejeito arenoso in natura foi utilizado no leito e na sub-base e uma mistura de solo-cimento com 8% de pozolana.
Vejam que interessante: a última figura embaixo, à direita, é a base imprimada antes da camada asfáltica. Numa estrada vicinal, não é preciso nem asfaltá-la. Vamos ter, nesse caso, uma estrada de terra de altíssima qualidade e durabilidade e de baixo custo e sustentável.
Em termos de legislação, isso é muito recente. Acho que, na semana passada, foi apresentado, no Senado, o Projeto de Lei nº 146, de 2019, que altera a Política Nacional de Resíduos Sólidos no sentido de fomentar o aproveitamento de rejeitos de mineração.
Destaco duas coisas, dois erros fundamentais nesse projeto, embora as emendas ainda estejam tramitando, que têm que ser corrigidos. O primeiro é que o destino dos rejeitos seria a fabricação de blocos para alvenaria, tijolos e telhas. Isso restringe a uma coisa que não tem escala. Vamos ver que é 1% ou 2%. E, pior, e até pintei de vermelho, essa medida deve ser implementada de forma produtiva, de modo a, a partir do quinto ano subsequente à aplicação da lei, abranger a totalidade dos resíduos. Isso é impossível. Cem por cento é inviável. Isso é Papai Noel. E mostro o porquê nos últimos eslaides.
Esta é uma a tabela — não se preocupem que vou mostrar os pontos importantes dela — de um estudo feito pela UFMG para o antigo Departamento Nacional de Produção Mineral. Toda parte de estudo de mercado e de quantificação fomos nós que fizemos, como consultoria, para a UFMG.
12:28
RF
É muito interessante, como os senhores e as senhoras podem ver, que isso está bem detalhado do ponto de vista da cadeia primária, da cadeia secundária. E vou fazer um primeiro destaque dos insumos da cadeia primária que foram feitos em três estágios no tempo: os primeiros 5 anos, o médio e o longo prazo. Estamos falando em torno de 20 anos. Vemos três cenários: pessimista, realista e otimista. A indústria cimenteira, por exemplo, pode absorver muito rápido essa demanda; já a indústria de pavimentação, que tem grande potencial, precisa dessa maturação, dessa legislação e desse incentivo.
Este é o aspecto mais importante: dependendo do cenário e do período de tempo, podemos ver que a cadeia primária absorve mais ou menos 90% daquilo que é produzido e a cadeia secundária, no máximo, 10%. Então, o foco é a cadeia primária. É aí que temos escala, é aí que temos realmente viabilidade para justificar investimento.
Temos mais dois últimos eslaides — o último é a conclusão.
Este é um cenário conservador, realista. Podemos ver, lá em cima, o patamar de produção do Quadrilátero Ferrífero em milhões de toneladas por ano, o que talvez caia um pouco agora com algumas minas fechando; em vermelho, a disposição em rejeito ou pilhas; e, em verde, o que é viável. Portanto, num cenário realista e conservador, chegaríamos, no máximo, a 26,5% do rejeito aproveitado. Três quartos continuariam indo para a pilha ou para outras alternativas de disposição. No cenário mais otimista, conseguimos chegar a 40%, se houver fomento legal, fiscal, entre outros, à indústria de pavimentação.
Para viabilizar este projeto, o que temos que ter? Iniciativas em escala. Se o input é em milhões de toneladas, a saída, do outro lado, tem que ser em milhões de toneladas. Essa é a solução. Segundo, para processo e produtos, o foco tem que estar na cadeia primária. Aí teremos impacto. Terceiro, tecnologia de processamento adequada, testada, no mínimo, em escala-piloto, para não termos risco tecnológico; e rentável, tem que haver taxa de retorno atrativa e payback rápido, senão o investidor não coloca dinheiro, a menos que tenha subsídio — que é uma coisa de que não gosto.
Por fim, foco na fabricação e comercialização de insumos para a indústria da construção civil. Quais são os desdobramentos? Reciclagem de parcelas significativas dos passivos ambientais com geração de receita, o que é importante. Segundo, viabilização dos polos regionais de materiais de construção sustentáveis, que vão propiciar projetos regionais sustentáveis, como conjuntos habitacionais, pavimentação, entre outros e, por fim, geração de oportunidade de emprego e renda para as comunidades atingidas.
Basicamente é isso.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Zé Silva. SOLIDARIEDADE - MG) - Muito obrigado, Dr. Marcelo, pela exposição, que realmente nos deixa todos animados e, ao mesmo tempo, muito curiosos e ávidos por estudar o tema, não é Deputado Newton Cardoso Jr?
O SR. NEWTON CARDOSO JR (Bloco/MDB - MG) - Sr. Presidente, qual foi o projeto de lei mencionado, por gentileza?
O SR. PRESIDENTE (Zé Silva. SOLIDARIEDADE - MG) - Depois eu vou pedir que fale.
Prof. Marcelo, embora esta seja a 11ª audiência pública, eu me contive e não fiz nenhuma pergunta até aqui, mas vou fazer três considerações.
Uma delas é em relação aos resíduos, ou rejeitos — vamos chamar rejeitos — que poderão ser utilizados pela agricultura. Eu fui agrônomo numa cidade do Triângulo Mineiro, Uberaba, onde existe uma quantidade estratosférica de rejeitos de fabricação de fertilizantes que podem ser utilizados na correção de solo em larga escala, talvez até com tecnologia mais avançada do que a do próprio rejeito de outros minerais metálicos, mas que o Estado brasileiro passou para a iniciativa privada, sem que isso pudesse ser apreciado pela legislação brasileira e pudesse ser doado inclusive para a agricultura, para o agricultor familiar. Essa é uma pergunta, que evidentemente não está na área de foco de vocês, que quero colocar na Consultoria, para podermos pensar nesse rejeito, que pode ser utilizado pela agricultura.
12:32
RF
A segunda consideração é uma pergunta também para ter um pouco de informações. O Prof. Sidney falou em 2 bilhões de toneladas de rejeitos produzidos no Brasil todo ano, aproximadamente. Há uma relação dos três principais minerais metálicos, por exemplo, 1 tonelada de ouro gera 1 tonelada de rejeito? Vou citar os três primeiros só para termos uma noção de grandeza.
Outra pergunta, com certeza, especialmente a população das grandes cidades gostaria de saber se há riscos à saúde e ao meio ambiente na utilização desses rejeitos em obras de infraestrutura e habitações sustentáveis, como o próprio Prof. Marcelo disse.
Por último, vocês citaram alguns avanços na legislação, especialmente o Prof. Marcelo. Quais os avanços da legislação — esta pergunta poderá ser feita oficialmente, por escrito, também para nossa Consultora Legislativa — nós temos para o aproveitamento desses rejeitos? O senhor citou incentivo fiscal, formas de financiamento, certificação das licitações, tudo muito pragmático. Eu acho que foi muito objetivo, mas faço essa pergunta. Se puder depois nos encaminhar...
Dando celeridade aos nossos trabalhos, passo a palavra à Deputada Áurea Carolina, que se inscreveu pelo tempo da Liderança, 3 minutos, mais 3 minutos.
V.Exa. tem 6 minutos para fazer as suas considerações aos expositores.
A SRA. ÁUREA CAROLINA (PSOL - MG) - Muito obrigada, Deputado Zé Silva.
Boa tarde a todo mundo.
Muito obrigada aos Srs. Denes, Sidney e Marcelo pelas brilhantes exposições, importantíssimas para o acúmulo de conhecimento desta Comissão Externa.
A cada audiência pública, nós chegamos um pouco mais à beira do abismo que é a situação atual da política mineral no nosso País, um modelo colapsado que precisa urgentemente de respostas no âmbito da legislação, da gestão das políticas públicas, na conscientização da sociedade sobre a necessidade de sairmos desta encruzilhada: é ruim com a mineração e pior sem a mineração. Não é possível mais nós aceitarmos essa dependência do modelo.
Como foi apresentado aqui pelo Sr. Denes, em várias cidades a situação é crítica. Como exemplo, em Itabira, há uma perspectiva de 10 anos para o fechamento das atividades pela Vale. A cidade fica sem saída. Não é possível mais que essa lógica extrativista predatória condene populações inteiras desta Nação ao empobrecimento, ao adoecimento, à morte, à lama. Nós temos a responsabilidade de trazer, com a viabilidade econômica dessas alternativas de aproveitamento de utilização dos rejeitos, a possibilidade para reduzir a intensidade desse modelo predatório e caminhar rumo a uma política mais responsável.
Eu não acredito, Sr. Denes, apesar de alguns interlocutores terem trazido isso, que é possível ter uma mineração sustentável, diante da devastação toda que é a atividade. Mas podemos chegar a um modelo mais responsável, responsivo à sociedade brasileira, em que os empreendedores privados, junto com o poder público, mitiguem os danos.
12:36
RF
Está mais do que evidente aqui, Deputado Zé Silva, que não viabilizaram essas alternativas por irresponsabilidade, porque há estudos que mostram que há muita possibilidade de utilização desses materiais em vários ramos da indústria. Isso não é pouca coisa. Então, se criarmos incentivo e obrigatoriedade na legislação, vamos dar um passo importante. A Consultoria Legislativa é extremamente competente e solícita e tenho certeza de que vai nos ajudar numa resposta para inserir isso no marco regulatório que nós vamos propor com a Comissão Externa.
Eu quero aproveitar para fazer um registro hoje, 21 de março, Dia Internacional de Luta pela Eliminação da Discriminação Racial, por coincidência, 1 ano da Deliberação Normativa do COPAM nº 220, de 21 de março de 2018, que trata do Plano Ambiental de Fechamento de Mina. Uma das imagens que o senhor mostrou do Parque das Mangabeiras expõe dois trabalhadores negros nos anos 60. A origem desse modelo está assentada na lógica colonial brasileira, na exploração de mão de obra escravizada e na reprodução de um racismo estrutural que tem impacto sobre as populações atingidas.
Em Brumadinho, nessas várias cidades, a maior tristeza, a maior dor recai sobre as populações empobrecidas, que são, em grande parte, negras, comunidades indígenas e quilombolas, que são atingidas e invisibilizadas nessa discussão em grande medida. Nós tivemos uma retomada indígena Naô Xohã, em São Joaquim de Bicas, próximo a Brumadinho, que foi atingida pelo rompimento da barragem da Mina do Córrego do Feijão. É terrível ver a situação daquele grupo que luta há séculos no nosso País pelo seu direito à vida, pelo seu direito ao território. E a mineração sai devastando os territórios.
Eu, como Parlamentar negra, faço questão de demarcar aqui hoje que essa luta por justiça socioambiental, por uma transição econômica no modelo mineral é também uma luta antirracista, é uma luta para que a sociedade brasileira consiga superar essa lógica colonial, subserviente, que vemos até no Presidente, que foi aos Estados Unidos e fez concessões absurdas ao império, sem contrapartida para a Nação brasileira. Isso é inaceitável, numa conjuntura também em que nós somos surpreendidas a cada momento com tragédias sucessivas, notícias terríveis — hoje, o ex-Presidente Michel Temer foi preso.
Este debate sobre a mineração não pode ser apagado no meio desse noticiário das trevas. A situação de Brumadinho, o crime da Vale, a situação de Mariana e de tantas outras cidades não podem ser perdidas de vista no nosso compromisso público. Nós não podemos deixar que o ritmo de trabalho aqui seja desacelerado e que não tenhamos a aprovação dessas medidas tão importantes.
O Parlamento brasileiro tem que dar essa resposta, os culpados têm que ser responsabilizados. Contamos muito com a contribuição preciosa dos senhores especialistas, que, a cada momento, aqui nos trazem mais condição, mais fundamentação para irmos adiante nesta luta.
O SR. PRESIDENTE (Zé Silva. SOLIDARIEDADE - MG) - Muito obrigado, Deputada Áurea. Parabéns pelo seu trabalho, pelo seu comprometimento.
Dando prosseguimento, concedo a palavra ao Deputado Rogério Correia, acrescido do tempo de Liderança de 4 minutos.
V.Exa. tem 7 minutos.
12:40
RF
O SR. ROGÉRIO CORREIA (PT - MG) - Obrigado, Presidente.
Eu vou iniciar por onde a Deputada Áurea terminou, e conversávamos sobre isso. Parece que um escândalo sepulta o outro, enterra outro escândalo. Neste caso, sepulta mesmo. Querem que esqueçamos o que foi o crime da Vale em Mariana e, agora, em Brumadinho, onde quase 400 pessoas foram soterradas na lama, fora o Rio Paraopeba, que soterrou 20 outras pessoas pela lama da Samarco, também da Vale, e do Rio Doce, que até hoje não voltou ao normal, e vai demorar décadas. Talvez o Rio Paraopeba demore séculos para voltar ao que era. E um crime é sobreposto a outro.
Agora, a Operação Lava-Jato, também para esconder o que Bolsonaro tem de ligação com as milícias, para esconder os crimes que estão sendo apontados contra Queiroz, laranja que financiava a campanha de Bolsonaro, a reforma da Previdência, que retira direitos dos trabalhadores, a Lava-Jato, repito, agora — agora! —, tardiamente, prende o Presidente Temer. Certamente tem suas razões. Mas é bom lembrar que Temer foi aquele que, junto com Cunha e outros, fez a retirada da Presidenta Dilma, sepultando a democracia. Agora vai ele para a prisão, com a Lava-Jato querendo esconder Bolsonaro. É muito estranho. É tudo muito estranho. E, por trás disso, está a figura de Moro.
Portanto, nós vamos vendo no Brasil um escândalo suceder outro e outros escândalos sendo esquecidos. A nossa obrigação aqui é não deixar que se esqueça os crimes em Mariana, cometido pela Samarco, e em Brumadinho, cometido pela Vale.
Nesse sentido, Presidente, eu queria fazer um requerimento, uma moção, alguma coisa que obrigasse a Vale a retirar aquela uma propaganda de televisão que está insultando as pessoas mineiras, as vítimas. Parece que a Vale é tão boazinha, que ela está agora arrumando Brumadinho. Eu vi a propaganda e fiquei estarrecido. Nós vemos a propaganda e parece que a Vale vai arrumar Brumadinho. Está investindo tanto, que Brumadinho será outra cidade. Não acreditei quando ouvi eles dizerem que vão escrever uma nova história para Brumadinho. A Vale vai escrever uma nova história para Brumadinho! A história da Vale foi a do crime, da morte das pessoas. Ela está dizendo agora que, com os recursos que está investindo, vai escrever uma nova história para Brumadinho. Isso é uma ofensa. Isso é uma ofensa que a Vale faz a todos os mineiros, a todo o povo brasileiro, como se ela fosse uma heroína, por estar, na obrigação que tem, minimizando, se é que está fazendo, os dramas que aconteceram em Brumadinho.
Eu acho que nós deveríamos exigir a retirada dessa propaganda. Ela é ofensiva. Ela é mentirosa. A Vale assassina e mente e fica impune, como está impune em relação à Mariana. É preciso, Sr. Presidente, fazer alguma coisa em relação a essa propaganda — não sei, uma ação. Nós precisamos pensar em alguma coisa, porque ela é ofensiva ao povo.
Ao mesmo tempo, o tema que nos traz aqui do descomissionamento é grave, porque outras minas, e, agora, outras barragens também já estão sendo anunciadas com risco e novamente sendo suspensas, como a de Alegria, ontem, em Ouro Preto. A Vale anunciou que ela também não tem segurança e que vai paralisar as suas atividades. Os Prefeitos ficam apavorados: "Olha, como vai tirar isso daqui? Como nós vamos viver economicamente?" Mas, como nós vamos viver com aquilo lá?
12:44
RF
Então, não sabemos nem se a Vale é transparente, se é real. Não temos um laudo do que de fato está acontecendo. Ficamos nas mãos da Vale, que pode chantagear o Estado ou não. Não sabemos o que tem risco e o que não tem. É isso que nós continuamos vivendo. E não temos uma resposta do Governo. Cadê o Governo Bolsonaro? Ele sobrevoou o local no dia, fez uma demagogia danada e desapareceu. Não se ouve falar de uma atitude sua em relação a essa questão. Nada! Absolutamente nada! A vida passa normalmente. Do Governo Zema, que eu saiba, o Corpo de Bombeiros Militar, mesmo assim, porque é uma obrigação, e nós temos que aprofundar... Enfim, os Governos vão permitindo que a Vale toque a vida como se nada tivesse acontecido. Esse é que é o dilema.
Então, essa questão de descomissionamento tem que estar em lei. Não há condições de uma empresa fazer a exploração de uma barragem e permanecer lá depois de tudo acabar. Isso tem que estar em lei. Aliás, em Minas, nós colocamos em lei: terminou, há o descomissionamento imediato. Tem que estar já no planejamento o descomissionamento, inclusive com um fundo que o garanta se a porcaria da empresa fugir, como aconteceu com Morro Velho. Aliás, eu fiz muito piquete lá na época dos mineiros de Nova Lima, que tinham uma tradição muito grande de mobilização, e que, provavelmente, estariam lutando contra essa reforma da Previdência. Eu já fiz muito piquete lá. A mineradora ganhou tanto dinheiro em Nova Lima, e fugiu. Disse que está com uma mina na Bolívia. E o Estado vai pagar o descomissionamento de lá. Vimos isso outro dia na televisão.
Então, o descomissionamento não é obrigatoriedade da legislação. A empresa simplesmente explora o que quiser, e depois umas decretam falência e vão explorar em outros países, como é o caso dessa sul-africana, se não me engano, de Morro Velho. Na época, nós fazíamos denúncia disso, porque ainda eram vinculada ao apartheid, que ainda existia na África do Sul. Saíram de lá, Deputada Áurea, é bom lembrar isso, era sul-africana, repito, muitas vezes denunciada de racismo, de fascismo, do apartheid na África do Sul. Explorou o povo mineiro de Nova Lima, depois saiu, foi para a Bolívia, onde está, e deixou aquela bomba-relógio na cabeça das pessoas. Esse é o papel da mina de Morro Velho, dos mineiros de Nova Lima. Inclusive tivemos o Deputado Estadual Dazinho, mineiro, que lutou muito contra isso. Essa história vai se repetir. Nós temos que contar uma verdadeira história para a frente.
Concluindo, Sr. Presidente, eu estou muito otimista quanto ao nosso trabalho na Comissão. Nós conseguiremos aprovar essas leis aqui. Essa briga de Moro com Maia parece ser séria, porque ontem o Presidente Maia respondeu a Moro que ele faz plágio, que mandou um projeto para cá e quer mandar na Câmara Federal, dizendo quando quer aprovar o pacote dele, Moro. Maia respondeu, e hoje está o sogro dele preso. É muito engraçado. As coisas aqui acontecem numa velocidade, que está o sogro de Maia preso, Moreira Franco. E Moro, provavelmente, vai dizer que não tem nada a ver com isso.
Eu acho que, com isso, enterra-se a reforma da Previdência. Não é ruim, não. Pelo menos, enterra-se a reforma da Previdência. Mas vamos ver se colocamos os projetos de Brumadinho na pauta e na Ordem do Dia para votar como prioridade. Aí vamos mostrar ao povo brasileiro que estamos respondendo ao crime da Vale, tanto de Mariana quanto de Brumadinho.
Parabenizo os expositores. Acho que todas as ideias para descomissionamento devem ser aproveitadas. Mas o fundamental é que isso fique sob responsabilidade da empresa — era a opinião que eu queria de vocês — como obrigação legal, responsabilidade da empresa em fazer o descomissionamento no prazo estabelecido, e não ficar adiando anos e anos, décadas e décadas, para depois largar essa bomba na cabeça das pessoas.
Muito obrigado, Presidente.
12:48
RF
O SR. PRESIDENTE (Zé Silva. SOLIDARIEDADE - MG) - Muito obrigado, Deputado Rogério Correia. Parabéns pelo posicionamento.
Colegas Parlamentares, o Deputado Rogério Correia fez uma proposta que, pela urgência e pela contundência da sua necessidade, já solicito à Assessoria da Câmara dos Deputados que, regimentalmente, já se garanta hoje um requerimento nosso para imediatamente notificar o Ministério Público Estadual de Minas Gerais e o Ministério Público Federal no sentido de tomarem as medidas cabíveis juridicamente para tirar aquela propaganda desrespeitosa. Só o recurso que, tenho certeza, estão gastando com a mídia em veicular a propaganda já teria resolvido o problema da aflição e do pânico que nós presenciamos na cidade quando por lá passamos.
Depois vamos ouvir um depoimento de Brumadinho.
Pode ter certeza de que vamos tomar imediatamente as medidas necessárias. Parabéns!
Aproveito também, Deputado, antes de dar seguimento aos debates, para comunicar que eu e o Relator nos reunimos ontem com a Consultoria Legislativa e a Assessoria da Comissão e fizemos um cronograma do encerramento das atividades até a proposição das leis.
Temos mais duas audiências públicas, terça-feira e quarta-feira próximas. Para a de quarta-feira, já temos confirmado três palestrantes de outros países para falar das suas experiências em relação ao monitoramento.
No dia 4 de abril, quinta-feira, na primeira semana do mês, vamos ter uma reunião com a Consultoria Legislativa, com os Parlamentares, quando vão apresentar todas as proposições. Após todos os debates e os 110 projetos que estão tramitando na Casa, todos nós Deputados vamos tomar conhecimento. Estamos propondo começar às 9 horas e terminar na hora que for preciso — às 18 horas, às 19 horas, às 20 horas.
Terminado, imediatamente na sexta-feira, abriremos do dia 5 ao dia 11 de abril consulta pública na Internet para a população brasileira melhorar a proposta e nos dar sugestões em relação a essa legislação. Então, de 5 a 11, fica em consulta pública.
Vamos, junto com a Consultoria, fazer a redação final nos dias 15, 16 e 17. Em seguida será a Semana Santa, Sexta-Feira da Paixão.
Nos dias 22 e 23, já vamos, regimentalmente, pegar a assinatura de todos os Líderes dos partidos. Queremos ter 100% no requerimento das proposições protocoladas com requerimento de urgência urgentíssima.
No dia 25 de abril, já há uma proposta, que vamos passar para todos assinarem, para criar o Dia Nacional de Mobilização em Defesa dos Atingidos por Barragens de Mineração no Brasil. Nesse dia, pretendemos fazer uma grande mobilização aqui. Estamos requerendo um espaço maior, o Auditório Nereu Ramos ou outro, para as 300, 400, não sei quantas pessoas pretendemos trazer. Nesse dia, vamos requisitar ao Presidente da Câmara que vá ao evento receber da Comissão o requerimento de urgência urgentíssima. E queremos que ele anuncie, na segunda e na terça-feira da outra semana que já vai colocar o requerimento de urgência em votação. Depois é só votar as leis e, então, encerraríamos.
12:52
RF
Deputada Áurea Carolina, nós não vamos abrir mão dessa velocidade, dessa urgência do trabalho. Aí é votar. E a Comissão cumprirá o seu papel, com a Consultoria, especialmente os consultores que nos ajudaram nessas 11 audiências públicas, seguindo todos os pontos.
Peço aos colegas que todos assinemos a proposição de criação do Dia Nacional de Mobilização em Defesa dos Atingidos por Barragens de Mineração no Brasil. A Assessoria vai passar a proposição para os colegas assinarem.
Dando prosseguimento, o próximo inscrito é o Deputado André Janones.
V.Exa. tem 3 minutos, Deputado.
O SR. ANDRÉ JANONES (Bloco/AVANTE - MG) - Bom dia, Deputado Zé Silva; bom dia a todos os presentes aqui no plenário.
Primeiro, quero registrar a presença do meu amigo Dr. Wilson Paiva, advogado, especialista em gestão do SUS em Guarulhos. Está aqui nos visitando e veio trazer um projeto fantástico chamado Hospital do Bem, que, logo, Dr. Wilson, vamos apresentar ao Ministério da Saúde.
Muito obrigado pela presença.
Deputado Zé Silva, fiquei muito feliz quando V.Exa. informou o cronograma, porque, como muito bem colocou o Deputado Rogério Correia, o assunto vai saindo da mídia. Aí eu me lembro da fala, na última reunião aqui, de Simone, uma das atingidas em Mariana: "Depois as câmeras se desligam e a gente fica só". Eu vejo que as câmeras já se desligaram, Deputada Áurea Carolina. Mas eles não estão sós, porque nós estamos aqui, como se diz no popular, carregando o piano, para garantir que o crime que aconteceu em Brumadinho não fique impune e principalmente para que nós não tenhamos novas tragédias como essa.
Então, eu sinto um alívio com a fala do Deputado Zé Silva. Realmente, esta Comissão está em muito boas mãos. Tenho certeza de que vamos atingir o objetivo.
Quero parabenizar todos os palestrantes. Foi uma exposição muito clara. Não ficou nenhuma indagação.
Para finalizar, quero dar um informe, uma notícia boa, Deputado Zé Silva. Eu estive em Brumadinho há mais ou menos 20 dias participando de uma reunião que tinha representantes de todas as comunidades do Município. Eles fizeram algumas reivindicações, dentre elas, algo para revitalizar o turismo na cidade — a mesma reivindicação que foi feita em Macacos. A linha de crédito que foi disponibilizada pelo Ministro do Turismo não contemplava o capital de giro, mas apenas equipamentos e obras. Eles pediram que tentássemos agilizar isso, de alguma maneira, para reverter essa situação.
Eu pedi uma audiência com o Ministro do Turismo. Ele nos recebeu ontem às 18 horas. O nosso gabinete trouxe Fernanda, representando o Município de Brumadinho, e Marcelo, representando o Distrito de Macacos.
Aqui nós criticamos quando temos o que criticar, mas também aplaudimos quando o trabalho é efetuado corretamente. O Ministro foi muito solícito e imediatamente, durante a audiência mesmo, atendeu a ambos os pedidos. Já chamou os técnicos e lhes pediu que se inicie uma forte campanha publicitária para tentar atrair turistas para a região, e incluiu também a linha de crédito de capital de giro dentro dos valores que estão sendo disponibilizados para o Município de Brumadinho.
Então, quero dar aqui esta boa notícia, fazer, mais uma vez, o meu agradecimento público ao Ministro Marcelo Álvaro Antônio e pedir, já falei com V.Exa., que possamos ouvir Fernanda. Espero que seja atendido, Sr. Presidente.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Zé Silva. SOLIDARIEDADE - MG) - Vamos sim, Deputado, com muita honra.
Continuando o nosso debate, passo a palavra ao Deputado Newton Cardoso Jr.
V.Exa. tem 3 minutos.
12:56
RF
O SR. NEWTON CARDOSO JR (Bloco/MDB - MG) - Muito obrigado, Sr. Presidente.
Quero cumprimentar os caros colegas e cada um dos palestrantes que participam dos trabalhos desta Comissão neste início de tarde. Esta talvez tenha sido uma das reuniões mais qualificadas de que participei desde o início dos trabalhos. A qualidade das apresentações aqui foi impecável. Quero parabenizar cada um dos senhores pelo conteúdo apresentado e pela escolha deste importante tema, que infelizmente só passa a ser discutido depois do crime.
Se a companhia Vale tivesse usado a sua influência e o poder que tem perante o Governo, perante a máquina pública, para aprovar ou para apoiar soluções integradas, como as que foram discutidas e apresentadas aqui, tenho certeza de que o tamanho das barragens, em todo o Estado de Minas Gerais, em todo o Brasil, já seria menor, por conta da viabilização de diversas das soluções sugeridas. A empresa tem o poder nas mãos, mas decidiu usá-lo para tirar vidas.
Isso é muito grave, e temos sempre que lembrar que a tragédia que estamos discutindo aqui é a enésima desse tipo, porque a barragem que se rompeu neste crime que ocorreu em Minas Gerais não é a primeira nem a segunda barragem que se rompe em função justamente da falta de responsabilidade, da falta de interesse de uma empresa que é hoje controlada por estrangeiros, que tem mais de 48% do seu capital nas mãos de estrangeiros. Isso é muito grave.
Eu quero apoiar as apresentações feitas aqui, Presidente, e dizer que, infelizmente, apesar de todas as soluções, ainda temos algo que trabalha contra elas, um problema que reside ainda um pouco em nossas sociedades e que, infelizmente, no caso de Minas Gerais, não é diferente: a grande quantidade de fake news. Por exemplo, o setor siderúrgico tem no mínimo seis ou sete resíduos, que hoje são chamados de subprodutos. Como pode o pó de balão, o fino de minério, o fino de carvão, o pó de filtro, a água de lavador, a escória siderúrgica, entres outros, terem sido sempre chamados de resíduos, de lixo, de sobras, quando a terminologia mais adequada é subproduto?
Até respondendo a V.Exa., Sr. Presidente, em relação a uma solução para a agricultura, o pó de balão, que é uma sobra do processo industrial, algo que vira um talco, com muito teor de carbono e um pouco de ferro, tido como um produto altamente maléfico para o solo por ter fenóis, etc., outro dia, foi apontado, por um estudo da EMBRAPA, como um produto que pode ser usado para plantar alface de alta qualidade, porque é higroscópico, porque tem sílica, porque tem não sei o que mais.
Então, quando vemos que o uso desses subprodutos é muito claramente viável, não apenas na construção civil, não apenas na construção pesada, mas também na agricultura, ficamos com esse desafio da escala. Eu gostei muito da fala do Dr. Marcelo quanto a importância do foco na cadeia primária, na escala, para gerar receita a partir da reciclagem desses materiais.
13:00
RF
Esse é um caminho que nós nesta Casa temos que trabalhar para simplificar. Há o problema da certificação, o problema do incentivo às licitações. Eu tenho a convicção de que nós temos que parar um pouco com o incentivo fiscal. Vamos com calma em relação a ele, porque o momento não o está permitindo. Ele é necessário, sim, pois há um problema. Mas a sucata, no mesmo setor, na mesma cadeia produtiva, já é isenta de uma série de tributos. Então, vamos tratar os subprodutos como tratamos a sucata, porque com isso conseguiremos viabilizar seu uso em escala, em todos os setores possíveis, diminuindo e reduzindo o impacto dessa atividade, que infelizmente tem sido predatória.
Deputada Áurea Carolina, V.Exa. é sempre muito brilhante nas suas explanações. Temos convicções um pouco diferentes, mas respeito a sua fala e concordo que, sem dúvida, é predatória a forma como se tem atuado. Eu sigo muito o pensamento progressista que aprendi com meu pai, que foi Governador de Minas Gerais. O Deputado Rogério conhece muito bem a história dele. Meu pai me deu uma sugestão há 5 anos, quando eu estava entrando nesta Casa. Ele disse que o setor de ferro-gusa, por ser o maior setor de produção, de primeira agregação de valor ao minério, deveria brigar para que Minas Gerais fosse proibido de exportar minério — proibido! —, para que pudéssemos produzir tudo em ferro-gusa: chapas de aço, veículos, peças.
Caminhando para a conclusão, Presidente, quero dizer que, além de tudo, temos uma associação que se chama ANITECO — Associação Nacional da Indústria do Tijolo Ecológico, também mencionada aqui dentro do mesmo conceito de qualidade constitutiva, que poderia estar fabricando todas as casas do Minha Casa, Minha Vida a partir do subproduto da mineração. O que falta hoje realmente é apoio, inclusive da nossa Casa, que tem que tomar o protagonismo para viabilizar a redução da burocracia no que diz respeito a essas soluções.
Para finalizar, trago uma sugestão: promover uma denúncia, com a assinatura de todos os colegas aqui, ao CONAR — Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária, antes de envolver o Ministério Público em Minas Gerais. Vamos todos aqui assinar agora à tarde uma denúncia ao CONAR contra a publicidade criminosa e enganosa dessa empresa, que já matou mais de 300 pessoas em Brumadinho.
Que as famílias possam ter o conforto de Deus em seus corações e que nós possamos defender o povo de Minas Gerais contra essa indústria criminosa, que não agrega valor e que não defende o povo desse Estado.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Zé Silva. SOLIDARIEDADE - MG) - Obrigado, Deputado.
Consulto os Srs. Parlamentares se concordam com a proposta do Deputado Newton Cardoso Jr. (Pausa.)
Se concordam, já peço a assessoria para preparar a denúncia. Esta foi uma decisão rápida e objetiva.
Quero registrar e agradecer carinhosamente a presença da Prefeita de Dom Bosco, Iramaia; o Vice-Prefeito Rogério; os Vereadores Vicente, Alvim, Chiquinho e João Alfredo; o ex-Vereador Gersim; e o Secretário de Governo, Ronildo Cordeiro da Silva. Agradeço também ao Vereador Thiago Martins, de Unaí, jovem político e grande liderança. Estavam com o Senador Rodrigo Pacheco, de Minas Gerais, no Senado, evidentemente buscando recursos para a região do noroeste mineiro. Muito obrigado pela presença, que nos honra muito, na nossa Comissão nesta manhã de quinta-feira.
Tem a palavra o Deputado Newton Cardoso Jr.
O SR. NEWTON CARDOSO JR (Bloco/MDB - MG) - Presidente, gostaria de mencionar também a presença conosco do Vereador Beto Fulgêncio, do Município de Pirapora, que veio aqui para fazer uma denúncia sobre a situação do Vapor Benjamim Guimarães, que circula naquelas águas do Rio Paraopeba que estão sofrendo com o impacto da contaminação de rejeitos. O Vereador veio aqui pedir apoio para revitalizarmos o Benjamim Guimarães, que é o último barco a vapor de Minas Gerais.
Bem-vindo, Beto!
Muito obrigado.
13:04
RF
O SR. PRESIDENTE (Zé Silva. SOLIDARIEDADE - MG) - Fica registrada também a sua presença, Beto. Muito obrigado.
Dando prosseguimento à nossa audiência pública nesta manhã, passarei a palavra ao Presidente da Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado de Minas Gerais, o Deputado Vilson. Nós lutamos juntos em defesa dos trabalhadores da agricultura familiar.
Já me posicionei claramente contra a reforma da Previdência, Vilson, e sei que V.Exa. também já se posicionou contra ela nas reuniões. Agradeço seu convite para estar dia 12 em Belo Horizonte, já com o meu posicionamento público e claro contra a reforma da Previdência. Nós estaremos lá para prestigiá-lo.
V.Exa. está com a palavra, dispondo de 3 minutos para o seu pronunciamento.
O SR. VILSON DA FETAEMG (PSB - MG) - Obrigado, Deputado Zé Silva, Coordenador desta Comissão. Cumprimento todos os colegas Parlamentares e todas as mulheres desta plenária, especialmente a nossa Deputada Áurea, que está cumprindo seu primeiro mandato. Eu também estou cumprindo meu primeiro mandato. Entramos quentes, fervendo, aqui neste Congresso Nacional.
Eu gostaria aqui, Deputado Zé Silva, de dizer que não tive oportunidade de frequentar uma academia para ter conhecimento acadêmico, mas acompanho as reuniões e audiências que acontecem nesta Comissão Especial e em outras — alguns acham que as outras são mais importantes — e quero aqui, de modo especial, parabenizar pelas exposições o Denes Martins, da UFOP, o Sidney e o Marcelo, que mostraram para nós que não temos conhecimento que é possível minerar sem agredir o meio ambiente e sem cometer crime, com reaproveitamento dos resíduos. Deputado Zé Silva, nós somos da área rural e conhecemos a nossa realidade. Gostaria inclusive que esses resíduos fossem usados nas estradas vicinais rurais, que estão todas abandonadas. Principalmente neste período chuvoso, as nossas estradas estão um caos. Quero parabenizar os três expositores, porque mostraram para nós aqui que há um caminho possível, apontaram soluções, e é isso que nós queremos.
Esta Comissão não pode parar, com a sensação, como o Deputado disse, de que a imprensa nos calou. Nós não podemos nos calar. Com imprensa ou sem imprensa, Deputado Rogério, Deputada Áurea e colegas aqui presentes, nós vamos continuar neste trabalho.
Eu quero concordar com o que foi dito em relação à propaganda enganosa da Vale. Eu fiquei chocado. Nela, a Vale se mostra como uma santa, como se fosse trazer a redenção. A empresa comete um crime brutal daqueles e coloca no ar essa propaganda, achando que nós somos, no mínimo, trouxas.
Eu concordo também com a posição encaminhada por V.Exa. neste dia.
Fiquei preocupado com o número apresentado pelo Denes: 500 milhões de toneladas por ano. Quero mencionar que estive em visita a Conceição do Mato Dentro. Lembro a grande luta que travamos lá, representando os agricultores. A EMATER local estava conosco naquele empreendimento. Nós estávamos segurando a peteca quando vimos uma senhora analfabeta com mais de 70 anos. Foi construído um mineroduto pegando água potável para levar minério lá para o oceano. Concordo com o Deputado Newton Cardoso Jr: isso tinha que ser transformado. Na época, a senhora disse: "Com essa água que vocês estão levando, vocês podiam devolver a nossa água aqui". A lei existe para o pequeno produtor. Então, precisa haver benevolência.
13:08
RF
Agora, eu consigo entender, Deputada Áurea, como as empresas fazem lobby para agilizar os licenciamentos ambientais. Elas pintam um quadro para quem está naquele conselho de que tudo aquilo funciona. Mas, com a exposição brilhante de três expositores aqui, ficou claro que se trata de subsídio. Eu, que não tive oportunidade nem de pensar em ser engenheiro, agora tenho mais consciência para representar melhor e com mais ênfase a nossa sociedade, sem com isso querer proibir o funcionamento de empreendimentos em Minas e no Brasil.
Era só isso.
Parabenizo esta Comissão e desejo que ela continue prestando o brilhante trabalho que tem feito aqui.
Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Zé Silva. SOLIDARIEDADE - MG) - Obrigado, Deputado Vilson da Fetaemg.
Agradeço a presença da Sra. Fernanda Perdigão, que é do Distrito de Córrego Ferreira, em Brumadinho. Para as pessoas que estão nos acompanhando pela Internet, quero informar que ela representa duas entidades: Abrace a Serra e Comitê Popular da Zona Rural de Brumadinho. Nós vamos ouvi-la durante 3 minutos e, em seguida, passaremos imediatamente para as respostas e para as considerações finais dos expositores.
A SRA. FERNANDA PERDIGÃO - Obrigada. Boa tarde a todos os presentes.
Eu quero começar parabenizando esta importante Comissão pela iniciativa. Na pessoa do Sr. Coordenador, o Deputado Zé Silva, cumprimento os demais presentes. Agradeço também ao Sr. Deputado André Janones. Ontem tivemos uma vitória com relação ao Ministro do Turismo. Foi uma conquista bem significativa para Brumadinho, que está tão ameaçado. As redes hoteleiras, os restaurantes e o comércio vêm sofrendo, principalmente pelo que sai na mídia. Brumadinho está sendo tachado como uma cidade com contaminação em seus rios, águas, solo. Pequenos agricultores não conseguem mais comercializar os seus produtos por essa discriminação generalizada. Acredito que muitos aqui conhecem a região e sabem que Brumadinho tem um território extenso e que nem toda a cidade utiliza essa água.
13:12
RF
Infelizmente, além do impacto da lama nas regiões afetadas, como o Córrego do Feijão e o Parque da Cachoeira, também existe um impacto incalculável, que é o emocional. São fornecidas informações picadas na região. Principalmente na zona rural, a qual represento aqui através do Comitê Popular, a falta de informação é generalizada. Em relação ao tal cadastro para recebimento do salário mínimo, por exemplo, que está sendo divulgado a cada instante pela empresa, existe uma falha gigantesca de comunicação. Nós temos uma particularidade em Brumadinho. Há vários distritos, alguns distantes, e isso tem gerado de certa forma pânico na região, por não se saber se vai se conseguir fazer esse recebimento. Então, eu queria deixar isso dito aqui e, se possível, registrado, para sejam fornecidas de forma eficiente informações com relação a esse cadastramento, porque isso está gerando muito transtorno a essa população.
Hoje nós também não sabemos a realidade do impacto ambiental na região e pedimos, como através do Ministro do Turismo foi solicitado, que sejam fornecidas informações precisas quanto a isso, para que as pessoas que desejam conhecer e frequentar Brumadinho possam fazê-lo sem medo de contaminação.
Com relação ao cadastramento, há algo bem sério acontecendo. Ele está sendo foco de utilização para campanha política. Estão sendo entregues documentos particulares para possíveis candidatos, inclusive alguns que atualmente já ocupam cargos eletivos. A população está entregando toda a documentação ao primeiro que aparece na frente, recebendo informações às vezes equivocadas sobre a data-limite para o cadastramento para o recebimento dessa doação.
Também há necessidade de programas e planejamentos relativos à utilização da agricultura familiar sustentável. Existem vários projetos. Pequenos agricultores estão perdendo realmente a sua produção por essa discriminação com relação ao solo e à água de Brumadinho.
No mais, quero agradecer muito pela oportunidade da fala. Espero realmente que este trabalho da Comissão continue, que as atividades não cessem como vem cessando na mídia a divulgação dos impactos desse crime.
Agradeço a todos os presentes. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Zé Silva. SOLIDARIEDADE - MG) - Obrigado, Fernanda.
O Sr. Francisco, que é do CONAMA, insiste em falar. Sr. Francisco, nós queremos ouvir as pessoas, só que eu preciso de um planejamento e tenho que seguir o Regimento. A Fernanda falou porque o Deputado requereu isso com antecedência. Depois de ouvir os expositores, porque alguns terão que se deslocar, eu vou ouvir carinhosamente o senhor. Eu só peço ao senhor que fique bem tranquilo. Eu agradeço inclusive a compreensão do senhor. Nós queremos ouvi-lo com tranquilidade.
Eu quero agradecer ao Prefeito Carlos Alberto, de Arinos, no noroeste de Minas, uma pessoa competente, que está aqui em Brasília com uma grande comitiva. Agradeço ao Prefeito e a toda a equipe que o está acompanhando, junto com o Tiago Martins.
Senhoras e senhores, vou passar a palavra aos convidados para as respostas às interpelações feitas pelos Parlamentares, começando pelo Sr. Sidney, já que nós tivemos problemas de horário e ele vai ter que se ausentar em breve para não perder o voo de retorno.
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Zé Silva. SOLIDARIEDADE - MG) - Pois não, Deputado Vilson.
O SR. VILSON DA FETAEMG (PSB - MG) - Sobre a grande audiência que V.Exa. pretende fazer para dar visibilidade ao tema, quero só deixar registrado, como falei com V.Exa., que a minha federação pode fornecer dois ônibus para trazer o pessoal para cá, para fazer massa e mostrar que não estamos quietos.
13:16
RF
O SR. PRESIDENTE (Zé Silva. SOLIDARIEDADE - MG) - Obrigado, Deputado Vilson. Esse apoio da federação será fundamental.
Tem a palavra o Sr. Sidney Nicodemos.
O SR. SIDNEY NICODEMOS - Quero agradecer a todos os Deputados e Deputadas pelos comentários sobre a modesta contribuição que pudemos trazer aqui. Respondo agora aos questionamentos na ordem em que foram feitos.
O Deputado Zé Silva perguntou sobre os grandes volumes gerados na extração de alguns minerais, inclusive em relação ao ouro, à bauxita e ao alumínio. A quantidade é gigantesca. O minério de ferro está cada vez mais escasso em Minas Gerais. Então, os volumes gerados crescem numa proporção geométrica, à medida que o teor de óxido de ferro diminui. No caso do ouro, por exemplo, a proporção é da ordem de alguns gramas para toneladas de resíduos. Quanto à bauxita, a escala é um pouco menor, mas também são proporções gigantescas de volume. No caso do minério de ferro, que é o nosso foco, para 1 tonelada de minério sinter feed ou pellet feed, é gerada pelo menos 1 tonelada de resíduos, quer dizer, para os 500 milhões a que o Marcelo se referiu, geram-se pelo menos outros 500 milhões, totalizando os 2,5 bilhões de toneladas de resíduos que geramos.
Sobre o uso na agricultura, vemos isso com muito bons olhos, porque, depois da área de construção civil, o setor que mais demanda e que é a nossa maior vantagem competitiva é o setor agrícola. Então, a caracterização físico-química desses resíduos tem, sim, uma aplicabilidade alta no setor agrícola.
A criação de legislação de incentivo é uma porta de entrada, como o nobre Deputado falou. Creio que, nessa linha, basta simplesmente não cobrarmos impostos sobre esses produtos de reúso, essas matérias-primas de segunda geração.
A Deputada Áurea perguntou a respeito da reutilização dos resíduos. Eu concordo com ela, mas penso que, após essa reutilização, deve-se fazer a utilização dos espaços com empreendimentos do aparelho público para outros fins, como educação, lazer, etc. Como o Deputado Rogério citou, a exemplo de outras aplicações, é obrigação da empresa, junto com a academia, com as empresas e com organizações não governamentais que cuidam desse projeto, encontrar novas aplicações para esses resíduos.
Acho que já falamos sobre a aplicação na pavimentação de rodovias vicinais, como o Deputado Vilson mencionou. Considero que essa é uma das aplicações mais importantes que podemos fazer de cunho ambiental e social. Sabemos que as estradas de Minas Gerais estão bastante complicadas.
O SR. PRESIDENTE (Zé Silva. SOLIDARIEDADE - MG) - Obrigado, Prof. Sidney.
Dando prosseguimento, passo a palavra ao Prof. Denes.
O SR. DENES MARTINS DA COSTA LOTT - Quero agradecer a presença aos Deputados, que estavam atentos às nossas manifestações, e lembrar que a questão da mineração, especialmente das cidades mineradoras, clama por uma atuação desta Casa Legislativa. O soterramento que ameaça Itabira, Congonhas, Conceição do Mato Dentro, São Gonçalo do Rio Abaixo e outras cidades seria tão grande quanto os que vitimaram Brumadinho e Mariana. Então, precisamos de novas legislações, sem perder de vista a atuação da sociedade como um todo.
13:20
RF
Muito obrigado. Desejo um bom trabalho a todos na continuidade das atividades desta Comissão. Boa tarde.
O SR. PRESIDENTE (Zé Silva. SOLIDARIEDADE - MG) - Obrigado, Dr. Denes.
Em seguida, falará o Dr. Marcelo Augusto Martins Neto.
Antes, quero agradecer à comitiva do Prefeito Carlos Alberto, que conta com o Vereador William Professor, a Primeira-Dama Louise, o competente Secretário que cuida dos projetos e o engenheiro Iago. É uma comitiva competente. Muito obrigado.
Tem a palavra o Dr. Marcelo.
O SR. MARCELO AUGUSTO MARTINS NETO - Inicialmente, quero agradecer aos Deputados e Deputadas não a presença, mas o seu trabalho. Esta iniciativa é muito importante. O problema é gigantesco daqui para frente. O problema é muito grave, mas não vamos resolver tudo de uma vez. Então, ranquear e estabelecer prioridades é fundamental.
Insisto em dois pontos, os quais tentei transmitir às senhoras e aos senhores. O primeiro ponto é a cadeia primária, que é função da escala. Se não houver a disponibilização de insumos, a partir de uma rota industrial simples e sustentável economicamente, toda a outra cadeia, todas as possibilidades de utilização de resíduos de rejeitos de mineração não vão se viabilizar do ponto de vista técnico e comercial. É importante o ponto de vista comercial também, porque o mercado tem que absorver, tem que estar dentro das normas técnicas da ABNT, e, para isso, a cadeia primária é essencial.
O conceito de polos de material de construção sustentável é abrangente e muito interessante, porque parte do princípio de que se têm uma cadeia primária e uma cadeia secundária. Há desdobramentos muito interessantes do ponto de vista de infraestrutura para os Municípios do entorno onde esses polos serão instalados, na medida em que as indústrias vão estar ali. As indústrias da cadeia secundária, por exemplo, as que fabricam blocos, podem ser criadas via cooperativismo, não sendo necessário montar uma empresa. Pode-se ter uma cooperativa de moradores locais, por exemplo. A UFMG, que é nossa parceira tecnológica, está disposta a fazer transferência de tecnologia e treinar o pessoal das comunidades. No caso da pavimentação de estradas, por exemplo, desenvolve-se a cadeia produtiva no âmbito local, regional, para viabilizar de fato o aproveitamento de rejeitos numa escala compatível com a geração, não só para fazer propaganda, mas para, de fato, gerar um impacto positivo para a sociedade.
Isso tudo é bacana, mas como pode acontecer? Uma legislação favorável é fundamental. É preciso uma legislação que incentive, que azeite, que lubrifique, que pavimente o caminho para que essas iniciativas tenham resultado. Eu me coloco à disposição para atender quem quiser tratar de detalhes quanto a isso. Obviamente o tempo é muito curto, mas estou à disposição, como enorme prazer. É uma enorme responsabilidade esta que assumo como mineiro e geólogo. Acho importante cada um chamar para si a responsabilidade de contribuir para esse tipo de iniciativa, que é fundamental.
Muito obrigado a todos.
O SR. PRESIDENTE (Zé Silva. SOLIDARIEDADE - MG) - Muito obrigado. Parabéns, Dr. Marcelo, pela exposição pragmática e objetiva.
Passo a palavra agora ao Relator, o Deputado Júlio Delgado.
O SR. JÚLIO DELGADO (PSB - MG) - Inicio pedindo escusas ao Marcelo; ao Denes, com quem falei agora; e ao Sidney, com quem falei quando se despediu aqui. Na legislatura passada, estivemos muito envolvidos na questão das denúncias e, hoje, com a prisão do ex-Presidente Temer e de um dos seus principais Ministros, nossa presença foi muito demandada também. Eu cheguei aqui para a nossa oitiva quando o Sr. Denes estava fazendo uso da palavra, mas fui chamado para justamente discutir estratégias com relação ao que ocorreu. Estive ausente, mas me senti muito bem representado, como sempre me sinto. Para mim, é uma honra ser substituído aqui pela Deputada Áurea, que tem dado uma contribuição muito grande.
13:24
RF
Deputado Vilson, Deputado Rogério e Deputada Áurea — o Deputado Janones estava aqui, mas teve que sair —, não posso falar em relação aos dois membros remanescentes, mas a nossa dedicação aqui é meio que um mea-culpa. Pelo menos eu, que venho da legislatura anterior — não posso dizer se os Deputados Zé Silva e Newton Cardoso Jr sentem a mesma coisa —, penso que talvez, se nós tivéssemos tido essa atuação, que foi enriquecida com as presenças da Deputada Áurea, do Deputado Rogério, do Deputado Janones e do Deputado Vilson, se tivéssemos feito o que estamos fazendo agora quando houve o acidente de Mariana, o desastre poderia ter sido minimizado. Não é que tenhamos alguma responsabilidade, mas a nossa dedicação total, somada à dos colegas que chegam à Casa neste mandato, demonstra o nosso objetivo neste primeiro momento. Como já disseram os Deputados Zé e Rogério, nós não temos como evitar o rompimento de novas barragens. Ontem mesmo houve uma sobrecarga numa outra barragem de processamento a úmido, o que demonstra claramente que não temos como evitar, mas queremos, por meio de uma legislação, minimizar os muitos riscos de isso voltar a acontecer, porque a reincidência em Brumadinho nos toca muito forte. Todos aqui sabem o que estamos dizendo, e é por isso a nossa dedicação.
Peço escusas neste momento aos três convidados. Já disse isto ao Marcelo, mas gostaria de dizer ao Sidney que a assessoria e a consultoria desta Casa, com muita competência, elaboram alguns questionamentos que eu pretendia fazer. Então, eu vou passá-los a todos, através da nossa Secretaria, para que vocês possam colaborar com a Comissão. As respostas a esses questionamentos fariam parte da relatoria, mas esses são questionamentos de toda a Comissão.
E quero dizer que também concordo com o que definimos de calendário, com a proposição do Deputado Newton, do Deputado Vilson e da Deputada Áurea sobre quando nós vamos apresentar o nosso trabalho. Ontem, tivemos um bom papo com a consultoria. Vamos apresentar o nosso trabalho de modo bastante consistente, para que depois possamos contar com a colaboração do restante da bancada mineira e dos Líderes para aprovarmos e votarmos isso nos meses de abril e maio, sem o comprometimento de outras ações de responsabilidade da Casa.
Agradeço ao Presidente e peço novamente desculpas à Comissão, a todos, principalmente aos convidados, reiterando que as perguntas que vamos fazer são questionamentos elaborados pela consultoria da Casa e da nossa Comissão. Agradeço a todos convidados.
E quero dizer à Fernanda que, na semana passada, quando fomos a Brumadinho, me chamou atenção que, enquanto estávamos fazendo o debate, passavam por quem estava lá três ou quatro pessoas com listas para pegar nome, endereço e telefone dos presentes. Se existia uma lista elaborada pela Câmara, essas outras não eram necessárias. Então, sabíamos que havia gente interessada em fazer isso. Pode ter certeza de que nós, pelo menos, queremos atender a todos, sem distinção. Eu não tenho essa lista — o Presidente não tem, nenhum membro da Comissão tem. Nós acreditamos que é por meio de um atendimento coletivo que se faz isso. Entre outras preocupações que foram levantadas lá e aqui, cito principalmente uma reivindicação que foi feita, salvo engano, pelo Deputado Newton e pelo Deputado Janones, no sentido de nós elaborarmos um estudo sobre a qualidade da água, porque não adianta botar poço artesiano se a água no lençol estiver contaminada. Precisamos fazer esse levantamento.
13:28
RF
Com base nesses questionamentos todos, satisfatórios ou não, nós estamos elaborando um documento que vamos entregar à Vale e encaminhar também ao Ministério Público, para que este possa acompanhar as demandas que vêm de Brumadinho, de Barão de Cocais e dos outros locais que estamos visitando.
Então, pode ter certeza de que, da nossa parte, há uma atenção total no sentido de dar prosseguimento e atender as demandas. Com relação a Brumadinho, especificamente, demanda-se que não haja a diminuição do contingente de bombeiros nas buscas pelos que ainda estão desaparecidos nesse grave crime e que o IML e o Corpo de Bombeiros possam ter incrementados seu efetivo e maquinário, para que possam continuar incessantemente atendendo aqueles que ainda buscam parentes desaparecidos. Em relação a essa demanda, cabe a nós o dever de fazer a cobrança ao Governo de Minas e à empresa responsável pelo grave crime cometido.
Agradeço ao Presidente e a todos aqui.
O SR. PRESIDENTE (Zé Silva. SOLIDARIEDADE - MG) - Obrigado, Deputado Júlio Delgado.
Tem a palavra o Deputado Newton Cardoso Jr, por 1 minuto.
O SR. NEWTON CARDOSO JR (Bloco/MDB - MG) - Deputado Zé Silva, mais uma vez, muito obrigado. Serei muito breve.
Apenas fazendo um comentário à parte, quero dizer que me sinto grato por ter escutado as apresentações de hoje, pois voltei à cadeira do curso de especialização em siderurgia que fiz na UFOP há pouco mais de 10 anos. Estou muito alegre em poder escutar novamente os termos e temas que foram estudados.
Mas, como Presidente da Comissão de Turismo, é minha obrigação relatar aqui que o Município de Brumadinho, que tem um fortíssimo apelo turístico e é um polo fundamental de atração de turistas em Minas Gerais, contribuindo com Ouro Preto, Tiradentes e tantas outras regiões turísticas do Estado, está completamente comprometido. Eu quero desde já colocar a Comissão de Turismo à disposição para colaborar com os trabalhos desta Comissão, para implementarmos, em parceria, soluções para a retomada, não apenas nos distritos, mas em todo o Município, de toda a pujança turística que lá existia.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Zé Silva. SOLIDARIEDADE - MG) - Obrigado, Deputado Newton Cardoso Jr.
Tem a palavra o Deputado Rogério Correia, por 30 segundos.
O SR. ROGÉRIO CORREIA (PT - MG) - Serei rápido. Eu me esqueci de tratar de uma questão relacionada ao Rio São Francisco.
Estive ontem na reunião da Frente Parlamentar Ambientalista com a responsável por esse assunto na SOS Mata Atlântica, a Malu, que também já esteve aqui com a gente. Ela nos disse que eles já tinham um estudo mostrando que, infelizmente, a presença de metais pesados já havia sido detectada em Três Marias, na Bacia do Rio São Francisco. Eu poderia fazer contato com a SOS Mata Atlântica, pedindo-lhe que traga um quadro do São Francisco, porque as pessoas de lá também estão querendo notícias, e que nos diga qual contribuição nós podemos dar para a Bacia do São Francisco, especialmente Três Marias. Então, era esta a sugestão: que ela venha aqui em uma das duas próximas reuniões. Eu faria contato com ela.
13:32
RF
O SR. PRESIDENTE (Zé Silva. SOLIDARIEDADE - MG) - Deputado Rogério, está acatada a sua sugestão.
Antes do encerramento, eu queria pedir licença à consultoria para ouvirmos o Sr. Francisco Rodrigues Soares, da Fundação Rio Parnaíba. O Sr. Francisco trabalha no CONAMA há 20 anos e representa a Região Nordeste naquele Conselho. Não estava prevista a sua fala, mas, pela contundência dele ao pedir para falar, vou lhe conceder um tempo.
Sr. Francisco, o tema aqui é exclusivamente barragem de mineração. Esse é o assunto. A Casa não permite este tipo de participação, mas, respeitosamente, nós vamos ouvi-lo. O senhor tem 2 minutos.
O SR. FRANCISCO RODRIGUES SOARES - Boa tarde a todos. Quero parabenizar esta Comissão por esta grande iniciativa.
Sou Conselheiro do CONAMA há mais de 20 anos e ambientalista há mais 50 anos, representando sempre a sociedade civil. O País tem vários problemas ambientais do País, mas o caso de Brumadinho não pode ser considerado um desastre, mas, sim, uma catástrofe ambiental, a maior catástrofe ambiental do Brasil, com mais de 300 óbitos, com impacto na Bacia do Rio Paraopeba pela contaminação por metais pesados, que vai chegar até a Bacia do Rio São Francisco. Mas o que eu quero dizer para o senhor é que Brumadinho pode ser considerado hoje a nossa Chernobil. Brumadinho é a nossa Chernobil, devido às tantas mortes que aconteceram e aos impactos na Bacia do Rio Paraopeba, que podem chegar ao Rio São Francisco.
O CONAMA se reuniu ontem, e o caso de Brumadinho foi tratado. Nós, que já estávamos preocupados há muito tempo com o rompimento da barragem de Fundão, em Mariana, começamos a apresentar propostas para que fosse incluída no Regimento Interno do CONAMA, que vai sofrer uma mudança agora, a participação de um representante do Movimento dos Atingidos por Barragens, porque neste País há pessoas atingidas não só por barragens de rejeito, mas também por barragens de hidrelétricas e de abastecimento de água do DNOCS, no Nordeste, região onde só não está havendo maiores catástrofes por causa da seca e da estiagem. Esta semana mesmo, ficamos sabendo que há uma barragem em Ubajara cujas paredes estão quase se rompendo.
Temos que ter uma política séria de preservação e de segurança das barragens, seja do DNOCS, seja de rejeitos. Então, na mudança nas câmaras técnicas que tratam da Lei de Resíduos Sólidos, Presidente, nós propusemos que também fosse incluída na Lei de Resíduos Sólidos, que trata de rejeitos de mineração no Brasil, a determinação de que o CONAMA discuta resoluções para coibir esse tipo de licenciamento ambiental para barragens, porque as pessoas estão dormindo ao lado de uma bomba atômica. Minas Gerais dorme ao lado de uma bomba atômica, porque, além de Fundão, Mariana e Brumadinho, há outras barragens que podem se romper a qualquer momento.
O que houve em Brumadinho foi o maior desastre ambiental do Brasil. Vi o acidente com césio-137 em Goiânia, o derramamento de petróleo pela Chevron na Bacia de Campos e também o caso de Mariana, mas o caso de Brumadinho não é um desastre, é uma catástrofe ambiental, a maior do País, com mais de 300 óbitos.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Zé Silva. SOLIDARIEDADE - MG) - Obrigado, Sr. Francisco. Já que o senhor disse que este desastre não é só de Minas, mas de todo o Brasil, deixo só registrado para a história que, lá do Piauí, o impacto veio pelo Rio Parnaíba e, depois, pelo Rio São Francisco, até chegar à Barra do Guaicuí, onde o Rio das Velhas se encontra com o Rio São Francisco. Então, nós agradecemos e ficamos felizes com a contribuição do senhor.
13:36
RF
Nada mais havendo a tratar, convoco reunião de audiência pública e deliberação de requerimentos para o dia 26 de março de 2019, terça-feira, às 13 horas, neste plenário.
Esta encerrada a presente reunião. Muito obrigado a todos.
Voltar ao topo